fisioterapia respiratória em terapia intensiva pediátrica e neonatal - uma revisão baseada em...

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Resumo Objetivo: avaliar as evidências sobre a eficá- cia, indicações, efeitos adversos e as limitações dos procedimentos fisioterapêuticos respirató- rios nos pacientes pediátricos. Fontes de dados: foi realizada uma busca sistemática da literatura nas bases de dados eletrônicos MedLine, ISI Web, Lilacs e SciELO no período de 1970 a 2006. Os critérios de inclusão foram artigos de revisão, artigos originais e experimentais reali- zados com recém-nascidos, lactentes e crianças sob cuidados intensivos. Quarenta e quatro es- tudos foram incluídos. Síntese dos dados: foram identificadas quatro categorias em relação à fi- sioterapia respiratória: indicações, objetivos, técnicas fisioterapêuticas e, o papel da fisiotera- pia no período periextubação. Conclusões: a fi- sioterapia respiratória tem indicação e eficácia comprovadas em pacientes com quadros de hi- persecreção brônquica e na redução de atelecta- sias pós-extubação. Descritores: Doenças respiratórias. Unidades de terapia intensiva. Medicina baseada em evidên- cia Abstract Objective: to evaluate the evidences about respi- ratory physiotherapeutic measures on children – ef- ficacy, adverse reactions, indications and limits. Data sources: a systematic selection was proceeded in electronic databases MedLine, ISI Web, Lilacs and SciELO, in the period extending from 1970 to 2006. Articles selected were revisions, originals and experimental ones, focused on children, infants and newborns hospitalized in intensive care. Forty four studies were selected. Data synthesis: four ca- tegories predominate in respiratory physiothera- peutic measures – indications, objectives, techni- ques, and peri-extubation role. Conclusions: there is evidence and proved efficacy for physiotherapeu- tic measures when bronchial hyper secretion is pre- sent and in reducing post-extubation atelectasies. Keywords: Physical therapy. Respiratory tract di- seases. Intensive care units. Evidence based medicine Resumen Objetivo: evaluar las evidencias sobre la efica- cia, indicaciones, efectos adversos y las limitacio- nes de los procedimientos fisioterapéuticos respira- torios en los pacientes pediátricos. Fuentes de los datos: fue realizada una búsqueda sistemática de la literatura en las bases de datos electrónicos MedLi- ne, ISI Web, Lilacs e SciELO en el periodo de 1970 a 2006. Los criterios de inclusión fueron artículos originales y experimentales realizados con recién nacidos, lactantes y niños sobre cuidados intensi- vos. Cuarenta y cuatro estudios fueron incluidos. Síntesis de los datos: predominaron cuatro catego- rías en relación a la fisioterapia respiratoria: indi- caciones, objetivos, técnicas fisioterapéuticas y el papel de la fisioterapia en el período peri-extuba- 216 PEDIATRIA (SÃO PAULO) 2007;29(3):216-221 REVISÕES E ENSAIOS Fisioterapia respiratória em terapia intensiva pediátrica e neonatal: uma revisão baseada em evidências Carla Marques Nicolau 1 , Ana Lúcia Lahóz 2 Serviço de Fisioterapia do Instituto da Criança (ICr-HC-FMUSP) 1 Mestranda em Ciências do Departamento de Pediatria da FMUSP Fisioterapeuta responsável pelo Berçário Anexo à Maternidade do ICr-HC-FMUSP 2 Especialista em Insuficiência Respiratória e Cardiovascular em UTI do Hospital do Câncer. Fisioterapeuta responsável pela UTI Pediátrica do ICr-HC-FMUSP

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Resumo

Objetivo: avaliar as evidências sobre a eficá-cia, indicações, efeitos adversos e as limitaçõesdos procedimentos fisioterapêuticos respirató-rios nos pacientes pediátricos. Fontes de dados:foi realizada uma busca sistemática da literaturanas bases de dados eletrônicos MedLine, ISIWeb, Lilacs e SciELO no período de 1970 a2006. Os critérios de inclusão foram artigos derevisão, artigos originais e experimentais reali-zados com recém-nascidos, lactentes e criançassob cuidados intensivos. Quarenta e quatro es-tudos foram incluídos. Síntese dos dados: foramidentificadas quatro categorias em relação à fi-sioterapia respiratória: indicações, objetivos,técnicas fisioterapêuticas e, o papel da fisiotera-pia no período periextubação. Conclusões: a fi-sioterapia respiratória tem indicação e eficáciacomprovadas em pacientes com quadros de hi-persecreção brônquica e na redução de atelecta-sias pós-extubação.

Descritores: Doenças respiratórias. Unidades deterapia intensiva. Medicina baseada em evidên-cia

Abstract

Objective: to evaluate the evidences about respi-ratory physiotherapeutic measures on children – ef-ficacy, adverse reactions, indications and limits.Data sources: a systematic selection was proceeded

in electronic databases MedLine, ISI Web, Lilacsand SciELO, in the period extending from 1970 to2006. Articles selected were revisions, originalsand experimental ones, focused on children, infantsand newborns hospitalized in intensive care. Fortyfour studies were selected. Data synthesis: four ca-tegories predominate in respiratory physiothera-peutic measures – indications, objectives, techni-ques, and peri-extubation role. Conclusions: thereis evidence and proved efficacy for physiotherapeu-tic measures when bronchial hyper secretion is pre-sent and in reducing post-extubation atelectasies.

Keywords: Physical therapy. Respiratory tract di-seases. Intensive care units. Evidence based medicine

Resumen

Objetivo: evaluar las evidencias sobre la efica-cia, indicaciones, efectos adversos y las limitacio-nes de los procedimientos fisioterapéuticos respira-torios en los pacientes pediátricos. Fuentes de losdatos: fue realizada una búsqueda sistemática de laliteratura en las bases de datos electrónicos MedLi-ne, ISI Web, Lilacs e SciELO en el periodo de 1970a 2006. Los criterios de inclusión fueron artículosoriginales y experimentales realizados con reciénnacidos, lactantes y niños sobre cuidados intensi-vos. Cuarenta y cuatro estudios fueron incluidos.Síntesis de los datos: predominaron cuatro catego-rías en relación a la fisioterapia respiratoria: indi-caciones, objetivos, técnicas fisioterapéuticas y elpapel de la fisioterapia en el período peri-extuba-

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PEDIATRIA (SÃO PAULO) 2007;29(3):216-221

n REVISÕES E ENSAIOS

FFiissiiootteerraappiiaa rreessppiirraattóórriiaa eemm tteerraappiiaa iinntteennssiivvaappeeddiiááttrriiccaa ee nneeoonnaattaall:: uummaa rreevviissããoo bbaasseeaaddaa eemmeevviiddêênncciiaass

Carla Marques Nicolau1, Ana Lúcia Lahóz2

Serviço de Fisioterapia do Instituto da Criança (ICr-HC-FMUSP)1 Mestranda em Ciências do Departamento de Pediatria da FMUSP

Fisioterapeuta responsável pelo Berçário Anexo à Maternidade do ICr-HC-FMUSP2 Especialista em Insuficiência Respiratória e Cardiovascular em UTI do Hospital

do Câncer. Fisioterapeuta responsável pela UTI Pediátrica do ICr-HC-FMUSP

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ción. Conclusiones: la fisioterapia respiratoria tie-ne indicación y eficacia comprobadas en pacientescon cuadros de hipersecreción brónquica y en la re-ducción de atelectasias pos-extubación.

Palabras clave: Enfermedades respiratorias. Uni-dades de terapia intensiva. Medicina con base enevidencia

Introdução

A fisioterapia é uma modalidade terapêuticarelativamente recente dentro das unidades de te-rapia intensiva pediátrica e neonatal e que está emexpansão, especialmente nos grandes centros. Se-gundo a portaria do Ministério da Saúde no 3.432,em vigor desde 12/8/1998, as unidades de terapiaintensiva de hospitais com nível terciário devemcontar com assistência fisioterapêutica em perío-do integral, por diminuírem as complicações e operíodo de hospitalização, reduzindo, conse-qüentemente, os custos hospitalares.

Dentre as várias áreas de atuação, fisioterapia émais utilizada nas unidades de tratamento intensi-vo na prevenção e tratamento das doenças respira-tórias. A fisioterapia respiratória era, a princípio,considerada sinônimo de tapotagem, a primeiratécnica utilizada sistematicamente nesse período.Com o desenvolvimento de outras manobras fi-sioterápicas, as possibilidades disponíveis para ahigiene brônquica tiveram incremento com a dre-nagem postural, vibração, compressão, e outrasque podem ser utilizadas individualmente oucombinadas entre si. De modo geral, essas técni-cas foram inicialmente utilizadas e avaliadas nosadultos, e não diferem das manobras de fisiotera-pia realizadas nestes pacientes.

Ao longo do tempo, alguns aspectos passarama ser observados com a fisioterapia respiratória,como a diferente resposta dos pacientes a umamesma manobra, segundo a faixa etária, a consti-tuição física e o tipo de doença. Outras observa-ções constataram em alguns casos efeitos adversosda fisioterapia respiratória. Isso foi observadomais freqüentemente nos recém-nascidos, espe-cialmente nos prematuros, e ensejou uma escolhamais criteriosa das técnicas fisioterapêuticas, quepassaram a ter avaliação e execução individualiza-das, de acordo com o paciente. Há uma tendêncianos dias correntes a evitar manipulações freqüen-tes e/ou intensas especialmente no recém-nascidopré-termo, pelo risco de efeitos adversos.

Todos os aspectos citados, relativos a eficácia,efeitos adversos e peculiaridades do tratamentofisioterápico respiratório em crianças, poucas ve-zes são avaliados com objetividade, pela comple-xidade dos casos internados em terapia intensi-va, e pela falta de padronização no tratamento.Porém, há a necessidade dessa avaliação, quepode auxiliar na redução da morbidade e morta-lidade dos pacientes, especialmente dos recém-nascidos em tratamento intensivo, com reduçãodo tempo de hospitalização e custos hospitala-res. Por estes motivos foi realizada a presente re-visão sistemática baseada em evidências, relativaà eficácia, efeitos adversos e indicações dos pro-cedimentos fisioterapêuticos respiratórios empacientes pediátricos.

Fonte dos dados

Procedeu-se uma busca sistemática da literatu-ra por meio da consulta aos indexadores de pes-quisa nas bases de dados eletrônicos MedLine, ISIWeb, Lilacs e SciELO. O levantamento foi reali-zado com os seguintes descritores: newborn (orneonate) / recém-nascido (ou neonato) and / e in-fants (or children) / crianças and / e respiratoryphysiotherapy (or physiotherapy) / fisioterapiarespiratória (ou fisioterapia) and / e intensive careunit (unidade de terapia intensiva). Foram defi-nidos como critérios de inclusão: artigos de revi-são, editoriais, artigos originais e artigos experi-mentais de língua inglesa, portuguesa ouespanhola, realizados com seres humanos na faseneonatal e pediátrica, publicados no período de1970 a 2006 em periódicos especializados inde-xados nas bases de dados consultadas. Foramencontrados 76 artigos, dos quais 32 foram ex-cluídos da análise. Dos artigos excluídos, 13 oforam porque envolviam pesquisa com ani-mais,12 eram sobre fisioterapia neurológica/mo-tora e 7 eram relativos à pesquisa realizada comadolescentes não internados em terapia intensiva.Todos os 44 artigos restantes foram localizados eincluídos no estudo.

Síntese dos dados

Após leitura detalhada e análise criteriosa dosartigos levantados, foram identificadas quatrocategorias em relação à fisioterapia respiratória:1. indicações da fisioterapia respiratória neonatale pediátrica; 2. objetivos da fisioterapia respira-

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tória; 3. técnicas fisioterapêuticas utilizadas –eficácia versus efeitos adversos; 4. papel da fisio-terapia na extubação/reintubação.

Indicações da fisioterapia respiratória neonatal e pediátrica

Com relação às indicações da fisioterapia res-piratória em recém nascidos pré-termo (RNPT),Paratz e Burns1 concluíram que o tratamento fi-sioterapêutico em RNPT enfermos tem indicaçãosob certas condições clínicas, como as síndromesaspirativas, a síndrome do desconforto respirató-rio, pneumonias, atelectasias, e na prevenção decomplicações da ventilação mecânica. Quatrooutros estudos2-5 concluíram que a intervençãofisioterapêutica está indicada na presença de se-creção na via aérea, e nos casos com evoluçõesdesfavoráveis à gasometria e/ou ao exame radio-lógico, sinais indicativos de possíveis problemascom a depuração ciliar, com a ventilação ou ou-tra alteração da mecânica respiratória, e na maio-ria das vezes com as três condições.

Em algumas situações a fisioterapia respirató-ria tem mostrado grande impacto e pode alterar oprognóstico do paciente. Isto foi observado nasíndrome do desconforto respiratório, na síndro-me de aspiração meconial, na displasia bronco-pulmonar, nas pneumonias neonatais e nos pós-operatórios de cirurgias de grande porte. Afisioterapia pré e pós-extubação também mostrouvalor na redução da incidência de complicações,como as atelectasias pós-extubação6-8.

Os pacientes pediátricos internados em tera-pia intensiva têm indicação de fisioterapia respi-ratória em casos de hipersecreção brônquica,submetidos ou não à ventilação mecânica, poishá otimização da função cardiopulmonar e redu-ção do agravo respiratório9,10.

Objetivos da fisioterapia respiratória neonatal

Seis estudos4,9-13 descrevem os objetivos da as-sistência fisioterapêutica em recém-nascidos ecrianças:

l otimizar a função respiratória de modo a facili-tar as trocas gasosas e adequar a relação venti-lação-perfusão;

l adequar o suporte respiratório;l prevenir e tratar as complicações pulmonares;

l manter a permeabilidade das vias aéreas;l favorecer o desmame da ventilação mecânica e

da oxigenoterapia.

Embora os objetivos da fisioterapia sejam se-melhantes àqueles traçados para os adultos, a as-sistência fisioterapêutica em Pediatria / Neonatolo-gia apresenta particularidades relacionadas àsdiferenças anatômicas e fisiológicas existentes nes-tes pacientes, em relação às demais faixas etárias.

Técnicas fisioterapêuticas utilizadas –efeitos benéficos versus efeitos adversos

Os artigos selecionados apresentaram grandevariabilidade em relação às técnicas fisioterapêu-ticas empregadas em neonatos e crianças. Asmais utilizadas e avaliadas são as denominadasmanobras de higiene brônquica: tapotagem (oupercussão), vibração/vibrocompressão, mano-bras com ambú (bag-squeezing), aspiração devias aéreas e endotraqueal, estímulo de tosse e oposicionamento em posturas de drenagem. Ape-nas dois artigos14,15 apresentaram além das ma-nobras de higiene brônquica, recursos que en-globavam exercícios respiratórios passivos emrecém-nascidos pré-termo.

As manobras de higiene brônquica são utiliza-das para mobilizar e remover as secreções nasvias aéreas, no sentido de melhorar a função pul-monar. Entretanto, em algumas situações, a fisio-terapia respiratória pode ser lesiva ao paciente,principalmente ao recém-nascido pré-termo, poisele pode não suportar o manuseio, mesmo poucointensos e habituais, de uma UTI neonatal16.

Em relação aos recursos fisioterapêuticos, vá-rios autores contra-indicam as manobras de higie-ne brônquica para RNPT com peso de nascimen-to menor que 1.500 g nos primeiros 3 dias de vida,devido à maior labilidade e possibilidade de ocor-rer hemorragia intracraniana17-19. Para estesRNPT, o posicionamento é fundamental e parte in-tegrante da assistência fisioterapêutica durante osprimeiros dias de vida, pois possibilita melhorescondições biomecânicas ao segmento tóraco-ab-dominal e otimiza a função respiratória, sem pro-mover eventos hemorrágicos.

De acordo com algumas pesquisas, as mano-bras de higiene brônquica, principalmente a tapo-tagem, podem provocar nos RN efeitos adversos –hipoxemia17,18, fratura de costelas20, e, por vezes,lesões cerebrais21-23. Foi observado através de ba-

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lão esofágico que a tapotagem provoca aumentona pressão intratorácica, sem interesse para o au-mento no clearance das secreções brônquicas24.

A eficácia da tapotagem em RN é questionadapor diversos autores11,20,24,25. Isso porque nessaidade o tórax é muito maleável, tem dimensõesreduzidas e, sendo assim, o efeito mecânico datapotagem é consideravelmente menor do queem outras faixas etárias. Seria necessário, portan-to, aplicar uma energia mais intensa do que aaplicada em adultos para ocorrer o desprendi-mento das secreções brônquicas, o que oferece-ria o risco, por vezes observado, de causar dor eaté fratura de costelas11,20,24,25.

Na área pediátrica, dois artigos26,27 ressaltam aimportância da monitoração do paciente duran-te a realização da tapotagem, pois pode ocorrerarritmia cardíaca e/ou instabilidade hemodinâ-mica. Além das crianças em UTI, a indicação demonitoração deve abranger os pacientes comdoenças crônicas hipersecretivas, mesmo que es-táveis clinicamente. Wollmer26 relata que a tapo-tagem em crianças pneumopatas crônicas comfibrose cística, tem eficácia comprovada na dre-nagem da secreção brônquica e na redução de in-fecções locais.

Uma possível indicação de tapotagem seriamos quadros de broncoespasmo, mas na literaturanão há estudos suficientes para esta avaliação,que deveria ser mais estudada. Um estudo obser-vou que frente à ausculta pulmonar de sibilosisolados a tapotagem deve ser evitada, até o mo-mento em que o paciente apresentar outros ruí-dos adventícios28.

Dois artigos14,29 verificaram a reexpansão deáreas atelectásicas com o uso da tapotagem, porémhouve um caso de atelectasia secundária ao proce-dimento, com arritmia cardíaca importante30.

O posicionamento na postura de Trendelem-burg para drenagem de secreções respiratórias écontra-indicada em recém-nascidos, crianças cominstabilidade hemodinâmica, e/ou com aumentoda pressão intracraniana. A postura favorece o au-mento da pressão intracraniana, e o refluxo gas-troesofágico eleva o risco de broncoaspiração epneumonia aspirativa28,30.

Em relação à técnica descrita como aumentodo fluxo expiratório (AFE), apenas um estudo31

relata melhora dos níveis de oxigenação arterialem lactentes hipersecretivos com esta técnica.

A aspiração das vias aéreas é um procedimen-to muitas vezes realizado nas UTI para manter a

permeabilidade das mesmas, em especial nos pa-cientes com pouca tosse, como os RNPT. Emborao procedimento seja relativamente simples, exi-ge cuidado rigoroso na sua execução devido aosefeitos indesejáveis que pode determinar. As al-terações fisiológicas induzidas pela aspiraçãoainda são pouco conhecidas. Podem ocorrer efei-tos cardiovasculares adversos, determinados pelahipoxemia, e por alterações do sistema nervosoautônomo. Por meio da estimulação dos recepto-res simpáticos pode resultar secundariamentevasoconstrição periférica e aumento da pressãoarterial, e em decorrência da estimulação dos re-ceptores parassimpáticos a bradiarritmia. Algunsestudos32-35 relatam que os efeitos adversos (au-mento do fluxo sanguíneo cerebral e da pressãointracraniana durante a aspiração traqueal), po-dem suplantar os efeitos benéficos.

São descritas, também, outras complicaçõesassociadas à aspiração de vias aéreas e endotra-queais, que, geralmente, resultam de técnica deaspiração inadequada. Podem ocorrer lesões damucosa traqueobrônquica, perfuração brônquicapela sonda de aspiração (com pneumotórax se-cundário), atelectasia (devido ao uso de pressãonegativa excessiva), além de bacteremia e infec-ções respiratórias.

Vários estudos36-40 não recomendam a realiza-ção da aspiração em horários pré-estabelecidos,sugerindo que a necessidade da remoção do ex-cesso de secreções das vias aéreas deva ser indi-vidualizada.

De forma geral, estudos sugerem40,41 que a as-piração endotraqueal não deve ser realizada nos 3primeiros dias de vida do RNPT, pois não estádemonstrada melhora no prognóstico dos re-cém-nascidos submetidos rotineiramente a esseprocedimento. Além disso, nessa fase o RNPT éextremamente vulnerável ao desenvolvimento dahemorragia peri-intraventricular. Em relação àtosse obtida por estimulação direta da fúrcula dorecém-nascido e de lactentes, os efeitos encontra-dos são semelhantes, ocorrendo um rápido eabrupto aumento do fluxo sanguíneo cerebral e dapressão intracraniana, devendo ser empregadosomente em lactentes crônicos e hipersecretivos.

Papel da fisioterapia na extubação/reintubação

O papel da fisioterapia respiratória no períodode periextubação para reduzir a freqüência de

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atelectasia e a necessidade de reintubação foi ava-liado por meio de metanálise42. Somente 3 estu-dos6-8 alcançaram os critérios para inclusão nestaanálise: ensaio clínico prospectivo e randomizadoou quase-randomizado em recém-nascidos sobventilação mecânica em fase de extubação tra-queal. Foram avaliadas as manobras fisioterapêuti-cas: vibração ou tapotagem seguida de aspiração;drenagem postural seguida de aspiração; ausênciade intervenção. Esses estudos mostraram grandevariabilidade tanto nas características dos pacien-tes pesquisados quanto nas técnicas e nas estraté-gias de fisioterapia utilizadas. Entretanto, a análiseconjunta demonstrou que as manobras de higienebrônquica diminuíram a necessidade de reintuba-ção. Além disso, observou-se uma tendência a me-nor índice de atelectasia pós-extubação. Portanto,as manobras avaliadas parecem ser benéficas noperíodo de periextubação. Outro estudo recente,de Bloomfield et al.43, avaliou retrospectivamenteos episódios de atelectasia pós-extubação, comcontrole histórico e não mostrou efeito benéficodas manobras de higiene brônquica.

Conclusão

A análise dos estudos realizados na faixa pe-diátrica e neonatal mostra que a fisioterapia res-piratória está indicada e tem eficácia comprova-da nos casos de hipersecreção brônquica. Nestacondição as manobras de higiene brônquica pa-recem auxiliar na depuração de secreção das viasaéreas, reduzindo, também, os episódios de ate-lectasia pós-extubação. No entanto, as evidên-cias quanto aos efeitos benéficos e adversos dosprocedimentos fisioterapêuticos são limitadas,por amostras pequenas e pouco controladas. Operíodo neonatal parece apresentar contra-indi-cações à fisioterapia respiratória, especialmentenos primeiros dias de vida e nos RNPT.

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FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA EM TERAPIA INTENSIVA PEDIÁTRICA E NEONATAL

Endereço para correspondência:Sra. Carla Marques Nicolau Rua Fidalga, 764Vila MadalenaSão Paulo – SPCep 05432-000E-mail: [email protected]

Recebido para publicação: 10/12/2006Aceito para publicação: 18/4/2007

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