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Parasitologia Wuchereria bancrofti

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Parasitologia

Wuchereria bancrofti

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• Epidemiologia

A Wuchereria bancrofti é o verme nematelminto endêmico nas Américas

causador da Filariose Linfática ou Elefantíase. Possui grande importância epi-

demiológica na África, mas no Brasil, as últimas décadas foram marcadas por

importantes medidas de prevenção e controle que culminaram com a diminui-

ção das áreas consideradas endêmicas no país, restando atualmente apenas a

região metropolitana de Recife/PE nos municípios de: Recife, Olinda, Jaboatão

Guararapes e Paulista. Desde 2013, não foram registrados novos casos de

transmissão da doença e o Brasil passa atualmente pelo processo de certifica-

ção de eliminação da Filariose. Desse modo, é importante que profissionais de

saúde saibam identificar as manifestações da doença e conhecer seu ciclo para

contribuírem para seu enfrentamento. É uma doença crônica que pode atingir

pessoas de todas as idades e de ambos os sexos.

• Morfologia e Ciclo Biológico

O parasito é longo, delgado, branco leitoso, opaco e de cutícula lisa. A

fêmea tem tamanho maior, variando de 7 a 10 cm de comprimento por 0,3 mm

de diâmetro, ao passo que o macho mede de 3,5 a 4 cm de comprimento por

0,1 mm de diâmetro. A extremidade anterior afilada apresenta uma região dila-

tada com papilas sensoriais e a boca. Na parte posterior enrolada ventralmente,

concentram-se os órgãos reprodutivos. Na fêmea, os ovos embrionados podem

ser encontrados na parte distal do útero e as microfilárias (larvas alongadas)

estão na parte mais proximal. Possui órgãos genitais duplos, com exceção da

vagina, que é única e exteriorizada em uma vulva localizada próxima à extremi-

dade anterior do parasita. Diferente dos outros helmintos, esses ovos são en-

voltos por uma membrana ovular, em vez de uma casca uterina. No macho, os

órgãos reprodutivos são representados por duas espículas na região posterior.

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Os vermes adultos habitam o sistema linfático humano (vasos e linfonodos),

onde permanecem enovelados gerando inflamação e obstrução. Possuem uma

sobrevivência de 4 a 8 anos, dando origem a milhões de microfilárias imaturas

que circulam no sangue. Por meio de reprodução sexuada, dão origem ovos

embrionados envoltos por uma membrana ovular, que ao se desenvolverem

formam as microfilárias, que são revestidas por uma bainha alongada proveni-

ente da membrana. Medem de 250 a 300µm de comprimento e possuem uma

membrana de revestimento (bainha) que é flexível. Adquirem movimentação

ativa e após serem geradas na circulação linfática, migram à corrente sanguínea

e se acumulam na circulação pulmonar. Durante o sono à noite (em torno de

23h às 1h), as microfilárias migram da circulação pulmonar alcançando a circu-

lação periférica, quando é possível fazer seu diagnóstico pela coleta de sangue.

Durante o dia, retornam à circulação pulmonar, deixando o sangue periférico

negativo para a pesquisa de parasitos. A explicação para esse fenômeno de

periodicidade ainda não foi elucidada, porém é importante conhecê-lo por mo-

tivos diagnósticos. Durante a microfilaremia noturna (período em que há micro-

filárias circulantes), o indivíduo pode ser picado por fêmeas hematófagas dos

mosquitos da espécie Culex quinquefasciatus (popularmente conhecido como

“pernilongo” ou “muriçoca” ou “carapanã”), que é o hospedeiro intermediário e

responsável pela transmissão da filariose nas Américas. Essas larvas sugadas

durante o repasto sanguíneo, após poucas horas, perdem a bainha de revesti-

mento e perfuram a parede do estômago, alcançando e alojando-se nos mús-

culos torácicos do inseto, onde a princípio diminuem de tamanho nos primeiros

5 dias (larvas salsichóides) e aumentam de comprimento após 8 a 9 dias, sendo

consideradas larvas de segundo estágio (L2). A L2 cresce rapidamente, tripli-

cando de tamanho em 4 dias e migra para a hemolinfa alcançando o estágio L3,

que é o estágio infectante para o hospedeiro humano (vertebrado). A L3migra

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ativamente pelo corpo do inseto até chegar na bainha da tromba ou probóscida

(“lábios do mosquito”). O período de desenvolvimento no interior do mosquito

dura de 15 a 20 dias, em temperaturas de 20º a 25ºC, podendo ser em menor

tempo em temperaturas mais elevadas. Como a vida média dos mosquitos do

gênero Culex é de cerca de um mês e o ciclo do parasito no inseto (de microfilá-

ria até larva L3) ocorre em torno de 20 dias, é curto o período de tempo no qual

o vetor pode transmitir o parasito ao homem. Quando o inseto volta a picar e

faz o seu repasto sanguíneo, ocorre a penetração da larva L3 pela pele lesada

de um novo hospedeiro humano. A partir dessa fase, não há muitos dados na

literatura médica, mas acredita-se que a L3 migre pelos linfáticos e sofra mais

dois estágios de evolução até alcançar a forma adulta (machos e fêmeas sexu-

almente maduros) e chegar no local de permanência, produzindo novas microfi-

lárias circulantes e reiniciando o ciclo (período de 1 ano, aproximadamente). Ou

seja, a W.bancrofti possui formas evolutivas diferentes nos hospedeiros verte-

brados e nos invertebrados: no ser humano, encontraremos as filárias (vermes

adultos) e microfilárias; no mosquito, encontraremos larvas.

• Patogenia e Manifestações Clínicas

As manifestações são variadas e os possíveis sintomas da Elefantíase

estarão relacionados ao processo de desenvolvimento das larvas e também aos

locais onde se alojaram os vermes adultos. Podendo ocorrer infecções assinto-

máticas até casos graves e incapacitantes permanentemente. Os vermes adul-

tos (filárias) lesionarão os vasos linfáticos e as microfilárias atuarão no ambien-

te extra-linfático. A patogenia se resume em lesões genitais, obstruções e in-

flamações.

A presença do parasito nos linfonodos gera adenite, marcada por hiper-

plasia de histiócitos e eosinófilos, podendo gerar também granulomas. O aco-

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metimento de vasos linfáticos tem como característica inflamação e dilatação,

gerando linfangite. Nas lesões genitais, o processo inicia-se por uma funiculite

filariana (inflamação do cordão espermático) e depois varicocele. Além disso,

orquite, epididimite, espessamento da túnica vaginal, entre outras alterações,

culminam na filaríase genital crônica, clinicamente determinada por hidrocele.

De modo geral, a presença de microfilárias enoveladas na luz dos vasos linfáti-

cos gera inflamação e obstrução linfática e, assim, edema linfático (linfedema).

As manifestações clínicas dependerão do órgão acometido, sendo os

principais membros inferiores, genitália e membros superiores e até mamas,

mas podendo também ocorrer em outras regiões (espaço pleural, cavidade pe-

ritoneal, vias urinárias, intestinos, entre outros). Pode gerar também a Eosinofi-

lia Pulmonar Tropical, caracterizada por sibilos noturnos secundários à inflama-

ção das vias aéreas pelos parasitos. Chama-se elefantíase o linfedema crônico

resultante de fibromiosite crônica, hipertrofia e fibrose dérmica e subcutânea,

com aumento de espessura, ceratose, rachaduras e perda de elasticidade na

pele. Nesse estágio são comuns infecções bacterianas secundárias, que podem

agravar a condição do paciente. A evolução natural da doença consiste em um

período pré-patente (entre a picada do mosquito e a microfilaremia), com dura-

ção de aproximadamente 12 meses em que os pacientes costumam estar as-

sintomáticos ou apresentar manifestações alérgicas. Em seguida, há o período

patente assintomático, no qual há microfilaremia, porém sem manifestações

clínicas. Isso dá lugar ao período agudo, marcado por fenômenos inflamatórios:

linfangites, linfadenites, orquites, epididimites e funiculites. Cada ataque cursa

com dor, calor, edema e eritema na região acometida (trajeto linfático) associa-

da a sintomas sistêmicos, como febre, calafrios e mal-estar. Exames laboratori-

ais podem mostrar eosinofilia discreta (4 a 5%) e a duração é em média 3 a 4

dias, mas pode se estender por semanas. Esses episódios são recorrentes e

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podem acontecer com intervalos de semanas a meses. Parte dos indivíduos

apresenta remissão gradual dos sintomas, porém alguns evoluem para a forma

crônica, que é a elefantíase. Fatores que favorecem a evolução para a forma

crônica são: número de larvas na infecção inicial, frequência de reinfecções, in-

tensidade da reação inflamatória (resposta do hospedeiro) e frequência de in-

fecções bacterianas secundárias.

• Diagnóstico

O diagnóstico deve ser suspeitado em indivíduos provenientes de regi-

ões endêmicas da doença que apresentem os sintomas típicos. É baseado na

detecção de microfilárias no sangue, visualização dos vermes adultos por ul-

trassom ou sorologia.

A ultrassonografia possibilita em alguns casos a visualização de vermes

adultos vivos em movimento no vaso linfático, achado conhecido como “sinal

da dança das filárias”. Desse modo, é possível detectar a doença mesmo na

ausência de microfilaremia, porém métodos parasitológicos são ideais para

controle de cura. Nos testes com material sanguíneo, deve-se optar pela coleta

de sangue entre 23h e 1h, período de maior microfilaremia. No exame a fresco,

utiliza-se gota de sangue capilar ou venoso para observação direta do parasita

no microscópio, porém é um exame de baixa sensibilidade. Pode-se fazer como

na Malária o exame da gota espessa corada com Giemsa, que foi por muitos

anos o padrão-ouro, com a limitação de que pode haver falsos-negativos

quando a carga parasitária é baixa (exame de baixa sensibilidade e alta especi-

ficidade). Outra técnica é a Concentração de Kott, que utiliza sedimentação pa-

ra avaliar a microfilaremia de maneira quantitativa e apresenta maior sensibili-

dade que a gota espessa e auxilia no controle de cura, mas é de alto custo e

pouco disponível. Atualmente, o padrão-ouro é a Técnica de Filtração em

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Membrana de Policarbonato, que tem a maior sensibilidade, detectando cargas

parasitárias pequenas, e é utilizada como controle de cura. Além de métodos

parasitológicos, há métodos diagnósticos antigênicos que utilizam a técnica de

ELISA para detectar antígenos de W. bancrofti no sangue ou em outros materi-

ais.

• Diagnóstico Diferencial

O principal diagnóstico diferencial da Elefantíase por Filariose é o linfe-

dema causado por erisipelas de repetição. Nesse caso, o paciente apresenta

diversas infecções estreptocócicas ao longo da vida causando lesão linfática e

aumentando a susceptibilidade a novas infecções. Cronicamente, isso leva a

dilatação de vasos linfáticos e edema. Além disso, deve-se fazer diagnóstico

diferencial com outras causas de linfedema, como linfedema primário, maligni-

dade e tuberculose.

• Tratamento

A droga de escolha é a dietilcarbamazina (DEC), distribuída exclusiva-

mente pelo SUS, que tem ação microfilaricida e também contra vermes adultos,

reduzindo rapidamente a carga parasitária no sangue e até mesmo fazendo

desaparecer a dança das filárias na ultrassonografia. O esquema preconizado é

6 mg/kg/dia por 12 dias, não sendo recomendado para crianças menores de 2

anos, grávidas e nutrizes Os principais efeitos adversos são sonolência, des-

conforto gástrico e náusea. Além disso, a morte de microfilárias leva a reações

sistêmicas autolimitadas, como febre, hematúria, cefaléia, mialgia, astenia e

tontura. Também são descritas linfadenites nesse contexto. Está indicado o uso

de sintomáticos e só se interrompe o tratamento em caso de efeitos graves. Em

caso de persistência de microfilaremia após tratamento, deve-se considerar

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manutenção de vermes adultos vivos e falha de tratamento. Nesses casos, ini-

cia-se um novo curso de dietilcarbamazina associada a ivermectina ou alben-

dazol.

Antes do tratamento com DEC, deve-se avaliar possível coinfecção com

Loa Loa (Loíase) e Onchocerca volvulus (Oncocercose), pois nesses pacientes

podem ocorrer reações graves. Nesses casos, recomenda-se o uso prévio de

Albendazol 400mg, em dose única, adicionada de Invermectina (200mcg/kg/),

via oral.