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EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA __ VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE BELO HORIZONTE “É preciso pensar e operar o Direito Sanitário no sentido de concretizar a Constituição Federal, que antes de representar um dado da realidade, vislumbra uma nova ordem que precisa ser construída. Para tanto, ou bem se renovam as categorias, exigência da qual é portadora a própria Constituição, ou se frustrarão todos os objetivos constitucionais.”” (Sebastião Botto de Barros Tojal, in Curso de Extensão em Direito Sanitário para membros do Ministério Público e da Magistratura Federal, Ministério da Saúde, 2002) O Ministério Público do Estado de Minas Gerais, através da Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde desta Comarca, com fundamento nos artigos 1 o , incisos I, III e IV; 5 o , caput e §1 o , 6 o , inciso II; 37, caput e §6 o ; 127, caput; 129, incisos II e III; 196 a 198 e 227, caput e §§ 1 o e 7 o da Constituição Federal, nos artigos 1 o , inciso IV; 5 o , caput ; 11; 12, caput e §1 o ; 19 e 21 da Lei 7347/85, nos artigos 1 o , caput; 25, inciso IV, alínea “a” e 27, incisos I e II da Lei 8625/93, nos artigos 2 o , §§ 1 o , 4 o e 5 o , inciso III; 6 o , inciso I, alínea “d”; 7 o , incisos I, II, IV e XII; 8 o , e 17, incisos II, III, IV e IX da Lei Orgânica da Saúde nº 8080/90, vem ajuizar a presente CAO - SAÚDE Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa da Saúde Av. Augusto de Lima, 1740 – Barro Preto – CEP 30190-003 Telefax: (31) 3295 1127 – e-mail: [email protected]

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA __ VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE BELO HORIZONTE

“É preciso pensar e operar o Direito Sanitário no sentido de concretizar a Constituição Federal, que antes de representar um dado da realidade, vislumbra uma nova ordem que

precisa ser construída. Para tanto, ou bem se renovam as categorias, exigência da qual é portadora a própria Constituição, ou se frustrarão todos os objetivos

constitucionais.”” (Sebastião Botto de Barros Tojal, in Curso de Extensão em Direito Sanitário para membros do Ministério

Público e da Magistratura Federal, Ministério da Saúde, 2002)

O Ministério Público do Estado de Minas Gerais,

através da Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde desta Comarca, com fundamento

nos artigos 1o, incisos I, III e IV; 5o, caput e §1o, 6o, inciso II; 37, caput e §6o; 127, caput;

129, incisos II e III; 196 a 198 e 227, caput e §§ 1o e 7o da Constituição Federal, nos

artigos 1o, inciso IV; 5o, caput ; 11; 12, caput e §1o; 19 e 21 da Lei 7347/85, nos artigos

1o, caput; 25, inciso IV, alínea “a” e 27, incisos I e II da Lei 8625/93, nos artigos 2o, §§

1o, 4o e 5o, inciso III; 6o, inciso I, alínea “d”; 7o, incisos I, II, IV e XII; 8o, e 17, incisos II, III,

IV e IX da Lei Orgânica da Saúde nº 8080/90, vem ajuizar a presente

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AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

em face do Estado de Minas Gerais (Fazenda Pública

do Estado de Minas Gerais), observando-se o rito comum ordinário, que deverá ser

citado na pessoa do Excelentíssimo Senhor Procurador Geral do Estado, na Praça da

Liberdade, s/nº, bairro Funcionários, neste Município e Comarca, pelos fatos e

fundamentos a seguir descritos.

DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO

A Constituição Federal, em seu artigo 129, inciso II,

preceitua que incumbe ao Ministério Público zelar pelo efetivo respeito aos poderes

públicos e aos serviços de relevância pública dos direitos assegurados na mesma

Constituição, promovendo as medidas assecuratórias à sua garantia.

Em duas únicas oportunidades, a Constituição Federal

mencionou a expressão “relevância pública”: no momento acima aduzido – artigo 129,

inciso II, que cuida da legitimidade ministerial - e na conceituação dos serviços e ações

de saúde – artigo 197.

No mesmo diapasão, a Constituição do Estado de

Minas Gerais; a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, em seu artigo 25, inciso

IV, alínea “a” e a Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, em seu

artigo, remetem o Ministério Público à legitimação ativa para o ajuizamento de ação civil

pública para a defesa dos interesses difusos e coletivos indisponíveis.

Corroborando tal entendimento, a Organização Pan-

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americana da Saúde e do Escritório Regional da Organização Mundial de Saúde

concluíram o seguinte:

“O conceito de ações e serviços de relevância pública,

adotado pelo artigo 197 do atual texto constitucional, norma preceptiva, deve ser

entendido desde a verificação de que a Constituição de 1988 adotou como um dos

fundamentos da República a dignidade da pessoa humana. Aplicado às ações e aos

serviços de saúde , o conceito implica o poder de controle, pela sociedade e pelo

Estado, visando zelar pela sua efetiva prestação e por sua qualidade. Ao qualificar as

ações e serviços de saúde como de relevância pública, proclamou a Constituição

Federal sua essencialidade. Por ‘relevância pública’ deve-se entender que o interesse

primário do Estado, nas ações e serviços de saúde, envolve sua essencialidade para a

coletividade, ou seja, sua relevância social. Ademais, enquanto direito de todos e dever

do Estado, as ações e serviços de saúde como conjunto de medidas dirigidas ao

enfrentamento das doenças e suas seqüelas, através da atenção médica preventiva e

curativa, bem como de seus determinantes e condicionantes de ordem econômica e

social. Tem o Ministério Público a função institucional de zelar pelos serviços de

relevância pública, dentre os quais as ações e serviços de saúde, adotando as medidas

necessárias para sua efetiva prestação, inclusive em face de omissão do Poder

Público.” (Série Direito e Saúde nº 1, Brasília, 1994).

Dessa forma, diante dos preceitos constitucionais

aduzidos, deve o Ministério Público, legitimado que está, exigir dos Poderes Públicos e

daqueles que prestam atividades essenciais o efetivo respeito aos direitos assegurados

na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional, sobretudo quando se tratam

de ações e serviços de relevância pública como a que temos em cena.

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DOS FATOS

Desde meados do ano de 2003, o Ministério Público

do Estado de Minas Gerais, através de sua Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde

de Belo Horizonte e de São João Del Rei, tem recebido, freqüentemente, usuários do

Sistema Único de Saúde portadores da DEMÊNCIA DE ALZHEIMER reclamando a

falta de medicamentos (Donepezil, Rivastigmina, e Galantamina) de uso contínuo e

monitorado, cuja dispensação é de competência da Secretaria de Estado da Saúde de

Minas Gerais, motivo pelo qual o parquet instaurou o Inquérito Civil nº 02/2004.

Instada a manifestar-se sobre a situação atual da

dispensação dos referidos medicamentos ante os constantes protestos dos usuários do

SUS, a Secretaria de Estado da Saúde, em primeiro lugar, confirmou que é sua a

competência para distribuição dos medicamentos, que os mesmos constam da relação

de medicamentos excepcionais padronizados pelo Ministério da Saúde para tratamento

da Demência de Alzheimer (Protocolo de Diretrizes Terapêuticas do Ministério da

Saúde - Portaria SAS / MS nº 843, de 31 de outubro de 2002) e que a dispensação não

tem sido feita na forma devida. Em seguida, afirmou que os medicamentos

Rivastigmina e Donepezil estavam em processo de aquisição, nada informando sobre

o medicamento Galantamina.

O citado processo de aquisição dos medicamentos

começou, segundo os próprios comunicados da Secretaria de Estado da Saúde, em 05

de junho de 2003 e, até o presente momento – 29 de março de 2004, ainda não foi

finalizado.

Na defesa da saúde pública e da lei, a Promotoria de

Justiça de Defesa da Saúde, vale citar, vem, pois, desde o primeiro protesto, oficiando

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ao órgão administrativo competente para que, cumprindo os atos de sua competência

legal, providencie os medicamentos supracitados, mas não logrou êxito o parquet.

Assim, temos que, até o momento, o acesso aos

medicamentos supracitados não foi, regular e adequadamente, garantido aos usuários

do SUS que dele dependem, levando-os a declínios cognitvos e funcionais

irreversíveis, que poderiam ser evitados pelo uso dos medicamentos, e ao aumento da

sobrecarga familiar no cuidado com os pacientes portadores de demência de

Alzheimer.

É importante ressaltar que, em estudo realizado pelo

Dr. Alexandre Resende Fraga, médico dos quadros de técnicos concursados do

Ministério Público, concluiu-se que os três medicamentos (Eranz – Donepezil - , Rivastigmina – Exelon - e Galantamina - Reminyl) devem ser fornecidos em

cumprimento da Portaria SAS/MS nº843, de 31 de outubro de 2002, pois a Demência

de Alzheimer, que provoca deterioração de funções cognitivas (linguagem, percepção,

outras) com perda gradual de autonomia nos indivíduos por ela afetados, é incurável,

porém tratável. E fundamental, dentre as formas de tratamento que conhecemos, é a

intervenção médica via tratamento farmacológico, que produz acentuada e

importantíssima melhora dos sintomas psicológicos e do comportamento retardando,

no mínimo em 6 meses por ano, o desenvolvimento maléfico da Demência de

Alzheimer.

Importante, também, é ressaltar que, dentre os três

medicamentos disponíveis para tratamento, apenas um deles será indicado para cada

paciente de acordo com seus níveis próprios de tolerância e melhora. Não é permitida

a associação entre eles, e cada paciente deve ser monitorado periodicamente a fim de

que se avalie o benefício, a tolerância, a necessidade de continuidade do tratamento e

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a possibilidade de substituição de um dos medicamentos pelo outro em caso de

intolerância. Logo, é pacífico que os três medicamentos devem ter o acesso garantido

para que a universalidade dos portadores da Demência de Alzheimer possam

submeter-se ao tratamento devido e às possibilidades dignas de melhora possível.

Vale ainda dizer que, os referidos medicamentos, há

mais de 205 dias não são devidamente fornecidos pela Secretaria Estadual de Saúde.

Por todo o exposto, conclui-se o seguinte:

1 – O regular e devido tratamento farmacológico da

Demência de Alzheimer contribui para significativa melhora cognitiva e comportamental

dos portadores do mal, reduzindo o impacto social da Demência em diversos contextos

e, efetivamente, representa, neste caso, o direito à saúde garantido na Constituição de

1988.

2 – O paciente que se submete ao tratamento

farmacológico deve utilizar o medicamento prescrito ao seu caso diariamente, e deve

ser reavaliado periodicamente a fim de que se possa avaliar o benefício, a tolerância à

droga, e a necessidade de continuidade do tratamento. Se o paciente não tem o acesso

devido ao medicamento, todo o tratamento e toda a possível melhoria nas condições

cognitivas e comportamentais do paciente ficam prejudicadas. Isto, além de onerar os

cofres públicos com a constante necessidade de se reiniciar tratamentos interrompidos

por falta de medicamentos, em última e mais importante instância, gera incalculáveis

danos aos já sofridos portadores da Demência de Alzheimer e aos, não menos, sofridos

familiares dos mesmos, que vêm esvair-se as chances de melhora e prorrogação de

vida e saúde frente ao cabal descumprimento de preceito fundamental estabelecido na

Constituição de 1988.

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3 – É da competência do Estado, através do Gestor

Estadual de Saúde, a coordenação e execução da assistência farmacêutica aos

pacientes com Demência de Alzheimer, assim como definido pela política nacional de

medicamentos. Mas o mesmo não tem atuado em conformidade com suas obrigações.

4 – Inclui-se na execução da assistência farmacêutica

o controle de estoque de forma a garantir a continuidade da terapia tal qual

estabelecido no Protocolo de Diretrizes Terapêuticas do Ministério da Saúde.

DOS FUNDAMENTOS DO DIREITO

A partir dos fatos expostos, temos, prima facie, que o

artigo 6o da Constituição Federal reconheceu à saúde o status de direito social

fundamental, atribuindo à União, aos Estados e aos Municípios a competência para

cuidar da saúde e assistência pública (artigo 23, II).

É assegurado ainda no artigo 196 que a saúde é

direito de todos e dever do Estado, sendo certo que tal direito há que ser prestado de

forma integral e, para tanto, as ações e serviços de saúde devem promovê-la, protegê-

la e recuperá-la.

A Lei Orgânica da Saúde (Lei 8080/90) ainda

estabelece que a saúde é um direito fundamental, devendo o Estado prover o

necessário à plenitude deste direito, inclusive a assistência farmacêutica.

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DA ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA INTEGRAL

Relevante é ressaltar que, além de todos os princípios

constitucionais sobre a saúde (artigos 196 e seguintes e, especificamente o Art. 198, II,

estabelecendo como diretriz o atendimento integral, com prioridade para as atividades

preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais), existem regras legais a amparar

especificamente a assistência farmacêutica integral.

De fato, o art. 6°. , I, “c”, constante do capítulo “Dos

Objetivo e Atribuições” do SUS - Lei Federal nº 8080/90, estabelece que a assistência

terapêutica integral, inclusive farmacêutica, está incluída no campo de atuação do

Sistema Único de Saúde.

A assistência farmacêutica, contida expressamente na

Lei Orgânica da Saúde, é tratada pelo Ministério da Saúde através da Portaria nº 3916,

de 30 de outubro de 1998, que define publicamente os programas, orientações,

formulações políticas e administrativas acerca da estratégia geral, bem como aponta as

competências para atuação nos três níveis de governo.

É sabido que a política nacional de medicamentos é

parte essencial da política nacional de saúde, garantindo a necessária segurança,

eficácia e qualidade dos medicamentos, a promoção do uso racional e o acesso da

população.

A assistência farmacêutica no SUS envolve as

atividades de seleção, programação, aquisição, armazenamento e distribuição, adoção

da relação de medicamentos essenciais (RENAME), regulamentação sanitária de

medicamentos, reorientação da assistência farmacêutica, desenvolvimento científico e

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tecnológico, promoção da produção de medicamentos, desenvolvimento e capacitação

de recursos humanos, controle da qualidade e utilização – nesta compreendida a

prescrição e a dispensação – o que deverá favorecer a permanente disponibilidade dos

produtos selecionados com base em critérios epidemiológicos.

Neste diapasão, caberá ao gestor estadual, entre

outras responsabilidades, coordenar e executar a assistência farmacêutica no seu

âmbito, definida pela Portaria MS nº 1318/02.

Os medicamentos elencados na referida Portaria são

conhecidos como excepcionais, de alto valor unitário ou que por cronicidade do

tratamento se tornam excessivamente caros para serem suportados pelos usuários.

Utilizados no nível ambulatorial, a maioria deles é de uso crônico e parte deles integra

tratamentos por toda a vida.

O Programa de Medicamentos Excepcionais existe

desde 1993 mas, a partir de 1997, houve incremento da lista, mas sua dispensação

persistia irregular e inconstante nas Secretarias Estaduais de Saúde. Todavia, a partir

de 2002, o Programa de Medicamentos Excepcionais foi remodelado pelo Ministério da

Saúde e recebeu o aporte de R$ 483.000.000,00 e, neste ano de 2004, a previsão

orçamentária supera o valor de R$ 590.000.000,00. Em termos operacionais, os recursos financeiros para a aquisição dos Medicamentos Excepcionais são transferidos pelo Ministério da Saúde aos Estados todos os meses e de forma antecipada. Os Estados planejam a aquisição a partir das necessidades, adquirem e controlam a distribuição e os estoques.

Finalmente, após três anos de preparo, de forma

valiosa e audaciosa, do ponto de vista técnico, o Ministério da Saúde lançou a obra

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“Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas” para os medicamentos excepcionais, um

manual colocado à disposição dos gestores do SUS e profissionais relacionados à

saúde que traçam o planejamento desde o diagnóstico até o tratamento das doenças,

passando por conceitos, aspectos epidemiológicos, potenciais complicações e morbi-

mortalidade associada à doença, detalhando todo o tratamento.

Neste ponto, vale ressaltar que o direito dos usuários

e pacientes do SUS de receberem medicamentos que lhes forem regularmente

prescritos é inafastável. Deriva de preceito constitucional e, como tal, não concretiza-se

com a abstenção estatal, mas, pelo contrário, com o estabelecimento e efetivação das

políticas públicas, que, no caso, existe e deve ser concretizada em todos os casos

pertencentes ao âmbito de sua matéria.

DA AUTO-APLICABILIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS CONCERNENTES À

SAÚDE COMO DIREITO PÚBLICO SUBJETIVO E DIREITO FUNDAMENTAL

Faz-se necessário afirmar que a Constituição de 1998

possui características tais que a filiam ao Estado Democrático de Direito (Art. 1º da CF).

Assim, possuem os direitos fundamentais – dentre eles a saúde como será demostrado

– evidente caráter vinculativo em relação ao legislador, ao poder público, aos órgãos

administrativos, ao Poder Executivo, aos Juízes, aos Tribunais, e, também, no âmbito

das relações jurídico-privadas (Sarvelt, Ingo Wolfgang – A Eficácia do Direitos

Fundamentais, Porto Alegre: Livr. Do Advog. Ed., 1998, 386p.).

A Constituição Federal, neste aspecto, reclama

eficácia, estando, pois, o Estado juridicamente obrigado a exercer as ações e serviços

de saúde e que estes sejam seguros.

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Também o art. 25 da Declaração Universal do Direitos

do Homem (ONU) subscrita pelo Brasil , reconhece a saúde como direito fundamental

ao asseverar que ela é condição necessária à vida digna.

Já que é fundamental ao homem o direito à saúde, ele

é auto-aplicável, conforme expressa previsão do Art. 5º., Parágrafo 1º, da CF: “ As

normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”. Tal

dispositivo em conjunto com o princípio da inafastabilidade do controle judiciário (Art. 5º

XXXV, da CF/88) obriga o Poder Judiciário a manifestar-se sobre o caso que lhe for

apresentado.

O direito à saúde, pois, é um direito público subjetivo

obviamente oponível contra o Estado, podendo sua tutela ser realizada judicialmente.

Disso não discorda o Supremo Tribunal Federal: “o direito público subjetivo à saúde

representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas

pela própria Constituição da República (art. 196)” (Recurso Extraordinário 271.286/RS,

Relator Ministro Celso de Mello, Informativo STF n. 210, de 22/11/2000, p.3).

Interessante também trazer à colocação (EMI nº

598526481, Quarto Grupo de Câmaras Cíveis, TJRS, Relator: Desembargador Luiz

Felipe Brasil Santos, Julgado em 11/06/1999): “EMBARGOS INFRINGENTES.

DIREITO SUBJETIVO À PRESTAÇÃO DETERMINADA NO ÂMBITO DA SAÚDE .

Auto-Aplicabilidade do art. 196, da CF, que assegura o direito à saúde, reconhecendo ,

em decorrência, a caracterização do direito subjetivo a determinada prestação nessa

área, sempre que, no exame do caso concreto, exsurgir a evidência de que se encontra

em jogo o valor básico e maior da preservação da vida humana, pressuposto de todo e

qualquer direito. Desacolheram os embargos”.

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Restasse alguma dúvida sobre ser a saúde um direito

fundamental do homem, bastaria a simples leitura do disposto no Art. 2º da Lei Federal

nº 8080/90:

“ A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as

condições indispensáveis ao seu pleno exercício”.

Claramente, pois, além de poder ser catalogado como

social, o direito à saúde também é fundamental do ser humano e público subjetivo, isto

é, auto-aplicável e que pode ser defendido em juízo.

Assim, ressalte-se, os dispositivos constitucionais

ligados à saúde – direito social conforme o art. 6º da Constituição – não se constituem

em meras normas programáticas, não significam promessas de atuação estatal. Têm,

por outro lado, eficácia imediata. Segundo José Afonso da Silva os Direitos Sociais,

como dimensão dos direitos fundamentais do homem, são prestação positivas do

Estado, enunciadas na Carta Magna e que possibilitam melhores condições de vida aos

mais fracos, direitos que tendem a realizar a equiparação das situações sociais

desiguais. A saúde encontra-se em tal contexto.

De tanta relevância é, que vários diplomas legais

estabelecem princípios e normas que devem ser observados, e a presente ação visa

resguardar a eficácia de tais princípios e mandamentos tão correntemente ameaçados

pela ordem econômica, pelo exercício privado do poder público e pela inércia estatal

em concretizar e proteger os bens fundamentais de uma sociedade que se pretende

civilizada, como a saúde pública, por exemplo.

Cabe uma palavra sobre o orçamento do Estado para

o ano de 2004. Como é sabido, a Emenda Constitucional nº 29/00 garantiu o custeio da

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saúde, pelo que é obrigatória a aplicação de percentuais sobre o produto da

arrecadação de determinados impostos e de outros recursos pelos três entes da

federação. É público e notório o descumprimento por parte do Estado de Minas Gerais

da Emenda Constitucional aludida, sendo certo que do orçamento previsto para as

ações e serviços de saúde, apenas a metade do orçamento tem sido comprometido.

DO CONFRONTO ENTRE OS FATOS E O DIREITO

In casu, a Demência de Alzheimer é tratada pela

Portaria SAS/Ministério da Saúde nº 842, de 31 outubro de 2002, que contemplou o

Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para o tratamento da demência. Tal

Protocolo evidencia a necessidade do uso dos medicamentos, os riscos, os critérios de

inclusão e exclusão nos tratamentos.

A competência legal para dispensação dos devidos

medicamentos é da Secretaria de Saúde do Estado de Minas Gerais, tal qual definido

nos diplomas legais já citados e na Portaria GM nº1318, de 23 de julho de 2002.

Portanto, fornecer os medicamentos em questão para

todos os pacientes do “SUS” que deles necessitar mediante a apresentação do

competente receituário médico, em quantidade e qualidade que lhes garanta

atendimento integral, permanente, respeitando prioritariamente o direito à vida e à

saúde, é obrigação do Estado de Minas Gerais.

Uma vez que o Estado - Membro não tem, como

relatado, cumprido com sua competência legal, erige-se a necessidade de clamar

perante ao Estado - Juiz que, por meio de efetiva e tempestiva tutela jurisdicional,

obrigue o poder público a atender e respeitar o preceito fundamental covardemente

atacado.CAO - SAÚDE

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Não adianta garantir a esses pacientes um tratamento

limitado, insuficiente, que abreviará sua vida ou causará danos à saúde, pois essa

postura omissa desobedece a diretriz da “resolutividade”. “Meio-tratamento” não é

tratamento integral.

De que adianta fornecer tratamento inferior, se o

tratamento que funciona é, justamente, o integral (devido e regular conforme os

preceitos terapêuticos)? O tratamento limitado só onera os cofres públicos de forma

desnecessária e lesa incalculavelmente o bem jurídico Saúde Pública.

Outras conclusões jurídicas importantes:

a) a situação ilegal descrita no item “Dos fatos” não

pode ser justificada sob o argumento da discricionariedade administrativa. Este

princípio, criado para garantir a agilidade na administração da coisa pública, com vistas

ao interesse público, não pode ser de justificativa para a omissão ilegal, violadora da

Lei e dos princípios da Administração Pública, previstos no artigo 37 da CF. Não tem a

pessoa jurídica de direito público estadual o poder de decidir, em última análise, sobre

onde e como negará ao cidadão direitos públicos subjetivos fundamentais.

b) não se pode concluir que estamos tratando de

matéria sujeita à discricionariedade administrativa. Esse poder não pode servir como

funcionamento para decidir sobre a vida ou morte de doentes. É preciso atentar para a

seguinte conclusão, única possível diante da Lei: não prestar o atendimento integral,

garantido pelas leis e Constituição, significa simplesmente descumprir a lei e a

Constituição, proporcionando sérios riscos à vida dos usuários de saúde.

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d) não se está, aqui, estabelecendo prioridade na

atuação da administração pública, colocando-se na posição do Poder Executivo

Estadual. A fixação de prioridades de governo é ampliação acobertada pela Lei, desde

que, na sua execução, não se deixe direitos fundamentais e indisponíveis ao

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desamparo da atuação Estatal. Mesmo na área dos direitos sociais, como a saúde,

pode-se estabelecer prioridades, no exercício da discricionariedade. Todavia, sua

efetivação não pode ensejar situações ilegais e o respeito à Lei é dever fundamental

de qualquer esfera de governo.

e) não há que se falar em limites orçamentários ou

em observância da Lei de Responsabilidade Fiscal, como desculpas para a

manutenção da situação ilegal narrada nesta inicial. A sociedade, a população, os

cidadãos têm direitos extraídos do ordenamento jurídico em vigor, identificados em

normas jurídicas auto-aplicáveis. Submetê-los ao saldo do “caixa” do Poder Público, de

qualquer esfera, significaria, na verdade, negá-los. Note-se que a legislação antes

transcrita não sujeita o direito do cidadão, do paciente portador de Demência de

Alzheimer que necessita de assistência farmacêutica, em nenhuma passagem, ao

“saldo bancário” da Administração. O Legislador, sábio, percebeu que, assim não fosse,

tais direitos seriam sempre negados sob a desculpas da falta de dinheiro, o que

dificilmente poderia ser posto em dúvida, pois a ninguém é dado conhecer exatamente

e com a necessária rapidez as minúcias do movimento financeiro de qualquer pessoa

jurídica de direito público interno. Por outro lado, antes das “Responsabilidades Fiscais”

há a “Responsabilidade Social”, muito mais importante – quer nos direitos

hierarquicamente superiores que ampara, quer nas consequências legais àqueles que

a desrespeitam.

E não se pode ignorar, que nenhum administrador

público seria alcançado pelas penalidades previstas na “Lei de Responsabilidade

Fiscal” se demonstrasse estar agindo em defesa da vida, no cumprimento da Lei e de

Decisão Judicial.

Sobre a questão, em casos semelhantes, já se

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manifestaram os Tribunais:

“...o Judiciário não desconhece o rigorismo da Constituição

ao vedar a realização de despesas pelos órgãos públicos além daqueles em que há

previsão orçamentária; este Poder, todavia, sempre consciente de sua importância

como integrante de um dos Poderes do Estado, como pacificador dos conflitos sociais e

defensor da Justiça e do bem comum, tem agido com maior justeza optando pela

defesa do bem maior, veementemente defendido pela Constituição – A VIDA –

interpretando a lei de acordo com as necessidades sociais imediatas que ela se propõe

a satisfazer” (Apel.. Cível nº 98.006204-7, Santa Catarina, Rel. Nilton Macedo

Machado, 08/09/98).

Mais adiante, nessa mesma Decisão:

“... Sendo a saúde direito e dever do Estado (CF, art.

196, CE, art. 153), torna-se o cidadão credor desse benefício, ainda que não haja

serviço oficial ou particular no País para o tratamento reclamado. A existência de

previsão orçamentária própria é irrelevante, não servindo tal pretexto como escusa,

uma vez que o executivo pode socorre-se de créditos adicionais. A vida, dom maior,

não tem preço, mesmo para um sociedade que perdeu o sentido da solidariedade, num

mundo marcado pelo egoísmo, hedonista e insensível. Contudo, o reconhecimento do

direito à sua manutenção (...) não tem balizamento caritativo, posto que carrega em si

mesmo, o seio da legitimidade constitucional e está ancorado em legislação obediente

àquele comando.” (TJSP, Des. Xavier Vieira, Agravo de Instr. nº 96.012721-6).

“A respeito, cabe ver que a Portaria nº 21 de 21.03.95,

do Ministério da Saúde, já recomendava a utilização da combinação de novos

medicamentos com o então conhecido AZT, de modo que, somente atribuível à incúria

da Administração não ter ela já licitada, - inclusive com previsão orçamentaria – de

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modo a permitir, de modo continuado, o fornecimento de tais medicamentos aos dele

necessitados, em quantidades adequadas. Portanto, não socorre a agravante o

argumento de necessidade de licitação prévia ou previsão orçamentária, muito menos

cabe-lhe colocar em dúvida a eficácia dos remédios em questão, os quais, aliás, são

sempre receitados pelos médicos.” (Agravo de Instrumento nº 82.036-5, 8ª Câm. Dir.

Público do TJSP, Rel. José Santana).

Como se percebe, mostra-se irrelevante a eventual

falta de prévia dotação orçamentária prevendo o atendimento integral dos pacientes do

SUS, ou seja, o cumprimento da Lei. Consoante enfatiza com lucidez João Angélico

(Contabilidade Pública, Ed. Atlas, pág 35): “durante a execução orçamentária, o Poder

Executivo pode solicitar ao Legislativo, e este conceder, novos créditos orçamentários.

Eles serão adicionados aos créditos que integram o orçamento em vigor. Por essa

razão denominam-se créditos adicionais. Os créditos adicionais aumentam a despesa

pública do exercício, já fixada no orçamento.”

Por fim, vale transcrever parte da obra de Germano

Schwartz (Direito à Saúde – Efetivação em uma Perspectiva Sistêmica , pág. 80/81, Ed.

Livraria do Advogado):

“Não é por falta de aporte financeiro que o Estado

poderá se eximir de seu dever. A saúde reclama prestação sanitária tão-somente.

Sarlet (1998), a respeito da negação das prestações sanitárias com base na ausência

de recursos e da incompetência dos órgãos judiciários para decidirem sobre a alocação

e destinação de recursos públicos, não nos parece que esta solução possa prevalecer,

ainda mais na hipótese em que está em jogo a preservação da vida humana (p. 298)”.

Ora, a hipótese de não-existência de previsão

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orçamentária não pode ser alegada pelo Estado, até porque não se pode antever com

eficácia as necessidades da população, ou ainda, de outra banda, não se pode

favorecer a omissão do ente responsável, premiando-o por sua negligência e/ou

inércia. Ao se referir ao Sistema Único de Saúde e à sistemática sanitária brasileira

instalada pela CF/88, Cláudio Barros Silva (1995) se posiciona expressamente quanto à

impossibilidade de condicionamento para o exercício do direito à saúde: “ Como

consequência do sistema o acesso à assistência, à saúde, passou a ser universal e

igualitário, não havendo, por ser direito subjetivo do cidadão, qualquer condicionamento

ao exercício. O papel do Estado é garantir a satisfação desse direito público

subjetivo” (p. 100) .

O Supremo Tribunal Federal – STF, em acórdão no

autos do Agravo Regimental em Agravo de Instrumento nº 238.328-0 (julgado em

16/11/99), no voto do Relator Ministro Marco Aurélio, quando provocado a se

pronunciar sobre a matéria, afirmou que “a falta de dispositivo legal para o custeio e

distribuição de remédios para AIDS não impede que fique comprovada a

responsabilidade do Estado, pois decreto visando-a não poderá reduzir, em si, o direito

assegurado em lei. E, esclareça-se desde já, com base no art. 23 da CF/88, que o

cidadão pode demandar contra qualquer dos entes federados na busca da proteção de

saúde: SAÚDE PÚBLICA. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS POR

ENTIDADE PÚBLICA MUNICIPAL PARTICIPANTE DO SUS. CONCESSÃO DE

TUTELA ANTECIPADA EM PLEITO ORDINÁRIO. DIREITO À VIDA. DEVER COMUM

DOS ENTES FEDERADOS. ARTS. 196 E 198 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

PRECEDENTES PRETORIANOS . AUSÊNCIA DE PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA QUE

NÃO PODE PENALIZAR O CIDADÃO. AGRAVO NÃO PROVIDO. DECISÃO

CONFIRMADA. As entidades federativas têm o dever ao cuidado da saúde e da

assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadores de deficiência de

saúde, a teor do disposto no art. 23 da Constituição Federal. Assim, não se pode

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prestar à fuga de responsabilidade a mera argüição de violação ao princípio do

orçamento e das normas de realização de despesa pública, quando verificado que o

Estado, na condição de instituição de tributo especial dirigido a suplementar verbas da

saúde, não o faz com competência devida. (Agravo de Instr. nº 1999.002.12096, 9ª

Câm. Cível, TJRJ, Rel. : Des. Marcus Tullius Alves, Julgado em 02/05/2000)”.

Sobre as razões de Estado para não fazer valer os

direitos públicos subjetivos em questão é interessante referir que decidiu o Pretório

Excelso: “ É preciso advertir que as razões de Estado – quando invocadas como

argumento de sustentação da pretensão jurídica do Poder Público ou de qualquer outra

instituição – representam expressão de um perigoso ensaio destinado a submeter, à

vontade do Príncipe que é intolerável), a autoridade hierárquico-normativo da própria

Constituição da República, comprometendo, desse modo, a idéia de que o exercício do

poder estatal, quando praticado sob a égide de um regime democrático, está

permanentemente exposto ao controle social dos cidadãos e à fiscalização jurídica

constitucional”. (Ag. Reg. em Agravo de Instrumento n. 236.546, relator Ministro Celso

de Mello, Revista de Direito Administrativo, out./dez. de 1999, vol. 218, Edit. Renovar-

FGV, pág. 222).

Aliás, o Supremo Tribunal Federal, reiteradas vezes,

repeliu argumento de ordem política por entender que a alegação das razões do Estado

– além de não se legitimar como fundamento idôneo de impugnação judicial –

representaria, por efeito das gravíssimas consequências provocadas por seu eventual

reconhecimento, uma ameaça inadmissível às liberdades públicas, à supremacia da

ordem constitucional e aos valores democráticos que a informam, culminando por

introduzir, no sistema de direito positivo, um preocupante fator de ruptura e

desestabilização ( vide RTJ – 164/1145-1145, Rel. Ministério Público, Celso de Mello).

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DO PEDIDO

Diante de todo o exposto, o Ministério Público de

Minas Gerais pede que seja julgado procedente o pedido para:

1. Condenar o Estado de Minas Gerais (Fazenda

Pública de Minas Gerais) a efetivar, no prazo

máximo de 15 (quinze dias), o fornecimento dos

medicamentos Donepezil (Eranz), e Galantamina (Reminyl), conforme prescrição médica indicando

a utilização de tal medicamento, para pacientes do

Sistema Único de Saúde portadores da Demência

de Alzheimer, presentes e futuros, de todo o

Estado de Minas Gerais, prosseguindo-se o

fornecimento enquanto perdurar a prescrição

médica, sob pena de, nos termos do art. 11 da Lei

n° 7.347/95, pagamento de multa no valor de um

mil reais por dia de atraso no fornecimento em

relação a cada paciente, do medicamento referido,

quantia que deverá ser revertida para o fundo de

reconstituição dos interesses metaindividuais

lesados, criado pelo art. 13 daquela Lei, sem

prejuízo de outras providências tendentes ao

cumprimento da ordem judicial. Aqui, vale ressaltar

que o medicamento Rivastigmina já teve,

recentemente, garantido o seu fornecimento pela

digna e honrada Justiça de Primeira Instância

desta Comarca via medida liminar provocada pelo

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Ministério Público.

E requer, o parquet, a citação do ESTADO DE MINAS

GERAIS ( FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DE MINAS GERAIS), na pessoa do

Excelentíssimo Procurador-Geral do Estado para, querendo, contestar no prazo legal a

presente ação, sob pena de suportar os efeitos da revelia.

DO PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

A assistência e o atendimento de saúde, por

guardarem estreita relação com a manutenção da vida humana, são sempre relevantes

e urgentes. E diante da urgência reclamada pela espécie, requer-se a concessão

liminar da antecipação dos efeitos da tutela pretendida, nos termos do disposto nos

artigos 273, inciso I, e 461 do Código de Processo Civil.

O acolhimento liminar dos efeitos da tutela urge e

impera, porquanto o provimento da pretensão, somente ao final, poderá ser inócuo para

prevenir os danos à saúde de vários portadores da Demência de Alzheimer.

O uso dos citados, e nesta reclamados, medicamentos

deve ser regular e monitorado. A falha na dispensação dos medicamentos acarreta falta

de freqüência no uso e no monitoramento dos mesmos, o que, por sua vez, lesa os

cofre públicos, uma vez que fica reiterada a necessidade de se reiniciar tratamentos

que já deveriam estar em estágios avançados de acompanhamento e intervenção. Mas,

principalmente, a inobservância do aludido preceito fundamental contribui para abreviar

a vida dos portadores do mal e para a ocorrência de irremediáveis e progressivos

danos em suas funções cognitivas.

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Ocorre, pois, que a atual postura estatal face os

portadores da Demência de Alzheimer, vem causando e tende a causar, a cada

segundo que passa, danos irreversíveis a diversos deles, que, além da demência, têm

que suportar do Estado, ao qual pagam os seus tributos regularmente, tratamento

indigno de cidadãos e pessoas humanas, o que, por sua vez, fere, de forma

contundente, os princípios mais básicos do que entendemos ser o Estado Democrático

de Direito.

A aludida situação ainda contribui para a ocorrência

diversos e graves impactos sociais nas famílias dos portadores do referido mal, pois os

mesmos ficam sobrecarregados no cuidado com os pacientes, que, se estivessem

fazendo uso regular dos medicamentos, estariam em condições sensivelmente

melhores.

Em suma, os portadores da Demência de Alzheimer,

há muito vem suportando um injustificado sofrimento devido à omissão do Poder

Público Estadual, que lhes nega o atendimento integral e devido a que fazem jus por

força de Lei. Não é possível aquilatar o alcance dos danos à saúde da população,

podendo ser afirmado, porém, que eles são grandiosos, dramáticos, presentes e

contínuos, os quais devem ser rapidamente afastados pelo Poder Judiciário.

E ainda temos que a medida liminar que aqui se pede,

visa proteger, também, aos futuros portadores da demência, que, infelizmente, tendem

a aumentar, já que contamos em nossa população com um número cada vez maior de

pessoas com mais de 60 anos (idade com maior probabilidade de início de

desenvolvimento do mal). Será muito mais eficaz no combate à terrível demência, o

tratamento regular e devido realizado quando das primeiras manifestações do mal.

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Relevante é o fundamento da lide, pois pretende-se,

em última análise, a manutenção da vida, da saúde de milhares de pessoas neste

Estado e a eliminação do atual estado de perigo à saúde e à vida.

Presentes estão, tendo em vista tudo que foi

demonstrado nos documentos inclusos do inquérito civil, a verossimilhança das

alegações combinada à prova inequívoca e o “ periculum in mora”.

Vale dizer que o prazo estabelecido no pedido, para

cumprimento da obrigação de dar, não deve iludir o julgado quanto ao perigo da

demora. É facilmente perceptível que as providências reclamadas nesta inicial não se

resolvem da noite para o dia. A administração pública estadual terá de quantificar e

redimencionar a demanda desses medicamentos, para a aquisição racional deles.

Talvez necessite adquiri-los emergentes num primeiro momento e, depois, mediante

procedimentos licitatórios.

Todavia, é perfeitamente justificado o receio de

ineficácia do provimento final, caso a Administração não seja obrigada, desde já, a

tomar as providências que ensejarão a observância da ordem judicial no prazo

estabelecido na respectiva decisão. Esta a razão da necessidade da concessão liminar

dos efeitos da tutela pleiteada. Há risco à vida e à saúde dos portadores da Demência

de Alzheimer, facilmente evitável se o Poder Público Estadual for compelido a atuar

desde agora, com tempo razoável para alcançar o resultado consubstanciado no pedido

desta ação civil pública.

Protesta-se pela produção de provas, por todos os

meios admitidos em direito, sobretudo pela juntada de novos documentos e perícias,

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além de oitiva de testemunho e peritos, caso se faça necessário.

Dá-se à causa o valor de R$1,00 (um real), ainda que

inestimável o objeto tutelado.

Belo Horizonte, 30 de março de 2004.

____________________________________Josely Ramos PontesPromotora de Justiça

_________________________________

Fernando Cézar Carrusca VieiraEstagiário do Ministério Público

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