folheto biográfico - vergílio ferreira
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Folheto Biográfico sobre a vida e obra de Vergílio Ferreira.TRANSCRIPT
Escola Secundária Rainha
Dona Amélia
Manhã Submersa e Em Nome da Terra são dois
livros marcantes da obra literária de Vergílio
Ferreira. Manhã Submersa dá-nos
o ambiente totalitário, concentra-
cionário, dos seminários, onde
jovens vindos do mundo rural
eram preparados para a vida reli-
giosa. Não é um livro que procure
fazer a denúncia de um sistema de
valores culturais ou religiosos em si, mas sim a
caracterização de um ambiente de segregação
de valores básicos. No centro das preocupações
de Vergílio Ferreira, está o indivíduo, a sua in-
serção num ambiente que não respeita as suas
necessidades humanas, o seu crescimento afas-
tado da família. O próprio autor viveu na sua
infância num seminário (o do Fundão) e o livro
exprime o desconforto humano pelo abandono
e pelo sofrimento com a austeridade desses
ambientes. Ambientes que foram uma referên-
cia cultural para muito daquilo que foi o Estado
Novo. Vergílio procurava compreender os mo-
dos como o ser humano se deteriora, como ele
sofre e que sentido ocorre na sua existência.
Folheto Biográfico
Vergílio António Ferreira nasceu em Melo, a 28 de
janeiro de 1916, e faleceu em Lisboa, a 1 de março
de 1996. Foi escritor, romancista e ensaísta, e estu-
dou no Seminário do Fundão, entre 1926 e 1932,
completando os seus estudos na cidade de Coim-
bra. Licenciou-se em Filologia Clássica na Universi-
dade de Coimbra, onde, durante a segunda metade
dos anos trinta, tomaria contacto com um neorrea-
lismo emergente. Foi professor em Évora (1945-
1958) e em Lisboa (desde 1959 até à sua reforma).
Notabilizou-se no domínio da prosa ficcional, sendo
um dos maiores romancistas portugueses do século
XX. Foi como escritor que mais se distinguiu. O seu
nome continua, atualmente, associado à literatura,
através da atribuição do Prémio Vergílio Ferreira.
Em 1992, recebeu o Prémio Camões. A sua vasta
obra, geralmente dividida em ficção (romance, con-
to), ensaio e diário, costuma ser agrupada em dois
períodos literários: o Neor-
realismo e o Existencialismo.
Considera-se que Mudança
é a obra que marca a transi-
ção entre os dois períodos.
Temas como a morte, o
mistério, o amor, o corpo, o
sentido do universo, o vazio
de valores e a arte são re-
correntes na sua produção
literária.
Vergílio Ferreira
Vergílio Ferreira nasceu de frente para a serra, esse fascínio de
mistério onde Torga encontrou um reino maravilhoso, a figura-
ção melancólica da natureza e o doce encanto do natural. Vergí-
lio Ferreira viu, nessa realidade geológica, o campo de vivências
onde seres humanos construíram vidas sobre as quais ele pen-
sou. A sua solidão de criança e a sua vivência num seminário
proporcionaram-lhe uma forma particular de olhar o mundo.
Imerso nos autores clássicos e nas palavras
contemporâneas de Malraux, tentou, em
obras literárias, saber o sentido da existência.
Interrogou se ela se forma em ideias base da
nossa vivência ou se temos uma essência que
nos preenche como seres humanos. No livro
Em Nome da Terra, Vergílio Ferreira propõe
um exercício filosófico, o de sabermos como
podemos enfrentar a morte. Trata-se de um
diálogo entre uma personagem que relembra uma história de
vida, um amor construído, a memória dele, a realidade que
sobra desse real e a efemeridade do tempo. O corpo e a usura
do tempo são aspetos destacados nesse diálogo entre o presen-
te e o passado, tempo recordado num quotidiano vivido, mas
onde não se encontra um sentido. O livro faz uma viagem entre
a abordagem filosófica, a da procura da verdade, e um narrador
que realiza uma desconstrução dos processos de racionalizar o
mundo. Neste processo, algum sentido da existência é encon-
trado em alguns aspetos de encantamento de sentir o mundo. É
na recuperação do passado que o narrador descobre uma forma
de eternidade, dando à memória a possibilidade de se emocio-
nar e oferecendo a uma vida efémera a eternidade. A eternida-
de como um deus, a divindade do homem, que é uma breve
cintilação de luz, a vida, a construção da arte humana.
28 de janeiro de 2016 nascimento de Vergílio FERREIRA
Vergílio Ferreira é um dos gran-
des nomes da literatura do século
XX. A sua obra evoluiu entre uma
abordagem da vida e da socieda-
de com referências do neorrealis-
mo e uma vertente designada
existencialismo. Fazem parte des-
sa primeira fase O Caminho Fica
Longe, 1943, Onde Tudo Foi Mor-
rendo, 1944, e Vagão J, 1946. Com Manhã Submer-
sa,1953, Aparição, 1959, e Cântico Final, 1960, Ver-
gílio Ferreira dá expressão aos temas que marca-
rão a sua obra literária. A vida e os seus limites co-
mo experiência, a efemeridade dos gestos huma-
nos, a morte e os modos de reivin-
dicar a vivência humana pelo cor-
po e pelas expressões do amor são
cruciais na sua obra. Vergílio Fer-
reira construiu uma obra literária
onde as ideias filosóficas estão
muito presentes, onde encontra-
mos referências a autores seus
contemporâneos, tais como André Malraux, Albert
Camus, ou referências à cultura clássica. Vergílio
Ferreira criou um conjunto de obras onde tentou
compreender as multiplicidades que nos definem.
Interrogou-se continuamente sobre os modos de
criar uma verdade que seja anterior
a todos os modos racionais de pen-
sar a vida. Tentou criar um mundo
fundado na nossa própria sensibili-
dade, o amor como forma primeira
de sermos humanos.
“Preparar o futuro - o futuro… E uma súbita
ternura não sei porquê. Até ao oculto na sua
comoção. Preparar o futuro, preparação para
a morte. Está certo. Parte-se carregado de
coisas, elas vão-se perdendo pelo caminho. Se
ao menos uma breve ideia. Não tenho. Não é
bem a vida que faz falta - só aquilo que a faz
viver”.
(Para sempre, pág. 10)
O silêncio estala no ar branco, os pássaros ca-
lam-se na sombra das ramadas. Só de vez em
quando, vem de longe, dá a volta pelos mon-
tes, uma voz canta pelo ermo das quintas.
Ouço-a na minha alegria morta, na revoaada
da memória longínqua, escuto-a. E é como se
mais forte que o cansaço e a ruína, do lado de
lá da amargura, é a voz da terra, da divindade
do homem. (Para sempre, pág. 16)
A vida inteira para dizer uma palavra!
Felizes os que chegam a dizer uma palavra!
(Para sempre, Epígrafe)