relatório de estágio: kvalitext – serviços - de tradução, lda
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MESTRADO EM TRADUÇÃO E SERVIÇOS LINGUÍSTICOS
TRADUÇÃO ESPECIALIZADA
Relatório de estágio: Kvalitext – Serviços de Tradução, Lda. Ana Filipa Fernandes Pereira
M 2018
Ana Filipa Fernandes Pereira
Relatório de estágio: Kvalitext – Serviços de Tradução, Lda.
Relatório realizado no âmbito do Mestrado em Tradução e Serviços Linguísticos, orientado
pela Professora Doutora Maria Alexandra Guedes Pinto
Supervisor de Estágio na empresa, Ângela Nogueira
Faculdade de Letras da Universidade do Porto
Maio de 2018
Relatório de estágio: Kvalitext – Serviços de Tradução, Lda.
Ana Filipa Fernandes Pereira
Relatório realizado no âmbito do Mestrado em Tradução e Serviços Linguísticos, orientado
pela Professora Doutora Maria Alexandra Guedes Pinto
Membros do Júri
Professor Doutor Thomas Hüsgen
Faculdade de Letras - Universidade do Porto
Professora Doutora Alexandra Guedes Pinto
Faculdade de Letras - Universidade do Porto
Professora Doutora Joana Guimarães
Faculdade de Letras - Universidade do Porto
Classificação obtida: 18 valores
“Insist on yourself; never imitate. Your own gift you can
present every moment with the cumulative force of a whole
life's cultivation; but of the adopted talent of another you
have only an extemporaneous half possession. That which
each can do best, none but his Maker can teach him.”
— Ralph Waldo Emerson
iv
Sumário
Agradecimentos ............................................................................................................... vi
Resumo ........................................................................................................................... vii
Abstract .......................................................................................................................... viii
Índice de ilustrações ........................................................................................................ ix
Índice de tabelas ............................................................................................................... x
Lista de abreviaturas e siglas ........................................................................................... xi
Glossário ......................................................................................................................... xii
Introdução ......................................................................................................................... 1
Capítulo 1 – Apresentação da empresa acolhedora .......................................................... 2
1.1. Missão, Visão e Valores ........................................................................................ 2
1.2. Especializações e tipos de textos traduzidos .......................................................... 3
1.3. Organização e instalações ...................................................................................... 5
Capítulo 2 – Descrição do estágio .................................................................................... 8
2.1. Duração do estágio ................................................................................................. 8
2.2. Tipos de trabalhos realizados ................................................................................. 9
2.3. Apreciação global do estágio ............................................................................... 12
2.4. Considerações sobre os manuais de instruções .................................................... 14
Capítulo 3 – Gestão de projetos, CAT-tools e garantia de qualidade ............................. 23
3.1. Gestão de projetos ................................................................................................ 23
3.1.2. Project Open ..................................................................................................... 26
3.2. CAT-tools ............................................................................................................. 29
3.2.1. SDL Trados Studio ............................................................................................ 31
3.2.2. memoQ .............................................................................................................. 33
3.2.3. Wordbee ............................................................................................................ 35
3.2.4. SDL Passolo ...................................................................................................... 37
3.3. Controlo de qualidade .......................................................................................... 39
3.3.1. Xbench .............................................................................................................. 42
3.3.2. FLiP .................................................................................................................. 43
Capítulo 4 – Tradução: análise de casos práticos ........................................................... 45
4.1. Instruções do cliente ............................................................................................ 45
4.2. Qualidade do texto de partida .............................................................................. 52
4.3. Influência do texto de partida .............................................................................. 58
4.4. Adequação ao género textual ............................................................................... 61
v
4.5. Terminologia ........................................................................................................ 63
4.5.1. Vazio terminológico.......................................................................................... 65
4.5.2. Polissemia terminológica .................................................................................. 69
4.5.3. Empréstimos ..................................................................................................... 70
4.5.4. Tradução de palavras-sinal ............................................................................... 74
4.6. Registo de língua ................................................................................................. 77
Considerações finais ....................................................................................................... 80
Referências bibliográficas .............................................................................................. 83
Anexos ............................................................................................................................ 86
Anexo 1 – Lista de projetos realizados ....................................................................... 86
Anexo 2 – Plano de estágio ......................................................................................... 88
Anexo 3 – Documento de avaliação do estágio curricular ......................................... 90
Anexo 4 – Resultados do inquérito realizado ............................................................. 91
vi
Agradecimentos
Antes de tudo, gostaria de agradecer à Professora Doutora Alexandra Guedes Pinto,
cuja orientação, disponibilidade e dedicação foram essenciais para a conclusão do meu
percurso na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Muito obrigada por tudo o
que me ensinou e por ter exigido sempre o melhor de mim.
Gostaria também de agradecer a todos os elementos da Kvalitext, com quem
bastante aprendi. Um agradecimento especial às administradoras Joana Pinto e Mónica
Silva, pela oportunidade de estágio e de aprendizagem, e à minha orientadora na empresa,
Ângela Nogueira, pela sua simpatia e paciência incansável.
Muito obrigada a todos os meus amigos que desde sempre me acompanharam e
apoiaram. Um agradecimento especial às minhas amigas de Aveiro, que comigo iniciaram
a aventura no ensino superior, tornando-a única, e, mesmo longe, estiveram sempre muito
perto.
Por fim, ao José, por todo o companheirismo e apoio e, claro, aos meus pais, que
sempre apoiaram as minhas decisões e cujo orgulho em mim me inspirou a ir mais longe.
vii
Resumo
O presente relatório visa apresentar e refletir sobre o trabalho efetuado no decorrer
do estágio curricular realizado na empresa Kvalitext – Serviços de Tradução, Lda., no
âmbito do Mestrado em Tradução e Serviços Linguísticos. O seu principal objetivo será
abordar a transição do mundo académico para o mercado de trabalho da tradução,
compreender o ciclo de vida de um projeto de tradução em ambiente de empresa e refletir
sobre o processo tradutivo através da análise de excertos de traduções realizadas.
Para além de descrever a empresa acolhedora, o estágio e as tarefas aí realizadas,
este relatório aborda também a importância da gestão de projetos, das ferramentas de
apoio à tradução e dos processos de garantia de qualidade; as características e desafios da
tradução técnica e, por fim, as teorias e conceitos de tradução que forneceram uma valiosa
base teórica para todo o trabalho desenvolvido ao longo do estágio.
Palavras-chave: relatório de estágio, tradução, textos técnicos, teorias da tradução,
gestão de projetos.
viii
Abstract
This report seeks to present and reflect on the work carried out during the internship
that took place at Kvalitext – Serviços de Tradução, Lda., as part of the Master’s Degree
in Translation and Language Services. Its main objective is to address the transition from
the academic world to the labour market of translation, to understand the life cycle of a
translation project in a translation company and to reflect about the translation process
through the study of some translations excerpts.
Besides describing the company, the internship and the tasks developed there, the
report also approaches the significance of project managing, computer-assisted tools for
translating and quality assurance process; the characteristics and challenges of technical
translation and the translation theories and concepts that provided an important theoretical
foundation for all the work carried out during the internship.
Keywords: internship report, translation, technical texts, translation theories, project
managing.
ix
Índice de ilustrações
Figura 1: Organigrama organizacional da Kvalitext. ........................................................ 6
Figura 2: Número de palavras traduzidas por mês. ........................................................... 9
Figura 3: Número de projetos realizados por par de línguas. .......................................... 10
Figura 4: Número de projetos realizados por área temática. ........................................... 11
Figura 5: Número de projetos realizados por género textual. ......................................... 11
Figura 6: Visualização do separador “Projects” no Project Open. ................................. 27
Figura 7: CAT-tools utilizadas. ........................................................................................ 31
Figura 8: Exibição dos resultados da TM no Studio. ...................................................... 32
Figura 9: Texto entre tags no memoQ. ............................................................................ 34
Figura 10: Tags do memoQ contendo informação textual. ............................................. 34
Figura 11: Interface do Wordbee. .................................................................................... 35
Figura 12: Exemplo de sugestões de tradução do Wordbee. ........................................... 36
Figura 13: Interface do SDL Passolo. ............................................................................ 38
Figura 14: Identificação da ausência do símbolo ™ no target. ....................................... 42
Figura 15: Exemplos de erros falsos assinalados pelo Xbench. ...................................... 42
Figura 16: Identificação da seleção errada do particípio passado do verbo “imprimir” no FLiP.
........................................................................................................................... 43
Figura 17: Tipos de instruções fornecidas pelos clientes. ............................................... 47
Figura 18: Cânula de fluxo oral e nasal. .......................................................................... 65
Figura 19: Componentes de uma cânula. ........................................................................ 66
Figura 20: Captura de ecrã da pré-visualização do livro Fundamentos de Enfermagem no
Google Books. ................................................................................................... 68
Figura 21: Definição de “bateria”, segundo a Infopédia. ................................................ 69
Figura 22: Definição de “pilha”, segundo a Infopédia. ................................................... 69
Figura 23: Mensagens de alerta de um manual de instruções. ........................................ 74
Figura 24: Número de entradas nas páginas de Portugal do Google para o trio de termos
“perigo aviso atenção”. ..................................................................................... 76
Figura 25: Número de entradas nas páginas de Portugal do Google para o trio de termos
“perigo aviso cuidado”. ..................................................................................... 76
x
Índice de tabelas
Tabela 1: Exemplos de sequências textuais presentes nos manuais de instruções. ......... 17
Tabela 2: Modalidade expressa pelos atos ilocutórios. ................................................... 19
Tabela 3: Mecanismos linguísticos presentes nos manuais de instruções. ..................... 19
Tabela 4: Ciclo de vida de um projeto de tradução na Kvalitext. ................................... 24
Tabela 5: Incertezas causadas por strings descontextualizados. ..................................... 49
Tabela 6: Frases típicas do discurso publicitário............................................................. 62
xi
Lista de abreviaturas e siglas
EN – Inglês
ES – Espanhol
FLUP – Faculdade de Letras da Universidade do Porto
LM – Linguistic Manager (gestor de qualidade)
MTSL – Mestrado em Tradução e Serviços Linguísticos
PM – Project Manager (gestor de projetos)
PMBOK – Project Management Body of Knowledge
PMI – Project Management Institute
PO – Project Open
PT_BR – Português do Brasil
PT_PT – Português europeu
QA – Quality Assurance (garantia de qualidade)
TB – Term base (base de dados)
TCh – Texto de chegada
TM – Translation memory (memória de tradução)
TP – Texto de partida
UC – Unidade curricular
xii
Glossário
Full match – correspondência de 100% entre o segmento a traduzir e o segmento presente
na memória de tradução
Fuzzy (match) – correspondência de 99% a 70% entre o segmento a traduzir e o segmento
presente na memória de tradução
Kit de tradução – documentos disponibilizados ao tradutor para levar a cabo a tradução,
que, para além do texto a traduzir, podem incluir documentos de referência, memórias de
tradução, bases de dados, glossário etc.
Package – documento zipado do SDL Trados Studio que inclui os documentos a serem
traduzidos nessa mesma CAT-tool
Query (sheet) – documento entregue ao cliente (pelo gestor de projetos) com questões do
revisor/tradutor relativas a um dado projeto desse cliente
Return package – documento zipado produzido no SDL Trados Studio pelo tradutor ou
pelo revisor no final da tradução ou da revisão, respetivamente
Source – área que, numa CAT-tool, se destina à digitação do texto de chegada
Tag – etiquetas com informações relativas à formatação do texto
Target – área que, numa CAT-tool, se destina à exibição do texto de partida
1
Introdução
Desde o momento em que ingressei no Mestrado em Tradução e Serviços
Linguísticos (MTSL), o meu objetivo final era realizar um estágio curricular numa
empresa de tradução. Desde o meu ponto de vista, o estágio e a redação do relatório sobre
o trabalho desenvolvido estabelecem uma união entre os conhecimentos teóricos
adquiridos no MTSL e os conhecimentos práticos aprofundados e/ou adquiridos numa
empresa de tradução. Daniel Gouadec afirma, inclusivamente, que “professional
translation has nothing to do with the academic exercise of ‘translation’” (Gouadec, 2007:
3), sendo um facto que as circunstâncias nas quais se realizam a tradução académica e a
tradução profissional são algo diferentes, sendo o contexto académico mais relaxado e,
na maior parte das vezes, não implicando a publicação das traduções efetuadas pelos
alunos, facto que torna mais difícil preparar os estudantes de tradução para a realidade, a
exigência e a responsabilidade da sua profissão.
É neste contexto que surge o presente relatório, elaborado sob a orientação da
Professora Doutora Alexandra Guedes Pinto, no qual reflito sobre os conhecimentos
adquiridos no MTSL e descrevo e avalio alguns dos aspetos mais relevantes do estágio
curricular realizado na empresa Kvalitext – Serviços de Tradução, Lda., que teve início
no dia 15 de janeiro de 2018 e fim no dia 27 de abril do mesmo ano. Durante esses três
meses e meio, as principais tarefas realizadas envolveram a tradução e a localização de
textos de inglês para português europeu, sob a orientação da Linguistic Manager (LM) da
empresa, Ângela Nogueira.
Em primeiro lugar, efetuar-se-á a apresentação da empresa de estágio, e, em
seguida, realizar-se-á uma descrição do mesmo. Depois, abordar-se-á a importância da
gestão de projetos, das ferramentas de apoio à tradução e dos processos de garantia de
qualidade. Seguidamente, serão avaliados excertos de traduções realizadas, com ênfase
na tradução de textos técnicos, pondo em evidência as dificuldades encontradas e, sempre
que possível, justificando as decisões tomadas com base em teorias apreendidas durante
o mestrado. Por fim, apresentar-se-á um inquérito lançado a vários elementos ligados ao
mundo da tradução, que servirá como base para uma reflexão sobre a formação e a
profissão do tradutor.
2
Capítulo 1 – Apresentação da empresa acolhedora
1.1. Missão, Visão e Valores1
A Kvalitext – Serviços de Tradução, Lda. é uma empresa de tradução sediada em
Espinho e fundada em 2008 por Mónica Silva e Joana Pinto, que ocupam o cargo de
administradoras.
A missão da empresa é disponibilizar, quer ao mercado nacional, quer ao
internacional, serviços de tradução profissionais de qualidade, para que os clientes da
empresa possam promover os seus produtos e serviços num número de mercados
alargado, ultrapassando barreiras culturais e linguísticas. Assim, a visão da empresa passa
pela aposta numa equipa de tradutores profissional e devidamente formada e pela
contínua melhoria dos recursos e das ferramentas de tradução, de forma a cumprir os
requisitos dos clientes.
Nesta linha de pensamento, a Kvalitext define os seguintes valores como essenciais
para o desenvolvimento da empresa:
• Espírito de equipa – promoção de um espírito de entreajuda e de partilha de
conhecimentos;
• Proatividade – autonomia do tradutor e capacidade de identificação das
necessidades do cliente;
• Orientação para o mercado – identificação das necessidades do mercado e
dos clientes, para fidelização dos mesmos;
• Criação de valor – insistência na contínua formação dos tradutores e em
rigorosos padrões de qualidade para satisfação do cliente.
Adicionalmente, a Kvalitext foi a primeira empresa de tradução em Portugal a obter,
em 2010, a certificação EN 15038 que, em finais de 2015, se transformou na norma
ISO 17100: 2015 (certificação renovada por uma auditoria realizada aquando das
primeiras semanas de estágio), que especifica os requisitos organizacionais, profissionais
1 Informações baseadas no documento interno da empresa Declaração Missão Visão Valores V3 2016.
3
e de qualidade que os prestadores de serviços de tradução deverão seguir, bem como os
processos inerentes ao workflow tradutivo. Segundo as disposições da norma,
(…) translation is just one of the steps of the process and does not guarantee
quality if no revision by a second translator is carried out, as well as the precise
definition of the professional abilities of each of the participants in the translation
process, principally the translators, revisers and translation project managers.2
Por outras palavras, a qualidade da tradução não é apenas definida pela tradução
propriamente dita, mas também por todos os processos anteriores e posteriores a esta e
pelas habilitações de todos os intervenientes (gestores de projetos, tradutores e revisores).
Pela minha experiência na Kvalitext, e por todas as informações presentes neste relatório
de estágio, torna-se visível a conformidade da empresa com a referida norma ISO, que
não só otimiza o workflow tradutivo, mas também confere uma imagem mais profissional
e transparente da empresa e dos seus processos.
1.2. Especializações e tipos de textos traduzidos
Desde 2008 que a Kvalitext tem vindo a orientar os seus serviços para a tradução,
localização e revisão de conteúdos de áreas técnicas e científicas. Desta forma, muitos
projetos estão relacionados com a área da saúde e da medicina, mais concretamente, com
dispositivos médicos e documentação destinada a profissionais de saúde, ou com a
tradução técnica de manuais de instruções do setor industrial. Para além destas duas
grandes áreas, destacam-se ainda as áreas da tradução jurídica e da tradução de textos de
marketing, entre outras.
As línguas estrangeiras dos colaboradores in-house são o inglês, o espanhol, o
alemão e o francês, pelo que estas são as línguas de partida de grande parte dos projetos
realizados na empresa, que têm como língua de chegada o português europeu e/ou o
português do Brasil. A adaptação linguística do português europeu ao português do Brasil
(e vice-versa) representa, aliás, outro serviço da Kvalitext, que conta com dois
colaboradores brasileiros. Esta adaptação linguística pressupõe não só uma adaptação
2 http://iso17100.com/ – última consulta a 9 de março de 2018.
4
gramatical e sintática, mas também a adaptação terminológica a cada público-alvo
(português ou brasileiro) e às suas especificidades culturais.
A tradução automática e a pós-edição são também uma aposta recente da empresa,
um serviço pensado para responder às exigências dos projetos mais volumosos e com um
prazo de entrega mais curto. A empresa conta com um motor de tradução automática
interno, cujas propostas de tradução são cuidadosamente analisadas por um pós-editor de
forma a garantir que o produto final se adapta aos requisitos de qualidade da empresa e
aos critérios do cliente.
Finalmente, é também interessante referir que os tradutores da Kvalitext, de forma
geral, não se especializam em determinas áreas de tradução, mas sim em determinados
clientes, ou seja, sempre que possível, todos os projetos de um mesmo cliente são
atribuídos ao(s) mesmo(s) tradutor(es). Esta é uma prática recorrente na empresa e
bastante lógica, uma vez que:
• Cada cliente estabelece instruções gerais (e às vezes bastante extensivas) a
serem aplicadas a todos os seus projetos;
• Cada cliente tem uma terminologia específica;
• Muitos clientes possuem guias de estilo individuais3;
• Alguns clientes enviam os seus projetos em CAT-tools menos usuais (como
em Wordbee ou XTM);
• Certos projetos envolvem apenas a tradução de novos segmentos ou a
adaptação ortográfica de segmentos anteriormente traduzidos pelo tradutor
(concretamente, adaptações à grafia pós-Acordo Ortográfico).
Tendo em conta que os Translators e os Senior Translators têm um volume de
trabalho mais elevado e participam simultaneamente em vários projetos, por vezes
torna-se difícil ter presente as instruções específicas e as preferências terminológicas de
cada cliente. Portanto, dentro do possível, é certamente mais rentável e benéfico ter um
tradutor especializado num número definido de clientes e familiarizado com os
procedimentos, instruções, terminologia e CAT-tools específicas desse cliente.
3 Quando o cliente não fornece um guia de estilo, é aplicado o guia de estilo interno da Kvalitext.
5
1.3. Organização e instalações
Na Kvalitext equilibram-se dois valores muito importantes para um
desenvolvimento bem-sucedido e conclusão de um projeto de tradução: espírito de equipa
e proatividade. Assim, cada colaborador deverá compreender as suas funções e
responsabilidades. Afinal de contas, uma clara distribuição de tarefas promove
autonomia, responsabilidade e celeridade.
No momento do estágio, a Kvalitext contava com os seguintes recursos humanos4:
• Duas Administradoras, encarregadas da gestão e controlo a empresa,
focando-se essencialmente nas áreas de marketing, recursos humanos,
finanças, qualidade e gestão das operações internas;
• Um IT Manager, responsável pelo desenvolvimento, manutenção e
atualização de todo o sistema informático, bem como pela resolução de
eventuais problemas;
• Duas Project Managers (PM), responsáveis pelo atendimento, apoio e
satisfação do cliente, um papel que será aprofundado no ponto 3.1.;
• Duas Linguistic Managers, responsáveis não só pela tradução e revisão de
textos, mas também pelo controlo, harmonização e atualização da
terminologia, bem como pela garantia de qualidade; além disto, este
departamento é também responsável por ações de formação e pelo
acolhimento e acompanhamento de novos colaboradores e estagiários,
como foi o caso;
• Cinco Senior Translators, intervenientes em projetos de maior extensão
e/ou complexidade (espera-se que sejam capazes de traduzir 3500 palavras
por dia) e responsáveis pela revisão e projetos de pós-edição;
• Nove Translators, intervenientes em traduções de textos de diferentes
volumes e complexidades (espera-se que sejam capazes de traduzir 2500
palavras por dia), efetuando, ocasionalmente, tarefas de revisão;
• Três Assistant Translators, cargo desempenhado pelos estagiários, que
traduzem textos de caráter mais geral e pouco complexos; espera-se que um
Assistant Translator seja capaz de traduzir 2000 palavras por dia e que, ao
4 Informações baseadas no documento interno da empresa Manual de Procedimentos V. 12/2016.
6
longo do seu estágio, aumente progressivamente essa média;
• Tradutores freelance.
Desde o primeiro dia de estágio, a administração e as LM tornaram clara a máxima
da empresa: comunicar, comunicar, comunicar. Na Kvalitext, o trabalho em equipa e a
cooperação são encarados como fatores determinantes para o sucesso e o
desenvolvimento da empresa e dos seus colaboradores, pelo que os estagiários são
encorajados a dirigir todas as suas dúvidas a qualquer elemento da equipa, especialmente
às LM e aos Senior Translators, que sempre se mostraram acessíveis e prontos para
responder a todas as questões, por mais ocupados que estivessem.
Mensalmente, são realizadas reuniões entre os tradutores e a administração, onde
os colaboradores fazem um balanço do mês de trabalho, compartilhando dificuldades e
formas encontradas para as contornar, dúvidas em relação a certos procedimentos internos
e sugestões para melhorar o fluxo de trabalho. Esta iniciativa parece-me bastante
importante, atendendo principalmente ao número de colaboradores e à exigência e rigor
Administração
Departamento de TI
Departamento de Gestão de
Projetos
Project Manager
Departamento Operacional
Senior Translator
Translator
Assistant Translator
Freelancer
Departamento de Qualidade
Linguistic Manager
Figura 1: Organigrama organizacional da Kvalitext.
7
de certos clientes. Se os colaboradores sentirem que, na prática, há certos procedimentos
que não funcionam ou que deveriam ser melhorados, é muito gratificante que a sua
opinião seja ouvida e que, consequentemente, se implementem mudanças para possibilitar
a sua rentabilidade e melhorar o ciclo de vida de um projeto. Logo, a comunicação e a
cooperação entre todos os colaboradores são fatores importantes para a prosperidade de
qualquer empresa.
Nos seus quase dez anos de atividade, a Kvalitext tem vindo a crescer de forma
constante, expandindo as suas instalações e alargando a sua equipa de tradução.
Atualmente, as instalações da empresa estendem-se por dois pisos: um inferior, no qual
se localizam a sala de reuniões e um espaço de convívio, onde os colaboradores realizam
as suas pausas e descontraem; e outro superior, onde se encontram as estações de trabalho
dos colaboradores, que se encontram agrupadas por “ilhas de idiomas”. De forma a
promover a interajuda entre os tradutores que partilham as mesmas línguas de trabalho
(para além do inglês, comum a todos os colaboradores), existe uma ilha dedicada ao
alemão, duas ao espanhol e, outra, ao francês, o que garante um apoio constante entre
tradutores e revisores.
Cada estação de trabalho encontra-se equipada com cadeiras ergonómicas e, além
disso, é possível requisitar apoios para mãos, costas e pés, comodidades essenciais para
o tradutor, que ajudam a prevenir eventuais mazelas provocadas por gestos repetitivos e
má postura. Em suma, torna-se evidente que os colaboradores e a administração se
esforçam para criar um ambiente cómodo e agradável que promova a concentração e o
bem-estar, ambos essenciais para o bom desempenho do tradutor.
8
Capítulo 2 – Descrição do estágio
2.1. Duração do estágio
O estágio curricular realizado na Kvalitext teve uma duração de três meses e duas
semanas, com inicio a 15 de janeiro de 2018 e fim a 27 de abril do mesmo ano, num
regime de oito horas diárias. Pela primeira vez, a empresa acolheu simultaneamente três
estagiárias e, desta forma, pude contar com a companhia de uma colega do MTSL e de
uma outra colega oriunda do Mestrado em Tradução Especializada da Universidade de
Aveiro.
Segundo o plano de estágio redigido pela empresa (cf. Anexo 2), o estágio
curricular tem como objetivo a adaptação do estagiário ao mundo da tradução profissional
e a sua formação no que diz respeito aos procedimentos e exigência de uma empresa de
tradução. Ocupando o cargo de Assistant Translator, os objetivos a atingir seriam, numa
primeira fase, a consolidação e o aperfeiçoamento dos conhecimentos adquiridos em
contexto académico, a familiarização com algumas CAT-tools e a tradução (e
autorrevisão) de uma média diária de 2000 palavras de textos pouco complexos. Numa
segunda fase, em virtude da adaptação ao workflow da empresa e à experiência adquirida,
espera-se que o estagiário tenha desenvolvido boas e metódicas capacidades de busca de
informação; que domine, pelo menos, uma CAT-tool de tradução e uma outra de QA e
que, portanto, seja capaz de traduzir uma média diária de 2500 palavras de textos de áreas
de conhecimento mais específicas e complexas.
Com o acompanhamento das LM, a primeira semana de estágio foi dedicada à
integração das estagiárias na Kvalitext e à familiarização com os seus processos. Assim,
tive acesso à documentação da empresa relativa aos respetivos procedimentos internos e
organização, ao guia de estilo e aos manuais de instruções de todas as CAT-tools utilizadas
na Kvalitext e adaptados aos procedimentos da empresa. Para além disso, as LM
forneceram traduções e revisões de projetos anteriores para que, por um lado, nos
familiarizássemos com as áreas de conhecimento mais trabalhadas na empresa e com
alguma terminologia geral a elas associada e, por outro, para que tivéssemos consciência
das exigências de qualidade da empresa.
9
Em suma, o estágio curricular na Kvalitext promoveu a consolidação, na prática e
no mundo da tradução profissional, dos conhecimentos teóricos adquiridos durante a
formação académica. Adicionalmente, ao longo dos três meses e meio de estágio pude
também tornar-me mais autónoma e familiarizar-me com áreas mais especializadas da
tradução, bem como entender as exigências do mercado de tradução, competências e
conhecimentos adquiridos satisfatoriamente graças à minha experiência diária na
empresa.
2.2. Tipos de trabalhos realizados
O trabalho realizado ao longo das 19 semanas de estágio curricular foi
exclusivamente constituído por tarefas de tradução e de localização. No total, foram
realizados 34 projetos (cf. Anexo 1) e traduzidas aproximadamente 106 650 palavras,
distribuídas ao longo dos meses de estágio da forma seguinte:
Os pares de línguas com os quais trabalhei foram Inglês–Português europeu
(EN→PT_PT), Inglês–Português do Brasil (EN→PT_BR) e Espanhol–Português
europeu (ES→PT_PT). O primeiro par foi bastante prevalente na maior parte dos projetos
12 050
38 360 38 340
17 900
0
5 000
10 000
15 000
20 000
25 000
30 000
35 000
40 000
45 000
Janeiro (2 semanas) Fevereiro Março Abril
N.º de palavras traduzidas por mês
Figura 2: Número de palavras traduzidas por mês.
10
efetuados, conforme se pode verificar na figura 3, representando 94% de todo o trabalho
desenvolvido. No entanto, foi com o par de línguas ES→PT_PT que se efetuou o projeto
com o maior volume de palavras: 17 000 no total.
A predominância do inglês como língua de partida pode ser explicada pelo facto de
a maioria dos textos traduzidos durante o estágio se encontrar inserida na área da tradução
médica (35%) ou na área da tradução técnica (26%), onde o inglês é o idioma privilegiado
para a comunicação especializada. Estas são as duas grandes áreas de especialização da
empresa, sendo que os projetos da primeira englobavam a tradução de manuais de
instruções de equipamentos, de materiais médicos, de dispositivo de rastreio de
patologias, entre outros; e a localização de softwares de aparelhos médicos. Nestes
projetos prevalecia a terminologia médica que obrigava a uma pesquisa mais aprofundada
e cuidada, uma vez que tais documentos se destinavam a especialistas da área, ou seja,
profissionais de saúde. Já a segunda área englobava a tradução de manuais de instruções
de máquinas industriais e agrícolas, entre outras, o que exigia uma compreensão do
funcionamento e das funcionalidades das mesmas.
Para além das áreas técnica e médica, tive também a oportunidade de trabalhar em
projetos de marketing, de informática, do setor automóvel, projetos jurídicos e didáticos,
32 (94%)
1 (3%) 1 (3%)
N.º de projetos realizados por par de línguas
EN→PT_PT EN→PT_BR ES→PT_PT
Figura 3: Número de projetos realizados por par de línguas.
11
o que, por sua vez, me permitiu traduzir uma grande variedade de géneros textuais5, como
podemos verificar nos gráficos abaixo.
5 Proposta de subclassificação de tipos de texto utilizada na Kvalitext.
12 (35%)
9 (26%)
6 (18%)
4 (12%)
2 (6%)1 (3%)
Áreas temáticas
Medicina Técnica Marketing Informática Didática Jurídica
15 (44%)
7 (20%)
4 (12%)
3 (9%)
2 (6%)1 (3%)
1 (3%)1 (3%)
Géneros textuais
Manual de instruções Software informático Política de privacidade
Folheto informativo Formação Anúncio publicitário
Folha de venda Guião
Figura 5: Número de projetos realizados por género textual.
Figura 4: Número de projetos realizados por área temática.
12
Como é possível constatar na figura 4, durante o estágio tive a oportunidade de
explorar várias áreas temáticas o que, nesta fase de aprendizagem, me parece essencial,
pois tal permitiu-me entrar em contacto com a terminologia de diversas áreas, identificar
temas onde me sentia mais confortável e reconhecer os meus pontos fortes e os pontos a
melhorar. Para minha surpresa, constatei que os projetos de marketing me causavam mais
incertezas já que, por vezes, se tornava difícil saber até que ponto me poderia distanciar
do texto de partida (TP) e decidir qual a tradução mais apropriada e apelativa para o
público de chegada. Por outro lado, mesmo reconhecendo a complexidade dos projetos
da área da medicina, descobri que a minha formação em Ciências, adquirida no ensino
secundário, estava ainda bastante presente, o que me fez sentir mais confortável nessa
área.
Igualmente, tal como demonstrado na figura 5, tive a oportunidade de trabalhar com
vários géneros textuais, o que me permitiu estudar as suas convenções, especificidades e,
por último, identificar as estratégias de tradução para cada caso. Numa fase anterior à
tradução propriamente dita, a análise textual e a classificação do texto quanto ao género
ajudam o tradutor a compreender o TP, a definir estratégias de tradução e a estruturar a
sua tradução. De acordo com Chesterman, a definição de estratégias de tradução é
particularmente importante para orientar e materializar o trabalho do tradutor, já que “[t]o
speak of translation strategies is thus to look at translation as an action, to place it in a
wider context of action theory” (Chesterman, 2000: 88). Analisando a figura 5, torna-se
evidente que os manuais de instruções foram o género de texto mais traduzido no decorrer
do estágio (44%) e, devido ao elevado volume de trabalho que este género representa no
mundo da tradução, será relevante efetuar uma reflexão sobre as características e
particularidades deste género textual no âmbito deste relatório, tarefa que
empreenderemos adiante na secção 2.4.
2.3. Apreciação global do estágio
Conforme já mencionei, a via profissionalizante foi, sem dúvida, a melhor forma
de consolidar e colocar em prática os conhecimentos adquiridos ao longo do MTSL. A
variedade de géneros textuais traduzidos, bem como as CAT-tools e ferramentas de QA
utilizadas para tal, contribuíram para a expansão dos meus conhecimentos e muniram-me
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de estratégias para lidar com as várias dificuldades e contratempos do mundo da tradução.
Adicionalmente, o contacto com textos de várias áreas temáticas permitiu-me adquirir um
considerável conhecimento geral e terminológico dessas mesmas áreas, um valioso ponto
de partida para, futuramente, lidar com textos mais específicos e complexos.
Diria que os primeiros obstáculos com os quais tive de lidar no início do estágio
estavam relacionados com a autoconfiança nas minhas capacidades e com o “peso” da
responsabilidade da profissão. No entanto, com os conselhos dos membros da Kvalitext
e, especialmente, com o apoio incansável da minha orientadora na empresa, fui capaz de
ultrapassar estes primeiros desafios. Desta forma, considero que a integração numa
equipa de tradução in-house como a da Kvalitext foi crucial para a minha evolução não
só a nível profissional, mas também pessoal. Na empresa, tive a oportunidade de
amadurecer conhecimentos e também de adquirir rapidamente outras competências
através do exercício diário da tradução e do contacto com tradutores/revisores com longos
anos de experiência. Neste contexto, convém realçar o ambiente profissional na Kvalitext,
mas também o de companheirismo e de entreajuda, o ambiente de aprendizagem ideal
para quem está prestes a lançar-se no mundo da tradução. Para além disso, os métodos de
trabalho e as instalações da empresa também possibilitaram a assimilação da
autodisciplina e da concentração essenciais para a rentabilidade de tradução.
De igual forma, os requisitos de qualidade da empresa foram também importantes
nesta fase final de aprendizagem e de transição para o “mundo real” da tradução. Graças
aos mesmos, os meus métodos de pesquisa de informações tornaram-se mais exaustivos
e os procedimentos de autorrevisão mais exigentes, o que potenciou a qualidade das
minhas traduções e, consequentemente, criou um sentimento de orgulho cada vez maior
em relação ao meu trabalho.
Em relação aos aspetos menos positivos, devo referir que, por vezes, estive horas
ou mesmo um dia inteiro sem qualquer projeto. Claro que, para potenciar o meu tempo
na empresa, gostaria de estar constantemente a traduzir, mas tal nem sempre foi possível.
Contudo, este tempo livre não foi desperdiçado, mas antes utilizado para recolher
informações para a elaboração do relatório de estágio e para analisar as alterações
implementadas às minhas traduções pelos revisores. Assim, até estes momentos sem
projetos, que poderiam ter sido desanimadores, foram úteis do ponto de vista pedagógico,
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para que eu aprendesse com os meus erros.
Em suma, considerei o estágio curricular realizado na Kvalitext extremamente
proveitoso: o protocolo de estágio proposto foi cumprido, as minhas expectativas em
relação ao estágio foram superadas e, de forma geral, fiquei também satisfeita com o meu
desempenho. Já no que diz respeito à avaliação final do estágio por parte da empresa
acolhedora, esta foi positiva (cf. Anexo 3), tendo sido oferecida a possibilidade de
permanência na Kvalitext através de um estágio profissional.
2.4. Considerações sobre os manuais de instruções
Entre todos os projetos realizados ao longo do estágio, o discurso técnico foi, sem
dúvida, o mais prevalente e, inserido neste tipo de discurso, os manuais de instruções
foram o género textual mais traduzido. De facto, em 2006, a tradução de manuais de
instruções representava cerca de 90% das traduções realizadas anualmente (Byrne, 2006:
2), uma tendência que decerto se manterá, visto que as legislações e normas internacionais
exigem que a documentação técnica associada aos produtos esteja disponível nas línguas
dos países onde estes são comercializados.
Uma vez que cada tipo de texto é produzido com um objetivo específico e para um
público-alvo definido (Byrne, 2012: 70), apresentando algumas características
definitórias e expectáveis, é importante que o tradutor seja capaz de conhecer, identificar
e adotar as estruturas e convenções de cada género textual; caso contrário, “[w]ithout the
ability to recognize a text as a sample of a particular form […] we [tradutores] would be
unable to decide what to do with it; we could neither comprehend nor write nor, clearly,
translate” (Bell, 1991: 206 apud Byrne, 2012: 70–71). Logo, o conhecimento bilingue
das tipologias textuais é essencial para a interpretação, abordagem e consequente tradução
do TP.
No que diz respeito aos manuais de instruções, estes constituem um género textual
que visa “to provide the reader with easy access to precisely the information they need at
a particular moment and to ensure that it is clear and comprehensible” (Byrne, 2012: 59).
Logo, um manual de instruções não é um fim em si mesmo, ou seja, o leitor consulta
secções específicas do manual para, assim, poder desempenhar determinadas tarefas; o
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manual de instruções é, portanto, um meio e deve, desta forma, preencher certos requisitos
para cumprir a sua função de forma eficiente. Todavia, parece existir um “sentimento de
insatisfação generalizado” (Guimarães, 2012: 1) em relação aos manuais de instruções,
que frequentemente são considerados ininteligíveis ou mal traduzidos. Desta forma,
penso que será relevante refletir sobre as características essenciais dos manuais de
instruções para que, enquanto tradutora, possa oferecer um pequeno contributo para a
compreensão do género textual e para o aumento da qualidade das traduções do mesmo.
Segundo as tipologias textuais de Katharina Reiss, posteriormente sumarizadas por
Christiane Nord (1997), cada texto assume uma função mais prevalente: informativa,
expressiva ou operativa (Nord, 1997: 37–38). Neste enquadramento teórico, será mais
relevante abordar a função informativa, uma vez que é a função principal dos manuais de
instruções. Neste tipo de textos, “the main function is to inform the reader about objects
and phenomena in the real world” (id.: 37) ou, mais especificamente, transmitir conteúdo
factual relativo ao produto visado no respetivo manual de instruções, pelo que o texto de
chegada (TCh) deve ser uma tradução integral e correta do TP (id.: 38). Logo, um manual
de instruções terá uma função informativa tanto na língua de partida como na língua de
chegada, o que, segundo Nord, é um tipo de tradução instrumental (id.: 50), que oferece
ao leitor de chegada um texto traduzido que cumpre a mesma função comunicativa do
TP, sem que o leitor se aperceba de que está a ler uma tradução (ibid.), uma “ilusão” que
os manuais de instruções traduzidos, idealmente, deverão ser capazes de perpetuar.
Para que esta “ilusão” possa ser criada, a transmissão da informação técnica deverá
ser cuidada; quer no TP, quer nas suas traduções, essa informação deverá apresentar-se
bem fraseada e estruturada, de forma clara e concisa (Byrne, 2009: 2), cumprindo
requisitos de “readability” e de “usability” (Byrne, 2006: 92–93); respetivamente, o
requisito de legibilidade refere-se à adaptação da complexidade linguística (tamanho das
frases e das palavras, número de sílabas etc. [Olohan, 2016: 53]) ao nível do
conhecimento do público-alvo; já a usabilidade avalia com que eficácia os leitores
conseguem aplicar essa informação linguística e técnica para desempenhar a tarefa
pretendida (Byrne, 2006: 92–93). Adicionalmente, Robinson propõe um terceiro fator
igualmente importante para a tradução técnica: “reliability” (Robinson, 2003: 7); segundo
o autor, o tradutor deverá desempenhar o seu trabalho de forma responsável e fiável para
fornecer ao leitor de chegada toda a informação de que este necessita (ibid.).
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Igualmente importantes são os parâmetros de compreensibilidade estabelecidos por
Göpferich (Göpferich, 2009: 40–48) (percetibilidade, simplicidade, estrutura, correção,
concisão e motivação), bastante relevantes para a elaboração e também para a tradução
de textos técnicos, sendo, portanto, fundamental refletir sobre os mesmos.
• Concisão: apenas deverá ser fornecida a informação necessária para que o
texto cumpra a sua finalidade comunicativa; informação excessiva ou
escassa, bem como redundâncias, tautologias e repetições desnecessárias
confundem o leitor, aumentam o seu esforço cognitivo e levam-no a perder
tempo (id.: 40).
• Correção: o texto deverá encontrar-se livre de erros, adaptado às convenções
do género textual no qual este se insere e ser compatível com os
conhecimentos e expectativas do leitor (id.: 42), isto é, deve cumprir a noção
de legibilidade apresentada por Byrne (Byrne, 2006: 92).
• Motivação: o manual de instruções, para além de procedimental, deverá
também ser motivacional para atrair e satisfazer os leitores (Göpferich,
2009: 43). Segundo Olohan (Olohan, 2016: 66), os leitores devem ser
persuadidos em relação à utilidade do manual de instruções, que deverá
incutir um sentimento de confiança para realizar as tarefas propostas no
texto.
• Estrutura: os manuais de instruções devem apresentar o seu conteúdo de
forma lógica e estruturada (Göpferich, 2009: 44).
• Simplicidade: devem privilegiar-se estruturas que promovam uma maior
clareza das frases, evitando a voz passiva, ambiguidades, formas verbais
complexas etc. (id.: 46).
• Percetibilidade: a informação apresentada deverá ser legível (id.: 48), de
acordo com o requisito de usabilidade mencionado por Byrne (Byrne, 2006:
93), permitindo ao leitor executar facilmente as ações descritas.
Estas características sumariamente abordadas são essenciais para que um manual
de instruções cumpra com eficiência a sua função comunicativa, logo, são relevantes não
apenas para a comunicação técnica, mas também para a tradução técnica, já que, no
desenvolver da sua profissão, “translators have to exercise a skill akin to that of technical
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writers” (Owens, 1996: 143). Contudo, uma análise textual não deverá ser exclusivamente
sustentada pelas características gerais de cada género textual, uma vez que cada texto é
uma entidade híbrida e complexa. Será, então, fundamental aprofundar a análise textual
dos manuais de instruções e analisá-los à luz das sequências textuais propostas por Jean
Michelle-Adam (1992).
Como já foi referido, os textos são unidades heterogéneas, isto é, são compostos
por várias sequências textuais interligadas, de entre as quais prevalece uma, a sequência
textual predominante, que contribuirá para a classificação do género textual. Segundo
Adam, essas sequências textuais podem ser individualizadas em sequências narrativas
(narração de um acontecimento), descritivas (descrição das qualidades de
pessoas/objetos), argumentativas (comprovação/refutação de um facto ou hipótese),
explicativas-expositivas (exposição de informações), instrucionais-diretiva (transmissão
de comandos) e dialogais-conversacionais (que ocorrem na interação oral).
Pelo anteriormente exposto e devido à natureza instrucional e diretiva dos manuais
de instruções, é possível concluir que a sequência textual predominante neste género
textual será a instrucional-diretiva, orientando as ações do leitor através de comandos e
impondo e/ou delimitando certos comportamentos. Todavia, os manuais de instruções
não se limitam à comunicação de instruções; frequentemente, estes textos cumprem
também uma função retórica6, promovendo o produto e tentando estabelecer a
credibilidade e o profissionalismo da marca (Olohan, 2016: 58), apresentando, portanto,
elementos de marketing para atrair e fidelizar clientes (Guimarães, 2012: 29). Assim,
sequências textuais como a descritiva e a explicativa também se encontram presentes
neste género textual, como podemos constatar na tabela seguinte.
Tabela 1: Exemplos de sequências textuais presentes nos manuais de instruções.
Instrucional-diretiva
(predominante)
Hold the transducer by the handle and guide the transducer
carefully into the entrance of the trocar. Push the transducer
slowly down the trocar until it is seen, using the video monitor, to
6 Utilizamos aqui o termo “retórica” na aceção de Oswald Ducrot; nas suas palavras, “[e]ntenderei por
argumentação retórica a atividade verbal que visa fazer alguém crer em alguma coisa” (Ducrot, 2009: 20).
18
touch the site of interest.
Descritiva
The XXXXX slide scanner is a member of XXXXX’s
industry-leading family of digital pathology products for
anatomic pathology labs. The scanner’s easy-to-use slide trays
allow the loading and fast scanning of up to 6 standard slides or 3
double slides.
Explicativa-expositiva
Because of reports of severe allergic reactions to medical devices
containing latex (natural rubber), the FDA advises health-care
professionals to identify their latex-sensitive patients and be
prepared to treat allergic reactions promptly.
Como ilustrado pela tabela 1, na sequência instrucional-diretiva é evidente a
prevalência de verbos no imperativo (por ex., “hold” e “push”) e a descrição de várias
etapas a serem realizadas em sucessão para atingir um determinado fim (por ex., trabalhar
com o aparelho em questão). Embora menos frequentes, as sequências descritivas estão
também presentes nos manuais de instruções, não só listando as características dos
produtos, mas também promovendo a marca e tentando obter a confiança e a aprovação
do leitor; para tal, é empregue o presente do indicativo (por ex., “is”) para descrever o
estatuto da empresa que desenvolveu o produto e adjetivos para promover o mesmo (por
ex., “industry-leading”, “easy-to-use” e “fast”). Por último, é também comum o leitor
deparar-se com sequências explicativas-expositivas que relatam informações relevantes
para o utilizador, utilizando, por exemplo, conjunções causais (“because”) e verbos no
presente do indicativo (“advises”).
Sendo a sequência textual instrucional-diretiva a sequência dominante, é fácil
prever que os atos de fala predominantes (Austin, 1965 e Searle, 1969) serão o ato
ilocutório diretivo (associado a uma modalidade deôntica) e o assertivo (associado a uma
modalidade epistémica), uma vez que o significado pragmático subjacente a cada ato de
fala faz com que os atos ilocutórios diretivos e assertivos expressem uma modalidade
implícita (Duarte et al., 2003: 80), conforme podemos constatar na tabela abaixo.
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Tabela 2: Modalidade expressa pelos atos ilocutórios.
Ato ilocutório
assertivo
Failure to observe warning messages will
result in death or serious injury.
Valor de
certeza Modalidade
epistémica Information in this document may be
subject to change without notice.
Valor de
possibilidade
Ato ilocutório
diretivo
You must dispose of these items through
designated collection facilities appointed
by government or local authorities.
Valor de
obrigação
Modalidade
deôntica Do not reuse passwords. Valor de
proibição
You can choose a different
option for each slide position in the tray.
Valor de
permissão
Dado que os atos ilocutórios diretivos são os mais característicos nos manuais de
instruções, durante os vários projetos realizados fui observando os mecanismos
linguísticos utilizados para concretizar esses mesmos atos, bem como outras formulações
frásicas prevalentes nos manuais de instruções. Tendo por base a análise do corpus
realizada por Joana Guimarães na sua tese de doutoramento, na qual a autora procedeu
“ao levantamento das principais características dos manuais originalmente redigidos em
língua portuguesa” (Guimarães, 2012: 61), empreendi numa tarefa semelhante, ainda que
mais simples e limitada, ou seja, no levantamento de mecanismos linguísticos presentes
nos manuais de instruções, conforme explicitado e exemplificado na tabela abaixo, onde
apresento o texto de partida e a minha proposta de tradução.
Tabela 3: Mecanismos linguísticos presentes nos manuais de instruções.
Mecanismos Texto de partida Tradução
Verbos no
imperativo/infinitivo
“Choose the SAVE button”;
“Refer to the Troubleshooting
chapter (…) for
troubleshooting errors”;
“Place tissue slides in XXXXX
until loading the instrument”;
“Consult user documentation”.
“Selecione o botão SAVE
(Guardar)”;
“Consulte o capítulo «Resolução
de problemas» (…) para
solucionar erros”;
“Colocar as lâminas de tecido em
XXXXX até carregar o
instrumento”;
20
“Consultar a documentação do
utilizador”.
Verbos na forma
negativa do imperativo
“Do not reuse passwords”;
“Do not attempt to scan slides
that do not have cover slips”.
“Não reutilize palavras-passe”;
“Não efetue a leitura de lâminas
sem lamelas”.
Verbos modais
deônticos
“Wet slides should not be used
on the scanner”;
“This manual must always be
easily accessible”;
“You can choose a different
option for each slide position in
the tray”.
“Não devem ser utilizadas
lâminas molhadas no leitor”;
“Este manual deverá estar sempre
facilmente acessível”;
“Pode selecionar uma opção
diferente para cada posição das
lâminas no tabuleiro”.
Repetição de
substantivos que
identificam partes do
equipamento/da tarefa a
operar
“When the foot pedal is used,
release the foot pedal to cut the
pad”.
“Quando é utilizado o pedal, solte
o pedal para cortar a almofada”.
Relações causa-efeito
“Once pressed, the Emergency
Stop button blocks the operation
of the converter”.
“Depois de pressionado, o botão
de paragem de emergência
bloqueia o funcionamento do
conversor”.
Paralelismo interfrásico
“Do not place the system on any
cart, stand, tripod, bracket, or
table that is unstable. Do not
place the system in close
proximity to other devices that
generate vibrations. Do not
place the system near large
windows to avoid prolonged
exposure to direct sunlight.”
“Não coloque o sistema sobre
carrinhos, suportes, tripés ou
mesas instáveis. Não coloque o
sistema nas proximidades de
outros dispositivos que gerem
vibrações. Não coloque o sistema
perto de janelas amplas para
evitar a sua exposição prolongada
e direta à luz solar.
Ações por ordem
cronológica
“1. Power cycle the scanner.
2. Re-run the diagnostic test.
3. If the failure re-occurs,
contact XXXXX Support.”
“1. Desligue e volte a ligar o
leitor.
2. Execute novamente o teste de
diagnóstico.
3. Se a falha voltar a ocorrer,
contacte o Serviço de Assistência
Técnica da XXXXX.”
O imperativo é o modo verbal mais utilizado para transmitir o valor instrutivo e,
assim, foi o modo verbal mais empregue (quer na forma afirmativa, quer na forma
21
negativa) na tradução das instruções. No entanto, convém referir que, em português, estas
podem também ser transmitidas através de um infinitivo com valor de imperativo, uma
opção empregue em alguns contextos. Para além disso, as obrigações, proibições e
permissões podem também ser transmitidas através do uso de verbos modais (em inglês,
“should”, “must”, “can” etc.), para os quais procurei uma tradução que transmitisse a
mesma modalidade deôntica, recorrendo para tal aos verbos “dever” e “poder”.
Ainda que, conforme referido, o discurso técnico procure ser conciso, também
evidencia, por vezes, uma terminologia consistente e até repetitiva, para que os termos
sejam interiorizados pelo leitor. Considerando, por exemplo, o segmento “When the foot
pedal is used, release the foot pedal to cut the pad”, podemos constatar que o termo “foot
pedal” poderia ser omitido e substituído, na tradução, por um pronome (por ex., “Quando
é utilizado o pedal, solte-o para cortar a almofada”) de forma a melhorar estilisticamente
a frase. No entanto, para este projeto em específico, o cliente forneceu as seguintes
instruções:
a. Do not use synonyms or pronouns (if a word is repeated in a few sentences in
a row, it means it should be repeated in translation also).
b. Use solely unambiguous terms.
c. Do not use unnecessarily complicated grammar structures.
d. Try to use active voice in your translation, avoid passive voice especially in
instructions / commands.
Este tipo de instruções é muito comum na tradução técnica, já que, de forma geral, se
promove uma evasão à polissemia, à ambiguidade, aos pronomes, à voz passiva e a
quaisquer estruturas frásicas que sejam demasiado complexas e, por conseguinte, causem
dúvida ao leitor ou lhe exijam um maior esforço cognitivo para decifrar e executar a ação
descrita no texto. Da mesma forma, para promover a simplicidade e a percetibilidade, é
comum os redatores técnicos recorrerem a um paralelismo interfrásico, isto é, uma
repetição de certos elementos transversal a várias frases para assegurar a coesão e facilitar
a transmissão da mensagem (no exemplo apresentado, os elementos repetidos são:
advérbio de negação [“Não”] + verbo [“coloque”] + sintagma nominal [“o sistema…”])
e para, através das mesmas palavras, fornecer informações semelhantes. Esta prática, que
22
Byrne denomina “iconic linkage” (Byrne, 2012: 130), aumenta a legibilidade e a
percetibilidade do texto, o que, por sua vez, contribui para a usabilidade do manual de
instruções em questão.
Assim, convém que os tradutores tenham presente que os manuais de instruções,
atendendo à sua função informativa, não apresentam preocupações primordiais de
estilística ou de retórica. Segundo Cabré (Cabré, 1999: 47), “[i]n general texts,
expression, variety and originality prevail over other features; in specialized texts,
concision, precision and suitability are the relevant criteria”, pelo que as questões
estilísticas podem ser ligeiramente “sacrificadas” para que o texto cumpra a sua função
comunicativa: a transmissão clara e precisa de instruções para execução por parte dos
leitores.
Por conseguinte, é da responsabilidade do tradutor conhecer as características
inerentes ao géneros textuais com os quais habitualmente trabalha, já que, segundo Byrne
(Byrne, 2006: 4), “[f]ailing to comply with target language text conventions can
undermine the credibility of the text, the author and the information in the text”. Assim,
é essencial que o tradutor coloque em prática um modelo de análise textual e, na tradução
de manuais de instruções mais concretamente, que cumpra os critérios de legibilidade,
usabilidade, fiabilidade e compreensibilidade deste género textual para priorizar a sua
função comunicativa. Por último, é importantíssimo que o tradutor tenha consciência de
que alguns dos seus erros poderão ter consequências práticas, já que o incumprimento dos
critérios e dos mecanismos linguísticos aqui analisados “can have a range of
consequences ranging from frustrated users to serious damage or even injury” (Byrne
2006: 82).
23
Capítulo 3 – Gestão de projetos, CAT-tools e garantia de
qualidade
3.1. Gestão de projetos
A profissão do tradutor tem vindo a ser remodelada pela globalização, pelos
avanços tecnológicos e pelo crescimento e reconhecimento do mercado, fatores que estão
a transformar os serviços de tradução numa indústria (Rico Pérez, 2002). Assim, os
prestadores destes serviços têm de se adaptar às mudanças de um mercado que, por um
lado, exige competências mais abrangentes por parte do tradutor e, por outro, espera que
os profissionais da tradução sejam capazes de lidar com projetos cada vez mais complexos
e extensos. É neste contexto que surge a gestão de projetos de tradução, “the key element
marrying crafts, needs, and expertise” (ibid.).
De forma geral, segundo o Guia PMBOK, um projeto é um “temporary endeavor
undertaken to create a unique product, service, or result” (PMI, 2013: 3) e a gestão de
projetos consiste na “application of knowledge, skills, tools, and techniques to project
activities to meet the project requirements” (id.: 5). Partindo destas definições, podemos
afirmar que cada tradução é, certamente, um projeto, uma vez que é temporária,
apresentando uma data de entrega bem especificada, e única, já que o resultado, isto é, o
texto traduzido, é sempre diferente.
Contudo, para além daquelas características, Rico Pérez refere que certos projetos
de tradução têm uma característica adicional, “leveraging”, já que, embora cada tradução
seja, de facto, única, muitas são o “cumulative effect” (Rico Pérez: 2002) de traduções já
realizadas. Mais concretamente, algumas traduções efetuadas durante o estágio
consistiram em breves atualizações de ortografia (adaptação à grafia pós-Acordo) ou na
tradução de passagens introduzidas e/ou alteradas em documentos informativos já
traduzidos previamente. Em ambos os casos, o produto final do projeto era apenas
ligeiramente diferente das suas versões passadas, pelo que o trabalho anteriormente
realizado por outros tradutores consistiu numa forma de “leveraging”, uma mais-valia
para entregar um produto final com boa qualidade e num espaço de tempo menor.
Desta forma, atendendo aos elevados fluxos de projetos de tradução e à sua
24
complexidade e exigência crescentes, torna-se indispensável a existência um gestor de
projetos (project manager – PM) capaz de criar e coordenar uma equipa de tradutores
cujas competências consigam satisfazer os requisitos do trabalho e do cliente,
acompanhando todo o ciclo de vida de um projeto.
Por ciclo de vida do projeto entende-se “the series of phases that a project passes
through from its initiation to its closure” (PMI, 2013: 38), ou seja, um conjunto de fases
lógicas e sequenciais inter-relacionadas que culminam numa entrega (id.: 41). É da
responsabilidade da empresa e do PM definir o número de fases de cada projeto,
dependendo da complexidade do mesmo e dos procedimentos internos em vigor.
Relativamente aos projetos realizados na Kvalitext, será possível dividir o seu ciclo de
vida em três fases, de acordo com a nomenclatura de Daniel Gouadec (2007: 13):
“pre-translation”, “translation” e “post-translation”. A tabela seguinte apresenta de forma
sucinta as várias fases e subfases às quais um projeto de tradução é sujeito na Kvalitext,
segundo a proposta de faseamento de Gouadec (2007). A mesma tabela indica os
intervenientes e resume as atividades compreendidas em cada fase.
Tabela 4: Ciclo de vida de um projeto de tradução na Kvalitext.
Fases do projeto Atividades Interveniente(s)
Pré-tradução
Análise do projeto proposto pelo
cliente;
Emissão/aprovação do orçamento.
Cliente, PM
Compilação do kit de tradução7;
Seleção da equipa de tradução e
revisão;
Upload do kit de tradução no PO;
PM
Transferência Pré-transferência
Análise do kit de tradução;
Abertura do package para
tradução;
Verificação da TM e da TB (se
disponíveis);
Antecipação de potenciais
dificuldades.
Tradutor
7 Recomendamos a consulta da lista de abreviaturas e do glossário.
25
Transferência
Tradução. Tradutor
Comunicação com o cliente/PM
caso surjam dúvidas.
Tradutor, PM,
cliente
Pós-transferência
Autorrevisão;
QA;
Verificação ortográfica;
Upload do return package da
tradução no PO;
Revisão;
QA;
Verificação ortográfica;
Upload do return package da
tradução revista no PO.
Tradutor, revisor
Pós-tradução
Verificação do cumprimento dos
requisitos estabelecidos no kit de
tradução;
Entrega do projeto.
PM, cliente
Desta forma, a gestão de projetos revela-se essencial para a organização da empresa
e para a satisfação do cliente, equilibrando e mediando os interesses de ambos. Pelo
exposto, e com base em Gouadec (Gouadec, 2007: 118–119) e na minha experiência na
Kvalitext, conclui-se que um PM desempenha duas funções distintas, mas
complementares e igualmente relevantes:
• Perante o cliente, o PM é a face da empresa e o ponto de contacto entre esta
e o cliente, estando também responsável, na fase de pré-tradução, pela
avaliação dos potenciais projetos, dos seus requisitos (por ex., CAT-tools e
equipa de tradução a serem utilizadas) e prazos; numa fase posterior, a da
tradução, deve comunicar desenvolvimentos e problemas e, na fase de
pós-tradução, está encarregado da entrega final do projeto e da recolha de
feedback junto do cliente.
• Na empresa, é da responsabilidade do PM, na fase de pré-tradução, verificar
o conteúdo dos ficheiros do projeto, identificar full matches, fuzzies e
repetições, formar uma equipa de tradução capaz de fazer frente às
exigências do projeto, disponibilizar o kit de tradução contendo as
26
instruções do cliente e, de forma geral, acompanhar atentamente o ciclo de
vida de um projeto, garantindo que é cumprido dentro do prazo e da
qualidade acordados com o cliente.
Em suma, embora o papel do PM seja mais visível nas fases de pré e de
pós-tradução, e ainda que este não participe no ato tradutivo propriamente dito (Melby,
1998), a sua relevância é transversal a todas as fases do trabalho, tornando a gestão de
projetos num serviço fulcral quer para o cliente, quer para a empresa (Bustamante, 2011).
Para o cliente, a gestão de projetos representa qualidade e transparência, uma vez que as
empresas que aplicam técnicas e procedimentos da gestão de projetos criam uma melhor
imagem junto dos seus clientes. Já na empresa, um PM melhora a comunicação e
cooperação entre os diferentes membros da equipa de tradução e torna o tradutor mais
produtivo e eficiente, pois ajuda-o a compreender o seu papel numa determinada linha de
trabalho e a finalidade da mesma.
3.1.2. Project Open
Para fazer frente ao crescente fluxo de trabalho, a Kvalitext criou, em 2013, uma
equipa exclusivamente dedicada à gestão de projetos, à comunicação com a equipa de
tradução interna e externa e à comunicação com os clientes. Atualmente, as duas PM da
empresa contam com o Project Open (PO), uma plataforma online em ambiente de
intranet e de código aberto, para gerir e planear todos os projetos realizados na empresa
e atribuí-los a diferentes tradutores e revisores. Mediante credenciais individuais, cada
colaborador tem acesso a informações específicas à sua função. Na figura 6 abaixo
apresentada, está aberto o separador “Projects”, exibindo os projetos atribuídos ao
utilizador, bem como um conjunto de informações básicas, como, por exemplo, o nome
do projeto, o seu número de identificação interno, a PM por ele responsável, a data de
entrega ao cliente e o número total de palavras.
27
Clicando num projeto específico, o tradutor é, em seguida, direcionado para a
página exclusiva desse projeto, onde encontra os subseparadores “Summary”, “Files” e
“Trans Tasks”.
O “Summary” é o separador central do projeto; aí, para além de algumas
informações gerais já presentes na vista global de “Projects”, encontram-se outras mais
específicas, como os pares linguísticos do projeto, a CAT-tool a ser utilizada, o tipo de
ficheiro de entrega, o material de referência, a área temática, a equipa alocada ao projeto
(PM, tradutor e revisor) e, se referido pelo cliente, as instruções gerais e o público-alvo
do TCh.
O separador seguinte, “Files”, consiste numa metódica organização de pastas, cada
uma delas destinada ao upload de:
• O package com o(s) ficheiro(s) a traduzir;
• Referências fornecidas pelo cliente (glossários, originais dos ficheiros etc.)
• Instruções específicas para o projeto (se disponíveis)8;
• Guia de estilo do cliente (se existente);
• Queries já realizadas por outros tradutores e/ou o template a ser utilizado
para colocar questões ao cliente;
• O return package do(s) ficheiro(s) traduzido(s) (e relatórios de QA);
8 No ponto 4.1. efetuaremos uma reflexão sobre a importância das instruções do cliente e as consequências
da falta das mesmas.
Figura 6: Visualização do separador “Projects” no Project Open.
28
• O return package do(s) ficheiro(s) revisto(s) (e relatórios de QA);
• O package entregue ao cliente.
Se tivermos em consideração o elevado fluxo de trabalho de uma empresa de
tradução como a Kvalitext, a organização, a adequada identificação e a rápida
disponibilidade dos ficheiros (quer no PO, quer no servidor da empresa) tornam-se
particularmente relevantes. Afinal de contas, uma organização metódica dos recursos
contribui para a eficácia e para a agilidade do ciclo de vida de um projeto e assegura que
toda a informação essencial para a fase de transferência esteja sempre disponível para
todos os intervenientes no projeto.
O último subseparador é o das “Trans Tasks” e, como o nome indica, permite que
os intervenientes de um determinado projeto saibam em que fase este se encontra e quem
está a trabalhar nele num dado momento. Assim, no início de todos os projetos, a PM
atribui uma tarefa a um determinado colaborador (tradução, revisão, compilação de
glossário, pós-edição etc.) que fica responsável pela sua atualização em cada fase do
projeto. Exemplificando, quando uma PM cria um projeto de tradução, o seu estado é
marcado como “Created” até que sejam organizadas e disponibilizadas todas as
informações referente ao mesmo; esta fase de pré-tradução é concluída quando a PM
seleciona a equipa de tradução e de revisão e, respetivamente, lhes atribui as tarefas “for
Trans” e “for Edit”, fazendo com que cada um dos intervenientes receba um e-mail
avisando de que foram alocados a um projeto. A primeira subfase da tradução (a
pré-transferência) inicia-se quando o tradutor lê o “Summary” do projeto, efetua o
download dos ficheiros disponibilizados em “Files” e marca o estado da sua tarefa como
“Trans-ing”, iniciando, em seguida, a subfase de transferência. Mais tarde, concluídas a
tradução e a autorrevisão, o tradutor terá de colocar na respetiva pasta em “Files” o return
package e quaisquer outros ficheiros exigidos e marcar o projeto como “for Edit”. Nessa
altura, o projeto passará para as mãos do revisor, que deverá alterar a sua tarefa para
“Editing”. A subfase de pós-transferência termina quando o revisor coloca no PO o return
package após a sua revisão e define o estado do projeto como “for Delivery”. Nesta fase,
a PM receberá um e-mail alertando-a de que o projeto se encontra pronto para ser entregue
ao cliente, o que ocorre quando são efetuadas as verificações finais e o projeto é marcado
como “Delivered”. Se aprovado pelo cliente, o projeto passará, então, pelos estados
29
“Invoiced” e “Payed”, concluindo, desta forma, a fase de pós-tradução.
Esta descrição dos diferentes estados pelos quais um projeto passa durante o seu
ciclo de vida na Kvalitext demonstra que as noções gerais da gestão de projetos se
encontram naturalmente enraizadas na tradução e na sua categorização segundo a divisão
de tarefas propostas por Daniel Gouadec (Gouadec, 2007: 21–25). Desta forma,
ferramentas de gestão de projetos como o Project Open refletem as noções da gestão de
projetos geral e adaptam-se perfeitamente ao fluxo de trabalho das empresas de tradução,
permitindo a sincronia entre os diferentes participantes no projeto e a otimização do
mesmo. Adicionalmente, estes programas também beneficiam em muitos os gestores de
projetos na medida em que lhes poupam tempo, permitem uma visão geral do
desenvolvimento do projeto e facilitam a divulgação das informações provenientes de
clientes. Igualmente importante é a rapidez do programa e a capacidade de organização e
de armazenamento seguro e prolongado de todos os recursos no PO, tornando esta
ferramenta numa boa aliada de todos os colaboradores.
Em suma, devido aos desenvolvimentos tecnológicos e científicos e à existência
diversificada de ferramentas de apoio à tradução cada vez mais sofisticadas, grandes
empresas e, por conseguinte, os seus tradutores, poderão ser sobrecarregados com vários
projetos, cada um com os seus desafios, exigindo uma equipa cooperante para os
ultrapassar. Desta forma, a gestão de projetos de tradução, potenciada pelo uso de
tecnologias apropriadas, torna-se cada vez mais relevante e usual. Logo, o gestor de
projetos é a resposta aos desafios provocados pelo rápido crescimento do mercado de
tradução, um elemento-chave para a harmonização e comunicação da equipa, a ponte de
comunicação entre os tradutores e o cliente.
3.2. CAT-tools
No início da sua atividade, há dez anos, a Kvalitext trabalhava maioritariamente
com duas ferramentas de apoio à tradução (CAT-tools) que, entretanto, já desapareceram
do mercado. Hoje, a empresa trabalha com cerca de sete CAT-tools (com os tradutores
alternando constantemente entre elas, em função das preferências dos clientes), com
várias outras ferramentas de garantia de qualidade (QA) e com a já referida ferramenta
30
de gestão de projetos, o que demonstra a crescente relevância que todas estas ferramentas
têm vindo a ganhar no mercado de tradução, com muitas delas, principalmente as CAT-
tools, a tornarem-se praticamente indispensáveis. Assim, reconhecendo a importância da
tecnologia no apoio à tradução, a Kvalitext conta, há vários anos, com um engenheiro
informático responsável pelo desenvolvimento e manutenção dos softwares, hardwares e
sistema informático da empresa.
É, portanto, indiscutível que estas tecnologias têm vindo a ganhar terreno no mundo
da tradução, pelo que o tradutor tem de se superar constantemente e não apenas possuir
boas competências linguísticas e de tradução, mas também um vasto leque de
competências informáticas e técnicas, como o conhecimento para solucionar problemas
informáticos, proficiência em várias CAT-tools, competência para criar e gerir TM e TB,
capacidade para efetuar uma pesquisa eficiente na Internet, entre outras (Gouadec, 2007:
91). De forma geral, “[t]he translator now needs to be familiar with different computer
environments and platforms, and should be able to set up, uninstall and use any new
software that happens to be required, or adapt it to specific needs and uses” (ibid.),
esperando-se, desta forma, uma grande flexibilidade de conhecimentos e de adaptação
por parte do tradutor.
As CAT-tools são, indiscutivelmente, uma mais-valia para todos os intervenientes
num projeto de tradução, principalmente quando este é extenso e/ou envolve vários
tradutores. Segundo Esselink (Esselink, 2000: 366), a produtividade de um tradutor
poderá aumentar, em média, 30% a 50% através da utilização de uma CAT-tool, o que,
globalmente, pressupõe uma redução de 15% a 30% do custo de uma tradução. De facto,
ao longo do estágio curricular, foi possível constatar que as CAT-tools tornam o trabalho
do tradutor mais célere e rigoroso, asseguram consistência e uniformidade terminológica
(através da partilha de TM), efetuam contagem de palavras, de repetições, de full e fuzzy
matches etc., permitem visualizar e movimentar as tags presentes no source, entre outros
benefícios.
Na Kvalitext foi possível não só aprofundar o conhecimento em determinadas
ferramentas de tradução adquirido durante o MTSL, mas também entrar em contacto,
quer direta, quer indiretamente com outras (através dos manuais internos disponibilizados
para todas as ferramentas), bem como explorar mais a fundo as suas funcionalidades. No
31
que diz respeito às CAT-tools, foram utilizadas quatro durante o estágio, nomeadamente
o SDL Trados Studio (versão 2017), o memoQ (versões 2015 e 8.2), o Wordbee e o SDL
Passolo (versão 2016).
Para efeitos de relatório, serão listadas a seguir as CAT-tools utilizadas ao longo do
estágio com o objetivo de colocar em evidência algumas das suas vantagens ou
desvantagens; não serão apresentadas, portanto, características gerais dos programas, mas
sim certos aspetos e reflexões sobre os mesmos, que me pareceram mais relevantes em
virtude da minha utilização do software.
3.2.1. SDL Trados Studio
O SDL Trados Studio (doravante, Studio) é a CAT-tool mais utilizada na Kvalitext
e, apesar de a versão utilizada na empresa (a mais recente até à data) ser diferente da
trabalhada na UC de Informática da Tradução do MTSL, a adaptação à versão 2017 não
acartou qualquer dificuldade devido à semelhança entre as diferentes versões do software.
Ao trabalhar no Studio, o tradutor tem de ter especial cuidado com as TM, mais
23 (68%)
9 (26%)
1 (3%)1 (3%)
CAT-tools utilizadas
SDL Trados Studio memoQ Wordbee SDL Passolo
Figura 7: CAT-tools utilizadas.
32
concretamente, verificar se estas estão corretamente atribuídas e atualizadas. Da mesma
forma, deve ter consciência de que, ao confirmar um segmento, está não só a inserir uma
tradução no target daquele projeto, mas também a partilhar uma TM que, mais tarde, será
consultada pelos colegas para referência e uso e, por isso, deve garantir que a entrada que
insere na TM é fruto de um trabalho profissional e consciente. Afinal de contas, uma TM
é o resultado de anos de trabalho e de constante atualização e melhoria, pelo que deve ser
utilizada com cuidado. Por conseguinte, uma TM constitui, para qualquer profissional de
tradução, a já referida forma de “leverage” (Rico Pérez, 2002), ou seja, uma espécie de
vantagem porque, segundo a autora (ibid.),
every translation assignment (…) is nevertheless associated, to a lesser or greater
extent, to other translation projects we handled in the past or that we might do in the
future, either because we are working for the same client on different updates of the
same product or because we are specializing in a particular field.
Isto corrobora a visão de Essenlink, que defende que as TM “are specifically designed to
recycle previously created translations as much as possible” (Esselink, 2000: 363). De
facto, muitas traduções realizadas ao longo do estágio prendiam-se com documentos com
secções reescritas ou novas cuja tradução era necessária, situações nas quais uma TM
fiável e recheada se revela essencial para efetuar uma tradução coerente e de qualidade
num espaço de tempo relativamente menor, devido a todos os apoios disponíveis.
A figura 89 exibe uma captura de ecrã dos resultados da TM do projeto 2018_0438,
que consistiu na tradução de 2600 palavras de um manual de instruções com 149 páginas
já anteriormente traduzidas na Kvalitext.
9 Na caixa cinzenta encontra-se o segmento presente no source, na rosa o segmento presente na TM, na
verde a sua tradução e nas caixas amarelas a identificação da TM e do colaborador que inseriu a entrada.
Figura 8: Exibição dos resultados da TM no Studio.
33
Neste tipo de tradução, o Studio é bastante útil porque apresenta os fuzzy matches
de forma muito clara: em primeiro lugar, é exibido o segmento presente no source com
as diferenças destacadas (na figura, a palavra a azul indica que aquele termo é novo), na
linha abaixo à esquerda é exibido o segmento presente na TM com as novas palavras a
azul e as palavras que não se encontram presentes no segmento do source que está a ser
traduzido a vermelho e rasuradas; à direta, é apresentada a tradução desse segmento da
TM. Com tais realces, o tradutor pode mais rapidamente identificar as diferenças entre o
source e a TM e, assim, acelerar o seu processo de tradução. Por fim, a linha inferior
amarela fornece, entre outras, uma informação particularmente relevante: a data da
inserção desse segmento na TM, bastante útil para o tradutor porque, em caso de dúvida
em relação a certos termos, será sempre mais seguro seguir as entradas mais recentes da
TM porque, à partida, serão as mais atuais.
Globalmente, o Studio demonstrou ser uma CAT-tool muito confiável e intuitiva,
cuja utilização é relativamente simples assim que o utilizador esteja familiarizado com as
suas funcionalidades mais relevantes. Para trabalhar com TM e TB, o software revelou-se
também o ideal, com uma organização que permite ao tradutor/revisor economizar tempo
e esforço.
3.2.2. memoQ
O memoQ foi a segunda ferramenta mais utilizada durante o estágio na Kvalitext e,
assim, pude explorar uma funcionalidade do software não trabalhada em contexto
académico: o servidor online. Uma das características definidoras deste software é o facto
de possibilitar o trabalho em projetos online, no servidor do cliente (mediante credenciais
individuais), não sendo necessário definir TM, TB ou parâmetros de QA (como ocorre no
Studio). Tudo isto facilita, sem dúvida, o trabalho do tradutor, mas sujeita-o a uma ligação
à Internet, o que, por um lado, pode tornar o programa algo lento e, por outro, pode causar
problemas na sincronização dos ficheiros ou até mesmo impedir a tradução, caso haja
uma falha na ligação à Internet (como algumas vezes aconteceu).
34
Duas outras particularidades do memoQ prendem-se com a possibilidade de
facilmente inserir as tags no target pela ordem em que aparecem no source através do
atalho “F9” e, para além disso, a possibilidade de localizar, através de “Crtl + F”,
determinada frase/palavra no documento e gerar uma lista com todas as suas ocorrências,
inclusivamente com as palavras do texto contido nas tags que, obviamente, não pode ser
editado, mas cujo conteúdo é importante para a seleção de preposições (como realçado a
preto na figura 9) ou quando é necessário movimentar as tags para assegurar a coerência
da frase (como demonstrado na figura 10).
Figura 10: Tags do memoQ contendo informação textual.
De forma geral, no memoQ realizavam-se projetos online ou projetos offline que
exigiam especial atenção às tags, casos nos quais esta CAT-tool se revelava
particularmente útil. No entanto, no que diz respeito à utilização de TM e TB, o memoQ
apresenta tais recursos de forma menos eficiente quando comparado com o Studio.
Figura 9: Texto entre tags no memoQ.
35
3.2.3. Wordbee
O Wordbee é uma plataforma de tradução online com uma interface algo
semelhante às ferramentas de tradução mais usuais: apresenta o source à esquerda e o
target à direita, sendo os resultados da TM apresentados à direta, à semelhança do
memoQ.
Tratando-se de uma CAT-tool online, os tradutores e/ou revisores (mediante
credenciais individuais) podem trabalhar simultaneamente no mesmo projeto e,
supostamente, ver o progresso do colega em tempo real, sendo o cliente também capaz
de acompanhar o estado do projeto.
Por se tratar de uma CAT-tool com versões gratuitas e, portanto, mais económica
quando comparada com outras como o Studio ou o memoQ, alguns clientes da Kvalitext
têm vindo a aderir a esta ferramenta que, apesar de à primeira vista parecer semelhante
às CAT-tools mais comuns, na verdade ainda apresenta algumas diferenças significativas.
A maior diferença relaciona-se com as teclas de atalho. Ao contrário de muitas
outras CAT-tools, o atalho para confirmar um segmento é “Alt + seta para baixo”, muito
diferente do comum atalho “Crtl + Enter”. Além disso, não existe nenhuma tecla de atalho
para realizar uma pesquisa Concordance (como o “F3” no Studio ou o “Crtl + K” no
Figura 11: Interface do Wordbee.
36
memoQ), sendo, então necessário digitar ou copiar e colar o fragmento a pesquisar, o que
acaba por consumir algum tempo.
Adicionalmente, o Wordbee apresenta várias outras limitações que tornam esta
CAT-tool bastante desvantajosa: em primeiro lugar, as repetições não são propagadas ao
longo do documento, o que numa fase de autorrevisão com uma ferramenta de QA pode
revelar segmentos idênticos no source traduzidos de diferentes formas (o que certamente
poderia ser evitado), devendo o tradutor uniformizar esta situação; em segundo lugar, o
Wordbee apresenta automaticamente, a partir de fragmentos presentes na sua TM,
sugestões de tradução no target que, embora pudessem ser úteis em frases muito curtas,
são mais um entrave ao fluxo de trabalho porque as palavras apresentam maiúsculas e/ou
minúsculas diferentes do source (como ilustrado na figura 12), o que poderá passar
despercebido ao tradutor, levando-o a erros desnecessários. Igualmente desfavorável é o
facto de a funcionalidade “copy source no target” não substituir o texto presente no target
(como ocorre no Studio), mas sim adicionar o texto do source após o texto já presente no
target.
Tal situação foi particularmente problemática porque o projeto 2018_9822
realizado no Wordbee tinha como par de línguas ES→PT_PT, pelo que, devido à
proximidade entre estas duas línguas românicas, a tradução de muitos segmentos requeria
poucas ou mesmo nenhumas alterações em relação ao TP. No entanto, mesmo para estes
segmentos, o Wordbee apresentava uma sugestão de tradução com
maiúsculas/minúsculas muito diferentes das presentes no TP, levando-me a perder ainda
mais tempo nestes segmentos que, à partida, não necessitariam de qualquer edição. Por
último, convém ainda referir que, embora no website do Wordbee seja referido que é
possível acompanhar a tradução dos colegas em tempo real, tal não se verificou na prática,
uma vez que é necessário fechar e voltar a abrir a janela de trabalho para poder ver o
Figura 12: Exemplo de sugestões de tradução do Wordbee.
37
progresso da tradução do colega e inclusive para atualizar a TM, o que pressupõe um
inconveniente ainda maior e pode até mesmo colocar em causa a qualidade da tradução
quando existem vários participantes num mesmo projeto.
De forma geral, considerei o Wordbee limitador, com teclas de atalho pouco
intuitivas, com processos demasiado demorados e repetitivos e pouco “user-friendly”
para uma ferramenta de tradução tão básica. A sua maior desvantagem é o tempo (tão
precioso na tradução) que é necessário despender em processos repetitivos e em ações
que deveriam ser rápidas e simples. Se, segundo Esselink (Esselink, 2000: 359),
“computer aided translation tools are used to support the translator, by eliminating
repetitive work”, o Wordbee realmente falha em algumas das suas funções.
3.2.4. SDL Passolo
O SDL Passolo (Passolo) é uma CAT-tool exclusiva para a localização do material
informático, isto é, conteúdos textuais de softwares, aplicações, websites etc. Todavia,
embora o Passolo seja dedicado à localização, entre os oito projetos de localização
realizados ao longo do estágio, apenas um foi efetuado no Passolo, tendo os restantes sido
efetuados no memoQ (três), no Studio (três) e no Wordbee (um), talvez porque os clientes
não veem vantagens na aquisição de um software próprio para localização e ainda porque
os projetos realizados no memoQ e no Studio apresentavam strings mais longos e
contextualizados, com tags de formatação e sem aceleradores ou teclas de atalho,
tornando talvez as referidas CAT-tools mais adequadas para a localização.
Na UC de Tradução Automática e Pós-Edição tive a oportunidade de abordar a
versão 2011 do Passolo, mas, ainda assim, a adaptação à versão 2016 utilizada na empresa
levou algum tempo, o que, aliado às especificidades do programa e a uma interface pouco
intuitiva, tornou o meu trabalho algo mais lento.
Embora também seja um software da SDL, a interface do Passolo (figura 13) é
bastante diferente da do Studio e mais confusa; por exemplo, a localização do TP pode
ser realizada em dois locais diferente (a verde na figura) e as TM e TB são exibidas no
canto inferior esquerdo do ecrã (a amarelo), disposições que me pareceram pouco
adequadas e que dificultaram um pouco a progressão do trabalho. O tamanho do tipo de
letra também me pareceu igualmente inadequado, exigindo-me um maior esforço,
38
principalmente porque estava habituada a trabalhar com a fonte bastante aumentada quer
no Studio, quer no memoQ; já no Passolo, não existe ou não encontrei forma de
personalizar o tamanho do tipo de letra do source, o que me causou algum desconforto e
dificuldade.
Um dos aspetos positivos do Passolo é o facto de permitir a integração de TM e
TB, o que é bastante importante para garantir a consistência terminológica. Mais
especificamente, muitos clientes que solicitam à Kvalitext a tradução de, por exemplo,
manuais de instruções dos seus equipamentos, solicitam também a localização do
software associado a esse mesmo equipamento. Desta forma, é essencial assegurar uma
consistência terminológica, contribuindo esta funcionalidade do Passolo para tal.
Em suma, as tecnologias e as ferramentas de apoio à tradução têm vindo a adquirir
uma maior proeminência no mercado de tradução, representando um aliado incontornável
no auxílio ao ofício do tradutor. Por outro lado, tal é o desempenho das CAT-tools que as
Figura 13: Interface do SDL Passolo.
39
exigências de qualidade e celeridade colocadas sobre os profissionais da tradução são
progressivamente mais elevadas.
3.3. Controlo de qualidade
Os procedimentos de controlo de qualidade que decorrem na fase de
pós-transferência, isto é, depois da conclusão do processo tradutivo, são essenciais para
a garantia de qualidade do projeto e para a satisfação do cliente. Sendo a Kvalitext uma
empresa certificada pela norma ISO 17100, os processos de controlo de qualidade são
uma etapa fundamental e obrigatória no ciclo de vida de um projeto de tradução, entre os
quais se destacam os procedimentos de:
• Autorrevisão;
• Garantia de Qualidade (QA); e
• Revisão.
A autorrevisão consiste, tal como o seu nome indica, na revisão que o tradutor faz
ao próprio trabalho, após a sua conclusão. De acordo com Mossop, a autorrevisão é
particularmente importante porque, para além de reforçar o controlo de qualidade, ajuda
os tradutores a sentirem-se mais “self-reliant” (Mossop, 2014: 118), isto é, confere-lhes
mais responsabilidade e “obriga” a que estes se esforcem por encontrar soluções para os
desafios tradutivos do seu projeto (e não a delegar essa responsabilidade no revisor), o
que, consequentemente, origina uma maior satisfação e orgulho para com a tradução
realizada (ibid.).
Reconhecendo a relevância desta etapa e estando ciente da minha predisposição
para gralhas e omissões de palavras ou parte delas, procurei seguir um processo metódico
de autorrevisão baseada nas indicações de Mossop (ibid.), que englobava:
1. Leitura monolingue do texto de chegada;
2. Leitura comparativa texto de chegada–texto de partida;
3. Garantia de Qualidade (com o Xbench)
4. Verificação ortográfica (com o FLiP).
40
Quando as circunstâncias assim o permitiam, o processo de autorrevisão era
iniciado após uma pausa ou, preferencialmente, no dia a seguir à conclusão da tradução,
para colocar alguma “distância” entre o TP e a tradução realizada “so that the wording of
the translation seems somewhat unifamiliar” (id.: 119). Assim, uma leitura monolingue
do TCh permitia concentrar-me nas questões linguísticas da língua de chegada:
construção frásica, regências verbais, sintaxe, naturalidade da frase, pontuação etc. Em
seguida, realizava uma leitura comparativa segmento a segmento, lendo, em primeiro
lugar, o TCh e, depois, comparando-o com o TP, para verificar a terminologia, detetar
omissões, adições não intencionais e outros erros de tradução. A direcionalidade da leitura
comparativa era, portanto, texto de chegada–texto de partida; caso contrário, uma leitura
do TP em primeiro lugar iria reavivar o processo de tradução anteriormente realizado e
certos erros poderiam passar despercebidos porque não estaria realmente a ler o que
estava escrito no TCh, mas sim o que eu me lembrava de ter traduzido.
O facto de estar familiarizada com os procedimentos sugeridos por Brian Mossop
em Revising and Editing for Translators (2014) foi, sem dúvida, uma mais-valia neste
processo de autorrevisão que, por vezes, se pode tornar moroso e exaustivo. Em primeiro
lugar, esta é uma atividade que exige uma constante concentração para ultrapassar a
“cegueira” que o tradutor cria em relação à sua tradução (Mossop, 2014: 119), ou seja, é
necessária uma leitura minuciosa e atenta de todo o TCh. Em segundo lugar, a
autorrevisão exige um contínuo autoquestionamento das nossas soluções tradutivas e da
terminologia empregue; contudo, uma questão se levanta: será proveitoso efetuar uma
nova pesquisa para confirmar a tradução de um termo relativamente à qual estamos
inseguros quando, durante a fase da tradução, já consultamos todas as fontes disponíveis?
Considero que sim, já que a visão holística adquirida do TP depois de concluída a
tradução pode ajudar-nos a compreender certos termos e, por conseguinte, efetuar uma
pesquisa mais eficaz.
Por último, é importante assinalar que nem sempre era possível aplicar inteiramente
os métodos acima listados nem efetuar uma autorrevisão aprofundada, uma vez que as
exigências dos prazos de entrega obrigavam a apressar o procedimento. Todavia, quer por
brio profissional, quer por respeito para com o cliente e para com o revisor, a autorrevisão
não deverá ser sacrificada, até porque, tal como Mossop refere, “[s]kipping self-revision
is simply unprofessional” (Mossop, 2014: 182).
41
Concluída a autorrevisão, era então iniciada a revisão, uma etapa essencial para a
garantia da qualidade do projeto. Mais do que uma mera correção linguística, uma revisão
deverá assegurar que uma tradução “is an accurate and acceptable rendition of a source
text for the target readership” (Chakhachiro, 2005: 255), isto porque, por vezes, o tradutor
está tão concentrado nas instruções do cliente ou nos problemas tradutivos que, não
intencionalmente, descura as necessidades do público-alvo; assim, cabe ao revisor
reconciliar os interesses do tradutor, do cliente e/ou do público de chegada (Mossop,
2014: 123).
A revisão apresenta-se, então, como um procedimento valioso para todos os
intervenientes no projeto de tradução. Para um tradutor recém-formado ou para um
estagiário, a revisão reveste-se de uma maior importância, convertendo-se numa
oportunidade de aprendizagem e de feedback em relação ao trabalho produzido. Segundo
Gouadec (Gouadec, 2007: 337),
[t]he future translator needs to acquire the necessary knowledge and competence
in the first stages of training, to be guided during the actual translation process, and to
receive feedback through correction or revision afterwards – revision being a major
opportunity to learn what went wrong, and why, but also to confirm what worked out
well.
Graças à vasta equipa da Kvalitext e ao apoio constante de todos os seus elementos,
verificou-se este acompanhamento crucial para a formação do estagiário/tradutor, bem
como a partilha de conhecimentos. Pode então dizer-se que o revisor desempenha duas
funções: uma profissional, revendo o texto para o cliente e assegurando a sua qualidade,
e outra “instrucional”, corrigindo os erros do tradutor, mostrando-lhe os seus pontos
fracos e como os evitar.
Na Kvalitext, estes processos de autorrevisão e de revisão, englobados na
pós-transferência, são potencializados por dois programas que serão sucintamente
abordados a seguir: o Xbench e o FLiP.
42
3.3.1. Xbench
O Xbench é uma ferramenta de QA mais avançada do que as funcionalidades de
QA e de Quality Assurance que, respetivamente, se encontram incluídas no Studio e no
memoQ. Desta forma, o QA realizado nestas CAT-tools deve ser completado por um QA
mais aprofundado realizado no Xbench.
Uma das melhores funcionalidades do Xbench é, sem dúvida, a possibilidade de
inclusão de uma “Project checklist”; esta lista, fornecida pelo cliente, consiste num
ficheiro compatível com o programa, indicando, entre outras, preferências terminológicas
e de sinais de pontuação (por ex., preferência pelas aspas em linha/latinas em detrimento
das aspas elevadas/inglesas), que, quando integrado no programa, elabora uma lista de
segmentos que não se encontram em conformidade com as instruções do cliente (figura
14). Tal é bastante útil porque, quando um tradutor participa simultaneamente em vários
projetos, é natural que pormenores estilísticos e preferenciais sejam confundidos ou
esquecidos, erros que, com o Xbench, podem ser rapidamente resolvidos.
Todavia, como ocorre em todas as ferramentas de QA, o Xbench apresenta bastantes
erros falsos, que são assinalados, por exemplo, quando os numerais do TP são escritos
por extenso no TCh, ou quando existem palavras escritas em maiúsculas no TP que o
programa erradamente reconhece como siglas ou unidades que não deveriam ser
traduzidas, o que, frequentemente, não é o caso, tal como se pode constatar na figura 15.
Figura 14: Identificação da ausência do símbolo ™ no target.
Figura 15: Exemplos de erros falsos assinalados pelo Xbench.
43
Contudo, apesar dos vários erros falsos apresentados pelas ferramentas de QA,
programas como o Xbench são bastante úteis para a correção de inconsistências
tradutivas, apresentando erros que normalmente passam despercebidos às
funcionalidades de QA incluídas nas CAT-tools. Assim, o tradutor/revisor deverá dedicar
algum tempo a cuidadosamente analisar os erros apresentados pelo Xbench, já que, no
meio de vários erros falsos, decerto existirão erros verdadeiros que, provavelmente, o
tradutor/revisor não conseguirá detetar “à vista desarmada”.
3.3.2. FLiP
Após realizadas as leituras monolingues e bilingues e o QA, o processo de
autorrevisão/revisão é, finalmente, concluído com uma verificação ortográfica potenciada
pelo FLiP, um programa de processamento de texto semelhante ao Microsoft Word, mas
com a particularidade de possuir um corretor ortográfico e sintático bastante fiável que
identifica e apresenta sugestões para erros ortográficos e de pontuação, erros de
concordância, palavras parónimas, erros na flexão dos verbos e no uso de particípios
passados (como demonstrado na figura 16), entre outros.
Este pode parecer um procedimento muito simples e comum, mas é tão importante
como qualquer outro processo inerente à tradução. Afinal de contas, qualquer falante
Figura 16: Identificação da seleção errada do particípio passado do verbo “imprimir” no FLiP.
44
nativo comete erros ao digitar, as frases longas propiciam erros de concordância em
género e/ou em número e os sinais de pontuação podem muito facilmente ser mal
colocados; estes são erros perfeitamente evitáveis, mas não facilmente percetíveis ao
tradutor e até mesmo ao revisor, já que estes estão diretamente envolvidos na produção
do texto. Um leitor final, por sua vez, mais distanciado em relação ao texto, poderá
facilmente detetar tais erros e, tratando-se da sua língua materna, considerá-los
inadmissíveis. Desta forma, um corretor ortográfico como o FLiP ajuda a evitar tais
situações e, como tal, a importância deste procedimento final não deverá ser subestimada.
45
Capítulo 4 – Tradução: análise de casos práticos
Neste capítulo serão apresentadas algumas passagens de vários projetos realizados
ao longo do estágio, mais propriamente aquelas que causaram maiores dificuldades
durante a tradução e que, por conseguinte, mobilizaram mais conhecimentos adquiridos
durante o MTSL ou no decorrer do próprio estágio.
De forma a contextualizar as passagens e a identificá-las, são fornecidas
informações relevantes sobre o projeto em questão; algumas eram facilmente acessíveis
através do PO (como o número de palavras do projeto e a área temática em que este se
insere), enquanto outras informações, tão ou mais relevantes como/do que as anteriores
(como a função do texto, segundo Katharina Reiss, e o tipo de tradução a realizar10,
segundo Christiane Nord, bem como o tipo e género de texto e o seu público-alvo),
tiveram de ser autonomamente deduzidas e refletidas durante a fase de pré-tradução, para
definir estratégias e prioridades para o ato tradutivo.
Finalmente, as passagens a abordar serão apresentadas em tabelas e, caso
necessário, as palavras/frases sobre as quais irá incidir a análise serão colocadas a negrito
e/ou sublinhadas. Sempre que seja pertinente, para além do TP e da tradução, será também
apresentada a versão revista e final.
4.1. Instruções do cliente
Segundo Christiane Nord, “[t]ranslating without clear instruction is like swimming
without water” (Nord, 1997: 78), isto é, as instruções são um componente vital para o
processo tradutivo e, como tal, a sua importância não deverá ser subestimada. Segundo
Gouadec, o tradutor deverá ter acesso, na frase de pré-tradução, ao que o autor denomina
“translation kit” (Gouadec, 2007: 63), que deverá conter o material a traduzir, os
documentos de referência relacionados com o material a traduzir, memórias de tradução
e bases de dados terminológicas, glossários contendo terminologia já aprovada pelo
10 Todos os projetos realizados constituíram uma tradução instrumental, já que a finalidade do TCh foi
sempre idêntica à do TP (Nord, 1997: 50).
46
cliente, guias de estilo, documentos que possam fornecer contexto (ibid.), entre outros
elementos possíveis.
No entanto, este kit nem sempre é suficiente e, de forma a tomar e/ou fomentar
decisões tradutivas, o tradutor necessita de informações extratextuais. Nomeadamente, o
tradutor deverá saber a finalidade do TCh que está a produzir, já que tal constitui um fator
determinante no processo de tradução (Nord, 1997: 27). Baseada na Skopostheorie de
Hans Vermeer e de Katharina Reiss (Grundlegung einer allgemeinen
Translationstheorie, 1984), Nord defende que os clientes necessitam de que a tradução
de um texto atinja uma finalidade em particular, pelo que “[t]he translator thus needs
information about the specific goals each translation is supposed to achieve, and this
requires extra-textual information of some kind, usually from the client” (Pym, 2010: 43).
Para Nord, estas informações extratextuais constituiriam o “translation brief” que,
idealmente, deveria fornecer informações como, por exemplo, o objetivo e a função do
TCh, o público-alvo (bem como os seus conhecimentos e expectativas em relação às
informações presentes no TP), o meio e o momento em que ocorrerá a comunicação etc.
(Nord, 1997: 30). Desta forma, o “translation brief” é particularmente relevante para uma
abordagem prévia e geral ao projeto em questão porque oferece ao tradutor informações
extratextuais valiosas que lhe permitem ter uma visão holística do projeto, decidir as
estratégias de tradução mais adequadas e tomar decisões fundamentadas.
Infelizmente, o estágio permitiu-me constatar que tais instruções são meramente
um cenário teórico e idealizado que, na prática, frequentemente não se concretizam com
a profundidade necessária. Após alguma reflexão e análise de todos os projetos realizados
ao longo do estágio, agrupei e classifiquei os cenários com os quais me deparei da forma
seguinte:
• Instruções inexistentes: o cliente não fornece quaisquer instruções para o
projeto em questão, nem informações contextuais (documentos de
referência, glossário etc.) nem informações extratextuais (finalidade da
tradução, público-alvo etc.);
• Instruções desadequadas/insuficientes: as “instruções” resumem-se à
explicitação dos pares de línguas e/ou a observações de que o TCh não
deverá conter erros ortográficos e gramaticais, deverá soar natural etc.
47
(aspetos que, no meu ponto de vista, são requisitos básicos de uma tradução
profissional);
• Instruções deduzidas: o cliente não fornece quaisquer instruções para o
projeto em questão, mas o PM e/ou o tradutor deduzem as instruções para o
projeto a partir de instruções gerais de projetos anteriores desse mesmo
cliente que poderão orientar o processo de tradução;
• Instruções suficientes: o cliente fornece material de apoio e providencia
informações relativas à finalidade da tradução e/ou o seu público-alvo.
Desta forma, o desenrolar do estágio permitiu corroborar uma realidade para a qual
os estudantes do MTSL tinham sido alertados durante o decorrer do mesmo: os clientes,
claramente, subestimam a importância das instruções e informações contextuais. Tal
cenário é ilustrado pelo gráfico abaixo, elaborado através da inclusão de cada projeto
trabalhado nas categorias anteriormente estabelecidas.
Como é possível constatar, considero que em mais de metade dos projetos (59%)
7 (20%)
7 (21%)
6 (18%)
14 (41%)
Tipos de instruções fornecidas
Inexistentes Desadequadas/insuficientes Deduzidas Suficientes
Figura 17: Tipos de instruções fornecidas pelos clientes.
48
não possuía instruções diretas suficientes para realizar a tradução da forma mais refletida
possível. Em alguns projetos, inclusivamente, em que as instruções foram consideradas
suficientes, estas apenas chegaram após o tradutor/PM tomar a iniciativa de inquirir o
cliente sobre determinados aspetos do projeto em questão11. Esta elevada percentagem de
instruções inexistentes, desadequadas/insuficientes ou deduzidas pode ser explicada
porque “[m]ost clients know next to nothing about what translation involves, (…) why
translators need documentation, and so on” (Mossop 2014: 23), pelo que a elaboração de
um “translation brief” por parte dos clientes “is quite a hit and miss affair” (Byrne, 2012:
13). Contudo, as instruções e colaboração do cliente são aspetos cruciais na tradução, cuja
inexistência dificulta o trabalho do tradutor, tal como evidenciado pelo exemplo seguinte.
Identificação do projeto: 2018_0702;
− Par de línguas: EN→PT_PT;
− N.º de palavras: 5424;
− Tempo despendido 18,25 horas;
− Área temática: Informática;
− Contexto: strings de um software médico de ensaios clínicos;
− Público-alvo: profissionais de saúde;
− Ferramentas utilizadas: SDL Passolo 2016.
Este projeto consistiu numa localização de um software o que, de forma geral,
envolve a localização “of all graphical user interface (GUI) components of a software
application, such as dialog boxes, menus, and error or status messages” (Esselink, 2000:
57).
Embora, aquando da receção deste projeto, já tivesse sido efetuado um outro de
localização (em memoQ), este revelou-se particularmente desafiante porque foi o
primeiro realizado em Passolo; a terminologia médica, para além de coexistir com a
linguagem informática, era abundante e, finalmente, porque não foram fornecidas
quaisquer instruções para o projeto. No entanto, o cliente em questão recorre
frequentemente aos serviços da Kvalitext, pelo que foi possível orientar o processo de
11 Também teria sido interessante quantificar tais casos, mas devido ao elevado número de projetos
trabalhados no decorrer do estágio não seria possível assinalá-los inequivocamente.
49
tradução a partir de instruções relativas a projetos anteriores. Para além disso, o primeiro
projeto de tradução realizado durante o estágio (projeto 2018_0193) pertencia ao mesmo
cliente, pelo que já estava algo familiarizada com a área e com a terminologia.
Devido à formação adquirida na UC de Tradução Automática e Pós-Edição, iniciei
este projeto consciente de que “the string section is the most complicated and time
consuming task in the translation process (…) mainly because the strings do not contain
contextual information” (id.: 59). Assim, devido a esta falta de contexto, deparei-me com
várias encruzilhadas resultantes da polissemia das palavras ou da incerteza em relação à
sua classe gramatical (tabela 5). Tal influenciou negativamente a localização, pois exigia
uma contante ponderação, atrasando o fluxo de trabalho e causando alguma frustração.
Tabela 5: Incertezas causadas por strings descontextualizados.
String Possíveis traduções Explicitação da incerteza
Orders Pedidos ou
Encomendas ou
Solicitações
“Order” é uma palavra demasiado abrangente
em inglês cujas traduções possíveis
apresentam significado distintos
TEST TESTE ou TESTAR “TEST” poderá ser um substantivo ou um
verbo
Set value Definir valor ou Valor
definido
“Set” poderá ser um verbo ou um adjetivo
participial
Clone Clone ou Clonar “Clone” poderá ser um substantivo ou um
verbo
Pick list Escolher lista ou Lista
de seleção
“Pick” poderá ser um verbo ou um
substantivo; “lista de seleção” é uma
tradução sugerida pelo Microsoft Language
Portal
Sleep Suspensão ou
Suspender
“Sleep” poderá ser um substantivo ou um
verbo; ambas as alternativas constam no
Microsoft Language Portal.
Test function Testar função ou
Função de teste
“Test” poderá ser um verbo ou um
substantivo; “testar a função” é uma tradução
sugerida pelo Microsoft Language Portal
A presença de imagens da interface do software em questão seria certamente uma
50
mais-valia, pelo que a PM do projeto pediu que o cliente nos enviasse screenshots do
mesmo. Todavia, o cliente não se mostrou disposto a tal, referindo que seria preferível
que o tradutor compilasse todas as incertezas numa query sheet, onde teria de introduzir
o número do string, o texto presente nesse string e a dúvida; obviamente que tal não seria
exequível, uma vez que iria desperdiçar demasiado tempo a preencher a query sheet, a
aguardar pela resposta do cliente e, mediante esta, poderia ainda ter de implementar
alterações na localização; uma vez que dispunha apenas de três dias para efetuar a
localização, todo o tempo era precioso. Desta forma, a equipa decidiu que o
preenchimento da query sheet ficaria reservado para casos que, após esgotados todos os
recursos, ainda levantassem incerteza suficiente em relação ao string. Assim, os strings
foram localizados da forma seguinte:
Para além destes casos, houve um outro que me levantou obstáculos constantes,
sendo ele o termo “run”. Na TB de projetos anteriores que incorporei no Passolo, este
termo encontrava-se traduzido como “ensaio/processamento”, não sendo claro se deveria
empregar os dois termos na minha tradução ou se deveria optar por um consoante o
contexto, uma decisão que, devido ao meu desconhecimento em relação à área, me
parecia impossível de tomar. Quando o revisor do projeto confrontou o cliente com esta
dualidade e lhe solicitou um aconselhamento em relação à escolha de um termo mais
apropriado, a resposta obtida foi: “A run is a ‘stainin run’ when slides are placed in the
instrument and the user instructs the instrument to proceed with staining the slides
according to the predetermined protocol”. Resumindo, a query colocada foi vã porque
para além de não esclarecer a minha dúvida, o cliente forneceu-me informações a partir
String Localização
Orders Pedidos
TEST TESTAR
Set value Definir valor
Clone Clone (confirmado pelo cliente)
Pick list Selecionar lista
Sleep Suspensão
Test function Função de teste (confirmado pelo cliente)
51
das quais nada podia deduzir, já que não tinha conhecimentos científicos para tal. Perante
este impasse, o revisor decidiu que o termo “ensaio” deveria ser o único utilizado ao longo
de toda a localização pois, pela sua experiência em relação à área e aos projetos anteriores
realizados para o cliente, este parecia-lhe o mais adequado, dado o contexto do projeto.
Uma dificuldade adicional ligada a este termo relacionou-se com o facto de o termo
“run” também fazer parte da terminologia utilizada por softwares, pelo que era importante
fazer uma distinção entre o “run” utilizado enquanto termo do produto/cliente em questão
e o “run” utilizado enquanto termo da área da informática. Contudo, esta nem sempre foi
uma diferenciação fácil porque o contexto do termo “run” por vezes era tão ambíguo que
impossibilitava tal distinção. Um exemplo ilustrativo é o string “Run Start” que, segundo
a base de dados terminológica do Microsoft Language Portal, poderá ser traduzido como
“Início da execução” ou, atendendo à terminologia presente na TB do cliente, “Início do
ensaio”.
Nesta situação em concreto, traduzi o string como “Início da execução”, de acordo
com a terminologia da Microsoft, porque os strings anteriores e seguintes pareciam
relacionar-se mais com processos do software do que com procedimentos laboratoriais.
Por outro lado, caso estivesse errada e “run” se referisse ao início de um ensaio (o que
não me pareceu tão provável), a localização “Início da execução” poderia também
enquadrar-se neste contexto, referindo-se, por elipse, ao início da execução do ensaio.
Assim, considerei que o string referido integrava a terminologia informática e não a do
cliente e que, como salvaguarda, efetuara também uma localização flexível que tinha uma
boa probabilidade de estar correta em ambos os casos.
Neste projeto, a inexistência de instruções, a falta de cooperação do cliente e a
desadequação das suas respostas tiveram, sem dúvida, um impacto negativo no projeto e
no meu desempenho. A insuficiência dos recursos disponibilizados pelo cliente levou a
um constante autoquestionamento das minhas decisões tradutivas e, ao longo da
localização, senti que cada novo string, em vez de me fornecer mais contexto e de
corroborar as minhas traduções anteriores, apenas me gerava mais inseguranças e
incertezas. Em suma, este não é o contexto mais indicado para desenvolver um bom
trabalho de tradução/localização.
Como os tradutores bem o sabem, uma boa sintonia entre todos os intervenientes
52
no ciclo de vida de um projeto permite uma maior eficiência, qualidade e satisfação geral;
contudo, os clientes têm de entender que também eles são participantes no projeto e, como
tal, devem assegurar o seu desenrolar e conhecer a sua função dentro do mesmo. Os PM,
pela sua maior proximidade com os clientes, são os que melhor podem sensibilizá-los e
contribuir para a alteração da sua atitude em relação à tradução; segundo Lucas Weschke,
“"[t]he primary objective of educating the client is mutual business benefit” (Owens,
1996: 149), ou seja, tanto os tradutores como os seus clientes têm de mutuamente entender
a sua função, exigências e expectativas. Talvez assim, “[o]nce clients understand the
impact of their input (…), they will be most likely to be more forthcoming in providing
(…) the information needed” (Clark, 2010: 10). Desta forma, talvez possamos
gradualmente alterar a mentalidade descrita por Robinson (Robinson, 2003: 16) quando
este refere que:
[u]ser-oriented thought about translation is product-driven: one begins with the
desired end result, in this case meeting a very short deadline, and then orders it done.
How it is done, at what human cost, is a secondary issue.
4.2. Qualidade do texto de partida
O caso prático a seguir apresentado representa mais um projeto para o qual não
foram fornecidas quaisquer instruções, pelo que tive de analisar o texto a traduzir de
forma mais minuciosa para, assim, tentar deduzir o seu conteúdo, a sua finalidade, o
público-alvo etc.
Identificação do projeto: 2018_0226;
− Par de línguas: EN→PT_PT;
− N.º de palavras: 4500;
− Tempo despendido 16,5 horas;
− Área temática: didática;
− Tipo de discurso: científico-pedagógico;
− Género de texto: ação de formação;
− Sequência textual predominante: explicativa-descritiva;
− Função do texto: informativa;
− Contexto: conjunto de ficheiros para uma formação, ente os quais uma apresentação
53
PowerPoint sobre a importância da comunicação interpessoal;
− Público-alvo: participantes na formação (colaboradores da empresa);
− Ferramentas utilizadas: SDL Trados Studio 2017.
Uma vez que o texto a traduzir se inseria numa área didática, isto é, destinava-se à
instrução, creio que teria sido útil que o cliente tivesse delineado uma fio condutor geral;
por exemplo, seria importante saber se me deveria manter próxima da informação
presente no TP ou se deveria privilegiar a língua de chegada e construir frases algo
diferentes das originais, mas que fossem mais facilmente percetíveis pelo público de
chegada. No entanto, o cliente nada indicou, fornecendo apenas os documentos a traduzir.
Quando o TP é a única referência para o tradutor levar a cabo o projeto de tradução,
é frustrante ser constantemente confrontado com ambiguidades, gralhas e erros
gramaticais no TP; quando o cliente não responde às questões colocadas, sendo, portanto,
impossível obter clarificações, a tarefa torna-se ainda mais árdua. Este foi o contexto do
projeto 2018_0226, do qual foram extraídos os exemplos presentes na tabela seguinte.
Texto de partida
No facts, only emotional
Would like to touch a sensitive point, to cause a specific behavior or (more often) to suppress
a behavior
Often used, when one no good arguments
If you strike the right note you able to impress the other one, that he / she will not continue
with the verbal attack.
Note: answer never whith same strength leads to verbal power struggle!
For People, good at keeping themselves under control
needs, feelings, thoughts of people we have to find most indirectly
Estes segmentos foram retirados de uma apresentação de PowerPoint contendo
dicas de comunicação para os formadores de uma determinada empresa, apresentando,
desta forma, ideias condensadas em pontos-chave ou frases curtas. Segundo Byrne,
“[w]hile this is good for the audience and the presenter, it is potentially bad news for the
translator because there may be a lot of potentially ambiguous sentences in a presentation”
(Byrne, 2012: 66). Neste caso em particular, mais do que ambiguidade, temos frases com
54
erros ortográficos e sem relação lógica aparente (os primeiros três exemplos da tabela são
pontos consecutivos de um mesmo diapositivo PowerPoint), o que não me parece
aceitável ou exequível para uma apresentação instrucional.
Desta forma, a fraca qualidade do TP e a presença de alguns segmentos em alemão
levaram-me a concluir que os documentos que me foram fornecidos eram o resultado de
uma má tradução para o inglês ou o produto de um motor de tradução automática. Logo,
considero injusto que qualquer cliente exija que o tradutor produza um TCh com
qualidade quando esta não está presente no TP e quando muito do seu tempo será
dedicado a interpretá-lo. Como proceder, então?
Em relação a isto, Robinson apresenta uma posição radical, referindo que
[t]he (…) translator (…), sick of rewriting [source language] SL texts from
scratch, building good arguments out of garbage, doing for the writer what the writer
should have done for himself or herself, and then getting no credit for it (…) may decide
to [render] the text in all its ghastliness. He or she will disambiguate no ambiguous
phrasings, silently correct no noun-verb incongruencies, register shifts or factual errors,
prune no repetitiveness, mend no style-context conflicts, rearrange no flaccid
sequencing. (apud Mossop, 2015)
Devo admitir que, ao longo deste projeto, várias vezes me senti tentada a seguir as
palavras de Robinson ao invés de procurar uma relação lógica entre as ideias e de produzir
um TCh minimamente coerente. Contudo, esta não é a mentalidade perpetuada na
Kvalitext, onde foi ensinado aos estagiários que um TP mau não justifica um TCh
igualmente mau, pelo que o tradutor não se deverá sentir “compelled to perpetuate the
more sinful omissions or commissions of his [sic] author” (Sykes, 1971: 6 apud Byrne,
2006: 18). Segundo este ponto de vista, e para valorizar a profissão do tradutor, este
deverá fazer tudo ao seu alcance para realizar o seu trabalho com o máximo de qualidade
possível.
Uma vez conformada com a situação, o mais importante seria concentrar os meus
esforços numa abordagem que, por um lado, levasse a um TCh minimamente lógico e,
por outro, não modificasse demasiado a mensagem do TP (apesar de esta ser difícil de
descodificar). Assim, devido à descontextualização entre os segmentos e, por vezes, à
55
impossibilidade de entender a ideia por detrás da frase, optei por uma estratégia de
tradução mais defensiva, isto é, uma tradução direta do TP, segundo a noção de Vinay e
Darbelnet (1958/1995), “which require[s] less intervention by the translator and less
deviation from the ST” (Byrne, 2012: 118). Desta forma, evitei, sempre que possível,
adições, omissões ou qualquer tipo de paráfrase ou reformulação que pudessem acarretar
uma má interpretação do TP, introduzindo erros no TCh. Efetuei, portanto, uma tradução
literal, “only deviating from this where necessary in order to produce a TT which is
grammatically correct and intelligible” (id.: 119), que é a situação ilustrada pela tabela
anterior, em que as frases do TP tiveram de ser corrigidas e a sua gramaticalidade
restaurada no TCh.
Texto de partida Tradução
No facts, only emotional Nada de factos, apenas emoções
Este segmento, para além de não apresentar qualquer relação lógica com os
anteriores ou seguintes, causou-me alguma estranheza, pois há uma quebra na coesão
interna da frase, isto é, não há paralelismo sintático entre os elementos enumerados. O
advérbio “No” é seguido pelo substantivo “facts”; logo, quando depois da vírgula é
introduzido outro advérbio, esperaria encontrar outro substantivo e não o adjetivo
“emotional”. Reconhecendo esta quebra de coesão, tentei restaurar o paralelismo sintático
no TCh, empregando uma estrutura do tipo “advérbio + substantivo, advérbio +
substantivo”, o que explica a recategorização do adjetivo “emotional” que, no TCh, é
transformado no substantivo “emoções”. Esta transformação quase intuitiva é
denominada, como referido, “recategorization” ou ainda “transposition” (Byrne, 2012:
121) e consiste na alteração da classe gramatical de uma palavra, sem que isto altere o
seu significado (ibid.).
Texto de partida Tradução
Would like to touch a sensitive point, to
cause a specific behavior or (more often) to
suppress a behavior
Tocar em pontos sensíveis para originar um
comportamento específico ou (mais
frequentemente) suprimi-lo
56
Often used, when one no good arguments Empregue quando não existem bons
argumentos
O primeiro segmento é agramatical porque não contém sujeito, algo que não deve
acontecer na língua inglesa, em que o sujeito tem de estar sempre expresso. A língua
portuguesa, por outro lado, tratando-se de uma língua de sujeito nulo, permite, muito
convenientemente, traduzir a frase agramatical como uma frase infinitiva sem qualquer
sujeito expresso12. Igualmente agramatical é o segmento seguinte, que também não
apresenta um elemento essencial da frase, o verbo, que se encontra ausente da frase
subordinada temporal. Presumindo que o elemento em falta se tratasse do verbo to have,
a gramaticalidade foi restaurada no TCh através da introdução do verbo “existir”.
Texto de partida Tradução
If you strike the right note you able to
impress the other one, that he / she will not
continue with the verbal attack.
Se agir corretamente poderá impressionar os
demais, que não irão continuar com os
ataques verbais.
Note: answer never whith same strength
leads to verbal power struggle!
Nota: nunca responda com a mesma
intensidade, conduz a uma luta verbal pelo
poder!
No primeiro segmento, encontramos um problema de lógica, tendo sido
erradamente utilizado o pronome “that” para ligar as frases, ao invés de uma conjunção
como, por exemplo, “that way”. Da mesma forma, existe também um problema na ligação
dos elementos frásicos da frase seguinte que, mais especificamente, não apresenta
qualquer conjunção e, adicionalmente, apresenta um erro ortográfico e uma alteração da
ordem das palavras. Na tradução, foi reposta a ordem natural do advérbio temporal e do
verbo e, apenas adicionando uma vírgula, conferiu-se à frase uma relação de
causa-efeito13.
12 Nesta tradução pudemos verificar posteriormente que teria sido mais correto a tradução “Tocar em pontos
sensíveis para originar um comportamento específico ou (mais frequentemente) para o suprimir”, optando
pela explicitação do conetor subordinativo final na segunda frase subordinada. 13 Posteriormente, pudemos verificar que a tradução do segundo segmento deveria ter sido: “Nota: nunca
responda com a mesma intensidade, isto conduz a uma luta verbal pelo poder!”, já que a explicitação do
sujeito da segunda frase é necessária para restaurar a total gramaticalidade deste excerto.
57
Texto de partida Tradução
For People, good at keeping themselves
under control
Para pessoas que conseguem manter-se sob
controlo
Este exemplo apresenta também erro ortográfico, colocando “people” em letra
maiúscula e, mais grave ainda, emprega uma vírgula entre o sujeito e o predicado, erros
que foram imediatamente detetados e corrigidos no TP.
Texto de partida Tradução
needs, feelings, thoughts of people we have
to find most indirectly
Temos de descobrir sobretudo indiretamente
as necessidades, os sentimentos e os
pensamentos das pessoas
Por último, neste segmento, escolhi repor a ordem natural dos elementos da frase
de forma a facilitar a sua leitura, ou seja, iniciei-a com um sujeito subentendido pelo
verbo, seguido dos seus completos diretos. A frase do TCh é, sem dúvida, de maior
extensão do que a do TP, mas é também mais clara, e, por conseguinte, de leitura mais
fácil, levando-me a crer que o espectador desta apresentação Power Point não
“desperdiçará” muito tempo na sua leitura. Assim, embora tentasse manter a concisão das
frases característica deste tipo de texto, tal nem sempre foi possível. Por um lado, as frases
do TP são, sem dúvida, mais curtas, mas apenas porque há muitas palavras em falta; por
outro, não creio que a clareza de uma frase deva ser “sacrificada” para esta ser mais curta.
Além disso, convém ainda referir que, na rápida análise efetuada aos documentos
do projeto durante a fase de pré-transferência, tornou-se evidente que estes apresentavam
uma qualidade fraca que, sem dúvida, influenciaria a fase da tradução. Assim, o cliente
foi alertado para este facto e, com o desenrolar da tradução, a PM do projeto foi-lhe
enviando excertos das passagens mais problemáticas do texto; no entanto, nunca houve
resposta.
Deste modo, sem qualquer apoio do cliente, coube aos tradutores envolvidos neste
projeto, auxiliados pela experiência dos revisores, interpretar e traduzir o TP da melhor
forma possível, para obter um texto minimamente lógico, coerente e gramaticalmente
58
correto em português. Isto pressupôs, claro está, um maior esforço por parte da equipa,
um maior dispêndio de tempo na decifração do TP (que poderia ser dedicado à tradução
propriamente dita) e, de forma geral, uma ligeira frustração e sentimento de injustiça
derivados das razões anteriormente expostas.
4.3. Influência do texto de partida
Algo de que me apercebi, principalmente através do feedback dos revisores dos
meus projetos, foi que, por vezes, as minhas traduções se aproximavam demasiado do TP.
Inconscientemente, devido à minha proximidade em relação ao TP e às releituras
constantes dos seus segmentos antes de realizar a sua tradução, por vezes produzi frases
pouco adequadas à língua portuguesa, que afetavam a clareza do TCh, como poderemos
constatar no caso prático a seguir apresentado.
Identificação do projeto: 2018_0482;
− Par de línguas: EN→PT_PT;
− N.º de palavras: 3680;
− Tempo despendido 14,25 horas;
− Área temática: automóvel;
− Tipo de discurso: técnico;
− Género de texto: manual de instruções;
− Sequência textual predominante: instrucional-diretiva;
− Função do texto: informativa;
− Contexto: manual de instruções relativo à montagem, manutenção e cuidados de segurança
de uma bicicleta;
− Público-alvo: pais das crianças que irão andar de bicicleta;
− Ferramentas utilizadas: memoQ15.
Texto de partida Tradução Revisão
Turn the setting screw
clockwise to reduce the
distance between the brake
lever and handlebar grip.
Vire o parafuso de ajuste no
sentido dos ponteiros do
relógio para reduzir a
distância entre a alavanca do
travão e a manete do guiador.
Rode o parafuso de ajuste
no sentido dos ponteiros do
relógio para reduzir a
distância entre a alavanca do
travão e a manete do guiador.
59
The grip width is set
correctly if the child’s hand
can securely grip the brake
lever with at least two fingers
and can pull on the brake
using normal force.
A largura da manete está
corretamente definida se a
criança conseguir agarrar
com segurança a alavanca do
travão com pelo menos dois
dedos e se conseguir puxar o
travão usando uma força
normal.
A largura da manete está
corretamente definida se a
criança conseguir agarrar
com segurança a alavanca do
travão com pelo menos dois
dedos e se conseguir acionar
o travão recorrendo a força
normal
Como podemos constatar na tabela, a interferência causada pelo TP durante o ato
tradutivo levou a traduções demasiado literais que quebram a fluência do TCh. Segundo
Franco Aixelá, por interferência entende-se “the importation into the target text of lexical,
syntactic, cultural or structural items typical of a different semiotic system and unusual
or non-existent in the target context” (Franco Aixelá, 2009: 75). Analisando o exemplo
fornecido, reconheço que existiu, segundo a terminologia do autor, uma interferência
lexical (ibid.) que levou à tradução literal de “turn” e “pull”. Quando encarados sem
qualquer contexto, os equivalentes mais diretos destes dois verbos serão, respetivamente,
“virar” e “puxar”, que foi a tradução pela qual optei. No entanto, a revisão colocou em
evidência uma forte influência do TP que originou uma tradução com uma seleção lexical
inapropriada.
Na língua portuguesa, os pares de palavras “rodar” e “parafuso”; e “acionar” e
“travão” têm uma tendência natural para coocorrerem juntas, tratando-se, portanto, de
colocações. Uma colocação é um tipo específico de coesão lexical “achieved through the
association of lexical items that regularly co-occur” (Halliday & Hasan, 1976: 284) ou,
ainda, segundo uma definição posterior e complementar de Haensch et al. (1982),
“aquella propiedad de las lenguas por las que los hablantes tienden a producir ciertas
combinaciones de palabras de entre una gran cantidad de combinaciones teóricamente
posibles” (apud Corpas Pastor, 2001: 96). Logo, em teoria, poderia ser possível dizer, por
exemplo, “virar o parafuso”, mas como já existe uma outra combinação lexical fixada
pela norma e pelo uso e, desta forma, familiar e idiomática para os falantes, a combinação
de palavras fixa-se em “rodar o parafuso”. Neste caso, uma tradução demasiado literal
levou à transposição de combinações lexicais pouco usuais na língua de chegada, criando
um “alien feel” (Robinson, 2003: 10) no público-alvo que põe em causa a idiomaticidade
do TCh. Tal sensação ocorre porque os falantes têm conhecimentos sobre as palavras do
60
seu idioma e sobre o significado das mesmas; mais especificamente, sabem “in what
environments they can appear and how they function in the language’s phrases and
sentences” (Fillmore et al., 1998: 502). Quando um TCh entra em conflito com esse
conhecimento relativo à coocorrência habitual de certas palavras, perde-se a fluência e a
clareza do mesmo, tornando-se evidente que o texto é uma tradução e não um documento
original escrito no idioma do leitor.
Esta influência pode ser explicada pela proximidade demasiada em relação ao TP
e, por vezes, pela perda da visão holística do texto, uma vez que as CAT-tools segmentam
o mesmo em frases, que são encaradas individualmente pelo tradutor. Estes fatores,
aliados à acumulação de várias horas de trabalho e à eminência do prazo de entrega,
podem levar a traduções irrefletidas e quase maquinais, que ignoram o contexto geral da
frase e as especificidades da língua de chegada (o que explica a seleção lexical
inapropriada presente no exemplo apresentado). Neste cenário, a revisão torna-se ainda
mais relevante, uma vez que o revisor se encontra mais “distanciado” do TP e lê a
tradução quase como se de um utilizador final se tratasse (Mossop, 2014: 167), sendo
assim capaz de assegurar um TCh fluído que corresponda às expectativas do público de
chegada.
Finalmente, é ainda interessante observar que o revisor aprovou a tradução dos
termos (“parafuso de ajuste”, “alavanca do travão”, “manete do guiador” e “manete”, por
ex.), o que talvez evidencie uma focalização preferencial na terminologia, o que,
inconscientemente, poderá levar à negligência de outros aspetos linguísticos da língua de
chegada, mais relacionados com a idiomaticidade das expressões. A terminologia é, sem
dúvida, essencial no discurso técnico e, além disso, assegura uma comunicação precisa;
no entanto, a terminologia representa apenas 5 a 10% do conteúdo de um texto técnico
(Byrne, 2006: 3), pelo que não deverá absorver toda a atenção e a grande parte do tempo
do tradutor, para que a clareza e a fluência do TCh não sejam sacrificadas. Afinal de
contas, uma tradução com equivalentes terminológicos adequados, mas que não cumpra
as convenções linguísticas da língua de chegada dificulta a compreensão do leitor e
poderá colocar em causa a credibilidade da informação transmitida.
61
4.4. Adequação ao género textual
Como anteriormente referido, a análise textual é bastante importante numa fase de
pré-transferência, uma vez que permite ao tradutor munir-se de uma “theoretical
guideline” (Wright & Wright, 1993: 179), que torna a fase de transferência mais concreta
e objetiva, aumentando também a velocidade de tradução e a precisão do TCh (id.: 180).
Tal análise é efetuada através de “an internalized model of textual interpretation” (id.:
175) que os tradutores vão adquirindo e aperfeiçoando através da experiência. Assim,
para o projeto seguinte, a análise do TP, segundo as tipologias textuais propostas por
Katharina Reiss, foi particularmente relevante.
Identificação do projeto: 2018_0633;
− Par de línguas: EN→PT_PT;
− N.º de palavras: 1050;
− Tempo despendido: 3,75 horas;
− Área temática: marketing;
− Tipo de discurso: publicitário;
− Género de texto: anúncio publicitário;
− Sequência textual predominante: descritiva, dialogal-conversacional;
− Função do texto: operativa;
− Contexto: anúncios publicitários de trampolins e karts;
− Público-alvo: crianças dos 3 aos 12 anos, atendendo às idades para as quais os brinquedos são
aconselhados;
− Ferramentas utilizadas: SDL Trados Studio 2017.
Analisando a intenção comunicativa na fase de pré-transferência, tornou-se claro
que o documento a traduzir era um tipo de texto operativo, ou seja, um anúncio
publicitário que apresentava um “persuasively organized content in order to encourage
the recipient to act in accordance with the intentions of the text sender” (Reiss & Vermeer:
2013: 182). Neste tipo de texto, está patente a função apelativa da linguagem (como
exemplificado na tabela 6), ou seja, o público-alvo deve ser conduzido a um certo
comportamento ou ação (Munday, 2001: 73) que, neste caso, será a compra do produto
publicitado.
62
Tabela 6: Frases típicas do discurso publicitário.
Textos de partida (excertos)
Take a look at our XXXXXX trampolines!
Order directly online! Find a dealer online!
Are you a real racing driver? Then go for the XXXXX.
What’s nicer than go-karting in the woods, across fields or in the dunes?
Wouldn’t you like to have a go-kart that is different and cool?
Do you want carefree riding fun with pedal support? If so, we have the innovative XXXXX
for you.
You will certainly steal the show in your neighbourhood with one of these!
Nestas passagens, podem ser detetados elementos caracterizadores deste tipo de
discurso: adjetivos valorativos, repetições exaustivas do nome da marca/produto e
imperativos e atos ilocutórios diretivos que concretizam a intenção do anúncio
publicitário: incitar o público-alvo a comprar o produto publicitado. Já as frases
interrogativas e as exclamativas desempenham funções adicionais, “contribuindo para
implicar directamente o leitor no discurso e gerar um clima de e intimidade” (Pinto, 2008:
239), tornando, desta forma, o texto mais expressivo e apelativo.
No que diz respeito ao discurso publicitário, convém ainda referir a distinção
efetuada por Charaudeau (1983) entre dois tipos de estratégias deste tipo de texto: uma
de persuasão e outra de sedução, que, respetivamente, resultam em dois tipos de contrato
(id.: 127): um contrato “sério”, sustentado por argumentação e direcionado a um público
mais racional, e um contrato “maravilhoso”14 (como é o caso deste anúncio publicitário),
que emprega estratégias de sedução direcionadas a um público menos racional (i.e., as
crianças), não mencionando qualidades técnicas do produto, mas sim promovendo o
desejo de o possuir, associando-o a características positivas (“cool”, “fun”, “innovative”)
e a cenário imaginários e aliciantes (“go-karting in the woods, across fields or in the
dunes”, “You will certainly steal the show”").
Efetuadas estas considerações, tornou-se óbvia a importância de construir um TCh
igualmente apelativo, que provocasse desejo e ação e, desta forma, tivesse um efeito
14 Usamos aqui as palavras do próprio Charaudeu.
63
equivalente no público de chegada português, dando primazia à sua cultura e idioma.
Estas considerações, combinadas com a instrução por parte do cliente de que a tradução
deveria ser informal, foram um “fio condutor” importante para a fase de transferência,
fundamentando as minhas decisões tradutivas e incutindo em mim uma maior segurança
e objetividade durante a tradução. Finalmente, as frases da tabela 6 foram traduzidas da
forma seguinte:
Tradução
Espreita os nossos trampolins XXXXX!
Encomendar diretamente online! Encontrar um fornecedor online!
És um verdadeiro piloto de corridas? Então escolhe o XXXXX.
Há alguma coisa melhor do que andar de kart pelos bosques, campos e dunas?
Gostavas de ter um kart a pedais fixe e diferente?
Queres conduzir sem preocupações e com o apoio dos pedais?
Sim? Então o inovador XXXXX é ideal para ti.
Vais certamente destacar-te na tua vizinhança com um destes!
4.5. Terminologia
A comunicação especializada desenrola-se em contextos mais restritos do que a
comunicação geral. Segundo Cabré (Cabré, 1999: 46), esta ocorre em contextos
profissionais, tendo como intervenientes especialistas na área em questão que, como tal,
possuem um conhecimento elevado sobre os temas, conceitos e termos dessa mesma área.
A linguagem utilizada por esses especialistas nesses contextos particulares constitui a
linguagem especializada, caracterizada pela sua especificidade e objetividade (id.: 59).
Desta forma, um dos desafios da tradução de textos especializados será não só
expressar o conteúdo do TP na língua de chegada, mas também fazê-lo através de uma
linguagem especializada que reflita corretamente o conhecimento concetual que o
público-alvo detém dessa área (id.: 47), sendo, portanto, essencial assegurar uma
equivalência terminológica exata entre as duas línguas.
Neste contexto, os prestadores de serviços de tradução surgem como facilitadores
de comunicação, estabelecendo equivalências entre a linguagem especializada de
64
diferentes idiomas, utilizando a terminologia para o efetuar (id.: 12). Logo, o tradutor de
comunicação especializada, embora não dominando a terminologia técnica, tem de estar
minimamente familiarizado com a mesma. Contudo, tal não é facilmente alcançável pelos
profissionais de tradução. A especificidade e o elevado conhecimento dos utilizadores das
línguas especializadas dificultam o trabalho dos tradutores que, não sendo especialistas
na área e não estando completamente familiarizados com a sua terminologia, ficam, desta
forma, dependentes dos conhecimentos de terceiros (especialistas ou semi-especialistas
da área em questão) e de pesquisas constantes (quer na fase de pré-transferência, quer na
de transferência). Resumindo, a dificuldade da tradução de documentos destinados a
especialistas relaciona-se com o facto de que “[t]he translator needs the ability to offer
thorough subject knowledge in addition to language skills” (Owens, 1996: 107).
Felizmente, o estágio realizado, graças ao “leverage” que as TM e as TB oferecem
(cf. ponto 3.2.1.), às bases de dados terminológicas online (por ex., IATE), às informações
extensivas e facilmente acessíveis na Internet e ao conhecimento e familiaridade que os
revisores da Kvalitext detêm em relação a determinadas áreas e/ou clientes, tornou mais
fácil entrar em contacto com a terminologia utilizada nas áreas especializadas.
Obviamente que isto não torna o tradutor num semi-especialista da área, mas certamente
confere-lhe alguns apoios para desenvolver o seu trabalho da melhor forma possível,
adquirindo progressivamente mais conhecimentos sobre as áreas de trabalho.
No entanto, os termos que o tradutor procura traduzir nem sempre se encontram nos
recursos que lhe são disponibilizados, uma situação que frequentemente me ocorreu e que
me fez sentir em desvantagem. Várias vezes me deparei com termos especializados que
não entendia e/ou para os quais não conseguia encontrar uma tradução, o que é bastante
desmoralizante, principalmente porque o público de chegada (os especialistas) decerto
será capaz de identificar facilmente um termo mal traduzido ou um que não se adapte ao
contexto em questão. Adicionalmente, considerava que não tinha experiência tradutiva
suficiente para assumir um risco calculado e simplesmente escolher uma tradução que me
parecesse mais correta. Neste contexto, apresento o seguinte projeto, que ilustrará
questões relacionadas com vazios terminológicos e com polissemia terminológica.
65
Identificação do projeto: 2018_0442;
− Par de línguas: EN→PT_PT;
− N.º de palavras: 7600;
− Tempo despendido: 16 horas;
− Área temática: medicina;
− Tipo de discurso: técnico;
− Género de texto: manual de instruções;
− Sequência textual predominante: instrucional-diretiva;
− Função do texto: informativa;
− Contexto: manual de instruções de um oxímetro para monotorização do sono;
− Público-alvo: profissionais de saúde;
− Ferramentas utilizadas: SDL Trados Studio 2017.
4.5.1. Vazio terminológico
O segmento apresentado na tabela abaixo, acompanhado pela respetiva ilustração
(figura 18) fornecida no manual de instruções do dispositivo, descreve como colocar
corretamente uma cânula de fluxo oral e nasal.
Texto de partida
Fit the oral and nasal airflow cannula so that
the two small open tubes point towards
patient’s nostrils while the third open tube
pointing towards his/her mouth. (…) Slide the
loop adjustment collar up under the chin to
hold the tubing securely in place. Figura 18: Cânula de fluxo oral e nasal.
66
Embora não conhecesse a designação do objeto da figura 18, estava familiarizada
com o mesmo, tal como pude constatar através da visualização da ilustração que, assim,
se revelou bastante útil. Desta forma, através de alguma pesquisa no IATE, não foi muito
difícil chegar à denominação do objeto em português: cânula de fluxo oral e nasal. Não
obstante, as dúvidas surgiram quando as instruções de colocação da cânula se tornaram
mais específicas, fazendo referência a várias partes desse mesmo objeto, nomeadamente
o “loop adjustment collar”. Felizmente, o contexto da frase tornava percetível o que este
elemento da cânula pudesse ser, e uma pesquisa de imagens no Google confirmou o meu
palpite.
Um “loop adjustment collar” era, de facto, um dispositivo deslizante localizado nos
tubos da cânula para fixar a mesma no seu devido lugar. No entanto, apesar de ter uma
clara ideia do objeto referenciado pelo termo, não consegui encontrar uma tradução para
o mesmo, o que me causou alguma frustração. Tentei ainda pesquisar o novo termo
introduzido pela figura 19, “bola”, que talvez se tratasse de uma denominação alternativa,
mas esta nova pesquisa foi tão infrutífera como a anterior. Tendo consultado bases de
dados terminológicas, manuais de instruções em português de dispositivos semelhantes,
procedimento de enfermagem e. inclusivamente, trocado ideias com os meus colegas,
sentia que tinha chegado a um “beco sem saída”, já que parecia que, em português, a
terminologia não estava tão aprofundada ao ponto de oferecer uma denominação para
cada um dos componentes da cânula. Assim, tendo aparentemente esgotado todas as
possibilidades, levantou-se a hipótese de ter de arriscar e oferecer um palpite como
Figura 19: Componentes de uma cânula.
67
tradução. De facto, Robinson (2003) defende que, nestas situações, o tradutor terá de
assumir alguns riscos e, pelo menos numa primeira fase, apresentar um palpite de
tradução minimamente fundamentado, isto porque “[t]he translator who never guessed,
who refused even in a first rough draft to write down anything about which s/he was not
absolutely certain would rarely finish a job” (Robinson, 2003: 130). Desta forma, para
assegurar o fluxo de trabalho e cumprir os prazos de entrega, tornava-se necessário
oferecer alguma sugestão de tradução para o termo.
Tendo em conta a informação contextual e a finalidade do “loop adjustment collar”,
ocorreram-me as possibilidades “aro ajustável”, “dispositivo ajustador” ou ainda
“ajustador”. Contudo, não fui capaz de me comprometer com nenhuma porque, na minha
perceção, poderia haver uma denominação no jargão médico para o “loop adjustment
collar” e, nesse caso, a minha tradução estaria totalmente errada. Assim, levei as minhas
opções e preocupações à LM da empresa que, conhecendo uma enfermeira, entrou em
contacto com a mesma e lhe expôs a nossa situação. Neste contexto, essa enfermeira
desempenhou o papel de especialista e informou-nos de que, tanto quanto sabia, não
existia nenhuma denominação específica para esse componente da cânula. Assim, a
escolha de uma tradução para “loop adjustment collar” parecia recair totalmente nas
minhas mãos.
Desta forma, voltei a encarar as minhas opções de tradução e coloquei-as no
Google, para avaliar que resultados surgiam e se algum poderia ser associado ao contexto
da tradução. Foi numa dessas pesquisas que me deparei com o livro Fundamentos de
Enfermagem de Patricia Ann Potter15, escrito na variante de português do Brasil, no qual
se explicava os passos para colocação de uma cânula.
15 Disponível em
https://books.google.pt/books?id=uToPBAAAQBAJ&pg=PA894&lpg=PA894&dq=c%C3%A2nula+ajus
tador&source=bl&ots=qNKtj-l3Y5&sig=FiIE4NSJAaahj9-yc5CQClRteeA&hl=pt-
PT&sa=X&ved=0ahUKEwiog4DblbTZAhWHtxQKHXhXD9AQ6AEIPDAG#v=onepage&q&f=false
(último acesso a 20/04/18).
68
Ainda que se tratasse de outra variante de português, a opção “ajustador plástico”
pareceu-me bastante válida; decidi, no entanto, prescindir do adjetivo “plástico” porque,
não sabendo por que materiais o “loop adjustment collar” é constituído, “ajustador
plástico” poderia ser demasiado restritivo. Entre todas as opções consideradas, esta última
aparentou, desta forma, ser a mais apropriada para preencher o vazio terminológico
presente na língua de chegada, servindo não só para denominar o elemento da cânula,
mas também para descrever a sua função.
Em suma, uma vez que uma equivalência terminológica exata possibilita a
comunicação especializada entre os falantes dos diferentes idiomas, o tradutor tem a
responsabilidade de explorar e esgotar todos os recursos ao seu dispor para tentar resolver
os seus dilemas tradutivos. Todavia, é igualmente importante que este tenha consciência
de que, no mercado da tradução, nem sempre há tempo para procurar um especialista,
contactá-lo e aguardar a sua resposta; ou, tal sendo possível, este nem sempre será capaz
de lhe fornecer respostas satisfatórias e definitivas, pelo que o tradutor deverá ser capaz
de, com a informação contextual disponível, escolher e comprometer-se com a opção
tradutiva que lhe parece mais aceitável. Nas palavras de Robinson (2003, 168),
the translator's goal can never be the perfect translation, or even the best possible
translation; it can only be the best possible translation at this point in time. (…) you
don't wait around hoping that a better alternative might arrive some time in the next
few days. You deliver your translation on time and feel pleased that it's done.
Figura 20: Captura de ecrã da pré-visualização do livro
Fundamentos de Enfermagem no Google Books.
69
4.5.2. Polissemia terminológica
Reconhecendo o papel crítico que a terminologia desempenha para garantir uma
comunicação especializada eficaz e exata, num cenário ideal, “terms should be
unambiguous and have one meaning and only one designation corresponding to one
form” (Cabré, 1999: 30). Por outras palavras, a terminologia deve encontrar-se livre de
termos sinónimos, homónimos e/ou polissémicos, devendo a relação estabelecida entre
um conceito e o seu termo ser clara e exclusiva. Todavia, na prática, é bastante comum
depararmo-nos com termos polissémicos que fazem referência a objetos diferentes e,
como tal, denominam conceitos diferentes. Assim, a polissemia de certos termos torna-os
ambíguos, causando dúvidas e incertezas ao tradutor.
Ao longo do estágio, a polissemia terminológica que constantemente me causou
mais dificuldades foi o termo “battery” que, em inglês, simultaneamente denomina dois
objetos (nomeadamente, “pilha” e “bateria”, em português), situação que vai contra os
princípios teóricos da terminologia, dado que o mesmo termo encontra-se relacionado
com dois significados diferentes. Já em português, esta polissemia não existe, tal como
demonstrado nas figuras 21 e 22.
Isto significa que é necessário contexto para efetuar a tradução da palavra “battery”
para português. No entanto, por vezes, mesmo com contexto, não se torna evidente se um
determinado dispositivo é alimentado a pilhas ou a bateria, como podemos constatar
Figura 21: Definição de "bateria", segundo a Infopédia.
Figura 22: Definição de "pilha", segundo a Infopédia.
70
através dos excertos seguintes.
Texto de partida (excertos)
This Device is a battery operated device.
Internally Powered (on battery power)
Open the battery door at the left side of the device.
Turn off XXXXX and take battery out of XXXXX main device.
Carefully position the battery door and gently get it into place.
Nestas situações de incerteza, torna-se necessário recorrer a informações
extratextuais como, por exemplo, a imagens fornecidas com o manual de instruções.
Analisando as ilustrações do dispositivo em questão, pareceu-me que, devido às suas
dimensões reduzidas, seria mais plausível que este fosse alimentado a pilhas. Mesmo
assim, isto era apenas um palpite, por isso considerei que seria mais seguro pesquisar as
especificações técnicas de dispositivos semelhantes. Dos cinco modelos de oxímetros que
encontrei, quatro eram alimentados a pilhas. Assim, pareceu-me bastante provável que
este oxímetro fosse também alimentado do mesmo modo.
Conforme é possível deduzir através deste caso prático, a existência de terminologia
polissémica coloca em causa os pressupostos da comunicação especializada, lançando
dúvidas sobre as informações a transmitir. Mais uma vez, confirmam-se as ideias de
Robinson, que afirma que “all translation contains an element of guesswork” (Robinson,
2003: 130); no entanto, a terminologia é de tal maneira crucial na comunicação
especializada que não deve ser deixada ao acaso, por isso, nos casos de polissemia e de
vazios terminológicos, até os palpites devem estar devidamente fundamentados.
4.5.3. Empréstimos
O empréstimo é uma das estratégias de tradução mais simples, que envolve a
transferência de um item lexical da língua de partida para a língua de chegada,
frequentemente utilizado quando existe um vazio terminológico nesta última (Byrne,
2012: 120). Dado que a produção técnica, científica e informática ocorre
71
predominantemente em inglês, é natural que os vocábulos desta língua sejam
incorporados e fixados nas restantes línguas. As palavras do domínio informático (e-mail,
Internet, website, PC etc., com as quais várias vezes me deparei) são exemplos de
empréstimos que, pelo seu uso extensivo, já se encontram aceites pela norma portuguesa.
Uma outra característica da comunicação especializada é a prevalência de siglas, já
que estas contribuem para a concisão e clareza do texto, isto é, aportam uma grande
quantidade de informação numa expressão apenas. Todavia, é importantíssimo realçar
que, para que as siglas contribuam para a compreensão do texto, deverão encontrar-se
devidamente fixadas e normalizadas na linguagem especializada, para que possam ser
reconhecidas e utilizadas pelos especialistas da área, atingindo, frequentemente, um
estatuto internacional (por ex., PC, CPU, ABS etc.).
As siglas são tão frequentes na comunicação técnica e científica que, muitas vezes,
no início destes textos, é habitual efetuar-se uma especificação das siglas utilizadas ao
longo do documento. Através da minha experiência, constatei que esta é uma prática
bastante comum em manuais de instruções e, logo no primeiro projeto realizado na
empresa, deparei-me com algumas incertezas em relação ao tratamento das siglas.
Identificação do projeto: 2018_0193;
− Par de línguas: EN → PT_PT;
− N.º de palavras: 7550;
− Tempo despendido: 38,25 horas16;
− Área temática: medicina;
− Tipo de discurso: técnico;
− Género do texto: manual de instruções;
− Sequência textual predominante: instrucional-diretiva;
− Função do texto: informativa;
− Contexto: manual de instruções de um scanner de amostras de tecido humano e do
computador que processa as imagens, contendo instruções sobre o transporte, montagem e
utilização, bem como normas de segurança;
− Público-alvo: profissionais de saúde com formação para operar o aparelho;
− Ferramentas utilizadas: SDL Trados Studio.
16 Esta foi a primeira tradução realizada na Kvalitext, o que explica o elevado número de horas dedicadas
a este projeto.
72
Sigla Denominação por extenso
CDU Calibration and Diagnostics Utility
EC European Community
ICC International Color Consortium
ICD Implantable cardioverter-defibrillator
IEC International Electrical Commission
IMS Image Management System
PC Personal computer
PM Preventative maintenance
Para este projeto não foram fornecidas instruções relativas ao tratamento das siglas,
o que constituiu um problema, já que existiam siglas com tradução oficial (por ex., EC),
outras tão usuais que já se encontravam incorporadas na língua (por ex., PC) e ainda
algumas que pareciam fazer parte da terminologia do produto (por ex., CDU e IMS) e,
portanto, podem considerar-se características do mesmo.
Devido a estas incertezas, e com vista a realizar uma tradução consistente, coloquei
uma query ao cliente para averiguar se deveria efetuar a tradução das siglas ou se as
deveria manter em inglês no TCh (i. e., realizar um empréstimo). A resposta fornecida
foi: “it is ok to translate some”. Desta forma, naquele momento, pareceu-me mais
indicado traduzir as siglas da forma seguinte:
Texto de partida Tradução Revisão
CDU ACD CDU
Calibration and Diagnostics
Utility
Aplicação de Calibração e
Diagnósticos
Utilitário de calibração e
diagnósticos
EC CE —
European Community Comunidade Europeia —
ICC ICC —
International Color
Consortium
Consórcio Internacional da
Cor
International Color
Consortium
ICD CDI —
Implantable Cardioversor-desfibrilador —
73
cardioverter-defibrillator implantável
IEC CEI IEC
International Electrical
Commission
Comissão Eletrotécnica
Internacional
—
IMS IMS —
Image Management System Sistema de gestão de
Imagem
Sistema de gestão de
imagens
PC PC —
Personal computer Computador pessoal —
PM PM —
Preventative maintenance Manutenção preventiva —
Como se pode constatar, o revisor do projeto discordou com a tradução de algumas
siglas e, em retrospetiva, concordo plenamente com as suas alterações. Em primeiro lugar,
as minhas decisões em relação às siglas que parecem ser exclusivas deste produto não
foram consistentes: por exemplo, traduzi “CDU”, mas não “IMS” ou “PM”. Em virtude
da experiência que adquiri deste então, se tivesse de traduzir este mesmo documento ou
revê-lo, realizaria um empréstimo das siglas “CDU”, “IMS” e “PM”, já que, por um lado,
são referentes ao produto e, por outro, uma vez que o produto em questão tem um software
associado (que não se encontrava localizado), seria mais seguro manter as siglas em inglês
no manual de instruções traduzido, para que o utilizador do produto e do seu software
estivesse familiarizado com as mesmas.
No que diz respeito às organizações também mencionadas na lista (European
Community, International Electrical Commission e International Color Consortium),
constatei que existe uma tradução oficial para a primeira, bem como para a sua sigla;
descobri também uma tradução para a segunda, mas não para a sua sigla; para a última,
não fui capaz de encontrar qualquer tradução oficial. Desta forma, decidi traduzir as
denominações e as siglas correspondentes das duas primeiras organizações, enquanto
para a terceira traduzi apenas a sua designação. Todavia, o revisor considerou que estas
opções não seriam as mais adequadas, já que, na ausência de uma tradução oficial dos
nomes das organizações, seria melhor realizar um empréstimo do que impor a nossa
tradução.
74
Tendo em conta tudo o que aprendi desde que realizei este projeto, e considerando
o estatuto internacional ao qual a terminologia almeja, sem dúvida que teria recorrido a
mais empréstimos para a tradução destas siglas, até porque, provavelmente, o
público-alvo estará familiarizado com as mesmas.
4.5.4. Tradução de palavras-sinal
Para além das funções dos manuais de instruções já descritas no ponto 2.4., outra
função igualmente importante deste género textual passa por alertar os
leitores/utilizadores para os potenciais riscos inerentes à utilização do produto, caso não
sejam tomadas as medidas de segurança apropriadas. Assim, muito frequentemente, o
utilizador depara-se com mensagens como a apresentada abaixo (imagem extraída do já
mencionado projeto 2018_0193) no início do manual de instruções ou antes de
procedimentos delicados.
A utilização de palavras-sinal (por ex., “Warning”, “Caution” e “Notice”) é
Figura 23: Mensagens de alerta de um manual de
instruções.
75
normalizada por instruções presentes em normas como a ISO/IEC Guide 37: 2012
relativas às instruções de utilização de produtos por parte dos consumidores, que
recomendam os retadores técnicos a seguir uma “hierarchy of ‘signal words’ when
alerting users to risks and unwanted states of various kinds” (Olohan, 2016: 63). Assim,
a referida norma ISO sugere o uso de “DANGER, WARNING and CAUTION to alert
users to high, medium and low risks respectively” (ibid.). Tal hierarquia deverá,
obviamente, ser também respeitada na tradução dessas mesmas palavras-sinal, que
deverão transmitir o mesmo nível de advertência e claramente comunicar os riscos aos
quais o utilizador está sujeito. Não havendo qualquer entrada na TM contendo tais
palavras, coube-me a mim decidir qual a tradução mais apropriada.
Ainda que “DANGER”, o elemento superior da hierarquia das palavas-sinal que
denota um maior risco, não se encontrasse presente no TP, é também importante ponderar
sobre a sua tradução, já que as palavras-sinal seguintes têm de comunicar um nível de
risco sucessivamente menor. Pelo contacto estabelecido com manuais de instruções
enquanto leitora, diria que uma tradução apropriada para “DANGER” seria “PERIGO”,
o que me levou a traduzir “WARNING” e “NOTICE” como “AVISO” e
“OBSERVAÇÃO”, respetivamente. O maior desafio foi, desta forma, a tradução de
“CAUTION”.
Através da consulta de bases de dados (nomeadamente, o Linguee e o IATE) e
dicionários bilingues online (como a Infopédia), obtive as sugestões de tradução
“cuidado”, “advertência”, “precaução” e “atenção”. Entre estas possíveis opções teria,
então, de selecionar a que melhor cumpriria o objetivo do TP.
Segundo as teorias funcionalistas da tradução, “a translation is designed to achieve
a purpose” (Pym, 2010: 41). Mais especificamente, a Skopostheorie de Hans Vermeer em
coautoria com Katharia Reiss defende que cada texto é produzido com um objetivo
específico e que, da mesma forma, cada tradução tem também um objetivo específico a
ser alcançado (id.: 44–45). Segundo Vermeer (Vermeer, 1989 apud Nord, 1997: 29,
tradução da autora),
[t]he Skopos rule thus reads as follows: translate/interpret/speak/write in a way
that enables your text/translation to function in the situation in which it is used and with
the people who want to use it and precisely in the way they want it to function.
76
Neste caso, a tradução de “CAUTION” deverá ser uma que cumpra o objetivo das
palavras-sinal, ou seja, comunicar de forma rápida e inequívoca o nível de risco inerente
ao funcionamento daquele aparelho e, adicionalmente, transmitir um grau de risco
inferior a “AVISO” e superior a “OBSERVAÇÃO”. Assim, descartei as opções
“advertência” e “precaução” porque contêm muitos caracteres, ou seja, são demasiado
longas para serem de leitura rápida e fácil, principalmente tendo em conta que a palavra
no TCh é apresentada em maiúsculas. A minha escolha final seria, então, entre “atenção”
e “cuidado”.
Em termos pragmáticos, pareceu-me que “atenção” se adequaria melhor nesta
hierarquia porque a considerava uma palavra mais imperativa do que “cuidado”. Esta
tratava-se, no entanto, de uma visão subjetiva, pelo que decidi enquadrar estas duas
opções com os outros elementos da hierarquia de palavras-sinal e efetuar uma pesquisa,
através do Google, nos webistes em português, para ver qual combinação seria mais
frequente.
Figura 24: Número de entradas nas páginas de Portugal do
Google para o trio de termos “perigo aviso atenção”.
Figura 25: Número de entradas nas páginas de Portugal do
Google para o trio de termos “perigo aviso cuidado”.
77
Como é possível constatar, a pesquisa no Google favoreceu a minha preferência,
apresentando mais entradas para o trio de termos “perigo”, “aviso” e “atenção”, pelo que
“CAUTION” foi, finalmente, traduzido como “ATENÇÃO”.
4.6. Registo de língua
Uma diferença cultural registada no par de línguas mais trabalho durante todo o
estágio (EN→PT_PT) foi a formalidade do discurso. Martin Joos refere a existência de
uma escala de formalidade que contém vários registos de língua, sendo eles, do mais
formal para o mais informal, “frozen”, “formal”, “consultative”, “casual” e “intimate”,
(Joos, 1968: 188–189). O linguista refere ainda que o registo de língua “consultative” é o
predominante no inglês americano, sendo até mesmo empregue em conversas entre
desconhecidos (ibid.). No entanto, a língua portuguesa apresenta uma maior formalidade
quando comparada com o inglês, pelo que o registo “formal” é muito mais prevalente.
Consequentemente, esta discrepância cultural entre os registos utilizados pelas duas
línguas esteve na origem das dificuldades evidenciadas no projeto seguinte.
Identificação do projeto: 2018_0422;
− Par de línguas: EN → PT_PT;
− N.º de palavras: 983;
− Tempo despendido: 3,75 horas;
− Área temática: informática;
− Função do texto: informativa;
− Contexto: strings de um software antivírus e dos e-mails gerados pelo mesmo;
− Público-alvo: utilizadores do software;
− Ferramentas utilizadas: memoQ.
As dificuldades encontradas neste projeto relacionaram-se com a localização da
saudação inicial presente nos e-mails gerados por um software antivírus.
Texto de partida Tradução Revisão
Hello, </p> The following
threats were detected on
<EventDate> between
Caro utilizador, </p> as
seguintes ameaças foram
detetadas a <EventDate>
Olá, </p> As seguintes
ameaças foram detetadas a
<EventDate> entre as
78
<EventTime> and
<EventEndTime>.
entre as <EventTime> e as
<EventEndTime>.
<EventTime> e as
<EventEndTime>.
Pelo anteriormente referido, considerei que não seria adequado manter a
informalidade da língua inglesa (traduzindo “Hello” pelo seu equivalente mais direto,
“Olá”) no TCh português, mesmo tratando-se de textos de e-mail, que tendem a ser mais
informais.
Desta forma, para escolher uma saudação que se adaptasse à formalidade do
português, considerei a opção “Bom dia”, que seria ligeiramente mais formal e apropriada
para um e-mail. Contudo, esta opção foi logo descartada porque “Bom dia” é uma
saudação com uma extensão horária limitada, ou seja, apenas se aplica no início do dia,
o que não seria muito indicado como saudação inicial. Assim, “Caro utilizador”
pareceu-me ser a tradução mais indicada, uma vez que evidenciava um tratamento mais
formal e seria aplicável em todos os casos.
Todavia, o revisor não concordou com este ponto de vista e, estando já
familiarizado com a empresa que produziu o software, informou-me de que esta se
caracteriza por ser informal e por tratar os utilizadores do seu software com bastante
proximidade. Tal é também sustentado por Byrne, que afirma que “[t]he very nature of
the company, its culture, goals and organisation are reflected in the types of documents
that company produces” (Byrne, 2006: 49), ou seja, a utilização de “Hello” como
saudação inicial não é propriamente uma marca da informalidade do inglês, mas mais um
registo característico da filosofia da empresa. Não tendo este conhecimento, efetuei a
tradução que me pareceu mais correta naquele momento, embora agora reconheça que
“Caro utilizador” talvez seja uma saudação demasiado formal.
Ainda em relação à questão do registo de língua, será interessante voltar a analisar
o já mencionado projeto 2018_0633 (anúncio publicitário a trampolins e karts), para o
qual o cliente forneceu a instrução de que a informalidade do TP deveria ser mantida no
TCh (principalmente porque o público-alvo eram crianças); aplicava-se, portanto, um
registo de língua mais casual que, em virtude dessas instruções do cliente e da análise
textual por mim efetuada na fase de pré-tradução, procurei deixar transparecer no TCh.
Contudo, quando tive acesso às alterações efetuadas pelo revisor deste projeto, constatei
79
que este não tinha concordado com algumas das minhas opções, especialmente com a
tradução da palavra “cool”.
Texto de partida Tradução Revisão
Safe, cool and nicely
compact.
Seguro, fixe e compacto. Seguro, compacto e original.
Wouldn’t you like to have a
go-kart that is different and
cool?
Gostavas de ter um kart a
pedais fixe e diferente?
Gostavas de ter um kart a
pedais que prima pela
diferença?
Then go for the XXXXX for
the coolest moves.
Então escolhe o XXXXX
para as manobras mais
fixes.
Então escolhe o XXXXX
para as manobras mais
divertidas.
There are also some
supercool accessories to
make the XXXXX complete!
Há também acessórios
super fixes para completar o
teu XXXXX!
Há também fantásticos
acessórios para
complementar o teu
XXXXX!
Tendo em conta o público-alvo e a informalidade requerida pelo cliente, considerei
apropriado traduzir “cool” como “fixe”, um adjetivo valorativo coloquial frequentemente
empregue por crianças e jovens dentro do intervalo de idades que este anúncio publicitário
pretende alcançar. O revisor, no entanto, pareceu discordar e substituiu o adjetivo “fixe”
por outros como “original”, “divertidas” e “fantásticos”, o que, embora não contendo a
coloquialidade de “fixe”, alarga a variedade lexical do TCh, introduzindo adjetivos que
promovem também o desejo. Contudo, discordei bastante da tradução “Gostavas de ter
um kart a pedais que prima pela diferença?”, já que não me parece nem informal, nem
compreensível por crianças, nem ilustrativa do registo de língua utilizado pelas mesmas.
Tal corrobora a visão de Gouadec, que refere que “the reviser may, at times, make
rash corrections” (Gouadec, 2007: 225), descartando, desta forma, uma escolha tradutiva
fundamentada nas instruções do cliente e justificada por um processo de análise textual.
80
Considerações finais
O objetivo do presente relatório foi apresentar e refletir sobre as atividades
desenvolvidas na empresa de tradução Kvalitext, no âmbito do estágio no MTSL e,
adicionalmente, espelhar a transição do mundo académico para o “mundo real” da
tradução.
Para complementar e expandir a descrição e avaliação da experiência vivida neste
estágio e com o intuito de melhor avaliar essa transição, de perceber o que um mestrado
de tradução como o da FLUP oferece aos estudantes e o que as empresas de tradução
procuram num colaborador, lancei um inquérito (cf. Anexo 4) a cinco docentes do MTSL,
a dez estudantes desse mesmo mestrado (cinco do 1º ano e cinco do 2º), a cinco
colaboradores da Kvalitext e a três administradores de empresas de tradução de forma a
avaliar as competências (numa escala de 1 a 5, em que 1 representa uma competência
nada essencial e 5 uma competência muito essencial) que cada grupo considera mais
relevante para o exercício da tradução. Assim, neste momento conclusivo, apresentarei
um resumo dos resultados deste inquérito, na medida em que me parece que os mesmos
espelham bem alguns dos pontos essenciais a reter de todo o percurso académico e
profissional que este mestrado envolve.
Um resultado que imediatamente me chamou a atenção foi a relevância atribuída
por todos os participantes às competências relacionais e interrelacionais (capacidade de
trabalho em equipa e de comunicação, aceitação de críticas e feedback), o que revela que,
ao contrário de uma conceção popular e obsoleta, o tradutor não trabalha sozinho atrás do
ecrã do computador. O estágio realizado na Kvalitext permitiu-me comprovar que a
tradução é um esforço de equipa resultante de uma constante troca de conhecimentos e
ideias e, desta forma, fui capaz de aprender bastante num espaço de tempo relativamente
reduzido.
No que diz respeito às competências pessoais, todos os participantes reconhecem
as exigências da profissão, destacando a importância da capacidade para lidar com o
stress e para trabalhar sob pressão. De facto, a pressão dos prazos de entrega é uma
constante no dia-a-dia do tradutor, tal como frequentemente os professores do MTSL
referiam e tal como pude comprovar na minha experiência na empresa. Embora, enquanto
estagiária, não tivesse prazos de entrega demasiado apertados, pelo menos em dois
81
projetos senti que o tempo urgia e que cada minuto deveria ser bem empregue.
Pessoalmente, sinto que traduzir sob pressão me deixa mais suscetível a erros, mais
frustrada e perturba a minha concentração; tais situações são, sem dúvida, desagradáveis,
mas também reconheço que foi importante experienciá-las enquanto estagiária, para me
ambientar e saber lidar com esta realidade, com o acompanhamento e ajuda da minha
orientadora. Outras características pessoais consideradas igualmente importantes são a
dedicação, a perseverança, a concentração e a autodisciplina. Estas últimas duas foram
inclusivamente classificadas como essenciais por parte dos administradores de empresas
de tradução, já que são determinantes para a rentabilidade de um tradutor. Por essa mesma
razão, estas são características que a componente teórica do MTSL visa incutir e
desenvolver nos estudantes como forma de preparação para a profissão que terão de
enfrentar.
Como seria de esperar, as competências linguísticas de um tradutor são também
bastante importantes; a relevância atribuída ao conhecimento da terminologia e das
convenções textuais sustentam o importante contributo que a análise textual oferece à
tradução, conforme defendido anteriormente. Para além disto, a fluência em pelo menos
duas línguas estrangeiras, aliada a uma proficiência linguística nas mesmas, é bastante
valorizada pelos administradores de empresas de tradução porque é uma forma de
potenciarem os seus recursos. Estes esperam também que os seus colaboradores se
especializem numa área de conhecimento concreta; os tradutores inquiridos, por outro
lado, não parecem considerar tal relevante, já que, para estes, talvez seja mais proveitoso
possuir conhecimentos gerais sobre várias áreas de conhecimento, o que lhes permite mais
facilmente adaptarem-se e familiarizarem-se com as mesmas.
De forma geral, através da minha experiência e da análise dos resultados deste
pequeno inquérito, considero que as competências incutidas pelos docentes do MTSL são
as que o mercado de tradução procura e necessita, existindo, desta forma, uma
coadunação entre os conteúdos lecionados e as competências que os profissionais de
tradução mais experientes consideram essenciais para singrar na profissão. Verifica-se
também um reconhecimento dos desafios e exigências da profissão por parte dos alunos
do primeiro ano do MTSL e uma consciencialização dos alunos do segundo ano em
relação ao “mundo real” da tradução uma vez concluído o estágio curricular, o que indicia
a concretização do processo de evolução expectável dos estudantes.
82
Pelo exposto, acredito que a via profissionalizante é uma forma muito natural e
produtiva para concluir o MTSL. Com efeito, o estágio curricular, para além de
complementar os conhecimentos previamente adquiridos, permite que o estudante de
tradução tenha uma transição mais suave e bem orientada entre o mundo académico e o
“mundo real” da tradução. Adicionalmente, o estágio possibilita a adaptação à dinâmica
de uma empresa e, através do contacto estabelecido com os seus colaboradores, constitui
um momento de aprendizagem intensiva que, no meu caso, contribuiu para o aumento da
autoconfiança e da autonomia, o que me permitiu sentir, de facto, uma tradutora.
83
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86
Anexos
Anexo 1 – Lista de projetos realizados
N.º do projeto Género de texto N.º de palavras N.º de horas
despendidas CAT-tool
2018_0193 Manual de
instruções 7 550 38,75
SDL Trados
Studio 2017
2018_0226 Ação de formação 4 500 16,5 SDL Trados
Studio 2017
2018_0307 Política de
privacidade 5 040 13 memoQ 2015
2018_0318 Folheto
informativo 5 000 16,5
SDL Trados
Studio 2017
2018_0387 Manual de
instruções 212 1,25
SDL Trados
Studio 2017
2018_0389 Folheto
informativo 209 1,75
SDL Trados
Studio 2017
2018_0340 Política de
privacidade 3 500 18,25 memoQ 8.2
2018_0422 Software
informático 983 3,75 memoQ 2015
2018_0438 Manual de
instruções 2 600 10,5
SDL Trados
Studio 2017
2018_00442 Manual de
instruções 7 600 16
SDL Trados
Studio 2017
2018_0482 Manual de
instruções 3 680 14,25 memoQ 2015
2018_0566 Manual de
instruções 3 000 10,5
SDL Trados
Studio 2017
2018_0587 Manual de
instruções 6 323 23,75 memoQ 2015
2018_0633 Anúncio
publicitário 1 050 3,75
SDL Trados
Studio 2017
2018_0642 Política de
privacidade 1 229 6,5
SDL Trados
Studio 2017
87
2018_0702 Software
informático 5 424 18,25
SDL Passolo
2016
2018_0740 Manual de
instruções 370 1,5
SDL Trados
Studio 2017
2018_0862 Manual de
instruções 3 900 7,5
SDL Trados
Studio 2017
2018_0784 Manual de
instruções 950 4,25
SDL Trados
Studio 2017
2018_0790 Política de
privacidade 3 200 9,5
SDL Trados
Studio 2017
2018_0809 Manual de
instruções 5 220 17,75
SDL Trados
Studio 2017
2018_0822 Software
informático 17 000 39,75 Wordbee
2018_0915 Software
informático 1 427 3,5
SDL Trados
Studio 2017
2018_0944 Software
informático 1 045 5
SDL Trados
Studio 2017
2018_0962 Software
informático 136 0,15 memoQ 2015
2018_0982 Manual de
instruções 439 2,25 memoQ 8.2
2018_0987 Folha de venda 470 2,75 SDL Trados
Studio 2017
2018_1002 Manual de
instruções 1 400 3,5
SDL Trados
Studio 2017
2018_1008 Ação de formação 6 185 16,75 memoQ 8.2
2018_1048 Manual de
instruções 4 000 9,5
SDL Trados
Studio 2017
2018_1123 Folheto
informativo 520 1,75 memoQ 8.2
2018_1129 Manual de
instruções 375 2
SDL Trados
Studio 2017
2018_1134 Guião 200 1 SDL Trados
Studio 2017
2018_1145 Software
informático 1 700 5,5
SDL Trados
Studio 2017
91
Anexo 4 – Resultados do inquérito realizado
Este inquérito, realizado através do Google Forms, pretendia que os
administradores de empresas de tradução (Admin), os tradutores (Trad), docentes do
MTSL (Docentes) e alunos do 2º ano (2º ano) e do 1º ano (1º ano) classificassem as
competências que consideram essenciais num tradutor, numa escala de 1 a 5, em que 1
representa uma competência nada essencial e 5 uma competência muito essencial.
As respostas obtidas permitiram o cálculo das médias de classificação da relevância
das características listadas na tabela seguinte.
Admin Trad Docentes 2º ano 1º
ano
Competências
linguísticas
Conhecimento da
terminologia e convenções
textuais inerentes ao tipo de
texto
5 4,4 4 4,8 4,2
Fluência em, pelo menos,
duas línguas estrangeiras 4,3 3,2 3 2,8 3,8
Proficiência linguística nas
línguas de trabalho 4,3 4,8 4,8 4,8 5
Competências
relacionais e
interrelacionais
Capacidade de comunicação
e de trabalho em equipa 4,3 4 4,8 5 4,6
Capacidade para aceitar e
lidar com feedback e
críticas
5 4,6 4,6 5 4,8
Competências
culturais e
interculturais
Conhecimento sobre a
cultura de partida e sobre a
cultura de chegada
4,3 3,6 4,8 4,4 5
Competências
pessoais e
interpessoais
Capacidade para se adaptar
a e familiarizar com várias
áreas de conhecimento
3,7 4,8 4,6 4,4 4,2
Capacidade para lidar com
o stress e para trabalhar sob
pressão
4,3 4,6 4,6 4,4 4,6
Competência para
desempenhar qualquer
papel no projeto de tradução
(gestor de projetos, tradutor,
2,3 3 3,8 3,6 3,8
92
revisor)
Criatividade/imaginação 3,3 3,6 3,8 4 4
Dedicação e perseverança 4,3 4,2 4,6 4,8 5
Concentração e
autodisciplina 5 4,6 4,8 4,8 4,8
Especialização numa área
de conhecimento concreta 4,3 2,6 3,4 3,4 3
Experiência profissional 2,3 4 3,8 3,4 3,6
Formação académica
(licenciatura e/ou mestrado
em Tradução)
3,7 4,6 4,6 4,6 4,8
Competências
informáticas
Boas capacidades de
pesquisa de informação 5 4,8 4,8 4,6 4,6
Bom domínio de programas
de Gestão de Projetos 1,3 2,8 3,2 3,2 3,2