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ESTRATÉGIAS DE AVALIAÇÃO NO ENSINO JURÍDICO VALUATION STRATEGIES IN LEGAL EDUCATION Rosendo Freitas de Amorim Olivia Pinto de Oliveira Bayas Queiroz RESUMO Constata-se uma crise no ensino jurídico do Brasil, como parte do problemático quadro apresentado pelo sistema educacional do país, consequência da precariedade da educação básica. Não obstante os problemas enfrentados pelo ensino superior brasileiro em geral, o ensino jurídico possui problemas particulares, relacionados ao perfil do professor e do aluno, à metodologia e avaliação do ensino, bem como à estrutura curricular, dentre outros aspectos. Partindo desse pressuposto, faz-se necessária uma reflexão no sentido de não somente reconhecer deficiências, mas principalmente de sugerir propostas capazes de contribuir para melhoria do ensino jurídico no Brasil. O presente estudo objetiva analisar o sistema de avaliação do processo ensino/aprendizagem e propor estratégias avaliativas capazes de contribuir para a transformação do ensino jurídico brasileiro. Mediante pesquisa bibliográfica, buscou-se responder aos seguintes questionamentos: a) O que é avaliação? b) Quais os métodos avaliativos? c) Como se caracterizam? d) Quais as críticas que sofrem? e) Tais métodos são adequados para avaliar a aprendizagem do ensino jurídico? Por quê? Para tanto, foi necessária a contextualização sobre a atual conjuntura do ensino jurídico. Em seguida, tomou-se a avaliação como instrumento capaz de transformar o ensino jurídico nacional, partindo do seu conceito, características, espécies, críticas, para, ao final, analisar a viabilidade e adequação dos instrumentos avaliativos no ensino do Direito no Brasil. PALAVRAS-CHAVES: PALAVRAS-CHAVE: ENSINO JURÍDICO, APRENDIZAGEM, AVALIAÇÃO, CRISE. ABSTRACT There is a crisis in legal education in Brazil, as part of the problem table by the country's educational system, to the precariousness of basic education. Despite the problems faced by the Brazilian higher education in general, the legal education has particular problems, related to the profile of the professor and the student, the methodology and evaluation of teaching and the curriculum structure, among other things. On this assumption, it is necessary to consider not only to acknowledge shortcomings, but mainly to suggest proposals able to contribute to improvement of legal education in Brazil. This study aims to analyze the system for evaluating the teaching / learning strategies and propose evaluation capable of contributing to the transformation of legal education in Brazil. Through literature search, we tried to 4608

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ESTRATÉGIAS DE AVALIAÇÃO NO ENSINO JURÍDICO

VALUATION STRATEGIES IN LEGAL EDUCATION

Rosendo Freitas de Amorim Olivia Pinto de Oliveira Bayas Queiroz

RESUMO

Constata-se uma crise no ensino jurídico do Brasil, como parte do problemático quadro apresentado pelo sistema educacional do país, consequência da precariedade da educação básica. Não obstante os problemas enfrentados pelo ensino superior brasileiro em geral, o ensino jurídico possui problemas particulares, relacionados ao perfil do professor e do aluno, à metodologia e avaliação do ensino, bem como à estrutura curricular, dentre outros aspectos. Partindo desse pressuposto, faz-se necessária uma reflexão no sentido de não somente reconhecer deficiências, mas principalmente de sugerir propostas capazes de contribuir para melhoria do ensino jurídico no Brasil. O presente estudo objetiva analisar o sistema de avaliação do processo ensino/aprendizagem e propor estratégias avaliativas capazes de contribuir para a transformação do ensino jurídico brasileiro. Mediante pesquisa bibliográfica, buscou-se responder aos seguintes questionamentos: a) O que é avaliação? b) Quais os métodos avaliativos? c) Como se caracterizam? d) Quais as críticas que sofrem? e) Tais métodos são adequados para avaliar a aprendizagem do ensino jurídico? Por quê? Para tanto, foi necessária a contextualização sobre a atual conjuntura do ensino jurídico. Em seguida, tomou-se a avaliação como instrumento capaz de transformar o ensino jurídico nacional, partindo do seu conceito, características, espécies, críticas, para, ao final, analisar a viabilidade e adequação dos instrumentos avaliativos no ensino do Direito no Brasil.

PALAVRAS-CHAVES: PALAVRAS-CHAVE: ENSINO JURÍDICO, APRENDIZAGEM, AVALIAÇÃO, CRISE.

ABSTRACT

There is a crisis in legal education in Brazil, as part of the problem table by the country's educational system, to the precariousness of basic education. Despite the problems faced by the Brazilian higher education in general, the legal education has particular problems, related to the profile of the professor and the student, the methodology and evaluation of teaching and the curriculum structure, among other things. On this assumption, it is necessary to consider not only to acknowledge shortcomings, but mainly to suggest proposals able to contribute to improvement of legal education in Brazil. This study aims to analyze the system for evaluating the teaching / learning strategies and propose evaluation capable of contributing to the transformation of legal education in Brazil. Through literature search, we tried to

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answer the following questions: a) What is evaluation? b) What are the evaluation methods? c) How to characterize? d) What are the criticisms that have? e) These methods are adequate to evaluate the learning of legal education? Why? Thus, it was necessary to contextualize the current situation of legal education. Then took up the assessment as a tool capable of transforming the national education law, starting from its concept, characteristics, species, critical to the end, examine the feasibility and appropriateness of assessment tools in the teaching of law in Brazil.

KEYWORDS: KEY WORDS: LEGAL TEACHING, LEARNING, VALUATION, CRISIS.

INTRODUÇÃO

O ensino jurídico encontra-se em crise. Trata-se de um quadro enfrentado pelo sistema educacional como um todo (ENCARNAÇÃO, 1995, p. 110), fruto da educação básica. Não obstante os problemas comuns ao sistema educacional geral, o ensino jurídico também possui problemáticas particulares, relacionadas ao perfil do professor e do aluno, à metodologia do ensino e de avaliação, à estrutura curricular e outros aspectos.

Partindo desse pressuposto, faz-se necessária uma contribuição no sentido de, não somente conscientizar a respeito do atual momento educacional, mas, principalmente, de oferecer soluções capazes de transformar o ensino jurídico.

O presente estudo, portanto, tem por objetivo analisar o sistema de avaliação de aprendizagem para, ao final, propor estratégias avaliativas capazes de contribuir para a transformação do ensino jurídico brasileiro.

Mediante pesquisa bibliográfica, buscou-se responder aos seguintes questionamentos: a) O que é avaliação? b) Quais os métodos avaliativos? c) Como se caracterizam? d) Quais as críticas que sofrem? e) Tais métodos são adequados para avaliar a aprendizagem do ensino jurídico? Por quê?

Previamente torna-se pertinente uma análise acerca do ensino jurídico brasileiro hodierno, buscando apresentar uma contextualização sobre a atual conjuntura educacional. Em seguida, toma-se a avaliação como um significativo instrumento capaz de aprimorar o ensino jurídico, partindo do seu conceito, características, espécies, críticas, para, ao final, analisar a viabilidade e adequação dos instrumentos avaliativos no ensino do Direito no Brasil.

1 ENSINO JURÍDICO NO BRASIL

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Não há que se falar em ensino sem aprendizagem, tampouco em aprendizagem sem ensino. Afinal, “não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender” (FREIRE, 2007, p. 23).

Para que o processo de aprendizagem tenha sucesso é necessário um ensino de qualidade. Mas o que vem a ser qualidade no processo de ensino? Quais os parâmetros para se estabelecer a qualidade do ensino de um curso superior?

Segundo Getulino do Espírito Santo Maciel (1995, p. 90-91), a qualidade do ensino refere-se à análise global dos seguintes elementos: corpo docente, corpo discente, estruturação dos currículos, filosofia da instituição na condução do tripé ensino/pesquisa/extensão e absorção pelo mercado de trabalho da mão-de-obra formada.

O curso de Direito é composto por um corpo docente que, em sua grande maioria, exerce o magistério como uma segunda profissão ou até mesmo por diletantismo, razão pela qual os professores costumam ser desinteressados pela formação didático-pedagógica. Essa situação gera ausência de interação docente-discente, aulas expositivas dogmáticas e desprovidas de diálogo com o alunado – fruto do processo de aprendizagem daqueles que hoje fazem parte do corpo de professores da universidade –, ensino acrítico e, ainda, desinteresse do estudante por pesquisas. Cabe ressaltar que a estrutura curricular “mínima” costuma ser confundida com “suficiente”, responsável pela não formação de profissionais “plenos”, mas de “menor alcance” (FARIA, 1995, p. 102).

Outro aspecto a ser analisado, refere-se ao tipo de aluno predominante no ensino superior. Ferreira Sobrinho (1997, p. 54) distingue o aluno nominal do aluno real, sendo o primeiro o “que apenas está presente em uma sala de aula, por imposição curricular”, e o segundo o “ que lá se encontra com o desejo de aprender alguma coisa”.

Nas universidades, infelizmente, predomina o aluno nominal. Trata-se de um indivíduo desinteressado das coisas sérias do estudo mas que pretende colar grau com um mínimo de esforço. Freqüenta as aulas apenas porque as disciplinas fazem parte da exigência de conclusão do curso. Entretanto, se pudesse, ficaria em casa, na praia ou nos barzinhos da vida, encharcando-se de bebida alcoólica ou de outra coisa pior, à espera do diploma que cairia do céu. (FERREIRA SOBRINHO,1997, p. 54)

Diante desse quadro, como o mercado de trabalho poderá absorver a quantidade de mão-de-obra resultante do processo falho de ensino-aprendizagem? Afinal, supõe-se que os bacharéis que se graduem em tal contexto, genericamente, não estejam aptos para representarem a sociedade juridicamente, seja no campo público ou privado.

Mais do que ensinar o exercício de uma atividade profissionalizante, os cursos de Direito deveriam formar cidadãos, educar para a cidadania, colaborar para a conscientização do indivíduo sobre o seu papel social, desenvolver o raciocínio crítico, ensinar a pensar.

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Acerca da educação como instrumento de cidadania, Leonel Severo Rocha (1995, p. 69-70) apresenta comentários ao “balanço da educação imperial” feito em 1882 por Rui Barbosa:

(...) Assim, ele [Rui Barbosa] entendia que a educação era uma das condições necessárias para a existência de uma cidadania plena (ROCHA, 1995, p. 69-70).

(...) Rui Barbosa estava consciente de que Mill tinha vantagem, em relação a Comte, de recusar a priori toda concepção determinista do indivíduo, fundada, como pregava o positivismo, na existência da revolução de leis naturais, pois o inglês defendia de maneira intransigente a liberdade. Para Mill, a liberdade era a própria condição de existência do indivíduo.

Assim, pensamos que a metodologia intuitiva de Rui Barbosa deve ser interpretada na perspectiva de Mill, fundada na liberdade; jamais poderia levar a políticas autoritárias. O método intuitivo de Rui Barbosa, como premissa necessária ao desenvolvimento da sociedade, defendia a criatividade e a liberdade. (ROCHA, 1995, p. 79-80)

João Bosco da Encarnação (1995) entende que o Direito deveria ser comprometido com a Verdade (Filosofia), com a resposta prática a essa Verdade (Arte) e com a técnica, o direito processual (Tecnologia). Entretanto, após análise, o mesmo autor conclui que:

(...) o Direito fica no meio do caminho, como técnica esvaziada. Ignora o seu nascedouro na essência do seu “ser social”, e não desemboca na realidade prática da vida social.

Essa a razão para que o Direito permaneça alheio à vida da sociedade, como propriedade dos técnicos, os “juristas”, e nas mãos deles, cada vez mais se “tecnize” e se isole. (ENCARNAÇÃO, 1995, p. 114)

A partir da constatação supracitada, cabe tentar mudar essa realidade. Não adianta atribuir culpa ao “sistema” e furtar-se enquanto, professor, aluno ou cidadão, de tomar iniciativas no sentido de superar esta realidade. Conforme Eduardo de Oliveira Leite (1995, p. 18):

Alardear a incapacidade discente para a reflexão e a crítica é fácil. Constatar a inexistência das condições necessárias mínimas ao desenvolvimento dos estudos superiores é chavão surrado que não pode mais ser repetido de forma leviana e aleatória, como se o problema escapasse da nossa esfera de atuação.

Dentro desse contexto, pretende-se analisar instrumentos avaliativos, suas características, aplicabilidade, críticas e, por fim, sua viabilidade e adequação ao ensino nos cursos de Direito do Brasil, possibilitando uma transformação na melhoria da qualidade do ensino jurídico nacional.

2 AVALIAÇÃO DO PROCESSO ENSINO E APRENDIZAGEM

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Segundo Vani Moreira Kenski (1989, p. 131), “o ato de avaliar está presente em todos os momentos”. Diariamente costuma-se assumir posições, atribuir juízos, tudo baseado na individualidade, valores e personalidade de cada um.

A avaliação da aprendizagem em uma escola ou universidade é “o processo que envolve o conhecimento da realidade e sua transformação, conseguinte as estratégias, instrumentos, registros e intervenções compõem a avaliação” (BENFATTI, 2008, p. 17).

A avaliação, portanto, é necessária para que se verifique o grau de aprendizagem pelo aluno do conteúdo estudado. O nível de aprendizagem poderá ser constatado através de nota ou conceito. A nota é apenas uma conseqüência do processo ensino/aprendizagem, e não um fim em si mesmo, ou o objetivo maior a ser buscado.

Contudo, verifica-se que a avaliação sofreu uma transformação em seu sentido, na realidade, uma perversão. Acerca da “avaliação pervertida” ou “perversão da avaliação”, Celso dos Santos Vasconcellos (1992, p. 9) dispõe:

No princípio era o caos. Um dia, o professor descobriu que podia mandar o aluno para fora de sala de aula, que a instituição cuidava de ameaçá-lo com a expulsão. Mais tarde um pouco, descobriu que tinha em suas mãos uma arma muito mais poderosa: a nota. Começa a usá-la, então, para conseguir a ordem no caos. O caos se fez cosmos, o maldito cosmos da nota...

Há uma inversão de valores no processo de aprendizagem, em que se busca obter uma nota a todo custo, como se os fins justificassem os meios. Para tanto, não somente os alunos fazem uso de “cola” ou “pesca”, mas também de técnicas de memorização, “decorando” nomes, datas, dispositivos legais.

A “cola” é repudiada por tratar-se de pesquisa em procedimento avaliativo no qual não é permitida a consulta a materiais, acarretando, portanto, desigualdade entre os avaliados. No entanto, a famosa “decoreba” ainda é exigida dos alunos, por terem que se preparar para processos avaliativos que não exigirão dos mesmos um raciocínio reflexivo ou crítico, mas apenas números e frases prontas.

A memorização por si só proporciona apenas uma aprendizagem superficial, a qual será esquecida ao final da avaliação; não há um conhecimento contínuo, conteúdos acumulados, pois o que se memorizou objetivando uma nota, após a sua obtenção não há porque continuar armazenado no cérebro.

Dessa forma, a memorização com a finalidade apenas de obtenção de nota também deve ser repudiada. Para tanto, o professor é um agente importante, pois é o responsável pelo estabelecimento do processo de avaliação a ser utilizado.

O professor não pode sucumbir e utilizar a avaliação como um instrumento de poder, subjugando seus alunos. Tal comportamento contribui ainda mais para uma cultura de submissão à nota.

(...) todos os dias tem-se o poder sendo exercitado inadequadamente dentro da universidade. Toma-se como referencial o seguinte: (...) quando um professor

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universitário decide, aleatoriamente, quem passará de ano e quem será reprovado, qual o rótulo que se pode dar para isto? Talvez poder seja uma palavra aceitável, não acham?

Com efeito, (...) existe induvidosamente uma relação de poder. Mas poder utilizado nocivamente, quase sempre como instrumento de satisfação de desequilíbrios pessoais. (...)

Infelizmente não é possível, pelo menos atualmente, evitar que os professores universitários exercitem, de forma abusiva ou inadequada, a idéia de avaliação. Entendem como avaliação algo que é apenas uso arbitrário da condição de professor, uma vez que avaliar não é uma tarefa simples. (FERREIRA SOBRINHO, 1997, p. 88-89)

Importante mencionar o stress, a ansiedade, a angústia e o sofrimento pelos quais passam diversos alunos quando estão em “semana de prova”. Sobre o assunto, Xênia Diógenes Benfatti (2008, p. 19) dispõe:

(...) Quanto maior a expectativa anunciada pelo professor, maiores serão as possibilidades da ansiedade ser instaurada antes, durante e depois da aplicação dos testes. Há relatos de alunos que falam de suas angústias geradas em momentos de testagem, e que destacam a atitude docente como recorrente a essa tensão. Outros chegam em sua sala de aula nos dias de folga nos dias de prova e fazem tantas recomendações que chegam a amedrontar o aluno, e há ainda os que se recusam a falar e tirar suas dúvidas, e o que circulam, insistentemente, pela sala a procura de situações inflacionárias. Tais comportamentos não valorizam a aprendizagem, mas sim o poder e a autoridade do exame.

A avaliação também não pode ser utilizada como instrumento de vingança pessoal do professor contra o aluno, tampouco como meio de barganha, objetivando a obtenção de favores imorais. A avaliação deve ser “efetiva” (FERREIRA SOBRINHO, 1997, p. 90), resultando da correta apreciação pelo professor.

A avaliação é conseqüência natural do processo de aprendizagem. Não deve ser vista como um fim em si mesmo, pois o que se busca em sala de aula é “ensinar e aprender” recíprocos entre professor-aluno, e não apenas uma nota.

Ainda sobre o assunto, Xênia Diógenes Benfatti (2008, p. 14) defende que:

A atividade avaliativa impressa no planejamento deverá estar pautada para a transformação dos sujeitos protagonizados nas atividades desenvolvidas, e não somente para a verificação dos dados coletados. A razão da avaliação não deverá estar dirigida para a nota, mas para as ações e atividades que possibilitem a compreensão dos sujeitos e a superação dos desafios da aprendizagem individual e coletiva. A nota não pode ser o centro do processo de ensino e de aprendizagem, quando assim é colocada tira-se de foco o que deve justificar a aprendizagem, que é a descoberta, a construção e o desenvolvimento do ser. O estudo não pode estar a serviço da nota, mas a serviço da aprendizagem e do desenvolvimento do ser.

Vale ressaltar que a nota nem sempre traduz com fidedignidade o grau de conhecimento e aprendizagem do alunado. Aspectos que interferem negativamente no grau de

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fidedignidade da nota alcançada: ansiedade prévia e durante a avaliação, assuntos de foro íntimo ligados à vida privada do aluno, questões mal-elaboradas, pressão do professor durante a avaliação.

Mesmo com tantos riscos da nota obtida pelo aluno não corresponder ao seu verdadeiro grau de apreensão e conhecimento, a avaliação ainda é um instrumento necessário ao sistema de aprendizagem.

O grande desafio reside em avaliar da forma mais fidedigna possível. Para tanto, o professor possui um importante papel, devendo, pois, possuir uma preparação didático-pedagógica para elaborar procedimentos avaliativos adequados aos alunos que possui, à matéria que ensina e desenvolve com seus alunos. Além do conhecimento pleno do assunto estudado, é preciso, também, criatividade na elaboração de atividades.

Também é imprescindível ter em mente que a avaliação não consiste em um momento estanque, isolado do todo. Se a avaliação faz parte do processo de aprendizagem, então ela está presente em todos os momentos do ensino. Afinal, “alunos e professores estão permanentemente avaliando a tudo e a todos” (KINSKI, 1989, p. 133).

Partindo desse pressuposto, defende-se que avaliação isolada e aplicada em um determinado momento da aprendizagem não será reflexo do processo como um todo, somente referindo-se àquela determinada situação. Qual metodologia de avaliação deve, então, ser utilizada pelo professor que busca avaliar o seu aluno de uma forma mais fidedigna e comprometida com um projeto de ensino do curso de Direito, voltado ao estudo reflexivo e raciocínio crítico?

A avaliação efetiva vai se dar durante o processo, nas relações dinâmicas de sala de aula que orientam as tomadas de decisões freqüentes, relacionadas ao tratamento do conteúdo e à melhor forma de compreensão e produção do conhecimento pelo aluno.

Para que isso ocorra faz-se necessário que o professor esteja permanentemente atento às alterações de comportamento dos alunos. Que haja um clima favorável à participação de todos em sala de aula. Que os alunos não se sintam reprimidos e possam manifestar suas dúvidas, inquietações e incompreensões quanto ao que está sendo aprendido. (KINSKI, 1989, p. 139)

A mesma autora sugere a realização de auto-avaliação pelos alunos, e formulação de atividades pelo professor através de paradas para reflexão, “para que os alunos individualmente ou em grupos possam utilizar o conjunto de conhecimentos apreendidos para criar, questionar, sugerir, procurar novas formas de aplicar aquele saber, enfim mostrar as transformações que o novo saber lhes proporcionou” (KINSKI, 1989, p. 141).

A auto-avaliação nesse contexto passa a ter uma grande importância. A opção por um ensino transformador leva a que o aluno precise ter oportunidades de desenvolvimento de sua capacidade crítica e, para isso, é importante que ele tenha condições não só de criticar o que lhe é externo. Que essa capacidade se volte para dentro de si mesmo nas suas relações com o conhecimento e com os outros, através da auto-crítica, da auto-avaliação.

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(...) Essas paradas para reflexão tendo em vista a verificação da aprendizagem dos alunos não podem ser, porém, o único elemento sob o qual o aluno vá ser avaliado. O professor precisa ter a preocupação de, no decorrer do processo, utilizar diferentes meios através dos quais os alunos tenham oportunidades de demonstrar o seu aprendizado, as relações que vem estabelecendo entre o novo conhecimento e as aprendizagens anteriores, e as relações que fazem entre o conteúdo aprendido e a realidade histórico-concreta em que se situam. Para isto deve o professor propor a execução de diferentes atividades pelos alunos, elaboradas em grupo ou individualmente, como a realização de experimentos, elaboração de projetos, participação em discussões etc... (KINSKI, 1989, p. 141-142)

Como aplicar em termos concretos tal concepção em turmas com aproximadamente cinqüenta alunos? Realmente é desumano exigir do professor conhecer individualmente cada um de seus cinqüenta alunos (sem mencionar que os professores costumam ser responsáveis por diversas turmas!) e, além disso, ser capaz de avaliar fidedignamente cada um diariamente.

Como utilizar-se de todos os instrumentos avaliativos adequados, oferecendo espaço para a discussão e reflexão em sala de aula, quando se tem apenas uma carga-horária, em geral, insuficiente para lecionar todo o conteúdo programático da matéria? Sabe-se que algumas disciplinas são prejudicadas em virtude da ausência de horas-aula suficientes para o programa ser “ensinado”, ou seja, através de aulas expositivas fechadas, sem abertura para debates e questionamentos . Imagine-se, então, se o professor decidir fazer uso de avaliações diárias reflexivas?

Vale ressaltar, também, a comodidade (e, em alguns casos, a necessidade!) em utilizar-se de avaliações de “fácil” correção. Os professores normalmente são responsáveis por diversas turmas, disciplinas, algumas vezes em instituições diferentes, para poder sustentar-se economicamente. Dessa forma, para conseguirem cumprir o prazo estabelecido pelas instituições de ensino, têm que se valer de mecanismos nem sempre adequados ao ensino transformador, como, por exemplo, o uso de provas objetivas.

A realidade do sistema avaliativo reflete apenas uma das vertentes da crise enfrentada pelo ensino jurídico. É preciso que o professor assuma a responsabilidade que lhe é exigida, principalmente no âmbito do ensino jurídico, o qual exige uma formação cidadã, crítica, reflexiva.

(...) a responsabilidade do professor na apresentação de um determinado tema é absoluta, dependendo dos elementos levantados pelo docente, ele estará proporcionando aos alunos a possibilidade de novas incursões no conhecimento jurídico, limitando a criatividade e o exercício da imaginação O Direito – e esta é uma das razões que explica o desinteresse dos alunos pela ciência jurídica – é apresentado como algo definitivo, acabado, pronto, como ciência estática quando, na realidade, é essencialmente dinâmica.

O exame das fontes – doutrina, legislação, jurisprudência, teses, revistas jurídicas -, quando realmente realizado (e aqui o pressuposto de um corpo docente gabaritado deve ser inquestionável) conduz normalmente o corpo discente no mesmo caminho. (LEITE, 1995, p. 36)

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O compromisso do professor é essencial para o enfrentamento da crise do ensino jurídico, bem como os gestores das instituições de ensino jurídico . É sob uma perspectiva de avaliação transformadora, que o professor deve buscar que os resultados do processo avaliativo constituam parte de um diagnóstico fidedigno da realidade ensino-aprendizagem, proporcionando tomadas de decisões sobre o que fazer para superar os problemas constatados (VASCONCELLOS, 1992, p. 49).

Para tanto, faz-se necessário analisar criticamente alguns instrumentos avaliativos e sua viabilidade para a avaliação no ensino jurídico.

3 INSTRUMENTOS AVALIATIVOS

3.1 PROVA

Inicialmente, é importante observar que prova não é sinônimo de avaliação. A prova é “um instrumento de avaliação que verifica o desempenho do aluno em uma determinada circunstância de aprendizagem” (BENFATTI, 2008, p. 14). Constitui, portanto, apenas um dos vários instrumentos avaliativos existentes no processo de aprendizagem.

A aplicação de provas é bastante comum no ensino jurídico. No entanto, para o seu uso adequado, faz-se necessário que o professor esteja preparado para o “devido emprego técnico-pedagógico de elaboração e análise desses instrumentos” (BENFATTI, 2008, p. 11). Tal preparação é importante em virtude dos seguintes aspectos:

(...) As provas elaboradas sem o conhecimento técnico-pedagógico necessário apresentam questões mal formuladas, valorização dos itens inadequada, conteúdo não representativo e critérios não definidos, são instrumentos que fazem do aluno vítima de um resultado não representativo. (BENFATTI, 2008, p. 12)

Antes da elaboração de uma prova torna-se imprescindível que o professor tenha em mente algumas questões: “quais os objetivos de aprendizagem; qual a função destes objetivos e o que os alunos sabem após as aulas ministradas”(FERREIRA, SOBRINHO, 1997, p. 92).

Após os questionamentos prévios, o professor está apto a elaborar sua prova que poderá ser escrita ou oral, dissertativa ou objetiva. No curso de Direito é importante priorizar a argumentação. Dessa forma, deve o professor utilizar-se principalmente de testes dissertativos, seja oral ou escrito. Através de tal estilo, será possível avaliar o raciocínio lógico seguido pelo aluno até a sua conclusão.

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No entanto, Dinah Martins de Souza Campos (apud FERREIRA SOBRINHO, 1997, p. 93) apresenta não somente vantagens, mas também desvantagens das questões dissertativas:

1. Vantagens:

- relativamente fáceis de serem organizadas.

- podem ser rapidamente escritas no quadro negro.

- não exigem grande número e questões.

- possibilitam ao aluno organizar seu pensamento e apresenta-lo subjetivamente.

- avaliam a capacidade de interpretar, avaliar e criticar do aluno.

2. Desvantagens:

- ressente-se de uma amostra adequada.

- podem não ser representativas do rendimento do aluno.

- valorizam mais a habilidade de redação do que o conteúdo.

- a correção é difícil, reflete a influência de fatores pessoais do professor que a corrige.

- gastam muito tempo e energia do aluno e do professor.

A desvantagem mais preocupante da prova dissertativa reside na possibilidade de refletir a subjetividade do professor na sua correção. A prova objetiva, por sua vez, afasta a tal influência, entretanto não deixa de apresentar uma série de desvantagens.

Há uma grande necessidade do estudante de Direito em treinar a redação, raciocínio lógico, quesitos não avaliados pelos testes objetivos. Questões de certo/errado, de verdadeiro/falso, de correspondência, de múltipla escolha, de ordenação favorecem o “chute”, o improviso, a sorte. Mais do que nunca, observa-se que a nota em testes objetivos não reflete com fidedignidade a aprendizagem dos conhecimentos pelo aluno.

Entretanto, isso não quer dizer que questões objetivas sejam proibidas no ensino jurídico:

Eventualmente o professor de Direito poderá fazer testes objetivos. Mas certamente não deverá utilizá-los como regra, a menos que queira ver seus alunos sendo craques na arte de ligar respostas e preencher lacunas e ignorantes naquilo que precisarão quando ingressarem na vida profissional. (FERREIRA SOBRINHO, 1997, p. 98)

Os testes orais revelam grande importância no curso de Direito, afinal, o profissional da área deverá utilizar-se da retórica em sua atuação enquanto advogado, promotor,

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procurador e juiz. Para que o aluno desenvolva a retórica em sala de aula faz-se necessário que o professor evite comentários jocosos pelos alunos, imponha educação e respeito ao colega que está sendo avaliado.

José Wilson Ferreira Sobrinho (1997, p. 98-99) dispõe da seguinte forma sobre o assunto:

Como se pode pensar um Bacharel em Direito que não conheça, pelo menos, rudimentos da retórica? Certamente que isto não é razoável como também não é crível que um grande cirurgião possa não manejar o bisturi de forma impecável.

(...) Portanto, o exame oral, no caso do Curso de Direito, ainda tem sua validade. Aliás, é recomendável que o professor faça, de modo intermitente, exames orais dentro da sala de aula a fim de desinibir os alunos, principalmente aqueles que se mostrem vocacionados para a docência.

Entretanto, as provas orais não devem ser utilizadas isoladamente. Elas devem coexistir com os demais tipos avaliativos, principalmente pelo fato de pessoas diferentes possuírem atributos diferentes. Existem indivíduos com talento para a escrita, outros que se sobressaem na oratória. Um teste oral privilegiaria uns em detrimentos de outros, não refletindo com fidedignidade a aprendizagem de cada um dos alunos.

Importante observar que, mesmo uma prova bem elaborada, ou seja, equilibrada quanto ao conteúdo abordado e pontuação distribuída, composta de itens objetivos e dissertativos, pode não refletir fidedignamente o processo de aprendizagem.

Nesse sentido, Xênia Diógenes Benfatti (2008, p. 11-12) apresenta algumas críticas ao sistema de avaliação mediante provas:

(...) a prova é um instrumento de avaliação que oferece informações circunstanciais e passíveis de não representação. (...)

Utilizar somente provas para avaliação da aprendizagem é reduzir a avaliação e limitar suas funções e princípios, tornando-a inexpressiva. O professor precisa reconhecer que ao avaliar ele emite um juízo de valor sobre o desempenho discente, portanto, compete-lhe utilizar instrumentos adequados para o conhecimento da realidade em estudo. (BENFATTI, 2008, p. 11-12)

Logo, deve o professor aplicar instrumentos diversificados e adequados para a avaliação do ensino/aprendizagem, objetivando mudar aquilo que deva ser modificado para melhorar a qualidade do ensino.

3.2 TRABALHOS INDIVIDUAIS OU EM EQUIPE

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O professor deve estimular o lado pesquisador do aluno. O objetivo de um trabalho, enquanto método de avaliação, é a pesquisa do conteúdo solicitado pelo aluno, seja realizado em equipe ou individualmente.

O trabalho individual revelará a pesquisa, esforço, capacidade de síntese e argumentação de cada aluno sobre o tema solicitado. O cuidado e atenção, no entanto, que o professor deve possuir na avaliação refere-se às fontes de pesquisa.

O acesso à internet pelos alunos tem tornado mais presente o plágio de obras acadêmicas. Dessa forma, o que deveria ser um trabalho de pesquisa, com a apresentação de várias fontes, posicionamentos doutrinários e legislação pertinente, torna-se objeto de crime autoral ou, quando muito, um mero “recorta e cola” de fontes diferenciadas, sem a apresentação de qualquer argumento pessoal do aluno frente ao assunto.

Trata-se de uma realidade fática presente, inclusive, em trabalhos elaborados individualmente ou em equipe, devendo ser veementemente coibido. Não obstante a dificuldade da pesquisa individual como instrumento avaliativo, a mesma deve ser estimulada, pois quando realizada com compromisso, consolida o processo de ensino e aprendizagem.

Uma vez vencido o aspecto da veracidade da autoria da pesquisa, passa-se a analisar o trabalho em grupo. O trabalho em grupo permite uma maior integração entre os alunos. Colabora para uma organização e divisão de tarefas, estimulando a solidariedade e a vivência entre seus pares.

Entretanto, mediante uma análise crítica do instrumento avaliativo em tela, o professor deve estar consciente de que, barreiras existem para que o seu objetivo nem sempre seja alcançado. Divisão desigual de tarefas entre os membros da equipe, esforço e empenho da minoria do grupo, utilização do período de reunião em grupo para tratar de assuntos alheio ao do trabalho, são problemáticas comuns ao se utilizar do trabalho em equipe.

José Wilson Ferreira Sobrinho (1997, p. 95), referindo-se ao trabalho em equipe realizado fora da sala de aula, é bastante enfático ao tecer suas críticas:

Na verdade esse tipo de avaliação não serve para nada, salvo para que um trabalhe e os outros espertalhões assinem o trabalho que não ajudaram a escrever. Infelizmente a regra é esta: nem todos os membros do grupo trabalham realmente.

(...) Portanto, os trabalhos em grupo que são feitos fora da sala de aula não são um bom indicativo de participação coletiva, a menos que o professor, se dispuser de tempo, solicite a cada membro do grupo que, sem tempo para decorar, exponha na sala de aula a parte que lhe coube na divisão do trabalho. (...)

A participação do grupo, portanto, é nominal, admitidas as exceções de estilo. A avaliação, neste caso, é injusta: é injusta com aquele que trabalhou sozinho e com aqueles que não trabalharam mas ganharão mas ganharão a nota respectiva. (...) Para que uma avaliação seja pelo menos aceitável é preciso que ela seja capaz de identificar tais distorções na participação de um trabalho. Se não identificar isto será mais uma

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forma de premiar a apropriação indevida do trabalho alheio por estudantes que não passam de vagabundos sentados em bancos universitários.

Diante de tal enfoque negativo, pergunta-se: deve o trabalho em grupo ser aplicado? Celso dos Santos Vasconcellos (1992, p. 48) posiciona-se da seguinte forma:

Muitas vezes, os professores apontam a dificuldade de avaliar o trabalho em grupo. O enfrentamento desta questão exige que múltiplos aspectos sejam analisados, a começar pela própria proposta de trabalho que o professor faz: até que ponto ela está clara para o professor e para os alunos? Um outro elemento que deve ser considerado: reclama-se muito que os alunos não sabem trabalhar em grupo, mas será que em algum momento esses alunos foram devidamente orientados do ponto de vista da metodologia de trabalho em grupo? O professor deve capacitar os educandos, deixar claro quais os objetivos do trabalho e acompanhar o desenrolar do mesmo. Diante das dificuldades, primeiramente o grupo deve tentar resolve-las; se não conseguir deve solicitar ajuda do professor, que deve ficar o porquê dos diferentes níveis de participação.

Em termos de avaliação, uma alternativa é o professor dar o total de pontos para que o grupo distribua a cada membro, de acordo com critérios estabelecidos (“quem não trabalha, não come”). Vejamos um exemplo: o professor entende que trabalho vale 9; como são seis elementos, o grupo recebe o total de 54 pontos. Trata-se de uma tentativa de gestão coletiva tanto da produção do conhecimento (o que é fundamental), quanto da avaliação.

Cabe inicialmente ao professor, portanto, deixar bem claro para si e para os alunos os propósitos do trabalho. Tratar-se-á de um trabalho com o objetivo do professor abordar um assunto de uma maneira mais dinâmica? Ou para formar consenso em grupos? Ou, ainda, adotando uma linha descompromissada com o ensino, terá o trabalho em grupo o intuito de que o próprio professor possa ter um “descanso” nas aulas em que as equipes estiverem trabalhando? O professor deve ter plena consciência dos seus objetivos.

Uma vez estabelecidos os seus objetivos enquanto professor, devem os alunos tomar conhecimento do trabalho: tema tratado, tarefas a serem cumpridas, formato exigido (forma escrita, oral, tempo de apresentação), prazo estipulado e demais aspectos relevantes. O professor ter o cuidado de ressaltar a relevância do tema a ser pesquisado e discutido, estimulando, assim, os alunos a realizarem-no.

Dessa forma, o trabalho em grupo poderá perfeitamente ser utilizado como instrumento avaliativo no ensino jurídico.

3.3 SEMINÁRIO

O seminário caracteriza-se pelo envolvimento dos alunos com a pesquisa de temas a serem discutidos em sala de aula, partindo de uma exposição dialogada pelos alunos responsáveis. É necessária, para tanto, a preparação dos alunos sobre a temática objeto

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do seminário, bem como uma revisão literária do material estudado, a fim de esclarecer dúvidas quanto à interpretação dos textos (FERREIRA SOBRINHO, 1997, p. 82-83).

O professor deverá orientar os alunos sobre o procedimento a ser seguido no seminário: temas, material de pesquisa, responsabilidade de cada aluno, datas, texto-roteiro sobre as atividades a serem desenvolvidas.Ao final das atividades, é importante que os alunos participem com suas conclusões sobre o tema em discussão, apresentando suas opiniões e críticas.

O seminário pode ser utilizado como metodologia de ensino ou de avaliação. A sua aplicação no ensino torna as aulas mais dinâmicas, possibilitando a maior participação da turma. E a sua utilização como método de avaliação proporciona uma maior preocupação com a pesquisa do assunto, bem como maior interesse em participar ativamente das atividades sugeridas, tendo em vista o aluno estar sendo avaliado durante todo o seminário.

A auferição de nota pelo professor poderá ser feita a partir da abordagem do tema pelo aluno responsável, bem como pela participação e contribuição dos demais para a discussão do assunto, seja através de perguntas, colocações, pesquisas extras, contanto que sejam pertinentes à matéria em análise.

O seminário, portanto, constitui um interessante mecanismo de avaliação do ensino jurídico, uma vez que envolve a pesquisa, a retórica, a argumentação e o contato com as pessoas (colegas de sala), estimulando a solidariedade e respeito.

4 ESTRATÉGIAS DE AVALIAÇÃO NO ENSINO JURÍDICO

Antes de analisar a viabilidade e adequação de alguns instrumentos avaliativos no ensino jurídico brasileiro, é imprescindível identificar os objetivos do curso de Direito. Eduardo Oliveira Leite (1995, p. 25/31) dispõe sobre o assunto da seguinte forma:

O curso de Direito deve ter como meta a formação de juristas capazes não só de interpretar o fenômeno jurídico (...) mas capazes de adquirir um conhecimento integral da sociedade onde se encontra inserido o fenômeno jurídico. Capazes de entender que a norma jurídica resulta de um duplo movimento: de uma opção valorativa, a partir de julgamentos de valor, e dos reflexos impostos pela realidade social; ou seja, o Direito como elemento condicionante e condicionado pelas realidades do meio em que se manifesta.

O ideal, considerando a complexidade da vida profissional do bacharel em Direito e os objetivos do curso jurídico – desenvolvimento do raciocínio e espírito crítico – continua sendo uma aula que não se limite a mera informação, de ordem legal ou doutrinária, mas que favoreça a transposição destes elementos à realidade (...).

Não somente a aula deve afastar-se do padrão expositivo, oferecendo meras informações a serem absorvidas como verdades absolutas, mas também as avaliações

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devem corresponder ao que busca a Escola Reflexiva[1]. Raciocínio e espírito crítico devem estar atrelados à análise teórica e fática do Direito.

A análise jurisprudencial reúne os atributos supramencionados, necessários ao estudante de Direito, pois exige conhecimento prévio legal e doutrinário acerca da situação que lhe é apresentada. O aluno deve analisar criticamente o caso concreto à luz do Direito, identificando, portanto, princípios, dispositivos constitucionais e legais e a doutrina adequada à questão apreciada.

A apreciação legal e doutrinária encontrará seu desfecho na análise jurisprudencial (ou fáctica) e, nessa esfera (...) o aluno espontaneamente procurará aprofundar seu conhecimento e seus estudos, numa postura juridicamente crítica, só possível onde já há preliminarmente conhecimento e análise do fenômeno jurídico.

(...) A jurisprudência, de certa forma, conduz forçosamente ao prático, ao quotidiano, porque ela nada mais é do que a postura crítica do ordenamento em relação ao fato. (LEITE, 1995, p. 34-35)

O aluno pode analisar jurisprudências individualmente ou em grupo, através de testes dissertativos ou objetivos, na forma escrita ou oral, com ou sem consulta a materiais. O estudo de casos, portanto, permite a variação de abordagens avaliativas.

As disciplinas propedêuticas, contudo, não podem se utilizar de análises jurisprudenciais, ressalvadas as devidas exceções. Por tratarem-se de matérias iniciais e preparatórias, necessitam avaliar a aprendizagem dos conceitos e características dos institutos. Dessa forma, pertinente é a utilização de provas, dissertativas e/ou objetivas.

Não somente nessa situação devem as provas ser aplicadas. Na realidade, é necessário que haja uma interação entre os instrumentos avaliativos, de forma que o ensino e a avaliação sejam dinâmicos. Aulas e avaliações podem se utilizar de diferentes métodos, buscando interagir melhor com cada um dos alunos da sala de aula, além de tentar alcançar e desenvolver atributos peculiares aos diversos tipos de estudantes.

No que tange à auto-avaliação, trata-se de um instrumento avaliativo sui generis que requer maior criticidade e maturidade dos alunos, razão pela qual deve ser objeto de um estudo próprio.

O enfoque em trabalhos em grupo também é importante para o ensino jurídico. O profissional do Direito lida diretamente com pessoas, seja enquanto advogados, ao tratarem com seus clientes ou com os demais membros da banca de advogados do escritório; seja enquanto funcionário público, ao lidar com causas coletivas, crimes e investigação, cargos administrativos e repartições públicas, magistratura, Defensoria e Ministério Públicos e outros.

Lidar com o Direito é lidar com pessoas, do contrário significa isolar-se e observar o Direito à distância da sociedade (se é que isso é possível!). Os trabalhos em grupo oferecem essa oportunidade de solidariedade e diálogo entre os seus membros.

O estágio prático supervisionado ao final do curso, principalmente em parceria de órgãos como a Defensoria Pública, promove abertura de horizontes sociais aos alunos.

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O alunado chega ávido por situações-problema, elaboração de petições, ajuizamentos e, logo a partir do atendimento, depara-se com problemáticas completamente distanciadas do seu mundo vivido.

A partir de tal contato inicial, os estudantes do Curso de Direito começam a enxergar outras camadas sociais e, portanto, outros problemas, passando a tomar consciência de uma realidade que não faz parte do pequeno mundo no qual se encontra. Isso pode gerar maior sentimento de humildade, solidariedade, envolvimento com programas sociais.

Trata-se de colocar em prática o educar para a cidadania, promovendo situações de maior compreensão da realidade da qual faz parte, do papel social que ocupa, das responsabilidades sociais, bem como da autonomia para posicionar-se e atuar da forma como lhe aprouver.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A avaliação pode constituir-se num importante mecanismo de transformação do ensino jurídico no Brasil. Através de instrumentos avaliativos adequados, o aluno poderá alcançar de maneira mais clara os objetivos do curso de Direito, desenvolvendo o raciocínio e espírito crítico.

Avaliações realizadas mediante análises jurisprudenciais, participação em estágio prático supervisionado, aplicação de provas, realização de trabalhos individuais ou em grupo, seminários, são estratégias viáveis para avaliar o ensino jurídico, haja vista desenvolverem a criticidade, a argumentação, a retórica, a escrita, o raciocínio lógico e a solidariedade entre os colegas de sala. Na realidade, faz-se necessário a interação entre os diversos instrumentos avaliativos, devendo cada qual ser utilizado no contexto e no momento adequado.

Para tanto, cabe ao professor analisar a adequação de cada instrumento avaliativo em conformidade com o projeto de ensino jurídico de cada da instituição, o tema em estudo, a carga horária da disciplina, a quantidade de alunos na sala de aula e outros aspectos que o professor julgue necessário.

Faz-se necessário que haja uma conscientização pelo professor da sua função de educador, formando o indivíduo para viver em sociedade, educando-o para o exercício da cidadania.

Constata-se, portanto, o importante papel do professor e da avaliação do processo ensino e aprendizagem como agente e instrumento, respectivamente, de transformação e melhoria do ensino jurídico no Brasil.

REFERÊNCIAS

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AGUIAR, Roberto A. R. de Aguiar. Habilidades: ensino jurídico e contemporaneidade. Rio de Janeiro: DP&A editora, 2004.

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BENFATTI, Xênia Diógenes. Provas: uma crítica e reflexão sobre essa prática de avaliação. In: ABSIL, Wilhelmus Jacobus. Pedagogia universitária III: ação docente e os desafios do fazer pedagógico na universidade. Fortaleza: Fundação Edson Queiroz, 2008, p. 11-27.

ENCARNAÇÃO, João Bosco da. A questão do ensino jurídico. In: ENCARNAÇÃO, João Bosco da; MACIEL, Getulino do Espírito Santo. (orgs.) Seis temas sobre o ensino jurídico. São Paulo: Cabral editora, 1995, p. 105-123.

FARIA, José Eduardo. O ensino jurídico. In: ENCARNAÇÃO, João Bosco da; MACIEL, Getulino do Espírito Santo. (org.) Seis temas sobre o ensino jurídico. São Paulo: Cabral editora, 1995, p. 99-103.

FERREIRA SOBRINHO, José Wilson. Metodologia do ensino jurídico e avaliação em Direito. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 1997.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 36. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2007.

KENSKI, Vani Moreira. Avaliação da aprendizagem. In: VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Repensando a didática. São Paulo: Papirus, 1989.

LEITE, Eduardo de Oliveira. A aula em direito. In: ENCARNAÇÃO, João Bosco da; MACIEL, Getulino do Espírito Santo. (org.) Seis temas sobre o ensino jurídico. São Paulo: Cabral editora, 1995, p. 13-43.

MACIEL, Getulino do Espírito Santo. Por um ensino jurídico crítico. In: ENCARNAÇÃO, João Bosco da; MACIEL, Getulino do Espírito Santo. (org.) Seis temas sobre o ensino jurídico. São Paulo: Cabral editora, 1995, p. 89-98.

ROCHA, Leonel Severo. Ensino do direito e cultura política. In: ENCARNAÇÃO, João Bosco da; MACIEL, Getulino do Espírito Santo. (org.) Seis temas sobre o ensino jurídico. São Paulo: Cabral editora, 1995, p. 67-88.

VASCONCELLOS, Celso dos Santos. Avaliação: concepção dialética-libertadora do processo de avaliação escolar. Cadernos Pedagógicos do Libertad. 2.ed. São Paulo: Libertad-Centro de Formação e Assessoria Pedagógica, 1992, v. 3.

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[1] Trata-se de uma “organização (escolar) que continuadamente se pensa a si própria, na sua missão social e na sua organização, e se confronta com o desenrolar da sua atividade em um processo heurístico simultaneamente avaliativo e formativo. Se, como dizia Habermas, só o EU que se conhece a si próprio e questiona a si mesmo é capaz de aprender, de recusar tornar-se coisa e de obter a autonomia, eu diria que só a escola que se interroga sobre si própria se transformará em uma instituição autônoma e responsável, autonomizante e educadora. Somente essa escola mudará o seu rosto”( ALARCÃO, 2001, p. 15).

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