a resposta da geração y na estratégia de crescimento organizacional

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Volume 2 Número 2 Jul/Dez 2012 Doc. 10 Rev. Bras. de Casos de Ensino em Administração ISSN 2179-135X _________________________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________________________ ©FGV-EAESP / RAE 2012 Todos os direitos reservados. Permitidas a citação e a reprodução parcial ou total, desde que identificada a fonte. Em caso de dúvidas, consulte a Redação: [email protected]; (11) 3799-3717 A RESPOSTA DA GERAÇÃO Y NA ESTRATÉGIA DE CRESCIMENTO ORGANIZACIONAL 1 MICHELE OTOBELLI BERTELI [email protected] Universidade de Caxias do Sul – Caxias do Sul – RS, Brasil GABRIELA CRISTINA LAIN [email protected] Universidade de Caxias do Sul – Caxias do Sul – RS, Brasil VINÍCIUS DE VARGAS BACICHETTO [email protected] Universidade de Caxias do Sul – Caxias do Sul – RS, Brasil SYLVIA MARIA AZEVEDO ROESCH [email protected] Universidade de Caxias do Sul – Caxias do Sul – RS, Brasil PELAYO MUNHOZ OLEA [email protected] Universidade de Caxias do Sul – Caxias do Sul – RS, Brasil Submetido em 06/07/2012, aceito para publicação em 01/10/2012 _________________________________________________________________________________________________ Roberto Ludembark, Régis Fagundes e Leonel Castilhos eram jovens formados na área de Ciências da Computação que trabalhavam na Hollinfo, uma empresa do ramo de informática em Porto Alegre/RS. Depois de algum tempo, os três colegas começaram a discordar da forma como a empresa atuava junto aos clientes, onde o objetivo era somente o faturamento, não existindo espaço para negociações entre os colaboradores e os clientes. Com isso, pediram demissão da empresa Hollinfo e fundaram a Treviso, em 1989, decisão que mudou completamente suas vidas. No decorrer da história da Treviso, diferentes acontecimentos marcaram seu crescimento, mas foi durante os primeiros anos da década de 2000 que a empresa viu seu faturamento crescer numa média de 25% ao ano. Após 22 anos atuando na região de Porto Alegre, os atuais sócios da Treviso, Sr. Ludembark e Sr. Fagundes, decidiram implantar um plano de desenvolvimento da empresa que envolvia grandes mudanças, na busca da melhoria dos resultados financeiros e da satisfação interna dos funcionários. No entanto, os sócios não esperavam que fossem enfrentar tantas barreiras e problemas, apesar dos dois anos de planejamento para essa alteração. Uma das maiores dificuldades foi em relação aos funcionários classificados como geração Y, que é aquela que não se prende à empresa 1 Este caso relata uma situação real ocorrida numa organização do Rio Grande do Sul. O nome da empresa, bem como o de seus dirigentes, é fictício, de modo a preservar as fontes do caso real aqui exposto.

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Volume 2 Número 2 Jul/Dez 2012 Doc. 10

Rev. Bras. de Casos de Ensino em Administração ISSN 2179-135X _________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________ ©FGV-EAESP / RAE 2012 Todos os direitos reservados. Permitidas a citação e a reprodução parcial ou total, desde que identificada a fonte. Em caso de dúvidas, consulte a Redação: [email protected]; (11) 3799-3717

A RESPOSTA DA GERAÇÃO Y NA ESTRATÉGIA DE CRESCIMENTO ORGANIZACIONAL 1 MICHELE OTOBELLI BERTELI – [email protected] Universidade de Caxias do Sul – Caxias do Sul – RS, Brasil GABRIELA CRISTINA LAIN – [email protected] Universidade de Caxias do Sul – Caxias do Sul – RS, Brasil VINÍCIUS DE VARGAS BACICHETTO – [email protected] Universidade de Caxias do Sul – Caxias do Sul – RS, Brasil SYLVIA MARIA AZEVEDO ROESCH – [email protected] Universidade de Caxias do Sul – Caxias do Sul – RS, Brasil PELAYO MUNHOZ OLEA – [email protected] Universidade de Caxias do Sul – Caxias do Sul – RS, Brasil

Submetido em 06/07/2012, aceito para publicação em 01/10/2012

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Roberto Ludembark, Régis Fagundes e Leonel Castilhos eram jovens formados na área de Ciências da Computação que trabalhavam na Hollinfo, uma empresa do ramo de informática em Porto Alegre/RS.

Depois de algum tempo, os três colegas começaram a discordar da forma como a empresa atuava junto aos clientes, onde o objetivo era somente o faturamento, não existindo espaço para negociações entre os colaboradores e os clientes. Com isso, pediram demissão da empresa Hollinfo e fundaram a Treviso, em 1989, decisão que mudou completamente suas vidas. No decorrer da história da Treviso, diferentes acontecimentos marcaram seu crescimento, mas foi durante os primeiros anos da década de 2000 que a empresa viu seu faturamento crescer numa média de 25% ao ano.

Após 22 anos atuando na região de Porto Alegre, os atuais sócios da Treviso, Sr. Ludembark e Sr. Fagundes, decidiram implantar um plano de desenvolvimento da empresa que envolvia grandes mudanças, na busca da melhoria dos resultados financeiros e da satisfação interna dos funcionários.

No entanto, os sócios não esperavam que fossem enfrentar tantas barreiras e problemas, apesar dos dois anos de planejamento para essa alteração. Uma das maiores dificuldades foi em relação aos funcionários classificados como geração Y, que é aquela que não se prende à empresa

1 Este caso relata uma situação real ocorrida numa organização do Rio Grande do Sul. O nome da empresa, bem como o de seus dirigentes, é fictício, de modo a preservar as fontes do caso real aqui exposto.

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em que está atuando profissionalmente, pois, quando esse grupo não recebe respostas às suas necessidades de ascensão imaginada, busca outros ambientes de trabalho, o que ajuda a provocar um aumento no grau de rotatividade2.

Nesse momento, era fundamental que a empresa tomasse decisões rápidas quanto aos desgastes gerados com os colaboradores e com os problemas financeiros.

Histórico

Roberto Ludembark era um jovem com 20 anos, recém-formado em Ciências da Computação, que atuava numa empresa de informática na região de Porto Alegre/RS. Descontente com a forma de gestão da organização, decidiu abrir seu próprio negócio, junto com outros dois colegas, Régis Fagundes e Leonel Castilhos. Em novembro de 1989, os três colegas fundaram a empresa de software Treviso, com o objetivo de fornecer ferramentas de gestão empresarial conforme demanda dos clientes.

A empresa constituiu-se de maneira informal, em função da visão dos seus fundadores, que disponibilizaram um modelo de gestão sem hierarquia, onde os funcionários tinham autonomia para tomar decisões junto aos clientes, bem como para definir seus horários de trabalho. Após oito meses de operação, dois funcionários foram contratados.

No ano de 1995, a Paris S.A., uma empresa nacional na área de comércio, contratou a Treviso para manter o seu software de gestão, realizando as manutenções necessárias. A empresa Paris expandiu seus negócios e sentiu necessidade de obter um novo sistema, que integrasse todas as áreas da organização. Em 1996, a Paris S.A. propôs para a Treviso o desenvolvimento de um sistema integrado de gestão que utilizasse uma nova tecnologia. Nesse acordo, a Paris contratou o suporte de consultores especializados nas diferentes áreas do negócio (vendas, finanças, contabilidade, produção etc.) e arcou com os custos dessas horas de consultoria, enquanto a Treviso selecionou a tecnologia e desenvolveu o software. Ao final do projeto, a empresa Paris ficou com o sistema completo desenvolvido pela Treviso e contratou um dos sócios da Treviso, o Sr. Leonel Castilhos, para gerenciar a área de informática da organização. Os outros sócios, o Sr. Ludembark e o Sr. Fagundes, continuaram com a Treviso, e iniciaram, em 1997, a comercialização do sistema desenvolvido.

Um novo foco da Treviso foi estabelecido, agora com um sistema integrado de gestão Enterprise Resource Planning (ERP), atendendo empresas de grande porte e aumentando a participação no mercado. Esse cenário desencadeou a necessidade de contratação de 32 pessoas e a alteração de endereço, no ano de 2000, para um prédio de três andares na região central de Porto Alegre.

Em 2002, contando com uma equipe de 50 funcionários, os sócios reescreveram o sistema, utilizando a linguagem Oracle, aproveitando a inteligência e o conceito do sistema até então utilizado. O software reprogramado abrangeu outros níveis de concorrência, fazendo com que a Treviso deixasse de ser uma empresa da área de informática para ser uma empresa desenvolvedora de sistemas de gestão empresarial.

Para competir com as grandes empresas brasileiras da área de informática, a Treviso precisava continuar crescendo. Para tanto, em 2008, adquiriu um terreno visando à construção de

2 Cf. ZEMKE, R. O. Respeito as gerações. In: MARIANO, S. R. H.; MAYER, V. F. (Orgs.). Modernas práticas de gestão de pessoas. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008.

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uma nova sede e, durante os anos de 2009 e 2010, a empresa planejou seu crescimento e as mudanças que seria necessário implantar para atingir o objetivo de tornar-se uma sociedade anônima (S.A.).

O sucesso dos produtos e da sua evolução tecnológica ocasionou o crescimento corporativo da organização, inaugurando, em 2010, a terceira filial, sendo todas elas localizadas na região sul do País e responsáveis pela comercialização do sistema. A empresa expandiu seus negócios para contemplar novos mercados. O crescimento da organização pode ser observado na tabela do Anexo 1, que apresenta os índices de faturamento da empresa durante o período de 2001 a 2010.

Em janeiro de 2011, as primeiras mudanças foram implantadas, uma vez que o projeto estava programado para um período de três anos, com um crescimento de 30% ao ano. Ao final desse prazo, o objetivo era se tornar uma S.A., pois assim a Treviso teria acesso a financiamentos do governo para realizar projetos de pesquisa. No desdobramento dessa estratégia, a empresa necessitou elaborar diferentes ações, entre elas a formalização da empresa e alteração do regime tributário. Com isso, realizaram-se diversas reuniões e trabalhos de endomarketing para conscientização dos funcionários sobre a mudança, além da criação do plano de cargos e salários e da inserção de benefícios, que serão apresentados no decorrer deste caso.

Ambiente organizacional e sistema de gestão de pessoas da Treviso

Em 2011, a Treviso, com 22 anos de experiência, disponibiliza ao mercado soluções em gestão empresarial informatizada. O organograma da empresa com a quantidade de funcionários, assim como a descrição das atribuições dos sócios, é apresentado no Anexo 2. Conta, em média, com 180 funcionários, que dispõem de um ambiente de trabalho pouco convencional para desenvolverem suas tarefas de maneira criativa e liberal. Esse ambiente permite a exposição de ideias e a criação, com objetivo de desenvolver soluções inovadoras para o mercado. Os colaboradores são cobrados por tarefas finalizadas, sendo a forma e o local de execução definidos pelo próprio funcionário.

A Treviso está consolidada no mercado como uma das empresas desenvolvedoras de sistemas ERPs mais reconhecidas no Brasil. Utiliza tecnologia de ponta e oferece serviços como customização, suporte técnico, portal de atendimento e consultoria.

Seus funcionários têm liberdade durante o atendimento ao cliente, podendo tomar decisões na hora da negociação e da venda dos serviços. O sócio Ludembark explica:

Se o funcionário decidir não cobrar algum valor para desenvolver um determinado projeto, visando à permanência deste cliente na empresa, ele tem o poder de isentar, sem a necessidade de solicitar autorização ao supervisor. Outro destaque é que a equipe de trabalho da Treviso possui um relacionamento amigável

entre colegas, consultores, supervisores e diretores. Os sócios prezam pelo sistema horizontal de trabalho, em que não se destacam os modelos de hierarquia. O clima de entusiasmo e cooperação entre todos é evidente. O Sr. Ludembark complementa:

O objetivo é fazer com que os funcionários tenham vontade de trabalhar e se sintam familiarizados no ambiente da organização. A empresa adotou este modelo muito antes de outras grandes empresas, como a Google, que hoje é referência em sistema de gestão de pessoas colaborativo. O ramo da

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informática exige um ambiente que desperte a criatividade das pessoas. A rigidez de horários e funções inibe essa característica indispensável. A Treviso não exige o uso de cartão ponto, os funcionários possuem horários flexíveis, com a

opção de trabalhar em casa. A única exceção é para as telefonistas e o suporte técnico, que necessariamente precisam atender ao público nos horários estabelecidos. Ludembark destaca que essa flexibilidade não exime das responsabilidades, ou seja, as tarefas e os resultados esperados são cobrados. A empresa também utiliza um software para apurar o clima organizacional, com o qual os funcionários podem avaliar a empresa, seus gestores e deixar sugestões e ideias. O pagamento dos funcionários é em parte registrado na folha de pagamento e em parte é pago “por fora”; alguns funcionários não são registrados, e os consultores são sócios de outras empresas do grupo e recebem pró-labore. Um funcionário argumenta:

Gosto do sistema de gestão da Treviso, trabalho no horário em que acredito que sou mais criativo, e, quanto ao sistema de pagamento, acho excelente, como a maioria dos meus colegas, pois dessa forma pagamos menos impostos e sobra mais no final do mês. Já trabalhei em outras empresas do ramo e o sistema de pagamento é o mesmo, porém não existem a flexibilidade e o excelente clima de trabalho que temos aqui. Com o nível de satisfação dos funcionários elevado, em julho de 2009, a Treviso foi

premiada, pela revista Época da Editora Globo, como uma das 100 melhores empresas para se trabalhar. A pesquisa foi aplicada pelo Instituto Great Place to Work. A Treviso também foi reconhecida como uma das 25 empresas com mais jovens na equipe, 32% do quadro funcional é composto por jovens. Para o Great Place to Work, é considerado jovem todo aquele com idade inferior a 25 anos. O Instituto considera a confiança entre líderes e liderados a principal característica dos melhores locais de trabalho. O ponto central de definição entre as melhores empresas para se trabalhar é um local onde os funcionários acreditam nas pessoas para quem trabalham, têm orgulho do que fazem e gostam das pessoas com quem trabalham, ou seja, a qualidade dos locais de trabalho pode ser mensurada em três relações existentes na empresa: 1) O relacionamento entre lideranças e suas equipes; 2) O relacionamento de cada indivíduo com suas atribuições e empresa; 3) O relacionamento entre funcionários.

No ano seguinte, em 2010, a Treviso foi novamente premiada, dessa vez pela revista Computer World, com a 23ª posição entre as 60 melhores empresas para se trabalhar na categoria TI & Telecom.

Após esses reconhecimentos, que são resultado de uma equipe motivada e impulsionada pelo crescimento das vendas, os sócios, empolgados e confiantes, decidem investir. Em 2010, a empresa adquiriu um terreno com 11.500 m² para a construção de uma nova sede, abordando um novo conceito: todos trabalharem em um único pavimento. A Treviso, além do gasto com a aquisição do terreno, ainda investiu R$ 200 mil em obras de aterro até o final de 2010. Nesse mesmo ano, também foi aberta a terceira filial da empresa, sendo as outras fundadas em 2005 e 2008. A função das filiais é comercializar o produto, porém o desenvolvimento ou a customização continuam sendo realizados na matriz, em Porto Alegre.

A empresa planeja continuar crescendo, e para isso é fundamental a implantação de um novo modelo de gestão que esteja alinhado aos objetivos estratégicos. Conhecendo as ações necessárias

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para implantação, a empresa tentou preparar a equipe para uma grande mudança. Foram organizados encontros com os funcionários, onde os sócios apresentaram a estratégia a ser adotada pela empresa, mostrando os benefícios que essas alterações iriam proporcionar. Também foram realizados trabalhos de endomarketing, com o objetivo de deixar o processo de mudança transparente a todos os funcionários da organização.

Mudança: implantação do novo modelo

Roberto Ludembark percebeu que o ritmo de crescimento da Treviso estava muito acelerado: em torno de 25% ao ano, e, para acompanhar esse ritmo, precisava mudar. Era preciso profissionalizar a empresa para se tornar competitiva, e assim disputar o mercado com grandes organizações da área. Entre os objetivos que ele estabeleceu para a Treviso, encontrava-se o de tornar-se uma empresa S.A. nos próximos dois ou três anos. Isso permitiria que a empresa tivesse acesso a diversos benefícios, entre eles, linhas de crédito do governo para investir em pesquisa e desenvolvimento, a um custo muito menor do que o oferecido pelos bancos. Porém, para isso, era necessário que a empresa se constituísse de maneira transparente e profissional. Ou seja, trabalhar na informalidade tornou-se um risco e estava impedindo a empresa de crescer.

Para regularizar toda a situação, foram feitos investimentos expressivos em consultoria. Durante dois anos consecutivos (2008 e 2009), foi desenvolvido e analisado o projeto de formalização da Treviso com o apoio de advogados, contadores e consultores, sendo que no ano de 2011 as alterações planejadas se iniciaram. Alteração do regime tributário

Em janeiro de 2011, a Treviso passou seu regime tributário de lucro presumido para lucro real e todos os funcionários passaram a ser registrados (regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT). Considerando que o produto da empresa é desenvolvimento de software, 70% do custo é referente à mão de obra. Ludembark argumenta que, enquanto a empresa estava no modelo de tributação de lucro presumido, não era necessário justificar as despesas, por isso era possível manter salários informais. Agora, no lucro real, é imprescindível que as despesas sejam legalmente declaradas.

Um dos sócios da empresa destaca que a profissão da área de informática é relativamente nova no mercado (cerca de 40 anos), enquanto a lei regulamentadora das situações legais (CLT) é muito mais antiga, fazendo com que ocorram divergências nessas questões. O sócio acrescenta:

A CLT possui regras de equiparidade salarial, controle de ponto e outras normas que não se aplicam ao ramo de informática, pois este precisa de liberdade para trabalhar, uma vez que atua com a parte intelectual, de criatividade e inovação. As leis engessam o crescimento destes profissionais. Além disso, a grande maioria são jovens, constituintes da geração Y, que preferem receber na informalidade, através de RPA (Requisição de Pagamento Autônomo), PJ (Pessoa Jurídica) ou free-lance (Profissional Autônomo).

Novo pacote de benefícios Nesse mesmo período, os funcionários passaram a ter carteira assinada e, com isso, pagar

imposto de renda, além da previdência social obrigatória. Também adquiriram direito ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). O resultado foi que o salário líquido reduziu. Os sócios já

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haviam previsto que isso iria ocorrer e, para compensar essa redução no salário líquido, eles criaram, juntamente com a consultoria, um plano de cargos e salários flexível, com novas funções e diferentes benefícios. O valor dos benefícios recebidos por cada funcionário equivale ao valor descontado pelo pagamento dos tributos obrigatórios, fazendo com que ninguém seja financeiramente prejudicado em função das alterações realizadas.

No mesmo mês, foi implantado o novo sistema de benefícios da Treviso, similar ao de grandes empresas. A Treviso passou a disponibilizar o vale-alimentação de aproximadamente um salário mínimo por funcionário; plano de saúde para toda a família por um custo de R$ 5,00 por pessoa; seguro de vida de R$ 50 mil no caso de morte natural e R$ 100 mil no caso de morte acidental; auxílio-educação de 40% do salário mínimo por funcionário, extensivo aos filhos. Outros fatores agregados com o regime da CLT (visto que muitos funcionários não eram registrados) foram o direito ao FGTS, férias remuneradas e 13º salário. Resposta da geração Y

Apesar de todos os esforços da empresa para agradar e reter seus funcionários, o Sr. Ludembark desabafa, em maio de 2011:

Entre janeiro e fevereiro deste ano [2011], 35 pessoas pediram demissão (20% do quadro funcional da empresa). Gastamos mais de R$ 400 mil em rescisões que não estavam previstas, e precisamos buscar recursos financeiros em bancos a juros altíssimos! Optamos por fazer “acordo” com esses funcionários, com objetivo de tentar evitar possíveis ações na justiça devido aos pagamentos “por fora”, e arcamos com todas as despesas de uma demissão. Ou seja, conforme legislação vigente, 40% do saldo do FGTS, 13º e férias pagas integralmente. O Anexo 3 apresenta dados específicos dos funcionários que pediram demissão da Treviso. O

financeiro da empresa complementa: O faturamento da empresa caiu mais de 30% de janeiro a março de 2011, se comparado ao mesmo período do ano passado! O Sr. Ludembark argumenta que o elevado número de pedidos de demissão foi devido à

facilidade com que esses funcionários conseguem emprego nessa área. O sócio complementa: Esses jovens fazem parte de uma nova geração que já nasceu na era da informática. É a geração Y, que permanece no emprego enquanto estiver bom, não existe vestir a camisa e se aposentar no mesmo emprego. Esses jovens buscam qualidade de vida, são imediatistas e individualistas. Para eles, o que importa é o salário líquido ao final do mês, não estão preocupados com benefícios ou com o futuro. Um dos funcionários que pediram demissão argumenta: Tomei a decisão de sair da empresa em virtude do salário, que teve uma redução de praticamente 30%. Os benefícios não resolvem essa situação, pois meu plano de vida estava adaptado para a realidade anterior à mudança ocorrida na empresa.

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Mudança na cultura da empresa

Após o primeiro trimestre de 2011, período de maior turbulência, já foi possível perceber, em abril do mesmo ano, algumas mudanças na cultura da empresa. Foram contratados novos funcionários, que consideram o modelo de trabalho da Treviso excelente e estão disseminando essa ideia dentro da empresa. Porém, Ludembark afirma que esse processo é muito lento e ainda precisa de investimento e tempo para reverter a situação.

Em maio de 2011, o sócio conclui que não tem como medir o prejuízo da mudança. São diversos clientes insatisfeitos, atrasos no atendimento de novas solicitações, boatos de que a empresa foi vendida, entre outros.

A psicóloga Fabiane Freitas expõe o problema enfrentado com os clientes: Devido à falta momentânea de colaboradores especializados, os projetos sofreram atrasos em suas entregas, o que ocasionou insatisfação de alguns clientes. Alguns projetos específicos ficaram sem colaboradores, o que gerou um atraso maior até que outras pessoas se inteirassem da necessidade específica do cliente. O que a Treviso precisa fazer para recuperar o mercado? Voltar a ser uma das melhores

empresas para se trabalhar? Construir a nova sede e continuar crescendo? E quanto aos colaboradores, o que pode ser feito para evitar suas insatisfações?

Que estratégia adotar?

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Anexo 1 Faturamento da empresa Treviso

ANO RECEITA (em R$) % CRESCIMENTO 2001 1.974.452,79 34,69 2002 2.557.562,48 29,53 2003 3.171.724,21 24,01 2004 4.331.113,29 36,55 2005 4.952.667,09 14,35 2006 5.042.946,89 1,82 2007 5.997.531,83 18,93 2008 7.765.208,48 29,47 2009 11.257.080,00 44,97 2010 13.190.216,00 17,17

Média anual 25,15

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Anexo 2 Treviso – estrutura organizacional e responsabiliade dos diretores

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A RESPOSTA DA GERAÇÃO Y NA ESTRATÉGIA DE CRESCIMENTO ORGANIZACIONAL

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Anexo 3 Perfil dos funcionários que pediram demissão da empresa Treviso

CARGO TEMPO DE EMPRESA

Analista de Negócios 2,5 anos Analista de Sistemas 11 meses Analista de Sistemas 2,5 anos Analista de Suporte Técnico 2,5 anos Analista de Suporte Técnico 1,5 ano Assistente Comercial 2 anos Assistente Técnico 1,2 mês Assistente Técnico 3 anos Consultor Comercial 8 anos Consultor Comercial 2 anos Consultor Comercial 8 anos Consultor Comercial 15 anos Consultor de Implementação 6 meses Consultor de Implementação 4 anos Consultor de Implementação 1 ano Consultor de Implementação 1 ano Consultor de Implementação 1,9 mês Consultor de Implementação 6 meses Consultor de Implementação 6 meses Consultor de Implementação 5 meses Consultor de Implementação 3 anos Consultor de Negócios 3 anos Consultor de Negócios 10 meses Consultor de Negócios 10 meses Desenvolvedor 3 anos Desenvolvedor 3,5 anos Desenvolvedor 2,5 anos Desenvolvedor 1 ano Desenvolvedor 1,5 ano Desenvolvedor 3 anos Desenvolvedor 4 anos Desenvolvedor 1,5 ano Desenvolvedor 3,5 anos Recepcionista 10 meses