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REGISTOS E NOTARIADO

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REGISTOSE

NOTARIADO

• Existe uma ordem jurídica abstracta e uma ordem jurídica concreta.

• A primeira resulta da aplicação das regras vigentes à situação factual tal e qual como esta é (ou seja, como na verdade os factos que a conformam sucederam) – esta será a verdadeira ordem jurídica.

• Acontece, porém, que nem sempre se obtém conhecimento de todos os factos juridicamente relevantes que contribuem para a composição daquela situação. Seja por não se ter conhecido certo facto que na realidade se produziu; seja por se ter presumido o conhecimento de certo facto que na verdade não se produziu; seja por não se terem considerado todos os factos juridicamente relevantes para a resolução do caso concreto; etc.. Desta desconexão surge a ideia de ordem jurídica concreta; esta será, portanto, o resultado da aplicação das regras vigentes aos factos tal como estes aparecem.

• O conhecimento é assim um pressuposto natural da eficácia jurídica.

• A obtenção do conhecimento supõe: um sujeito (que o obtém); certo objecto (relativamente ao qual se obtém o dito conhecimento); e, um meio de conhecimento (isto é, um modo através do qual se dá conhecimento: notoriedade, citação, notificação, testemunha, anúncio, edital, registo público, etc.).

• Acontece, por vezes, que a eficácia de certo facto depende deste ser levado ao conhecimento, de alguém ou de todos (apesar, portanto, da sua inveracidade, que se ignora). Nesses casos, o fenómeno do conhecimento surge como um prolongamento da ordem jurídica concreta, independente, por isso, das desconexões que esta possa manter com a ordem jurídica abstracta.

• Surge então o fenómeno da publicidade: tornar público para que a eficácia (lato sensu) do facto esteja garantida. Nesta perspectiva, conhecimento será então sinónimo de comunicação ou transmissão, desde que se entenda que comunicar, para este efeito, não implica necessariamente uma específica intenção declarativa, bastando a simples cognoscibilidade objectiva (mesmo que não prevista por aquele que dá a conhecer). Parece, assim, mais apropriado falar simplesmente em publicidade do que em comunicação.

• A publicidade jurídico-privada pode assumir diversos graus, que se distinguem em função das repercussões que a publicidade pode ter sobre a realidade que manifesta .

• Numa ordem crescente de importância, existe um primeiro nível, correspondente à simples notícia, que se verifica sempre que se publicitem situações que independentemente da comunicação já são públicas, notórias. É exemplo prototípico o que resulta do disposto nas alíneas a) e b) do nº 2 do art. 5º do Código do Registo Predial .

• Num segundo nível, existe a publicidade que constitui o único meio de prova da situação em causa. É o caso típico, regra geral , do registo civil (arts. 2º e 3º do Código do Registo Civil). Neste caso, a publicidade, ao contrário do que pode parecer, não é constitutiva em virtude de, uma vez efectuado o registo, o facto registado passar a produzir efeitos desde a data em que ocorreu e não apenas a partir da data do registo.

• Em terceiro lugar, existe aquilo que alguns designam por publicidade legitimadora em função da qual se faz prevalecer, a favor de certos terceiros, a "realidade aparente" (ou seja, a que resulta da publicidade) sobre a realidade substantiva (ou seja, a não publicitada ou a erradamente publicitada), em caso de discrepância entre ambas. É a regra geral do registo predial (art. 5º/nº1 do Código do Registo Predial) ou do registo comercial (art. 14º do Código do Registo Comercial).

• Por fim, existirá a publicidade a que se pode chamar constitutiva, quando a eficácia absoluta (típica) do facto esteja dependente da sua publicitação. É exemplo paradigmático o registo de constituição de hipoteca (art. 4º/nº2 do Código do Registo Predial e art. 687º do Código Civil ).

• O objecto do conhecimento - ou seja, aquilo que se dá a conhecer - é formado pelos factos que interferem com a conformação interna de uma dada situação jurídica. Rigorosamente, o que a terceiros interessa conhecer é a situação jurídica (de certa pessoa ou de certo bem, grosso modo). Todavia, como tal situação tem normalmente um conteúdo muito complexo quase se não concebe a existência de meios potencialmente capazes de proporcionar um tão amplo conhecimento. Por isso, o que regularmente se dá a conhecer são os factos a partir dos quais se inferem certas situações

• Para levar ao conhecimento do público a verificação do facto, são necessários instrumentos, especialmente destinados ao efeito ou não. Esses instrumentos são os chamados meios de conhecimento.

• Os meios de conhecimento podem ser mediatos ou imediatos. Os primeiros supõem uma actividade de natureza jurídica, conduzida por um intermediário, que tem por finalidade levar certo objecto ao conhecimento de terceiros (é, designadamente, o caso dos registos públicos). Os segundos são aqueles em que é o próprio objecto que se transmite ao/s sujeito/s do conhecimento (é, designadamente, o caso da promessa pública - art. 459º - ou da proposta contratual ao público - art. 230º/nº3 -, ambos do Código Civil).

• Os meios de conhecimento também se podem distinguir em meios directos e indirectos. "Nos primeiros verifica-se uma presença física do sujeito com o objecto, isto é, uma directa apreensão sensorial .... Nos meios indirectos, o conhecimento obtém-se pela transmissão do objecto utilizando meios mecânicos (correio, imprensa, telecomunicações eléctricas ...) ou humanas, desde que o intermediário não pratique um acto jurídico, sendo a sua actuação de considerar como mera actividade material (mensageiro)“.

• A publicidade pode distinguir-se em:• - espontânea, quando exista notoriedade, ou seja, quando o facto

é público sem que exista uma específica finalidade de dar a conhecer (é exemplo típico a posse, quando exercida de modo a poder ser conhecida pelo público em geral);

• - provocada, quando, ao invés, exista uma específica finalidade de dar a conhecer (é exemplo típico o anúncio do achado a que o art. 1323º se refere ou a publicação no Diário da República da escritura de constituição de uma associação - art. 168º/nº2);

• - registal, quando a finalidade de dar a conhecer seja obtida através da utilização de meio mediato de conhecimento especialmente instituído (normalmente pelo Estado) para o efeito e dotado de fé pública.

• Os efeitos associados à falta de publicidade - ineficácia, relativa ou absoluta, impossibilidade de prova, sanção penal - supõem geralmente (a falta) de publicidade registal. Não é, no entanto, impossível que alguns desses efeitos apareçam igualmente ligados à publicidade provocada.

• De entre os inúmeros casos de publicidade espontânea destacam-se, pela sua expressividade, os três seguintes:• a) Nome individual• O nome é o instrumento de identificação de cada indivíduo no

meio social em que se integra. É por isso que o assento de nascimento deve conter "o nome próprio e os apelidos" da pessoa (art. 102º/a) do Código do Registo Civil); que mesmo o abandonado (art. 105º do mesmo diploma) deve ter nome (art. 108º do citado diploma); que se estabeleçam regras relativamente rigorosas quanto à composição do nome (art. 103º ainda do diploma em causa). –A proibição genérica de alteração do nome funda-se precisamente no

uso espontâneo que do mesmo se faz e não da publicidade que dele se obtém por via registal. É que, aquilo que efectivamente publicita o nome, é o seu uso quotidiano nas relações sociais.

• b) PosseO possuidor beneficia da presunção de titularidade do direito correspondente à posse que exerce (art. 1268º/nº1 do Código Civil), justamente por esse exercício aparentar perante terceiros aquela titularidade. Ou seja: na medida em que, normalmente, aquele que exerce o domínio de facto é titular do direito que justifica essa actuação, é razoável partir desse suposto e atribuir ao possuidor a vantagem decorrente da inversão do ónus probatório. A posse é meio de publicidade não apenas em relação às coisas móveis, como também em relação às coisas. Embora, é certo, a publicidade que resulta da posse no que toca às coisas móveis tenha maior importância prática do que aquela que daí resulta para as imóveis (precisamente por, em relação a estas, estar instituído o registo - predial - coisa que, para as móveis, apenas excepcionalmente existe ), sempre se deve dizer, no entanto, que, ao não estar instituída entre nós a regra de que a "posse vale título" , a posse significa para os móveis justamente o mesmo que significa para os imóveis: isto é, presunção de titularidade do direito (art. 1268º/nº1 do Código Civil).

• c) Formas públicas

• Em certos casos, numerosos mas ainda assim excepcionais (art. 219º do Código Civil), a lei impõe certa forma externa para a realização de determinado acto. As razões tradicionalmente invocadas para o efeito andam normalmente associadas à ponderação das partes, à obtenção de meios probatórios mais fiáveis e à necessidade pública de segurança acerca da situação jurídica de certas pessoas ou bens. Por conseguinte, a razão nunca será directamente a publicitação do acto a cuja titulação se procede.

• Os documentos escritos são de duas espécies: autênticos e particulares.

• Os autênticos podem ser oficiais, quando elaborados por uma autoridade pública, ou extra-oficiais, quando elaborados por um oficial público.

• Os particulares, por seu turno, podem ser autenticados, quando o seu conteúdo seja formalmente reconhecido perante o Notário (artigos 150º a 152º do Cód.Notariado), legalizados, quando apenas seja reconhecida a sua letra ou a assinatura (artigos 153º e segs. do mesmo diploma), e particulares stricto sensu, todos os demais.

• Convém acentuar, de resto, que mesmo a publicidade provocada resultante da titulação por escritura pública tem um alcance relativamente reduzido pois, sendo certo que qualquer interessado pode pedir certidão (artigo 164º/n.º 1, Cód.Notariado) de escritura arquivada, a verdade é que isso supõe saber onde buscar, o que pode revelar-se difícil atenta a referida regra inserta no n.º 3 do artigo 4º do Cód.Notariado.

• Recentemente, para uma série de actos em relação aos quais a lei exigia a escritura pública como forma ad substantiam (v.g., artigos 413º, 660, n.º 1, 875º, 947º, n.º 1) passou a bastar, em alternativa, o documento particular autenticado elaborado quer por Notário (a quem, de resto, já pertencia tal competência), quer por Conservador, oficial de registo, advogado, solicitador ou representante de Câmara de Comércio ou Indústria (artigo 38º, Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março). O que acarreta, por consequência, um alargamento de competências para a titulação que excede a esfera tradicional: ao lado do oficial público Notário, a validade formal de tais actos pode agora decorrer ainda da intervenção de quem, salvo o Conservador, não dispõe de estatuto comparável.

• Para evitar o surgimento de uma duplicidade de estatutos relativos a entidades que actuam para o mesmo fim e, designadamente, para impedir a frustração do respeito pelo princípio da legalidade a que se submete a intervenção do Notário (n.º 1 do artigo 11º do respectivo Estatuto – Decreto-Lei n.º 26/2004, de 4 de Fevereiro) e do Conservador (artigo 68º, Código do Registo Predial; artigo 47º, Código do Registo Comercial, embora aqui apenas quando o registo se deva lavrar por transcrição), cumpre entender que às demais entidades competentes para formalizar actos jurídicos privados, quando autenticam documentos particulares, cabe observar não apenas as disposições legais constantes dos artigos 150º a 152º do Código do Notariado, como também todas aquelas a que o Notário estaria obrigado se a sua participação fosse pretendida pelas partes para o mesmo efeito. Assumirão, portanto, nestas vestes, a natureza de “órgão especial do notariado” [artigo 3º, n.º 1, alínea d), Código do Notariado].

• Objecto do registo • I) Várias posições são teoricamente admissíveis e já

foram, de facto, formuladas acerca daquilo que constitui o quid registável.

• Uma opinião clássica, provavelmente irreflectida (provavelmente, por isso, não é exactamente uma opinião), afirma que o objecto do registo é constituído por direitos.– É evidente, porém, o desacerto desta visão, não apenas por razões teóricas,

mas práticas acima de tudo. Torna-se impossível registar um direito, porque este é uma realidade meramente intelectual, ideal, e por conseguinte não se vê meio de se poder reduzi-lo à materialidade da descrição por escrito . E ainda que o "registo do direito" fosse feito na perspectiva da titularidade (isto é, por exemplo, algo do género "A comprou x, logo A é proprietário de x"), esse registo seria sempre uma afirmação mais ou menos gratuita, dado que o conservador não dispõe de meios para garantir efectivamente a veracidade de um assento feito nesses moldes “Os direitos, como qualidades morais e seres do esprito, escapam ás operações do Cadastro, e sómente podem apparecer como resultados dos factos, de que elle toma conta (Neto Paiva, O Cadastro, Imprensa da Universidade, Coimbra, 1849, pág. 9)”.

• Numa perspectiva extremamente formal, existem outros que afirmam que o objecto do registo é formado por documentos. É verdade, de facto, que a generalidade dos pedidos de registo se fundamenta, em termos probatórios, em documentos escritos. Mas isso não é, do ponto de vista substancial, uma necessidade absoluta. E, de qualquer modo, se acontece na maior parte dos casos, não é sempre, todavia . O que, desde logo, elimina a correcção desta opinião. Por outro lado, o documento, mesmo para efeitos registais, é apenas um meio probatório (artigo 362º), o que de resto é confirmado pela letra do artigo 43º/n.º 1 do Cód.Reg.Predial. Por último, o registo é, em geral, apenas um extracto do documento que eventualmente serviu de base à sua elaboração (cf., por exemplo, o artigo 76º/n.º 1/1ª parte, Cód.Reg.Predial), não uma transcrição integral do mesmo. Como, além disso, nem sempre aquele documento fica arquivado na Conservatória (ver, por exemplo, o artigo 26º/n.º 1 do Cód.Reg.Predial), torna-se óbvio que aquilo que o registo pretende publicitar não é exactamente o documento, mas antes o conteúdo básico que do mesmo resulta (portanto, a ideia nele contida, ou seja, certo facto).

• Nem se torna necessário buscar situações marginais. Basta, para exemplo, o caso da declaração de nascimento (artigo 96º, Cód.Reg.Civil).

• Numa visão materialista, também já se tem afirmado que o registo tem coisas por objecto . O que até tem alguma correspondência na letra da própria lei: repare-se, por exemplo, na denominação do Código aprovado pelo Decreto-Lei n.º 277/95 de 25 de Outubro: Código do Registo de Bens Móveis. Surge, no entanto, de imediato uma crítica óbvia: isto apenas quadraria aos registos reais e, mesmo assim, indiscutivelmente, só aos que se referem a coisas corpóreas.

• Precisamente a descrição predial, no registo predial, ou a matrícula, no registo comercial (artigo 62º, Cód.Reg.Comercial), que até são, em qualquer dos casos, assentos principais , demonstram que os actos de registo podem ter coisas ou pessoas por objecto. Acontece é que os citados registos não se limitam a tais objectos, nem serão esses actos de registo o essencial das instituições registais correspondentes, dado que não é sobre eles que se forma a fé pública registal Por conseguinte, assentos em torno dos quais se organizam aqueles registos públicos e, por isso, aos quais devem ser conexionados os restantes assentos.

• Ideia diferente se deve fazer, por fim, da opinião (maioritária) segundo a qual são os factos jurídicos o objecto do registo (v.g..,venda, doação, nascimento, casamento, óbito, etc.). Na verdade, não só os mais importantes actos de registo praticados têm por objecto os factos cuja inscrição é pedida, como é precisamente sobre a existência, veracidade e conteúdo dos mesmos que se fundamenta a confiança (fé pública) de terceiros.

• Isto é confirmado, por um lado, pela própria letra de uma série de disposições legais (cf., por exemplo, as alíneas a), b), c) e d) do n.º 1 do artigo 2º do Cód.Reg.Predial ou o n.º 1 do artigo 1º do Cód.Reg.Civil). E, por outro, por ser evidente que somente um facto será realidade minimamente acessível ao conhecimento do conservador (bem como, por sua vez, ao conhecimento dos terceiros a quem o registo se destina). Além de que aos terceiros interessa sobretudo conhecer a situação jurídica de certa pessoa ou coisa. Ora, apenas a partir dos factos que a conformam será exequível deduzir tal situação.

• O facto registado, aliás, à parte ser objecto dos actos próprios do registo, é simultaneamente objecto da própria publicidade registal. Isto é, sobre ele é que se forma a confiança de terceiros naquilo que do registo resulta

• Acontece, porém, que a publicidade registal vai mais longe: não se limita a atestar a verificação do facto; permite também que o público em geral se possa fiar nos efeitos que típica e normalmente se produzem associados a tal facto (cf., por exemplo, o artigo 7º do Cód.Reg.Predial ou o artigo 11º do Cód.Reg.Comercial) . Na verdade, o registo serve de base à presunção, não apenas de que o facto registado ocorreu efectivamente, como também de que o conteúdo, ou seja, os efeitos que em geral ele é susceptível de gerar, se produziram igualmente.

• O objecto da publicidade registal é, portanto, plural: • - por um lado, os factos que se registaram e que se provam precisamente

pelo registo, ou seja, documentalmente;• - por outro, as situações jurídicas que desse documento (ou seja, do

registo) se retiram por ilação e que, portanto, se provam por presunção (naturalmente ilidível, nos termos gerais do artigo 350º/n.º 2). Isto é, o público pode fiar-se, por exemplo, que se A registou a compra de x a seu favor será seu proprietário; se B registou uma hipoteca a seu favor terá efectivamente essa garantia constituída em seu benefício; etc.

• A conexão – isto é, a interligação de inscrições registais em torno de um determinado assento – supõe antes de mais determinados factores – usualmente designados pressupostos de conexão – de cuja verificação depende a própria exequibilidade dessa conexão. São eles: a determinação do objecto ao qual o registo se reporta e a fixação de regras de competência que estabeleçam quem fica obrigado a praticar os actos que possibilitam a conexão e quem é que deve conexionar O assento que tem por objecto a realidade à qual certo Direito Registal se refere (como já se disse, pessoa ou coisa, basicamente).

• Determinação do objectoOs registos podem ser reais ou pessoais. Os primeiros referem-se a coisas ou realidades equiparáveis (registo predial, registo de coisas móveis, propriedade industrial). Os segundos reportam-se a pessoas ou entidades afins (registo civil, registo comercial, registo de pessoas colectivas). Estes poderão distinguir-se em gerais e especiais, consoante se reportem à generalidade das pessoas (pelo menos de certa espécie) ou se reportem antes a pessoas com certa qualidade (registo comercial, por exemplo).

• Em qualquer caso, a realidade individual em relação à qual se publicita algo deve ser certa, deve estar suficientemente concretizada: por outras palavras, supõe-se um mínimo de individualização da pessoa ou da coisa a quem ou à qual determinada inscrição registal diz respeito .

• Esta individualização faz-se através de uma identificação tanto quanto possível exaustiva, atendendo-se para o efeito aos caracteres que essencialmente demarcam essa realidade face a outras da mesma espécie e natureza. Daí a formulação, no registo predial, do chamado princípio da especialidade.

• Assim, por exemplo : • - no registo predial, o acto de registo individualizador do

prédio é a descrição (artigos 79º e segs. do Cód.Reg.Predial), a qual "tem por fim a identificação física, económica e fiscal dos prédios" pelo que, por conseguinte, "de cada prédio é feita uma descrição distinta" . Da descrição devem constar basicamente, pelo menos, as menções a que alude o artigo 82º do Cód.Reg.Predial ;

• - no registo de bens móveis, este deverá conter as especificações a que se referem os artigos 43º, 48º/n.º 2 e 50º do Código do Registo de Bens Móveis;

• - no registo comercial, é a matrícula que identifica o comerciante através dos elementos a que o artigo 62º do Cód.Reg.Comercial faz referência;

• - no registo civil, é fundamentalmente o assento de nascimento que individualiza a pessoa singular em causa através dos elementos exigidos pelo artigo 102º/n.º 1 do Cód.Reg.Civil.

• No caso do registo predial, em que o elemento de conexão, ou seja, o território, tem natureza fixa e imutável, o dever de conexão supunha que todos os assentos relativos ao mesmo prédio estivessem realizados "na conservatória da situação dos prédios" (artigo 19º/n.º 1, Cód.Reg.Predial).

• Daí que, se a apresentação fosse feita em conservatória territorialmente incompetente, o registo eventualmente aí realizado fosse juridicamente inexistente [artigo 14º/a) do Cód.Reg.Predial] , embora o conservador devesse transferir "os documentos e cópia dos registos para a conservatória competente" (artigo 15º/n.º 3 do mesmo diploma); a partir da transferência, o registo passava a existir juridicamente.

• Todas estas regras foram entretanto abolidas a partir de 1 de Janeiro de 2009, pois, na medida em que os registos são agora lavrados por via electrónica [artigo 22º/b), Cód.Reg.Predial] numa base central de dados, desapareceu concomitantemente a aludida regra de competência territorial das Conservatórias (através da revogação do disposto no art. 19º). Por esta razão:

• – o registo pode ser pedido em qualquer Conservatória, independentemente da área de localização do imóvel ;

• – deixa de haver fundamento para tornar juridicamente inexistente o registo feito em Conservatória situada em área diversa daquela onde o imóvel se localiza [daí a revogação simultânea da alínea a) do art. 14º do Cód.Reg.Predial].

• Ainda assim a competência territorial não se tornou inteiramente irrelevante uma vez que “as certidões negativas de registos têm de ser confirmadas pelo serviço de registo da área da situação do prédio” (art. 110º-A, n.º 2, Cód.Reg.Predial).

Espécies e elementos de conexão•  • Existem duas espécies de conexão:• a) conexão de alteração, sempre que se registam factos que de algum modo modificam

uma situação jurídica anterior, tal como ela resulta do registo, mas que não sejam isoladamente objecto de qualquer assento próprio;

• b) conexão de referência, sempre que os factos posteriormente registados que modificam uma situação anterior, tal como ela resulta do registo, sejam por si objecto de um assento próprio.

• Em qualquer dos casos, conectam-se factos. Mas, nesta segunda espécie de conexão, também se conectam assentos. Daí decorre a importância da distinção: é que a forma como se procede à conexão de referência não é necessariamente igual à forma como se procede à conexão de alteração. Na primeira, uma vez que já existe um assento do facto em causa, não se torna indispensável proceder a uma segunda descrição extensiva (por escrito) do mesmo (através de averbamento que o resuma ) . E, aliás, nem sempre a referida distinção se funda apenas em razões formais: por exemplo, no registo predial ou no registo comercial, dificilmente se conceberia um sistema que não implicasse, no mínimo, dois assentos: descrição predial e matrícula, de um lado; inscrições a elas relativas, do outro.

Elementos da conexão de alteração

Esta conexão implica dois elementos: o assento e os averbamentos através dos quais se registam os factos que modificam a situação jurídica que daquele assento decorre.

•No registo predial, é possível proceder a averbamentos a ambos os assentos prediais: descrição (artigos 88ºe segs.) e inscrição (artigos 100º e segs.).• No que toca especificamente aos averbamentos a este último assento, surge uma especial dificuldade no que respeita à formulação do critério a que materialmente obedece a distinção inscrição/averbamento à inscrição.• Uma hipótese de explicação seria considerar exaustiva a enumeração do artigo 101º do Cód.Reg.Predial, de modo que todo o registo que aí não coubesse seria necessariamente uma inscrição. No entanto, então não teria razão de ser, em primeiro lugar, a regra dos n.º 1 e 2 do artigo 100º, nem, em segundo lugar, a própria epígrafe do artigo 101º (averbamentos especiais).• Mais vale, portanto, aceitar a indicação do artigo 101º em termos estritamente formais : em todos os casos aí estabelecidos deve o conservador proceder a um averbamento porque a lei assim o diz. Aliás, levando em consideração todo o artigo 101º, torna-se quase impossível descobrir um fio condutor comum. • Fora do âmbito do artigo 101º, aplicar-se-ão as regras dos n.º 1 e 2 do artigo 100º. Razão pela qual se pode afirmar que, em geral, cada acto transmissivo ou constitutivo de direitos dá origem a uma inscrição, o que, de resto, é confirmado pelo artigo 95º

• Elementos da conexão de referência• Como está em causa a interligação entre dois assentos, os elementos de

conexão são precisamente esses dois assentos acrescidos dos elementos que formalmente executam a interligação. Estes podem ser averbamentos ou apenas cotas de referência. Por outro lado, como a conexão entre os assentos é unilateral, um dos assentos – justamente aquele no qual é feito o averbamento ou é lançada a cota de referência ao outro – será o principal; estoutro, por consequência, será o secundário.

• O averbamento é um resumo (portanto, um extracto) do facto ocorrido e, por isso, no caso da conexão de referência, é um resumo do assento secundário (artigo 76º/n.º 2 do Cód.Reg.Predial). As cotas de referência são expressões codificadas que identificam certo assento. • No caso do registo predial, a conexão de referência é estabelecida de forma

relativamente simples: como só há dois assentos, descrição e inscrição, sendo o primeiro a chave de uma organização registal predial de fólio real como a nossa, a descrição é naturalmente o assento principal e a inscrição o assento secundário. Uma vez que o registo é agora lavrado por via electrónica, procede-se à ligação entre ambos os assentos lançando “no seguimento da descrição do prédio … as inscrições ou as correspondentes cotas de referência“ (artigo 79º/n.º 3 do mesmo diploma).

• Processo registal - O processo registal predial é composto, lógica e necessariamente, pelas seguintes fases: apresentação, instrução, qualificação.

• Cronologicamente, a sequência será a seguinte :• "1º La previa producción extrarregistal de la modificación jurídico-real .• 2º La plasmación de la modificación jurídico-real en una documentación pública e

auténtica .• 3º La formulación de una declaración de voluntad de un particular, dirigida al

registrador, en la cual se pretenda la práctica de un asiento. ...• 4º La presentación en el Registro de los títulos o documentos que justifiquen

dicha pretensión y la reunión por tales documentos de las exigencias establecidas en la Ley para que el asiento pueda practicarse.

• 5º Cuando la mutación que el Registro debe publicar entraña una modificación de una anterior situación registral – lo que ocurra en todos los caso en que no sea una primera inscripción – debe derivar del titular inscrito (tracto sucesivo).

• Una vez iniciado y puesto en marcha el procedimiento registral" segue-se: • "1º La formulación por el funcionario encargado del Registro de un juicio sobre la

legalidad de la pretensión y sobre la validez y eficacia de las mutaciones jurídico-reales que se pretende publicar en el Registro (calificación), y la adopción de una decisión.

• 2º La eventual interposición de los recursos pertinentes contra la decisión del registrador, (...)".

• Sujeitos, em geral• Por sujeitos do processo registal entendem-se as

partes entre as quais se estabelece a relação (relação processual registal) que tem por finalidade obter a publicação de certo facto.

• As partes do processo registal são assim:• - o apresentante; • - a Conservatória competente.

• O primeiro deve identificar-se desta forma tão ampla (cf. o artigo 42º/n.º 1, Cód.Reg.Predial) na medida em que pode tratar-se de pessoa com interesse na sua realização (artigo 36º/n.º 1/1ª parte, Cód.Reg.Predial) ou pode muito simplesmente consistir em pessoa obrigada à sua promoção (artigo 36º/n.º 1/in fine, Cód.Reg.Predial).

• Iniciativa – Pedido de registo• Em abstracto, a iniciativa do processo registal tanto pode pertencer

ao que apresenta o pedido de registo como à própria Conservatória. Neste caso, no entanto, o registo será oficioso e, portanto, não existirá apresentante . Apesar de excepcionais, estes casos multiplicam-se ainda assim (por exemplo, no Cód.Reg.Predial, os casos dos artigos 90º, 92º/n.º 7, 101º/n.º 4 e n.º 5).

• A oficiosidade para desencadear o processo registal também pode ser imposta a entidades distintas da própria Conservatória, como adiante se verá.

• Têm legitimidade para pedir o registo predial (artigo 36º, Cód.Reg.Predial): – os sujeitos, activos ou passivos, da respectiva relação jurídica; – em geral, todas as pessoas que nele tenham interesse; ou – aquelas que estejam obrigadas à sua promoção.

• Em geral (artigo 8º-C/n.º 1, Cód.Reg.Predial), o registo predial deve ser pedido no prazo de 30 dias a contar: • a) da data em que tiverem sido titulados os factos; ou • b) da data do cumprimento das obrigações fiscais quando este deva ocorrer depois da

titulação.

• Deve, porém, ser pedido no prazo de 10 dias:• a) o registo das acções referidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 3º, quando sujeitas ao

registo dito obrigatório [contados após a data da audiência de julgamento (artigo 8º-C/n.º 2)];• b) o registo das decisões finais proferidas nestas acções [contados a partir do respectivo

trânsito em julgado (artigo 8º-C/n.º 3)];• c) o registo das providências decretadas nos procedimentos referidos na alínea d) do artigo 3.º

[contados a partir da data em que tiverem sido efectuadas (artigo 8º-C/n.º 4)];• d) o registo dos actos praticados no âmbito da alínea a) do nº 1 do artigo 8º-B deve ser

promovido através de comunicação efectuada pelas entidades aí referidas [contados após a prática do acto (artigo 8º-C/n.º 5)];

• e) o registo correspondente às hipóteses decorrentes das alíneas b) a e) do n.º 1 e na alínea b) do n.º 3 do artigo 8º-B [contados a partir da data da titulação dos factos (artigo 8º-C/n.º 6)].

• É de concluir, assim, que o prazo geral de 30 dias acaba, afinal, por funcionar muito residualmente.

• O pedido de registo predial (apresentação) pode ser efectuado por via electrónica [preferencialmente até nos casos das alíneas a) e d) do nº 1 e do nº3 do artigo 8º-B – artigo 42º-A], por telecópia (fax), por via imediata, pelo correio ou presencialmente (artigo 41º-B):

• 1. A apresentação efectuada presencialmente pode revestir a forma verbal (Portaria n.º 621/2008 de 18/07, artigo 2º/n.º 1);

• 2. A apresentação por via postal e por via imediata faz-se por forma escrita, de acordo com modelos aprovados (Portaria nº 621/2008, artigo 2º/n.º 2) – no segundo caso, “o pedido e os respectivos documentos são apresentados mediante depósito imediato, em envelope, em caixa própria para o efeito existente no serviço” (Portaria nº 621/2008, artigo 2º/n.º 5);

• 3. Na apresentação por telecópia, “o pedido de registo deve ser assinado pelo advogado, notário, solicitador ou representante da câmara de comércio e indústria que o subscreve e conter o respectivo carimbo”; estes “devem manter arquivados os originais do requerimento e dos documentos transmitidos” assim como “devem indicar no pedido de registo que os documentos transmitidos estão conformes com o respectivo original” (Portaria n.º 621/2008, artigo 6º/n.º 2, n.º 3 e n.º 6);

• 4. A apresentação por via electrónica faz-se através do sítio na Internet www.predialonline.mj.pt (artigo 18º/n.º 1, Portaria n.º 621/2008); a apresentação online só é considerada validamente submetida após a emissão de um comprovativo electrónico pelo sítio referido que indique a data e a hora em que o pedido foi concluído (artigo 21º/n.º 1 da citada Portaria).

• Ao acto que dá origem ao processo registal chama-se apresentação.

• O facto de tal processo se poder iniciar a instância de uma entidade distinta da própria Conservatória, não implica necessariamente que a apresentação seja opcional. Na verdade, devem distinguir-se, ao menos, três paradigmas: • - casos de registo obrigatório; • - casos de registo indirectamente obrigatório; e,• - casos de registo facultativo.

– O registo é obrigatório sempre que a sua promoção represente um dever para a pessoa com legitimidade para o efeito e, portanto, sempre que a sua falta implique a aplicação de sanções de natureza penal àquele que estava vinculado à apresentação. É exemplo paradigmático, em geral, o registo civil (artigo 295º/n.º 1, especialmente). Constitui igualmente exemplo o registo comercial, embora apenas em algumas situações (artigos 15º e 17º)

– O registo é indirectamente obrigatório quando se conceda à pessoa com legitimidade para tanto o poder de optar entre apresentar ou não apresentar o pedido de registo, embora, caso não o faça, isso lhe possa acarretar determinadas desvantagens. Por isso, quando tal suceda, registar será, não um dever, mas antes um ónus jurídico . Era exemplo normalmente apontado precisamente o do registo predial antes de implantada a reforma que vigora desde 1 de Janeiro de 2009.

– Por fim, o registo é facultativo quando promover ou não promover o registo seja totalmente indiferente para quem tiver legitimidade para o pedir.

• Entre os artigos 8º-A e 8º-D do Cód.Reg.Predial consagra-se, provavelmente, a maior novidade trazida pela mais recente reforma do registo predial: a chamada obrigatoriedade da sua promoção.

• Antes de mais, convém, no entanto, fazer duas precisões:

– Entre o registo facultativo e o registo obrigatório stricto sensu há uma série de possibilidades intermédias – o indirectamente obrigatório, usando a terminologia que ficou consagrada para caracterizar o regime que vigorou até 31 de Dezembro de 2008, é aquele em que a respectiva apresentação constitui um ónus para o interessado;

– Por outro lado, uma coisa é registo obrigatório, outra é registo oficioso, outra ainda é registo com efeito constitutivo – não obstante qualquer delas contribuir (tendencialmente) para o estabelecimento de uma maior congruência entre a realidade registal e a realidade extraregistal, não operam ao mesmo nível nem constituem categorias indiferenciadas.

• Crê-se que o registo só é verdadeiramente obrigatório em sentido estrito (“directamente obrigatório”, no dizer do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 116/2008), desde que:

• 1º - a falta da apresentação correspondente seja punida através de alguma sanção (como sucedia na vigência do Cód.Reg.Predial de 1967 nos concelhos onde estivesse em vigor o cadastro geométrico da propriedade rústica – artigos 14º, 15º, 16º e 280º: pois então a apresentação extemporânea dava lugar a auto de transgressão, pagamento de multa e procedimento criminal, por desobediência qualificada, caso aquele não ocorresse);

• 2º – a pessoa sancionada seja o interessado na respectiva realização – ou, por outras palavras, seja o beneficiário dos efeitos do facto registável .

– Ora, isto geralmente não sucede. Normalmente, “a responsabilidade pelo agravamento (para o dobro – artigo 8º-D/n.º 1, Cód.Reg.Predial) do emolumento … recai sobre a entidade que está obrigada a promover o registo e não sobre aquela que é responsável pelo pagamento do emolumento” (artigo 8º-D/n.º 3, Cód.Reg.Predial).

• Assim, bem vistas as coisas, para o interessado, a promoção do registo predial ainda é menos indirectamente obrigatório do que era até 31 de Dezembro de 2008:• – é que, na hipótese típica [a do interessado ser um particular – alínea

f)], o registo só é obrigatório quando se trate de facto para o qual mais nenhuma entidade tenha o dever de promover a correspondente apresentação (o que será hipótese claramente residual – artigo 8º-B/n.º 2, Cód.Reg.Predial);

• – fora desta situação, o referido interessado tem (apenas) o ónus de verificar se a entidade a quem incumbe o dever de proceder à apresentação em causa efectivamente o fez e actuar em sua substituição caso tal não tenha sucedido (artigo 8º-B/n.º 5 e 36º, Cód.Reg.Predial) se assim o entender, sem prejuízo da responsabilidade inerente.

• Por conseguinte, em conclusão, parece mais apropriado dizer que o registo predial não é propriamente obrigatório mas antes oficioso.

• O que significa que existirão agora duas modalidades de oficiosidade na promoção do registo:• 1ª) aquela que incide sobre a própria Conservatória (relativamente à qual, porém, não

existe, tal como sucede com os Tribunais e com o Ministério Público, sanção para o não cumprimento do dever correspondente – art. 8º-C/n.º 7, Cód.Reg.Predial);

• 2ª) e aquela que recai sobre as entidades enumeradas pelo art. 8º-B – o que acarreta, por consequência, que em hipóteses como as integráveis na alínea b) do nº 1 do art. 8º-B, ao dobro do emolumento, acresça responsabilidade disciplinar.

• Claro que entre estas duas espécies de oficiosidade existe uma marcada diferença: Na primeira, o registo faz-se quer o interessado queira, quer não queira (por isso são tão pouco numerosas as situações aqui integráveis); na segunda, o registo jamais se fará se a entidade a quem cabe o dever de o promover o não cumprir Poderia levantar-se a questão de saber se nos casos de oficiosidade, particularmente naqueles que cabem na previsão do artigo 8º-B do Cód.Reg.Predial, não se estaria na presença de uma hipótese paralela à do contrato com eficácia de protecção para terceiro.

• Princípio da legitimação

• I) Ao artigo 9º/n.º 1 está subjacente o chamado princípio da legitimação, segundo o qual somente o titular registal se "considera legitimado para actuar en el tráfico y en el proceso como tal titular, es decir tanto en el ámbito extrajudicial como en el judicial, y en la forma que el proprio asiento determina". Razão pela qual, todo o facto registável com eficácia transmissiva ou constitutiva de encargos sobre imóveis, somente poderá ser titulado quando o transmitente ou aquele que sofre a oneração mostre ter registo definitivo a seu favor em relação ao imóvel em causa.

• Isto é, parte-se do princípio que o titular registal é o verdadeiro titular do direito em causa (artigo 7º do Cód.Reg.Predial). Pelo que, portanto, em regra, apenas esse titular registal tem legitimidade para intervir em qualquer documentação (solene, pelo menos), referente ao imóvel relativamente ao qual beneficia de inscrição definitiva a seu favor.

• A compreensão da disposição em causa supõe, antes de mais, uma clarificação relativa ao conceito de título. Na acepção substancial, título é "o facto ou conjunto de factos de que" (a relação jurídica) "tira a sua existência e o seu conteúdo e regime". Diversamente, na sua acepção formal, título é sinónimo de documento escrito. É obviamente nesta última acepção que o termo é empregue no referido artigo 9º do Cód.Reg.Predial.

• Neste sentido, o artigo 9º/n.º 1 impõe um certo dever a todas as entidades com competência para documentar – isto é, titular – actos jurídicos particulares. O que, pelo menos, abrange:• - o Notário (artigo 1º do Cód.Notariado); • - as entidades com competência para autenticar ou legalizar

documentos particulares sempre que estes sejam suficientes para formalizar actos jurídicos relativos a imóveis (artigo 22º, Decreto-Lei n.º 116/2008), ou seja, actualmente, “as câmaras de comércio e indústria, reconhecidas nos termos do Decreto-Lei n.º 244/92 de 29 de Outubro, os conservadores, os oficiais de registo, os advogados e os solicitadores” (artigo 38º/n.º 1, Decreto-Lei n.º 76-A/2006 de 29/03);

• - e também, em algumas situações, o Tribunal (quando, por exemplo, profere decisão de execução específica nos termos do artigo 830º)

• O dever que é imposto a tais entidades está implícito na disposição contida no artigo 9º/n.º1: não poderão documentar, isto é, dar forma legal, aos actos jurídicos dos particulares enquanto não for apresentada certidão do registo predial demonstrando que aquele que transmite ou onera tem inscrição em vigor a seu favor. O que indiscutivelmente força a realização da apresentação registal.

• A inobservância deste dever por parte das entidades em causa, acarretará responsabilidade civil, penal ou disciplinar sobre as mesmas, mas não implica, com certeza, qualquer consequência sobre o acto jurídico particular indevidamente formalizado

• O ponto que essencialmente demarca a aplicação do artigo 9º/n.º1 reside na titulação de factos transmissivos ou constitutivos de encargos.

• O facto transmissivo abrangerá sem dificuldade todos os casos de aquisição derivada translativa.

• Contrariamente, o acto constitutivo de encargos, embora pareça indicar acto de oneração, assume aqui um sentido diferente (rigorosamente, um sentido mais amplo), tendo em consideração a enumeração constante do n.º 1 do artigo 2º do Cód.Reg.Predial. Na realidade, resulta daqui que, por exemplo, também há constituição de encargos quando se constitui o apanágio do cônjuge sobrevivo (artigo 2º/n.º 1/p) e artigo 2018º) ou quando se constituem "quaisquer outras restrições ao direito de propriedade" [artigo 2º/n.º 1/u)]. Por conseguinte, acto constitutivo de encargos vai aqui no sentido de qualquer acto que imponha limitações ao exercício do direito daquele contra quem se constitui, independentemente de daí resultar ou não a atribuição a terceiro de um direito real.

• No artigo 34º está contido o princípio chamado do trato sucessivo (continuità delle trascrizioni).

• Como se podia antever do que se disse sobre o princípio da legitimação, o trato sucessivo tem dois sentidos. • Um sentido material, a que já se fez referência, segundo

o qual a demonstração da titularidade do direito supõe a verificação de um nexo ininterrupto de factos aquisitivos, válidos e eficazes, desde o primeiro titular até ao actual. Interessa aqui, portanto, o aspecto substantivo, independentemente de a referida sucessão de factos surgir correctamente retratada no registo ou não.

• Diversamente, em sentido formal, o trato sucessivo supõe apenas que do registo conste um encadeamento lógico de inscrições, independentemente de o mesmo corresponder (ou não) àquilo que na verdade sucedeu (embora, evidentemente, se pretenda a máxima correspondência possível).

• O artigo 34º consagra, claro, o trato sucessivo formal. Deve-se, aliás, ter em conta que, ao pretender-se uma sucessão lógica no arquivo registal, o que está basicamente em causa é um problema de racionalidade do próprio registo. Daí que a realização de uma inscrição possa "forçar" a realização de inscrições anteriores eventualmente em falta mas só do ponto de vista registal. • (Sublinha-se, do ponto de vista registal. Repare-se, por exemplo, que se

A, que tem inscrição a seu favor, vende a B, que não inscreve, e B vende a C, que pretende inscrever, basta que A e C façam uma escritura pública de venda (absolutamente) simulada do primeiro para o segundo para, registalmente, existir um encadeamento lógico de factos registáveis)

• Contudo, também é certo que essa exigência de racionalidade tem repercussões externas, na medida em que o referido encadeamento de inscrições assenta no pressuposto de que as mesmas correspondem à realidade (o que está especialmente acertado se o dever imposto pelo artigo 9º/n.º 1 for observado).

• A compreensão do disposto no artigo 34º supõe que se distinga o âmbito de aplicação, respectivamente, do seu n.º 1 e n.º 2, por um lado, e do seu n.º 4, por outro. • O n.º 1 e o n.º 2 supõem prédios registalmente

inexistentes, portanto, prédios não descritos, ou então, prédios descritos mas sem qualquer inscrição em vigor. Ao invés, o n.º 4 supõe prédios descritos e com inscrição em vigor, desde que essa inscrição seja de aquisição ou reconhecimento de direito transmissível ou seja inscrição de mera posse

• No âmbito do n.º 1 (pensado para a aquisição derivada constitutiva negocial), a realização do primeiro registo não implica a realização dos registos anteriores relativos aos factos que fundam a titularidade subjacente àquele primeiro registo, salvo se:• - se tratar de aquisição por negócio

jurídico, desde que • - tenha por efeito a constituição de

encargos.• Nestes casos, exige-se inscrição prévia a favor

daquele contra quem se constitui o encargo.

• Para efeitos do n.º 2 (concebido para a aquisição derivada translativa, de carácter negocial ou não), a realização da primeira inscrição também não implica a realização de registos anteriores relativos a factos que fundam a titularidade subjacente àquele primeiro registo, salvo se “o documento comprovativo do direito do transmitente não tiver sido apresentado perante o serviço de registo”.• De todo o modo, “a inscrição prévia … é sempre

dispensada no registo de aquisição com base em partilha” (n.º 3).

• No âmbito do n.º 4, exige-se a realização de todas as inscrições intermédias eventualmente em falta entre aquela que está em vigor e actual, desde que a que esteja em vigor seja uma daquelas a que a disposição se refere e a mesma tenha natureza definitiva.

• Não importa se a aquisição ocorre por negócio jurídico ou por qualquer outro título, embora obviamente estejam excluídas do seu âmbito de aplicação todas as aquisições originárias (usucapião, por exemplo). Estas implicam antes o chamado reinício do trato sucessivo (artigo 116º/n.º 3 do Cód.Reg.Predial).

• Exceptuam-se à aplicação do n.º 2, entre outros, os casos em que:• - o registo posterior é consequência de outro anteriormente

lavrado a título definitivo (por exemplo, registo de "penhora de bens em execução hipotecária, quando a respectiva hipoteca se encontra definitivamente inscrita"); ou,

• - se verifique a hipótese do artigo 35º.

• A impossibilidade prática de provar o facto ou factos necessários à inscrição prévia ou à/s intermédia/s pelos meios normais – documentos, designadamente – permite àquele que pretende efectuá-las recorrer aos chamados meios de justificação (notarial – artigos 89º e segs. do Cód.Notariado; ou registal, artigos 117º e segs. do Cód.Reg.Predial), nos termos do artigo 116º do Cód.Reg.Predial.

• No primeiro caso, a finalidade é obter um documento autêntico – escritura pública – pelo qual se reconstitua o devir histórico do/s facto/s cujo registo deveria ter sido promovido (por exigência do trato sucessivo registal). É com fundamento no conteúdo desse documento que se procederá à inscrição prévia ou às intermédias.