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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁSPromotoria de Justiça de São Miguel do Araguaia
ACP - SANEAGO - SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA - HidrômetroACP -ilegalidade cobrança taxa instalação/manutenção/conservação hidrômetro
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA/GO
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS,
por intermédio do Promotor de Justiça que esta subscreve, com
amparo nos artigos 37, caput, § 4º e 129, inciso III, ambos da
Constituição Federal; no artigo 25, inciso IV, alínea “b”, da Lei nº.
8625/93; e, na Lei nº 7347/85, ajuíza a presente AÇÃO CIVIL
PÚBLICA, COM PEDIDO LIMINAR em face da SANEAMENTO DE GOIÁS S/A -
SANEAGO, CNPJ n.° 01616929/0001-02, Sociedade de Economia
Mista constituída da Lei Estadual 6680/67, que deverá ser citada na
pessoa do seu Diretor-Presidente NICOMEDES DOMINGOS
BORGES, na Avenida José Sebba, n.° 1.245, Jardim Goiás,
Goiânia/GO, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas:
I) SÍNTESE DOS FATOS
Em virtude de diversos cidadãos terem procurado esta
Promotoria de Justiça relatando que a SANEAGO, ora ré, estaria
cobrando a instalação de hidrômetros junto aos consumidores do
Município de São Miguel do Araguaia, o que, a primeira vista,
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representa violação ao Código de Defesa do Consumidor, fez com
que este presentante oficiasse a empresa na busca de
esclarecimentos.
Em resposta a requisição formulada, no parecer n.°
107/2007, aduz a Procuradora Simone da Cunha Vilela que:
“O artigo 38 da Lei n° 14.939/2004, que instituiu o
Marco Regulatório da Prestação de Serviços de Abastecimento de
Água e Esgotamento Sanitário, prescreve que são direitos dos
prestadores dos serviços:
(...)
IV – cobrar tarifas pelos serviços prestados, nos termos
estabelecidos nesta Lei e nos contratos e instrumentos jurídicos
equivalentes, assim como outros preços previstos;
V – cobrar, além das tarifas, outros serviços e/ou
procedimentos efetivamente prestados aos usuários.
(grifo nosso)
Conforme dispositivos legais transcritos neste parecer,
os prestadores dos serviços têm o direito, de cobrar, além das
tarifas, outros serviços e/ou procedimentos prestados aos clientes.”
Além disso, a procuradora mencionada justificou a
cobrança da instalação hidrômetro transcrevendo o artigo 20, da
Resolução 289/2003 da AGR e o artigo 55, da Lei 14.939/2004, que
abaixo também transcrevemos:
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Art. 20, da Resolução 289/2003 – Para que as
solicitações de ligações definitivas possam ser atendidas,
o interessado deverá preparar as instalações de acordo
com os padrões da SANEAGO e efetuar o pagamento das
despesas decorrentes da ligação e, nos casos especiais,
autorização do órgão competente.
Art. 55, da Lei 14.939/2004 (Lei Estadual) – Para
atender aos usuários que não têm capacidade econômica
de pagar integralmente os custos dos serviços ou para
aqueles locais nos quais, em razão dos elevados custos
da prestação ou baixa capacidade de pagamento do
conjunto dos usuários, seja inviável a recuperação total
dos custos, o Poder Público instituirá mecanismos e
fontes de subsídios ou subvenções ao consumo ou para
investimentos.
Analisando as informações e a documentação acostada,
foi instaurado o Procedimento Preparatório para Inquérito Civil
Público para apurar a legalidade da cobrança da instalação de
hidrômetro, ocasião em que entendeu este presentante, nas
conclusões do presente inquérito, serem insuficientes os argumentos
utilizados pela ré para autorizar a cobrança da instalação de
hidrômetro e, por isso, ajuíza a presente Ação Civil Pública.
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II – FUNDAMENTOS JURÍDICOS
II. A) AÇÃO CIVIL PÚBLICA DEFESA DO CONSUMIDOR – NOÇÕES GERAIS – LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO
A Ação Civil Pública, ex vi do disposto no artigo 1º da
Lei nº 7347/85, como fator de mobilização social, é a via processual
adequada para impedir a ocorrência ou reprimir danos ao patrimônio
público, ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de
valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico,
protegendo, assim, os interesses difusos, coletivos e individuais
homogêneos da sociedade, sendo que, diante de sua magnitude e
excelência, mereceu assento constitucional, como se extrai do artigo
129, inciso III, da Constituição da República Federativa brasileira.
Não restam dúvidas, portanto, de que o dano aos
consumidores é um interesse de dimensão difusa, o que autoriza
sua tutela processual por intermédio da ação civil pública.
Nesse contexto, em razão de sua destacada atuação,
desde 1985, no ajuizamento de ações civis públicas, o MINISTÉRIO
PÚBLICO aparece, hoje, como autêntico representante da sociedade
brasileira na defesa de seus interesses transindividuais, dentre eles
o de conservar o de proteger os consumidores.
Por isso, a Constituição Federal, através de seu artigo
127 c/c os artigos 1° e 5° da Lei 7.347, consagraram
definitivamente a legitimidade ativa do MINISTÉRIO PÚBLICO para a
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defesa de interesses transindividuais, sejam eles coletivos, difusos
ou, ainda, os tidos por direitos ou interesses individuais homogêneos
tratados coletivamente.
Com essa linha de entendimento, farta é a
jurisprudência proveniente dos Tribunais, inclusive do SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL e SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
reconhecendo a legitimidade ativa do MINISTÉRIO PÚBLICO para
interpor ações de civis publicas com o fito de defender os direitos
difusos, coletivos e individuais homogêneos dos consumidores. A
propósito, veja-se:
(STF-014693) MINISTÉRIO PÚBLICO. Legitimidade para propor ação civil pública quando se trata de direitos individuais homogêneos em que seus titulares se encontram na situação ou na condição de consumidores, ou quando houver uma relação de consumo. É indiferente a espécie de contrato firmado, bastando que seja uma relação de consumo. Precedentes. (Ag. Reg. no Recurso Extraordinário nº 424048/SC, 1ª Turma do STF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence. j. 25.10.2005, DJU 25.11.2005). (escurecemos e grifamos)
STJ-174337) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE ATIVA (CF, ART. 129, III, E LEI 8.078/90, ARTS, 81 E 82, I). CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO. RODOVIA. EXIGÊNCIA DE TARIFA (PEDÁGIO) PELA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO CONCEDIDO QUE PRESCINDE, SALVO EXPRESSA DETERMINAÇÃO LEGAL, DA EXISTÊNCIA DE IGUAL SERVIÇO PRESTADO GRATUITAMENTE PELO PODER PÚBLICO. 1. O Ministério Público está legitimado a promover ação civil pública ou coletiva, não apenas em defesa de direitos difusos ou coletivos
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de consumidores, mas também de seus direitos individuais homogêneos, nomeadamente de serviços públicos, quando a lesão deles, visualizada em sua dimensão coletiva, pode comprometer interesses sociais relevantes. Aplicação dos arts. 127 e 129, III, da Constituição Federal, e 81 e 82, I, do Código de Defesa do Consumidor. 2. A Constituição Federal autorizou a cobrança de pedágio em rodovias conservadas pelo Poder Público, inobstante a limitação de tráfego que tal cobrança acarreta. Nos termos do seu art. 150: "... é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) V - estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público". Assim, a contrapartida de oferecimento de via alternativa gratuita como condição para a cobrança daquela tarifa não pode ser considerada exigência constitucional. 3. A exigência, ademais, não está prevista em lei ordinária, nomeadamente na Lei 8.987/95, que regulamenta a concessão e permissão de serviços públicos. Pelo contrário, nos termos do seu art. 9º, parágrafo primeiro, introduzido pela Lei 9.648/98, "a tarifa não será subordinada à legislação específica anterior e somente nos casos expressamente previstos em lei, sua cobrança poderá ser condicionada à existência de serviço público alternativo e gratuito para o usuário." 4. Recurso especial do Estado do Paraná conhecido em parte e improvido; recurso especial de VIAPAR S/A conhecido em parte e, nessa parte, parcialmente provido; recursos especiais do DNER e da União conhecidos em parte e, nessa parte, providos; e recurso especial do DER conhecido e provido. (Recurso Especial nº 417804/PR (2002/0018047-0), 1ª Turma do STJ, Rel. Min. Teori Albino Zavascki. j. 19.04.2005, unânime, DJ 16.05.2005). (escurecemos e grifamos)
Nota-se que a presente ação tutela não um único
consumidor, mas todos os consumidores do Município de São Miguel
do Araguaia, bem como do Município de Mundo Novo, que faz parte
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da presente comarca. Isso porque, como confessado pela empresa
ré, na sua resposta, tal prática é rotineira em suas ações, atingindo
todos os usuários/consumidores dos municípios que compõem a
comarca, ou melhor, todo Estado de Goiás.
Em resumo, vem o Ministério Público, pela presente,
defender direito difuso, de toda população da Comarca de São
Miguel do Araguaia, possivelmente atingida pela cobrança abusiva
de instalação de hidrômetro.
Fixadas estas balizas, impende observar que a
Constituição Federal de 1988 conferiu ao Parquet o status de
guardião da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses
sociais e individuais indisponíveis, sendo que, no afã de
instrumentalizar o ombudsman com mecanismos idôneos para a
consecução de suas finalidades institucionais, estabeleceu
expressamente dentre suas funções a de promover o inquérito civil e
a ação civil pública (artigo 129, inciso III).
Nas pegadas da orientação dada pela Magna Carta,
diversas leis foram chancelando ao MINISTÉRIO PÚBLICO a iniciativa
da ação civil pública, como parte pública legitimada ativamente à
defesa do interesse público (em sentido lato)1.
1 Verbi gratia: a Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7347/85), o Código de Defesa
do Consumidor (Lei nº 8078/90) e o Estatuto do Ministério Público (Lei nº
8625/93.
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Dessarte, verifica-se que não apenas a Carta de 1988 e
as leis federais, mas também a jurisprudência, deixam consolidado
que o MINISTÉRIO PÚBLICO tem legitimidade ativa para a
propositura da ação civil pública para a defesa dos consumidores em
juízo.
Gizadas estas asserções, insta finalizar este item
evidenciando que a conformação institucional do MINISTÉRIO
PÚBLICO brasileiro, delineada pelo artigo 127 da Carta Republicana,
indica que o Poder Constituinte Originário, expressão suprema da
Cidadania, engendrou uma instituição nos moldes do ombudsman
dos países nórdicos, ao qual compete a “defesa do povo” contra as
agressões à eficácia vertical dos direitos fundamentais, além de
combater a improbidade, a corrupção e a criminalidade.
Em resumo, patente é a legitimidade do Ministério
Público para aforar a presente ação.
III. B) DAS JUSTIFICATIVAS APRESENTADAS PELA SANEAGO QUE AUTORIZAM A
COBRANÇA DA INSTALAÇÃO DO HIDRÔMETRO
As justificativas apresentadas pela Procuradora da
empresa ré não se mostram suficientes para autorizar a cobrança
que rechaçamos de abusiva. Para embasar a cobrança citou alguns
dispositivos, que transcrevemos em sua integralidade, porém
imprestáveis para tal desiderato.
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Antes de apresentarmos outros argumentos que
rechaçam a cobrança, iremos rebater o afirmado pela SANEAGO.
Comecemos com o artigo 55 da Lei Estadual 14.939/2004. Este
dispositivo não pode servir de argumento para autorizar a cobrança
de instalação de hidrômetro. A SANEAGO por manter relação de
natureza privada com o consumidor não é quem institui os subsídios
referidos no dispositivo. Nesse sentido, a Jurisprudência:
(STJ-205134) AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SERVIÇO DE
RELIGAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA. PAGAMENTO A
EMPRESA CONCESSIONÁRIA SOB A MODALIDADE DE
TARIFA. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE ATIVA. 1.
A União Federal é parte ilegítima para figurar no pólo
passivo das ações que versam sobre cobrança de serviço
de religação de energia elétrica por parte de
concessionária de serviços públicos, uma vez que trata-se
de tarifa que não beneficia a União. 2. A relação
jurídica do serviço público prestado por
concessionária tem natureza de direito privado,
pois o pagamento é feito sob a modalidade de
tarifa, e não estando os serviços jungidos às
relações de natureza tributária, mas, ao contrário,
encontrando disciplina também no Código de
Defesa do Consumidor, inexiste empecilho à defesa dos
usuários via ação civil pública, cuja legitimação encontra
na figura do Ministério Público um representante por lei
autorizado. 3. A jurisprudência do STJ firmou-se no
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sentido de que instruções normativas não se enquadram
no conceito de "Lei Federal" do artigo 105, inciso III, da
Constituição Federal, ainda que tenham caráter
normativo. 4. Recurso especial parcialmente conhecido e
improvido. (Recurso Especial nº 591916/MT
(2003/0164487-9), 2ª Turma do STJ, Rel. João Otávio de
Noronha. j. 27.02.2007, unânime, DJ 16.03.2007).
É verdade que a SANEAGO pertence ao Estado de
Goiás, sendo uma sociedade de economia mista. Contudo, como
acima aludido, a relação jurídica do serviço público prestado
por concessionária tem natureza de direito privado,
regulando-se pelo Código de Defesa do Consumidor. E este, só pode
pagar pelo que consome, nos termos da Lei.
O que nesse campo do saneamento básico é autorizado
pela Lei n.° 11.445/2007, no artigo 30, é a definição de categoria de
usuários, distribuídas por faixas ou quantidades crescentes de
utilização ou consumo. Ou seja, a tarifa a ser cobrada depende do
consumo do usuário. Aqueles que consomem menos pagam menos
pela tarifa. Já os que consomem mais pagam uma tarifa maior. Isso
ocorre, como afirma a doutrina (Carvalho Filho, José dos Santos:
Manual de Direito Administrativo, 15ª ed., Ed. Lumen Juris, 2007, p.
331), em razão das diretrizes estabelecidas para a política adotada
para prestação dos serviços de saneamento básico, em que, além
dos usuários, deve ser considerado o próprio serviço a ser prestado.
Mesmo assim, esta política tarifária deve seguir o balizado pelo
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Poder Público. É o que mais ou menos acontece com a energia
elétrica também.
Em resumo, a SANEAGO não tem o direito, nem poder,
de se colocar no lugar do próprio Estado. Cabe a este as
providências previstas no dispositivo citado, e não àquela. Tudo que
for feito pela SANEAGO deve estar respaldado em Lei.
Quanto ao artigo 20, da Resolução 289/2003,
inicialmente, aduzimos que é uma resolução e não uma Lei. E
mesmo assim, aquela não pode ser interpretada de forma isolada.
Tem que ser feito conjuntamente, seguindo a diretriz maior prevista
na Lei 11.445/2007. No mais, uma coisa é a ligação da instalação
com a rede da SANEAGO, e outra, completamente diferente, é a
instalação/manutenção/conservação do hidrômetro. Tanto isso é
verdade que em inúmeras residências espalhadas por todo
Estado de Goiás existem a ligação com a rede da SANEAGO,
mas não há medição via hidrômetro. Nesses casos, a cobrança
se faz por um valor mínimo estipulado.
Quanto ao inciso V, do artigo 38, da Lei Estadual
14.939/2004, iremos abordá-lo quando do estudo da Lei
11.445/2007, pois o entendimento desse dispositivo passa,
necessariamente, pela Lei Federal em tela.
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Cabe aqui ainda salientar que mais a frente será
comentado a regra do artigo 40, inciso III, da Lei 11.445/2007, que
só reforça o aludido sobre o artigo 20, da Resolução 289/2003.
III. C) OBSERVAÇÕES SOBRE A LEI 11.445/2007
De acordo com o artigo 3°, inciso I, alínea “a”, da Lei
11.445/2007, considera-se saneamento básico o conjunto de
serviços, infra-estruturas e instalações de:
a) Abastecimento de água potável: constituído pelas
atividades, infra-estruturas e instalações necessárias
ao abastecimento público de água potável, desde a
captação até as ligações prediais e respectivos
instrumentos de medição.
b) Esgotamento sanitário: constituído pelas atividades,
infra-estruturas e instalações operacionais de coleta,
transporte, tratamento e disposição final adequados
dos esgotos sanitários, desde as ligações prediais até o
seu lançamento final no meio ambiente.
Ora, de acordo com a norma acima escrita o serviço
de abastecimento de água potável ocorre desde a captação até
as ligações prediais e respectivos instrumentos de medição,
cabendo a concessionária prestá-lo em sua integralidade. É um
serviço único. E para remunerar este serviço cabe ao usuário o
pagamento de uma tarifa.
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Esse entendimento esposado é confirmado pelo
artigo 29, inciso I, da Lei 11.445/2007:
Artigo 29 – Os serviços públicos de saneamento
básico terão a sustentabilidade econômico-financeira
assegurada, sempre que possível, mediante remuneração pela
cobrança dos serviços:
I – de abastecimento de água e esgotamento
sanitário: preferencialmente na forma de tarifas e outros
preços públicos, que poderão ser estabelecidos para cada um
dos serviços ou para ambos conjuntamente.
O que se entende do dispositivo é que é possível
uma cobrança única, englobando tanto o serviço
abastecimento de água e esgotamento sanitário, ou uma
cobrança em separado, isto é, uma só para o abastecimento e
outra só para o esgotamento.
Saliente-se que essa cobrança em separado é muito
comum em Goiás. Na imensa maioria das residências de São
Miguel do Araguaia e de Mundo Novo não há esgotamento
sanitário. Daí não pode a concessionária cobrar o esgotamento.
Por isso, é cindido o pagamento. Mas, quando ele existe, sobre
o valor do serviço abastecimento se cobra 80% para custear o
esgotamento. Essa é a cisão permitida.
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O que a SANEAGO pretende com a referida cobrança
é, de forma indevida, cindir algo que deve ser remunerado, em
regra, de forma única. Aqui entra o inciso V, do artigo 38, da
Lei Estadual 14.939/2004. Segundo a ré, este artigo
autorizaria a cobrança de outro serviço e/ou procedimento
prestado ao usuário. Acontece que não se pode fazer essa
interpretação do dispositivo, pura e simples, sem levar em
consideração todo ordenamento jurídico, notadamente a Lei
11.445/2007 e o Código de Defesa do Consumidor.
Como se sabe, é direito do consumidor pagar pelo
que realmente consumiu, sendo dever do fornecedor cobrar o
efetivamente consumido. E dessa forma, é preciso não
distorcer o fato.
O que se quer afirmar é que instalação de
hidrômetro faz parte da prestação do serviço abastecimento de
água, porque é o modo pelo qual o fornecedor se desincumbe
do dever de cobrar do consumidor aquilo que ele realmente
consumiu.
Tanto isso é verdade que se o fornecedor cobrar além
do devido, segundo as regras insculpidas no parágrafo único, do
artigo 42, da Lei 8.078/90, o consumidor “tem direito à repetição do
indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso,
acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de
engano justificável”.
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Hoje, a melhor forma de auferir o consumo é através
do hidrômetro. Nada impede que no futuro seja criado outro
mecanismo mais eficaz, a exemplo do que aconteceu com o serviço
de telefonia fixa, que pode ser medido por pulso ou minuto. O que
cabe ao fornecedor é cobrar do consumidor exatamente o que ele
consumiu. Isso vale dizer, engloba algo maior, previsto tanto no
CDC, como na Lei 8987/95, relacionado ao direito de informação, do
consumidor/usuário.
Em resumo o que se deseja mostrar é que quando
se paga a fatura da água, nesta, ou melhor, no valor da fatura,
estão inclusas todas as despesas, bem como os lucros, que são
auferidos pela concessionária, desde a captação até as ligações
prediais e respectivos instrumentos de medição. Autorizar a
empresa ré a continuar cobrando algo que já está incluso na
tarifa paga pelo consumidor representa enriquecimento sem
causa, vedado por nosso ordenamento jurídico.
Interessante se faz notar o artigo 40, inciso III, da
Lei 11.445/2007. Vejamo-lo:
Artigo 40. Os serviços poderão ser interrompidos
pelo prestador nas seguintes hipóteses:
(...)
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III – negativa do usuário em permitir a instalação
de dispositivo de leitura de água consumida, após
ter sido previamente notificado a respeito.
Esse dispositivo legal só comprova que o encargo
financeiro da instalação do hidrômetro tem que ficar a cargo da
concessionária e não do consumidor. Este, sequer pode recusar
a instalação. Isso porque é um direito/dever do fornecedor
auferir quanto foi gasto do consumidor, até porque também é
direito do consumidor só pagar pelo que consumiu.
Contudo, se é um direito/dever do fornecedor
instalar hidrômetro, é incongruente cobrar do consumidor a
instalação. Isso porque, além de não ter o direito de recusar a
instalação, ainda caberia o consumidor o pagamento da
mesma. Em resumo, cobrar a instalação de hidrômetro do
consumidor é violar o princípio da
proporcionalidade/razoabilidade, bem como o princípio da
eqüidade, e ainda as normas protetivas previstas no Código de
Defesa do Consumidor.
Em se percorrendo a ordem natural das coisas,
seria somente o fornecimento da água tratada ao consumidor o
serviço pretendido. É disso que necessita o usuário. O
hidrômetro, como se nota pelo artigo 40, é mais um dever da
concessionária do que do usuário/consumidor. Este, como
asseverado, tem o direito de pagar o que consumiu, sendo
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁSPromotoria de Justiça de São Miguel do Araguaia
dever da concessionária cobrar o valor correto. Daí a
necessidade de se instalar o hidrômetro, para aquela se
desincumbir do seu dever.
Quando a Lei inclui “instrumentos de medição”
como parte do serviço de abastecimento de água, já o incluiu
no valor da tarifa. Essa é justificativa utilizada para se
aumentar, inclusive, o valor da tarifa, pois se aduz que a
concessionária necessita se ressarcir do valor desprendido com
a instalação dos instrumentos de medição. Agora, em se
mantendo essa cobrança o consumidor/usuário paga duas
vezes o mesmo serviço, na medida em que já o faz quando
paga a tarifa.
É bom que se diga, até levando em conta um dos
princípios basilares previstos no artigo 47, do CDC, em que as
cláusulas contratuais devem ser interpretadas de maneira mais
favorável ao consumidor, a interpretação acima é a única em
consonância com a Constituição Federal (artigo 170, V c/c o
parágrafo único, incisos II e III, do artigo 175) e com o Código
de Defesa do Consumidor.
Ressalte-se que a própria Jurisprudência já se
manifestou sobre a quem cabe prover as despesas com a
instalação, manutenção e conservação dos hidrômetros. E, de
acordo com a mesma, cabe a concessionária.
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(TJRJ-040721) AÇÃO REVISIONAL DE DÉBITO - CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO - FORNECIMENTO DE ÁGUA - DEFEITO NA INSTALAÇÃO DO HIDRÔMETRO - RESPONSABILIDADE DA CONCESSIONÁRIA - COBRANÇA PELA TARIFA MÍNIMA. A prestação do serviço essencial de fornecimento de água está submetida às regras do Código de Defesa do Consumidor, sendo da responsabilidade da Concessionária os prejuízos decorrentes dos defeitos no serviço de instalação do hidrômetro. Havendo falha no serviço de instalação do medidor de fornecimento de água, ocasionando medições fictícias, o consumo deve ser cobrado com base na tarifa mínima. Improvimento do recurso. (Apelação Cível nº 200500112960, 10ª Câmara Cível do TJRJ, Rel. Des. José Geraldo Antônio. j. 06.09.2005).
(TJRJ-038884) APELAÇÃO CÍVEL. DIREITOS PROCESSUAL
CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO ORDINÁRIA DE
REVISÃO DE DÉBITO C/C ANULAÇÃO DE ACORDO.
DISTRIBUIÇÃO POR DEPENDÊNCIA A MEDIDA CAUTELAR.
AÇÃO CONSIGNATÓRIA DISTRIBUÍDA POR DEPENDÊNCIA
AO PROCESSO PRINCIPAL. CEDAE. FORNECIMENTO DE
ÁGUA. ALEGAÇÃO DE DEFEITO NO HIDRÔMETRO.
Concluiu o perito técnico que o aparelho instalado no
condomínio apresentava defeitos que comprometeram o
seu regular funcionamento, acarretando aumento
excessivo do consumo. O vínculo obrigacional
estabelecido com base no serviço de água configura
uma relação de consumo, eis que presentes as
características estabelecidas no Código de Defesa
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do Consumidor. A cobrança de tarifa de água se faz
por medição, quando há hidrômetro instalado no
imóvel, sendo responsabilidade da concessionária
sua manutenção e conservação. Correta a sentença ao
determinar que a empresa fornecedora revisse os valores
cobrados, na forma do art. 108 do Decreto 553/76, ante
a verificação de discrepante diferença na média mensal
registrada anteriormente, assim como o restabelecimento
do fornecimento de água. Pedido consignatório que
merece julgado procedente, tendo em vista que o valor
do débito depende de liquidação por arbitramento, não
podendo antes disso decidir o ilustre sentenciante pela
insuficiência do depósito. Desprovimento do primeiro
recurso. Provimento do segundo. (Apelação Cível nº
2004.001.17869, 15ª Câmara Cível do TJRJ, Rel. Des.
José Pimentel Marques. j. 02.03.2005).
Como ficou esclarecido, a cobrança da instalação de
hidrômetro aos consumidores da Comarca de São Miguel do
Araguaia é uma violação as regras previstas na Constituição Federal,
no Código de Defesa do Consumidor e na Lei 11.445/2007, pois
representa uma dupla oneração ao consumidor/usuário, que acaba
por pagar 2 (duas) vezes um mesmo serviço, que teria que ser pago
só pela tarifa referente ao abastecimento de água.
Feitas essas considerações, entende o Ministério
Público que a interferência do Poder Judiciário é imperiosa, do
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contrário, continuamente, o consumidor/usuário será lesado no
seu direito de pagar o realmente devido.
III.D) DA NULIDADE DO ITEM 4.3 DO CONTRATO DE
ADESÃO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
De acordo com o item 4.3 do Contrato de Adesão
firmado entre a ré e os consumidores/usuários do serviço
público, este últimos devem: “Guardar e conservar, na
condição de fiel depositário, o padrão de ligação de Água, o
hidrômetro e outros dispositivos da SANEAGO”.
(escurecemos e grifamos)
Ora, é imperioso perceber o absurdo jurídico acima
transcrito. Em se interpretando a cláusula acima, combinada
com a exigência de que o custo da instalação do hidrômetro
fique por conta do consumidor/usuário, observa-se o seguinte:
o consumidor fará uma doação a SANEAGO de um
hidrômetro e ainda será obrigado a ser fiel depositário
da mesma.
Com o perdão do termo, isto é uma excrescência,
tamanho o abuso perpetrado pela ré. Fere de morte o princípio
da razoabilidade e o direito do usuário do serviço.
Entende o Ministério Público que isso representa um
constrangimento ilegal por parte da ré, na medida em que ela
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obriga o consumidor a lhe “doar” um hidrômetro e, pior, ainda
transforma o doador em seu fiel depositário, pois, se este
“danificar” o mesmo ainda pode sofrer penalidades.
De acordo com o artigo 538, do Código Civil,
“considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por
liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens
para o de outra”. (escurecemos e grifamos)
Dois são os elementos peculiares à doação: a) o
animus donandi (elemento subjetivo), que é a intenção de
praticar uma liberalidade; e, b) a transferência de bens,
acarretando a diminuição do patrimônio do doador (elemento
objetivo).
Compulsando o presente contexto, inexiste a
vontade do consumidor de praticar tal liberalidade em favor da
ré. O que existe é uma injusta imposição, na qual se aproveita
da condição de única fornecedora do serviço para cobrar de
forma abusiva uma “doação” do aparelho de medição.
Não há dúvidas que essa cláusula combinada com a
prática da cobrança da instalação do hidrômetro pela ré, é nula
de pleno direito. Nesse contexto, aduz o artigo 51, do Código
de Defesa do Consumidor que são nulas de pleno direito as
cláusulas contratuais que “(...) IV – estabeleçam obrigações
consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o
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consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam
incompatíveis com a boa-fé ou a equidade”.
(escurecemos)
Ademais, como acima esclarecemos, a
responsabilidade pela instalação/manutenção/conservação
do hidrômetro pertence à ré. Nesse sentido está o farto
repositório de Jurisprudência já citado, ao qual nos
reportamos, pois só faz corroborar o argumentos acerca da
nulidade da presente cláusula do contrato de adesão que segue
anexo a esta exordial.
In casu, essa cláusula certamente é abusiva e por
isso, merece ser declarada nula. Por isso, atendendo ao
consumidor Alkemar de Melo Ferreira que procurou esta
Promotoria de Justiça, no dia 15 de agosto de 2007
(declaração em anexo), para relatar o abuso cometido pela ré,
com fulcro no §4°, do artigo 51, do Código de Defesa do
Consumidor, é medida que se impõe a declaração de nulidade
da cláusula aludida, pois além de ser abusiva, não assegura o
justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes, na
medida em coloca o consumidor/usuário em desvantagem
exagerada perante a ré.
III. E) DA RESTITUIÇÃO DO VALOR COBRADO
INDEVIDAMENTE
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Conforme o artigo 42, parágrafo único, do CDC, o
valor cobrado indevidamente do consumidor deve ser
restituído em dobro, com juros e correção monetária. Nesse
sentido, certamente, antes de se ajuizar este feito, diversos
consumidores já pagaram, e alguns, estão pagando em
parcelas a referida instalação.
Segundo a Procuradora da ré, foi utilizada como
base para elaborar a tabela em anexo a Lei 14.939/2004, no
seu artigo 38, que já demonstramos não ter a validade
preconizada.
Isto posto, os consumidores que a partir de 15 de
setembro de 2004, em que foi publicada a Lei supracitada, até
a data de julgamento da presente, que indevidamente
pagaram pelo “serviço” questionado, têm direito de se utilizar
do transporte da coisa julgada, preconizado no artigo 103, §3°,
do CDC, para promover à liquidação e à execução do valor
indevidamente pago e usado para enriquecer ilicitamente a
empresa ré.
Desse modo, além de se impedir a cobrança é
necessário possibilitar aos consumidores a restituição do valor
cobrado e pago, em arrepio ao ordenamento pátrio.
III.F) DO DANO MORAL COLETIVO
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Uma vez que a cobrança da instalação de hidrômetro aos
consumidores, não só aos da Comarca de São Miguel do Araguaia,
como também de todo o Estado de Goiás, está sendo realizada
desde 15 de setembro de 2004, ao arrepio da legislação
consumerista, inclusive confessado pela empresa ré, conduta esta
que lesou uma infinidade de consumidores/usuários, é indene de
dúvidas que tal situação ocasionou uma lesão ao direito difuso de
todos os consumidores/usuários do serviço público prestado.
Pela lesão causada a interesse ou direito difuso e coletivo,
o sujeito passivo da ação civil pública poderá ser condenado ao
pagamento de uma determinada quantia em dinheiro a título de
indenização pelos danos coletivos causados, sem prejuízo da multa
pelo eventual descumprimento.
Com se vê, há duas hipóteses de incidência da
condenação pecuniária em questão.
Os valores da condenação em pecúnia para o
ressarcimento dos danos causados aos interesses difusos ou
coletivos (cobrança por mais de três anos de diversos consumidores
para que seja instalado hidrômetro, ao arrepio da legislação
consumerista) e aqueles relativos à multa que será estabelecida em
caso de inadimplemento das obrigações de fazer ou não fazer que a
seguir serão pleiteadas.
Como ensina Carlos Alberto Bittar Filho:
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“(...) O DANO MORAL COLETIVO É A INJUSTA LESÃO
DA ESFERA MORAL DE UMA DADA COMUNIDADE, OU
SEJA, É A VIOLAÇÃO ANTIJURÍDICA DE UM
DETERMINADO CÍRCULO DE VALORES COLETIVOS.
Quando se fala em dano moral coletivo, está-se
fazendo menção ao fato de que o patrimônio
valorativo de uma certa comunidade (maior ou
menor), idealmente considerado, foi agredido de
maneira absolutamente injustificável do ponto de
vista jurídico: quer isso dizer, em última instância,
que se feriu a própria cultura, em seu aspecto
imaterial.”2
Em abalizado comentário, aduz Luis Gustavo Grandinetti
Castanho De Carvalho: “O Direito se preocupou durante séculos com
os conflitos intersubjetivos. A sociedade de massas, a complexidade
das relações econômicas e sociais, a percepção da existência de
outros bens jurídicos vitais para a existência humana, deslocaram a
preocupação jurídica do setor privado para o setor público; do
interesse individual para o interesse difuso ou coletivo; do dano
individual para o dano difuso ou coletivo. Se o dano individual
ocupou tanto e tão profundamente o Direito, o que dizer do dano
2 “Do dano moral coletivo no atual contexto jurídico brasileiro” in Direito do Consumidor, vol. 12- Ed. RT. Vale destacar, ainda, a manifestação de André de Carvalho Ramos que, ao analisar o dano moral coletivo, assim dissertou: “(...) é preciso sempre enfatizar o imenso dano moral coletivo causado pelas agressões aos interesses transindividuais. Afeta-se a boa-imagem da proteção legal a estes direitos e afeta-se a tranqüilidade do cidadão, que se vê em verdadeira selva, onde a lei do mais forte impera. (“A ação civil pública e o dano moral coletivo”, Revista de Direito do Consumidor, vol. 25- Ed. RT, p. 83). Continua o citado autor, dizendo: “Tal intranqüilidade e sentimento de desapreço gerado pelos danos coletivos, justamente por serem indivisíveis, acarretam lesão moral que também deve ser reparada coletivamente. Ou será que alguém duvida que o cidadão brasileiro, a cada notícia de lesão a seus direitos não se vê desprestigiado e ofendido no seu sentimento de pertencer a uma comunidade séria, onde as leis são cumpridas? A expressão popular ‘o Brasil é assim mesmo’ deveria sensibilizar todos os operadores do Direito sobre a urgência na reparação do dano moral coletivo” (idem, ibidem).
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que atinge um número considerável de pessoas? É natural que o
Direito se volte, agora, para elucidar as intrincadas relações
coletivas e difusas e especialmente à reparação de um dano que
tenha esse caráter” (Responsabilidade por dano não-patrimonial a
interesse difuso: dano moral coletivo, p. 29).
Xisto Tiago de Medeiros Neto, procurador do Ministério
Público do Trabalho, leciona que Assim, há de se ressaltar que, no
tempo atual, tornou-se necessária e significativa para a ordem e a
harmonia social, a reação do Direito em face de situações em que
determinadas condutas vêm a configurar lesão a interesses: 1)
juridicamente protegidos; 2) de caráter extrapatrimonial; 3)
titularizados por uma determinada coletividade. Ou seja: adquiriu
relevo jurídico, no âmbito da responsabilidade civil, a reparação do
dano moral coletivo (em sentido lato) (Revista do Ministério Público
do Trabalho n.° 24, ano 2002, pág. 79).
André de Carvalho Ramos, captando esse aspecto,
registra que o entendimento jurisprudencial de aceitação do dano
moral em relação a pessoas jurídicas, “é o primeiro passo para que
se aceite a reparabilidade do dano moral em face de uma
coletividade”. E ainda acresce: “o ponto chave para a aceitação do
chamado dano moral coletivo está na ampliação de seu conceito,
deixando de ser o dano moral um equivalente da dor psíquica, que
seria exclusividade de pessoas físicas” (A ação civil pública e o dano
moral coletivo. In: Revista de Direito do Consumidor, n. 25/98, p.
82).
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Rogério Tadeu Romano, Procurador da República, em
artigo disponível na internet, considera ”perfeitamente aceitável a
reparabilidade do dano moral em face da coletividade, que apesar
de ente despersonalizado, possui valores morais e um patrimônio
ideal a ser receber proteção do Direito. Ora, se aceita-se a
reparabilidade do dano moral em face das pessoas jurídicas, quanto
a honra objetiva, a fortiori, deverá ser aceita tal tese em face da
coletividade”.
Xisto doutrina de forma conclusiva que “Resta evidente,
com efeito, que, toda vez em que se vislumbrar o ferimento a
interesse moral (ressalte-se, extrapatrimonial) de uma coletividade,
configurar-se-á dano passível de reparação, tendo em vista o abalo,
o sentimento negativo, a desalentadora indignação, ou a diminuição
da estima, infligida e apreendida em dimensão coletiva. Nesse
passo, é imperioso que se apresente o dano como injusto,
usurpando a esfera jurídica da coletividade em detrimento dos
valores fundamentais do seu acervo” (Revista do Ministério Público
do Trabalho, n.° 24, ano 2002, pág. 84).
E, segundo destaca Gabriel A. Stiglitz, citado por Xisto os
danos morais coletivos devem ser indenizados na medida em que
“produzcan verdaderos sufrimientos, incomodidades o alteraciones
ponderables en el orden extrapatrimonial y en tanto las inevitables
secuelas psíquicas y espirituales que sobrevengan de esas
agresiones”.(24) Arremata, ainda, o jurista argentino: La disciplina
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de la responsabilidad civil debe tender prioritariamente a la
prevención y cesación de los perjuicios colectivos, en uma actitud
dinámica acorde con el imperativo de eficacia del derecho y guiada
por el propósito último — sustentado en principios de justicia y
solidaridad social — de mantener a la colectividad a resguardo de
padecimientos, intraquilidades y angustias generalizadas,
resultantes de una actividad o conductas desequilibrantes de la
pacífica convivencia comunitaria. Elenca-se, por fim, os seguintes
elementos que caracterizam o dano moral coletivo e revelam o seu
conceito:
• a conduta antijurídica do agente, que poderá ser uma
pessoa (física ou jurídica);
• a ofensa a valores extrapatrimoniais essenciais,
identificados no caso concreto, reconhecidos e inequivocamente
compartilhados por uma determinada coletividade (titular de
interesses morais protegidos pela ordem jurídica);
• a certeza do dano causado, correspondente aos efeitos
que, ipso facto, emergem coletivamente, traduzidos pela sensação
de desvalor, de indignação, de menosprezo, de inferioridade, de
descrédito, de desesperança, de aflição, de humilhação, de angústia
ou respeitante a qualquer outro sentimento de apreciável conteúdo
negativo;
• o nexo causal observado entre a conduta ofensiva e a
lesão socialmente repudiada (Revista do MPT, n.° 24, ano 2002,
pág. 85).
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A partir da Constituição da República de 1988,
descortinou-se um novo horizonte quanto à tutela dos danos morais
(particularmente no que tange à sua feição coletiva), face à adoção
do princípio basilar da reparação integral (art. 5º, V e X) e diante do
direcionamento do amparo jurídico à esfera dos interesses
transindividuais, valorizando-se, pois, destacadamente, os direitos
de tal natureza (a exemplo dos artigos 6º, 7º, 194, 196, 205, 215,
220, 225 e 227)(45) e os instrumentos para a sua proteção (art. 5º,
LXX e LXXIII, e art. 129, III).
Com isso, a tutela do dano moral coletivo passou a ter,
explícita e indiscutivelmente, fundamento de validade constitucional.
Destaque-se, por oportuno, a ampliação do objeto da ação popular
manejada pelo cidadão, que, em decorrência do referido artigo 5º,
LXXIII, da Lei Maior, passou a visar a anulação de ato lesivo (e a
conseqüente reparação por perdas e danos — art. 11 da Lei n.
4.717/65) ao patrimônio público e também à moralidade
administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e
cultural. Daí a pertinência dessa ação no campo do dano moral
coletivo, conforme destacado por Carlos Alberto Bittar Filho, ao citar
Hely Lopes Meirelles:
“Embora os casos mais freqüentes de lesão se refiram ao
dano pecuniário, a lesividade a que alude o texto
constitucional tanto abrange o patrimônio material quanto
o moral, o estético, o espiritual, o histórico. Na verdade,
tanto é lesiva ao patrimônio público a alienação de um
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imóvel por preço vil, realizada por favoritismo, quanto a
destruição de um recanto ou de objetos sem valor
econômico, mas de alto valor histórico, cultural, ecológico
ou artístico para a coletividade local” (pág. 59).
Ainda dentro do enfoque constitucional, vê-se que o
artigo 129, inciso III, ao conferir legitimação qualificada ao
Ministério Público para o manuseio da ação civil pública, também
abriu o leque do seu objeto para qualquer interesse difuso e
coletivo, além daqueles referentes ao patrimônio público e social e
ao meio ambiente. Assim, a ação civil pública tornou-se instrumento
de alçada constitucional apto a ser utilizado pelo parquet na busca
da proteção irrestrita de todo interesse de natureza transindividual,
inclusive os de caráter moral. E por força do § 1º do mesmo artigo
129 da Lei Maior, também foram legitimados para este fim os entes
arrolados no artigo 5º (caput e incisos I e II) da Lei da Ação Civil
Pública (Lei n. 7.347/85).
Frise-se, também, que sob a égide do regime
constitucional passado, quando do surgimento da Lei da Ação Civil
Pública (Lei n. 7.347/85), o respectivo artigo 1º limitava o seu uso
somente nas hipóteses de lesão ao meio ambiente, ao consumidor e
ao patrimônio cultural, além de não fazer referência específica ao
dano moral, utilizando o termo dano, sem qualificativo.
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Com efeito, a redação original, em seu caput, previa:
“Art. 1º Regem- se pelas disposições desta lei, sem prejuízo da ação
popular, as ações de responsabilidade por danos causados: (...).”
A possibilidade jurídica do pedido de indenização por dano
moral coletivo decorre de expresso dispositivo legal: o art. 1º,
caput, da Lei da Ação Civil Pública (Lei Federal n° 7.347/85):
Art. 1º. Regem-se pelas disposições desta Lei, sem
prejuízo da ação popular, AS AÇÕES DE
RESPONSABILIDADE POR DANOS MORAIS e
patrimoniais causados (...) A QUALQUER outro
INTERESSE DIFUSO OU COLETIVO.
Xisto arremata a exposição da configuração do dano
moral coletivo com as seguintes ponderações:
“Na atualidade, a ação impositiva, por meio dos
mecanismos e órgãos competentes, objetivando a
efetivação dos direitos, em prol dos indivíduos e da
coletividade, é o que dá concretude à idéia de cidadania.
Em muito maior dimensão isso ocorrerá quando tratar-se
de valores fundamentais, status reconhecido
constitucionalmente aos direitos ou interesses coletivos,
materiais ou morais.
Sem dúvida, a evolução do regime da responsabilidade
civil, tendo por norte o equilíbrio e o desenvolvimento
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sociais, possibilitou a devida proteção em face de danos
infligidos aos valores morais reconhecidos a coletividades
de pessoas, fruto da ampla projeção que adquiriu o
conceito de dignidade humana.
A ordem jurídica, assim, considera ser a coletividade
titular de direitos ou interesses extrapatrimoniais, os
quais são passíveis de tutela por meio do sistema
processual apto a essa finalidade, definidor da chamada
jurisdição civil coletiva, cujos fundamentos principais
encontram-se gizados na Carta Constitucional de 1988
(art. 5º, XXXV e LV, e art. 129, III e § 1º), ordenando-se
instrumentalmente com a interação das normas da Lei da
Ação Civil Pública (art. 21) e da parte processual do
Código de Defesa do Consumidor (arts. 90 e 117).
Não se há de duvidar, enfim, que, no tempo presente, o
reconhecimento e a efetiva reparação dos danos morais
coletivos — na medida em que sanciona o ofensor
(desestimulando novas lesões) e compensa os efeitos
negativos decorrentes do desrespeito aos bens mais
elevados do agrupamento social — constitui uma das
formas de alicerçar o ideal de um Estado Democrático de
Direito (ob. cit.pág. 109).
Ressalte-se que, para fins de indenização por danos
morais, é suficiente a demonstração do fato que deu origem ao
dano, o que pensamos já ter feito nesta inicial:
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“Indenização de direito comum. Dano moral. Prova.
Juros moratórios. Súmula n.º 54 desta Corte. 1 – Não
há que falar em prova do dano moral, mas, sim,
na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento,
sentimentos íntimos que o ensejam. Provado
assim o fato, impõe-se a condenação, sob pena
de violação ao art. 334 do Código de Processo
Civil. 2 – Na forma da Súmula n.º 54 da Corte, os
juros moratórios nestes casos contam-se da data do
evento. 3 - Recurso especial conhecido e provido, em
parte.”3
O VALOR DEVIDO a título de indenização pelos
danos morais coletivos, observa Carlos Alberto Bittar,
“(...) deve traduzir-se em MONTANTE QUE
REPRESENTE ADVERTÊNCIA AO LESANTE E À
SOCIEDADE DE QUE SE NÃO SE ACEITA O
COMPORTAMENTO ASSUMIDO, OU O EVENTO
LESIVO ADVINDO. Consubstancia-se, portanto, em
IMPORTÂNCIA COMPATÍVEL COM O VULTO DOS
INTERESSES EM CONFLITO, REFLETINDO-SE DE
MODO EXPRESSIVO, NO PATRIMÔNIO DO
LESANTE, A FIM DE QUE SINTA, EFETIVAMENTE,
A RESPOSTA DA ORDEM JURÍDICA AOS EFEITOS
DO RESULTADO LESIVO PRODUZIDO. DEVE,
3 STJ - RESP n.º 86.271 – SP – 3ª Turma - Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito – DJ 09/12/97.
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POIS, SER QUANTIA ECONOMICAMENTE
SIGNIFICATIVA, EM RAZÃO DAS
POTENCIALIDADES DO PATRIMÔNIO DO
LESANTE. Coaduna-se essa postura, ademais, com a
própria índole da teoria em debate, possibilitando que
se realize com maior ênfase, a sua função inibidora
de comportamentos. Com efeito, o peso do ônus
financeiro é, em um mundo em que cintilam
interesses econômicos, a resposta pecuniária mais
adequada a lesionamentos de ordem moral.”4
Por oportuno, vale trazer à baila a judiciosa lição do Ministro Luiz Fux, vazada no RECURSO ESPECIAL Nº 598.281 – MG:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AO MEIO AMBIENTE. DANO MATERIAL E MORAL. ART. 1º DA LEI 7347⁄85.1. O art. 1º da Lei 7347⁄85 dispõe: "Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:I - ao meio ambiente;II - ao consumidor;III - a bens e direitos de valor artístico. estético. histórico. turístico e paisagístico;IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo;V - por infração da ordem econômica."2. O meio ambiente ostenta na modernidade valor inestimável para a humanidade, tendo por isso alcançado a eminência de garantia constitucional.3. O advento do novel ordenamento constitucional - no que concerne à proteção ao dano moral - possibilitou ultrapassar a barreira do indivíduo para abranger o dano extrapatrimonial à pessoa jurídica e à coletividade.
4 “Reparação Civil por Danos Morais” in RT, 1993, pp. 220-222.
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4. No que pertine a possibilidade de reparação por dano moral a interesses difusos como sói ser o meio ambiente amparam-na o art. 1º da Lei da Ação Civil Pública e o art. 6º, VI, do CDC.5. Com efeito, o meio ambiente integra inegavelmente a categoria de interesse difuso, posto inapropriável uti singuli. Consectariamente, a sua lesão, caracterizada pela diminuição da qualidade de vida da população, pelo desequilíbrio ecológico, pela lesão a um determinado espaço protegido, acarreta incômodos físicos ou lesões à saúde da coletividade, revelando atuar ilícito contra o patrimônio ambiental, constitucionalmente protegido.6. Deveras, os fenômenos, analisados sob o aspecto da repercussão física ao ser humano e aos demais elementos do meio ambiente constituem dano patrimonial ambiental.7. O dano moral ambiental caracterizar-se quando, além dessa repercussão física no patrimônio ambiental, sucede ofensa ao sentimento difuso ou coletivo - v.g.: o dano causado a uma paisagem causa impacto no sentimento da comunidade de determinada região, quer como v.g; a supressão de certas árvores na zona urbana ou localizadas na mata próxima ao perímetro urbano.8. Consectariamente, o reconhecimento do dano moral ambiental não está umbilicalmente ligado à repercussão física no meio ambiente, mas, ao revés, relacionado à transgressão do sentimento coletivo, consubstanciado no sofrimento da comunidade, ou do grupo social, diante de determinada lesão ambiental.9. Destarte, não se pode olvidar que o meio ambiente pertence a todos, porquanto a Carta Magna de 1988 universalizou este direito, erigindo-o como um bem de uso comum do povo. Desta sorte, em se tratando de proteção ao meio ambiente, podem co-existir o dano patrimonial e o dano moral, interpretação que prestigia a real exegese da Constituição em favor de um ambiente sadio e equilibrado.10. Sob o enfoque infraconstitucional a Lei n. 8.884⁄94 introduziu alteração na LACP, segundo a qual passou restou expresso que a ação civil pública objetiva a responsabilidade por danos morais e patrimoniais
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causados a quaisquer dos valores transindividuais de que cuida a lei.11. Outrossim, a partir da Constituição de 1988, há duas esferas de reparação: a patrimonial e a moral, gerando a possibilidade de o cidadão responder pelo dano patrimonial causado e também, cumulativamente, pelo dano moral, um independente do outro. (escurecemos e grifamos)12. Recurso especial provido para condenar os recorridos ao pagamento de dano moral, decorrente da ilicitude perpetrada contra o meio ambiente, nos termos em que fixado na sentença (fls. 381⁄382). VOTO (transcrição de alguns trechos) EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX (Relator): Preliminarmente, conheço do recurso pela alínea "a", do permissivo constitucional, uma vez que a matéria restou devidamente prequestionada. (...)In casu, a controvérsia cinge-se à possibilidade de condenação ao pagamento de indenização por dano moral em sede de dano ambiental.O art. 1º, da Lei 7.347⁄95, assim dispunha:Lei 7347 de 24 de julho de 1985Art. 1º - Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos causados:l - ao meio-ambiente;ll - ao consumidor;lll - a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;IV - (VETADO).Atualmente o art. 1º Lei 7.347⁄95, com a novel redação dada pelo art. 88 da Lei nº 8884⁄94, prevê:Lei 8884 de 11 de junho de 1994Art. 88. O art. 1º da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, passa a vigorar com a seguinte redação e a inclusão de novo inciso:
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Regem-se pelas disposições desta lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:.........................................................................................V - por infração da ordem econômica."Com efeito, originariamente, o objeto da lei que disciplina a Ação Civil Pública versava, apenas, os danos causados ao meio-ambiente, consumidor e aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. Contudo, a legislação sofreu significativas mudança, no sentido de ampliar o objeto da ação sub examine, para abranger a responsabilidade do infrator pelos danos morais causados a quaisquer dos valores e direitos transindividuais amparados pela referida legislação.(...) "OS DANOS MORAIS E PATRIMONIAISoriginariamente, o objeto da LACP consistia na disciplina da ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor e a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico,turístico e paisagístico. Mas, como já anotamos a legislação subseqüente ampliou gradativamente o objeto da ação civil pública.Diante, porém, das inevitáveis discussões doutrinárias e jurisprudenciais sobre a ação civil pública da Lei n. 7.347⁄85 também alcançaria ou não os danos morais, o legislador resolveu explicitar a mens legis. A Lei n. 8.884⁄94 introduziu uma alteração na LACP, segundo a qual passou a ficar expresso que a ação civil pública objetiva a responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados a quaisquer dos valores transindividuais de que cuida a lei.São cumuláveis as indenizações por dano material e moral oriundos do mesmo fato - é o que dispõe a Súm. 37, do Superior Tribunal de Justiça. E, nos termos de sua Súm. 227, a pessoa jurídica também pode sofrer dano moral.omissis" (p. 132-132)(...)4. Responsabilidade coletiva
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Em matéria de responsabilidade civil, fala-se de um "declínio da responsabilidade individual",1 para destacar o fato de que o fenômeno imputativo se descola do indivíduo para o grupo. Neste contexto intervém a "teoria dos danos coletivos", que podem revestir formas ou expressões variadas e especiais como o caso do dano ecológico.8Faz-se, igualmente, referência ao dano causado coletivamente e sofrido por grupos.Quando se fala de grupos na responsabilidade coletiva, faz-se referência aos grupos de risco ou de autoria anônima. São tais os casos em que os danos a terceiros são causados por um grupo de vizinhos, ou uma equipe de médicos, ou de fabricantes, ou de"caçadores, sem que se possa saber quem é o autor. O problema aqui são os grupos que atuam em uma sociedade massificada, e que produzam riscos para terceiros. Estes riscos derivam de um relaxamento da atividade inibitória do sujeito pelo só fato de agir em grupo, ou ainda pelo princípio de confiança que deposita nos demais.Os grupos podem sofrer danos, como tais, e dar origem a pretensões ressarcitórias.Na medida em que se reconhecem bens coletivos, há também um dano dessa categoria derivado da lesão desse bem. A titularidade da pretensão ressarcitória não é individual porque o bem afetado não o é; é grupo no caso em que se tenha concedido a um grupo a legitimação para atuar ou, ainda, que se houve difusão.No plano da legitimação para agir, estamos habituados a que se concedam ações individuais como reconhecimento de um interesse individual, seja um direito subjetivo ou um interesse legítimo ou de fato, não reprovado pela lei.Podem existir também muitos indivíduos interessados na mesma coisa. Por exemplo, quando um aposentado reclama o reajuste de sua pensão, e o juiz lhe dá a razão, podem existir milhares de pessoas na mesma situação, como tem acontecido na Argentina. Por isso é razoável que se dite um acórdão que sirva para todos os casos semelhantes, conferindo-lhe efeitos erga omnes à coisa julgada. Com isso se economiza um gasto inútil de atividade jurisdicional.
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o interesse é individual, a legitimação é individual, mas há homogeneidade.objetiva entre todos eles, e é suscetível de uma única decisão.Além disso, pode existir um interesse que não seja de um indivíduo, mas de: um grupo como tal. O interesse grupal importa à corporação, não aos indivíduos que a compõem. Por isso o titular é o grupo e pode acionar como tal.No interesse individual, plurindividual e grupal, há uma relação direta com seu titular. Este vínculo assemelha-se à mesma noção difundida no direito privado patrimonial: desfrute sobre um bem ou uma coisa, calcada sobre o modelo do domínio; há uma relação de imediatismo.Contrariamente, há outros interesses que importam à sociedade em seu conjunto ou ainda a uma generalidade indeterminada de sujeitos. Estes são os transindividuais gerais, que podem referir-se a toda a comunidade ou a um grupo, com maior' ou menor grau de coesão em função do interesse, mais ou menos determinado. A titularidade é difusa, porque não há um vínculo direto entre uma pessoa a esse tipo de interesse. Não há nada que se assemelhe ao vínculo de domínio, ao seu imediatismo. É característico dos interesses difusos, sua individualidade: se são gerais e não há relação de imediatismo no desfrute, não há possibilidade de dividir seu gozo.Em virtude disto, designa-se a um representante, o Estado, e se dá a esse interesse geral o caráter de público. O titular é a comunidade, o legitimo é o Estado, o interesse é público.Em razão das insuficiênCias do Estado neste campo, legitima-se genérica- í mente aqueles que usam ou gozam deles. Surge assim a titularidade difusa.É importante esclarecer que esta co-titularidade não surge de um contrato, nem de uma obrigação legal, mas de um contato social, ou, de fato, cuja proximidade é reconhecida pelo legislador como suposto de fato da co-titularidade. Contrariamente, nos interesses coletivos, naqueles em que há um grupo, existe uma relação jurídica, não de fato, que fundamenta a co-titularidade.
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Finalmente, por razões de organização, legitimam-se agrupamentos, que se consideram mais eficazes que os indivíduos, para atuar neste meio.Podemos fazer a seguinte tentativa classificatória: a) interesse individual: o interesse é individual, a legitimação também, e é diverso de outros interesses; cada titular inicia uma ação e obtém uma decisão;b) interesses plurindividuais homogêneos: o interesse é individual, d' legitimação é individual, mas o interesse é homogêneo e suscetível de uma única decisão. Cada titular exerce uma ação individual, e pode obter uma decisão (seria desejável que tivesse efeito erga omnes);c) interesse transindividual coletivo: o titular do interesse é o grupo, resulta legitimado. Promove uma ação, e seus efeitos obrigam o grupo;d) interesse transindividual difuso: que importam à sociedade em seu conjunto ou a uma generalidade indeterminada de sujeitos;e) interesse público: legitima-se o Estado para a defesa de um interesse geral.Os interesses do direito "coletivo" foram conceituados como "os transindividuais de natureza indivisível de que seja titular, grupo, categoria ou classe de pessoas ligada entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base" (CDC, art. 81, par. un.).A Lei argentina 24.240 de proteção dos consumidores e usuários confere ação às associações de consumidores, constituídas como pessoas jurídicas, quando os interesses dos mesmos resultem afetados ou ameaçados (art. 52). A Lei 10.000⁄86 da Província de Santa Fé permite a defesa de "valores da comunidade" e estabelece um recurso que procede "contra qualquer decisão, ato ou omissão de uma autoridade administrativa provincial, municipal ou comunal ou de entidades ou pessoas privadas em exercício de funções públicas, que, violando disposições da ordem administrativa local, lesionarem interesses simples ou difusos dos habitantes da província". A Constituição argentina faculta ao defensor do povo e às associações que persigam esses fins, a interpor ação de amparo contra qualquer forma de discriminação, no
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relativo a direitos que protejam o meio ambiente, a concorrência, o usuário e o consumidor e os direitos de incidência coletiva em geral (art. 43).A responsabilidade civil atual apresenta duas áreas: a tutela resarcitória e a tutela inibitória. Um caso de tutela inibitória é a Lei da Ação Civil Pública, 7.347⁄ 85, art. 11, que afirma que na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de multa diária.5. Dano moralSegundo entendimento generalizado na doutrina, é possível distinguir, no âmbito dos danos, a categoria dos danos patrimoniais, de um lado, dos danos extrapatrimoniais, ou morais, de outro. A caracterização do dano moral tem sido deduzida na doutrina sob forma negativa, na sua contraposição ao dano patrimonial; assim, "quando ao dano não correspondem as características de dano patrimonial, estamos em presença de dano moral".O dano moral é susceptível de uma definição positiva: lesão aos direitos personalíssimos,14 o mais amplamente; lesão aos direitos fundamentais, individuais ou coletivos.A noção restritiva do dano moral começou a ser expandida.O agravo moral em seu sentido originário no século XIX, é uma sanção diante de um comportamento doloso do autor. De tal maneira surge quando a causa fonte do crédito indenizatório é delitual. Logo, a doutrina começou a interpretar que o dano moral é o gênero, e que o agravo moral é uma de suas espécies.O dano moral começou a ser aplicado fora dos delitos e dos quase-delitos. A partir da admissibilidade do dano moral nos contratos, abre-se um importante capítulo. Poderíamos assinalar diferentes pontos:- o ressarcimento do dano derivado do descumprimento da prestação com prometida. que é o caso de maior resistência da admissibilidade do ressarcimento;- o de interesse extrapatrimonial comprometido na prestação de
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conteúdo patrimonial, que se tem admitido com freqüência; - o dos danos sofridos pela pessoa. com motivo, ou com ocasião da celebração ou cumprimento de um contrato. Este suposto é indiscutível.O requerimento da tipicidade do dano moral para admitir sua reparação, foi se desvalorizando.O Código Civil alemão em seu art. 253 dispunha que, em se tratando de um prejuízo que não fosse pecuniário, só poderia se exigir a reparação em dinheiro.omisiss6. Dano moral coletivo ressarcitório e punitivoAno atrás, indicou-se a possibilidade jurídica do dano moral coletivo, assinalando que muitos tocam a categorias de pessoas: usuários de telefones, a comunidade habitacional de um prédio, os consumidores de uma publicidade desleal, que poderiam ver afetados sentimentos grupais.Um avanço muito importante neste tema foi dado pelo art. 43 da Constituição argentina, ao reconhecer a legitimação para agir das associações com fins de deduzir o amparo quando há lesão de direitos q'de protegem o ambiente, a concorrência, os direitos de incidência coletiva em geral.Na Argentina admitimos a possibilidade da reparação do dano moral coletivo.No Brasil, a Lei 7.347, art. 1.°, diz: "regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados (...) ao meio ambiente (...)".No suposto da lesão dos bens coletivos, e o meio ambiente, o dano moral admite uma função ressarcitória e punitiva.O criticável na tese punitiva dentro desta matéria foi que pretendia ser excludente com relação a uma finalidade reparatória, e restritiva, ao permitir somente alguns casos específicos de ressarcimento. Consolidada a tese ressarcitória, revaloriza-se progressivamente a possibilidade de utilizar a indenização como pena, recorrendo-se à tese anglo-saxônica do dano punitivo. "Na reparação dos danos morais, o dinheiro não desempenha a função de equivalência, como em regra,
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nos danos materiais, porém, concomitantemente, a função satisfatória é a pena". O que nos interessa pôr em relevo é que essa teoria aponta, basicamente, para a destruição da razão econômica, que permitiu que o dano se ocasionara. Era mais rentável deixar que o prejuízo se realizasse que preveni-lo; o dano punitivo arruína este negócio e permite a prevenção.Na concepção punitiva, não se reclama dinheiro como preço nem como reparação, mas como satisfação exigida do culpado, a vindicta, a pena. O dano moral e uma sanção por algo imoral.Na Argentina, as Jornadas Nacionales de Derecho Civil, disseram: "Es prudente establecer como requisito de admisibilidad de Ias condenaciones punitivas Ia existencia de un dafio resarcible individual o colectivo causado por el sancionado ("De lege ferenda", punto 6)". No Proyecto de Código Civil Argentino de 1998, art. 1622. Dafio a intereses de incidencia colectiva. En el caso de dafio a intereses de incidencia colectiva corresponde prioritariamente Ia reposición aI estado anterior al hecho generador, sin perjuicio de Ias demás responsabilidades. Si Ia reposición es total o parcialmente imposible, el responsable debe reparar e! dafio mediante otros bienes que satisfagan intereses de incidencia colectiva equivalentes aIos afectados. Están legitimados para accionar el damnificado directo, el defensor deI pueblo, el Ministerio Público y Ias asociaciones que propenden a Ia defensa de esos intereses y están registradas conforme a Ia ley especial."O advento do novel ordenamento constitucional - no que concerne à proteção ao dano moral - possibilitou ultrapassar a barreira do indivíduo para abranger o dano extrapatrimonial à pessoa jurídica e à coletividade.No que pertine a possibilidade de reparação por dano moral a interesses difusos como sói ser o meio ambiente amparam-na: art. 1º da Lei da Ação Civil Pública e o art. 6º, VI, do CDC.(...)
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Deveras, o dano moral individual difere do dano moral difuso e in re ipsa decorrente do sofrimento e emoção negativas. Destarte, não se pode olvidar que o meio ambiente pertence a todos, porquanto a Carta Magna de 1988 universalizou este direito, erigindo-o como um bem de uso comum do povo. Desta sorte, em se tratando de proteção ao meio ambiente, podem co-existir o dano patrimonial e o dano moral, interpretação que prestigia a real exegese da Constituição em favor de um ambiente sadio e equilibrado.Sob o enfoque infraconstitucional a Lei n. 8.884⁄94 introduziu uma alteração na LACP, segundo a qual passou a ficar expresso que a ação civil pública objetiva a responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados a quaisquer dos valores transindividuais de que cuida a lei.Outrossim, A partir da Constituição de 1988, existem duas esferas de reparação: a patrimonial e a moral, separadamente, ou seja, pode o cidadão responder pelo dano patrimonial causado e também, cumulativamente, pelo dano moral, um independente do outro.
O egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região também
admite a configuração do dano moral com repercussão coletiva,
senão vejamos:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OFENSAS CONTRA COMUNIDADEINDÍGENA. DANO MORAL COLETIVO. MAJORAÇÃO.1. Tendo restado demonstrada a discriminação e o preconceito praticados pelos réus contra grupo indígena Kaingang, é devida indenização por danos moral.2. O dano moral coletivo tem lugar nas hipóteses onde exista um ato ilícito que, tomado individualmente, tem pouca relevância para cada pessoa; mas, frente à coletividade, assume proporções que afrontam o senso comum.
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3. Indenização por danos morais majorada para R$ 20.000,00, a ser suportada de forma solidária por ambos os réus desta ação (TRF 4ª Região, Apelação Cível, Processo n.° 200371010019370, relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA).
Consubstanciado a necessidade de se reparar o dano
moral coletivo, este deve ser fixado em patamares suficientes para
reparar o mal causado, além de funcionar como fator de inibição de
outras ilegalidades e punição das já consumadas.
Em se considerando que existem nos municípios de São
Miguel do Araguaia e Mundo Novo (integrantes da comarca) cerca de
6.277 (seis mil duzentos e setenta e sete) ligações feitas pela
empresa ré, conforme por ela mesmo informado, nos ofícios-
resposta em anexo, pode-se entender que este número é o melhor
referencial para se demonstrar o número de vezes que houve a
lesão do direito perpetrado, na medida em que ou se cobrou
efetivamente a instalação, ou ainda deixou o usuário/consumidor de
instalá-lo por falta de condições financeiras para arcar com tal
despesa, tendo assim que pagar a esdrúxula “taxa mínima”.
Como, segundo tabela fornecida, em anexo, confirmada
pela ré, faz-se a cobrança de R$ 51,67 (cinqüenta e um reais e
sessenta e sete centavos) por cada hidrômetro instalado, em se
multiplicando este valor por 6.277 teríamos R$ 324.332,59
(trezentos e vinte e quatro mil e trezentos e trinta e dois reais e
cinqüenta e nove centavos), numerário que consideramos justo,
necessário e apto a sanar o dano moral coletivo perpetrado.
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O valor deverá ser revertido ao Conselho da
Comunidade da Comarca de São Miguel do Araguaia, instituído
por este juízo.
IV – DO PEDIDO LIMINAR
Da análise do arcabouço trazido com esta vestibular,
vislumbram-se presentes os pressupostos que rendem azo ao
deferimento da medida liminar, nos termos do artigo 12 da Lei n.°
7.347/85 c/c o artigo 84 do Código de Defesa do Consumidor. Esta
medida é possível porque a tese jurídica exposta é plausível e
fundada na necessidade de se assegurar a fruição da tutela de
mérito pretendida antes da estabilização da demanda e da
efetivação do contraditório.
Disso, resulta que em se continuando a desmedida
cobrança por parte da empresa ré, incontáveis consumidores
continuarão a pagar duplamente o mesmo serviço. Ou melhor,
continuarão a enriquecer a parte ré sem causa prevista no
ordenamento. E pior, com o passar do tempo, mais e mais
consumidores/usuários continuarão a serem atingidos por essa
cobrança, sem meio de defesa, pois, conforme o artigo 40, da Lei
11.445/2007, é possível existir até o corte do abastecimento de
água, caso o consumidor se recuse em pagar o preço pedido.
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Pois bem, estão presentes a fumaça do bom direito e o
perigo da demora. Assim, requer o parquet à imediata suspensão
por parte da SANEAGO, da cobrança do referido “serviço” de
instalação/manutenção/conservação do hidrômetro de todos
os usuários da Comarca de São Miguel do Araguaia
(englobando os Municípios de São Miguel do Araguaia e
Mundo novo), bem como a imediata suspensão do pagamento
daqueles que se encontram em curso.
Em caso de descumprimento desta, requer ainda a
cominação de multa na ordem de R$ 5.000,00 (cinco mil
reais) por cada consumidor/usuário que for impelido pela ré
a pagar pelo irregular serviço de instalação de hidrômetro.
V – DOS PEDIDOS DEFINITIVOS
Tecidas estas razões, o Ministério Público do Estado
de Goiás requer:
a) Que seja concedido o pedido liminar na forma do item
IV;
b) Que a presente Ação Civil Pública seja recebida,
autuada e processada, eis que presentes os requisitos
dos artigos 282 e 283 do Código de Processo Civil e da
Lei 7.347/85;
c) Que seja citado o requerido na pessoa de seu
representante legal, na forma em que preceitua o
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Código de Processo Civil para, querendo, ofertar
resposta, sob pena de confissão quanto à matéria de
fato e sob os efeitos da revelia;
d) Que, após a regular tramitação processual, seja julgado
procedente o pedido nessa Ação civil Pública para
que a empresa ré se abstenha de cobrar dos
usuários do serviço de abastecimento de água nos
Municípios de São Miguel do Araguaia e Mundo
Novo a indevida cobrança de
instalação/manutenção/conservação de
hidrômetro;
e) Que a SANEAGO seja condenada, nos termos do artigo
parágrafo único, do artigo 42, do CDC, a restituir, em
dobro, acrescido de correção monetária e juros
legais o valor cobrado indevidamente, e já pago,
total ou parcialmente, pelos consumidores para a
instalação de hidrômetros desde 15 de setembro
de 2004 até a data do julgamento do julgamento
da presente Ação Civil Pública;
f) Que, até para garantir o transporte da coisa julgada,
que pode beneficiar milhares de consumidores
prejudicados com a desmedida cobrança e que já a
pagaram em parte ou em sua integralidade, e
autorizado no §3°, do artigo 103, do Código de Defesa
do Consumidor, a empresa ré, após o deferimento do
pedido, seja compelida a custear ampla divulgação
junto aos meios de comunicação, na Comarca de
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São Miguel do Araguaia, do resultado positivo do
presente feito, para, assim, possibilitar aos
consumidores à liquidação e a execução nos
termos dos artigos 96 a 99, do CDC;
g) Cominação de astreintes, nos mesmos valores da
multa diária supra, para assegurar o cumprimento da
decisão final;
h) A condenação da Ré ao pagamento de INDENIZAÇÃO
POR DANOS MORAIS COLETIVOS, em valor não
inferior a R$ 324.332,59 (trezentos e vinte e quatro
mil e trezentos e trinta e dois reais e cinqüenta e nove
centavos), valor este a ser revertido ao Conselho da
Comunidade da Comarca de São Miguel do Araguaia;
i) Que seja declarada nula de pleno direito a seguinte
cláusula “Guardar e conservar, na condição de fiel
depositário, o padrão de ligação de Água, o
hidrômetro e outros dispositivos da
SANEAGO” (item 4.3 do contrato em anexo), face aos
expostos, para com os consumidores residentes na
presente comarca, que alberga São Miguel do Araguaia
e Mundo Novo.
j) A produção de todas as provas admitidas em direito,
notadamente documental, depoimento pessoal do réu,
sob pena de confissão, oitiva das testemunhas que
oportunamente serão arroladas, perícias e inspeções.
Termos em que pede deferimento.
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Dá-se à causa o valor de R$ 324.332,59 (trezentos
e vinte e quatro mil e trezentos e trinta e dois reais e
cinqüenta e nove centavos), para efeitos meramente fiscais.
São Miguel do Araguaia/GO, 27 de novembro de 2007.
Cristhiano Menezes da Silva CairesPromotor de Justiça Substituto