documento protegido pela lei de direito … · resumo a união estável na ... direito de família,...

62
Quantidade de “enter” para posicionar o cabeçalho, apague em seguida <> <> <> <> UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA <> <> <> <> <> DIREITO DE FAMÍLIA A UNIÃO ESTÁVEL NA SOCIEDADE BRASILEIRA <> <> Por: Maria de Lourdes Ivo Teixeira <> <> <> Orientador Prof. Jean Alves Rio de Janeiro 2013 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

Upload: ngoanh

Post on 07-Oct-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Quantidade de “enter” para posicionar o cabeçalho, apague em seguida

<>

<>

<>

<> UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA <> <> <> <> <>

DIREITO DE FAMÍLIA A UNIÃO ESTÁVEL NA SOCIEDADE BRASILEIRA

<> <>

Por: Maria de Lourdes Ivo Teixeira

<>

<>

<>

Orientador

Prof. Jean Alves

Rio de Janeiro

2013

DOCU

MENTO

PRO

TEGID

O PEL

A LE

I DE D

IREIT

O AUTO

RAL

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA <> <>

<>

<>

<> DIREITO DE FAMÍLIA

UNIÃO ESTÁVEL NA SOCIEDADE BRASILEIRA <>

<>

<>

<>

Apresentação de monografia à AVM Faculdade

Integrada como requisito parcial para obtenção do

grau de especialista em Direito Privado e Civil

Por: .Maria de Lourdes Ivo Teixeira

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus pela oportunidade de

aperfeiçoar e aumentar meus

conhecimentos jurídicos.

Aos meus pais e meu irmão (in

memoriam) pelo exemplo e incentivo à

cultura.

À minha irmã e meus sobrinhos pela

alegria demonstrada ao tomar

conhecimento da nova etapa assumida.

DEDICATÓRIA

Ao meu marido João Guilherme, pelo

entusiasmo, dedicação e colaboração

demonstrados durante o mais novo

projeto de minha vida.

RESUMO

A união estável na sociedade brasileira, tema de nossa pesquisa, inserida no

Direito de Família, é um estudo que se compõe de três capítulos com

referências bibliográficas e jurisprudenciais, em que enfocamos no Capítulo 1 a

origem da união estável, direitos, evolução legislativa e o seu posicionamento

no Código Civil. No Capítulo 2 tratamos da família homoafetiva, princípios e

direitos e a visão homofóbica da família heterossexual. No Capítulo 3 cuidamos

da legalização da união homoafetiva no Direito Comparado, a jurisprudência

nos Tribunais brasileiros e, por fim, a realização do sonho – o casamento.

METODOLOGIA

Para a realização do presente trabalho foram utilizados livros de

direito de autores famosos (juristas), consultas a jurisprudências, como também

pesquisas no direito comparado, tudo relativo ao tema proposto. Usamos as

reportagens em jornais, revistas, internet, bem assim opiniões de parentes e

amigos sobre a união estável entre pessoas de mesmo sexo e de sexos

diferentes, até mesmo quanto ao casamento homoafetivo.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I A União Estável 11

CAPÍTULO II - Família homoafetiva 30

CAPÍTULO III - A legalização das uniões homoafetivas 35

CONCLUSÃO 46

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 52

BIBLIOGRAFIA CITADA 55

ANEXO 1 48

ANEXO 2 51

ANEXO 3 53

ANEXO 4 54

ANEXO 5 56

ÍNDICE 61

8

INTRODUÇÃO

A sociedade atual vem modificando dia a dia seus conceitos, sua

maneira de viver, seus valores.

A agitação constante, as dificuldades diárias, a economia doméstica

e financeira, modifica as atitudes do cidadão urbano e faz com que a

objetividade social transforme determinados hábitos que hoje não

correspondem mais à realidade social antiga.

Logo, o que antigamente era visto como uma norma social imutável,

hoje já é visto de uma forma bem diferente e aceita como um fato costumeiro.

Estamos falando, nada mais nada menos, da união estável.

Para os nossos dias já não há preconceito e discriminação social

para aqueles que resolvem assumir a união estável como um modo de vida.

As relações humanas tendem a modificar-se dia a dia, e não há

porque não aceitar a união estável que está bem difundida na sociedade

brasileira, como em outros países.

Hoje é aceitável que as pessoas possam conviver

harmoniosamente, conhecendo-se melhor, sem que haja obstáculos sociais.

O casamento ainda existe, com todas as suas implicações,

obrigações, formalidades, mas isso não quer dizer que a felicidade seja maior

para as pessoas casadas, do que aquelas que vivem em união estável.

Algumas relações estáveis poderão ser convertidas, mais tarde, em

casamento. Outras não tendem a se perpetuar.

Alguns casamentos não sobrevivem a um longo tempo e esses

mesmos ex-cônjuges poderão se relacionar com outras pessoas e

formalizarem uniões estáveis duradouras e felizes. Outra situação também

pode suceder. Ex-cônjuges, que desfizeram o casamento através do divórcio,

mais tarde vieram a conviver em união estável perfeita.

Concluindo, temos que, o casamento sempre existirá, tanto aquele

que é amparado e regulado pela lei civil, bem assim o religioso. A união estável

tende a crescer muito mais porque, embora gere direitos e obrigações,

dispensa formalidades para sua constituição, e a finalidade é a mesma: a

felicidade das pessoas que a compõe. A realização do ser humano.

9

DIREITO DE FAMÍLIA CONCEITO

O Direito de Família é o mais humano de todos os direitos. É, de

todos os ramos do direito, o mais intensamente ligado à própria vida, porque de

um modo geral as pessoas provêm de uma organização familiar e a ela estão

vinculadas durante a sua existência mesmo que venham a constituir uma

família pelo casamento ou pela união estável.

A família é uma realidade sociológica e constitui a base do Estado, o

núcleo fundamental em que repousa toda a organização social (1).

Cabe ao Estado organizar a vida em sociedade e proteger os

indivíduos, devendo intervir para coibir excessos e impedir a colisão de

interesses (2).

O Estado impõe regras de comportamento para serem respeitadas

por todos a fim de viabilizar o convívio social.

O Estado tem o dever de regular as relações das pessoas, mas não

pode deixar de respeitar o direito à liberdade e garantir o direito à vida, de

forma digna e feliz (3).

O ordenamento jurídico possibilita a vida em sociedade e é

composto de uma infinidade de normas, que na bela expressão de Norberto

Bobbio, como as estrelas no céu, jamais alguém conseguirá contar (4).

(1) Carlos Roberto Gonçalves, Direito Civil Brasileiro, Direito de Família, v.6., p.17.

(2) Alvaro Villaça Azevedo, Do Bem de Família, 242

(3) Sérgio Gischkow Pereira, Estudo de Direito de Família, 13.

(4) Norberto Bobbio, A teoria do ordenamento jurídico, 37.

10

O Direito de Família constitui o ramo do Direito Civil que disciplina a

relação entre pessoas unidas pelo matrimônio, pela união estável ou pelo

parentesco, bem como os institutos complementares da tutela e da curatela,

visto que, embora tais institutos de caráter protetivo ou assistencial não

advenham de relações familiares, tem em razão de sua finalidade, nítida

conexão com aquele (5).

O Código Civil de 2002 destina o Livro IV da Parte Especial ao

Direito de Família. Trata em primeiro lugar sob o título “Do direito pessoal” das

regras sobre o casamento, sua celebração, validade e causas de dissolução,

bem como da proteção da pessoa dos filhos.

Em seguida, dispõe sobre as relações de parentesco, enfatizando a

igualdade plena entre os filhos consolidada pela Constituição Federal/1988.

No segundo título (Do direito patrimonial), cuida do direito

patrimonial decorrente do casamento, dando ênfase ao regime de bens e aos

alimentos entre parentes, cônjuges e conviventes. Disciplina também o usufruto

e a administração dos bens de filhos menores, bem como o bem de família.

O Título III é dedicado à união estável e seus efeitos, como inovação

e consequência de seu reconhecimento como entidade familiar pela CF/88 (art.

226, §3º).

Por fim, no Título IV o Código de 2002 normatiza os institutos

protetivos da tutela e da curatela, a exemplo do Código de 1916 (5).

(5) Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil Brasileiro, v. 5., p.3 - 4.

11

CAPÍTULO 1

A União Estável Na Sociedade Brasileira

1.Origem da união estável A evolução do conhecimento científico, os movimentos políticos e

sociais do século XX e o fenômeno da globalização provocaram mudanças

profundas na estrutura da família e nos ordenamentos jurídicos de todo o

mundo.

A família constitui o alicerce mais sólido em que se assenta toda a

organização social, e por isso merece a proteção especial do Estado como se

vê no art. 226, da CF/88 que a ela se refere como “base da sociedade”.

Daí porque se observa uma intervenção crescente do Estado no

campo do Direito de Família, visando conceder-lhe maior proteção e propiciar

melhores condições de vida às gerações novas.

O Código Civil de 1916 proclamava no art. 229 que o primeiro e

principal efeito do casamento é a criação da família legítima

A família estabelecida fora do casamento era considerada ilegítima e

só mencionada em alguns dispositivos que faziam restrições a esse modo de

convivência então chamado de concubinato, proibindo-se, por exemplo,

doações ou benefícios testamentários do homem casado à concubina, ou a

inclusão desta como beneficiária de contrato de seguro de vida.

Os filhos que não procediam de justas núpcias, mas de relações

extramatrimoniais, eram classificadas como ilegítimas e não tinham sua filiação

assegurada pela lei, podendo ser naturais ou espúrios.

Os naturais eram os que nasciam de homem e mulher entre os quais

não havia impedimento matrimonial.

Os espúrios eram os nascidos de pais impedidos de se casar entre

si em decorrência de parentesco, afinidade ou casamento anterior e se

dividiam em adulterinos e incestuosos.

Somente os filhos naturais podiam ser reconhecidos, embora

apenas os legitimados pelo casamento dos pais, após a sua concepção ou

nascimento, fossem em tudo equiparados aos legítimos.

Aos poucos, no entanto, a começar pela legislação previdenciária,

alguns direitos da concubina foram sendo reconhecidos, tendo a jurisprudência

admitido outros, como o direito à meação dos bens adquiridos pelo esforço

comum.

12

O grande passo, no entanto, foi dado pela atual Constituição, ao

proclamar, no art. 226, §3º “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a

união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei

facilitar sua conversão em casamento”.

A partir daí, a relação familiar nascida fora do casamento passou a

denominar-se união estável, ganhando novo status dentro do nosso

ordenamento jurídico.

1.1.Origem dos direitos da União Estável

Ao longo do século XX, as transformações sociais, foram gerando

uma sequência de normas que alteraram, gradativamente, a feição do direito

de família brasileiro, culminando com o advento da Constituição Federal de

1988. Esta alargou o conceito de família, passando a integrá-lo às relações

mono parentais, de um pai com seus filhos. Esse redimensionamento, “calcado

na realidade que se impôs, acabou afastando da ideia de família o pressuposto

de casamento. Para sua configuração, deixou-se de exigir a necessidade de

existência de um par, o que, consequentemente, subtraiu de sua finalidade a

proliferação” (6).

Assinala, a propósito, Eduardo de Oliveira Leite que a singeleza

ilusória de apenas dois artigos, os art. 226 e 227 da CF “gerou os efeitos

devastadores numa ordem jurídica, do Direito de Família, que se pretendia

pacificada pela tradição, pela ordem natural dos fatos e pela influência do

Direito Canônico” (7). O citado art. 227, aduz, redimensionou a ideia de filiação,

enquanto no art. 226 incluiu no plano constitucional o conceito de entidade

familiar, “que decorrente da união estável entre homem e mulher, quer daquele

oriundo da comunidade entre qualquer dos pais e seus descendentes, previsto

no art. 226, §4º da CF”.

(6) Yvone Coelho de Souza e Maria Berenice Dias, Famílias modernas, cit., v.8., p 65.

(7) Famílias Monoparentais, p.7 - 8.

13

O novo e instigante dispositivo constitucional reconheceu a

existência das “famílias monoparentais”, que passam, a partir de então, a ser

protegidas pelo Estado. Ao lado do casamento (legalizado), o constituinte

reconheceu a união livre (não legalizada).

1.2.Evolução Legislativa

Ao reconhecer como família a união estável entre um homem e uma

mulher a Carta Magna conferiu juridicidade ao relacionamento existente fora do

casamento.

Em 29.12.1994 surgiu a primeira lei (Lei 8971) regulando a previsão

constitucional, mas que se revelou tímida. Em 10.05.1996 surgiu a Lei 9278,

com maior campo de abrangência, já que não quantificou prazo de convivência

e albergou as relações entre pessoas somente separadas de fato, gerando a

presunção de que os bens adquiridos são frutos do esforço comum (8).

Finalmente, o Código Civil de 2002 inseriu o título referente à união

estável no Livro de Família, incorporando em cinco artigos, os princípios

básicos das aludidas leis, que têm agora caráter subsidiário, tratando, nesses

artigos, dos aspectos pessoais e patrimoniais.

Verifica-se assim, que a Constituição Federal, alterando o conceito

de família, impôs novos modelos.

Embora a família continue ser a base da sociedade e a desfrutar da

especial proteção do Estado, não mais se origina apenas do casamento, uma

vez que, a seu lado, duas novas entidades familiares passaram a ser

reconhecidas: a constituída pela união estável e a formada por qualquer dos

pais e seus descendentes (9).

(8) Yvone Coelho de Souza e Maria Berenice Dias, Famílias Modernas, cit., v.8., p.66.

(9) Heloisa Helena Barbosa, O direito de família, cit., 104.

14

1.3.União Estável no Código Civil O Código Civil de 2002 destina o Livro IV da Parte Especial ao

direito de família.

O Título III é dedicado à União Estável e seus efeitos como inovação

e consequência de seu reconhecimento como entidade famílias pela CF (art.

226, §3º)

Em cinco artigos o novo diploma incorpora os princípio básicos das

lei 8971/94 e 9278/96 que agora tem caráter subsidiário. Trata nesses

dispositivos, dos aspectos pessoais e patrimoniais, deixando para o direito das

sucessões, o efeito patrimonial sucessório. Em face da equiparação do referido

instituto ao casamento, aplicam-se-lhe os mesmos princípios e normas

atinentes a alimentos entre cônjuges.

Os termos mais usados nos textos legais para identificar os sujeitos

da união estável são companheiro (Lei 8971/94) e convivente (Lei 9278/96). O

Código Civil prefere o vocábulo companheiro, mas usa também convivente e

concubina. A própria CF já utilizava a nomenclatura companheiro (CF 201,V).

Todavia, essa diferença, não inviabiliza o uso das duas expressões como

sinônimas, servindo, ambas, para designar os que vivem sob união estável

(10).

(10) Euclides de Oliveira - União Estável: conceituação e efeitos jurídicos, 154.

15

1.4.Requisitos para a configuração da união estável Uma das características da união estável é a ausência de

formalismo pra a sua constituição. Enquanto o casamento é precedido de um

processo de habilitação, com publicação dos proclamas e de inúmeras outras

formalidades, a união estável, ao contrário, independe de qualquer solenidade,

bastando o fato da vida em comum. Como assinala Antonio Carlos Mathias

Coltro, a união de fato se instaura “a partir do instante em que resolvem seus

integrantes iniciar a convivência, como se fossem casados, renovando dia a dia

tal conduta, e recheando-a de afinidade e afeição, com vistas à manutenção da

intensidade” (11).

Embora por essa razão tal modo de relacionamento afetivo

apresente uma aparente vantagem, por não oferecer dificuldade para sua

eventual dissolução, bastando o mero consenso dos interessados, por outro

lado cede passo como acentua Euclides de Oliveira (12), à dificuldade de prova

que lhe é inerente, por falta de documento constitutivo da entidade familiar.

Recomenda, por isso, o mencionado autor, embora não exigível

instrumentação escrita, seja formalizada a constituição da união estável “por

meio de um contrato de convivência entre as partes, que servirá como marco

de sua existência, além de propiciar regulamentação do regime de bens que

venham a ser adquiridos no seu curso. Os mais preocupados ainda poderão,

ao seu alvitre, solenizar o ato de união mediante reunião de familiares e amigos

para comemorar o evento, até mesmo com troca de alianças e as bênçãos de

um celebrante religioso, em festa semelhante às bodas oficiais”.

(11) A união estável: um conceito? in Direito de Família - Aspectos constitucionais,

civis e processuais, v. 2., p. 37.

(12) União estável, cit., p. 125.

16

Esclarece Zeno Veloso que, malgrado a teoria da união estável seja

a informalidade, não se pode dizer que a entidade familiar surja no mesmo

instante em que o homem e a mulher passam a viver juntos, ou no dia

seguinte, ou logo após. Há que existir, aduz, uma duração, “a sucessão de

fatos e de eventos, a convivência more uxorio, a notoriedade, enfim a soma de

fatores subjetivos e objetivos que, do ponto de vista jurídico, definem a situação

(13).

Vários são, portanto, os requisitos ou pressupostos para a

configuração da união estável, desdobrando-se em subjetivos e objetivos.

Podem ser apontados como de ordem subjetiva os seguintes: a) convivência

more uxorio, b) affectio maritalis; ânimo ou objetivo de constituir família. E, com

o de ordem objetiva: a) diversidade de sexos; b) notoriedade; c) estabilidade ou

duração prolongada; d) continuidade; e) inexistência de impedimentos

matrimoniais; f) relação monogâmica.

1.4.1.Pressupostos de ordem subjetiva

a) - Convivência “more uxório”. É mister uma comunhão de vidas no

sentido material e imaterial, em situação similar à de pessoas casadas. Envolve

a mútua assistência material, moral e espiritual, a troca e soma de interesses

da vida em conjunto, atenção e gestos de carinho, enfim, a somatória de

componentes materiais e espirituais que alicerçam as relações afetivas

inerentes à entidade familiar.

Embora o art.1723 do Código Civil não se refira expressamente à

coabitação ou vida em comum sob o mesmo teto, tal elemento constitui uma

das mais marcantes características da união estável, até porque, com o

acentua Zeno Veloso, “essa entidade familiar decorre desse fato, da aparência

de casamento, e essa aparência é o elemento objetivo da relação, a mostra, o

sinal exterior, a fachada, o fator de demonstração inequívoca da constituição

de uma família” (14).

(13) Código Civil Comentado, v. XVII, p. 117.

(14) Código Civil Comentado, v. XVII, p. 115.

17

A Súmula 382 do Supremo Tribunal Federal proclama, todavia, que

“a vida em comum sob o mesmo teto, more uxório, não é indispensável à

caracterização do concubinato”. É difícil, no entanto, imaginar que o casal

tenha a intenção de constituir família se não tem vida em comum sob o mesmo

teto. A aludida Súmula fala em concubinato e não em união estável. Foi editada

numa época em que se dava ênfase, para o reconhecimento dos direitos da

concubina, à existência de uma sociedade de fato, de caráter obrigacional, em

que pouco importava a convivência sob o mesmo teto para sua caracterização.

Com tais argumentos vários julgados têm afastado a aplicação da

aludida súmula 382 do STF à união estável, afirmando-se que “não há como

reconhecer o relacionamento afetivo, mesmo que de longa data, como união

estável, se as partes não viviam sob o mesmo teto. A moradia comum é

configuração típica de uma vida de casados, a que almeja a união estável”

(15).

Argumenta-se, diz outro julgado, “esgrimindo-se contra a tese da

necessidade da vida em comum sob, o mesmo teto, com a Súmula 382 do

STF”.

Esse argumento, com a máxima vênia, revela desconhecimento do

verdadeiro sentido da aludida Súmula, que fala em concubinato, não em união

estável.

A Súmula foi editada há cerca de quarenta anos, quando era

impensável algo parecido com a união estável (16).

Pode acontecer, todavia, que os companheiros, excepcionalmente,

não convivam sob o mesmo teto por motivo justificável, ou seja, por

necessidade profissional ou contingência pessoal ou familiar. Nesse caso,

desde que, apesar do distanciamento físico, haja entre eles a affectio

societatis, a efetiva convivência, representada por encontros frequentes, mútua

assistência e vida social comum, não há como negar a existência da entidade

familiar.

(15) TJRS. Ap. 70.000.339.168, 7ª Câmara Cível, rel. Des. Brasil Santos, j. 1º-3-2000.

(16) TJRS. EI 70.003.119.187, 4ª Câmara, rel.Des. Vasconcellos Chaves,j.12.4.2002.

18

Efetivamente, acarreta insegurança no meio social atribuir a uma

relação entre duas pessoas que viviam sob tetos diferentes, sem justificativa

plausível para esse procedimento, a natureza da união estável, com todos os

direitos que esta proporciona. Mas, por outro lado, não se pode ignorar o

comportamento de muitos casais, que assumem ostensivamente a posição de

cônjuges, de companheiro e companheira, mas em casas separadas. Nem por

isso se pode afirmar que não estão casados, ou não vivem em união estável.

Como acentua Zeno Veloso, “se o casal morando em locais

diferentes assumir uma relação afetiva, se o homem e a mulher estão imbuídos

do ânimo firme de constituir família, se estão na posse do estado de casados, e

se o círculo social daquele par, pelo comportamento e atitudes que os dois

adotam, reconhece ali uma situação com aparência de casamento, tem-se de

admitir a existência de união estável” (17).

A tendência parece ser mesmo, como assinala Rodrigo da Cunha

Pereira, “a de dispensar a convivência sob o mesmo teto para a caracterização

da união estável, exigindo-se, porém, relações regulares, seguidas, habituais e

conhecidas, se não por todo mundo, ao menos por um pequeno círculo” (18),

aduzindo o mencionado autor que “no direito brasileiro já não se toma o

elemento de coabitação como requisito essencial para caracterizar ou

descaracterizar o instituto da união estável, mesmo porque, hoje em dia, já é

comum haver casamentos em que os cônjuges vivem em casas separadas,

talvez como uma fórmula para a durabilidade das relações”.

Esse tem sido, com efeito, o, posicionamento do STJ: “não exige a

lei específica (Lei 9278/96) a coabitação com o requisito essencial para

caracterizar a união estável”. Na realidade, a convivência sob o mesmo teto

pode ser um dos fundamentos a demonstrar a relação comum, mas a sua

ausência não afasta, de imediato, a união estável. Diante das alterações de

costumes, além das profundas mudanças pelas quais tem passado a

sociedade, não é raro encontrar cônjuges ou companheiros residindo em locais

diferentes.

(17) Código Civil, cit., v. XVII, p.114.

(18) Concubinato e união estável, p.30.

19

O que se mostra indispensável é que a união se revista de

estabilidade, ou seja, que haja aparência de casamento (19).

b) “Affectio maritalis”: ânimo ou objetivo de constituir família. O

elemento subjetivo é essencial para a configuração da união estável. Além de

outros requisitos, é absolutamente necessário que haja entre os conviventes,

além do afeto, o elemento espiritual caracterizado pelo ânimo, a intenção, o

firme propósito de constituir um a família, em fim a “affectio maritalis”.

O requisito em apreço exige a efetiva constituição de família, não

bastando para a configuração da união estável o simples animus, o objetivo de

constituí-la, “já que, se assim não fosse, o mero namoro ou noivado, em que há

somente o objetivo de formação familiar, seria equiparado à união estável” (20).

Não configuram união estável, com efeito, os encontros amorosos,

mesmo constantes, ainda que os parceiros mantenham relações sexuais, nem

as viagens realizadas a dois ou o comparecimento juntos a festas, jantares,

recepções etc., se não houver da parte de ambos o intuito de constituir uma

família.

Muitas vezes se torna difícil a prova do aludido elemento subjetivo.

São indícios veementes dessa situação de vida à moda conjugal “a mantença

de um lar comum, frequência conjunta a eventos familiares e sociais, eventual

casamento religioso, existência de filhos havidos dessa união, mútua

dependência econômica, empreendimentos em parceria, contas bancárias

conjuntas etc.” (21).

(19) Resp. 474.962-SP., 4ª T., rel. Min. Salvio de Figueiredo Teixeira, DJU 1º.3.2004.

(20) Regina Beatriz Tavares da Silva. Novo Código Civil Comentado, p. 1532.

(21) Euclides de Oliveira-União estável, cit., p.133.

20

1.4.2.Pressupostos de ordem objetiva a)Diversidade de sexos.

Por se tratar de modo de constituição de família que se assemelha

ao casamento, apenas com a diferença de não exigir a formalidade da

celebração, entendia-se, até recentemente, que a união estável só poderia

decorrer de relacionamento entre pessoas de sexo diferente. A doutrina

considerava da essência do casamento a heterossexualidade e classificava na

categoria de ato inexistente, a união entre pessoas do mesmo sexo.

Segundo a lição de Alvaro Villaça Azevedo “desde que foram

conferidos os efeitos ao concubinato, até o advento da Súmula 380 do

Supremo Tribunal Federal, sempre a Jurisprudência brasileira teve em mira o

par andrógino, o homem e a mulher. Coma CF, de 05.10.1988, ficou bem claro

esse posicionamento, de só reconhecer, com o entidade familiar, a união

estável entre o homem e a mulher, conforme o claríssimo enunciado do §3º do

seu art. 226” (22).

A Jurisprudência reconhecia tão somente a existência de sociedade

de fato, entre sócios, a indicar direitos de participação no patrimônio formado

pelo esforço comum de ambos, e não união livre como entidade familiar. Desse

modo, a união de duas pessoas do mesmo sexo, chamada de parceria

homossexual ou união homoafetiva, por si só, não gerava direito algum para

qualquer delas, independentemente do período de coabitação (23).

(22) Comentários ao Código Civil,v. 19, p.203.

(23) TJMG, RT 742/393. V. Inventário. Habilitação. Companheiro do falecido.

Pretensão à condição de herdeiro e meeiro do de cujus. Não cabimento. Direitos

decorrentes da união estável para fins sucessórios restritos ao companheiro

sobrevivente de união estável entre homem e mulher. (TJSP, Lex 262/319). “Ainda

que evidenciada por longo tempo a relação homossexual entre dois homens, a ela não

se aplicam as disposições da lei 8791/94, sob a alegação da união estável”. Sobretudo

porque a Carta Magna, em seu art. 226 estabelece que a família, base da sociedade,

tem especial proteção do Estado, e que é reconhecida a união estável entre homem e

mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento.

Esse preceito constitucional, pois, tem por escopo a união entre pessoas de sexo

oposto e não elementos do mesmo sexo (TJRJ, Ap. 10.704/2000, 3ª Câm. Cív.).

21

É de ponderar, neste ponto, segundo ainda, a doutrina de Alvaro

Villaça Azevedo que “provada a sociedade de fato, entre os conviventes do

mesmo sexo, está presente o contrato de sociedade, reconhecido pelo art.

1363 do Código Civil, independentemente de casamento ou de união estável”.

Sim, porque celebram contrato de sociedade as pessoas que se obrigam,

mutuamente, a combinar seus esforços pessoais e/ou recursos materiais, para

a obtenção de fins comuns (24).

A matéria ficava assim excluída do âmbito do Direito de Família,

gerando apenas efeitos de caráter obrigacional.

A diversidade de sexos, com o já foi dito, requisito natural do

casamento, sendo, por isso, consideradas inexistentes as uniões

homossexuais.

Aos pouco, no entanto, eminentes doutrinadores começaram a

colocar em evidência, com absoluta correção, a necessidade de atribuir

verdadeiro estatuto de cidadania às uniões estáveis homoafetivas.

Na jurisprudência, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

passou a reconhecer a união entre homossexuais como possível de ser

abarcada dentro do conceito de entidade familiar, sob a forma de união estável

homoafetiva, ao fundamento de que a ausência de lei específica sobre o tema

não implica ausência de direito, pois existem mecanismos para suprir as

lacunas legais aplicando-se aos casos concretos a analogia, os costumes e os

princípios gerais de direito, em consonância com os preceitos constitucionais

(art. 4º da LINDB) (25).

(24) Alvaro Villaça Azevedo. Comentários, cit., v.19, p.296.

(25) TJRS. Ap. 70.009.550.070, 7ª Câm. Cív., rel. Des. Maria Berenice Dias. j.,

17.11.2004. V. ainda “constitui união estável a relação fática entre duas mulheres,

configurada na convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com o objetivo

de constituir verdadeira família, observados os deveres de lealdade, respeito e mútua

assistência”.

22

A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça admitiu a possibilidade

jurídica do pedido de reconhecimento da união estável entre homossexuais e

determinou que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro retomasse o

julgamento da ação envolvendo um brasileiro e um canadense, que viviam

juntos havia quase 20 anos, ação esta que fora extinta sem análise de mérito.

Os Ministros Pádua Ribeiro (relator) e Massami Uyeda votaram a favor do

pedido, por entenderem que a legislação brasileira não traz nenhuma proibição

ao reconhecimento de união estável entre pessoas do mesmo sexo. Os

Ministros Fernando Gonçalves e Aldir Passarinho Junior votaram contra, por

entenderem que a CF só considera entidade familiar a união estável resultante

da relação entre homem e mulher. O Ministro Luis Felipe Salomão, que proferiu

o voto de desempate, também ressaltou que o legislador, caso desejasse,

poderia utilizar expressão restritiva de modo a impedir que a união entre

pessoas do mesmo sexo ficasse definitivamente excluída da abrangência legal,

mas não procedeu dessa maneira (26).

(26) Disponível em http://www.ibdefam.org.br/noticias&noticias2636, acessado em

5.9.2008.

23

Em 1998, o STJ, tendo como relator o Ministro Ruy Rosado de

Aguiar Junior, decidiu que, em caso de casal homossexual, o parceiro teria

direito a receber metade do patrimônio obtido pelo esforço comum. (REsp

148.897). Também já foi reconhecido pela 6ª Turma da mencionada Corte o

direito do parceiro receber a pensão por morte do companheiro (REsp

395.804).

À falta de legislação específica, os casais que viviam em união

homoafetiva buscavam os seus direitos junto ao Poder Judiciário. Os tribunais

reconheciam nesses casos, o direito de inclusão do companheiro como

dependente no plano de saúde; de recebimento de pensão em caso de morte

do parceiro segurado no INSS ou em plano de previdência privada (27); de

guarda de filhos, em caso de um dos parceiros ser mãe ou pai biológico da

criança; de adoção por casal formado por duas pessoas do mesmo sexo; e de

participação no patrimônio formado pelo esforço comum de ambos.

No dia 5.5.2011, o STF, ao julgar a Ação Direta de

Inconstitucionalidade (ADIn) 4277 e a Arguição de Descumprimento de

Preceito Fundamental (ADPF) 132, reconheceu a união homoafetiva como

entidade familiar, regida pelas mesmas regras que se aplicam à união estável

dos casais heterossexuais. Proclamou-se, com efeito vinculante, que o não

reconhecimento da união homoafetiva contraria preceitos fundamentais como

igualdade, liberdade (da qual decorre a autonomia de vontade) e o princípio da

dignidade da pessoa humana, todos da CF. A referida Corte reconheceu,

assim, por unanimidade, a união homoafetiva como entidade familiar, tornando

automáticos os direitos que até então eram obtidos com dificuldade na Justiça.

(27) Decidiu a 3ª Turma do STJ. Comprovada a existência de união estável entre

pessoas do mesmo sexo, deve-se reconhecer o direito do companheiro sobrevivente

de receber benefícios decorrentes do plano de previdência privada (PREVI-Caixa de

Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil) com os idênticos efeitos operados

pela união estável. “Até então tal benefício só era concedido dentro do Regime Geral

da Previdência Social. Aduziu a relatora Ministra Nancy Andrighi: “Se por força do art.

16 da Lei 8213/91, a necessária dependência econômica para a concessão da pensão

por morte entre companheiro de união estável é presumida, também o é no caso de

companheiros do mesmo sexo, diante do emprego da analogia que se estabeleceu

entre essas duas entidades familiares (STJ, REsp 1016.981-RJ, 3ª Turma, rel.

Nancy Andrighi). Disponível em http//www.conjur.com.br

24

O STJ, logo depois, ou seja, no dia 11.5.2011, aplicou o referido

entendimento do STF, por causa do seu efeito vinculante, reconhecendo

também o status da união estável aos relacionamentos homoafetivos (28).

b)Notoriedade

Exige o art. 1723 do Código Civil, para que se configure a união

estável, que a convivência, além de contínua e duradoura, seja “pública”. Não

pode, assim, a união permanecer em sigilo, em segredo, desconhecida no

meio social. Requer-se por isso, notoriedade ou publicidade no relacionamento

amoroso, ou seja, que os companheiros apresentem-se à coletividade como se

fossem marido e mulher (more uxório). Relações clandestinas, desconhecidas

da sociedade, não constituem união estável.

Realmente como um fato social “a união estável é tão exposta ao

público como o casamento, em que os companheiros, são conhecidos no local

em, que vivem, nos meios sociais, principalmente de sua comunidade, junto

aos fornecedores de produtos e serviços, apresentando-se, enfim, como se

casados fossem. Diz o povo em sua linguagem autêntica, que só falta aos

companheiros “o papel passado” (29).

Nessa consonância, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul manteve a decisão da 2ª Vara de Família e Sucessões da

Capital que não reconheceu a união estável entre um padre da igreja católica,

falecido em 2007, e uma mulher com quem se relacionou efetivamente. Frisou

o relator que “quando a lei fala em publicidade do relacionamento, a mesma

não pode ser limitada. Pelo contrário, deve ser ampla e irrestrita para que

chegue ao conhecimento de tantas pessoas quanto possível e em todos os

lugares públicos. Não é porque o casal frequentava locais adredemente

escolhidos em razão do impedimento legal e moral do de cujus, que estava

suprido o requisito do art. 1723 do Código Civil (convivência pública)”.

(28) 2ª Seção, rel. Min. Nancy Andrighi.

Disponível em http//www.conjur.com.br 13.5.2011.

(29) Alvaro Villaça Azevedo, Comentários, cit., v. 19, p. 254-255.

25

c)Estabilidade ou duração prolongada A denominação “união estável” já indica que o relacionamento dos

companheiros deve ser duradouro, estendendo-se no tempo. Não obstante, tal

requisito foi enfatizado no art. 1723 do Código Civil, ao exigir que a convivência

seja pública, contínua e “duradoura”. Ainda que a lei não estabeleça um prazo

determinado de duração para a configuração da entidade familiar, a

estabilidade da relação é indispensável.

Embora o nosso diploma não tenha estabelecido prazo algum para

caracterização da união estável, pondera Zeno Veloso que “o que não se

marcou foi um prazo mínimo, um lapso de tempo rígido, a partir do qual se

configuraria a união estável. Mas há um prazo implícito, sem dúvida, a ser

verificado diante de cada situação concreta. Como poderá um relacionamento

afetivo ser público, contínuo e duradouro se não for prolongado, se não tiver

algum tempo, o tempo que seja razoável para indicar que está constituída uma

entidade familiar?”.

A Lei n. 8971/94 exigia o prazo de cinco anos de convivência, ou

prole, para a configuração da união estável. A Lei n. 9278/96 omitiu o tempo

mínimo de com vivência e existência de prole. Para alguns autores seria

razoável exigir-se um prazo mínimo de convivência, entendendo outros que

poderia ele ser de pelo menos dois anos de vida em comum, por analogia com

as disposições constitucionais e legais relativas ao tempo para concessão do

divórcio. No entanto, não parece correto, como adverte Euclides de Oliveira, o

engessamento temporal de uma relação amorosa “que pode subsistir durante

alguns meses ou anos, consolidando-se na linguagem do poeta como definitiva

enquanto dure”.

O prazo de cinco anos, que chegou a constar do Projeto do Novo

Código Civil, mostra-se inconveniente em algumas hipóteses, como lembra

Alvaro Villaça Azevedo: “Existe inconveniente, por exemplo, se já estiverem os

companheiros decididos a viver juntos, com prova inequívoca (casamento

religioso, por exemplo) e qualquer deles adquirir patrimônio onerosamente,

antes do complemento desse prazo. Por outro lado, pode haver início da união

já com filhos comuns”.

Desse modo, deverá o juiz, em cada caso concreto, verificar se a

união perdura por tempo suficiente ou não, para o reconhecimento da

estabilidade familiar, perquirindo sempre o intuito de constituição de família,

que constitui o fundamento do instituto em apreço.

26

d)Continuidade.

Para que a convivência possa ser alçada à categoria de união

estável faz-se necessário que, além de pública e duradoura, seja também

“contínua”, sem interrupções (Código Civil art. 1723). Diferentemente do

casamento em que o vínculo é formalmente documentado, a união estável é

um fato jurídico, uma conduta, um comportamento. A sua solidez é atestada é

atestada pelo caráter contínuo do relacionamento. A instabilidade causada por

constantes rupturas desse relacionamento poderá provocar insegurança a

terceiros, nas suas relações jurídicas com o s companheiros.

Naturalmente, desavenças e desentendimentos ocorrem com todos

os casais, durante o namoro, o noivado, o casamento ou o companheirismo,

seguido, muitas vezes, de uma breve ruptura do relacionamento e posterior

reconciliação. Todavia, “se o rompimento for sério, perdurando por tempo que

denote efetiva quebra de vida em comum, então se estará rompendo o elo

próprio de uma união estável. Se já havia tempo suficiente para sua

caracterização, a quebra de convivência será causa de dissolução, à

semelhança do que se dá no casamento. Se não havia tempo bastante que se

pudesse qualificar como “duradouro” então sequer estaria configurada a união

estável, ficando na pendência de uma eventual reconciliação com recontagem

de tempo a partir do reinício da convivência, tanto para fins de duração como

para sua continuidade.

Caberá ao juiz, depois de analisar as circunstâncias e as

características do caso concreto, decidir se a hipótese configura união estável,

mesmo tendo havido ruptura do relacionamento e reconciliação posterior ou

não.

Se os companheiros, depois de estabelecer a união estável, se

casam ou a convertem em casamento, o tempo anterior de convivência

permanecerá valendo como união estável, com natural sujeição às normas da

legislação correspondente, em especial quanto à divisão dos bens havidos em

comum durante esse período. Assim, os bens adquiridos pelo casal, em cada

período, serão computados para efeito de partilha, se a aquisição ocorreu a

título oneroso. Cada patrimônio, em cada união matrimonial ou estável, deve

ser considerado isoladamente, para que se evitem locupletamento sem causa,

indevido.

Decidiu o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que, havendo

convolação da união estável em casamento, a vigência deste se inicia a partir

da data do pedido.

27

Nada obsta que o casal separado judicialmente, ou divorciado e que

volta a conviver, opte por não restabelecer o casamento e passe a viver em

união estável. Nesse contexto assentou o Tribunal de Justiça de São Paulo

“Ex-cônjuges”. Restabelecimento de vida em comum, sem restauração do

vínculo. Declaratória objetivando o reconhecimento da sociedade de fato.

Interesse de agir existente. Inadmissibilidade de ser imposto ao casal o

restabelecimento do casamento civil. Extinção do processo afastada.

e)Inexistência de impedimentos matrimoniais

O §1º do art. 1723 do Código Civil veda a constituição de união

estável “se ocorrerem os impedimentos do art. 1521”, ressalvado o inciso VI,

que proíbe o casamento das pessoas casadas, se houver separação judicial ou

de fato. Assim, não podem constituir união estável os ascendentes com os

descendentes, seja o parentesco natural ou civil; os afins em linha reta, ou

seja, sogro e nora, sogra e genro, padrasto e enteada, madrasta e enteado,

observando-se que o vínculo de afinidade resulta tanto do casamento com o da

união estável, com o dispõe o art. 1595, “caput”; os irmãos, unilaterais ou

bilaterais, os colaterais até o terceiro grau inclusive, e o cônjuge sobrevivente

com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu

consorte.

Os impedimentos baseados no interesse público e com forte

conteúdo moral, que representem um obstáculo para que uma pessoa

constitua família pelo vínculo do casamento, são aplicáveis também, para os

que pretendem estabelecer família pela união estável. Quem não tem

legitimação para casar não tem legitimação para criar entidade familiar pela

convivência, ainda que observe os requisitos do “caput” do art. 1723 do Código

Civil.

Dispõe o §2º do aludido art. 1723 que, porém, “as causas

suspensivas do art. 1523 não impedirão a caracterização da união estável”.

Não se aplicam, portanto, à união estável as causas suspensivas que

correspondem aos impedimentos proibitivos ou meramente impedientes do art.

183, XIII a XVI, do Código de 1916. Dessa forma pode a viúva, por exemplo,

constituir união estável, mesmo que o novo relacionamento se inicie antes de

10 meses depois do começo da viuvez.

28

f)Relação monogâmica Como também ocorre nas uniões conjugais, o vínculo entre os

companheiros deve ser único, em face do caráter monogâmico da relação.

Não se admite que a pessoa casada, não separada de fato, venha a

constituir união estável, nem que aquela que convive com um companheiro

venha a constituir outra união estável. A referência aos integrantes da união

estável, tanto na CF como no novo Código Civil é sempre feita no singular.

Assim, “a relação de convivência amorosa formada à margem de um

casamento ou de uma união estável caracteriza-se como proibida, porque

adulterina, no primeiro caso, e desleal no segundo”.

Embora a convivência múltipla a um só tempo, simultânea, não

caracterize união estável, admite-se a existência de uniões estáveis

sucessivas. Pode, com efeito, uma pessoa conviver, com observância dos

requisitos do art. 1723, “caput”, do Código Civil, em épocas diversas com

pessoas diversas.

Os direitos dos companheiros serão definidos, nessa hipótese, em

cada período de convivência, como também sucede com a pessoa que se casa

mais de uma vez, sucessivamente.

O vínculo entre os companheiros, assim, tem de ser único, em vista

do caráter monogâmico da relação. Pode acontecer, todavia, que um dos

conviventes esteja de boa-fé, na ignorância de que o outro é casado e vive

concomitantemente com seu cônjuge ou mantém outra união estável. Zeno

Veloso defende o reconhecimento, nessa hipótese, ao convivente de boa-fé

que ignorava a infidelidade ou a deslealdade do outro “uma união putativa com

os respectivos efeitos para este parceiro inocente”.

Na mesma linha, Euclides de Oliveira, sustenta a possibilidade de

existir uma segunda união de natureza putativa, como se dá no casamento,

mesmo em casos de nulidade ou de anulação, quando haja boa-fé por parte de

um ou de ambos os cônjuges, com reconhecimento de direitos, nos termos do

art. 1561 do Código Civil.

Da mesma forma, e por igual razão, “pode haver uma união estável

putativa quando o partícipe da segunda união não saiba da existência de

impedimento decorrente da anterior e simultânea união de seu companheiro;

para o companheiro de boa-fé subsistirão os direitos da união que lhe parecia

estável, desde que duradoura, contínua, pública e com o propósito de

constituição de família, enquanto não reconhecida ou declarada a sua

invalidade em face de uma união mais antiga e que ainda permaneça”.

29

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul tem, reiteradamente,

reconhecido as denominadas “uniões paralelas” como uniões estáveis, ao

fundamento, especialmente, de que “o judiciário não pode se esquivar de

tutelar as relações baseadas, no afeto, não obstante as formalidades muitas

vezes impingidas pela sociedade para que uma união seja “digna” de

reconhecimento judicial”. Dessa forma, havendo duplicidade de uniões

estáveis, cabível a partição do patrimônio amealhado na concomitância das

duas relações.

Todavia, o STF, no julgamento do caso da família paralela

constituída, durante 37 anos, por Valdemar do Amor Divino Santos e Joana da

Paixão Luz, da qual resultaram 9 filhos (Valdemar teve ainda 11 filhos com a

esposa, com a qual vivia maritalmente), decidiu com voto contrário do Ministro

Carlos Ayres Britto, que não acolhia a pretensão da primeira de receber a

metade da pensão por morte do citado Valdemar. Segundo o relator, Min.

Marco Aurélio, a referida união afetiva não podia ser considerada merecedora

da proteção do Estado, porque conflitava com o direito posto. O atual Código

Civil, aduziu, “versa, ao contrário do anterior, de 1916, sobre a união estável,

realidade a consubstanciar núcleo familiar. Entretanto, na previsão está

excepcionada a proteção do Estado quando existente impedimento para o

casamento relativamente aos integrantes da união, sendo que, se um deles é

casado, esse estado civil apenas deixa de ser óbice quando verificada a

separação de fato. A regra é fruto do texto constitucional e, não se pode olvidar

que ao falecer, o varão encontrava-se na chefia da família oficial, vivendo com

a esposa”. Entendimento reiterado pelo STF (RE 590.779-ES, j. 10.02.2009).

Igualmente a 6ª Turma do STJ negou à concubina o direito ao

recebimento de pensão por morte do segurado legalmente casado. Por maioria

de votos foi reformado o Acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região

que entendeu dever a pensão ser rateada entre a viúva e a concubina, diante

da demonstrada dependência econômica desta.

Por sua vez, a 3ª Turma da referida Corte igualmente afastou a

pretensão manifestada por concubina, afirmando que “emprestar aos novos

arranjos familiares, de uma forma linear, os efeitos jurídicos inerentes à união

estável, implicaria julgar contra o que dispõe a lei; isso porque o art. 1727 do

Código Civil/02 regulou, em sua esfera de abrangência, as relações afetivas

não eventuais em que se fazem presentes impedimentos para casar, de forma

que só podem constituir concubinato os relacionamentos paralelos a

casamentos ou união estável pré e coexistente”.

30

CAPÍTULO 2 FAMÍLIA HOMOAFETIVA

CONCEITO A homossexualidade acompanha a história do homem. Sabe-se da

sua existência desde os primórdios dos tempos gregos (1). Não é crime nem

pecado; não é uma doença nem um vício. Também não é um mal contagioso,

nada justificando a dificuldade que as pessoas têm de conviver com

homossexuais. É simplesmente uma outra forma de viver. A origem não se

conhece. Aliás, nem interessa, pois, quando se buscam causas, parece que se

está atrás de um remédio, de um tratamento para encontrar cura para algum

mal. Mas tanto a orientação sexual não é uma doença que, na Classificação

Internacional das Doenças-CID, está inserida no capítulo Dos Sintomas

Decorrentes de Circunstâncias Psicossociais. O termo “homossexualismo” foi

substituído por homossexualidade, pois o sufixo “ismo” significa doença,

enquanto o sufixo “dade” quer dizer modo de ser (2).

Em face do repúdio social, fruto da rejeição de origem religiosa, as

uniões de pessoas do mesmo sexo receberam, ao longo da história, um sem

número de rotulações pejorativas e discriminatórias. Porém, essa é uma

realidade que não se pode mais fazer de conta que não existe. É que as

pessoas não abandonam o sonho de buscar a felicidade. Afastam-se de

relacionamentos jurados como eternos e partem em busca de novos amores.

Ingressam em novos vínculos afetivos, mesmo afrontando o estabelecido pelo

Estado como forma única de constituição da família. Mas a felicidade nem

sempre se encontra no relacionamento heterossexual.

(1) Maria Berenice Dias, União homoafetiva...35

(2) Idem, 53.

31

2.1Princípio da não-discriminação A Constituição Federal expressa, no seu art. 3ª, como objetivo da

República Federativa do Brasil, “a construção de uma sociedade livre, justa e

solidária, e a promoção do bem de todos, sem preconceito de origem, raça,

sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminações”.

Melhor seria que a orientação e a expressão sexual tivessem sido

incluídas, explicitamente, no rol prescrito no art. 226 da Constituição Federal de

1988.

As organizações lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros (LGBT)

pressionaram muito os constituintes, para que isso acontecesse, mas não

obtiveram êxito, embora a homofobia esteja provocando a morte de muitos

homossexuais.

Porta nova (2008), ao julgar recurso referente à primeira ação em

que dois homens pedem autorização para contraírem casamento, no Tribunal

de Justiça gaúcho (e, possivelmente, na Justiça brasileira), diz ser descabida a

discriminação que impede os homossexuais de realizarem o desejo do

matrimônio. E justifica de forma admirável: “(...) quando nos colocamos a

discutir a orientação sexual das pessoas, seja ela qual for, invadimos uma

dimensão tão privada que, talvez, em sede de direito não se devesse ter a

liberdade de fazê-lo”. De acordo com esse juiz, a sexualidade humana integra

os direitos da personalidade, de tal modo que orientar-se conforme sua

vontade, fazer escolhas, alterar o próprio meio, adaptando-se às suas

necessidades - tudo isso faz parte da essência do ser humano, não podendo

ser considerado “não natural”.

O especialista em Bioética, D’Agostinho (2006. p. 129-140, apud

PORTANOVA, 2008) afirma ser necessário,

(...) ler a sexualidade humana não apenas biologicamente, mas

antropologicamente, numa perspectiva que não pretenda calcar sua

compreensão sobre aquela (aliás, essencial) dos seus mecanismos

fisiológicos, ou sobre o mero funcionamento dos órgãos com os quais

extrinsecamente se manifesta e que, por isso mesmo, denominamos sexuais. É

necessário pesar a sexualidade humana com referência a toda a pessoa, como

direcionada não apenas à reprodução da espécie, mas, em primeiro lugar, à

própria reprodução do eu.

Silva (2001, p. 226-27) também reconhece que o legislador

constituinte optou por “vedar distinções de qualquer natureza e qualquer forma

de discriminação, que são (expressões) suficientemente abrangentes para

32

recolher, também, aqueles fatores que têm servido de base para

desequiparações e preconceitos”.

2.2.Direito à sexualidade

A sexualidade integra a própria condição humana. É direito humano

fundamental que acompanha a pessoa desde o seu nascimento, pois decorre

de sua própria natureza. Como direito do indivíduo, é um direito natural,

inalienável e imprescritível. Ninguém pode se realizar como ser humano senão

tiver assegurado o respeito ao exercício sexualidade, conceito que compreende

tanto a liberdade sexual, como a liberdade à livre orientação sexual. O direito a

tratamento igualitário independe da tendência afetiva. Todo ser humano tem o

direito de exigir respeito ao livre exercício da sexualidade, pois é um elemento

integrante da própria natureza humana e abrange sua dignidade (3).

Como todos os segmentos alvo do preconceito e discriminação

social, as relações homossexuais sujeitam-se à deficiência de normação

jurídica, sendo deixadas à margem da sociedade e à míngua do direito. Por ser

fato diferente dos estereótipos, que não se encaixam nos padrões, é tido como

imoral ou amoral. Em virtude do preconceito, tenta-se excluir a

homossexualidade do mundo do Direito. Mas imperativas a sua inclusão no rol

dos direitos humanos fundamentais, como expressão de um direito subjetivo

que se insere em todas as suas categorias, pois ao mesmo tempo é direito

individual, social ou difuso (4).

Ainda que tenha se omitido o legislador de referir às uniões

homoafetivas, não há como deixá-las fora do atual conceito de família.

Passando duas pessoas ligadas por um vínculo afetivo a manter relação

duradoura, pública e contínua, como se casados fossem, formam um núcleo

familiar à semelhança do casamento, independentemente do sexo a que

pertencem. A única diferença que essa convivência guarda com a união estável

entre um homem e uma mulher é a inexistência da possibilidade de gerar

filhos. Tal circunstância, por óbvio, não serve de fundamento para a

diferenciação levada a efeito.

(3) Maria Berenice Dias. Família Homoafetiva, 174.

(4) Idem, 175.

33

Como a capacidade procriativa ou a vontade de ter prole não são elementos

essenciais para que se empreste proteção legal a um par, é de reconhecer-se

a incompatibilidade da regra com o preceito igualitário, que dispõe de um

espectro maior. O argumento de que à entidade familiar denominada de união

estável o legislador constitucional impôs o requisito da diversidade de sexo é

insuficiente para concluir que os vínculos afetivos estabelecidos entre pessoas

do mesmo sexo devam ser ignorados ou não possam ser protegidos. A

diversidade de sexo e a capacidade procriativa não são elementos essenciais

para reconhecer a entidade familiar como merecedora da especial tutela do

Estado (5).

E mais. A orientação sexual adotada na esfera da privacidade não

admite restrições, o que configura afronta ao direito à liberdade a que faz jus

todo ser humano, pois diz com sua condição de vida.

(5) Maria Berenice Dias. União Homoafetiva...117.

34

2.3.Visão homofóbica da família heterossexual De todas as vítimas de preconceito, os denominados GLBT’s (gays,

lésbicas, bissexuais, travestis e transgêneros) são os que mais sofrem em

consequência da discriminação social. Isso, porque são os únicos que

enfrentam a discriminação tanto fora quanto dentro de casa, no seio da própria

família. Todos sabemos que a grande maioria dos pais não consegue conter

seu dissabor, tristeza ou vergonha, diante da notícia de que tem um filho gay

ou uma filha lésbica. Alguns chegam a preferir ver o filho morto, a vê-lo

homossexual. A psicologia mostra que todo ser humano sente necessidade de

gozar de respeito e de ser bem visto pelos seus familiares. Assim, qualquer

restrição por parte dos parentes provoca intrincadas sequelas psicológicas,

que, para uns, são profundamente marcantes e jamais superadas, chegando a

prejudicá-los por toda a vida. Inquestionavelmente, a família heterossexual

androcêntrica tem sido extremamente desrespeitosa, castradora e perversa,

com relação aos homossexuais. É muito comum se verem irmãos (e até pais),

fingirem ignorar as relações amorosas de suas irmãs (ou filhas) lésbicas ou

dirigirem galanteios à namoradas delas. Por tudo isso, lamentavelmente, ainda

é muito trivial que parceiros homossexuais escondam de seus pais a sua

orientação homossexual.

A ausência de compreensão e de amor doméstico, associada à

estigmatização social, traz várias consequências danosas para os não

heterossexuais. Uma delas é a já mencionada redução da autoestima e da

autoconfiança dos homossexuais, que, muitas vezes, tenta esconder-se em

capas multicoloridas e, outras vezes expressam-se sob a forma de auto

rejeição consciente ou inconsciente. Considerando que existem estudos

revelando uma porcentagem de cerca de dez por cento da população mundial

com orientação homossexual, é possível dimensionar o quanto esse perverso

preconceito homofóbico prejudica à sociedade como um todo. A rigor, todos

saem perdendo. As vítimas do preconceito, porque sofrem com a homofobia e

tendem a se tornarem tímidas diante da prepotência dos que se arvoram o

direito de padronizar o comportamento sexual alheio. Os próprios

preconceituosos, porque perdem inúmeras chances de ampliarem seus

relacionamentos sociais e seus horizontes mentais. E os pais, por povoar uma

sociedade eticamente empobrecida, onde uns odeiam os outros (6).

(6) Joaquina Lacerda Leite, A conjugalidade homossexual no Brasil, p. 45-46.

35

CAPÍTULO 3 A LEGALIZAÇÃO DAS UNIÕES HOMOAFETIVAS

CONCEITO O conceito legal de família trazido pela Lei Maria da Penha (Lei

11340/06) insere no sistema jurídico também as uniões homoafetivas, quer as

formadas por duas mulheres ou constituídas entre dois homens - todas

configuram entidade familiar. Ainda que a lei tenha por finalidade proteger a

mulher, acabou por cunhar um novo conceito de família independentemente do

sexo dos parceiros. Diz o seu art. 2ª: Toda mulher, independentemente de

classe, raça, etnia, orientação sexual (...) goza dos direitos fundamentais,

inerentes à pessoa humana. O parágrafo único do art., 5º reitera que

independe de orientação sexual todas as situações que configuram violência

doméstica e familiar. O preceito tem enorme repercussão. Como é assegurada

a proteção legal a fatos que ocorrem no ambiente doméstico, isso quer dizer

que as uniões de pessoas do mesmo sexo são entidades familiares (1).

Violência doméstica, como diz o próprio nome, é violência que acontece no

seio de uma família. A Lei Maria da Penha amplia o conceito de família,

alcançando as uniões homoafetivas. Pela primeira vez foi consagrada, no

âmbito infraconstitucional, a ideia de que a família não é constituída por

imposição da lei, mas sim por vontade de seus próprios membros (2). Assim,

se família é a união entre duas mulheres, igualmente é família a união entre

dois homens. Ainda que eles n ao encontrem ao abrigo da Lei Maria da Penha,

para todos os outros fins impõe-se este reconhecimento. Basta invocar o

princípio da igualdade. A entidade familiar ultrapassa os limites da pressão

jurídica para abarcar todo e qualquer agrupamento de pessoas onde permeia o

elemento afeto.

Ao ser afirmado que está sob o abrigo da lei a mulher, sem distinguir

sua orientação sexual, encontra-se assegurada proteção às lésbicas como às

travestis, às transexuais e aos transgêneros que mantêm relação íntima de

afeto em ambiente familiar ou de convívio. Em todos esses relacionamentos, as

situações de violência contra o gênero feminino justificam especial proteção.

(1)Maria Berenice Dias. A Lei Maria da Penha na Justiça, 37.

(2) Leonardo Barreto Moreira Alves. O Reconhecimento Legal...149.

A partir da nova definição de entidade familiar, trazida pela Lei Maria

da Penha, não mais cabe questionar a natureza dos vínculos formados por

36

pessoas do mesmo sexo. Ninguém pode continuar sustentando que, em face

de omissão legislativa, não é possível emprestar-lhes efeitos jurídicos. Há uma

nova regulamentação legislativa - meramente formal - para a democratização

do acesso ao casamento no Brasil: a nova definição legal da família brasileira

se harmoniza com o conceito de casamento “entre cônjuges” do art. 1511 do

Código Civil, não apenas deixando de fazer qualquer alusão à oposição de

sexos, mas explicitando que a heterossexualidade não é condição para o

casamento (3).

O avanço é significativo, visto que coloca um ponto final à discussão

que entretém a doutrina e divide os tribunais. A eficácia da lei é imediata,

passando as uniões homossexuais a merecer especial proteção do Estado (CF

226). Não cabe sequer continuar falando de sociedade de fato, subterfúgio de

conotação nitidamente preconceituosa, pois nega o componente de natureza

sexual e afetiva dos vínculos homossexuais, além de negar vigência à lei

federal.

3.1.A União Homoafetiva no Direito Comparado

O primeiro país a reconhecer legalmente a união homoafetiva foi a

Dinamarca, em junho de 1989, quando aprovou “a parceria homossexual

registrada, Lei 372/1989, que produz os mesmos efeitos legais do contrato de

casamento, com exceção da adoção e da guarda, que foram proibidas”. Os

primeiros parceiros, na Dinamarca e no mundo a formalizarem sua união,

foram Axel (72 anos) e Eigil Axil (67 anos), que viveram em comunhão por

quarenta anos (Matos, 2004, p. 92).

Quatro anos depois, a Noruega aprovou norma similar (Lei 40/1993),

mas não proibia a adoção. Em 1994, foi a vez da Suécia (Azevedo, 2000,

p.144-146). Na Finlândia essa oficialização foi aprovada em 2002 (Glanz, 2005,

p. 411). Assim, no início deste século toda a Escandinávia tinha dado passo

importante em prol da libertação dos gays e lésbicas, mostrando ao mundo um

belo exemplo de respeito às diferenças, consequentemente, aos direitos

humanos. Nesses países, predomina a religião luterana.

(3) Roberto Arriada Lorea, A definição legal da família brasileira.

Por isso, suspeitamos que a postura não homofóbica verificada

naqueles países quiçá seja consequência da teoria crítica de Lutero, com

37

relação a determinadas práticas da Igreja Católica, que nada tem a ver com a

pregação e a prática generosa e compreensiva de Jesus Cristo.

A Constituição da África do Sul, datada de 1996, veda

expressamente qualquer discriminação fundada na orientação sexual, embora

não tenha reconhecido o casamento homossexual. Em 2006, após o Tribunal

Constitucional desse país declarar que a legislação vigente discriminava

homossexuais - ao definir o casamento como “união entre um homem e uma

mulher” - o Parlamento Sul Africano aprovou a união estável e o casamento

homossexual.

Na Europa Ocidental, o Parlamento Europeu aprovou uma

resolução, em fevereiro de 1994 estabelecendo a paridade de direitos dos

homossexuais da comunidade europeia e o dever de se respeitar o princípio da

igualdade, no tratamento das pessoas, independentemente de sua orientação

sexual (Barroso, 2007). O tratado de Amsterdã, concluiu em 1997, autorizou o

conselho da União Europeia, após consulta ao Parlamento Europeu, a tomar

medidas sancionatórias contra a discriminação decorrente de orientação

sexual. A partir daí, vários países começaram a adotar medidas de proteção

aos direitos das uniões homoafetivas.

A Islândia aprovou lei similar à dinamarquesa em 1996, mas não

restringiu a adoção. Na Holanda, em julho de 1997, foi legalizada a união entre

pessoas do mesmo sexo, sob impedimento da adoção e da prática da

inseminação artificial (Azevedo, 2000, p. 146-147). Em 2001, esse país foi

pioneiro, ao estender o direito ao casamento aos casais homossexuais

(Barroso, 2007). A Bélgica enveredou pela mesma trilha. No ano de 2003,

autorizou o casamento de pessoas do mesmo sexo.

Na Espanha, as comunidades autônomas (País Vasco, Catalunha,

Galícia, Navarra, Aragon e Baleares) possuem leis civis próprias que vigem ao

lado do Código Civil nacional. A Catalunha editou a Lei 10, em 15.07.98,

regulando as uniões estáveis hetero e homossexuais. O mesmo aconteceu

com Aragon (em 1999), mas sem efeitos fiscais ou sucessórios. Navarra (em

junho de 2000) e Valência (em maio de 2001) - (Glanz, 2005, p. 409-410).

Finalmente em 2005, foi aprovado o casamento entre homossexuais, com

vigência em todo o país.

Portugal aprovou a Lei 7/2000 e adotou medidas de proteção às

uniões entre pessoas iguais em sexo, de fato (Glanz, 2005, p. 418).

Em 1999, a França aprovou Pacto Civil de Solidariedade entre

pessoas do mesmo sexo (PACS), equiparando os pactuantes aos cônjuges

38

(Glanz, 2005, p. 399).

A Alemanha aprovou a Lei de parceria de vida em comum, em

22.02.2001, regulando o registro de convivência de parcerias de mesmo sexo.

A Hungria também já equiparou as uniões homossexuais às heterossexuais,

incluindo, porém, a adoção (Glanz, 2005, p. 404).

Em julho de 2001, o prefeito de Londres introduziu o registro da

união estável homossexual ou heterossexual, Manchester fez o mesmo em

2002 (Glanz, 2005, p. 415).

O Canadá autorizou o casamento homossexual desde 2005, após

várias sentenças judiciais com cedendo às uniões homoafetivas os mesmos

direitos atribuídos aos casais heterossexuais, e após a suprema corte ter

declarado inconstitucional a lei que permitia a concessão de alimentos apenas

às uniões entre pessoas de sexos diferentes. Além de declarar a

constitucionalidade, afirmou que a medida concretizava o princípio de

igualdade. Aquele país considera a discriminação decorrente da orientação

sexual como violação à garantia constitucional da igualdade (Barroso, 2007).

Nos Estados Unidos, nove Estados já admitem uniões de mesmo

sexo: VERMONT, Califórnia, Connecticut, Delaware, Illinois, Massachussets,

New Jersey, Nova York e Pensylvania, bem como o Distrito de Columbia. Por

outro lado, há Estados que as proíbem expressamente como o Texas,

Oklahoma, Kansas e Missouri. São Francisco aprovou o registro de uniões

homossexuais, mas o tribunal local o suspendeu (Glanz, 2005, p. 420).

Na Califórnia, a Corte Suprema (05/2008) vedou a proibição do

casamento, do mesmo sexo. Naquele ano, esse Estado juntamente com

Massachussets, eram os únicos, nos Estados Unidos, que permitiam o

casamento homoafetivo.

Na América do Sul, a situação tem evoluído muito lentamente. Em

Buenos Aires (Argentina), a lei 1004/2002, formalizou as uniões civis homo e

heterossexuais, devendo as mesmas serem registradas em cartório próprio.

O Uruguai legalizou a união civil homossexual em dezembro de

2007, ao aprovar a chamada “união concubinária”, que regula tanto as uniões

estáveis homossexuais quanto as heterossexuais, envolvendo pessoas que

vivem juntas por mais de cinco anos.

De tudo que foi visto, e com inspiração em França e Souza (2006, p.

422), podemos classificar os países, com relação à forma de encarar a

conjugalidade homossexual, em quatro grupos:

1) – países que proíbem a discriminação homofóbica e autorizam a

39

união e casamento homossexual;

2) - países que proíbem a discriminação homofóbica, mas autorizam

somente a união homoafetiva;

3) - países que ignoram os direitos dos pares homoafetivos,

consequentemente não reconhecem nem a união nem o

casamento homossexual;

4) - países que criminalizam a homossexualidade.

Estes situam-se no oriente onde se verifica que muitos dos direitos

conquistados pelas mulheres, nos países ocidentais, também são negados

(Joaquina Lacerda Leite, A conjugalidade homossexual, p. 62/65).

3.2.Jurisprudência nos tribunais brasileiros 3.2.1.Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, período de 1992-2008

Se lavarmos em conta um resumo dos pedidos, sem tenças,

recursos e acórdãos dos processos do TJRJ notaremos que os índices de

deferimento são bastante desfavoráveis aos requerimentos homossexuais,

tanto com relação ao reconhecimento das uniões homoafetivas, quanto com

relação a partilhas. Na decisão dos conflitos de competência, todos os

acórdãos determinaram que o juízo cível era competente. Isso significa que o

Tribunal vê as uniões homoafetivas como relações jurídicas regidas pelo direito

obrigacional. Esse olhar ignora a afetividade que norteia essas relações e

insiste em desprezar o seu caráter conjugal, para atribuir-lhe um falso caráter

patrimonialista e comercial. É evidente que essas decisões são orientadas pela

homofobia.

Notemos que quarenta por cento das vezes em que um juízo

singular extinguiu um processo, alegando impossibilidade jurídica do pedido, o

Tribunal reafirmou a decisão. Já os pedidos de pensão previdenciária

apresentam índice de deferimento mais elevado (66%). Conclui-se do exposto,

que o TJRJ ainda é muito conservador no julgamento das causas em que o

conflito está relacionado a uma relação homossexual. Esse Tribunal começou a

lidar com processos envolvendo uniões homoafetivas desde 1992.

40

3.2.2.Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal O STF teve oportunidade de discutir a questão das uniões

homossexuais na Sessão iniciada em quatro de maio e encerrada em cinco de

maio de 2011 para julgamento de duas ADIN. A primeira, arguindo o

descumprimento de preceito fundamental (ADPF 132 – Arguição de Descum

primento de Preceito Fundamental), foi ajuizada em fevereiro de 2008, pelo

Governador do Rio de Janeiro (Sergio Cabral, PMDB) e recepcionada pelo

Ministro Ayres de Brito como ação direta de inconstitucionalidade. A segunda,

foi uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI 4277), impetrada em 2009

pela Vice-Procuradora Geral da República, Débora Duprat. Ambas requeriam

que a Lei 9278/96-que trata das uniões estáveis heterossexuais-passasse a ser

aplicada às uniões homoafetivas. Ambas foram relatadas pelo Ministro Ayres

de Brito e deferidas por unanimidade.

É evidente que essa decisão do STF constitui uma enorme vitória do

segmento LGBT.

O autoritarismo ainda é muito presente na nossa sociedade. No

sistema judiciário, por exemplo, ainda há juízes que tratam as partes e seus

advogados com desprezo e arrogância, porque não entendem que uma Justiça

eficiente e respeitosa é essencial para a consolidação da democracia.

A histórica jurisprudência daquele Tribunal, em favor do segmento

LGBT, é digna de elogios. A história social brasileira mostra que o Poder

Judiciário sempre consegue enfraquecer os preconceitos, quando afasta a

leitura literal da lei para fazer interpretações baseadas no fato social, na

Justiça, na equidade e nos princípios gerais do direito. Assim aconteceu com a

superação das discriminações que pairavam sobre as mães solteiras, as

pessoas separadas e divorciadas, as uniões informais, ou filhos nascidos fora

do casamento. Isto já está acontecendo com os LGBT’s, que passaram a sentir

mais autoconfiança e menos timidez em revelarem seus amores, após a

decisão memorável do STF, ocorrida em 05.05.2011.

Outra observação importante: os Desembargadores que negavam

sistematicamente os direitos das uniões homossexuais mudaram

imediatamente de postura, em decorrência da decisão do Supremo.

Esperamos que os crimes motivados por homofobia passem a ser

energicamente investigados, e que o preconceito institucionalizado nas

delegacias de polícia diminua, após a decisão do STF. Essa onda renovadora

do Direito de Famílias precisa chegar urgentemente ao Congresso Nacional,

para que possa libertar-se das pressões religiosas e, finalmente com atraso

41

reconhecer a união homoafetiva como entidade familiar com todos os direitos

das demais famílias. Este é o sonho que temos tentado concretizar.

A Sessão do STF que deferiu os processos impetrados pelo

Governador do Rio de Janeiro e pela Subprocuradora Geral da República,

construiu uma argumentação imensamente rica a respeito dos direitos das

pessoas que desenvolvem relações homoeróticas.

Destacamos a seguir alguns dos argumentos apresentados pelos

Ministros.

Do discurso de Carmen Lucia, que se tornou famosa pelas posições

avançadas defendidas no TJ mineiro, extraímos a seguinte lição: “Aqueles que

fazem a opção pela união homoafetiva não podem ser desigualados da

maioria. As escolhas pessoais livres e legítimas são plurais na sociedade e

assim terão de ser entendidas como válidas. (...). O direito existe para a vida,

não é a vida que existe para o direito. Contra todas as formas de preconceitos,

há a CF”.

A Ministra Ellen Gracie ressaltou o sofrimento e a humilhação a que

as lésbicas e os GBT’s foram secularmente submetidos e a importância do

Poder Judiciário na superação dessa problemática. Sua afirmação é muito

oportuna, porque reafirma que a jurisprudência é muito mais célere do que a

lei, quanto ao reconhecimento dos novos direitos. “O reconhecimento hoje pelo

Tribunal desses direitos responde a um grupo de pessoas que durante longo

tempo foram humilhadas, cujos direitos foram ignorados, cuja dignidade foi

ofendida, cuja identidade foi denegada e cuja liberdade foi oprimida. As

sociedades se aperfeiçoam através de inúmeros mecanismos e um deles é a

atuação do Poder Judiciário”.

O Ministro Joaquim Barbosa ressaltou a defasagem entre as

transformações sociais e a renovação do direito, mas admitiu que novos

paradigmas surgiram a partir da última década do século passado. Vejamos o

que ele falou nesse sentido: “Estamos aqui diante de uma situação de

descompasso em que o direito não foi capaz de acompanhar as profundas

mudanças sociais. Essas uniões sempre existiram e sempre existirão. O que

muda é a forma como as sociedades as enxergam e vão enxergar em cada

parte do mundo. Houve uma significativa mudança de paradigmas nas últimas

duas décadas”.

O Ministro Gilmar Mendes revelou-se mais tímido, ao ponderar não

caber ao STF a delimitação dos direitos decorrentes do reconhecimento, pelo

STF, da união estável entre pessoas do mesmo sexo. Diferentemente do

42

Relator, limitou-se a reconhecer a união homoafetiva, abstendo-se de

pronunciar sobre as suas possíveis consequências.

Segundo o Ministro – Relator Ayres de Brito, o assunto deveria ser

amplamente divulgado, analisado e discutido nos cursos jurídicos, para que os

estudantes e professores percebam a importância do direito como instrumento

de correção das injustiças e, por conseguinte de combate aos preconceitos.

No seu parecer, o Relator Ayres, após creditar à Desembargadora

aposentada Berenice Dias (TJRS) a iniciativa da criação da palavra

“homoafetividade, faz uma bela preleção sobre as mentes atrasadas e cruéis

das pessoas que alimentam e propagam preconceitos”.

Em outro trecho do parecer de Ayres de Brito, ele ressalta a

importância da compreensão e da tolerância, como essência do amor ao

próximo e a relevância da família, como local privilegiado da prática desse

amor.

Afinal, é no regaço da família que desabrocham, com

muito mais viço as virtudes subjetivas da tolerância, sacrifício e

renúncia, adensadas por um tipo de compreensão que certamente

esteve presente na proposição spnozista de que, “Nas coisas ditas

humanas, não há o que crucificar, ou ridicularizar. Há só o que

compreender”.

3.2.3.Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça

O primeiro caso apreciado pelo STJ sobre a relação homoafetiva,

constou do Recurso Especial 148.897/MG, relatado pelo Ministro Ruy Rosado

de Aguiar, na 4ª Turma, em 10.02.1998. Fundamentando-se no direito das

obrigações (art. 1363 do Código Civil/1916) e na evolução da própria

jurisprudência do STJ, consolidada pela Súmula 380, Rosado entendeu que a

união entre pessoas do mesmo sexo, somente poderia ser reconhecida como

sociedade de fato, desde que fosse comprovado o esforço comum de ambos

os conviventes na aquisição dos bens a serem partilhados. Decidia, ainda, que

os bens deveriam ser divididos proporcionalmente ao esforço de cada parceiro.

A jurisprudência do STJ conseguiu dar um salto de qualidade

somente em 04.02.2010 por ocasião do julgamento do REsp 1.026.981-RJ,

relatado pela Ministra Nancy Andrighi.

Em seu minucioso voto, fundamentado na doutrina, na lei e nos

princípios fundamentais, a relatora Nancy Andrighi ressaltou que a união

afetiva envolvendo pessoas do mesmo sexo, não poderia ser ignorada por uma

43

sociedade com estruturas familiares cada vez mais complexas sob pena de

supressão dos direitos fundamentais dos envolvidos.

Ao finalizar seu voto, a relatora reafirmou que a defesa dos direitos

deve basear-se na fraternidade e na solidariedade e que o Poder Judiciário não

pode esquivar-se de ver e de dizer o novo, como fez no passado, quando

apoiou os relacionamentos entre pessoas não casadas, obrigando o

Parlamento a legalizar a união estável.

Em abril de 2010, houve novo avanço, quando a 4ª Turma do STJ,

analisando o recurso interposto pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul,

autorizou a adoção de duas crianças por um casal lésbico. O Relator do caso,

o Ministro Luiz Felipe Salomão, fundamentou seu voto favorável às adotantes

no Estatuto da Criança e do Adolescente, que privilegia o interesse da criança.

Concordamos que, para uma criança abandonada, é mais interessante ter um

lar, homo ou heterossexual, onde receba amor, do que continuar ao desabrigo

ou abrigar-se em um orfanato.

Mas, o passo mais importante foi dado em 11.05.2011 – apenas seis

dias após a histórica decisão do STF a favor do reconhecimento da união

homossexual como entidade familiar.

Muitos e muitos casos foram e serão julgados, mas temos que

considerar, sempre, uma constante incontestável; as mudanças sociais

efetivamente importantes para a construção de uma sociedade fundamentada

no bem estar coletivo, na justiça e na solidariedade. Com isso, queremos dizer

que as pessoas com a consciência política e crítica bem desenvolvida devem

aproveitar esse momento democrático raro em nosso País, para articular

pessoas interessadas em construir uma nova sociedade, onde a renda não

seja perversamente concentrada e onde todos possam estudar, cuidar da

saúde, fruir cultura e arte, alimentar decentemente o corpo e a alma, enfim,

transitar pelo percurso-vida com dignidade, em ambiente dominado pela paz,

respeito mútuo e solidariedade. Nesse novo mundo, esse instrumento

fantástico, que é a ciência jurídica, deixará de servir apenas aos ricos,

passando a servir a toda sociedade.

44

3.3.A realização do sonho – o casamento Depois que o STF deliberou que as uniões homo são iguais as

uniões heterossexuais, os juízes de primeira instância passaram a autorizar a

conversão de uniões homossexuais em casamento, com fundamento no art.

226, da CF vigente.

Na medida em que os movimentos sociais são mais frequentes e

que as pessoas tornam-se mais conscientes, mais críticas e mais exigentes na

efetivação dos direitos fundamentais previstos na CF/88, já não é mais válido

aquele discurso que se diz avançado, porque aceita a concessão dos direitos

civis às uniões homoafetivas. Na verdade, ainda é muito conservador aquele

discurso, pois não admite que os homossexuais contraiam casamento, por

considerar um fato permissível apenas aos pares heterossexuais. Depois que o

STF, ouviu as pressões dos homossexuais e proclamou seu direito

constitucional de se juntarem ou casarem com quem lhes aprouver, o

impedimento que exclui lésbicas e gays de contraírem casamento foi

definitivamente anulado.

A seguir, citaremos os cinco primeiros casamentos homossexuais

autorizados pela justiça brasileira de primeira instância.

Muitos outros já se realizaram e ainda se realizarão em tempo breve,

devido à enorme demanda reprimida em nosso país pelo direito insensível que

vigia até maio de 2011.

Em 09 de maio de 2011, foi celebrado em Goiânia (GO) o primeiro

casamento gay do Brasil, entre Liorcino Mendes e Odilio Torres.

O primeiro casamento lésbico, foi o da juíza Sonia Maria Mazzetto

Moroso, titular da 1ª Vara Criminal de Itajaí (SC), com a servidora municipal

Lilian Regina Torres, este casamento ocorreu também em maio de 2011. O

casamento foi autorizado pelo juiz Roberto Ramos Alvim, da Vara de Família

da mesma Comarca e abençoado pela religião umbandista, conforme noticiado

pelo site do Observatório da Mulher, acessado em 20/07/2011.

No dia 28.06.2011, por autorização do juiz Fernando Henrique Pinto,

da 2ª Vara de Família de Jacareí (SP), realizou-se a conversão da união

estável de Luiz André Moresi e José Sérgio Sousa em casamento civil (Jornal

do Comércio, 28.06.2011). Nesse mesmo dia, Brasília também registrou o

primeiro casamento lésbico de sua história, unindo Silvia Gomide e Cláudia

Gurgel, após 11 anos de convivência conjugal (Correio Brasiliense,

28.06.2011).

Em 14 de julho do mesmo ano, Alberto Carlos Andreoni casou-se

45

com Izaias Ambrósio da Silva, no segundo Cartório de Notas e Títulos de

Araraquara (SP), tendo o matrimônio sido abençoado por uma mãe de santo

(noticiado por Araraquara.com, em 14.07.2011).

É evidente que os casamentos homossexuais relatados

anteriormente, não teriam sido autorizados, antes da decisão corajosa do STF,

reconhecendo os direitos civis das uniões homoafetivas.

Nunca é demais ressaltar, entretanto, que a louvável decisão é

consequência da luta incessante do movimento LGBT’s e da lucidez e coragem

política do TJRGS e do TJPR, que vêm deferindo as petições dos pares

homossexuais.

Queremos também citar o posicionamento da Rede Globo, tendo em

vista a recente mudança radical de postura, em que a estigmatização, o

deboche e a ridicularização dos gays foram substituídas por tratamento sério e

respeitoso. Entendemos que ela constitui importante iniciativa em prol da

reafirmação dos princípios constitucionais da não discriminação, da igualdade e

da dignidade da pessoa humana.

Finalizando, é importante a realização do sonho, acalentado pela

Constituição democrática de 1988, de implantar em terras brasileiras, uma

sociedade livre de preconceitos e alicerçada pela solidariedade.

46

CONCLUSÃO Este trabalho é o resultado final de um projeto de pesquisa

destinado a estudar, no Direito de Família, a união estável na sociedade

brasileira a partir de diversos segmentos sociais. Foram analisadas diversas

visões de diferentes instituições, tais como: igrejas, família heterossexual,

Poderes Executivo e Legislativo (nível federal), ordenamento jurídico pátrio e

estrangeiro, doutrina jurídica e jurisprudência dos Tribunais Estaduais e dos

Tribunais Superiores de Justiça. Relatamos também as primeiras autorizações

para a conversão de uniões homoafetivas em casamentos concedidas no Brasil

entre maio e julho de 2011.

Um grande número de dicionaristas jurídicos brasileiros define a

homossexualidade como perversão sexual, desvio do desejo sexual ou

inversão sexual. Esses dicionaristas veem as lésbicas, gays, bissexuais,

travestis e transgêneros como doentes, contrariando os resultados das

pesquisas das sociedades científicas nas áreas da saúde e da antropologia.

Os dicionários linguísticos, em contrapartida, definem os

homossexuais de forma respeitosa, como indivíduos que sentem atração

sexual por pessoas do mesmo sexo.

Há um grande número de pessoas de elevado nível e escolaridade

tais como professores, desembargadores, promotores, advogados que

confundem as diversas formas de manifestação da sexualidade.

Se analisarmos a legislação federal sobre família, disposta na

Constituição Federal, no Código Civil de 2002 e na Lei 9278/96, verificamos

que a norma brasileira só explicíta textualmente três espécies de família –

casamentaria, monoparental e união estável heterossexual. Isso já é um

grande avanço em relação ao Código Civil anterior que só admitia a família

casamentaria. Foram ignoradas outras entidades familiares como as formadas

por avós e netos, tios e sobrinhos, irmãos órfãos ou pares homossexuais.

Embora a homofobia esteja sendo reduzida, a sociedade brasileira continua

homofóbica. Durante esta pesquisa ficou evidenciado que a Igreja Católica e

demais religiões evangélicas – exceto a luterana e parte da presbiteriana e da

anglicana – estimulam seus fieis a cultivarem a repulsa à homossexualidade. O

sistema educacional também contribui para a disseminação da homofobia, na

medida em que muitos professores e diretores reforçam ou toleram

passivamente os comportamentos homofóbicos dos estudantes. O sistema de

ensino não tem ressaltado a importância, para toda a sociedade, do amor e

respeito à diversidade, em todas as suas formas (étnico racial, sexual,

47

geracional etc.). A maioria dos professores e diretores não está preparada para

lidar com o preconceito de seus alunos.

As famílias, heterossexual e androcêntrica, geralmente reagem com

violência e desrespeito, quando descobrem que tem um filho homossexual.

É muito difícil uma pessoa conseguir manter o equilíbrio emocional,

quando sua sexualidade constitui motivo de vergonha para os pais.

Os poderes Executivo e Legislativo, a nível federal, estão, aos

poucos, assumindo a obrigação de garantir aos pares homoafetivos, os

mesmos direitos dos heterossexuais.

A Constituição Federal de 1988 prescreve a construção de uma

sociedade livre de preconceitos.

Há um número crescente de pensadores comprometidos com a

defesa dos direitos humanos.

Acreditamos que num futuro bem próximo haverá uma emenda na

CF que assegurará o casamento entre pessoas do mesmo sexo, sem nenhuma

restrição, pois, afinal, “TODOS SÃO IGUAIS PERANTE A LEI”.

48

ANEXO 1 Eu sou um padre do século XXI”, diz padre excomungado em Bauru Padre Beto não se retrata e afirma que em momento algum desrespeitou os dogmas da religião. A reportagem é de Marcelo Canellas. Esta semana, um padre do interior de São Paulo bateu de frente com a Igreja Católica, à qual jurou obediência, por defender ideias polêmicas sobre sexo fora do casamento e homossexualidade. Acabou excomungado. Padre Beto não se retrata e afirma que em momento algum desrespeitou os dogmas da religião. A reportagem é de Marcelo Canellas. “Sexo é uma coisa, amor é outra”, diz Beto Daniel, padre excomungado. “Ele faz pronunciamentos, declarações sobre temas complicados, polêmicos”, comenta dom Caetano Ferrari, bispo de Bauru. “Eu posso amar uma pessoa e não fazer sexo com ela. Eu posso fazer sexo com uma pessoa e não amá-la”, afirma padre Beto. “Ele é filho rebelde. Ele avança o sinal”, observa dom Caetano. Quem é o padre que tirou o bispo do sério, a ponto de ser excomungado? “Eu sou padre do século XXI. Ponto final”, diz padre Beto. Na orelha, um piercing. “Já tenho três anéis, colocar mais um, pelo amor de Deus, né? E eu não gosto de anel com pedra, né? Falei: vou fazer um piercing”. Em casa, Che Guevara na parede. Charutos. E uma salada de entidades místicas, santos e estrelas de cinema. E muitas atividades fora da igreja. Padre Beto se orgulha de ter estudado na Alemanha, no mesmo seminário em que o papa emérito Bento XVI se formou. Servindo à Diocese de Bauru, no interior de São Paulo, desde 2001, ele acaba de ser excomungado por causa de vídeos como esse, em que aparece em uma mesa de bar, falando sobre bissexualidade: “Do homem se apaixonar por um outro homem, ou da mulher se apaixonar por uma outra mulher. E os dois sendo casados. Aqui existe amor também”, diz no vídeo. A Diocese de Bauru diz que os vídeos provocaram escândalo, e exigiu que o padre os retirasse da internet. “Nós não queremos enquadrá-lo também na marra. Mas ele fez um

49

juramento como sacerdote, eu fiz também, de fidelidade aos ensinamentos da Igreja. Se eu sou da Igreja não posso falar contra o ensinamento da Igreja”, explica dom Caetano. Padre Beto se recusou a cumprir a ordem. “É inegável a existência de bissexuais”. Ele teve uma semana para voltar atrás. Quando o prazo se esgotou, a diocese instaurou o processo de excomunhão. “Há quatro anos que eu estou aqui, todo ano eu tenho uma conversa com ele sobre estas coisas porque chegam para mim. O pessoal ouve na homilia, lê, ouve na rádio, ouve não sei o quê. Agora veio do mundo inteiro! Entende? Então nós tivemos que dizer: Beto, não dá mais, Beto”, diz Dom Caetano. A excomunhão foi decretada, na terça-feira passada, por um juiz instrutor nomeado pelo bispo. De acordo com a nota oficial da Igreja, padre Beto foi excomungado por violar as obrigações do sacerdócio e por se negar a cumprir a promessa de obediência. A despedida do sacerdote foi numa igreja lotada, em que os fiéis aplaudiram de pé a última missa do padre Beto. Ele não pode mais rezar missa e nem fazer casamentos e batizados. Também não tem mais direito a nenhum dos sacramentos católicos. Não pode se confessar, por exemplo, nem comungar. Mas, de acordo com as regras da Igreja, ainda pode ser chamado de padre até que o Vaticano dê a última palavra. A punição pode ser revista imediatamente em caso de retratação pública, o que não parece estar nos planos do padre Beto. “Eu posso me arrepender, dizer que um casal pode ter relações sexuais antes do casamento? Se eu disser que vou me arrepender disso é de uma infantilidade muito grande e, hoje em dia, uma situação ridícula”. O que seria, para padre Beto, fidelidade e traição no casamento? “Em um dos seus comentários, você diz que se alguém tem uma relação extraconjugal com o consentimento do seu parceiro não há traição, é isso?”, pergunta o repórter. “É isso. Se realmente há um consentimento franco dos dois”. Para ele, suas opiniões não desrespeitam os dogmas da Igreja. “Eu não toquei em dogma algum. Eu estou discutindo normas morais. Eu não posso comparar o amor homossexual com o dogma “Jesus Cristo é filho de Deus”. São discussões completamente diferentes”.

50

E contesta a ideia de pecado na relação homossexual. “Onde existe pecado entre duas pessoas do mesmo sexo que se querem bem, que se gostam, que se amam?”. “Agora uma questão pessoal, e você tem todo o direito de não responder se não quiser. No momento em que surgiu esta polêmica, muita gente começa a questionar e justificar a sua postura dizendo que você é gay. Você é gay?”, pergunta o repórter. “Não. Eu não sou gay, eu sou heterossexual e nunca senti atração por pessoa do mesmo sexo”, responde. Muito popular entre os jovens de Bauru, padre Beto divide opiniões na Faculdade de Direito onde dá aula de ética, “É inadmissível uma pessoa ser escrava de uma doutrina”, defende o estudante Francisco Soares Neto. “A partir do momento que você se torna padre, pressupõe-se que você é a favor dos ensinamentos da Igreja, que você concorda com isso”, opina a estudante Manoela Veloso. “Ao meu ver ele não infringiu nada. Ele estava ali refletindo sobre o assunto. E é o que ele nos faz na sala de aula: refletir, pensar”, afirma a estudante Marcela Gallo. “Para muitos católicos, vai contra a Igreja Católica. Então confunde a cabeça da criança, por exemplo, que vai a uma missa e escuta um padre falar isso, sendo que em casa se prega outra coisa”, comenta a estudante Regina Benatti. O padre excomungado diz que agora vai se dedicar ao magistério e ao trabalho de comunicador. E que seguirá procurando Deus onde for possível. “Deus eu encontro em qualquer lugar. Se ele não vai mais estar acessível à minha pessoa pela eucaristia, que era um alimento espiritual fantástico, eu acredito que Deus vai me alimentar de uma outra forma”. (Entrevista realizada no programa Fantástico da Rede Globo, em

05.05.2013, às 21:47h – g1.globo.com)

51

ANEXO 2 Joelma calada é uma poeta

Para quem conhece Joelma, a voz da Banda Calypso, não foi uma surpresa a entrevista que deu ao jornalista Bruno Astuto da revista Época. Entre um assunto e outro, a cantora afirmou que se tivesse um filho gay “lutaria até a morte para fazer sua conversão”. Não contente em falar na tal “cura” ainda fez uma comparação tão absurda que até Deus deve ter ruborizado. “Já vi muitos se regenerarem. Conheço muitas mães que sofrem por terem filhos gays. É como um drogado tentando se recuperar”.

Leia também: Depois de polêmica com a Banda Calypso, Chimbinha está em depressão, diz jornal

Mas é isso, não foi uma surpresa porque Joelma é reincidente no assunto preconceito. Em agosto do ano passado, um vídeo amador flagrou a cantora conversando com um fã gay e soltando pérolas como “[Você] vai se converter, vai virar homem, vai casar, ter filhos, vai dar muita alegria para o seu pai e sua mãe”. O fã ainda dá um belo troco – “Eu já dou, do jeito que sou” -, mas Joelma não quer nem saber.

Agora, diante da explosiva (e, felizmente, negativa) repercussão de suas palavras no final de semana, Joelma soltou um comunicado oficial com a velha desculpa que foi mal interpretada, que suas palavras foram distorcidas, aquela coisa toda. Até poderia ser verdade, pois existem jornalistas que são tão canalhas quanto ela é preconceituosa, mas esse vídeo do ano passado e suas declarações posteriores (“Conviver com o erro da pessoa é uma coisa, mas incentivar o erro é errado” ou “Falei em cura porque diversos fãs já me disseram que se livraram do homossexualismo”) confirmam que é isso mesmo que ela pensa. No domingo, em meio ao fogo cruzado, ela até retuitou um fã que disse o seguinte: “Tô contigo na sua opinião sobre os gays. Também acho que ser gay é

52

fogo no cu. Homem nasce pra ser homem e mulher pra ser mulher.” Para bom entendedor... Joelma, a preconceituosa da vez. E a liberdade de expressão (gritam seus fãs)? Bem, ela tem todo o direito de falar o que quer, mas também precisa arcar com as consequências de seus atos e falas. Isso é uma democracia. Ninguém é obrigado a aceitar ou gostar de homossexuais ou pitboys ou comediantes de stand up, mas é preciso respeitá-los. Os evangélicos e católicos não são obrigados a aceitar o casamento igualitário (civil), mas nosso Estado é laico e nenhuma religião tem o direito de se meter nesse assunto. É isso que pessoas nocivas como os deputados Marco Feliciano e Jair Bolsonaro não conseguem colocar em suas cabecinhas.

Pode ser que agora esteja acontecendo uma nova onda conservadora (eu acho que é a mesma de sempre, só mais organizada e com microfone na mão, graças a uma imprensa que vive de “polêmicas”), mas também existe uma reação progressista. O médico da família brasileira, Dr. Dráuzio Varella, disse em artigo que “mais antiga do que a roda, a homossexualidade é tão legítima e inevitável quanto a heterossexualidade. Reprimi-la é ato de violência que deve ser punido de forma exemplar, como alguns países fazem com o racismo”. Entendeu Joelma ou quer que Camilla Uckers explique?

(Yahoo! Notícias 2.4.2013)

53

ANEXO 3

Primeiro casamento civil entre dois homens em Caxias ocorre

em 9 de março

Casal tem planos de adotar uma criança futuramente

Está marcado para o dia 9 de março o primeiro casamento civil entre dois homens em Caxias do Sul. Délvio Anderson Silva, 29 anos, e Leandro Manica Fenner, 26, já haviam tentado se casar no final do ano passado, porém, não obtiveram autorização da Justiça. Agora, receberam o consentimento. Eles estão juntos há dois anos e meio, e inclusive já realizaram uma festa simbólica de casamento, entre familiares e amigos. Após se estabilizaram financeiramente, o casal tem planos de adotar uma criança. Em 17 de dezembro do ano passado, o juiz Sérgio Fusquine Gonçalves havia autorizado todos os cartórios da cidade a celebrar casamentos entre pessoas do mesmo sexo. Contudo, a sentença de caráter normativo foi suspensa, a pedido do promotor Luis Carlos Prá. Até que o recurso seja avaliado, a autorização de Fusquine segue nula. Porém, casais homoafetivos ainda podem procurar o cartório de registro civil e, se Ministério Público e Judiciário autorizarem, têm chances de casar. Em 8 de fevereiro deste ano, ocorreu a primeira união homoafetiva da cidade, entre Roberta Neto, 22, e Elisandra Cristina da Cruz Ferreira, 20. google.com.br – pioneiro.clicrbs.com.br – 9.3.2013

54

ANEXO 4 Cerimônia reúne quatro casais de lésbicas em 1º casamento gay do PI 'Hoje é um dia de muita comemoração. Estou muito feliz', disse Lourdes. Casamento foi realizado nesta sexta (5) em capela do Tribunal de Justiça. Quatro casais de lésbicas oficializaram a relação durante o primeiro casamento civil entre homossexuais no Piauí. A cerimônia foi realizada nesta sexta-feira (5) na capela do Tribunal de Justiça pela juíza Zilnéia Barbosa. A pedagoga Rosângela Alencar e a funcionária pública Lourdes Oliveira moram juntas há cinco anos, mas só conseguiram oficializar a união nesta sexta-feira. Lourdes foi casada durante 14 anos e tem três filhos de 19, 16 e 14 anos. Ela contou que após separar do marido resolveu morar com Rosângela. O filho mais velho de Lourdes acompanhou a cerimônia. Karl Marx, 19 anos, conseguiu compreender que a mãe não era feliz no casamento, mas confessou que no início foi difícil entender a relação entre duas mulheres. “A gente costuma aceitar e achar bonito quando acontece em outra família, mas quando a situação é dentro da sua casa, não é tão fácil assim. Hoje eu sei que a minha mãe está mais feliz assim. Compreendi que ela queria mudar de vida”, disse Karl. “Hoje é um dia de muita comemoração. Estou muito feliz e sei que aquele receio que tinha da sociedade agora não existe mais. A partir de hoje tudo será diferente”, disse Lourdes. Estamos felizes com o casamento. “Sabemos que agora tudo será diferente" Morando há oito anos juntas, a psicóloga Alessandra Oliveira e Virgínia Lemos, que é professora, também comemoraram a oficialização do relacionamento. Elas não comentaram muito sobre a vida íntima, mas sabem que agora tudo será diferente. O casal agora pensa em aumentar a família. “Estamos felizes. Sabemos que agora tudo será diferente. Demorou bastante para justiça reconhecer o casamento entre duas pessoas do mesmo sexo.”, disse Virginia. “Era um sonho antigo e que agora se torna realidade”, completou

55

Alessandra Oliveira. Para Marinalva Santana, diretora do Grupo Matizes, que luta pelos direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (LGBT) no estado, a cerimônia de casamento civil homoafetivo é um grande avanço. “É uma solenidade histórica, um divisor de águas para os nossos direitos”, ressalta. O casamento civil entre pessoas do mesmo sexo foi autorizado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em outubro de 2011. De acordo com Marinalva Santana, depois da regulamentação todos os pedidos que chegam aos cartórios piauienses deixam de depender do entendimento individual de cada juiz e passam a obedecer aos critérios estabelecidos pelo Provimento nº 24/2012. “A partir de agora o véu da censura cai por terra. A união entre homossexuais no Piauí é reconhecida. Estamos cumprindo a lei e nos próximos casamentos comunitários não haverá cerimônias separadas como esta de hoje”, disse a juíza Zilnéia Barbosa. (Em 5.4.2013, globo.com – Teresina 13:26h)

56

ANEXO 5 Daniela Mercury assume relacionamento com mulher: "Malu agora é minha esposa" A cantora Daniela Mercury está apaixonada. A cantora, que se separou recentemente, publicou uma foto sua ao lado da nova mulher nesta quarta-feira (3) em sua página no Instagram e escreveu na legenda:

"Malu agora é minha esposa, minha família, minha inspiração pra cantar", escreveu.

Malu Veçosa é jornalista e em seu perfil no Twitter se descreve como "editora-chefe da TV Bahia, apresentadora do CBN Salto-Alto, fotógrafa-aprendiz e feliz". Veçosa é ex-namorada da assessora de imprensa Fabiana Crato, que trabalhou com a cantora até o Carnaval deste ano.

Logo após a publicação da montagem, que tem imagens das duas usando alianças, os seguidores da cantora deixaram mensagens de apoio nos comentários da rede social: "Felicidades. Que essa nova família seja sempre de muito amor e respeito", escreveu o seguidor @dantasgardiman. O seguidor @samirmatos disse: "Sejam felizes, vc deu um tapa na cara de Feliciano e cia com luva de pelica, num momento importante que o Brasil vem passando, chega de retrocesso".

A assessoria de imprensa da cantora disse ao UOL que "não fala sobre sua vida pessoal", e que Mercury está em Portugal. O empresário da cantora afirmou ao UOL que "Ninguém fala em nome de Daniela, só ela própria. Ela chega na próxima semana da Europa e só ela pode falar". Mercury confirmou em fevereiro deste ano que se separou do publicitário italiano Marco Scabia após três anos de união. Com o empresário, ela adotou três meninas: Ana Isabel, 2, Ana Alice, 10 e Márcia, 13. Após o fim da união, a estrela voltou a morar em Salvador. A cantora também é mãe de Giovana, 25, e Gabriel, 26, frutos de seu primeiro casamento, com Zalther Povoas.

Procurado pelo UOL, Marco Scabia afirmou, através de sua assessoria de imprensa, que prefere não se pronunciar sobre o

57

novo relacionamento de Daniela. A assessora do publicitário disse que "ele tem uma relação muito bacana com Daniela, com quem tem três filhas maravilhosas". Yahoo, notícias em 4.4.2013

58

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

DIAS, Maria Berenice, Manual de direito das famílias, 8.ed. 2ª tiragem, rev. e

atual., RT 2011.

GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito civil brasileiro, v. 6, Direito de família, 9.

Ed., Saraiva, 2012.

LEITE, Joaquina Lacerda, A conjugalidade homossexual no Brasil: Múltiplas

Visões, GZ editora, Salvador, 2011.

BIBLIOGRAFIA CITADA ALVES, Leonardo Barreto Moreira, O reconhecimento legal, p. 149.

AZEVEDO, Alvaro Villaça, Do bem de família, p. 242.

_________ Comentários ao Código Civil, v. 19, p. 203, 254-255, 296.

BOBBIO, Norberto, A teoria do ordenamento jurídico, 37.

BARBOSA, Heloisa Helena, O direito de família, cit., p. 104.

DIAS, Maria Berenice, Família homoafetiva; União homoafetiva: A lei Maria da

Penha na Justiça, 37.

DINIZ, Maria Helena, Curso de direito civil brasileiro, v. 5, p. 3-4.

LOREA, Roberto Arriada, A definição legal da família brasileira.

OLIVEIRA, Euclides, União estável, Conceituação e Efeitos jurídicos, 154.

_________A união estável: Um conceito? In Direito de Família, aspectos

constitucionais, civis e processuais, v. 2, p. 37.

_________União estável, cit., p. 125, 133.

PEREIRA, Sergio Gischkow, Estudos de direito de família, 13.

PEREIRA, Rodrigo da Cunha, Concubinato e união estável, p. 30.

SILVA, Regina Beatriz Tavares da, Novo Código Civil comentado, p. 1532.

SOUZA, Yvone Coelho e Maria Berenice Dias, Famílias modernas, cit. V. 8, p.

65 e Famílias monoparentais, p. 7-8.

VELOSO, Zeno, Código Civil Comentado, v. 17, p. 114, 115, 117.

Conferência Estadual GLBT, Salvador.

REsp. 474962-SP, 4ª.T., Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU,

1.3.2004.

TJRS, Ap. 70.000.339.168, 7ª Câmara Cível, Rel. Des. Brasil Santos, j.

1.3.2000.

TJRS, EI 70.003.119.187, 4ºª Câmara Civel, Rel. Des. Vasconcellos Chaves, j.

12.4.2002.

59

TJMG, RT 742/393, v. Inventário. Habilitação. Companheiro do falecido.

Pretensão à condição de herdeiro (TJSP, LEX, 262/319) – ainda que evidente...

TJRJ, Ap. 10.704/2000, 3ª Câmara Cível.

TJRS, Ap. 70.009.550.070, 7ª Câmara Cível, Rel. Maria Berenice Dias, j.

17.11.2004.

Disponível em http://www.ibdfam.org.br/notícias&notícias 2636, acessado em

5.9.2008.

REsp. 148.897.

REsp. 395.804.

Decidiu a 3ª T. do STJ, Min. Nancy Andrighi, REsp. 1.016.981-RJ, 3,ª T.,

http://www.conjur.com.br

2ª Seção, Rel Min. Nancy Andrighi, disponível em http://www.conjur.com.br de

13.5.2011.

Constituição da República Federativa do Brasil, 1988, Saraiva.

Código Civil, 2002, Theotônio Negrão.

ÍNDICE

60

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

TEMA: Direito de Família – Conceito 9

CAPÍTULO 1

A União Estável na Sociedade Brasileira 11

1.Origem da União Estável 11

1.1.Origem dos direitos da União Estável 12

1.2.Evolução Legislativa 13

1.3.União Estável no Código Civil 14

1.4.Requisitos para a configuração da União Estável 15

1.4.1.Pressupostos de ordem subjetiva 16

1.4.2.Pressupostos de ordem objetiva 20

a).Diversidade de sexos 20

b).Notoriedade 24

c).Estabilidade ou duração prolongada 25

d).Continuidade 26

e).Inexistência de impedimentos matrimoniais 27

f).Relação monogâmica 28

CAPÍTULO 2

Família Homoafetiva 30

2.Conceito 30

2.1.Princípio da não-discriminação 31

2.2.Direito à sexualidade 32

2.3.Visão homofóbica da família heterossexual 34

CAPÍTULO 3

61

A legalização das Uniões Homoafetivas 35

3.Conceito 35

3.1.A união homoafetiva no direito comparado 36

3.2.Jurisprudência nos tribunais brasileiros 39

3.2.1.Jurisprudência do TJRJ, 1992-2008 39

3.2.2.Jurisprudência do STF 40

3.2.3.Jurisprudência do STJ 42

3.3.A realização do sonho – o casamento 44

CONCLUSÃO 46

ANEXO 1 48

ANEXO 2 51

ANEXO 3 53

ANEXO 4 54

ANEXO 5 56

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 58

BIBLIOGRAFIA CITADA 58

ÍNDICE 60