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Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino, na Pesquisa e na Extensão Região Sul 1 INTERDISCIPLINARIDADE COMO FOCO EM UMA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMIÍLIA (ESF) DO INTERIOR DO PARANÁ Patrícia Chiconatto Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário UNICENTRO, [email protected] Agostinho Vanderlei Basso Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário UNICENTRO, [email protected] Diulia Gomes Klossowski Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário UNICENTRO, [email protected] Marcia Ansolin Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário UNICENTRO, [email protected] Priscila Molinari Mello Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário UNICENTRO, [email protected] Vania Schmitt Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário UNICENTRO, [email protected] Jáima Pinheiro de Oliveira Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário UNICENTRO, [email protected] Cristiana Magni Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário UNICENTRO, [email protected] Rafael Siqueira de Guimarães Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário UNICENTRO, [email protected] Eixo temático: Conhecimento Interdisciplinar Introdução A expansão e a qualificação da Atenção Básica, organizada pela Estratégia Saúde da Família (ESF), faz parte do conjunto de políticas prioritárias apresentadas pelo Ministério da Saúde e aprovadas pelo Conselho Nacional de Saúde. A antiga concepção de trabalho era centrada exclusivamente no tratamento da doença. Atualmente, procura-se desenvolver práticas gerenciais e sanitárias, democráticas e participativas, onde ocorra trabalho em equipes voltado ao cuidado integral (BRASIL, 2013). Diante disso, é necessária uma reciclagem da prática, conceitual e histórica, que possibilite o desenvolvimento de um trabalho interdisciplinar. Cardoso & Nascimento (2010) apontam as dificuldades encontradas na construção de uma proposta interdisciplinar na área da saúde, como a relação do saber-poder disciplinar que aprisiona o conhecimento em compartimentos, a formação especialista nas instituições de ensino, o processo de trabalho fragmentado em campos específicos que se materializa nas diversas profissões que compõe a área da saúde.

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Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino,

na Pesquisa e na Extensão – Região Sul

1

INTERDISCIPLINARIDADE COMO FOCO EM UMA ESTRATÉGIA SAÚDE

DA FAMIÍLIA (ESF) DO INTERIOR DO PARANÁ

Patrícia Chiconatto Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário – UNICENTRO, [email protected]

Agostinho Vanderlei Basso Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário – UNICENTRO, [email protected]

Diulia Gomes Klossowski Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário – UNICENTRO, [email protected]

Marcia Ansolin Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário – UNICENTRO, [email protected]

Priscila Molinari Mello

Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário – UNICENTRO, [email protected]

Vania Schmitt Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário – UNICENTRO, [email protected]

Jáima Pinheiro de Oliveira Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário – UNICENTRO, [email protected]

Cristiana Magni Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário – UNICENTRO, [email protected]

Rafael Siqueira de Guimarães Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário – UNICENTRO, [email protected]

Eixo temático: Conhecimento Interdisciplinar

Introdução

A expansão e a qualificação da Atenção Básica, organizada pela Estratégia Saúde da Família (ESF),

faz parte do conjunto de políticas prioritárias apresentadas pelo Ministério da Saúde e aprovadas pelo

Conselho Nacional de Saúde. A antiga concepção de trabalho era centrada exclusivamente no tratamento da

doença. Atualmente, procura-se desenvolver práticas gerenciais e sanitárias, democráticas e participativas,

onde ocorra trabalho em equipes voltado ao cuidado integral (BRASIL, 2013). Diante disso, é necessária

uma reciclagem da prática, conceitual e histórica, que possibilite o desenvolvimento de um trabalho

interdisciplinar. Cardoso & Nascimento (2010) apontam as dificuldades encontradas na construção de uma

proposta interdisciplinar na área da saúde, como a relação do saber-poder disciplinar que aprisiona o

conhecimento em compartimentos, a formação especialista nas instituições de ensino, o processo de trabalho

fragmentado em campos específicos que se materializa nas diversas profissões que compõe a área da saúde.

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Diante do exposto, o objetivo do trabalho em questão é investigar o conhecimento interdisciplinar dos

profissionais com relação ao seu ambiente de trabalho durante o primeiro semestre de 2013.

Justificativa do eixo escolhido

Devido as atuais discussões a respeito da interdisciplinaridade e à necessidade relatada pela

enfermeira chefe de uma ESF do interior do Paraná em relação a esta temática, com base na necessidade de

capacitação de sua equipe, um grupo de alunos do Mestrado Interdisciplinar em Desenvolvimento

Comunitário da UNICENTRO, elaborou uma proposta de investigação voltada à interdisciplinaridade na

relação entre os profissionais de uma ESF. O objetivo foi verificar os saberes e as práticas destes

profissionais com relação ao trabalho interdisciplinar.

Objetivos

Objetivo Geral:

Organizar uma consulta com os profissionais de saúde de uma Estratégia Saúde da Família

(ESF), em determinadas áreas (saúde, educação, condição social e afins), levando em conta

seus conhecimentos prévios.

Objetivos Específicos:

Verificar junto aos profissionais de saúde como ocorre a prática do controle social no SUS

como meio de proporcionar melhoria às condições de saúde para a comunidade local

atendida;

Verificar o conhecimento dos profissionais sobre Neoplasia e proporcionar uma reflexão

sobre prevenção e cuidados da referida doença;

Verificar o conhecimento sobre a cobertura vacinal, em menores de dois anos, contra a

Influenza e H1N1, no período da campanha do ano de 2013;

Verificar a percepção dos profissionais de saúde em relação aos benefícios e ao controle do

atendimento para beneficiários do Programa Bolsa Família;

Verificar os saberes e as concepções sobre o tema alimentação saudável;

Verificar o conhecimento sobre a prática da interdisciplinaridade na oferta de serviços à

comunidade e como ocorre sua concretização.

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Metodologia

A pesquisa apresenta como percurso metodológico a pesquisa qualitativa, com observação

participante, através de reuniões e questionários semi-dirigidos. O estudo ocorreu numa Unidade Básica de

Saúde, localizada em uma cidade do interior do Paraná, com participação dos profissionais da saúde da

Estratégia Saúde da Família (ESF).

Ao considerar que a metodologia de um trabalho científico é essencial e deve encaminhar os

impasses teóricos para a prática cotidiana, esta pesquisa qualitativa preocupou-se com o que não pode ser

quantificado, na tentativa de compreender valores culturais e a representação de um grupo, por meio das

relações dos atores sociais dentro de uma instituição e para avaliação das políticas públicas e sociais

(MINAYO, 2004).

Minayo (2004, p. 13) comenta que ao se trazer o debate qualitativo para o campo da Saúde

“presencia-se o eclodir de questões semelhantes às do âmbito maior das Ciências Sociais.” Segundo a

autora, sua especificidade necessita de uma abordagem que compreenda para transformar, como a teoria,

que ao ser desafiada pela prática, pensada de modo permanente.

A primeira etapa constou de uma reunião com toda a equipe da ESF, em horário definido pela

enfermeira chefe do local, a fim de expor os objetivos da pesquisa. A investigação teve início com uma

observação participante que, segundo Spradley (1980) apud Correia (2009), não é realizada uma simples

descrição da situação, mas abrange fatos reais, dando sentido, orientação e dinâmica para cada fato.

A segunda etapa constou da aplicação de um questionário semi-dirigido, com assuntos relacionados

ao trabalho interdisciplinar. As questões abordadas no questionário foram:

Caracterização do grupo (gênero, escolaridade, profissão/função e tempo de trabalho);

Câncer;

Vacinação em crianças menores de 02 anos;

Concepção de alimentação saudável;

Controle social no SUS e conselho municipal de saúde;

Programa Bolsa Família;

Interdisciplinaridade.

As respostas ao questionário foram organizadas para uma análise qualitativa, , procurando observar a

realidade e a percepção do grupo, no momento, em relação às questões pesquisadas.

A terceira e última etapa constou de uma reunião para um feedback aos profissionais participantes.

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Resultados e Discussão

De acordo com os dados obtidos, elencaram-se temas vistos como necessários à capacitação desses

profissionais, como forma de um plano de ação fornecido à chefia do local pesquisado.

A Tabela 1 mostra as informações pertinente ao perfil dos participantes da pesquisa. Profissionais do

sexo feminino foi a grande maioria e com relação ao nível de escolaridade, 75% deles Um possuem curso

técnico ou especialização.

Tabela 1. Caracterização do perfil dos profissionais de saúde da ESF Variáveis n Frequência

(%) N = 16

Frequência Acumulada (%)

Gênero

Feminino 13 81,25 81,25

Masculino 3 18,75 100,00 Escolaridade

Fundamental completo 1 6,25 6,25

Médio completo 2 12,5 18,75

Curso técnico 8 50 68,75

Especialização 4 25 93,75

Mestrado 1 6,25 100,00 Profissão

Enfermeiro 1 6,25 6,25

Técnico em enfermagem 5 31,25 37,50

Técnico em saúde bucal 2 12,5 50,00

Médico 1 6,25 56,25

Zeladora 1 6,25 62,5

Agente Comunitário de Saúde 4 25 87,5

Cirurgião dentista 2 12,5 100,0 Tempo de trabalho na profissão

<1 ano 1 6,25 6,25

1 a 5 anos 6 37,50 43,75

5 a 10 anos 5 31,50 75,00

10 a 15 anos 1 6,25 81,25

>15 anos 2 12,5 93,75

Não respondeu 1 6,25 100,00

Os pontos levantados no questionário foram elencados para discussão.

Interdisciplinaridade

Mediante as respostas dos participantes, a maioria (n=13) entende o que é interdisciplinaridade.

Porém, quando o questionamento se desdobra para a sua presença ou ausência no serviço de saúde,

houveram algumas contradições em seus discursos. Mesmo assim, muitos responderam que ela não ocorre.

Portanto, podemos dizer que a interdisciplinaridade, como conceito e como ação, não faz parte do

entendimento dos profissionais de saúde desta ESF. Consideramos que há benefícios de um trabalho

interdisciplinar, sendo uma necessidade da comunidade. Segundo Vilela e Mendes (2003, p. 527) “a

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interdisciplinaridade é fundamentalmente um processo e uma filosofia de trabalho que entra em ação na hora

de enfrentar os problemas e questões que preocupam cada sociedade”.

Ao questionar se a interdisciplinaridade ocorre no ambiente de trabalho deles, a resposta abaixo

retrata um posicionamento de saber o que é interdisciplinaridade, mas ao mesmo tempo revela que não está

incorporada em sua prática cotidiana.

“Não. Muitas vezes o profissional que desempenha certa função não repassa o que

sabe. Se você quiser saber tem que ir atrás”.

Câncer

Em relação ao Câncer, podemos considerar que o conjunto de aspectos que caracterizam os

conhecimentos de profissionais que trabalham na área da saúde sobre a neoplasia é um dado importante a ser

destacado pois, geralmente, pacientes com este diagnóstico fazem parte da rotina de qualquer unidade desta

natureza, quer seja, clínicas, hospitais, laboratórios, ESFs, entre outros.

Para que estes pacientes sejam atendidos de forma adequada, é necessário que um aporte teórico e

prático sobre esta doença, faça parte do repertório de conhecimentos do profissional de saúde,

principalmente em uma esfera interdisciplinar de integração entre todos os profissionais que atuam na

unidade em que o portador de câncer é atendido.

Estudos efetuados para se verificar a contribuição da interdisciplinaridade nestes ambientes e para

pensar as relações de trabalho, analisando a contribuição destas experiências na constituição de formas

novas de organização do trabalho em saúde, têm contribuído para que isto aconteça. Matos et al (2010)

efetuaram um estudo dessa natureza em dois hospitais públicos do sul do Brasil, sendo que, uma equipe

atende pacientes com câncer e outra presta cuidados a idosos. Os resultados da pesquisa mostram que a

perspectiva interdisciplinar auxilia na melhora das relações de trabalho entre os profissionais e na relação

com os doentes e suas famílias, ao aproximar os profissionais das necessidades dos doentes, contribuindo

para um aumento na qualidade do atendimento.

Porém, para que estas ações sejam realmente efetivas, reforçamos ser necessário um conhecimento

efetivo do profissional, que possa atender a todas as necessidades do doente com câncer e contribuir para

uma assistência de melhor qualidade. Conhecimento este que deve se estender no que concerne à prevenção

e cuidados. Ao proporcionar uma reflexão sobre prevenção e cuidados sobre o câncer entre os participantes,

foi possível observar a fragilidade na explanação dos saberes sobre esta temática, assim como nas

colocações com relação ao cuidado e acolhimento dos doentes com câncer, o que permitiu elencar esta

temática para a oferta de uma capacitação. Isto demonstra a responsabilidade dos profissionais com relação

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ao acolhimento do paciente, à medida que se interessam em adquirir maiores conhecimentos em uma

formação continuada e interdisciplinar.

Se os profissionais carecem de conhecimento sobre o câncer, os usuários da UBS também deixam de

se beneficiar com informações úteis sobre a prevenção e os cuidados, as quais deveriam propiciar um

trabalho mais qualificado por parte dos integrantes da ESF e melhora na qualidade de vida dos doentes.

Na visão de Matos et al (2010) a prática interdisciplinar coloca-se como potencializadora da

integração que permitiria uma compreensão ampliada do objeto de trabalho em saúde, pela interação entre

os profissionais e a articulação entre os diversos saberes e fazeres presentes no trabalho em saúde,

possibilitando deste modo outras formas de relação entre os sujeitos envolvidos no processo.

Sendo assim, a questão da Interdisciplinaridade, traz à tona a importância da atuação dos

profissionais visando práticas e saberes, englobando aspectos sociais, culturais, de saúde, educacionais, entre

outros. A partir destes saberes é possível verificar as necessidades específicas para o desenvolvimento

comunitário, reforçando a estrutura social e contribuindo com o ambiente à sua volta.

Segundo Morin (2003.p. 97)

[...] um modo de pensar, capaz de unir e solidarizar conhecimentos separados, é capaz de se desdobrar

em uma ética da união e da solidariedade entre humanos. Um pensamento capaz de não se fechar no

local e no particular, mas de conceber os conjuntos, estaria apto a favorecer o senso da

responsabilidade e o da cidadania.

Segundo Minayo (2004, p.15-16) “[...] saúde e doença exprimem agora e sempre uma relação que

perpassa o corpo individual e social, confrontando com as turbulências do ser humano enquanto ser total.

Saúde e doença são fenômenos clínicos e sociológicos vividos culturalmente [...]”. Estes profissionais

buscam seguir um caminho de construção do conhecimento, pelo qual, segundo Minayo (2004) se exercita a

apreensão, a crítica e a dúvida. Somente assim, a prática interdisciplinar envolvendo trabalho em saúde,

poderá favorecer o vínculo, o acolhimento, o acesso e a integralidade do cuidado dentro de um sistema de

saúde mais efetivo

Cobertura vacinal

Em relação à Influenza, é uma doença respiratória infecciosa, transmitida por vírus e de interesse

para a Saúde Pública Brasileira (BRASIL, 2013). De acordo com dados de Cintra e Rey (2006) e também do

Ministério da Saúde (BRASIL, 2013), as crianças são disseminadoras ativas do vírus Influenza, excretando-

o mais facilmente e com maior carga viral, podendo ter complicações graves com morbidade significativa

associada a infecções do trato respiratório.

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Além desta grave complicação, vale ressaltar que gripes podem ser causas de otites, aumento de

consultas médicas, utilização de antibióticos, quadros de bronquite, falta das crianças na escola e falta dos

pais ao trabalho, entre outras. Há três anos, o Ministério da Saúde, ampliou a faixa de risco para a infância,

também para crianças entre 06 meses e 02 anos de idade, visando auxiliar no controle de surtos.

Assim torna-se importante verificar se ações específicas estão sendo desenvolvidas para esta faixa

etária e de que forma estão ocorrendo. Descrever a realidade pode ser muito interessante e de grande

colaboração pois, como afirma Minayo (2002, p. 15), “a realidade social é o próprio dinamismo da vida

individual e coletiva com toda a riqueza de significados dela transbordante”.

Com esta perspectiva de observação participante, foi possível analisar alguns apontamentos

contraditórios. Em relação à cobertura vacinal no município, apenas dois profissionais relatam ter

conhecimento, embora a Campanha da Gripe estivesse em sua etapa final há alguns dias antes desta reunião

com os participantes.

De acordo com a maioria dos profissionais, há resistência das mães em vacinar seus filhos menores

de 02 anos de idade, referindo medo e insegurança. Entretanto, ao analisarmos que o conhecimento em

relação à cobertura vacinal é escasso, como tomar como verdadeira a colocação de que há resistência por

parte das mães? Na cidade analisada, segundo dados do Ministério da Saúde, em 2013, foram vacinadas, até

o momento, 100% das crianças, ou seja, as mães tem a consciência de que é preciso vacinar seus filhos.

Segundo Minayo (2004), qualquer grupo, seja de mães ou de profissionais de saúde, tem seus segredos e sua

estratégia comportamental, podendo, então, ser uma idéia empírica essa resistência relatada pelos

profissionais.

Quanto ao tipo de Campanha específica para crianças, as respostas foram um tanto quanto

contraditórias também, pois alguns profissionais referem que “não há campanha específica”, outros que é

através dos Agentes Comunitários de Saúde, outros somente através de rádio ou apenas de cartazes.

As respostas conduzem a uma reflexão: como estará a relação dos profissionais em relação ao todo

da ESF e às ações propostas?. Como está o sentimento de pertencimento ao grupo, tão pensado por Bauman

(2003), parecendo haver um distanciamento de saberes que não se entrelaçam, caracterizando um

individualismo profissional. “Os saberes e as práticas só existem na medida em que são usados ou exercidos

por grupos sociais” e se entrelaçam (SOUZA SANTOS, p. 23, 2002).

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Concepção de alimentação saudável

Outra questão abordada consistiu na concepção de alimentação saudável por meio de perguntas

fechadas com assuntos pertinentes a alimentação, bem como uma questão aberta acerca de como os

entrevistados conceituavam alimentação saudável.

Com relação à concepção, a maioria dos profissionais de saúde tiveram um conhecimento satisfatório

sobre as noções básicas de alimentação saudável. No entanto, foi dada maior atenção à questão do conceito

de alimentação saudável, tendo em vista que os profissionais da saúde têm importante papel não só na

formação de hábitos alimentares, levando em conta somente uma perspectiva nutricional, mas também para

a contribuição de uma perspectiva sócio-cultural, possibilitando a coerência destes aspectos pré-existentes

na comunidade atendida pela ESF.

O duplo sentido de alimentação saudável e a ingestão de nutrientes e/ou grupos alimentares foram as

categorias mais marcantes apontadas pelos entrevistados. Destaca-se que a alimentação saudável toma um

duplo sentido quando observamos os seguintes relatos dos profissionais:

“... que fornece os nutrientes necessários ao desenvolvimento e manutenção de um

organismo saudável e isenta de componentes prejudiciais” ou “... alimentos com

pouca gordura, não ingerir enlatados...”.

Diante do interrogar sobre essa questão, não se pode esquecer que o profissional se relaciona com as

coisas do mundo objetivo, quer dizer, que tem seu trabalho técnico no centro de saúde (conceito ideal), e

com as realidades exteriores ao profissional, que por si mesmas não são objetos de seu trabalho (conceito

real). É nesse último conceito que Silva et al. (2002) refletem a respeito do quanto a compreensão sobre a

alimentação saudável se mostra complexa na linguagem, sobretudo em relação à vida dos profissionais.

Em se tratando dos nutrientes e/ou grupos alimentares como referências simbólicas do discurso dos

profissionais, exemplificadas como segue:

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“a que tem a maioria dos nutrientes necessários para cada indivíduo”,

“... contemple todos os nutrientes necessários para o organismo...”,

“...a alimentação saudável deve ter alimentos variados que tenham proteínas,

carboidratos, vitaminas e sais minerais...”

Nasce a concepção de uma alimentação saudável referida por nossos atores como uma soma de

nutrientes, valorizando o organismo e não o conteúdo humano, imperando o fato de que o corpo se alimenta

de nutrientes e não de alimentos. No entanto, é necessário ir além da concepção de alimento, na significação

de algo comestível que contém os nutrientes necessários à vida, atingindo a proporção de que o ato de comer

pode admitir diferentes significados, que dão sentido às ações sociais. Neste sentido, é imprescindível ir

além da Ciência da Nutrição (CN), a qual o alimento está relacionado às suas composições nutricionais,

tanto de micronutrientes (vitaminas e minerais) e macronutrientes (carboidratos, lipídeos e proteínas),

alcançando a significação das Ciências Sociais onde “a comida” merece um lugar de expressão social de um

grupo.

Corroborando com tais ações, Carvalho et al. (2011) apontam que o ato de alimentar não deve surgir

somente como uma função natural (biológica), mas sim como um aliado da natureza e da cultura, de tal

modo que a comida assuma sentidos e significados culturais (simbólicos).

Em suma, não se pode esquecer que o conhecimento científico contribui para alimentação, no entanto

ganha destaque os hábitos alimentares conjugados ao estilo de vida, apoiado nas condições sócio-culturais

que moldam a comunidade em questão.

Controle social no SUS e Conselho Municipal de Saúde

O controle social no âmbito do SUS é representado pelos Conselhos e Conferências de Saúde,

visando fortalecer as políticas de saúde, de forma a melhorar o atendimento da população, bem como,

garantir a saúde nos municípios brasileiros.

Conforme a Lei nº 8.142/90, os Conselhos de Saúde "atuam na formulação e proposição de

estratégias e no controle da execução das políticas de saúde, inclusive em seus aspectos econômicos e

financeiros" (BRASIL, 1990). Da mesma forma, a Resolução nº 333/2003, em sua primeira diretriz,

apresenta que “o Conselho de Saúde é um órgão colegiado, deliberativo e permanente do Sistema Único de

Saúde em cada esfera do governo, que consubstancia a participação da sociedade organizada na

administração da saúde, como subsistema da Seguridade Social, propiciando seu controle social" (BRASIL,

2003)

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Sendo assim, gerir a Saúde de forma eficaz é um desafio diário e necessita de estrutura, recursos

financeiros e, principalmente, capacidade de quem administra esta esfera complexa e tão necessária para

uma atenção adequada às necessidades específicas de cada população atendida, não deixando de levar em

conta as especificidades de cada local e região, sendo o Brasil um país de múltiplos enfoques.

Foi verificada pouca participação dos profissionais nos Conselhos de Saúde. O questionamento

quanto ao conhecimento transformou-se em esclarecimento, com a apresentação da importância destes

conhecimentos para a prática de trabalho diária dos participantes, seus direitos e deveres, bem como, da

população atendida pelos mesmos.

Programa Bolsa Família

A erradicação da pobreza e redução dos níveis de desigualdade no Brasil são metas de difícil

alcance em um prazo razoável, a menos que se recorra a mecanismos diretos de redistribuição de renda

(SOARES, et al, 2006).

O maior programa de transferência de renda atuante no Brasil é o Programa Bolsa Família (PBF),

criado em 2003. É considerado como o principal programa na esfera de combate à fome, à pobreza e às

desigualdades, estando associado à garantia e ao acesso aos direitos sociais básicos, sendo eles: educação,

saúde, segurança alimentar e assistência social. Além disso, tem permitido construir meios para que as

famílias beneficiadas possam sair da vulnerabilidade em que se encontram e possam ser emancipadas

(SILVA, 2007).

Um dos propósitos do PBF é promover a segurança alimentar e nutricional da população atendida,

isto ocorre pelo impulso que a renda fornece à alimentação familiar ou também por meio das ações de

atenção básica em saúde que integram o conjunto de condições a serem cumpridas pela família, tais como

monitoramento do crescimento e desenvolvimento infantil; assistência pré-natal; participação em atividades

educativas em saúde e o esquema de imunização (BURLANDY, 2007).

Sabe-se que para o acompanhamento das condicionalidades do programa, é necessário que estas

famílias frequentem unidades de saúde, por isso a importância de saber o que os profissionais, que atendem

esta população, pensam sobre o programa, visto que eles têm contato direto com a realidade que as

autoridades responsáveis pelo programa não acompanham.

Dentre os 16 indivíduos participantes da pesquisa, três entrevistados não souberam responder

quando questionados sobre quais controles de saúde são realizados com os beneficiários dentro da ESF. Isto

pode ser explicado pelo fato de terem sido abordados também funcionários que não participam deste

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processo. Os demais 13 participantes da pesquisa informaram realizar um ou mais procedimentos de

avaliação

A questão mais polêmica sobre o tema foi em relação à concepção que os profissionais possuem

sobre o PBF. Nesta etapa, apenas um participante não respondeu a questão.Nove profissionais apontaram

que, na sua concepção, o Programa Bolsa Família ajuda os beneficiários e cinco pensam que precisa haver

mais fiscalização no Programa para que o benefício seja utilizado da forma esperada. Um dos participantes

apontou apenas que precisa melhorar a fiscalização, não expondo seu ponto de vista sobre o tema. No total,

cinco demonstraram não estar contentes com o PBF, o que se torna explícito por meio de uma das respostas

obtidas.

“Entendo ser um programa necessário, porém a melhoria da qualidade de vida dos

beneficiários está relacionada à boa utilização dos recursos fornecidos e não

apenas à existência dos recursos. A fiscalização das reais necessidades das famílias

beneficiadas”.

Com base nas respostas obtidas, é possível verificar certa preocupação por parte dos profissionais da

área de saúde com relação ao conhecimento e à vivência que o Governo Federal possui sobre a realidade do

Programa. Além do acompanhamento das condicionalidades, os profissionais que trabalham diretamente

com os beneficiários deveriam ser ouvidos, pois eles podem apontar com maior precisão as falhas que ainda

persistem no Programa.

Considerações Finais

Após o término deste estudo chegou-se a conclusão que a interdisciplinaridade é conhecida

conceitualmente mas pouco compreendida na sua essência, não sendo praticada pelos participantes no dia a

dia da unidade de saúde. Foi possível perceber que não há interação entre os saberes envolvidos, bem como

há evidente necessidade de aquisição de conhecimentos específicos e aprofundamento destes conhecimentos

junto à equipe da ESF. Os saberes existentes foram apresentados de forma superficial, com dificuldade de

aprofundamento e reflexão.

A dificuldade de diálogo e entrosamento permeia neste serviço de saúde. O foco de cada profissional

se encontra no seu próprio saber e, consequentemente, há a fragmentação da equipe e do próprio indivíduo.

Morin (1999) procura mostrar a inadequação dos saberes fragmentados, os quais levam à

hiperespecialização, que impede a visão global do conhecimento como um todo. A troca de saberes é

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fundamental, é através das equipes interdisciplinares que se preconiza a produção social da saúde a partir da

co-responsabilidade e de vínculos entre os diferentes atores sociais que participam das relações que

sustentam a dinâmica social (GARBOIS, VARGAS e CUNHA, 2008).

Assim, verifica-se num primeiro momento, que existe um distanciamento entre saberes, sendo que,

se torna imprescindível voltar o olhar para o todo, bem como valorizar os pequenos detalhes e a todos os

atores sociais, superando as hierarquias existentes e buscando as relações simbólicas exercidas por cada

sujeito em seus grupos. Desta forma, é importante que os profissionais da saúde busquem a articulação das

diretrizes políticas e as suas práticas em saúde, procurando ampliá-las com pesquisas e criação de novas

tecnologias que possibilitem a reorganização de suas práticas (FIGUEIREDO e MELLO, 2007).

Como vemos, o processo de investigação realizado também se desdobra para as pesquisas

individuais dos membros da equipe de pesquisadores, pois o estudo proporcionou um prévio conhecimento

dos sobre os temas discutidos e que serão utilizados em suas pesquisas individuais. A observação

participante, a partir das temáticas propostas para discussão, permitiu uma aproximação dos pesquisadores

com a comunidade da ESF, além do levantamento de uma demanda para capacitação dos profissionais da

equipe.

Desta forma, este trabalho veio contribuir, mesmo que timidamente, para alguma mudança da

realidade da ESF visando o desenvolvimento não só da unidade de saúde mas de toda a comunidade

envolvida.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos a Secretaria Municipal de Saúde da ESF pesquisada, pela possibilidade de realização

deste projeto de investigação exploratória da comunidade.

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REFERÊNCIAS

BAUMAN, Z. Comunidade: a busca por segurança no mundo atual. Rio de Janeiro: Zahar, 2003.

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68, n. 249, p. 25694, Seção I, dez. 1990

BRASIL. Ministério da Saúde. Resolução nº 333, de 4 de novembro de 2003. Aprova as diretrizes para

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Brasília, DF, n.236, p. 57, nov. 2003. Seção 1.

BRASIL. Ministério da Saúde. Campanha Nacional de Vacinação contra a influenza: Informe técnico.

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