Download - Trabalho Prof Katia Marro Pronto
PARTICIPAÇÃO CONTROLE
SOCIAL E DOMOCRACIA
Por: Aline da Silva Praxedes Vieira Consoli Lima
Elisangela Maria de Lima
Gisele de Cássia Barra Araujo
Maria Rosilene Bezerra da Silva
Rio das Ostras, Fevereiro de 2013.
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Universidade Federal Fluminense
Pólo Universitário de Rio das Ostras
Instituto de Humanidades e Saúde
Departamento Interdisciplinar
Pós Graduação Lato-Sensu: Gestão de cuidado em Saúde
ALINE DA SILVA PRAXEDES VIEIRA CONSOLI LIMA
ELISANGELA MARIA DELIMA
GISELE DE CASSIA BARRA ARAÚJO
MARIA ROSILENE BEZERRA DA SILVA
PARTICIPAÇÃO, CONTROLE SOCIAL E DEMOCRACIA
Atividade de Dispersão apresentado à
Disciplina “Participação, controle social
e democracia” do curso de Pós
Graduação Lato Senso: Gestão de
Cuidado em Saúde, ministrada pelos
Professores Bruno Teixeira e Katia Marro.
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Rio das Ostras, 01 de março de 2013
Sumário
INTRODUÇÃO..........................................................................................................................4
DIFERENTES FORMAS DE DEMOCRACIA.........................................................................5
PROCESSO HISTORICO DA DEMOCRACIA BRASILEIRA E PARTICIPAÇÃO
POPULAR..................................................................................................................................6
DESAFIOS PARA EXERCER A CIDADANIA NA CONJUNTURA ATUAL....................12
BIBLIOGRAFIA......................................................................................................................16
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INTRODUÇÃO
Esse trabalho constitui uma exigência para avaliação final da disciplina “Participação,
Controle Social e Democracia”, ministrada pelos professores Katia Marro e Bruno Ferreira.
Diante do desafio de elaborar um material que sirva como subsídio para uma suposta
formação para conselheiros. O trabalho apresentado dá suporte aos conselheiros para uma
análise crítica de seu papel, da sua ação enquanto agente de mudança, compreendendo o
processo de construção dos conselhos, outros mecanismos de controle social e de
democratização da política pública.
Para concretização deste material, debruçamo-nos sobre diversos aspectos teóricos,
históricos e políticos, considerando os limites, distorções e desafios mapeados pelos autores
indicados na disciplina e outros considerados importantes na discussão dessa temática.
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DIFERENTES FORMAS DE DEMOCRACIA
Ao falar sobre democracia, é importante fazer um breve resgate histórico. Na Grécia
antiga, essa forma de governo se dava diferente de como vivenciamos atualmente; ela era
exercida por grupos específicos que detinham o poder de tomarem decisões sobre a vida da
sociedade, excluindo-se desse processo, as mulheres, os escravos (entenda-se por escravos,
povos vencidos em guerras) e estrangeiros. Na realidade, essa forma de democracia, acaba
tendo a participação de mais ou menos 1/3 da população apenas.
Outro aspecto importante a ser ressaltado é que nesse período a democracia era
associada somente aos direitos políticos, não sendo reconhecido nenhum direito civil e social.
Inicialmente, os direitos civis, por exemplo, só irão ser criadas durante a sociedade feudal,
mas especificamente, em seu processo de crise, durante a revolução burguesa; tendo como
característica principal a proteção do indivíduo contra o absolutismo até então predominante
Por não ser o objetivo desse trabalho, não nos deteremos com maiores detalhes nesses
aspectos históricos.
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PROCESSO HISTORICO DA DEMOCRACIA BRASILEIRA E
PARTICIPAÇÃO POPULAR
De 1500 até 1889 vivemos sob um regime monárquico absolutista. É importante
ressaltar, porém, que é nesse panorama que começa a se construir direitos. Segundo Carvalho
(2002), a Constituição outorgada de 1824, estabeleceu os quatro poderes (Executivo,
Legislativo, Judiciário e Moderador) e regulou os direitos políticos, definindo quem teria
direito de votar e ser votado:
Podiam votar todos os homens de 25 anos ou mais que tivessem renda mínima de 100 mil-réis. Todos os cidadãos qualificados eram obrigados a votar. As mulheres não votavam, e os escravos, naturalmente, não eram considerados cidadãos. (CARVALHO, 2002, p. 29-39).
Pode-se perceber que os direitos aqui relatados estão basicamente resumidos ao voto,
mesmo assim, representava um grande avanço no processo histórico de um país que até
recentemente era colônia.
Importante ressaltar que mesmo neste contexto pouco favorável à participação do
povo nas decisões políticas do país, diferentemente da experiência de democracia grega,
conforme relatada anteriormente, já é possível perceber algumas manifestações insipientes
conforme nos relata Carvalho:
O papel do povo foi (...) decisivo em 1831, quando o primeiro imperador foi forçado a renunciar. Houve grande agitação nas ruas do Rio de Janeiro, e uma multidão se reuniu no Campo de Santana, exigindo a reposição do Ministério deposto. Ao povo uniram-se a tropa e vários políticos em raro momento de confraternização. Embora o movimento se limitasse ao Rio de Janeiro, o apoio era geral. (CARVALHO, 2002, p. 28)
Em 1889 é proclamada a Republica Federativa do Brasil. Porém, ser proclamada a
república, não significou uma mudança imediata. Um povo submetido a um regime
absolutista por mais três séculos de história carrega com ele marcas da subserviência que lhes
foram impostas todo o tempo como um processo natural. Portanto, apesar de nesse momento,
serem chamados a exercer sua cidadania na nova realidade do país, para a maioria, não está
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muito claro o que é ser cidadão. Desconhecem o poder que detém em suas mãos nessa nova
forma de governo, continuando a mercê dos interesses de quem ocupa o poder da elite
governista.
Desde a Proclamação da República, até 1930, o Brasil passa a ser governado pela
conhecida República Café com Leite, onde o poder se manteve, durante décadas, nas mãos de
apenas dois Estados do Brasil: São Paulo e Minas Gerais. As eleições eram revezadas, sendo
que cada Estado governava por um determinado período. Nessa conjuntura, manter a
população alienada aos direitos era muito importante. Essa alienação era reforçada por
práticas coercitivas e coronelistas, como o voto de cabresto.
Carvalho aponta quatro equívocos cometidos pelos críticos que analisam a falta de
participação popular no Brasil de forma ahistórica e culpabilizando a sociedade (aqui é isso
mesmo gi, significa que quem está fazendo a critica não está levando em conta o contexto
histórico do momento e culpa a sociedade pela falta de mobilização.
O primeiro era achar que a população saída da dominação colonial portuguesa pudesse, de uma hora para outra, comportar-se como cidadãos atenienses, (...). O Brasil não passara por nenhuma revolução, como a Inglaterra, os Estados Unidos, a França. O processo de aprendizado democrático tinha de ser, por força, lento e gradual. O segundo equívoco já fora apontado por alguns opositores da reforma da eleição direta. (...) Quem era menos preparado para a democracia, o povo ou o governo ou as elites? Quem forçava os eleitores, quem comprava os votos, quem fazia atas falsas, quem não admitia derrotas nas urnas? Eram os grandes proprietários, os oficiais da Guarda Nacional, os chefes de polícias e seus delegados, os juízes, os presidentes das províncias ou estados, os chefes dos partidos nacionais ou estaduais. (...) O terceiro equívoco era desconhecer que as práticas eleitorais em países considerados modelos, como a Inglaterra, eram tão corruptas como no Brasil. (...)O quarto e ultimo equívoco era achar que o aprendizado do exercício dos direitos políticos pudesse ser feito por outra maneira que não sua prática continuada e um esforço por parte do governo de difundir a educação primária. (CARVALHO, 2002, p. 43-44)
No processo histórico brasileiro, a democracia é uma conquista recente que se deu
através de lutas e mobilização social. Não foi um movimento de progressão uniforme,
havendo em diferentes momentos históricos, avanços e retrocessos. O período Vargas é uma
exemplificação de como essa realidade se deu. Caracterizou-se pelo alargamento dos direitos
sociais, tendo como grande marco a criação e Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em
1943. No tocante aos direitos políticos houve a criação da justiça eleitoral e a introdução do
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voto secreto, que segundo afirma Carvalho (2002) tinha o objetivo de proteger o eleitor das
pressões exercidas pelo coronelismo, no famoso voto de cabresto, já citado anteriormente. É
também dessa época a conquista do direito ao voto pelas mulheres.
Em contra partida, é de conhecimento notório, o autoritarismo, a centralização e o uso
coercitivo da força como características do seu governo, assim como a ausência da percepção
por parte da população da realidade que os rodeava. Essa alienação se dava através da forma
de governo de Vargas, marcada pelo populismo, ao ponto de ser considerado pelo povo, como
sendo o “pai dos pobres”.
É importante salientar, que os direitos alcançados nesse período não são apenas fruto
de iniciativas do governo; mas sim resultado de conquistas obtidas através das lutas
incansáveis dos diversos movimentos sociais da época, tendo como maior representatividade
o movimento operário.
Observando o período Vargas e o Governo Militar, iniciado com a tomada do poder
em 1964 pode-se perceber diversos aspectos que se assemelham, dando continuidade a esse
processo de avanços e retrocessos, alargamento e coerção de direitos:
Como em 1937, o rápido aumento da participação política levou em 1964 a uma reação defensiva a imposição de mais um regime ditatorial em que os direitos civis e políticos foram restringidos pela violência. Os dois períodos se assemelham ainda pela ênfase dada aos direitos sociais, agora estendidos aos trabalhadores rurais e pela forte atuação do Estado na promoção do desenvolvimento econômico. (CARVALHO, 2002, p. 157).
Diferentemente do período Vargas, onde o povo tinha a “falsa” ideia de um
governante que criava relações paternalistas com eles, na ditadura militar, buscou-se alienar a
sociedade para que esta não participasse nas decisões da vida pública, como se essas não
fossem de sua competência, criando uma cisão entre sociedade civil e Estado, cabendo a este
gerir e governar de forma centralizada; propagando uma ideia de nacionalismo e
desenvolvimento, conforme FALEIROS (2000) “No período que vai de 1964, ano do golpe
militar, a 1988, ano da Constituição democrática, o país se desenvolveu economicamente com
expansão da produtividade, modernização da economia e entrada do capital estrangeiro em
parceria com o Estado”.
Evidentemente essa ideologia não conseguiu se propagar hegemonicamente.
Concomitantemente, começam surgir grupos contrários ao governo militar, representados por
diversos movimentos populares que, nesse momento histórico, encontra adesão de
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simpatizantes das diferentes grupos, como por exemplo: estudantes, trabalhadores,
intelectuais, mulheres, etc. A oposição à ditadura vai se tornando densa, mais organizada
conseguindo de fato com que suas ações tenham expressões marcantes e importantes no
contexto histórico do nosso país.
Com o surgimento dos movimentos sociais contrários aos governos autoritários e a efervescência política que provocou o processo de redemocratização do país, criou-se um contraponto com um Estado ditatorial e uma sociedade civil que buscava mudanças. Este contexto caracterizou uma pseudodicotomia entre Estado e sociedade civil e uma pseudo-homogeneização dessa última, como se ela fosse composta unicamente por setores progressistas ou pelas classes subalternas. (BRAVO e CORREIA, 2012, p. 127).
O processo de redemocratização do país não foi fácil, muito pelo contrário: desenhou-
se um cenário de perseguições, prisões arbitrárias, torturas e mortes daqueles considerados
pelos dominantes como “subversivos” a ordem estabelecida.
A ditadura se caracterizou por forte censura, ausência de eleições, controle do Congresso Nacional pelo poder militar, então no Executivo e repressão violenta aos opositores, considerados subversivos por lutarem de forma armada ou não, pela derrubada do sistema autoritário e sua substituição pelo sistema democrático (...). Dezenas de brasileiros foram presos, torturados, exilados, mortos, desaparecidos. (FALEIROS, 2000 p. 42).
Ou seja, a ação dos movimentos populares, imprescindível no processo de retomada da
democracia, não se deu de forma fácil ou pacífica, afinal não era interessante para a ideologia
dominante uma forma de governo com a participação do povo:
Em outras palavras, não tem demasiado sentido falar da democracia em sua abstração, quando na verdade do que se trata é de examinar as formas, as condições e os limites da democratização em sociedade como a capitalista, que se fundam em princípios constitutivos que lhes são irreconciliavelmente antagônicos. Isto não subestima em nada a transcendência da democracia como forma de governo e como modo de vida, sobretudo depois dos rios de sangue que correram na América Latina para conquistá-la. Mas sua necessária valorização não pode ignorar que em sua concretização histórica a democracia (...) sempre é encontrada entrelaçada com uma cultura de dominação classista, que impõe rígidos limites a suas potencialidades representativas e, em maior medida ainda, as possibilidade de autogoverno da sociedade civil. (BORON, 2003, p. 68-69).
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Foi nesse cenário de derramamento de sangue, muitas vidas sacrificadas ou marcadas
para sempre que culminamos em um dos momentos históricos mais importante: a volta da
democracia, gerando como fruto dessa batalha a promulgação da Constituição de 1988, onde
são conquistados direitos civis, sociais e políticos de forma universal, nunca antes garantidos
em nossa sociedade; conhecida até hoje, como a “Constituição Cidadã”.
Assim como a historia abordada até agora foi sempre em movimento de avanços e
retrocessos, conflitos de interesses, o processo da formação constituinte não foi diferente.
Havia muito em jogo, interesses antagônicos entravam em choque o tempo todo. Diferentes
formas de se entender como seria a participação da sociedade nesse novo cenário coexitiram;
havia aqueles que defendiam que política era assunto para pensadores e especialistas, indo de
encontro ao que defendiam os movimentos populares, que política deveria ser discutida e
construída com a participação do povo, muito além da ação isolada do voto a cada eleição. Eis
então o controle social surgindo no Brasil:
No Brasil, a expressão controle social tem sido utilizada como sinônimo de controle da sociedade civil sobre as ações do Estado, especificamente no campo das políticas sociais, desde o período da redemocratização dos anos de 1980. A utilização da expressão com este sentido foi propiciada pela conjuntura de lutas políticas pela democratização do país frente ao Estado autoritário, implantado a partir da ditadura militar. (...) No processo de redemocratização do país a expressão controle social1
passa a ser compreendida como o controle da sociedade sobre o Estado.(BRAVO e CORREIA, 2013, p. 127).
E para se falar sobre participação popular e controle social democrático, é primordial
resgatar momentos na história da humanidade que já expressavam essa busca pelo direito da
comunidade estar presente nas decisões do governo do seu povo2:
A comuna de Paris - um governo de trabalhadores por dois meses na França, em 1871- considerado por muitos historiadores como a primeira experiência histórica de autogestão operária através de conselhos populares” (...).(...) os sovietes russos [que] nasceram em São Petersburgo em 1905. Era sobretudo “organismos políticos de luta pelo poder estatal num momento de crise aguda da sociedade: (...)Os sovietes foram recriados na Russia em fevereiro de 1917 (...). Eram organismos de classe, compostos por operários, soldados e intelectuais revolucionários. Após 1917, os partidos políticos, os sindicatos e as associações voluntárias foram perpassados pelos sovietes.
1 Grifo nosso
2 Para maior aprofundamento sobre esse tema, conferir texto da Gohn 1990, conforme indicado na bibliografia.10
Os sovietes são os casos mais famosos de gestão participativa através de conselhos de operários, cidadãos e camponeses. (GOHN, 1990, p. 66-68).
Todo esse resgate histórico é necessário para que possamos entender melhor a
conjuntura atual em que vivemos.
O período contemporâneo vem sendo balizado pelo Projeto Neoliberal. Via de regra, a
política governamental brasileira, igualmente vem sofrendo essa influência e fazendo
rearranjos, se caracterizando pela combinação de progressiva desobrigação do Estado para
com a manutenção dos serviços públicos e a criação de mecanismos que apoiam e facilitam a
sua transformação pelo capital privado em atividades rentáveis. Ou seja, busca-se desmontar
uma das maiores conquistas dos direitos sociais que vimos até o momento: a universalidade
de acesso e a responsabilização do Estado pela efetivação dos mesmos.
Tal tendência, conhecida como a Contra-Reforma do Estado Brasileiro, acentuou-se
nos últimos anos, na medida em que diferentes governos empenharam-se em implementar o
projeto neoliberal, onde destaca-se a redução dos direitos sociais e trabalhistas, o desemprego
estrutural, a precarização do trabalho, a abertura comercial, a liberalização financeira, a
desregulamentação dos mercados e das relações trabalhistas, o desmonte da previdência
pública, a obtenção (a qualquer custo) do equilíbrio orçamentário e do controle da inflação -
especialmente via redução dos gastos públicos, aumento das taxas de juros, a privatização das
empresas estatais e transferência de gestão para a iniciativa privada, desresponsabilizando o
Estado. Iamamoto destaca que o “projeto neoliberal subordina os direitos sociais à lógica
orçamentária, à política social à política econômica, em especial às dotações orçamentárias”
(IAMAMOTO, 2011:149).
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DESAFIOS PARA EXERCER A CIDADANIA NA CONJUNTURA
ATUAL
Uma das principais características do Projeto Neoliberal, como já citado
anteriormente, está relacionada com a auto regulação do mercado, que reflete se na ideologia
da sociedade de uma forma geral. O indivíduo deve ser livre para competir; não uma
liberdade genérica, estendida a todos, mas uma liberdade que o leva a competir com o outro,
numa concepção individualista. Nessa lógica da individualidade, não mais nos reconhecemos
no outro; a busca pelo coletivo é desestimulada e cada vez menor.
A democracia burguesa, em sua natureza, é individualista, nega os interesses e direitos
coletivos. Entendemos os direitos como conquistas, que assim como a sociedade fazem parte
de um “jogo de tensões” e interesses, sendo desta forma uma representação do beneficiamento
do Capital, tanto no aspecto político (através do assistencialismo e do clientelismo, por
exemplo) quanto no aspecto econômico. Nessa lógica neoliberal, é estimulado o sustento de
cada um unicamente pela sua força de trabalho; de uma forma alienada que aquele que a
vende não se percebe como explorado e sim como privilegiado por ter seu sustento garantido.
Pode-se pagar pela casa, pelo carro, pela saúde, pela moradia, minando todo o processo de
luta que se deu para a conquista dos direitos. Nesse cenário, esses direitos ganham aspectos de
favores, de esmola e não de exercício pleno de cidadania.
Na sociedade atual não podemos dizer que temos uma democracia plena, universal, de
forma que todos os indivíduos consigam interferir de maneira igual nos rumos da sociedade.
A democracia na sociedade burguesa vem ideologicamente influenciada pela lógica neoliberal
que investe no conceito de democracia minimalista (assim como o Estado é Mínimo) em que
é admitido a existência do desemprego e da miséria, por exemplo, reduzindo “a democracia a
uma questão de método, completamente dissociado dos fins, dos valores e dos interesses que
animam a luta dos atores coletivos” (BORON, 2003, p. 66). Tem-se a ideia de uma
democracia abstrata, que escamoteia a realidade, é genérica e despolitizada.
Em uma sociedade desigual como a neoliberal tem-se a concepção de que a construção
da política só pode ser feita por uma parcela pequena e elitizada da população, uma vez o
povo não teria entendimento e conhecimento suficiente para tal.
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Por isso, o conceito de cidadania moderna é um conceito de cidadania passiva, que
dispensa a participação política, tornando os cidadãos sujeitos passivos e alienados conforme
destaca Boron:
O esvaziamento da política, crescentemente convertida em um assunto “mass mediático” e no qual a televisão substitui a ágora, converte os partidos em simples carimbos privados de qualquer capacidade de convocação e de mobilização; e a “flexibilização” laboral e a progressiva informalização dos mercados de trabalho destrói pela raiz os próprios fundamentos da ação sindical. O que resta, então? Resta a estratégia predileta que o neoliberalismo impôs as classes populares: ou “salve-se quem puder”, abdicando qualquer pretensão solidária, qualquer esforço coletivo de organização e representação. (BORON, 2003, p. 108).
Somente a partir desta constatação e desta avaliação crítica e que deve ser gerado o
sentimento de participação. O grande desafio é repensar o conceito de sociedade civil na
contemporaneidade. É um equívoco pensa-la como expressão de interesses universais, de
pactos sociais. É necessário entender seu caráter heterogêneo, contraditório, como espaço de
lutas, de interesses conflitantes e por este motivo espaço de articulação com os movimentos
sociais.
Uns dos principais mecanismos de luta e de participação popular são os Conselhos e as
Conferências, conforme determinado na Lei 8142/90:
§ 1° A Conferência de Saúde reunir-se-á a cada quatro anos com a representação dos vários segmentos sociais, para avaliar a situação de saúde e propor as diretrizes para a formulação da política de saúde nos níveis correspondentes, convocada pelo Poder Executivo ou, extraordinariamente, por esta ou pelo Conselho de Saúde.§ 2° O Conselho de Saúde, em caráter permanente e deliberativo, órgão colegiado composto por representantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários, atua na formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do governo.
Tendo em vista a proposta central desse trabalho, a partir desse momento, ateremos
nossa discussão exclusivamente sobre os Conselhos.
Contraditoriamente às orientações legais de constituição, objetivos e operacionalização
dos conselhos, os mesmos acabam apresentando distorções no seu funcionamento:
[Lamentavelmente esses espaços não se efetivaram como espaços reais de controle social e sim como] (...) espaços de pactuações em torno das dificuldades das gestões, tendem a forma consensos em torno das propostas
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para um suposto “bem comum” da sociedade. Os conselheiros tendem a ser responsabilizados pela gestão da saúde, como, por exemplo, em inúmeros casos se veem pressionados a aprovar prestações de contas pouco transparentes, sob o argumento dos prejuízos ao município ou Estado com a não aprovação das mesmas.Assim, os conselhos podem se constituir em mecanismos de legitimação do poder dominante e cooptação dos movimentos sociais, que em vez de controlar, passam a ser controlados (BRAVO e CORREIA, 2012, p. 135-136).
Existem outros problemas que são muito importantes ser trazido para debate, pois,
além dessa cooptação já citada, temos também a questão do desrespeito ao que determina o
Art. 1º § 4º da Lei 8142/90 “A representação dos usuários nos Conselhos de Saúde e
Conferências será paritária em relação ao conjunto dos demais segmentos”. Essa paridade em
muitos casos não é respeitada, são destinados assentos a Ongs ou entidades que nem sempre
representas os interesses da população e sim o interesse dos governantes. Há também a
situação que o conselheiro que representa a sociedade civil, exerce cargo do confiança para o
gestor, sendo mais fácil ser cooptado.
Outra barreira concreta no tocante aos conselheiros é quanto à formação dos mesmos
que são diversas e nem sempre é fácil se encontrar o caminho para superar essas diferenças
que podem ser antagônicos. Ser conselheiro é estar a no controle e na elaboração de
determinada política pública e suas ações, além de fiscalizá-la, portanto, todo o conhecimento
deve estar voltado para esse objetivo, que deve sempre ser norteado pelo interesse da
coletividade da comunidade. Outro grande desafio a ser enfrentado é a ausência de
participação da vida política; militar, fazer parte, conhecer e defender projetos que busquem
sempre defender o alargamento dos direitos de uma maioria e não de uma pequena minoria
que detém o poder.
Os desafios a vencer são grandes e numerosos. Construir uma cidadania de fato
participativa tem sido um grande desafio e cada dia mais, meios são criados para que todo e
qualquer movimento nesse sentido seja desarticulado. Não é interessante para a hegemonia
neoliberal que seja exercida a capacidade de pensar, planejar e construir juntos. Onde o povo
tem voz e vez. Lutar contra esse poder que tenta nos dominar é sem dúvida “remar contra a
maré”.
Por acreditar que estamos em um processo constante de mudança e construção e na
expectativa que possam ser sempre para melhor, não faremos conclusão ao fim desse trabalho.
Acreditamos que essa conclusão está sendo construída em nosso dia a dia e mudanças podem
vir e novos panoramas nos desafiam a não nos acomodarmos.
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Deixamos a todos os conselheiros um desafio de escolher qual tipo de conselho
desejam construir e a qual objetivo esse servirá, conforme nos fala Gohn (1990, p. 87) “Os
conselhos são instrumentos de determinados processos. Estes processos podem ter diferentes
objetivos, contribuir para mudanças sociais significativas ou auxiliar a consolidação de
estruturas sociais em transição ou sob o impacto de fortes pressões sociais”.
BIBLIOGRAFIA
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GOHN, Maria da Glória 1990 "Conselhos populares e participação popular", in Serviço Social e Sociedade, (São Paulo) V . IX, N º26, pp. 25 – 47
CARVALHO, Jose Murilo de. Cidadania do Brasil: o longo caminho. 3ª Ed. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira, 2002
BRAVO, Maria Inês Souza & CORREIA, Maria Valeria Costa. Desafios do controle social na atualidade. In Serviço Social & Sociedade. São Paulo: Cortez, n109, 2012.
DIAS, Edmundo Fernandes. A liberdade (im)Possível na ordem do capital. Reestruturação produtiva e passivização. 2ª edição. Textos didáticos. IFCH/UNICAMP. N.29. Setembro de 1999. p.39-78
BORON, Atílio. A sociedade civil após o dilúvio neoliberal. In SADER, Emir & GENTILE, Pablo (orgs.). Pós-neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995.
FALEIROS, Vicente de Paula. “Natureza e desenvolvimento das políticas sociais no Brasil”. In: Capacitação em serviço social e política social, módulo 3. – Brasília: UnB, Centro de Educação Aberta, Continuada a Distância, 2000, p. 41-56.
IAMAMOTO, M. V. Serviço Social em tempo de Capital Fetiche. Capital financeiro, trabalho e questão social. São Paulo: Cortez, 2011.
BRASIL. Lei Federal 8142, de 28 de dezembro de 1990. Brasília: Assessoria de Comunicação Social, 1991.
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