gazeta mÉdica da bahia – 1908 alfredo thomé de britto 1908 – 1912 augusto cezar vianna 1913...

136

Upload: trinhdien

Post on 11-Jun-2018

258 views

Category:

Documents


6 download

TRANSCRIPT

Page 1: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides
Page 2: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

GAZETGAZETGAZETGAZETGAZETA MÉDICA DA BAHIAA MÉDICA DA BAHIAA MÉDICA DA BAHIAA MÉDICA DA BAHIAA MÉDICA DA BAHIAA Gazeta Médica da Bahia (Gaz. méd. Bahia) [CDU: 616 051)], fundada em 1866, é o periódico oficial da Faculdade de

Medicina da Bahia (FAMEB) da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Editor ConvidadoEditor ConvidadoEditor ConvidadoEditor ConvidadoEditor ConvidadoManoel Barral-Netto

Conselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialAldina Barral (UFBA, CPqGM/FIOCRUZ – Salvador, BA)

Aluízio Prata (UFTM – Uberaba, MG)Álvaro A. Cruz Filho (UFBA – Salvador, BA)

Ângela Maria Silva (UFS – Aracaju, SE)Edgar M. de Carvalho Filho (UFBA – Salvador, BA)

Eliane Azevêdo (UEFS – Feira de Santana, BA)Ernesto Takatomi (UFU – Uberlândia, MG)

Fernando Martins Carvalho (UFBA – Salvador, BA)Irismar Reis de Oliveira (UFBA – Salvador, BA)

João Barberino Santos (UnB – Brasília, DF)Kátia Acuña (UFAC – Rio Branco, AC)

Luís Fernando Fernandes Adan (UFBA – Salvador, BA)Mary Clarisse Bozzetti (UFRGS – Porto Alegre, RS)

Niels Olsen Saraiva Camara (USP, SP)Pedro F. C. Vasconcelos (IEC – Belém, PA)Raymundo Paraná (UFBA – Salvador, BA)Rodolfo Teixeira (UFBA – Salvador, BA)

William Saad Hossne (UNESP, CUSCamilo – SP)

SecretariaSecretariaSecretariaSecretariaSecretariaJundiára PaimDiagramaçãoDiagramaçãoDiagramaçãoDiagramaçãoDiagramação

Luciana Bastianelli

RevisãoRevisãoRevisãoRevisãoRevisãoJosé Tavares-Neto

Correção e ImpressãoCorreção e ImpressãoCorreção e ImpressãoCorreção e ImpressãoCorreção e ImpressãoGráfica Contexto

www.contexto-ba.com.br

Redação e SecretariaRedação e SecretariaRedação e SecretariaRedação e SecretariaRedação e SecretariaGazeta Médica da Bahia

Faculdade de Medicina da Bahia/UFBALargo do Terreiro de Jesus - Centro Histórico

40026-010 Salvador, Bahia, BrasilTel: (55) (71) 3283-5568/ Fax: (55 (71) 3283-5566 Ramal 203 ou

207E-mail: [email protected]://www.ufba.br/medicina/gmbahia ou

hrrp://www.gmbahia.ufba.br

Suporte AdministrativoSuporte AdministrativoSuporte AdministrativoSuporte AdministrativoSuporte AdministrativoArtigos submetidos para publicação, correspondência

referente a separatas de artigos publicados, reclamações,mudança de endereços, “marketing”, propaganda e demaiscomunicados devem ser encaminhados à Redação da GazetaMédica da Bahia.

PermissãoPermissãoPermissãoPermissãoPermissãoCopyright 2008 pertence à Gazeta Médica da Bahia da

Faculdade de Medicina da Bahia (FAMEB) da UniversidadeFederal da Bahia (UFBA). Todos os direitos reservados.Salvo sob autorização oficial da GMBahia ou da FAMEB,nenhuma parte ou seção da GMBahia poderá serreproduzida em qualquer forma ou por quaisquer meios. Aautorização para fotocópia ou reprodução de qualquermaterial veiculado pela GMBahia deverá ser feito pelamesma ou pela FAMEB através de carta oficial, na qualdeverão conter, o volume, o número e as páginas a seremautorizadas.

Periodicidade: SemestralTiragem: 1.000 exemplaresAssinatura Gratuita: docentes e Bibliotecas de Escolas Médicasdo BrasilIndexação: LILACS, Bibliografia Brasileira de Medicina

APOIOAPOIOAPOIOAPOIOAPOIODECIT-SECTIE-MS (Secretaria de Ciência e Tecnologia e

Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde)FAPESB (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da

Bahia)CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico)CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de

Nível Superior)

CAPCAPCAPCAPCAPAAAAAFoto da fachada da Faculdade de Medicina da Bahia,

Largo do Terreiro de Jesus (Salvador, BA, Brasil), de R. A.Read (cerca de 1903/1904).

Logomarca do Bicentenário da Faculdade de Medicinada Bahia da Universidade Federal da Bahia (de Guga

Dias e Mário Santana)

Page 3: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIAUNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIAUNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIAUNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIAUNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIAFFFFFAAAAACULDADE DE MEDICINA DA BAHIACULDADE DE MEDICINA DA BAHIACULDADE DE MEDICINA DA BAHIACULDADE DE MEDICINA DA BAHIACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIAReitor Naomar Monteiro de Almeida Filho

FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIADiretor José Tavares Carneiro NetoVice-diretor Modesto Jacobino

Secretários Sônia Celino, Denise Sapucaia e Josias de SenaSubstituto Eventual do Vice-Diretor Déa Mascarenhas CardozoRepresentante no CONSEPE Fernando Martins CarvalhoColegiado do Curso de Graduação em Medicina

Coordenador Antônio Natalino Manta DantasVice-Coordenador Edilson Bittencourt Martins

Colegiado do Programa de Pós-graduação em Medicina e SaúdeCoordenador Antonio Alberto da Silva LopesVice-Coordenadora Helma P. Cotrim

Colegiado do Programa de Pós-graduação em Patologia Humana e Experimental(em convênio com o Centro de Pesquisas Gonçalo Moniz, FIOCRUZ, Bahia)

Coordenadora Aldina Maria Prado BarralVice-Coordenadora Fabíola Cardillo (CPqGM/FIOCRUZ)

Colegiado do Curso de Mestrado em Saúde, Ambiente e TrabalhoCoordenador Fernando Martins CarvalhoVice-Coordenador Marco Antônio Vasconcelos Rêgo

DEPARTAMENTOSAnatomia Patológica e Medicina Legal

Chefe Iguaracyra Barreto de Oliveira AraújoVice-Chefe Luiz Antônio Rodrigues Freitas

Apoio Diagnóstico e TerapêuticoChefe Marcelo Benício dos SantosVice-Chefe Luiz Erlon Araújo Rodrigues

CirurgiaChefe Gildásio de Cerqueira DaltroVice-Chefe Paulo Afonso Batista dos Santos

Ginecologia, Obstetrícia e Reprodução HumanaChefe Antonio Carlos Vieira LopesVice-Chefe Nilma Antas Neves

MedicinaChefe (pro tempore) Luiz Guilherme da Costa LyraVice-Chefe (pro tempore) André Luiz Peixinho

Medicina Preventiva e SocialChefe Marco Antonio Vasconcelos RêgoVice-Chefe Mônica Angelim Gomes de Lima

NeuropsiquiatriaChefe Vitória Eugênia Ottoni CarvalhoVice-Chefe Domingos Macedo Coutinho

PediatriaChefe Luís Fernando Fernandes AdanVice-Chefe Isabel Carmen Fontes da Fonseca

ADMINISTRAÇÃO DO PAVILHÃO DE AULAS DA FAMEB (campus Canela) Edvaldo Pereira dos Santos Filho

DIRETÓRIO ACADÊMICO DE MEDICINA (DAMED)Comissão Gestora Alencastro de Oliveira Vilas Boas,

Luamorena Leoni SilvaMarta Teixeira Rocha

Page 4: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

PROFESSORES TITULARES E EMÉRITOS DAPROFESSORES TITULARES E EMÉRITOS DAPROFESSORES TITULARES E EMÉRITOS DAPROFESSORES TITULARES E EMÉRITOS DAPROFESSORES TITULARES E EMÉRITOS DAFFFFFAAAAACULDADE DE MEDICINA DA BAHIACULDADE DE MEDICINA DA BAHIACULDADE DE MEDICINA DA BAHIACULDADE DE MEDICINA DA BAHIACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA

TITULARES

Edgar Marcelino de Carvalho FilhoFernando Martins CarvalhoIrismar Reis de OliveiraLícia Maria Oliveira MoreiraLuciana Rodrigues SilvaLuiz Erlon Araújo RodriguesLuiz Guilherme da Costa LyraMarcelo Benício dos SantosManoel Barral-NettoOddone Braghiroli NetoReinaldo Pessôa MartinelliRoberto Lorens Marback

EMÉRITOSa

Zilton de Araújo AndradeAluízio PrataAdilson Peixoto SampaioRodolfo dos Santos TeixeiraEliane AzevêdoNelson BarrosOrlando Figueira SalesElsimar Coutinhob

Roberto Figueira Santosb

Armênio Guimarãesb

Maria Theresa de Medeiros Pachecob

a Na ordem de indicação do título pela Congregação, e aprovaçãopelo Conselho Universitário (CONSUNI) da UFBA.b Ainda não aprovado pelo CONSUNI-UFBA.

DIRETORES DA FDIRETORES DA FDIRETORES DA FDIRETORES DA FDIRETORES DA FAAAAACULDADE DE MEDICINA DA BAHIACULDADE DE MEDICINA DA BAHIACULDADE DE MEDICINA DA BAHIACULDADE DE MEDICINA DA BAHIACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA1808 – 1828 COLEGIO MÉDICO-CIRÚRGICO DA

BAHIA (sem nomeação de Diretorespelo Governo Imperial)

1829c – 1833 Jozé Avellino Barboza 1832 Lei de 03 de Outubro de 1832, da

Regência Trina, em nome do ImperadorD. Pedro II, altera a denominação paraFaculdade de Medicina da Bahia

1833 – 1836 Jozé Lino Coutinho1836 – 1844 Francisco de Paula Araujo e Almeida1844 – 1855 João Francisco de Almeida1855 – 1857 Jonathas Abbott*1857 – 1871 João Baptista dos Anjos1871 – 1874 Vicente Ferreira de Magalhães*1874 – 1881 Antonio Januario e Faria1881 – 1886 Francisco Rodrigues da Silva1886 – 1891 Ramiro Affonso Monteiro1891 – 1895 Antonio Cerqueira Pinto1895 – 1898 Antonio Pacifico Pereira1898 – 1901 José Olimpio de Azevedo1901 – 1908 Alfredo Thomé de Britto1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna1913 – 1914 Deocleciano Ramos1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna

1931 – 1932 Aristides Novis1932 – 1933 Augusto Cezar Vianna1933 – 1936 José de Aguiar Costa Pinto1936 – 1946 Edgard Rego Santos1946 – 1950 José Olympio da Silva* 1950 Francisco Peixoto de Magalhães Neto*1950 – 1953 Eduardo Lins Ferreira Araujo*1953 – 1955 Hosannah de Oliveira*1955 – 1960 Rodrigo Bulcão D’Argollo Ferrão1960 – 1962 Benjamim da Rocha Salles1962 – 1965 Carlos Geraldo de Oliveira1965 – 1968 Jorge Augusto Novis1968 – 1972 Rodrigo Bulcão D’Argolo Ferrão1973 – 1977 Renato Tourinho Dantas1977 – 1980 Plínio Garcez de Senna1980 – 1984 Newton Alves Guimarães1984 – 1988 José Maria de Magalhães Netto1988 – 1992 Heonir de Jesus Pereira Rocha1992 – 1996 Thomaz Rodrigues Porto da Cruz1996 – 2000 José Antonio de Almeida Souza 2000 Fernando Martins de Carvalho*2000 – 2003 Manoel Barral-Netto 2003 Orlando Figueira Sales*2003 – José Tavares Carneiro Neto(*) Diretor Interinoc O 1o Diretor foi escolhido pela Congregação na reunião de 16 de

dezembro de 1829.

Page 5: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

CORPO DOCENTE DA FCORPO DOCENTE DA FCORPO DOCENTE DA FCORPO DOCENTE DA FCORPO DOCENTE DA FAAAAACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA,CULDADE DE MEDICINA DA BAHIA,CULDADE DE MEDICINA DA BAHIA,CULDADE DE MEDICINA DA BAHIA,CULDADE DE MEDICINA DA BAHIA,SEGUNDO A UNIDADE DEPSEGUNDO A UNIDADE DEPSEGUNDO A UNIDADE DEPSEGUNDO A UNIDADE DEPSEGUNDO A UNIDADE DEPARARARARARTTTTTAMENTAMENTAMENTAMENTAMENTALALALALAL

DEPARTAMENTO DE ANATOMIA PATOLÓGICA EMEDICINA LEGAL

Aldina Maria Prado BarralAntonio Nery Alves FilhoAristides Chetto de QueirozDaysi Maria de Alcantara JonesEduardo Antonio Gonçalves RamosEduardo José Bittencourt StudartHelenemarie Schaer BarbosaIguaracyra Barreto de Oliveira AraújoJosé Américo Seixas SilvaLuciano Espinheira Fonseca JuniorLuis Carlos Cavalcante GalvãoLuiz Antonio Rodrigues de FreitasManoel Barral-NettoMarco Antonio Cardoso de AlmeidaMitermayer Galvão dos ReisMoysés SadigurskyPaulo Roberto Fontes AthanazioRaul Coelho Barreto FilhoRenée Amorim dos Santos

DEPARTAMENTO DE APOIO DIAGNÓSTICO ETERAPÊUTICO

Cesar Augusto de Araújo NetoHélio BragaLuiz Erlon Araújo RodriguesMarcelo Benício dos SantosRosa Vianna Dias da Silva Brim

DEPARTAMENTO DE CIRURGIAAgnaldo da Silva FonsecaAlfredo Rogério Carneiro LopesAndré Barbosa Castelo BrancoAndré Ney Menezes FreireAntonio Argolo Sampaio FilhoAntonio Francisco Junquilho VinhaesAntonio Gilson Lapa GodinhoAntonio Marcos FerraciniAntonio Natalino Manta DantasCarlos Alberto Paes AlvesCicero Fidelis LopesClotario Neptali Carrasco CuevaDanilo Cruz Sento SéDurval Campos Kraychete

Ediriomar Peixoto MatosEdson Bastos FreitasEdvaldo FahelEpaminondas Castelo Branco NetoGervásio Batista CamposGildásio de Cerqueira DaltroHeitor Carvalho GuimarãesHélio Andrade LessaJayme Victal dos Santos SouzaJehorvan Lisboa CarvalhoJorge Luiz Andrade BastosJosé Luiz CoelhoJosé Siqueira de Araújo FilhoJosé Valber Lima MenezesJuarez Araujo AndradeJuvenal Mascarenhas NassriLeandro Publio da Silva LeiteLuciano Santos GarridoLuis SchiperMaria de Lourdes Lima FalcãoMário Castro CarreiroMário Cesar Santos de AbreuModesto Antonio de Oliveira JacobinoNilo Cesar Leão Barreto de SouzaNilson Ferreira GomesNormand Araujo MouraOddone Braghirolli NetoOsório José de Oliveira FilhoPaulo Afonso Batista dos SantosPaulo André Jesuíno dos SantosPedro Hamilton Guimarães MacedoRené Mariano de AlmeidaRoberto Lorens MarbackVenceslau dos Reis Souza SilvaVilson UlianVirginia Emilia Café Cardoso PintoVitor Lucio Oliveira AlvesWellington Alves Cavalcante

DEPARTAMENTO DE GINECOLOGIA, OBSTETRÍCIAe REPRODUÇÃO HUMANA

Antonio Carlos Vieira LopesCarlos Augusto Santos de MenezesConceição Maria Passos de QueirozDenise dos Santos BarataEdson O’Dwyer Júnior

Page 6: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

Fortunato TrindadeHilton PinaHugo da Silva Maia FilhoIone Cristina BarbosaJorge Luiz Sapucaia CalabrichManoel Alfredo Curvelo SarnoMarcelo de Amorim AquinoMaria da Purificação Paim Oliveira BurgosMaria Teresa Rebouças Gonçalves de AzevedoNélia Maria Dourado Lima BarretoNilma Antas NevesOlivia Lucia Nunes CostaSandra Serapião SchidlerVera Lucia Rodrigues Lobo

DEPARTAMENTO DE MEDICINAAlcina Maria Vinhaes BittencourtAlvaro Augusto Souza da Cruz FilhoAna Cláudia Rebouças RamalhoAndré Castro LyraAndré Luiz PeixinhoAndré Vila SerraAntonio Alberto da Silva LopesAntonio Carlos Moreira LemosAntonio Raimundo Pinto de AlmeidaArgemiro D’Oliveira JuniorCarlos Roberto Brites AlvesEdgar Marcelino de Carvalho FilhoEdilton Costa e SilvaEdmundo José Nassri CâmaraEleonora Lima PeixinhoElvira Barbosa Quadros CortesFernando Antonio Glasner da Rocha AraújoFrancisco Hora de Oliveira FontesGeorge Barreto de OliveiraGilvandro de Almeida RosaHelma Pinchemel CotrimIgelmar Barreto PaesIraci Lucia Costa OliveiraJackson Noya Costa LimaJacy Amaral Freire de AndradeJorge Carvalho GuedesJorge Luiz Pereira e SilvaJosé Alberto Martins da MattaJosé Antonio de Almeida SouzaJosé Tavares Carneiro NetoLeila Maria Batista AraújoLísia Marcílio RabeloLuis Guilherme Costa LyraLuiz Carlos Santana PassosMargarida Célia Lima Costa NevesMargarida Maria Dantas Dutra

Maria da Glória Mota BonfimMaria das Dores Acioli de LimaMaria Ermecília Almeida MeloMaria Georgina BarbosaMaria Margarida dos Santos BrittoMaria Zenaide GonzagaMurilo Pedreira Neves JúniorNewton Sales Guimarães FilhoOctavio Henrique MessederPaulo Novis RochaRaymundo Paraná Ferreira FilhoRegis de Albuquerque CamposReinaldo Pessôa MartinelliRoberto José da Silva BadaróRomário Teixeira Braga FilhoRoque Aras JúniorTania Morais RegisTarcisio Matos de AndradeThomaz Rodrigues Porto da CruzVitória Regina Pedreira de Almeida

DEPARTAMENTO DE MEDICINA PREVENTIVA ESOCIAL

Annibal Muniz Silvany NetoCláudio Fortes Garcia LorenzoEduardo José Farias Borges dos ReisFernando Martins CarvalhoLorene Louise Silva PintoMarco Antônio Vasconcelos RêgoMônica Angelim Gomes de LimaPaulo Gilvane Lopes PenaRita de Cássia Franco RêgoRita de Cássia Pereira FernandesRonaldo Ribeiro JacobinaSumaia Boaventura AndréVera Lúcia Almeida Formigli

DEPARTAMENTO DE NEUROPSIQUIATRIAAilton de Souza MeloÂngela Marisa de Aquino Miranda ScippaAntonio Fernando Bermudez DreyerAntonio Reinaldo RabeloAntonio de Souza Andrade FilhoArlúcia de Andrade FauthCarlos Antonio Ferrreira TeixeiraCélia Nunes SilvaDomingos Macedo CoutinhoIrismar Reis de OliveiraJosé Cortes Rolemberg FilhoJosé Marcos Pondé Fraga LimaMario Ernani Ancilon Cavalcanti

Page 7: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

Miriam Elza GorenderRita de Cássia Saldanha de LucenaRoberto Miguel Correia da SilvaVitoria Eugênia Ottoni CarvalhoWaldeck Barreto D’AlmeidaWania Marcia AguiarWilliam Azevedo Dunninghan

DEPARTAMENTO DE PEDIATRIAAngela Peixoto de MattosAngelina Xavier AcostaCrésio de Aragao Dantas AlvesCristiana Maria Costa Nascimento de CarvalhoDéa Mascarenhas CardozoDulce Emilia Moreira C. GarciaEdilson Bittencourt MartinsEdna Lucia Santos de SouzaHagamenon Rodrigues da SilvaHugo da Costa Ribeiro JuniorIsabel Carmen Fontes da FonsecaLara de Araújo TorreãoLicia Maria Oliveira MoreiraLuciana Rodrigues SilvaLuís Fernando Fernandes AdanLuiza Amélia Cabus MoreiraMaria Betânia Pereira TorallesMaria do Socorro Heitz FontouraNadya Maria Bustani CarneiroPriscila Pinheiro Ribeiro LyraSilvana Fahel da FonsecaSolange Tavares Rubim de PinhoSuzy Santana CavalcanteTeresa Cristina Martins Vicente RobazziVanda Maria Mota de Miranda

Page 8: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

6 Gaz. méd. Bahia 2007;77:2(Jul-Dez):74-76José Tavares-Neto

Page 9: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

7Gaz. méd. Bahia 2007;77:2(Jul-Dez):74-76 Editorial

III CENTENÁRIO DA MEDICINA NO BRASILIII CENTENÁRIO DA MEDICINA NO BRASILIII CENTENÁRIO DA MEDICINA NO BRASILIII CENTENÁRIO DA MEDICINA NO BRASILIII CENTENÁRIO DA MEDICINA NO BRASILPERPSECTIVAS DA MEDICINA NO SÉCULO XXIPERPSECTIVAS DA MEDICINA NO SÉCULO XXIPERPSECTIVAS DA MEDICINA NO SÉCULO XXIPERPSECTIVAS DA MEDICINA NO SÉCULO XXIPERPSECTIVAS DA MEDICINA NO SÉCULO XXI

19 de Fevereiro de 2008

19h00 Abertura

20h00 Perspectivas da Medicina no Século XXI Prof. Zilton Andrade

20 de Fevereiro de 2008

08h30 às 09h15 O Médico Cientista: Desafios no Brasil Marco Antonio Zago (CNPq)

09h15 às 10h00 Pós-Graduação na Área Médica: Jorge Guimarães (CAPES)O Que Esperar no III Milênio?

Pausa

10h30 às 11h15 O Ministério da Saúde e a Pesquisa Reinaldo GuimarãesMédica no Brasil (Ministério da Saúde)

11h15 às 12h00 Bioética: O desafio no Século XXI Eliane Azevêdo (FAMEB)

Almoço

14h00 às 16h00 Mesa-Redonda: Ensino Médico José Tavares-Neto (FAMEB)Coordenador

Novas Tendências do Ensino Médico Milton Arruda (FMUSP)Medicina Baseada em Evidências Antônio A. Lopes (FAMEB)Avaliação no Ensino Médico Jadete B. Lampert (UFSM)Ensino e Pesquisa no Hospital Universitário Protásio L. Luz (FMUSP)

16h00 às 18h00 Mesa-Redonda: Impacto de Novas Ronaldo Damião (UERJ)Abordagens sobre a Medicina CoordenadorAplicações da Genômica em Medicina Samuel Goldenberg (FIOCRUZ)Células-Tronco e Engenharia Tecidual Radovan Borojevic (UFRJ)Biomarcadores em Medicina Edgar M. Carvalho (FAMEB)Bioinformática: Perspectivas na Medicina Glaucius Oliva (USP)

Page 10: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

8 Gaz. méd. Bahia 2007;77:2(Jul-Dez):74-76José Tavares-Neto

21 de Fevereiro de 2008

08h30 às 10h30 Mesa-Redonda: Aspectos Modesto Jacobino (FAMEB)Globais da Saúde CoordenadorAmbiente e Saúde Paulo Saldiva (FMUSP)Novas Estratégias de Vacinas Jorge Kalil (FMUSP)Globalização e Saúde da Criança Cristiana Carvalho (FAMEB)Sistema Global de Inovação em Saúde José Carvalheiro (FIOCRUZ)

Pausa

10h45 às 12h45 Mesa-Redonda: Doenças Negligenciadas Jorge Solla (SESAB)Coordenador

Grandes Endemias no Brasil Antoniana Krettli (FIOCRUZ)Dengue e Pandemias Virais Luiz Tadeu Figueiredo (USP)Doenças Parasitárias Mitermayer Reis (FAMEB)Doenças Micobacterianas J.R.Lapa e Silva (FM-UFRJ)

Almoço

14h30 às 17h00 Mesa-Redonda: Perspectivas da Isaac Roitmann (MCT)Medicina no Brasil CoordenadorCiência e Ensino: Desafios e Oportunidades Maria do C. Leal (FIOCRUZ)Produção de Fármacos no Brasil: Desafios João B. Calixto (UFSC)O Problema das Doenças Crônicas em Países Álvaro Cruz (FAMEB/OMS)em Desenvolvimento.Financiamento à Pesquisa na Bahia Dora Leal Rosa (FAPESB)Financiamento à Pesquisa Médica Suzanne Serruya (MS)

17h00 Rumos da FAMEB no Século XXI: Manoel Barral-Netto ( FAMEB)Contribuições do Simpósio

17h30 Encerramento José Tavares-NetoModesto JacobinoManoel Barral-NettoCoordenação do DAMEDAntônio N. M. Dantas(Professor Decano)Zilton Andrade(Professor Emérito Decano)

Instituição organizadora: Faculdade de Medicina da Bahia da UFBA.Local: Auditório Alfredo Brito - Faculdade de Medicina da Bahia - Largo do Terreiro de Jesus - Salvador/BA.Coordenação: Manoel Barral Netto, José Tavares-Neto (Diretor FAMEB) e Aldina Barral.

Page 11: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

1

EDITORIALEDITORIALEDITORIALEDITORIALEDITORIAL

A Faculdade de Medicina da Bahia (FAMEB) teve, sempre, destacado papel na produção de conhecimentos médicos noBrasil. É, pois, de grande interesse promover um evento que avalie a situação atual e as perspectivas do ensino e das ciênciasmédicas ao completarem-se os duzentos anos da escola mater da medicina brasileira. Juntamente com o Diretor da FAMEB, Dr.José Tavares-Neto, e a coordenadora do Curso de Pós-Graduação em Patologia, Dra. Aldina Barral, pensamos em promover umevento de cunho técnico-científico que avaliasse as perspectivas da Medicina moderna. O evento complementa o necessárioolhar ao passado e visa mirar o futuro da FAMEB. A proposta foi acolhida pela Comissão do Bicentenário e integra, assim, aprogramação oficial.

O simpósio “Perspectivas da Medicina no Século XXI” iniciar-se-á no primeiro dia do terceiro centenário do ensino médicoem nosso país, ou seja, um dia após a comemoração do Bicentenário da FAMEB. Grandes especialistas de diversas escolasbrasileiras aceitaram o convite para participar do Simpósio o que o engrandece de maneira especial. A presença a um evento doporte deste seminário é, inevitavelmente, limitada. Para maior difusão destas excelentes apresentações, elaborou-se este númeroespecial da Gazeta Médica da Bahia, para o qual o seu Editor, Dr. José Tavares Neto, indicou-me como Editor convidado.

Os professores da FAMEB têm publicado umnúmero crescente de trabalhos científicos, comuma saudável interação com outras instituiçõesnacionais e internacionais. A complexidade dasrelações de co-autoria em trabalhos científicosda FAMEB (indexados pelo Institute for ScientificInformation no ano de 2007) está ilustrada nafigura deste texto (elaborada pelo Dr. CarlosMorel) onde o ponto central representa a FAMEBe cada ponto adicional uma instituição com a qualhá pelo menos um artigo em co-autoria. Esta figuraé parte de um estudo sobre a produção científico-tecnológica no complexo da saúde e evidencia ainserção da FAMEB em redes de pesquisanacionais e internacionais. A riqueza destaintegração deve ser bem compreendida com oobjetivo de orientar os rumos futuros, permitindoa aceleração do crescimento científico e o retornoem benefícios à sociedade. É, justamente, neste conhecimento e planejamento que o Seminário pretende contribuir.

As cores dos círculos designam o escore k das instituições (número de conexões com outras instituições presentes na rede:azul claro =1 1; verde escuro = 2; até vermelho = 15).

Neste evento de celebração da ciência médica, lamentamos todos, a precoce ausência do Prof. Heonir Rocha. Continua a nosfazer grande falta a sua competência, além do seu dinamismo e entusiasmo no ensino e na pesquisa. Em seu nome, homenageamosa todos os professores-pesquisadores que contribuíram para o progresso da ciência entre nós, e que não tiveram a oportunidadede comemorar o bicentenário da nossa escola.

Para a realização do Seminário “Perspectivas da Medicina no Século XXI” contamos com importantes apoios institucionais.Compreenderam a magnitude do evento: o DECIT (Diretoria de Ciência e Tecnologia da Secretaria de Ciência e Tecnologia eInsumos Estratégicos do Ministério da Saúde); a FAPESB (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia); o CNPq(Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - Ministério de Ciência e Tecnologia); a CAPES (Coordenaçãode Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior do Ministério da Educação) e a Fundação Oswaldo Cruz (Ministério daSaúde). Tivemos ainda o apoio da LGC Biotecnologia® e da DIREX do Brasil®.

Esperamos que os excelentes textos que compõem este Suplemento da Gazeta Médica da Bahia sejam de grande utilidadepara aqueles que militam no ensino e na pesquisa médica.

Salvador da Bahia, aos 19 de fevereiro de 2008,no 200o ano da fundação da Faculdade de Medicina da Bahia

Manoel Barral-NettoEditor convidado, Gazeta Médica da Bahia

Professor Titular de Patologia da Faculdade de Medicina da Bahia (UFBA)

UFBA-Medicine Co-authorship Networks 2007Institutions color-coded by ‘k-core (1 to 15)Sorce of articles:ISI, through Portal CAPESSoftwares used: VantagePoint; UCINet; NetDrawAuthorship: CDTS/Fiocruz (C. Morel)

Page 12: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

2 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):2-6Zilton A. Andrade

Perspectivas da Medicina no Século XXIPerspectivas da Medicina no Século XXIPerspectivas da Medicina no Século XXIPerspectivas da Medicina no Século XXIPerspectivas da Medicina no Século XXI

Medicine Perspectives in the XXI Century

Zilton A. AndradeProfessor Emérito da Faculdade de Medicina da Bahia da Universidade Federal da Bahia; Salvador, BA, Brasil

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. Zinton Andrade. Fiocruz-BA. R.Waldemar Falcäo, 121, Candeal. 40296-710. Salvador, BA, Brasil.

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):2-6.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Fazer uma apreciação das perspectivas ou dos possíveisdesdobramentos que a Medicina experimentará neste séculoque estamos iniciando foi a tarefa que me foi outorgada, comoparte das comemorações pelos 200 anos da nossa queridaFaculdade de Medicina, uma incumbência que me deixasumamente honrado e profundamente agradecido.

Fazer previsões num campo tão amplo e tão complexo comoé o da Medicina, não é uma tarefa fácil, mas não deixa de serum exercício fascinante para qualquer um. Ao ponderar sobreo assunto, verifiquei que teria a fazer um exercício emfuturologia. Embora tal exercício seja estimulante por si mesmo,ele não deixa de ser complexo e sujeito a muitas falhas.Todavia, posso sentir-me mais confortado e ficar menosapreensivo ao verificar que tarefa semelhante havia sido dadaao famoso químico francês Marcellin Berthelot no início doséculo XX, quando lhe foi solicitado indicar as perspectivasda química para o então longínquo ano 2000. Maravilhadoentão com os progressos da sua especialidade, ele concluía oseu relato da seguinte maneira: “não haverá no mundo nemagricultura, nem pastores, nem camponeses, o problema dacultura do solo terá sido suprimido pela química. Nãoteremos minas, nem indústrias subterrâneas, nem greves demineiros. O problema dos combustíveis desaparecerá graçasà química e à física. Não mais teremos alfândega, nemprotecionismos, nem guerras, nem fronteiras adubadas comsangue humano. A navegação aérea, com seus motoresmovidos por energia química, vai tornar estas instituiçõesobsoletas. Estaremos então bem perto de realizar o sonhodos socialistas, contanto que consigamos descobrir umaquímica espiritual que mude a natureza moral do homem deuma maneira tão profunda como a nossa química transformaa natureza material”. Este final inteligente e irreverente serviupara atenuar o fracasso do grande químico como futurologista.Aliás, já foi verificado que, os futurologistas profissionaisque fizeram previsões, não para um século, mas para 10 anos,erraram mais do que acertaram.

Todavia, resolvi aceitar o desafio, sabendo que algumasperspectivas que vou aqui traçar poderão estar realizadas ounão, mesmo antes do fim das primeiras décadas deste século,enquanto outras poderão estar não resolvidas no início doséculo XXII. Também estou consciente de que existem outras

perspectivas possíveis, que deixaram de serem abordadas,mas que poderão vir a revolucionar a medicina de um futuropróximo.

Os Dois Componentes da Medicina

De saída devemos considerar, para as finalidades dopresente exercício, que há dois componentes distintos dentroda MEDICINA. O primeiro é representado pela PesquisaMédica e o segundo pela Medicina Aplicada, que é aquelaque é utilizada diretamente para o paciente. Enquanto oprimeiro setor vem mostrando um progresso extraordináriodesde fins do século XIX até hoje, o segundo, embora tenhasempre se beneficiado deste progresso, nos apresenta a cadadia problemas graves e uma crise crescente. Isto está bemrepresentado no paradoxo da simultaneidade do progressocrescente da ciência médica conviver com a desconfiança nacapacidade da medicina em prover saúde para todos, comuma atuação cada vez mais questionada. A idílica relaçãomédico-paciente dos tempos do médico-de-família, tão aogosto dos saudosistas, foi afetada por múltiplos fatores davida moderna. Antigamente a grande população marginalizadanão tinha voz e os médicos concentravam a sua atenção numaminoria que podia pagar. A minoria rica vivia sem ossobressaltos e as pressões pelas mudanças, comuns nos diasde hoje, e acolhia aos médicos com simpatia, os quaiscostumavam ser indivíduos ricos e socialmente bem educados,na sua maioria oriundos da própria classe abastada. É possívelque o decantado prestígio dos médicos de então tenha emparte decorrido mais dos fatos citados acima, que da admiraçãopela sua ciência e do seu desempenho profissional. Hoje, asociedade é mais complexa, as comunicações são rápidas eintensas, as pessoas estão mais bem informadas, háconsciência da existência de uma dívida social que urge serresgatada. Os médicos se originam de vários estratos sociaise nem sempre enriquecem, necessitando ocupar váriosempregos para manter uma aparência de riqueza. Por outrolado, o médico passou a ser responsabilizado por falhas quemuitas vezes dependem mais da estrutura social, política eeconômica da comunidade, falhas pelas quais ele não tem aresponsabilidade, nem o poder para resolvê-las. Costuma-sedizer que antigamente os médicos tinham conhecimentoscientíficos até certo ponto rudimentares, contavam comrecursos técnicos escassos, mas eram respeitados e amadospelos seus clientes. Que tinham espírito humanitário e eramdedicados aos seus pacientes quaisquer que eles fossem.Este ideal romântico não resiste a uma análise mais objetiva.

Page 13: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

3Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):2-6 A Medicina no Século XXI

Hoje os conhecimentos e os recursos técnicos permitem umaassistência muito mais efetiva, mas os clientes desconfiamdos médicos, as queixas se multiplicam e até algumaspendências já começam a aparecer na justiça. Vamos analisarestes dois aspectos da Medicina e tentar delinear quais serãoas perspectivas para cada setor no decorrer século XXI.

A Pesquisa Científica em Medicina

A Pesquisa Médica certamente continuará o seucrescimento exponencial neste novo século. O numero deinvestigadores aumenta em todo o mundo, os governantesestão conscientes das vantagens em se investir em pesquisa,as universidades no primeiro mundo continuarão a encarar apesquisa como primordial, e países como o nosso, mais cedoou mais tarde, vão reconhecer esta verdade. Neste enorme ediversificado contingente, os pesquisadores, com asvantagens dos progressos tecnológicos em automação,informática, nanotecnologia, e comunicação, certamente vãoobter dados para consolidar os progressos atuais e fazeravançar as fronteiras do conhecimento muito além do quepodemos imaginar.

Dentro das pesquisas de ponta que se fazem atualmentevou abordar quatro áreas que, no melhor do meu julgamento,penso poderão suscitar fantásticos progressos médicosdurante o século XXI.

O primeiro diz respeito ao que se convencionou chamarde Neurociências, com as investigações modernas sobre osistema nervoso dando sinais de expansão e aprofundamento.

O sistema nervoso que, na sua extraordinária complexidade,sempre se constituiu no reduto menos accessível dainvestigação médica, está sendo agora investigado com novasforças. Tudo indica que esta tendência continuará comsucesso crescente por muitos anos. O mecanismo da memóriaestá sendo escrutinado com técnicas experimentais, balizadasem dados fisiológicos e bioquímicos. Vários processospatológicos na esfera psiquiátrica estão sendo exploradosnos seus aspectos morfológicos, bioquímicos e moleculares.A neuro-farmacologia, que já apresenta resultadossurpreendentes no tratamento da depressão, da esquizofreniae da re-inervação é hoje um setor em franco desenvolvimento.Confio que a humanidade ficará sabendo mais sobre afisiologia dos neurônios, sobre as suas sínteses de proteínasestruturais e armazenadoras de dados, de enzimas, dehormônios e de polipeptídios neuro-transmissores, sobre seusfios condutores para os órgãos periféricos, suas estaçõesintermediárias representadas pelo sistema nervoso autônomo,suas sinapses e receptores. Estes conhecimentospossibilitarão um salto de qualidade no diagnóstico etratamento das doenças neurológicas e psiquiátricas.

Até a pouco se temia que os avanços tecnológicos naárea de computadores e da produção de inteligência artificialfossem competir com a utilização do cérebro humano. O estudodeste último, que é muito mais complexo e sofisticado que omais avançado engenho artificial que se possa imaginar, vai

certamente trazer dados que beneficiarão as pesquisastecnológicas, criando mais um ambiente de cooperação quede competição entre os dois setores que deverão apresentarprogressos continuados ao longo do século XXI.

O segundo tema escolhido pode ser designado comoCiência da Adesividade, um campo relativamente novo daBiologia Celular e Molecular. Não fosse a possibilidade dascélulas aderirem entre si, os seres vivos formariam apenasgeléias disformes. As células possuem uma espécie de velcrona sua membrana externa que faz com elas se colem entre si ecom a matriz extracelular. Este fenômeno se dá pela presençadas moléculas de adesão, que são também receptores químicosfazendo protusões na membrana externa das células. Graçasaos progressos na produção de anticorpos monoclonais e daaplicação de técnicas da biologia molecular, estas moléculasde adesão estão sendo isoladas e estudadas. Elas têm umcomportamento essencialmente dinâmico e podem surgir,serem modificadas ou suprimidas, conforme as circunstânciasou os estímulos recebidos, com as mais variadas repercussõesfuncionais. As moléculas de adesão possibilitam a estimulaçãofuncional, a migração, a ancoragem, a diferenciação fenotípicae a multiplicação das células. A capacidade da célula cancerosade se movimentar, atravessar as paredes dos vasos e selocalizar e proliferar em outros locais no processo de metástasetem muito que ver com as moléculas de adesão que se formamou deixam de se formar. Nos processos inflamatórios éessencial que as moléculas de adesão se expressem nasuperfície das células endoteliais dos pequenos vasossanguíneos para que os leucócitos possam aí aderir e migrarpara combater as infecções. A inflamação é um processobásico, sendo denominador comum de muitas doenças.Mesmo a arteriosclerose e, por extensão, o processo deenvelhecimento têm bases inflamatórias e esses processospoderão vir a ser mais bem conhecidos e controlados a partirde novos conhecimentos no campo da ciência da adesividade.Espera-se que vários processos ditos degenerativos possamsofrer uma intervenção importante com dados que estão sendoagora obtidos a respeito dos mecanismos de migração ediferenciação de células da matriz conjuntiva, dependentesda adesividade celular. Até pouco tempo atrás a Ciência daAdesividade nem era reconhecida como tal. Hoje cresceu detal modo, já tem revistas e congressos próprios, e tudo indicaque estará fadada a trazer grandes revelações no futuro, aolongo do século XXI.

A terceira área diz respeito ao que se convencionou chamarde “Células Tronco” Ainda hoje causa celeuma nos mais altosescalões do governo americano a decisão sobre se aspesquisas com tecidos embrionários obtidos de abortosespontâneos devem ou não ser proibidas. Evocam-seargumentos de que tais pesquisas poderiam estimular a práticade abortos, além do argumento delas se imiscuírem em

Page 14: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

4 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):2-6Zilton A. Andrade

assuntos sobre a criação da vida, uma área tabu para muitosreligiosos. As células embrionárias, altamente indiferenciadas,têm o potencial para se diferenciar em qualquer tecido ouórgão durante o processo de evolução intra-uterina. Oscientistas vêem a possibilidade de entender os fatores e osmecanismos envolvidos neste processo fundamental. Daí apossibilidade de que tais células tronco possam vir a sermanipuladas para reparar os órgãos e tecidos lesados ou parase transformarem in vitro em órgãos e tecidos geneticamenteplanejados, susceptíveis de serem implantados num novohospedeiro, sem os riscos da rejeição imunológica. Nos anos80 a TV nos Estados Unidos chegou a apresentar um filmecientífico em defesa da pesquisa com células embrionárias.Esta foi feita pela documentação de uma paciente portadorado mal de Parkinson, o qual havia sido praticamente curadoapós a implantação de células embrionárias no interior docérebro da paciente. Esta, no auge da sua doença, não podiasequer se alimentar devido aos fortes tremores da sua doença.As células implantadas mantiveram sua viabilidade eproduziram a dopamina necessária para corrigir os abalosmusculares característicos da doença. Vários estudos básicossemelhantes estão sendo feitos visando os problemasrelacionados com o implante de células embrionárias para acura de doenças que resultam de falhas enzimáticas, para acorreção do diabetes, do mal de Parkinson, da doença deAlzheimer, etc, mas os estudos básicos, visando oentendimento dos mecanismos íntimos envolvidos nadiferenciação celular e no controle da multiplicação celularsão complexos, mas cruciais. Os progressos futuros sãoesperados mais nestes setores, que nas tentativas aplicadase ainda precoces.

Ao lado das pesquisas sobre células tronco embrionárias,vários estudos básicos são também esperados sobre aschamadas “”células tronco do adulto”. Nos primórdioshistóricos da patologia celular já havia a noção de que ascélulas do organismo exibiam capacidade de regeneração ediferenciação em graus diferentes entre si, havendo algumas,como as do chamado sistema retículo-endotelial, queguardavam mais nitidamente a “memória” do mesênqimaembrionário de onde provieram, podendo formar qualquer tipode tecido conjuntivo. Daí se evoluiu para um conceito daexistência, nos vários órgãos e tecidos, das chamadas célulasde reserva ou células basais, que poderiam reparar os tecidose, eventualmente, também dar origem ao câncer. Hoje em diaestas células de reserva voltaram à tona e estão sendoestudadas nos seus aspectos básicos em vários órgãos, comono fígado (“células basais”), no sistema nervoso central (ondese documentou recentemente a possibilidade da regeneraçãode neurônios a partir das “células de reserva”) e na medulaóssea, onde elas estão aparentemente mais concentradas.Espera-se que os estudos básicos prossigam vigorosostambém nesta área das células tronco do adulto, ondenumerosas aplicações práticas vêm sendo feitas com injeçõescelulares, com resultados variados e com fundamentos maisou menos empíricos.

A quarta área a ser aqui citada em último lugar é aquelaque seguramente vai mostrar avanços mais substanciais nodecorrer do século XXI. Trata-se da Ciência Genética, aquelaresultante dos conhecimentos mais precisos e daspossibilidades de manipulação dos genes, a que comumentese tem designado de engenharia genética. Desde a descobertada estrutura do DNA, o material genético fundamental, feitapor Watson e Crick em 1953, que os progressos no campo daCiência Genética vêm num crescendo surpreendente. Hojeuma fração infinitesimal do DNA pode ser artificialmenteampliada e servir para o diagnóstico de doenças e paraestudos científicos os mais variados. O fracionamento desetores específicos do DNA cromosomial com o auxílio deenzimas de restrição, a localização e identificação de genesdentro dos cromossomos, a possibilidade de incorporaçãodos mesmos no núcleo de outras células, vêm fornecendoperspectivas as mais fantásticas no campo da medicina. Asterapêuticas gênicas, conseguindo a incorporação de genesselecionados de um doador normal no genoma de um receptordeficiente, visando a cura de doenças causadas peladeficiência de um determinado enzima ou fator, para aestimulação das reações imunes, já estão dando os seusprimeiros passos. O fantástico trabalho de mapeamento dogenoma humano, que já vem sendo feito, possibilitaráconhecimentos esperados e inesperados acerca dosprocessos fisiopatológicos básicos, com profundasrepercussões na medicina preventiva, preditiva, e curativa.O conhecimento de que os genes dentro dos núcleos estãosujeitos a uma fina inter-regulação está a indicar apossibilidade de conhecermos os detalhes mais fundamentaissobre o processo de multiplicação celular e sobre a origem docâncer, o que poderá levar à uma intervenção médica para asua cura. Já sabemos que há genes produtores de fatores decrescimento e que promovem a multiplicação celular (proto-oncogenes) e outros que modulam ou reprimem estes mesmosgenes. Esta fina regulação é essencial para que se dê aregeneração dos tecidos. Ela pode vir a ser alterada por fatoresvariados, tais como as radiações, os vírus, produtos químicose até os raios solares. Os proto-oncogenes atuando semoposição se transformam então em oncogenes e promovem ocrescimento continuado e incontrolado das células,característico das neoplasias malígnas. Os segredos destainteração gênica podem ser desvendados e os elementos paraintervenção médica podem muito bem ocorrer no século XXI,possibilitando para a humanidade o controle mais efetivo deum terrível flagelo.

Certamente estaremos lidando com uma nova medicina– a medicina regenerativa – em breve nos nosso dia-dia,que utilizará os conhecimentos desta área recémdesbravada da medicina para buscar a regeneração detecidos alterados por doenças degenerativas, daí trazendoa cura potencial de patologias que atualmente só possuemintervenções paliativas. Além disso, estaremos lidando coma integração da terapêutica com o genoma dos indivíduosno que se denomina atualmente de farmacogenômica.

Page 15: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

5Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):2-6 A Medicina no Século XXI

Saberemos se uma droga é capaz de atuar especificamentenas células de um determinado indivíduo, chegando-se áindividualidade dos tratamentos de patologias como ocâncer.Medicina Assistencial

A crise da medicina assistencial é universal. Tudo decorredo fato de que ela está se tornando cada vez mais cara. Outrofator é o aumento crescente das populações. Mesmo nospaíses ricos os custos crescentes da assistência médica estãopreocupando aos planejadores. Como disse recentemente umobservador inglês: “A raiz do problema é estrutural. Ela éintrínseca ao sistema no qual uma coletividade médica emexpansão, face uma população com predominância depessoas sadias, é levada a medicar situações de normalidade,como a menopausa, convertendo riscos em doenças etratando condições triviais com procedimentos sofisticadose caros. Os médicos e os ‘consumidores’ (usuários) demedicina estão encerrados num reino da fantasia onde todomundo tem alguma coisa errada consigo e onde todos equalquer coisa pode ser curada”.

Como consequência do crescimento da demanda e doscustos elevados dos equipamentos de alta tecnologia hojeutilizados, bem como da sua manutenção e renovação, e dospreços dos medicamentos, a medicina se tornouexcessivamente cara, com o seu exercício se tornando cadavez mais impessoal e frio. O uso de aparelhos sofisticados, dealta tecnologia, passou a ser um modismo não só estimuladopor fabricantes e revendedores, como exigido por clientes. Oimportante problema da indicação precisa de cada técnicamuitas vezes é deixado de lado, o que pode tornar a atuaçãomédica onerosa e inadequada. Sabemos que o charlatão éjulgado pelos seus sucessos e o médico pelos seus erros. Aexaltação dos erros médicos está também na moda nos nossosmeios de comunicação. Isto faz com que a medicina modernaapareça aos olhos de muitos como um elefante branco,funcionando com espantosa ineficiência. O governo, osinstitutos de previdência, as companhias de seguro, asinstituições beneficentes, não conseguem planejar mais umaassistência que satisfaça aos seus usuários. Enquanto isso agrande massa do povo pobre nos países menos desenvolvidosestá relegada a uma medicina da idade média.

Estes problemas são antigos. Já em 1978 a OMS realizouuma célebre reunião com as autoridades sanitárias de todo omundo na cidade ucraniana de Alma Ata sob a égide “Saúdepara Todos no Ano 2000”. A reunião começou definindo Saúdecomo “um estado de bem-estar físico, mental e social e nãomeramente a ausência de doença”. Enfatizou os cuidadosprimários e declarou ser a saúde um direito do cidadão e umadever do estado. Estabeleceu metas para que houvesse nomundo plena saúde para todos no ano 2000.

Tais metas não foram alcançadas, senão parcialmente. Naminha previsão de perspectivas para a Medicina do séculoXXI acredito que as linhas mestras daquela declaração vãoser re-tomadas em alguns países, entre os quais o nosso.

Estas linhas foram discutidas na VIII Reunião Nacional deSaúde realizada em Brasília em março de 1986 e muitas estãosendo implementadas hoje em dia entre nós. A estrutura socialde um país, com desigualdades e pobreza, que marginalizauma parcela considerável dos seus cidadãos, faz muito mal àsaúde pública. Com as evidências de consolidação do nossosistema democrático, com uma progressiva melhoria nadistribuição da renda, poderemos esperar para um futuropróximo a adoção do que imagino sejam as 4 prioridadesfundamentais para a saúde do povo brasileiro:

1) Prioridade para aumentar e racionalizar os recursos paraa saúde;

2) Prioridade para impulsionar os cuidados primários emsaúde;

3) Prioridade para as medidas da medicina preventiva;4) Por último, a prioridade mais prioritária de todas, que é

aquela que visa incorporar todos os nossoscompatriotas no processo produtivo, tornando-osverdadeiros cidadãos.

Destas prioridades, é interessante analisar um pouco maisa situação da medicina preventiva. Nestas últimas décadasela assinalou conquistas extraordinárias. A varíola tãodesfigurante e temida nos seus terríveis surtos epidêmicos,foi erradicada da face da terra. A paralisia infantil está quaseerradicada. Doenças da infância, como a coqueluche e osarampo, estão se tornando raridades. As doenças infecciosasintestinais e pulmonares, causadoras das diarréias epneumonias, as duas causas que juntas com a desnutriçãosão determinantes da alta mortalidade infantil dos paísespobres, já estão na mira das medidas preventivas. As doençascardiovasculares, primeira causa de morte nas áreas maisdesenvolvidas do mundo, vêm sofrendo forte impacto na suaprevalência e morbidade, mais pela crescente prática doexercício físico, pelas mudanças nos hábitos alimentares epela diminuição do tabagismo, do que pelos avanços dacirurgia com suas pontes de safena, transplantes ecardioplastias. As doenças valvulares não são mais o quecostumavam ser, devido ao tratamento curativo e preventivodas infecções do trato respiratório alto com os antibióticos. Adoença de Chagas está sendo controlada em todo o territórionacional, graças à erradicação do seu principal vetor, oTriatoma infestans, pelo uso sistemático de inseticidas nasmoradias das zonas endêmicas. A dengue, a febre amarela e ocólera estão sendo mantidos à distância nos tempos atuaisatravés de medidas da medicina preventiva. Também a melhorarma de que se dispõe no momento contra a SIDA ou AIDS éa prevenção. Todos estes dados ainda dizem muito pouco doextenso campo e das amplas perspectivas da medicinapreventiva. E impressionante como os feitos desta medicinapoderosa e vitoriosa são pouco conhecidos do público emgeral e até de muitos médicos. Já foi dito que a medicinapreventiva não tem charme. Os meios de comunicação e opúblico, que ficam excitados e maravilhados com as notíciassobre bebês de proveta, transplantes de orgãos homólogosou heterólogos, implantes de órgãos artificiais, não sabem

Page 16: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

6 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):2-6Zilton A. Andrade

colocar em uma perspectiva correta as vitórias da luta contrao câncer pela citologia preventiva, as vantagens doaleitamento materno para prevenir doenças na infância ouquando uma vacina livra a humanidade de uma doença grave.Muitos médicos ainda têm a noção de que medicina preventivaé algo para ser utilizado pelo Ministério da Saúde nas suascampanhas sanitárias, não tendo a mesma significação noplano da medicina individual que ela tem no coletivo. A culpanão é deles, mas da nossa estrutura de ensino médico queenfatiza a medicina terciária, aquela do hospital e dos aparelhosde alta tecnologia, que por ser muito cara está na raiz da criseporque passa a nossa medicina assistencial.

Considerando esta e outras peculiaridades da medicinaassistencial entre nós tentarei enunciar algumas conclusõesfuturólogas: 1) a medicina privada individual, a medicina deconsultório, seguirá a sua tendência atual para odesaparecimento, sendo substituída pelos pequenoshospitais e clínicas; 2) a medicina de massa será exercida emdistritos sanitários, criados com o zoneamento da cidade paraincluir um determinado numero de famílias residentes. Estasfamílias estarão incluídas dentro de um plano de cuidadosprimários de saúde. Os cuidados serão prestados por umaequipe de saúde, onde, além do médico generalista, estarãoprofissionais para-médicos formando uma equipe cuja funçãoé mais cuidar da saúde, que tratar das doenças. Sabe-se que70% das pessoas que procuram os serviços de saúde e osconsultórios particulares necessitam apenas de cuidadosgerais, de orientação sobre maternidade, cuidados pré-natais,conselhos sobre alimentação, higiene, prática de exercíciofísico e prescrição de medicação simples. Serão aí aplicadasmedidas gerais da medicina preventiva, tais como asimunizações e citologias preventivas; 3) os pacientes comproblemas mais sérios serão encaminhados aos hospitais depequeno, médio ou grande porte, conforme as circunstâncias.Aí estarão os especialistas, os aparelhos de tecnologiasofisticada. Esta divisão racional, que aliás não tem novidades,mas não está ainda devidamente implementada, vai cortar oscustos com a assistência médica, possibilitar saúde para todoscomo seria desejável. Quem vai pagar por estes serviços noséculo XXI é assunto para algum economista ou político quequeira se exercitar em futurologia.

Em relação com estas mudanças, muitas coisas terão tambémque mudar, pois a medicina não existe livre no tempo e noespaço. Das coisas que devem mudar e que me compete aquianalisar, uma é a formação dos médicos. As nossas escolasmédicas vão ser pressionadas para reformas urgentes. Vãoser instadas a perderem o ranço de escolas técnicas e a se

transformarem em verdadeiras instituições de ensino epesquisa, com corpos docente e discente trabalhando emtempo integral, tendo como produto primário o médicogeneralista, que vai passar a ser requisitado pelo mercado detrabalho. Terá fim o ensino livresco, de detalhes, que serásubstituído pelo ensino dos princípios gerais, dos aspectosconceituais, dos trabalhos práticos, das comparações eilacões, o qual deverá dar régua e compasso, embora nãonecessariamente erudição, ao jovem médico generalista.

Nesta fase a orientação geral da nossa educação já deveráter também mudado. Há anos atrás tive a oportunidade deescrever uns comentários sobre o resultado de um examevestibular que ocorreu em Belo Horizonte. Este exame haviareprovado em massa e provocou a necessidade de novo examepara que a universidade não viesse a funcionar com apenasmetade das suas vagas preenchidas. O problema todo seresumia a que as provas, em lugar das perguntinhas habituais,agora continham quesitos que obrigavam os alunos araciocinar para poder responder. Condicionados por umaeducação de reflexos, que induz à memorização e ao saberaparente, os candidatos ficaram paralisados ante anecessidade de raciocinar, pensar. A crise que este vestibularprovocou foi muito reveladora dos descaminhos da nossaeducação, mas a mensagem que ele continha aparentementedeixou de ser captada pelas autoridades responsáveis. Estetipo de ensino nos acompanha deste os bancos escolares ese continua nas universidades. Apreciamos melhor o saberdizer, que o saber fazer. Os estudantes são induzidos amemorizar uma gama infinita de informações que pouco têm aver com o desempenho prático que dele se espera. Alguém jádisse que eles são capazes de mencionar o nome correto deuma doença de fundo genético, rara e estranha, cujo únicocaso foi descrito na Suécia há uns 5 anos atrás, mas não têma mesmo interesse ou curiosidade pela nossa patologiaregional.

Por modificações que agora estão em curso nas escolasprimárias, pelo maior acesso do povo à educação, pelas ilhasde competência que surgem dentro das universidades, pelaevolução natural do homem e do seu meio, o sentido geral danossa educação deverá mudar radicalmente no século XXI. Éa minha previsão-esperança marcando o final deste exercício.Resta-me agradecer a atenção de todos e desejar, de todocoração, que a nossa bicentenária Faculdade de Medicina daBahia continue como um brilhante farol a nos orientar eestimular, e que continue na sua marcha gloriosa por muitosséculos vindouros, capitaneando o progresso médico emnosso país.

Page 17: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

7Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):7-11 Os Desafios do Médico-Cientista

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. Marco Zago. Hemocentro. RuaTenente Catão Roxo, 2501. 14051-140. Ribeirão Preto, SP, Brasil.Endereço eletrônico: [email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):7-11.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Os Desafios do Médico-CientistaOs Desafios do Médico-CientistaOs Desafios do Médico-CientistaOs Desafios do Médico-CientistaOs Desafios do Médico-Cientista

The Challenges of Scientist-Physician

Marco A. ZagoDepartamento de Clínica Médica, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo; Ribeirão Preto, SP, Brasil

O médico-cientista representa um vínculo central para o processo da descoberta científica e sua transformação emelementos concretos da prática médica, exigindo das instituições atenção especial para sua formação, estímulo nacarreira, oportunidades de ocupar espaços relevantes nas escolas médicas e apoio material para desenvolvimento desuas pesquisas. Preservado e incentivado, encontrará desafios e obstáculos. Os grandes desafios para o desenvolvimentoda pesquisa médica neste início de século incluem, em primeiro lugar, processos eficientes para gerenciar as informaçõesvisando a extrair conhecimento útil para a prática médica a partir da grande massa de informações científicas acumuladas.Como sempre, o progresso somente ocorre a partir da pesquisa inovadora, mas é necessário fortalecer a pesquisatranslacional, que leva o conhecimento básico para sua aplicação ao paciente, e a pesquisa clínica, que se dedica àotimização de métodos diagnósticos, terapêuticos ou preventivos. Esses progressos ocorrem em uma ambiência muitoespecial, em que se destacam a rapidez da circulação de informações, os imperativos para revisão de conceitos éticos,e uma impressionante mudança do perfil demográfico e nosológico da população. Assim, os poderosos instrumentos dapesquisa médica e biomédica atualmente disponíveis poderão ser rápida e eficientemente utilizados para alcançaralvos que podem modificar significativamente a prática da medicina, em benefício dos pacientes.Palavras-chave: médico-cientista, prática médica, século XXI, pesquisa.

Physician-scientists are a central link between the process of scientific discovery and its tranfer to the medical practice,requiring special attention from the institutions for their education, stimulus to the career development, opportunities tooccupy relevant positions in the medical schools and material support for their researches. If they are preserved and encouged,they will meet the challenges and overcome the obstables. A major challenge for the medical research at the beginning of thiscentury is efficiently extracting useful knowledge to medical practice from the large body of scientific information accumulated.As always, progress only stems from innovative research, but it is necessary to strengthen the translational research, which takesthe basic knowledge to patient application, and the clinical research, which is dedicated to the optimization of diagnostic,therapeutic or preventive methods. These developments occur in a very special and ever changing environment, in which themost relevant features are the rapid spread of information, the needs for reviewing ethical concepts and practical principlesderived thereof, and an impressive change in the demographic and nosologic profile of the population. If these chalanges aremet, the powerful tools of medical and biomedical research currently available can be used to quickly and efficiently achievetargets that will significantly modify the practice of medicine for the benefit of patients.Key words: Physician-scientist, medical practice, twenty-first century, research.

Três textos de grande impacto na comunidade científicaao longo dos últimos 20 anos do século passado apontavampara um fenômeno que parecia irreversível, a extinção domédico-cientista nos Estados Unidos, o país onde haviaatingido o auge de sua existência: “The clinical investigatoras an endangered species” (WYNGAARDEN , 1979), “Theend of the physician-scientist?” (GILL, 1984) e “The physician-scientist: an essential and fragile link in the medical researchchain” (ROSENBERG, 1999). Isso, no entanto não aconteceu,pois as iniciativas de instituições como National HealthInstitutes e várias fundações de apoio à pesquisa médicalevaram a uma revitalização desta carreira (LEY, 2005). Aqui,como lá, é necessário garantir apoio à formação destes

cientistas, e fortalecer seu papel nas instituições, envolvendomecanismos de contratação de pessoal, ascensão na carreira,remuneração e papel no ensino médico. As agências defomento à pesquisa como CNPq, FAPs, FINEP e mesmo oMinistério da Saúde e Comitê Gestor do Fundo Setorial daSaúde devem estar atentos para aperfeiçoar o apoio a essespesquisadores.

A reorganização das escolas médicas no Brasil, com aseparação dos cursos fundamentais que ficaram a cargo dedepartamentos situados em institutos básicos (por exemplo,de ciências biológicas, de ciências biomédicas ou de química),provavelmente serviram para corroborar a pesquisa básica,mas afastaram-nas sensivelmente da medicina clínica ereduziram seu papel na formação dos jovens médicos. Osprogramas de fortalecimento dos médicos-cientistas devemlevar em conta a meta de garantir a inserção de médiospesquisadores nas ciências básicas. Sem ignorar acontribuição vigorosa dos biólogos, bioquímicos,fisiologistas, farmacologistas, e outros cientistas não-médicos,a presença de pesquisadores com formação médica garante

Page 18: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

8 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):7-11Marco Zago

desenvolvimento de investigações e grupos de pesquisa quetêm um perfil especial no progresso da medicina.

Preservado e valorizado, o médico-cientista encontraráobstáculos e desafios. Vamos abordar algumas questões que,a meu ver, vão desempenhar um papel importante na pesquisamédica e biomédica nos próximos anos. Embora nossapreocupação precípua seja a pesquisa médica no Brasil, emgrande parte as questões pertinentes são compartilhadas pelapesquisa médica em geral. Algumas particularidades própriasde nosso país serão assinaladas ao longo do texto, mas nãohá motivo para entender que os desafios e perspectivas sejamsensivelmente diferentes aqui e no restante do mundo, excetopelo que ocorre em países onde há grandes massas aindavivendo na pobreza extrema, com índices muito baixos deacesso à atenção à saúde, e expostos a endemias de grandesproporções.

Esses obstáculos e desafios estão resumidos nos tópicosseguintes: gerenciamento de informações, as três fases dapesquisa médica, ambiência, instrumentos e alvos.

Gerenciamento de Informações

O impressionante progresso das ciências a partir dasegunda metade do século anterior reflete-se no crescimentoexponencial das publicações científicas. Uma questão centralquando se lida com esse volume extraordinário de informaçõesé como utilizá-las adequadamente para fazer progredir oexercício de uma profissão fundamentada na ciência, como amedicina.

Este será, sem sombra de dúvida, um dos principaisobstáculos a ser vencidos no século 21: extrair conhecimentoda ciência e aplicá-lo para o avanço da prática médica(CULLITON, 2006). Não se trata apenas de separar os melhorestrabalhos, mas sim identificar aqueles que representam umacontribuição nova e relevante que pode direta ou indiretamentemodificar a prática médica.

Um exemplo é a história que levou ao desenvolvimento doprimeiro medicamento para tratamento de uma neoplasiaplanejado com base no conhecimento do defeito molecular, oimatinib, utilizado para o tratamento da leucemia mielóidecrônica. A doença, conhecida desde 1845, caracteriza-se pelaexpansão maciça das células mielóides da medula óssea e dosangue periférico, onde têm aspecto “maduro”, com umaevolução oligossintomática que dura em média 3-5 anos,quando sofre uma metamorfose, assumindo uma evoluçãoaguda, e rapidamente progride para a morte. Nenhuma formade tratamento da doença adotada até a década de 80 do séculopassado tinha qualquer impacto sobre a sobrevida dospacientes, e somente a introdução do transplante de medulaóssea começou a modificar esse quadro (SPECK, 1984). Em1960, Nowell e Hungerford descreveram uma alteraçãocromossômica característica, o cromossomo Ph1, presente empraticamente todos os casos típicos da doença (NOWELL, P.;HUNGERFORD. D., 1960, 1961). Em 1973 demonstrou-se queesse defeito era devido a uma translocação entre os

cromossomos 9 e 22, e nove anos mais tarde observou-se quea translocação cria um gene híbrido formado pela junção departe do gene abl com o gene bcr. Esse gene híbrido bcr/ablcodifica uma tirosino-cinase hiperativa que provoca o fenótipoleucêmico. Em 1996 foi desenvolvida uma pequena moléculaque ocupa o lugar do ATP no centro ativo da enzima, inibindosua ação. O uso terapêutico dessa molécula (imatinib),autorizado pelo FDA em 2001, modificou completamente oprognóstico da doença, sendo hoje o medicamento de escolhade primeira linha para tratar leucemia mielóide crônica.

Entre 1960 e 2007 o PubMed registra 17.303 trabalhos sobreleucemia mielóide crônica; essa é, obviamente, apenas umafração de tudo o que se publicou no mundo neste períodosobre a doença. No entanto, não mais do que 100-200 dosartigos publicados neste período (ou seja, menos de 1% dototal) encerram toda a base científica para o progresso doconhecimento sobre a doença que teve impacto decisivo naprática médica. Mesmo se limitarmos à mais expressiva revistade hematologia, Blood, encontramos neste período mais de1.000 artigos publicados sobre esta moléstia.

Portanto, o gerenciamento de informações passa a sercentral para a missão de extrair conhecimento útil a partir damassa crescente de dados científicos. Esse problema já foiresolvido para situações mais simples, como o gerenciamentode grandes volumes de dados derivados do seqüenciamentode genomas, da análise de proteomas ou de transcriptomas,espaço que foi ocupado pela bioinformática, que se consolidouna última década. Uma visão ampliada deve colocar ainformática biomédica e todas as ciências de informação nocentro desta questão.

As Três Fases da Pesquisa Médica e Biomédica

A história da leucemia mielóide crônica resume ainda astrês fases necessárias para que o conhecimento científico sejautilizado de maneira a produzir mudanças e progressos naprática médica: a pesquisa básica, a pesquisa translacional e apesquisa clínica (Quadro 1).

Quadro 1. Três fases da pesquisa médica e biomédica. Apesquisa não é diferente na sua essência nem no seu valor,variando, sim, as abordagens e o foco. Por isso, devemosreconhecer diferentes fases da pesquisa, e não diferentes tiposde pesquisa.

Pesquisa básica: que revela novos achados quanto aosmecanismos fisiopatológicos, etiopatogenia, ou basespatológicas, moleculares e celulares das doenças.Pesquisa translacional: que promove a transferência desteconhecimento novo para sua aplicação humana (medicinaclínica), para o diagnóstico, o tratamento ou prevenção dadoença.Pesquisa clínica: que busca a otimização dos métodos dediagnóstico, de tratamento e de prevenção.

Page 19: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

9Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):7-11 Os Desafios do Médico-Cientista

Vistas destas formas, estas três modalidades constituemum verdadeiro “continuum” que leva a pesquisa da bancadaou da comunidade para suas aplicações. A pesquisa básicanão se restringe obrigatoriamente à que se faz na bancadados laboratórios de bioquímica, fisiologia ou farmacologia,pois a descrição de doenças ou suas variantes e oconhecimento derivado de estudos epidemiológicosdescritivos conformam-se a essa noção. Assim, o progressoda pesquisa médica capaz de produzir resultados relevantesno Brasil passa pelo fortalecimento da pesquisa translacionale da pesquisa clínica.

Adicionalmente, deve-se enfatizar que o conhecimentobásico, quando alcança as aplicações clínicas pela pesquisatranslacional e pesquisa clínica, é geralmente acompanhadode um forte efeito multiplicador. Assim, a demonstração deque uma droga anti-tirosino-cinase tem importante efeito anti-neoplásico provou uma procura por outras drogas com efeitosemelhante, e como conseqüência já foram testadas ou estãoem teste para o tratamento do câncer mais de 70 moléculasque interferem com tirosino-cinases (HUNTER, 2007).

Ambiência, Instrumentos e Alvos

Ao considerarmos esses objetivos, ou seja, ogerenciamento do conhecimento e o fortalecimento daspesquisas translacional e clínica, devemos considerar algunsaspectos que vão modular e focalizar nossas ações na próximadécada: a ambiência, os instrumentos e os alvos.

Ambiência deve ser entendida como o ambiente materiale intelectual em que se executa a pesquisa, representadapelo momento histórico tanto da ciência, como dascondições físicas da população como das oportunidadescriadas pelo desenvolvimento científico e tecnológico dopaís. Alguns dos tópicos que caracterizam a ambiêncianeste momento estão listados no Quadro 2. O vínculo comas condições mundiais é evidente, embora algumaspeculiaridades relacionadas com o Brasil possam serapontadas: enquanto os 6 primeiros são válidosuniversalmente, os dois últimos têm maior peso no Brasil.Progressos científico e tecnológico ocorrem paralelamentee influenciam-se mutuamente. O avanço tecnológicoviabiliza execução de atividades de pesquisa que dependemde instrumentação apropriada, cuja importância pode sercomprovada na área de microscopia e manipulação decélulas e componentes celulares, de um lado, e do progressoda área de imagens médicas do outro. De fato, atransformação produzida nas práticas diagnósticas emcurto período de tempo pela ultra-sonografia, tomografiacomputadorizada e ressonância nuclear magnética não temparalelo na história da medicina. Esta é uma tendência quese acentuará, certamente, nesta década, aumentando aproeminência da engenharia biomédica, da física médica,da instrumentação médica e da nanotecnologia.

Outra característica dos tempos atuais é a rapidez decirculação das informações, cujo acesso quase universal e

instantâneo tornou-se possível graças à internet.Juntamente com o progresso do conhecimento científico etecnológico, isso vem acelerando a velocidade com que asdescobertas relevantes da ciência básica alcançam suasaplicações clínicas. Nós já nos referimos aos 41 anosdecorridos entre a descoberta do cromossomo Ph1 em 1960,e a chegada às farmácias do imatinib para tratamento daleucemia mielóide crônica. Desde a descoberta de Marshalle Warren (1984), em 1984, da presença em lesões ulceradasdo estômago e duodeno de uma bactéria desconhecida,depois denominada Helicobacter pylori, até a comprovaçãode seu efeito etiopatogênico sobre o câncer de estômagodecorreram apenas 10 anos (INTERNATIONAL AGENCYFOR RESEARCH ON CANCER WORKING GROUP ON THEEVALUATION OF CARCINOGENIC RISKS TO HUMANS,1994), e a impressionante modificação que essa descobertaproduziu nas condutas médicas levou a um declínio damortalidade por câncer do estômago em todo o mundo,também observado no Brasil (Figura 1). Finalmente, adescoberta da mutação de JAK2 em doençasmieloproliferativas 2004 levou à sua utilização consensualcomo marcador diagnóstico da policitemia vera, emsubstituição a testes mais antigos e consagrados, como adeterminação do volume sangüíneo e a dosagem deeritropoetina, em menos de 4 anos (SKODA, 2007) (Tabela 1).

Quadro 2. Ambiência da pesquisa no século 21.

Avanço científicoProgresso tecnológicoRapidez de circulação de informaçõesQuestões éticas advindas do progresso científicoIdentificação e peso dos fatores ambientaisMudança do perfil demográficoMudança do perfil nosológico

Figura 1. Câncer no Brasil: evolução da mortalidade ajustadapor 100.000 habitantes do sexo masculino para três tipos decânceres muito comuns.

1980 1985 1990 1995 2000 2004

18

15

12

9

6

3

Anos

Próstata

Estômago

Cólon e Reto

Page 20: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

10 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):7-11Marco Zago

A importância das questões éticas não pode ser minimizada.Exige que pesquisadores, autoridades de saúde, profissionaisda saúde, representantes dos interesses da população,legisladores e juristas discutam os progressos da ciência e datecnologia vis-à-vis os interesses dos pacientes e dapopulação de uma maneira mais ampla. Neste aspecto, énecessário um grande esforço para passar da visão herdadado passado, de que as pesquisas médicas embutem comfreqüência grandes riscos aos pacientes, para uma visão maismoderna de que as doenças representam um grande risco e,por isso, a condução de pesquisa médica para dar acesso aospacientes a melhores alternativas de diagnóstico, prevençãoe tratamento é um dever moral da comunidade médica ecientífica (HARRIS, 2005). Obviamente que os limitesclaramente expressos na declaração de Helsinque têm queobservados, mas é imperativo mudar a ênfase, passando deuma visão restritiva e proibitiva para atitude mais positiva emvista da responsabilidade da sociedade de promover oprogresso do conhecimento e da prática médica.

O Brasil é um dos mais expressivos exemplos da mudançado perfil demográfico corrente em numerosos países domundo. A associação de um aumento da expectativa de vida,redução da mortalidade infantil e grande diminuição dafertilidade, passando da média de 6,2 para 2,2 filhos por mulherentre o início da década de 60 e o presente, fez com que aproporção de idosos e muito idosos aumentassesignificativamente no país, esperando-se que em 2025 o Brasiltenha cerca de 34 milhões de pessoas com mais de 70 anos,correspondendo a 13% de sua população, projetando umapopulação de mais de 13 milhões de brasileiros com mais de80 anos em 2050. Essa mudança levou doenças como enfartes,acidentes vasculares cerebrais e câncer para o topo das causasde morte na população brasileira. Ao mesmo tempo, asdoenças da urbanização e causas externas, como acidentes,homicídios, alcoolismo, uso de drogas ocupam o primeiro lugarcomo causa de morte e como carga de doença dos adultosjovens, em fase produtiva da vida. De fato, a OrganizaçãoMundial da Saúde estima que, em 2020, 75% da carga de doençanos países em desenvolvimento será representada pordoenças mentais, doenças crônicas e degenerativas, e doençasda urbanização incluindo seqüelas de acidentes detrânsito(HEALTH CARE FOR CHRONIC CONDITIONSTEAM, 2005). Como conseqüência, essas moléstias adquiremuma posição de destaque na atenção da pesquisa médica.Mais que isso, porém, toda a assistência à saúde e o próprioensino de medicina deverão ser replanejados e adequados aessa nova realidade.

Quanto aos prinicpais instrumentos (Quadro 3), o uso dasmodernas abordagens para estudo de genoma, proteoma eexpressão gênica já produziram uma substancial modificaçãona maneira como a ciência é conduzida, em especial no modelode geração de hipóteses. A disponibilidade de grande massade dados biológicos fundamentais permite sua livre exploraçãopreliminar, com intenso uso de informática, para gerarhipóteses focalizadas que podem então ser testadas segundopadrões mais tradicionais, embora fazendo uso de um arsenalmuito potente para examinar e modificar o comportamento degenes, de células e de organismos, como iRNA e a geração deanimais knock-out.

O exame da situação no Brasil revela uma ciência biomédicae disciplinas como bioquímica, fisiologia, farmacologia,parasitologia, imunologia e biologia celular e molecular fortes,com expressão internacional e uma rede de laboratórios egrupos de pesquisa consolidados. É previsível que, mantidasas condições de apoio a esses grupos, a produção científicacrescerá em volume e qualidade. Por outro lado, a pesquisatranslacional é ainda frágil, e precisa ser incentivada paragarantir que fluxo de informações derivadas das ciênciasbásicas atinja os pacientes. A recente criação de uma rede deCentros de Pesquisa Clínica, iniciativa conjunta do ComitêGestor do Fundo Setorial de Saúde e do Decit da Secretaria deCiência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério daSaúde, constitui o primeiro passo para reforçar a pesquisaclínica no país, juntamente com os programas de pesquisaepidemiológica, como por exemplo os estudos de coorte derecém-nascidos (CARVALHO et al., 2007; VICTORA et al.,2007) e o projeto ELSA (Estudo Longitunidal de Saúde doAdulto, http://www.elsa.org.br)

Juntamente com a rede de grupos de pesquisa básica, ofortalecimento da pesquisa translacional e da pesquisa clínica

Quadro 3. Principais instrumentos da pesquisa médica ebiomédica no início do século 21.

Genoma, proteoma, expressão gênica, estudos deestrutura-funçãoAnticorpos monoclonais, iRNA, outras sondasmolecularesTécnicas de imagem: microscópicas, organismo(imagenologia clínica)Isolamento e cultura de célulasAnimais transgênicosEpidemiologia (em especial estudos de coortes)Trials clínicos

Tabela 1. Diminuição do intervalo de tempo decorrido entre a descoberta básica e sua aplicação clínica.

Ano Achado Ano Aplicação Intervalo

1960 Ph1 2001 Aprovação do imatinib pelo FDA 41 anos1984 H. pylori 1994 Carcinógeno tipo I (IARC) 10 anos2004 Mutação JAK2 2007 Achado diagnóstico para policitemia vera 4 anos

Page 21: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

11Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):7-11 Os Desafios do Médico-Cientista

criará condições para que todo o ciclo da pesquisa médica ebiomédica, da banca básica à aplicação clínica, como exemplificadopelas histórias do Ph1-imatinib ou do H. pylori, possa sedesenvolver no Brasil (Quadro 4).

O Quadro 5 resume alguns aspectos que devem marcar apesquisa médica e biomédica no Brasil na próxima década.

Referências

1. CARDOSO, V.C. et al. Profile of three Brazilian birth cohortstudies in Ribeirão Preto, SP and São Luís, MA. Braz J Med BiolRes, 40:1165-76, 2007.2. CULLITON, B.J. Interview. Extracting knowledge fromscience: a conversation with Elias Zerhouni. Health Affairs (WebExclusive), 25:w94-w103, 2006.3. GILL, G.N. The end of the physician-scientist? The AmericanScholar, 53:353-368, 1984.4. HARRIS, J. Scientific research is a moral duty. J Med Ethics,31:242-248, 2005.5. HEALTH CARE FOR CHRONIC CONDITIONS TEAM.Innovative care for chronic conditions. Building blocks. WorldHealth Organization, Geneva, 98 pages, 2002.6. HUNTER, T. Treatment of chronic myelogenous leukemia:the long road to imatinib. J Clin Invest, 117: 2036-2043, 20077. INTERNATIONAL AGENCY FOR RESEARCH ON CANCERWORKING GROUP ON THE EVALUATION OF CARCINOGENICRISKS TO HUMANS. Schistosomes, Liver Flukes, and Helicobacterpylori. Lyon: International Agency for Research on Cancer, 177-240, 1994.8. LEY, T.L; ROSENBERG L.E. The physician-scientist careerpipeline in 2005. Build it, and they will come. JAMA, 294:1343-1351, 2005.9. MARSHALL BJ, WARREN JR. Unidentified curved bacilli inthe stomach of patients with gastritis and peptic ulceration. Lancet,1:1311-1315, 1984.10 . NOWELL, P.; HUNGERFORD, D. A minute chromosomein human chronic granulocytic leukemia. Science 132:1497,1 9 6 0 .11 . ______. Chromosome studies in human leukemia. II. Chronicgranulocytic leukemia. J. Natl. Cancer Inst., 27:1013–1035, 1961.12 . ROSENBERG, L.E. The physician-scientist: An essential —and fragile — link in the medical research chain. J. Clin. Invest.,103:1621-1626, 1999.13 . SKODA, R. The genetic basis of myeloproliferative disorders.Hematology. Am Soc Hematol Educ Program, 1-10, 2007.14 . SPECK, B. et al. Allogeneic bone-marrow transplantation forchronic myelogenous leukaemia. Lancet, 1(8.378):665-668, 1984.15 . VICTORA, C.G. et al. Cohort Profile: The 1993 Pelotas (Brazil)Birth Cohort Study. Int J Epidemiol, 2007 Sep 10; [Epub ahead ofprint].16 . WYNGAARDEN, J.B. The clinical investigator as anendangered species. N Engl J Med, 23:1254-1259, 1979.

Quadro 4. Principais alvos da pesquisa médica e biomédica.

Identificar as bases moleculares para:Compreender a heterogeneidade de mecanismosmolecularesEntender as variações da evolução e do desfecho clínicoBusca de alvos terapêuticosBusca de alvos preventivosTratamento individualizadoDesenvolver métodos precisos para:Diagnóstico precoceAvaliar evolução, resposta terapêutica, remissão e cura

Quadro 5. Alguns tópicos que deverão constituir o foco de atençãodos pesquisadores médicos e biomédicos e dos formuladores depolítica científica e tecnológica nos próximos anos.

Apoio à formação, à inserção e ao papel do médico-cientistaGerenciamento de informaçõesBioinformática, informática médica, ciências de informaçãoPesquisa médica translacionalPesquisa clínicaInstrumentação, engenharia biomédica e nanotecnologiaGerontologia e geriatriaDoenças crônico-degenerativas e oncologiaMedicina regenerativaMedicina personalizadaDoenças do “terceiro perfil”, da urbanização e ligadas àdegradação do meio ambienteFortalecimento e modernização da ética médica e biomédica

Page 22: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

12 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):12-21Reinaldo Guimarães et al.

O Ministério da Saúde e a Pesquisa em Saúde no BrasilO Ministério da Saúde e a Pesquisa em Saúde no BrasilO Ministério da Saúde e a Pesquisa em Saúde no BrasilO Ministério da Saúde e a Pesquisa em Saúde no BrasilO Ministério da Saúde e a Pesquisa em Saúde no Brasil

Ministry of Health and the Research in Public Health in Brazil

Reinaldo Guimarães1 , Suzanne Jacob Serruya2, Adriana Diaféria3

1Secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde; 2Diretora do Departamento de Ciência eTecnologia do Ministério da Saúde; 3Diretora do Departamento de Economia em Saúde do Ministério da Saúde; Brasília, DF, Brasil

O artigo apresenta as bases conceituais da atuação recente (2003-2007) da Secretaria de Ciência, Tecnologia eInsumos Estratégicos do Ministério da Saúde. Começa discutindo o panorama da pesquisa em saúde no mundo e noBrasil e segue dialogando com a perspectiva de que o Ministério da Saúde deve tornar-se um ator relevante nadefinição e implementação da política de pesquisa em saúde no país, bem como nas ações de fomento. Finalmente,apresenta os principais desafios que se colocam para o ministério nos anos vindouros.Palavras-chave: Ministério da Saúde, pesquisa em saúde, ciência e tecnologia, Brasil.

The article presents the conceptual bases which has driven the performance of the Secretary of Science, Technology andHealth Products of the Brazilian Ministry of Health between 2003 and 2007. It starts discussing the landscape of healthresearch worldwide and into the country. It supports the idea of a more important role of the Ministry of Health in theconstruction and implementation of a health research policy in Brazil. Finally, it presents the main challenges for theMinistry in that field in the next years.Key words: Ministery of Health, research in health, science and technology, Brazil.

Entre 2003 e 2007, a Secretaria de Ciência, Tecnologia eInsumos Estratégicos comprometeu cerca de R$ 232,7 milhõespara o apoio à pesquisa e à inovação em saúde no Brasil e R$180,4 milhões para o fortalecimento da estrutura produtiva darede de laboratórios farmacêuticos oficiais. Vale frisar queesses recursos são incrementais aos oriundos do MCT, doBNDES, do MEC e das agências estaduais. Algumas dessasagências, além disso, alocaram recursos de seus orçamentose dos Fundos Setoriais de Saúde e Biotecnologia aos projetosapoiados pela Secretaria.

Essas ações realizaram-se a partir de um esforço deconstrução conceitual, da tradução desses conceitos em umaformulação política explícita e da pactuação dessa política,bem como de uma agenda de prioridades de pesquisa, comagentes governamentais, pesquisadores, gestores de saúdee usuários do SUS.

O objetivo desse artigo é expor alguns dos conceitos quefundamentaram a decisão de levar o Ministério da Saúde aoterreno do fomento à pesquisa científica e tecnológicaextramuros, o que jamais havia ocorrido de modo consistentedesde a sua criação, em 1953. Em outros termos, discutir aimportância e a oportunidade de, em um país como o Brasil,trazer a autoridade sanitária nacional para o centro das açõesde política de ciência, tecnologia e inovação em saúde.

A Pesquisa em Saúde no Mundo e no Brasil

Com a exceção dos países com pretensões hegemônicasglobais ou regionais, a saúde é o setor que mais mobilizarecursos para a pesquisa, desenvolvimento e inovação. Deacordo com o Global Forum for Health Research (2006), em2003 foram desembolsados 125,8 bilhões de dólares com esseobjetivo. Visto em uma perspectiva temporal, os desembolsosvêm crescendo a uma velocidade média de cerca de 10% aoano desde 1998, quando a série foi iniciada. Os dados estãoapresentados na Figura 1.

A desagregação desses recursos segundo a sua fonterevela que o setor privado mobiliza mais recursos do que osetor público e que a relação entre os dois tipos de fontes se

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. Dr. Reinaldo Felippe Nery Guimarães.Secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Ministérioda Saúde - Bloco G, Gabinete 8º Andar. 70058-900. Brasília, DF, Brasil.Tel: +55 (61) 3315-2839; Fax: +55 (61) 3223-0799. Endereçoeletrônico: [email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):12-21.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Figura 1. Estimativas dos dispêndios mundiais com pesquisae desenvolvimento em saúde entre 1998 e 2003.

Fonte: Estimativas do Global Forum for Health Research baseadas emdados de relatórios oficiais de OECD e RICYT, de levantamentosnacionais, associação farmacêutica e outras publicações.

0

20

40

60

8084.9

92.0 98.0105.9

115.9125.8

100

120

140

1998 1999 2000 2001 2002 2003

Page 23: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

13Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):12-21 MS e a Pesquisa em Saúde no Brasil

mantém constante (55% contra 45%) durante os anoslevantados. Revela também que a participação dos países derenda média ou baixa no esforço mundial de pesquisa émarginal e que decresceu no período estudado (4,2% em 1998e 3.3% em 2003). Os valores em três pontos da série históricapor países de renda alta e média/baixa e segundo a fonte(pública ou privada) podem ser observados na Tabela 1.

A concentração das atividades de pesquisa em saúde nomundo não difere em substância da dos demais campos depesquisa. Segundo Paraje (2005), 90,4% do output bibliográficocientífico-tecnológico mundial estão concentrados em 42países de renda alta e destes, os cinco mais produtivos (EUA,Reino Unido, Japão, Alemanha e França), respondem por 72,5%da produção total. Os 9,6% restantes estão distribuídos entreos demais países da seguinte maneira: 1,7% entre 63 países derenda baixa, 5,4% entre 54 países de renda média inferior e

2,5% entre 31 países de renda média superior. Vale destacar ofato de que os países de renda média superior possuem menorpresença do que os de renda média inferior. Importa aindatomar nota de que os cinco países líderes neste últimosubgrupo (China, Federação Russa, Brasil, Turquia e África doSul) são responsáveis por 4,4% dos 5,4%. Se somarmos a esses4,4% a parcela correspondente à produção da Índia (que estáentre os países de renda baixa), teremos algo em torno a 5% dooutput mundial em pesquisa em saúde localizado em algunspoucos países entre os quais está o Brasil. A esse grupo, foidada recentemente a denominação de Innovative DevelopingCountries – IDC (MOREL et al., 2005). Estes países, muitoembora não pertençam ao pequeno grupo de países ricoslograram desenvolver uma importante capacidade instalada depesquisa, existindo para eles um papel identificável no cenáriomundial de pesquisa e inovação em saúde.

Tabela 1. Estimativa dos dispêndios globais com pesquisa e desenvolvimento em saúde em 1998, 2001 e 2003 por fonte esegundo a renda dos países.

Fonte: Estimativas do Global Forum for Health Research baseadas em dados de relatórios oficiais de OECD e RICYT, de levantamentosnacionais, associação farmacêutica e outras publicações.

2003 2001 1998

$ % S % $ %

Total 125.8 100 105.9 100 84.9 100

Total public sector 56.1 45 46.6 44 38.5 45Total private sector 69.6 55 59.3 56 46.4 55

Total private for profit 60.6 48 51.2 48 40.6 48Total private not for profit 9.0 7 8.1 8 5.9 7

HICs

Public sector 53.8 43 44.1 42 36.2 43Private for profit sector 59.3 47 49.9 47 40.0 47

Domestic pharmaceuticals 53.2 42 44.1 42 35.0 41Foreign pharmaceuticals 6.1 5 5.8 5 5.0 6

Private not-for-profit 8.6 7 7.7 7 5.6 7

Total HIC 121.7 97 101.6 96 81.8 96

LMICs

Public sector 2.4 1.9 2.5 2.4 2.3 2.7Public sector domestic 1.9 1.5 2.0 1.9 1.8 2.1Public funding from foreign ODA 0.4 0.3 0.4 0.4 0.4 0.5Public funding for international research 0.07 0.1 0.07 0.1 0.07 0.1

Private for profit sector: foreign and domestic pharmaceuticals 1.4 1.1 1.35 1.3 0.98 1.2Domestic private not-for-profit 0.08 0.1 0.08 0.1 0.08 0.1Foreign private not-for-profit 0.3 0.2 0.3 0.3 0.2 0.3

Total LMIC 4.1 3.3 4.3 4.0 3.6 4.2

Page 24: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

14 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):12-21Reinaldo Guimarães et al.

Segundo dados do Diretório dos Grupos e Pesquisa noBrasil, em 2004, para um total de 19.470 grupos de pesquisaem atividade, o país contava com 6.471 grupos com pelo menosuma linha de pesquisa vinculada à saúde humana (CNPq,2005). Essas linhas de pesquisa eram desenvolvidas por 25.562pesquisadores, em um total de 77.649, e, dentre aqueles, 15.978possuíam titulação doutoral. Esses dados sobre a capacidadeinstalada e a massa crítica nacional de pesquisa em saúde sãodemonstrados na Figura 2.

A atividade de pesquisa em saúde segundo os seus principaissegmentos mostra que em 2004 quase 50% da mesma vinculava-se à pesquisa clínica e cerca de 25% à pesquisa biomédica. Osdados completos estão apresentados na Tabela 2.

Figura 2. Grupos e pesquisadores envolvidos com pesquisaem saúde humana. Brasil, 2004.

Esse esforço realizado pelo país nos últimos 55 anos temfeito com que o Brasil venha galgando posições no rankingmundial de atividade de pesquisa realizada em universidadese institutos de pesquisa. Em 2006, o país alcançou a 15ª posição

dentre os países do mundo no que se refere a publicaçõescientíficas em periódicos indexados. Mesmo dentre os IDCs,quando se leva em conta este indicador da atividade depesquisa a performance do Brasil é bastante positiva, conformese pode observar na Figura 3.

No entanto, é muito provável que o conceito dos IDCs,proposto por Morel et al. (2005), esteja em rápida evolução.Essa evolução pode ser entendida quando são revelados, por

exemplo, os dados brasileiros correspondentes ao aspectomais relevante do processo de inovação, que é a atividade depesquisa e desenvolvimento nas empresas. Extraídos dosresultados da Pesquisa sobre Inovação Industrial 2001 –PINTEC (IBGE, 2003), apresentamos alguns indicadores paraos setores industriais que estão mais associados ao ComplexoIndustrial da Saúde (CIS). O nível de agregação dos dados daPINTEC permite que trabalhemos apenas com proxis dessanatureza. Os dados estão descritos na Tabela 3.

A tabela compara a performance das empresas vinculadasao CIS com o total das empresas cobertas pela PINTEC,segundo alguns aspectos vinculados às atividadesinovadoras. O que se observa é que, com a exceção do pessoalocupado, onde as empresas do CIS estão na média de toda aindústria de transformação, em todos os outros aspectos elasapresentam proporções superiores. Suas receitas sãoproporcionalmente maiores, a presença de empresasinovadoras e com atividades internas de P&D entre elas émaior, a presença de pessoal ocupado com P&D em geral ecom nível superior também é maior. No entanto, mesmo que sepossa afirmar que as empresas do CIS encontram-se em um“patamar inovador” mais elevado do que o conjunto daindústria de transformação no Brasil, quando se compara suasperformances com as indústrias vinculadas à saúde em paísesdesenvolvidos, a diferença é ainda brutal. Inovamos pouco ea qualidade das inovações, medida pela sua radicalidade oupela quantidade de pesquisa e desnvolvimento tecnológicoautóctone envolvido nas mesmas, é muito baixa. Levando emconta toda a indústria de transformação, cerca de 60% dasinovações observadas pela PINTEC referem-se a compras denovas máquinas no país ou no exterior.

Um outro modo de avaliar a capacidade inovadora em saúdeno país é medir a participação das empresas do CIS no balançogeral do financiamento à pesquisa em saúde entre nós. Osdados que apresentaremos são preliminares e foram extraídosdo levantamento 2003-2005 de um observatório do

Groups Researchers PhD

129996471

52087

25562

31995

15978

HealthOther

Tabela 2. Distribuição das linhas de pesquisa vinculadas àsaúde humana segundo segmentos. Brasil, 2004.

Segmento Nº de linhas de pesquisa %

Clínica 8.586 46,8Biomédica 4.531 24,7Tecnologia em Saúde 2.781 15,2Saúde Pública 2.431 13,2Não Classificada 22 0,1Total 18.351 100,0Fonte: CNPq/MCT – Censo 2004 do Diretório dos Grupos de Pesquisano Brasil.

Figura 3. China, Índia, México e Brasil. Número de artigos emcampos de pesquisa em saúde. Médias qüinqüenais, 1995-2005.

Fonte: ISI/Essential Science Indicators.

0

5.000

1995-1999 1996-2000 1997-2001 1998-2002 1999-2003 2000-2004 2001-2005

10.000

15.000

20.000

25.000

30.000

35.000

40.000

China Índia BrasilMéxico

Page 25: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

15Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):12-21 MS e a Pesquisa em Saúde no Brasil

financiamento à pesquisa em saúde no Brasil, apoiado peloMinistério da Saúde e realizado pelo Grupo de Pesquisa deEconomia em Saúde do Instituto de Medicina Social da UERJe pelo Instituto de Informação e Comunicação em Ciência eTecnologia da Fiocruz1 .

A metodologia dos levantamentos está de acordo com asorientações da “Família Frascati” da OCDE e está organizadasegundo uma matriz de fontes e usuários. Entre 2003 e 2005,foram destinados no Brasil para pesquisa em saúde (R$ correntes)R$ 2,99 bilhões, sendo R$ 2,1 bilhões oriundos do setor público,R$ 824,6 milhões do setor privado e R$ 55,2 milhões de organismosinternacionais. Na Figura 4, o fluxo de recursos entre fontes eusuários em valores proporcionais pode ser observado.

O que cabe destacar aqui é o balanço entre o setor públicoe o setor privado (essencialmente as indústrias do CIS) noesforço de pesquisa em saúde no Brasil. O que se observa éque menos de 30% desse esforço tem como fonte aquelasindústrias e as mesmas utilizam um volume similar de recursoscom atividades de pesquisa e desenvolvimento. Nos SistemasNacionais de Inovação em países desenvolvidos, o balanço éoposto ao verificado no Brasil. Neles, entre dois terços e trêsquartos do esforço nacional para a pesquisa em saúde temcomo fonte e destino o setor industrial.

Daí que talvez o grupo dos IDCs possa estar sediferenciando em dois subgrupos, de acordo com a efetiva

participação do setor industrial nos respectivos SistemasNacionais de Inovação. Por um lado, aqueles países emdesenvolvimento, como o Brasil, cujo setor industrial tem umaparticipação ainda pequena no sistema de inovação e, por outro,os países nos quais se observa um crescimento sustentado daparticipação da indústria no esforço nacional de pesquisa,desenvolvimento e inovação em saúde. A rigor, aquelesprimeiros deveriam ser denominados de “países emdesenvolvimento potencialmente inovadores” e a Índia e a Chinade “países em desenvolvimento inovadores”. Aliás, diferençasentre Brasil, Índia, China e Rússia, países comumente agrupadosem um coletivo denominado BRICs, parecem ser bem maisprofundas do que parecem em um primeiro olhar2 .

Por que a Autoridade Nacional de Saúde deve Tornar-se um AtorCentral no Terreno da Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde?

Há duas razões básicas para que o Ministério da Saúdevenha a ocupar um lugar central na política de pesquisa emsaúde. A primeira delas é fazer com que a agenda da pesquisaem saúde aproxime-se da agenda da política pública de saúde,com suas necessidades e prioridades.

O orçamento do National Institutes of Health (NIH)proposto para 2008 é de US$ 28,7 bilhões (cerca de 80% paraa pesquisa extramural e 10% para aquela realizada em seuspróprios institutos). Seria razoável pensar que com essa

1 As atividades do observatório são coordenadas pelo Prof. Cid Manso deMello Vianna, do IMS, UERJ. O primeiro levantamento cobriu os anos de2000 a 2002 e seus resultados estão publicados em Mello Vianna, C.M. etal. – Bulletin of the World Health Organization, 2007; 85:124-130.

2 Para uma discussão qualificada e ampliada do tema, ver Fiori, J.L. – Anova geopolítica das nações e o lugar da Rússia, China, India, Brasil eÁfrica do Sul, in OIKOS no 8, ano VI, 2007, pp 77-106.

Tabela 3. Empresas da indústria de transformação entre 1998 e 2003. Total de empresas e setor de saúde.

Empresas da indústria de transformação entre 1998 e 2000. Total de empresas e setor de saúde (1)Todos os setores (A) Setor de saúde (B) B/Ax100

Total de empresas 72.005 1.239 1,72Receita líquida (R$ 1.000,00) 582.406.146 17.631.823 3,03Empresas inovadoras 19.165 613 3,20Empresas com atividades internas de P&D 7.412 380 5,13Pessoal ocupado 4.959.623 81.783 1,65Pessoal ocupado com P&D (2) 41.467 2.757 6,65Com nível superior 12.953 1.163 8,98(1) Proxi formada pela soma da CNAE - “Fabricação de produtos farmacêuticos” com “Fabricação de instrumentos de instrumentação médico-hospitalar, instrumentos de precisão e óticos, equipamentos para automação industrial, cronômetros e relógios”. (2) Equivalente em tempo integral.

Empresas inovadoras entre 2001 e 2003 com atividades internas de P&D. Pessoal ocupado com P&D em 31/12/2003.Total de empresas e setor de saúde (1).

Todos os setores (A) Setor de saúde (B) B/Ax100Total de empresas 84.262 1.467 1,74Receita líquida (R$ 1.000,00) 953.705.414 25.204.887 2,64Empresas inovadoras 28.036 666 2,38Empresas com atividades internas de P&D 4.941 333 6,74Pessoal ocupado 5.354.909 138.511 2,59Pessoal ocupado com P&D (2) 38.523 2.114 5,49Com nível superior 21.795 1.391 6,38(1) Proxi formada pela soma da CNAE - “Fabricação de produtos farmacêuticos” com “Fabricação de instrumentos de instrumentação médico-hospitalar, instrumentos de precisão e óticos, equipamentos para automação industrial, cronômetros e relógios”. (2) Equivalente em tempo integral.

Page 26: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

16 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):12-21Reinaldo Guimarães et al.

quantidade de recursos a idéia de estabelecer prioridades noapoio à pesquisa pudesse ser abandonada. No entanto, oNIH, que responde ao correspondente norte-americano doMinistério da Saúde, estabelece as suas prioridades. São muitoamplas, naturalmente, mas indispensáveis para justificar asolicitação dos recursos ao Congresso. Todos os demaisórgãos de fomento à pesquisa em saúde no mundodesenvolvido igualmente estabelecem suas prioridades, agorajá em um patamar orçamentário bem mais modesto, muitoembora ainda impressionantes para os padrões brasileiros3.

Mas além do problema da escassez dos recursosfinanceiros, a definição de prioridades é essencial para que seestabeleça a primeira justificativa dada mais acima para que oMinistério da Saúde se ocupe da gestão da pesquisa em saúde.Determinar prioridades é essencial para que a agenda depesquisa se aproxime da agenda da política pública de saúde.

Em muitos países em desenvolvimento que possuemalguma tradição em pesquisa, em particular na região dasAméricas, a política de C,T&I é governada por órgãossimilares ao nosso CNPq e por outras agências subordinadasou não a um ministério com ação horizontal (ou dito de outramaneira, transversal), como o Ministério da Ciência eTecnologia (MCT). No terreno científico e tecnológico, asações horizontais dizem respeito a todas as áreas doconhecimento, sem “especializações”. Seu contraponto sãoas ações setoriais (ou verticais), que tratam de um setor deatividade específico. No Brasil, o principal setor de atividade

cujas diretrizes e ações de política científica e tecnológica sãomajoritariamente definidas e executadas em uma concepçãosetorial é o setor agropecuário. Nele, o Ministério daAgricultura (que é um ministério setorial, diferentemente doMCT), mediante a ação da Empresa Brasileira de PesquisaAgropecuária (EMBRAPA), é o principal ator no campo dapesquisa. No entanto, o setor agropecuário é uma exceção.Há outras razões envolvidas, mas é indiscutível que o sucessoda pesquisa científico-tecnológica e da inovação brasileirasno setor agropecuário deve muito à decisão, tomada em 1973,de verticalizar a política de pesquisa neste setor. Registre-seque este sucesso é tanto científico-acadêmico (medido pelapresença internacional de endereços de autores de artigosacima da média nacional para todas as áreas) quantotecnológico e inovador (medido pelo sucesso no terreno doagronegócio e da agricultura familiar).

Em essência, quando se setorializa uma política de ciência,tecnologia e inovação, o que acontece é que as prioridadesdesta política ficam mais próximas da política setorial comoum todo. Naturalmente, para o sucesso desse movimento háoutras variáveis importantes envolvidas como, por exemplo,o grau de prioridade da política setorial no conjunto dasprioridades de governo e, ainda mais relevante, a importânciaeconômica do setor no conjunto da economia. Essas duascondições estiveram presentes no caso agropecuário.

O setor de saúde no Brasil é um dos poucos setoresgovernado por uma política que pode ser chamada de políticade Estado. As bases da política de saúde no país foramestabelecidas a partir de um amplo processo de debate enegociação na sociedade e no parlamento e o produtoresultante foi inscrito na Constituição brasileira. Trata-se deuma das poucas políticas públicas que hoje em dia é“acompanhada” por uma frente parlamentar suprapartidáriano Congresso Nacional. A partir de 1988, a política de saúdeno Brasil tem sido objeto de permanente priorização no âmbitodos governos e da sociedade.

O setor de saúde no Brasil mobiliza hoje entre 7,5% e 8%do PIB, sendo cerca de 40% desse esforço oriundo do setorpúblico nas três esferas de governo. Além de uma imensarede de prestação de serviços, ele incorpora um importantesegmento industrial, responsável pela fabricação demedicamentos, dispositivos diagnósticos, equipamentos, vacinase hemoderivados. Este segmento é intensivo em tecnologia einovação, embora essas atividades sejam desenvolvidaspredominantemente no exterior. Ao lado da necessidade deaproximar as ações de pesquisa das necessidades da políticade saúde, essas características de prioridade política e deimportância econômica justificam um movimento deverticalização na política de C,T&I em saúde no Brasil.

O segundo motivo pelo qual o Ministério da Saúde deveter um papel mais importante do que tem na pesquisa em saúdeé a necessidade de carrear mais recursos financeiros para apesquisa, bem como a necessidade de encontrar novas fontesde recursos. A experiência recente da ação do Ministério daSaúde em nosso país confirma esse argumento.

3 Medical Research Council, 2004-2005 (Br) – 512,4 milhões de Libras(~ US$ 887 milhões). Canadian Institutes for Health Research, 2002-2003 (Can) – 615 milhões de Dólares Canadenses (~ US$ 499 milhões).Institut National de la Santé et de la Recherche Médicale, 2005 (Fr) –499 milhões de Euros (~ US$ 584 milhões). No mundo dos InnovativeDeveloping Countries, as cifras são bem menores e comparáveis àsbrasileiras. O orçamento do Indian Council for Medical Research noano fiscal de 2002/2003 foi de aproximadamente US$ 200 milhões.

Figura 4. Fluxo de recursos financeiros destinados à pesquisaem saúde no Brasil entre 2003 e 2005. Resultados preliminares.

Fonte: Observatório do financiamento à pesquisa em saúde no Brasil.Levantamento 2003-2005.

DispêndiosTotais

em P&D/S

Ministério da Saúde

Outros Ministérios

OrganizaçõesInternacionais

Out. Org. Estad. /Municipais

ONGs

Conselhos e Associações

Universidades e Inst. de Pesquisa

Outras Instituições Privadas

(10,6%)

(1,6%)

(4,5%)

(0,6%)

(0,7%)

(0,1%)

(26,3%)

(0,3%)

(1,8%)

Out. Estaduais/ Municipais

(14,8%)

(13,8%)

(19,2%)

(8,9%)

(13,2%)

(27,8%)

Setor Industrial

(55,3%)

OrganizaçõesInternacionais

Ministério da Saúde

MCT

MEC

Out. Ministérios

FAPs

Setor Privado

(0,5%)

Page 27: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

17Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):12-21 MS e a Pesquisa em Saúde no Brasil

Em 2003, foi criada a Secretaria de Ciência, Tecnologia eInsumos Estratégicos em Saúde, que abrigou oDepartamento de Ciência e Tecnologia (DECIT), existentedesde o ano 2000. A partir de 2004, mediante a elaboraçãode uma política explícita para o setor e de uma AgendaNacional de Prioridades de Pesquisa em Saúde (ANPPS),bem como do reforço substancial de seu orçamento, oDECIT passou a ter uma presença cada vez mais relevanteno cenário do fomento à pesquisa em saúde no Brasil.

O advento da Politica Nacional de Ciência, Tecnologiae Inovação em Saúde e a elaboração da ANPPSestabeleceram as bases norteadoras do fomento à pesquisano Ministério da Saúde. A articulação das ações em tornoda ANPPS representou a decisão mais importante para aexecução da Política Nacional de Ciência, Tecnologia eInovação em Saúde no País, permitindo que a definiçãodas prioridades estivessem em consonância com osprincípios, objetivos e cenários relacionados com o sistemanacional de saúde.

A execução da agenda no Departamento de Ciência eTecnologia – DECIT/SCTIE – foi conduzida majoritariamentepor meio de 76 chamadas públicas nacionais e estaduais,que resultaram no apoio a 1950 projetos, além de outros253 contratados diretamente no quadriênio 2004-2007. Noprocesso de articulação nacional do fomento à pesquisaem saúde, o DECIT buscou também estabelecer parceriasinstitucionais para a realização de projetos querespondessem ao quadro de desigualdade regional emsaúde e pesquisa, tendo como perspectiva a carga brasileirade doença.

Entre esses estudos nacionais, destacam-se:- O Estudo Multicêntrico Randomizado em Terapia

Celular em Cardiopatias, iniciado em 2005, com aparticipação de mais de 30 centros em todo país, sob acoordenação de quatro instituições de pesquisa.

- A Pesquisa Nacional de Demografia em Saúde, queentrevistou cerca de 15 mil mulheres e examinou 5 milcrianças, e cujos resultados deverão, em 2008, orientare trazer novas evidências para áreas prioritárias, comoalimentação e nutrição, saúde da criança e saúde damulher.

- O Estudo Longitudinal de Saúde dos Adultos –ELSA Brasil –, que recrutará nas regiões brasileiras15 mil adultos com o objetivo de investigar dois dosprincipais componentes da atual carga de doençano Brasil, a hipertensão arterial e o diabetes mellitus.Este estudo também deverá trazer informaçõesimportantes nas temáticas de saúde mental e saúdeda mulher.

A Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação emSaúde (PNCTIS) propôs a formação de redes para ampliar acapacidade de produzir conhecimentos e qualificar as decisõesna gestão pública, visando a assegurar o aprimoramento dacapacidade regulatória do Estado (MINISTÉRIO DA SAÚDE/CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE, 2005). Em 2005, com o

objetivo de implementar a capacitação e fortalecer a infra-estrutura em pesquisa clínica, foram selecionadas 19instituições, representativas de todas as regiões brasileiras,que hoje integram a Rede Nacional de Pesquisa Clínica. Aorganização da expertise em pesquisa clínica em rede nacionalpermite não só investir recursos em um campo fundamentalpara o desenvolvimento de novos produtos e processos emsaúde, mas contribuir para que as unidades integrantesadquiram sustentabilidade na proposição, desenho econdução de ensaios clínicos que atendam as necessidadesda saúde pública brasileira.

Ainda com respeito à constituição de redes de pesquisa,devemos sublinhar a criação da Rede Multicêntrica deAvaliação de Implantes Ortopédicos – REMATO –, instituídapara avaliação e certificação de órteses e protéses,considerando que a qualidade dos implantes representa oprincipal causa de efeitos adversos relacionados aosprocedimentos cirúrgicos em traumato-ortopedia.

A 12ª Conferência Nacional de Saúde (2003) estabeleceuas bases necessárias para gestão de tecnologias noMinistério da Saúde. Entre as sugestões levantadas, mereceudestaque a recomendação de estruturar atividades deAvaliação de Tecnologias em Saúde – ATS –, por serconsiderada instrumento fundamental para a incorporaçãocrítica e independente de tecnologias e processos nas trêsesferas gestoras do Sistema Único de Saúde. Em 2005, com oobjetivo de institucionalizar a ATS, a SCTIE criou aCoordenação Geral de Avaliação de Tecnologias em Saúdeintegrada ao DECIT, com a missão de implementar, monitorare difundir a ATS no SUS (MINISTÉRIO DA SAÚDE/DECIT/SCTIE, 2005). Essa Coordenação desenvolve projetos emparceria com o Centro Cochrane do Brasil e universidadesbrasileiras, tanto no que respeita a elaboração de metanálises,avaliações econômicas, estudos de custo-efetividade, mastambém na formação de recursos humanos com a oferta decursos de especialização e mestrado profissional na gestãode tecnologias da saúde.

A implementação destes projetos tem proporcionado oaprofundamento de parcerias, o enfrentamento de temáticascomplexas e inovadoras e a realização de estudos de maiorabrangência, além de potencializar a capacidade de pesquisabrasileira.

Como estratégia para reduzir as desigualdades regionais,foi instituído em 2002 o Programa Pesquisa para o SUS – PPSUS–, que ampliou uma iniciativa de parceria com estados,buscando o fortalecimento da gestão e o desenvolvimentocientífico e tecnológico nas unidades federativas. Esteprograma tem permitido estruturar a capacidade de pesquisalocal, envolvendo gestores e pesquisadores em cada estado,bem como descentralizar recursos em busca de eqüidade erespeito às vocações regionais. Traduzindo a adesão a estePrograma, há um vigoroso incremento do volume total derecursos, com participaçao importante da contrapartidaobrigatória e a realização de 43 editais e 941 projetos, noperíodo de 2004 a 2007.

Page 28: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

18 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):12-21Reinaldo Guimarães et al.

Quais Tipos de Pesquisa Devem Ser Apoiadas pelo Ministérioda Saúde?

Um dos subterfúgios históricos para justificar a pequenapresença extramural do Ministério da Saúde no cenário daP&D no Brasil desde a sua criação em 1953 foi o de considerarque apenas a pesquisa capaz de trazer respostas imediatasàs demandas da saúde pública seria de interesse doministério. Esse tipo de apreciação, entre outros fatores,resultou da valorização de um modelo de compreensão doprogresso técnico e das relações entre as pesquisas “básica”e “aplicada” nascido no pós Segunda Guerra e hojeinteiramente ultrapassado.

As bases da crítica a esse modelo têm fundamentohistórico (STOKES, 1997). Elas sugerem que, provavelmente,o progresso técnico jamais se deu segundo os pressupostoslineares daquele modelo. No entanto, a revolução napesquisa e desenvolvimento no campo da saúde nos últimos30 anos literalmente pôs abaixo qualquer veleidade de eficáciaexplicativa daquele modelo nos dias de hoje.

A velocidade crescente no avanço do conhecimento e odecorrente aumento da competição para a utilização desteno âmbito do complexo industrial da saúde mudaram a faceda P&D em saúde, diminuindo o tempo de transformação doconhecimento novo em produto ou processo novos eaumentando enormemente o espaço de uma modalidade depesquisa denominado genericamente de “estratégica”. Estase caracteriza por explorar a fronteira do conhecimentoincluindo desde o início do projeto considerações deutilização prática do eventual conhecimento novo. Em outrostermos, esse tipo de pesquisa opera no ambiente da pesquisa“desinteressada”, utiliza sua rigorosa base conceitual, seuferramental metodológico e técnico tendo, no entanto, sempreem vista um ponto de chegada vinculado à resolução de umproblema concreto de saúde humana.

O crescimento do espaço da pesquisa estratégica atraiuem todo o mundo legiões de investigadores em saúde,particularmente biocientistas, modificando seus interessesem pesquisa, atraindo-os para novas linhas de atuação ealterando suas carreiras. Criou uma provável novamodalidade de pesquisa denominada “translacional” ecunhou uma expressão explicativa desse deslocamento deinteresses – “da bancada para a beira do leito”.

A partir da noção de carga da doença, o Comitê Ad-Hocpara a Pesquisa em Saúde para o Desenvolvimento (GLOBALFORUM FOR HEALTH RESEARCH, 1999) propôs umesquema analítico interessante para avaliar o escopo dapesquisa em saúde onde para cada doença ou agravo à saúdepodem ser identificados quatro componentes, a saber: 1)carga evitável com a utilização de uma combinação dasintervenções de saúde existentes; 2) carga evitável com amelhoria da eficiência das intervenções existentes; 3) cargaevitável com as intervenções existentes embora não custo-efetivas e 4) carga não evitável com as intervençõesexistentes.

Este esquema permite vislumbrar como, no terreno docuidado da saúde das populações, todo o escopo dapesquisa em saúde necessita ser mobilizado para otimizar acobertura populacional e a eficácia do conjunto dasintervenções disponíveis. Assim, a melhoria da eficiênciadas intervenções já disponíveis será tributária, entre outrasmodalidades, de pesquisa operacional e de pesquisa sobrepolíticas e sistemas de saúde. A melhoria dos padrões decusto-efetividade está vinculada à pesquisa clínica,biomédica e epidemiológica e a exploração de novasintervenções será dependente, predominantemente, depesquisa de ponta, seja de bancada seja clínica. E em todosos três campos de intervenção, para que se passe do terrenoda pesquisa para o da inovação, será exigida a pesquisa e odesenvolvimento realizados no âmbito do complexoindustrial da saúde.

A atuação do Ministério da Saúde no campo de P&Ddeve estender-se a todos os terrenos capazes de aumentar acobertura e a eficácia das ações de saúde. Para que a grandecapacidade instalada de pesquisa em saúde no país possaser adequadamente posta a serviço da melhoria dascondições de saúde de nosso povo, será necessário que oministério tenha uma visão abrangente, se dispondo a apoiaros diversos elos da cadeia de conhecimento na pesquisa emsaúde, com especial atenção para a pesquisa estratégica.Naturalmente, uma abordagem dessa natureza pressupõerecursos financeiros ilimitados, o que não é o caso. Daí queé essencial estabelecer prioridades.

Os Novos Desafios para o Ministério da Saúde no Fomento àCiência, à Tecnologia e à Inovação

Pertencente ao campo da economia da tecnologia, oconceito de Sistemas Nacionais de Inovação desenvolveu-se nos anos entre 1980 e 1990, na Europa e nos EstadosUnidos. Buscava-se compreender os processos dearticulação entre os inúmeros atores envolvidos noaparecimento de novos produtos e processos no mercado,em particular aqueles envolvendo conhecimento científico etecnológico avançado. De acordo com Albuquerque (1996),um Sistema Nacional de Inovação “é uma construçãoinstitucional, produto de uma ação planejada e conscienteou de um somatório de decisões não planejadas edesarticuladas, que impulsiona o progresso tecnológicoem economias capitalistas complexas. Através daconstrução desse sistema de inovação viabiliza-se arealização de fluxos de informação necessários ao processode inovação tecnológica”.

O desenvolvimento do conceito baseou-se inicialmenteno exame das economias líderes mundiais e mais tardeestendeu-se aos países de industrialização mais recente,entre os quais os IDCs. Também é mais recente a extensãodo conceito a setores econômicos (sistemas setoriais deinovação). Uma das características desses sistemas setoriaisé a presença de grande heterogeneidade no processo

Page 29: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

19Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):12-21 MS e a Pesquisa em Saúde no Brasil

inovativo entre distintos setores e mesmo entre sub-setoresdentro de setores (GELIJNS & ROSENBERG, 1995).

O foco principal dos estudos está posto, de modo geral,sobre as relações entre atores públicos e privados com vistasao desenvolvimento econômico. A articulação entre ossistemas nacionais de inovação e o aumento do bem-estar e ainclusão social é um terreno a ser ainda explorado. No Brasil,cabe destacar as pesquisas de Albuquerque et al. (2004) quediscutem as possibilidades, no campo da saúde, da“construção combinada de um sistema de inovação e de umsistema de bem-estar social” e de Carlos Gadelha et al. (2003ª,2003b) que cunharam e desenvolveram os conceitos de“complexo industrial da saúde” e “complexo produtivo dasaúde” (que desvela as relações entre o complexo industrial eos serviços de saúde).

É bem conhecida a grande importância dos aportes deconhecimento desenvolvido nas instituições de pesquisa parao avanço do complexo industrial da saúde, em particular emseus componentes de caráter fortemente biotecnológico, comoo de medicamentos, vacinas e dispositivos diagnósticos. Aregulamentação da Lei da Inovação, a Política Industrial,Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE I e II ), a Lei deDesoneração Fiscal (Lei do Bem) e a regulamentação doFNDCT abrem largos caminhos para o estabelecimento dessaspontes. Mas, por outro lado, é também conhecido que o lugarda inovação, por excelência, são as empresas e, mesmo comos avanços políticos e legais recentes, é necessário desobstruirainda mais os canais de apoio a projetos de P&D diretamentea elas.

É essa a base conceitual que vem orientando a atuação doMinistério da Saúde no terreno do Complexo Industrial daSaúde. Durante o ano de 2007, as principais açõesdesenvolvidas disseram respeito a transformar essesconceitos em política pública. Fazê-los migrar do ambienteacadêmico onde foram gerados para a arena da gestão desaúde. Essa tarefa ficou a cargo, predominantemente, daSecretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos.

Como já foi apresentado em seção anterior deste artigo,vínculos mais fortes entre as atividades de P&D em saúdenas universidades e institutos de pesquisa e os gestores desaúde são bastante recentes e intermitentes. De modoparecido, a relação entre o Complexo Industrial e os gestoresda política de saúde têm sido, historicamente, superficiais enão mais do que utilitárias. Houve algumas conjunturasatípicas, entre os quais se destaca o que se localiza nas décadasde 70 e início dos anos 80 do século passado, com asiniciativas da Central de Medicamentos e do ProgramaNacional de Autosuficiência em Imunobiológicos. Mas foraessas e talvez umas poucas outras exceções, aquela relaçãopode ser resumida em operações comerciais de compra e vendapara o suprimento de necessidades do SUS, orientadas porregras muitas vezes pouco claras sobre o que comprar, comocomprar e, principalmente, por que comprar.

A passada década de 90, na qual predominaram políticasque estimularam uma extensa abertura comercial sem as

devidas salvaguardas quanto à capacidade produtivanacional, testemunhou um grande aumento da fragilidade daestrutura industrial brasileira em saúde. Todos os setoresindustriais que fazem parte do Complexo Industrial da Saúdeperderam competitividade no mercado brasileiro e no exterior.O déficit acumulado cresceu em aproximadamente US$ 700milhões ao ano no final dos anos 80, para um patamar superiora US$ 5 bilhões ao ano (2007), sobretudo para os produtos demaior densidade de conhecimento e tecnologia, a exemplo defármacos e medicamentos, equipamentos médicos de baseeletrônica, novos materiais (órteses e próteses),hemoderivados, vacinas e reagentes para diagnóstico. A perdade competitividade na indústria nacional da saúde tornou opaís extremamente dependente em setores estratégicos tantodo ponto de vista tecnológico quanto das necessidades desaúde.

Voltando às contribuições de Albuquerque e Gadelha(IDEM, IBIDEM), o ponto de partida para essa revisão deveser a de compreender o setor de saúde como um segmento davida do país que possui, estruturalmente, uma dupla inserção:por um lado, ele se articula com o mundo do bem-estar e dainclusão social, objeto portanto do mundo das políticassociais, mas que também se articula com esse dinâmicosetor industrial – o Complexo Industrial da Saúde – que otorna parte das políticas de desenvolvimento, geração deemprego e renda. Em conseqüência, as relações entre apolítica de saúde e a indústria da saúde devem deixar deser utilitárias e superficiais e alcançar um outro patamar.Para ficar apenas no mercado público, que é responsávelpor cerca de 25% do mercado nacional de medicamentos,50% do mercado de equipamentos e 90% do de vacinas,essa nova relação deve incluir atividades tais como as queapresentamos a seguir:

i. O fortalecimento da capacidade produtiva da indústrianacional de insumos para a saúde, mediante ofortalecimento de programas de financiamento àprodução e à inovação;

ii. O fortalecimento dos mecanismos de regulação demercado mediante a melhoria das condições decompetitividade com os produtos importados e agarantia de compra para produtos estratégicos para oSUS;

iii. A internalização, pelas empresas, dos procedimentosde P&D, hoje realizados predominantemente noexterior, bem como a ampliação dos mecanismos desuporte das atividades de P&D para as mesmas, pelosgovernos federal e estaduais;

iv. A construção de mecanismos de associação entre osprodutores públicos e privados com vistas aofortalecimento da complementaridade no atendimentoàs necessidades do SUS;

v. O reforço às atividades de pesquisa em saúde nasuniversidades e institutos de pesquisa, ajustando-asa prioridades estabelecidas pelo sistema de saúde, emparticular por seu componente público;

Page 30: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

20 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):12-21Reinaldo Guimarães et al.

vi. A construção, entre esses três mundos – empresas,instituições de pesquisa e sistema de saúde – de pontesmais sólidas e permanentes do que as existentesatualmente.

Essas e outras ações podem ser sintetizadas em duasgrandes diretrizes estratégicas:

1. Reduzir a vulnerabilidade da política social brasileiramediante o fortalecimento do Complexo Industrial e deInovação em Saúde, associando o aprofundamentodos objetivos do Sistema Único de Saúde com atransformação necessária da estrutura produtiva e deinovação do País, tornando-a compatível com um novopadrão de consumo em saúde e com novos padrõestecnológicos.

2. Aumentar a competitividade em inovações dasempresas e dos produtores públicos e privados dasindústrias da saúde, tornando-os capazes de enfrentara concorrência global, promovendo um vigorosoprocesso de substituição de importações de produtose insumos em saúde de maior densidade deconhecimento que atendam às necessidades de saúde.

Em 2007, para atender as novas prioridades, ocorreramalterações significativas na estrutura e atribuições daSecretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos,sendo transferidas à Secretaria Executiva do Ministério daSaúde as atividades anteriormente executadas peloDepartamento de Economia da Saúde – DES –, passandoeste departamento, com uma nova conformação4, a ocupar-se com o incentivo ao desenvolvimento tecnológico, àinovação e ao aumento da capacidade produtiva no contextodo Complexo Industrial da Saúde, assumindo ainda partedas atividades até então afetas ao Departamento deAssistência Farmacêutica – DAF – e ao Departamento deCiência e Tecnologia – DECIT.

Com a nova estrutura, o Departamento de Economia daSaúde passa a contar com três áreas. A primeira, oriunda doDepartamento de Assistência Farmacêutica – DAF –, passoua ser responsável pelo fomento à inovação e aumento dacapacidade produtiva nos produtores farmacêuticos ebiotecnológicos públicos, agora com o papel ampliado decobrir todo o segmento de base química e biotecnológicado Complexo Industrial da Saúde. Neste são incluídos osprodutores de fármacos, biofármacos, imunobiológicos(soros e vacinas), sangue e hemoderivados e reagentespara diagnóstico. Para cobrir o segmento de equipamentose materiais de uso em saúde foi criada uma nova áreadestinada a desenvolver ações de fomento à inovação e àprodução no âmbito da indústria de produtos médicos,que engloba uma grande variedade de produtos etecnologias presentes de forma intensiva nos programasde assistência do SUS, que, portanto, não podem ficarsujeitos à dependência de importações, às oscilações do

mercado financeiro internacional e, conseqüentemente, refémde estratégias competitivas descoladas do interesse nacional.

Uma terceira área, denominada de assuntos regulatórios,incorporou uma série de atividades que vinham sendodesenvolvidas no Departamento de Ciência e Tecnologia –DECIT –, e que impactam direta e indiretamente no ComplexoIndustrial da Saúde, como é o caso dos temas ligados àbiotecnologia, biossegurança e patrimônio genético.

Neste contexto, ao longo de 2007, o Departamento deEconomia da Saúde elaborou e institucionalizou dois programasde fomento à produção e inovação, que passam a integrar umconjunto de políticas adotadas para estimular a inovação e aeficiência produtiva no Complexo Industrial da Saúde.

O primeiro programa, denominado “Programa Nacional deFomento à Produção Pública e Inovação no ComplexoIndustrial da Saúde”, é dirigido aos produtores públicosencarregados da fabricação de medicamentos eimunobiológicos e que são considerados, por suascaracterísticas e relevância estratégica, prioritários parainvestimento e implementação de ações voltadas aodesenvolvimento do Complexo Industrial da Saúde,abrangendo toda a cadeia produtiva em que estão inseridos.

A segunda proposta é a do “Programa Nacional paraQualificação, Produção e Inovação em Equipamentos eMateriais de Uso em Saúde no Complexo Industrial da Saúde”,que tem como alvo a indústria de produtos médicos, queengloba uma grande variedade de produtos e tecnologias.

Os dois programas têm por objetivo geral promover ofortalecimento e modernização dos produtores estratégicosdo Complexo Produtivo da Saúde, por intermédio da ampliaçãoda capacidade inovadora e da mudança do patamarcompetitivo, contribuindo para a redução da defasagemtecnológica existente e para o desenvolvimento econômico,científico e tecnológico do País.

Além de representar um passo importante para diminuir asfragilidades do SUS, os programas vêm ao encontro de umasérie de prioridades estabelecidas por um conjunto de políticasnacionais estratégicas para o País, com destaque para a PolíticaIndustrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), aPolítica de Desenvolvimento da Biotecnologia e a PolíticaNacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos.

Em 2007, concomitantemente ao desenvolvimento dosnovos programas, foram atendidas demandas referentes àssolicitações dos produtores públicos que receberam recursosda ordem de R$ 65 milhões. Desse valor, R$9.202.802 foramdestinados a reempenhos relativos a projetos de exercíciosanteriores, R$46.879.820 foram destinados a 15 projetos novose R$9.574.228 foram destinados ao atendimento de outrasprioridades da SCTIE.

Referências

1. ALBUQUERQUE et al. Pesquisa e Inovação em Saúde: uma discussãoa partir da literatura sobre economia da tecnologia. Ciência e SaúdeColetiva, v. 9, n. 2, 277-294, junho de 2004.

4 E, futuramente, também com uma nova denominação – Departamentodo Complexo Industrial e Inovação em Saúde (DCIIS).

Page 31: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

21Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):12-21 MS e a Pesquisa em Saúde no Brasil

2. GADELHA, C.A.G. O Complexo Industrial da Saúde e aNecessidade de um Enfoque Dinâmico na Economia da Saúde.Ciência e Saúde Coletiva, v. 8, n. 2, p. 521-535, 2003a.3. GADELHA, C.A.G. et al. Saúde e Inovação: uma abordagem sistêmicadas indústrias da saúde. Cadernos de Saúde Pública, v.19, n. 1, p. 47-59, 2003b.4. GELIJNS, A; ROSENBERG, N. The Changing Nature ofM e d i c a l Te c h n o l o g y D e v e l o p m e n t . I n : R o s e n b e rg , N . ;Gel i jns , A. ; Dawkins , H. Sources of Medica l Technology:U n i v e r s i t i e s and Industr ies (1995) – Nat ional Academy ofSciences http://nap.edu/catalog/4819.html . Consulta realizadaem fev. 2006.5. GLOBAL FORUM FOR HEALTH RESEARCH. The 10/90 Reporton Health Research, Geneva, 49 p., 1999.

6. GLOBAL FORUM FOR HEALTH RESEARCH. Helping Correct the10/90 Gap. Geneva, 96 p., 2006.7. MINISTÉRIO DA SAÚDE/CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE.Anais da 2a Conferência de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde.Editora do Ministério da Saúde. Brasília. 271 p., 2005.8. MINISTÉRIO DA SAÚDE/DECIT/SCTIE. Fluxos Financeiros paraa Pesquisa em Saúde no Brasil. mimeo., 2005.9. MOREL, C. et al. Health Innovation Networks to Help DevelopingCountries Address Neglected Diseases. Science, v. 309, Issue 5733,401-404, 15 July 2005.10. PARAJE, G. et al. Increasing International Gaps in Health-RelatedPublications. Science, v. 308, Issue 5724, 959-960, 13 May 2005.11. STOKES, D. Pasteur’s Quadrant: Basic Science and TechnologicalInnovation. The Brookings Institution Press, Washington, D.C., 1997.

Page 32: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

22

Novas TNovas TNovas TNovas TNovas Tendências do Ensino Médicoendências do Ensino Médicoendências do Ensino Médicoendências do Ensino Médicoendências do Ensino Médico

New Trends in Medical Education

Milton A. MartinsFaculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; São Paulo, SP, Brasil

No início do século XXI, muitas mudanças têm sido propostas na formação médica no mundo e no Brasil. Algunseventos das últimas décadas do século XX sintetizam alguns dos princípios básicos que devem orientar essasmudanças: a Declaração de Alma-Ata (1978), a Declaração de Edimburgo (1988) e, no Brasil, o trabalho da ComissãoNacional de Avaliação do Ensino Médico (CINAEM) e as Diretrizes Curriculares para os Cursos de Graduação emMedicina (2001), nas quais devem ser formados médicos em número suficiente para atender às demandas sociais,com uma formação geral, formação técnica profunda, mas também ética humana e responsabilidade social.Palavras-chave: ensino médico, transformações curriculares, Declaração de Alma-Ata, Declaração de Edimburgo,Diretrizes Curriculares.

In the beginning of XXI century, many changes in medical education have been suggested in the world and also in Brazil.In the last decades of XX century, some events are representative of the basic principles that must orient these changes: theDeclaration of Alma-Ata (1978), the Declaration of Edinburgh (1988) and, in Brazil, the work of the National Commissionof Evaluation of Medical Education (CINAEM) and the National Guidelines for Medical Schools (2001). Medicalschools must prepare doctors in numbers adequate to social needs, with a profound technical training, but with also andethical and humanistic formation and with social responsibility.Key words: Medical Education, curriculum reform, Declaration of Alma-Ata, Declaration of Edinburgh, BrazilianNational Guidelines for Medical Education.

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. Milton de Arruda Martins. Faculdadede Medicina da Universidade de São Paulo. Av. Dr. Arnaldo, 455, sala1210. 01246-903. São Paulo, SP, Brasil. Tel: 55 11 30617317. FAX:55 11 30850992. Endereço eletrônico: [email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):22-24.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Há duzentos anos foi fundada na Bahia a primeiraFaculdade de Medicina do Brasil. Assim, é oportuno fazeralgumas considerações sobre o ensino médico de graduaçãoneste início do século XXI e do terceiro século de formaçãomédica no Brasil. No mundo todo e no Brasil em particular, háem curso mudanças fundamentais na formação médica.Transformações profundas nos projetos curriculares deinúmeras escolas médicas têm sido propostas e realizadas(TOSTESON, 2000 ). No Brasil, praticamente todas as escolasmédicas fizeram recentemente, estão fazendo ou planejam fazermudanças curriculares. A formação de médicos para atuar nesteinício de século é uma tarefa extremamente complexa e exigeuma profunda reflexão por parte de todas as escolas médicas.

Para pensar o ensino médico no Brasil neste início de século, éimportante fazer referência a alguns eventos recentes queinfluenciaram o crescente movimento internacional e nacional demudanças na formação médica de graduação: a Conferência deAlma-Ata (1978), a Declaração de Edimburgo (1988) e, no Brasil, asatividades da Comissão Interinstitucional Nacional de Avaliaçãodo Ensino Médico (CINAEM), na década de 90, e as DiretrizesCurriculares para os Cursos de Graduação em Medicina (2001).

Em 1978, foi realizada a Conferência Internacional de AtençãoPrimária, em Alma-Ata, no Cazaquistão, então parte da União

Soviética. Essa conferência foi promovida pela OrganizaçãoMundial da Saúde, como parte do objetivo de “Saúde paraTodos no Ano 2000” (GARCIA-BARBERO, 1995). A declaraçãode Alma-Ata (WHO, 1988), elaborada nesta conferência, foi aprimeira declaração internacional que enfatizava a importânciada atenção primária à saúde, tendo influência decisiva naorganização de sistemas de saúde de vários países, incluindo oBrasil, e na redefinição dos objetivos da formação dosprofissionais de saúde, com destaque para os médicos.

“A Conferência enfatiza que a saúde – estado decompleto bem-estar físico, mental e social, e nãosimplesmente a ausência de doença ou enfermidade – é umdireito humano fundamental, e que a consecução do maisalto nível possível de saúde é a mais importante meta socialmundial, cuja realização requer a ação de muitos outrossetores sociais e econômicos, além do setor saúde.

A chocante desigualdade existente no estado de saúdedos povos, particularmente entre os países desenvolvidos eem desenvolvimento, assim como dentro dos países, é política,social e economicamente inaceitável e constitui, por isso,objeto da preocupação comum de todos os países.

Os governos têm pela saúde de seus povos umaresponsabilidade que só pode ser realizada medianteadequadas medidas sanitárias e sociais. Uma das principaismetas sociais dos governos, das organizações internacionaise de toda a comunidade mundial na próxima década deveser a de que todos os povos do mundo, até o ano 2000,atinjam um nível de saúde que lhes permita levar uma vidasocial e economicamente produtiva. Os cuidados primáriosde saúde constituem a chave para que essa meta seja

Page 33: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

23Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):22-24 Novas Tendências do Ensino Médico

atingida, como parte do desenvolvimento, no espírito dajustiça social.

Os cuidados primários de saúde são cuidados essenciaisde saúde baseados em métodos e tecnologias práticas,cientificamente bem fundamentadas e socialmente aceitáveis,colocadas ao alcance universal de indivíduos e famílias dacomunidade, mediante sua plena participação e a um custoque a comunidade e o país possam manter em cada fase deseu desenvolvimento, no espírito de autoconfiança eautomedicação. Fazem parte integrante tanto do sistema desaúde do país, do qual constituem a função central e o focoprincipal, quanto do desenvolvimento social e econômicoglobal da comunidade. Representam o primeiro nível decontato dos indivíduos, da família e da comunidade com osistema nacional de saúde, pelo qual os cuidados de saúdesão levados o mais proximamente possível aos lugares ondepessoas vivem e trabalham, e constituem o primeiro elementode um continuado processo de assistência à saúde.” (THEEDINBURGH DECLARATION, 1988).

Na década de 80 do século passado, a Federação Mundialde Educação Médica e suas associações regionais promoveramreuniões com a finalidade de estabelecer metas de melhoria naqualidade do ensino médico. A Conferência Mundial deEducação Médica, realizada em Edimburgo em 1988, na qual foielaborada a Declaração de Edimburgo, teve um papelfundamental nas mudanças curriculares que foram realizadasnas décadas seguintes (THE EDINBURGH DECLARATION,1988; PAHO AND PAN-AMERICAN FEDERATION OFASSOCIATIONS OF MEDICAL SCHOOLS, 1993). NaDeclaração de Edimburgo, várias propostas foram feitas paraas escolas médicas, no sentido de aprimorar a formação médica:

- Ampliar os ambientes em que os programaseducacionais são realizados, para incluir todos osrecursos de assistência à saúde da comunidade e nãoapenas os hospitais;

- Garantir que os conteúdos curriculares reflitam asprioridades de saúde do país e a disponibilidade derecursos;

- Garantir a continuidade do aprendizado durante a vida,mudando de uma ênfase nos métodos passivos paraum aprendizado mais ativo, incluindo estudoindependente e métodos tutoriais;

- Criar tanto currículos como sistemas de avaliação dosalunos para atingir tanto a competência profissional comovalores sociais e não apenas a retenção de informações;

- Promover treinamento dos professores comoeducadores e não apenas como especialistas emdeterminados conteúdos e considerar a excelênciaeducacional tão importante quanto a excelência na áreada pesquisa biomédica ou na prática clínica;

- Complementar o treinamento no tratamento depacientes, incluindo grande ênfase na promoção dasaúde e na prevenção das doenças;

- Procurar a integração entre a formação nas ciênciascom a formação na prática, utilizando também a solução

de problemas como base para o aprendizado noscenários clínicos e na comunidade;

- Empregar métodos de seleção de estudantes demedicina que não incluam apenas a capacidadeintelectual e o desempenho acadêmico, mas queincluam também qualidades pessoais.

A Declaração de Edimburgo também propõe umenvolvimento mais amplo da sociedade, que inclui osMinistérios da Saúde e Educação e os serviços de saúde nosentido de coordenar os projetos de formação médica com osserviços de atenção à saúde, uma formação de um número demédicos de acordo com as necessidades da sociedade,treinamento para o trabalho em equipe com outrosprofissionais de saúde, definir responsabilidades e alocarrecursos para a educação médica continuada.

No Brasil, na década de 90 do século XX, com aparticipação das escolas médicas, de docentes, estudantes erepresentantes das principais entidades médicas, foi realizado,pela CINAEM (Comissão Interistitucional Nacional deAvaliação do Ensino Médico), um amplo diagnóstico dasituação das escolas médicas e do ensino médico, concluindo-se pela necessidade de haver uma ampla transformação daescola médica, com o desenvolvimento de currículos que levemem conta as necessidades de saúde de nossa população(ALMEIDA, 1997). Deslocar o centro do processo de ensino-aprendizagem da transmissão de conhecimentos para aaprendizagem baseada na prática da assistência às pessoas eàs comunidades foi também uma proposta importante daCINAEM. A necessidade de mudanças nas áreas da gestãodos cursos, capacitação docente, processo de formação eavaliação foram, também, conclusões da CINAEM.

O processo de avaliação promovido pela CINAEMdisseminou pelo país propostas de mudanças no ensino médicoque antes eram restritas a um número menor de escolas médicas.

Em 2001, foram promulgadas pelo Ministério da Educaçãoas Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Medicina(WWW.ABEM-EDUCMED.ORG.BR, 2007), que hojeconstituem os princípios gerais para a formação médica mediantea estruturação de um currículo para uma sólida formação emMedicina. A partir da definição das diretrizes curriculares, asescolas médicas brasileiras devem concentrar esforços erecursos visando formar um “médico, com uma boa formaçãogeral, humanista, crítica e reflexiva. Capacitado a atuar,pautado em princípios éticos, no processo de saúde-doençaem seus diferentes níveis de atenção, com ações de promoção,prevenção, recuperação e reabilitação à saúde, na perspectivada integralidade da assistência, com senso deresponsabilidade social e compromisso com a cidadania,como promotor da saúde integral do ser humano”. O antigocurrículo mínimo foi substituído pelas diretrizes curriculares.Trata-se de texto que estabelece diretrizes gerais para a formaçãodo médico e que permite uma ampla liberdade das instituiçõesde ensino para sua aplicação.

Um dos desafios principais das escolas médicas quepretendem aproximar a formação médica cada vez mais do

Page 34: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

24 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):22-24Milton A. Martins

proposto pelas diretrizes curriculares é pensar a formação médicacomo um todo integrado e não como mera soma de conteúdosdas diversas disciplinas e especialidades médicas. As diretrizescurriculares estabelecem, corretamente, que existem competênciasgerais que devem ser adquiridas durante os cursos de graduação:atenção à saúde, tomada de decisões, comunicação,administração e gerenciamento e educação permanente.

Segundo as diretrizes curriculares, a estrutura do curso degraduação em Medicina deverá:

- Ter como eixo do desenvolvimento curricular asnecessidades de saúde dos indivíduos e daspopulações referidas pelo usuário e identificadas pelosetor de saúde;

- Utilizar metodologias que privilegiem a participação ativado aluno na construção do conhecimento e a integraçãoentre os conteúdos, além de estimular a interação entreo ensino, a pesquisa e a extensão/assistência;

- Incluir dimensões éticas e humanísticas,desenvolvendo no aluno atitudes e valores orientadospara a cidadania;

- Promover a integração e a interdisciplinaridade emcoerência com o eixo de desenvolvimento curricular,buscando integrar as dimensões biológicas,psicológicas, sociais e ambientais;

- Inserir o aluno precocemente em atividades práticasrelevantes para a sua futura vida profissional;

- Utilizar diferentes cenários de ensino-aprendizagempermitindo ao aluno conhecer e vivenciar situaçõesvariadas de vida, da organização da prática e dotrabalho em equipe multiprofissional;

- Propiciar a interação ativa do aluno com usuários eprofissionais de saúde desde o inicio de sua formação,proporcionando ao aluno lidar com problemas reais,assumindo responsabilidades crescentes como agenteprestador de cuidados e atenção, compatíveis com seugrau de autonomia, que se consolida na graduaçãocom o internato;

- Através da integração ensino-serviço vincular aformação médico-acadêmica às necessidades sociais dasaúde, com ênfase no Sistema Único de Saúde (SUS).

Uma das competências mais importantes a ser adquiridadurante o curso de graduação em medicina é a capacidade dese atualizar continuamente, de saber como buscar a informaçãoque é fundamental para resolver algum problema clínico e saberselecionar a informação relevante e utilizar os dados obtidos deforma crítica. Hoje é impossível que todos os conteúdos decada área da medicina sejam transmitidos ao estudante duranteseu curso (TAYLOR, 1994; MARTINS, 2006). Os docentes demedicina têm a tarefa de selecionar o que é realmente importantede sua área para a formação geral de todos os médicos.

Os principais teóricos da educação de adultos, como PauloFreire, já demonstraram que a prática é o grande motivador doaprendizado. O aprendizado das chamadas ciências básicas émais motivador e mais produtivo quando o estudante temdiante de si problemas médicos para resolver. Estratégias de

ensino que exigem a participação ativa do estudante na buscade soluções para problemas reais ou construídos comobjetivos pedagógicos claros têm contribuído para aconquista da autonomia intelectual do estudante. Afinal, natradição das escolas médicas, o período do internatojustamente é uma busca por parte do interno da solução dosproblemas médicos que seus pacientes apresentam.

Os hospitais universitários brasileiros, à medida que seintegram cada vez mais ao Sistema Único de Saúde, estão setornando hospitais de alta complexidade. O ensino degraduação não pode mais ser baseado exclusivamente ouprincipalmente nas enfermarias desses hospitais. Adiversificação dos cenários de aprendizagem é urgente,incluindo treinamento junto à comunidade, em unidadesbásicas de saúde, ambulatórios, serviços de emergência eenfermarias de hospitais comunitários.

As escolas médicas devem, também, deixar claro, em todosos momentos do curso que um médico deve ter uma altacompetência técnica, mas deve também ter uma formaçãohumanística e ética e atuar de forma socialmente responsável.Os médicos com quem os estudantes convivem devem ter claroque jamais estão ensinando apenas sua área de conhecimento,mas estão sendo modelo de atendimento aos pacientes.

Outro desafio para o século XXI é o currículo médico seadequar à visão moderna de saúde, que envolve fatoresbiológicos, psicológicos, sociais, ambientais, hábitos e estilode vida e acesso aos serviços de saúde. A promoção da saúde,a prevenção, a busca da qualidade de vida, a reabilitação e areintegração à sociedade passam a ser tão importantes comoo diagnóstico e tratamento das diversas enfermidades.

É também importante que os métodos de avaliação dosestudantes sejam adequados às mudanças que estão sendofeitas nos cursos de graduação. Hoje, existem várias formasde avaliar não só conhecimentos como habilidades e atitudese as escolas médicas têm que se capacitar para aperfeiçoaremseus sistemas de avaliação.

Referências

1. TOSTESON, D.C. New pathways in general medical education. NEJM322:234-238, 2000.2. GARCIA-BARBERO, M. Medical education in the light of the WorldHealth Organisation health for all strategy and the European Union.Med Educ, 29:3-12, 1995.3. WHO. From Alma-Ata to the year 2000: reflections at the midpoint.Geneva, Switzerland, 1988.4. THE EDINBURGH DECLARATION. Med Educ, 22:481-2, 1988.5. PAHO & PAN-AMERICAN FEDERATION OF ASSOCIATIONSOF MEDICAL SCHOOLS. Latin American position paper: WorldSummit on Medical Education. Med Educ, 17: 524-533, 1993.6. ALMEIDA, M.J. Educação médica e saúde: limites e possibilidadesdas propostas de mudança. São Paulo, 1997, 316p. Tese (Doutorado) –Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo.7. WWW.ABEM-EDUCMED.ORG.BR/diretrizes_curriculares.htm.Acessado em 2007.8. TAYLOR, C.E. International experience and idealism in medicaleducation. Acad Med, 69:631-634, 1994.9. MARTINS, M.A. Ensino médico. Rev Assoc Med Bras, 52:282,2006.

Page 35: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

25

Medicina Baseada em Evidências: Potenciais Contribuições para a Educação Médica ContinuadaMedicina Baseada em Evidências: Potenciais Contribuições para a Educação Médica ContinuadaMedicina Baseada em Evidências: Potenciais Contribuições para a Educação Médica ContinuadaMedicina Baseada em Evidências: Potenciais Contribuições para a Educação Médica ContinuadaMedicina Baseada em Evidências: Potenciais Contribuições para a Educação Médica Continuada

Evidence-Based Medicine: Potential Contributions to Continuous Medical Education

Antonio Alberto LopesProfessor Associado, Livre Docente de Clínica Médica/Nefrologia da Faculdade de Medicina da Bahia da Universidade Federal

da Bahia (UFBA); Salvador, BA, Brasil

Este artigo descreve o conceito de Medicina Baseada em Evidências (MBE) e como esta pode contribuir para educaçãomédica continuada e conseqüentemente para melhorar a prática da medicina. A MBE requer a aplicação doconhecimento científico para resolver problemas de pacientes e de quem necessita de cuidados em saúde de modogeral. A MBE é importante no processo de educação médica continuada por promover a integração da experiênciaclínica com a capacidade de pesquisar, selecionar, avaliar e aplicar racionalmente a informação científica paramelhorar as práticas em saúde. A aplicação de métodos e estratégias para fortalecer o alicerce científico do estudantede medicina e do médico, sem desprezar os valores humanitários da profissão, deverá contribuir para a melhoria daqualidade da assistência médica em geral.Palavras-chave: Medicina Baseada em Evidências, educação médica, tratamento, diagnóstico.

This article describes the concept of Evidence-Based Medicine (EBM) and how it may contribute to continuous medicaleducation and consequently to improve the practice of medicine. EBM requires the application of the scientific knowledgeto solve problems of patients and those who need health care in general. EBM is important in the process of continuousmedical education by promoting the integration of clinical experience with the capacity to search, select, evaluate andrationally apply the scientific information to improve the practice of medicine. The application of methods and strategiesto strength the scientific background of the medical student and the medical doctor, while preserving the humanitarianvalues of the medical profession, should contribute to improve the quality of medical care in general.Key words: Evidence-based medicine, medical education, treatment, diagnosis.

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. Antonio Alberto Lopes. RuaMarechal Floriano 448, apartamento 1301, Canela. 40110-010.Salvador, BA, Brasil.Endereço eletrônico: [email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):25-30.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Não existe um momento que alguém pode se considerarportador de todo o conhecimento necessário para a prática damedicina. Em verdade, as dúvidas e os questionamentos sobrea melhor conduta para ser adotada e a conduta que deve serevitada devem fazer parte do dia-a-dia de quem praticamedicina. Desta forma, para que os anos de prática médica setraduzam em constante aperfeiçoamento, é fundamental queo estudante de medicina adquira atitudes de auto-aprendizagem, desenvolva espírito crítico e saiba pesquisar eavaliar criticamente a literatura para responder as dúvidas equestões. A Medicina Baseada em Evidências foidesenvolvida justamente para promover educação médicacontinuada e melhorar a prática da medicina. Neste artigo édescrito o conceito de Medicina Baseada em Evidências (MBE)e mostrado exemplo de como ela pode contribuir para educaçãomédica continuada.

Medicina Baseada em Evidências: O Contexto Pedagógico

O termo Medicina Baseada em Evidências começa aaparecer na literatura no início da década de 90 do séculopassado (EVIDENCE-BASED MEDICINE WORKING GROUP,

1992). A MBE visa a integração da experiência clínica com acapacidade de analisar e aplicar racionalmente a informaçãocientífica ao procurar soluções para os problemas dospacientes e de quem necessita de cuidados de saúde de modogeral (EVIDENCE-BASED MEDICINE WORKING GROUP,1992). Ela se fundamenta primariamente em atitudes visandoboas práticas para promover saúde, prevenir e curar(SACKETT et al., 1997). Na prática clínica, as dúvidas quesurgem ao se procurar resolver problemas de pacientes sãoas principais fontes de questões para a MBE. Odesenvolvimento do raciocínio clínico, formação científica,atitudes de auto-aprendizagem e capacidade de integrarconhecimentos de diversas áreas são fundamentais para aprática da MBE. Na MBE o indivíduo deve ser capaz de:

1. Elaborar questões relacionadas com problemas queafetam ou podem afetar a saúde das pessoas;

2. Pesquisar eficientemente as fontes de informação pararesponder a questão;

3. Avaliar a qualidade, o significado e aplicabilidade dainformação para a solução do problema;

4. Aplicar adequadamente a informação para resolver oproblema.

Na MBE as questões são classificadas como básicas(background) e aplicadas (foreground) (SACKETT et al.,2000). As respostas para questões básicas dependem deconhecimento das ciências básicas e são frequentementerelacionadas com etiologia, patogênese de doenças,mecanismos de ação e efeitos adversos de medicamentos.Imagine que o problema identificado em um paciente de 20

Page 36: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

26 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):25-30Antonio Alberto Lopes

anos seja pneumonia comunitária. Neste caso, um estudantepoderia elaborar a seguinte questão básica: “quais são ascausas (agente infeccioso) mais freqüentes de pneumoniacomunitária em um homem jovem?”. Uma questão básica comoesta se caracteriza por dois elementos: 1) a raiz da questão e 2)o problema ou um aspecto do problema (NOBRE et al., 2003).A raiz é formada por um pronome ou advérbio (qual, quais, oque, por que, como, onde, quem, quando) e um verbo. Nopresente exemplo “quais são” representa a raiz e “as causasmais freqüentes de pneumonia comunitária em um homemjovem”, o aspecto do problema. Seguem outros exemplos dequestão básica:

Qual é o mecanismo do edema no paciente comsíndrome nefrótica?O que determina a imunodeficiência no pacienteinfectado pelo HIV?

A questão aplicada (foreground) pode ser também referidacomo “questão clínica” por sua relação mais direta com aconduta a ser adotada, ex., conduta terapêutica ou condutadiagnóstica (NOBRE et al., 2003). A questão aplicada podeestar também relacionada com o conhecimento sobre fatoresindicadores do prognóstico.

Em uma publicação prévia foram mostrados exemplos dequestões clínicas seguindo um contexto denominado PPR(LOPES, 2000). O primeiro P do PPR diz respeito ao problemade saúde, o segundo P ao fator de predição de resultado e o Rao resultado (LOPES, 2000). No contexto do PPR, ao declararo problema, determinadas características da pessoa devemser levadas em consideração de forma a facilitar a localizaçãodas informações necessárias. Por exemplo, se febre é uma dasmanifestações clínicas, é importante dizer se o paciente é umacriança, um adulto jovem ou um idoso, considerando que aidade modifica de forma importante o contexto do problema. Ofator de predição de resultado pode ser um tratamento, umteste diagnóstico, uma exposição, um comportamento dapessoa, uma característica sócio-demográfica, um sintoma ouum sinal do exame físico. O resultado pode ser o diagnóstico quese quer afastar ou confirmar, a cura ou prevenção de uma doença,a redução do custo do tratamento, redução da necessidade dehospitalização, ou a melhora da qualidade de vida. Seguemexemplos de questões aplicadas (questões clínicas):

Em um paciente com idade de 78 anos com fibrilaçãoatrial crônica (P, problema), o uso de anticoagulanteoral é mais efetivo do que aspirina (P, preditor:tratamento) para prevenir acidente vascular encefálicoe embolismo arterial, sem aumentar consideravelmenteo risco de sangramento (R, resultado)?Em um homem de 30 anos com doença hepática crônica,apresentando piora recente do quadro de insuficiênciahepática (P, problema), a ressonância magnética,comparada com a ultrassonografia e tomografiacomputadorizada helicoidal (P, preditor: testediagnóstico), tem maior capacidade para aumentar oureduzir a probabilidade do diagnóstico de carcinomahepatocelular (R, resultado)?

Analisando essas questões aplicadas, pode se identificarfacilmente os três elementos do PPR. Na primeira questão, porexemplo, o primeiro P (problema) é fibrilação atrial em um homemidoso, o segundo P (preditor) é uma intervenção terapêutica(anticoagulante oral comparado com aspirina) e o R (resultado)é a prevenção de um evento adverso (acidente vascularencefálico, embolismo arterial).

Estas questões podem ser também enunciadas de outraforma, mantendo, no entanto, os itens do PPR, conformemostrado em seguida:

Será que o uso de anticoagulante oral é mais efetivodo que aspirina para prevenir acidente vascularencefálico e embolismo arterial sem aumentar o riscode hemorragia intracraniana em um paciente de 78 anoscom fibrilação atrial?A ressonância magnética tem maior capacidade do quea ultrassonografia e a tomografia computadorizadahelicoidal para aumentar ou reduzir a probabilidade decarcinoma hepatocelular em um homem de 30 anos comdoença hepática crônica e piora recente do quadro deinsuficiência hepática?

A Pesquisa da Resposta para a Questão e Avaliação daQualidade Científica da Informação

A pesquisa da literatura para responder uma questão básicaé de modo geral mais simples do que a pesquisa para responderuma questão clínica. O livro de texto convencional representauma fonte adequada para responder a maioria de questõesbásicas. Por outro lado, para responder uma questão clínica olivro tradicional freqüentemente não é suficiente. As limitaçõesdo livro convencional são especialmente notadas paraquestões clínicas relacionadas com tratamento. Também paraas questões de diagnóstico, o livro de texto nem semprefornece as informações com detalhes que permitam concluirquanto ao real valor dos dados do exame clínico ou dos examescomplementares para confirmar ou afastar um diagnóstico,bem como para aumentar ou reduzir as chances da presençade uma determinada doença. Portanto, para responderquestões aplicadas (clínicas) uma pesquisa mais aprofundadada literatura é frequentemente necessária.

Ao pesquisar a literatura, é interessante levar emconsideração os três itens do PPR, pois eles orientam naescolha dos termos para a pesquisa da literatura. É tambémimportante considerar o que já sabemos quanto a questão aser pesquisada. Estudos prévios sugerem que o uso deanticoagulantes orais é mais eficaz do que antiplaquetáriosem reduzir o risco de acidente vascular encefálico em pacientescom fibrilação atrial, sem aumentar o risco de hemorragias.Estes estudos, no entanto, não permitem concluir se osresultados podem ser aplicados para pacientes idosos. OQuadro 1 mostra termos que poderiam ser usados paraidentificar artigos publicados em revistas indexadas noMEDLINE que possam esclarecer a dúvida sobre uma possívelsuperioridade de anticoagulantes orais em relação à aspirina

Page 37: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

27Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):25-30 Medicina Baseada em Evidências

em reduzir eventos adversos em pacientes idosos comfibrilação atrial.

Resumos de artigos publicados em revistas indexadas noMEDLINE podem ser localizados através do PUBMED(www.pubmed.gov ou www.pubmed.org). O Quadro 2 mostrao resultado da pesquisa utilizando o PUBMED.

Cada uma das três pesquisas iniciais baseadas nos itensdo PPR resultou em um grande número de artigos. Acombinação destas três pesquisas (pesquisa número 4)resultou em número bem menor de artigos (208 artigos),cujos resumos contêm termos dos três itens do PPR. Comose trata de uma questão de tratamento, foram solicitadosapenas artigos de trabalhos identificados como ensaioclínico (pesquisa 6), o que resultou em um número aindamenor de artigos (39 artigos). A pesquisa poderia ser aindamais restrita se utilizássemos termos como “elderly” ou“aged”, considerando que o paciente é idoso. Neste casonão foi necessário maior restrição considerando que a listade artigos não é excessivamente longa. Além do mais nãofoi preciso rever todos os resumos, pois a resposta para aquestão usada como exemplo deve ser encontrada nosprimeiros artigos da lista, que foram aqueles publicados maisrecentemente.

O Quadro 3 mostra artigos de ensaios clínicos mais recentescomparando anticoagulante oral com aspirina para prevençãode acidente vascular encefálico em idosos com fibrilação atrial(MANT et al., 2007; RASH et al., 2007). Ao avaliar os resumos,o primeiro artigo da lista da pesquisa número 6 “Warfarin versusaspirin for stroke prevention in an elderly communitypopulation with atrial fibrillation... Lancet2007;370(9586):493-503” foi considerado o mais adequadopara responder a questão (MANT et al., 2007). Ao se clicar nolink deste artigo em PUBMED, foram identificadas (Quadro 4)revisões do artigo em dois periódicos, o ACP Journal Club(JAFFER, 2007a) e Evidence-Based Medicine (JAFFER, 2007b).Estes dois periódicos têm como objetivo selecionar e analisarcriticamente artigos de trabalhos considerados relevantes paraa prática clínica, sendo considerados importantes instrumentospara a MBE (McKIBBON, K.A.; WILCZYNSKI, N.L.; HAYNES,R.B., 2004; DUNCAN, B.B.; SCHMIDT, M.I., 1999).

O artigo original publicado na Lancet (MANT et al.) estádisponível para acesso online através dos periódicos daCAPES (www.periodicos.capes.gov.br). A revisão do artigopublicada em Evidence-Based Medicine (JAFFER, 2007b) estátambém disponível gratuitamente e pode ser acessada clicandono link “Evid Based Med ...” do PUBMED ou através doendereço (http://ebm.bmj.com/cgi/content/full/12/6/172). Umaleitura do artigo original permite uma avaliação mais detalhadada qualidade metodológica e dos resultados do trabalho. Poroutro lado, a revisão publicada em Evidence-Based Medicine(JAFFER, 2007b) permite uma resposta mais rápida para aquestão. Os resultados do estudo permitem concluir que ouso do anticoagulante oral varfarina, mantendo a razãonormatizada internacional (RNI) entre 2 e 3, é mais eficaz doque aspirina em prevenir acidente vascular cerebral em idososcom fibrilação atrial, sem aumentar o risco de hemorragias.

É importante notar que uma pesquisa no PUBMED, similarà mostrada no Quadro 3, porém solicitando apenas artigospublicados no último ano e identificados como revisão oumeta-análise, em lugar de ensaio clínico, mostrou seis artigospublicados em revistas indexadas no MEDLINE no ano de2007. O estudo com melhor qualidade metodológica entre osseis é uma meta-análise publicada em Annals of InternalMedicine que incluiu 29 ensaios clínicos randomizadospublicados de 1966 até março de 2007, totalizando 28.044participantes (HART, R.G.; PEARCE, L.A.; AGUILAR, M.I.,2007). Os resultados do ensaio clínico mais recente restrito apacientes idosos (MANT et al.) não foram incluídos na meta-análise, pois foram publicados em agosto de 2007. A conclusãodesta meta-análise (HART, R.G.; PEARCE, L.A.; AGUILAR,M.I., 2007) foi similar à do ensaio clínico publicado na revistaLancet (MANT et al.). Os resultados do estudo publicado naLancet, no entanto, são mais específicos para pacientesidosos.

Uma fonte de revisão sistemática que deve ser consideradaao procurar respostas para questões aplicadas é a BibliotecaCochrane. Esta pode ser acessada no portal da BibliotecaVirtual em Saúde (www.bireme.br). Consultando a BibliotecaCochrane foi identificada uma revisão sistemática sobre o usode anticoagulantes para prevenir acidente vascular encefálico

Quadro 1. Termos de procura para a questão sobre anticoagulantes em pacientes com fibrilação atrial orientados pelo PPR.

(P) PROBLEMA

Fibrilaçãoatrial

Termos de Procura

AtrialFibrillation

(P) PREDITOR

Anticoagulante oralversus Aspirina

Termos de Procura

Anticoagulant,Anticoagulants, Aspirin,

Warfarin, Antiplatelet

(R) RESULTADO

Reduzir riscos de acidente vascular cerebral eembolismo arterial sem aumentar o risco de

hemorragia

Termos de Procura

Stroke, Embolism, Haemorrhage, Hemorrhage,Bleeding

Page 38: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

28 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):25-30Antonio Alberto Lopes

Quadro 2. Resultado da pesquisa através do PUBMED.

Quadro 3. Ensaios clínicos mais recentes comparando anticoagulante oral com aspirina para prevenção de acidente vascularencefálico em idosos com fibrilação atrial.

Quadro 4. Referências de revisões e comentários sobre o ensaio clínico mostradas em PUBMED.

Ordem da pesquisa Sintax Número de artigos#1 Problema “atrial fibrillation”[Title/Abstract] 21.142#2 Preditor (anticoagulant [Title/Abstract] OR anticoagulants[Title/Abstract] OR 10.303

warfarin[Title/Abstract]) AND (aspirin[Title/Abstract] OR(antiplatelet[Title/Abstract])

#3 Resultados (stroke[Title/Abstract] OR “arterial embolism”[Title/Abstract]) AND 6.048(hemorrhage[Title/Abstract] OR haemorrhage[Title/Abstract] ORBleeding[Title/Abstract])

#4 Combinando os #1 AND #2 AND #3 208três itens do PPR

#5 Termo mais específico “clinical trial”[Publication Type] 518.674para estudos sobre tratamento

#6 Pesquisa restrita aos #4 AND #5 39trabalhos com maiornível de evidência

Page 39: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

29Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):25-30 Medicina Baseada em Evidências

em pacientes com fibrilação atrial (Anticoagulants forpreventing stroke in patients with nonrheumatic atrialfibrillation and a history of stroke or transient ischaemicattack). Como a última atualização desta revisão foi feita em2004 e não enfoca o problema em pacientes idosos, ela nãopode ser considerada a fonte mais adequada para responder aquestão de tratamento usada como exemplo neste artigo.

O UPTODATE é um instrumento de rápido acesso atravésda Internet (www.uptodateonline.com) ou CD-ROM, útil pararesponder questões aplicadas e também questões básicas. OUPTODATE tem um formato de livro e está disponível emdiversas instituições acadêmicas, a exemplo da Faculdade deMedicina da Bahia. Uma pesquisa no UPTODATE, versãoonline 15.3, utilizando os termos “warfarin, aspirin, atrialfibrillation, stroke” mostrou links para 53 capítulosrelacionados com o tópico de interesse. O capítulo“Anticoagulation to prevent embolization in atrialfibrillation” possibilitou uma boa visão do que existia naliteratura até junho de 2007. Como o artigo da Lancet foipublicado em agosto de 2007, os resultados deste trabalhonão foram, no entanto, contemplados na versão 15.3 doUPTODATE. Os resultados da meta-análise referidaanteriormente não foram também contemplados noUPTODATE, embora o autor principal seja também um dosautores do capítulo do UPTODATE. A versão 16.1 doUPTODATE que estará disponível online em março de 2008,provavelmente irá incluir os dados do ensaio clínico (MANTet al.) e da meta-análise (HART, R.G.; PEARCE, L.A.;AGUILAR, M.I., 2007).

Avaliação da Qualidade Científica da Informação e doSignificado dos Resultados

Antes de aplicar os achados de um trabalho científicopara solucionar o problema identificado na prática, é importanteavaliar a qualidade científica e o significado dos resultados.Os seguintes pontos devem ser observados na análise de umartigo científico visando a obtenção de resposta para umaquestão específica: 1) o objetivo do estudo, 2) a metodologiaempregada, 3) o significado dos resultados e 4) a aplicabilidadedos resultados na prática. O objetivo do estudo permiteconcluir se o artigo tem relação com a questão clínica. A análiseda metodologia do trabalho permite avaliar a credibilidadedos resultados encontrados. Como a metodologia de umtrabalho está intimamente ligada com o objetivo, a análisemetodológica não pode ser divorciada da questão clínica. Aose avaliarem trabalhos sobre o valor de testes diagnósticos,por exemplo, deve ser observado se o resultado do teste foidefinido sem um conhecimento do diagnóstico definitivo (i.e.,o diagnóstico de acordo com o padrão-ouro) ou vice-versa,de forma a evitar viés de observação (e.g., erros ao se classificarum teste diagnóstico como positivo ou negativo ou a doençacomo presente ou ausente). Quando o artigo é sobre a eficáciade intervenções preventivas ou terapêuticas, é importanteverificar se a designação (ou alocação) para os grupos foi

feita de forma randômica (aleatória) e se a avaliação de eventosfoi cega, ou seja, desconhecendo o grupo para o qual opaciente foi alocado.

O aprendizado de epidemiologia clínica tem sidoconsiderado fundamental para a prática da MBE, considerandoa importância para a avaliação metodológica de trabalhosclínicos bem como para o entendimento e aplicação dosresultados. Na análise de estudos sobre testes diagnósticos,por exemplo, é necessário que se entenda, pelo menos, osignificado de termos como sensibilidade, especificidade erazão de probabilidade (likelihood ratio) do teste diagnóstico(DEEKS, J.J. & ALTMAN, D.G., 2004; JAESCHKE, R.; GUYATT,G. & SACKETT, D.L., 1994ª, 1994b). O entendimento dosignificado dos termos risco relativo, redução do risco relativo,redução do risco absoluto, número necessário para tratar(NNT), sobrevida cumulativa, intervalo de confiança, poderestatístico e erro tipo 1 (valor de P) é importante para que sepossa chegar a conclusões corretas sobre estudos deterapêutica e prognóstico (GUYATT, G.; SACKETT, D.L. &COOK, D.J., 1993, 1994; LAUPACIS et al., 1994).

Informações provenientes de revisões sistemáticas ediretrizes clínicas devem ser também avaliadas criticamenteantes de serem utilizadas para responder questões aplicadas.Os critérios para seleção dos trabalhos científicosdesempenham importante papel nos resultados de revisõessistemáticas e meta-análises (BHANDARI et al., 2004;OXMAN, A.D.; COOK, D.J.; & GUYATT, G.H., 1994)). Ao seutilizar recomendações de diretrizes clinicas é importanteobservar: 1) se consideram os trabalhos relevantes maisrecentes, 2) a metodologia usada para chegar ao consenso e3) a metodologia usada para determinar a qualidade\força daevidência (ATKINS et al., 2004; HAYWARD et al., 1995;WILSON et al., 1995; GUYATT et al., 1995). Cuidadosespeciais devem ser tomados quando as recomendações sãoprovenientes de revisões não sistemáticas.

Aplicação da Informação Científica para Resolver o Problema

No processo de praticar MBE, que vai da identificação doproblema à escolha da alternativa a ser adotada, não se podeesquecer que cada pessoa que procura cuidados médicos éum ser único, apesar de possuir características similares adiversos outros pacientes. Evidências que vêm de estudosrealizados com grupos de pacientes ajudam a tomar as decisõesmais acertadas, mas não podem ser desvinculadas daexperiência clínica. Para estabelecer as limitações em se aplicaros resultados de um determinado estudo para solucionar oproblema de um paciente, as seguintes perguntas podemajudar:

1) Se o estudo fosse realizado no local onde exerçomedicina, os resultados seriam semelhantes aosencontrados pelo investigador?

2) O estudo oferece informações que permitam avaliar seos resultados dependem de característicasdemográficas e clínicas dos pacientes, como idade,

Page 40: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

30 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):25-30Antonio Alberto Lopes

sexo, nível educacional, gravidade da condição edoenças associadas?

3) Os benefícios foram avaliados juntamente com oscustos e riscos?

4) As informações realmente ajudam a orientar os meuspacientes?

5) As informações ampliam a minha capacidade decolaborar com colegas da minha área e com outrosprofissionais de saúde?

O estudo que foi selecionado para responder a questãosobre anticoagulantes em pacientes idosos com fibrilação atrialmostrou evidência de maior eficácia da varfarina quandocomparada com a aspirina para reduzir acidente vascularencefálico sem aumentar o risco de hemorragia. Neste estudoprocurou-se manter a RNI entre 2 e 3. Para obtermos resultadossimilares, antes de tudo, precisamos garantir a manutençãoda RNI nos limites alcançados no ensaio clínico. No nossomeio, os benefícios e riscos da anticoagulação podem diferirdos observados no estudo, por exemplo, devido àsdificuldades para garantir a avaliação adequada da RNI e oajuste da dose do anticoagulante.

Comentários Finais

Quando a MBE começou a ser divulgada na década de 90observou-se forte oposição ao movimento. Os opositores daMBE entendiam que ela negava o papel da intuição, daexperiência clínica e do conhecimento fisiopatológico nasdecisões clínicas. Em verdade, a MBE visa a uma maiorintegração da experiência clínica com o conhecimento científicono processo de tomada de decisão, sem negar valorestradicionais da medicina. A MBE é totalmente condizente coma idéia de que a boa prática médica requer integração da ciênciae da arte (LOPES, 2000). A aplicação de métodos e estratégiasnas escolas médicas que favoreçam o desenvolvimento deatitudes de auto-aprendizagem e que fortaleçam o alicercecientífico do médico, sem desprezar os valores humanitáriosda profissão, deverá contribuir para a melhoria da qualidadeda assistência médica que é oferecida no Brasil.

Agradecimento

Agradeço a Gildete B. Lopes, Mestre em Medicina e Saúde,pela revisão do artigo.

Referências

1. ATKINS, D. et al. Grading quality of evidence and strength ofrecommendations. BMJ, 328:1490, 2004.2. BHANDARI, M. et al. Users’ guide to the surgical literature: how touse a systematic literature review and meta-analysis. Can J Surg, 47:60-67, 2004,3. DEEKS, J.J.; ALTMAN, D.G. Diagnostic tests 4: likelihood ratios.BMJ, 329:168-169, 2004.4. DUNCAN, B.B.; SCHMIDT, M.I. Medicina embasada em evidências.Rev Assoc Med Bras, 45:247-254, 1999.

5. EVIDENCE-BASED MEDICINE WORKING GROUP. Evidence-based medicine: a new approach to teaching the practice of medicine.JAMA, 268:2420-2425, 1992.6. GUYATT, G.H.; SACKETT, D.L.; COOK, D.J. Users’ guides to themedical literature. II. How to use an article about therapy or prevention.A. Are the results of the study valid? Evidence-Based Medicine WorkingGroup. JAMA, 270:2598-2601, 1993.7. ______. Users’ guides to the medical literature. II. How to use anarticle about therapy or prevention. B. What were the results and willthey help me in caring for my patients? Evidence-Based MedicineWorking Group. JAMA, 271:59-63, 1994.8. ______, et al. Users’ guides to the medical literature. IX. A methodfor grading health care recommendations. Evidence-Based MedicineWorking Group. JAMA, 274:1800-1804, 1995.9. HART, R.G.; PEARCE, L.A.; AGUILAR, M.I. Meta-analysis:antithrombotic therapy to prevent stroke in patients who havenonvalvular atrial fibrillation. Ann Intern Med , 146:857-867,2007 .10. HAYWARD, R.S. et al. Users’ guides to the medical literature. VIII.How to use clinical practice guidelines. A. Are the recommendationsvalid? The Evidence-Based Medicine Working Group. JAMA, 274:570-574, 1995.11. JAESCHKE, R.; GUYATT, G.; SACKETT, D.L. Users’ guides to themedical literature. III. How to use an article about a diagnostic test. A.Are the results of the study valid? Evidence-Based Medicine WorkingGroup. JAMA, 271:389-391, 1994a.12. ______. Users’ guides to the medical literature. III. How to use anarticle about a diagnostic test. B. What are the results and will they helpme in caring for my patients? The Evidence-Based Medicine WorkingGroup. JAMA 271:703-707., 1994b.13. JAFFER, A.K. Warfarin reduced major stroke more than aspirin inelderly patients with atrial fibrillation in primary care. ACP J Club,147:59, 2007a.14. ______. Warfarin reduced major stroke more than aspirin in elderlypatients with atrial fibrillation in primary care. Evid Based Med, 12:172,2007b.15. LAUPACIS, A. et al. Users’ guides to the medical literature. V. Howto use an article about prognosis. Evidence-Based Medicine WorkingGroup. JAMA, 272:234-237, 1994.16. LOPES, A.A. Medicina Baseada em Evidências: a arte de aplicar oconhecimento científico na prática clínica. Rev Assoc Med Bras,46:285-288, 2000.17. MANT, J. et al. Warfarin versus aspirin for stroke prevention in anelderly community population with atrial fibrillation (the BirminghamAtrial Fibrillation Treatment of the Aged Study, BAFTA): a randomisedcontrolled trial. Lancet, 370:493-503, 2007.18. McKIBBON, K.A.; WILCZYNSKI, N.L.; HAYNES, R.B. What doevidence-based secondary journals tell us about the publication ofclinically important articles in primary healthcare journals? BMC Med,2:33, 2004.19. NOBRE M.R. et al. A prática clínica baseada em evidências. Parte I- questões clínicas bem construídas. Rev Assoc Med Bras, 49:445-449,2003.20. OXMAN, A.D.; COOK, D.J.; GUYATT, G.H. Users’ guides to themedical literature. VI. How to use an overview. Evidence-Based MedicineWorking Group. JAMA, 272:1367-1371, 1994.21. RASH, A. et al. A randomised controlled trial of warfarin versusaspirin for stroke prevention in octogenarians with atrial fibrillation(WASPO). Age Ageing, 36:151-156, 2007.22. SACKETT, D.L. et al. Evidence-Based Medicine: how to practiceand teach EBM. Churchill Livingstone, 1997.23. ______. Evidence-Based Medicine, 2nd ed. Edinburgh, UK,Churchill Livingstone, 2000.24. WILSON, M.C. et al. Users’ guides to the Medical Literature.VIII. How to use clinical practice guidelines. B. what are therecommendations and will they help you in caring for your patients?The Evidence-Based Medicine Working Group. JAMA, 274:1630-1632, 1995.

Page 41: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

31

Dois Séculos de Escolas Médicas no Brasil eDois Séculos de Escolas Médicas no Brasil eDois Séculos de Escolas Médicas no Brasil eDois Séculos de Escolas Médicas no Brasil eDois Séculos de Escolas Médicas no Brasil ea Avaliação do Ensino Médico no Panorama Atual e Perspectivasa Avaliação do Ensino Médico no Panorama Atual e Perspectivasa Avaliação do Ensino Médico no Panorama Atual e Perspectivasa Avaliação do Ensino Médico no Panorama Atual e Perspectivasa Avaliação do Ensino Médico no Panorama Atual e Perspectivas

Two Centuries of Brazilian Medical Schools and the Assessment Medical Education in the Present and Future View

Jadete Barbosa LampertUniversidade Federal de Santa Maria, CCS; Santa Maria, RS, Brazil

Para tratar da avaliação do ensino médico, busca-se de forma sucinta e pontual mencionar fatos na perspectivahistórica de dois séculos, que se seguiram a criação da primeira escola médica no Brasil. Pretende-se assim mostraros desafios contemporâneos de construir mudanças na busca de saúde como qualidade de vida, no que se refere àsescolas responsáveis pela formação do profissional médico. Nessa perspectiva tem-se a avaliação do ensino médicocomo um processo que tem dado passos na construção participativa, crítica e contextualizada.Palavras-chave: escolas médicas, ensino médico, avaliação do ensino.

To discuss about the assessment of medical education, it seek for a brief and punctual way to mention the facts in thehistorical perspective of two centuries, which had followed to creation of the first medical school in Brazil. It intends withit, to show the contemporaneous challenges of making changes in seeking for health as quality of life, as it refers toresponsible schools for the graduation of the medical professional. In this perspective there is the assessment of medicaleducation as a process that has been taken steps to its participatory, critical and context construction.Key words: Medical school, medical education, education assessment.

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dra. Jadete Barbosa Lampert, Rua Dr.Pantaleão, 233 (apto. 602). 97010-180. Santa Maria, RS, Brasil. Tel. 5555 3221-7097. Fax: 55 55 3222-5858. Endereço eletrônico: [email protected]

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):31-37.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Dois séculos de passaram desde que Dom João VI aportouem Salvador, na Bahia, e criou a primeira escola médica noBrasil. Desde então relevantes transformações ocorreram nomundo, o Brasil cresceu, a população se multiplicou e asnecessidades sanitárias permanentes se somaram a uma sériede demandas em saúde, identificadas na produção deconhecimentos e no desenvolvimento sem precedentes daciência e da tecnologia, especialmente, nos últimos quarentaanos. Avanços que estão contextualizados no mundo dotrabalho, onde as escolas médicas se situam e se comprometema formar profissionais capazes de prestar cuidados dequalidade às necessidades de saúde da população brasileira.Tratando se de sistema complexo é bom situar fatos, trabalhose as idéias em uma perspectiva histórica para melhor entenderos desafios contemporâneos de mudanças e as probabilidadesna formação do profissional médico. Decorrente, fica maisclaro o correspondente papel das escolas médicas na educaçãoe na assistência a saúde, necessitando construir o processoavaliativo institucional para a auto-avaliação eacompanhamento do processo de formação de maneiraparticipativa, construtiva e formativa.

Século XIX

No século XIX, depois da medicina dos físicos e cirurgiões,curiosos e feiticeiros, é iniciada no Brasil a denominada

medicina pré-científica. Esta inicia com a criação das duasprimeiras escolas médicas, a de Salvador, em fevereiro, e a doRio de Janeiro, em abril de 1808, com a chegada de Dom JoãoVI com sua família e corte. O Brasil passa a categoria de Reinoem1815, e logo, rompe com Portugal, em 1822, inclusive oslaços culturais e científicos. Começam a desaparecer os físicose cirurgiões de formação ibérica e dá-se início ao surgimentodos doutores das escolas nacionais com influência da escolafrancesa (SANTOS FILHO, 1991).

A medicina brasileira denominada de pré-científica, usandotextos e conhecimentos vindos de fora, ao iniciar a produçãoprópria de estudos e pesquisas, ao redor de 1866, dá início àmedicina científica propriamente dita. Iniciam-se os estudosdos pesquisadores da Bahia e a adoção de métodosexperimentais de investigação. Surgem os institutos depesquisa Manguinhos, Bacteriológico e Butantã esobressaem-se pesquisadores como Osvaldo Cruz, AdolfoLutz, Carlos Chagas, Vidal Brasil, Pirajá da Silva, que trazemcontribuições relevantes para a saúde pública nacional.Iniciam-se o saneamento básico das cidades, o ensinoespecializado, a assistência hospitalar, a indústria farmacêuticade alto padrão e a prática médico-cirúrgica. As escolas médicasdenominadas faculdade de medicina, na reforma de 1832,continuam sendo em número de duas até o final do século,quando se cria a terceira escola médica, em 1897, a Faculdadede Medicina de Porto Alegre.

Século XX

Se o século XIX deu início ao ensino superior com a criaçãodas escolas de medicina e o início da produção científica nonosso país, foi no século XX que as transformações se

Page 42: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

32 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):31-37Jadete Barbosa Lampert

mostram em crescente aceleração – entre outras, vai dadescoberta do raio-X à ressonância magnética – impulsionandomudanças significativas no entorno. Com o avanço edesenvolvimento científico e tecnológico, dentro da tendênciamundial, as áreas do conhecimento se ampliaram e asespecialidades se multiplicaram e novas profissões surgiramna área da saúde, assim como as denominadas medicinasalternativas.

A relação do Estado com a sociedade brasileira no iníciodo século era contemplativa e campanhista, quando selimitava a implementar campanhas de combate às doenças emsituações de epidemias ou de calamidades já instaladas sob aorientação dos profissionais médicos da época. Na evoluçãoe ao final, o Estado reconhece e assume com a homologaçãoda Constituição Brasileira, em 1988, que a saúde e a educaçãosão direito do cidadão e dever do Estado, com o compromissode organizar um sistema único de saúde com acesso universale igualitário, dando a este, além de outras atribuições, a deordenar a formação de recursos humanos na área da saúde(BRASIL, 1988).

As escolas, que eram três até a primeira década do séculoXX, na segunda década somam mais cinco escolas, o que fazcom que a criação de escolas médicas seja um dos temas dedebate no Congresso Nacional de Práticos, em 1922, no Riode Janeiro, primeiro congresso de âmbito nacional que trata ese preocupa com a educação médica (PEREIRA NETO, 2001).Na década de sessenta, com a industrialização no país e ofoco na saúde do trabalhador, desencadeia-se a criaçãoatabalhoada de novas escolas. Em apenas cinco anos, criaram-se 35 escolas, chegando ao final do século com 113 escolasmédicas. Neste cenário, para contextualizar, deve-se mencionaro crescimento da população brasileira que, segundo o IBGE,perfazia no início do século, em números arredondados, 17milhões, e ao final já eram 170 milhões de habitantes. Assimcomo, também, é importante perceber que se adquire melhorentendimento do processo saúde-doença, a partir do InformeLalonde, em 1974, e maior conhecimento sobre os fatoresdeterminantes de saúde e de doença, o que amplia o campo deatuação de medicina no que se refere às possibilidades depromover, preservar, recuperar e reabilitar a saúde, ainda muitolimitada aos aspectos das doenças com ações diagnósticas ecurativas.

O profissional médico no mercado de trabalho eranotadamente liberal e autônomo até a criação do DepartamentoNacional de Saúde Pública, em 1922, e o aparecimento deAssociações Voluntárias e Beneficentes, quando passa a serassalariado e a receber honorários. Mas, é na segunda metadedo século XX, com o surgimento das cooperativas eseguradoras de saúde, que o médico começa a assumirmúltiplas atividades e a perder a autonomia na relação com oseu cliente, à medida que a assistência que presta estáintermediada por instituições que vendem e compram seusserviços. Ao final, assume múltiplas atividades (MACHADO,1996) em um sistema de saúde brasileiro constituído por umacomplexa rede de prestadores e compradores de serviços inter-

relacionados, complementares e competitivos que formam umcomplicado mix de serviços públicos e privados (TRAVASSOSet al., 2000).

A Corporação Médica

A Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro, primeiraassociação profissional, criada em 1829, passou a chamar-sede Academia Imperial de Medicina, em 1835, e depois AcademiaNacional de Medicina, em 1885. Ainda no século XIX, em1887, foi fundada a Sociedade de Medicina e Cirurgia. Naprimeira metade do século XX, em 1927, foi criado o SindicatoMédico Brasileiro, movimento pioneiro da consciência declasse, inspirado nas ideologias corporativistas da época. Élogo no início da segunda metade do século XX que acorporação se fortalece mais com a criação da AssociaçãoMédica Brasileira (AMB), em 1951, e do Conselho Federal deMedicina (CFM) com seus conselhos regionais, em 1957. Em1962, foi criada, em Minas Gerais, a Associação Brasileira deEscolas Médicas que, em 1975, passou a denominar-se deAssociação Brasileira de Educação Médica (ABEM), jáinstalada no Rio de Janeiro. Foi criada, ainda, em 1967, aAssociação Nacional dos Médicos Residentes (ANMR) e,em 1977, a Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM),por meio de um decreto presidencial, em resposta a movimentoreivindicatório dos médicos-residentes. O código de éticacriado pelo CFM, em 1965, foi alterado em 1984. Em 1986, foicriada a Direção Executiva Nacional dos Estudantes deMedicina. Segundo Wilensky (1997, apud Machado, 1995),no processo de profissionalização a classe médica conta comescolas com um conjunto de idéias, valores e critériospadronizados de prática e treinamento por pares experientes.Para dar conta de ações que respondessem à divulgação deerros médicos pela mídia e à proposta de instituir-se um examede ordem, em 1991, por iniciativa da ABEM e CFM, foi criadaa Comissão Interinstitucional Nacional de Avaliação dasEscolas Médicas (CINAEM) formada por onze entidades derelevância médica e educacional no país para avaliação dasescolas médicas. Esse movimento inédito na representaçãode soma de poder para avaliar e implementar mudanças sedesfez no início da entrada do novo milênio, deixando umespaço de desafio para a construção histórica dastransformações que a contemporaneidade requer.

O Perfil de Doenças

A população brasileira na miscigenação de raças compôsum perfil nosológico. O sarampo e a varíola trazidos peloscolonizadores dizimaram milhares de índios. Com os negrosvindos da África para o trabalho escravo vieram a filariose, afebre amarela, a ancilostomíase e as verminoses. No início doséculo XX eram recorrentes as epidemias de doençasinfecciosas, as pestes, as endemias como a tuberculose,hanseníase, dengue, febre amarela (SANTOS FILHO, 1991). Apenicilina descoberta por Fleming, em 1928, começa a ser

Page 43: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

33Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):31-37 Dois Séculos de Escolas Médicas no Brasil

utilizada na clínica em 1940. Com as medidas de saneamentobásico, as vacinações e a farmacologia que se desenvolveram,as doenças infecciosas são prevenidas e facilmenteidentificadas e curadas, e a população brasileira fica maislongeva e começam a aparecer as doenças crônicas:arteriosclerose, hipertensão arterial sistêmica, diabetes, stress,depressão etc. Na década de 80, surgem os primeiros casosde AIDS (síndrome de imunodeficiência adquirida). Adramaticidade dos casos de AIDS e o fato de atingir todas asclasses sociais mobilizam o poder público e contribui paradois eventos: o reaparecimento de doenças infecciosas, comoa tuberculose; e a necessidade da pessoa portadora dasíndrome ser vista como um todo no seu contexto, não sóbiológico, mas sócio-cultural, ambiental, econômico, exigindoum atendimento em equipe multidisciplinar. Este fato reforça amobilização crescente desencadeada no Brasil com oMovimento da Reforma Sanitária, de construir um novo modelode assistência em saúde, que é contemplada na ConstituiçãoBrasileira de 1988. A consciência da necessidade de investirna promoção e preservação da saúde vem se instalando àmedida que não se dá conta do custo-benefício ao limitar oinvestimento no diagnóstico e tratamento das patologiasinstaladas.

Os Paradigmas na Educação Médica e a Avaliação das EscolasMédicas

Se no final do século XIX já havia uma tendência àsespecializações, após o Relatório Flexner, em 1910, o avançocientífico proporcionou o surgimento de novasespecialidades. Mas, por outro lado, a fragmentação doconhecimento em especialidades dificultou de forma marcanteo cuidado do ser humano na sua integralidade e aimpossibilidade de conhecimento do conhecimento (MORIN,s/d). Nos currículos dos cursos de graduação das escolasmédicas este desenvolvimento da ciência se traduziu namultiplicação de disciplinas agrupadas em ciclo básico e cicloprofissionalizante, atendendo a um currículo mínimo (MEC,Lei 5.540/68 e Resolução nº. 8/69), com grande dificuldade deinteragir e desenvolver atividades integradas.

A CINAEM, ao ser formada, na década de 90, promove umamplo movimento de avaliação do ensino médico que levantouo diagnóstico das escolas médicas brasileiras através de trêsestudos: estudo transversal do perfil do corpo docente; estudolongitudinal para estudar o médico formado na graduação eum estudo do modelo pedagógico. Neste mesmo período, poriniciativa do governo, se realiza o Exame Nacional de Curso, o“Provão”, que embora altamente questionado nos critériosadotados de avaliação e classificações, fortalece a perspectivada avaliação ser construída no dia-a-dia das instituições deensino superior. Ainda na última década do século XX, iniciam-se as discussões para a formulação das Diretrizes CurricularesNacionais (DCN) para os cursos de graduação da medicina,homologadas em 07 de novembro de 2001 (Brasil, res. nº. 4,CNE/MEC, 2001), tendo como atores atuantes os Projetos

UNI, a ABEM e a CINAEM. As DCNs afirmam que oprofissional médico tem que ter formação generalista,humanista, crítica e reflexiva, e com princípios éticos devepromover a saúde integral do ser humano.

Já nos últimos vinte anos do século XX, eventos mundiaise internacionais sinalizam com políticas para ações quegarantam mudanças na formação dos profissionais da saúde,com vistas aos desafios postos para oferecer uma assistênciade qualidade e de acesso universal e igualitário. Após aDeclaração de Alma-Ata, “Saúde para Todos no ano 2000”,conclamaram-se todas as nações para empenhar-se em garantira atenção primária em saúde a todos os povos. Entende-secom clareza que o paradigma vigente não mais consegueexplicações satisfatórias para os fenômenos, mostrandodisfunção essencial entre as realidades e os modelospropostos, situação caracterizada como de crise. O novoparadigma que vem sendo construído deve preencher,segundo Kuhn (1996), duas condições: 1) resolver problemasdetectados que o paradigma anterior não tenha conseguidoresolver; e 2) preservar uma parte substantiva do que foiconstruído pelo paradigma velho. Estudos aprofundados ereflexões quanto à relevância técnica e responsabilidade socialde governos e sociedades para a construção de sistemas desaúde e educação, de âmbito internacional, vêm se somandoa uma série de documentos que subsistem, em que um nãosupera o outro (Carta de Otawa/1986; Conferência de Adelaide/1988; Conferência de Sundsvall/1991; Conferência de Jacarta/1997; Declaração de Bogotá/1992; três Conferências Mundiaisde Educação Médica de Edimburgo /1988/1993/2000). Apromoção da saúde passa para a agenda das políticas públicasindicando que são necessárias ações de âmbito inter-setorial.Na prática, encontram-se dois grupos de interpretação: umcom enfoque no comportamento dos indivíduos e em seusestilos de vida, situando-os na família e no âmbito cultural desua comunidade, concentra-se no comportamento doindivíduo passível de mudança e sob controle da própriapessoa; o outro reúne conceitos que caracterizam a ênfase nopapel protagonista dos determinantes gerais, saúde comoproduto de um amplo espectro de fatores relacionados com aqualidade de vida, incluindo padrões de alimentação enutrição, habitação e saneamento, condições de trabalho,oportunidade de educação ao longo da vida, ambiente físicolimpo, apoio social para famílias e indivíduos, estilo de vidaresponsável e adequados cuidados com a saúde. Este último,segundo Buss (2000), está voltado para o coletivo deindivíduos e ao ambiente físico, social, político, econômico ecultural através de políticas públicas e de condiçõesfavoráveis ao desenvolvimento da saúde e do esforço dosindivíduos e das comunidades. O novo paradigma daintegralidade busca interligar setores que se complementem ese potencializem no entendimento e nas ações que preenchamos espaços deixados pela abordagem restrita a partes do corpodo paciente, não considerando o conjunto e o contexto ondeo indivíduo se insere. O reconhecido avanço da ciênciabiológica com resolução de problemas insondáveis relativo

Page 44: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

34 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):31-37Jadete Barbosa Lampert

aos diagnósticos e às terapêuticas nas diversasespecialidades, distanciou o profissional da abordagemintegral do ser humano no contexto social, econômico, políticoe ambiental. E uma forma de atuar sobre o corpo moldou operfil da profissão médica moderna, muito mais impessoal etécnica, desumanizando o ato médico. Segundo Santos (1995),este “utilizou a visão mecanicista do objeto profissional,fazendo crer que o corpo fosse divisível em partes, àsemelhança de uma máquina”.

As Escolas Médicas e Perspectivas no Século XXI

O crescimento do número de escolas médicas no Brasil,no século XX, ocorre de forma acentuada na década de 60, eapós desaceleração pelos alertas da grande deterioração daqualidade do ensino nas décadas seguintes, novamente, nadécada de 90, é desencadeada nova leva de criação de novasescolas que adentra ao novo século. A questão das condiçõesdevidas para que seja oferecido um ensino de qualidadecontinuam a preocupar as instituições e estudiosos da área. Apreocupação em especial se volta para a qualificação do corpodocente para orientar, acompanhar e avaliar o processo ensino-aprendizagem na formação do futuro profissional. Preocupaçãoque se estende a todas as escolas existentes que estãoimplementando as DCNs, pois, para sua efetivação, devemestar em condições de desenvolver novas metodologias deensino-aprendizagem que superem a predominância datransmissão de conhecimentos em aulas teóricas para grandesgrupos de estudantes em disciplinas que não interagem, comoacontece no modelo tradicional. Para a mudança de modelode assistência, além da reestruturação do sistema de serviços,as escolas devem estar formando o profissional adequadopara nele atuar. Com esta responsabilidade social, a escoladeve dar conta de condições básicas para formar umprofissional com conhecimento, habilidades e atitudes capazesde atender com qualidade as necessidades e demandas dapopulação brasileira. Surge aí o ponto crucial de se dispor dedocentes, na grande maioria, formados no modelo anterior,tradicional, flexneriano, modelo ainda hegemônico naassistência, e com muito pouco tempo para refletir sobre suainserção e responsabilidade enquanto docente, que deveorientar e facilitar o processo ensino-aprendizagem, carro-mestre das transformações que estão em construção. Vejamosos diferentes enfoques e características predominantes emum e outro modelo paradigmático no Quadro 1.

Nesse caminho de mudança na perspectiva de futuro, valeressaltar duas iniciativas de apoio ao processo de mudançana educação médica do Ministério da Saúde em parceria como Ministério da Educação e a OPS: o lançamento do Programade Incentivo às Mudanças Curriculares no Ensino Médico –PROMED (BRASIL, 2002) – e o Programa Nacional deReorientação da Formação Profissional em Saúde – PRÓ-SAÚDE (BRASIL, 2005). Esses programas têm como uma dasmetas aproximar a formação profissional e científica dasnecessidades reais do SUS, sobretudo na estruturação da

atenção básica, que deve ser a porta de entrada do sistema.Isso significa que os profissionais podem melhorar as açõesdesenvolvidas no Programa Saúde da Família (PSF/MS, 1994),que se propõe resolver adequadamente a maioria de demandasnos serviços de saúde.

As avaliações do ensino médico aparecem de formasubstancial a partir da década de 90 do século passado. Naentrada do século XXI, com a aprovação, em 2004, do SistemaNacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) cria-se a expectativa de estar em andamento a construção de umacultura de avaliação como processo participativo e construtivoda auto-avaliação. Nesta linha, a partir de 2006, está emandamento um projeto de avaliação das escolas médicasbrasileiras, coordenado pela Comissão de Avaliação dasEscolas Médicas (CAEM) da ABEM, que tem como objetivos:promover e acompanhar as mudanças nas escolas médicaspara atender às DCNs com perspectivas à consolidação doSUS e incentivar e apoiar a construção do processo deavaliação (auto-avaliação, avaliação externa, meta-avaliação)em cada escola médica no atendimento aos princípios doSINAES. Os estudos já realizados mostram que as escolasmédicas aderiram e estão em movimento de implementaçãodas DCNs (BRASIL, 2006; ABEM/CAEM, 2007). O resultadoparcial da avaliação das tendências de mudanças nas escolasmédicas brasileiras, no desenvolvimento do primeiro momentodo projeto da CAEM/ABEM, realizada e analisada com 28escolas, em 2006, foram apresentados no 45º CongressoBrasileiro de Educação Médica. Embora o processo propostono projeto careça do segundo e do terceiro momentosprevistos, já foi possível estabelecer a tipologia de tendênciasde mudanças dessas escolas, mostrando o perfil do momentodas escolas no processo de mudanças. O estudo mostra quepredominantemente as escolas alteraram e/ou construíramprojetos pedagógicos coerentes com as DCNs. A busca poroutros locais de práticas de ensino fora do hospital está bemmarcada. A abordagem pedagógica tem dificuldades naimplementação de metodologias ativas, que notadamente écoerente com as poucas ações para criar e implementarpolíticas de desenvolvimento docente. Os estudos mostramo processo de mudanças desencadeado com avançossignificativos em algumas escolas. No entanto, a debilidadedas mudanças neste início do processo está pautadafortemente nos aspectos de formação pedagógica ecapacitação gerencial dos docentes, concomitante aomovimento de reestruturação da rede de serviços dentro daproposta do Sistema Único de Saúde.

Referências

1. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MÉDICA/COMISSÃODE AVALIAÇÃO DAS ESCOLAS MÉDICAS. Projeto de Avaliação detendências de mudanças nos cursos de graduação das escolas médicasbrasileiras. ABEM, 2006 www.abem-educmed.org.br.2. ALMEIDA, M.J. et al. Implantação das Diretrizes CurricularesNacionais na Graduação em Medicina no Paraná. Rev. Bras. Educ.Med., Rio de Janeiro, v.31, mai./ago.2007.

Page 45: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

35Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):31-37 Dois Séculos de Escolas Médicas no Brasil

Quadro 1. Características predominantes dos cursos de graduação da escola de medicina, na construção do paradigma daintegralidade para atender as DCNs e do paradigma flexneriano (tradicional, conservador) mostradas em cinco eixos de relevânciana formação profissional.

MUNDO DO TRABALHOIntegralidade - DCN••••• Para a construção do projeto pedagógico, considera primordialmente a carência de profissionais médicos relacionada à

atenção básica de saúde e às oportunidades de emprego;••••• Reconhece a existência de prática liberal e/ou assalariada e a influência na formação do médico e promove a análise crítica com

orientação sobre os aspectos econômicos e humanísticos na prestação de serviços de saúde e suas implicações éticas;••••• Aborda a relação institucional mediadora, seguradoras de saúde e similares, entre prestadores e usuários dos serviços de

saúde com análise crítica desta relação e reflexos na relação médico-paciente e proporciona exercício didático-pedagógicodo trabalho em equipe multidisciplinar com orientação de aspectos éticos e humanísticos.

Tradicional - Flexneriano••••• Para a construção do projeto pedagógico, não considera as oportunidades de emprego nem a carência de profissionais

médicos para a atenção básica de saúde;••••• O mercado de trabalho é referido apenas pelo tradicional consultório, onde o médico domina os instumentos diagnósticos

e os encaminhamentos, onde pode cobrar honorários sem intervenção de terceiros;••••• Não faz parte do projeto pedagógico abordar aspectos do mundo do trabalho como a relação institucional mediadora,

seguradoras, planos de saúde, etc., entre prestadores e usuários de serviços de saúde e a repercussão na relação médico-paciente, nem o trabalho em equipe multidisciplinar.

PROJETO PEDAGÓGICOIntegralidade - DCN••••• Orienta o curso para causas biomédicas, epidemiológico-sociais e ambientais na determinação da saúde, abordando

conhecimento de forma integrada com metodologías interativas, e orienta o curso para as necessidades da atenção básicacom forte interação com os serviços de saúde e a comunidade, articulando aspectos de promoção, prevenção, cura ereabilitação;

••••• Analisa de forma crítica a necessidade do uso da tecnología pesada e de alto custo, enfatizando o custo-benefício da suaaplicação e a atenção básica de saúde;

••••• Na pesquisa referencia-se nas necessidades de saúde com base demográfica, epidemiológica e sócio-econômica, no campoda atenção básica, na gestão do sistema de saúde, na interação escola-serviço-comunidade e no processo ensino-aprendizagem, e estimula a participação de discentes, contribuindo para a tomada de decisão com base em informaçõesrelevantes com vistas à melhoria das práticas de assistência em saúde;

••••• Oferece cursos de pós-graduação em campos gerais e especializados na seqüência da graduação relacionados com asnecessidades de atendimento a saúde da população articulados com os gestores do Sistema de Saúde e franqueia aeducação permanente relacionada a doenças prevalentes em interação com aos profissionais dos serviços.

Tradicional - Flexneriano••••• Orienta o curso para causas biomédicas na determinação da doença, tratando do diagnóstico, tratamento e recuperação do

doente, enfocando a doença apresenta o conhecimento fragmentado em disciplinas/especialidades;••••• Enfatiza a alta tecnologia na área clínica e cirúrgica e as indicações sem a análise crítica do custo-benefício;••••• Na pesquisa referencia-se nas necessidades de saúde com base exclusivamente demográfica e epidemiológica com ênfase

nas ações diagnósticas e curativas;••••• Oferece residências, especializações, mestrado e doutorado em campos especializados com total autonomia sem compromisso

com a educação permanente.

ABORDAGEM PEDAGÓGICAIntegralidade - DCN••••• Tem estrutura curricular que proporciona atividades em grande parte integradas, áreas de prática real em atenção de

adultos, materno-infantil, saúde da família, medicina do trabalho, etc.;••••• O processo ensino-aprendizagem centrado no estudante com métodos de aprendizagem ativa com ênfase na realidade de

saúde e com abordagem multi e interdisciplinar em pequenos grupos tendo o professor como orientador e facilitador e naprática usa também os serviços e espaços comunitários, avaliando conhecimentos, habilidades e atitudes com estímulo aavaliação interativa e a auto-avaliação;

Page 46: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

36 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):31-37Jadete Barbosa Lampert

••••• Proporciona condições adequadas dos espaços físicos e de materiais de apoio para o desenvolvimento do processoensino-aprendizagem e oferece tutoria com análise e solução de problemas baseados em situações reais.

Tradicional - Flexneriano••••• Estrutura curricular fracionada em ciclos básico e profissionalizante bem separados e organizados com disciplinas

fragmentadas;••••• O proceso ensino-aprendizagem centrado no professor que enfatiza as aulas teóricas expositivas em disciplinas isoladas e

as práticas são predominantemente demonstrativas e centradas no professor com avaliações escritas predominantementede memorização;

••••• Sem a devida preocupação em proporcionar condições físicas e de materiais de apoio para o ensino-aprendizagem (biblioteca,salas, laboratórios, recursos audiovisuais e de informática, biotério, etc.) e em oferecer tutoria.

CENÁRIOS DA PRÁTICAIntegralidade - DCN••••• Os locais de ensino da prática contam com as unidades de atenção a saúde do sistema em diferentes graus de complexidade

tecnológica (primária, secundária e terciária) no entendimento da construção da rede do sistema de saúde, contribuindocom os mecanismos de referência e contra-referência voltado para às necesidades de saúde prevalentes dentro de umavisão intersetorial com enfoque na saúde;

••••• Proporciona ao discente ampla participação com orientação e supervisão docente nos vários cenários de prática;••••• oferece práticas que se desenvolvem ao longo de todo o curso, utilizando os serviços em todos os níveis de atenção de

forma integral (medicina integral do adulto, medicina do trabalho, saúde da mulher, emergencias/urgências, etc.).Tradicional - Flexneriano••••• Locais de prática no hospital secundário e terciário com enfoque fortemente voltado para as doenças crônicas e graves;••••• Proporciona ao discente observação de práticas demonstrativas com oportunidade a atividades selecionadas;••••• Oferece práticas ligadas aos departamentos (clínica médica, cirúrgica, etc.) e às disciplinas (cardio, pneumo, nefro, gastro,

dermato, etc.) que quando oportunizadas ao discente se retringe ao âmbito das especialidades – visão segmentada dopaciente.

DESENVOLVIMENTO DOCENTEIntegralidade - DCN••••• oferece e exige capacitação didático-pedagógica de todos os docentes com acompanhamento e desenvolvimento no

cotidiano das tarefas didático-pedagógicas (apoio institucionalizado) dispondo de núcleo de apoio didático-pedagógico;••••• promove de forma sistemática e exige a atualização e aprimoramento técnico-científico dos professores em especial relativo

às exigências de necessidades/demandas vigentes em saúde com incorporação crítica de novos conhecimentos e tecnologias;••••• estimula os docentes e apóia sua participação no planejamento e avaliação do sistema de saúde em sua área de influencia,

analizando os modelos de prática e desenvolvendo processo formativo ligado as necesidades regional e local em saúde etem serviços assistenciais integrados com o sistema de saúde e os médicos dos serviços têm participação na docência;

••••• promove capacitação gerencial e possuem docentes que assumem cargos administrativos institucionais com bomconhecimento de ciências administrativa, liderando programas, buscando assessorar-se de acordo com as necessidadesidentificadas e proporcionando participação ativa e responsabilização dos segmentos docente, discente e técnico-administrativo nas decisões, processos, resultados e avaliações institucionais.

Tradicional - Flexneriano••••• sem a preocupação não oferece e nem promove (ou raramente o faz) a capacitação didático-pedagógica do corpo docente;••••• não estimula nem oferece atualização técnico-científica aos professores (ou raramente o faz), deixando por conta do próprio

docente, embora esta seja a principal exigência para a docência neste modelo;••••• não estimula o corpo docente que por sua vez não participa dos serviços e do planejamento do sistema de saúde (municipal,

regional) na sua área de influência, e os médicos dos serviços não participam na docência;••••• docentes assumem cargos gerenciais (disciplina, departamento, direção de escola, de hospital universitário, etc.) de forma

empírica e fundada em experiência própria. Não há a preocupação institucional em capacitação gerencial dos docentes queassumem cargos administrativos.

Page 47: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

37Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):31-37 Dois Séculos de Escolas Médicas no Brasil

3. BRASIL. Ministério da Saúde. Ministério da Educação. ProgramaNacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde PRÓ-SAÚDE [texto na Internet]. Brasília (DF): Ministério daSaúde, Ministério da Educação; 2005 [citado 2007 Fev 5].Disponível em: http:/ /www.abem-educmed.org.br/pro_saude/publicacao_pro-saude.pdf4. BRASIL. Ministério da Saúde. Ministério da Educação. Aaderência dos cursos de graduação em enfermagem, medicina eodontologia às di re t r izes curr iculares nacionais . Brasí l ia ,Ministério da Saúde, 2006, 162p:Il. (Série F. Comunicação eEducação em Saúde).5. BRASIL. Constituição (1988). Constituição [da] República Federativado Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.6. BUSS, P.M. Promoção da saúde e qualidade de vida. Ciência & SaúdeColetiva, Abrasco, 5(1):163-77, 2000.7. EDLER, F.; FONSECA, M.R.F. Seleção de artigos da Série “Históriada Educação Médica no Brasil”, primeira parte. Cadernos da ABEM,v.2, jun./2006.

8. KUHN, T. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: EditoraPerspectiva S.A, 4ª edição, 1996.9. LAMPERT, J.B. Tendências de Mudanças na Formação Médica noBrasil: tipologia das escolas. São Paulo, Editora Hucitec, Rio de Janeiro,ABEM, 2002.10. ______. Educação em saúde no Brasil: para não perder o trem dahistória. Cadernos da ABEM, v.2, jun./2006.11. MACHADO, M.H. Os Médicos e sua prática profissional: asmetamorfoses de uma profissão. Rio de Janeiro, [Tese de doutorado,Universidade Estadual do Rio de Janeiro], 1996.12. SANTOS FILHO, L.C. História Geral da Medicina Brasileira. SãoPaulo, Hucitec, Editora USP, v.1, 1991.13. SANTOS, P.M.L. Profissão médica no Brasil. In: Profissões desaúde: uma abordagem sociológica, M.H. Machado (org.), pp.97-115,Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 1995.14. TRAVASSOS, C. et al. Desigualdades geográficas e sociais na utilizaçãode serviços de saúde no Brasil. Ciência & Saúde Coletiva. Abrasco, RJ,5(1):133-49, 2000.

Page 48: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

38

Ensino e Pesquisa no Hospital UniversitárioEnsino e Pesquisa no Hospital UniversitárioEnsino e Pesquisa no Hospital UniversitárioEnsino e Pesquisa no Hospital UniversitárioEnsino e Pesquisa no Hospital Universitário

Teaching and Research in University Hospitals

Protasio Lemos da LuzDiretor, Divisão de Cardiologia Clínica, InCor – Hospital das Clínicas. Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

(USP); São Paulo, SP, Brasil

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Prof. Dr. Protasio Lemos da Luz.Divisãode Cardiologia, InCor-HC/FMUSP. Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar,44, Bloco II, Cerqueira César. 05403-000. São Paulo, SP, Brasil.Endereço eletrônico: [email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):38-39.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

O hospital comum tem por finalidade essencial tratar dedoentes. Já o Hospital Universitário (HU) tem característicasespeciais porque, além disso, deve ensinar e avançar oconhecimento através de pesquisas. Para tanto é dirigido porprofessores e servido por profissionais de primeira linha. Supõe-se que a função assistencial possa ser feita da melhor maneira,com a maior competência, visto que o HU detém tecnologia,conhecimento e profissionais diferenciados que os apliquem.Na prática, isso nem sempre é verdade. Às vezes, faltamequipamentos; a maioria dos hospitais públicos universitáriosnão tem recursos imediatos para adquirir equipamentosmodernos, pois custam caro; dependem de verbasorçamentárias governamentais e estão sujeitos a burocracias;falta-lhes agilidade. Por outro lado, os profissionais nem sempreestão presentes em tempo suficiente para impulsionar arenovação de equipamentos e o funcionamento do hospital;a maioria trabalha em tempo parcial e tem suas atividadesdivididas com hospitais particulares, ou suas própriasclínicas, que são mais rentáveis. Portanto, o compromissodos médicos com o destino do hospital, ou a ausência dessecompromisso, determina em grande parte a sorte dainstituição hospitalar. Há também considerávelheterogeneidade na qualidade dos HUs no país. A conclusãoé que nem todo HU presta os melhores serviços assistenciais.Não se pode esquecer, porém que os HUs atendemprincipalmente pacientes do SUS, pessoas com recursosmateriais modestos, e assim cumprem relevante papel social.

Já no ensino, o HU é insubstituível. Hospital Universitárioé o verdadeiro campo de luta do médico iniciante. Ali todas asnuances de todas as doenças são encontradas, bem comoquase todos os matizes de caracteres que simbolizam o serhumano. Digo quase porque os ricos não costumam se tratarem hospitais universitários, salvo algumas exceções.

Para o ensino, nada substitui o contato com o paciente.Mesmo sistemas de simulação recentemente oferecidos pormodernas tecnologias não substituem o homem doente.Podem-se simular fenômenos físicos, mas não a alma humana,os sentimentos, os dramas pessoais. E tudo isso o estudanteprecisa aprender.

Da Medicina, pode-se dizer o que Camões disse da arte daguerra: “Não se aprende, senhor, na fantasia; sonhando,imaginando ou estudando; senão vendo, tratando epelejando”1.

Porém, não é apenas a variedade de casos que conta. Contaigualmente, ou mais, a supervisão dada pelos professores, asdiscussões à beira-de-leito, as “dicas” que a experiência ensinae que só o contato diário aluno/professor pode transmitir. Alémda abordagem objetiva da doença, dos métodos diagnósticos eopções terapêuticas, ali se ensina humanismo e integridadeprofissional, pelo método mais eficiente que é o exemplo.Portanto, o HU é o templo do ensino médico, o lugar onde asteorias são testadas e onde os médicos jovens adquirem umavisão do mundo real onde exercerão sua profissão2. Por outro lado, a pesquisa representa a última fronteiraconquistada por alguns HUs no Brasil, e aquela a serconquistada por outros. Na verdade, deveria ser assim desdeo início de qualquer HU, e continuar sendo sempre. Mas nemsempre o é.

O Hospital Universitário deve avançar o conhecimento,analisar e aprimorar procedimentos, testar novosequipamentos. Boa parte da aparelhagem que se usa paradiagnósticos ou intervenções vem de fora do país; impõe-se,portanto, uma avaliação de custo/benefício no que respeita asua aplicabilidade no nosso país. O HU deve ser um lugaronde se exerça crítica isenta de novos conceitos, onde seavaliem os resultados dos diversos procedimentos médicos.E há muitas condições favoráveis para isso: pacientes emgrande número, multidisciplinaridade, problemas nãoresolvidos, tecnologias e competência dos profissionais. Épreciso, no entanto, criar condições para que isso seconcretize. É necessária estrutura física, orçamento, pessoalespecializado; de enorme importância também é a implantaçãoda carreira de pesquisador, de modo que investigadoresqualificados possam se dedicar integralmente à pesquisa comsalários e oportunidades justas para progredir na carreiraprofissional; deve-se lembrar que os próprios pesquisadorestêm condições de buscar recursos financeiros em agênciasfomentadoras, e assim criar condições para o desenvolvimentode programas de pesquisa a longo prazo; em suma, taisprogramas requerem um conjunto de facilidades que permitamque a pesquisa seja uma atividade profissional em si, e nãoapenas um apêndice eventual do hospital.

1 Os Lusíadas (Luiz Vaz de Camões).2 Da Luz, P.L .Nem só de ciência se faz a cura. Editora Atheneu, 2004.

Page 49: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

39Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):38-39 Ensino e Pesquisa no Hospital Universitário

O InCor é um exemplo, entre outros, onde tal sistema foiimplantado e funciona concomitantemente com asatividades assistenciais e de ensino. Laboratóriosespecíficos foram criados, como os de imunologia, biologiavascular e molecular, insuficiência cardíaca, imagem etc.Pesquisadores clínicos e de áreas básicas desenvolvematividades em conjunto procurando solucionar problemasclínicos que podem requerer cooperação multidisciplinar.

Tal sistema permite o aperfeiçoamento dos cuidadosmédicos, ensino diferenciado e também progressocientífico com a criação de soluções inovadoras.

Recentemente, o Ministério da Saúde junto com oMinistério de Ciência e Tecnologia criaram centros depesquisa cl ínica em 17 unidades hospitalaresuniversitárias buscando precisamente incentivar apesquisa nos HUs. É uma iniciativa extremamente louvávelque já está dando frutos e deve ser fortalecida nospróximos anos.

A s s i m , e n s i n o e p e s q u i s a s ã o p i l a r e sfundamenta is do HU e devem cons t i tu i r - se emobjetivos precípuos dessas instituições na formaçãomédica no Brasil.

Page 50: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

40

Perspectivas da Genômica na Medicina do Século XXIPerspectivas da Genômica na Medicina do Século XXIPerspectivas da Genômica na Medicina do Século XXIPerspectivas da Genômica na Medicina do Século XXIPerspectivas da Genômica na Medicina do Século XXI

Genomic Perspectives in the Medicine of XXI Century

Samuel GoldenbergInstituto Carlos Chagas (ICC-FIOCRUZ) e Instituto de Biologia Molecular do Paraná; Curitiba, PR, Brasil

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. Samuel Goldenberg. Instituto CarlosChagas (ICC-FIOCRUZ) e Instituto de Biologia Molecular do Paraná.Rua Prof. Algacyr Munhoz Mader 3775. 81350-010. Curitiba, PR,Brasil. Endereço eletrônico: [email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):40-41.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

As ciências médicas e biológicas passaram a ter umcomponente importante na geração de novos conhecimentosa partir do final do século XX graças ao desenvolvimento dastecnologias que permitiram a determinação das sequênciasnucleotídicas de diferentes genomas. O nascimento dagenômica e o desenvolvimento de disciplinas relacionadas aela permitem o estudo minucioso dos mecanismos primáriosenvolvidos na regulação da expressão gênica e na análise depolimorfismos associados à expressão fenotípica.

A Genômica pode ser conceituada como o estudo daestrutura, função e interações do conjunto de genes de umorganismo. No caso da saúde humana, a abordagem holísticada genômica tem o potencial de gerar novos conhecimentossobre as doenças através da compreensão dos mecanismosbásicos de funcionamento da célula normal, diagnóstico,tratamento e desenvolvimento de novos tratamentos e drogas.A ciência genômica compreende várias disciplinas, tais comogenômica funcional, proteômica, metabolômica etc. Destamaneira, surge a “Genômica Médica” que integra estesconhecimentos buscando compreender como variações nogenoma influenciam na susceptibilidade a doenças,diagnóstico e prognóstico de tratamento e resposta atratamento.

O grande volume de dados gerados requer grandecapacidade de processamento não apenas em “hardware”,mas também em “software”. O desenvolvimento recente dagenômica acarretou no desenvolvimento de uma importanteárea de apoio que é a bioinformática. A genômica caracteriza-se por realizar análises globais, trabalhando, portanto, comum grande número de dados e variáveis. A consequência éque a bioinformática é uma área do conhecimento em expansãosendo essencial para todas as áreas da genômica, incluindo agenômica médica.

Mais recentemente, com o advento de novos instrumentosde alta performance para o sequencimento de nucleotídeos ea redução de custos operacionais, podemos imaginar que embreve cada indivíduo poderá carregar consigo um “chip”contendo a sequência do seu genoma. Tal realidade permiteantever o grande desenvolvimento da farmacogenômica, queé o estudo de como cada indivíduo reage a um medicamento

ou o estudo de como os genes que interagem em um individuodeterminam uma resposta a drogas. Os estudos genômicosdeverão permitir um melhor e mais amplo mapeamento dospolimorfismos existentes no genoma humano e a conseqüenteassociação dos mesmos à susceptibilidade a doenças.

Os progressos na área de genômica médica têm sidoenormes e neste início do século XXI um passeio pela áreaexigiria a redação de um compêndio. Estes enormes avançostornam difícil a previsão exata dos beneficios da genômica àsciências médicas.

O que se pode antever é que os beneficios serão enormesna medicina, pois poderemos prever o risco dos indivíduosdesenvolverem, por exemplo, uma doença complexa,possibilitando o tratamento preventivo. Neste sentido, ostratamentos serão dirigidos a cada indivíduo com base nainformação contida em seu genoma. A farmacogenômica deveráser uma área de grande desenvolvimento. Outra área em quese imagina um maior crescimento é a de diagnóstico, tantoligado à genética epidemiológica como ligado à detecção depatógenos.

No final do século XX, com o advento dos diferentesprojetos genoma, houve a necessidade de desenvolvimentode ferramentas que permitissem a determinação da funçãodos genes de função desconhecida, na verdade, majoritáriosquando comparados aos genes de função conhecida. Umadestas ferramentas são os microarranjos de DNA (biochips).Os microarranjos consistem da representação de um genomaatravés da aplicação de um conjunto representativo de genesde um organismo em uma superfície rigida (por exemplo, umalâmina de vidro). Assim, através das técnicas de hibridaçãode ácidos nucléicos marcados com fluoróforos distintos,podemos identificar o conjunto de genes expressos ao longodo tempo ou sob diferentes condições experimentais,mimetizando o programa de expressão gênica que ocorre nacélula. Existem também microarranjos de proteínas quepermitem, por exemplo, a identificação de proteínas queinteragem entre si, como, por exemplo, um receptor e seuligante ou um antígeno e um anticorpo. Estes microarranjostêm um enorme potencial como ferramentas de diagnóstico.Exemplificando, se sabemos que a expressão de umdeterminado gene está associada à predisposição para umaneoplasia, podemos diagnosticar precocemente a doençaatravés da evidência da expressão do gene em questão emcélulas do indivíduo. Os microarranjos podem também serutilizados para o seguimento de tratamentos quimioterápicosonde podemos avaliar o nível de expressão de genesmarcadores. De maneira análoga, podemos construir um

Page 51: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

41Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):40-41 Genômica na Medicina do Século XXI

biochip com genes (ou proteínas) de diversos patógenos eatravés da hibridação de ácidos nucléicos (ou uma reação deinteração de proteínas) diagnosticar a presença do patógeno(ou a resposta do organismo infectado ao patógeno).

No campo das doenças infecto-contagiosas é possívelantevermos grandes progressos e novos desafios. Osequenciamento dos genomas de patógenos provê a basepara a sua detecção por amplificação de ácidos nucléicos oupode ainda permitir a expressão de antígenos recombinantesmicrobianos para os testes de diagnóstico indiretos. Não sepode descartar o surgimento de novos patógenos no futuro,pois há, na natureza, um grande número de microrganismosainda desconhecidos que podem entrar em contato com ohomem pelo rompimento de barreiras físicas (por exemplo,desmatamento e destruição de reservatórios naturais) ou pormutações que os tornem patogênicos. Um exemplo recentefoi o vírus da febre aviária (SARS) com os primeiros casosdetectados no início deste século XXI. Graças à possibilidadede sequenciamento rápido de genomas e identificação depatógenos foi possivel enfrentar o problema antes que setransformasse em uma pandemia.

Ainda no terreno da infectologia, com o maiorconhecimento dos genomas de patógenos, existe o potencialde desenvolvimento de novas vacinas, utilizando técnicas deDNA recombinante, peptídeos sintéticos, anticorposhumanizados e vacinas de DNA diretamente. Talvez asbarreiras para a disponibilização de novas vacinas ao mercadosejam muito mais de ordem econômica (o lucro previsto e osinvestimentos dos grandes produtores internacionais) do quede ordem técnica.

Entretanto, mesmo não havendo disponibilidade de vacina,os estudos de genômica dos patógenos e da sua interaçãocom o hospedeiro humano abrem uma grande avenida para odesenvolvimento de novos antivirais. No final do século XX,tivemos o exemplo da AIDS e de como o desenvolvimento deantivirais contribuiu para controlar uma doença queapresentava alta taxa de mortalidade. Os estudos de genômicaestrutural e a possibilidade de ensaios in silico deverãopermitir o desenho de novas drogas que poderão ser ainda

mais efetivas quando sua prescrição estiver associada aoconhecimento prévio da estrutura genética de cadaindivíduo.

As possibilidades e perspectivas descritas acima estãomais próximas da realidade do que da ficção científica e em umespaço tão curto quanto uma década poderemos estar vivendoo que antevemos. Todavia, resta um grande desafio para ahumanidade de ordem muito mais da Ética do que dodesenvolvimento científico. Como lidar com as novasconquistas? Esta medicina do futuro estará disponível atodos? As nações mais pobres poderão lidar com o lucro danova indústria farmacêutica? O conhecimento da estruturagenética de cada indivíduo seria um critério de seleção ediscriminação? Grandes desafios nos esperam e oxalá a novamedicina possa contribuir para melhorar a qualidade de vida ediminuir as iniquidades entre os povos.

Bibliografia Recomendada

1. BELL, J. Predicting disease using genomics. Nature, 429:453-456,2004.2. BROECKEL, U.; MARESSO, K.; KUGATHASAN, S. Functionalgenomics and its implications for molecular medicine.Pediatr.Clin.North Am., 53: 807-816, 2006.3. LAZARIDIS, K.N.; PETERSEN G.M. Genomics, geneticepidemiology, and genomic medicine. Clin.Gastroenterol.Hepatol., 3(4):320-328, 20054. PETRIK, J. Diagnostic applications of microarrays. Transfus.Med.,16(4): 233-247, 2006.5. RAPPUOLI, R. From Pasteur to genomics: progress and challengesin infectious diseases. Nature Medicine, 10: 1177-1185, 2004.6. SEO, D.; GINSBURG, G.S. Genomic medicine: bringing biomarkersto clinical medicine. Curr.Opin.Chem.Biol., 9(4): 381-386, 2005.7. TREVINO, V.; FALCIANI, F.; BARRERA-SALDAÑA, H.A. DNAmicroarrays: a powerful gernomic tool for biomedical and clinicalresearch. Mol.Med., 13: 527-541, 2007.8. WESTON, A.D.; HOOD, L. Systems biology, proteomics, and thefuture of health care: toward predictive, preventive, and personalizedmedicine. J.Proteome Res., 3(2): 179-196, 2004.9. WILLARD, H.F.; ANGRIST, M.; GINSBURG, G.S. Genomic Medicine:genetic variation and its impact on the future of health care.Philos.Trans.R.Soc.B.Biol.Sci, 360: 1543-1550, 2005.10. WILTGEN, M.; TILZ, G.P. DNA microarray: principles and clinicalimpact. Hematology, 12(4): 271-287, 2007.

Page 52: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

42

TTTTTerapias Celulares e Bioengenhariaerapias Celulares e Bioengenhariaerapias Celulares e Bioengenhariaerapias Celulares e Bioengenhariaerapias Celulares e Bioengenharia

Cell Therapies and Bionegineering

Radovan BorojevicInstituto de Ciências Biomédicas, Universidade Federal do Rio de Janeiro; Rio de Janeiro, RJ, Brasil

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. Radovan Borojevic. Instituto deCiências Biomédicas, Centro de Ciências de Saúde. Universidade Federaldo Rio de Janeiro. Caixa Postal: 68021. 21941-970. Cidade Universitária,Ilha do Fundão. Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Tel 21 2590 8736. Fax 212562 6483. Endereço eletrônico: [email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):42-46.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

As Terapias Celulares e a Bioengenharia atuam no contextoda Medicina Regenerativa, procurando controlar e ampliar acapacidade natural da regeneração de tecidos. A regeneraçãomantém naturalmente a homeostasia tecidual, substituindocontinuamente as células gastas. Uma intensa regeneração énatural e contínua nos tecidos altamente expostos ao estresseexterno, como o epitélio intestinal ou cutâneo, assim comonos tecidos caracterizados pela alta taxa de renovação, comoas células sangüíneas. Por outro lado, a regeneração podeeventualmente reparar os tecidos lesados por trauma, doençadegenerativa ou senescência. A medicina regenerativa buscacriar condições ideais para reparo, regeneração e/ousubstituição de tecidos lesados fornecendo: (a) elementoscelulares requeridos, (b) fatores de proliferação e diferenciaçãocelular que podem garantir a geração de quantidade suficientede células novas e (c) estruturas supramoleculares queprovidenciam a organização espacial plenamente funcionalde novos tecidos gerados e a sua integração sistêmica. Oconjunto dessas ações representa o campo de ação dasterapias celulares e de bioengenharia, compreendendo aengenharia gênica, celular e tecidual, e a biomimética.

A importância crescente da medicina regenerativa noterceiro milênio é devida às modificações demográficas esociais. O aumento progressivo da idade das populaçõeshumanas, e em particular das populações urbanas, gera anecessidade de garantir cada vez mais a qualidade da vida,compatível com uma carga social aceitável. O número total e aproporção de habitantes de terceira idade (65-85 anos) e emsenectude avançada (>85 anos) estão aumentandocontinuamente e rapidamente: o número do primeiro grupotriplicará nos próximos 50 anos, e do segundo será multiplicadopor seis. O segundo desses dois grupos consome vinte vezesmais custos da assistência médica e duas vezes mais internaçãohospitalar do que o primeiro. As doenças degenerativas são acausa essencial e crescente dessa carga social, causando adeterioração da qualidade de vida e aumento dos custos daassistência médica. A degradação ambiental e o aumento daidade associam-se para aumentar o risco de neoplasias, e onúmero de pacientes com doenças cancerosas aumenta em

proporção direta com a idade média das populações. Por outrolado, as populações jovens, vivendo em aglomerações de altadensidade, estão mais expostas a lesões traumáticas. Emboranumericamente menos significativas, essas lesões têm umaltíssimo custo social, gerando freqüentemente pessoasjovens debilitadas ou permanentemente incapacitadas parauma vida normal e produtiva. Em populações urbanas do Brasil,as lesões traumáticas são a primeira causa tanto da internaçãohospitalar quanto da morte na segunda e terceira décadas davida dos jovens. Em 2004, foram gastos no SUS 585 milhõesde reais somente com órteses e próteses. Estima-se que, nomundo todo, cerca de 11.750.000 pacientes poderão sebeneficiar de uma terapia ortopédica associada combioengenharia, com o valor de biomateriais usados em terapiasde U$3.250.000 (MEDTECH INSIGHT REPORT, 2004).

Ambas as situações exigem terapias que possam preservar,melhorar, e/ou restaurar as funções teciduais. Contrastandocom os fármacos, antibióticos ou vacinas, que podem serusados indistintamente por um grande número de pacientes,a medicina regenerativa é individual, dirigida especificamentea cada um dos casos atendidos, no seu contexto particular.Trata-se, portanto, de uma medicina individualizada, cuja açãopode envolver várias etapas, independentes ou associadas:

- Introdução de células, hormônios ou fatores decrescimento, ou de estruturas supramolecularessemelhantes aos elementos de matriz extracelular emediadores intercelulares associados (biomateriais),facilitando in situ a mobilização, expansão e integraçãode populações de células regenerativas internas,fomentando o reparo de lesões ou de regeneração erenovação de tecidos degenerados (terapias celularese biomiméticas).

- Manipulação ex vivo de células do próprio paciente,sua expansão, diferenciação e integração potencial emestruturas ordenadas superiores, que serão re-introduzidas nas regiões lesadas e integradas noprocesso de regeneração (bioengenharia ouengenharia tecidual).

Ambos os processos se beneficiam dos grandes avançosda genômica, que geram potencialmente acesso às informaçõesnecessárias para definir o perfil do paciente, as necessidadesde células envolvidas nos procedimentos planejados, econtrolam a interação entre as células manipuladas, os tecidosinternos e os elementos estruturais extracelulares. Osconhecimentos mais amplos da área de pós-genômica são abase conceptual dessa parte de medicina, requerendo umaextensão de conhecimentos genômicos para os das

Page 53: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

43Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):42-46 Terapias Celulares e Bioengenharia

organizações celulares, das interações e de funções celularesno seu contexto tecidual, e da função das estruturassupracelulares. A complexidade do controle da expressãoprogramada de conjuntos de genes do genoma, delineada emestudos pós-genômicos, torna essa tarefa particularmenteárdua.

Células

Os elementos celulares são o ingrediente fundamental paraas terapias celulares e a bioengenharia. O conceito de célulastronco ou células progenitoras foi claramente definido desdeo fim do século XIX, no contexto de regeneração tecidual.Organismos primitivos que possuem uma alta capacidade deregeneração serviram de modelos ricos para a compreensãodos processos morfogenéticos regenerativos (BEKKUM,2004). A presença de células pluripotentes, com amplacapacidade de reconstituição de novos tecidos foi claramentedefinida nesses modelos. No fim do século XX, o conceitoamplo de células tronco em animais superiores foi confirmado,e a sua aplicação em medicina regenerativa abriu novoscaminhos de terapias celulares (BIANCO, P.; ROBEY, P.G., 2001;PRENTICE, 2006).

As células tronco embrionárias foram inicialmente isoladase caracterizadas em roedores, estabelecidas in vitro eamplamente usadas em geração de linhagens de camundongosgeneticamente modificados. Em 1998 foram estabelecidasprimeiras linhagens de células tronco embrionárias humanas.Consideradas totipotentes (embora as células derivadas damassa central embrionária de blastocisto não possuam mais acapacidade de gerar trofoblasto e todas as estruturas extra-embrionárias como p.ex. a placenta), a possibilidade de gerartodos os tecidos de um organismo humano levantouesperança de terapias celulares ilimitadas. Amplosinvestimentos foram dedicados ao desenvolvimentotecnológico dessas terapias. Atualmente, seu uso em terapiade doenças genéticas é considerado promissor mesmo sendodistante, já que neste caso todas as células autólogas dopaciente são portadoras do defeito inscrito no genoma e, entreas células alogenéicas, as células tronco embrionárias são asmais promissoras. Em terapias de degeneração e trauma o seuuso está ainda limitado. Todos os modelos experimentaisatestam a dificuldade de controlar a grande capacidade deproliferação e diferenciação dessas células, e o aparecimentode teratocarcinomas foi relatado com a freqüênciaincompatível com seu uso amplo em terapias humanas. A faltade previsibilidade da sua evolução pós-terapéutica geraquestionamentos éticos para aplicações médicas (BISHOP,A.E.; BUTTERY, L.D.K.; POLAK, J.M., 2002; PERA, M.F.;TROUNSON, A.O., 2004; VOGEL, 2005).

As células tronco adultas (incluindo as células derivadasde fetos em formação e as coletadas de estruturas extra-embrionárias no momento do parto) são atualmente objeto deamplos estudos. Seu uso terapêutico se baseia em décadasde experiência clínica em dois cenários. O transplante de

alogenéico e autólogo de medula óssea em hemoterapia éfundamentalmente um transplante de células troncohematopoiéticas. Por outro lado, o uso amplo de transplantede osso e de tecido medular autólogos em ortopedia éfundamentalmente um uso de células tronco mesenquimaisda medula em reparo de lesões dos tecidos do esqueleto.Ambas as aplicações remetem à presença de pelo menos doistipos de células tronco na medula óssea adulta, que cooperamna manutenção da capacidade produtora e regenerativa dasmúltiplas linhagens celulares, essencialmente de origemmesodermal.

Além da sua permanência na medula óssea, as célulastronco medulares têm a capacidade de circular pelo organismo,no nível basal baixo e permanente. Em resposta às agressõese lesões agudas, as vias de sinalização sistêmica, comandadasessencialmente pelos eixos de quimiocina SDF1-CXCR e devárias citocinas, induzem a entrada de células tronco nacirculação. Elas identificam, pelo contato físico com asuperfície endotelial, os tecidos envolvidos com a respostainflamatória à agressão, migram dos vasos para o espaçotecidual e promovem o processo regenerativo (PALUMBO,R.; BIANCHI, M.E., 2004). Se a regeneração for eficiente, avolta à normalidade restitui o nível basal da circulação decélulas tronco medulares. Essa circulação já indica oenvolvimento da arvore vascular na eficiência de regeneraçãomediada pelas células tronco. Além de permitir a distribuiçãosistêmica de células tronco medulares, a arvore vascularpossui o seu próprio nicho perivascular que garante amanutenção permanente de células tronco mesenquimais(SILVA MEIRELLES, L.; CHAGASTELLES, P.C.; NARDI N.B.,2006).

As células tronco circulantes e as células troncoperivasculares são, portanto, presentes em todos os tecidosvascularizados. Esse fato chama os seguintes comentários.Múltiplos estudos detectaram em vários tecidos a presençade células tronco residentes, capazes de “transdiferenciação”em outros tipos celulares quando adequadamentemanipuladas. Em muitos senão em maioria dos casos trata-sede células tronco hematopoiéticas ou mesenquimaisassociadas à arvore vascular. As células mesenquimais podemser isoladas e expandidas, com uma facilidade particular nocaso de tecidos ricamente vascularizados e de estruturamaleável, como é o caso do tecido adiposo. Até que pontoessas células são equivalentes às células tronco mesenquimaisda medula óssea permanece ainda uma questão aberta, masevidências experimentais mostram que ambas podem seramplamente usadas em terapias celulares (BAPTISTA, 2007).

A circulação de células tronco é relevante durante odesenvolvimento embrionário, quando permite a redistribuiçãode células progenitoras ao longo da formação de órgãos.Notadamente, o sistema hematopoiético e suas células troncose deslocam da região aorta-gonada-mesonefron para o fígadofetal e placenta, alojando-se finalmente na medula óssea. Amigração é intensa no período do parto, no qual sãoredistribuídas as funções respiratória, digestiva e circulatória.

Page 54: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

44 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):42-46Radovan Borojevic

No parto, uma fração do sangue circulante fica retida naplacenta, e pode ser colhida pela punção do cordão umbilical.As células tronco obtidas dessa rica fonte podem serpurificadas e criopreservadas. A sua utilização em transplanteautólogo e alogenéico é factível, e essa fonte de células troncojovens representa um potencial terapêutico relevante (VEN,2007). Da mesma maneira, as células perivasculares podemser purificadas da placenta e da geléia de Wharton, a bainhaconjuntiva do próprio cordão umbilical, representando umafonte interessante de células tronco mesenquimais (CAN, A.;KARAHUSEYINOGLU, S., 2007).

Os tecidos epiteliais, tanto de origem ectodérmica quantoendodérmica, e os derivados desses folhetos embrionários,possuem sistemas próprios de células tronco. Elas mantêm asua renovação contínua, conseqüente ao desgaste dainterface com meios externos. Seu nicho é geralmenteassociado com a membrana basal da interface com tecidossubjacentes. Uma hierarquia complexa define uma populaçãocelular menor de replicação muito lenta, que representa areserva tecidual de progenitores com capacidade regenerativaalta, e que mostra a capacidade de gerar in vitro os holoclonesde longa e ampla capacidade proliferativa e diferenciativa.Distanciando-se dos nichos, as células tronco de transiçãoproliferam intensamente, geram a massa celular e perdem aamplitude de suas capacidades, gerando in vitro osmeroclones e teloclones (PELLEGRINI, 1999). Os nichos decélulas tronco-epiteliais são bem delimitados, providos de umamatriz extracelular informativa, e abrigam geralmente umnúmero muito pequeno de progenitores – não mais de quatrocélulas no caso dos nichos de epitélio intestinal adjacentesàs criptas de Lieberkühn (YEN, T.H.; WRIGHT, N.A., 2006).

A transição epitélio-mesenquimal ocorre regularmente nodesenvolvimento embrionário e em certas situaçõespatológicas. Ela é relevante na formação de vasos, gerandotodas as células ecto-mesenquimais derivadas da crista neuralde origem ectodérmica, incluindo células perivasculares emvários tecidos, assim como todas as células da vasculaturacoronariana, incluindo as células tronco associadas, derivadasdo proepicárdio de origem endodérmica (WESSELS, S.A.;PÉREZ-POMARES, J.M., 2004). As transições posteriores sãoa priori possíveis, tanto no sentido epitélio-mesenquimalquanto mesenquimo-epitelial. Esta última possibilidade érelevante para a potencial geração de células epiteliaisglandulares, cujas células tronco podem ser de difícil acesso,como é o caso das Ilhotas de Langerhans. A possibilidade deobter as células secretoras a partir de uma fonte rica e de fácilacesso, como as células tronco mesenquimais, estáestimulando numerosas pesquisas.

A utilização de células tronco adultas autólogas atualmenteultrapassou a utilização consagrada de transplante de medulaóssea. Estudos clínicos, desde a fase I até a fase III, já estãosendo realizados, em procedimentos de regeneração davascularização em patologias isquêmicas, reparo do tecidomúsculo-esqulético, conjuntivo, cutâneo, entre outros. Comojá indicado, uma grande parte destas terapias dirige-se aos

pacientes idosos, vítimas de processos degenerativosassociados à senectude ou às doenças degenerativas.Podemos questionar até que ponto as células tronco autólogasde um paciente idoso guardam a capacidade de regeneração,já que a erosão dos telómeros atinge todas as células e a lei deHayflick nos ensina que a capacidade proliferativa de célulasse esgota com tempo e com a ampliação de células cultivadasin vitro (HAYFLICK, 1998). Duas linhas de estudos recentespodem responder a essa questão. As telomerases que podemprevenir a erosão dos telomeros são ativas em célulasembrionárias, desativadas ao longo da diferenciação tecidual,mas podem ser reativadas, como ocorre em neoplasias cujascélulas são imortais. No transplante de medula óssea, o númerode células tronco transplantadas após uma mieloablação radicalé muito inferior ao normal. Para repor a cinética dahematopoiése e manté-la para o resto da vida, o organismopode transitoriamente reativar a telomerase em células troncohematopoiéticas normais, até atingir o numero e o estadoequivalente ao normal de células plenamente capacitadas parauma proliferação longa e intensa. A priori, o mesmo podeocorrer na participação de células tronco medulares nosprocessos de regeneração, na presença de uma demandaregenerativa intensa. Estudos atuais procuram estabelecerprotocolos de ativação temporária da telomerase em célulascultivadas in vitro, para ampliar esta capacidade natural decélulas tronco (KOBUNE, 2005; PETERSEN, T.; NIKLASON,L., 2007). Por outro lado, a característica de células troncoprogenitoras teciduais é a sua proliferação lenta in situ comuma erosão dos telomeros menor do que no resto dos tecidos.Ela gera assim a sua reserva ampla de células com altacapacidade de proliferação e diferenciação durante a ampliaçãoin vitro e in vivo, como mostrado em cultivo de holoclones.

Em conclusão, não devemos negligenciar a relevância dosestudos sobre as células tronco embrionárias. Entretanto, nomomento atual, o uso de células tronco adultas autólogasmostra a vantagem da ausência de problemas de rejeição doimplante, de segurança de uso e de previsibilidade de êxitoterapêutico. Protocolos experimentais, pré-clínicos e clínicosmostraram amplamente a exeqüibilidade das terapias usandoimplante de células autólogas, ausência de eventos adversos,e resultados clínicos muitas vezes surpreendentes eduradouros de reparo e regeneração de processosdegenerativos e lesões trumáticas (DOHMANN, 2007; MAO,2006).

Mediadores de Crescimento e de Diferenciação Celular

A homeostasia celular em tecidos é garantida pelo equilíbrioentre a proliferação, diferenciação e apoptose. Essesfenômenos são garantidos pela sinalização parácrina,autócrina ou mediada pelos contatos intercelulares. Emprocessos degenerativos, o saldo global de celularidade énegativo, resultando em perda de volume e de função tecidual.Correções da sinalização podem ser necessárias, assim comoa reposição exógena de uma reserva celular. Em trauma, a perda

Page 55: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

45Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):42-46 Terapias Celulares e Bioengenharia

física de tecidos gera uma sinalização de reparo intensa. Oaporte de células e de estruturas tridimensionais de reposiçãogeradas pela bioengenharia pode ser suficientementeestimulado na sua integração tecidual pelos mediadoresinternos. Entretanto, ela pode depender criticamente do tempo.A vascularização rápida dos implantes que deve prevenir anecrose, e a integração física e funcional do implante podemrequerer estímulos adicionais.

Um grupo de mediadores celulares humano está disponívelna forma recombinante, e eles podem ser usados comoadjuvante em terapias celulares. Os cuidados devem incluir asua difusão potencial pela circulação dos líquidos biológicos.Um dos exemplos são as proteínas morfogenéticas do osso(bone morphogenetic proteins – BMPs) cujo uso emestimulação da regeneração óssea é relevante. Essas proteínaspossuem in vivo uma estabilidade longa, e após a difusãopara a circulação sanguínea podem permanecer ativos durantesemanas. A conseqüência será a calcificação ectópica dosvasos com deterioração funcional grave. Em muitos casos, aassociação com as moléculas da matriz extracelular pode reteros fatores de crescimento em sítios previstos, evitando essetipo de problemas.

Uma das alternativas à administração de fatores decrescimento é a introdução das construções gênicas quecodificam a sua síntese in situ. No caso de construçõesplasmidiais (naked DNA), a degradação dos vetores livres érápida, eliminando o perigo da sua difusão sistêmica. Quandointegrados dentro de células, eles promovem a síntese localde proteínas sinalizadoras, podendo atingir concentraçõeslocais altas. Entretanto, a atividade sintética é curta (geralmenteatingindo o máximo em 24-48 h, e voltando aos níveis basaisem 7 dias). Esse fato permite um controle rígido da atividadeestimuladora no tempo, evitando crescimento celularexagerado e prolongado (CARVALHO, 2007). Os mesmosvetores podem ser encaminhados aos alvos teciduaisespecíficos através das nanoparticulas seletivamente dirigidaspara os ligantes teciduais, tornando o método extremamenteespecífico e operacional (KOFRON, M.D.; LI, X.; LAURENCIN,C.T., 2004).

Biomateriais

Os biomateriais são usados em engenharia tecidual, emassociação ou não com as células. Quando implantados devemguiar e sustentar os processos regenerativos. A bioengenhariavisa produzir estruturas capazes de substituírem tecidos ouórgãos que perderam a sua estrutura e/ou função. Os materiaisusados neste processo devem providenciar uma estrutura quegarantirá a função e a integração do implante no organismoreceptor, a sua interação com as células do leito tecidual e,idealmente, a sua substituição progressiva pelo tecidoendógeno neoformado.

Nos tecidos de sustentação, as propriedades mecânicasdos biomateriais são fundamentais, e os materiais nãocelularizados como implantes metálicos são aceitáveis. Os

materiais cuja interface com tecidos vivos será mais próxima ànatural, como as biocerâmicas, terão preferência, pois podeminduzir a neoformação do osso ou dentina e a integração plenaem estruturas endógenas. A velocidade da sua integraçãopode ser controlada pelas propriedades químicas e pelaqualidade nano-estrutural da sua superfície que determina asua interação com as células. Os biomaterias ideais devem serosteocondutores e osteoindutores. A primeira propriedadepermite a interação com osteoblastos e células envolvidas naintegração do implante, como os vasos sanguíneos. A segundainduz a ativação da osteogênese, com a neoformação do tecidoósseo (DERUBEIS, A.R.; CANCEDDA, R., 2004).

Nos tecidos moles (conjuntivo) e contráteis (músculos),os biomateriais devem garantir e promover a ordem espacialda regeneração celular, e a sua função será necessariamentetemporária. De mesmo, a reconstrução dos vasos ou deestruturas dos sistemas respiratório, digestório, genito-urinário, secretor e cutâneo deve garantir a separação físicado meio interno estruturado dos meios líquidos ou gasosos.A continuidade física da cobertura superficial garantida pelobiomaterial deve ser associada com a seletividade dapermeabilidade molecular dessas interfaces biológicas, para aqual a presença da camada celular reconstituída dentro de umtempo operacional é absolutamente necessária.

Nos sistemas de função complexa, como o nervoso,sensorial e cognitivo, a função essencial dos biomateriais é aproteção do espaço e a facilitação da regeneração celular, jáque as suas funções são essencialmente dependentes dasinterações celulares (YARLAGADDA, P.K.;CHANDRASEKHARAN, M.; SHYAN, J.Y., 2005).

Os biomaterias podem ser de dois tipos:- Materiais de sustentação ou preenchimento não

integráveis nos tecidos vivos: implantes metálicos,plásticos não-degradáveis, derivados de silicone esimilares para cirurgia plástica.

- Materiais integráveis mineralizados: biocerâmicas,materiais ósteo-miméticos. Materiais integráveis molese elásticos: polímeros de carbohidratos, proteínasestruturais, biomateriais condro-miméticos.

A eficiência de ambos os tipos depende do estabelecimentodas interações célula-célula e célula-matriz que ocorrem emescala nanométrica. As nano-estrutras são informativas edeterminam o comportamento celular. Os biomateriais usadosem bioengenharia devem, portanto, possuir a nano-estruturabiomimética ou indutora da resposta célula desejada. Oconhecimento e desenvolvimento de materiais nano-estruturados é atualmente o grande desafio da biotecnologiaaplicada à medicina. Como as interações entre as células e ossubstratos ocorrem na escala nanométrica, o conhecimento ea capacidade de manipular os biomateriais nessa escala podempermitir a melhoria ou o desenvolvimento de novas propostas(VENUGOPAL, J.; RAMAKRISHNA, S., 2005). Uma dasdificuldades é o parco conhecimento que temos da nano-toxicologia e dos efeitos potencialmente adversos dosbiomateriais nano-estruturados (CURTIS, 2006). Uma das

Page 56: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

46 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):42-46Radovan Borojevic

possibilidades é o estudo e profundo conhecimento dematrizes nanoestruturadas biógenas, obtidas de tecidos vivos,que podem servir de exemplo para aperfeiçoar os biomateriaissintéticos com propriedades biomiméticas.

Em conclusão, as terapias celulares, a bioengenharia e aciência de biomateriais são novas áreas, repletas de promessase de desafios. Pelo caráter multidisciplinar do desafio, somentea cooperação entre as ciências biológicas básicas, ciênciasexatas e clínica médica poderão trazer propostas que servirãopara melhorar a qualidade de vida e adequar o custo social damedicina às realidades do novo milênio.

Referências

1. BAPTISTA, L.S. et al . Bone marrow and adiposetissue-derived mesenchymal stem cells: how close are they? J StemCells, 2: 73-90, 2007.2. BEKKUM, D.W. Phylogenetic aspects of tissue regeneration: role ofstem cells. A concise overview. Blood Cells Mol Dis, 32: 11-16, 2004.3. BIANCO, P.; ROBEY, P.G. Stem cells in tissue engineering. Nature,414: 118-121, 2001.4. BISHOP, A.E.; BUTTERY, L.D.K.; POLAK, J.M. Embryonic stemcells. J Pathol, 197: 424-429, 2002.5. CAN, A.; KARAHUSEYINOGLU, S. Concise review: human umbilicalcord stroma with regard to the source of fetus-derived stem cells. StemCells, 25: 2886-2895, 2007.6. CARVALHO, L.P. et al. Hydrodynamics- and ultrasound-basedtransfection of heart with naked plasmid DNA. Hum Gene Ther, 2007Nov 20; [Epub ahead of print].7. CURTIS, J. et al. Nanotechnology and nanotoxicology: a primer forclinicians. Toxicol Rev, 25: 245-60, 2006.8. DERUBEIS, A.R.; CANCEDDA, R. Bone marrow stromal cells(BMSCs) in bone engineering: limitations and recent advances. AnnBiomed Eng, 32: 160-165, 2004.9. DOHMANN, H.F. et al. Bone-marrow mononuclear cell therapy ofsevere ischemic heart failure. C R Biol, 330: 543-549, 2007.10. HAYFLICK, L. How and why we age. Exp Gerontol, 33:639-653,1998.

11. KOBUNE, M. et al. Telomerized human bone marrow-derived cellclones maintain the phenotype of hematopoietic-supportingosteoblastic and myofibroblastic stromal cells after long-term culture.Exp Hematol, 33: 1544-1553, 2005.12. KOFRON, M.D.; LI, X.; LAURENCIN, C.T. Protein- and gene-based tissue engineering in bone repair. Curr Opin Biotechnol, 15: 399-405, 2004.13. MAO, J.J. et al. Craniofacial tissue engineering by stem cells. J DentRes, 85: 966-79, 2006.14. PALUMBO, R.; BIANCHI, M.E. High mobility group box 1 protein,a cue for stem cell recruitment. Biochem Pharmacol, 68: 1165-1170,2004.15. PELLEGRINI, G. et al. The control of epidermal stem cells(holoclones) in the treatment of massive full-thickness burns withautologous keratinocytes cultured on fibrin. Transplantation, 68: 868-79, 1999.16. PERA, M.F.; TROUNSON, A.O. Human embryonic stem cells:prospects for development. Development, 131: 5515-5525, 2004.17. PETERSEN, T.; NIKLASON, L. Cellular lifespan and regenerativemedicine. Biomaterials, 28: 3751-3756, 2007.18. PRENTICE, D.A. Current science of regenerative medicine withstem cells. J Invest Med, 54: 33-37, 2006.19. SILVA MEIRELLES, L.; CHAGASTELLES, P.C.; NARDI, N.B.Mesenchymal stem cells reside in virtually all post-natal organs andtissues. J Cell Sci, 119: 2204-13, 2006.20. VEN, C. et al. The potential of umbilical cord blood multipotentstem cells for nonhematopoietic tissue and cell regeneration. ExpHematol, 35: 1753-1765, 2007.21. VENUGOPAL, J.; RAMAKRISHNA, S. Applications of polymernanofibers in biomedicine and biotechnology. Appl Biochem Biotechnol,125: 147-58, 2005.22. VOGEL, G. Ready or not. Human ES cells head toward the clinic.Science, 308: 1534-1538. 2005.23. WESSELS, S.A.; PÉREZ-POMARES, J.M. The epicardium andepicardially derived cells (EPDCs) as cardiac stem cells. Anat Rec,276A: 43-57, 2004.24. YARLAGADDA, P.K.; CHANDRASEKHARAN, M.; SHYAN, J.Y.Recent advances and current developments in tissue scaffolding. BiomedMater Eng, 15: 159-177, 2005.25. YEN, T.H.; WRIGHT, N.A. The gastrointestinal tract stem cellniche. Stem Cell Rev, 2: 203-312, 2006.

Page 57: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

47

Biomarcadores em MedicinaBiomarcadores em MedicinaBiomarcadores em MedicinaBiomarcadores em MedicinaBiomarcadores em Medicina

Biomarkers in Medicine

Albert Schriefer1,2 & Edgar M. Carvalho1,3

Serviço de Imunologia do Hospital Universitário Professor Edgard Santos, Faculdade de Medicina da Universidade Federal daBahia1, Instituto de Ciências de Saúde da Universidade Federal da Bahia2, Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública3;

Salvador, BA, Brasil

Os biomarcadores podem ser definidos como variáveis genéticas, imunológicas e bioquímicas que se relacionamcom expressão de doença. Nas doenças inflamatórias crônicas e nas doenças neoplásicas estes marcadores serelacionam com atividade ou remissão do processo patológico, contribuindo de modo importante como guia detratamento. Nos processos infecciosos, como a expressão da doença varia de formas assintomáticas, oligossintomáticasà doença clássica, estes marcadores têm um papel importante como valor preditivo de evolução clínica. Do ponto devista genético é amplamente conhecida a associação de doença com antígenos do sistema HLA e mais recentementea expressão clínica de doenças tem sido associada com polimorfismos de genes. Entretanto poucos genes tem sidodiretamente implicados com o desenvolvimento de uma determinada patologia. Na presente revisão ênfase é dada amarcadores biológicos utilizados no acompanhamento de doenças reumáticas sistêmicas e de marcadores biológicosassociados com formas clínicas de doenças infecciosas como a doença de Chagas, infecção pelo HTLV-1 e leishmanioses.Palavras-chave: biomarcadores, sistema HLA, HTLV, doença de Chagas, leishmanioses.

Biomarkers can be defined by genetic immunologic or biochemical variables associated with disease expression. In chronicinflammatory diseases and in patients with cancer theses markers can be associated with remission or activity of the diseaseand play a pivotal role in the decision about the type of therapy to be used. Disease expression is quite variable in infectiousdiseases, as infected individuals can be completely asymptomatic have in oligosymptomatic for of the infection or have fullblown disease. In such case these markers may have predictive value regarding disease expression. For many years it isknown that there is an association between HLA antigens and diseases but very few genes or their products have beencorrelated with pathology. In the present review emphasis is given to biomarkers that are used to monitor remission oractivity of chronic inflammatory diseases and biomarkers associated with disease expression in infections diseases suchHTLV-1 infection, Chagas diseases and leishmaniasis.Key words: Biomarkers, HLA antigens, Chagas diseases, leishmaniasis.

O melhor conhecimento da fisiopatologia tem permitido aidentificação de marcadores genéticos, bioquímicos eimunológicos que contribuem não só com o diagnóstico dasdoenças, mas também com a atividade e remissão dos processospatológicos. Marcadores bioquímicos e imunológicos têmmostrado forte associação com câncer de próstata, câncer deintestino, câncer de fígado e de mama e têm sido amplamenteutilizados como método auxiliar no diagnóstico das doençasauto-imunes e doenças inflamatórias crônicas. Marcadoresgenéticos têm sido associados com várias doenças e espera-separa o século XXI um grande avanço no conhecimento sobre opapel de genes no desenvolvimento de doenças inflamatórias,neoplásicas e doenças infecciosas.

O desenvolvimento de doença depende de um conjuntode fatores extrínsecos envolvendo aspectos ambientais,infecções, hábitos de vida e fatores intrínsecos reguladosprincipalmente por genes. Somente no fim do século XX

evidências passaram a serem acumuladas de que nadependência destes fatores, havia uma grande diversidadena expressão clínica de uma mesma doença. Estes aspectostem sido melhor estudados nas doenças infecciosas, doençasauto-imunes, doenças inflamatórias crônicas e neoplasias.Obviamente que outros fatores principalmente relacionadoscom novas formas de terapia, tem influenciado a expressãoclínica e o curso das enfermidades mas, nesta revisão, ênfaseé dada a como as características próprias dos indivíduosinterferem no desenvolvimento das doenças, e principalmente,a identificação de marcadores biológicos que se associamcom expressão da doença e com resposta terapêutica. Estesmarcadores quando acoplados a história clínica e exame físicodo paciente são de grande valor para determinação doprognóstico, da gravidade da enfermidade e podem auxiliar aescolha terapêutica. A Tabela 1 mostra alguns marcadoresbiológicos e a significância destas variáveis.

Entretanto estes marcadores têm muito pouco valorquando analisados de forma dissociada da doença. Porexemplo, enquanto mais de 90% dos pacientes com síndromede Reiter ou com espondilite ancilosante tem HLA-B27positivo, quando este marcador é avaliado na população,documenta-se que a maioria dos indivíduos que tem HLA-B27, nunca desenvolverão síndrome de Reiter ou espondilite

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr.Edgard M. Carvalho. Serviço deImunologia, Hosp. Univers. Prof. Edgard Santos, UFBA. Rua João dasBotas, s/n. 40110-160. Salvador, BA, Brasil.

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):47-51.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Page 58: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

48 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):47-51Albert Schriefer & Edgar M. Carvalho

ancilosante. Esta tem sido a tônica da associação de doençascom antígenos do sistema HLA, como acontece com a artritereumatóide, diabetes melitus, febre reumática e doença celíaca.Como até o momento não existe forma de prevenir oaparecimento destas doenças em indivíduos geneticamentesusceptíveis, a identificação de marcadores pode até funcionarcomo um fator de constrangimento, desde que a presençadestes marcadores não significa que o indivíduo desenvolveráa doença. Neste contexto os biomarcadores não devem serutilizados isoladamente no diagnóstico de enfermidades, esim, na monitorização clínica e terapêutica de pacientes e namonitorização clínica de indivíduos sadios que tem granderisco de desenvolvimento de uma determinada patologia.

Biomarcadores em Reumatologia

A Reumatologia é uma das áreas da medicina em que osbiomarcadores têm um importante papel. As doençasreumáticas sistêmicas principalmente as doenças auto-imunestem um espectro clínico amplo e evolução clínica heterogênea.Até a segunda metade do século 20 o diagnóstico destasdoenças era feito com base em critérios clínicos e de examescomplementares, que hoje são reconhecidos como presentesem formas graves ou estágios avançados destas doenças.São exemplos clássicos desta situação o lúpus eritematososistêmico (LES) e a artrite reumatóide. Em passado recente oLES era diagnosticado predominantemente quando o pacienteapresentava uma lesão clássica em asa de borboleta em regiãopara nasal, artrite e a presença das células LE no sangue porum método com baixa sensibilidade. Em muitos casos odiagnóstico do LES era feito já na vigência de doença renal.Por estas razões o LES era considerado invariavelmente umadoença grave com sobrevida de apenas 52% após 4 anos dedoença (HARVEY, A.M.; SHULMAN, L.E.; TUMULTY, P.A.,1954). Hoje, principalmente devido à ajuda de biomarcadorescomo a identificação do anticorpo anti núcleo, anticorpos antiDNA e o anticorpo anti SSA é possível o reconhecimento deformas mais leves da doença. Este aspecto associado aoadvento de novas formas de tratamento mudouconsideravelmente a história natural da doença e hoje 90%dos pacientes com LES tem sobrevida superior a 20 anos,dados estes que contrastam com as observações feitas entre

as décadas de 1950 a 1990 (HARVEY, A.M.; SHULMAN, L.E.;TUMULTY, P.A., 1954; WARD, M.M.; PYERR, E.; STUDENS,K.S., 1995). Por outro lado, a presença de anticorpos anti DNAe a queda nos níveis séricos do complemento, principalmenteníveis de C3 e C4, foram identificados como indicadores deatividade da doença (HARDIN, 1986; SHOENFELD, Y.;ISEMBERG, D.A. 1987). Desta forma alterações nestesparâmetros em indivíduos em fase de remissão da doença,indicam a necessidade de um acompanhamento emonitorização mais freqüente e re-introdução precoce decorticosteróides e drogas imuno moduladoras.

Uma outra entidade em que os marcadores biológicos temtido uma participação importante é na artrite reumatóide, doençaque no passado o diagnóstico dependia de achadosradiológicos. Como as alterações radiológicas caracterizadasprincipalmente por erosões ósseas representam um estágioavançado da doença, esta confirmação diagnóstica tardia,terminava por retardar o tratamento e conseqüentementeinterferir no prognóstico da artrite reumatóide. A identificaçãodo fator reumatóide, e mais recentemente a documentaçãodos anticorpos citrulinados têm se constituídos marcadoresbiológicos que permitem a utilização precoce de formas maisagressivas de tratamento da doença (LEE, R.M.; SCHUR, P.H.,2003; MEYER, 2003; BRIDGES, JR., S.L.; DAVIDSON, P.E.,2005; LINDGVIST, 2007). Isto porque participam do tratamentoda artrite reumatóide um número grande de drogas: 1) osantiinflamatórios não hormonais; 2) antiinflamatórioshormonais; 3) drogas modificadoras da artrite reumatóiderepresentadas por vários medicamentos incluindo cloroquina,metotrexato, azatioprina e leflunomida entre outros e 4) osagentes biológicos representados principalmente pelosagentes inibidores do fator de necrose tumoral alfa (TNF-α) eo anticorpo contra o antígeno CD20 expresso em células B.Neste contexto, a documentação de que a presença deanticorpos anti citrulina (LEE, R.M.; SCHUR, P.H., 2003;MEYER, 2003) e títulos elevados de fator reumatóide(BRIDGES, JR., S.L.; DAVIDSON, P.E., 2005) se associam comgravidade da doença, tem feito com que a documentaçãodestes biomarcadores, associados a apresentação clínica,permita a utilização cada vez mais precoce de drogas commaior potencial de controlar a doença como o methotrexato, aleflunomida e os agentes biológicos (LINDGVIST, 2007).

Tabela 1. Biomarcadores associados a doenças auto-imunes e doenças neoplásicas.

Biomarcador Significado

Anticorpo anti DNA Diagnóstico e atividade do LESAnticorpo anti SSA e anti SSB Síndrome de S. jogrenAnticorpo de anti citrulina Pior prognóstico da Artrite ReumatóideAntígeno prostático solúvel Câncer de próstataα feto proteína Câncer de fígadoAntígeno carcino embrionário (CEA) Câncer de cólonCA 15.3 Câncer de mamaCA 125 Câncer de ovário

Page 59: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

49Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):47-51 Biomarcadores em Medicina

Biomarcadores em Doenças Infecciosas

O avanço no conhecimento sobre o binômio, infecção-doença, tem mudado o conceito das doenças infecciosas e osmarcadores biológicos tem tido um importante papel nestaárea. Algumas doenças infecciosas como as leishmanioses,doença de Chagas, hepatite viral e a síndrome deimunodeficiência adquirida foram descritas no século XX e aexpressão clínica destas infecções é extremamente variável.Inicialmente a documentação de infecção por métodosindiretos como a presença de anticorpos contra antígenosdos agentes infectantes, permitiu o entendimento de que namaioria das doenças infecciosas o número de infectados ébem maior do que o número de doentes. Estima-se, porexemplo, que na infecção pelo Tripanossoma cruzi 70% dosindivíduos são assintomáticos e somente cerca de 30%desenvolvem a forma clássica da doença de Chagas (ANDRADE, 1999). Hoje, se sabe que estes indivíduosassintomáticos denominados como portadores da formaindeterminada da doença podem ou não desenvolver doençacardíaca. Adicionalmente, entre os doentes, existem aquelesque se caracterizam predominantemente por apresentararritmia, enquanto outros desenvolvem uma insuficiênciacardíaca grave. Também tem sido observado que enquantono passado a doença de Chagas era muito observada entre osjovens, hoje uma grande parcela dos pacientes commiocardiopatia chagásica são diagnosticados após os 40 anosde vida. Vários estudos têm sido conduzidos no sentido deentender a imunopatogênese da doença de Chagas e hoje sesabe que a agressão ao músculo cardíaco é mediadaprincipalmente pela resposta imune do hospedeiro (DRIGO,2006; CUNHA-NETO, 2005; MACHADO, 2005). Umadeficiência nos mecanismos regulatórios da resposta imuneleva a uma intensa resposta inflamatória e conseqüentementedano tecidual. Com a finalidade de evitar que a respostaimunológica cause dano tecidual vários mecanismosregulatórios atuam no sentido de modular a respostaimunológica. Tem papel importante nesta modulação as célulasregulatórias e as citocinas. Dentre estas, a interleucina 10 (IL-10) tem um importante efeito modulador da resposta imunehumana. Em contraste o TNF-α é uma citocina pró-inflamatóriae relacionada com dano tecidual na infecção pelo T. cruzi(CUNHA-NETO, 2005; MACHADO, 2005). Indivíduos com aforma indeterminada da doença de Chagas produzemsignificativamente mais IL-10 e menos TNF-α do que pacientescom miocardiopatia chagásica (SOUZA, 2007).

O vírus linfotrópico das células T humanas (HTLV-1) foiidentificado em 1980 e é o causador da leucemia de células Tdo adulto (ATLL) e da mielopatia associada ao HTLV-1 ouparaparesia espástica tropical (HAM/TSP). O HTLV-1 é umretrovírus que infecta predominantemente os linfócitos T eum dos genes do vírus, o TAX, tem a propriedade de transativarnas células humanas vários genes relacionados com ativaçãocelular e secreção de citocinas (HOLLSBERG, 1999; MARINER,2001). Assim os linfócitos T de indivíduos infectados pelo

HTLV-1 acham-se ativados, e em indivíduos infectados poreste vírus, há uma produção elevada de citocinas como ofator de necrose tumoral (TNF-α), interleucina 2 (IL-2),interferon gama (IFN-γ), interleucina 15 (IL-15) por célulasmononucleares do sangue periférico cultivadas in vitro semqualquer estímulo (HOLLSBERG, 1999; CARVALHO, 2001).Do ponto de vista imunológico, pacientes que apresentamHAM/TSP produzem mais IFN-γ e TNF-α e tem maior cargapró-viral, do que indivíduos portadores da infecção pelo HTLV-1 (NAGAI, 2001; SANTOS, 2004). Adicionalmente, enquantonos portadores de HTLV-1 a principal fonte de IFN-γ são ascélulas T CD4+, nos pacientes com HAM/TSP a principal fontedesta citocina são as células T CD8+ (SANTOS, 2004).

O HTLV-1 tem sido considerado um vírus de baixamorbidade, desde que ATLL e HAM/TSP só ocorrem emmenos de 5% dos indivíduos infectados (EDLICH, R.;ARNETTE, J.; WILLIAMS, F., 2000). Todavia anormalidadesimunológicas semelhantes às documentadas em pacientes comHAM/TSP, têm sido observadas em cerca de 45% dosportadores de HTLV-1 (CARVALHO, 2001). Como as alteraçõesimunológicas têm uma relação estreita com a patogênese dadoença, estudos têm sido realizados no sentido de compararmanifestações clínicas e neurológicas a em indivíduosinfectados pelo HTLV-1 com e sem alterações de respostaimune e em controles soro-negativos para o HTLV-1. Estesestudos têm mostrado que quando comparados comindivíduos soro-negativos para o vírus, indivíduos infectadospelo HTLV-1 apresentam mais parastesias em membrosinferiores, maior freqüência de fraqueza muscular e maismanifestações urinárias, como noctúria, urgência miccional eincontinência urinária (CASKEY, 2007; CASTRO, 2007). Temsido documentado que uma grande percentagem de indivíduosinfectados pelo HTLV-1 e com queixas urinárias tem um quadrode bexiga neurogênica documentada através de estudosurodinâmicos. Estes indivíduos com bexiga neurogênicaassociada ao HTLV-1 embora não preencham os critérios paraHAM/TSP apresentam níveis elevados de IFN-γ, TNF-α e decarga pró-viral semelhantes aos observados a pacientes comHAM/TSP. A documentação de que produção elevada de IFN-γ, TNF-α e carga pró-viral são biomarcadores de doençaneurológica é também bem caracterizada em crianças infectadaspelo HTLV-1, que tem uma doença denominada dermatiteinfectiva. A resposta imune na dermatite infectiva se caracterizapor uma grande produção de TNF-α e de IFN-γ e, nestascrianças, detecta-se uma elevada carga pró-viral. Estudosrecentes mostram que diferente da maioria dos pacientes comHTLV-1 que desenvolvem HAM/TSP somente após a 5ªdécada, crianças com dermatite infectiva desenvolvemprecocemente, ainda na adolescência HAM/TSP. Estes dadosindicam que portadores de HTLV-1 que apresentam níveiselevados de IFN-γ, TNF-α e da carga pró-viral têm riscoelevado para desenvolver HAM/TSP.

As leishmanioses constituem um espectro de doenças queocorrem, sobretudo em regiões tropicais e subtropicais doglobo. Várias espécies de leishmania tem sido implicadas como

Page 60: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

50 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):47-51Albert Schriefer & Edgar M. Carvalho

causadoras da doença no homem e fatores relacionados como parasita e com o hospedeiro relacionam-se com a diversidadede expressão clínica após a infecção. A Leishmania chagasi éa causadora da leishmaniose visceral no Novo Mundo, mas85% dos indivíduos infectados não desenvolvem doença(BADARÓ, 1986). A capacidade de células mononucleares deproduzir IFN-γ após estímulo com antígeno de leishmania emcrianças recém infectadas com L. chagasi é um biomarcadorimportante do controle da infecção, enquanto a ausência deprodução de IFN-γ está fortemente relacionada com odesenvolvimento da doença (CARVALHO, 1992). Aleishmaniose visceral pode ter evolução fatal e os exameslaboratoriais assim como a pesquisa de parasita não sãométodos fidedignos de resposta terapêutica. Váriosmarcadores solúveis tem sido associados com respostaterapêutica como a queda nos níveis do receptor solúvel dainterleucina 2 (IL-2R) e da molécula de adesão intercelular(ICAM-1) solúvel. Em contrapartida nos pacientes que nãorespondem a terapia antimonial as concentrações séricas doIL-2R solúvel e da ICAM-1 solúvel permanecem elevados(SCHRIEFER, 1995).

Com relação ao parasito a forte associação entre espéciede leishmania e forma de doença sugere um papel proeminentedo conteúdo genético do parasito sobre os desfechos clínicose prognósticos das infecções. A Leishmania braziliensis umdos agentes causadores da leishmaniose tegumentaramericana (LTA) apresenta um elevado grau de polimorfismogenético e fenotípico (KAHL, 1991; GOMES, 1995;CUPOLILLO, 2003; OLIVEIRA, 2004), o qual é acompanhadopor um espectro de apresentações clínicas no hospedeirohumano, incluindo: leishmaniose cutânea localizada (LC),leishmaniose mucosa (LM) e leishmaniose disseminada (LD).A LM é uma forma grave da doença que ocorre no curso ouapós a cura da LC ou da LD. O desenvolvimento debiomarcadores de cepas parasitárias com capacidade preditivasobre a evolução para LM seria de grande valor no manejoclínico dos casos de LTA pela L. braziliensis.

Estudos experimentais têm mostrado que L. braziliensisisoladas de pacientes com diferentes formas de doençaapresentam comportamentos biológicos distintos em modelosanimais (KAHL, 1991; OLIVEIRA, 2004), reforçando oraciocínio acima sobre a relação entre carga genética da cepaparasitária e evolução clínica do paciente.

Mais recentemente estudo de epidemiologia molecularrevelou que a população de L. braziliensis de uma área hiper-endêmica para LTA localizada no sudeste do estado da Bahia,chamada Corte de Pedra, é multiclonal estando as diferentesformas de LTA estatisticamente associadas a clonesespecíficos naquela população (SCHRIEFER, 2004). Para testara hipótese de que o polimorfismo parasitário estaria envolvidono espectro de doenças causadas pela L. braziliensis, ecaracterizar acuradamente a estrutura populacional dessesparasitos naquela área endêmica, 45 amostras de L. braziliensisisoladas de pacientes com LC, LM ou LD entre 1991 e 2001foram genotipadas por RAPD (Randomly amplified

polymorphic DNA – DNA polimórfico randomicamenteamplificado) e comparadas. O dendrograma de similaridadegerado a partir da comparação dos perfis eletroforéticos dosRAPDs obtidos para cada isolado revelou a existência denove unidades discretas de tipagem agrupadas em cincosubpopulações ou clados. Mais importante, todas as formasde LTA apresentaram uma diferença estatisticamentesignificante em suas frequências entre os clados, indicandoque infecções com os diferentes genótipos de L.braziliensis são provavelmente acompanhadas pormanifestações clínicas específicas naquela área endêmica(SCHRIEFER, 2004).

O modo clonal de reprodução e a associação de genótiposde L. braziliensis com formas de LTA propiciam que cepasassociadas a desfechos clínicos de leishmaniose possam serdistinguidas com base em marcadores moleculares bemdefinidos. Esses biomarcadores poderiam ser explorados nodesenvolvimento de ferramentas diagnósticas com valorprognóstico para o melhor manejo de casos humanos. Estahipótese leva em conta que a reprodução clonal tenderia asegregar grandes quantidades de mutações clinicamenteirrelevantes (e.g. indels ou mutações de ponto), juntamentecom aqueles tratos genéticos realmente importantes para odesenvolvimento dos diversos desfechos da LTA, as quaispoderiam ser detectadas por procedimentos diagnósticosaltamente sensíveis e específicos como a reação em cadeiapela DNA polimerase (PCR).

Associação entre cepas e forma clínica da doença temtambém sido documentada na infecção causada pelaLeishmania donovani. Os melhores exemplos de estudosnesse sentido referem-se à distinção de cepas de L. donovanicom maior propensão a causar leishmaniose dérmica póscalazar (PKDL, post-kalazar dermal leishmaniasis) empacientes com leishmaniose visceral (LV). Num dessesestudos Das Gupta et al. (1991) clonaram um minicírculo doDNA mitocondrial do parasito, que usado como sonda écapaz de hibridizar apenas a parasitos isolados de casos dePKDL, mas não de LV por L. donovani. No outro estudo,Sreenivas et al. (2004) reportaram um ensaio de detecção deum polimorfismo localizado no gene codificante para asubunidade 28S do RNA ribossomal capaz de diferenciarcepas de L. donovani causadoras de PKDL daquelascausadoras de VL. Todos esses esforços acima deverão seintensificar e se mostrar ainda mais bem sucedidos nospróximos anos como conseqüência natural da divulgaçãodas seqüências completas dos genomas das diferentesespécies de leishmania, dentre elas as já disponíveis on-linepara a L. major, L. infantum e L. braziliensis (SangerInstitute).

Referências

1. ANDRADE, Z.A. Immunopathology of Chagas disease. Mem InstOswaldo Cruz, 94:71-80, 1999.2. BADARÓ, R. et al., New perspective in a sub-clinical form of visceralleishmaniasis. J Infect Dis, 154:1003-1011, 1986.

Page 61: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

51Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):47-51 Biomarcadores em Medicina

3. BRIDGES, Jr., S.L. et al. Rheumatoid factor. In Koopman, W.J.;Moreland, L.W. (ed). Arthritis and applied conditions 1 ed. Philadel-phia, Lippincott, Williams & Wilkins, p:1227-47, 2005.4. CARVALHO, E.M. et al. Cytokine profile and immunomodulationin asymptomatic human T lymphotropic vírus type 1 infected blooddonnors. J Require Immuno Defic Syndr, 27:1-6, 2001.5. ______. Immunologic markers of clinical evolution in childrenrecently infected with Leishmania donovani chagasi. J Infect Dis,165:535-40, 1992.6. CASKEY, M.F. et al. Clinical manifestations associated with HTLV-1 type I infection: A cross sectional study. AIDS Res Human retroviruses,23:365-371, 2007.7. CASTRO, N.M. et al., Urinary symptoms associated with Human T celllymphotropic vírus type I infection: Evidence of urinary manifestationsin large group of HTLV-1 carriers. J Urololy, 69:813-818, 2007.8. CUNHA-NETO, E. et al., Cardiac gene expression profiling providesevidence for citokinopathy as a molecular mechanism in Chagas diseasecardiomyopathy. Am J Pathol, 167:305-313, 2005.9. CUPOLILLO, E. et al ., Genetic polymorphism and molecularepidemiology of Leishmania (Viannia) braziliensis from different hostsand geographic areas in Brazil. J Clin Microbiol, 41: 3126-3132, 2003.10. DAS GUPTA, S.; GHOSH D.K.; MAJUMDER, H.K. A cloned kineto-plast DNA mini-circle fragment from a Leishmania spp. specific for post-kala-azar dermal leishmaniasis strains. Parasitology, 102:187-191, 1991.11. DRIGO, S.Z. et al. TNF-α gene polymorphism are associated withreduced survival in several Chagas disease cardiomiopathy patients.Microbes and Infect, 193:1394-1399, 2006.12. EDLICH, R.; ARNETTE, J.; WILLIAMS, F. Global epidemic ofhuman T cell lymphotropic virus type I (HTLV-1). J Emerg Med,18:109-111, 2000.13. GOMES, R.F. et al. Leishmania (Viannia) braziliensis: geneticrelationships between strains isolated from different areas of Brazil asrevealed by DNA fingerprinting and RAPD. Exp Parasitol, 80: 681-687, 1995.14. HARDIN, J.A. The lupus auto antigens and the pathogenesis ofSLE. Arthrites Rheum, 29:457-462, 1986.15. HARVEY, A.M.; SHULMAN, L.E.; TUMULTY, P.A. Systemiclupus erythematosus: Review of the literature and clinical analysis of138 cases. Medicine, 33:291-295, 1954.16. HOLLSBERG, P. Mechanism of T cell activation by human T celllymphotropic virus type I. Microbial Mol Biol Rev, 63:308-333, 1999.17. KAHL, L.P. et al. Leishmania (Viannia) braziliensis: comparativepathology of golden hamsters infected with isolates from cutaneousand mucosal lesions of patients residing in Tres Bracos, Bahia, Brazil.Am J Trop Med Hyg, 44: 218-232, 1991.

18. LEE, R.M.; SCHUR, P.H. Clinical utility of anti CCP assay inpatients with rheumatic diseases. ANN RHEUM DIS, 62:870-4,2003.19. LINDGVIST, E. et al. Prognostic laboratory markers of jointdamage in rheumathoid arthritis. Ann Rheum Dis, 64:196-201,2007.20. MACHADO, F.S. et al., CCR5 plays a critical role in the developmentof miocarditis and host protection in mice infected with trypanossomaCruzi. J Infect Dis, 191:627-636, 2005.21. MARINER, J.M. et al., Human T cell lymphotropic virus type ITax activates IL-15R alpha gene expression through an NF-Kappa Bsite. J Immunol, 166:2602-2609, 2001.22. MEYER, O. et al. Anticitrullinated protein/peptide antibody assaysin early rheumatoid arthritis for predictive five years radio-graphicdamage. Annals of Rheum Dis, 62:120-6, 2003.23. NAGAI, M. et al. Increased HTLV-1 pro viral load and preferentialexpression of HTLV-1 Tax specific CD8+ T cells in cerebrospinal fluidfrom patients with HAM/TSP. Ann Neurol, 50:807-812, 2001.24. OLIVEIRA, C.I. et al. Leishmania braziliensis isolates differing atthe genome level display distinctive features in BALB/c mice. Microbesand Infection 6:977-984, 2004.25. Santos, S.B. et al. Exacerbated inflammatory cellular immuneresponse characteristics of HAM/TSP is observed in a large proportionof HTLV-1 asymptomatic carriers. BMC Infectious Diseases, 4:1-4,2004.26. Schriefer, A. et al. Multiclonal Leishmania braziliensis PopulationStructure and Its Clinical Implication in a Region of Endemic AmericanTegumentary Leishmaniasis (ATL). Infect Immun, 72:508-514, 2004.27. Schriefer, A.B. et al. Serum soluble markers in the evaluation oftreatment of human visceral leishmaniasis. Clin Exp Immunol, 102:535-540, 1995.28. SHOENFELD, Y.; ISEMBERG, D.A. DNA antibody idiotipies: Areview of their genetic, clinical and immune pathological features.Seminar Arthritis Rheum, 16:215-221, 1987.29. SOUZA, P.E.A. et al. Trypanosoma cruzi infection induces differ-ential modulation of costimulatory molecules and cytokines by mono-cytes and T cells from patients with indeterminate and cardiac Chagasdisease. Infect Immuno, 75:1886-1897, 2007.30. Sreenivas, G. et al. DNA polymorphism assay distinguishes isolatesof Leishmania donovani that cause kala-azar from those that causepost-kala-azar dermal leishmaniasis in humans. J Clin Microbiol, 42:1739-1741, 2004.31. WARD, M.M.; PYERR, E.; STUDENS, K.S. Long-term survival insystemic lupus erythematosus: Patients characteristics associated withpoorer outcomes. Arthritis Rheum, 38:274-279, 1995.

Page 62: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

52

Bioinformática: Perspectivas na MedicinaBioinformática: Perspectivas na MedicinaBioinformática: Perspectivas na MedicinaBioinformática: Perspectivas na MedicinaBioinformática: Perspectivas na Medicina

Bioinformatics: Perspectives in Medicine

Glaucius OlivaCentro de Biotecnologia Molecular Estrutural, Instituto de Física de São Carlos, Universidade de São Paulo; São Paulo, SP,

Brasil

A medicina moderna requer a integração e análise de grandes quantidades de dados genômicos, moleculares,celulares, associados a informações clínicas, desta forma apresentando desafios fenomenais para a Bioinformática.Esta área interdisciplinar da ciência, que começou com a análise de seqüências gênicas e cresceu na direção dodesenvolvimento de técnicas automatizadas de anotação de genomas e transcriptomas, está agora caminhando nadireção das áreas emergentes da genômica integrativa e comparada, e buscando, em última instância uma medicinapersonalizada. Os impactos previstos vão da identificação de milhares de novos alvos terapêuticos para doençasgenéticas e moleculares ao florescimento de uma medicina preventiva personalizada, com base no risco genéticoindividual. A Farmacogenômica permitirá a otimização da eficácia e minimização dos efeitos colaterais dosmedicamentos. A elucidação da estrutura tridimensional das proteínas humanas e de patógenos permitirá odesenvolvimento de novos medicamentos planejados quimicamente para interagir especificamente com seus alvos.A Terapia Gênica, em conjunto com a tecnologia de manipulação de células-tronco vislumbra a possibilidade dereposição corretiva de tecidos e genes. Esta revisão visita as principais tendências em bioinformática que detêmpapel maior na busca de futuras descobertas biológicas e aplicações clínicas.Palavras-chave: bioinformática, proteínas, genômica, biologia estrutural, farmacogenômica, SNP.

Modern medicine requires the integration and analysis of large amounts of data, coming from genomic, molecular,cellular and clinical information, thus demanding a remarkable set of challenges to Bioinformatics. The evolutionof this interdisciplinary area, which started with sequence analysis and has led to high-throughput whole genome ortranscriptome annotation today, is now going to be directed towards recently emerging areas of integrative andtranslational genomics, and ultimately personalized medicine. The foreseen impacts cover from the identification ofthousands of new therapeutic targets for genetic and molecular diseases to the flourishing of a new personalizedmedicine, based on the individual genetic risk. Pharmacogenomics will allow the optimization of the efficacy andminimization of side effects of drugs. The elucidation of the tridimensional structure of human and pathogenproteins should lead to the development of new drugs, designed to specifically interact with their targets. Genetherapy, in conjunction with stem cell Technologies opens the pathway to corrective reposition of genes. This reviewoutlines the most promising trends in bioinformatics, which may play a major role in the pursuit of future biologicaldiscoveries and medical applications.Key words: Bioinformatics, proteins, genomics, structural biology, pharmacogenomics, SNP.

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. Glaucius Oliva. Centro deBiotecnologia Molecular Estrutural, Instituto de Física de São Carlos,Universidade de São Paulo, C.P.369. 13560-970. São Carlos, SP, Brasil.Endereço eletrônico: [email protected]. Apoio: FAPESP, CNPq.

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):52-58.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

O conceito de Bioinformática é muito amplo e suadefinição mais geral engloba qualquer análise de dadosbiológicos utilizando-se métodos computacionais. Noentanto o entendimento usual desta moderna área doconhecimento está na utilização das ciências da informaçãoe da implementação computacional de técnicas físicas eestatísticas aplicadas ao estudo dos sistemas biológicos,desde o nível molecular (p.ex. DNA, RNA, proteínas) até odos organismos e sistemas complexos. Neste artigo serãopredominantemente abordados os impactos do vertiginosocrescimento das informações genômicas e moleculares, namedicina do presente e do futuro. Neste contexto a

bioinformática está focada em três tipos de bancos dedados: seqüências genômicas, estruturas macromolecularese experimentos de genômica funcional (p.ex. análises detranscrição gênica, proteômica, dados de interações entregenes expressos, etc.). No entanto a Bioinformática podeser também aplicada na análise de outros tipos de dadoscomo árvores filogenéticas, relações entre vias metabólicas,correlação com dados estatísticos sobre pacientes,populações e suas patologias entre outros. Um amploespectro de técnicas é utilizado, como alinhamentos deseqüência primária, superposições entre estruturastridimensionais de proteínas, construção de árvoresfilogenéticas, predição, modelagem e classificação deestruturas protéicas e de RNA, predição de função protéicae agrupamento de dados de expressão gênica. Esta pletorade dados e análises tem modificado de forma explosiva aforma como a medicina moderna é exercida, com amploimpacto no bem estar e qualidade de vida da sociedadehumana.

Page 63: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

53Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):52-58 Bioinformática na Medicina

A Explosão do Conhecimento Genômico e Molecular

Desde a seminal elucidação da estrutura em dupla-hélicedo DNA por James D. Watson e Francis H.C. Crick em 1953,que abriu o caminho para a compreensão dos mecanismos dearmazenamento, transcrição, tradução e replicação dainformação genética, o crescimento do conhecimentogenômico e molecular dos organismos vivos tem sidoexplosivo. Em dezembro de 2007 o banco de dados denucleotídeos mantido pelo European Molecular BiologyLaboratory (EMBL) registra mais de 190 bilhões de pares debase em 108 milhões de seqüências depositadas (ver http://www3.ebi.ac.uk/Services/DBStats/ para atualizações diárias).Este esforço internacional tem resultado no seqüenciamentode genomas completos de 51 organismos do domínio Archea,569 de Bacteria e 73 de Eukariota (http://www.ebi.ac.uk/genomes/index.html) que inclui, entre outros, o genomahumano, de chimpanzé, canino, bovino, murino e de diversospatógenos humanos. O custo por base seqüenciada tem caídode forma vertiginosa. O geneticista e escritor britânico RichardDawkins, em seu livro A Devil’s Chaplain (DAWKINS, 2004),faz uma análise retrospectiva do número de bases de DNAseqüenciadas por £ 1.000, em dados históricos dos últimos 40anos, concluindo que em média, a cada 27 meses o custo éreduzido à metade. Como ilustrado na Figura 1, é possívelestimar que no ano de 2050 deva ser possível obter um genomapessoal ao custo de aproximadamente £ 100 ou cerca de R$400,00 ! Esta perspectiva, somada à compreensão de como ospolimorfismos na seqüência de nucleotídeos pode afetar afunção biológica correspondente, fortemente sugere impactosantes inimagináveis na Medicina do futuro. Os impactosprevistos vão da identificação de milhares de novos alvosterapêuticos para doenças genéticas e moleculares aoflorescimento de uma medicina preventiva personalizada, combase no risco genético individual. A Farmacogenômicapermitirá a otimização da eficácia e minimização dos efeitoscolaterais dos medicamentos. A elucidação da estruturatridimensional das proteínas humanas e de patógenospermitirá o desenvolvimento de novos medicamentosplanejados quimicamente para interagir especificamente comseus alvos. A Terapia Gênica, em conjunto com a tecnologiade manipulação de células-tronco vislumbra a possibilidadede reposição corretiva de tecidos e genes.

Naturalmente, o seqüenciamento de um Genoma é apenaso primeiro passo nas ciências genômicas, necessariamenteacompanhado de intensa atividade comparativa e experimentalque permita a identificação dos genes ali codificados e suasfunções (Genômica Funcional). Como cada gene de umorganismo somente é transcrito em localizações, momentos equantidades específicas, os estudos de Transcriptômicabuscam determinar os padrões de transcrição gênica no espaçoe no tempo, pela quantificação dos RNA mensageiros emdiferentes tecidos e condições fisiológicas.

A tradução da informação contida nas moléculas de RNAmensageiro se dá pela síntese protéica ao nível ribossomal,

modulada por multivariados fatores físico-químicos celulares,levando a um padrão definido de proteínas presentes nascélulas em cada instante de tempo, foco de atenção daProteômica.

O que tem ficado evidente nos diversos projetos genomaconcluídos, é que a complexidade de um organismo não estádeterminada pelo número de genes codificados em seugenoma, mas na expressão concertada de genes, sistêmica ouregulada por estímulos ambientais. As pesquisas na área deInteractômica visam determinar a existência de interações entreproteínas correlacionadas funcionalmente.

Em última instância é essencial entender como as proteínasagem, pela elucidação de suas estruturas molecularestridimensionais e a relação entre a estrutura e a funçãobiológica, que é o objetivo dos programas de GenômicaEstrutural. Com estas informações pode-se então abordar, deforma completa, o complexo problema de identificar alvosmacromoleculares de importância médica, que possam serutilizados na descoberta de novos fármacos.

A Compreensão Estrutural dos Determinantes Genéticos

As proteínas, fenótipos principais dos genes eresponsáveis pela maioria das atividades fundamentais dosorganismos, são macromoléculas de peso molecular na amplafaixa de 104 a 106 unidades de massa atômica, constituindo-seem polímeros formados pela ligação covalente entre os 20aminoácidos diferentes utilizados universalmente pelosorganismos vivos em nosso planeta. Como característicafundamental para sua funcionalidade, a atividade biológica dasproteínas depende criticamente de sua estrutura tridimensional.Técnicas físicas experimentais como a cristalografia de proteínase a ressonância magnética nuclear, têm permitido conhecer aestrutura 3D de mais de 48.000 proteínas, registradas no ProteinData Bank (http://www.rcsb.org) em dezembro de 2007. Este

Figura 1. Custo de seqüenciamento do DNA. Número debases de DNA seqüenciadas por £1.000, com 4 dadoshistóricos dos últimos 40 anos, e extrapolação linear futura.(Adaptado por R.C.Garratt com base na figura original emDawkins, R. “A devil’s chaplain”) (DAWKINS, 2004).

1

100

1960 1980 2000 2020 2040

10000

1000000

1E8

1E10

ano

No.

de

base

s se

quen

ciad

aos

por 1

000

libra

sTempo para reduzir o custo pela metade = 27 mesesCusto de um gneoma pessoal em 2050 ~ R$ 400,00

Page 64: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

54 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):52-58Glaucius Oliva

espetacular avanço da Bioinformática Estrutural nos últimosanos tem nos ajudado a compreender de forma mais abrangentea hierarquia modular da organização das macromoléculasbiológicas. Como a pressão da seleção natural atuaprimeiramente na função biológica, é natural e de fato observadoque as estruturas tridimensionais protéicas se conservam maisdo que as seqüências de proteínas e genes codantes. Assim, asproteínas podem ser organizadas na forma de um númerolimitado de famílias estruturais, recentemente descritas de formasistematizada na tabela periódica das proteínas (The ProteinChart) (GARRATT, R.C.; ORENGO, C.A., 2007), que permiteuma visualização ao mesmo tempo abrangente e compacta dosprincípios que dirigem a diversidade de estruturas protéicas.

Uma importante fronteira da moderna pesquisa emBioinformática Estrutural está no desenvolvimento demetodologias teóricas que permitam a modelagem moleculardas proteínas, a partir de suas seqüências de aminoácidos.Nos casos em que há significativa homologia com outrasproteínas com estrutura 3D conhecida, pode-se fazer amodelagem molecular teórica para propor modelos para aproteína de interesse, para o que há inúmeras ferramentascomputacionais disponíveis (EDWARDS, Y.J.K.; COTTAGE,A., 2003). Vários grupos tem avançado no desenvolvimentode ferramentas automáticas para a modelagem da estruturatridimensional de proteínas, como o SWISS MODEL(SCHWEDE, 2003) e o GENO3D (COMBET, 2002), ainda quecom confiabilidade limitada. No entanto, com o explosivoaumento no número de estruturas conhecidasexperimentalmente, pode-se prever que em futuro não muitodistante, será possível modelar com precisão razoável aestrutura da grande maioria das proteínas, a partirexclusivamente de suas seqüências de aminoácidos.

Fármacos Planejados a Partir da Estrutura 3D de AlvosTerapêuticos

Nos casos em que proteínas são associadas a doençasmoleculares ou a patógenos, a elucidação de sua estruturapermite o desenvolvimento de fármacos inteligentes,planejados de forma a interagir especificamente com seureceptor, maximizando a afinidade e minimizando os efeitoscolaterais. Exemplos recentes de sucesso desta abordagemsão os inibidores da protease do vírus HIV (KIM, 1995;KALDOR, 1997; WLODAWER, 2002), os fármacosantiinflamatórios inibidores específicos da enzima ciclo-oxigenase 2 (COX2) (KURUMBAIL, 1996; FLOWER, 2003), oantigripal Relenza™, inibidor específico da enzima viralneuraminidase (VON ITZSTEIN, 1993) e o anticancerígenoGlivec™, inibidor específico da proteína tirosina quinase(SCHINDLER, 2000; CAPDEVILLE , 2002).

No entanto a batalha pela saúde prossegue, com muitasáreas em que há poucas ou nenhuma alternativa terapêuticacomo câncer, doenças do envelhecimento e reações auto-imunes. Além disso, o aparecimento de novos e maispoderosos agentes infecciosos e o desenvolvimento de

resistência por microorganismos e vírus que se supunhacontrolados, claramente demonstram a permanentenecessidade de busca por novos medicamentos. O mecanismode ação de medicamentos envolve a interação,preferencialmente específica, entre os princípios ativos(geralmente moléculas pequenas) e receptores biológicosmacromoleculares. O paradigma central de um bom fármaco éque este deve interagir especificamente com seus receptores,pela complementaridade estrutural entre o arranjo espacialdos grupos funcionais da micromolécula com o sítio receptorda macromolécula (VERLINDE, C.L.M.J.; HOL, W.G.J., 1994;BARREIRO, E.J.; FRAGA, C.A.M., 2001).

Desta forma, o atual estado da arte na descoberta de novosfármacos requer primeiramente a identificação de alvosmacromoleculares relevantes para uma determinada condiçãopatológica, seguida da elucidação de suas estruturastridimensionais, de forma a permitir a aplicação da tecnologiado planejamento racional. Como a esmagadora maioria dosalvos são proteínas, fica evidente que encontrar os genesque codificam por proteínas-alvo é uma ferramentapoderosíssima e central na farmacologia moderna.

Assim, todo programa moderno de descoberta de novosmedicamentos inicia-se pela seleção de proteínas medicamenterelevantes e sua validação como alvos terapêuticos. AValidação de Alvos é hoje uma atividade de pesquisa centralna área do desenvolvimento farmacêutico, pois leva à reduçãodo número de potenciais alvos (p.ex., todas as proteínashumanas ou de um dado parasita) para um número maisrealístico relacionado ao estudo de uma doença em particular,permitindo assim iniciar um programa de planejamento racionalde novos fármacos baseado em estruturas. A descoberta denovos fármacos é um empreendimento de alto custo e longaduração. É muito mais racional certificar-se amplamente que oalvo a ser escolhido de fato tem relação com a doença em focoe que interferir com ele deve efetivamente produzir osresultados biológicos ou terapêuticos esperados. Desta formahá intensa atividade de desenvolvimentos tecnológicos quepossam acelerar os estágios iniciais de identificação evalidação de alvos, minimizando o uso de recursos materiais ehumanos desnecessariamente. Procura-se demonstrar acorrelação entre uma dada classe de proteínas, genes ou viasmetabólicas com uma doença humana específica, o mesmovalendo para doenças de animais ou plantas. Um estudorecente estimou que a validação de alvos representa hojeaproximadamente um quinto do custo e tempo envolvido emdescoberta e desenvolvimento de novos fármacos(TOLLMAN, 2002), indicando que esta etapa representa umgargalo na indústria farmacêutica. A escolha de alvosmoleculares terapêuticos adequados no processo dedescoberta é uma vantagem competitiva extremamenteimportante em um setor caracterizado pelo alto risco edependente de inovações constantes.

Para identificar um gene como tendo importânciafarmacológica, é preciso determinar sua função, de forma queas técnicas experimentais para a validação de alvos são

Page 65: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

55Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):52-58 Bioinformática na Medicina

freqüentemente aquelas utilizadas em Genômica Funcional.Entre as abordagens importantes ao problema destaca-se aBioinformática, reconhecida como uma ferramenta essencialna análise de seqüências genômicas completas para aidentificação e extração das seqüências codantes ecorrespondentes proteínas e que permite a comparaçãomúltipla de seqüências entre diversas espécies. Atençãoespecial tem sido dada à genômica comparativa, na qualgenomas completos de espécies próximas e/ou distantespodem indicar genes conservados de relevância funcional.Por exemplo, a analise do genoma de linhagens virulentas enão-virulentas de uma dada espécie bacteriana pode indicaros potenciais genes associados à sua patogenicidade(ROSAMOND, J.; ALLSOP, A., 2000). O tamanho e acomplexidade dos bancos de dados de seqüências de ácidosnucléicos e proteínas requer o constante desenvolvimentode novas e poderosas ferramentas de software e hardwarepara o garimpo de informações.

Outra abordagem importante para a identificação depotenciais alvos terapêuticos são os estudos comparativosde análise de expressão gênica, com o uso de micro-arranjosde cDNA (PEROU, 2000), análise serial de expressão gênica(SAGE) (HERMEKING, H., 2003) e particularmente astecnologias proteômicas de eletroforese multidimensional eespectrometria de massa (WANG, J.H.; HEWICK, R.M., 1999),que permitem identificar quais genes e proteínas estão sendodiferencialmente expressos. Como exemplo, pode-se buscaros genes mais ou menos expressos em tecidos tumorais ouque apresentem uma determinada característica patológica.Outra possibilidade é analisar os genes ativados oudesativados durante a transformação de parasitas do estágionão-infectivo para infectivo.

Há vários estudos funcionais in vitro e in vivo que temsido utilizados em larga escala na identificação e/ou validaçãode alvos, freqüentemente em contextos celulares e bioquímicosdefinidos. É o caso do sistema de duplo-híbrido em levedura,que pode indicar proteínas que interagem entre si (FIELDS,S.; SONG, O., 1989) e que, portanto, requerem ação conjugadapara sua função. Outro exemplo é a clonagem porcomplementação, na qual linhagens celulares deficientes degenes metabolicamente importantes são complementadas porgenes exógenos (TANAKA , 1990).

Uma técnica que tem tido grande importância na validaçãode alvos potencialmente interessantes é a adição ou remoçãoseletiva de genes (knockins e knockouts, respectivamente)seguida de observações sobre viabilidade do organismotransgênico e do fenótipo resultante naqueles que sobrevivem(GORDON, J.W.; RUDDLE, F.H., 1981; HARRIS, 2001). Quandoo gene está presente em um genoma em cópia única, esteprocesso é facilitado. Abordagens de deleção sistemática degenes em larga escala, pelo uso de técnicas como transposonse mutagênese insercional aleatória tem permitido a identificaçãode vários genes de interesse (ZAMBROWICZ, 1998).

Mais recentemente, grande interesse tem sido despertadocom as técnicas de RNA-antisenso e RNA de interferência,

que envolvem a utilização de oligonucleotídeos que sãocomplementares a uma dada porção de uma molécula de mRNAe portanto capazes de inibir sua translação, splicing etranscrição (DEAN, 2001; HEASMAN, , 2002). Na técnica deRNA de interferência (RNAi), um método de validação dealvos atual e muito popular, utiliza-se RNA de dupla fita(dsRNA), que quando introduzido em células é digerido afragmentos curtos de pequenos RNA’s de interferência(siRNA) que são replicados por uma RNA polimerase. Estatécnica tem sido aplicada com sucesso no silenciamento degenes de nematóides e moscas e tem amplo potencial deaplicação na validação de alvos terapêuticos (FJOSE, 2001;BRUMMELKAMP, T.R.; BERNARDS, R.; AGAMI, R., 2002)

Além de apresentar correlação causal com a ocorrência dedoenças, um bom alvo terapêutico para o desenvolvimentode fármacos deve ter propriedades características quepermitam a ligação de moléculas pequenas adequadas àfarmacologia, ou seja, de baixo peso molecular e balançoequilibrado de polaridade (para viabilizar a solubilidade eligação ao receptor) e lipofilicidade (para proporcionar aabsorção através de membranas lipídicas). Desta forma, oconjunto de alvos para fármacos é a intersecção entre ogenoma drogável (= todos os genes que codificam porproteínas potencialmente capazes de ligar moléculaspequenas) e do conjunto dos genes correlacionados adoenças. Estimativas recentes sugerem que no genomahumano espera-se encontrar de 600 a 1.500 bons alvos parafármacos (HOPKINS, A.L.; GROOM, C.R., 2002).

O Desafio das Doenças Infecciosas Tropicais

As doenças infecciosas tropicais continuam a afetarseriamente o desenvolvimento social e econômico dos paísesmais pobres, afetando de forma desproporcional as populaçõesmarginalizadas. Estudos recentes indicam que nos países debaixa renda as doenças infecciosas representam até 45% dascausas de morte registradas (WHO, 1999). A doença deChagas, causada pelo protozoário Trypanosoma cruzi, afetaparticularmente os países das Américas Central e do Sul, ondeainda exerce forte impacto negativo sobre a saude e qualidadede vida das populações mais pobres. Estima-se que haja 16 a18 milhões de infectados com o T.cruzi e cerca de 120 milhõesde pessoas sob risco de contrair a doença. Além damortalidade, os infectados pelo parasita sofrem de severosproblemas cardíacos, gastrointestinais e mesmo danoneurológico, resultando em impacto estimado de 580 milDALYs (Disability Adjusted Life Years, uma medidaquantitativa do impacto da doença na perda de anos de vidasaudável). Os tratamentos quimioterápicos disponíveis,nifurtimox (Lampit) e benznidazol (Rochagan), apresentambaixa eficácia e alta toxicidade, razão pela qual o nifurtimoxnão é comercializado no Brasil, Argentina, Chile e Uruguai háalguns anos (FAIRLAMB, 1999). Além disso, tanto obenznidazol como o nifurtimox apresentam sérios efeitoscolaterais como: hiporexia, perda de peso, náuseas, vômitos,

Page 66: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

56 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):52-58Glaucius Oliva

alergia cutânea e neuropatia periférica e tem eficácia duvidosa,uma vez que algumas cepas estudadas apresentamsusceptibilidade diferente para esse tipo de droga (CASTRO,J.A.; DE MECCA, M.M.; BARTEL, L.C., 2006).

Uma diferença fundamental entre tripanossomatídeos e ohospedeiro humano é a compartimentalização metabólica daglicólise, com nove das enzimas glicolíticas seqüestradas emuma organela denominada glicossomo (MICHELS , 2006). Estadiferença resulta em diferenças estruturais significativas comas enzimas homólogas humanas, tornando-se, portanto, alvosatrativos para o desenvolvimento de inibidores específicos.Estudos experimentais e de simulação computacional docontrole do fluxo metabólico na via glicolítica tem demonstradoque os alvos preferenciais para inibição são o transportadorde glicose e as enzimas aldolase e gliceraldeído-3-fosfatodesidrogenase (GAPDH) (ALBERT, 2005). Desde a elucidaçãoda estrutura da TcGAPDH em nosso laboratório (SOUZA,1998), temos desenvolvido diversos estudos de busca porinibidores em produtos naturais (TOMAZELA, 2000;MORAES, 2003) , estruturas de complexos proteina-ligante(PAVÃO, 2002; CASTILHO, 2003), estudos computacionaisquantitativos da relação estrutura-atividade (QSAR) (LEITÃO,2004), planejamento e desenvolvimento de análogos (DEMARCHI, 2004; ALVIM, 2005) .

Um exemplo é o complexo da enzima com o produto naturalchalepina, uma cumarina extraída da arvore de mata atlânticaPilocarpus spicatus, elucidado por cristalografia de raios-X(CASTILHO, 2003) e representado na Figura 2. Com base nestaestrutura, diversos análogos foram planejados e sintetizados,buscando aperfeiçoar a afinidade e especificidade dos ligantes(ALVIM, 2005; COLLINS, F.S.; BROOKS, L.D.;CHAKRAVARTI , A., 1998), maximizando assim seu potencialfarmacológico. Estas metodologias tem, portanto, criadoperspectivas promissoras de descoberta de novas alternativasquimioterápicas para o tratamento da doença de Chagas.

Figura 2. Estrutura cristalográfica do complexo entre a enzimagliceraldeído-3-fosfato desidrogenase de Trypanosoma cruzie o inibidor cumarínico chalepina, extraído da plantaPilocarpus spicatus.

SNPs e Diferenças Genéticas-Estruturais

O tipo mais comum de variações genéticas entre oshumanos é o Polimorfismo de Nucleotídeo Único (SNP, doinglês Single nucleotide polymorphism), que representamcerca de 90% das diferenças de seqüência do código genéticoentre indivíduos (COLLINS, F.S.; BROOKS, L.D.;CHAKRAVARTI, A., 1998) . Os estudos realizados até opresente momento indicam que há cerca de 15 milhões deposições no genoma humano nas quais pode haver diferençasentre duas pessoas ou populações. Em meados de 2007 maisde três milhões destas posições tem sido mapeadas ecatalogadas no HapMap (http://www.hapmap.org), uma basede dados internacional publica dedicada a auxiliar os cientistasa encontrar genes associados com doenças humanas erespostas diferenciadas a fármacos. Em sua já tradicionaledição de final de ano, a conceituada revista científicaAmericana Science escolheu como maior avanço científicode 2007 os estudos da Variação Genética Humana (PENNISI,2007). Nestes estudos tem sido utilizados chips de DNA quepodem analisar cerca de 500 mil SNPs por vez, em amostrasgenômicas de centenas ou milhares de pessoas com e semuma doença em particular. Pela correlação entre SNPs esintomas, pode-se determinar o grau de susceptibilidade dedesenvolvimento de uma determinada patologia associado acada uma destas diferenças genéticas.

Um grande desafio nesta área é entender como e quandoestas variações causam as doenças a elas relacionadas, umpasso essencial para permitir avançar na sua prevenção oucura. SNPs em regiões codantes (cSNPs) ou regulatórias sãoas mais prováveis de afetar a função gênica (SYVANEN, 1999).Regiões gênicas amplamente estudadas em diferentesindivíduos tem mostrado que cerca de metade dos cSNPs sãosilenciosas e o restante causam mutações do tipo missense,ou seja, que alteram um códon fazendo com que este codifiqueum aminoácido diferente (CARGILL, 1999). Alguns destesmissense cSNPs são neutros e não causam alteraçõesdetectáveis no fenótipo gênico, enquanto outras podemresultar em diferenças em características individuais, diferentesrespostas a fármacos ou mesmo susceptibilidades distintas adoenças.

Uma maneira de abordar esta questão é mapear asmudanças genéticas nas correspondentes estruturas protéicascomo codificadas pelos genes, e buscar entender o efeitoproduzido, experimental ou teoricamente (por técnicas demodelagem molecular). O grande volume de dadosexperimentais sobre o efeito de mutagênese sítio-dirigida emestrutura e função de proteínas torna possível prever opossível efeito de uma mutação do tipo missense cSNP resultarem alterações na função molecular. No modelo proposto porWang e Moult (2001) e implementado de forma automatizadano servidor http://www.SNPS3D.org (YUE, P.; MELAMUD,E.; MOULT, J., 2006), cada mutação é associada ao seu impactosobre um ou mais papéis que o dado resíduo de aminoácidoexerce na estrutura protéica, como estabilidade no

Page 67: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

57Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):52-58 Bioinformática na Medicina

enovelamento, conexão com ligantes, catálise, regulaçãocatalítica direta ou alostérica, ou modificação pós-traducional,entre outras. Algumas mutações podem ser consideradasconservativas e neutras, enquanto outras produzem mudançasno caráter hidrofóbico, interações de van der Waals, ligaçõeseletrostáticas, interações de hidrogênio ou pontes di-sulfeto.

O resultado destas análises tem indicado que 90% dasmutações do tipo missense conhecidamente causativas dedoenças e que foram analisadas por este modelocomputacional, afetam predominantemente a estabilidade dasproteínas, através de variados fatores energéticos (YUE, P.;LI, Z.; MOULT, J., 2005). Surpreendentemente, mais de 70%das variações genéticas humanas são neutras, o remanescenteestando potencialmente envolvidas em doenças poligênicas.

Perspectivas Futuras

Diversos estudos tem se proposto a avaliar o potencialimpacto futuro da Bioinformática (BAYAT, 2002). O volumesem precedentes de dados biológicos e clínicos que tem sidoproduzidos desde a disseminação explosiva das ciênciasgenômicas tem demandado interpretação e análise somentepossíveis com as técnicas em evolução da Bioinformática.Uma das perspectivas futuras de curto prazo é que as análisesda bioinformática vão identificar mais genes associados adoenças e simultaneamente permitir o desenvolvimento denovos fármacos planejados para o seu tratamento. ABioinformática deverá também auxiliar na identificação degenes de susceptibilidade e elucidar as vias patogênicasenvolvidas nas doenças, desta forma oferecendo novasoportunidades para o desenvolvimento de tratamentos maisespecíficos e eficientes. Por exemplo, alvos potenciaisenvolvidos em diferentes tipos de câncer têm sidorecentemente identificados através da análise de perfis deexpressão gênica (GRAEBER, T.G.; EISENBERG, D., 2001).

Em uma perspectiva temporal de maior prazo, as análisesbioinformáticas integrando dados genômicos, moleculares,patológicos e clínicos deverão revelar potenciais reaçõesadversas de fármacos em indivíduos específicos, através detestes genéticos simples. Em última instância afarmacogenômica permitirá utilizar a informação genéticapessoal no tratamento das doenças, trazendo à tona uma novaera de medicina personalizada, na qual pacientes poderão levar,em um “cartão genético” todas as informações sobre seupróprio perfil genético para a eficácia e efeitos colaterais decertos fármacos.

Como resultado destes avanços, a Bioinformática deveráaproximar os biologistas moleculares e pesquisadores clínicos,capitalizando na ampla disponibilidade de dados e nasferramentas da biologia computacional. Os médicos do futuroestão sendo formados agora, e certamente aqueles que terãomais sucesso são os que transitarem com igual freqüência efacilidade entre a prática clínica e o laboratório de pesquisas,apoiados pelo uso extensivo de ferramentas computacionais.

Agradecimento

O autor agradece fortemente ao Dr. R.C.Garratt pelasprazeirosas e produtivas discussões sobre o tema deste artigo, epela gentil cessão da imagem que compõe a Figura 1 deste texto.

Referências

1. ALBERT, M.A. et al. Experimental and in silico analyses of glycolyticflux control in bloodstream form Trypanosoma brucei. J Biol Chem,280: 28306-28315, 2005.2. ALVIM, J. et al. Preparation and evaluation of a coumarin librarytowards the inhibitory activity of the enzyme gGAPDH fromTrypanosoma cruzi. J Braz Chem Soc, 16: 763-773, 2005.3. BARREIRO, E.J.; FRAGA, C.A.M. Química Medicinal: as basesmoleculares da ação dos fármacos. 1ª. Edição, Porto Alegre: ArtmedEditora, 2001.4. BAYAT, A. Science, medicine, and the future: Bioinformatics. BMJ,324:1018-1022, 2002.5. BRUMMELKAMP, T.R.; BERNARDS, R.; AGAMI, R. A system forstable expression of short interfering RNAs in mammalian cells. Science,296: 550-553, 2002.6. CAPDEVILLE, R. et al. Gleevec (STI571,imatinib), a rationallydeveloped, targeted anticancer drug. Nat Rev. Drug Discov, 1: 493-502, 2002.7. CARGILL, M. et al. Characterization of single nucleotidepolymorphisms in coding regions of human genes. Nat Genet, 22:231-238, 1999.8. CASTILHO, M.S. et al., Evidence for the two phosphate bindingsites of an analogue of the thioacyl intermediate for the Trypanosomacruzi glyceraldehyde-3-phosphate dehydrogenase-catalyzed reaction,from its crystal structure. Biochemistry, 42: 7143-7151, 2003.9. CASTRO, J.A.; DE MECCA, M.M.; BARTEL, L.C. Toxic side effectsof drugs used to treat Chagas’ disease (American trypanosomiasis).Hum Exp Toxicol, 25: 471-479, 2006.10. COLLINS, F.S.; BROOKS, L.D.; CHAKRAVARTI, A. A DNApolymorphism discovery resource for research on human geneticvariation. Genome Res, 8:1229-1231, 1998.11. COMBET, C. et al. Geno3D: Automatic comparative molecularmodelling of protein. Bioinformatics, 18: 213-214, 2002.12. DAWKINS, R. A devil’s chaplain: reflections on hope, lies, scienceand love”, A Mariner Book, Houghton Mifflin Company, Boston - NewYork, 2004.13. DE MARCHI, A.A. et al. New 3-piperonylcoumarins as inhibitorsof glycosomal glyceraldehyde-3-phosphate dehydrogenase (gGAPDH)from Trypanosoma cruzi. Bioorg Med Chem Lett, 12: 4823-4833,2004.14. DEAN, N.M. Functional genomics and target validation approachesusing antisense oligonucleotide technology. Curr Opin Biotechnol, 12:622-625, 2001.15. EDWARDS, Y.J.K.; COTTAGE, A. Bioinformatics methods topredict protein structure and function - A practical approach. MolBiotechnol, 23: 139-166, 2003.16. FAIRLAMB, A.H. Future prospects for the chemotherapy of Chagas’disease. Medicina (B Aires), 59: 179-187, 1999.17. FIELDS, S.; SONG, O. A novel genetic system to detect protein–protein interactions. Nature, 340: 245-246, 1989.18. FJOSE, A. et al. RNA interference: mechanisms and applications.Biotechnol Annu Rev, 7: 31–57, 2001.19. FLOWER, R.J. The development of COX2 inhibitors Nat Rev.Drug Discov 2, 179-191 (2003).20. GARRATT, R.C.; ORENGO, C.A. The Protein Chart, Wiley-VCHVerlag,Weinheim, 2007.21. GORDON, J.W.; RUDDLE, F.H. Integration and stable germ linetransmission of genes injected into mouse pronuclei. Science, 21, 1244-1246, 1981.

Page 68: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

58 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):52-58Glaucius Oliva

22. GRAEBER, T.G.; EISENBERG, D. Bioinformatic identification ofpotential autocrine signaling loops in cancers from gene expressionprofiles. Nat Genet, 29:295-300, 2001.23. HARRIS, S. Transgenic knockouts as part of highthroughput,evidence-based target selection and validation strategies. Drug DiscovToday, 6: 628-636, 2001.24. HEASMAN, J. Morpholino oligos: making sense of antisense? DevBiol, 243: 209-214, 2002.25. HERMEKING, H. Serial analysis of gene expression and cancer.Curr Opin Oncol, 15: 44-49, 2003.26. HOPKINS, A.L.; GROOM, C.R. The druggable genome. Nat Rev.Drug Discov., 1: 727-730, 2002.27. KALDOR, S.W. et al. Viracept (nelfinavir mesylate, AG1343): apotent, orally bioavailable inhibitor of HIV-1 protease. J Med Chem,40:3979-3985, 1997.28. KIM, E.E. et al. Crystal structure of HIV-1 protease in complexwith VX-478, a potent and orally bioavailable inhibitor of the enzyme.J Am Chem Soc, 117:1181-1182, 1995.29. KURUMBAIL, R.G. et al. Structural basis for selective inhibition ofcyclooxygenase-2 by anti-inflammatory agents. Nature, 384: 644-648,1996.30. LEITÃO, A. et al. Structure-activity relationships of novel inhibitorsof glyceraldehyde-3-phosphate dehydrogenase. Bioorg Med Chem Lett,14: 2199-2204, 2004.31. MICHELS, P.A. et al. Metabolic functions of glycosornes intrypanosomatids Biochim Biophys Acta, 1763: 1463-1477, 2006.32. MORAES, V.R.D. et al. Enzymatic inhibition studies of selectedflavonoids and chemosystematic significance of polymethoxylatedflavonoids and quinoline alkaloids in Neoraputia (Rutaceae). J BrazChem Soc. 14: 380-387, 2003.33. PAVÃO, F. et al. Structure of Trypanosoma cruzi glycosomalglyceraldehyde-3-phosphate dehydrogenase complexed with chalepin,a natural product inhibitor, at 1.95 angstrom resolution. FEBS Lett,520: 13-17, 2002.34. PENNISI, E. Breakthrough of the year: human genetic variation.Science, 318: 1842-1843, 2007.35. PEROU, C.M. et al. Molecular portraits of human breast tumours.Nature, 406: 747-752, 2000.36. ROSAMOND, J.; ALLSOP, A. Harnessing the Power of the Genomein the Search for New Antibiotics. Science, 287: 1973-1976, 2000.

37. SCHINDLER, T. et al. Structural mechanism for STI571 inhibitionof Abelson tyrosine kinase. Science, 289: 1938-1942, 2000.38. SCHWEDE, T. et al. SWISS-MODEL: an automated proteinhomology-modeling server. Nucleic Acids Res, 31: 3381-3385, 2003.39. SOUZA, D.H.F. et al. Trypanosoma cruzi glycosomal glyceraldehyde-3-phosphate dehydrogenase: structure, catalytic mechanism and targetedinhibitor design FEBS Lett, 424: 131-135, 1998.40. SYVANEN, A.C. et al. Enthusiasm mixed with skepticism aboutsinglenucleotide polymorphism markers for dissecting complexdisorders. Eur J Hum Genet, 7:98-101, 1999.41. TANAKA, K. et al. Analysis of a human DNA excision repair geneinvolved in group A xeroderma pigmentosum and containing a zincfingerdomain. Nature, 348: 73-76, 1990.42. TOLLMAN, P. et al. A Revolution in R&D:how genomics andgenetics are transforming the biopharmaceutical industry. BostonConsulting Group Report, 26 November, 1-64, 2002.43. TOMAZELA, D.M. et al. Pyrano chalcones and a flavone fromNeuraputia magnifica and their Trypanosoma cruzi glycosomalglyceraldehyde-3-phosphate dehydrogenase-inhibitory activities.Phytochemistry, 55: 643-651, 2000.44. VERLINDE, C.L.M.J.; HOL, W.G.J. Structure-based drug design:progress, results and challenges. Structure, 2: 577-587, 1994.45. VON ITZSTEIN, M. et al. Rational design of potent sialidase-basedinhibitors of influenza virus replication. Nature, 363: 418-423, 1993.46. WANG, J.H.; HEWICK, R.M. Proteomics in drug discovery. DrugDiscov Today, 4: 129-133, 1999.47. WANG, Z.; MOULT, J. SNPs, protein structure, and disease. HumMutat., 17: 263-270, 2001.48. WHO. “Removing Obstacles to Heathy Development”, WHOReport on Infectious Diseases, WHO, http://www.who.int/infectious-disease-report/index-rpt99.html,1999.49. WLODAWER, A. Rational approach to AIDS drug design throughstructural biology Annu Rev Med, 53: 595-614, 2002.50. YUE, P.; LI, Z.; MOULT, J. Loss of protein structure stability as amajor causative factor in monogenic disease. J Mol Biol, 353:459-473,2005.51. YUE, P.; MELAMUD, E.; MOULT, J. SNPs3D: Candidate gene andSNP selection for association studies. BMC Bioinformatics, 7: 166, 2006.52. ZAMBROWICZ, B.P. et al. Disruption and sequence identification of2,000 genes in mouse embryonic stem cells. Nature, 392, 608-611, 1998.

Page 69: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

59

Energia, Sustentabilidade e Cidadania: Algumas Reflexões sobre as Opções Energéticas doEnergia, Sustentabilidade e Cidadania: Algumas Reflexões sobre as Opções Energéticas doEnergia, Sustentabilidade e Cidadania: Algumas Reflexões sobre as Opções Energéticas doEnergia, Sustentabilidade e Cidadania: Algumas Reflexões sobre as Opções Energéticas doEnergia, Sustentabilidade e Cidadania: Algumas Reflexões sobre as Opções Energéticas doBrasil, Vistas sob o Prisma de um MédicoBrasil, Vistas sob o Prisma de um MédicoBrasil, Vistas sob o Prisma de um MédicoBrasil, Vistas sob o Prisma de um MédicoBrasil, Vistas sob o Prisma de um Médico

Energy, Sustentability and Citizenship: Reflections on Brazilian Energetic Options Through a Doctor’s Prism

Paulo SaldivaFaculdade de Medicina da USP; São Paulo, SP, Brasil

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. Paulo Saldiva. Av. Dr. Arnaldo, 455,Cerqueira César. 01246-903. São Paulo, SP, Brasil. Tel (11) 3066-7234. Endereço eletrônico: [email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):59-64.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Considerações Iniciais

O homem é o objeto central dos processos de prospecçãoe comercialização da indústria de petróleo, gás e combustíveisrenováveis. A disponibilidade de energia capaz de serarmazenada e “empacotada” em tanques de combustível outambores de gás abriu ao homem as portas da mobilidademecanizada e de geração de eletricidade. Os hidrocarbonetospresentes no petróleo permitiram o desenvolvimento de novosprodutos e compostos que modificaram o formato e eficiênciade diversos utensílios e a produção de novos medicamentos.Mais importante, a disponibilidade de energia e novoscompostos fez com que novos comportamentos e atitudes deconsumo fossem incorporados pela sociedade dos homens,gerando hábitos que demandam uma produção de energiacada vez maior.

O cenário acima exposto fez com que hoje nos defrontemoscom algumas questões de extrema relevância para a saúdehumana e sustentabilidade do planeta. Em nosso entender, ospontos importantes a merecer atenção podem ser assimapresentados:

a) Quais são as alternativas energéticas que permitemconciliar o aumento da necessidade de energia da parteda sociedade com aspectos de eficiência, preço esustentabilidade? A concentração da produção depetróleo e gás em algumas regiões críticas do planetatem provocado uma série de tensões nas últimasdécadas, com impactos nos preços destes produtosno mercado internacional. Um elenco ampliado dealternativas energéticas factíveis é o melhor antídotopara estas dificuldades.

b) Quais as fontes energéticas que promovem menorimpacto ambiental, seja em escala global (minimizandoos efeitos climáticos) como em escala regional(minimizando os efeitos adversos da exploração eemissões)? O aquecimento global pelas emissões deCO2 e metano é uma questão que saiu da esfera técnicada academia e da indústria, para atingir o cotidiano docidadão comum. O mesmo se pode dizer dos efeitos

adversos das emissões veiculares, que tem sido objetode uma política de controle cada vez mais restritiva,visando preservar a saúde humana. Em conseqüênciaa estes problemas, gerados pela queima decombustíveis derivados de petróleo e gás, cresce nasociedade um sentimento que visa a redução dasemissões de poluentes por fontes fixas e móveis, queterá implicações futuras no mercado destescombustíveis. É importante frisar que, no níveltecnológico presente e para a maior parte dasaplicações do petróleo e gás (e seus derivados), umaredução significativa das emissões não pode serobtida somente através da melhoria tecnológica doprocesso industrial ou da engenharia dos motores,mas, necessariamente, deve considerar a composiçãodo combustível como fator determinante. Um exemploclaro é representado pelos veículos diesel, onde atecnologia de catalisadores é dependente daformulação do combustível.

c) Como transformar o processo de produção de energiaem um dos instrumentos que auxiliem a obtenção deuma equidade sócio-econômica entre nações ricas epobres, como também reduzam os contrastes sociaise de saúde dentro de uma mesma nação? A produçãode energia é uma fonte de riqueza. O desenvolvimentode novas fontes de energia, que ampliem oshorizontes geográficos da produção de combustíveis,poderá levar ao desenvolvimento sócio-econômicode regiões menos favorecidas. Os combustíveisderivados da biomassa representam uma dasalternativas para a expansão das fronteiras daprodução de energia e riqueza, tanto em escala global(como no caso dos países da África) como em nossopaís.

O conjunto de situações acima expostas indicaclaramente que homem e a indústria de produção de petróleo,gás e seus derivados criaram vínculos que, de tão íntimos,selaram os seus destinos em um pacto implícito. O futuro dohomem depende de produção de fontes crescentes deenergia limpa e sustentável. O futuro do mercado de energiavai depender da sua capacidade de atender aos anseios dohomem por fontes que assegurem a estabilidade climáticado planeta, o menor dano possível à saúde humana e queconduzam a um futuro com menor desigualdade sócio-econômica.

Page 70: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

60 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):59-64Paulo Saldiva

Poluição do Ar e Saúde

A qualidade do ar das Regiões Metropolitanas do Brasilvem apresentando uma substancial melhora nas últimasdécadas. Um dos instrumentos para a melhoria da qualidadedo ar foi, sem dúvida, a implementação de um programa decontrole de emissões veiculares de longo prazo, o Proconve.Considerando que o meio ambiente urbano é o habitat naturalmais característico de veículos motorizados, a exposição degrande número de indivíduos a poluentes atmosféricos é umasituação inevitável. Mesmo os mais ferrenhos admiradoresde veículos concordam que a inalação de gases de emissãoautomotiva não faz bem à saúde. Apesar deste consenso, ofator saúde é raramente levado em conta quando da definiçãode políticas de combustível ou transporte. Por exemplo, oprograma de etanol combustível foi implementado em nossoPaís devido aos seus aspectos econômicos e não propriamentepelos seus efeitos sobre a saúde. Na verdade, nunca houveum estudo de impacto ambiental que levasse em conta osefeitos da produção e das emissões veiculares para aimplementação do novo combustível, bem como quando assuas proporções de adição à gasolina foram alteradas desdeo início da produção de veículos movidos a etanol. Esta mesmadespreocupação também ocorre quando da definição do usoe ocupação do solo no cenário urbano. Drásticas modificaçõesde rotas de tráfego podem, por vezes, afetar regiõesresidenciais, sem que se leve em conta a exposição dapopulação nas áreas de maior impacto. É até certo pontointeressante notar que este tipo de despreocupação nãoocorreria caso houvesse a iniciativa da montagem de umanova indústria ou de uma usina termoelétrica no espaço urbano.Esta situação parece indicar que não nos sentimos ameaçadospelos veículos, que são, em última análise, objetos de desejoe não de ameaça.

Uma vez reconhecido o íntimo compartilhamento deespaço entre veículos (e suas emissões tóxicas) e a populaçãourbana, torna-se defensável argumentar a favor de os efeitosà saúde humana devem fazer parte das políticas de transportes,de combustíveis, de engenharia veicular, de ocupação doespaço urbano, enfim, de todos os aspectos que regulam otráfego e emissões de automotores no cenário urbano. Há,todavia, que se reconhecer que a tarefa não é trivial.

Os efeitos à saúde da população devido à exposição apoluentes ambientais são diversos, exibindo diferentesintensidades e manifestando-se com diferentes tempos delatência: efeitos comportamentais e cognitivos, inflamaçãopulmonar e sistêmica, alterações do calibre das vias aéreas,do tônus vascular e do controle do ritmo cardíaco, alteraçõesreprodutivas, morbidade e mortalidade por doenças cárdio-respiratórias e aumento da incidência de neoplasias, entreoutros. Dada a multiplicidade de desfechos possíveis, énecessária a definição, de forma objetiva, de efeito adverso àsaúde. A partir desta definição, é possível selecionar quaissão os eventos úteis para se determinar o impacto que algumamodificação ambiental terá sobre a população exposta.

Embora o conceito de efeito adverso ou prejudicial sobrea saúde humana seja amplamente utilizado para a definição demedidas de avaliação de risco ou de gestão ambiental, umadefinição precisa sobre os limites existentes entre um achadocom significância estatística e uma alteração que acarrete umprejuízo relevante para a saúde ainda carece de um melhoraclaramento.

A definição mais amplamente adotada para caracterizarum efeito adverso à saúde tem sido aquela preconizada pelaAmerican Thoracic Society (1995), que define agravo à saúde“como um evento médico significativo, caracterizado por umou mais dos seguintes fatores: 1) interferência com a atividadenormal dos indivíduos afetados; 2) doença respiratóriaepisódica; 3) doença incapacitante; 4) doença respiratóriapermanente; 5) disfunção respiratória progressiva”.

No ano de 2000, à luz dos novos conhecimentos científicos,a Sociedade Americana de Doenças Torácicas expandiu oescopo de sua definição anterior, incorporando os seguinteseventos: biomarcadores, qualidade de vida, alteraçõesfisiológicas, sintomas, aumento de demanda por atendimentomédico e, finalmente, mortalidade (AMERICAN THORACICSOCIETY, 2000). Mais recentemente, em 2004, a SociedadeAmericana de Cardiologia (BROOK et al., 2004) publicou umdocumento reconhecendo a poluição atmosférica com um fatorde risco para o agravamento de doenças cardiovasculares,notadamente infarto agudo do miocárdio, insuficiênciacardíaca congestiva e desenvolvimento de arritmias.

Estudos realizados com dados da American Cancer Society(POPE et al., 2002) incluem neoplasias pulmonares como umindicador de efeitos da poluição atmosférica. Finalmente,alterações reprodutivas, tais como baixo peso ao nascer,abortamentos e alterações da relação de sexos ao nascimentotambém foram incorporados ao conjunto de indicadores deefeitos prejudiciais significantes da poluição do ar.

Do acima exposto, podem ser relacionados diferentesefeitos adversos da poluição do ar sobre a saúde humana,alguns deles manifestando-se de forma aguda – horas ou diasapós a exposição – enquanto outros são evidenciadossomente após longos períodos de exposição – os chamadosefeitos crônicos. Tantos os efeitos agudos como os efeitoscrônicos podem exibir diferentes níveis de gravidade,abrangendo uma gama de efeitos que oscilam do desconfortovago até (como desfecho de maior gravidade) a morte. Algunsexemplos talvez auxiliem a aclarar melhor estas idéias. Quandodo aumento da poluição do ar, uma grande fração da populaçãoapresentará alterações cognitivas ou irritabilidade nãoespecíficas. Uma menor proporção dos indivíduos expostosapresentará um aumento de marcadores plasmáticos epulmonares de inflamação, indicando a presença de inflamaçãosubclínica. Em uma proporção menor, esta inflamação poderáacarretar alterações funcionais, como aumento da pressãoarterial, discreto distúrbio do controle autonômico do coraçãoou queda de indicadores de função pulmonar. Em um nível degravidade maior, indivíduos que utilizam medicaçãocronicamente para o controle de doenças respiratórias e

Page 71: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

61Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):59-64 Energia, Sustentabilidade, Cidadania e o Médico

cardíacas (asma e hipertensão arterial, por exemplo),necessitarão maior quantidade de medicamento para controlara sua doença. Haverá aqueles que, incapazes de controlar asalterações por si próprios, procurarão o médico paraconsultas ou, nos casos mais graves, serão internados empronto-socorros ou hospitais. Finalmente, uma parte dosafetados morrerá no dia ou em poucos dias após, em virtudedos efeitos da poluição a que foram expostos

Como a maior parte dos estudos que avaliam os efeitosagudos da poluição utiliza desfechos graves comointernações respiratórias e mortalidade, é provável que oscoeficientes relacionando prejuízo à saúde humana compoluição atmosférica estejam subestimando os efeitos reais,dado que eventos que comprometem a qualidade de vida,tais como comprometimento do controle de doenças crônicas,não são computados pela inexistência de notificaçãocompulsória dos mesmos.

Estudos de longa duração, com acompanhamento degrupos populacionais por períodos de tempo prolongados,levaram ao reconhecimento de efeitos da poluição que setraduzem apenas após aos de exposição. Assim como ocigarro manifesta os seus efeitos após anos de consumotabágico, a poluição repete, em menor escala, alguns dosseus efeitos crônicos. A Tabela 1 apresenta a relação dealguns dos efeitos crônicos da poluição do ar.

A definição de efeito adverso à saúde deve ser,necessariamente, acompanhada da caracterização dos gruposmais suscetíveis. O aumento da suscetibilidade aos poluentesé dependente de fatores individuais, de moradia e sócio-econômicos. Entre os fatores de natureza individual os maisimportantes são idade, morbidades associadas ecaracterísticas genéticas. Os extremos da pirâmide etária têmsido consistentemente apontados como alvos preferenciaisda ação adversa dos poluentes atmosféricos, especialmentenos segmentos abaixo dos 5 e acima dos 65 anos de idade.Morbidades associadas, tais como asma, bronquite crônica,doença aterosclerótica, diabetes mellitus, miocardiopatias earritmias cardíacas estão entre as condições patológicassabidamente predisponentes da suscetibilidade aos efeitosdos poluentes atmosféricos.

As condições de moradia afetam a dose recebida e,conseqüentemente, a suscetibilidade aos poluentes. Nosgrandes centros urbanos, existem áreas onde a geração edispersão dos poluentes favorece que os níveis ambientaisde poluição sejam significativamente maiores do que a médiaurbana. Áreas vizinhas aos grandes corredores de tráfego,os baixos dos urbanos, regiões sujeitas a constantescongestionamentos, são pontos que condicionam maior riscoaos seus habitantes. Por exemplo, medidas de materialparticulado de diâmetro inferior a 2,5 µm realizadas sob oelevado Costa e Silva (o popular minhocão), em São Paulo,revelam valores 3 vezes superiores à média da cidade.

O tipo de construção também afeta o grau de penetraçãodos poluentes no interior das residências. Construções maisantigas e desprovidas de condicionamento de ar tendem a

apresentar maior grau de penetração dos poluentesatmosféricos.

Condições sócio-econômicas também interferem com asuscetibilidade aos poluentes atmosféricos. Na cidade deSão Paulo, foi demonstrado que, dada uma mesma variaçãode poluição ambiental (expressa em termos de MP10), amortalidade será maior nos bairros com piores indicadoressócio econômicos. A Figura 1 mostra um exemplo destasituação, mostrando o incremento porcentual de mortalidadepara idosos com idade acima de 65 anos em diferentes regiõesda cidade de São Paulo, em função diferenciadas porindicadores sócio-econômicos (no caso, fração da populaçãocom educação de nível superior). Como pode ser evidenciadana Figura 1, a região mais carente apresenta incremento demortalidade aproximadamente 6 vezes maior do que oobservado na área mais desenvolvida.

Os fatores que determinam a maior vulnerabilidade dapopulação menos favorecida frente aos poluentesatmosféricos podem ser divididos em 2 grandes grupos:eventos pertinentes às condições de saúde e acesso acuidados e medicação, e condições que favorecem uma maiorexposição aos poluentes.

No primeiro grupo, é sabido que a população mais carenteapresenta condição de saúde mais precária, devido aproblemas de saneamento, nutrição, acesso a serviçosmédicos e menor poder de compra de medicamentos quandoda instalação de uma doença. O segundo grupo – maiorexposição – tem sido reconhecido como um fator relevante narelação entre poluição do ar e saúde. A relação entre exclusãosocial e maior exposição aos poluentes ocorre tanto em níveiscontinentais, como dentro de cada comunidade. Processosindustriais mais “sujos”, veículos com tecnologia menosdesenvolvida, combustíveis com maiores teores decontaminantes, são eventos reconhecidamente mais freqüentesnos países em desenvolvimento. Em menor escala, dentro deuma mesma comunidade, é comum o fato de que as profissõesque levam a uma maior exposição aos poluentes (trabalhadoresde rua, por exemplo) sejam exercidas pelos segmentos maiscarentes da população. Da mesma forma, moradias nas bordasde vias com alto tráfego, e a utilização de lenha ou resíduospara a preparação de alimentos são eventos mais comuns aosgrupos menos favorecidos. Desta forma, a maior vulnerabilidadedos segmentos de menor poder econômico aos poluentesatmosféricos é determinada tanto pelas piores condições basaisde saúde e acesso aos instrumentos de saúde, como tambémpor uma maior exposição à poluição.

O material particulado é o poluente atmosférico maisconsistentemente associado a efeitos adversos à saúdehumana. A toxicidade do material particulado depende de suacomposição e diâmetro aerodinâmico. Composição e diâmetrodas partículas poluentes estão relacionados, comodemonstrado na Figura 2.

A Figura 3 mostra o aspecto de partículas ambientais(partículas totais em suspensão), coletadas em filtro de nitro-celulose, mostrando uma grande variação de sua morfologia.

Page 72: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides
Page 73: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

63Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):59-64 Energia, Sustentabilidade, Cidadania e o Médico

- Algumas doenças predispõem a uma maiorsuscetibilidade aos efeitos adversos do MP: doençapulmonar obstrutiva crônica, insuficiência cardíacacongestiva e miocardiopatia isquêmica;

- Fatores sócio-econômicos influenciam asuscetibilidade ao MP, dados que o seu impacto emtermos de mortalidade será tanto maior quanto menoro índice de desenvolvimento social e econômico dapopulação exposta;

- Os mecanismos que regulam as mortes respiratórias ecardiovasculares são aparentemente distintos. Amortalidade por doenças respiratórias parece dependerda indução de um estado inflamatório pulmonar, comprejuízo das defesas respiratórias contra agentesinfecciosos inalados. A mortalidade por doençascardiovasculares está mais associada a distúrbios docontrole autonômico do coração ou alterações dosfatores de coagulação.

Os efeitos crônicos também têm sido demonstrados apartir da detecção de alterações estruturais dos pulmõesde indivíduos que habitam regiões com concentrações deMP. A primeira demonstração clara de que os níveis de MPpromovem alterações inflamatórias difusas do tratorespiratório em humanos veio de estudos de nosso grupo(SOUZA, 1998), onde foram detectados hiperplasia muco-secretora, remodelamento com fibrose das pequenas viasaéreas e lesão da região centro acinar de jovens falecidospor causas externas e habitantes da região metropolitanade São Paulo. Neste mesmo estudo, as lesões observadasestavam em íntima relação anatômica com focos dedeposição e retenção de material carbonáceo (antracose),sugerindo uma relação de causa e efeito. Posteriormente,as mesmas observações foram relatadas por outros doisgrupos de pesquisadores (CHURG, 2000; PINKERTON,2000). Os estudos realizados em pulmões de humanostambém foram claros em determinar que a quantidade deMP retido nos pulmões parece ser um indicador preciso dadose acumulada de exposição a este material, constituindo-se em um “banco de memória” das fontes poluidoras queproduziram os elementos tóxicos acumulados. Mais ainda,

é fato conhecido que as parte das partículas de antracoseinaladas são transferidas para outros compartimentos(linfático, sanguíneo e outros tecidos). Qualquerpatologista habituado à atividade de autópsia reconhecepontos de deposição antracótica na pleura, no diafragma,e em linfonodos torácicos e abdominais. Também éamplamente conhecido o achado de nódulos silicóticos emoutros órgãos que não os pulmões, bem como a translocaçãode fibras de amianto para a cavidade peritoneal.Componentes solúveis aderidos ao MP proveniente dafumaça do tabaco alcançam a circulação e estão associadosao desenvolvimento de neoplasias em diversos órgãos alémdos pulmões. Desta forma, é plausível postular que o MPsirva de veículo transportador para que elementos tóxicosa ele aderidos penetrem nos espaços aéreos distais e sejamliberados, a partir dos pulmões, para diferentescompartimentos do organismo humano, favorecendo odesenvolvimento de doenças crônicas na espécie humana.

A Tabela 2 mostra os coeficientes que relacionamexposição crônica a material particulado (aumento de 10μg/m3 de MP2,5) e mortalidade por doenças respiratórias,cardiovasculares e câncer do pulmão, obtidos pelo estudode seguimento de cerca de 500.000 pessoas de diferentesregiões da América do Norte por 21 anos (POPE et al.,2002).

O estudo de Pope et al. (2002) indica claramente quea mortalidade por doenças cárdio-respiratórias e o câncerdo pulmão está associada à exposição prolongada ao

Figura 4. Concentração de alguns metais pesados compotencial tóxico presentes no material particulado urbano deSão Paulo.

Figura 5. Concentrações de alguns hidrocarbonetospolicíclicos aromáticos com potencial carcinogênico,presentes nas partículas ambientais do centro de São Paulo.

Cd Cu Cr Pb Ni Mn Zn0

500100015002000250030003500400045005000

mic

rogr

amas

/gra

r

0200400600800

1000120014001600

nano

gram

as/g

rar

Antrac

eno

Pireno

B[a]Antr

acen

o

B[k]Fluo

ranten

o

Tabela 2. Coeficientes relacionando aumento de mortalidadepor diferentes causas a exposição crônica a MP2,5. Oscoeficientes foram calculados para um aumento de 10 μg/m3

de MP2,5 (POPE et al., 2002).

Mortalidade % de aumento (IC)

Todas as causas 1,06 (1,02 – 1,4)Cardiopulmonar 1,09 (1,03 – 1,16)Câncer do pulmão 1,14 (1,04 – 1,23)Outras causas 1,01 (0,95 – 1,04)

Page 74: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

64 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):59-64Paulo Saldiva

material particulado, especialmente a sua fração mais fina(MP2,5). Como resultado do aumento destas doençasocorre uma redução da expectativa de vida, comodemonstrado pelo estudo das seis cidades Norte-Americanas conduzido por Dockery e colaboradores(1996) (Figura 6).

Os resultados demonstrados na Figura 6 indicam quea expectativa de vida decresce em aproximadamente umano e meio para cada 10 μg/m3 de MP2,5, devido adoenças cárdio-pulmonares e câncer do pulmão.

Figura 6. Expectativa de vida em 6 cidades americanas queexibem diferentes níveis ambientais de MP 2,5 (DOCKERY etal., 1996).

70,0

72,5

75,0

77,5

80,0

10 15 20 25 30PM2.5 (ug/m3)

Page 75: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

65

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. Jorge Kalil. Laboratório deImunologia, Instituto do Coração, Faculdade de Medicina da Universidadede São Paulo. Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44, 9

o. andar, Bloco 2.

05403-903. São Paulo, SP, Brasil.

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):65-71.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Novas Estratégias de VNovas Estratégias de VNovas Estratégias de VNovas Estratégias de VNovas Estratégias de Vacinasacinasacinasacinasacinas

New Strategies in Vaccines

Jorge Kalil, Edecio Cunha-Neto, Luiza GuilhermeInstituto do Coração (InCor) e Disciplina de Imunologia Clínica e Alergia, Departamento de Clínica Médica, Faculdade de

Medicina da Universidade de São Paulo e Instituto do Milênio; São Paulo, SP, Brasil

Modelos Atuais de Desenvolvimento de Vacinas

A partir da primeira vacinação feita por Jenner que gerou aprodução de anticorpos contra o vírus da varíola, vinculou-se a capacidade de proteção após a imununização comdiferentes patógenos (vírus e bactérias) à produção deanticorpos. Com os novos conhecimentos da imunologia, umavacina para ser eficiente precisa ativar linfócitos T auxiliadoresque por sua vez ativam linfócitos B a produzir anticorposespecíficos, bem como produzir células citotóxicas potentes.As células T auxiliadoras também geram inúmeras células dememória que rapidamente são mobilizadas quando ocorre apenetração de um agente infeccioso no organismo. Osconhecimentos atuais sobre as interações celulares queocorrem para o desencadeamento da resposta imune, nospermitem analisar os fatores relevantes envolvidos noreconhecimento do antígeno pelos linfócitos T, portanto, aescolha do antígeno para a confecção de uma vacina éfundamental.

Dentre as novas abordagens, temos vacinasconfeccionadas a partir de seqüências de aminoácidos deproteínas que são sintetizadas em laboratório (vacinas depeptídeos sintéticos); vacinas com proteínas recombinantese vacinas de DNA.

Nos três modelos de vacinação citados (proteínarecombinante, na baseada em peptídeos sintéticos ou DNA),a escolha dos epítopos é fundamental. É necessário que ospeptídeos sejam naturalmente apresentados ao linfócito Tdurante a infecção; que sejam reconhecidos por praticamente100% dos indivíduos e que induzam resposta imune adequada.O principal evento no desencadeamento da resposta imune éo reconhecimento do antígeno pelo receptor ab do linfócito Tligado às moléculas HLA de classe I ou II. Atualmente, existemprogramas computadorizados baseados em algoritmos queindicam a capacidade de ligação de determinados peptídeos adeterminadas moléculas HLA, permitindo a escolha desegmentos com maiores chances de serem reconhecidos pelamaioria dos indivíduos, no caso de escolha para uma vacina(CUNHA-NETO, 1999).

Vacina com Proteínas Recombinantes

A partir da identificação de proteínas imunogênicasde um determinado agente microbiano é possível identificaras seqüências de nucleotídeos que compõem estasproteínas em um banco de dados e produzir grandesquantidades destas proteínas, usando-se a metodologiadenominada de DNA recombinante. Resumidamente,segmentos de genes que codificam determinadasseqüências são acoplados em vetores específicos queposteriormente são inseridos em bactérias, geralmente E.coli, em leveduras ou em células de mamíferos. Asbactérias ou leveduras recombinantes são posteriormenteselecionadas de forma específica e o crescimento é feitoem larga escala, geralmente em fermentadores. Uma vezobtida grande quantidade de bactérias ou leveduras, estassão submetidas à lise celular liberando a proteínarecombinante produzida, para posterior purificação pormétodos bioquímicos. Um exemplo de vacina recombinanteé a vacina contra a hepatite B produzida em leveduras,através da clonagem do gene do antígeno de superfície dovírus da hepatite B (HBsAg) e que induz a formação deanticorpos protetores contra o vírus da hepatite B.

Pelo método de vacina recombinante também é possívelintroduzir apenas sequências gênicas de proteínasimunodominantes de determinados patógenos em vetoresbacterianos ou virais atenuados, que serão inoculados e queirão replicar-se no organismo. Os vetores atenuados maisutilizados são o vírus da vaccínia, poliovírus, cepas atenuadasde Salmonella, cepas de BCG do Mycobacterium bovis, entreoutros.

Vacina com Peptídeos Sintéticos

Baseia-se na seleção de epítopos imunodominantescontendo aproximadamente 15 resíduos de aminoácidos.A vantagem deste modelo é a possibilidade de testarpequenas alterações de seqüência, i.e., pode-se substituirou eliminar 01 a 02 resíduos de aminoácidos. Estasalterações permitem verificar a capacidade de respostapelos linfócitos T e B dos novos epítopos assim como acapacidade de ligação às moléculas HLA para posteriorapresentação ao linfócito T, e desencadeamento daresposta imune.

A síntese de peptídeos imunogênicos tem grande potencialpara o desenvolvimento de vacinas.

Page 76: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

66 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):65-71Jorge Kalil et al.

Vacina de DNA

Insere-se o DNA que codifica uma determinada proteínaem um plasmídeo contendo a região promotora que irá permitira transcrição do gene introduzido em células de mamíferosque após ser inoculado, desencadeia uma resposta ativa delinfócitos T e B. Aparentemente, algumas célulasapresentadoras de antígenos (monócitos e/ou célulasdendríticas) são transfectadas com estes plasmídeos contendoos epítopos imunogênicos e são capazes de desencadearresposta imune específica. A grande vantagem, deste modeloé a possibilidade de promover a resposta de células Tcitotóxicas (CTLs) na ausência de germes vivos atenuados e,desta forma, tornar-se uma vacina potente.

É estável, com baixo custo de produção e possibilidade dese usar o mesmo vetor para diversos antígenos. As vacinasgênicas são normalmente inoculadas por via intramuscularou usando o processo de biobalística que utiliza uma armagênica “gene gun” que promove a aceleração e introdução demicropartículas de ouro encobertas com o DNA de interessena derme. O processo da biobalística necessita apenas depequenas quantidades de DNA (<1μg) em relação à injeçãointramuscular que necessita de aproximadamente 100μg. Outroaspecto a ser considerado é o tipo de resposta imunepreferencialmente desencadeada, decorrente da via deinoculação. Aparentemente, a via intramuscular induzpreferencialmente padrão Th1 e a biobalística induzpreferencialmente Th2 (OLIVEIRA, 1999).

Recentemente, uma vacina de DNA foi utilizada comsucesso por grupo brasileiro, da FMUSP/RP, para proteger emesmo tratar infecção instalada por Mycobacteriumtuberculosis resistente a tratamento em camundongos(LOWRIE, 1999).

Essas novas metodologias podem usar adjuvantes(extratos de bactérias, hidróxido de alumínio e lipídeos) emvacinas com peptídeos sintéticos e imunomuduladores comocitocinas e moléculas co-estimuladoras em vacinas de DNA.

O uso de substâncias adjuvantes ou imunomuduladorespode aumentar a resposta imune. Os adjuvantes induzeminflamação local e aumentam a expressão de moléculas co-estimuladoras e produção de citocinas, principalmente a IL-12 que estimula o crescimento e a diferenciação dos linfócitosT. Bactérias mortas pelo calor são potentes adjuvantes e sãonormalmente usadas para imunização em modelosexperimentais. Devido ao forte efeito inflamatório, estassubstâncias não são usadas em humanos. Alguns adjuvantesde efeito inflamatório mais leve estão sendo usados emhumanos, como gel de hidróxido de alumínio (liga proteínasde forma não covalente e, portanto, induz uma leve inflamação);substâncias lipídicas que serão ingeridas por fagócitos.Também existe a possibilidade de se injetar substâncias queativem linfócitos T, como a IL-12. Em vacinas usando DNArecombinante ou plasmídeos é possível incorporar genes desubstâncias co-estimuladoras (moléculas B7 e CD40) ou genesde citocinas, p. ex. IL-12.

Graças às novas abordagens propostas, inúmeros ensaiosde vacinas vêm sendo realizados no mundo contra vírus,parasitas e bactérias. A maioria encontra-se em fase depesquisas básica ou pré-clínica, conforme relatado no JordanReport 2002 - National Institutes of Health (NIH) (JORDANREPORT, 2002). Apesar de já existirem vacinas comercializadase em uso para vários microrganismos, novos modelos devacinas vêm sendo usados, p.ex. contra Bordetella pertussistais como a vacina com toxinas B. pertussi (PT) purificadas eacelulares, vacina PT recombinante e peptídeos PTconjugados; vacina contra H. influenzae envolvendo vacinasrecombinantes de proteínas ou subunidades de proteínasbacterianas. No que diz respeito às vacinas anti-virus os testesde vacinas com proteínas virais recombinantes, vacinas depeptídeos e vacina de DNA vêm sendo extensivamenteanalisados. Um exemplo é a tentativa de se produzir vacinaeficaz e segura contra o HIV. Já são descritos inúmeros tiposde vacinas usando subunidades do vírus HIV; ou ensaios devacina baseados em peptídeos de proteínas virais (vacina depeptídeos sintétiticos ou recombinantes); ensaios departículas virais, principalmente na forma de vacinarecombinante, usando sequências de DNA de proteínas virais(vacina de DNA). A maioria destes estudos encontra-se emfase pré-clínica, com ensaios em pequenos animais. Alguns jáem ensaios de fase clínica I e como tratamento e prevenção dadoença e outros modelos em fase II e III.

Estes exemplos nos mostram a importância e a diversidadede abordagens para confecção de vacinas à luz dosconhecimentos atuais, visando a produção de vacinas eficazese seguras contra diversos patógenos.

Estudos de Nosso Grupo para Obtenção de Vacina contraHIV

Situação Atual

A infecção pelo HIV é a grande epidemia emergente denosso século. A obtenção de uma vacina eficaz contra o HIVé um objetivo global e uma contribuição fundamental para obem-estar das partes economicamente menos favorecidas domundo. Dentre os desafios para o desenvolvimento dessavacina, um dos maiores é a grande diversidade do HIV-1. Aexperimentação em primatas não-humanos mostrou que,embora a imunização com vírus inativado fosse capaz de geraranticorpos neutralizantes e proteger contra o desafio com ovírus HIV ou SHIV homólogo, essa proteção era altamenterestrita, não ocorrendo contra variantes próximos ou outrosisolados (BABA et al., 2000; MASCOLA et al., 2000). Atéhoje, tem sido muito difícil induzir a produção de anticorposde amplo espectro neutralizante (revisto por LETVIN, 2005).Por isso, muitas das vacinas experimentais correntemente emtestes têm como princípio o estímulo da imunidade celular.Embora várias vacinas experimentais que induzem a imunidadecelular tenham-se mostrado imunogênicas em ensaios clínicosde fase I, a grande maioria não mostrou qualquer proteção em

Page 77: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

67Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):65-71 Novas Estratégias de Vacinas

ensaios de vacinação profilática (p. ex. ensaio IIb vacina Merck,interrompido em 2007), ou controle de viremia, no caso dasvacinas terapêuticas (KINLOCH-DE-LOES et al., 2005).

Importância da Identificação de Epítopos VacinaisReconhecidos por Linfócitos T CD4+

Embora sejam os linfócitos T CD8+ (citotóxicos) anti-HIV-1 os que efetivamente destroem células infectadas pelo vírus,sua atividade é fundamentalmente dependente da presençade células T CD4+ anti-HIV-1 (ROSENBERG et al., 1997;KALAMS et al., 1998; HEENEY et al., 2002). Recentemente,foi observado que vacinação preserva as células T CD4+ dememória de primatas desafiados com SIV (MATTAPALLIL etal., 2006), e que isto leva a uma sobrevida aumentada (LETVINet al., 2006). Dessa forma, a inclusão de epítopos apropriadosdo HIV-1 reconhecidos pela célula T CD4+ pode ser uma parteessencial para o sucesso de uma candidata a vacina anti-HIV-1. Entretanto, há poucos epítopos para linfócitos T CD4+ doHIV-1 já conhecidos, em comparação aos epítopos CD8+,muito mais estudados. Isto pode ser comprovado por exemplo,pelo número de trabalhos descrevendo epítopos na proteínap17 gag do HIV-1 (22 para linfócitos CTL/CD8+ versus 5 paralinfócitos helper/CD4+), relatadas até 2003 na base de dadosde seqüências do HIV-1 de Los Alamos, http://HIV-1-web.lanl.gov). Assim, existe uma importante necessidade deidentificação de epítopos e elucidação de respostas de célulasT CD4+ anti-HIV-1, que pode melhorar a eficácia de novosimunógenos anti-HIV-1.

Resultados Anteriores do Grupo: Identificação de EpítoposNovos Imunodominantes do HIV-1

É possível que as dificuldades enfrentadas pelas vacinasexperimentais testadas até hoje sejam em parte derivadas dodesenho de suas sequências. Praticamente todas as vacinasexperimentais testadas foram baseadas em proteínas ou genesinteiros do HIV-1. Vacinas de DNA, recombinantes ou devetores virais que codificam genes ou proteínas inteiras doHIV-1 permitem a reprodução dos mecanismos de escapemolecular desenvolvidos pelo HIV-1 nativo, em resposta àspressões imune e outras, o que pode ser responsável pelaausência de proteção conferida por tais vacinas. Uma vacinaputativa baseada em epítopos – apresentados fora docontexto das sequências flanqueadoras das proteínasnativas – poderia abortar os mecanismos de escape doprocessamento, apresentação e reconhecimentoimunológicos, levando à indução de respostas imunescelulares amplificadas. Outro aspecto essencial é que taisepítopos devem ser reconhecidos pela totalidade – ou amaioria – dos indivíduos, e a sua identificação é altamenteprioritária, de forma a cobrir uma proporção significante dapopulação exposta. É possível que esta estratégia, junto comnovas estratégias para formulação de imunógenos, possagerar uma vacina protetora.

A identificação e análise de epítopos de linfócitos T e Btem sido um dos principais focos de nosso grupo de pesquisanos últimos anos, com ênfase para a identificação de epítoposde linfócitos T CD4+ (RIZZO et al., 1989; CUNHA-NETO etal., 1994,1995, 1996; ABEL et al., 1997; ABEL et al., 2005;DURANTI et al., 1999; IWAI et al., 2001; IWAI et al., 2005;FONSECA et al., 2005).

Em estudos anteriores, estabelecemos como metaidentificar epítopos imunodominantes novos, nãopreviamente conhecidos, do HIV-1 reconhecidos por linfócitosT CD4+, para um possível uso vacinal. Nossa estratégia foi de1) a identificação de epítopos vacinais é importante para aconstrução de uma vacina – já que podem ser usados fora docontexto da seqüência flanqueadora na proteína nativa, o queevitaria o escape evolutivo do reconhecimento dos epítopos,por processamento alternativo; 2) a seleção de múltiplosepítopos aumenta as chances de cobertura vacinal napopulação; 3) a identificação de epítopos de linfócitos T CD4+capazes de se ligarem a múltiplas moléculas HLA-DR (queapresentam epítopos para linfócitos T CD4+) distintas,presentes na grande maioria da população, aumentando aschances de cobertura na população geneticamenteheterogênea; 4) a seleção de regiões mais conservadas noHIV aumentaria a abrangência da proteção mesmo quanto aisolados virais mais distantes. Com tais premissas, utilizamoso algoritmo TEPITOPE (STURNIOLO et al., 1999;www.vaccinome.com) para varrer as regiões conservadas dogenoma completo do HIV-1 (subtipo B), e selecionar seqüênciasdas proteínas do HIV-1 que poderiam se ligar a múltiplasmoléculas HLA-DR comuns na população geral. Essaestratégia tem possibilitado ao nosso grupo selecionarepítopos freqüentemente reconhecidos pelos linfócitos TCD4+ nas proteínas imunodominantes obtidas de váriospatógenos e alvos de doenças auto-imunes (IWAI et al., 2003;FONSECA et al., 2004; DAMICO et al., 2005; ABEL et al.2005; FONSECA et al. 2006). Foram selecionados 18 epítopos,dos quais 11 ainda não descritos, com a propriedade de seligarem promiscuamente a pelo menos dois terços das 25moléculas HLA-DR descritas pelo algoritmo TEPITOPE. Acapacidade dos epítopos identificados de se ligarem amúltiplas moléculas HLA-DR, representando empiricamentea variedade dessas moléculas na população, foi confirmadapor ensaios de ligação HLA- peptídeo. A análise com ensaiode ELISPOT-IFN-gama mostrou que todos os 18 peptídeosselecionados foram reconhecidos por células mononuclearesde pelo menos 18% dos pacientes em diferentes estágios dainfecção por HIV (de progressores lentos com CD4+>500 semantiretrovirais até progressores rápidos com CD4+ <200 comantiretrovirais). Significantemente, 91% (29/32) dos pacientesreconheceram pelo menos um dos 18 peptídeos (FONSECA etal., 2006), reconhecendo em média 5 peptídeos distintos. Osdados indicam que os peptídeos testados são frequentementereconhecidos em populações de pacientes HIV+ nãoselecionadas, o que indica que são naturalmente apresentadosdurante a infecção pelo HIV-1 (FONSECA et al., 2006). Pela

Page 78: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

68 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):65-71Jorge Kalil et al.

característica poliepitópica e polialélica das seqüências deconsenso do HIV-1 do subtipo B selecionadas pelo nossogrupo (FONSECA et al., 2006), serem freqüentementereconhecidas por células T CD4+, é esperado que essesepítopos possam produzir uma resposta com significanteamplitude e cobertura sobre a disparidade HLA daspopulações altamente heterogêneas, e talvez permitir umaimunização cruzada entre os clados, já que as sequências sãoaltamente conservadas entre subtipos distintos (FONSECAet al., 2006).

Com o objetivo de avaliar efetivamente a imunogenicidadedos epítopos, construímos vacina de DNA contendoplasmídeo pVAX-1 codificando in tandem os epítoposimunodominantes de sequências conservadas do HIV-1frequentemente reconhecidas por pacientes HIV-1+ descritosanteriormente (Figura 1). Imunizamos camundongos Balb/c eavaliamos a frequência de células produtoras de IFN-gama eproliferativas (ensaio de diluição de CFSE). Nossos resultadospreliminares apontam para a imunogenicidade da vacina deDNA, elicitando números significativos de linfócitos T CD4+e CD8+, indicando o sucesso da abordagem poliepitópica epolialélica. Experimentos pré-clínicos utilizando camundongos“humanizados” (transgênicos para moléculas HLA de classeII, TANEJA et al. 2003) poderão demonstrar o perfil de respostaimune humana antes de ensaios clínicos com voluntáriossaudáveis ou pacientes. Estudos com primatas não-humanos,e ensaios clínicos com a vacina já estão em planejamento.

Estudo do Nosso Grupo para Obtenção de Vacina contra oEstreptococo do Grupo A

Infecções por S. pyogenes ou estreptococo betahemolítico do grupo A causam faringites ou infecções de pele.A incidência de faringites varia de acordo com as mudançasde estações, idade, condições sócio-econômicas, fatoresambientais e qualidade do tratamento. As principais seqüelasdas faringites causadas pelo S. pyogenes são a febre reumática(FR) e suas complicações, doenças invasivas como fasciitenecrotizante e outras.

Em países em desenvolvimento e ou subdesenvolvidogrande número de indivíduos não tem acesso ao atendimentomédico o que favorece o aparecimento principalmente da FR.Dados da organização Mundial da Saúde de 2004 registram616 milhões de casos de faringite estreptocócica eaproximadamente 20 milhões de casos de FR no mundo. Adoença reumática cardíaca (DRC), a mais grave seqüela da FRé ainda considerada um dos maiores problemas de saúdepública em países em desenvolvimento, sendo responsávelpor 233.000 mortes/ano. No Brasil, a FR e a DRC ainda sãomuito freqüentes principalmente em regiões onde acesso aotratamento médico é mais difícil.

O desenvolvimento de uma vacina contra o estreptococobeta hemolítico, certamente acarretará na diminuição dos casosde faringite estreptocócica e consequentemente FR e de suasseqüelas, e outras doenças decorrente da estreptococcia.

O grande desafio, em produzir a vacina é não causar doençaauto-imune. Neste sentido, há 20 anos trabalhamos paracompreender mecanismos desencadeadores das reações auto-imunes. Vários trabalhos que realizamos permitiram identificarregiões da proteína M, principal proteína da bactéria, compotencial de desencadear doença e, também regiõesprotetoras. Todos os nossos estudos conjuntamente comdados de diversos pesquisadores corroboram para odesenvolvimento da vacina contra o estreptococo queatualmente encontra-se em fase experimental em camundongosem nosso laboratório. O artigo submetido envolve o desenho,a escolha e definição da região escolhida como agente vacinal.

Abordamos a confecção de vacina contra oestreptococo do grupo A, com base na escolha de peptídeosimunodominantes com caráter protetor. Concebemos doismodelos distintos para o desenvolvimento da vacina comosegue:

Metodologia1º) Vacina partindo da inoculação de peptídeos sintéticos

– Analisamos a reatividade humoral por teste imunoenzimáticode ELISA, inicialmente em 250 amostras de soros,selecionamos 38 peptídeos que apresentaram maiorreatividade e aumentamos o número de amostras para 620indivíduos (323 de indivíduos normais, 296 de pacientes comFR). O valor de corte (controle negativo) foi calculado pelométodo do “Box plot” e pelo teste de Kruskal –Wallis.

Analisamos também a resposta celular (linfócitos T) de258 indivíduos (133 pacientes e 125 controles) por teste deproliferação celular, que consiste em estimular os linfócitosde sangue periférico com os peptídeos sintetizados por 96hseguido de incorporação de timidina triciada para contagemdas células atividas em contador beta de irradiação.

Identificamos os antígenos HLA de classe II (HLA-DR)de 197 indivíduos testados para resposta celular, pormetodologia de reação em cadeia com polimerase – PCR.

A partir da análise dos 38 peptídeos compartilhadoslocalizados nos blocos C2, C3 e parte do bloco D, identificamos25 resíduos de aminoácidos(SEASRKGLRRDLDASREAKKQVEKA) reconhecidos poranticorpos presentes em mais de 80% dos soros dosindivíduos testados, que foi definido como epítopo B.Anticorpos reativos ao epítopo B foram capazes de inibir aadesão e invasão de 7 cepas testadas do S. pyogenes à célulaHEp2, como segue: M5, M6, M44/61 e M87 > 95% de inibiçãoda adesão e invasão celular e M1 90%, M71 e M22 70% deinibição da adesão e invasão celular. Paralelamenteidentificamos a região reconhecida por linfócitos T (epítopoT) composta por 22 resíduos de aminoácidos(KGLRRDLDASREAKKQLEAEQQ). A comparação dosepítopos T e B mostrou o compartilhamento de 16 resíduos deaminoácidos (KGLRRDLDASREAKKQ) (GUILHERME et al.2006). A identificação das moléculas HLA de classe II mostrouque indivíduos que reconhecem os epítopos T e B sãoportadores de diversos HLA-DR.

Page 79: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

69Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):65-71 Novas Estratégias de Vacinas

Figura 1. Etapas para a construção de uma vacina de DNA contra o HIV-1 contendo múltiplos epítopos CD4+.

Construção de gene artificial com 18 epítopos do HIV-1 in tandem (spacers GPGPG , otimização de códons)

Subclonagem do gene artificial poliepotópico no vetor pVAX-1

Figura 2. Vacina recombinante da porção C-terminal.

Figura 3. Epítopos T e B.

gp160 (174-185) gp160 (188-201) gp160 (481-498) rev (11-27) vpr (58-72) vpr (65-82) vif (144-158) vpu (6-20) nef (180-194)

p17 (73-89) p24 (33-45) p24 (131-150) p6 (32-46) pol (63-77) pol (136-150) pol (785-799) gp41 (261-276) gp160 (19-31)

espaçadores GPGPG Novos epítopos

Nhe

IP

me

IA

fl II

Hin

d III

Asp

718

IK

pn I

Bam

HI

Bst

X I

Eco

RI

Pst

IE

co R

VB

st X

IN

ot I

Xho

IX

ba I

Dra

IIA

pa I

Pm

e I

pVAX1

T7

Epitopos T and B

16 aa _ _ _ _ _ _Epitopo T (22aa)

_ _ _ _ _ 16 aa _ _ _ _Epitopo B (25aa)

Região Idêntica253 KGLRRDLDASREAKKQLEAEQQ279

288 EASRKGLRRDLDASREAKKQVEKA 312

253KGLRRDLDASREAKKQLEAEQQKLEEQNKISEASRKGLRRDLDASREAKKQVEKA312

55 aa

PepVacTB1

INPI – 0501290 / 0604997-4

C - 1 215-249

C - 2 250-284

C - 3 285-308

D 309-450

Proteína M5 Robinson et al, Infect Immun, 1991

NH2 A1 - 6

B1 - 4

C 1, 2,3

D COOH

Desenho Vacina

Proteína Recombinante

Epitopos T e B

253KGLRRDLDASREAKKQLEAEQQKLEEQNKISEASRKGLRRDLDASREAKKQV309

Gene clonado

156 pb

14.8 kDa

ProteínaRecombinante

TB1

~9 kDa

INPI – 0501290 / 0604997-4

Page 80: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

70 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):65-71Jorge Kalil et al.

2º) Vacina recombinante da porção C-terminal – assequências gênicas correspondentes aos epítopos com caráterprotetor, delineados a partir do modelo de vacina usandopeptídeos sintéticos, foram inseridas em vetores de expressãopara a proteína M (Figura 2).

A identificação dos epítopos T e B permitiu a construçãodo agente vacinal contendo os resíduos de aminoácidos dosdois epítopos ligados por 07 resíduos, constituído no totalpor 55 resíduos de aminoácidos em conformidade com aseqüência da proteína nativa:KGLRRDLDASREAKKQLEAEQQKLEEQNKISEASRKGLRRDLDASREAKKQVEK. Estas seqüências foram patenteadas (PI0501290-2; PI0604997 e PCT/BR 2007/000184) (Figura 3).

Para o desencadeamento da resposta imune é necessáriaa participação de três moléculas: as moléculas HLA nasuperfície de células apresentadoras de antígenos, o peptídeoantigênico, e o receptor do linfócito T. Os epítoposcomponentes da vacina induziram resposta de anticorpos epor linfócitos T de indivíduos portadores de diversasmoléculas HLA indicando que o epítopo vacinal é universal.

A vacina foi produzida em duas formulações, 1. na forma depeptídeo sintético e 2. na forma de proteína recombinante eencontra-se em fase experimental em modelos de camundongos(artigos em preparação). Os resultados são promissores, poisos animais respondem ao agente vacinal em combinação comadjuvantes com altos títulos de anticorpos do tipo IgG quandoimunizados por via subcutânea e boa resposta de IgA e IgG porvia intranasal e não desenvolvem reações de auto-imunidadeem tecido cardíaco e outros tecidos analisados, nemcitotoxicidade em vários órgãos avaliados (Figura 4).

Vários testes ainda em andamento estão sendo efetuadospara confirmação da capacidade de proteção e segurança davacina.

A produção da vacina contra o estreptococo seráextremamente importante para a prevenção das estreptococciase suas sequelas em nosso país e em diversos países emdesenvolvimento e também em países de primeiro mundo, ondeo número de faringites estreptocócicas é muito elevado.

Referências

1. ABEL, L.C. et al. T cell epitope characterization in tandemlyrepetitive Trypanosoma cruzi B13 protein. Microbes Infect, 2005;7(11-12):1184-95.2. ______. Molecular mimicry between cardiac myosin and Trypanosomacruzi antigen B13: identification of a B13-driven human T cell clone thatrecognizes cardiac myosin. Braz J Med Biol Res, 1997;30(11):1305-8.3. BABA, T.W. et al. Human neutralizing monoclonal antibodies of theIgG1 subtype protect against mucosal simian-human immunodeficiencyvirus infection. Nat Med, 2000 Feb;6(2):200-6.4. CUNHA-NETO, E. MHC-restricted antigen presentation andrecognition: constraints to gene, recombinant and peptide vaccines inhumans. Braz. J. Med.Biol. Res., 1999 32:199-205.5. ______. Autoimmunity in Chagas’ disease. Identification of cardiacmyosin-B13 Trypanosoma cruzi protein crossreactive T cell clones inheart lesions of a chronic Chagas’ cardiomyopathy patient. J ClinInvest., 1996;98(8):1709-12.6. ______. Autoimmunity in Chagas disease cardiopathy: biologicalrelevance of a cardiac myosin-specific epitope crossreactive to animmunodominant Trypanosoma cruzi antigen. Proc Natl Acad Sci U SA., 1995;92(8):3541-5.7. ______. Restricted heterogeneity of T cell receptor variable alphachain transcripts in hearts of Chagas’ disease cardiomyopathy patients.:Parasite Immunol., 1994;16(4):171-9.

Figura 4. Soro humano reativo ao epítopo candidato a vacina inibe a adesão e invasão de várias cepas do estreptococo dogrupo A, à célula HEp2 in vitro.

Adesão - S. pyogenes Inibição Adesão/Invasão, soro humano

S. pyogenes cepas Inibição adesão/invasão%

M5 99,0

M6 99,0

M44/61 98,0

M87 97,0

M1 90,0

M71 e M22 70,0

UFC sem sero > 200.000

Page 81: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

71Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):65-71 Novas Estratégias de Vacinas

8. DAMICO, F.M. et al. T-cell recognition and cytokine profile inducedby melanocyte epitopes in patients with HLA-DRB1*0405-positiveand -negative Vogt-Koyanagi-Harada uveitis. Invest Ophthalmol VisSci, 2005; 46:2465-2471.9. DURANTI, M.A. et al. Trypanosoma cruzi: conformationalpreferences of antigenic peptides bearing the immunodominant epitopeof the B13 antigen. Exp Parasitol., 1999;93(1):38-44.10. FONSECA, S.G. et al. Identification of novel consensus CD4+ Tcell epitopes from clade B HIV-1 whole genome that are frequentlyrecognized by HIV-1 infected patients AIDS, 2006; 20(18):2263-7311. ______. Identification of multiple HLA-A*0201-restrictedcruzipain and FL-160 CD8+ epitopes recognized by T cells fromchronically Trypanosoma cruzi-infected patients.T cells in the localinflammatory infiltrate of Chagas disease cardiomyopathy. Microbesand Infection, 2005; 7:688-697.12. GUILHERME, L. et al. Towards a vaccine against rheumatic fever.Clin. Immunol. Dev., 13: 125-132, 2006.13. HEENEY, J.L. The critical role of CD4(+) T-cell help in immunityto HIV. Vaccine, 2002; 20:1961-63.14. IWAI, L.K. et al. Retro-inverso peptide analogues of Trypanosomacruzi B13 protein epitopes fail to be recognized by human sera andperipheral blood mononuclear cells. Peptides, 22:853-60, 2001.15. ______. T-cell molecular mimicry in Chagas disease: identificationand partial structural analysis of multiple cross-reactive epitopesbetween Trypanosoma cruzi B13 and cardiac myosin heavy chain.2005. J Autoimmun., 24:111-7, 2005.16. ______. In silico prediction of peptides binding to multiple HLA-DR molecules accurately identifies immunodominant epitopes fromgp43 of Paracoccidioides brasiliensis frequently recognized in primaryperipheral blood mononuclear cell responses from sensitized individuals.Mol Med., 9(9-12):209-19., 2003.17. JORDAN REPORT. 20th Anniversary – Accelerated Developpmentof Vaccines. In: Division of Microbiology and Infection Diseases –National institute of Health, 2002, p.1-261.

18. KALAMS, S.A.; Walker, B.D. The critical need for CD4 help inmaintaining effective cytotoxic T lymphocyte responses. J. Exp. Med.,1998; 188(12):2199-204.19. KINLOCH-DE LOES, S. et al. Impact of therapeutic immunizationon HIV-1 viremia after discontinuation of antiretroviral therapy initiatedduring acute infection. J Infect Dis., 2005 Aug 15;192(4):607-17.20. LETVIN, N.L. Progress toward an HIV vaccine. Annu Rev Med.,2005;56:213-23.21. ______. Preserved CD4+ central memory T cells and survival invaccinated SIV-challenged monkeys. Science., 312(5779):1530-3, 2006.22. LOWRIE, D.B. et al. Theraphy of tuberculosis in mice by DNAvaccination. Nature, 1999. 400: 269-271.23. MASCOLA, J.R. et al. Protection of macaques against vaginaltransmission of a pathogenic HIV-1/SIV chimeric virus by passiveinfusion of neutralizing antibodies. Nat Med., 2000 Feb;6(2):207-10.24. MATTAPALLIL, J.J. et al. Vaccination preserves CD4 memory Tcells during acute simian immunodeficiency virus challenge. J. Exp.Med., 203(6):1533-41, 2006.25. OLIVEIRA, S.C. et al. Immunological properties of gene vaccinesdelivered by different routes. Braz. J Med. Biol. Res., 1999, 32: 207-214.26. RIZZO, L.V.; CUNHA-NETO, E., TEIXEIRA, A.R. Autoimmunityin Chagas’ disease: specific inhibition of reactivity of CD4+ T cellsagainst myosin in mice chronically infected with Trypanosoma cruzi.Infect Immun., 57:2640-4, 1989.27. ROSENBERG, E.S. et al. Vigorous HIV-1-specific CD4+ T cellresponses associated with control of viremia. Science, 1997;278(5342):1447-50.28. STURNIOLO, T. et al. Generation of tissue-specific and promiscuousHLA ligand databases using DNA microarrays and virtual HLA class IImatrices. Nat Biotechnol., 1999; 17(6): 555-61.28. TANEJA, V. et al. HLA-DRB1*0402 (DW10) transgene protectscollagen-induced arthritis-susceptible H2Aq and DRB1*0401 (DW4)transgenic mice from arthritis. J Immunol., 2003;171(8):4431-8.

Page 82: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

72

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dra. Cristiana Nascimento-Carvalho.RuaProf. Aristides Novis, No. 105-1201B. 40210-630. Salvador, BA, Brasil.Tel.: 55 71 32357869, FAX: 55 71 33320725. Endereço eletrônico:[email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):72-73.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Globalização e Saúde da CriançaGlobalização e Saúde da CriançaGlobalização e Saúde da CriançaGlobalização e Saúde da CriançaGlobalização e Saúde da Criança

Globalization and Child Health

Cristiana M. Nascimento-CarvalhoFaculdade de Medicina da Bahia da UFBA; Salvador, BA, Brasil

Globalização é o conjunto de transformações de caráter político e econômico que vem acontecendo nas últimasdécadas com abrangência mundial. Tais transformações têm sido acompanhadas de notável aumento na facilidadede comunicação entre as pessoas, assim como na realização de viagens internacionais. Tudo tem gerado mudança nocomportamento humano, resultando em violência, difusão no uso de tóxicos, doenças infecciosas e poluição ambiental.Alteração no padrão alimentar resultando em aumento na prevalência de obesidade e risco de doença cardiovasculartem sido registrado desde a infância. Iniciativas contrárias aos agravos à saúde trazidos pela globalização têm sidotomadas.Palavras-chave: violência, pobreza, obesidade, epidemia, infecção.

Globalization comprises the political and economic transitions in the world during the last decades. An increasing incommunication and international travels has been observed. The human behavior has changed. As a result, violence, toxicabuse, infectious diseases and environment pollution have been increasing. Feeding practices have changed and consequentgreater rates of obesity and cardiovascular disease risk among children and adults have been reported. Measures to containthe negative effects of globalization to health have been performed.Key words: Violence, poverty, obesity, epidemics, infection.

Globalização é o conjunto de transformações na ordempolítica e econômica mundial que vem acontecendo nas últimasdécadas. O ponto central da mudança é a integração dosmercados que passaram a ser explorados por grandescorporações internacionais. Esse processo tem sidoacompanhado por uma intensa revolução nas tecnologias deinformação, como telefones, computadores e televisão. Porisso, os desdobramentos da globalização ultrapassam oslimites da economia e começam a provocar homogeneizaçãocultural entre os países (ANÔNIMO, 2007). Soma-se a essesfenômenos, o progressivo desaparecimento das fronteirasnacionais, que facilita a circulação de número ampliado depessoas (GREENBERG, 2003).

Com a integração mundial e sendo a economia a molapropulsora dos costumes, a valorização da mão de obra maisbarata nos países menos desenvolvidos tem geradodesemprego nos países desenvolvidos. Os países que têm semantido à margem dessa evolução estão enfrentando atraso emiséria crescentes (ANÔNIMO, 2007). Assim sendo, asdesigualdades sociais têm na prática aumentado, a despeitoda maior comunicação e circulação (ANYANGWE, S.C.;MTONGA, C.; CHIRWA, B., 2006). A facilidade das viagensinternacionais é uma característica significativa daglobalização que ajuda a difundir as doenças transmissíveisno século atual (BUSS, 2006). Tal difusão baseia-se no

aumento da amplitude da transmissibilidade dos agentesinfecciosos e no aumento da exposição dos hospedeiros. Oturismo e a exploração sexual de crianças e jovens pobres,habitantes de regiões pobres no mundo, é outro aspecto quevem sendo cada vez mais percebido (BUSS, 2006). Além dasinfecções e da violência, poluição ambiental e difusão detóxicos são outros itens da lista de agravos à saúde associadosà globalização (BERLINGUER, 1999). Em função da quebra defronteiras nacionais, maciça comunicação e homogeneizaçãode cultura, as práticas alimentares tem se modificado, sofrendoforte influência da propaganda e da pressão socioeconômica(GRACEY, 2002). O uso crescente de comidas rápidas,seguindo o padrão industrializado, tem influenciado oscostumes infantis. Aumento conseqüente na prevalência deobesidade e doença cardiovascular, desde a infância, tem sidoregistrado (GRACEY, 2003). Curiosamente, a adesão a novoscostumes tem impedido a transmissão de conhecimento entregerações de uma mesma comunidade, o que por vezes é vitalpara a sobrevivência (McDADE et al., 2007). De fato, oscomplexos determinantes sociais da saúde da criança tem sidoreconhecidos, e entre eles está a globalização (GREENBERG,2003). A organização familiar também está se modificando nomundo globalizado e com isso a forma de cuidar das crianças(FALL, L.; SECK, B., 2003).

O projeto Global Equity in Health, lançado em fevereirode 1996, representou uma reação a tendência que vinhatomando rumo (BERLINGUER, 1999). A formação da AliançaGlobal para Vacinas e Imunização (GAVI) e o acordo TRIPScom acesso universal a medicamentos são iniciativas querepresentam o lado positivo da globalização (MATILDA,2006). Em agosto de 2006, foi aprovada a Declaração do Riode Janeiro, durante o 11º. Congresso Mundial de Saúde

Page 83: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

73Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):72-73 Globalização e Saúde da Criança

Pública; essa Declaração foi uma convocatória àsolidariedade e a responsabilidade globais contra a exclusãosocial e as enormes barreiras e desafios à saúde no mundocontemporâneo (MATILDA, 2006).

Referências

1. ANÔNIMO. O que é globalização. http://www.geniodalampada.com/trabalhos_prontos/ geografia10.htm. Acesso em 21 de dezembro de 2007.2. ANYANGWE, S.C.; MTONGA, C.; CHIRWA, B. Health inequities,environmental insecurity and the attainment of the millenniumdevelopment goals in sub-Saharan Africa: the case study of Zambia. IntJ Environ Res Public Health 3: 217-227, 2006.3. BERLINGUER, G. Globalização e saúde global. Estudos Avançados13: 21-38, 1999.

4. BUSS, P.M. A globalização e a saúde. Opinião (Agência Fiocruz deNotícias), Rio de Janeiro, março 21, 2006.5. FALL, L.; SECK, B. Development of African children: influence ofthe home environment. Med Trop (Mars) 63: 413-421, 2003.6. GRACEY, M. Child health in an urbanizing world. Acta Paediatr 91:14-15, 2002.7. ______. Child health implications of worldwide urbanization. RevEnviron Health 18: 51-63, 2003.8. GREENBERG, R.E. Community pediatrics research. Pediatrics 112:766-769, 2003.9. MATIDA, A.H. Reafirmando compromissos por uma agenda maisampla e solidária pela saúde dos povos. Rev Bras Saúde Materno-Infantil 6: 363-365, 2006.10. McDADE, T.W. et al. Ethnobotanical knowledge is associated withindices of child health in the Bolivian Amazon. Proc Natl Acad SciUSA 104: 6134-6139, 2007.

Page 84: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

74

Grandes Endemias no BrasilGrandes Endemias no BrasilGrandes Endemias no BrasilGrandes Endemias no BrasilGrandes Endemias no Brasil

Great Endemic Diseases in Brazil

Antoniana U. KrettliCentro de Pesquisas René Rachou, Fiocruz; Belo Horizonte, MG, Brasil

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dra. Antoniana U. Krettli. Centro dePesquisas René Rachou, Fiocruz. Av Augusto de Lima 1715, BairroBarro Preto. 30190-002. Belo Horizonte, MG, Brasil. Endereçoeletrônico: [email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):74-78.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

As doenças endêmicas, na sua grande maioria, fazemparte do grupo das doenças negligenciadas que ocorremgeralmente entre populações mais pobres nos trópicos. Entreelas estão algumas doenças parasitárias como malária,leishmanioses, doença de Chagas e as helmintoses(esquistosomose, ancilostomose, filarioses, entre outras).As endemias humanas são responsáveis pela perda potencialde vida saudável, calculada em anos num fator denominadoDALYS, um Daly é igual a um ano de vida potencial perdida,segundo a Organização Mundial da Saúde (WHO, 2002).Esses valores resumidamente são:

VALORES DE DALYS, VIDA POTENCIAL PERDIDA EMANOS, SEGUNDO A OMS, COMO CONSEQUÊNCIA DEALGUMAS DOENÇAS ENDÊMICAS HUMANAS

DALYs total no mundo 1.457.257Doenças infecciosas 359.377HIV/AIDS 88.429Malária 42.280Tuberculose 36.040Filariose linfática 5. 644Leishmanioses 2.357Ancilostomose 1.825Esquitossomose 1.760

Esse marcador econômico, a DALY, mostra que a maláriacontinua sendo a endemia mais importante do mundo.Atualmente, há cerca de 2,4 bilhões de pessoas expostas adoença, sendo 80% na África, onde mais de 2 milhões morrempor ano, a maioria crianças menores de 5 anos.

Os mecanismos de transmissão das endemias humanassão vários, podendo ser por contaminação direta através decontato com o parasito no meio, por veiculação através deoutros organismos vivos (os hospedeiros intermediários comoinsetos hematófagos, moluscos), por transfusão sanguínea(hematozoários causadores da malária e doença de Chagas),por via transplacentária, por ingestão de alimentoscontaminados. Resumidamente, enquanto a maioria dashelmintoses é transmitida por contato direto com parasitos

presentes no solo (ovos de áscaris, larvas de ancilostomídeos)ou na água (larvas de esquistossoma) os protozoários sãoveiculados por insetos, seja através: (i) da picada infectantede mosquitos anofelinos na malária, ou das Lutzomias,pequenos insetos hematófagos conhecidos como “mosquitopalha” no caso das leishmanioses; ou (ii) por contaminaçãocom fezes de “barbeiros” na tripanossomíase americana.

As helmintoses infectam cerca de um bilhão de indivíduos,na sua maioria vivendo em péssimas condições humanas empaises menos desenvolvidos localizados na região tropical. Aesquistossomose é endêmica em 74 países com 600 milhões deindivíduos em risco de infecção, 200 milhões infectados. A maioriados indivíduos é assintomática, outros desenvolvem fibrose ehipertensão periportal, varizes esofagianas até hemorragias letais.A ancilostomose, cujo principal sintoma clínico é a anemia, geradéficit físico, intelectual e cognitivo em crianças com infecçõesmais intensas. Essa importante parasitose, bem como aesquistossomose, poderia ser facilmente evitada unicamenteatravés de medidas básicas de saneamento, com o uso deprivadas para que os ovos dos helmintos, eliminados nas fezes,não tenham contato com o solo ou com a água (no caso daesquistossomose). Medidas terapêuticas e preventivas,acessíveis para ambas as helmintoses, incluem tratamento emmassa com anti-helmínticos, saneamento básico e educação,as quais reduziriam drasticamente sua transmissão bem como ade outras helmintoses inclusive ascaridiose e enterobiose. Nãohá vacinas disponíveis, há algumas em fase de teste.

As medidas preventivas contra essas helmintosesintestinais são simples, sendo em resumo:

• Tratamento com anti-helmínticos;• Saneamento básico.As filarioses, ao contrário das demais helmintoses, são

veiculadas pela picada infectante de mosquitos culicíneosinfectados (os “pernilongos” ou “muriçocas”) com larvas dosfilarídeos. Constituem, portanto, uma exceção entre ashelmintoses humanas, a maioria adquirida por contato diretocom o parasito. As filarioses são de ocorrência elevada naregião amazônica, como a oncocercose (causadora de cegueiraentre populações indígenas por exemplo), enquanto a filariosebancroftiana ocorre em baixas prevalências na amazônia e emalgumas outras regiões do nordeste do Brasil. Ao contrárioda esquitossomose e a ancilostomose, teoricamente de fácilcontrole com as atuais medidas disponíveis de profilaxia, asfilarioses exigem medidas mais complexas por envolver uminseto vetor e serem frequentemente assintomáticas.

Entre as grandes endemias causadas pelos protozoários,focalizaremos a malária, as leishmanioses e a doença de Chagas.

Page 85: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

75Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):74-78 Grandes Endemias no Brasil

A doença de Chagas ou tripanosomíase americana écausada pelo Trypanosoma cruzi, um parasito descoberto noBrasil em 1909, pelo genial Carlos da Cruz Chagas, pesquisadordo Instituto Oswaldo Cruz. Estima-se que a endemia acometamais de 15 milhões de pessoas na América latina, com cerca75-90 milhões expostas a infecção. Segundo Coura (MemóriasIOC, vol 102, Suppl., 2007) inicialmente uma enzootia de animaissilvestres, a doença acometia acidentalmente o ser humano, naforma de uma antropozoonose, quando esse invadia osecótopos silvestres. A doença estabeleceu-se como umaimportante endemia nos últimos 200-300 anos, um resultado daderrubada das florestas e domiciliação dos triatomíneoshematófagos. A transmissão da doença, na maioria dos casos,é através de contaminação com fezes dos insetos eliminadasimediatamente após a picada do inseto ao exercer suahematofagia. Os parasitos eliminados penetram através dasmucosas ou na solução de continuidade da mesma, no local dapicada. Nos últimos anos um importante mecanismo de infecçãotem sido descrito, no qual ocorre contaminação de alimentos,inadequadamente acondicionados antes de serem triturados,macerados junto com insetos naturalmente infectados.

Embora a transmissão domiciliar da doença de Chagasesteja sob controle, no Brasil há cerca de 8 milhões de adultosdoentes na fase crônica, a maioria não tratados. Estima-seque metade dessa população irá desenvolver sintomasimportantes como cardiopatia grave, exigindo implantação demarca-passo, e/ou doença digestiva (mega-cólon, mega-esôfago) ambos de prognósticos sombrios, com freqüentenecessidade de abordagens cirúrgicas. Não há tratamentomedicamentoso ideal da fase crônica. Como a endemia acometesomente a América Latina, existe pouco interesse da indústriafarmacêutica em desenvolver novos medicamentos, umanecessidade urgente porque os poucos fármacos disponíveissão pouco eficazes na cura da doença crônica. Outro problemacrítico ainda não resolvido dificultando o controle da doençaé a ausência de critérios de cura pós tratamento, sendonecessário e urgente o desenvolvimento e a padronização detécnicas para diagnóstico sorológico e controle de cura dospacientes tratados.

As leishmanioses afetam 12 milhões de indivíduos nomundo, enquanto 350 milhões estão em risco de adquirir adoença. No Brasil há mais de um e meio milhão de casosdiagnosticados, cerca de 2.000 casos novos por ano. É asegunda endemia mais importante entre as doençasparasitárias, podendo acometer indivíduos mesmo nos grandescentros onde os vetores existem nas periferias dos mesmos,proliferando no solo úmido e rico em matéria orgânica; o cãorepresenta importante reservatório da doença. Uma zoonosedescrita há mais de cem anos, as leishmanioses ocorrem nasformas tegumentar e visceral, sendo causadas por diferentesespécies de leishmania. A leishmaniose visceral pode ser letalse não tratada, tendo no Brasil o cão e outros canídeos comoprincipal reservatório, depois do homem. Não há vacinasdisponíveis e o tratamento é de longa duração além de sertóxico.

Há numerosos grupos trabalhando na tentativa dedesenvolver vacinas contra as leishmanioses tegumentar e avisceral. Uma dessas vacinas desenvolvida no Brasil,temporariamente liberada pelo Ministério da Agricultura (masnão pelo Ministério da Saúde), foi disponibilizada ecomercializada para vacinação de cães. Existe ainda polêmicaem torno do uso dessa vacina, pois o antígeno vacinal, além deproteger apenas pequena parte da população canina vacinada,gera uma resposta imune humoral (de anticorpos circulantes)que pode ser um fator confusional na interpretação das medidasde endemicidade e de transmissibilidade da enfermidade para oser humano. Outro antígeno vacinal desenvolvido para uso emhumanos, tem sido proposto para ser empregado junto commedicamentos, nos casos de tratamento fracasso de indivíduosresistentes aos medicamentos disponíveis. Nesse caso, háaparente benefício da vacina por gerar uma cicatrização maisrápida das lesões produzidas pelos parasitos resistentes aosfármacos. Devido a enorme contribuição e envolvimento dosgrupos da Bahia no estudo das leishmanioses, sobretudo osgrupos dos Professores Manuel Barral e Edgar M. Carvalho,organizadores e conferencistas desse simpósio, pouca ênfaseserá dada na minha apresentação nas leishmanioses, apesar desua indiscutível importância atual.

A malária humana é conhecida no Ocidente desde 400 AC,onde foi primeiro reconhecida por Hipocrates (Grécia antiga)como uma doença febril periódica, causadora de convulsõese de vísceras pigmentadas. No Oriente, há informações douso de plantas medicinais para tratar febres e outras doençasa milhares de anos, inclusive da Artemísia annua,recentemente redescoberta e da qual se extrai o princípio ativomais importante para tratar malária grave, a artemisinina.Responsável pela dizimação de populações de áreas rurais, atransmissão da malária foi atribuída a picadas de insetos eposteriormente associada aos pântanos, sendo por issodenominada “Mal aire” pelos romanos. Mas apenas a partirdo século 18 ocorreram as grandes descobertas que permitiramcaracterizar a natureza parasitária da doença, numa ordeminteressante porque, primeiro foi descoberto o tratamento dadoença, em 1770 sendo a descoberta do parasito feita cemanos depois. O uso de infusões de cascas de uma plantaPeruana, entre ameríndios no Peru, aparentemente levou osjesuítas espanhóis a propor seu uso para tratar febres inclusiveda nobreza, com sucesso. Posteriormente, levadas pelosEspanhóis, do Novo Mundo para Europa, a planta permitiu oisolamento e caracterização da quinina, princípio ativo dessaplanta, e o controle da endemia que durante milhares de anosdizimava populações. Foi Alphonse Laveran, Médico Militar,que encontrou organismos móveis no sangue de um pacientefebril, que identificou como parasitos. Essa descoberta lheconferiu um Prêmio Nobel mais tarde. A descoberta do vetorocorreu pouco depois (1887) por Donald Ross, Médico MilitarInglês trabalhando na Índia, inicialmente com modelos animaise depois com parasitos humanos. Ross também recebeu oPrêmio Nobel, assim como Paul Müller, Suíço, o descobridorda atividade inseticida do DDT em 1948.

Page 86: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

76 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):74-78Antoniana U. Krettli

Figura 1. Distribuição do T. cruzi no continente americano em hospedeiros vertebrados (homem e animais silvestres) e devetores da doença, triatomíneos hematófagos; ciclo do parasito nesses hospedeiros (http://www.cdfound.to.it/).

O uso do DDT intradomiciliar para controle dos mosquitosvetores, e da cloroquina (composto sintetizado com base noanel quinolínico, da quinina) como profilático e curativo,permitiu o inicio da Campanha de Erradicação da Malária em1955. No entanto, essa campanha foi interrompida nos anossetenta devido à emergência e grande dispersão de parasitosP. falciparum resistentes a cloroquina, em todo o mundo.

O ciclo dos parasitos da malária é complexo (esquemaabaixo) se iniciando quando os esporozoítos são inoculadospela picada do mosquito vetor na pele do vertebrado. Oprincipal vetor da malária humana no Brasil é o mosquitoanofelino da espécie An. darlingi que apesar de sua grandeantropofilia (prefere se alimentar em seres humanos) é muitomenos suscetível a malária do que o An gambiae, principalvetor da malária no continente africano, onde ocorre a maláriamais grave e o maior número de óbitos no mundo causadospelo P. falciparum. Há várias outras espécies de anofelinosvetores da malária na Amazônia legal onde a doença é endêmicasendo difícil ali o controle vetorial pelas condições ambientaise abundância de criadouros na área.

Os esporozoítos inoculados sofrem a primeira evoluçãono fígado, para depois iniciar o ciclo esquigônicointraeritrocítico; no sangue também circulam os gametócitos,os quais, se ingeridos pelo mosquito suscetível, iniciam ociclo esporogônico, culminando com a formação deesporozoítas nas glândulas salivares, os quais iniciam um novociclo se inoculados pela picada em um hospedeiro nãoinfectado. Há quatro espécies que parasitam o homem, oPlasmodium vivax, P. falciparum, P. malariae, P. ovale, apenasa última não existe no Brasil.

O P. falciparum, a espécie mais patogênica, causadora damalária cerebral grave letal para indivíduos primoinfectadosnão tratados, é altamente polimórfico e dotado de uma grandecapacidade de adaptação. Enquanto o tratamento do P. vivax(espécie mais prevalente no Brasil) é feito com cloroquina eprimaquina (para evitar recaídas tardias conseqüentes dareativação do hipnozoitas remanescentes no fígado), sãonecessárias associações de fármacos para tratar os casos deP. falciparum resistentes aos antimaláricos. São várias aslimitações dos antimaláricos disponíveis para esse tratamento,algumas das quais resumidas no quadro abaixo.

LIMITAÇAO DOS ANTIMALÁRICOS DISPONÍVEISSEGUNDO A OMS

Cloroquina ......................... ResistênciaAmodiaquina ..................... Toxicidade, ResistênciaQuinina .............................. Desistência, Toxicidade,

ResistênciaMefloquina. ........................ Custo, Resistência, ToxicidadeHalofantrina ....................... Custo, Resistência, ToxicidadeArtemisinina ....................... Desistência, Toxicidade, CustoSulfadoxina ........................ ResistênciaAtovaquoneproguanil ....... ResistênciaLumefantrina ...................... Desistência, Resistência, Custo

O mapa da distribuição dos parasitos resistentes aosantimaláricos, segundo a OMS (Figura 2), mostra que esse éum problema mundial importante, exigindo a pesquisaconstante de novos fármacos mais potentes. Como a

Page 87: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

77Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):74-78 Grandes Endemias no Brasil

Figura 2. Distribuição mundial da malária (em azul) e das áreas onde ocorre resistência do P. falciparum. Em branco, áreas ondenão ocorre transmissão da doença, em azul escuro áreas de maior risco de transmissão da doença.

Figura 3. Incidência parasitária anual da malária no Brasil ede casos autóctones de malária.

quimioterapia medicamentosa continua sendo a arma mais eficazno controle da malária, a busca de novos antimaláricos temsido intensificada. Na maior parte das áreas endêmicas a maláriacontinua em expansão, inclusive no Brasil. A terapia combinadarecomendada pela OMS nos casos da malária grave contém emgeral o sal de artemisinina, um derivado da planta medicinalchinesa, Artemisia annua; mas já há relatos de resistênciacontra esse fármaco, inclusive na América latina.

Nosso grupo tem se dedicado ao estudo da atividadeantimalárica de plantas medicinais e de outras plantasbrasileiras, na busca de novos antimaláricos (KRETTLI et al.,Memórias IOC, 2001; Ciência Hoje 2004) utilizando comomodelos formas sanguíneas do P. falciparum in vitro ou do P.berghei em camundongos. Mais recentemente estudamostambém novas moléculas obtidas por síntese e combinaçõesentre antimaláricos e/ou antibióticos (ANDRADE et al., EJP2007). Esperamos encontrar compostos inéditos e obterfármacos mais eficazes contra parasitos resistentes àcloroquina, mefloquina e artemisinina. Caracterizamos diversosprincípios químicos muito ativos, alguns dos quais protegidospor patentes internacionais e nacionais com nossoscolaboradores, num projeto multidisciplinar de longa data.

A Amazônia legal concentra hoje 99,5% dos casos anuaisregistrados, cerca de 600 mil em 2005. Fora da Amazônia háfocos de malária devido às migrações internas. Dezenas denovos casos por vezes ocorrem antes de se caracterizar aetiologia da doença, sobretudo nos focos de P. vivax, causadorda febre terçã benigna. As áreas de risco de transmissão damalária no Brasil e focos com casos de transmissão autóctone,fora da região amazônica, estão ilustrados na Figura 3.

A série histórica dos casos de malária no Brasil está naFigura 4 e as espécies diagnosticadas pelos técnicos doMinistério da Saúde na Figura 5 (www.saude.gov.br/svs).

Nos últimos anos houve progressos substanciaisresultado dos grandes financiamentos de agências privadase públicas no estudo de novos fármacos e de vacinas contraa malária. No entanto, não há vacinas disponíveis apesar dascentenas de antígenos vacinais já testados em animaisexperimentais, dezenas deles também usados em ensaios pré-clínicos e clínicos nas áreas endêmicas. Recentemente, cercade quatro mil crianças menores de dois anos foram vacinadasnas áreas endêmicas da África (Moçambique), num projeto

Fonte: SIVEP-Malária, Sinan/SVS/MS.

Page 88: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

78 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):74-78Antoniana U. Krettli

Figura 4. Série histórica dos casos de malária no Brasil(organizados por FONTES, C.J., UFMT).

Figura 5. Número de casos de malária conforme as espécies,segundo o Ministério da Saúde.

multinacional com dezenas de parcerias (ALONSO et al.,Lancet, 2006 e 2007). A vacinação resultou em proteçãocontra a malária medida pela reduzida mortalidade, menorincidência da doença grave, menor intensidade dossintomas da malária bem como menor prevalência dadoença. No entanto, nenhuma das vacinas testadas contramalária no campo até o momento preveniu a infecçãohumana ou gerou uma resposta protetora de longa duração.

A utilização de tecnologias da genômica e bioinformáticadeve contribuir para a descoberta de alvos específicos contraos parasitos da malária, além da obtenção de métodos rápidose mais eficazes de diagnóstico, de novos inseticidas, bemcomo protocolos de manipulação genética dos vetores dadoença. O genoma do Plasmodium falciparum, principalresponsável pela malária cerebral e pelas mortes resultantesda endemia humana, está totalmente seqüenciado, comotambém está o do An. gambiae, principal transmissor damalária no continente africano. Esse conhecimento deverámudar profundamente as abordagens usadas na busca demecanismos de controle da doença, na obtenção de novosantimaláricos e nas técnicas de intervenção da transmissãoda doença.

Os países mais ricos (G8) recém criaram um fundo (GlobalNetwork) visando combater as principais endemias humanasnos trópicos (malária, HIV-AIDS e outras infecçõesparasitárias e bacterianas) através da coordenação deatividades integradas para medidas de controle dessasdoenças. A proposta é criar-se uma “vacina contra a pobreza”com conseqüentes mudanças das políticas públicas desaúde. Essas, sem dúvida, fazem parte do caminho desoluções definitivas para controlar as endemias, difíceis noBrasil, onde o modelo de desenvolvimento desigualconcentra bens e riquezas numa minoria, enquanto a maioriada população empobrece. Apesar das tecnologias adequadasavançadas, e mesmo se vacinas específicas foremconstruídas com sucesso, suas aplicações só serãopossíveis com a erradicação da pobreza. Antígenos vacinaispoderosos teriam pequeno impacto sem a possibilidade desua aplicação controlada entre as populações pobres, asmais afetadas. Isso significa ter de se substituir políticascompensatórias, atualmente adotadas, por políticas deemprego e de melhoria salarial, menores diferenças entre asclasses sociais e melhor acesso a saúde e a educação pelaspopulações mais pobres.

As recomendações para melhorar o controle das grandesendemias no nosso meio, em resumo, são: (i) acesso aodiagnóstico rápido e eficaz; (ii) tratamento adequado,atualmente precário nas leishmanioses e na doença de Chagasporque os fármacos disponíveis são tóxicos; e na malária ondehá resistência medicamentosa; (iii) desenvolver novosquimioterápicos urgentemente para tratar a malária, asleishmanioses, e, a doença de Chagas; (iv) acesso as medidasbásicas de saúde e a educação; (v) investimento na pesquisae na tecnologia – transferir a ciência em produto depende degrandes investimentos.

Figura 6. Ciclo da malária (adaptado de RICHIE & SAUL,Nature, 415, 2002) e alvos dos antimaláricos.

700

600

500

400

300

200

100

0

P. falciparum P. vivax Positivos

Cas

es (*

1000

)

Page 89: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

79Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):63-67 Grandes Endemias no Brasil

Dengue e Pandemias viraisDengue e Pandemias viraisDengue e Pandemias viraisDengue e Pandemias viraisDengue e Pandemias virais

Dengue and Pandemic Viral Diseases

Luiz Tadeu Moraes FigueiredoCentro de Pesquisa em Virologia, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (USP); Ribeirão Preto, SP, Brasil

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. Luiz Tadeu Moraes Figueiredo. Centro de Pesquisa em Virologia, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP.Av. Bandeirantes, 3900. 14049-900. Ribeirão Preto, SP, Brasil. Endereço eletrônico: [email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):79. © 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Os vírus emergentes e ligados a pandemias possuemgrande capacidade de adaptação e devem surgir com maiorfreqüência nos próximos anos. São, em sua maioria, zoonóticos,e sob influência de alterações ambientais e climáticas, namaioria das vezes causadas pela ação humana, costumamadaptar-se a novos ciclos naturais mantenedores, os quais,por sua vez, facilitam maior freqüência de infecções humanas.Também, o transporte é importante fator na emergência depandemias. Este pode dar-se por seres humanos infectados,conseqüência da enorme intensificação e rapidez das viagensno mundo atual ou, até mesmo, por aves migratórias virêmicas.Assim, estes vírus, introduzidos em locais distantes daquelesonde ocorrem habitualmente, se espalham rapidamente. Ainda,contribui para a emergência de vírus pandêmicos, o aumentoda população humana mundial, acometendo, especialmente,pessoas vivendo em condições precárias, inclusive, emconvívio com animais infectados. Os vírus pandêmicos sãotransmitidos por artrópodos hematófagos (ex: Dengue, Oestedo Nilo, Chikungunya) ou por via respiratória (ex: Influenza).Estes vírus armazenam seus genomas em fitas simples de RNAe estão em constante mutação causada por suas polimerasesque, ao transcreverem os RNAs da progênie, fazem freqüenteserros na incorporação de nucleotídeos à cadeia ou, pelainfecção simultânea por mais de um vírus, gerando mutantesque recombinam partes do genoma de cada um dos infectantes.A capacidade de mutar e evoluir dos vírus pandêmicos estádiretamente ligada ao potencial de adaptação.

Os Flavivirus do dengue, originaram-se de uma zoonosede primatas do sudeste asiático, evoluindo, em algumas

centenas de anos, para os 4 tipos que conhecemos hoje,mantidos em ciclo humano com participação de mosquitoaltamente antropofílico, o Aedes aegypti, que, inclusive, podetransmitir o vírus diretamente às suas próximas gerações. Hápelo menos 20 anos o dengue é endêmico no Brasil, atualmentecom 3 tipos circulando e 1 na eminência de ser introduzido. Jácausou milhões de casos em centenas de epidemias que temse sucedido em todas as regiões do país. Entretanto, estavirose mantêm característica emergente quanto a novasapresentações clínicas e também, ligada a uma progressivainfantilização da febre hemorrágica/síndrome de choque dodengue no país. O Flavivírus do Oeste do Nilo foi introduzidoa partir do Velho Mundo, em 1999, na América do Norte, tendocausado milhares de casos de encefalite com mais de 1000óbitos. Transportado, provavelmente, em aves migratórias,chegou à América do Sul em 2006 e é altamente provável suaintrodução no Brasil. O Alphavirus chikungunya se espalhounos últimos 2 anos, a partir da África, via Oceano Índico, porgrande parte da Ásia, causando pandemia com milhões decasos na Índia. A introdução de indivíduos virêmicos já levoua surtos de febre do Chigungunya, em 2007, na Itália e também,o vírus já foi detectado em pelo menos 30 viajantes na Guyanafrancesa. Portanto, a introdução deste vírus na América doSul é provável e sua transmissão em cidades infestadas peloAedes aegypti levaria a grandes epidemias. Quanto aoOrthomyxovirus da influenza aviária H5N1, este tem seespalhado progressivamente pelo mundo e deve chegar aoBrasil. Resta saber o grau de adaptação à transmissão inter-humana dos vírus que aqui serão introduzidos.

Page 90: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

80

Doenças Negligenciadas: Doenças MicobacterianasDoenças Negligenciadas: Doenças MicobacterianasDoenças Negligenciadas: Doenças MicobacterianasDoenças Negligenciadas: Doenças MicobacterianasDoenças Negligenciadas: Doenças Micobacterianas

Neglected Diseases: Mycobacterial Diseases

José R. Lapa e SilvaFaculdade de Medicina/Universidade Federal do Rio de Janeiro; Rio de Janeiro, RJ, Brasil

As duas mais antigas Faculdades de Medicina do Brasil, a Faculdade de Medicina da Bahia e a Faculdade deMedicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) completam seu Bicentenário em 2008. Ambas têm umalonga tradição de ensino e pesquisa em tuberculose (TB), uma doença negligenciada, como a hanseníase e amalária. Nos últimos 15 anos, a Unidade de Pesquisa em TB da UFRJ tem-se empenhado em suplantar estanegligência. Contribuiu para a criação da Rede Brasileira de Pesquisa em TB e estabeleceu parcerias comUniversidades no Brasil e nos Estados Unidos, que permitiram o avanço do conhecimento em muitos campos,inclusive nos mecanismos de desenvolvimento da doença. Um dos aspectos mais intrigantes da patogenia da TB é oestado de imunossupressão relativo que acompanha seu desenvolvimento. Portadores de TB apresentam inibição daproliferação de linfócitos T, produção reduzida de IL-2 e ausência de reatividade cutânea à tuberculina. Evidênciasclínicas e experimentais sólidas indicam que IL-10 e TGF-βββββ desempenham um papel importante nesta alteraçãofuncional. O complexo milieu de citocinas existente nos tecidos infectados pelo Mycobacterium tuberculosis,particularmente nos pulmões, influencia a expressão de moléculas co-estimulatórias e de moléculas MHC ClasseII, interferindo no desfecho da resposta imunitária contra o bacilo. Tais idéias levaram nosso grupo a desenvolveruma estratégia de pesquisa para entender a cinética da participação de citocinas imuno-regulatórias, desde a fase dediagnóstico da infecção ativa, durante e ao final da quimioterapia específica, através do escarro induzido seriado.Palavras-chaves: doenças negligenciadas, tuberculose, imuno-regulação, citocinas, receptores.

The two oldest Schools of Medicine in Brazil, Faculdade de Medicina da Bahia and Faculdade de Medicina of theUniversidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) celebrate their Bicentennial in 2008. Both have a long tradition inteaching and research in tuberculosis (TB), a neglected disease as leprosy and malaria. Over the last 15 years, the TBResearch Unit/UFRJ has worked to overcome this neglect in Brazil. It contributed to the creation of the Brazilian TBResearch Network and established partnerships with Brazilian and US Universities that resulted in new information inmany fields related to TB, including its pathogenesis. One of the most intriguing aspects of TB pathogenesis is the state ofrelative immunosuppression that accompanies the development of the disease. TB patients suffer inhibition of T lymphocyteproliferation, reduced secretion of interleukin-2 and inhibition of skin reactivity to tuberculin. Sound clinical andlaboratory evidences indicate that IL-10 and TGF-βββββ have important role in this dysfunctional immune state. The complexmilieu of cytokines present locally in tissues infected by Mycobacterium tuberculosis particularly in the lungs influencethe expression of costimulatory MHC Class II molecules, interfering in the outcome of the immune response against thebacilli. Such ideas lead our group to develop a strategy to understand the kinetics of participation of immune regulatorycytokines in the lungs of TB cases, from the early phase of diagnosis to the end of anti-TB treatment, using serial sputuminduction.Key words:Neglected diseases, tuberculosis, immune regulation, cytokines, receptors.

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. José R. Lapa e Silva. LaboratórioMultidisciplinar de Pesquisa, Hospital Universitário Clementino FragaFilho/UFRJ, Avenida Professor Rodolpho Paulo Rocco, 255, Ilha doFundão, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. 21951-913. Telefone/FAX – 55 212562-2669. Endereço eletrônico: [email protected] Instituto do Milênio CNPq 420121/2005-6,FAPERJ E-26/152.469/2002, Fogarty International Center-NIH(AITRP-D43 TW00018, ICOHRTA-5 U2R TW006883).

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):80-85.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Bicentenário da FAMEB

É com emoção e orgulho que me associo às celebraçõesdo Bicentenário da Faculdade de Medicina da Bahia(FAMEB), em 18 de fevereiro de 2008, no bojo dascomemorações dos 200 anos da chegada da Família RealPortuguesa ao Brasil em 1808. Esta data marca também o

início do Ensino Superior no país. Mais um grande motivode minha enorme alegria é também a coincidência de outrascomemorações, os 200 anos da Faculdade de Medicina daUniversidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), à qual estouassociado desde 1968, a ser celebrado em 5 de novembro de2008, e os 30 anos do Hospital Universitário Clementino FragaFilho/UFRJ, no dia 01 de março de 2008.

A Escola de Cirurgia do Rio de Janeiro foi criada por CartaRégia em 05 de novembro de 1808, com a nomeação doCirurgião Joaquim José Marques como Lente do Curso deLigaduras, Partos e Operações de Cirurgia. Desde então teveos nomes de Academia Médico-Cirúrgica, Faculdade deMedicina do Rio de Janeiro, Faculdade de Medicina daUniversidade do Rio de Janeiro, Faculdade Nacional deMedicina da Universidade do Brasil e desde 1965, Faculdadede Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro(GOMES, M.M.; VARGAS, S.S.M.; VALLADARES, A.F.,

Page 91: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

81Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):80-85 Doenças Negligenciadas – Doenças Micobacterianas

2001). Mas para gerações de médicos formados nos últimos50 anos, ela sempre será a Nacional de Medicina.

Doenças Micobacterianas Neglicenciadas

Coube-me, nesta seleta mesa-redonda sobre DoençasNegligenciadas, o tema Doenças Micobacterianas. O termodoenças negligenciadas é geralmente utilizado para as doençasde alto impacto social em grande parte do planeta, mas que,por tipicamente afetar países em desenvolvimento, e nestes,as populações mais empobrecidas, não desperta o interesseda indústria farmacêutica e de insumos biológicos, e mesmodos meios acadêmicos. O termo Doenças Negligenciadas seaplica, por exemplo, para três das doenças infecciosas de maiorprevalência no mundo, a tuberculose, a hanseníase e a malária.As duas primeiras são provocadas por espécies do gêneroMycobacterium, tema desta conferência.

A hanseníase, ou Morbus Hansen (MH), é longamenteassociada à história da humanidade. No início da 2007, aprevalência global de MH permanecia em 225.000 casos,enquanto em 2006 foram detectados cerca de 260.000 casos, umdecréscimo de cerca de 13% em relação ao ano anterior (WHO,2007a). A terapia com fármacos combinados e dispensados degraça, o acesso à informação e aos meios diagnósticos permitirameste decréscimo importante do número de casos. A meta é aeliminação da doença como um problema de saúde pública,definida como uma prevalência inferior a 1 caso por 10.000habitantes. O Brasil continua ainda um dos locais de altaendemicidade da doença, particularmente na Região Amazônica.

Nos últimos 30 anos tenho-me dedicado à pesquisa etreinamento de recursos humanos em tuberculose e é sobre elaque me disponho a falar hoje. Passados 125 anos da descriçãodo agente etiológico por Robert Koch, a tuberculose continua aassombrar a humanidade. Os dados estimados para 2005 relativosà incidência, prevalência e mortalidade globais foram de 136, 217e 24 casos por 100.000 habitantes, respectivamente (WHO, 2007b).Ocorreram naquele ano mais de 8.800.000 casos novos e 1.500.000mortes totalmente evitáveis. O Sudeste da Ásia, Pacífico Ocidentale a África contribuem com 88% dos casos. Apesar das Américasapresentarem apenas 4% dos casos do mundo, o Brasil e o Perunotificaram 50% dos casos do Hemisfério Ocidental, sendo nossopaís colocado em 16º. lugar entre os 22 países que apresentam80% dos casos de tuberculose. Desde 1993 a tuberculose foideclarada uma emergência sanitária global pela OrganizaçãoMundial da Saúde (KRITSKI et al., 2006). Até então, pouquíssimaatenção era dada a esta doença pela academia, indústria eorganismos multilaterais. Soma-se a isso, particularmente no Brasil,o desmantelamento dos serviços de saúde no inicio dos anosNoventa, com a implantação de políticas neo-liberais pelo GovernoCollor e também como conseqüência da Reforma Sanitária.

A Luta contra a Negligência no Combate à Tuberculose

A Universidade Federal do Rio de Janeiro, assim como aUniversidade Federal da Bahia, tem uma longa tradição de

estudo da tuberculose, vindo desde os anos 30 do séculoXX. Um famoso médico baiano emigrado para o Rio de Janeiro,Prof. Clementino Fraga, tinha grande interesse pelo estudo daTisiologia. Dois dos seus filhos fizeram brilhante carreiraacadêmica, Clementino Fraga Filho, decano da Faculdade deMedicina e que preside, do alto dos seus 90 anos, ascelebrações pelos 30 anos do hospital que leva o seu nome, eProf. Helio Fraga, brilhante tisiologista e que muito contribuiupara recolocar a tuberculose no mapa. Em 1957, a entãoUniversidade do Brasil criou o Instituto de Tisiologia ePneumologia para abrigar a primeira Cátedra de Tisiologia doBrasil, ocupada após brilhante concurso em 1951 peloProfessor Antonio Ibiapina. A ele sucedeu o Prof. NewtonManhães Bethlem, já no Hospital Universitário ClementinoFraga Filho, grande Tisiologista e meu mentor. Ao aluno coubea honra de suceder o mestre, quando assumi o cargo deProfessor Titular da Disciplina de Pneumologia em 1997.

Mas antes disso, ao retornar ao Brasil em 1993 após longosanos na Europa, convidei o então jovem Tisiologista AfrânioKritski a se transferir do Instituto de Tisiologia e Pneumologiapara o Hospital Universitário, a fim de que pudéssemosorganizar um setor de pesquisa em tuberculose, praticamenteinexistente então no Rio de Janeiro. Pretendíamos assimterminar com a negligência que cercava a tuberculose, pelomenos em nossa Universidade. Para isso contamos com oapoio de um outro personagem profundamente ligado à Bahia,o Prof. Warren D. Johnson, Jr., Professor de Medicina Tropicalda Universidade Cornell de New York e Doutor Honoris Causada FAMEB/UFBA. Outros dois colegas da Cornell, Dr. Lee W.Riley, hoje em Berkeley, e Dr. John L. Ho foram também parceirosnesta empreitada. Ainda em 1993 iniciamos uma profícuacolaboração que persiste até hoje. Em 1995, criamos a Unidadede Pesquisa em Tuberculose do HUCFF/UFRJ e já em 1997começamos a participar de projetos financiados pelosNational Institutes of Health dos Estados Unidos, em parceriacom a Cornell, como AITRP, ICIDR, em parceria com aUniversidade Johns Hopkins, e ICOHRTA, agora emassociaçào com Cornell, Johns Hopkins e Berkeley.

Mas a mais importante das nossas iniciativas foi afundação, em 2001, da Rede Brasileira de Pesquisa emTuberculose, REDE-TB, organização que reúne 170pesquisadores de todas as áreas do conhecimentointeressados em tuberculose. A missão da REDE-TB é acapacitação científica e tecnológica no país para odesenvolvimento de novas tecnologias e produtos e colaborarna revisão de políticas públicas necessárias ao controle datuberculose. O fulcro da atividade é a geração e difusão deconhecimentos em tuberculose. Como nas colaborações comas universidades americanas, a pesquisa norteia ações deformação de recursos humanos, nas áreas de pós-graduaçãotanto stricto sensu como lato sensu. Desde 2002 exerço afunção de coordenador da área de recursos humanos daREDE-TB, com a missão de formar recursos humanos de altonível para o controle da tuberculose. O modelo de intervençãoda Coordenação de Recursos Humanos da REDE-TB é o

Page 92: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

82 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):80-85José R. Lapa e Silva

modelo piramidal, em quatro níveis, sendo a base compostade atividades de motivação para a pesquisa, de onde serãorecrutados os candidatos à formação nos demais níveis,chegando até o topo, destinado aos cursos de pós-graduaçãoformais.

O mesmo modelo foi empregado na proposta vitoriosaque competiu para o programa ICOHRTA AIDS/TB(International Clinical, Operational, and Health ServicesResearch Training Award for AIDS and Tuberculosis)financiado pelo Fogarty International Center/NIH, que visadesenvolver treinamento em pesquisa multidisciplinar emAIDS e TB. Nos primeiros dois anos do projeto, de outubrode 2005 a dezembro de 2007 foram treinados 959 alunos nosdiversos níveis.

Resultados das diversas ações descritas acima nãotardaram a aparecer. Estudo recentemente publicado por nossogrupo (KRITSKI et al., 2007) demonstrou um aumento donúmero de tese e artigos indexados tendo tuberculose comotema principal nos últimos anos. Buscamos artigos indexadosno Medline e no Scielo contendo a palavra tuberculose eautores afiliados a instituições brasileiras, bem comodissertações e teses no banco da CAPES. Houve dois marcosno número de artigos internacionais: um em 1995, quandopassaram de 10/ano, e 2000, quando passaram de 30/ano. Aspublicações, essencialmente relatos de caso e revisõesinicialmente, passaram a incluir artigos originais em ciência,tecnologia e inovação científica. Estas mudanças podem refletiro incremento das atividades de pesquisa nas instituiçõesacadêmicas e novas atitudes relativas aos objetivos dapesquisa em tuberculose nos últimos anos.

Apesar de um grande incremento nos investimentos empesquisa em tuberculose desde meados da década passada,seja por organismos governamentais, multilaterais e grandesfilantropos, a indústria farmacêutica permanece praticamenteausente do cenário da pesquisa em TB (FEUER, 2006). Estima-se que sejam necessários investimentos da ordem de 9 bilhõesde dólares pelos próximos dez anos para compensar o atrasocientífico, e sem a indústria tal nível de investimento não seráatingido.

Além das atividades políticas e organizacionais descritasanteriormente, as colaborações com a Universidade Cornellresultaram em avanços do conhecimento na área deimunopatogenia da tuberculose pulmonar e na genéticamolecular da micobactéria. A limitação de tempo não mepermitirá abordar estas duas áreas em profundidade, assimvou me ater nesta parte final aos resultados envolvendo osestudos de imunologia pulmonar.

Imunopatogenia da Tuberculose Pulmonar

O Mycobacterium tuberculosis (M.tb.) infectaaproximadamente um terço da população mundial, porém ainfecção não significa necessariamente que o indivíduo vádesenvolver a forma ativa da doença, permanecendo assim,em mais de 80% dos casos, em estado de latência

(“dormência”). Este enorme reservatório de pessoasportadoras da forma latente da doença constitui um desafio àsaúde pública mundial para o qual até hoje não há perspectivade solução. É deste reservatório que sairão os casos ativos econtagiosos, que perpetuarão o ciclo da infecção-doença-infecção. A TB continuará a assombrar, assim, a humanidadepelos próximos decênios. Várias razões contribuem para estarealidade. A primeira e mais importante é sua associação comas baixas condições sócio-econômicas da maioria dos seusportadores e das nações onde eles vivem. Apesar da doençater distribuição mundial e de todas as nações notificarem casosde tuberculose, mais de 80% destes casos se concentram em22 países, como citado anteriormente, todos com renda médiaou baixa, no conceito do Banco Mundial. Nestes países, agrande maioria dos casos, por sua vez, ocorre em pessoasabaixo da linha de pobreza.

A resistência natural contra a TB parece estar relacionadacom a maior ou menor velocidade com que o hospedeiroinfectado é capaz de desenvolver sua resistência adquirida.Os fatores que diminuem a capacidade de desenvolverresistência ao M.tb são a desnutrição, o alcoolismo, a silicose,o diabetes melito, a paracoccidioidomicose, a gastrectomia eas condições de imunossupressão por doenças ou drogas(KRITSKI et al., 2006). Em granulomas de pacientes comtuberculose latente, há uma predominância de citocinas dotipo 1 (Th1), com grande expressão de interferon-gama (IFN-γ), Fator de Necrose Tumoral alfa (TNF-α), Interleucina 1-beta (IL-1β) e enzimas como Óxido Nítrico Sintase Indutível(NOS2 ou iNOS), e baixa expressão de IL-4. Estascaracterísticas são fundamentais para a indução e manutençãoda latência. A tuberculose pode tornar-se reativa devido auma falta de ativação dos macrófagos pelo IFN-γ (ARRIAGAet al., 2002).

Um dos aspectos mais intrigantes da patogenia da TB é oestado de imunossupressão relativo que acompanha odesenvolvimento da forma ativa da TB. Enquanto a grandemaioria de indivíduos infectados, mas não doentes, exibe umaforte reação de hipersensibilidade retardada aos antígenos deM.tb., pacientes com a forma ativa da TB apresentam inibiçãoda proliferação de linfócitos T, produção reduzida de IL-2 eausência de reatividade cutânea à tuberculina ou anergiatuberculínica (ELLNER, 1978; SCHAUF et al., 1993; SENDIDEet al., 2005). Evidências clínicas e experimentais sólidasindicam que IL-10 e Fator de Transformação e Crescimentobeta (TGF-β) desempenham um papel importante nestaalteração funcional (HIRSCH et al., 1996; MURRAY, P.J.;YOUNG, R.A., 1999). Um outro aspecto relacionado àimunodepressão relativa nos casos ativos de TB é adiminuição de expressão do antígeno leucocitário humano(HLA)-DR e de CD86 em macrófagos e células dendríticas(APCs). O complexo milieu de citocinas existente localmentenos tecidos infectados pelo M.tb. influencia a expressão demoléculas co-estimulatórias e de moléculas do ComplexoPrincipal de Histocompatibilidade (MHC) Classe II,interferindo de modo significativo no desfecho da resposta

Page 93: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

83Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):80-85 Doenças Negligenciadas – Doenças Micobacterianas

imunitária contra o bacilo. A presença de níveis localmenteaumentados de IL-10 poderia favorecer o estabelecimento dedisfunção imune nos tecidos infectados pelo bacilo,resultando em regulação negativa da expressão de moléculasMHC Classe II (SENDIDE et al., 2005) e de CD86, CD40 eCD54 (BARRERA et al., 2004) em APCs. Este fenômeno foiaté mesmo observado em voluntários normais portadores deinfecção tuberculosa latente (indivíduos PPD+) (BARRERAet al., 2004). Evidências oriundas de modelos animais indicamque diferentes espécies micobacterianas podem inibir aexpressão de MHC Classe II (FULTON, S.A.; REBA, S.M.;PAI, R.K., 2004) e CD86 (BONATO et al., 2001) em macrófagos.Já a ativação da sinalização via CD40 em APCs torna a respostaantimicobacteriana mais ativa (DEMANGEL et al., 2001). Aocontrário, a ausência de engajamento adequado de CD28 ou aativação aumentada de CD152 poderia tornar a célula Tanérgica e contribuir para a disfunção imune relativa (SHARPE,A.H.; FREEMAN, G,J., 2002).

Existem indícios de que a imunossupressão tenha a vercom a capacidade do Mycobacterium de manipular a reaçãoimune do hospedeiro a seu favor, funcionando como ummecanismo de evasão que permite ao bacilo se estabelecer etambém evoluir para a forma ativa da doença. A proteção imunecontra a tuberculose envolve vários elementos da imunidadecelular, especialmente os macrófagos e os linfócitos T, quedesempenham um papel crítico em limitar a infecção porMycobacterium tuberculosis. No entanto, vários fatores quemediam a suscetibilidade e a resistência específica àmicobactéria permanecem desconhecidos. O papel decitocinas no milieu local de desenvolvimento da infecção écentral ao processo, visto que as funções dos macrófagos elinfócitos T são influenciadas por elas. Há muito se sabe que,em modelos experimentais de tuberculose em camundongos,o controle da carga bacilar infectante se segue aodesenvolvimento de clones de linfócitos T CD4+ que produzemIL-2, capaz de induzir proliferação e ativação de outroslinfócitos T e de interferon-γ, que induz a ativação dosmecanismos microbicidas intra-celulares dos macrófagos(ORME et al., 1993). Várias evidências da literatura tambémindicam que tais mecanismos são atuantes nos humanos(GEROSA et al., 1999). Pelo menos no modelo murino, omecanismo de controle intra-celular da micobactéria envolvea regulação positiva da enzima iNOS, que produzintermediários reativos de nitrogênio, altamente eficazes contraa micobactéria (DARWIN et al., 2003). Nosso grupo foi oprimeiro a demonstrar a expressão funcional da isoformainduzível da sintase do óxido nítrico in situ nos pulmões deportadores de tuberculose ativa, mas o papel desta enzima nocontrole da tuberculose em humanos permanece a serelucidado (NICHOLSON et al., 1996). A importância do IFN-γno controle da tuberculose em humanos tem sido atestadapela grande suscetibilidade à infecção por micobactérias empessoas que apresentam uma mutação em um doscomponentes do receptor para IFN-γ que o torna disfuncional(JOUANGUY et al., 1996). Portanto, um elemento chave da

resposta protetora contra a tuberculose envolve a secreçãosincronizada de citocinas pró-inflamatórias, como TNF-α ecitocinas do eixo IFN-γ/IL-12/IL-23 (KINDLER et al., 1989;OTTENHOFF et al., 2005; SALGAME, 2005). Isto é bemevidente pelo aumento na suscetibilidade às micobacteriosesou TB ativa em indivíduos tratados com antagonistas de TNF-α ou naqueles contendo mutações em genes essenciais àsfunções efetoras imunes, como IFN-γ, IL-12, NRAMP1, TLR2e MCP-1 (CARAGOL et al., 2003; FLORES-VILLANUEVA etal., 2005; GREENWOOD et al., 2000; MALIK, 2005; OGUS etal., 2004). Para proteger contra excesso de dano motivado porestas citocinas pró-inflamatórias, a secreção de citocinas comação anti-inflamatória como TGF-β e IL-10 é essencial noprocesso. No entanto, se estas citocinas anti-inflamatóriasestiverem desproporcionalmente representadas no início doprocesso imune anti-tuberculose, elas poderão contribuir paraa supressão da resposta protetora, mesmo na presença dascitocinas pró-inflamatórias. As interações que sustentam aimunidade não-esterilizante permanecem, no entanto,desconhecidas. Estudos com células imunes do sangueperiférico sugerem que em indivíduos saudáveis com TBlatente as células respondem a antígenos de M. tuberculosiscom produção de IFN-γ, enquanto células de portadores deTB ativa têm uma resposta predominantemente Th0 ou Th2(ROOK, D.R.; DHEDA, K.; ZUMLA, A., 2005; TORRES et al.,1998).

Os mecanismos pelos quais a imunossupressão relativaocorre em diversas etapas da tuberculose ativa começam aser desvendados Nosso grupo demonstrou a presença de IL-10 e de TGF-β imunorreativo em quantidades elevadas, e co-expressão dos receptores I e II de TGF-β no lavadobroncoalveolar (LBA) de portadores de tuberculose(BONECINI et al., 2004). Níveis de IFN-γ e IL-10 estãoelevados no fluido de LBA de TB, comparado com controlescom outras pneumopatias e voluntários saudáveis. A atividadede TGF-β está elevada nos fluidos do LBA de portadores deTB.

No período de março de 1998 a março de 2001 foramsubmetidas à indução de escarro 172 pessoas que seapresentaram aos ambulatórios do serviço de Pneumologiado HUCFF com os sinais e sintomas sugestivos de tuberculose.Trinta e quatro indivíduos portadores de tuberculose aceitaramparticipar e foram incluídos neste estudo longitudinal, apósassinarem o TCLE, em que foram submetidos a novas induçõesde escarro nos seguintes tempos após a introdução daquimioterapia anti-tuberculose: 15, 30, 60 e 180 dias. Trêsprojetos resultaram da constituição desta coorte.

No primeiro trabalho (FLORES-BATISTA et al., 2007), oescarro coletado no momento do diagnóstico foi investigadopara a expressão de moléculas relacionadas à apresentaçãoantigênica por células apresentadoras de antígenos e demoléculas co-estimulatórias. Moléculas co-estimulatórias ecélulas dendríticas desempenham função importante naimunidade mediada por linfócitos T. Muitos aspectos de suaparticipação na tuberculose pulmonar em humanos

Page 94: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

84 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):80-85José R. Lapa e Silva

permanecem obscuros. Este estudo analisou a expressão demoléculas co-estimulatórias e de células dendríticas em célulasbroncopulmonares de pessoas com TB obtidas por induçãode escarro. Portadores de TB (n=22) e controles sem TB (n=17)foram incluídos. Realizou-se a imunolocalização de moléculasco-estimulatórias (CD86, CD40, CD40L, CD28 e CD152) e decélulas dendríticas (Classe II do MHC/HLA-DR, CD1a). Acoloração por HLA-DR mostrou positividade em 18/22 casosde TB e em 16/17 controles (p=0,36). Uma reduçãoestatisticamente significante no número de células HLA-DR+foi encontrada nos casos de TB (p<0,001). A coloração paraCD86 mostrou baixa positividade em casos de TB (10/22)comparada aos indivíduos controles (16/17) (p=0,042) e umadiminuição estatisticamente significante nas percentagens decélulas CD86+ foi também vista (p=0,042). Pacientes comdoença radiologicamente limitada (afetando < 1 lobo)mostraram uma redução estatisticamente significante naexpressão de CD86 (p=0,021) comparados com pessoasapresentando formas pulmonares mais avançadas (afetando> 1 lobo). Não se observaram diferenças estatísticas nafreqüência das colorações positivas para CD1a, CD40, CD40L,CD28 e CD152 entre grupos TB e controles. HLA-DR e CD86,duas moléculas envolvidas em apresentação de antígeno eativação de linfócitos T encontram-se diminuídas nos pulmõesde pessoas com TB. Estes achados podem explicar, pelo menosem parte, a disfunção imune vista na TB ativa, particularmentena fase inicial do desenvolvimento da doença.

No segundo trabalho (LAGO et al., 2005, 2007), dos trintae quatro indivíduos portadores de tuberculose incluídos noestudo longitudinal, quatro foram excluídos por ter-sedeterminado soropositividade para o HIV após a sua inclusão.Dos trinta que completaram o protocolo, nove indivíduos foramexcluídos por insuficiência de material para a execução dasdosagens pelo método de ELISA. Assim, 21 portadores detuberculose que completaram o protocolo de estudo eapresentaram material broncopulmonar à indução de escarronos pontos pré-determinados (momento de diagnóstico,tempos 15, 30, 60 e 180 dias de tratamento) foram avaliadosatravés de dosagens seriadas das concentrações de IL-10 einterferon-gama no sobrenadante do escarro. IL-10 e IFN-γforam vistos em todos os pontos temporais estudados. Niveisde IL-10 desceram em paralelo à curva de negativaçãobacteriológica do escarro até T60. Entre T60 e T180, doispadrões diferentes foram vistos: no Padrão 1 (n=7), os níveisde IL-10 voltaram a subir; no Padrão 2 (n=13) os níveis de IL-10 decresceram ainda mais ou se mantiveram estáveis. Emagosto de 2005, todos os 21 indivíduos foram contactadospela equipe de estudo, sendo que 20 foram encontrados eresponderam a novo questionário, visando determinar quetipos de eventos sanitários eles apresentaram neste períodode evolução após o tratamento para tuberculose. Destes, seis(30%) apresentaram um segundo episódio de tuberculose,sendo que desses, três apresentavam história de tuberculoseno passado (um desses teve um outro episódio após o fim doacompanhamento de 180 dias do protocolo). O tempo médio

de seguimento foi de 69,8 ± 1,3 meses. Durante o seguimento,5/7 indivíduos com Padrão 1 apresentaram pelo menos umsegundo episódio de TB, comparado a 1/13 em casos dePadrão 2 [OR: 3,0 (1,59-13,27), p= 0,007]. Não houve associaçãosimilar com IFN-γ. O nível de IL-10 no escarro de 180 dias noscasos que recidivaram foi significantemente maior que doscasos sem recidiva. A presença de altos níveis de IL-10 aofinal do tratamento poderia funcionar como um fator de riscopara recaídas de TB.

Ainda utilizando a mesma coorte de portadores detuberculose, acompanhados ao longo do tratamento mediantea indução de escarro nos tempos previamente estabelecidos,o terceiro trabalho aplicou o método da reação em cadeia dapolimerase em tempo real (Real Time PCR) para analisar aexpressão de mRNA em lisados de células broncopulmonarespara o gene constitutivo GAPDH e para 17 genes envolvidosem imunorregulação (TNF-α, IL-10, IL-12p35 & p40, IFN-γ,TGF-β RI & RII, IL-1Rn, CD80, CD86, Socs3, Socs1, TLR2,IRAK-M, NEMO, IDO e IL23). Tal expressão foi estudada em30 portadores de TB, 11 portadores de outras pneumopatias(OLD) e 16 voluntários saudáveis (HCW) antes e após o inícioda quimioterapia para TB. Amostras de células pulmonaresforam coletadas através do escarro induzido. Osresultadosdemonstraram que antes da quimioterapia houvepredominância da expressão das seguintes citocinas anti-inflamatórias, inflamatórias, receptores e genes reguladoresde supressão da resposta imune em TB: IFN-γ, IL-12p35, IL-12p40, TLR2, IRAK-M, IL-1Rn, TGFRI e TGFβRII, IDO, IL-10,SOCS3 e SOCS1, comparados a OLD e HCW (p<0,05, Kruskal-Wallis). Dos mediadores imunológicos avaliados a partir de15° dia de tratamento, mantiveram-se com expressãosignificativa ao final do tratamento SOCS1, SOCS3, TLR2,IRAK-M, IL-12p35, IL-12p40, NEMO e IFN-γ, quandocomparados aos grupos controles. Portanto, antes dotratamento, a expressão de citocinas inflamatórias e o grau deativação das células presentes no meio pulmonar foramcontrabalançados pela expressão de fatores desativadores.Eles podem estar envolvidos na supressão da resposta imune,resultando na TB ativa. Associado a isto, após início daquimioterapia e redução da carga bacilar, citocinas anti-inflamatórias, receptores e outros fatores (IL-10, TGFβ-RI,TGFβ-RII, NEMO, TLR2, IDO) e genes regulatóriossupressivos (SOCS1, SOCS3) aumentaram sua expressão. Istopode contribuir para a contenção da inflamação pulmonarexcessiva, limitando o dano tecidual. Alternativamente, podefacilitar a recidiva da tuberculose em pacientes susceptíveis(manuscrito em preparação).

Outro importante estudo publicado com nossa parceria(STERLING et al., 2007) analisou várias citocinas equimiocinas, desta vez no sangue periférico de crianças atécinco anos de idade que tiveram tuberculose disseminada,como meningite tuberculosa ou tuberculose miliar, tuberculosepulmonar sem evidência de disseminação, todas já curadasapós tratamento adequado, que foram comparadas comcrianças infectadas mas não doentes, caracterizadas por teste

Page 95: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

85Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):80-85 Doenças Negligenciadas – Doenças Micobacterianas

cutâneo positivo ao PPD. Células mononucleadas do sangueperiférico foram cultivadas em diversas condições in vitro eos sobrenadantes usados para medição das citocinas. O únicofator significativamente diferente foi MCP-1, que estava muitoaumentado em relação aos controles em crianças curadas detuberculose pulmonar. Já as crianças com tuberculosedisseminada apresentavam queda substancial nos valores deMCP-1.

Os dados apresentados abrem caminho para odesenvolvimento de novos insumos para o diagnóstico rápidoda tuberculose, assim como a identificação de novos alvosmoleculares para o desenvolvimento de novas vacinas enovos fármacos contra a tuberculose e quem sabe poderemossonhar, ainda em nossas vidas, com o controle e erradicaçãoda tuberculose do planeta.

Referências

1. ARRIAGA, A.K. et al.Immunological and pathological comparativeanalysis between experimental latent tuberculous infection and progressivepulmonary tuberculosis. Clin Exp Immunol 128: 229-237, 2002.2. BONATO, V.L. et al.Down-modulation of CD18 and CD86 onmacrophages and VLA-4 on lymphocytes in experimental tuberculosis.Scand J Immunol 54: 564-73, 2001.3. BONECINI ALMEIDA, M.G. et al. Down-Modulation of LungImmune Response by IL-10 and TGF-β Ligands and TGF-β receptors Iand II in Active Tuberculosis. Infect Immun 72: 2628-2634, 2004.4. CARAGOL, I. et al. Clinical tuberculosis in 2 of 3 siblings withinterleukin-12 receptor b1 deficiency. Clin Infect Dis 37: 302-306, 2003.5. DARWIN, K.H. et al., The proteasome of Mycobacterium tuberculosisis required for resistance to nitric oxide. Science. 302: 1963-1966, 2003.6. DE LA BARRERA, S. et al., IL-10 down-regulates costimulatorymolecules on Mycobacterium tuberculosis-pulsed macrophages andimpairs the lytic activity of CD4 and CD8 CTL in tuberculosis patients.Clin Exp Immunol 138: 128-38, 2004.7. DEMANGEL, C. et al. Stimulation of dendritic cells via CD40enhances immune responses to Mycobacterium tuberculosis infection.Infect Immun 69: 2456-61, 2001.8. ELLNER, J.J. Suppressor adherent cells in human tuberculosis. JImmunol 121: 2573-2579, 1978.9. FEUER, C. Tuberculosis Research & Development. A critical analysis.1a. edição. New York: Treatment Action Group, 73 p.,.2006.10. FLORES-BATISTA, V.C. et al. Low expression of antigen-presentingand costimulatory molecules by lung cells from tuberculosis patients.Braz J Med Biol Res 40: 1671-1679, 2007.11. FLORES-VILLANUEVA, P. et al. A functional promoterpolymorphism in monocytes chemoattractant protein-1 is associatedwith increased susceptibility to tuberculosis. J Exp Med 202:1649-1658, 2005.12. FULTON, S.A. et al. Inhibition of major histocompatibility complexII expression and antigen processing in murine alveolar macrophagesby Mycobacterium bovis BCG and the 19-kilodalton mycobacteriallipoprotein. Infect Immun 72: 2101-2110, 2004.13. GEROSA, F. et al. CD4 (+) T cell clones producing both interferon-gamma and interleukin-10 predominate in bronchoalveolar lavages ofactive pulmonary tuberculosis patients. Clin Immunol 92: 224-234,1999.14. GREENWOOD, C.M. et al. Linkage of tuberculosis to chromosome2q35 loci, including NRAMP1, in a large aboriginal Canadian family.Am J Hum Genet 67: 405-416, 2000.15. HIRSCH, C.S. et al. Cross-modulation by transforming growth factorbeta in human tuberculosis: suppression of antigen-driven blastogenesisand interferon gamma production. Proc Natl Acad Sci U S A 93: 3193-3198, 1996.

16. JOUANGUY, E. et al. Interferon-gamma-receptor deficiency in aninfant with fatal bacille Calmette-Guérin infection. N Engl J Med 335:1956-1961, 1996.17. KINDLER, V. et al. The inducing role of tumor necrosis factor inthe development of bactericidal granuloma during BCG infection. Cell56: 731-40, 1989.18. KRITSKI, A.L. et al. Tuberculose: do Ambulatório à Enfermaria.3a. Edição. Rio de Janeiro: Editora Atheneu, 259 p., 2006.19. ______. Two decades of research on tuberculosis in Brazil: state of theart of scientific publications. Rev Saude Publica 41 Suppl: 9-14, 2007.20. LAGO, P.M. et al. Role of regulatory cytokines and inducible nitricoxide synthase (NOS) in active tuberculosis. In: Proceedings AmericanThoracic Society May 20-25, San Diego, EUA, 2:A57, 2005.21. ______. Increased Levels of Sputum IL-10 at the End of Anti-Tuberculosis (TB) Chemotherapy Is a Marker for Relapse. In:. ProceedingsAm. Thor. Soc 20-24 de maio, San Francisco, EUA, 4:A820, 2007.22. MALIK, A.N.J.; Godfrey-Faussett, P. Effects of genetic variabilityof Mycobacterium tuberculosis strains on the presentation of disease.Lancet Infect Dis 5: 174-183, 2005.23. GOMES, M.M.; VARGAS, S.S.M.; VALLADARES, A.F. A Faculdadede Medicina Primaz do Rio de Janeiro em dois dos cinco séculos dehistória do Brasil. 1ª. Edição. Rio de Janeiro: Editora Atheneu, 258 p.,2001.24. MURRAY, P.J.; YOUNG, R.A. Increased antimycobacterial immunity ininterleukin-10-deficient mice. Infect Immun 67: 3087-3095, 1999.25. NICHOLSON, S. et al. Inducible nitric oxide synthase in pulmonaryalveolar macrophages from patients with tuberculosis. J. Exp. Med.1996; 183:2293-2302.26. OGUS, A.C. et al. The Arg753Gln polymorphism of the humantoll-like receptor 2 gene in tuberculosis disease. Eur Respir J 23: 219-223, 2004.27. ORME, I.M. et al. Cytokine secretion by CD4 T lymphocytesacquired in response to Mycobacterium tuberculosis infection. J Imunol151: 518-525, 1993.28. OTTENHOFF, T.H.M. et al. Control of human host immunity tomycobacteria. Tuberculosis 85: 53-64, 2005.29. ROACH, D.R. et al. TNF regulates chemokine induction essentialfor cell recruitment, granuloma formation, and clearance ofmycobacterial infection. J Immunol 168: 4620-4627, 2002.30. ROOK, G.R.A.W.; DHEDA, K.; ZUMLA, A. Immune responses totuberculosis in developing countries: implications for new vaccines.Nature Rev Immunol 5: 661-667, 2005.31. SALGAME, P. Host innate and Th1 responses and the bacterialfactors that control Mycobacterium tuberculosis. Curr Opin Immunol17: 374-380, 2005.32. SCHAUF, V. et al. Cytokine gene activation and modifiedresponsiveness to IL-2 in the blood of tuberculosis patients. J Infect Dis168: 1056-1059, 1993.33. SENDIDE, K. et al. Mycobacterium bovis BCG attenuates surfaceexpression of mature Class II molecules through IL-10-dependentinhibition of Cathepsin S. J Immunol 175:5324-5332, 2005.34. SHARPE, A.H.; FREEMAN, G.J. The B7-CD28 superfamily. NatRev Immunol 2: 116-26, 2002.35. STERLING, T.R. et al. Immune Function in Young Children withPrevious Pulmonary or Miliary/Meningeal Tuberculosis and Impact ofBCG Vaccination. Pediatrics 120: e912-e921, 2007.36. TOOSSI, Z.; ELLNER, J.J. Defective interleukin 2 production andresponsiveness in human pulmonary tuberculosis. J Exp Med 163: 1162-1172, 1986.37. TORRES, M. et al. Cyotkine profiles for peripheral bloodlymphocytres from patients with active pulmonary tuberculosis andhealthy household contacts in response to 30-kilodalton antigen ofMycobacterium tuberculosis. Infect Immun 66: 176-180, 1998.38. WALLIS, R.S. et al. Granulomatous infectious disease associated withtumor necrosis factor antagonists. Clin Infect Dis 38: 1261-1265, 2004.39. WHO 2007a: www.who.int/lep/en/. Acessado em 17 de dezembro de2007.40. WHO 2007b: http://www.who.int/tb/en. Acessado em 26/07/2007.

Page 96: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

86

FFFFFundo Setorial de Saúde: Novo Instrumento para Fundo Setorial de Saúde: Novo Instrumento para Fundo Setorial de Saúde: Novo Instrumento para Fundo Setorial de Saúde: Novo Instrumento para Fundo Setorial de Saúde: Novo Instrumento para Fomento de Pomento de Pomento de Pomento de Pomento de Pesquisa na Área da Saúdeesquisa na Área da Saúdeesquisa na Área da Saúdeesquisa na Área da Saúdeesquisa na Área da Saúde

Health Sectorial Fund: A New Instrument for Health Research Funding

Isaac RoitmanPresidente do Comitê Gestor do Fundo Setorial de Saúde

O Fundo Setorial de Saúde criado em 2001 é um novo instrumento para o fomento da pesquisa na área da saúde. Ohistórico e os principais desafios do Fundo são descritos. São listados os principais projetos financiados no períodode 2002-2007, mostrando-se a evolução orçamentária do Fundo no período de 2002-2006. As estratégias de definiçãodas prioridades são descritas, em particular o I Seminário do Fundo Setorial de Saúde. A atual composição doComitê Gestor é apresentada.Palavras-chave: pesquisa em saúde, gestão de pesquisa, financiamento à pesquisa, prioridades de pesquisa.

The Health Sectorial Fund, launched in 2001, is a new instrument for health research funding. Its history and majorchallenges are described, as well as its priority setting strategies. The main projects supported by de Fund between 2002 and2007 are listed as well the budget between 2002-2006. The First Health Sectorial Fund Seminar is particularly describedas a tool to choose the priorities. The current composition of the Management Comittee is also presented.Key words: Health research, research management, research funding, research priorities.

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. Isaac Roitman.Secretaria de Políticas,Programas de Pesquisa e Desenvolvimento, Ministério de Ciência eTecnologia, Esplanada dos Ministérios, Bloco E, 2.andar. 70067-900.Brasília, DF, Brasil.

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):86-89.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Introdução

Os Fundos surgiram na esteira do processo de privatizaçãode alguns setores da economia nacional, como exploração depetróleo, telecomunicações, energia elétrica e outros, emresposta à necessidade de aumentar os recursos destinados àC&T e garantir seu fluxo constante. O primeiro a ser criado foio Fundo Setorial do Petróleo e Gás Natural, CT-Petro. A lei queem 1997 instituiu o Conselho Nacional de Política Energética ea Agência Nacional do Petróleo, também previu a destinaçãode parcela dos royalties da produção de petróleo e gás naturalpara o financiamento a programas de amparo à pesquisa científicae ao desenvolvimento tecnológico aplicados à indústria dopetróleo. A implementação iniciou-se em 1999 após a publicaçãodos instrumentos legais que regulamentam seu funcionamentoe serviu como piloto para os outros Fundos.

O Fundo Setorial da Saúde – CT-Saúde –, foi criado pelaLei No. 10.332, de 19 de dezembro de 2001, para subsidiar efomentar o Programa de Fomento à Pesquisa em Saúde. Asprincipias prioridades do Fundo são: 1) capacitaçãotecnológica e inovação tecnológica nas áreas de interesse doSistema Único de Saúde – SUS; 2) difusão e incorporação denovas tecnologias visando ampliação do acesso aos bens eserviços em saúde, tendo por base a eqüidade, a integralidadee a elevação dos atuais patamares de qualidade. O objetivogeral do CT-Saúde é contribuir – por meio do fomento deatividades de Ciência, Tecnologia e Inovação – C,T&I – parao melhoramento das condições gerais de saúde da população

brasileira, com base nos princípios constitucionais da justiçasocial e da eqüidade no acesso a bens e serviços de qualidadeem saúde. Os objetivos específicos são: 1) contribuir para amelhoria da qualidade dos serviços de saúde ofertados àpopulação brasileira, por meio das ações de C,T&I; 2)contribuir para ampliar o acesso da população aos bens eserviços de saúde, por meio das ações de C,T&I; 3)estimularo aumento dos investimentos públicos e privados em C,T&Iaplicados à saúde; 4) estimular a atualização tecnológica da“indústria” brasileira de bens e serviços de saúde; 5) estimulara formação e a capacitação de Recursos Humanos para aPesquisa em Saúde; 6) difundir o conhecimento científico etecnológico.

Os recursos que compõem o Fundo Setorial da Saúdeoriginam-se dos 17,5% da contribuição do domínio econômico- CIDE que incide sobre valores envolvidos a título deremuneração, derivados de licença de uso e compra deconhecimentos tecnológicos e de contratos de transferênciade tecnologia, relativos à exploração de patentes ou de usode marcas e os de fornecimento de tecnologia e prestação deassistência técnica e afins. Do total desses recursos, trintapor cento, no mínimo, serão aplicados nas regiões Norte,Nordeste e Centro-Oeste, em programas de fomento àcapacitação tecnológica, à pesquisa científica e aodesenvolvimento tecnológico. O Decreto No. 4.143 de25.02.2002 regulamenta a Lei No. 10.332, na parte que instituio mecanismo de financiamento para o Programa de Fomentoà Pesquisa em Saúde, estabelece que os recursos parapesquisa e desenvolvimento serão incorporados no FundoNacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico –FNDCT. Para efeito do disposto nesse Decreto, se entendecomo atividades de pesquisa científica e desenvolvimentotecnológico: I – os projetos de pesquisa científica etecnológica; II – o desenvolvimento tecnológico experimental;III – o desenvolvimento de tecnologia industrial básica; IV –

Page 97: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

87Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):86-89 Fundo Setorial de Saúde

a implantação de infra-estrutura para atividades de pesquisaV – a formação e a capacitação de recursos humanos; VI – adocumentação e a difusão do conhecimento científico etecnológico.

Os Desafios do CT-Saúde

Nos países em desenvolvimento, 60% de todas as mortessão devidas às doenças não transmissíveis e esta cifra deveráalcançar 73% por volta de 2020. As situações e problemas desaúde oferecem desafios para a política de saúde que sãobastante específicos e de complexidade e escala variada. Osdesafios para as atividades de C,T&I, sendo elasmultidisciplinares e multisetoriais, também se inserem no marcoda especificidade de cada doença ou situação de saúde.Inicialmente, deve-se levar em conta a inserção dosinvestimentos do CT- Saúde na complexa realidade impostapela globalização, tanto nos países em desenvolvimento, quantonos mais pobres, nos quais os recursos dedicados à pesquisaem saúde, de modo geral, são muito limitados ou inexistentes.Assim, no auge de um processo de globalização que, até aqui,tem privilegiado, de modo quase exclusivo, critérios econômicos,como a eficiência das inovações tecnológicas e gerenciais, temospela frente o desafio de estabelecer relações mais profícuasentre a ciência, a tecnologia e a saúde humana. As ações doFundo devem resultar no desenvolvimento de produtos eprocessos industriais e de serviços em saúde que venham acontribuir para a produção e oferta de bens e serviços baseadasna justiça social. No Brasil, a necessária interação entre ossistemas de saúde, de educação, meio ambiente, ciência etecnologia e o sistema produtivo é ainda muito frágil e deveráser fortalecida através da integração permanente e consistentecom outras ações de C,T&I no âmbito federal, estadual emunicipal.

Uma agenda de pesquisas e estudos em C,T&I deve incluiros seguintes aspectos de importância estratégica: 1) impactoda transição epidemiológica sobre a sociedade: ampliação dosestudos epidemiológicos prospectivos e de avaliação deriscos à saúde e ao ambiente no Brasil vis-a-vis impactos etendências da oferta/demanda de cuidados em saúde; 2) efeitosda globalização da economia sobre a saúde: estudos dasrelações entre livre comércio e políticas públicas; 3) estratégiasde redução das desigualdades em saúde: mapeamento e análisedas tendências recentes e projeções referentes à eqüidade:perfis de alocação de recursos, padrões de distribuição daoferta de serviços de saúde e de conflitos redistributivos,direitos e assimetrias sociais, limites ao acesso à informação egeração de iniqüidades; 4) modelos organizacionais e sistemasde saúde: reorientação do modelo assistencial baseado nadoença e hospitalar para a atenção integral do indivíduo, emseu ambiente e relações sociais; estudos integrados dasmodalidades de financiamento para os sub-sistemas públicoe privado; qualidade de gestão e aplicação de recursos emsaúde; 5) políticas públicas e mercantilização da medicina noBrasil: análise dos conflitos de interesse atuais e potenciais.

Identificação de reformas necessárias; 6) desenvolvimentode recursos humanos do setor saúde e mercado de trabalhoem saúde: padrões ocupacionais, características da inserçãoprofissional e demandas de qualificação nos subsistemaspúblico e privado; formação de gestores do SUS; gênero ejornada de trabalho; tendências recentes e futuras da absorçãode novos trabalhadores; centralidade do papel dos HospitaisUniversitários; 7) empresas prestadoras de serviços privadosde saúde: mapeamento e caracterização tipológica;identificação de perfis organizacionais e padrões deincorporação tecnológica nos diversos segmentos; 8) redes esistemas de geração e difusão da informação científica,tecnológica e de saúde; 9) educação, informação ecomunicação para a promoção em saúde; 10) Qualificação docontrole social e consolidação do SUS.

As atividades de C,T&I realizadas em outros campos esetores – saneamento básico, educação, cultura, ambiente,habitação, transportes, geração de empregos, agricultura,energia, relações internacionais, direito e outros – devem serconsiderados relevantes para o alcance de resultadospositivos em qualidade de vida e saúde no Brasil.

O CT-Saúde deverá considerar ações de C,T&I quecontribuam para a prática da intersetorialidade.Uma carteirade fomento no tema deverá incluir projetos focalizando osseguintes aspectos, de importância estratégica: 1) modo devida, estilos de vida e vulnerabilidade em saúde; 2) políticaspúblicas, promoção da saúde e prevenção de doenças; 3)estudos de demanda e oferta de políticas intersetoriaisespecíficas e articuladas de impacto em saúde humana.

Com relação ao complexo industrial da saúde asprioridades contemplam dois grandes segmentos produtoresde insumos em saúde: 1. cadeia tecnológica de fármacos emedicamentos e desenvolvimento e produção deimunobiológicos; 2. indústria de insumos e equipamentosmédico-hospitalares, odontológicos e laboratoriais. Noprimeiro segmento deve ser priorizado investimentos paraprojetos, tanto em rotas de farmoquímica como rotasbiotecnológicas, visando: 1) bioprospecção, incluindopesquisa e produação de novas moléculas e “drug design” apartir da biodiversidade brasileira; 2) identificação de novosprincípios ativos; 3) extração de produtos naturais de origemanimal e vegetal; 4) pesquisa em fitomedicamentos oufitoterápicos, plantas/hervas medicinais; 5) testesfarmacológicos, testes toxicológicos, testes bioquímicos, testesmicrobiológicos; 6) metodologias de escolha de moléculas devalor terapêutico; 7) pesquisas clínicas em pacientes e emvoluntários (estudos de eficácia, toxicidade e efeitoscolaterais), contemplando estudos de efetividade,farmacocinéticos (condições de absorção, biotransformaçãoe eliminação do medicamento, ou seja, biodisponibilidade emetabolismo da droga); 8) análise galênica (de composição,pureza, estabilidade, etc), de relevância na geração de normasde especificações de produção e normas de controle dequalidade; 9) P&D de produtos inovadores (me too):biodisponibilidade e bioequivalência.

Page 98: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

88 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):86-89Isaac Roitman

São requeridos estudos prospectivos, incluindo, entreoutros, os seguintes aspectos de importância estratégica:1)mapeamento e análise das pesquisas clínicas emdesenvolvimento no Brasil, com ênfase nos aspectoscontratuais envolvendo a indústria; 2) análise do processode reorganização do sistema de P&D da indústriafarmacêutica mundial e das tendências observadas nasrelações de comércio exterior; 3) dimensionamento dacapacidade instalada no país em ciência e tecnologiaaplicada aodesenvolvimento de fármacos e medicamentos;4) análise da dinâmica do setor produtor de fármacos emedicamentos no Brasil; 5) estudos prospectivos emgenômica com foco em vacinas, farmacogenômica e kitsdiagnósticos; 6) estudos prospectivos contemplandodoenças prioritárias (câncer, doenças cardiovasculares,hipertensão, diabetes, infecções hospitalares e resistênciabacteriana, dengue, malaria e tuberculose) vis-a-vispesquisa e plataformas tecnológicas farmacêutica ebiotecnológica.

Com referência às condições concorrenciais e deevolução dos submercados de especialidades farmacêuticas,devem ser considerados os seguintes componentes: osprodutos genéricos, similares, me too, produtos novos,possíveis políticas diferenciadas por produtos ou classesterapêuticas, levando em conta os respectivos custos detratamento para os pacientes, política de assistênciafarmacêutica e acessibilidade aos medicamentos essenciaise para doenças negligenciadas; difusão de produtos novosnos mercados brasileiro e internacional; automedicação edemanda espontânea; o papel dos agentes econômicosenvolvidos no processo de difusão do medicamento nomercado: médicos, representantes de laboratórios, farmácias,mídia, etc.

Principais Projetos Financiados

Nos seis anos de existência do CT-Saúde um númeroexpressivo de projetos já foram financiados. De forma geralos comitês gestores evitam a pulverização do fomento, dandopreferência a projetos estruturantes e a linhas prioritárias paraa melhoria do atendimento à saúde no Brasil. Nesse contextoa articulação permantente com o Ministério da Saúde,particularmente com a Secretaria de Ciência e Tecnologia eInsumos Estratégios se constitue como uma estratégiafundamental.Abaixo estão relacionados os principais projetosfinanciados no período de 2003-2007.

1. Editais para pesquisa em dengue e terapia celular;2. Apoio e desenvolvimento e inovação em saúde e

centros de pesquisas em investigações clínicas;3. Rede de pesquisas em tuberculose*;4. Auto-suficiência em radionucleotídeos (CNEN/IPEN);5. Fármacos e vacinas;6. Pesquisa em violência, acidentes e trauma;7. Fármacos e vacinas (Inovacinas);

8. Pesquisa clínica em hospitais universitários*;9. Projeto Onconet*;11. Rede nacional de biodiversidade microbiana e

metagenômica*;12. Proteoma estrutural e funcional do veneno do

escorpião amarelo Tityus serrulatus*;13. Identificação de moléculas biologicamente ativas a

partir de metagenomas de solos;14. Consolidação de núcleos de produção de moléculas

bioativas*;15. Hidrolases sintéticas*;16. Desenvolvimento de fármacos*;17. Desenvolvimento de tecnologia e escalonamento

industrial para produção de imunobiológicos parasaúde humana e animal*;

18. Fármacos a partir de substâncias bioativas;19. Potencial farmacólogico de organimso marinhos*;20. Doenças negligenciadas (dengue)*;21. Neurociências: Instituto Internacional de

Neurociências de Natal;22. Marco passo brasileiro: desenvolvimento de protótipo

industrial*;23. Saúde do idoso*;24. Poluição ambiental*;25. Avaliação da conformidade de material biológico

(normatização)*;26. Moléculas bioativas para a área de saúde humana*;26. Rede multicêntrica de implantes ortopédicos*;27. Avaliação e certificação de insumos farmacêuticos*;28. Cadeia tecnológica de medicamentos: cooperação

universidade-empresa*;29. Desenvolvimento de fatores da coagulação sanguínea

por DNA recombinante*;30. Rede nacional de farmacogenética/genômica*;31. Criação de estruturas nacionais para suporte a áreas

fundamentais da cadeia de desenvolvimento defármacos e medicamentos;

32. Apoio a projetos de P&D&I de equipamentos paradiagnóstico e tratamento.

33. Apoio a projetos de pesquisa sobre gravidez egestação na adolescência*;

34. Uso da biodiversidade como fonte de novoscompostos químicos ativos contra alvos molecularesdefinidos para o tratamento de malária, tuberculose edoenças mediadas por linfócito;

35. Formação, capacitação e fixação de recursos humanose reforço das estruturas físicas de vigilância em tornode zoonoses virais e arboviroses emergentes daAmazônia*;

36. Apoios à projetos de pesquisa sobre o câncer;37. Estudo longitudinal da efetivade da cirurgia bariátrica

e suas consequencias a longo prazo*;38. Análise de custo-efetivade da insulina glargina em

comparação com à insulina NPH para pacientesdiabéticos tipo 1 na perspectiva do SUS*;

Page 99: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

89Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):86-89 Fundo Setorial de Saúde

39. Estudo clínico para avaliar a eficácia do desoxicolatode anfoterecina B lipossomal, comparado com oantimoniato de meglumina em pacientes comleishmaniosose visceral*;

40. Pesquisa sobre terapia por ondas de choque extra-corporéa multiwave para regeneração de tecidos.

A disponibilidade de recursos tem aumentado ao longo dosanos. Abaixo estão listados os valores empenhados do CT-Saúdeno período de 2002-2006 (em RS $):

2002 421.000,002003 24.174.943,002004 26.912.745,002005 33.918.793,002006 54.508.945,00

Definição das Prioridades

As prioridades das ações verticais do CT-Saúde sãodefinidas pelo Comitê Gestor que procura definir os temas apartir de sugestões da comunidade científica, do setorempresarial, dos órgãos de governo (MCT, MS, ANVISA,FUNASA) e das agências de fomento, etc.

Em 2007 foi organizado um Seminário do CT-Saúde,realizado nos dias 13 e 14 de novembro com a finalidade dediscutir temas passíveis de serem fomentados no biênio 2008-09. Vários temas foram apresentados e além da presença dosmembros do comitê gestor e dos relatores dos temas, cerca de22 convidados entre comunidade científica, setor empresariale órgãos governamentais, enriqueceram as discussões. Ostemas discutidos foram:

• Prioridades de pesquisas no Ministério da Saúde;• Centro de Desenvolvimento de Medicamentos da UFC:

uma opção para P&D de medicamentos no país;• Epidemiologia Genética;• Perspectivas de Gênomica/Bioinformática na área da

saúde no Brasil;

• Perspectivas da Telemedicina no Brasil;• Saúde digital;• Doenças ocupacionais; • Gestão tecnológica: relação universidade/empresa;• Engenharia Biomédica no Brasil;• Peptídeos bioativos e vacinais; • Doença mental: depressão; • Saúde ocular do idoso; • Terapia celular.

Composição do Atual Comitê Gestor do CT-SaúdeIsaac Roitman (MCT) Presidente do CT-Saúde

Eliane de Brito Bahrut (FINEP)Marco Antonio Zago (CNPq)Reinaldo Felippe Nery Guimarães (Ministério da Saúde)Edna Coven (ANVISA)MárioRoberto Castelani (FUNASA)Walter Araújo Zim (UFRJ) (representante da comunidade

científica)Protásio Lemos da Luz (INCOR/USP) (representante da

comunidade científica)Carlos Alexandre Geyer (representante do setor

empresarial)Eduardo Gonçalves (representante do setor empresarial)Guilherme Eduardo Quintas (MCT) (secretário técnico)Raquel de Andrade Lima Coelho (representante técnico

do CNPq)Maura Ferreira Pacheco (representante técnico da

FINEP)

Informações Adicionais

Outras informações do CT-Saúde podem ser obtidas napágina do MCT <www.mct.gov.br>. Para contatos escreverpara <ct-saú[email protected]>.

* Em parceria com o Departamento de Ciência e Tecnologia doMinistério da Saúde (DECIT/MS).

Page 100: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

90

Ciência e Ensino – Desafios e OportunidadesCiência e Ensino – Desafios e OportunidadesCiência e Ensino – Desafios e OportunidadesCiência e Ensino – Desafios e OportunidadesCiência e Ensino – Desafios e Oportunidades

Science and Education – Challenges and Opportunities

Maria do Carmo LealPesquisadora Titular da Fundação Oswaldo Cruz; Vice Presidente de Ensino, Informação e Comunicação da Fundação Oswaldo Cruz; Rio de

Janeiro, RJ, Brasil

Este artigo faz uma sucinta revisão histórica do desenvolvimento científico brasileiro dos anos 70 até os dias atuais,focalizando a importância central da pós-graduação (cursos de mestrado e doutorado) neste processo. Descreve ascaracterísticas da pós-graduação e apresenta os avanços alcançados quanto ao número de cursos, profissionaisformados e aumento expressivo da publicação científica e citação dos artigos. Atribui os resultados ao planejamentoestratégico de médio e longo prazo feito pelo país para a área de C&T, num esforço coordenado de instituições dosMinistérios da Educação e da Ciência e Tecnologia, notadamente a CAPES, CNPq e FINEP. Ressalta a capacidade deadaptação da pós-graduação aos novos desafios que se colocaram para a formação profissional e a criatividade nabusca de uma desconcentração dos cursos da Região Sudeste. Chama a atenção para as possibilidades da pós-graduação apoiar a política externa brasileira, como um forte instrumento para consolidar a presença do Brasil nacooperação Sul-Sul. Por fim, relata a experiência da Fundação Oswaldo Cruz com a realização de dois cursos deMestrado na África de Língua Portuguesa, Angola e Moçambique.Palavras-chave: pós-graduação, ciência e tecnologia, cooperação internacional, África.

This article gives a brief historical overview of scientific development in Brazil since the 70’s until the present day, focusingon the importance of the graduate courses (master’s and doctoral) in this process. The paper describes the features of thecountry´s graduate programs and presents the progress made on: number of courses offered, vocational training and scientificpublication and citation of articles. This manuscript assigns results to the medium and long term strategic planning of thecountry in the area of Science and Technology, in a coordinated effort of institutions of the Ministries of Education, andScience and Technology, notably Brazil´s research financing agencies: CAPES, CNPq and FINEP. The article also emphasizesthe ability to adapt Graduate Programs to new challenges arising from the need to descentralize courses, formerly concentratedin Brazil´s Southeast. It draws attention to the possibilities of the graduate programs to support Brazilian foreign policy, as animportant tool for consolidating the presence of Brazil in South South cooperation. Finally, it reports the experience of theOswaldo Cruz Foundation, with the completion of two master´s courses in Portuguese-speaking Africa, Angola and Mozambique.Key words: Graduate courses, science and technology, international, Africa.

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dra. Maria do Carmo Leal. Av Brasil,4365 - Manguinhos. 21040-900. Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Endereçoeletrônico: [email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):90-97.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

O Brasil termina o ano de 2007 com boas e más notícias nocampo da educação e da ciência. Muito embora venhaassegurando o acesso quase universal das crianças brasileirasde sete anos à escola, tem apresentado indicadoreseducacionais para o ensino de nível fundamental que estãoabaixo dos padrões esperados para o seu nível dedesenvolvimento e renda per capita. O estudo da Organizaçãopara a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE)avaliou o desempenho de estudantes de 15 anos emmatemática oriundos de escolas particulares e privadas devários países e dentre os 57 países avaliados classificou oBrasil entre os últimos lugares, no 53o. No desempenho daleitura o Brasil ficou na 48a posição entre os 56 paísesanalisados (MEC, 2007). Em um outro extremo, encontra-se aperformance apresentada pelo país que surpreendeu a todospor colocar-se em 11º lugar entre os melhores paises para sefazer ciência segundo o ranking da Scientist Magazine of the

Life Sciences publicada em novembro de 2007 (SCIENTISTMAGAZINE OF THE LIFE SCIENCES, 2007). Como se sabe, aprodução científica no Brasil cresce passo a passo com odesenvolvimento dos cursos de pós-graduação, notadamente,mestrado e doutorado.

Este desempenho polarizado entre o ensino fundamentale a pós-graduação deve-se a vários fatores, cuja enumeraçãoseria impossível de ser esgotada aqui. Mas, dentre eles,podemos citar o desinvestimento crônico na educação básica,queda do poder aquisitivo e do prestígio social dosprofessores de primeiro grau e à falta de profissionalismo ecritérios meritocráticos para escolha de dirigentes de escolas.Em contraposição, o sistema estabelecido pela pós-graduaçãodefiniu um processo de regulação e avaliação sistemáticas deseus cursos, aplicados por pares, com critérios coerentes ecalcados na qualidade do curso, infra-estrutura das instituiçõesacadêmicas e na produção científica de professores e alunos.Os resultados tão diferentes destas duas estratégias merecemuma profunda reflexão. Políticas Públicas de médio e longoprazo, com um sistema de monitoramento e avaliaçãoconcomitante como as implementadas na área de C&T sãopouco comuns no nosso país. Esta experiência de sucessopoderia ser aproveitada como estímulo para a definição de

Page 101: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

91Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):90-97 Ciência e Ensino

políticas mais duradouras e consistentes dirigidas a outroscampos da vida econômica, social, educacional e cultural.

Ciência e Ensino de Pós-Graduação no Brasil

Em 2002 a Academia Brasileira de Ciências lançou a terceiraedição da “Ciência no Brasil”, organizado pelos acadêmicosAntonio Carlos Campos de Carvalho, Diógenes de AlmeidaCampos e Luiz Bevilacqua (CARVALHO, A.C.C.; CAMPOS,D.A.; BEVILACQUA, L., 2002). Já nesta ocasião Carvalhochama a atenção para a grande dinâmica da ciência brasileira,em fina sintonia com o aumento da formação de doutores e daprodução científica (CARVALHO, 2002).

No texto do Israel Vargas é feito um contraponto entre otempo consumido pelo Brasil para erradicação doanalfabetismo e o pouco investimento na educação básicacomparado com o realizado por outros países desenvolvidos.Este investimento tardio na educação básica constituiu-seposteriormente em uma das grandes causas e,simultaneamente, conseqüência das enormes iniqüidadessociais do país. O texto destaca o investimento primorosoque o Brasil fez no desenvolvimento científico ao longo dosanos oitenta e noventa, particularmente nestes últimos, comcrescimento anual contínuo, chegando a mais de 10% ao anoentre os anos de 1992 a 1997.

Da mesma forma, o autor mostra o investimento em bolsasde estudo para formar cientistas, tendo aumentadoconsistentemente nos anos oitenta e noventa, com registradocrescimento neste último, quando também se inicia o processode incremento de publicação de artigos científicos.

A acumulação alcançada na formação de cientistas, aferidapela análise da publicação científica, ganha uma dimensãoprópria, não mais ficando em sintonia com o crescimento doProduto Interno Bruto Brasileiro, indicador utilizado nodocumento como parâmetro de comparação econômica entrepaíses. Ao contrário, descola-se deste indicador, crescendonuma velocidade surpreendente. O autor mostra que, noperíodo de 1996-1999, o Brasil não somente aumentou o númerode artigos publicados, como também melhorousubstantivamente o índice de citação dos trabalhos, emrelação aos indicadores da mesma série histórica apresentadapela Índia, China e Coréia do Sul (VARGAS, 2002).

O autor notifica o retardo ou retraimento dodesenvolvimento do componente tecnológico da ciênciabrasileira, dando dedicada atenção a este tópico que vemsendo tão exaustivamente destacado atualmente nos fórunscientíficos nacionais.

A coordenação entre os órgãos de fomento da pesquisa edesenvolvimento tecnológico para planejamento e execuçãode um Programa de Ciência e Tecnologia para o Brasil foiiniciada em 1973-1974, com o I Plano Básico deDesenvolvimento Científico e Tecnológico – I PBDCT –(SALLES FILHO, 2002), reafirmada no II Plano Básico deDesenvolvimento Científico e Tecnológico – II PBDCT – em1978 (SALLES FILHO, 2003a) e no III Plano Básico de

Desenvolvimento Científico e Tecnológico (III PBDCT),estabelecido nos anos 80 (SALLES FILHO, 2003b).

As principais instituições responsáveis pela formulação edesenvolvimento dos Planos foram o CNPq, com suportefinanceiro do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científicoe Tecnológico (FNDCT), a Financiadora de Estudos e Projetos(FINEP) e o BNDES, além da CAPES, com presença maisdestacada no terceiro plano.

No I PBDCT o objetivo principal era integrar Indústria-Pesquisa-Universidade, como núcleo fundamental de umaestrutura nacional integrada de Educação/Ciência -Tecnologia/Empresa, com o progresso científico e tecnológicoatrelado ao processo de desenvolvimento nacional. Nosegundo, que seguiu a mesma linha, era mais clara ainda a“harmonia entre o planejamento maior do País e o planejamentoem C&T. Mais que uma harmonia, era uma vinculação ao Planode Desenvolvimento Nacional – PND – no qual o SistemaNacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico(SNDCT) deveria operar para as políticas industrial e agrícola.Todas as instituições assumiram, no Plano, um caráter funcionalpara o PND” (SALLES FILHO, 2003b). Neste mesmo período, élançado o Primeiro Plano Nacional de pós-graduação (1975/1979) formulado pela Secretaria de Ensino Superior do Ministérioda Educação e Cultura - MEC – e CAPES em colaboração como CNPq (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2004).

No último dos planos, o III PBDCT, cujas ações seriamexecutadas no período 1980/85, as atividades de C&T seriamexpandidas e a articulação entre os órgãos do Sistema deC&T, enfatizada. Neste plano, aparece pela primeira vez acapacitação de recursos humanos, com ênfase na formaçãodo pesquisador e na pós-graduação, como objeto de um dosseus capítulos. O Segundo e Terceiro Planos Nacionais dePós-Graduação foram definidos pela CAPES em 1982-1985 e1986-1989, em seqüência a este processo de planejamento(MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2004).

O ensino de pós-graduação brasileira iniciou-se no finaldos anos 60 e, em 2006, já tinha o quantitativo de 3.624 cursosde Mestrado e Doutorado reconhecidos e distribuídos por12,5% das instituições de ensino superior e 39,5% dosInstitutos de Pesquisa do país. Nestes cursos titularam-semais de 32.000 mestres e 9.300 doutores, nas diversas áreasdo conhecimento. O número de docentes envolvidos comesta formação ultrapassou o número de 41.000 (CAPES, 2007).

As Tabelas 1 e 2 contêm mais alguns dados descritivosdemonstrando a pujança da pós-graduação brasileira, que sedistribui por todas as regiões geográficas do territórionacional, muito embora com uma expressiva concentração dosseus programas na Região Sudeste, com mais da metade doscursos, seguida da Região Sul, com 20%, áreas que detém osmelhores indicadores econômicos e sociais do país. A Tabela3 mostra que há grandes diferenças também quanto aosconceitos dos cursos.

Outro aspecto que é peculiar à pós-graduação brasileira éa concentração de cursos em instituições públicas federais eestaduais, em franco contraste com a intensidade da presença

Page 102: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

92 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):90-97Maria do Carmo Leal

Tabela 3. Conceito dos cursos de pós-graduação por Região Geográfica na avaliação trienal da Capes de 2007.

Tabela 2. Alguns indicadores de produtividade das IES e dePesquisa relativos à pós-graduação. Brasil, 2006.

Número de alunos de graduação titulados 717.858Número de alunos de pós-graduação titulados 41.646Proporção de alunos de graduação em 5,8 relação à pós-graduaçãoNúmero de funções docentes em IES 305.960Número de docentes de pós-graduação 41.152Proporção de docentes das IES envolvidos 13,5 com a pós-graduaçãoNúmero de programas de pós-graduação 2.267Número de artigos publicados no 473.166 quadriênio 2003-06Número de livros e capítulos de livros 142.665 publicados 2003- 06Número de pesquisadores 138.278Média de artigos/pesquisador 3,42Média de livros e capítulos de 1,0 livros/pesquisador

Fonte: portal do MEC e da Capes e Grupos de Pesquisa do CNPq censo2006.

Tabela 1. Instituições de Pesquisa e do Ensino Superior (IES)e sua relação com a pós-graduação. Brasil, 2006.

Número de IES do Brasil 2.457Número de IES com programas de pós-graduação 308Proporção de IES com programas de pós-graduação 12,5Número de Instituto de Pesquisa 81Número de Institutos de Pesquisa com PG 32Proporção de Institutos de Pesquisa com PG 39,5

Fonte: portal do MEC e da Capes e Grupos de Pesquisa do CNPq censo2006.

da iniciativa privada nas Instituições de Ensino Superior, quetitulam para a graduação. As Instituições de Ensino Superiortitularam 717.858 alunos em nível de graduação em 2006 emtodo o país. Destas, 10% eram públicas e 90% privadas,enquanto que 48% das pós-graduações estavam presentesno primeiro grupo, perfil este que se reproduz dentro dasregiões geográficas brasileiras (CNPq, 2007).

A construção deste patrimônio científico que o Brasil hojedetém se deu ao longo de mais de 40 anos de dedicação dasinstituições de ensino e pesquisa à formação pós-graduada,num esforço coordenado pela CAPES que instituiu, desde1976, um sistema de avaliação periódica dos cursos,conduzido por equipes docentes de elevado prestígioacadêmico e científico. As avaliações, que se baseavam emcritérios de qualidade do curso, infra-estrutura das instituiçõesacadêmicas e produção científica de professores e alunos,estabeleceram no país um cenário de competição científicapelo mérito, que muito contribuiu para a elevação do níveldos cursos e da produção científica.

Paralelo a isto foi instituído, em parceria com o CNPq, umsistema de bolsa de fomento aos alunos recém graduados, deforma a permitir a formação de jovens cientistas. No ano de2006 mais de 50.000 bolsas de estudos foram oferecidas noBrasil pela Capes (60%) e CNPq. Um número pequeno debolsas é também disponibilizado pelas Fundações Estaduaisde Apoio à Pesquisa (FAPs).

Um sistema de estímulo à vocação científica foi tambémimplantado no país há mais de 40 anos, com a CAPES e CNPqconcedendo bolsas de iniciação científica aos alunos degraduação para participarem em projetos de investigação ecomo auxiliares das atividades docentes.

Não é, portanto, surpreendente que este investimentovenha hoje alcançar os resultados que têm.

No ano de 2006, o Censo dos Grupos de Pesquisa doCNPq (CNPq, 2007) mostrou que o país tinha 21.024 gruposde pesquisa registrados nas diversas grandes áreas doconhecimento, com predomínio nas Ciências da Vida, 39%,seguido das Humanidades com 36% e das Ciências daNatureza, com 25%. Há presença das atividades de pesquisaem todas as Regiões Geográficas, mas com uma grandeconcentração na Região Sudeste, que abriga 50% do total degrupos, mostrando uma distribuição semelhante à dos cursosde pós-graduação. Um crescimento do número depesquisadores e de grupos vem sendo registrado a cadacontagem. Em 2000, seis anos antes, o número de grupos era10.772, a metade de 2006, mostrando o vertiginoso aumentodas atividades de pesquisa no país (CNPq, 2007).

O ritmo de crescimento das atividades de pesquisa ésemelhante ao da pós-graduação, em quantidade, qualidade,área do conhecimento, localização geográfica e situação

Regiões Conceito (%) Total

3 4 5 6 7 No %

Centro-Oeste 34,1 43,1 17,9 4,1 0,8 246 100Nordeste 35,6 42,9 17,1 4,0 0,3 595 100Norte 51,1 40,3 7,2 1,4 0,0 139 100Sudeste 19,6 32,2 30,3 11,1 6,8 2066 100Sul 25,6 41,2 24,5 6,0 2,7 738 100BRASIL 25,4 36,7 25,4 8,2 4,3 3784 100

Fonte: www.capes.gov.br Diretoria de Avaliação, dados atualizados em 24/12/2007.

Page 103: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

93Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):90-97 Ciência e Ensino

administrativa das instituições, dada a correlação que seestabeleceu no país entre estes dois processos. No Brasil,quase toda pesquisa produzida é feita dentro das instituiçõesde ensino superior e institutos de pesquisa, sem quasenenhuma participação das empresas privadas. Ou seja, nomesmo local e circunstância onde acontecem os cursos depós-graduação. Provavelmente será possível tambémencontrar uma correlação entre os temas de investigação dosGrupos de Pesquisa e das teses e dissertações.

A internacionalização da produção científica da pesquisabrasileira pode também ser apreendida nestes dadoscomparando-se o número de artigos publicados em revistasde circulação internacional no censo de 2004 e 2006. Houveum crescimento de 0,59 artigos por pesquisador, para 0,78, ouseja, de 25% entre os dois períodos.

Alguns autores explicam o paradoxo do crescimento daprodução científica nacional, mesmo em períodos de poucosrecursos para a ciência, através da parceria com pesquisadoresestrangeiros (MANEGHINI, 1996). Outros identificam uma fortecorrelação entre as parcerias internacionais e o aumento dacitação dos resultados dos estudos brasileiros (VELLOSO,A.; LANNES, D.; MÉIS, L., 2004). Glanzel, Leta & Thijsatribuem a melhoria das citações à boa performance da ciênciabrasileira em si (GLANZEL, W.; LETA, J.; THIJIS, B., 2006).

O fortalecimento da pós-graduação no território nacionalpermitiu também uma seleção mais criteriosa dos alunos paraformação no exterior, que tem alto custo econômico,priorizando-se as áreas identificadas como sendo ainda depequeno desenvolvimento científico, artístico ou cultural nopaís ou a oferta de bolsas de curta duração denominadas“bolsas sanduíche”. Segundo Marchelli, até 1980, mais de40% dos doutores brasileiros tinham obtido seus títulos noexterior e, na década de 90, apenas um em cada cinco títulosfoi obtido fora do país (MARCHELLI, 2005).

Um aporte de recursos foi feito para expandir e fortalecer osistema de pós-graduação nas regiões mais carentes do Brasil.Um grande e variado tipo de incentivo foi sendo implementado,de forma que os cursos mais estruturados técnica ecientificamente foram estimulados a fazerem parcerias dentrodo país com instituições de menor desenvolvimentoacadêmico, com o objetivo de minorar a distribuição desigualda formação e produção científica e tecnológica (Programasde Mestrado ou Doutorado Interinstitucional – MINTER/DINTER, Programa de Qualificação Institucional – PQI,Programa Nacional de Cooperação Acadêmica – PROCAD)(JANINE, 2007). Estas iniciativas de cunho solidário visavammelhorar.a formação docente, a investigação científica e criarredes de cooperação acadêmica entre instituições comprogramas de pós-graduação.

Diferentemente do ocorrido nos anos 80 e 90, quando osrecursos para o fomento à pesquisa eram escassos eintermitentes, nos últimos cinco anos o aporte financeirogovernamental para a investigação científica aumentou e sediversificou, associando-se mecanismos de fomento em nívelregional, com o recente fortalecimento das Fundações

Estaduais de Apoio à Pesquisa – FAPs –, viabilizando apoio aprojetos com lançamento de editais em nível local.

Todas estas iniciativas têm estimulado a produçãocientífica e permitido criar elos formais e informais entrepesquisadores dentro do país, melhorado o conhecimentosobre a realidade nacional, aumentado a produção científica,o intercâmbio entre grupos e diversificado a temática dainvestigação no país.

Embora ainda não devidamente avaliadas, as iniciativaspara promover parcerias interinstitucionais redundaram emcriação de novos cursos de pós-graduação, principalmentede doutorados, em regiões onde eles não existiam. Assim,estes programas baseados no princípio da solidariedade vêmcontribuindo para o desenvolvimento científico local e paradesconcentrar a formação de mestres e doutores da RegiãoSudeste.

Bortolozzi & Gremski em seu artigo sobre as assimetriasna pesquisa e na pós-graduação brasileira, reconhecem oesforço empreendido mas mostram as dificuldades para mudara atual situação. Em 2002 a Região Sudeste recebeu 60% dosrecursos disponíveis para a Ciência, Tecnologia, Inovação efundos setoriais, pois possui 63% dos doutores brasileiros,64% das bolsas da Capes, 58% dos programas de pós-graduação, embora não mais do que 43% da populaçãobrasileira (BORTOLOZZI, F.; GRAMSKI, W., 2004).

Em meados dos anos 90, conseqüente às mudançastécnicas e transformações econômico-sociais em curso nopaís que exigiam a presença de profissionais com perfis deespecialização distintos dos tradicionais, caracterizados pelaalta qualificação e produtividade nos serviços que prestam, aCAPES iniciou uma discussão sobre a necessidade de umaflexibilização do sistema tradicional de formação de pessoalem nível de mestrado. Foi criada a modalidade MestradoProfissional (Portaria n° 47 de 17/10/95: Programa deFlexibilização do modelo de pós-graduação stricto sensu emnível de Mestrado), por constatar-se que a qualificaçãodenominada “acadêmico-científica” era predominantementepara a carreira docente.

Programas voltados para tal clientela apresentar-se-iamdistintos dos tradicionais na orientação dos currículos, nacomposição do corpo docente e discente, nas formas definanciamento e nos arranjos institucionais.

No final de 1998, através da Portaria n° 48 (“Dispõesobre o reconhecimento dos mestrados profissionais e dáoutras providências”), a CAPES reconhece os mestradosprofissionais, explicitando duas diretrizes básicas: Primeiro,a formação de profissionais pós-graduados nessamodalidade deve torná-los aptos a elaborar novas técnicase processos de forma diferenciada de egressos dos cursosde mestrado que aprofundam conhecimentos ou técnicasde pesquisa científica, tecnológica ou artística; Segundo,estabelece o caráter de terminalidade nessa modalidade(CAPES, 2007b).

No ano de 2006 já existiam 157 programas de MestradoProfissional no território nacional, com ingresso de 3.272

Page 104: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

94 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):90-97Maria do Carmo Leal

alunos e 2.519 titulados, mostrando o grande potencial decrescimento desta modalidade de formação.

Somente em dezembro de 2004, 19 anos após o lançamentodo último Plano Nacional de Pós-Graduação, foi publicado oQuarto Plano referente ao qüinqüênio 2005-2010.

O Quarto Plano se inicia reconhecendo a importância daeducação como um poderoso instrumento dedesenvolvimento social e econômico e que o sucesso da pós-graduação brasileira se deve a vários fatores, dentre eles aestreita participação da comunidade científica nacional einternacional na sua construção, acompanhamento eavaliação, sob a coordenação da CAPES que, junto ao CNPq,asseguraram recursos e a continuidade governamental destapolítica pública. O objetivo norteador deste último Plano é aexpansão do sistema, adequando-o às necessidades do paíse da sociedade brasileira.

Na análise apresentada dos dados históricos da pós-graduação identifica-se um grande aumento da produtividade,aferida pelo número de alunos titulados e pelo aumentoexpressivo das publicações e citações de artigos. Também severifica uma pequena redução nas assimetrias regionais, coma Região Sudeste diminuindo relativamente a sua participaçãono conjunto dos cursos, de 83% em 1996 para 63% em 2004.Ratifica-se o investimento nesta tendência e na flexibilizaçãodo modelo da pós-graduação para aumentar a sua qualidade,adequar-se às especificidades das áreas do conhecimento eimpactar na área acadêmica e empresarial.

O Plano detém-se também no diagnóstico da precariedadeainda presente na formação pós-graduada do docente doensino superior e principalmente o estado de abandono daformação docente para a educação básica. Há uma claraexplicitação de compromisso com a capacitação neste últimonível, dada a carência do país e a capacidade de respostademonstrada pela pós-graduação ao longo das últimasdécadas.

O Quarto Plano Nacional prevê também um investimentodiferenciado na formação científica e tecnológica em áreasconsideradas estratégicas para a Política Industrial e deComércio Exterior, em reposta ao diagnóstico já feitoanteriormente, bem como a valorização de processos eprodutos tecnológicos, como novos indicadores na avaliaçãodos produtos e resultados dos cursos.

No capítulo que se refere à Cooperação Internacional, umdestaque é dado à busca de um maior aprimoramento dodesenvolvimento científico da pós-graduação e na suainserção no Plano Nacional de Desenvolvimento Econômicoe Social do país. Estimula-se aumento de intercâmbio de alunos(pós-graduação e graduação), professores e instituições e oestabelecimento de redes de pesquisa e colaboração científicadestacadamente na cooperação Sul-Sul.

Novos Desafios e Oportunidades para a Pós-Graduação

A maturidade hoje alcançada pela pós-graduação brasileirapermite que novos desafios se coloquem em relação à sua

expansão para além das fronteiras nacionais. A área de C&Tpode se habilitar a ser um dos componentes importantes dapolítica externa brasileira de integração cultural e desolidariedade e apoio ao desenvolvimento científico dos paísesda América Latina e África, particularmente os de língua oficialportuguesa – PALOP.

Há muitos anos o Brasil oferece gratuitamente vagas nasuniversidades públicas para formação superior de alunosoriundos dos países latino-americanos (Programa de Convêniode Estudante de Graduação PEC-G). O mesmo processo sepassa em relação à formação de mestres e doutores, a qual aCAPES e o CNPq disponibilizam um programa de bolsas deestudo (Programa Estudante Convênio da Pós-GraduaçãoPEC-PG). Em 2007, 88 bolsas de mestrado e 92 de doutoradoforam apoiadas, mais de 2/3 delas para estudantes latino-americanos, 27 para africanos e 14 para o Timor Leste (http://www.cnpq.br/resultados/2007/pec-pg.htm).

Um número crescente de bolsas PEC-PG tem sidodisponibilizado para alunos residentes nestes países, comoparte de uma estratégia brasileira de consolidação e priorizaçãodas relações Sul-Sul, no contexto internacional.

A proposta do PROSUL e do PROAFRICA instituídos em2001 e 2004 respectivamente, no âmbito do Ministério deCiência e Tecnologia, sob comando do CNPq, é promover ointercâmbio de pesquisadores do Brasil e dos países sul-americanos e africanos, em especial os lusófonos, com oobjetivo de elevação mútua da capacidade científico-tecnológica (CNPq/PROSUL, 2007; CNPq/PROAFRICA, 2007).

A experiência conduzida pela Capes, de estimulo àsparcerias entre instituições brasileiras com programas de pós-graduação já consolidados e outras em fase de consolidação,para o fortalecimento da investigação científica, da formaçãodocente e dos cursos de Mestrado e Doutorado, pode seradaptada para utilização fora do país. Ou seja, é possívelrealizar cursos de pós-graduação oferecidos pelas Instituiçõesde Ensino Brasileiras nos países latino-americanos e africanos,como um potente instrumento para o desenvolvimentocientífico destes países.

A Experiência da Fiocruz

Um exemplo da potencialidade deste caminho pode servislumbrado na experiência que a Fundação Oswaldo Cruzvem tendo na cooperação com os países africanos de línguaportuguesa.

Como Instituto de Ciência & Tecnologia devotado ao temada saúde e pertencente ao Ministério da Saúde, a instituiçãorealiza atividades de ensino, pesquisa e desenvolvimentotecnológico, é laboratório de referência para o diagnóstico evigilância de várias doenças e para o controle de qualidade deprodutos do Sistema Único de Saúde (SUS), além de produzirinsumos diagnósticos, imunobiológicos e medicamentos parao SUS.

A Fiocruz tem cerca de 4.200 servidores e mais 5.000terceirizados distribuídos em 14 Unidades Técnico Científicas,

Page 105: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

95Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):90-97 Ciência e Ensino

estando 9 delas localizadas no Rio de Janeiro e em Manaus,Recife, Salvador, Belo Horizonte e Paraná. Além disto, tem umescritório de representação no Distrito Federal.

Dezessete programas de pós-graduação se desenvolvemdentro destas Unidades Técnico Científicas, a maioria delesligados à área das Ciências Biológicas e Ciências da Saúde(Saúde Coletiva e Medicina). Têm ainda representação o campoda Educação em Ciência, História da Ciência e da Saúde, alémda área Multidisciplinar.

Com a experiência consolidada em mais de trinta anos deensino no mestrado e doutorado, a Fiocruz, como outrasinstituições nacionais, colaborou com várias universidadesbrasileiras estabelecendo parcerias para apoiar odesenvolvimento científico local, bem como desenvolveuestreita relação entre as suas próprias Unidades TécnicoCientíficas apoiando e consolidando programas de pós-graduação naquelas que estavam em regiões de menordensidade científica e tecnológica.

Vários dos Programas de pós-graduação da Fiocruzsolicitaram credenciamento à CAPES para a realização deMestrados Profissionais. Isto porque esta modalidade decurso, destinada à formação profissional, tem uma grandesintonia com a missão institucional da Fiocruz que ésimultaneamente um instituto de C&T mas, inserido noMinistério da Saúde com uma forte tarefa de formação dosseus quadros e dos gestores do sistema público da saúde.Nos últimos quatro anos cerca de 300 alunos foram tituladosneste tipo de curso.

Na relação da Fiocruz com os PALOP lembramos que osprimeiros alunos que vieram estudar na instituição remontamos anos 70 Entre 70 e 90 apenas cinco estudantes foramrecebidos, na década seguinte, 25 alunos e entre 2000 e 2006somaram 170, em cursos de vários tipos desdeaperfeiçoamento, especialização, mestrado e doutorado, emdiversas unidades da Fiocruz, mas com uma concentração de80% deles na Escola Nacional de Saúde Pública.

Em 1996, pela primeira vez, a instituição recebeu apoiofinanceiro da Agência Brasileira de Cooperação do Ministériodas Relações Exteriores e da Japan InternacionalCooperation Agency – JICA – para desenvolver um projetode formação profissional de curta duração para profissionaisdos países africanos de língua portuguesa. Os projetosfinanciaram propostas de capacitação nas áreas da SaúdePública e dos cuidados primários da saúde, principalmenteatravés da vinda de alunos africanos à Fiocruz. A ida de umamissão exploratória de profissionais da Fiocruz a todos osPALOP para um diagnóstico da situação dos sistemas desaúde também fez parte desta etapa. Em continuidade a estasiniciativas, no início de 2000 alguns cursos presenciais foramrealizados em Luanda – Angola e Maputo – Moçambique ecursos à distância foram ofertados para Cabo Verde, SãoTomé e Príncipe e Guiné Bissau, por professores da Fiocruz(FIOCRUZ, 2000).

Uma lição aprendida deste início de cooperação foi queeste esforço de formação desarticulado não redundava em

efetividade para a organização e o desenvolvimento dasinstituições e dos sistemas de saúde locais. E mesmo osmestres e doutores que foram formados na Fiocruz não ficaramnas universidades dos seus países de origem. Foram alçadosa melhores empregos em outros países ou mesmo emorganismos internacionais.

O maior desafio para o Brasil na cooperação com os paísesafricanos é instituir um padrão de intercâmbio técnico ecientífico que colabore com a formação criativa de profissionaiscapazes de edificar instituições estruturantes para os sistemaslocais destruídos pelas guerras e ainda em franco processode esfacelamento.

A dramática situação social e de saúde da maioria dosPALOP, que apresentam indicadores de condição de vidapiorados depois da independência, com nível de expectativade vida que atualmente não ultrapassa os 40 anos, dá umadimensão da urgência na modificação da atual situação.

Cooperações internacionais de todos os tipos estãoconstantemente sendo ofertadas pelos países desenvolvidosaos africanos. Para ser diferente e efetiva, a cooperaçãobrasileira no campo da formação de pessoal tem que estaracoplada a um projeto estratégico de recomposição dasinstituições nacionais daqueles países.

A Parceria com Angola

A Fiocruz recebeu apoio do PROAFRICA em 2005 para idade uma missão a Angola com o objetivo de organizar um cursode mestrado naquele país. Na ocasião optou-se por discutircom o Ministério da Saúde de Angola: 1 – a integração doprojeto do mestrado de Saúde Pública ao compromisso dafundação de uma Escola Nacional de Saúde Pública que seresponsabilizaria pela formação dos quadros gestores doSistema de Saúde; 2 – o curso de mestrado seriaprioritariamente destinado aos futuros professores da escola;3 – o curso seria desenhado para responder às necessidadesdesta clientela, habilitando-a para a função docente e o domíniodas disciplinas que compõem o campo da Saúde Pública.

O curso apoiado pela CAPES iniciou-se em março de 2007,com 33 alunos matriculados (até agora sem desistências), quedeverão fazer a sua qualificação no início de 2008. Asdisciplinas são oferecidas durante uma semana a cada mês,por professores da Fiocruz. A avaliação dos professores sobreos alunos é muito positiva.

No segundo ano está prevista a vinda dos mestrandos àFiocruz por um período de dois a três meses para analisar osdados das suas monografias e redigir os resultados dos seusestudos com os orientadores. Após a conclusão do mestradoalguns alunos poderão ser encaminhados para completar asua formação no doutorado no Rio de Janeiro.

As vantagens deste modelo de formação são apermanência dos alunos nos seus postos de trabalhosenquanto estudam, impossibilita a migração, mudança de paíse perda do investimento feito, possibilita a criação de umespírito de equipe no grupo que continuará partilhando de

Page 106: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

96 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):90-97Maria do Carmo Leal

uma experiência comum de trabalho após o curso, além dovantajoso custo-benefício do projeto.

As desvantagens são principalmente referidas à ausênciado ambiente acadêmico que há na instituição promotora docurso, indo desde as bibliotecas até às discussões científicase culturais que tanto colaboram na formação dos alunos.

Com o intuito de dar suporte para a organização da futuraEscola de Saúde Pública de Angola, a Fiocruz se comprometeua colaborar na definição das bases legais, estatuto, estruturafísica e organizacional da escola. E, com o apoio da AgênciaBrasileira de Cooperação do Ministério das Relações Exteriorestambém se disponibilizou a enviar livros doados pela EditoraFiocruz, conseguir doações de assinaturas de revistascientíficas brasileiras, bem como oferecer assessoria etreinamento especializados para organização de biblioteca ede portais para internet.

A Parceria com Moçambique

A outra experiência em curso na Fiocruz, de colaboraçãocom a África, é com Moçambique. Neste país, a proposta dequalificação de pessoal em nível de mestrado, se orienta parao fortalecimento do Instituto Nacional de Saúde Pública, quecorresponde ao Laboratório Nacional de Saúde daquele país.O curso seria oferecido por um consórcio das pós-graduaçõesna área de biociências do Instituto Oswaldo Cruz.

Com apoio do PROAFRICA, a Fiocruz fez uma primeiraviagem de missão científica em junho de 2007 para conheceras condições físicas e competências científicas locais doInstituto Nacional de Saúde Pública e da Faculdade deMedicina da Universidade Eduardo Mondlane, bem comodefinir conteúdos, clientela e as bases de desenvolvimentodo curso. A existência de uma estrutura de laboratório e deseis doutores/pesquisadores no Instituto viabilizou ocompartilhamento de responsabilidades na condução doprocesso. A coordenação do curso será de responsabilidadeda Fiocruz e uma coordenação adjunta será local, feita por umpesquisador do instituto. Da mesma forma, a orientação dealunos terá, sempre, a participação de um pesquisador doInstituto ou da Universidade.

O curso destinar-se-á prioritariamente para a formação dejovens pesquisadores para o Instituto Nacional de Saúde,dentro de uma perspectiva de absorção futura destesprofissionais nos quadros da instituição.

No momento atual o prazo para inscrições está aindaaberto. O processo de seleção ocorrerá em fevereiro de 2008 eo início das aulas está previsto para março deste mesmo ano.

Da mesma forma que no curso que se desenvolve emAngola, os mestrandos passarão um período de 3 a 6 mesesna Fiocruz em contato com o seu orientador, na fase de análiselaboratorial e dos resultados do estudo. Completada a fase domestrado, alguns alunos poderão ser selecionados para viremfazer o doutorado no Rio de Janeiro.

Paralelo ao processo de organização do curso, apresidência da Fiocruz, que participa da diretoria da Associação

Internacional de Laboratórios de Saúde Pública, solicitou aesta organização um apoio logístico e financeiro para osInstitutos de Saúde Pública dos PALOP. Um diagnóstico dasnecessidades dos Institutos já foi feito e a Bill e MelindaGates Foundation se disponibilizou a colaborar nofortalecimento de alguns dos Institutos, dentre eles o deMoçambique.

No campo da parceria científica, foi submetido e financiadopelo PROAFRICA um projeto de investigação propostoconjuntamente por cientistas da Fiocruz e do Instituto Nacionalde Saúde de Moçambique.

Escolas e Institutos Nacionais de Saúde Pública sãoinstituições estruturantes dos Sistemas Nacionais de Saúdepara formar gestores, organizar as estatísticas vitais, fazer odiagnóstico de doenças, epidemias, agravos em saúde,controle de produtos, vigilância, monitoramento einvestigação dos problemas de saúde das populações.Profissionais capazes de fazer investigações epidemiológicasde campo, dominar os recursos de diagnóstico laboratorial,fazer análise dos dados e publicá-los são necessários nestespaíses.

O manifesto interesse africano na cooperação bilateral como Brasil busca beneficiar-se da experiência brasileiraprincipalmente nos campos sociais da educação, saúde e naagricultura.

Sensibilizado com as necessidades dos países africanos einteressado no aprofundamento das relações comerciais entreo Brasil e estes países, em franca expansão, o Presidente Lulacriou um escritório da Empresa Brasileira de PesquisaAgropecuária – Embrapa – em Gana, em 2006 (EMBRAPA,2007) e criará um escritório da Fiocruz em Moçambique emmarço de 2008.

Considerações Finais

O ano de 2007 foi marcado pelo lançamento do Plano deAceleração do Crescimento do Governo Federal que se compôscom os Planos de Ações ministeriais para o quadriênio 2007-2010. Os grandes desafios colocados para a pós-graduaçãobrasileira no IV Plano Nacional são reiterados no Plano deAção do Ministério da Educação (PAC DA EDUCAÇÃO, 2007)e como um componente da primeira linha de ação do Plano doMinistério da Ciência e Tecnologia – expansão e consolidaçãodo Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação – (PACDA AÇÃO, 2007). O PAC da Saúde Mais saúde, direito detodos tem um capítulo dedicado à cooperação internacionalque identifica a saúde como “uma das áreas com maiorpotencialidade para contribuir com as estratégias da políticaexterna brasileira tanto sob o prisma da geopolíticainternacional quanto da necessidade de fortalecimento deblocos regionais, estreitando os laços de solidariedade comnações menos desenvolvidas” (PAC DA SAÚDE, 2007).

Os planos ministeriais, em sintonia com o governo federal,se alinham com as prioridades governamentais para a políticaexterna na cooperação Sul-Sul. A pós-graduação brasileira

Page 107: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

97Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):90-97 Ciência e Ensino

está pronta para dar a sua contribuição mais efetiva a estemovimento, levando a acumulação, criatividade, competênciae generosidade que fizeram parte da constituição da suahistória para os países irmãos da América Latina e África.

“O Brasil e a África estão fadados a caminhar lado alado, em nome da fraternidade, da solidariedade e dosdemais valores que lhes são comuns. Trata-se de um destinoinelutável, que se consagrará plenamente ao longo desteséculo, em benefício das futuras gerações de brasileiros eafricanos. Estamos diante do desafio de construir um imensoespaço de cooperação sul-sul. Transmitimos ao mundo – econtinuaremos a transmitir – um saudável exemplo decoesão, harmonia e respeito mútuo. Esperemos que esseexemplo se transforme em parâmetro ideal, capaz de inspirartodos aqueles que, nas décadas que se aproximam, deterãoo poder de influenciar os rumos das relações internacionais”(Embaixador Macieira sobre a política externa do Brasil para aÁfrica na Escola de Guerra Naval, 2007).

Referências

1. BORTOLOZZI, F.; GREMSKI, W. Pesquisa e pós-graduação brasileira– assimetrias. Revista Brasileira de Pós-Graduação 1 (2): 35-52. 2004.2. CAPES Portaria Nº 080, de 16 de dezembro de 1998. Dispõe sobre oreconhecimento dos mestrados profissionais e dá outras providências.( h t t p : / / w w w . c a p e s . g o v . b r /result.jsp?field=title&field=keywords&field=description&field=content&query=portaria+47&index=capes), 2007.3. CARVALHO, A.C.C., CAMPOS, D.A.; BEVILACQUA, L. (org)Science in Brazil. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Ciências, 330p, 2002.4. ______. Science and Technology in Brazil:current situation andfuture perspectives, p 5 – 8, in Carvalho A C C; Campos D A; BevilacquaL (org) Science in Brazil. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Ciências,330 p, 2002. 2002.5. CNPq Cooperação internacional – Programa Sul-Americano de Apoioàs Atividades de Cooperação em Ciência e Tecnologia – PROSUL, 2007.6. CNPq Cooperação internacional – Programa de Cooperação Temáticaem Matéria de Ciência e Tecnologia – PROAFRICA, 2007.

7. EMBRAPA Labex e Escritório de Negócios no Exterior (http://www.embrapa.br/a_embrapa/labex), 2007.8. FIOCRUZ Assessoria de Cooperação Internacional.DocumentosInstitucionais. Rio de Janeiro, 2000.9. JANINE, R. Solidariedade e cooperação na avaliação da pós-graduação( h t t p : / / w w w . c a p e s . g o v . b r /result.jsp?index=capes&field=title&field=keywords&field=description&field=content&query=minter%2Fdinter).10. GLANZEL, W.; LETA, J.; THIJS, B. Science in Brazil. Part 1 – Amacro level comparative study. Sociometrics, 67(1):67-86. 2006.11. MEC – INEP – Resultados da aplicação do PISA 2006 (http://www.inep.gov.br/download/internacional/pisa/aplicacao_pisa2006.pdf).12. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO – MEC/CAPES – Plano Nacionalde Pós-Graduação (PNPG) 2005-2010. Brasília, dezembro de 2004.13. PORTAL DA CAPES estatísticas (http://ged.capes.gov.br/AgDw/silverstream/pages/frPesquisaColeta.html), 2007.14. PORTAL CNPq – Grupos de Pesquisa (http://dgp.cnpq.br/censos),2007.15. MANEGHINI, R. The key role of collaborative work in the growth ofBrazilian science in the last ten years. Sociometrics,35(3):367-373. 1996.16. MARCHELLI, P.S. Formação de doutores no Brasil e no mundo:algumas comparações. Revista Brasileira de Pós-Graduação 2 (3): 7-29. 2005.17. PAC DA EDUCAÇÃO (http://portal.mec.gov.br/), 2007.18. PAC DA SAÚDE – Mais Saúde, Direito de Todos (http://bvsms.saude.gov.br/bvs/pacsaude/programa.php), 2007.19. PLANO DE AÇÃO 2007-2011 – Ciência, Tecnologia e Inovaçãopara o Desenvolvimento Nacional. (http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/66226.html), 2007.20. SALLES FILHO, S. Política de Ciência e Tecnologia no I PND (72-74) e PBDCT (73-74), Revista Brasileira de Inovação, 1 (2): 397- 419,jul-dez 2002.21. ______. Política de Ciência e Tecnologia no II PND (1976), RevistaBrasileira de Inovação, 2 (1): 179- 211, jan-jun 2003.22. ______.Política de Ciência e Tecnologia no III PND (80-85),Revista Brasileira de Inovação, 2 (2): 407- 432 , jul-dez 2003.23. THE SCIENTIST MAGAZIN OF THE LIFE SCIENCES. Bestplaces to work. Nov 2007.24. VARGAS, J.I. Science and Technology in a Developing Country:The Brazilian Case p 9 – 50 in Carvalho A C C; Campos D A; BevilacquaL (org) Science in Brazil. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Ciências,330 p, 2002.25. VELLOSO, A.; LANNES, D.; MÉIS, L. Concentration of science inBrazilian governmental universities. Sociometrics, 61(2):207-220. 2004.

Page 108: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

98

Desenvolvimento de Medicamentos no Brasil: DesafiosDesenvolvimento de Medicamentos no Brasil: DesafiosDesenvolvimento de Medicamentos no Brasil: DesafiosDesenvolvimento de Medicamentos no Brasil: DesafiosDesenvolvimento de Medicamentos no Brasil: Desafios

The Drug Development in Brazil: Challenges

João B. Calixto & Jarbas M. Siqueira Jr.Departamento de Farmacologia da UFSC; Florianópolis, SC, Brasil

Este artigo enfatiza o processo de desenvolvimento mundial de medicamentos, dando atenção especial ao cenáriodas indústrias farmacêuticas brasileiras, no que diz respeito a descoberta e o desenvolvimento de novos fármacos.Processo este que é longo, custoso e de alto risco, e por estas razões, está basicamente restrito aos países desenvolvidoscomo os Estados Unidos, Japão e alguns países Europeus. Apesar disso, o Brasil possui um grande mercado demedicamentos, porém esse mercado é quase que completamente dependente da matéria-prima produzida pelascompanhias multinacionais de alguns países desenvolvidos (USA) e em desenvolvimento (Índia). No presenteartigo, procuramos discutir os recentes avanços e as iniciativas governamentais lançadas nos últimos 10 anosvisando estimular a pesquisa e o desenvolvimento do setor farmacêutico brasileiro. Concluímos que o Brasil temcriado, principalmente na última década, a infra-estrutura e as condições básicas que certamente permitirão oestabelecimento de um importante pólo farmacêutico nos próximos anos.Palavras-chave: indústria farmacêutica, medicamentos, desenvolvimento de novas drogas.

This article focuses on the worldwide drug development process, giving special attention to the scenario of the BrazilianPharmaceutical Companies, in terms of drug discovery and development. The course of discovering and developing newdrugs is long, costly and of high risk, and for that reasons, it is basically restrict to some developed countries such as UnitedStates, Japan and a few European countries. Brazil has a great drug market, but this market is almost fully dependent onmedicines produced by multinational companies from developed countries. Here, we discussed the recent governmentalinitiatives to stimulate the research and development of the pharmaceutical sector in Brazil. We believe that Brazil has beenimplementing, especially in the last decade, the basic support that will certainly permit the establishment of a strongpharmaceutical park in a near future.Key words: Pharmaceutical industry, drugs, development of new drugs.

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. João Batista Calixto. Departamentode Farmacologia – CCB/UFSC – Bloco D – Campus UniversitárioTrindade. 88.040-900. Florianópolis, SC, Brasil. Tel.; (48) 3721-9491R. 229 – FAX: (48)32329139. Endereço eletrônico:[email protected]; [email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):98-106.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Breve Histórico sobre a Origem dos Medicamentos

Desde os primórdios da civilização, a procura pelotratamento das principais doenças que acometem ahumanidade tem sido uma preocupação constante dapopulação. Essa informação é facilmente comprovada pelosinúmeros registros encontrados nas primeiras civilizações quehabitaram a terra. Basicamente, os recursos terapêuticosutilizados pelos nossos ancestrais concentravam-se nosrecursos da natureza, notadamente nas plantas, animais eminerais.

Com certeza, a principal contribuição para odesenvolvimento da terapêutica moderna foi a utilizaçãodas plantas medicinais, inicialmente pelos Egípcios e quedepois foi alastrando para outras regiões do mundo. Háregistros do uso de muitas plantas medicinais, como apapoula (Papaver somnniferum), maconha (Cannabissativa), babosa (Aloe vera), dentre outras, há milhares deanos antes de Cristo. Contudo, foi somente no século XIX

que se iniciou a procura pelos princípios ativos presentesnas plantas medicinais, criando assim, os primeirosmedicamentos com as características que nós osconhecemos atualmente. Friedrich Serturner em 1806 foi opioneiro e o primeiro a isolar o alcalóide morfina da papoula,fato que marcou uma busca constante por outrosmedicamentos a partir de plantas. Em 1824 Pierre-JeanRobiquet isolou a codeína (antitussígeno) também dapapoula e em 1848, George Fraz Merck isolou a papaverinadesta mesma planta. Outros exemplos importantes demedicamentos isolados de plantas foram a atropina(antagonista muscarínico) isolada da Atropa beladona porMein em 1831; a cafeína obtida por Runge em 1820 da Coffeaarábica; digoxina (digitálico) isolada por Claude-AdopheNativelle a partir da Digitalis lanata e o curare (relaxantemuscular) isolado por Winstersteiner e Dutcher em 1943 doChondrodendron tomentosum. Entretanto, o marco históricono processo de desenvolvimento da indústria farmacêuticamundial foi a descoberta da salicina (analgésico e antitérmico)por Rafaele Piria em 1829 a partir da planta Salix alba. A partirda salicina foi realizada a primeira modificação estrutural,originando o ácido salicílico em 1839, utilizado no tratamentoda artrite reumatóide. A partir do ácido salicílico, Felix Hoffmansintetizou a aspirina (acido acetil salicílico) em 1897. Nasce entãoa famosa e poderosa indústria farmacêutica da Alemanha etambém a primeira patente que se tem conhecimento na áreade medicamento.

Page 109: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

99Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):98-106 Desenvolvimento de Medicamentos no Brasil

Outro grande marco no surgimento da indústriafarmacêutica moderna foi a descoberta feita pelo iminentemédico e pesquisador alemão Paul Erlich (1854 - 1915), prêmioNobel de Medicina e Fisiologia em 1908, que estabeleceu oconceito acerca do mecanismo de ação dos medicamentos,que foi fundamental para a criação dos medicamentossintéticos. Paul Erlich cunhou o seguinte conceito: “CorporaNon Agunt Nisi Fixate” – Uma substância química nãofuncionará a menos que ela seja capaz de se ligar em um sítioespecífico. A partir das descobertas de Paul Erlich, surgiu nosanos subseqüentes, o conceito relativo aos receptoresfarmacológicos, que propiciou o desenvolvimento da grandemaioria das drogas modernas disponíveis no mercado. Surgiuentão a importante definição do termo “Quimioterapia”.Contudo, a enorme contribuição de Paul Erlich para odesenvolvimento da terapêutica moderna, não ficou restrita aesse conceito fundamental. Em 1906, Paul Erlich trabalhandocom corantes e em parceria com a Hoechst, decidiu fazermodificações estruturais nos compostos chamadosarsenobenzenos. Após sintetizar 606 compostos, descobriu aarsfernamina (também conhecido por composto 606),denominado posteriormente como Salvarsan, utilizado para otratamento da sífilis. Além disso, Paul Erlich inovou aindamais, estabelecendo ele próprio, as primeiras noções do queconhecemos hoje sobre a pesquisa clínica, desenhando osprimeiros protocolos clínicos para avaliar a eficácia doSalvarsan em diversas clínicas da Alemanha.

Nas primeiras décadas do século XX, surgem ainda,embora de forma não planejada (serendipitous observations),outras descobertas importantes de alguns medicamentos quemarcaram a história da humanidade. Entre outros, pode sermencionado a descoberta da sulfonamida, e mais tarde dapenicilina por Alexander Fleming em 1928. A produção emescala industrial da penicilina pela Pfizer foi uma das maiorescontribuições da indústria farmacêutica para a terapêuticadurante a segunda guerra mundial, evitando assim a morte demilhares de pessoas.

Outro grande marco para o surgimento da indústriafarmacêutica moderna foi o entendimento de que o sucessonesta área dependia de um trabalho conjunto entre váriosprofissionais, incluindo biólogos, médicos, químicos, etc. Nointervalo entre a primeira e a segunda guerra mundial esseconceito foi estabelecido, surgindo a necessidade de realizarestudos pré-clínicos em animais para analisar o mecanismo deação de um novo composto e principalmente o seu possívelefeito tóxico (segurança). Um acidente ocorrido nos EstadosUnidos onde 76 pessoas morreram envenenadas após o usoda sulfonamida contendo 72% de dietilglicol como solvente,levou Ceiling e Cannon (1938) a sugerir os princípios básicospara a realização dos ensaios clínicos para novosmedicamentos, o que culminou com o estabelecimento doCódigo de Nuremberg, válido até hoje. Estabeleceu-se a partirdaí o conceito sobre a utilização de voluntários para arealização dos estudos clínicos e, por conseqüência, anecessidade de se criar os comitês de éticas em pesquisa

clínica. Ficou estabelecido que antes de ser administrada aoser humano, qualquer nova droga deveria apresentar asseguintes características:

• Composição química, método de preparação e o graude pureza bem estabelecidos;

• Testes de toxicidade aguda e prolongada por dosesrepetidas (segurança) em diferentes espécies animais;

• Realização de completa análise patológica em diversosórgãos animais, especialmente nos rins e fígado;

• Conhecimentos acerca da sua absorção, excreção,concentração nos tecidos, etc;

• Possível interação com outras drogas e alimentos.Surgiam assim, os estudos clínicos conhecidos hoje como

de fase I, II e III necessários para a avaliação da segurança eda eficácia de um novo medicamento. Paralelamente, foi criadonos Estudos Unidos em 1906, o “Food and drug act”, quemais tarde foi transformado na Agência Americana para oControle de Alimentos e Medicamentos (FDA), que nestaocasião analisava os medicamentos somente quanto ao seugrau de pureza e o padrão de qualidade. Em 1951 o FDA passoua definir que algumas drogas não atendiam a necessáriasegurança para uso humano, e estabeleceu que osmedicamentos devessem ser usados somente sob prescriçãomédica. Entretanto, o grande acidente ocorrido em váriospaíses do mundo com o uso clínico da talidomida utilizadadurante os primeiros meses da gestação, que resultou nonascimento de milhares de crianças com ausência de váriosmembros (focomegalia), levou a FDA em 1962 a estabelecerque antes do uso clínico ou da realização de propaganda deuma nova droga, o fabricante deve provar não somente a suaeficácia, mas principalmente a sua segurança. A partir dessanova decisão da FDA, a maioria dos países passou a adotaresses mesmos critérios e os medicamentos passaram por umrigoroso processo de análise, antes da sua aprovação eposterior uso clínico.

O Mercado Brasileiro, o Mercado Mundial e a Produção deMedicamentos

A partir da segunda guerra mundial, surge a indústriafarmacêutica em vários países da Europa e, sobretudo, nosEstados Unidos. A indústria farmacêutica passa a utilizar osrecursos da química sintética para aumentar o arsenalterapêutico. Surgem as grandes corporações farmacêuticasmultinacionais, sediadas em poucos países, principalmentenos Estados Unidos, Japão, Alemanha, Suíça, Inglaterra eFrança. Uma forte e estreita interação entre as principaisindústrias farmacêuticas, as universidades de vários países einstitutos de pesquisas da Europa e Estados Unidos passoua ser firmada, iniciando a partir daí, o conceito modernoempregado para a descoberta e o desenvolvimento de novosmedicamentos baseados em:

• Descoberta de alvos terapêuticos;• Desenho e seleção da molécula líder para o alvo

pretendido;

Page 110: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

100 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):98-106João B. Calixto & Jarbas M. Siqueira Jr.

• Otimização da molécula líder;• Desenvolvimento do candidato ao desenvolvimento;• Finalmente, a descoberta do medicamento.Para realizar com sucesso todas essas etapas, as grandes

indústrias farmacêuticas mundiais, além das parceriasrealizadas com as universidades, passaram a construir centrospróprios de pesquisas onde trabalham milhares de renomadospesquisadores de todas as áreas envolvidas nodesenvolvimento de uma nova droga. Para agilizar esseprocesso, a indústria passou a utilizar os recursos da químicacombinatória, e a realizar testes totalmente controlados porrobôs de alta capacidade, capazes de testar mais de 1 milhãode amostras a cada ano. Esse fato, ao mesmo tempo em quereduziu em parte, o tempo da descoberta de novas drogas, fezcom que os custos de desenvolvimento de um novomedicamento aumentassem expressivamente ( DIMASI et al.,2003). Além disso, a limitação na descoberta de novos alvosfarmacológicos, fez com que o desenvolvimento de novosmedicamentos reduzisse substancialmente nos últimos anos.Assim, de cada 30.000 moléculas sintetizadas, 20.000 (66,7%)entram na fase de estudos pré-clínicos, 200 (0,67%) entram nafase I de estudos clínicos; 40 (0,13%) passam para a fase II, 12(0,04%) entram na fase III e somente 9 (0,027%) são aprovadospelos órgãos regulatórios. É importante mencionar ainda queapenas 1 medicamento aprovado (0,003%) satisfaz o mercado,e em função disso, traz retorno para a industria que odesenvolveu.

Acima de qualquer outro setor, a indústria farmacêuticamundial é a que mais investe em pesquisa, desenvolvimento einovação (P,D&I), cerca de 20% do seu faturamento dasvendas, contra 6% da indústria eletrônica, 5% das indústriasde telecomunicações e 4% da industria automobilística (KALIL,2007). Por causa disso, e principalmente em função do longotempo de desenvolvimento, dos altos custos e dos riscosenvolvidos no desenvolvimento de um novo medicamento(estimado atualmente em mais de 1 bilhão de dólares), essaspesquisas ficam restritas a poucos países desenvolvidos. OsEstados Unidos são os líderes absolutos com cerca de 35%das descobertas mundiais, seguido do Japão 19%, Alemanha10%, França 9%, Reino Unido 7% e Suíça 5%. Esse quadrovem alterando ligeiramente nos últimos anos, mas acontribuição desses países no desenvolvimento de novosmedicamentos continua muito semelhante. Os dados da Figura1 mostram que apesar dos custos crescentes para desenvolveruma nova droga, a quantidade de novas entidades químicasaprovadas mundialmente vem decrescendo marcadamente acada ano, estabilizando em torno de 18 novas drogas em 2005e 2006. Para 2007, esse quadro não demonstra sinais dealterações (FRANTZ, 2005; OWENS, 2007). Tal fato, fez comque os investimentos em P&D por parte das grandesindústrias farmacêuticas mundiais passassem de cerca de 2bilhões de dólares na década de 1980, para mais de 40 bilhõesde dólares atualmente. Isso explica, pelos menos em parte, ogrande aumento dos preços observados para os novosmedicamentos. Os dados da Tabela 1 mostram que as

principais indústrias farmacêuticas mundiais detêm uma parcelaconsiderável do mercado mundial, que em 2006 foi cerca de643 bilhões de dólares, com estimativa de crescimento de 5-6% para 2008. Por causa dos aumentos crescentes dos gastosnecessários para se desenvolver novos medicamentosinovadores, associados aos elevados riscos envolvidos noprocesso, cada uma dessas grandes empresas necessita lançara cada ano entre 1 a 3 novas entidades químicas, e ainda mais,é necessário que esses produtos atinjam vendas superiores a1 bilhão de dólares anualmente (blockbuster). Esse fato temlevado a fusão das grandes corporações farmacêuticasmundiais, visando minimizar custos e maximizar seus lucros(FRANTZ, 2006).

As principais razões responsáveis pelas falhas nodesenvolvimento de novos medicamentos são: baixabiodisponibilidade 39%; ausência de eficácia (29%), detecçãoefeitos tóxicos 21%; razões de mercado 6% (VENKATESH,S.; LIPPER, R.A., 2000). Quanto mais avançada for a fase dedescontinuidade de um projeto de P&D na área dedesenvolvimento de novos medicamentos, maiores serão osprejuízos para a empresa. Em função disso, muitas indústriasfarmacêuticas estão fazendo grandes esforços visandoencontrar novos usos para os medicamentos já aprovados e/ou tentando rejuvenescer outros. A lista de descoberta paranovos usos dos medicamentos disponíveis no mercado ébastante grande e vem aumentando a cada ano (ASHBURN,T.T.; THOR, K.B., 2004). Merece ser também ressaltado ogrande número de novas drogas que saíram do mercadodurante a fase IV, principalmente por razões de segurança.Somente nos Estados Unidos entre 1999 a 2002, foram retiradasdo mercado 17 medicamentos, fato que aumenta ainda maisos custos e os riscos no desenvolvimento de novosmedicamentos (PREZIOSI, 2004).

Atualmente, todos os medicamentos conhecidos podemser enquadrados em cerca de 500 alvos moleculares, sendo queos relacionados com as proteínas G contribuem com cerca de45%, seguido pelas enzimas (28%), hormônios (11%), receptoresnucleares e DNA (4%), canais iônicos 5% e alvos ainda nãoconhecidos (7%) (GROOM, C.R.; HOPKINS, A.L., 2002).

O mercado brasileiro de medicamentos pode serconsiderado expressivo, levando-se em conta que uma parcelaimportante da população brasileira (cerca de 50%), ainda nãotem acesso aos mesmos por falta de recursos. Tendo em vistaque o Brasil encontra-se em um processo de crescimento, oaumento do PIB e a distribuição da renda podem causaraumentos significativos neste mercado. Os dados da Figura 2mostram que o Brasil ocupa um posição de destaque (9ºcolocado) no mercado mundial de medicamentos, sendocomercializados em 2006 mais de 8 bilhões de dólares nestesetor (IMS, 2006). É interessante observar que para 2008, oIMS Health prevê o crescimento de 12% a 13% para os setepaíses chamados “pharmerging” (Brasil, China, México,Coréia, Índia, Rússia e Turquia), podendo alcançar US$ 85-90bilhões, o que poderá representar cerca de 25 % do total emvendas de todo o mundo.

Page 111: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

101Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):98-106 Desenvolvimento de Medicamentos no Brasil

Figura 1. Novas moléculas aprovadas pelo FDA no períodode 1996-2007.

Fonte: FDA.

Figura 2. Os Dez maiores mercados mundiais demedicamentos. Valores em bilhões de dólares. Notar que oBrasil subiu uma posição em relação a 2005.

Fonte: IMS Retail Drug Monitor 2006.

Figura 3. Exportações, importações e déficit relacionado aosprodutos farmacêuticos (capítulo 30 da NCM) no período dejaneiro a novembro de 2007. Valores em Bilhões de dólares.

Figura 4. Evolução da participação de medicamentosgenéricos no mercado brasileiro. Os dados apresentados sãoreferentes à porcentagem do valor total de vendas em dólarese porcentagem de unidades vendidas.

Fonte: PróGenéricos.

Apesar disso, a indústria farmacêutica de capital nacionalbrasileira ainda é bastante incipiente, sendo considerada umaindústria de transformação. Os dados da Tabela 2 mostramque apenas 7 (sete) empresas nacionais figuram entre as 20maiores indústrias farmacêuticas instaladas no Brasil (IMS,2007). Assim, a grande maioria dos insumos farmacêuticos ede alguns medicamentos acabados é importada dos principaispaíses desenvolvidos e/ou de países em desenvolvimento(China, Índia, Israel e Coréia). Esse fato tem causado umcrescente aumento no déficit comercial da balança depagamentos no setor farmacêutico. Os dados sumarizados naFigura 3 revelam que em 2006 esse valor atingiuaproximadamente 2 bilhões de dólares, e em 2007 este valorultrapassou os 3 bilhões de dólares (FEBRAFARMA, 2008).Para equilibrar esse déficit comercial, grande parte das

Tabela 1. Participação das dez maiores indústriasfarmacêuticas mundiais.

Ranking Companhia US$ % do(Bilhões) mercado

global

1 Pfizer 45,08 7,012 GlaxoSmithKline 37,00 5,753 Sanofi-Aventis 35,64 5,544 AstraZeneca 25,74 4,005 Novartis 23,53 3,666 Merck 23,43 3,647 Johnson & Johnson 23,27 3,628 Roche 19,30 3,009 Wyeth 15,68 2,4410 Eli Lilly & Co. 14,82 2,30

Fonte: Valores baseados nos rendimentos referentes a 2006(CONTRACTPHARMA, 2008).

0,00

Bilh

ões

US

$

1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

0,50

1,00

1,50

2,00

2,50

3,00

3,50

Exportações (Bilhões US$)Importações (Bilhões US$)Déficit (Bilhões US$)

Fonte: MDIC/Secex\Sistema AliceAdaptado de FEBRAFARMA/Depto. de Economia (*) Período: Janeiro a Novembro de 2007

0,861,02

1,28 1,20 1,28 1,27 1,231,43 1,56

1,99

2,53

0

2

4

66,77

8,23 7,82

9,68 9,32

11,32 11,24

14,1

8%

10

12

14 % US$

% Unidades

1653

39

30

35

2724

1721

31

1814

18

60

50

40

30

20

10

0

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

México

Brasil

Espan

haCan

adá

Itália

Inglat

erra

França

Aleman

haJa

pão

USA

0,00

40,00

80,00

120,00

160,0020062005

200,00

8,10

7,48

8,37

6,76 11,6

310

,85

13,7

211

,99

14,9

414

,50

15,6

714

,99

25,6

324

,52

27,6

726

,73 56

,68

60,2

7

197,

8 018

4,20

US

$(B

ilhõe

s)

Page 112: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

102 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):98-106João B. Calixto & Jarbas M. Siqueira Jr.

exportações brasileiras (especialmente de produtos nãoindustrializados) é utilizada para cobrir as despesas deimportação de produtos farmacêuticos. Tal fato pode serconsiderado bastante preocupante, pois os medicamentosconstituem um bem essencial para a população, sendoconsiderado por muitos uma área muito sensível e mesmode segurança nacional para os paises. Qualquerdescontinuidade na disponibilidade externa dos mesmose/ou no processo de importação poderia causarconseqüências imprevisíveis para o Brasil. Para maisdetalhes sobre indústria farmacêutica brasileira,especialmente o mercado e cadeia produtiva ver: PalmeiraFilho & Pan (2003) e Capanema & Palmeira Filho (2007).

A Aprovação da Lei de Patentes e o Surgimento dosMedicamentos Genéricos no Brasil

Em 1997, em função da pressão exercida pelos paísesdesenvolvidos e detentores das tecnologias para desenvolvernovos medicamentos inovadores, o governo brasileiro aderiuao Acordo de Propriedade Intelectual (Trips) e passou areconhecer a lei de patentes (Lei 9.279). Entretanto, a aprovaçãodessa lei não foi associada com a introdução de políticaspúblicas compensatórias, necessárias para a proteção do setorfarmacêutico nacional, naquela época, totalmente dependentede cópia de produtos fabricados nos países desenvolvidos.

Entre outros aspectos, a aprovação da lei de patentes, deixoude contemplar:

• O estabelecimento de uma política industrial para osetor farmacêutico nacional;

• O apoio de políticas de incentivo às áreas de P&Dpara o setor farmacêutico;

• Não foi levada em consideração a pouca experiênciado setor farmacêutico nacional na área de P&D e,sobretudo, a pouca experiência sobre a interação dasempresas farmacêuticas brasileiras com asuniversidades e centros de pesquisa;

• A completa ausência de infra-estrutura e de pessoalqualificado em propriedade intelectual no Brasil;

• Finalmente, não foi priorizada a formação de recursoshumanos especializados, especialmente na pós-graduação, em áreas prioritárias da cadeia demedicamentos, como a Propriedade Intelectual,Toxicologia, Farmacologia Clinica, Farmacocinética,Tecnologia Farmacêutica, e tantas outras necessáriasao desenvolvimento da área de medicamentos.

Certamente, todos esses fatos listados acima contribuírampara dificultar o desenvolvimento do setor farmacêutico noBrasil, especialmente para as atividades relacionadas com aP,D&I. Entretanto, um fato relevante surgiu em fevereiro de1999 em decorrência da aprovação pelo Congresso nacionalda lei que regulamentou a comercialização dos medicamentosgenéricos (Lei 9.787). Sem dúvida nenhuma, esse fato em si,foi um grande estímulo para o desenvolvimento da indústriafarmacêutica nacional, permitindo a partir daí, o surgimentode grandes empresas nacionais dedicadas quase queexclusivamente a comercialização dessa classe demedicamentos. Ainda decorrente da aprovação da lei degenéricos no Brasil, foi à necessidade premente de apoiar àcriação de centros dedicados a pesquisa clínica, especialmenteaqueles voltados para o desenvolvimento de estudos debioequivalência, muitos deles apoiados pelo Ministério daSaúde. Não há dúvida que os medicamentos genéricosconstituem hoje uma realidade no Brasil, ocupando umaparcela expressiva e sempre crescente do mercado nacionalde medicamentos. Os dados da Figura 4 mostram a evoluçãodos medicamentos genéricos no Brasil nos últimos anos. Oaumento do mercado dos medicamentos genéricos contribuiutambém para permitir a participação de mais empresasbrasileiras de capital nacional nesse setor. Atualmente, 4empresas brasileiras dominam o mercado dos medicamentosgenéricos: EMS-Sigma Pharma (31%), Medley (29%), Aché(10%), Eurofarma (9%), outras empresas (21%) (IMS, 2006).Contudo, houve sem dúvida, uma falha estratégica por partedo governo e das empresas farmacêuticas interessadas emexplorar esse setor, por não ter estimulado paralelamente e,com a mesma intensidade, o surgimento da indústria defarmoquímicos no Brasil. Essas indústrias deveriam ser capazesde sintetizar em grande escala esses princípios ativos jádesprotegidos do privilégio de patente pelas indústriasresponsáveis pelo seu desenvolvimento. Em função disso, o

Tabela 2. Em destaque: Indústrias farmacêuticas de capitalnacional.

Fonte: IMS Health (até Jun/07).

Top 20 Indústrias farmacêuticas no Brasil

Ranking Companhia US$ %(milhões)

1 EMS Pharma 767,4 6,892 Sanofi-Aventis 723,9 6,503 Aché 627,1 5,634 Medley 610,8 5,485 Novartis 485,5 4,366 Pfizer 395,3 3,557 Eurofarma 379,9 3,418 Bayer Schering Ph. 365,0 3,289 Boehringer Ing 297,8 2,6710 Nycomed Pharma 269,8 2,4211 Janssen Cilag 261,9 2,3512 Dorsay Monange Ind. Ftca. 247,8 2,2213 Roche 245,8 2,2114 Astrazeneca 226,3 2,0315 Mantecorp IQ Farm. 225,2 2,0216 Biolab-Sanus Farma 198,5 1,9217 Merck Sharp Dhome 198,5 1,7818 Merck 192,6 1,7319 Bristol Myer Squib 188,1 1,6920 GlaxoSmithKline 177,5 1,59

Page 113: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

103Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):98-106 Desenvolvimento de Medicamentos no Brasil

Brasil passou a depender totalmente da importação dessasmatérias primas de vários paises, especialmente da Índia, China,Israel e Coréia.

É importante ressaltar que a Índia somente veio areconhecer a lei de patentes em medicamentos em 2006. Aausência de estímulo ao desenvolvimento de farmacoquímicosno Brasil causou, e ainda vem causando grandes dificuldadespara necessária fiscalização das fábricas produtoras dessasmatérias primas, condição essa indispensável para oestabelecimento do controle de qualidade dessas matériasprimas e, conseqüentemente dos próprios medicamentosacabados. Esse fato ainda vem causando alguns problemaspara a credibilidade dos medicamentos genéricos junto aparcela considerável da população brasileira.

Pesquisas e Desenvolvimento de Medicamentos a Partir dePlantas no Brasil

O Brasil possui a maior biodiversidade do mundo,compreendendo mais de 50.000 espécies de plantas superiores(20-22% do total existente no planeta), mais de 500 espéciesde mamíferos, cerca de 3.000 espécies de peixes, mais de 1.500espécies de pássaros, mais de 500 espécies de anfíbios emilhões de espécies de insetos e microorganismos. Em funçãodisso e, sobretudo pela grande tradição do uso das plantasmedicinais pela medicina popular no Brasil, o interesse pelosestudos das propriedades medicinais das plantas, vem sendoexplorado extensivamente pelos pesquisadores brasileiros e,mais recentemente, pela indústria farmacêutica, interessadaem desenvolver novos medicamentos.

O interesse pelos medicamentos derivados de plantas,também conhecidos como fitoterápicos ou fitomedicamentos,tem aumentado expressivamente em todo o mundo, emespecial nos países desenvolvidos, notadamente em algunspaíses da Europa e nos Estados Unidos. Estima-se que omercado mundial dessa classe de medicamentos já atinja acasa dos 20 bilhões de dólares anualmente (CALIXTO, 2000).Por outro lado, os compostos derivados de plantas sãoatualmente empregados na terapêutica moderna, além de teremum papel relevante para síntese de algumas moléculas maiscomplexas. Cerca de 30% dos medicamentos disponíveis aterapêutica, são derivados direta ou indiretamente de produtosnaturais, notadamente das plantas. Em algumas doenças comoo câncer, os medicamentos derivados de plantas chegam a60% (NEWMAN et al., 2002; CLARDY, J.; WALSH, C., 2004;BOLDI, 2004; KOEHN, F.E.; CARTER, G.T., 2005).

Em um levantamento realizado no período entre 1984 a2004, através do site Web of Science, Calixto (2005a) revelaque poucas áreas de pesquisa cresceram tanto no Brasil,baseado no número de trabalhos publicados em periódicosinternacionais, como as pesquisas com plantas. Aspublicações brasileiras na área de plantas passaram de 24entre 1984-1986 para 1.431 entre 2002-2004, um crescimentode 60 vezes. O Brasil é o líder absoluto das publicaçõesinternacionais na área de plantas na América Latina (41,6%).

Em função desse enorme progresso nas pesquisas realizadasna área de plantas no Brasil, observa-se nos últimos 10 anosum interesse crescente pelas indústrias farmacêuticasnacionais em estabelecer parcerias com universidades ecentros de pesquisa com o objetivo de desenvolverfitomedicamentos com comprovação científica quanto aeficácia, segurança e qualidade, baseado em estudos pré-clínicos e clínicos, conforme estabelecido na RDC ANVISA48/2004. Na Tabela 4 estão listadas algumas indústriasfarmacêuticas nacionais e algumas universidades que estãorealizando parcerias visando o desenvolvimento defitomedicamentos no Brasil.

Ao contrário dos enormes investimentos, dos altos riscose longo tempo de desenvolvimento de uma droga inovadora(nova entidade química), que como já comentado está restritoa algumas indústrias multinacionais sediadas em poucospaíses desenvolvidos, o desenvolvimento de umfitomedicamento com comprovação científica de segurança,eficácia e qualidade demanda muito menos recursos econseqüentemente menores riscos (CALIXTO, 2000).

O desenvolvimento do antiinflamatório tópico Acheflan®(Laboratório Aché), produzido a partir da planta Cordiaverbenácea, totalmente desenvolvido no Brasil, registradona ANVISA em 2004 e lançado no mercado em 2005, é um bomexemplo a ser seguido (CALIXTO, 2005a; PASSOS et al., 2007;FERNANDES et al., 2007; MEDEIRO et al., 2007). Desde oseu lançamento em 2005, o produto Acheflan® é o maisprescrito pela classe médica brasileira dentro dosantiinflamatórios tópicos (cerca de 44% das prescriçõesmédicas). Esse fato em si, vem estimulando outras indústriase atualmente existem algumas indústrias farmacêuticasbrasileiras com projetos de P,D&I já em estágios de pesquisaclínica avançada, cujos os medicamentos deverão entrar nomercado nos próximos 2 a 3 anos, ou mesmo antes disso.

Principais Problemas que Dificultam a Inovação na Área deMedicamentos no Brasil

Na Tabela 3 estão listados alguns dos principais problemasque dificultam o processo de inovação no Brasil de maneirageral, e em especial para o desenvolvimento da indústriafarmacêutica. Foge dos objetivos do presente artigo abordarem profundidade cada um desses tópicos. Com a participaçãode vários colegas interessados na pesquisa e nodesenvolvimento de medicamentos no Brasil, realizamos emoutubro de 2004, em São Paulo, o I Workshop sobre Fármacose Medicamentos. Os principais gargalos relacionados com odesenvolvimento de medicamentos no Brasil foram debatidosem profundidade por vários especialistas convidados, e odetalhamento completo do evento foi publicado nos Cadernosde Estudos Avançados da Fiocruz (CALIXTO, 2005b).Certamente, a falta de políticas de Estado e, não de Governo,de caráter duradouro e a descontinuidade de programasexistentes, têm sido o maior problema para o desenvolvimentoe a consolidação do setor farmacêutico no Brasil.

Page 114: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

104 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):98-106João B. Calixto & Jarbas M. Siqueira Jr.

Por se tratar de uma área prioritária, e mais do que isso, desegurança nacional, foi criado na década de 70 um órgãoestatal chamado Central de Medicamentos (CEME) evinculado ao Ministério da Saúde, que tinha por objetivos,entre outras funções, propiciar o desenvolvimento do setorfarmacêutico no Brasil, especialmente visando atingir em longoprazo, a autonomia brasileira para a fabricação local dosprincipais medicamentos de interesse nacional. Infelizmente,ao contrário que foi possível atingir nas áreas como a dopetróleo, com a Petrobras, com a fabricação de aviões pelaEmbraer e também com a Embrapa, na área agrícola, a CEMEperdeu completamente seus objetivos norteados por ocasiãoda sua criação, principalmente em função do seu envolvimentoindevido pelos setores políticos, fatores que culminaram comsua extinção ainda jovem em 1998.

A questão regulatória tem sido outra área de contínuascríticas e questionamentos por parte das indústriasfarmacêuticas brasileiras. A criação da Agencia Nacional deVigilância Sanitária (ANVISA) em janeiro de 1999 (Lei 9.782),foi sem dúvida, um grande avanço. Todavia, ao contrário doque foi originalmente idealizado por ocasião da sua criação, aANVISA deveria estar vinculada ao Ministério da Saúde efuncionar como uma agência semelhante ao FDA nos Estados

Unidos. A criação de uma agência autônoma subordinada aoSenado Brasileiro, fez com que a ANVISA perdesse grandeparte dos seus reais objetivos, principalmente quando serefere ao estabelecimento de uma política de Estado de longoprazo na área de Fármacos e Medicamentos e a necessidadedo Brasil consolidar o setor farmacêutico nacional, para atingira independência quanto a produção dos medicamentosessenciais.

As questões relacionadas ao acesso à biodiversidade, quenos últimos 5 anos pouco, ou quase nada avançaram no Brasil,têm criado enormes dificuldades para as empresasfarmacêuticas nacionais interessadas em desenvolvermedicamentos inovadores a partir de plantas. Igualmentepreocupante é a questão da regulamentação dos organismosgeneticamente modificados pela Comissão Técnica deBiossegurança (CTNBIO), que ao longo dos últimos anostem causado sérias restrições para a utilização no Brasil deprodutos derivados de biotecnologia.

A aprovação recente da Lei de Inovação (Lei 10.973/04),que ainda necessita de ser adequadamente regulamentada,traz grandes esperanças para os pesquisadores e empresáriosnacionais de maneira geral, visando criar condições parafacilitar e estimular a interação entre as universidades eempresas, e com isso, propiciar o processo de inovaçãotecnológica no Brasil. Contudo, no atual momento, ainda ébastante modesta a interação das universidades brasileiras ecentros de pesquisas com as empresas farmacêuticas. Asresistências são múltiplas e as dificuldades ainda estãopresentes, apesar dos imensos esforços por parte do governofederal, como por exemplo, com a criação dos fundos setoriaise posterior lançamento dos inúmeros editais para apoiar odesenvolvimento de pesquisa conjunta entre universidadese empresas, incluindo a área farmacêutica. A criação doPROFARMA pelo BNDES em 2004, e sua recente renovação eampliação, destinado a apoiar a inovação na área farmacêuticae da Saúde em geral, é um fato que merece destaque. Somam-se a isso, os diversos apoios financeiros por parte da FINEP,CNPq e do Ministério da Saúde visando propiciar ofortalecimento da pesquisa básica e clínica nas áreasrelacionadas ao desenvolvimento de medicamentos no Brasil.Finalmente, é também digno de nota, o apoio na forma desubvenção econômica, por parte da FINEP, para estimular asempresas nacionais, bem como a aprovação da Lei do Bem(Lei 11.196/05), que possibilita maiores investimentos dasindústrias em P,D&I. Apesar dos enormes esforços realizadospela CAPES e pelo CNPq visando a formação de pessoalqualificado para garantir o fortalecimento e maiorcompetitividade do setor farmacêutico no Brasil, ainda hánecessidade de priorizar a formação de pessoal qualificadoem várias áreas prioritárias relacionadas ao desenvolvimentode medicamentos, tais como: Toxicologia, Farmacocinética,Química Orgânica, Tecnologia Farmacêutica, FarmacologiaClínica, entre muitas outras. Essas distorções começam a serreduzidas pelo recente lançamento em março de 2004 depolíticas públicas nas áreas relacionadas com a Política

Tabela 3. Dificuldades ao desenvolvimento de P&D no setorfarmacêutico brasileiro

- Altos custos e riscos do desenvolvimento de novasdrogas tradicionais

- Elevados custos financeiros (juros) e pouca oferta decapital de risco

- Longo tempo de maturação dos projetos de P&D- Falta de divisões formais de P&D no setor industrial- Redução do número de empresas nacionais por

incorporação às multinacionais/transnacionais- Pouca experiência na área de inovação tecnológica- Ausência de pesquisadores nas empresas- Ausência (até recentemente) de um programa nacional

com a participação do governo e suas agências

Tabela 4. Alguns exemplos de interação universidade-empresana área de Fitoterápicos no Brasil.

Empresas Universidades

Aché Flora Medicinal São FranciscoApsen Formil UEMBiolab Sanus Herbarium UFCBYK Marjan UFPRCristália Veleda UFRGSCatarinense Lab. Simões UFSCEurofarma UnicampFarmasa UNIFESPAmazônia Fitomed. USP

Page 115: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

105Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):98-106 Desenvolvimento de Medicamentos no Brasil

Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), atravésdas principais agências de fomento à pesquisa. Outro grandedesafio a ser vencido seria aumentar o número depesquisadores nas empresas farmacêuticas, tendo em vistaque atualmente ele é muito reduzido. A interlocução entre ospesquisadores e as empresas farmacêuticas de capital nacional,é ainda muito difícil, em grande parte por falta de interlocutorestreinados nos melhores programas de Pós-graduação no Brasilou no exterior. Outra questão crucial seria estimular osinvestimentos de P,D&I dentro das próprias indústriasfarmacêuticas, como já vem sendo de fato tentado nos últimosanos. Esse fato contrasta frontalmente com os grandesinvestimentos realizados pelas empresas farmacêuticas queatuam nos países desenvolvidos. Os desafios a seremvencidos são ainda imensos, mas o futuro para o setor deP,D&I na área farmacêutica no Brasil, é sem dúvidas muitopromissor.

Conclusões e Perspectivas

Como discutido neste artigo, houve no Brasil,especialmente na última década, avanços importantes na áreade pesquisa e de desenvolvimento de medicamentos. Dentreoutros aspectos, podemos mencionar a consolidação da Pós-graduação brasileira, como uma das melhores do mundo, aaprovação da lei de patentes, a criação da ANVISA, osurgimento dos medicamentos genéricos no final da últimadécada, a criação das FAPs e dos fundos setoriais, osurgimento de várias unidades de pesquisa clínica capacitadaspara desenvolver estudos clínicos de medicamentos dentrodo padrão FDA, o surgimento do PROFARMA através doBNDES, a aprovação da Lei de Inovação, a criação da PolíticaIndustrial Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), oaumento ainda que modesto da interação universidade-empresa, estabelecimento de política governamental visandoincentivar a contratação de doutores nas empresas, a quedados juros e da inflação, a criação da lei de subvençãoeconômica para apoiar as empresas na área de inovação, etc.O reflexo direto dessas políticas já começa a ser notado naárea de P&D no setor farmacêutico brasileiro. Assim, várioslaboratórios de capital nacional começam a investir em P&D,principalmente com apoio dos fundos setoriais e do BNDES.O recente desenvolvimento do medicamento antiinflamatórioAcheflan® pelo Laboratório Ache, do Helleva® (análogo doSidenafil) pela Cristália são exemplos relevantes e que devemser seguidos pelas demais indústrias farmacêuticas nacionais.Apesar desses avanços, sem dúvidas, da maior relevânciaalcançados na última década, ainda temos que enfrentarenormes desafios para o estabelecimento de uma políticaindustrial competitiva e sólida em nível mundial na área deFármacos no Brasil. Entres outros pontos, pode sermencionado a pouca visibilidade das leis regulatórias na áreafarmacêutica no Brasil, o que tem limitado os investimentosde P&D no setor farmacêutico nacional. Somam-se a isso, asgraves deficiências ainda existentes nos laboratórios de

pesquisa nas universidades e centros de pesquisas nacionaisna área de farmacologia pré-clínica, notadamente na área detoxicologia animal e de farmacocinética. A ausência de biotériosde padrão internacional é outro gargalo que necessita serurgentemente solucionado, pois a qualidade dos animais parapesquisa é uma condição essencial para a acreditação doslaboratórios brasileiros junto aos órgãos regulatóriosinternacionais. As atuais dificuldades impostas à aquisiçãono exterior de reagentes e de equipamentos para pesquisatêm propiciado prejuízos irreparáveis para o setor de P&D demaneira geral, e em particular no setor farmacêutico. Esse últimoaspecto torna nossos laboratórios de pesquisas poucocompetitivos quando comparados aos existentes nos paísesdesenvolvidos. A Lei de Inovação aprovada recentementenecessita ser urgentemente regulamentada para facilitar anecessária interação entre as universidades e as empresas.

Outro aspecto da maior importância é a necessidade dogoverno utilizar o poder de compra do Estado para estimularas inovações no setor farmacêutico brasileiro, dandopreferência para compra de produtos desenvolvidos porempresas brasileiras. Essa política tem sido utilizada com muitosucesso em vários países desenvolvidos. Além disso, seriadesejável que os laboratórios estatais na área farmacêuticaexistentes no Brasil fossem modernizados, especialmente noque concerne a sua gestão e na contratação de pessoalcientífico qualificado para estabelecer parcerias efetivas como setor privado.

Finalmente, é possível concluir com base no exposto nesteartigo, que o Brasil está bastante maduro para estabeleceruma política de P&D de médio e longo prazo para o setorfarmacêutico. Temos ainda, como enfatizado, importantesdesafios a serem vencidos, mas as condições necessárias parasuperá-los foram ou estão sendo criadas.

Referências

1. ASHBURN, T.T.; THOR, K.B. Drug repositioning: identifying anddeveloping new uses for existing drugs. Nat Rev Drug Discov, 3:673-683, 2004.2. BOLDI, A.M. Libraries from natural product-like scaffolds. CurrOpin Chem Biol, 8: 281-286, 2004.3. CALIXTO, J.B. Efficacy, safety, quality control, marketing andregulatory guidelines for herbal medicines (phytotherapeutic agents).Braz J Med Biol Res, 33: 179-189, 2000.4. ______. I Workshop sobre fármacos & medicamentos. Cadernos deEstudos Avançados (Fiocruz), 2: 59-75, 2005b.5. ______. Twenty-five years of research on medicinal plants in LatinAmerica: a personal view. J Ethnopharmacol, 100: 131-134, 2005a.6. CAPANEMA, L.X.L.; PALMEIRA FILHO, P.L. IndústriaFarmacêutica Brasileira: Reflexões sobre sua Estrutura e Potencial deInvestimentos. In: Torres Filho ET & Puga FP (ed), Perspectivas doinvestimento 2007/2010. Rio de Janeiro: BNDES, p. 163-206, 2007.7. CEILING, E.M.K.; CANNON, P.R. Pathologic effects of elixirsulphanilamide(diethylene glycol) poisoning. JAMA, 1ll: 919, 1938.8. CLARDY, J.; Walsh, C. Lessons from natural molecules. Nature,432:829-37, 2004.9. CONTRACTPHARMA. Top 20 Pharmaceutical Companies Report, 2007.Endereço eletrônico:http://www.contractpharma.com/articles/2007/07/2007-top-20-pharmaceutical-companies-report (acessado em 06/01/2008).

Page 116: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

106 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):98-106João B. Calixto & Jarbas M. Siqueira Jr.

10. DIMASI, J.A.; HANSEN, R.W.; GRABOWSKI, H.G. The price ofinnovation: new estimates of drug development costs. J Health Econ,22:151-185, 2003.11. FEBRAFARMA: comércio exterior. Acessado em 05/01/2008.Endereço eletrônico: http://www.febrafarma.com.br/divisoes.php?area=ec&secao=co&modulo=arqs_economia.12. FERNANDES, E.S. et al. Anti-inflammatory effects of compoundsalpha-humulene and (-)-trans-caryophyllene isolated from the essentialoil of Cordia verbenacea. Eur J Pharmacol, 569: 228-236, 2007.13. FRANTZ, S. 2004 approvals: the demise of the blockbuster? NatureRev Drug Disc, 4:93-98, 2005.14. ______. Pipeline problems are increasing the urge to merge. NatureRev Drug Disc, 5:977-979, 2006.15. GROOM, C.R.; HOPKINS, A.L. The druggable genome. Nature RevDrug Disc, 1:727-730, 2002.16. IMS Retail drug Monitor, dezembro 2006.17. ______. junho 200718. KALIL, J. Da pesquisa fundamental à pesquisa clínica: como dominaras rotas tecnológicas, criando medicamentos e gerando patentes. In:Rafael Guerra, Buscando uma política de medicamentos para o Brasil.São Paulo: Febrafarma, p. 22, 2007.19. KOEHN, F.E.; CARTER, G.T. The evolving role of natural productsin drug discovery. Nat Rev Drug Discov, 4: 206-220, 2005.

20. MEDEIROS, R. et al. Effect of two active compounds obtainedfrom the essential oil of Cordia verbenacea on the acute inflammatoryresponses elicited by LPS in the rat paw. Br J Pharmacol, 151: 618-627, 2007.21. NEWMAN, D.J. et al. Natural products and derivatives as leads tocell cycle pathway targets in cancer chemotherapy. Curr Cancer DrugTargets, 2: 279-308, 2002.22. OVERINGTON, J.P; AL-LAZIKAN, B.; HOPKINS, A.L. Howmany drug targets are there? Nature Drug Disc , 5:993-996,2006 .23. OWENS, J. 2006 drug approvals: finding the niche. Nature RevDrug Disc, 6:99-101, 2007.24. PALMEIRA FILHO, P.L.; PAN, S.K. Cadeia farmacêutica no Brasil:avaliação preliminar e perspectivas. BNDES Setorial, 18: 3-22, 2003.25. PASSOS, G.F. et al. Anti-inflammatory and anti-allergic propertiesof the essential oil and active compounds from Cordia verbenacea. JEthnopharmacol, 110(2): 323-333, 2007.26. PREZIOSI, P. Science, pharmacoeconomics and ehics in drugR&D: a sustainable future scenario? Nature Rev Drug Disc, 3: 521-526, 2004.27. VENKATESH, S.; LIPPER, R.A. Role of the development scientistin compound lead selection and optimization. J Pharm Sci, 89(2):145-154, 2000.

Page 117: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

107

As Doenças Crônicas como Problema de Saúde Pública em Países de Renda Média e BaixaAs Doenças Crônicas como Problema de Saúde Pública em Países de Renda Média e BaixaAs Doenças Crônicas como Problema de Saúde Pública em Países de Renda Média e BaixaAs Doenças Crônicas como Problema de Saúde Pública em Países de Renda Média e BaixaAs Doenças Crônicas como Problema de Saúde Pública em Países de Renda Média e Baixa

Chronic Diseases as a Public Health Problem in Low to Middle-Income Countries

Álvaro A. Cruz1, Paulo A. M. Camargos2, Jean Bousquet3

1Professor Adjunto da Faculdade de Medicina da Bahia, UFBA, Pesquisador do CNPq, Consultor da Aliança Global contraDoenças Respiratórias Crônicas (Global Alliance against Chronic Respiratory Diseases – GARD); Salvador, BA; 2Professor

Titular da Faculdade de Medicina da UFMG, Coordenador do Grupo de Trabalho para implantação da GARD no Brasil; BeloHorizonte, MG; 3Professor of Medicine, University Hospital, Montpelier and INSERM, Chairman of GARD

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Prof. Dr. Prof. Álvaro A. Cruz. Programapara o Controle da Asma e da Rinite Alérgica na Bahia (ProAR). RuaCarlos Gomes, 270, 7º andar, Centro Médico Carlos Gomes. 40060-330.Salvador, BA, Brasil. Endereço eletrônico: [email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):107-109.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que houve35 milhões de mortes por doenças crônicas em 2005 (Figura1), o que perfaz 60% de todos os óbitos previstos e representao dobro da mortalidade associada a todas as doençasinfecciosas (incluindo AIDS, tuberculose e malária), afecçõesrelacionadas ao parto e puerpério, mortalidade de recém-nascidos e deficiências nutricionais combinadas (WHO, 2005).O número total de óbitos por doenças crônicas deve crescerem 17% nos próximos 10 anos, enquanto a mortalidade pordoenças infecciosas encontra-se em declínio. Diferentementede conceito amplamente difundido, as doenças crônicas nãosão um “privilégio” das nações ocidentais ricas, já que oitentapor cento das 35 milhões de mortes por esta enfermidadesocorreram em países de renda média e baixa (WHO, 2005).Ademais, na maioria dos países de renda média e baixa sãoexatamente as populações mais pobres as mais acometidaspor doenças crônicas (ABEGUNDE et al., 2007). Quase metadedas mortes por doenças crônicas ocorre prematuramente, empessoas abaixo dos 70 anos, e acometem homens e mulheresem proporção semelhante.

O conhecimento atual sobre fatores de risco associadosàs doenças crônicas indica que aproximadamente 80% demortes prematuras por doenças cardíacas e acidentesvasculares encefálicos, 80% das mortes prematuras pordiabetes tipo II e 40% da mortalidade por câncer são passíveisde prevenção (STRONG et al., 2005). Por outro lado, aprevalência, e conseqüentemente a mortalidade por doençasrespiratórias crônicas, podem ser reduzidas de formasignificativa por meio do controle do tabagismo e da poluiçãodo ar.

Em 23 de maio de 2007, a 60a Assembléia Mundial da Saúdeaprovou a resolução WHA60.23 “Prevention and control ofnoncommunicable diseases: implementation of the globalstrategy”, solicitando à Diretora Geral o preparo de um planode ação para a prevenção e o controle de doenças nãotransmissíveis a ser submetido à 61a Assembléia Mundial daSaúde através do seu Conselho Executivo. O Departamento

de Doenças Crônicas e Promoção da Saúde da OMS, apósamplas consultas às suas unidades técnicas, discussões comos escritórios regionais e representações nacionais da OMS,e em conjunto com a direção do Cluster de Doenças NãoTransmissíveis e Saúde Mental elaborou uma proposta para aapreciação do Conselho Executivo da Organização eencaminhamento à Assembléia Geral que terá lugar em 2008.

Uma Proposta de Ação contra as Doenças Crônicas

Um mundo livre de doenças crônicas passíveis deprevenção, em que todos tenham acesso às melhores opçõesde tratamento e de cuidados de saúde. Esta é visão que deveorientar as ações nesta área, cabendo à OMS a missão deliderar uma resposta intersetorial em múltiplos níveis paracombater mortalidade prematura e prejuízos à saúde causadospor doenças crônicas e seus fatores de risco.

São metas fundamentais para o controle das doençascrônicas, com a perspectiva de reduzir em 2% o número deóbitos (90% das mortes seriam evitadas em países de rendamédia e baixa) nos próximos cinco anos:

• Ação abrangente e coordenada na disseminação deinformação e defesa da causa;

• Trabalho normativo baseado em evidências;• Prevenção em escala populacional;• Opção por intervenções custo-efetivas para a

prevenção e controle;

Figura 1. Estimativa do número de mortes por grupo dedoenças em 2005 (WHO, 2005).

HIV/AIDS TB maláriadoenças

cardiovasculares

doençasrespiratórias

crônicascâncer diabetes

2.830

.000m

ortes

1.125

.000m

ortes

17.52

8.000

morte

s

883.0

00mo

rtes

1.607

.000m

ortes

4.057

.000m

ortes

7.586

.000m

ortes

Page 118: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

108 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):107-109Álvaro A. Cruz et al.

• Desenvolvimento e implementação de políticasnacionais para doenças crônicas;

• Estabelecimento de parcerias.Tomando como base a elevada mortalidade em países de

renda média e baixa, a possibilidade de intervenções baseadasem evidência para a sua prevenção e controle, e considerandoos seus fatores de risco comuns (tabagismo, redução da práticade atividades físicas, dieta inadequada e uso exagerado debebidas alcoólicas), os grupos nosológicos prioritários paraas ações devem ser: doenças cardiovasculares, câncer,doenças respiratórias crônicas e diabetes. O planejamento deações integradas para o controle das doenças crônicas, outrasenfermidades não transmissíveis, e entre estas e as açõesdirigidas às doenças transmissíveis, com ênfase em atençãoprimária, é vital no presente e no futuro.

Prioridade Operacional

A disponibilidade de recursos para a prevenção e controledas doenças crônicas é limitada. Para obtenção de resultadosrápidos e abrangentes é fundamental agregar instituiçõesinteressadas para multiplicar recursos humanos e financeirospor meio da constituição de parcerias, já que muitos dosdeterminantes associados às doenças crônicas não dizemrespeito exclusivamente ao setor saúde. Em face à naturezaintersetorial dos fatores de risco, é recomendável que asparcerias sejam também intersetoriais visando modificardeterminantes gerais que permitam influenciar favoravelmentedesfechos em saúde.

Prioridades Estratégicas

Entre os principais desafios e prioridades estratégicas aser perseguidos, destacam-se:

• Vigilância epidemiológica com foco em fatores de riscopara as doenças crônicas;

• Disseminação de informações e defesa da causa;• Estabelecimento de prioridades e políticas nacionais;• Promoção da saúde e prevenção em escala

populacional;• Fortalecimento e reorientação dos sistemas de saúde

para atenção primária e com acesso universal;• Parcerias, colaboração intersetorial e formação de redes

entre os diversos atores;• Capacitação de recursos humanos;• Mobilização de recursos;• Apoio estratégico à pesquisa;• Fortalecimento dos escritórios nacionais da OMS para

o apoio à luta contra as doenças crônicas.

O Exemplo da Aliança Global contra Doenças RespiratóriasCrônicas

Mais de um bilhão de pessoas em todo o mundo sofremde doenças respiratórias crônicas. Trezentos milhões têm asma,

duzentos e dez milhões têm doença pulmonar obstrutivacrônica (DPOC), quatrocentos milhões têm rinite alérgica, emuitos outros padecem de outras afecções, tais como, apnéiado sono, doenças ocupacionais, pneumopatias intersticiais,hipertensão pulmonar, fibrose cística e bronquiectasias(BOUSQUET, J.; KHALTAEV, N., 2007) e milhões morremanualmente (WHO, 2007). O número de mortes por DPOC temaumentado, e esta enfermidade deve ocupar a quarta posiçãono ranking global das principais causas de morte em 2030(MATHERS, C.D.; LONCAR, D., 2006). A despeito disso, asdoenças respiratórias crônicas recebem atenção insuficienteem saúde pública, de um modo geral, de governos, da mídia,de pacientes e de suas famílias.

A OMS deve intensificar ações em países de renda médiae baixa onde os governos estejam prontos para fortalecer ocombate às doenças crônicas. Mesmo com o apoio dosgovernos, a disseminação da prevenção e do controle destasdoenças requer um esforço colaborativo com parceirosnacionais, regionais e globais, cujos recursos combinadospossam produzir uma resposta mais rápida e intensa àsprioridades em doenças crônicas do país.

Por exemplo, a OMS está trabalhando para expandir avigilância, prevenção e controle das doenças respiratóriascrônicas em todo o mundo por meio da Aliança Global contraDoenças Respiratórias Crônicas (GARD), para a qual a OMSoferece liderança técnica e apoio de secretariado. A GARD éformada por 60 organizações governamentais e não-governamentais que agregam seus recursos humanos efinanceiros para combater as doenças respiratórias crônicas,e propõe três etapas de planejamento: (i) estimar a necessidadeda população e propor ação; (ii) formular e adotar políticas;(iii) identificar passos para a implementação das políticas. AAliança Global trabalha com a perspectiva de um mundo ondetodos possam respirar livremente (Figura 2) e sugere queparcerias semelhantes sejam desenvolvidas em cada paísinteressado. Os planos de ação contra doenças respiratóriascrônicas devem refletir uma combinação harmônica deintervenções verticais (específica para certas doenças) ehorizontal (atenção básica integrada), planejadas de acordocom as necessidades e os recursos de cada país (BOUSQUET,J.; DAHL, R.; KHALTAEV, N., 2007).

Entre os países que solicitem assistência, a GARD vaioferecer apoio ao desenvolvimento do componente dedoenças respiratórias crônicas dos seus planos de ação contradoenças não transmissíveis, e também para atividades decapacitação de instrutores para o treinamento de recursoshumanos visando a prevenção e o controle de doençasrespiratórias crônicas. Experts e Ministérios da Saúde dosseguintes países já expressaram seu interesse em adotar aproposta da GARD: Argélia, Cabo Verde, Tunísia, Brasil,Paraguai, Geórgia, Itália, Kazaquistão, Kirgistão, Noruega,Polônia, República Checa, Turquia, China e República da Coréia.A GARD vai oferecer assistência a esses países e a outros quesolicitem o apoio, com prioridade para os países alvoestabelecidos para ação em doenças crônicas entre 2008 e 2013.

Page 119: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

109Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):107-109 Doenças Crônicas e Saúde Pública

O Grupo de Doenças Respiratórias Crônicas da OMSestará empenhado em colaborações interdepartamentaiscom o objetivo de integrar planos e ações, não somenteentre as doenças crônicas, mas entre as crônicas nãotransmissíveis e as doenças transmissíveis, especialmenteno contexto da atenção primária. Neste sentido está previstacolaboração com o projeto de Controle Integrado deAfecções no Adulto e Adolescente (IMAI) e com aestratégia “Abordagem Prática à Saúde Pulmonar” (PAL)da OMS. Estes projetos estão desenvolvendo materiais parainformação e treinamento em alguns países, o que seráexpandido posteriormente.

A prioridade de trabalho técnico para a GARD e para aOMS, nesta área, será: (i) o desenvolvimento, tradução edisseminação da GARD Basket, um pacote de informações einstrumentos em um CD-Rom, e uma Matriz para Avaliação deDoenças Respiratórias Crônicas, com um sistema deinformação eletrônico. Estes produtos vão ser distribuídospara todos os países membros e serão realizadas algumastraduções. O sistema de informações será submetido avalidação em quatro países: Argélia, Brasil, China e Geórgia,antes de ser largamente usado.

Cuidados de saúde de elevada qualidade podem seroferecidos a casos leves de asma e DPOC em ambiente deatenção primária onde haja um médico, sem necessidade derecorrer a referência. Cuidados imediatos de emergência paraexacerbações destas enfermidades devem estar disponíveis

em atenção primária onde haja pessoal de enfermagemdevidamente capacitado, sob supervisão médica. A lista atualde medicações essenciais da OMS inclui todos os produtosfarmacêuticos que são necessários para o controle dasprincipais enfermidades respiratórias crônicas em atençãoprimária. Para o diagnóstico objetivo da DPOC é desejávelcontar com centros de referência ou unidades de cuidadosecundário que realizem espirometria, mesmo se não houverum especialista na região. Médicos de família podem sertreinados para utilizar um espirômetro simplificado e interpretaradequadamente os resultados.

A atenção deve concentrar-se nos países de renda médiae baixa definidos como alvo para o Plano de Ação da OMSpara Doenças não Transmissíveis 2008-2013. O secretariadoda GARD na OMS, bem como os parceiros da Aliança, estarãoprontos para assistir aos Países Membros cujos ministériosda saúde solicitem apoio ratificado pelos escritórios nacionaise regionais da OMS.

O propósito da GARD é iniciar uma abordagem ampla paracombater as doenças respiratórias crônicas (KHALTAEV, N.et al.), por meio de:

1. Desenvolvimento de metodologia padrão para obterdados relevantes sobre o impacto de doençasrespiratórias crônicas;

2. Defesa de ação contra as doenças respiratóriascrônicas;

3. Estimular os países na implementação de políticas depromoção da saúde e prevenção de enfermidadesrespiratórias crônicas;

4. Desenvolvimento de estratégias simples e acessíveispara o tratamento de doenças respiratórias crônicas.

Referências

2. ABEGUNDE, D.O. et al. The burden and costs of chronic diseasesin low-income and middle-income countries. Lancet 370:1929-38; 2007.7. BOUSQUET, J.; DAHL, R.; KHALTAEV, N. Global Alliance againstChronic Respiratory Diseases. Allergy 29:233-9; 2007.4. ______. Global surveillance, prevention and control of chronicrespiratory diseases. A comprehensive approach. Geneva, World HealthOrganization, 2007.8. KHALTAEV, N. et al. Global Alliance against Chronic RespiratoryDiseases. Narrowing the gap between current knowledge and action atcountry level to prevent and control chronic respiratory diseases.Journal of WAO, in press.6. MATHERS, C.D.; LONCAR, D. Projections of global mortalityand burden of disease from 2002 to 2030. PLoS Med 3:e442; 2006.3. STRONG, K. et al. Preventing chronic diseases: how many livescan we save? Lancet 366:1578-82; 2005.1. WHO. Preventing chronic diseases, a vital investment. Geneva,World Health Organization, 2005.5. WHO. Geneva, World Health Organization, 2007.

Figura 2. Folheto da Aliança Global contra doençasrespiratórias crônicas expressando a visão desta parceriadesenvolvida pela OMS.

Page 120: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

110

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dra. Dora Leal Rosa.UniversidadeFederal da Bahia, Faculdade de Educação, Departamento de EducaçãoI. Av. Reitor Miguel Calmon s/n Vale do Canela, Canela.40000-000. Salvador, BA, Brasil. Endereço eletrônico:[email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):110-113.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

O Financiamento à PO Financiamento à PO Financiamento à PO Financiamento à PO Financiamento à Pesquisa na Bahia: a Contribuição da Fesquisa na Bahia: a Contribuição da Fesquisa na Bahia: a Contribuição da Fesquisa na Bahia: a Contribuição da Fesquisa na Bahia: a Contribuição da FAPESBAPESBAPESBAPESBAPESB

Funding for Research in Bahia: The Contribution of FAPESB

Dora Leal RosaDiretora Geral da FAPESB e Professora Associada da Universidade Federal da Bahia; Salvador, BA, Brasil

Fazer ciência exige para sua realização um conjunto deinsumos dentre os quais se destaca o relativo aos recursosfinanceiros. No Brasil, o Estado tem sido tradicionalmente aprincipal fonte de recursos para pesquisa, sejam recursos comorigem no Governo Federal, ou, mais recentemente, nosgovernos estaduais.

No entanto, dimensionar o volume dos recursos aplicadosna atividade de pesquisa é tarefa complexa que exige cuidadona utilização da informação disponível, dadas as dificuldadesem se obter dados consolidados e consistentes ainda quemuito se tenha avançado com os registros estatísticos nessaárea, conforme pode ser verificado em publicações doMinistério da Ciência e Tecnologia e das agências federais eestaduais de fomento. Na Bahia, destaca-se o trabalho daSEI/Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais daBahia e particularmente o da Coordenação de Informações emC&T da SECTI/Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovaçãoque vem buscando desenvolver uma metodologia que permitacalcular os investimentos do governo estadual em ciência etecnologia, cujos resultados fundamentam o presente texto.Embora o foco deste trabalho seja discutir a contribuição daFundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia/FAPESBno financiamento à pesquisa na Bahia, não se pode deixar deregistrar as experiências que precederam a FAPSEB no aportede recursos oriundos do Tesouro do Estado para tal fim, osquais vieram se somar aos recursos alocados pelas agênciasfederais de fomento, contribuindo dessa forma para fortalecero sistema estadual de C&T.

O financiamento à pesquisa com recursos do Tesouroestadual tem antecedentes na experiência da FUNDEC –Fundação para o Desenvolvimento da Ciência na Bahia, criadaem 1950, no Governo Otávio Mangabeira e formalmente extintaem 1974, embora desde o final da década de sessenta tivessedeixado de operar Somente em 1991, na terceira gestão doGovernador Antonio Carlos Magalhães, a Bahia passou, denovo, a contar com um órgão cuja missão principal era o apoioàs atividades de ciência e tecnologia no Estado, qual seja oCADCT – Centro de Apoio ao Desenvolvimento Científico e

Tecnológico que por dez anos, até a criação da FAPSEB, em2001, foi uma referência para os pesquisadores baianos,apoiando-os através de diferentes programas de fomento, quesem dúvida em muito colaboraram para a construção da basecientífica e tecnológica do nosso Estado (CASTILHO, 2003).

Quando o CADCT completou dez anos, sua então diretora,Cleilza Ferreira Andrade, ao comentar a trajetória e experiênciadesse órgão, ressaltou o seu papel no apoio “à fixação dedoutores na Bahia, no intercâmbio acadêmico, na iniciaçãocientífica”, dentre outras iniciativas, e de forma pioneira“na parceria com o Governo Federal para a execução deprojetos cooperativos como o Pró-Nordeste de Pesquisa, Pós-Graduação, e o Pró-Ciências, para treinamento deprofessores nas áreas de matemática e ciências, o RECOPE– Redes Cooperativas de Pesquisa e o SEICT – Sistema deInformações em C&T, com a FINEP e IBICT/MCT”(ANDRADE, 2001).

Nos dez anos do CADCT cabe ainda destacar sua açãoindutora de competências em diferentes áreas de conhecimentocomo a da energia, do design, dentre outras, que certamentecontribuíram para o desenvolvimento da Bahia, além da parceriacom o SENAI, de caráter inovador, através do ProjetoNIMATECH – Núcleo de Tecnologias em Integração daManufatura, cujo principal objetivo foi apoiar os trabalhosdestinados à promoção de pessoal qualificado e especializado,além do desenvolvimento de projetos voltados para astecnologias computacionais integradas à manufatura. Comesta iniciativa o Estado buscava contribuir para ofortalecimento das indústrias metalúrgicas, mecânicas e outrossegmentos industriais. O Núcleo progrediu e se transformouno CIMATEC – Centro Integrado de Manufatura e Tecnologia,que continua recebendo o apoio da FAPESB, dentro dos seusdiversos Programas.

É nesse contexto, de expansão e consolidação da área deC&T do Estado e de atendimento à pressão da comunidadeacadêmica, que, em 2001, por ato do Governador Paulo Souto,a FAPESB é criada com um orçamento fixado em 1,0% da receitatributária líquida do Estado, garantindo dessa forma um fluxoregular de recursos para a atividade de fomento.

Em 27 de agosto de 2007, a FAPSEB completou seis anosdo ato de sua criação e implantação; é, assim, um órgão jovem,embora tenha se constituído a partir da experiência do CADCT;no entanto já podemos observar o seu desempenho e seusresultados para a área de C&T.

Através da análise de dados elaborados pelo MCT,relativos ao período 2000/2003, podemos verificar a crescenteparticipação do governo da Bahia nos dispêndios em ciência

Page 121: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

111Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):110-113 Financiamento da Pesquisa na Bahia

e tecnologia, observando-se o aumento dessa participação apartir de 2002, na qual certamente inclui-se a contribuição daFAPESB, pois é partir deste ano que a Fundação passa adispor de orçamento próprio e a contribuir para o fomento deatividades de C&T e P&D. Quando comparado aos recursosaportados pelo Governo Federal percebe-se que o maiorvolume vindo dessa esfera destina-se ao ensino superior.Conclui-se que, na Bahia, o Tesouro do Estado investe maisno fomento à pesquisa que o Governo Federal. Estes dadossão apresentados na Tabela 1.

Dados levantados no ICF/Sistema de InformaçõesGerenciais Contábeis e Financeiras do Estado da Bahiapermitem ampliar a série histórica construída pelo MCT demodo a perceber-se o volume de recursos aportados pelogoverno estadual para esta atividade, apresentado-se taisdados, por modalidade, na Tabela 2.

Os dados da Tabela 2 indicam que mais de 70% dos recursosdespendidos pelo governo estadual com C&T são destinadosa atividades de P&D e quase 30,0% com Atividades científicase técnicas correlatas . Estes mesmos dados indicam que entre2000 e 2006, o orçamento do Estado da Bahia para C&T quasetriplicou, passando de R$72.373.000,00 (setenta e dois milhões,trezentos e setenta e três mil reais) para R$214.531.000,00(duzentos e quatorze milhões, quinhentos e trinta e um milreais), variando, ao longo do período, em torno de 1,0% a1,4% da receita total do Estado (Tabela 3).

Cabe então verificar através de que órgãos do governo doestado esse volume de recursos é aplicado nas atividades deC&T. Segundo Cavalcante e Aquino (2005) as instituiçõesconsideradas típicas de C&T são “aquelas que realizam

atividades de C&T de modo permanente e organizado e astêm como atividade fim e objeto da aplicação da maior partede seus recursos” (op. cit. P.787). No âmbito do Governo daBahia, os autores mencionados consideraram comoinstituições típicas de C&T a Secretaria de Ciência, Tecnologiae Inovação/SECTI, a FAPESB, as universidades públicasestaduais (UNEB, UESC, UESB, UEFS), a Empresa Baiana deDesenvolvimento Agrícola (EBDA), Bahia Pesca, CompanhiaBaiana de Pesquisa Mineral (CBPM), Instituto Baiano deMetrologia e Qualidade (IBAMETRO) e a Superintendênciade Estudos Econômicos e Sociais (SEI).

Analisando a composição setorial e institucional dosinvestimentos do Governo do Estado da Bahia em C&T em2004, Cavalcante e Aquino verificaram que “a EBDAconcentrou a maior parcela de participação (41%), a Fundaçãode Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB)respondeu por 16%, tendo apresentado, ao longo do período2001-2004, uma forte tendência ascendente, o que explicainclusive, a trajetória ascendente dos investimentos em P&D”(op. cit. p.791). Na Figura 1, abaixo, são apresentados os dadosconstruídos por Cavalcante e Aquino sobre essa questão.

Se o orçamento alocado à FAPESB integra o cálculo dosinvestimentos do governo estadual em C&T com o das demaisinstituições consideradas típicas de C&T conforme o conceitodefinido por Cavalcante e Aquino, a aplicação desses recursosdistingue a Fundação das demais instituições, pois, dentreelas, é a que tem por missão o fomento à pesquisa. Assim, oorçamento da FAPESB, excluindo-se a parcela destinada aoseu custeio é destinado ao financiamento à pesquisa e outrasatividades que lhe são correlatas ou que estão com ela

Tabela 1. Bahia - Dispêndios em ciência e tecnologia e pesquisa e desenvolvimento do estado 2000-2003.

(em mil R$ correntes)

Esfera de governo Ciência e Tecnologia Pesquisa e Desenvolvimento

2000 2001 2002 2003 2000 2001 2002 2003

Governo Federal (1) 52.696 62.485 72.320 83.452 32.291 37.978 49.225 53.566Tesouro 20.405 24.507 23.095 29.886 - - - -Ensino superior 32.291 37.978 49.225 53.566 32.291 37.978 49.225 53.566

Governo Estadual 73.892 92.221 115.660 138.585 45.566 63.491 87.196 105.727Tesouro 72.373 88.689 110.859 130.647 44.047 59.959 82.395 97.789Ensino superior 1.519 3.532 4.801 7.938 1.519 3.532 4.801 7.938

Setor Empresarial 74.433 95.443 114.091 133.193 50.528 58.578 64.267 71.009Empresas 73.807 91.597 109.387 127.178 49.902 54.732 59.563 64.994Ensino superior 626 3.846 4.704 6.015 626 3.846 4.704 6.015

Fonte: Balanço Geral do Estado, Sistema de Avaliação dos Programas de Pós-Graduação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de NívelSuperior (Capes) e Sinopse Estatística do Ensino Superior do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), ambos do Ministérioda Educação (MEC), Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi), extração especial realizada pelo Serviço Federalde Processamento de Dados (Serpro).Elaboração: Coordenação-Geral de Indicadores - Ministério da Ciência e Tecnologia.Nota: (1) Corresponde aos dispêndios do Ministério da Ciência e Tecnologia.

Page 122: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

112 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):110-113Dora Leal Rosa

Figura 1. Investimento em C&T, composição setorial /institucional, 2004.

Fonte: SECTI/Coord. de informações em C, T&I.

Tabela 4. Execução Financeira FAPESB 2003-2006.

fortemente imbricadas, como o apoio à formação de recursoshumanos em cursos de pós graduação, o financiamento deinfra-estrutura para pesquisa, apoio técnico para pesquisa,dentre outros.

O orçamento de fomento da FAPESB pode ser melhoravaliado se comparado, por exemplo, ao do CNPq, que é, dentreas agências federais de fomento, a que tem o espectro maisamplo no apoio à atividade de pesquisa.

Em 2006, o CNPq aplicou na Bahia cerca de R$8.500.000,00(oito milhões e quinhentos mil reais) em diferentes modalidadesde apoio, destacando-se, dentre elas, o apoio aos núcleos deexcelência que receberam R$1.699.000,00 (um milhão,seiscentos e noventa e nove mil reais) e o auxílio à pesquisa,para o qual foi alocado o valor de R$6.437.000,00 (seis milhões,

quatrocentos e trinta e sete mil reais). Neste mesmo período, aFAPESB aplicou, com recursos do Tesouro do Estado,R$24.567.000,00 (vinte e quatro milhões, quinhentos e sessentamil reais) no fomento à pesquisa e demais programasinstitucionais. A tabela abaixo apresenta a execução financeirada FAPESB entre os anos de 2003-2006.

Em 2007, a FAPSEB aplicou em atividades de fomento,considerando todos os programas e modalidades de apoio,cerca de R$36.000.000,00 (trinta e seis milhões de reais) 60,0%dos quais vinculados ao Programa de Bolsas e 15,0% paraapoio à pesquisa.

No ano de 2008, de um orçamento novamente estimadoem R$36.000.000,00 (trinta e seis milhões de reais) a FAPSEBdeverá aplicar no financiamento à pesquisa (projetos de

Tabela 2. Bahia - Recursos do governo do estado aplicadosem ciência e tecnologia (C&T), por modalidade (não incluirecursos de ensino superior) 2000-2006.

(em mil R$ correntes)

Pesquisa e Atividades científicasValor desenvolvimento e técnicas correlatas

Anototal

Valor % Valor %

2000 72.373 44.047 60,9 28.326 39,12001 88.689 59.959 67,6 28.730 32,42002 110.860 82.395 74,3 28.465 25,72003 130.647 97.789 74,8 32.858 25,22004* 161.402 124.351 77,0 37.050 23,02005* 200.411 148.848 74,2 51.562 25,82006* 214.531 156.062 72,7 58.469 27,3

Fonte: Balanço Geral do Estado.Elaboração: Coordenação-Geral de Indicadores - Ministério da Ciênciae Tecnologia.* Dados levantados no ICF/Sistema de Informações Gerenciais Contábeise Financeiras do Estado da Bahia.

Tabela 3. Bahia - Participação percentual dos recursos aplicados em ciência e tecnologia (C&T) em relação à receita total doestado (não inclui recursos de ensino superior) 2000-2003.

(em mil R$ correntes)

Ano 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Recursos aplicados 72.373 88.689 110.859 130.647 161.402 200.411 214.531Receita total 6.419.709 8.319.985 9.868.801 10.913.916 13.048.649 14.446.993 15.946.448Participação (%) 1,13 1,07 1,12 1,2 1,2 1,4 1,3

Fonte: Balanço Geral do Estado.Elaboração: Coordenação-Geral de Indicadores - Ministério da Ciência e Tecnologia.

Fontes/ano 2003 2004 2005 2006Tesouro R$ R$ R$ R$

00 4.665.505,57 11.545.283,98 20.110.770,34 20.451.884,2601 780.428,03 3.670.092,90 1.483.730,06 4.115.123,70

Total 5.445.933,60 15.215.376,88 21.594.500,40 24.567.007,96

Fonte: Governo do Estado da Bahia. SEPLAN/SPO.

Page 123: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

113Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):110-113 Financiamento da Pesquisa na Bahia

pesquisa), R$8.000.000,00 (oito milhões de reais) o equivale acerca de 22,0% do seu orçamento de fomento tendo clareza deque a demanda será certamente maior do que o volume derecursos alocados para tal fim.

Em que pese a tendência ascendente nos investimentosdo Governo do Estado em C&T é preciso registrar que essesrecursos são insuficientes face a demanda que chega àFAPSEB para a atividade de pesquisa e outras modalidadesde apoio. É preciso ter em conta que a ampliação e qualificaçãoda comunidade acadêmica do Estado - dados da CAPESrelativos ao ano de 2006 registram uma população de 1.327doutores integrando programas de pós-graduação quando,em 1996, segundo tais dados, o total de docentes doutoresnesses programas era de apenas 365 todos eles integrando ocorpo docente da pós-graduação da UFBA. A esse propósitocabe mencionar uma situação que explicita a questão dainsuficiência de recursos qual seja o encaminhamento pelacomunidade acadêmica de 479 propostas de pesquisa,demandando recursos em torno de R$17.000.000,00 (dezessetemilhões de reais) em resposta ao edital de pesquisa cujovalor estabelecido era de R$2.000.000,00 (dois milhões dereais). Vê-se desse modo que o orçamento da FAPSEB,fixado em 1,0% da receita tributária líquida do Estado éclaramente insuficiente para atender a demanda que lhe éapresentada. Considerando tais limitações orçamentárias

para financiar diretamente a atividade de pesquisa, aFAPSEB tem buscado outros meios de viabilizar recursospara C&T no Estado, fazendo a mediação entre grupos depesquisa e outros agentes de fomento, o que tem permitidoampliar a captação para este fim.

A guisa de conclusão, enfatizamos o papel da FAPESB,agência de fomento do Estado da Bahia, contribuindo para odesenvolvimento da pesquisa no nosso Estado e, por essavia, para a construção de uma sociedade plural e inclusiva.

Agradecimentos

A autora agradece a colaboração das Assessoras LysVinhaes e Ana Oliveira na coleta de dados para este artigo.

Referências

1. ANDRADE, C.F. Memória, trajetória, consolidação. In CADCT 10Anos. Publicação comemorativa dos dez anos de atividade daSuperintendência de Apoio ao Desenvolvimento Científico eTecnológico – CADCT. Salvador – Bahia. Julho de 2001.2. CASTILHO, C.M.C de. Fundação de Amparo à Pesquisa da Bahia(FAPESB): um depoimento. Jornal da Ciência, 22 de agosto de 2003.3. CAVALCANTE, L.R.M.T; AQUINO, M.C. Investimentos do governodo estado da Bahia em ciência e tecnologia: metodologia de cálculo eanálise preliminar dos resultados 200-2004. In Bahia. Análise & Dados,Salvador, v.14, n.4, p.783-792, mar. 2005.

Page 124: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

114 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):114-116Suzanne Jacob Serruya & Itajaí Oliveira de Albuquerque

Dom João VI na Bahia e a Origem da Desigualdade Regional em Ciência & TDom João VI na Bahia e a Origem da Desigualdade Regional em Ciência & TDom João VI na Bahia e a Origem da Desigualdade Regional em Ciência & TDom João VI na Bahia e a Origem da Desigualdade Regional em Ciência & TDom João VI na Bahia e a Origem da Desigualdade Regional em Ciência & Tecnologia no Brasilecnologia no Brasilecnologia no Brasilecnologia no Brasilecnologia no Brasil

Dom Joao VI at Bahia State and the Origins of Regional Inequalities in Science & Technology in Brazil

Suzanne Jacob Serruya1, Itajaí Oliveira de Albuquerque2

1Diretora do Departamento de Ciência & Tecnologia da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministérioda Saúde, Médica, Doutora em Ginecologia e Obstetrícia (Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP); Campinas, SP;

2Consultor do Departamento de Ciência & Tecnologia da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministérioda Saúde; Médico, Mestrando em Ciências da Saúde (Universidade de Brasília – UNB); Brasilia, DF, Brasil

Relaciona a criação da Escola de Medicina da Bahia em 1808 e destaca a escassez de recursos para financiamento daunidade de ensino durante a vigência do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, extensiva ao período nacionaldo Império, sugestiva como o primeiro momento de desigualdade regional no fomento à pesquisa e ao ensino emsaúde no território brasileiro. Destaca as iniciativas atuais do governo brasileiro para reversão dessas desigualdadesa partir da elaboração de uma Agenda Nacional de Prioridades de Pesquisa em Saúde, com o exemplo dos resultadosda região do Nordeste brasileiro e do Estado da Bahia.Palavras-chaves: História da Medicina, desigualdades em pesquisa na saúde, fomento à pesquisa em saúde.

The authors relate the School of Medicine of Bahia’s creation in 1808 and detache the scarcity of funding for educationduring the Kingdom of Portugal, Brazil and Algarves, extensive to Brazilian Empire, and suggest this fact as the firstmoment of regional inequality in health research and education in Brazil. The Authors consider the current goals ofNational Agenda for Research Priorities in Health as the key point to revert Brazilian regional inequalities in healthresearch.Key words: History of the Medicine, Inequalities in Health Research, Funding for health research.

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dra. Suzanne Jacob Serruya. Diretora -Departamento de Ciência e Tecnologia (Decit), Secretaria de Ciência,Tecnologia e Insumos Estratégicos, Ministério da Saúde - Bloco G, 8ºAndar sala 849. 70058-900. Brasília, DF, Brasil. Tel: +55 (61) 33153197/ 3475; Fax: +55 (61) 3223-0799. Endereço eletrônico:[email protected]/[email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):114-116.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

Quando o Príncipe Regente Dom João VI, acompanhadoda corte portuguesa, aportou na cidade de São Salvador, alise escrevia uma nova página para a História do Brasil que, empouco mais de uma década, culminaria na proclamação daindependência da tutela colonial portuguesa. Mas, naquelefevereiro de 1808, os ganhos obtidos com a transferência realpara os trópicos, representavam muito pouco além da novidadeem si, mais ainda quando comparados ao montante de riquezastransferidas para Lisboa em trezentos anos de vassalagemcolonial.

No que respeita ao desenvolvimento das ciências e adifusão do conhecimento, àquela altura o Brasil estava aquémde outras colônias da América Espanhola, especialmente seconsiderarmos que a mais antiga universidade do continentelatino-americano fora fundada em 1538 na cidade de SãoDomingo, hoje capital da República Dominicana. Incorria emcrime grave adquirir prelos ou publicar um panfleto em terrasbrasileiras.

Podemos, portanto, avaliar o prejuízo que esse retardodo Século das Luzes legou ao desenvolvimento de umacivilização material em um território que, desde o seuachamento fora descrito como potencialmente rico,

abundância confirmada pelo sucedimento dos cicloseconômicos, financiadores do fausto da metrópoleportuguesa – isto é, desde o Pau-Brasil às drogas do sertãoe do garimpo do ouro, especialmente aquele lavrado nosveios das Minas Gerais, que em razão do volume expressivo,do quinto extorsivo de Lisboa e a conseqüente insatisfaçãodos reinóis originou a chamada Revolta Mineira de 1789,incontinenti reprimida pela metrópole portuguesa com a forca,o confisco de bens, o desterro e a rotulação dos envolvidoscomo infames, condição extensiva a todos os seusdescendentes até segunda geração.

Mas, se por um lado a criação da Escola Médica da Bahiarepresenta um momento especial entre os primeiros atos domonarca em solo brasileiro, com o objetivo de melhorar o statussocial e político da Colônia, por outro, como se veria, alocalização da sede administrativa do reino no Rio de Janeiroprenunciaria o advento de grandes dificuldades para a novaunidade de ensino, e podemos aqui distinguir um primeiroexemplo de desigualdade regional em ciência e educação, àocasião em que a Colônia se evoluiria politicamente paracondição de Reino Unido e enfim ao topos de paísindependente e soberano. Em termos gerais, a ordem real parainstalar o inédito estabelecimento de ensino em terrasbrasileiras, prometia-nos que no futuro teríamos superado aconstatação de Gabriel Soares de Souza, registrada no TratadoDescritivo do Brasil: cirurgião cada um o é em sua casa (DESOUZA, 2001).

Após a instalação da sede administrativa do reino no Riode Janeiro e de fundar-se ali a segunda escola médica noBrasil, as atividades de ensino no Hospital Militar do TerreiroJesus foram esquecidas pelo governo português. Até 1815,

Page 125: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

115Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):114-116 História do Brasil, Ciência e Tecnologia

as aulas ficaram minguadas ao ensino da Cirurgia e daAnatomia, com prejuízo irreparável da Obstetrícia. RegistraSantos Filho (1991):

Tanto quanto ou mais do que a do Rio de Janeiro, aFaculdade da Bahia sofreu escassez de material e de meios.(...) A penúria de aparelhagem e a deficiência das instalaçõesconcorreram para que o ensino fosse livresco e,conseqüentemente, verboso. (...) Entre lecionar na provínciae obter uma cátedra na Corte, onde a escola gozava de maioresrecursos governamentais, por certo que o médico bem dotadoe ambicioso preferiu integrar-se nesta última. (...)

Entretanto, ao tempo da transformação em Faculdade deMedicina da Bahia, em 1833, a antiga escola estava mais bemorganizada com um corpo docente selecionado por concursopúblico, e o currículo constituía-se de quatorze disciplinas,com aulas práticas ministradas nas enfermarias na Santa Casade Misericórdia.

Apesar da incontestável cronicidade da escassez derecursos, o progresso da escola era visível, demonstrada tantopela expansão da freqüência de alunos, quanto pela difusãodo conhecimento científico ali produzido. Em 1886, além dalaureada Gazeta Médica da Bahia noticiava-se a publicaçãode outra revista científica, a Gazeta Acadêmica da Bahia(SANTOS FILHO, 1991), como demonstração de ambiênciacientífica suficiente que sustentasse duas publicaçõesmédicas.

De grande destaque para a notável história da Medicinada Bahia é, sem dúvida, a constituição da chamada EscolaParasitológica e Tropicalista da Bahia, integrada por médicoscomo Paterson, Wucherer, Silva Lima, Antônio Januário deFaria, Pacífico Pereira, Antônio José Alves, Pires Caldas, SilvaAraújo e Victorino Pereira. Das reuniões informais desseinigualável grupo de estudiosos derivou não apenas afundação da Gazeta Médica da Bahia, mas a publicação deestudos clássicos da medicina brasileira, nitidamenteidentificados com as agruras de nossa realidade social, dentreos quais são destaques os temas: hipoemia intertropical e oAnkylostomum duodenale, a associação entre hematoquilúriae filária identificada por Wucherer na urina de pessoasacometidas por essa doença.

Embora ainda por essa época não tivéssemos indicadoresde citação bibliográfica, os tempos confirmaram que não hádemasia na afirmação de Nava (NAVA, 2004), quanto ao fatode que esse grupo baiano representa os verdadeiros iniciadoresde nossa medicina científica, quer seja pelo uso do modeloVirchowiano de estabelecer nexo causal que explicasse osachados anátomos – patológicos, quer fosse pelaexperimentação conferida aos estudos que de forma brilhantelideraram (COSTA, 1887).

A Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação emSaúde estabelece entre seus objetivos estratégicos criarmecanismos para reverter às desigualdades regionais esustentar e fortalecer o esforço nacional em ciência, tecnologiae inovação. Desde o princípio do governo do Presidente LuizInácio Lula da Silva, quando foi criada a Secretaria de Ciência,

Tecnologia e Insumos Estratégicos, o governo federal realizaum esforço contínuo de concretizar essas diretrizes nacionais.De 2003 até 2007, o conjunto de projetos financiados eparceiros evoluiu de 157 para 769, o que representa oincremento de 2,5 vezes no total de recursos investidos nofomento de projetos de Ciência , Tecnologia & Inovação emSaúde (C,T &IS) (Figura 1).

Entretanto, em busca de reverter as desigualdadesregionais brasileiras na produção científica, o Ministério daSaúde agiu de forma a estimular as regiões com expertiseacadêmica instalada e com série histórica deficitária nacaptação de recursos para fomento de projetos de pesquisaem saúde.

O resultado obtido demonstra não só a justeza da diretriz,mas a maturidade dos grupos de pesquisa do Nordestebrasileiro, que nos últimos cinco anos ocupa o segundo lugarnacional na captação de recursos para pesquisa em saúdemediante as seleções públicas financiadas pelo Departamentode Ciência e Tecnologia (DECIT) em parceria com os órgãosdo MCT, a Financiadora de Projetos (FINEP) e o ConselhoNacional de Pesquisa (CNPq). Convém destacar naquela regiãoo desempenho da Bahia, que aprovou 133 projetos, quaseempatando no ranque nacional com o Estado de Pernambuco,que em primeiro lugar aprovou 137 projetos (Figura 2).

Por outro lado, quando consideramos o Programa Pesquisapara o SUS (PPSUS), desenvolvido em parceria com asFundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (FAP), a situaçãose apresenta de igual modo elogiosa. Se considerarmos asregiões brasileiras, evidenciaremos que o Nordeste ocupa osegundo lugar nacional em captações de recursos parapesquisa em saúde.

Com base nesses fatos históricos, não seria demasiaconcluir que, face às reconhecidas dificuldades financeiras

Fonte: Decit/SCTIE/MS. Base de Dados Gerencial. Capturado em 10/09/2007.

Figura 1. Fomento de projetos em Ciência, Tecnologia &Inovação em saúde (C,T &IS) entre 2003 e 2007.

Nº de Projetos

157

763

514

769

Page 126: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

116 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):114-116Suzanne Jacob Serruya & Itajaí Oliveira de Albuquerque

Fonte: Decit/SCTIE/MS. Base de Dados Gerencial. Capturado em 10/09/2007.

Figura 2. Projetos financiados pelo DECIT, FINEP e CNPq.

do Reino Unido Portugal - Brasil e Algarves, e do governoimperial brasileiro, para financiarem uma escola médicanordestina, avanços consistentes foram garantidos e devem

ser honrosamente tributados à persistência industriosa dosmédicos e da sociedade baiana do século XIX, que às geraçõesmodernas legaram uma instituição de ensino e pesquisa dignada história da medicina e da produção científica brasileira.

A história, por sua vez, evidencia que a reversão dasdesigualdades históricas na produção de Ciência, Tecnologiae Inovação, de par com as desigualdades e iniqüidades emsaúde, serão revertidas apenas sob princípios republicanosque considerem as necessidades sociais em saúde e o princípiopétreo da equidade como mediadores entre a escassez dopassado e o potencial de futuro que no milênio estamosvivendo.

Referências

1. COSTA, C. Anuário Médico Brasileiro. Rio de Janeiro: Serafim JoséAlves Editor, 252 p. 1887.2. DE SOUZA, G. S. Tratado Descritivo do Brasil em 1587. 1ª edição.São Paulo / Belo Horizonte: Itatiaia Editora, 301 p. 2001.3. NAVA, P. Capítulos da História da Medicina no Brasil. São Paulo:Ateliê Editorial, 245 p. 2004.4. SANTOS FILHO, L. História Geral da Medicina Brasileira. 1ª edição.São Paulo: Hucitec – Edusp, 2 v, 680 p.1991.

Page 127: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

117

A FA FA FA FA Faculdade de Medicina da Bahia e a Ciência Médicaaculdade de Medicina da Bahia e a Ciência Médicaaculdade de Medicina da Bahia e a Ciência Médicaaculdade de Medicina da Bahia e a Ciência Médicaaculdade de Medicina da Bahia e a Ciência Médica

Bahia School of Medicine and the Medical Sciences

Aldina Barral,1,2 & Manoel Barral-Netto1,2

1Faculdade de Medicina da Bahia da UFBA; 2Centro de Pesquisas Gonçalo Moniz (FIOCRUZ-Bahia); Salvador, BA, Brasil

A Faculdade de Medicina da Bahia (FAMEB) é a mais antiga do país, criada em 18 de fevereiro de 1808, e teve umgrande papel na formação de pessoal e produção científica ao longo de sua história. O presente artigo busca avaliara produção científica da FAMEB em período recente. Para tanto, a sua produção científica é cotejada com a daUniversidade Federal da Bahia (UFBA), com base nos dados da Web of Sciences da Thomson Scientific no período de1998 a 2007. A FAMEB, uma das 30 Unidades da UFBA, e com 10% dos seus professores, é responsável por cerca de25% dos artigos da UFBA indexados internacionalmente. Ademais, entre os 10 artigos da UFBA mais citados nesteperíodo, cinco possuem autores da FAMEB. A análise da produção da FAMEB demonstra que a Imunologia, aMedicina Tropical, a Saúde Pública, Ambiental e Ocupacional, as Doenças Infecciosas, seguidas de Psiquiatria,Neurologia, Microbiologia, Farmacologia e Endocrinologia são as áreas com maior produtividade. Entre as dezrevistas com maior número de publicações indexadas da FAMEB, cinco são nacionais e cinco internacionais. Estudorecente da Academia Brasileira de Ciências também coloca a FAMEB entre as escolas médicas brasileiras commaior produção científica. Em conjunto, os dados demonstram que a FAMEB continua bastante ativa como pólogerador nas ciências médicas ao comemorar o seu bicentenário.Palavras-chave: Medicina, produção científica, ciências médicas.

The Bahia School of Medicine (FAMEB), founded in February 18th, 1808, is the Brazilian oldest medical schooland always played an important role in scientific production. The present report evaluates the recent scientificproduction of FAMEB. The production from FAMEB indexed at Web of Sciences from Thomson Scientific from 1998to 2007 is compared to the production of Federal University of Bahia (UFBA), its parent university. Despite representing10% of UFBA teachers and only one of the 30 Units that comprise UFBA, FAMEB is present in 25% of itsinternationally indexed scientific articles. Additionally, authors from FAMEB are responsible for six out of the 10most cited papers from UFBA. Immunology, Tropical Medicine, Public, Environmental and Occupational health,Infectious Diseases, followed by Psychiatry, Neurology, Microbiology, Pharmacology and Endocrinology are themost productive areas. Among the 10 journals with the highest numbers of papers from FAMEB, five are national andfive are international. A recent study from the Brazilian Academy of Sciences places FAMEB among the mostproductive medical schools from Brazil. Taken together, data indicate that FAMEB remains active as a scientificpowerhouse in medical sciences at its bicentennial celebration.Key words: Medicine, scientific production, medical sciences.

Recebido em 20/12/2007 Aceito em 25/01/2008Endereço para correspondência: Dr. Manoel Barral-Netto. Centro dePesquisas Gonçalo Moniz (FIOCRUZ-BAHIA); Rua Waldemar Falcão,121. 40296-710. Salvador, BA, Brasil. Telefone: 55-71-3176-2259;FAX 55-71-3176-2279. Endereço eletrônico: [email protected].

Gazeta Médica da Bahia 2008;78 (Suplemento 1):117-120.© 2008 Gazeta Médica da Bahia. Todos os direitos reservados.

A Bahia tem o privilégio de ter iniciado o ensino médicono Brasil. A Faculdade de Medicina da Bahia (FAMEB)completará 200 anos em 18 de fevereiro de 2008. Durante esteperíodo, a Faculdade formou importantes médicos no Brasil efoi um pólo referencial de geração de conhecimento médico.Impossível esquecer os ensinamentos da Escola Tropicalista,grande questionadora dos conhecimentos europeus sobreos problemas de saúde prevalentes no Brasil, principalmenteaqueles predominantes nas classes sociais negligenciadas,ou grandes nomes como Nina Rodrigues. Porém, o quedesejamos refletir neste texto é sobre a Faculdade de Medicinade hoje e suas possibilidades de continuar na vanguarda daciência médica.

Contexto da Produção Científica do Brasil e da Bahia

A produção científica brasileira tem apresentado umagrande expansão nas últimas décadas. O Brasil produz hojeaproximadamente 1,8% da produção científica internacional,enquanto que há 15 anos produzia meros 0,6%. Esta notávelexpansão ocorreu em quase todas as áreas do conhecimento,mas na área médica ela é mais expressiva. As publicaçõesmédicas representam cerca de 25% do total nacional. Aindamais importante que a publicação de circulação internacionalé que os trabalhos publicados sejam lidos e utilizados poroutros para o avanço do conhecimento. Neste aspecto,considerando o número de citações de artigos brasileiros,também é notável uma crescente e constante melhora dosíndices nacionais. Igualmente neste campo, a ciência médicase destaca, sendo responsável por cerca de 30% de todas ascitações recebidas pelos trabalhos publicadosinternacionalmente por instituições brasileiras.

Em um contexto mais local, como se situa a produçãocientífica internacional da FAMEB em relação às publicaçõesbaianas? A ciência baiana tem apresentado vitalidade em

Page 128: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

118 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):117-120Aldina Barral & Manoel Barral-Netto

relação ao panorama nacional. Recentemente, a expansão dosgrupos de pesquisa na Bahia ocorreu muito acima da médiado país, fazendo com que ocupemos o 7º. lugar neste critério.Chegamos assim perto da situação esperada em relação aopotencial econômico da Bahia, a sexta economia estadualbrasileira. A Universidade Federal da Bahia (UFBA) éresponsável pela imensa maioria da produção científica decirculação internacional no nosso Estado. A FAMEB éresponsável por cerca de 25% da produção científica da UFBA.

Apesar do crescimento da ciência brasileira, o volume totalde conhecimento gerado no país ainda é reduzido. A nossaprodução científica demonstra baixa eficiência na transferênciado conhecimento para as aplicações na sociedade e uma reduzidainteração com o setor empresarial. Na área biomédica, existemainda os problemas da grande dependência externa em fármacos,reagentes diagnósticos e equipamentos, além da fragilidade dalegislação para garantir o desenvolvimento da biotecnologia parafinalidades médicas. Todos estes obstáculos necessitam serenfrentados e resolvidos para que a ciência brasileira possacontribuir, de modo mais efetivo, para o progresso social.

Metodologia

Os dados apresentados neste relato se referem, em grandeparte, a levantamento feito na Web of Sciences da ThomsonScientific em novembro de 2007. Para a busca de dados daFAMEB, empregamos o seguinte argumento “AD=(med ORmedicina OR medicine) AND AD=(Univ Fed Bahia OR FedUniv Bahia OR Universidade Federal da Bahia OR UFBA)AND cu=Brazil AND Document Type=(Article)”. Olevantamento compreendeu o período de 1998 a 2007 e incluiuas bases de dados SCI-Expanded, SSCI and A&HCI.

Para avaliar o desempenho da FAMEB, é necessário colocá-la na perspectiva da produção científica da Universidade, daqual faz parte, a UFBA. Para a busca dos dados de publicaçõesinternacionalmente indexadas da UFBA, utilizamos as mesmasbases de dados e mesmo período, empregando o argumento:“AD=(Universidade federal da Bahia OR Federal Universityof Bahia OR UFBA OR Univ Fed Bahia OR Univ Fed da BahiaOR Fed Univ Bahia) AND cu=Brazil AND Type=(Article)”.

As buscas foram realizadas em novembro de 2007 peloque os dados deste último ano da série não estãocompletamente registrados.

Análise da FAMEB em Relação à UFBA

Os dados apresentados na Figura 1 indicam que tanto aFAMEB quanto a UFBA exibem uma tendência de crescimentonas suas publicações internacionais (painel esquerdo). Namaior parte do período analisado, a FAMEB produziu cercade 20 a 25% dos artigos científicos indexadosinternacionalmente publicados pela UFBA (Figura 1, paineldireito). A UFBA, instituição responsável pela maior produçãocientífica do Estado da Bahia, é formada por quase 30 Unidadesde Ensino e os professores da FAMEB representam poucomais de 10% do seu contingente de professores. Nota-se,assim, que a área médica representa um importante fator deprodução científica na Bahia.

Deve-se ressaltar ainda o impacto que os trabalhospublicados pelos docentes da FAMEB têm internacionalmente.Uma das estratégias empregadas para saber se os trabalhospublicados estão sendo utilizados e valorizadosinternacionalmente é a avaliação das citações recebidas pelosartigos publicados. Ao citar um trabalho, o autor está

Figura 1. Painel esquerdo: cada ponto representa o número anual das artigos científicos da UFBA (círculos claros) e da FAMEB(círculos pretos), constantes da base de dados do Institute for Scientific Information (ISI) no período de 1998 a 2006. Osargumentos de busca empregados são indicados no texto. Painel direito: contribuição percentual dos trabalhos da FAMEB emrelação ao número total de trabalhos da UFBA. Os números de 2007 não foram incluídos nos gráficos, pois o levantamento nãoinclui dados completos deste ano.

Page 129: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

119Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):117-120 A FAMEB e a Ciência Médica

reconhecendo uma contribuição anterior feita no tema. Nesteaspecto, a liderança da FAMEB é ainda mais marcante.Levantamento feito em 16/11/2007, abrangendo o período de1998 a 2007, revela que a FAMEB teve 60% dos artigos entreos dez mais citados da UFBA.

Quatro das dez revistas que publicam maior número detrabalhos da UFBA, na base analisada, são da área de medicinae uma da saúde pública. A Tabela 1 mostra que a Química, comtrês revistas, e a Física, com duas, também se destacam. Umaanálise das áreas do conhecimento com maior número depublicações na UFBA também revela uma expressivaparticipação da Medicina. Imunologia, Medicina Tropical,Doenças Infecciosas aparecem entre as dez principaiscategorias.

Tabela 1. Revistas com maior número de publicações da UFBAno período de 1998 a 2007, na base do Web of Sciences.

Título Percentual

Química Nova 2,95Journal of the Brazilian Chemical Society 2,84Arquivos de Neuropsiquiatria 2,41Revista de Saúde Pública 2,09Physica A 1,5Brazilian Journal of Medical and 1,39 Biological ResearchMemórias do Instituto Oswaldo Cruz 1,29Talanta 1,29Brazilian Journal of Physics 1,18American Journal of Tropical Medicine 1,13 and Hygiene

Dados da Produção Científica da FAMEB

Um segundo plano de análise dos dados das publicaçõesda FAMEB se refere a uma avaliação das suas característicasinternas. As dez principais áreas com maior produção deartigos indexados em revistas listadas na base do ISI estãolistadas na Tabela 2.

Tabela 2. Áreas do conhecimento com maior número de artigosda FAMEB em revistas indexadas na Web of Sciences noperíodo de 1998 a 2007.

Área Percentual

Imunologia 16,47Medicina Tropical 15,75Saúde Pública, Ambiental e Ocupacional 14,32Doenças Infecciosas 12,41Parasitologia 8,83Psiquiatria 7,16Neurociências 6,92Microbiologia 5,73Farmacologia 4,78Endocrinologia 4,29

Os artigos internacionalmente indexados da FAMEB, entre1998 e 2007, foram divulgados em diversas revistasespecializadas. A grande diversidade na escolha do veículode divulgação é saliente quando se observa que a publicaçãocom maior participação representa apenas 5,25% dos artigosda Faculdade. Este aspecto reflete uma necessidade natural,pois a FAMEB publica em diferentes áreas do conhecimentomédico, mas também é um aspecto positivo ao indicar acapacidade de divulgação em diferentes veículos científicos.As dez principais publicações que divulgaram artigos daFAMEB estão indicadas na Tabela 3. Cinco delas são nacionaise cinco são revistas estrangeiras.

Tabela 3. Dez revistas científicas da base da Web of Sciencescom maior participação na publicação de artigos da FAMEBno período de 1998 a 2007.

Revista Percentual

Arquivos de Neuropsiquiatria 5,25Memórias do Instituto Oswaldo Cruz 3,82American Journal of Tropical Medicine 3,1 and HygieneInfection and Immunity 3,1Revista de Saúde Pública 2,86Revista da Sociedade Brasileira de 2,62 Medicina TropicalTransactions of the Royal Society of 2,62 Tropical MedicineBrazilian Journal of Medical and 2,15 Biological ResearchJournal of Infectious Diseases 2,15Acta Tropica 1,67

Os professores com maior número de publicações indexadas,no período de análise: foram: Edgar M. de Carvalho, Aldina Barral,Manoel Barral-Netto, Álvaro Cruz Filho, Antônio Alberto Lopes,Raymundo Paraná, Mitermayer Galvão dos Reis, Achilea LisboaBittencourt, Irismar Reis de Oliveira, Fernando Martins Carvalho,Luiz Antonio R. Freitas, Roberto Badaró, Amélia Ribeiro deJesus e José Tavares Neto. Os Departamentos de Medicina(EMC, ACF, AAL, RP, RB e JT-N) e de Anatomia Patológica eMedicina Legal (AB, MB-N, MGR, ALB, LARF, ARJ) se destacam,mas há também participação dos Departamentos deNeuropsiquiatria (IRO) e de Medicina Preventiva (FMC).

Instituições com as quais a FAMEB colabora, listadas porordem de freqüência de co-autoria nas publicações: FundaçãoOswaldo Cruz (FIOCRUZ), Universidade de São Paulo (USP),Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, CornellUniversity, London School of Tropical Medicine and Hygiene,Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), UniversidadeFederal de minas Gerais (UFMG), Universidade Federal doRio de Janeiro (UFRJ), Universidade Federal do Rio Grandedo Sul (UFRGS) e Hospital São Rafael.

A análise do nosso desenvolvimento científico, observadoem diversas áreas, foi realizada em publicação recente da

Page 130: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

120 Gaz. méd. Bahia 2008;78 (Suplemento 1):117-120Aldina Barral & Manoel Barral-Netto

Academia Brasileira de Ciências (“Science in Brazil”). Estapublicação demonstra que a área médica apresentou umexcepcional desenvolvimento, entre os maiores de todas asáreas. Em 1981, as instituições cientificas do Brasil publicaram2.930 artigos internacionalmente e destes 10% foram da áreamédica. Em 2000, houve 13.232 publicações internacionaisbrasileiras e a área médica foi responsável por 19% delas. Em20 anos, a ciência médica brasileira passou de 290 artigosinternacionais para 2.515 artigos por ano. A melhoraquantitativa foi acompanhada de uma melhora na qualidade,já que outros parâmetros indicam que os nossos artigos estãosendo mais usados como fonte de informação em boaspublicações internacionais.

Apenas doze instituições médicas respondem por 80%desta produção. Nesta elite encontra-se a Faculdade deMedicina da Bahia, ao lado da Escola Paulista de Medicina,da Faculdade de Medicina da USP de São Paulo e de RibeirãoPreto, assim como as Faculdades de Medicina da UFRJ, UFMGe a FIOCRUZ. Este grupo de escolas da área médica detém80% dos pesquisadores nível I do CNPq e igual percentagemdos cursos de pós-graduação com conceito igual ou superiora cinco.

A Pós-Graduação na FAMEB

Um dos fatores importantes na produção científica naFAMEB é a existência de cursos de pós-graduação. A FAMEBpossui atualmente três cursos de pós-graduação (PG) strictosensu, os de Medicina e Saúde, o de Patologia Humana eExperimental e o curso de Saúde, Ambiente e Trabalho. Oscursos de Medicina e Saúde e o de Patologia säo dos maisantigos cursos de PG na Bahia e ambos têm conceito seis naCAPES. O curso de Saúde, Ambiente e Trabalho é de criaçãorecente e tem amplas perspectivas de consolidar.

Perspectivas

O documento “O Estado da Faculdade de Medicina daUniversidade Federal da Bahia em 2002” registra: “Que a nossaFaculdade de Medicina chegue à beira dos 195 anos, a secompletarem em 18 de fevereiro de 2003, mantendo elevada aciência médica é reconfortante. Continuamos, do ponto devista da produção de conhecimento, fiéis ao nosso passado.Precisamos envidar todos os nossos melhores esforços paraque a Faculdade de Medicina do Terreiro de Jesus, berço damedicina nacional, seja adequadamente restaurada. Não só aclasse médica, mas a Bahia precisa assumir o compromisso deapresentar este monumento vivo da Medicina em perfeitoestado nas comemorações dos 200 anos da Faculdade primazdo Brasil.” Nos cinco anos após este documento, nãoconseguimos a restauração completa da Faculdade, mas houveconsiderável progresso.

Para que a FAMEB mantenha o seu papel comoimportante pólo de formação de pessoal e geração deconhecimento é necessário que esteja preparada para os

novos desafios que se colocam no campo das ciênciasmédicas. Grande parte da produção científica médica baianaé centrada nas doenças infecto-parasitárias. A expansão doconhecimento em outras áreas é fundamental, pois o perfilepidemiológico da população brasileira mostra umenvelhecimento da população e uma queda da mortalidadeinfantil e por doenças infecto-contagiosas.

Várias novas áreas de avanço do conhecimento introduzemnovas tecnologias com grande potencialidade diagnóstica outerapêutica. A bioengenharia já se transforma de promessaem realidade. A nanotecnologia abre numerosas possibilidadesem técnicas diagnósticas assim como no desenvolvimento deabordagens terapêuticas de grande eficiência. A FAMEB,assim como as demais instituições do Estado, possuem umalto potencial de contribuição para o progresso. Para tal, énecessário que sejam capazes de expandir o número decientistas capacitados e produtivos. Só assim serão capazesde manter a produtividade nos temas onde representamliderança mundial ou nacional e também enfrentar os novosdesafios.

A perspectiva que tais promessas se concretizem é deotimismo. É saliente uma contínua, embora ainda insuficiente,expansão dos recursos federais em ciência, tecnologia einovação. O aumento de recursos para o fomento àpesquisa e a expansão do sistema de bolsas são sentidospela comunidade acadêmica. A aprovação da Lei deInovação abre perspectivas para maior apoio às empresase permite prever que haverá maior interação entre ascomunidades acadêmica e empresarial. Também deve sersalientada, neste cenário, a atuação continuada daSecretaria de Ciência e Tecnologia e da Fundação deAmparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB). Elassinalizam a atenção do governo do Estado para o campocientífico e estimulam a comunidade a uma maior produção.Além da importância intrínseca de promover projetos degrande porte, como a criação do parque tecnológico, e deaportar recursos financeiros estaduais para odesenvolvimento científico, deve ser lembrado ainda quetais iniciativas levam a uma maior captação de recursosfederais e internacionais para a Bahia.

É estimuladora a perspectiva de chegar aos 200 anos daFaculdade de Medicina com uma elevada atividade deprodução na ciência médica. Estamos confiantes que,asseguradas as condições internas de estímulo à produçãoacadêmica na UFBA e consolidado o cenário de financiamento,a Faculdade entrará no seu terceiro centenário renovada eprodutiva.

Agradecimentos

Este artigo é dedicado ao Prof. Heonir Rocha, grandeimpulsionador da pesquisa, como Professor, Diretor daFAMEB e Reitor da UFBA, e que nos deixou, prematuramente,antes do Bicentenário da FAMEB. Agradecemos ao Dr. BrunoBezerril Andrade pelas sugestões e cuidadosa revisão.

Page 131: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

NORMAS PNORMAS PNORMAS PNORMAS PNORMAS PARA PUBLICAÇÃOARA PUBLICAÇÃOARA PUBLICAÇÃOARA PUBLICAÇÃOARA PUBLICAÇÃO

1. Informações Gerais

A Gazeta Médica da Bahia (GMBahia), fundada em 10 de julho de 1866, teve circulação regular de 1866 a 1934 e de 1966 a 1972,e outro número avulso em 1976. A GMBahia é órgão oficial da Faculdade de Medicina da Bahia da Universidade Federal da Bahiae tem periodicidade semestral, mas a partir de 2008 será trimestral.

Os trabalhos submetidos à Gazeta Médica da Bahia serão encaminhados aos membros do Conselho Editorial, que decidirãosobre sua aceitação (com ou sem revisão) ou recusa, sem conhecimento de sua autoria (“blind review”).

A revista tem como linha editorial publicações científicas e trabalhos técnicos e de extensão vinculados, estritamente, à áreamédica em temas de interesse da saúde coletiva, epidemiologia, clínica, terapêutica, diagnóstico ou da reabilitação, ou de áreascorrelatas.

Aceitam-se trabalhos escritos em português, espanhol ou inglês, com título, resumo e palavras-chaves no idioma original eem inglês. Serão aceitos exclusivamente em língua portuguesa se for editorial, resenha bibliográfica, noticiário ou carta ao Editor.As demais formas de publicação devem conter resumo e “abstract”: artigo original; artigo de revisão (esse só será aceito deautor convidado pelo Conselho Editorial); artigo de opinião (“Ponto de vista”); discussão de caso na área da Bioética ou ÉticaMédica; conferência; comunicação (“Nota prévia”); relato de caso; informe técnico; resumo e “abstract” de Monografia;Dissertação ou Tese; relatório de atividade de extensão; opinião de estudante de Medicina; nota sobre História da Medicina; eprojetos e atividades na área da Educação Médica. Outro tipo de abordagem deverá, previamente à apresentação, receberautorização do Conselho Editorial da GMBahia.

A publicação submetida em língua estrangeira deve vir acompanhada de resumo em língua portuguesa.

2 Considerações Éticas e Bioéticas

Todos os trabalhos submetidos, envolvendo a participação de seres humanos, devem observar as recomendações daDeclaração de Helsinki de 1975 (revisada em 1983) e aquelas da Resolução nº 196, de 10 de outubro de 1996, do ConselhoNacional de Saúde do Ministério da Saúde. No trabalho deve ser citado qual o Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) aprovou oprojeto de pesquisa que originou a publicação, informando também o número/ano do Parecer (e.g., ... aprovado pelo Parecer nº24/2004 (ou assinale a data, se não houver número), do Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário ... [cidade, Estado]...”.

A citação de medicamento deve fazer referência ao nome genérico. Quando for estritamente necessária a citação do nome demarca do medicamento, inserir nota de rodapé informando a razão e o nome genérico, outras medicações similares e/ou de marca.Também, a Gazeta Médica da Bahia não aceita divulgação de produtos de indústria farmacêutica e de produtos médico-hospitalares.

3. Formato Geral do Trabalho a Ser Submetido

3.1 todo o trabalho deve ser compatível com o processador de texto “WORD for WINDOWS”â, em qualquer das versões do“software” e desde que assinale na etiqueta do CD (vide item 3.18);3.2 ao digitar o texto, o comando de retorno da linha “enter” só deve ser utilizado no final de cada parágrafo; em nenhumahipótese será aceito trabalho que ao final de cada linha conste um “enter”, pois só é cabível ao final do parágrafo;3.3 também não utilizar “tab” para recuo da primeira linha ou centralização de título ou capítulo;3.4 não utilizar espaço (“enter”) adicional entre os parágrafos;3.5 margens esquerda e direita com 3,0cm, e a superior e inferior de 2,5cm;3.6 as margens direita e esquerda devem ser alinhadas (justificadas);3.7 todas as páginas devem ser numeradas, inclusive a primeira, com números arábicos e no canto superior direito;3.8 o espaçamento de todo o texto deve ser duplo (exceto no título e “corpo” das tabelas, gráficos, figuras, etc.);3.9 o tamanho da fonte (letra), de todo o texto, deve ser 12, inclusive o título do trabalho;3.10 todos os trabalhos devem ter título em língua portuguesa e inglesa (exceto se for editorial, resenha bibliográfica, noticiárioou carta ao Editor), sendo o primeiro na mesma língua empregada no texto. O primeiro título deve ficar em negrito e com fonteno formato “times new roman” e, o segundo, sem negrito e com fontes em “arial” e em itálico.Exemplos (extraídos da RSBMT 34 (2), 2001):

Page 132: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

Facial nerve palsy associated with leptospirosisParalisia facial associada à leptospiroseouMudanças no controle da leishmaniose visceral no BrasilChanges in the control program of visceral leishmaniasis in Brazil

3.11 todo o texto deve ser redigido no formato de fonte “times new roman”, exceto o segundo título na língua inglesa (videacima) ou quando houver outra indicação técnica;3.12 não citar abreviaturas (sem antes a expressão completa) ou referência bibliográfica no resumo ou no “abstract”;3.13 no texto (exceto do resumo ou no “abstract”) as referências devem ser citadas da seguinte forma:

se o(s) autor(es) é (são) sujeito(s) do período ou da sentença. Exemplo:... Carmo et al.(5) (no caso de três ou mais autores, sendo o (5) sobrescrito correspondente aonúmero da referência bibliográfica) e Bittencourt & Moreira(3) (no caso de dois autores,com o “&” comercial entre os mesmos, sendo o (3) sobrescrito também correspondente aonúmero da referência bibliográfica) reviram, recentemente, a literatura e assinalaram ...

a(s) referência(s) bibliográfica(s) é(são) citada(s) conforme o número da referência bibliográfica.Exemplo:

... Em revisões recentes(3 5), foi assinalado a dispersão de pessoas com história da infecção,não obstante outros autores (2 4 11-16 25) avaliam isso como efeito da migração de pessoas ...(no caso, todos trabalhos foram citados pelo número da referência bibliográficacorrespondente)

3.14 quando o formato do trabalho couber capítulo (e.g., artigo, conferência) não “quebrar a página” entre um capítulo e oseguinte. O texto deve ser contínuo;3.15 figuras, gráficos, quadros, tabelas, etc., cada um destes elementos deve ficar em arquivo (CD) à parte e encaminhado, nascópias impressas, na ordem de citação e após o capítulo referências bibliográficas. A GMBahia não aceita para publicaçãoelementos coloridos (figuras, gráficos, etc.), mas, se houver indicação técnica, o autor deverá ressarcir as despesas adicionaiscom fotolitos e impressão;3.16 figuras, gráficos, quadros, tabelas, etc., só serão aceitos se digitados ou reproduzidos nos seguintes formatos: BMP,TIFF, PICT, GIF, ou outro de fácil compatibilidade;3.17 além das cópias impressas o autor responsável pela correspondência deve anexar CD, obrigatoriamente, com etiquetaespecificando o conteúdo e o sobrenome do primeiro autor em destaque;3.18 na etiqueta do CD, os arquivos devem ser nomeados da seguinte forma:

arquivo com o texto: sobrenome do primeiro autor[texto]anexo(s):

sobrenome do primeiro autor[tabela1]sobrenome do primeiro autor[tabela2]sobrenome do primeiro autor[quadro1]

3.19 antes de encaminhar as 4 (quatro) cópias impressas, exclua do CD todos os arquivos não relacionados ao trabalhoencaminhado;3.20 em todo o conteúdo, se for em língua portuguesa, os números decimais devem ser separados por vírgula (13,3%) e osmilhares por ponto (1.000.504 pessoas), mas, se for em língua inglesa a mesma situação é inversa, respectivamente: 13.3% ou1,000,504.

4. Itens de Cada Tipo de Trabalho

4.1 primeira página: títulos (em língua portuguesa e inglesa, ou vice-versa); nomes dos autores (com número sobrescrito para acorrespondência institucional na nota de rodapé), resumo (na linha seguinte: palavras-chave) e “abstract” (na linha seguinte“key-words”). O número de palavras-chave (ou de “key-words”) deve ser no mínimo de três (3) e no máximo seis (6). Ainda na primeirapágina, citar um “short title” com até 40 toques (incluindo os espaços entre as palavras), em língua portuguesa ou, caso seaplique, espanhola e em inglesa. Primeiro o resumo, se o texto for em língua portuguesa, ou abstract, se na língua inglesa. Osnomes dos autores devem ser registrados, preferencialmente: prenome e último sobrenome, abreviando ou excluindo os nomesintermediários, exceto Filho, Neto, Sobrinho, etc. (e.g., Demétrio C. V. Tourinho Filho ou Demétrio Tourinho Filho);4.2 nota de rodapé da primeira página:

1ª linha: vinculação institucional principal do(s) autor(es), antecedida pelo número de registro, citadosobrescrito após o nome de cada autor; cidade, abreviatura do Estado [e.g., 1. Faculdade de Medicina

Page 133: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

da Bahia da UFBA, Salvador, BA; 2. Hospital Geral do Estado (SESAB), Salvador, BA]. Não citartitulação, ocupação, cargo ou função;linha seguinte: Fonte (ou fontes) de financiamento, se houver;linha seguinte: Endereço para correspondência (em negrito e itálico): nome do autor responsável pelacorrespondência, endereço, CEP cidade, País. Telefone e/ou FAX. Exemplo: Dra. Magda Villanova, R.das Ciências 890 (Apto. 12), 40845-900 Salvador, BA, Brasil. Tel.: 55 71 789-0906; FAX: 55 71 789-6564;linha seguinte: endereço eletrônico (campo obrigatório, e com fontes de cor preta);linha seguinte: registrar a expressão: “Recebido para publicação em” (a data será registrada pelaSecretaria da Revista);

4.3 o resumo e o “abstract” (correspondendo à tradução do primeiro), na primeira página, devem ter até 250 palavras, ou até 100palavras se for comunicação, informe técnico ou outros formatos. O formato do resumo deve ser o narrativo, destacandoobjetivo(s), material(is) e método(s), local e população de estudo, principais resultados e conclusões (considerando osobjetivos do trabalho). O resumo e “abstract” não devem conter citações bibliográficas ou abreviaturas (exceto se citarpreviamente) o nome ou expressão por extenso;4.4 os artigos e as comunicações devem ter, respectivamente, até 20 (vinte) e dez (10) páginas impressas, incluindo as páginascorrespondentes às figuras, tabelas, etc.;4.5 os artigos têm os seguintes elementos:

4.5.1 primeira página, vide acima;4.5.2 as páginas seguintes (no máximo três), correspondendo ao capítulo introdução (a palavra“introdução” não deve ser registrada), devem conter a delimitação da pergunta a ser estudada e asjustificativas de forma objetiva;4.5.3 capítulo subseqüente, MATERIAL E MÉTODOS, escritos de forma que o leitor tenha a exatacompreensão de toda a metodologia e população estudada. Quando se aplicar (vide item 2), citar Comissãode Ética em Pesquisa (CEP) e número do Parecer que aprovou o projeto de pesquisa de onde se originouo artigo. As técnicas e métodos, já estabelecidos na literatura, devem ser descritos pela citação bibliográficaafim. Apenas se for estritamente necessário, este capítulo pode conter figura ou mapa, gráfico, quadro,tabela, etc. Caso se aplique, de forma objetiva, deve ser citado o plano da análise estatística;4.5.4 capítulo subseqüente, RESULTADOS, escritos de forma clara e objetiva, sem interpretação denenhum deles. O número de Tabelas, Figuras, Quadros, etc., deve ser o mais restrito possível e citadosno texto pelo número arábico correspondente, da seguinte forma: “... na Tabela 2 as principais asalterações eletrocardiográficas foram associadas ao tipo de saída hospitalar do paciente ...” ou Asprincipais alterações eletrocardiográficas foram associadas ao tipo de saída hospitalar do paciente(Tabela 2) ...”;4.5.5 capítulo subseqüente, DISCUSSÃO, baseada na interpretação dos resultados observados (semrepeti-los em detalhes e sem a citação de tabelas, figuras, etc.), comparando-os com a bibliografiapertinente. As especulações, sugestões ou hipóteses devem ter como fundamentação os resultadosobservados;4.5.6 capítulo, se couber, de AGRADECIMENTOS - citando, sumariamente, o nome completo da pessoa(instituição) e qual a real contribuição ao trabalho;4.5.7. capítulo final, das REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS (as mesmas normas são aplicadas aosdemais formatos de trabalhos). Não usar outros termos aparentemente equivalentes (Bibliografia,Referências, etc.). Devem ser ordenadas em rigorosa ordem alfabética, numeradas consecutivamente, ecitando todos os co-autores – exceto se houver 25 ou mais co-autores, nesse caso cite os 24 primeirosseguidos da expressão latina et al. No texto (exceto se sujeito da sentença), tabelas e em legendas deilustrações, as referências bibliográficas devem ser citadas por numerais arábicos e entre parênteses (1)

ou (2 14 23). Só a letra primeira letra do sobrenome de cada autor deve ficar em maiúscula e as demaisabreviaturas não devem ser seguidas por ponto ou ponto e vírgula entre os autores. Se houver mais deum trabalho do(s) mesmo(s) autor(es), a ordem dever ser cronológica, começando pelo mais antigo;

4.6 ainda sobre as Referências bibliográficas, use o estilo dos exemplos adiante descritos e que observam os formatos usadospela “National Library of Medicine” (NLM) no Index Medicus. Os títulos das revistas ou periódicos devem ser abreviados deacordo com a formatação oficial estabelecida no Index Medicus. Em caso de dúvida, consulte a Lista de Revistas Indexadasno Index Medicus (“List of Journals Indexed in Index Medicus”), publicada anualmente pela NLM em separado e também nonúmero de janeiro de cada ano do Index Medicus, a qual pode ser obtida no endereço eletrônico http://www.nlm.nih.gov (oumais especificamente no: http://www.nlm.nih.gov/tsd/serials/terms_cond.html; depois “clique” sobre o formato de impressãodesejado [“available formats”]);

Page 134: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

4.6.1 o estilo dos requisitos uniformes (o estilo de Vancouver) baseia-se, amplamente, no estilo-padrãoANSI adaptado pela NLM para seus bancos de dados (e.g., MEDLINE). Nas modalidades de referências,nota foi incluída quando o estilo Vancouver difere do atualmente usado pela NLM;4.6.2 modalidades de trabalhos a serem citados (alguns exemplos são fictícios):

ArtigoAlmeida BS, Tavanni GHT, Silva YHU, Caldas HFT, Almeida Neto BS. Níveis de aminotransferases emescolares de Mendonça (SE), soronegativos para os vírus das hepatites B e C. Rev Soc Bras Med Trop56: 34-39, 2001. Não citar número da revista ou periódico, só o volume.

Tese, Dissertação, Monografia ou assemelhandoBritto Netto AF. Distribuição espacial dos casos de sarampo no Nordeste brasileiro, de 1960 a 2002[tese de Livre-Docência]. Salvador: Universidade Federal da Bahia, 2003.

LivroCarmo HF, Fonseca Filho TG, Melo-Silva TT. Antropologia médica: estudos afro-brasileiros. 5ª edição.Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 302p., 2001.

Capítulo de livroVinhais C. Conduta e tratamento: hipertensão arterial. In: Sardinha GTR, Romero MC (ed), Terapêuticaclínica. 1ª edição. Porto Alegre: Artes Médicas, p. 123-129, 2001.

Resumo de trabalho científico apresentado em Evento CientíficoAraújo JS, Carneiro JN, Almeida BS, Tavanni GHT, Silva YHU, Caldas HFT, Almeida Neto BS.Esquistossomose mansônica na cidade do Salvador, Bahia. In: Resumos do XXII Simpósio Internacionalde Medicina Tropical, 20 a 27 de setembro, Rio Branco, p. 87, 1999.

PatenteLarsen CE, Trip R, Johnson CR, inventors; Novoste Corporation, assignee. Methods for proceduresrelated to the electrophysiology of the heart. US patent 5,529,067. Jun 25, 1995.

Publicação extraído de período ou jornal popularMarconi TQ. Novo caso de raiva humana em Salvador. Jornal Clarin, Salvador, junho 21; Sect. A:3 (col.5), 1999.

Publicação audiovisual [videocassete] [DVD], [CD-ROM] etc.HIV+/AIDS: the facts and the future [videocassete]. St. Louis: Mosby-Year Book, 1995.

Mapa (não parte de alguma publicação específica)Estado da Bahia. Distribuição dos casos de calazar [mapa demográfico]. Salvador: Secretaria de Estadode Saúde, Departamento de Epidemiologia, 2001.

4.6.2.1 publicação sem número ou volume: ... Curr Opin Gen Surg 325-33, 1993.4.6.2.2 paginação em numerais romanos: ... Hematol Oncol Clin North Am 9: xi-xii, 1995.4.6.2.3 se carta (letter) ou resumo (abstract) em publicação periódica: Clement J, FischerPA. Metronome in Parkinson’s disease [letter]. Lancet 347: 1337, 1996. Ou seja, colocarentre colchetes letter ou abstract.4.6.2.4 publicação de erratum: Hamlin JA, Kahn AM. Herniography in symptomaticpatients following inguinal hérnia repair [published erratum appears in West J Med162: 278, 1995]. West J Med 162: 28-31, 1995.4.6.2.5 publicação contendo retratação: Garey CE, Schwarzman AL, Rise ML, SeyfriedTN. Ceruloplasmin gene ... [retraction of Garey CE, Schwarzman AL, Rise ML, SeyfriedTN. In: Nat Genet 6: 426-31, 1994]. Nat Genet 11: 104, 1995.4.6.2.6 publicação retratada: Liou GI, …, Matragoon S. Precocious IRBP gene ... [re-tracted in Invest Ophthalmol Vis Sci 35: 3127, 1994]. Invest Ophthalmol Vis Sci 35:1083-8, 1994.

Page 135: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides

4.7 não incluir entre as referências bibliográficas: trabalhos submetidos e ainda não-aprovados; dados não-publicados oucomunicação pessoal. Essas informações devem citadas no texto, do seguinte modo: “... foi observado em 44,5% dos casosa mesma lesão [Almeida Neto & Souza R em 20/11/2004: dados não-publicados]” ou em caso de comunicação pessoal: “... oajuste do aparelho X® (nome do fabricante, cidade) para a temperatura ambiente de 25°C, foi realizado do seguinte modo ...[Silva-Araújo J (FAMEB/UFBA), comunicação pessoal em 07/10/2003]”;4.8 os quadros (fechados com linhas verticais nas laterais), figuras, gráficos e ou tabelas (sem linhas laterais verticais) devemter título objetivo, numeração com algarismo arábico e título [e.g. Tabela 4. Indicadores demográficos da população deCavunge, Ipecaetá, Bahia (2001)]. A compreensão desses elementos deve independer da leitura do texto. Em caso de figura,deve ser numerada no verso e o título encaminhado em folha à parte. Caso a(s) figura(s) ou outro(s) elementos seja(m)colorido(s), o autor principal deve informar ao Editor da GMBahia a fonte de custeio dessa despesa.

5. Submissão do Trabalho

Na carta ao Editor da GMBahia deve constar a assinatura de todos os autores do trabalho, mas, se isso não for possívelanexar à correspondência cópia de FAX ou de mensagem eletrônica autorizando o(a) autor(a) responsável a apresentar otrabalho para publicação. Na correspondência devem constar as seguintes informações: título do trabalho; seção da GMBahiaou tipo de trabalho (se artigo, conferência, comunicação, ou outro tipo de apresentação); declaração que o trabalho está sendosubmetido apenas à GMBahia; a concordância de cessão dos direitos autorais para a GMBahia; e se há algum conflito deinteresse de um ou mais autores.

Caso haja a utilização de figura, tabela, etc. publicada em outra fonte, deve-se anexar documento que ateste a permissão paraseu uso em publicação cientifica. Nesse caso, o documento probatório deve constar nome, endereço, e-mail, telefone e fax doautor responsável ou do Editor da publicação original.

Antes de submeter o trabalho, uma a uma das exigências deve ser revista pelo autor responsável para evitar a devolução oua rejeição do trabalho pela Secretaria da GMBahia.

Caso o trabalho seja entregue pessoalmente por um dos autores na Secretaria da GMBahia, o autor responsável deve trazeruma segunda via da carta de submissão para o devido registro de recebimento pela Secretaria. Não será aceito nenhum trabalhoentregue por terceiros ou em locais não autorizados. O trabalho deve ser encaminhado, preferencialmente, através decorrespondência registrada para o seguinte endereço:

Gazeta Médica da BahiaFaculdade de Medicina da Bahia (UFBA)

Largo do Terreiro de Jesus, Centro Histórico de Salvador40025-010 Salvador, Bahia, Brasil

Page 136: GAZETA MÉDICA DA BAHIA – 1908 Alfredo Thomé de Britto 1908 – 1912 Augusto Cezar Vianna 1913 – 1914 Deocleciano Ramos 1915 – 1930 Augusto Cezar Vianna 1931 – 1932 Aristides