aos que virão: hermenêutica ambiental em prol das gerações vindouras

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Aos que virão: hermenêutica ambiental em prol das gerações vindouras Lista de abreviaturas: ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade APP área de preservação permanente CAR Cadastro Ambiental Rural CFF novo Código Florestal Federal, Lei 4771/1965 e alterações, nomen iuris descrito na ementa da norma 1 CR Constituição da República julg. julgado a LACP Lei de Ação Civil Pública, Lei 7347/1985 e alterações LCIAA Lei de Crimes e Infrações Administrativas, Lei 9605/1998 e alterações LPAF Lei de Processo Administrativo Federal, Lei 9784/1999 e alterações PNMA Política Nacional do Meio Ambiente, Lei 6938/1981 e alterações PRA Programa de Regularização Ambiental publ. publicado a RL reserva legal SISNAMA Sistema Nacional do Meio Ambiente STF Supremo Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça TRF Tribunal Regional Federal v.g verbi gratia, por exemplo 1 In http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4771.htm, acesso a 22.10.2014. 1

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Aos que virão: hermenêutica ambiental em prol das geraçõesvindouras

Lista de abreviaturas:ADI – Ação Direta de

InconstitucionalidadeAPP – área de preservação

permanenteCAR – Cadastro Ambiental RuralCFF – novo Código Florestal

Federal, Lei 4771/1965 e alterações,nomen iuris descrito na ementa danorma1

CR – Constituição da Repúblicajulg. – julgado a LACP – Lei de Ação Civil Pública,

Lei 7347/1985 e alteraçõesLCIAA – Lei de Crimes e Infrações

Administrativas, Lei 9605/1998 ealterações

LPAF – Lei de ProcessoAdministrativo Federal, Lei9784/1999 e alterações

PNMA – Política Nacional do MeioAmbiente, Lei 6938/1981 ealterações

PRA – Programa de RegularizaçãoAmbiental

publ. – publicado aRL – reserva legalSISNAMA – Sistema Nacional do Meio

AmbienteSTF – Supremo Tribunal FederalSTJ – Superior Tribunal de JustiçaTRF – Tribunal Regional Federalv.g – verbi gratia, por exemplo

1In http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4771.htm, acesso a 22.10.2014.

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Alessandro Amaral Oliveira

Aos que virão: hermenêutica ambiental em prol dasgerações vindouras

ALESSANDRO AMARAL OLIVEIRA: Procurador Federal em exercício na Coordenação Nacional de

Contencioso Judicial da Procuradoria Federal Especializada junto ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente

e dos Recursos Naturais Renováveis (COJUD/PFE-IBAMA-MT), Órgão da Procuradoria-Geral Federal e

da Advocacia-Geral da União (PGF/AGU), a partir de 2015. Coordenador da PFE-IBAMA-MT/PGF/AGU

entre 2011 e 2015. Especialista em Direito Público pelo Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix em

parceria com a Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (ANAMAGES), em 2004. Bacharel em

Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (FD/UFMG), em 2002.

Introdução

A Constituição da República estabelece que “Todos têmdireito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bemde uso comum do povo e essencial à sadia qualidade devida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade odever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes efuturas gerações”, e que “Para assegurar a efetividadedesse direito, incumbe ao Poder Público [...] preservar erestaurar os processos ecológicos essenciais e prover omanejo ecológico das espécies e ecossistemas [...]”(art.225,caput,e§1º,I, negritamos). Nossa Constituiçãopositivou também que “As condutas e atividadesconsideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão osinfratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais eadministrativas, independentemente da obrigação dereparar os danos causados” (art.225§3º, negritamos). Apar destas regras, podemos extrair importantes

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diretrizes constitucionais ao bem-ambiente dos arts.1º,III,2

3º,3 5º,XXIII,4 23,VIeVII,5 24,VI,6 170,IIIeVI,7 e 186,IeII8.

A Lei 12.651/2012, alterada pela Lei 12.727/2012, ao ditara revogação do novo Código Florestal Federal (CFF -Lei 4771/1965 e alterações),9 aparentemente suprimiualgumas obrigações de preservação do ecossistema ereparo a dano em suposto prejuízo às gerações atuais evindouras, notadamente no que toca a áreas depreservação permanente (APP) e reservas legais (RL),quando reduzidas ou extintas, sendo exemplos o art.4º(que, para a medição da APP, passou a considerar, não onível mais alto do corpo hídrico, mas seu nível regular) e o

2Art.1ºA República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados eMunicípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e temcomo fundamentos:[...]III-a dignidade da pessoa humana;[...]3Art.3ºConstituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:I-construir uma sociedade livre, justa e solidária;II-garantir o desenvolvimento nacional;III-erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;IV-promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade equaisquer outras formas de discriminação. 4Art.5ª[...]XXIII-a propriedade atenderá a sua função social;[...]5Art.23.É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dosMunicípios:[...]VI-proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; VII-preservar as florestas, a fauna e a flora;[...]6Art.24.Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentementesobre:[...]VI-florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dosrecursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;[...]7Art.170.A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livreiniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames dajustiça social, observados os seguintes princípios:[...]III-função social da propriedade;[...]VI-defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme oimpacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração eprestação;[Redação dada pela Emenda Constitucional 42 de 19.12.2003][...]8Art.186.A função social é cumprida quando a propriedade rural atende,simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aosseguintes requisitos:I-aproveitamento racional e adequado;II-utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meioambiente;[...]9In http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4771.htm, acesso a 22.10.2014.

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art.67 daquela Lei (que gerou um aparente permissivo ànão reparação da RL, se sua destruição se dera antes de22.07.2008 em imóvel inferior a 4 módulos fiscais).

Traz-se aqui proposta hermenêutica de solução a estaantinomia aparente, estabelecendo leitura da Lei12.651/2012 cc 12.727/2012 que a harmonize com aConstituição da República, à luz da Jurisprudência doSupremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal deJustiça (STJ).

1.Comando constitucional bem-ambiental aoLegislador

Dê-se o nome que se queiraa isso, mas nos parece claropodermos extrair da Constituição três premissasjurídico-ambientais destinadas ao Legislador: (1)asleis ambientais devem salvaguardar o direito, não só dasgerações presentes, mas também das gerações futuras,logo, não podem suprimir ou reduzir direito vigente,principalmente considerando que os que virão nãoparticiparam nem participam do processo legislativo; (2)asleis ambientais devem assegurar a efetividade do direitodas gerações futuras, preservando e restaurando osprocessos ecológicos; e (3)há três esferas deresponsabilidade ambiental, a penal, a administrativa e acível – as duas primeiras podem ser minimizadas, pois,como sanção seguem o princípio da ultima ratio; já aobrigação constitucional de reparação dos danosambientais é irrenunciável pelo Legislador.

No âmbito do Supremo (STF), denomina-se Proibição deRetrocesso Social, o princípio aplicável ao Direito

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Ambiental que impede sejam desconstituídas asconquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formaçãosocial em que ele vive (AgI759543RJ, julgado [julg.] a28.10.2013 e publicado [publ.] a 28.10.2013)10,devendo o Estado abster-se de frustrar - mediantesupressão total ou parcial - os direitos sociais jáconcretizados (ARE715977SC, julg.18.02.2013 epubl.1º.03.2013)11, podendo o JUDICIÁRIO agir caso osoutros PODERES não cumpram com seu múnus, em meioaos quais o dever público de defesa ambiental(RE635073MG, julg.07.08.2014 e publ.12.08.2014)12.

10In http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudenciaDetalhe.asp?s1=000301341&base=baseMonocraticas, acesso a 22.10.2014.Refiro-me ao princípio da proibição do retrocesso, que, em tema de direitosfundamentais de caráter social, impede que sejam desconstituídas as conquistas jáalcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive, consoante adverteautorizado magistério doutrinário (GILMAR FERREIRA MENDES, INOCÊNCIOMÁRTIRES COELHO e PAULO GUSTAVO GONET BRANCO, “HermenêuticaConstitucional e Direitos Fundamentais”, 1ª ed./2ª tir., p. 127/128, 2002, BrasíliaJurídica; J. J. GOMES CANOTILHO, “Direito Constitucional e Teoria da Constituição”,p. 320/322, item n. 03, 1998, Almedina; ANDREAS JOACHIM KRELL, “DireitosSociais e Controle Judicial no Brasil e na Alemanha”, p. 40, 2002, Sergio Antonio FabrisEditor; INGO W. SARLET, “Algumas considerações em torno do conteúdo, eficácia eefetividade do direito à saúde na Constituição de 1988”, “in” Interesse Público,p.91/107, n. 12, 2001, Notadez; THAIS MARIA RIEDEL DE RESENDE ZUBA, “ODireito Previdenciário e o Princípio da Vedação do Retrocesso”, p. 107/139, itens ns. 3.1a 3.4, 2013, LTr, v.g.). 11In http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudenciaDetalhe.asp?

s1=000246387&base=baseMonocraticas, acesso a 22.10.2014.O princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais decaráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão oupela formação social em que ele vive. - A cláusula que veda o retrocesso em matéria dedireitos a prestações positivas do Estado (como o direito à educação, o direito à saúde ouo direito à segurança pública, v.g.) traduz, no processo de efetivação desses direitosfundamentais individuais ou coletivos, obstáculo a que os níveis de concretização de taisprerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser ulteriormente reduzidos ou suprimidospelo Estado. Doutrina. Em conseqüência desse princípio, o Estado, após haverreconhecido os direitos prestacionais, assume o dever não só de torná-los efetivos, mas,também, se obriga, sob pena de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los,abstendo-se de frustrar - mediante supressão total ou parcial - os direitos sociais jáconcretizados.12In http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudenciaDetalhe.asp?s1=000349927&base=baseMonocraticas, acesso a 22.10.2014.[…]1.A Corte Suprema já firmou a orientação de que é dever do Poder Público e dasociedade a defesa de um meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e

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Aplicando tal princípio especificamente ao DireitoAmbiental, o Superior Tribunal de Justiça (STJ)denominou-o Princípio da proibição do retrocessoecológico, assim o conceituando13:

Pressupõe que a salvaguarda do meioambiente tem caráter irretroativo: não podeadmitir o recuo para níveis de proteçãoinferiores aos anteriormente consagrados, amenos que as circunstâncias de fato sejamsignificativamente alteradas. Essaargumentação busca estabelecer um pisomínimo de proteção ambiental, para além doqual devem rumar as futuras medidasnormativas de tutela, impondo limites aimpulsos revisionistas da legislação.

Aplicando-o em concreto, o STJ deliberou em diversoscasos, do que faz exemplo o REsp0980709RS(2007/0207175-3, julg.11.11.2008, publ.02.12.2008)14, emque diz expressamente no voto do Min.Rel.HUMBERTO

MARTINS:

Inviável a aplicação de norma supervenientecom a finalidade de validar ato praticado soba égide da legislação anterior que,expressamente, contrariou a lei entãovigente.

No EREsp0418565SP (2009/0043549-3, julg.29.09.2010 epubl.13.10.2010)15, afastou aplicação de normatização

futuras gerações.2.Assim, pode o Poder Judiciário, em situações excepcionais, determinar que aAdministração pública adote medidas assecuratórias desse direito, reputado essencialpela Constituição Federal, sem que isso configure violação do princípio da separaçãode poderes.[...]13

In http://stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=97483, acesso a 22.10.2014.14In https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=200702071753&dt_publicacao=02/12/2008, acesso a 08.11.2014.15In https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=200900435493&dt_publicacao=13/10/2010, acesso a 06.11.2014.

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superveniente que autorizava queima de vegetação em facede norma anterior que vedava o ato.

Digno de nota também é o REsp0302906SP(2001/0014094-7, julg.26.08.2010 e publ.1º.12.2010)16:

EmentaPROCESSUAL CIVIL,ADMINISTRATIVO, AMBIENTAL EURBANÍSTICO. LOTEAMENTO CITYLAPA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AÇÃODE NUNCIAÇÃO DE OBRA NOVA.RESTRIÇÕES URBANÍSTICO-AMBIENTAIS CONVENCIONAISESTABELECIDAS PELO LOTEADOR.ESTIPULAÇÃO CONTRATUAL EMFAVOR DE TERCEIRO, DE NATUREZAPROPTER REM. DESCUMPRIMENTO.PRÉDIO DE NOVE ANDARES, EMÁREA ONDE SÓ SE ADMITEMRESIDÊNCIAS UNIFAMILIARES.PEDIDO DE DEMOLIÇÃO. VÍCIO DELEGALIDADE E DE LEGITIMIDADEDO ALVARÁ. IUS VARIANDIATRIBUÍDO AO MUNICÍPIO.INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA NÃO-REGRESSÃO (OU DA PROIBIÇÃO DERETROCESSO) URBANÍSTICO-AMBIENTAL. VIOLAÇÃO AOART.26,VII, DA LEI 6.766/79 (LEILEHMANN), AO ART.572 DO CÓDIGOCIVIL DE 1916 (ART.1.299 DO CÓDIGOCIVIL DE 2002) E À LEGISLAÇÃOMUNICIPAL. ART.334,I,DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.VOTO-MÉRITO.[...]10.O relaxamento, pela via legislativa,das restrições urbanístico-ambientaisconvencionais, permitido na esteira do ius

16In https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=200100140947&dt_publicacao=01/12/2010,acesso a 06.11.2014.

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variandi de que é titular o Poder Público,demanda, por ser absolutamente fora docomum, ampla e forte motivação lastreadaem clamoroso interesse público, posturaincompatível com a submissão doAdministrador a necessidades casuísticasde momento, interesses especulativos ouvantagens comerciais dos agenteseconômicos.11.O exercício do ius variandi, paraflexibilizar restrições urbanístico-ambientais contratuais, haverá de respeitaro ato jurídico perfeito e o licenciamento doempreendimento, pressuposto geral que, noDireito Urbanístico, como no DireitoAmbiental, é decorrência da crescenteescassez de espaços verdes e dilapidaçãoda qualidade de vida nas cidades. Por issomesmo, submete-se ao princípio da não-regressão (ou, por outra terminologia,princípio da proibição de retrocesso),garantia de que os avanços urbanístico-ambientais conquistados no passado nãoserão diluídos, destruídos ou negados pelageração atual ou pelas seguintes.[...]

Neste Julgado, não obstante superveniente alteraçãonormativa permissiva, o imóvel construído irregularmentesegundo norma vigente à data do fato, teve determinadasua demolição pelo STJ. Interessante transcrever aracionalidade da Decisão Superior por meio do voto doMin.Rel.HERMAN BENJAMIN:

“O que se tem, diante de nós, é fácil dedescrever para o leigo, sem necessidade debuscar – como temos sido obrigados a fazerneste Voto – teorias jurídicas complexas einstitutos de nomenclatura esquisita, sócompreensíveis aos iniciados. Leigos, nesteprocesso, são todos os milhares de lindeirospróximos e vizinhos remotos da obraembargada que, pelas mesmas razões que a

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empresa CCK afirma desconhecer,deixaram de construir em seus terrenos,conservaram suas residênciasunifamiliares, resistindo à tentação – que,no Brasil, amiúde compensa – de enfrentara lei e a oposição dos que se sentemprejudicados para edificar mais do que opermitido, ou de modo diverso dopermitido. Para essa população ordeira e agredida, apresente demanda pode ser resumida naluta entre os cumpridores e os infratores dalei, estes, mais à frente, por vezes com oamparo do Poder Judiciário, rebatizados deespertos, corajosos e empreendedores. Masnão passam de atrevidos. Felizmente, pelomenos nesta demanda, se pode clamar queainda há juízes! Pois em primeira esegunda instâncias se soube resgatar amarca da cidadania que são as obrigaçõesassumidas por particulares em favor dacoletividade.A ser diferente, que lição transmitiremosaos milhares de proprietários que,sossegada e pacificamente, cumpriram, evêm cumprindo, por dezenas de anos,as restrições urbanístico-ambientaisvigentes em São Paulo e em incontáveiscidades espalhadas por este imenso Brasil,da Amazônia aos Pampas?”

A mensagem do julgado é clara. O ato ilícito não podevaler à pena, sob o risco de ser estimulado.

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2.A Lei 12.651/2012 cc 12.727/2012, e a Constituição

2.1.ADIs

A Lei 12.651/2012 cc 12.727/2012 tem suaconstitucionalidade questionada por meio das AçõesDiretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 4901DF, 4902DFe 4903DF,17 propostas pelo Ministério Público Federal(MPF), ulteriormente reunidas em um só procedimento,18 epor meio da ADI4937DF19, proposta pelo PartidoSocialismo e Liberdade (PSOL) (com Perecer do MPFpela conexão com as do Parquet)20, todas incluindo comofundamento a fragilização da proteção ambientalpromovida pela revogação do novo Código FlorestalFederal (CFF - Lei 4771/1965 e alterações)21.

As ADIs pedem, no conjunto, a declaração deinconstitucionalidade dos artigos:3º,VIII,b,IX,XVIIeXIX,e§ú; 4º,IIIeIV,§§1º22,e4ºa6º; 5º;

17In http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=228842&caixaBusca=N, acesso a 04.11.2014.18In http://www.stf.jus.br/portal/diarioJustica/verDiarioProcesso.asp?numDj=26&dataPublicacaoDj=07/02/2013&incidente=4355097&codCapitulo=6&numMateria=5&codMateria=10, acesso a 08.11.2014.19In http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=235536,acesso a 04.11.2014.20Andamento de 02.07.2014 inhttp://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=4388129,acesso a 08.11.2014.21In http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4771.htm, acesso a 22.10.2014.22No Agravo de Instrumento 2012816-29.2013.8.26.0000 (MINISTÉRIO PÚBLICO DO

ESTADO DE SÃO PAULO [MPSP] x Cafeeira Bertin Ltda, Comarca de Lins), o TRIBUNAL

DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO (TJSP) julgou que os fatos ocorridos na vigênciado Código Florestal Federal são por esse regidos, aplicando-se o Princípio da Proibiçãodo Retrocesso: https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/abrirDocumentoEdt.do?origemDocumento=M&nuProcesso=2012816-29.2013.8.26.0000&cdProcesso=RI001XL170000&cdForo=990&tpOrigem=2&flOrigem=S&nmAlias=SG5SP&cdServico=190201&ticket=i04aS9XrwCeLvjYtoLE8mzbDmGLf%2FMwTyeWqRiDkbRiCy4IUZbNOKN4F0xYudKlvJSbYgCufpgo6S13naa%2FtBn01dlp92%2BGHI0iHgKWVoS2vkQg%2Fd2Uzp%2BGny%2BKR%2BYOwTWXptQignWFJch18b0slhWcGEm8R6Fb2GhNlGlZgxaUxUqNcgbHiVvuL47mi6m9INKdnndAn%2BKnMUBEvx%2BbLHBvUA8MLU1BI4kfv8Wr6LgY%3D e

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7º§3º; 8º§2º; 11; 12§§4ºa8º; 13§1º; 15; 17; 44; 48§2º;59§§2º,4ºe5º23; 60; 61A; 61B; 61C; 6224; 63;66,§§3,5º,IIaIV,e6º; 6725; 68; e78A.

Para a exposição que aqui se quer fazer, pinçamosilustrativamente alguns institutos consolidados descritosde modo diverso pela Lei 12.651/2012cc12.727/2012: APPe RL.

http://www.planetaverde.org/noticia/ambientais/2405/mp-sp-obtem-acordao-reconhecendo-que-novo-codigo-florestal-viola-principio-da-proibicao-do-retrocesso,ambos acessados a 15.12.2015.23Há Decisão Judicial, no controle difuso, reconhecendo a inconstitucionalidade destedispositivo: Ação 1156-59.2013.4.01.3603/MT/TRF1, julg.07.04.2014,publ.11.04.2014, Juiz EDUARDO DE MELO GAMA, inhttp://processual.trf1.jus.br/consultaProcessual/processo.php?trf1_captcha_id=72e2d1f2c03bf1807c046c07ee2b3330&trf1_captcha=v9pj&enviar=Pesquisar&proc=11565920134013603&secao=SNO, acesso a 28.11.2014.No controle concentrado, ao julgar a Arguição de Inconstitucionalidade 0039647-38.2011.8.13.0144 ou 1.0144.11.003.964-7/002 (MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE

MINAS GERAIS [MPMG] x Sinézia Maria da Silva Santos e Paulo Marcelo dos Santos,Comarca de Carmo do Rio Claro), o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS

GERAIS (TJMG), reconheceu a inconstitucionalidade da norma por ofensa aosarts.186,II, e 225CR: http://www4.tjmg.jus.br/juridico/sf/proc_movimentacoes2.jsp?listaProcessos=10144110039647002 ,http://www4.tjmg.jus.br/juridico/sf/proc_partes_advogados2.jsp?listaProcessos=10144110039647002 ehttps://www.mpmg.mp.br/comunicacao/noticias/tjmg-declara-a-inconstitucionalidade-do-artigo-67-do-novo-codigo-florestal.htm#.Vm92J7_w_2I , acessados a 15.12.2015.24No Agravo de Instrumento 2012816-29.2013.8.26.0000 (MINISTÉRIO PÚBLICO DO

ESTADO DE SÃO PAULO [MPSP] x Cafeeira Bertin Ltda, Comarca de Lins), o TRIBUNAL

DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO (TJSP) julgou que os fatos ocorridos na vigênciado Código Florestal Federal são por esse regidos, aplicando-se o Princípio da Proibiçãodo Retrocesso: https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/abrirDocumentoEdt.do?origemDocumento=M&nuProcesso=2012816-29.2013.8.26.0000&cdProcesso=RI001XL170000&cdForo=990&tpOrigem=2&flOrigem=S&nmAlias=SG5SP&cdServico=190201&ticket=i04aS9XrwCeLvjYtoLE8mzbDmGLf%2FMwTyeWqRiDkbRiCy4IUZbNOKN4F0xYudKlvJSbYgCufpgo6S13naa%2FtBn01dlp92%2BGHI0iHgKWVoS2vkQg%2Fd2Uzp%2BGny%2BKR%2BYOwTWXptQignWFJch18b0slhWcGEm8R6Fb2GhNlGlZgxaUxUqNcgbHiVvuL47mi6m9INKdnndAn%2BKnMUBEvx%2BbLHBvUA8MLU1BI4kfv8Wr6LgY%3D ehttp://www.planetaverde.org/noticia/ambientais/2405/mp-sp-obtem-acordao-reconhecendo-que-novo-codigo-florestal-viola-principio-da-proibicao-do-retrocesso,ambos acessados a 15.12.2015.25Há Decisão Judicial, no controle difuso, reconhecendo a inconstitucionalidade destedispositivo: Ação 1156-59.2013.4.01.3603/MT/TRF1, julg.07.04.2014,publ.11.04.2014, Juiz EDUARDO DE MELO GAMA, inhttp://processual.trf1.jus.br/consultaProcessual/processo.php?

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2.2.Aparente ofensa ao dever constitucional depreservação

2.2.1.APP, um caso

No que toca à APP, um ponto digno de nota é o art.4º,I,a,que dá a seguinte definição para uma espécie de APP(negritamos):

Considera-se Área de PreservaçãoPermanente, em zonas rurais ou urbanas,para os efeitos desta Lei [...,] as faixasmarginais de qualquer curso d’águanatural perene e intermitente, excluídos osefêmeros, desde a borda da calha do leitoregular, em largura mínima de 30 (trinta)metros, para os cursos d’água de menos de10 (dez) metros de largura.

A redação dada ao instituto correspondente do novoCódigo Florestal Federal (CFF - Lei 4771/1965 ealterações)26, está no art.2º,a,1 (negritamos):

Consideram-se de preservação permanente,pelo só efeito desta Lei, as florestas edemais formas de vegetação naturalsituadas [...] ao longo dos rios ou dequalquer curso d'água desde o seu nívelmais alto em faixa marginal cuja largura

trf1_captcha_id=72e2d1f2c03bf1807c046c07ee2b3330&trf1_captcha=v9pj&enviar=Pesquisar&proc=11565920134013603&secao=SNO, acesso a 28.11.2014.No controle concentrado, ao julgar a Arguição de Inconstitucionalidade 0039647-38.2011.8.13.0144 ou 1.0144.11.003.964-7/002 (MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE

MINAS GERAIS [MPMG] x Sinézia Maria da Silva Santos e Paulo Marcelo dos Santos,Comarca de Carmo do Rio Claro), o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS

GERAIS (TJMG), reconheceu a inconstitucionalidade da norma por ofensa aosarts.186,II, e 225CR: http://www4.tjmg.jus.br/juridico/sf/proc_movimentacoes2.jsp?listaProcessos=10144110039647002 ,http://www4.tjmg.jus.br/juridico/sf/proc_partes_advogados2.jsp?listaProcessos=10144110039647002 ehttps://www.mpmg.mp.br/comunicacao/noticias/tjmg-declara-a-inconstitucionalidade-do-artigo-67-do-novo-codigo-florestal.htm#.Vm92J7_w_2I , acessados a 15.12.2015.26In http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4771.htm, acesso a 22.10.2014.

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mínima será [...] de 30 (trinta) metros paraos cursos d'água de menos de 10 (dez)metros de largura”

Veja-se que o instituto curso d’água, sua metragem (10) ea da APP (30) foram mantidos. A alteração se dera nomarco para a medição do corpo hídrico, onde o novoCódigo Florestal Federal (CFF - Lei 4771/1965 ealterações)27 diz nível mais alto, a Lei 12.651/2012 cc12.727/2012 diz leito regular.

Em algumas regiões do país, a variação entre a calha doleito regular e o nível mais alto (leito máximo da cheia)pode chegar a 10 metros, como ocorre na Amazônia.28

No controle difuso, já há Decisão Judicial reconhecendosua inconstitucionalidade por ofensa ao dever dereparo: Ação 1156-59.2013.4.01.3603 (MT/TRF1,julg.07.04.2014, publ.11.04.2014)29.

MICHEL PRIEUR, na obra Princípio da Proibição deRetrocesso Ambiental (Brasília: Senado Federal, 2012,p.18)30, nos chama a atenção para uma característicacomum às normas ofensivas a tal Princípio (negritamos):

“[...]a regressão do Direito Ambiental serásempre insidiosa e discreta, para que passe

27In http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4771.htm, acesso a 22.10.2014.28Inhttp://www.senado.gov.br/noticias/OpiniaoPublica/inc/senamidia/notSenamidia.asp?ud=20120306&datNoticia=20120306&codNoticia=665538&nomeOrgao=&nomeJornal=A+CR%C3%8DTICA&codOrgao=47&tipPagina=1, acesso a 07.11.2014, ehttp://www.sbpcnet.org.br/site/publicacoes/outras-publicacoes/codigo-florestal.php,acesso a 12.11.2014.29Juiz EDUARDO DE MELO GAMA, inhttp://processual.trf1.jus.br/consultaProcessual/processo.php?trf1_captcha_id=72e2d1f2c03bf1807c046c07ee2b3330&trf1_captcha=v9pj&enviar=Pesquisar&proc=11565920134013603&secao=SNO, acesso a 28.11.2014.30In http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/242559, acesso a 06.11.2014.

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despercebida. E, por isso, ela se tornaainda mais perigosa.”

In casu, a regressão aparente enunciada supra, nível maisalto leito regular, parece ter passado desapercebidainclusive pelos Autores das ADIs citadas, visto que, smj,não reclamaram explicitamente do dispositivo, em quepese o questionamento pudesse se adequar `a lógicaintrínseca das suas Iniciais.

2.2.2.RL, um caso

Relativamente à RL, vamos ilustrar o paradoxo Lei12.651/2012cc12.727/2012 novo Código FlorestalFederal (CFF - Lei 4771/1965 e alterações)31 por meio doart.12§5º do primeiro conjunto normativo (negritamos):

[Art.12]Todo imóvel rural deve manter áreacom cobertura de vegetação nativa, a títulode Reserva Legal, sem prejuízo daaplicação das normas sobre as Áreas dePreservação Permanente, observados osseguintes percentuais mínimos em relação àárea do imóvel: [I-]localizado na AmazôniaLegal:[a)]80% (oitenta por cento), noimóvel situado em área de florestas[...].[§5º]Nos casos da alínea a do inciso I, opoder público estadual, ouvido o ConselhoEstadual de Meio Ambiente, poderá reduzira Reserva Legal para até 50% (cinquentapor cento), quando o Estado tiverZoneamento Ecológico-Econômico [ZEE]aprovado e mais de 65% (sessenta e cincopor cento) do seu território ocupado porunidades de conservação da natureza dedomínio público, devidamenteregularizadas, e por terras indígenashomologadas.[...]

31In http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4771.htm, acesso a 22.10.2014.

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O dispositivo aparentemente abre permissivo a novosdesmates e aumenta o ônus da coletividade em geral e dosindígenas em específico, em face doposseiro-possuidor-proprietário de imóvel rural particular.Levado `a última conseqüência, tal permissivo empurrariao Poder Público a estatizar a RL, fazendo-o arcar sozinhocom um dever que é coletivo no sentido de que não só doEstado lato sensu mas de cada cidadão,sobretudo o posseiro-possuidor-proprietário de imóvelrural, que tem um plus obrigacional, dada a função socialda propriedade (citadosarts.5º,XXIII,170,IIIeIV,e186,IeII,CR32).

2.3.Aparente ofensa ao dever constitucional derestauração/reparação

2.3.1.CAR, PRA e autorização

O Legislador elegera o dia 22.07.2008 como marcodivisório para o tratamento diferenciado a situaçõesfaticamente, exceto cronologicamente, idênticas.

Trazemos `a ilustração o art.61A da Lei12.651/2012cc12.727/2012, dispositivo pertinente à APP.Embora todo o artigo seja digno de análise, nós nosdeteremos apenas ao seu caput, que, na sua parte final, trazum controverso conceito, cuja apreciação será aprofundadamais adiante (negritamos):

Nas Áreas de Preservação Permanente, éautorizada, exclusivamente, acontinuidade das atividadesagrossilvipastoris, de ecoturismo e deturismo rural em áreas rurais consolidadas

32Constituição da República.

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até 22 de julho de 2008.[Incluído pela Lei12.727/2012]

Ao defender, na citada ADI unificada, ainconstitucionalidade deste dispositivo, o MPF reclama:

82.A Lei n°12.651/12 permitiu aconsolidação de danos ambientaisocasionados às áreas de preservaçãopermanente decorrentes de infrações àlegislação ambiental, desde que praticadosaté 22 de julho de 2008. Vale dizer: osproprietários rurais, mesmo que tenhamdescumprido a legislação anteriormentevigente, não serão obrigados a recuperarintegralmente os danos ambientais.

A par do fundamento ministerial para questionar aconstitucionalidade do dispositivo, mister observar que aprópria norma dá mecanismo de autocontenção, na medidaem que, não disse não haver APP, mas autorização de usoda APP; o que não poder ocorrer genericamente, mas tãosó casuisticamente. Assim, entendemos, ao contrário doParquet, não há uma autorização legislativa à

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continuidade da atividade poluidora(arts.3º33,4º34,e1435§1ºPNMA [Política Nacional do MeioAmbiente – Lei 6938/1981 e alterações])36, mas umpermissivo legislativo à autorização administrativa(art.1037PNMA).

Até porque, autorização é ato precipuamenteadministrativo, sem o qual, in casu, não há como saber se a

33Art.3º- Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: I-meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física,química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas; II-degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características do meioambiente; III-poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ouindiretamente: a)prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b)criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c)afetem desfavoravelmente a biota; d)afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e)lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos; IV-poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, diretaou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental; V-recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, osestuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora.[Redação dada pela Lei 7804/89][...]34Art.4º-A Política Nacional do Meio Ambiente visará:[...]VII-à imposição, ao poluidor eao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário,da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.[...]35Art.14-Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual emunicipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dosinconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará ostransgressores: I-à multa simples ou diária, nos valores correspondentes, no mínimo, a 10 (dez) e, nomáximo, a 1.000 (mil) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTNs,agravada em casos de reincidência específica, conforme dispuser o regulamento, vedadaa sua cobrança pela União se já tiver sido aplicada pelo Estado, Distrito Federal,Territórios ou pelos Municípios. II-à perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público; III-à perda ou suspensão de participação em linhas de financiamento emestabelecimentos oficiais de crédito; IV-à suspensão de sua atividade. §1º-Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado,independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados aomeio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União edos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, pordanos causados ao meio ambiente.[...]36In http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm, acesso a 08.11.2014.

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atividade poluidora se enquadra na Lei e no Ordenamento.Afinal, vale lembrar como a doutrina administrativistatradicionalmente defineautorização (MELLO,2003,p.401)38: “ato unilateral peloqual a Administração, discricionariamente, faculta oexercício de atividade material, tendo, como regra,caráter precário”.

Como se trata de norma de transição que visa permitir aregularização de atividade poluidora em APP sempenalização, a leitura sistêmica inclui o art.59 da Lei12.651/2012cc12.727/2012, que pressupõe implantaçãonormativa, e confecção e aprovação casuística do PRA(Programa de Regularização Ambiental) daquele que estáem situação ambiental irregular.

Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) semanifestou na PetREsp1240122PR (2011/0046149-6)39:

[...]o legislador não anistiou geral eirrestritamente as infrações ou extinguiu ailicitude de condutas anteriores a 22 dejulho de 2008, de modo a implicar perdasuperveniente de interesse de agir. Aocontrário, a recuperação do meio ambientedegradado nas chamadas áreas ruraisconsolidadas continua de rigor, agora pormeio de procedimento administrativo , noâmbito de Programa de RegularizaçãoAmbiental – PRA, após a inscrição doimóvel no Cadastro Ambiental Rural –CAR (§2°) e a assinatura de Termo de

37Art.10.A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos eatividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores oucapazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental dependerão de préviolicenciamento ambiental.[Redação dada pela Lei Complementar 140/2011][...]38

CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO. Curso de Direito Administrativo. São Paulo:Malheiros, 2003.39In https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=201100461496&dt_publicacao=19/12/2012, acesso a 08.11.2014.

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Compromisso (TC), valendo este comotítulo extrajudicial (§3°). Apenas a partirdaí "serão suspensas " as sançõesaplicadas ou aplicáveis (§5°, grifoacrescentado). Com o cumprimento dasobrigações previstas no PRA ou no TC,"as multas" (e só elas) "serão consideradasconvertidas em serviços de preservação,melhoria e recuperação da qualidade domeio ambiente".

Enfim, a autorização de que fala a Lei12.651/2012cc12.727/2012, art.61A, caput, não éautomática, mas demanda a assinatura do PRA (art.59)entre o Órgão competente do SISNAMA (SistemaNacional do Meio Ambiente, art.6º40PNMA) e oInteressado, o que pressupõe uma análise da viabilidadetécnico-ambiental da ocupação da APP antes da emissãodo ato administrativo autorizador.

No que toca à RL, a Lei 12.651/2012cc12.727/2012faculta a adesão ao PRA, art.66:

O proprietário ou possuidor de imóvelrural que detinha, em 22 de julho de2008, área de Reserva Legal em extensãoinferior ao estabelecido no art.12, poderáregularizar sua situação,independentemente da adesão ao PRA,adotando as seguintes alternativas,isolada ou conjuntamente:[I-]recompor aReserva Legal;[II-]permitir aregeneração natural da vegetação naárea de Reserva Legal;[III-]compensar a Reserva Legal.[...]

Nada obstante, deverá haver um ato administrativo queavalie, e autorize ou não, a proposta de regularização40In http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm, acesso a 08.11.2014.

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apresentada por aquele que tem deficitária sua RL. É damesma Lei 12.651/2012cc12.727/2012, art.14§1º(negritamos):

O órgão estadual integrante do Sisnamaou instituição por ele habilitada deveráaprovar a localização da Reserva Legalapós a inclusão do imóvel no CAR,conforme o art.29 desta Lei.

E é do mesmo conjunto normativo, art.17§4º(negritamos):

Sem prejuízo das sanções administrativas,cíveis e penais cabíveis, deverá seriniciado, nas áreas de que trata o §3o

deste artigo, o processo de recomposiçãoda Reserva Legal em até 2 (dois) anoscontados a partir da data da publicaçãodesta Lei, devendo tal processo serconcluído nos prazos estabelecidos peloPrograma de Regularização Ambiental -PRA, de que trata o art.59.[Incluído pelaLei 12.727/2012]

Convém registrar que o CAR (Cadastro Ambiental Rural),criado pela Lei 12.651/2012cc12.727/2012, art.29, édocumento meramente declaratório, sem natureza deautorização administrativa(AMS25934-12.2012.4.01.3900PA/TRF1, julg.13.11.2013,publ.25.11.201341; eAI2231-78.2013.4.01.0000MT/TRF1, julg.22.03.2013,publ.04.04.201342). Assim, conforme se extrai do citadojulgamento da PetREsp1240122PR41Tribunal Regional Federal da 1ªRegião inhttp://arquivo.trf1.jus.br/PesquisaMenuArquivo.asp?p1=259341220124013900&pA=&pN=259341220124013900, acesso a 09.11.2014.42Tribunal Regional Federal da 1ªRegião inhttp://processual.trf1.jus.br/consultaProcessual/processo.php?proc=22317820134010000&secao=TRF1&pg=1&enviar=Pesquisar, acesso a10.11.2014.

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(2011/0046149-6)43, a inscrição no CAR é etapa para aaprovação e subscrição do PRA entre o competente Órgãodo SISNAMA e o Interessado, documento este último que,entendemos, terá força de Compromisso para os fins doart.5º§6º44LACP (Lei de Ação Civil Pública - Lei7347/1985 e alterações).

Enfim, num e noutro caso, há necessidade de autorizaçãoadministrativa a fim de aferir se há, de fato, aregularização ambiental da atividade poluidora.

É certo, por óbvio, que tal autorização administrativadeverá observar o Ordenamento Jurídico como um todo eos princípios do direito ambiental em particular; devendoainda considerar os parâmetros normativos da própria Lei12.651/2012cc12.727/2012, notadamente aqueles previstosno art.3º,V,VIIeVIII45.

43In https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=201100461496&dt_publicacao=19/12/2012, acesso a 08.11.2014.44Art.5º[...]§6°Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessadoscompromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações,que terá eficácia de título executivo extrajudicial.[Incluído pela Lei 8078/1990]45

Art.3oPara os efeitos desta Lei, entende-se por:[...]V-pequena propriedade ou posse rural familiar: aquela explorada mediante o trabalhopessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar rural, incluindo os assentamentose projetos de reforma agrária, e que atenda ao disposto no art.3o da Lei no11.326, de 24de julho de 2006;[...]VII-manejo sustentável: administração da vegetação natural para a obtenção debenefícios econômicos, sociais e ambientais, respeitando-se os mecanismos desustentação do ecossistema objeto do manejo e considerando-se, cumulativa oualternativamente, a utilização de múltiplas espécies madeireiras ou não, de múltiplosprodutos e subprodutos da flora, bem como a utilização de outros bens e serviços;VIII-utilidade pública:a)as atividades de segurança nacional e proteção sanitária;b)as obras de infraestrutura destinadas às concessões e aos serviços públicos detransporte, sistema viário, inclusive aquele necessário aos parcelamentos de solo urbanoaprovados pelos Municípios, saneamento, gestão de resíduos, energia,telecomunicações, radiodifusão, instalações necessárias à realização de competiçõesesportivas estaduais, nacionais ou internacionais, bem como mineração, exceto, nesteúltimo caso, a extração de areia, argila, saibro e cascalho;c)atividades e obras de defesa civil;

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2.3.2.Embargo/Desembargo

No seu art.17§3º, a Lei 12.651/2012cc12.727/2012 dispõe(negritamos):

É obrigatória a suspensão imediata dasatividades em área de Reserva Legaldesmatada irregularmente após 22 dejulho de 2008.

d)atividades que comprovadamente proporcionem melhorias na proteção das funçõesambientais referidas no inciso II deste artigo;e)outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em procedimentoadministrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional aoempreendimento proposto, definidas em ato do Chefe do Poder Executivo federal;IX-interesse social:a)as atividades imprescindíveis à proteção da integridade da vegetação nativa, tais comoprevenção, combate e controle do fogo, controle da erosão, erradicação de invasoras eproteção de plantios com espécies nativas;b)a exploração agroflorestal sustentável praticada na pequena propriedade ou posse ruralfamiliar ou por povos e comunidades tradicionais, desde que não descaracterize acobertura vegetal existente e não prejudique a função ambiental da área;c)a implantação de infraestrutura pública destinada a esportes, lazer e atividadeseducacionais e culturais ao ar livre em áreas urbanas e rurais consolidadas, observadasas condições estabelecidas nesta Lei;d)a regularização fundiária de assentamentos humanos ocupados predominantementepor população de baixa renda em áreas urbanas consolidadas, observadas as condiçõesestabelecidas na Lei no11.977, de 7 de julho de 2009;e)implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e de efluentestratados para projetos cujos recursos hídricos são partes integrantes e essenciais daatividade;f)as atividades de pesquisa e extração de areia, argila, saibro e cascalho, outorgadas pelaautoridade competente;g)outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em procedimentoadministrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional à atividadeproposta, definidas em ato do Chefe do Poder Executivo federal;X-atividades eventuais ou de baixo impacto ambiental:a)abertura de pequenas vias de acesso interno e suas pontes e pontilhões, quandonecessárias à travessia de um curso d’água, ao acesso de pessoas e animais para aobtenção de água ou à retirada de produtos oriundos das atividades de manejoagroflorestal sustentável;b)implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e efluentestratados, desde que comprovada a outorga do direito de uso da água, quando couber;c)implantação de trilhas para o desenvolvimento do ecoturismo;d)construção de rampa de lançamento de barcos e pequeno ancoradouro;e)construção de moradia de agricultores familiares, remanescentes de comunidadesquilombolas e outras populações extrativistas e tradicionais em áreas rurais, onde oabastecimento de água se dê pelo esforço próprio dos moradores;f)construção e manutenção de cercas na propriedade;g)pesquisa científica relativa a recursos ambientais, respeitados outros requisitosprevistos na legislação aplicável;

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É importante registrar que a Constituição, os princípios doDireito Ambiental, a sistemática do Ordenamento Jurídicoe a própria Lei 12.651/2012cc12.727/2012 não permitemque o dispositivo seja lido a contrario sensu de modoamplo e irrestrito, ou seja, o Legislador não estáautorizando indiscriminadamente a atividadepoluidora em RL desmatada antes de 22.07.2008.

Pode se extrair isso da inteligência do §1º do mesmoartigo.

Admite-se a exploração econômica daReserva Legal mediante manejosustentável, previamente aprovado peloórgão competente do Sisnama, de acordocom as modalidades previstas no art.20.

Ora, é regra hermenêutica a leitura vinculada entre caput eparágrafo(s). O manejo sustentável é uma modalidade deexploração seletiva da vegetação nativa; se assim, para omanejo, com muito maior razão para a conversão do soloem pastagem eou cultura extensivas sucessoras dedesmates; enfim, se o menos exige autorização, o maiscertamente deve exigi-la.

O já citado §4º do mesmo art.17 também oferece suportelógico para concluirmos que a exploração pré-22.07.2008

h)coleta de produtos não madeireiros para fins de subsistência e produção de mudas,como sementes, castanhas e frutos, respeitada a legislação específica de acesso arecursos genéticos;i) plantio de espécies nativas produtoras de frutos, sementes, castanhas e outros produtosvegetais, desde que não implique supressão da vegetação existente nem prejudique afunção ambiental da área;j)exploração agroflorestal e manejo florestal sustentável, comunitário e familiar,incluindo a extração de produtos florestais não madeireiros, desde que nãodescaracterizem a cobertura vegetal nativa existente nem prejudiquem a funçãoambiental da área;k)outras ações ou atividades similares, reconhecidas como eventuais e de baixo impactoambiental em ato do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA ou dosConselhos Estaduais de Meio Ambiente;[...]

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desautorizada da RL também é vedada. Afinal, se a Leiestabeleceu um prazo paro o início da reparação do dano,discriminou a ação da abstenção; vale dizer, se a primeiranorma aparentemente permite de modo tácito aatividade poluidora iniciada pré-22.07.2008, a segundanorma tacitamente a veda, pois, pressupõe-se que, entre apublicação da Lei (18.10.2012 para a 12.727) e o fim doprazo (18.10.2014) haja a interrupção da poluiçãodeslicenciada (abstenção), para que, na sequência, se dêinício à recomposição da RL (ação). De toda sorte, o fato éque, transcorridos os 2 anos previstos na Lei, já está emmora aquele que não iniciou o processo de recomposiçãoda RL.

Outrossim o art.51 da mesma Lei (negritamos):

O órgão ambiental competente, ao tomarconhecimento do desmatamento emdesacordo com o disposto nesta Lei,deverá embargar a obra ou atividade quedeu causa ao uso alternativo do solo,como medida administrativa voltada aimpedir a continuidade do danoambiental, propiciar a regeneração domeio ambiente e dar viabilidade àrecuperação da área degradada.

É preciso também considerar o que dispõe o art.68 doconjunto normativo Lei 12.651/2012cc12.727/2012, quereconhece o ato jurídico perfeito no que toca a exploraçõeshavidas em RL de acordo com as normas então vigentes; oque implica em dizer que desmates ocorridos emdesacordo com as regras de então não podem ser tidoscomo válidos; logo, a exploração que se lhe suceda nãopode persistir; assim, o dano, ainda que anterior a22.07.2008, deve ser interrompido, e a vegetação nativarestaurada.

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Neste sentido, dispõe a Lei Complementar 140/2011(negritamos):

Art.17.[...]

§2oNos casos de iminência ou

ocorrência de degradação da qualidadeambiental, o ente federativo que tiverconhecimento do fato deverá determinarmedidas para evitá-la, fazer cessá-la oumitigá-la, comunicando imediatamenteao órgão competente para asprovidências cabíveis.[...]

Tal comando está inserido no contexto do Poder de Pol´ciada Administração.

O poder de polícia ambiental é exercido mais comumentepor meio de ações fiscalizadoras, uma vez que a tutelaadministrativa do ambiente contempla medidas corretivase inspectivas, entre outras (EDIS MILARÉ, 2005)46

incluindo dentre as ações de polícia ambiental a coibiçãoda prática de infrações e a imposição de sanções aosinfratores.

No que tange à medida de urgência, mister obervar o quediz a Lei de Processo Administrativo Federal (LPAF -L9784/99 e alterações), in verbis:

Art.45.Em caso de risco iminente, aAdministração Pública poderámotivadamente adotar providênciasacauteladoras sem a prévia manifestaçãodo interessado.

46Direito do Ambiente. São Paulo: RT, p.751.

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Destaca CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (2005)47,ao comentar a incidência do princípio do devido processolegal administrativo nas infrações e sançõesadministrativas, consoante determinação constitucional(grifamos):

“Esta exigência da Lei Maior erigedificuldades práticas no caso de certassanções, como por exemplo, na aplicaçãode multa de trânsito, e sugere – nisto,equivocadamente - que também haveria amesma dificuldade relativamente ahipóteses como as de apreensão deequipamentos de caça ou pesca efetuadafora das exigências legais, ou dealimentos comercializados em máscondições de higiene, ou a destruição, poreste motivo, de xícaras ou coposrachados, encontrados pela Fiscalizaçãoem bares ou restaurantes populares. Quanto às multas de trânsito, ter-se-á deentender que a lavratura do auto deinfração por parte do agente de trânsito –e que, por razões óbvias, não tem comodeixar de ser feita imediatamente e serematurados rigorismos formalísticos – éapenas uma preliminar do lançamento damulta, o qual só se estratifica depois deofertada a possibilidade de ampla defesae se esta for desacolhida. Quanto às outras hipóteses nãoprocederia a dúvida, pois não seriamsanções administrativas, masprovidências acautelatórias, e, por istomesmo, em face da urgência,desobrigadas de obediência a umprocesso preliminar.[...] Quase sempre tais providênciasprecedem sanções administrativas, mascom elas não se confundem. Assim, e.g.,

47Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Malheiros, págs.793/795.

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a provisória apreensão de medicamentosou alimentos presumivelmente imprópriospara consumo da população, a expulsãode um aluno que esteja a se comportarinconvenientemente em sala de aula, ainterdição de um estabelecimentoperigosamente poluidor, quando a medidatenha que ser tomada sem delongaalguma, são medidas acautelatórias e sóse converterão em sanções depois deoferecida oportunidade de defesa para ospresumidos infratores. Como se vê, emcertos casos a compostura daprovidência acautelatória é prestantetambém para cumprir a função desanção administrativa, mas só assumirátal caráter, quando for o caso, apósconclusão de um processo regular,conforme dito.”

Se assim quanto ao Direito Administrativo em geral, commuito maior razão no que toca ao Direito AdministrativoAmbiental.

A Precaução exige que sejam tomadas, por parte do Estadocomo também por parte da sociedade em geral, medidasambientais que, desde o primeiro momento, impeçam aocorrência de atividades potencial eou efetivamente lesivasao meio ambiente. Se assim antes do dano, com muitomaior razão quando o dano está em curso. Nesta linha depensamento, MACHADO (2001)48 nos ensina que:

“A precaução age no presente para nãose ter que chorar e lastimar o futuro. Aprecaução não só deve estar presentepara impedir o prejuízo ambiental, mesmoincerto, que possa resultar das ações ouomissões humanas, como deve atuar para

48PAULO AFONSO LEME MACHADO, Direito Ambiental Brasileiro, São Paulo: Malheiros, p.57.

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a prevenção oportuna desse prejuízo.Evita-se o dano ambiental através daprevenção no tempo certo”.

Outrossim, é este o comando oriundo do Princípio daPrecaução: sem licença, sem poluição lícita. O STJ assimo define49:

Preconiza que as ações positivas em favordo meio ambiente devem ser tomadasmesmo sem evidência científica absolutade perigo de dano grave e irreversível. Aprecaução, assim, é anterior à própriamanifestação do perigo, garantindomargem de segurança da linha de risco,em prol da sustentabilidade. Nos casos emque há conhecimento prévio das lesõesque determinada atividade pode causarno ambiente, aplica-se outro princípio: oda prevenção.

A par das razões expostas, mister registrar que há regimesespeciais de proteção constitucional a determinadasfitofisiomias, que afastam, em absoluto, a exploraçãoempírica deslicenciada da RL, do que faz exemplo aFloresta Amazônica, que, juntamente com a MataAtlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e aZona Costeira, são patrimônio nacional, e sua utilizaçãofar-se-á, na forma da lei, dentro de condições queassegurem a preservação do meio ambiente, inclusivequanto ao uso dos recursos naturais (art.225§4ºCR).

No que toca à Floresta Amazônica, além da Constituição,extraímos seu plus protetivo do conjunto normativo Lei12.651/2012cc12.727/2012, v.g: do art.3º,I,50 que define a

49In http://stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=97483, acesso a 09.11.2014.50

Art.3oPara os efeitos desta Lei, entende-se por:I-Amazônia Legal: os Estados do Acre,Pará, Amazonas, Roraima, Rondônia, Amapá e Mato Grosso e as regiões situadas ao

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Amazônia Legal; do citado art.12,I,a, que estabelecepercentual da RL florestal amazônica em 80%, superior aode qualquer outra fitofisionomia; do art.4251, ao ressalvardas conversões de multa o art.5052 Decreto 6514/2008, quetrata de infração a este patrimônio objeto de especialpreservação. No que toca ao Decreto 6514/2008, relevanteobservar o cuidado desta norma para com tal Bioma, pois,se seu art15B53 exige a regularização da atividadepoluidora para o desembargo, seu art.158A,§ú,54 vedaqualquer atividade poluidora desautorizada no Bioma.Outrossim a Lei 5173/1966 e alterações, que dispõe sobreo Plano de Valorização Econômica da Amazônia e cria aSuperintendência do Desenvolvimento da Amazônia(SUDAM). No âmbito administrativo, Órgão daProcuradoria-Geral Federal (PGF) e da Advocacia-Geralda União (AGU) emanou e OJU55456 precisamente no

norte do paralelo 13° S, dos Estados de Tocantins e Goiás, e ao oeste do meridiano de44° W, do Estado do Maranhão;[...]51Art.42.O Governo Federal implantará programa para conversão da multa prevista noart.50 do Decreto no6.514, de 22 de julho de 2008, destinado a imóveis rurais, referentea autuações vinculadas a desmatamentos em áreas onde não era vedada a supressão, queforam promovidos sem autorização ou licença, em data anterior a 22 de julho de 2008.[Incluído pela Lei 12.727/2012]52Art.50.Destruir ou danificar florestas ou qualquer tipo de vegetação nativa ou deespécies nativas plantadas, objeto de especial preservação, sem autorização ou licençada autoridade ambiental competente:Multa de R$5.000,00 (cinco mil reais) por hectareou fração.[...]53

Art.15-B.A cessação das penalidades de suspensão e embargo dependerá de decisão daautoridade ambiental após a apresentação, por parte do autuado, de documentação queregularize a obra ou atividade.[Incluído pelo Decreto 6686/2008]54Art.152-A.Os embargos impostos em decorrência da ocupação irregular de áreas dereserva legal não averbadas e cuja vegetação nativa tenha sido suprimida até 21 dedezembro de 2007, serão suspensos até 11 de dezembro de 2009, mediante o protocolopelo interessado de pedido de regularização da reserva legal junto ao órgão ambientalcompetente.[Redação dada pelo Decreto 6695/2008] Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica a desmatamentos irregularesocorridos no Bioma Amazônia.[Incluído pelo Decreto 6695/2008]55Orientação Normativa Uniformizada / Parecer 0249/2005/PROGE (ProcuradoriaGeral Especializada junto ao IBAMA, atual Procuradoria Federal Especializada junto aoIBAMA).56Ementa: Aplicação do artigo 50 da Lei de Crimes Ambientais combinado com artigo37 do Decreto nº3.179/99, quando o bem ambiental tiver tutelado como patrimônio

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sentido do reconhecimento da especialidade normativa daFloresta Amazônica. Ainda neste sentido, vale à pena citarprecedente do TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA

1ºREGIÃO (TRF1, 2013)57:

A decisão agravada restou lavrada nestestermos:[“...]O artigo 66 da lei de regência [Lei12.651/2012] é bem claro ao dispor que o‘proprietário ou possuidor de imóvel ruralque detinha, em 22 de julho de 2008, áreade Reserva Legal em extensão inferior aoestabelecido no art.12, poderá regularizarsua situação, independentemente daadesão ao PRA[....]”Em suas razões recursais, sustenta aautarquia recorrente, em resumo, alegitimidade do auto de infração e doembargo em referência, destacando que,além de terem sido lavrados antes daedição do novo Código Florestal [Lei12.651/2012cc12.727/2012], a área, a quese reportam, não se trata de mera área dereserva legal, mas sim de área de especialpreservação, encravada na FlorestaAmazônica[...].[...]verifico, agora, que se encontrampresentes, na espécie, os pressupostos doart.558 do CPC [...]

nacional.- Os bens ambientais considerados como patrimônio nacional na forma do §4º do art.225da Constituição Federal, que dispõe que a floresta Amazônica brasileira, a mataAtlântica, a serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira, são patrimônionacional e como tal, objetos de especial preservação, portanto qualquer ação danosa aesses bens será considerada infração administrativa punível com base no art.70 da Leinº9.605/98 e no art.37 do Decreto nº3.179/99, sem prejuízo das demais sançõesaplicáveis ao caso. A infração comporta, ainda, o encaminhamento de comunicação decrime ao Ministério Público. Precedentes do PARECER Nº0681/2004-PROGE/COEPA,homologado pelo Senhor Procurador-Geral.57Tribunal Regional Federal da 1ªRegião inhttp://processual.trf1.jus.br/consultaProcessual/processo.php?proc=22317820134010000&secao=TRF1&pg=1&enviar=Pesquisar, acesso a10.11.2014.

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Há que se ressaltar [...] que a áreadescrita nos autos encontra-se situadanos limites da Amazônia Legal,patrimônio nacional, nos termos doart.225, §4º, da Constituição Federal,inserida, assim, em área de especialproteção ambiental, competindo ao PoderLegislativo, dentro dos princípiosconstitucionais que regem o exercício dodireito de propriedade, estabelecernormas, limitando ou proibindo oexercício de atividades que ameacemextinguir, em área legalmente protegida,as espécies raras da biota regional,sujeitando-se o infrator ao embargo dasiniciativas irregulares, tais como amedida cautelar de apreensão do materiale das máquinas usadas nessas atividades,com a obrigação de reposição ereconstituição, tanto quanto possível, dasituação anterior e a imposição de multas(Lei nº6.902/81, art.9, d, e respectivo §2º),sem prejuízo da apuração daresponsabilidade criminal[...].Não cabe invocar-se, aqui, categoriasjurídicas de direito privado, para impor atutela egoística da propriedade privada, adescurar-se de sua determinante funçãosocial e da supremacia do interessepúblico, na espécie, em total agressão aomeio ambiente, que há de ser preservado,a qualquer custo, de formaecologicamente equilibrada, para aspresentes e futuras gerações, emdimensão difusa na força determinantedos princípios da prevenção e daparticipação democrática (CF, 225,caput).Na ótica vigilante da Suprema Corte, “aincolumidade do meio ambiente não podeser comprometida por interessesempresariais nem ficar dependente de

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motivações de índole meramenteeconômica, ainda mais se se tiver presenteque a atividade econômica, considerada adisciplina constitucional que a rege, estásubordinada, dentre outros princípiosgerais, àquele que privilegia a “defesa domeio ambiente” (CF, art.170, VI), quetraduz conceito amplo e abrangente dasnoções de meio ambiente natural, de meioambiente cultural, de meio ambienteartificial (espaço urbano) e de meioambiente laborial (...) O princípio dodesenvolvimento sustentável, além deimpregnado de caráter eminentementeconstitucional, encontra suportelegitimador em compromissosinternacionais assumidos pelo Estadobrasileiro e representa fator de obtençãodo justo equilíbrio entre as exigências daeconomia e as da ecologia, subordinada,no entanto a invocação desse postulado,quando ocorrente situação de conflitoentre valores constitucionais relevantes, auma condição inafastável, cujaobservância não comprometa nem esvazieo conteúdo essencial de um dos maissignificativos direitos fundamentais: odireito à preservação do meio ambiente,que traduz bem de uso comum dageneralidade das pessoas, a serresguardado em favor das presentes efuturas gerações” (ADI-MC nº3540/DF– Rel.Min.Celso de Mello – DJU de03/02/2006)”.[...]Registre-se, por oportuno, que, nãoobstante as razões lançadas pelo doutojuízo monocrático, no sentido de adequar-se a atuação do órgão ambiental às novasdiretrizes estabelecidas pelo CódigoFlorestal, no caso concreto, os autos deinfração e embargo foram lavrados muito

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antes de sua edição, não se podendoadmitir a imposição de sua observância,no particular.[Agravo de Instrumento 2231-78.2013.4.01.0000MT – Des.Rel.CARLOS

EDUARDO CASTRO MARTINS – Decisão de22.03.2013]

Doutro modo estaríamos a desrespeitar o deverconstitucional de preservação e restauração/reparação.

Atendida a Constituição (arts.5º,XXIII,58 23,VIeVII,59

24,VI,VIIeVIII,60 170,IIIeVI,61 186,IeII62, e22563), o

58Art.5º[...]XXIII-a propriedade atenderá a sua função social;[...]59Art.23 É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dosMunicípios:[...]VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer desuas formas;VII - preservar as florestas, a fauna e a flora;[...]60Art.24.Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentementesobre:[...]VI-florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dosrecursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;VII-proteção aopatrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico;VIII-responsabilidade pordano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético,histórico, turístico e paisagístico;[...]61

Art.170.A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livreiniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames dajustiça social, observados os seguintes princípios:[...]III-função social da propriedade;[...]VI-defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme oimpacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração eprestação;[Redação dada pela Emenda Constitucional 42/2003][...]62Art.186.A função social é cumprida quando a propriedade rural atende,simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aosseguintes requisitos:I-aproveitamento racional e adequado;II-utilização adequada dosrecursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;[...]63Art.225.Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de usocomum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e àcoletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.§1º-Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I-preservar erestaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies eecossistemas;II-preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País efiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;III-definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes aserem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somenteatravés de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributosque justifiquem sua proteção; IV-exigir, na forma da lei, para instalação de obra ouatividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente,estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;V-controlar a produção, a

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desembargo da atividade poluidora deverá considerar aexistência de Licença Ambiental, nos casos em que exigida(arts.3º,8ºe1064PNMA65, e A1RCONAMA66237/1987).

O desembargo da atividade poluidora deverá aindaconsiderar se esta subsume à totalidade do imóvel objetodo PA67 sob posse/domínio do Interessado/Parte nos termos

comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem riscopara a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;VI-promover a educação ambientalem todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meioambiente;VII-proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas quecoloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ousubmetam os animais a crueldade. §2º-Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambientedegradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, naforma da lei.§3º-As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão osinfratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,independentemente da obrigação de reparar os danos causados.§4º-A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na formada lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusivequanto ao uso dos recursos naturais.§5º-São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por açõesdiscriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.§6º-As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em leifederal, sem o que não poderão ser instaladas.64Art3ºPara os fins previstos nesta Lei, entende-se por:[...]II-degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características do meioambiente; III-poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ouindiretamente: a)prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b)criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c)afetem desfavoravelmente a biota; d)afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e)lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos; IV-poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, diretaou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental;[...][...]Art.8ºCompete ao CONAMA[Conselho Nacional do Meio Ambiente]:[Redação dadapela Lei 8028/90]I-estabelecer, mediante proposta do IBAMA, normas e critérios para o licenciamento deatividades efetiva ou potencialmente poluidoras, a ser concedido pelos Estados esupervisionado pelo IBAMA;[Redação dada pela Lei 7804/89][...][...]Art.10.A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos eatividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou

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Aos que virão: hermenêutica ambiental em prol das geraçõesvindouras

do art.3268IN2/2014MMA69.

Em caso positivo a retro/supra, sendo Floresta Amazônicao Bioma poluído (art.225§4º70CR cc 3º,I,71L.7212.651/2012cc 152A,§ú,73D746514/2008), a análise de licitude daatividade poluidora deverá considerar ainda se a RL75

(art.3º,III,76L.12.651/2012) do imóvel contempla o art.1277

cc 6878L.12.651/2012, relativamente ao marco temporal

capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental dependerão de préviolicenciamento ambiental.[Redação dada pela Lei Complementar 140/2011]65Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6938/1981 e alterações).66Anexo 1 da Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (disponível inhttp://www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm?codlegi=237, acesso a 06.02.2015).67Processo Administrativo.68Art.32.Os proprietários ou possuidores de imóveis rurais, que dispõem de mais de umapropriedade ou posse em área contínua, deverão efetuar uma única inscrição para essesimóveis.Parágrafo único. Para o cumprimento dos percentuais da Reserva Legal, bem como paraa definição da faixa de recomposição de Áreas de Preservação Permanente, previstosnos arts.12 e 61-A da Lei no12.651, de 2012, o proprietário ou possuidor deveráinscrever a totalidade das áreas.69Instrução Normativa do Ministério do Meio Ambiente, de 05.05.2014, publicada noDiário Oficial da União (DOU) de 06.05.2014.70Art.225[...]§4º-A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, oPantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilizaçãofar-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meioambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.[...]71Art.3ºPara os efeitos desta Lei, entende-se por:I-Amazônia Legal: os Estados do Acre,Pará, Amazonas, Roraima, Rondônia, Amapá e Mato Grosso e as regiões situadas aonorte do paralelo 13° S, dos Estados de Tocantins e Goiás, e ao oeste do meridiano de44° W, do Estado do Maranhão;[...]72Lei Federal.73Art.152-A.Os embargos impostos em decorrência da ocupação irregular de áreas dereserva legal não averbadas e cuja vegetação nativa tenha sido suprimida até 21 dedezembro de 2007, serão suspensos até 11 de dezembro de 2009, mediante o protocolopelo interessado de pedido de regularização da reserva legal junto ao órgão ambientalcompetente.[Redação dada pelo Decreto 6695/2008 Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica a desmatamentos irregularesocorridos no Bioma Amazônia.[Incluído pelo Decreto 6695/2008]74Decreto Federal.75Reserva Legal.76Art.3º[...]III-Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posserural, delimitada nos termos do art. 12, com a função de assegurar o uso econômico demodo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e areabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bemcomo o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa;[...]

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para RL de 80%, 26.07.1996, consoanteMPv.791511/199680.

Tratando-se de imóvel com passivo ambiental, deverá serconsiderado se houve assinatura de PRA81

(art.5982L.12.651/2012 ccPetREsp.1240122PR-2011/0046149-683).

77Art.12.Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título

de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de PreservaçãoPermanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel,excetuados os casos previstos no art. 68 desta Lei:[Redação dada pela Lei12.727/2012]I-localizado na Amazônia Legal:a)80% (oitenta por cento), no imóvelsituado em área de florestas;[...]78Art.68.Os proprietários ou possuidores de imóveis rurais que realizaram supressão devegetação nativa respeitando os percentuais de Reserva Legal previstos pelalegislação em vigor à época em que ocorreu a supressão são dispensados de promover arecomposição, compensação ou regeneração para os percentuais exigidos nesta Lei.[...]79Medida Provisória. 80Redação do art.44§2ºCFF (Código Florestal Federal – Lei 4771/1965 e alterações)dada pelo art.1ºda MPv inhttps://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MPV/Antigas/1511.htm, acesso a 07.02.2015.81Programas de Regularização Ambiental82Art.59.A União, os Estados e o Distrito Federal deverão, no prazo de 1 (um) ano,contado a partir da data da publicação desta Lei, prorrogável por uma única vez, porigual período, por ato do Chefe do Poder Executivo, implantar Programas deRegularização Ambiental - PRAs de posses e propriedades rurais, com o objetivo deadequá-las aos termos deste Capítulo.§1oNa regulamentação dos PRAs, a União estabelecerá, em até 180 (cento e oitenta) diasa partir da data da publicação desta Lei, sem prejuízo do prazo definido no caput,normas de caráter geral, incumbindo-se aos Estados e ao Distrito Federal o detalhamentopor meio da edição de normas de caráter específico, em razão de suas peculiaridadesterritoriais, climáticas, históricas, culturais, econômicas e sociais, conforme preceitua oart. 24 da Constituição Federal.§2oA inscrição do imóvel rural no CAR é condição obrigatória para a adesão ao PRA,devendo esta adesão ser requerida pelo interessado no prazo de 1 (um) ano, contado apartir da implantação a que se refere o caput, prorrogável por uma única vez, por igualperíodo, por ato do Chefe do Poder Executivo.§3oCom base no requerimento de adesão ao PRA, o órgão competente integrante doSisnama convocará o proprietário ou possuidor para assinar o termo de compromisso,que constituirá título executivo extrajudicial.§4oNo período entre a publicação desta Lei e a implantação do PRA em cada Estado eno Distrito Federal, bem como após a adesão do interessado ao PRA e enquanto estiversendo cumprido o termo de compromisso, o proprietário ou possuidor não poderá serautuado por infrações cometidas antes de 22 de julho de 2008, relativas à supressãoirregular de vegetação em Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal e de usorestrito.

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Aos que virão: hermenêutica ambiental em prol das geraçõesvindouras

Para fins de desembargo, a subscrição do PRA deveatender os termos do art.5º84

cc 2185D8235/2014 cc

§5oA partir da assinatura do termo de compromisso, serão suspensas as sançõesdecorrentes das infrações mencionadas no § 4o deste artigo e, cumpridas as obrigaçõesestabelecidas no PRA ou no termo de compromisso para a regularização ambiental dasexigências desta Lei, nos prazos e condições neles estabelecidos, as multas referidasneste artigo serão consideradas como convertidas em serviços de preservação, melhoriae recuperação da qualidade do meio ambiente, regularizando o uso de áreas ruraisconsolidadas conforme definido no PRA.83

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. NOVO CÓDIGO FLORESTAL (LEI12.651/2012). REQUERIMENTO. PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO CONTRAACÓRDÃO. INVIABILIDADE. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE . RECEBIMENTOCOMO EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. VIOLAÇÃO AO ART.535 DO CPC NÃOAPONTADA. AUTO DE INFRAÇÃO. IRRETROATIVIDADE DA LEI NOVA. ATOJURÍDICO PERFEITO. DIREITO ADQUIRIDO. ART.6º, CAPUT, DA LEI DEINTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO.1.Trata-se de requerimento apresentado pelo recorrente, proprietário rural, no bojo de“ação de anulação de ato c/c indenizatória”, com intuito de ver reconhecida a falta deinteresse de agir superveniente do Ibama, em razão da entrada em vigor da Lei12.651/2012 (novo Código Florestal), que revogou o Código Florestal de 1965 (Lei4.771) e a Lei 7.754/1989. Argumenta que a nova legislação “o isentou da punição que oafligia”, e que “seu ato não representa mais ilícito algum”, estando, pois, “livre daspunições impostas”. Numa palavra, afirma que a Lei 12.651/2012 procedera à anistiados infratores do Código Florestal de 1965, daí sem valor o auto de infração ambientallavrado contra si e a imposição de multa de R$1.500, por ocupação e exploraçãoirregulares, anteriores a julho de 2008, de Área de Preservação Permanente nas margensdo rio Santo Antônio.2.O requerimento caracteriza, em verdade, pleito de reconsideração da decisão colegiadaproferida pela Segunda Turma, o que não é admitido pelo STJ. Nesse sentido: RCDESPno AgRg no Ag 1.285.896/MS, Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, Segunda Turma, DJe29.11.2010; AgRg nos EREsp 1.068.838/PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, CorteEspecial, DJe 11.11.2010; PET nos EDcl no AgRg no Ag 658.661/MG, Rel. MinistroAldir Passarinho Junior, Quarta Turma, DJe 17.3.2011; RCDESP no CC 107.155/MT,Rel.Ministro Aldir Passarinho Junior, Segunda Seção, DJe 17.9.2010; RCDESP no Ag1.242.195/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 3.9.2010. Poroutro lado, impossível receber pedido de reconsideração como Embargos de Declaração,sob o manto do princípio da fungibilidade recursal, pois não se levanta nenhuma dashipóteses do art.535 do CPC.3.Precedente do STJ que faz valer, no campo ambiental-urbanístico, a norma maisrigorosa vigente à época dos fatos, e não a contemporânea ao julgamento da causa,menos protetora da Natureza: O "direito material aplicável à espécie é o então vigente à

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arts.3ºa5º86IN12/2014/87IBAMA.

Assinado o PRA, na hipótese compensação de RL, deve oInteressado indicar de pronto o imóvel compensador nostermos do citado art.5º§1ºD8235/2014.

época dos fatos. In casu, Lei n. 6.766/79, art.4º, III, que determinava, em sua redaçãooriginal, a 'faixa non aedificandi de 15 (quinze) metros de cada lado' do arroio" (REsp980.709/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 2.12.2008).4.Ademais, como deixa claro o novo Código Florestal (art.59), o legislador não anistiougeral e irrestritamente as infrações ou extinguiu a ilicitude de condutas anteriores a 22 dejulho de 2008, de modo a implicar perda superveniente de interesse de agir. Aocontrário, a recuperação do meio ambiente degradado nas chamadas áreas ruraisconsolidadas continua de rigor, agora por meio de procedimento administrativo , noâmbito de Programa de Regularização Ambiental – PRA, após a inscrição do imóvel noCadastro Ambiental Rural – CAR (§2°) e a assinatura de Termo de Compromisso (TC),valendo este como título extrajudicial (§3°). Apenas a partir daí "serão suspensas " assanções aplicadas ou aplicáveis (§5°, grifo acrescentado). Com o cumprimento dasobrigações previstas no PRA ou no TC, "as multas" (e só elas) "serão consideradasconvertidas em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meioambiente".5.Ora, se os autos de infração e multas lavrados tivessem sido invalidados pelo novoCódigo ou houvesse sido decretada anistia geral e irrestrita das violações que lhe deramorigem, configuraria patente contradição e ofensa à lógica jurídica a mesma lei referir-sea "suspensão" e "conversão" daquilo que não mais existiria: o legislador não suspende,nem converte o nada jurídico. Vale dizer, os autos de infração já constituídospermanecem válidos e blindados como atos jurídicos perfeitos que são - apenas a suaexigibilidade monetária fica suspensa na esfera administrativa , no aguardo documprimento integral das obrigações estabelecidas no PRA ou no TC. Tal basta parabem demonstrar que se mantém incólume o interesse de agir nas demandas judiciais emcurso, não ocorrendo perda de objeto e extinção do processo sem resolução de mérito(CPC, art.267, VI).[...]84

Art.5oApós a solicitação de adesão ao PRA, o proprietário ou possuidor do imóvelrural assinará termo de compromisso que deverá conter:I-o nome, a qualificação e o endereço das partes compromissadas ou dos representanteslegais; II-os dados da propriedade ou posse rural; III-a localização da Área de Preservação Permanente ou Reserva Legal ou área de usorestrito a ser recomposta, recuperada, regenerada ou compensada; IV-descrição da proposta simplificada do proprietário ou possuidor que vise àrecomposição, recuperação, regeneração ou compensação das áreas referidas no incisoIII;V-prazos para atendimento das opções constantes da proposta simplificada prevista noinciso IV e o cronograma físico de execução das ações;VI-as multas ou sanções que poderão ser aplicadas aos proprietários ou possuidores deimóveis rurais compromissados e os casos de rescisão, em decorrência do nãocumprimento das obrigações nele pactuadas; e

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2.3.3.RL em até 4 módulos fiscais

O art.67 da Lei 12.651/2012cc12.727/2012 enuncia:

Nos imóveis rurais que detinham, em 22de julho de 2008, área de até 4 (quatro)módulos fiscais e que possuamremanescente de vegetação nativa empercentuais inferiores ao previsto noart.12, a Reserva Legal será constituída

VII-o foro competente para dirimir litígios entre as partes.§1ºCaso opte o interessado, no âmbito do PRA, pelo saneamento do passivo de ReservaLegal por meio de compensação, o termo de compromisso deverá conter as informaçõesrelativas à exata localização da área de que trata o art.66, §6º, da Lei nº12.651, de 2012,com o respectivo CAR.§2oA proposta simplificada a que se refere o inciso IV do caput poderá ser apresentadapelo proprietário ou possuidor do imóvel rural independentemente de contratação detécnico responsável.§3oTratando-se de Área de Reserva Legal, o prazo de vigência dos compromissos,previsto no inciso V do caput, poderá variar em até vinte anos, conforme disposto no§2º do art.66 da Lei nº12.651, de 2012.§4oNo caso de território de uso coletivo titulado ou concedido aos povos oucomunidades tradicionais, o termo de compromisso será firmado entre o órgãocompetente e a instituição ou entidade representativa dos povos ou comunidadestradicionais.§5oEm assentamentos de reforma agrária, o termo de compromisso a ser firmado com oórgão competente deverá ser assinado pelo beneficiário da reforma agrária e pelo órgãofundiário.85

Art.21.Nas hipóteses mencionadas no §5º do art.59 da Lei nº12.651, de 2012, em quehaja áreas embargadas pelo órgão ambiental competente, o requerimento de desembargodeverá necessariamente estar acompanhado do termo de compromisso de que trata oart.5o.Parágrafo único. O disposto no caput aplica-se apenas aos casos em que o interessadotenha aderido ao PRA, nos termos deste Decreto.86Art.3ºO termo de compromisso ambiental é o documento pelo qual o interessadoformaliza, perante o órgão competente integrante do SISNAMA, a sua adesão ao PRA,podendo ser confeccionado em modelo sugerido pelo IBAMA.§1ºO termo de compromisso de que trata o caput, para produzir efeitos perante oIBAMA, deverá observar o art.5º do Decreto n. 8.235, de 2014 e conter, no mínimo, asseguintes informações:I-o nome, a qualificação e o endereço das partes compromissadas ou dos representanteslegais;II-os dados da propriedade ou posse rural e o número da inscrição do imóvel rural emregularização no SICAR;III-a relação de infrações cujas sanções estão sujeitas a suspensão pela adesão ao PRA,devendo constar os números de autos de infração e de demais termos próprios, bemcomo dos respectivos processos administrativos de apuração e constituição que tramitano IBAMA;

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com a área ocupada com a vegetaçãonativa existente em 22 de julho de 2008,vedadas novas conversões para usoalternativo do solo.

O dispositivo teve a constitucionalidade contestada nocontrole concentrado, via citada ADI proposta pelo MPF.

IV-a localização da área de preservação permanente ou de reserva legal ou de usorestrito a ser recomposta, recuperada, regenerada ou compensada, em conformidade coma informação constante do CAR;V-a descrição da proposta simplificada que vise à recomposição, recuperação,regeneração ou compensação das áreas referidas no inciso IV;VI-os prazos para atendimento das opções constantes da proposta simplificada e ocronograma físico de execução das ações;VII-as multas ou sanções que serão aplicadas aos proprietários ou possuidores deimóveis rurais compromissados e os casos de rescisão, em decorrência do nãocumprimento das obrigações nele pactuadas;VIII-os números da matrícula e do respectivo recibo de inscrição no SICAR do imóvelrural cujo excedente à área de reserva legal será utilizado para compensação, bem comocom as informações relativas à exata localização da área, nos termos do art.66,§6º, daLei n.12.651, de 2012;IX-o foro competente para dirimir litígios entre as partes.§2ºO termo de compromisso firmado no âmbito do PRA terá eficácia de título executivoextrajudicial e deverá ser publicado em jornal oficial, sob pena de ineficácia.Art.4ºApós a adesão ao PRA, por meio da formalização de termo de compromissoambiental firmado com o órgão competente integrante do SISNAMA, o proprietário oupossuidor que tenha sido autuado por infrações cometidas antes de 22 de julho de 2008,relativas à supressão irregular de vegetação em áreas de preservação permanente, dereserva legal e de uso restrito, poderá requerer ao IBAMA a suspensão das sançõesdecorrentes dessas infrações.§1ºO requerimento de que trata o caput, cujo modelo consta do Anexo desta InstruçãoNormativa, será dirigido à autoridade competente para o julgamento de autos deinfração, nos termos do art.2º, incisos II e III, da Instrução Normativa IBAMA n.10, de2012, e formulado nos autos do processo administrativo referente à autuação, bem comodeverá vir instruído com os seguintes documentos:I-recibo emitido pelo SICAR, relativo à inscrição do imóvel rural no CadastroAmbiental Rural - CAR de que trata a Lei n.12.651, de 2012; II-cópia do termo de compromisso firmado com o órgão competente integrante doSISNAMA, acompanhada de cópia da proposta, ainda que simplificada, do proprietárioou do possuidor que vise à recomposição, à recuperação, à regeneração ou àcompensação da Reserva Legal, quando for o caso, ou da Área de PreservaçãoPermanente, ou de uso restrito a ser recomposta, recuperada ou regenerada.III-cópia da página do diário oficial estadual em que o extrato do termo de compromissofoi publicado;IV-se pessoa física, cópias da cédula de identidade e do comprovante de inscrição noCadastro de Pessoas Físicas (CPF/MF) do interessado proprietário ou posseiro doimóvel rural; se pessoa jurídica, cópia do comprovante de inscrição no CadastroNacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) e do ato constitutivo e das suas subsequentes

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Tem-se notícia de ao menos uma Decisão Judicialreconhecendo sua inconstitucionalidade no controle difusopor ofensa ao dever de reparo:Ação 1156-59.2013.4.01.3603 (MT/TRF1 julg.07.04.2014,publ.11.04.2014)88.

Em Minas Gerais, o TRIBUNAL DE JUSTIÇA89, julgou-oinconstitucional:

alterações arquivados no órgão competente;V-se for o caso, cópia da matrícula do imóvel rural em regularização ou documentos quecomprovem a posse pelo interessado, bem como cópias das matrículas dos imóveisrurais cujo excedentes à área de reserva legal será utilizada para compensação da área dereserva legal do imóvel objeto do PRA, constando as informações referentes àspoligonais da área de reserva legal das propriedades.§2ºQuando o requerimento se der por meio de representante, deverá vir acrescido doinstrumento da procuração outorgada pelo interessado, com firma reconhecida, do qualdevem constar poderes específicos para que o mandatário receba notificações, firmeacordos, receba e dê quitação e pratique, junto ao IBAMA, os atos necessários àsuspensão das sanções, quando for o caso.§3ºO requerimento de suspensão de sanções será indeferido de plano caso o interessadonão tenha requerido a adesão ao PRA dentro do prazo legal.§4ºCaso haja qualquer alteração no Termo de Compromisso firmado com o órgãoambiental estadual competente, caberá ao autuado apresentar ao Ibama os documentospertinentes entre os previstos no §1º deste artigo para comprovação da alteração,incluindo o Termo Aditivo ao instrumento original, a cópia da alteração da proposta quevise à regularização ambiental do imóvel, a cópia da página do diário oficial estadual emque o extrato do termo aditivo foi publicado.Art.5ºUma vez atendidas as condições previstas na Lei n.12.651, de 2012, e nosDecretos n.7.830, de 2012, e 8.235, de 2014, formulado o requerimento de suspensão deque trata o art. 4º e enquanto estiver sendo cumprido o termo de compromisso firmadono âmbito do PRA, serão suspensas, pela autoridade julgadora competente, as sançõesdecorrentes das infrações mencionadas no §4º do art.59 da Lei n.12.651.87Instrução Normativa da Presidência do IBAMA, de 06.08.2014, publicada no DiárioOficial da União (DOU) de 07.08.2014.88Juiz EDUARDO DE MELO GAMA, inhttp://processual.trf1.jus.br/consultaProcessual/processo.php?trf1_captcha_id=72e2d1f2c03bf1807c046c07ee2b3330&trf1_captcha=v9pj&enviar=Pesquisar&proc=11565920134013603&secao=SNO, acesso a 28.11.2014.89Arguição de Inconstitucionalidade 0039647-38.2011.8.13.0144 ou 1.0144.11.003.964-7/002 (MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS [MPMG] x Sinézia Mariada Silva Santos e Paulo Marcelo dos Santos, Comarca de Carmo do Rio Claro):http://www4.tjmg.jus.br/juridico/sf/proc_movimentacoes2.jsp?listaProcessos=10144110039647002 ,http://www4.tjmg.jus.br/juridico/sf/proc_partes_advogados2.jsp?listaProcessos=10144110039647002 ehttps://www.mpmg.mp.br/comunicacao/noticias/tjmg-declara-a-inconstitucionalidade-do-artigo-67-do-novo-codigo-florestal.htm#.Vm92J7_w_2I , acessados a 15.12.2015.

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Em sessão realizada nessa quarta-feira,24 de junho, o Órgão Especial doTribunal de Justiça de Minas Gerais(TJMG) declarou, por unanimidade, ainconstitucionalidade incidental do artigo67 do Novo Código Florestal, que,segundo a Procuradoria de Justiça deDireitos Difusos e Coletivos, prevê aconsolidação dos desmatamentos ilícitos.A norma, de acordo com o órgão doMinistério Público de Minas Gerais(MPMG), permite o registro de reservalegal em percentual inferior a 20% daárea do imóvel nas propriedades ruraisque detinham, em 22 de julho de 2008, atéquatro módulos fiscais.

No julgamento da Arguição deInconstitucionalidade n.°1.0144.11.003.964-7/002, relatada pelodesembargador Walter Luiz, a corte doTJMG reconheceu que o artigo, ao isentaro proprietário rural de recompor a áreadesmatada, afronta dispositivos daConstituição Federal (CF): artigo 225,caput, que consagra o dever geral deproteção ambiental; artigo 225, § 3°, queprevê a obrigação de reparação do danoao meio ambiente; artigo 225, § 1°, I, queestabelece o dever de restaurar osprocessos ecológicos essenciais; artigo225, § 1°, IIII, que veda a utilização deespaço especialmente protegido de modoa comprometer os atributos que justificamsua proteção; artigo 186, II, queestabelece a exigência de que apropriedade atenda sua função social.

Além disso, foi considerado que a normaafronta ao princípio da vedação doretrocesso em matéria socioambiental.

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A decisão acolheu parecer daCoordenadoria de Controle daConstitucionalidade do MPMG, quedestacou a necessidade de sesalvaguardar o direito fundamental detodos ao meio ambiente ecologicamenteequilibrado como justificativa aoreconhecimento da inconstitucionalidadedos dispositivos ligados à alteraçãomenos restritiva estabelecida pelo código.

“O artigo 67 da lei concedeu verdadeiradesoneração do dever de restaurar asáreas de reserva ilegalmentedesmatadas”, ressaltou no documento aprocuradora de Justiça Elaine MartinsParise. Para a integrante do MPMG, oPoder Legislativo tem liberdade pararegulamentar as questões ambientais,desde que observe os preceitosconstitucionais. “O princípio daproibição do retrocesso ecológico sequalifica como um dos princípiosestruturantes do estado de DireitoAmbiental”, destacou.

O TJMG ainda rejeitou a preliminar desuspensão do julgamento até opronunciamento do Supremo TribunalFederal (STF) na Ação Direta deInconstitucionalidade (Adin) n.º 4.902-DF, ao argumento de que a existência deAdin não impede o exercício do controledifuso da constitucionalidade das leispelo juiz de Direito.

Para avaliar o impacto ambiental do art.67 da Lei12.651/2012cc12.727/2012, caso não o leiamos à luz dodever constitucional de reparação (art.225), remetemos oleitor aO Código Florestal e a Ciência: Contribuições

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para o Diálogo (SBPC/ABC, 2011)90 e ao Comunicado96/2011 da Fundação Federal IPEA91. Segundo esteúltimo estudo, se tomarmos o dispositivo de mododesconexo à Constituição, haveria um permissivo à nãorestauração/reparação de quase 30 milhões de hectares, inverbis:

“Neste primeiro cenário, considerou-se ahipótese de anistia dos passivos atuaisexistentes nas áreas de RL referentes aosimóveis rurais de até quatro módulosfiscais. Neste contexto, o passivo totalestimado isento de ser recuperado é de29,6 milhões de hectares (tabela 3), sendoque a maior parte deste passivo ocorreuna Amazônia e é de 18 milhões de ha(61%)”.

Nossa leitura não pode levar a tal resultado, pois não nosparece crível ter sido esta a intenção do LEGISLATIVO,sobretudo ciente que, assim como os demais Poderes, estásujeito à Constituição.

90In http://www.sbpcnet.org.br/site/publicacoes/outras-publicacoes/codigo-florestal.php,acesso a 12.11.2014; citado ainda pelo Senador RICARDO FERRAÇO – PMDB/ES(Partido do Movimento Democrático Brasileiro / Estado do Espírito Santo), em seuRequerimento publicado a 22.06.2011 quando da tramitação do Projeto de Lei queresultou na Lei 12.651/2012 (http://www.senado.leg.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=92565&tp=1, acesso a 25.11.2014).91Inhttp://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/comunicado/110616_comunicadoipea96.pdf, acesso a 12.11.2014.

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3.Antinomia e solução

3.1.Antinomia

NORBERTO BOBBIO (1996, p.81)92 define antinomia comoa situação de normas incompatíveis entre si; e(op.cit.p.86):

“como aquela situação na qual sãocolocadas em existência duas normas, dasquais uma obriga e a outra proíbe, ouuma obriga e a outra permite, ou umaproíbe e a outra permite o mesmocomportamento.[...]Para que possaocorrer antinomia são necessárias duascondições[...]:1)As duas normas devem pertencer aomesmo ordenamento.[...]2)As duas normas deve ter o mesmoâmbito de validade. Distinguem-se quatroâmbitos de validade de uma norma:temporal, espacial, pessoal e material.”

Insta então verificar se há antinomia na hipótese sobexame.

3.2.Lei 12.651/2012 cc 12.727/2012, Constituição eantinomia aparente

Frisamos, no início, que o PODER CONSTITUINTE

determina ao PODER LEGISLATIVO respeito ao direito dasgerações presentes e futuras, com vistas `a preservação e `arestauração dos processos ecológicos, de modo a sujeitaros que não preservem eou não restaurem a sanções penais

92NORBERTO BOBBIO. Teoria do Ordenamento Jurídico. Trad.MARIA CELESTE

C.J.SANTOS. Brasília: Fundação Universidade de Brasília, 1995.

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e administrativas, e obrigando-os a restaurarem/repararemo dano que tenham contribuído para dar causa (art.225CR).

Vimos que dispositivos como os arts.4º,I,a, e 12§5º da Lei12.651/2012 cc 12.727/2012, contrastados respectivamentecom os arts.2º,a,1,CFF,93 e com a inexistência depermissivo equivalente no diploma anterior, aparentementeofendem ao dever constitucional de preservação.

Vimos também que artigos como o 17§3º, o 61A, o 66 e o67 da Lei 12.651/2012cc12.727/2012 aparentementeofendem ao dever constitucional derestauração/reparação.

Sabemos que o Direito Constitucional Ambiental repercuteem três esferas de responsabilidade: cível (dever depreservar e restaurar/reparar), administrativa-pecuniária(sanção) e penal-criminal (sanção).

A Lei 12.651/2012cc12.727/2012, ao conceituar ereconceituar institutos ambientais, repercute nestas trêsesferas. Contudo, apenas uma destas três esferas estácristalizada constitucionalmente no sentido de não poderter seu grau de proteção reduzido pelo LEGISLATIVO: acível.

Assim, adotando o ensinamento de NORBERTO BOBBIO,restringiremos nossa análise ao âmbito conflituoso, semcontudo deixar de abordar as conseqüências de tal conflitonas outras duas esferas de responsabilidade.

Temos então que há conflito de eficácia entre osdispositivos citados, ao menos, da Lei12.651/2012cc12.727/2012 e a Constituição da República93Código Florestal Federal (CFF - Lei 4771/1965 e alterações), inhttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4771.htm, acesso a 22.10.2014.

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no que toca à responsabilidade cível de preservação erestauração/reparação.

A antinomia resultante de tal conflito, entretanto, é apenasaparente.

Diz-se aparente a antinomia quando o próprioOrdenamento oferece critério para sua solução.

NORBERTO BOBBIO (1996, págs.91-95)94 leciona:

“Devido à tendência de cadaordenamento jurídico se constituir emsistema, a presença de antinomias emsentido próprio é um defeito que ointérprete tende a eliminar. Comoantinomia significa o encontro de duasproposições incompatíveis, que nãopodem ser ambas verdadeiras, e, comreferência a um sistema normativo, oencontro de duas normas que não podemser ambas aplicadas, a eliminação doinconveniente não poderá consistir emoutra coisa senão a eliminação de umadas duas normas[...].Chamamos as antinomias solúveis deaparentes; chamamos as insolúveis dereais. [...] As regras fundamentais para a solução deantinomias são três:a)o critério cronológico;b)o critério hierárquico;c)o critério da especialidade.O critério cronológico, chamado tambémde lex posterior, é aquele com base noqual, entre duas normas compatíveis,prevalece a norma posterior: lex posteriorderogat priori.[...]

94NORBERTO BOBBIO. Teoria do Ordenamento Jurídico. Trad.MARIA CELESTE

C.J.SANTOS. Brasília: Fundação Universidade de Brasília, 1995.

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O critério hierárquico, chamado tambémde lex superior, é aquele pelo qual, entreduas normas incompatíveis, prevalece ahierarquicamente superior: lex superiorderogat inferiori.[...] Uma dasconsequências da hierarquia normativa éjustamente esta: as normas superiorespodem revogar as inferiores, mas asinferiores não podem revogar assuperiores. A inferioridade de uma normaem relação a outra consiste na menorforça de seu poder normativo; essa menorforça se manifesta justamente naincapacidade de estabelecer umaregulamentação que esteja em oposição àregulamentação de uma norma superior.O terceiro critério, dito justamente da lexspecialis, é aquele pelo qual, de duasnormas incompatíveis, uma geral e umaespecial (ou excepcional), prevalece asegunda: lex specialis derogat generali.”

Na hipótese que temos diante de nós, contudo, os trêscritérios de solução são aplicáveis. A Constituição éanterior, é superior e é geral em relação ao conjuntonormativo Lei 12.651/2012cc12.727/2012, que éposterior, inferior e especial.

Sabemos que há solução para isso. Voltemos aNORBERTO BOBBIO (1996, págs.105-109)95 em razão daexcelência lógica de sua didática:

“[...]Pode acontecer que duas normasincompatíveis mantenham entre si umarelação em que se podem aplicarconcomitantemente, não apenas um, masdois ou três critérios. Para exemplificar:uma norma constitucional e uma norma

95NORBERTO BOBBIO. Teoria do Ordenamento Jurídico. Trad.MARIA CELESTE

C.J.SANTOS. Brasília: Fundação Universidade de Brasília, 1995.

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ordinária são formuladas em temposdiversos: entre essas duas normas existeao mesmo tempo uma diferençahierárquica e uma cronológica. Se depois,como frequentemente acontece, a normaconstitucional é geral e a ordinária éespecial, os critérios aplicáveis são três.Essa situação complexa não causaparticular dificuldade quando as duasnormas são colocadas de maneira que,qualquer que seja o critério que se queiraaplicar a solução não muda. [...]Mas a situação não é sempre tão simples.[...] Trata-se, em outras palavras, desaber se existe um critério estável para asolução dos conflitos entre critérios – equal seja. Não podemos dar uma respostageral, temos que examinar, um por um, oscasos de conflito entre critérios.[...]1)Conflito entre o critério hierárquico e ocronológico: esse conflito tem lugarquando uma norma anterior superior éantinômica em relação a uma normaposterior inferior. O conflito consiste nofato de que, se se aplicar o critériohierárquico, prevalece a primeira, se seaplicar o critério cronológico, prevalece asegunda. O problema é: qual dos critériostem preponderância sobre o outro? Aresposta não é dúbia. O critériohierárquico prevalece sobre ocronológico, o que tem por efeito fazereliminar a norma inferior, mesmoque posterior. Em outras palavras, pode-se dizer que o princípio lex posteriorderogat priori não vale quando a lexposterior é hierarquicamente inferior à lexprior. Essa solução é bastante óbvia: se ocritério cronológico devesse prevalecersobre o hierárquico, o princípio mesmoda ordem hierárquica das normas seria

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tornado vão, porque a norma superiorperderia o poder, que lhe é próprio, denão ser ab-rogada pelas normasinferiores. O critério cronológico valecomo critério de escolha entre duasnormas colocadas no mesmo plano.Quando duas normas são colocadas sobredois planos diferentes, o critério naturalde escolha é aquele que nasce da própriadiferença de planos.2)Conflito entre o critério da especialidadee o cronológico: [...] deve ser resolvido afavor do primeiro [...]. Essa regra, poroutro lado, deve ser tomada com umacerta cautela, e tem um valormenos decisivo que o da regra anterior.Dir-se-ia que a lex specialis é menos forteque a lex superior, e que, portanto, a suavitória sobre a lex posterior é maiscontrastada. Para fazer afirmações maisprecisas nesse campo, seria necessáriodispor de uma ampla casuística.3)Conflito entre o critério hierárquico e ode especialidade. Nos dois casosprecedentes vimos o conflito destes doiscritérios respectivamente com o critériocronológico, e constatamos que ambos oscritérios são mais fortes que ocronológico. O caso mais interessante deconflitos é, agora, aquele que se verificaquando entram em oposição não mais umdos dois critérios fortes com o critériofraco (o cronológico), mas os doiscritérios fortes entre si. É o caso de umanorma superior-geral incompatível comuma norma inferior especial. [...]Teoricamente, deveria prevalecer ocritério hierárquico: se se admitisse oprincípio de que uma lei ordináriaespecial pode derrogar os princípiosconstitucionais, que são normasgeneralíssimas, os princípios

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fundamentais de um ordenamento jurídicoseriam destinados a se esvaziarrapidamente de qualquer conteúdo. Mas,na prática [... e descreve precedente emque a Corte Constitucional italiana aplicouo critério da especialidade em detrimentodo hierárquico].”

Na hipótese sob exame, o dever constitucional depreservar e de restaurar/reparar impera sobreespecificidade legal infraconstitucional no âmbito cível; e,mesmo no que toca à especialidade, mister questionar senão há clareza o bastante na regra constitucional de modoa afastar normativas infra com ela colidentes; e seintentamos, na prática, pôr em risco, princípios que,conquanto teóricos, são nosso suporte institucional.

BOBBIO (1996, p.113)96, chama-nos a atenção ainda paraum pressuposto lógico do qual decorre importante deverdo Ordenamento, que poderíamos chamarsupraconstitucional ou, kelseniamente97, fundamental,o dever de coerência-e-justiça:

“A coerência não é condição de validade,mas é sempre condição de justiça doordenamento. É evidente que quando duasnormas contraditórias são ambas válidase pode haver indiferentemente a aplicaçãode uma ou de outra, conforme o livre-arbítrio daqueles que são chamados aaplicá-las, são violadas duas exigênciasfundamentais em que se inspiram outendem a inspirar-se os ordenamentosjurídicos: a exigência da certeza (quecorresponde ao valor da paz ou da

96NORBERTO BOBBIO. Teoria do Ordenamento Jurídico. Trad.MARIA CELESTE

C.J.SANTOS. Brasília: Fundação Universidade de Brasília, 1995.97In http://pt.wikipedia.org/wiki/Norma_fundamental, acesso a 28.11.2014.

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ordem), e a exigência da justiça (quecorresponde ao valor da igualdade).Onde existem duas normas antinômicas,ambas válidas, e portanto ambasaplicáveis, o ordenamento jurídico nãoconsegue garantir nem a certeza,entendida como possibilidade, por partedo cidadão, de prever com exatidão asconseqüências jurídicas da própriaconduta, nem a justiça, entendida como oigual tratamento das pessoas quepertencem à mesma categoria.”

Destarte, ao se reconhecer a antinomiaaparente, tem-se que o critério de solução implica emafastar a incidência das normas da Lei12.651/2012cc12.727/2012 que conflitem com o deverconstitucional de preservação e reparação/restauração;podendo estas, no entanto, incidiremnas outras duas esferas de responsabilidade,administrativa-pecuniária e penal-criminal,sem que haja aí qualquerinconstitucionalidade.

3.3.O dia 22.07.2008 e as três esferas

O Projeto de Lei (PL) 1876, que resultou no conjuntonormativo Lei 12.651/2012cc12.727/2012, data de 1999,98

logo não nasceu com o conceito de área consolidada,como área de imóvel rural com ocupação antrópicapreexistente a 22 de julho de 2008, com edificações,benfeitorias ou atividades agrossilvipastoris, admitida,neste último caso, a adoção do regime de pousio(art.3º,IV,L.12.651/2012cc12.727/2012).

98In http://imagem.camara.gov.br/MostraIntegraImagem.asp?strSiglaProp=PL&intProp=1876&intAnoProp=1999&intParteProp=1, acesso a21.11.2014.

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Consta do histórico de tramitação do Projeto99, em19.03.2006, Relatório do Deputado LUCIANO ZICA –PT/SP100, pela rejeição, aprovado a 21.03.2006101.

Arquivado a 31.01.2007, o Projeto foi desarquivado a17.07.2007102.

Com a retomada da discussão, verifica-se que oLEGISLATIVO passou a tomar o PL.1876/1999 como meiode normatização paralela à Lei de Crimes e InfraçõesAdministrativas Ambientais (LCIAA – Lei 9605/1998 ealterações) e seus regulamentos, ora fazendo-se menção aoDecreto Federal 3179, de 21.09.1999, publicado22.09.1999, ora ao que lhe revogou e o substituiu, oDecreto 6514, de 22.07.2008, publicado 23.07.2008, emque pese as críticas a tal vinculação.

Assim, lemos, em voto de junho/2010,103 a indignação doDeputado IVAN VALENTE – PSOL/SP104:

“O Substitutivo INTRODUZ enquantoreferência do Código Florestal o dia 22 dejulho de 2008 para anistia aos crimesambientais cometidos anteriormente a estadata. Esta é a data da edição do decreto deregulamentação que deu efetividade para aLei de Crimes Ambientais (Lei 9605/98)que entrou em vigor 10 (dez) anos antes,

99In http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=382296&filename=Tramitacao-PL+1876/1999, acesso a 24.11.2014.100Partido dos Trabalhadores / Estado de São Paulo.101In http://www.camara.gov.br/internet/ordemdodia/ordemDetalheReuniaoCom.asp?codReuniao=12616 , acesso a 24.11.2014.102In http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=17338, acesso a 24.11.2014103In http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=784004&filename=VTS+1+PL187699+%3D%3E+PL+1876/1999, acesso a21.11.2014.104Partido Socialismo e Liberdade / Estado de São Paulo.

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ou seja, em 1998. Este dispositivo doSubstitutivo da Mesa (Art.2, III) acerca de“area rural consolidada” é totalmenteinoportuno e desnecessário, além de suacompleta inconstitucionalidade, visto que,o dispositivo desrespeita frontalmente eexplicitamente as determinações de umalegislação ambiental importante (Lei deCrimes Ambientais) que no mês de julhode 2010 completa 12 (doze) anos de suapublicação. Trata-se de uma soluçãolegislativa inédita esta encontrada peloRelator Aldo Rebelo, quando propõeincluir em lei, exatamente no CódigoFlorestal Brasileiro, uma inédita anistiaem série a quem cometeu crime ambientaldiscricionado por lei e enquadrado nosritos de procedimento sumario do Códigode Processo Civil (Lei 4.771/65, Art 1°, §1°), cuja previsão de enquadramentotambém foi RETIRADA peloSubstitutivo do Relator.”

Outrossim, em junho/2010,105 se manifestou o DeputadoSARNEY FILHO – PV/MA106:

“Essa data refere-se à edição doanteriormente citado Decretonº6.514/2008, que regulamenta a Lei deCrimes Ambientais. Ocorre que essa leifoi regulamentada inicialmente peloDecreto nº3.179, editado em 21 desetembro de 1999. Portanto, se tivesse queser eleita uma data para servir deparâmetro para vários dispositivos dosubstitutivo tendo em vista, sobretudo, achamada regularização ambiental, teria deser a data da primeira regulamentação daLei de Crimes Ambientais, ou seja, 21 de

105In http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=785020&filename=VTS+2+PL187699+%3D%3E+PL+1876/1999, acesso a24.11.2014.106Partido Verde / Estado do Maranhão.

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setembro de 1999. Na prática, a adoção dadata de 22 de julho de 2008 torna o textomais permissivo em pelo menos nove anosde degradação ambiental, isentando osinfratores de sofrerem penalidades nasesferas cível, administrativa e criminal.[...]Estão aqui os efeitos concretos dautilização da data errônea no conceito deárea rural consolidada: os programas deregularização ambiental. Se a idéia é aremessa ao regulamento da Lei de CrimesAmbientais, a data deveria ser 21 desetembro de 1999, quando foi editado oprimeiro regulamento, o Decreto nº 3.179.Deve-se perceber que as regras para oprograma de regularização fundiária sãomuito pouco claras, trazendo verdadeiraanistia para quem desmatou até 22 dejulho de 2008. O que acontece com osinúmeros processos administrativos ejudiciais em curso referentes a infraçõescontra a flora? O que acontece com assentenças penais já proferidas? Vale tudoaté a referida data? Os proprietários epossuidores de imóveis rurais quecumpriram as normas ambientais serãotratados da mesma forma que aqueles quesimplesmente optaram por ignorar a lei?Como controlar a qualidade técnica dessesprogramas? O que cabe ao Poder Públicoe o que é responsabilidade dosproprietários ou possuidores rurais em suaimplementação? O que ocorrerá se asobrigações assumidas pelo Poder Públicono programa, no lugar dos proprietários oupossuidores rurais, não forem executadas?Há vários questionamentos sérios sem adevida resposta.”

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É neste mesmo sentido a crítica do Senador RANDOLFE

RODRIGUES – PSOL/AP107, em seu voto108:

“A data proposta como marco paraestabelecimento deste conceito coincidecom a publicação da última versão doregulamento da Lei de CrimesAmbientais, o Decreto nº6.514, de 2008,que dispõe sobre as infrações e assanções administrativas ao meioambiente, estabelece o processoadministrativo federal para apuraçãodestas infrações, e dá outrasprovidências. O referido decreto apenasregulamenta as sanções pelodescumprimento dos dispositivos jávigentes do Código Florestal, cuja últimamodificação ocorreu com a edição daMedida Provisória 2.166-67 de 2001. Nãoé compreensível ou justificável, destaforma, o motivo do estabelecimento destadata.”

Destarte, verifica-se que a mens legislatoris passou peladescriminalização e legalização das infraçõesadministrativas perpetradas antes da edição doregulamento da Lei de Crimes e InfraçõesAdministrativas Ambientais (LCIAA – Lei 9605/1998 ealterações), terminando por fechar a redação com a data daedição do Decreto 6514, regramento atual da LCIAA,22.07.2008.

A mens legis, aliada à leitura do conjunto normativo à luzda Constituição, não pode ficar longe disso.

Enfim, temos diante de nós um conjunto normativo, Lei12.651/2012cc12.727/2012, pensado para abrandar a107Partido Socialismo e Liberdade / Estado do Amapá.108In http://legis.senado.leg.br/mateweb/arquivos/mate-pdf/96127.pdf, acesso a25.11.2014.

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responsabilização criminal-penal eadministrativa-pecuniária àqueles que, até a data daedição do Decreto 6514/2008, desatenderam este, a Lei deCrimes e Infrações Administrativas Ambientais (LCIAA –Lei 9605/1998 e alterações) e o do novo Código FlorestalFederal (CFF - Lei 4771/1965 e alterações)109.

Ocorre que, como exposto, sua leitura lisa e desatenta àConstituição poderia resultar em inconstitucional ofensa àesfera de responsabilização cível: dever de preservar erestaurar/reparar.

Destarte, a hermenêutica do conjuntonormativo Lei 12.651/2012cc12.727/2012 deveconsiderar que sua aplicação se presta à revogação desanções, previstasnas esferas deresponsabilização criminal-penal eadministrativa-pecuniária, masjamais ao desrespeito ao dever cível-constitucional depreservação e restauração/reparação.

3.4.Solução da antinomia aparente

3.4.1.Prevalece a constituição

Prevalece a Constituição, que, na esfera cível, salvaguardao dever de preservar e restaurar/reparar.

Aplica-se o conjunto normativo Lei 12.651/2012 cc12.727/2012, naquilo que não conflita com tal deverconstitucional: esferas criminal e administrativa.

109In http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4771.htm, acesso a 22.10.2014.

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Voltemos à casuística para bem ilustrar.

3.4.2.Dever de preservação

Arts.4º,I,a, e 12§5º da Lei 12.651/2012cc12.727/2012:contrastados respectivamente com os arts.2º,a,1,CFF,110 ecom a inexistência de permissivo equivalente no diplomaanterior, aparentemente ofendem ao dever constitucionalde preservação.

A solução a tal antinomia demanda ultra-atividade do novoCódigo Florestal Federal (CFF – Lei 4771/1965 ealterações) no que toca à área a ser preservada, por estarcristalizada constitucionalmente: esfera cível.

Os arts.4º,I,a, e 12§5º da Lei 12.651/2012 cc 12.727/2012implicam, contudo, em inimputabilidade administrativa ecriminal para aqueles que praticaram, pratiquem ouvenham a praticar atividade poluidora na margem deproteção reduzida pela norma superveniente.

Vale dizer: se há ou vier a haver dano à APP a menos de 10metros do nível mais alto do corpo hídrico, mas a mais de10 metros de seu leito regular, o dever constitucional depreservação obriga-o a reparar o dano, mas normatizaçãoinfralegal torna tal conduta impunível.

O mesmo raciocínio se aplica ao art.12§5º da Lei12.651/2012 cc 12.727/2012: a aparente redução da RLamazônica de 80 para 50% só pode ser tida comoinimputabilidade administrativa e criminal aos quereduzirem, mas persiste o dever constitucional depreservação da RL em 80%.

110Código Florestal Federal (CFF - Lei 4771/1965 e alterações), inhttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4771.htm, acesso a 22.10.2014.

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3.4.3.Autorização técnico-administrativa

Arts.17§3º e 61A da Lei 12.651/2012cc12.727/2012:pressupõem autorização técnico-administrativa casuísticaque ateste a ausência de óbice ambiental à atividadepoluidora iniciada antes da edição do Decreto 6514,22.07.2008.

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Tal autorização deve levar em conta osarts.3º111,4º112,10113e14114§1ºPNMA115.

Outrossim, também os parâmetros normativos da própriaLei 12.651/2012cc12.727/2012, notadamente aquelesprevistos no art.3º,V,VIIeVIII116, devem ser observados.

111Art.3º- Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: I-meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física,química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas; II-degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características do meioambiente; III-poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ouindiretamente: a)prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b)criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c)afetem desfavoravelmente a biota; d)afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e)lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos; IV-poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, diretaou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental; V-recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, osestuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora.[Redação dada pela Lei 7804/89][...]112Art.4º-A Política Nacional do Meio Ambiente visará:[...]VII-à imposição, ao poluidore ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário,da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.[...]113Art.10.A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos eatividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores oucapazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental dependerão de préviolicenciamento ambiental.[Redação dada pela Lei Complementar 140/2011][...]114Art.14-Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual emunicipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dosinconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará ostransgressores: I-à multa simples ou diária, nos valores correspondentes, no mínimo, a 10 (dez) e, nomáximo, a 1.000 (mil) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTNs,agravada em casos de reincidência específica, conforme dispuser o regulamento, vedadaa sua cobrança pela União se já tiver sido aplicada pelo Estado, Distrito Federal,Territórios ou pelos Municípios. II-à perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público; III-à perda ou suspensão de participação em linhas de financiamento emestabelecimentos oficiais de crédito; IV-à suspensão de sua atividade. §1º-Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado,independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados aomeio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União edos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por

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3.4.4.Embargo em RL

Art.66 da Lei 12.651/2012 cc 12.727/2012: a leiturasistêmica implica em dizer que o embargo é aplicável aqualquer exploração ilegal de RL, seja anterior, sejaposterior à edição do Decreto 6514, 22.07.2008.

danos causados ao meio ambiente.[...]115Política Nacional do Meio Ambiente – Lei 6938/1981 e alterações.116

Art.3oPara os efeitos desta Lei, entende-se por:[...]V-pequena propriedade ou posse rural familiar: aquela explorada mediante o trabalhopessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar rural, incluindo os assentamentose projetos de reforma agrária, e que atenda ao disposto no art.3o da Lei no11.326, de 24de julho de 2006;[...]VII-manejo sustentável: administração da vegetação natural para a obtenção debenefícios econômicos, sociais e ambientais, respeitando-se os mecanismos desustentação do ecossistema objeto do manejo e considerando-se, cumulativa oualternativamente, a utilização de múltiplas espécies madeireiras ou não, de múltiplosprodutos e subprodutos da flora, bem como a utilização de outros bens e serviços;VIII-utilidade pública:a)as atividades de segurança nacional e proteção sanitária;b)as obras de infraestrutura destinadas às concessões e aos serviços públicos detransporte, sistema viário, inclusive aquele necessário aos parcelamentos de solo urbanoaprovados pelos Municípios, saneamento, gestão de resíduos, energia,telecomunicações, radiodifusão, instalações necessárias à realização de competiçõesesportivas estaduais, nacionais ou internacionais, bem como mineração, exceto, nesteúltimo caso, a extração de areia, argila, saibro e cascalho;c)atividades e obras de defesa civil;d)atividades que comprovadamente proporcionem melhorias na proteção das funçõesambientais referidas no inciso II deste artigo;e)outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em procedimentoadministrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional aoempreendimento proposto, definidas em ato do Chefe do Poder Executivo federal;IX-interesse social:a)as atividades imprescindíveis à proteção da integridade da vegetação nativa, tais comoprevenção, combate e controle do fogo, controle da erosão, erradicação de invasoras eproteção de plantios com espécies nativas;b)a exploração agroflorestal sustentável praticada na pequena propriedade ou posse ruralfamiliar ou por povos e comunidades tradicionais, desde que não descaracterize acobertura vegetal existente e não prejudique a função ambiental da área;c)a implantação de infraestrutura pública destinada a esportes, lazer e atividadeseducacionais e culturais ao ar livre em áreas urbanas e rurais consolidadas, observadasas condições estabelecidas nesta Lei;d)a regularização fundiária de assentamentos humanos ocupados predominantementepor população de baixa renda em áreas urbanas consolidadas, observadas as condiçõesestabelecidas na Lei no11.977, de 7 de julho de 2009;

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3.4.5.Dever de restauração/reparação em RL

Art.67117 da Lei 12.651/2012cc12.727/2012: seu choquecom o dever constitucional de reparação exige oafastamento da norma da esfera jurídica cível,remanescendo apenas quanto à extinção de punibilidadecriminal e quanto a sanções pecuniárias administrativas

e)implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e de efluentestratados para projetos cujos recursos hídricos são partes integrantes e essenciais daatividade;f)as atividades de pesquisa e extração de areia, argila, saibro e cascalho, outorgadas pelaautoridade competente;g)outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em procedimentoadministrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional à atividadeproposta, definidas em ato do Chefe do Poder Executivo federal;X-atividades eventuais ou de baixo impacto ambiental:a)abertura de pequenas vias de acesso interno e suas pontes e pontilhões, quandonecessárias à travessia de um curso d’água, ao acesso de pessoas e animais para aobtenção de água ou à retirada de produtos oriundos das atividades de manejoagroflorestal sustentável;b)implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e efluentestratados, desde que comprovada a outorga do direito de uso da água, quando couber;c)implantação de trilhas para o desenvolvimento do ecoturismo;d)construção de rampa de lançamento de barcos e pequeno ancoradouro;e)construção de moradia de agricultores familiares, remanescentes de comunidadesquilombolas e outras populações extrativistas e tradicionais em áreas rurais, onde oabastecimento de água se dê pelo esforço próprio dos moradores;f)construção e manutenção de cercas na propriedade;g)pesquisa científica relativa a recursos ambientais, respeitados outros requisitosprevistos na legislação aplicável;h)coleta de produtos não madeireiros para fins de subsistência e produção de mudas,como sementes, castanhas e frutos, respeitada a legislação específica de acesso arecursos genéticos;i)plantio de espécies nativas produtoras de frutos, sementes, castanhas e outros produtosvegetais, desde que não implique supressão da vegetação existente nem prejudique afunção ambiental da área;j)exploração agroflorestal e manejo florestal sustentável, comunitário e familiar,incluindo a extração de produtos florestais não madeireiros, desde que nãodescaracterizem a cobertura vegetal nativa existente nem prejudiquem a funçãoambiental da área;k)outras ações ou atividades similares, reconhecidas como eventuais e de baixo impactoambiental em ato do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA ou dosConselhos Estaduais de Meio Ambiente;[...]117Já há Decisão Judicial, no controle difuso, reconhecendo a inconstitucionalidade destedispositivo: Ação 1156-59.2013.4.01.3603/MT/TRF1, julg.07.04.2014,publ.11.04.2014, Juiz EDUARDO DE MELO GAMA, inhttp://processual.trf1.jus.br/consultaProcessual/processo.php?trf1_captcha_id=72e2d1f2c03bf1807c046c07ee2b3330&trf1_captcha=v9pj&enviar=P

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não consolidadas como dívida de valor(art.5º,XXXVI,118CR119; art.2º,§ú,XIII,120LPAF121; LEF122; einteligência do REsp205739/SP123 e do AGI2012816-29.2013.8.26.0000-TJSP124).

Quer-se dizer com isto que os danos ambientais praticadosem imóveis com o perfil descrito no art.67 da Lei12.651/2012cc12.727/2012 não poderão ser objeto deapenamento criminal eou administrativo, mas deverãoser reparados, restaurando a vegetação nativa ao quedeveria existir de acordo com o art.68 do mesmo conjuntonormativo Lei 12.651/2012cc12.727/2012 (negritamos):

esquisar&proc=11565920134013603&secao=SNO, acesso a 28.11.2014.118Art.5º[...]XXXVI-a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e acoisa julgada;[...]119Constituição da República.120

Art.2oA Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios dalegalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampladefesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, oscritérios de:[...]XIII-interpretação da norma administrativa da forma que melhor garantao atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de novainterpretação.121Lei de Processo Administrativo Federal – Lei 9784/1999 e alterações.122Lei de Execução Fiscal – Lei 6830/1980 e alterações.123RECURSO ESPECIAL 1999/0018214-6 [...]II.No caso de descumprimento da pena de multa, conjuga-se o art.85 da Lei nº9.099/95 eo art.51 do CP, com a nova redação dada pela Lei nº9.286/96, com a inscrição da penanão paga em dívida ativa da União para ser executada.[...][Julg.22.08.2000, publ.23.10.2000, inhttps://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=199900182146&dt_publicacao=23/10/2000, acesso a 25.11.2014]124Agravo de Instrumento julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,Rel.Des.JOÃO NEGRINI FILHO, julg.07.11.2013 e publ.11.11.2013, inhttps://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/abrirDocumentoEdt.do?origemDocumento=M&nuProcesso=2012816-29.2013.8.26.0000&cdProcesso=RI001XL170000&cdForo=990&tpOrigem=2&flOrigem=S&nmAlias=SG5SP&cdServico=190201&ticket=i04aS9XrwCeLvjYtoLE8mzbDmGLf%2FMwTyeWqRiDkbRiCy4IUZbNOKN4F0xYudKlvJSbYgCufpgo6S13naa%2FtBn01dlp92%2BGHI0iHgKWVoS2vkQg%2Fd2Uzp%2BGny%2BKR%2BYOwx5sPNke3nisD%2B0ffAJdvVjF0pm7PHjhouE3Ryk5LKWBC8OmMO1PHDRexMqwW0odhDzPU8RzWcZ8wWFe6N0v%2BjhjgqN%2BqdiTsqz9f9TDy0Mk%3D ehttp://esaj.tjsp.jus.br/cpo/sg/show.do?processo.foro=990&processo.codigo=RI001XL170000, acesso a 28.11.2014.

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Os proprietários ou possuidores deimóveis rurais que realizaram supressãode vegetação nativa respeitando ospercentuais de Reserva Legal previstospela legislação em vigor à época em queocorreu a supressão são dispensados depromover a recomposição, compensaçãoou regeneração para os percentuaisexigidos nesta Lei.

Aqui é importante lembrar que o novo Código FlorestalFederal (CFF – Lei 4771/1965 e alterações), previu,quando de sua publicação, a proteção a 50% da vegetaçãonativa na Região Amazônica (art.44125); proteção estaelevada, desde 1996 a 80% (art.44§2º126, redação daMedida Provisória 1511/1996127, norma posteriormentemigrada para o art.16,I,128 redação dada pelaMedida Provisória 1956-50/2000129). De se notar aindaque, desde 1991 já era facultado ao proprietário de imóvela regularização de eventual déficit, nos termos do art.99130

125Art.44.Na região Norte e na parte Norte da região Centro-Oeste enquanto não for

estabelecido o decreto de que trata o artigo 15, a exploração a corte razo só é permissíveldesde que permaneça com cobertura arbórea, pelo menos 50% da área de cadapropriedade.[Redação Primitiva da Lei 4771/1965] Parágrafo único. A reserva legal, assim entendida a área de, no mínimo, 50% (cinquentapor cento) de cada propriedade, onde não é permitido o corte raso, deverá ser averbada à margem da inscrição da matrícula do imóvel no registro de imóveis competente,sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título,ou de desmembramento da área.[Incluído pela Lei 7803/1989]126Art.44[...]§2ºNas propriedades onde a cobertura arbórea se constitui de fitofisionomiasflorestais, não será admitido o corte raso em pelo menos oitenta por cento dessastipologias florestais.127Https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MPV/Antigas/1511.htm.128Art.16.As florestas e outras formas de vegetação nativa, ressalvadas as situadas emárea de preservação permanente, assim como aquelas não sujeitas ao regime deutilização limitada ou objeto de legislação específica, são suscetíveis de supressão,desde que sejam mantidas, a título de reserva legal, no mínimo:I-oitenta por cento, na propriedade rural situada em área de floresta localizada naAmazônia Legal;[...]129Https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MPV/Antigas/2080-58.htm.130Art.99.A partir do ano seguinte ao de promulgação desta lei, obriga-se o proprietáriorural, quando for o caso, a recompor em sua propriedade a Reserva Florestal Legal,prevista na Lei n°4.771, de 1965, com a nova redação dada pela Lei n° 7.803, de 1989,

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da Lei 8171, em 30 anos a partir de 1992, ou seja, 2022;medida esta que restou prorrogada para 2031, nos termosdo art.44,I,131 redação dada pela Medida Provisória2166-67/2001132 (mantida em vigor pelo art.2º133 EmendaConstitucional 32/2001134); agora prorrogadanovamente para 2032 (art.66§2º135Lei12.651/2012cc12.727/2012).

3.5.Preservação, restauração/reparação ecoerência-justiça

3.5.1.Preservação e restauração/reparação

É válido observar uma importante diferença entre asnormas que buscam a flexibilização do deverconstitucional de preservação (citadoart.225,caput,e§1º,I,CR) e aquelas cuja pior hermenêuticaquer levar à ofensa do dever de restauração/reparação(citado art.225§§1º,I,e3º,in fine,CR).

mediante o plantio, em cada ano, de pelo menos um trinta avos da área total paracomplementar a referida Reserva Florestal Legal (RFL).131

Art.44.O proprietário ou possuidor de imóvel rural com área de floresta nativa,natural, primitiva ou regenerada ou outra forma de vegetação nativa em extensãoinferior ao estabelecido nos incisos I, II, III e IV do art.16, ressalvado o disposto nosseus §§5o e 6o, deve adotar as seguintes alternativas, isoladas ou conjuntamente:[Redação dada pela Medida Provisória 2166-67/2001]I-recompor a reserva legal de sua propriedade mediante o plantio, a cada três anos, de nomínimo 1/10 da área total necessária à sua complementação, com espécies nativas, deacordo com critérios estabelecidos pelo órgão ambiental estadual competente;[Incluídopela Medida Provisória 2166-67/2001][...]132De 24.08.2001, publicada no DOU de 25.08.2001:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MPV/2166-67.htm#art1 .133Art.2ºAs medidas provisórias editadas em data anterior à da publicação desta emendacontinuam em vigor até que medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou atédeliberação definitiva do Congresso Nacional.134De 11.09.2001, publicada no DOU de 12.09.2001:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc32.htm .135

Art.66[...]§2oA recomposição de que trata o inciso I do caput deverá atender oscritérios estipulados pelo órgão competente do Sisnama e ser concluída em até 20 (vinte)anos, abrangendo, a cada 2 (dois) anos, no mínimo 1/10 (um décimo) da área totalnecessária à sua complementação.[...]

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3.5.2.Preservação

Normas da Lei 12.651/2012cc12.727/2012 enquadradas noprimeiro caso estão exemplificadas nos tópicos 2.2 e 3.4.2:são o art.4º,I,a, e o art.12§5º.

Estas normas trazem um conteúdo ex tunc e erga omnes, eatingem fatos anteriores e posteriores à Lei12.651/2012cc12.727/2012, anteriores e posteriores a22.07.2008.

Neste sentido, estas normas, embora ofensivas ao deverconstitucional de preservar (citadoart.225,caput,e§1º,I,CR), não ofendem ao deverconstitucional de isonomia (art.5º136CR).

3.5.3.Restauração/reparação

Já as normas que ofendem ao dever constitucional derestauração/reparação (citado art.225§§1º,I,e3º,in fine,CR),aqui exemplificadas nos tópicos 2.3 e 2.4.3 a 2.4.5,ofendem a um só tempo o dever constitucional de cuidadocom o bem-ambiente, como também a isonomia, e aindaao dever supraconstitucional (fundamental) de coerência,que não é condição de validade, mas é sempre condiçãode justiça do ordenamento (BOBBIO,1996,p.113).

Exemplifica-se com o art.67137 da Lei12.651/2012cc12.727/2012.

136Art.5ºTodos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-seaos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, àliberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade[...].137Já há Decisão Judicial, no controle difuso, reconhecendo a inconstitucionalidade destedispositivo: Ação 1156-59.2013.4.01.3603/MT/TRF1, julg.07.04.2014,publ.11.04.2014, Juiz EDUARDO DE MELO GAMA, inhttp://processual.trf1.jus.br/consultaProcessual/processo.php?trf1_captcha_id=72e2d1f2c03bf1807c046c07ee2b3330&trf1_captcha=v9pj&enviar=Pesquisar&proc=11565920134013603&secao=SNO, acesso a 28.11.2014.

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Como visto, tal dispositivo aparentemente extingue odever de restaurar/reparar a RL de imóveis inferiores a 4módulos fiscais destruída antes de 22.07.2008.

Os arts.12 e 68 do mesmo conjunto normativo, Lei12.651/2012cc12.727/2012, no entantoobrigam o proprietário-possuidor-posseiro a tê-la e mantê-la, ou, não tendo, a restaurá-la e repará-la.

A se fazer uso da solução de conflito por especialidade,vigerá o art.67. A se fazer uso da hierarquia (citadoart.225§§1º,I,e3º,in fine,CR), a norma deixa de incidirsobre o dever cível, gerando tão só inimputabilidadecriminal e administrativa.

A não se resolver a antinomia, eis a incoerência-injustiça:cada intérprete aplicará a norma que quiser.

A se resolver a antinomia a favor da aplicação lisa doart.67 contra o dever de restaurar/reparar(art.225§§1º,I,e3º,in fine,CR), eis a incoerência-injustiça anti-isonômica perante os que cumpriram a Lei eeis o prêmio-vexatório e o incentivo ao ilícito de que nosfala o STJ no citado REsp302906SP (2001/0014094-7,julg.26.08.2010 e publ.1º.12.2010)138.

Enfim, buscamos coerência-e-justiça quando interpretamosuma norma infraconstitucional de modo a garantir omáximo possível de relação isonômica entre v.g aquelesque desmataram sem autorização APP/RL e aqueles que aspreservaram em prol de si e dos que virão.

138In https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=200100140947&dt_publicacao=01/12/2010,acesso a 06.11.2014.

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3.5.4.Efeito ontológico do desrespeito ao comandoconstitucional

A nosso ver, não há como negar que abertura de umprecedente legislativo que ofenda ao dever constitucionalde restauração/reparação põe por terra todo o art.225CR,notada e obviamente porque cria uma expectativa de quevale à pena arriscar o descumprimento da lei. Nestesentido, relevante observar os dados do desmatamento naAmazônia fornecidos pelo Instituto Nacional de PesquisasEspaciais (INPE), ente vinculado ao Ministério da Ciência,Tecnologia e Inovação (MCTI). Consoante sítio doInstituto139, verificamos picos de desmate em 2008, anoindicado na Lei 12.651/2012cc12.727/2012 como o daconsolidação do ilícito, e 2011, ano da aprovação doPL1876/1999 (que ulteriormente resultou na Lei12.651/2012) na Câmara dos Deputados140.

3.5.5.Bem-ambiente e coerência-justiça

Tal qual definido pelo STJ141, o Princípio da Proibição doRetrocesso pode ser excepcionado se, e somente se, ascircunstâncias de fato forem significativamente alteradas.

Contrastando os fundamentos jurídicos que permitem aflexibilização do dever constitucional de preservação(art.225,caput,e§1º,I,CR) com o impositivo constitucionalde restauração/reparação (art.225§§1º,I,e3º,in fine,CR), eatentando para o princípio fundamental142

139In http://www.obt.inpe.br/degrad/, acesso a 25.11.2014.140In http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=17338, acesso a 25.11.2014.141

In http://stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=97483, acesso a 22.10.2014.142In http://pt.wikipedia.org/wiki/Norma_fundamental, acesso a 28.11.2014.

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(supraconstitucional) de coerência-e-justiça de todoOrdenamento Jurídico de que nos fala BOBBIO

(1996,p.113)143, parece-nos que a exceção prevista noPrincípio da Proibição do Retrocesso só se aplica ao deverconstitucional de preservação e não se aplica ao deverconstitucional de restauração/reparação.

Isto por que, como exposto, o dever do art.225§§1º,I,e3º,infine,CR não contempla nenhuma ressalva do Constituinte,e a razão disto é óbvia: não quebrar a isonomia e nãoincentivar o descumprimento do Ordenamento.

Assim, se as circunstâncias fáticas autorizarem/exigirem, acoletividade/Estado poderá flexibilizar o dever comumpara consigo e para com as gerações futuras comexcepcional redução protetiva em eventos vindouros, masjamais abrir mão do dever coletivo derestauração/reparação, a que estão sujeitos todos aquelesque descumpriram o Ordenamento, conforme a norma dadata do fato. Sob tal lógica, mesmo que se invoque aexcepcionalidade principiológica, persiste o deverconstitucional do art.225§§1º,I,e3º,in fine.

Não há, contudo, hoje, tal excepcionalidade, na medida emque os relatórios científicos gritam pela imperiosanecessidade de preservação: O Código Florestal e aCiência: Contribuições para o Diálogo (SBPC/ABC,2011)144 e Comunicados do IPEA, nº96, Código Florestal:Implicações do PL1876/99 nas áreas de Reserva Legal(IPEA, 2011)145.

143NORBERTO BOBBIO. Teoria do Ordenamento Jurídico. Trad.MARIA CELESTE

C.J.SANTOS. Brasília: Fundação Universidade de Brasília, 1995.144In http://www.sbpcnet.org.br/site/publicacoes/outras-publicacoes/codigo-florestal.php, acesso a 12.11.2014145Inhttp://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/comunicado/110616_comunicadoipe

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Ao contrário, há o dever coletivo em prol dobem-ambiente e há o comando supraconstitucionalem prol de coerência-e-justiça.

Conclusões

a)O bem-ambiente é regido por três esferas deresponsabilidade:

a.1)cível, que implica num dever constitucional depreservação (art.225,caput,e§1º,I,CR) e em um deverconstitucional de restauração/reparação(art.225§§1º,I,e3º,in fine,CR); e

a.2)administrativa-pecuniária e criminal-penal(art.225§3º,primeira parte,CR), que pressupõem fixaçãode sanção nos casos que a Lei assim determinar; comotratam de punição, estas esferas seguem o princípio daultima ratio; logo, podem ter sua aplicação minimizada.

b)As leis ambientais devem salvaguardar o direito aobem-ambiente, não só das gerações presentes, mas tambémdas gerações futuras; logo, não podem suprimir ou reduzirdireito vigente, principalmente considerando que os quevirão não participaram nem participam do processolegislativo; assim, para assegurar tal direito, há umcomando constitucional irrenunciável para Legislador ecomunidade em prol da preservação erestauração/reparação dos processos ecológicos: a isto,doutrina e jurisprudência dão o nome de Princípio daProibição do Retrocesso Ecológico, que é uma espécie daProibição do Retrocesso Social aplicada ao DireitoAmbiental.

a96.pdf, acesso a 12.11.2014.

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c)Sendo vedado ao Legislador abrir mão do dever depreservação e restauração/reparação do bem-ambiente, osdispositivos legais que conflitem com tal comando nãopodem ser aplicados, havendo vigência ultra-ativa danorma antecessora. No caso das normas analisadas nestebreve estudo, vale dizer que o conjunto normativo Lei12.651/2012cc12.727/2012 não revoga, no âmbitocível-constitucional, disposições do novo Código FlorestalFederal (CFF – Lei 4771/1965 e alterações) como oart.2º,a,1, deste; assim como o art.67 da Lei12.651/2012cc12.727/2012 não incide sobre o deverconstitucional de restauração/reparação da RL.

d)Como não há óbice constitucional à minimização desanções, ultima ratio, e atentando para o fato de que omarco temporal estabelecido pelo Legislador, 22.07.2008,é precisamente a data de edição do Decreto 6514, queregulamenta a Lei de Crimes e Infrações AdministrativasAmbientais (LCIAA – Lei 9605/1998 e alterações),concluímos que as normas da Lei12.651/2012cc12.727/2012 se aplicam de modo irrestritono âmbito das esferas de responsabilidade criminal-penal eadministrativa-pecuniária, inexistindo aí antinomia. Nocaso das normas analisadas neste breve estudo, istoequivale a dizer que o conjunto normativo Lei12.651/2012cc12.727/2012 revoga as sanções penais eadministrativas v.g no intervalo especial que se extraia dadiferença de medição entre seu art.4º,I,a e oart.2º,a,1,CFF; assim como extingue as sanções para apessoa que se encontre na situação prevista no art.67 daLei 12.651/2012cc12.727/2012; ressalvadas as dívidas devalor, que deixam de ter natureza jurídica de sanção

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(art.5º,XXXVI,146CR147; art.2º,§ú,XIII,148LPAF149; LEF150; einteligência do REsp205739/SP151 e do AGI2012816-29.2013.8.26.0000-TJSP152).

e)Tal interpretação assegura validade plena à Lei12.651/2012cc12.727/2012 no âmbito das esferassancionatórias (criminal-penal e administrativa-pecuniária)sem ofender o dever constitucional-cível de preservação erestauração/reparação em benefício nosso e dos que virão.

146Art.5º[...]XXXVI-a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e acoisa julgada;[...]147Constituição da República.148

Art.2oA Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios dalegalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampladefesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, oscritérios de:[...]XIII-interpretação da norma administrativa da forma que melhor garantao atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de novainterpretação.149Lei de Processo Administrativo Federal – Lei 9784/1999 e alterações.150Lei de Execução Fiscal – Lei 6830/1980 e alterações.151RECURSO ESPECIAL 1999/0018214-6 [...]II.No caso de descumprimento da pena de multa, conjuga-se o art.85 da Lei nº9.099/95 eo art.51 do CP, com a nova redação dada pela Lei nº9.286/96, com a inscrição da penanão paga em dívida ativa da União para ser executada.[...][Julg.22.08.2000, publ.23.10.2000, inhttps://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=199900182146&dt_publicacao=23/10/2000, acesso a 25.11.2014]152Agravo de Instrumento julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,Rel.Des.JOÃO NEGRINI FILHO, julg.07.11.2013 e publ.11.11.2013, inhttps://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/abrirDocumentoEdt.do?origemDocumento=M&nuProcesso=2012816-29.2013.8.26.0000&cdProcesso=RI001XL170000&cdForo=990&tpOrigem=2&flOrigem=S&nmAlias=SG5SP&cdServico=190201&ticket=i04aS9XrwCeLvjYtoLE8mzbDmGLf%2FMwTyeWqRiDkbRiCy4IUZbNOKN4F0xYudKlvJSbYgCufpgo6S13naa%2FtBn01dlp92%2BGHI0iHgKWVoS2vkQg%2Fd2Uzp%2BGny%2BKR%2BYOwx5sPNke3nisD%2B0ffAJdvVjF0pm7PHjhouE3Ryk5LKWBC8OmMO1PHDRexMqwW0odhDzPU8RzWcZ8wWFe6N0v%2BjhjgqN%2BqdiTsqz9f9TDy0Mk%3D ehttp://esaj.tjsp.jus.br/cpo/sg/show.do?processo.foro=990&processo.codigo=RI001XL170000, acesso a 28.11.2014.

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