a importância da educação patrimonial para a preservação e valorização de bens...
TRANSCRIPT
10
INTRODUÇÃO
O Patrimônio Histórico e Cultural de uma sociedade
tem sua importância baseada no fato de que são eles que
trazem, preservados, a memória coletiva da comunidade, suas
lutas, seu cotidiano. Preservar estes bens, que são públicos
porque fazem permanecer viva a história local, é fundamental
para a preservação e consequente valorização da identidade
histórica e, por conseguinte, construção de um sentimento de
pertencimento àquela comunidade, fomentando também os cuidados
que a população terá para com o bem e para com a memória que
ele resguarda.
O presente trabalho tem a intenção de produzir uma
pesquisa voltada para a Educação Patrimonial, empregando a
mesma como instrumento para valorização e preservação do
patrimônio público. Vamos, portanto, através deste trabalho,
demonstrar a importância da implantação da Educação
Patrimonial, enquanto tema transversal, nas escolas, como meio
para desenvolver o sentimento de reconhecimento sobre os bens
históricos e culturais da cidade, valorizando-os e
preservando-os, provocando assim o sentimento de pertencimento
e auxiliando na construção de um conceito de identidade
histórica e cultural através dos bens locais. O mapeamento
desses bens em conjunto com a implantação da educação
patrimonial nas escolas serão instrumentos valorosos para
promover esta consciência histórico-cultural coletiva, e dessa
11
forma, contribuir para a valorização e preservação da nossa
história, da nossa cultura, da nossa identidade.
Faz-se necessário pesquisar a temática da Educação
Patrimonial porque, cada vez mais, se torna perceptível o
descaso que tem se enraizado na sociedade para com o seu
patrimônio histórico e cultural. Estes bens, que englobam o
patrimônio material, quase sempre dentro do modelo “pedra e
cal”, mas que inclui também objetos e artefatos, e o
imaterial, tratando-se aqui das manifestações culturais
daquela população, estão relegados ao dano e ao desprezo,
tendo como fim provável a sua total inutilização ou
esquecimento. Atuar de maneira a demonstrar a importância da
preservação de nossa história é útil quando passamos a
perceber que é a partir da valorização do nosso passado que
lapidaremos uma identidade clara, sabendo o porquê de várias
indagações, e a partir deste momento, lutando pelo respeito e
manutenção desta mesma identidade, sem deixar espaço para
degradadores nem para um processo predador de aculturação.
Cada vez mais se faz importante que a população
seja conscientizada sobre o valor histórico e cultural dos
bens patrimoniais, os imateriais e materiais. Isto é percebido
quando vemos as tradições se esvaindo diante da chamada
globalização, que de certa forma produz o mesmo processo de
aculturação realizado pelos europeus quando de sua vinda
exploratória à América no início do século XVI. Isto fica mais
visível quando vemos os prédios históricos serem demolidos
para darem espaço aos empreendimentos dito modernos em nome de
um retorcido progresso.
12
A Educação Patrimonial como instrumento de
valorização e preservação dos bens históricos e culturais deve
ser desenvolvida em toda a sociedade, principalmente nas
escolas, instituições corresponsáveis pela formação cidadã dos
jovens, que se tornarão protetores ou degradadores dos bens,
da cultura e das tradições, da identidade local. A falta de
uma consciência histórico-cultural que faça surgir no cidadão
o sentimento de pertencimento àquela comunidade, que o faça se
identificar como dono daquela história faz com que os bens
culturais se tornem algo invisível aos seus olhos, ou até
mesmo, algo que atrapalha o avanço do dito “progresso”.
13
1 CONCEITUAÇÃO DE PATRIMÔNIO E DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL
O senso comum nos afirma que Patrimônio é algo
pertencido a alguém, seja herdado ou construído. Patrimônio
Histórico, então, seguindo a linha de raciocínio, pode ser
definido como tudo aquilo que remonta a história de uma
determinada comunidade, povo ou nação. Ainda utilizando o
senso comum, quando falamos de bens históricos a primeira
ideia que nos surge é de monumentos e edifícios antigos, isto
porque se relaciona a expressão patrimônio histórico a chamada
dimensão “pedra e cal”, que engloba o patrimônio edificado, em
detrimento a outros bens culturais significativos. (ORIÁ in
BITTENCOURT, 2002).
Isto se deve, segundo Ricardo Oriá, à primeira
legislação voltada para a temática de preservação patrimonial,
editada no período do Estado Novo (1937 – 1945) com grande
influência da escola positivista, que tem como marca a
exaltação da memória dos vencedores. O Decreto-Lei nº. 25/37,
ainda em vigor, reza:
14
Art. 1º - constitui o patrimôniohistórico e artístico nacional oconjunto dos bens móveis e imóveisexistentes no país e cuja conservaçãoseja de interesse público, quer porsua vinculação a fatos memoráveis dahistória do Brasil, quer por seuexcepcional valor arqueológico ouetnográfico, bibliográfico ouartístico. (Decreto-Lei nº. 25, de 30de Novembro de 1937).
O legislador deixou fora do que se considera
patrimônio histórico e artístico os chamados bens imateriais,
formados principalmente pelas manifestações culturais de uma
determinada população, sejam danças, costumes e tradições.
Embasando cientificamente nossa pesquisa, vamos
demonstrar o que os historiadores afirmam sobre o que é
Patrimônio Histórico e Cultural, apresentando o bem material e
imaterial, e através desta conceituação, seguiremos a trilha
para conhecer a importância de preservar tais objetos e ações.
1.1 O QUE É PATRIMÔNIO HISTÓRICO?
Patrimônio Histórico e Cultural pode ser
compreendido como um bem coletivo com a pretensão de expressar
uma dada visão de um determinado grupo social, com fins de
construir uma memória identitária comum. Pode ser classificado
15
em material e imaterial, arquitetônico ou edificado, religioso
ou sacro. (PAIM, 2010)
Todavia, Patrimônio Histórico, voltando ao âmbito
do senso comum, sempre foi visto como algo velho e alheio a
nós. Não se desenvolveu, por muito tempo, uma ligação que
fizesse do patrimônio um bem pessoal, algo que faça crescer em
si um sentimento de pertencimento e identidade. Sobre isto
Pedro Funari (2009) destaca a fala de Joaquim Falcão, jurista,
quando o mesmo afirma que “patrimônio histórico virou sinônimo
de igrejas barrocas, palácios e casas-grandes”, e complementa
afirmando que:
Tal queixa implicava que os indígenas,além dos africanos e de tudo que serefere à vida cotidiana, não eramassociados, por nós, ao patrimônio.Como consequência, patrimôniohistórico parecia ser algo distante,alheio, velho. (FUNARI, 2009).
Esta história contada a partir da visão
positivista, onde apenas a versão do vencedor tem importância
e prioridade, estar, a partir do advento da escola dos
annales, sendo desconstruída para abrir espaço para novos
olhares históricos, colocando em pé de igualdade todos os
segmentos sociais que fizeram parte do fato ou período.
Sobre Patrimônio Histórico, no sítio oficial do
Programa de Pós-Graduação Profissionalizante em Patrimônio
Cultural – PPGPPC – podemos ler:
16
Patrimônio Histórico é o conjunto debens que contam a história de umageração, através de sua arquitetura,vestes, acessórios, mobílias,utensílios, armas, ferramentas, meiosde transportes, obras de arte,documentos. […] O Patrimônio Históricoé importante para a compreensão daidentidade histórica, para que os seusbens não se desarmonizem oudesequilibrem, e para manter vivos osusos e costumes populares de umadeterminada sociedade.
Sendo assim, podemos notar que o termo patrimônio
histórico engloba uma quantidade considerável de instrumentos
que servem como documentos do passado, preservados para a
manutenção de uma visão histórica. Coloco “visão histórica”
porque os paradigmas utilizados na escolha dos objetos que
serão considerados patrimônios merecedores de preservação vão
se modificar dependendo do olhar do historiador, profissional
que, apesar de tentar manter certo afastamento do objeto
analisado, é parcial, mesmo sem querer, na sua interpretação
daquele objeto enquanto documento histórico.
Le Goff, na obra “Documento e Monumento” faz uma
discussão sobre o que é o monumento e qual sua função na
sociedade, mas antes disso, alerta o leitor lembrando-lhe que
o ícone é, na verdade, fruto de uma escolha da sociedade sobre
o que melhor lhe representa. Escolha esta que é feita,
principalmente, pelos historiadores. Sobre isto, ele afirma:
17
De fato, o que sobrevive não é oconjunto daquilo que existiu nopassado, mas uma escolha efetuada querpelas forças que operam nodesenvolvimento temporal do mundo e dahumanidade, quer pelos que se dedicamà ciência do passado e do tempo em quepassa, os historiadores. (LE GOFF,1996)
O profissional da ciência História tem papel
fundamental na construção do imaginário sobre o que vem a ser
patrimônio com necessidade de preservação para uma melhor
compreensão da história e o que foi criado para relacionar a
memória e o presente dos indivíduos, sendo que o primeiro é
resguardado entre várias edificações existentes e o segundo
faz parte do conjunto destas mesmas edificações. (POSSAMAI,
2000, pág.15).
Voltando às conceituações de Le Goff, a partir do
artigo “Patrimônio Histórico: Estudando a Memória do
Coletivo”, da profa. Ludmila Pena Fuzzi, “monumento é aquilo
que pode ser evocado do passado”.
Uma conceituação de Le Goff na obra “Monumento e
Documento”, diz que:
O monumentum é um sinal do passado.Atendendo às suas origens filológicas,o monumento é tudo aquilo que podeevocar o passado, perpetuar arecordação […].
......................................
......................................
..........................
18
O monumento tem como características oligar-se ao poder de perpetuação,voluntária ou involuntária, dassociedades históricas (é um legado àmemória coletiva) e o reenviar atestemunhos que só numa parcela mínimasão testemunhos escritos. (LE GOFF,1998)
Percebemos, portanto, que o principal papel do
Monumento, ou Patrimônio Histórico, é resguardar a memória
daqueles que possuem, direta ou indiretamente, alguma ligação
com o patrimônio em si ou com os processos que o constituíram
monumento, ou ainda, que fazem parte do contexto em que tal
símbolo está inserido.
Observamos até aqui que o patrimônio histórico é
uma variante, e que tem a função de preservar viva a memória
do coletivo, e ainda que o mesmo seja definido como tal a
partir da construção de um imaginário sobre o que merece ser
preservado enquanto representação física de uma sociedade.
1.1.1 Patrimônio Histórico Material e Imaterial
Apesar de o legislador do Estado Novo ter
construído uma visão de que apenas o patrimônio histórico
construído, da chamada dimensão “pedra e cal”, são passíveis
de preservação, o constituinte de 1988 lançou um novo olhar
sobre a conceituação de patrimônio, afirmando que também as
19
manifestações culturais são identificadoras de um povo e, por
conseguinte, necessária é a sua preservação como sendo a
manutenção do próprio povo, a partir de suas manifestações,
costumes e tradições.
A Constituição brasileira de 1988, no seu capítulo
III, sobre a Educação, Cultura e Desporto, na seção II, em seu
artigo 216, substitui a terminologia patrimônio histórico e
aplica o conceito de patrimônio cultural, englobando assim as
várias manifestações que representam o povo brasileiro. Pode-
se ler:
Art. 216 – Constituem patrimôniosculturais brasileiros os bens denatureza material e imaterial, tomadosindividualmente ou em conjunto,portadores de referência à identidade,à ação, à memória dos diferentesgrupos formadores da sociedadebrasileira, nos quais se incluem:
I – as formas de expressão;
II – os modos de criar, fazer e viver;
III – as criações científicas,artísticas e tecnológicas;
IV – as obras, objetos, documentos,edificações e demais espaçosdestinados às manifestações artístico-culturais;
V – os conjuntos urbanos e sítios devalor histórico, paisagístico,artístico, arqueológico,paleontológico, ecológico ecientífico.
20
Desta maneira, a Constituição de 1988 abre espaço
para que políticas públicas de preservação sejam implantadas
também para valorizar e preservar as manifestações culturais
do povo, e não apenas as edificações consideradas de grande
relevância para a história oficial.
Sobre a conceituação de patrimônio cultural, Godoy
afirma que se trata de:
Toda produção humana, de ordememocional, intelectual e material,independente de sua origem, época ouaspecto formal, bem como a natureza,que propiciem o conhecimento e aconsciência do homem sobre si mesmo esobre o mundo que o rodeia. (GODOY,1985)
O patrimônio cultural é tudo aquilo que se torna
identificador de um povo ou de uma região. Podemos utilizar
como exemplo as danças juninas, que são características dos
estados do nordeste brasileiro. O chimarrão que é
identificador do Rio Grande do Sul; o samba que é próprio do
Brasil, assim como outras manifestações que devem ser
preservadas e valorizadas com o objetivo de manter viva a
cultura, assim como cultivar o sentimento de pertencimento
daquela população à região.
Basta substituir a terminologia “patrimônio
histórico” por “patrimônio cultural”, e conseguimos expandir a
visão sobre o que é merecedor de preservação; não só mais o
que é construído, físico, é patrimônio, mas também tudo aquilo
21
que é representativo da história de uma determinada sociedade.
Fenelon, sobre os bens culturais de uma sociedade, afirma que:
Não são apenas aquelestradicionalmente considerados dignosde preservação, produzidos e definidospelos vencedores de cada época. Aocontrário, são os frutos de todos ossaberes, todas as memórias deexperiências humanas. Não apenasmonumentos, bens isolados edescontextualizados, mas testemunhosmateriais portadores de significação,passíveis de muitas leituras (FENELON,1993).
A história do “vencido” ganha vez a partir de este
novo olhar, o que é de grande importância para que se possam
conhecer, de maneira mais fiel possível, os fatos que
construíram a história. Não se pode mais olhar para a história
do Brasil colonial sem pensar sobre a história do índio, nem
ler sobre a história do Brasil Imperial, sem olhar também para
história dos negros cativos.
Notamos, portanto, uma universalização do conceito
de patrimônio histórico, com uma visão inovadora, que inclui a
história do vencido em pé de igualdade com a do vencedor,
considerando as duas importantes para a contextualização
correta do fato histórico.
É possível, portanto, compreender patrimônio
cultural imaterial como toda a expressão social, costumes e
tradições que sejam reconhecidos pelos sujeitos da comunidade
22
como características que as representem e as identifique. A
tradição oral é, neste momento, o principal meio de
sobrevivência do que é imaterial, pois estes bens são passados
de uma para outra geração a partir da interação e da
convivência das mesmas.
O Patrimônio Imaterial é transmitidode geração em geração e constantementerecriado pelas comunidades e grupos emfunção de seu ambiente, de suainteração com a natureza e de suahistória, gerando um sentimento deidentidade e continuidade,contribuindo assim para promover orespeito à diversidade cultural e àcriatividade humana. (PORTAL IPHAN).
Neste ponto podemos nos atrever a afirmar que
Patrimônio Histórico é um conjunto de bens que contam a
história de uma geração através de vários documentos físicos –
objetos, edificações, meios de transportes, documentos,
utensílios – que formam o conjunto de bens materiais – e de
vários documentos que ultrapassam a dimensão “pedra e cal”, os
chamados bens imateriais – formados pelo conjunto de
manifestações culturais, expressões vivas da comunidade.
Sabemos ainda que a expressão patrimônio cultural é, talvez,
mais correta para nomear este conjunto de bens, tendo em vista
que a mesma consegue englobar toda produção humana, de ordem
emocional, intelectual e material. Sabemos também que a sua
perpetuação depende além dos registros que são feitos através
de manuscritos, fotografias, filmagens, e as próprias
23
edificações enquanto documentos históricos também se fazem
necessário à transmissão dos conhecimentos através da
convivência de gerações, através de suas interações sociais e
manifestações, reforçando o sentimento de continuidade e
pertencimento daquela história.
Sobre o cuidar deste material, o Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN – faz uma
ressalva quanto a sua política pública de preservação,
demonstrando ser necessária uma distinção das ações políticas
para que a valorização e preservação do bem material e
imaterial sejam efetivadas. Uma ação prática que é
desenvolvida para preservar os bens histórico-culturais
materiais é o tombamento, que protege, através de lei,
determinado objeto contra ações de que desejam modificar o
mesmo. Todavia, esta ação não pode ser posta em prática quando
se trata de bem imaterial, sendo que para preservar este é
necessário conscientizar a população diretamente ligada ao
mesmo sobre a sua importância para a comunidade, enquanto
símbolo de identidade. Nesse caso, a preservação tem como foco
não a conservação de eventuais suportes físicos do bem, mas a
busca de instrumentos e medidas de salvaguarda que viabilizem
as condições de sua produção e reprodução, tais como: a
documentação do bem, com vistas a preservar sua memória; a
transmissão de conhecimentos e competências; o acesso às
matérias primas e demais insumos necessários à sua produção; o
apoio e fomento à produção e ao consumo; a sua valorização e
difusão junto à sociedade; e, principalmente, esforços no
sentido de que os detentores desses bens assumam a posição de
24
protagonistas na preservação de seu patrimônio cultural.
(Edições IPHAN, 2006).
1.2 O QUE É EDUCAÇÃO PATRIMONIAL
A Educação Patrimonial objetiva ummétodo de ensinar aos indivíduos detodas as idades, a conhecer a simesmo, a seu grupo, e seu patrimônio ea compartilhar esse conhecimento com ooutro. (POSSOLI, 2008)
A preservação do patrimônio cultural, enquanto
herança da coletividade, construído através de todas as
vivências individuais, só se efetiva a partir do processo de
implantação da Educação Patrimonial, sendo esta o principal
instrumento de valorização e consequente preservação dos bens
públicos de grande relevância cultural.
O conceito de Educação Patrimonial surgiu no Brasil
em meio a importantes discussões sobre a necessidade de se
aprofundar o conhecimento e a preservação do Patrimônio
Histórico e Cultural. O marco da Educação Patrimonial foi o
primeiro seminário “Uso Educacional de Museus e Monumentos”,
ocorrido em 1983, no Rio de Janeiro.
O princípio básico da Educação Patrimonial diz que:
25
Trata-se de um processo permanente esistemático de trabalho educacionalcentrado no Patrimônio Cultural comofonte primária de conhecimentoindividual e coletivo. A partir daexperiência e do contato direto com asevidências e manifestações da cultura,em todos os seus múltiplos aspectos,sentidos e significados, o trabalho deEducação Patrimonial busca levar ascrianças e adultos a um processo ativode conhecimento, apropriação evalorização de sua herança cultural,capacitando-os para um melhor usufrutodesses bens, e propiciando a geração ea produção de novos conhecimentos, numprocesso contínuo de criação cultural.(HORTA; GRUMBERG; MONTEIRO, 1999, p.06).
Educação patrimonial, de acordo com Oliveira (2011)
é um processo sistemático e permanente por meio do qual os
indivíduos se apropriam dos bens culturais e entendem a
necessidade e a importância da valorização e preservação do
patrimônio cultural, colocando-se como agentes diretos. Desse
processo também decorre o fortalecimento das identidades
individuais e coletivas. Sobre estas identidades.
É importante ressaltar que o nosso patrimônio
cultural é a herança das experiências vividas, que construíram
o passado e construirão o futuro, sabendo que é a identidade
individual que tem como pano de fundo a identidade coletiva,
que é o que permite a Educação Patrimonial, ou seja, o
patrimônio e a memória coletiva passam pelo patrimônio e a
memória individual, que compartilhados formam o patrimônio e a
memória cultural. (POSSOLI, 2008).
26
Segundo Horta (1999), a educação de um indivíduo
não acontece de uma hora para outra, é um longo processo
permanente, que inicia nos primeiros dias de vida e só termina
com a morte. Esse processo passa por várias etapas, chegando à
maturidade e uma inteligência capaz de utilizar o que já
sabemos e construir novo saberes.
A Educação Patrimonial, em suas formas de mediação,
possibilita a interpretação dos bens culturais, tornando-se um
instrumento importante de promoção e vivência da cidadania.
Consequentemente, gera a responsabilidade na busca, na
valorização e preservação do Patrimônio.
Horta utiliza o termo “alfabetização cultural” para
informar que a Educação Patrimonial possibilita ao indivíduo
realizar a leitura do mundo que o rodeia, levando-o a
compreensão do universo sociocultural e da trajetória
histórico-temporal em que se está inserido.
27
2 O ENSINO DE HISTÓRIA E A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL
A História é uma ciência social que desenvolve a
função de registrar os fatos e apresentá-los de maneira que o
indivíduo compreenda a importância e consiga, de maneira
satisfatória, contextualizar o mesmo, sabendo analisar as
informações com vistas a desenvolver um pensamento crítico
sobre o ocorrido.
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais
– PCN’s – de História, o ensino e a aprendizagem de História
envolvem uma distinção básica entre o saber histórico, como um
campo de pesquisa e produção de conhecimento do domínio de
28
especialistas, e o saber histórico escolar, como conhecimento
produzido no espaço escolar.
Considera-se que o saber históricoescolar reelabora o conhecimentoproduzido no campo das pesquisas doshistoriadores e especialistas do campodas Ciências Humanas, selecionando ese apropriando de partes dosresultados acadêmicos, articulando-osde acordo com seus objetivos. (PCN,1997)
Assim sendo, o PCN aponta que o saber histórico
escolar é um recorte do que os historiadores produziram sobre
os fatos, através de pesquisas e desenvolvimento de teorias.
Seria, portanto, uma forma simplificada de transmitir o
conhecimento histórico com vistas a uma fácil compreensão.
Procurando aproximar os homens, mulheres e crianças
comuns as questões de preservação e valorização do patrimônio
e da memória, muitas instituições vêm desenvolvendo ações de
educação patrimonial visando à democratização e acesso aos
bens patrimoniais. Todavia, estas ações educativas geralmente
acabaram passando ao largo das atividades desenvolvidas nas
escolas. “As ações de educação patrimonial preocupam-se com a
constituição de identidades e sentido de pertencimento dos
sujeitos, procurando o envolvimento da comunidade,
extrapolando os espaços da escola” (PAIM, 2010).
Mais recentemente passou a existir um diálogo entre
os espaços de memória e as escolas. Assim, as questões da
29
memória e do patrimônio aos poucos estão sendo incorporadas
aos currículos escolares. Segundo o historiador italiano Ivo
Matozzi (2008), o patrimônio passou a contribuir na formação
histórica, visto que permite dar consistência às informações e
abstrações dos textos históricos e porque constrói a percepção
e a visão histórica do território e do mundo.
2.1 A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA SALA DE AULA
É comum ouvirmos a afirmação de que o Brasil é um
país sem memória ou que nós não valorizamos a nossa História,
sempre a preterindo em favor da cultura estrangeira. No
entanto esta colocação não se afirma quando a retiramos do
senso comum, e isto fica explicito quando compreendemos não
ser possível constituir uma nação sem que haja a memória e a
história. Então devemos nos perguntar o porquê de tal
afirmação ser tão rotineira.
A disciplina de História nem sempre possuiu o papel
que atualmente exerce na comunidade escolar. Anteriormente,
esta disciplina era apenas um resumo de datas e nomes que
deveriam ser memorizados e, também, era utilizada para a
legitimação de determinados acontecimentos como sendo
verdadeiros e necessários à construção da nação. Para
demonstrar a importância da História para a construção do
imaginário coletivo do país, e como instrumento de legitimação
30
de ações, podemos recorrer ao período do governo militar no
Brasil, quando aqueles que ocupavam o poder executivo nacional
utilizaram a História como meio para doutrinar os estudantes
com a intenção de ganhar adeptos para o sistema de governo
vigente, para tanto a disciplina foi juntada à Geografia,
juntas, receberam a nova denominação de Estudos Sociais.
A consolidação dos Estudos Sociais emsubstituição a História e Geografiaocorreu a partir da Lei nº. 5.692/71,durante o governo militar. Os EstudosSociais constituíram-se ao lado daEducação Moral e Cívica em fundamentosdos estudos históricos, mesclados portemas de Geografia centrados noscírculos concêntricos. Com asubstituição por Estudos Sociais osconteúdos de História e Geografiaforam esvaziados ou diluídos, ganhandocontornos ideológicos de ufanismonacionalista destinado a justificar oprojeto nacional organizado pelogoverno militar implantado no país apartir de 1964. (PCN História, 1997).
A História só voltou à sua autonomia a partir da
década de 1980, quando não mais era possível perceber a
grandeza dos acontecimentos dentro de uma disciplina “Estudos
Sociais” que não abria espaço para a discussão e, por
consequência, o pensamento crítico.
Os Historiadores voltaram-se para aabordagem de novas problemáticas etemáticas de estudo, sensibilizadospor questões ligadas à história
31
social, cultural e do cotidiano,sugerindo possibilidades de rever noensino fundamental o formalismo daabordagem histórica tradicional. (PCNHistória, 1997)
Antes de adentrarmos à análise de como a educação
patrimonial está sendo abordada nas escolas, devemos perceber
que a tal ação extrapola os limites da escola, sendo possível
tratar de memória e patrimônio em qualquer lugar. Através de
fotos e documentos diversos, visitas à museus, centros de
memória, arquivos, construções, cidades, igrejas, terreiros,
ou ainda as manifestações como rezas, danças, festas, modos de
construir, de fazer comidas, de tocar música, de brincar e
vestir são instrumentos simples que nos levam a perceber que a
memória e o patrimônio estão presentes em tudo o que diz
respeito ao ser humano e as experiências vividas por cada um
de nós em diferentes tempos e lugares.
A educação patrimonial na sala de aula é algo
recente que, aos poucos, está se incorporando ao currículo
escolar oficial. Isto acontece porque se tornou visível,
graças a atuação de vários estudiosos como Horta, Matozzi,
Paim e outros, que a educação patrimonial auxiliar na mediação
e propicia aos diversos públicos a possibilidade de
interpretação dos bens culturais, atribuindo-lhes sentidos, e
estimulando a comunidade a exercer a cidadania e a possuir uma
responsabilidade social de compartilhamento, preservação e
valorização dos patrimônios material e imaterial que estão,
como já vimos, ao nosso redor.
32
Cultivar o sentimento de pertencimentoé o principal passo para uma efetivaeducação patrimonial com vistas apreservação e valorização do bem.Talvez, ao perceberem e entenderem queos monumentos, prédios, saberes efazeres são seus, as pessoas passem anão pichar, quebrar, menosprezar edestruir os bens públicos como vemosacontecer quase que diariamente comnossas escolas e prédios públicos.(PAIM, 2010)
O homem é um ser educável, já disse Paulo Freire
(1997). Nesse sentido, é importante proporcionar uma efetiva
educação para a memória e o patrimônio, compreendendo que o
homem está no mundo e com o mundo, e que isto o torna capaz de
se relacionar, e ainda, que estas relações não se dão apenas
com os outros, mas se dão no mundo, com o mundo e pelo mundo.
Quando o homem compreende a realidade, pode levantar hipótese
sobre o desafio dessa realidade e procurar soluções. (FREIRE,
1997).
O grande desafio do educador patrimonial,
historiadores e demais profissionais da memória, é conseguir
levar a discussão sobre o patrimônio para a sala de aula e, de
forma satisfatória, despertar na criança e no jovem o respeito
pela memória coletiva, fazendo com que estes construam suas
próprias identidades culturais, fazendo com que se apropriem
dos lugares e, a partir daí, percebam o quão estes são
importantes para a sua própria memória individual.
33
As pessoas só respeitam, admiram, preservam e se
identificam com aquilo que conhecem. Para que ocorra
especialmente a identificação com os bens patrimoniais faz-se
necessário pensar e construir possibilidades de educar para o
patrimônio, para que as pessoas conheçam e sintam-se
pertencentes aos espaços, às discussões, lugares de guarda e
preservação dos diferentes bens patrimoniais. Portanto, para
que efetivamente ocorra uma educação para o patrimônio, não
basta falar em ou sobre patrimônio, é preciso viver com o
patrimônio. (PAIM, 2010).
2.1.1 Interdisciplinaridade e Transversalidade do
Patrimônio no âmbito escolar.
O processo educativo, em qualquer área de
ensino/aprendizagem, tem como objetivo levar os alunos a
utilizarem suas capacidades intelectuais para a aquisição e o
uso de conceitos e habilidades, na prática, em sua vida diária
e no próprio processo educacional. O uso leva à aquisição de
novas habilidades e conceitos (HORTA, 2004). A Educação
Patrimonial consiste em provocar situações de aprendizado
sobre o processo cultural e, a partir de suas manifestações,
despertar no aluno o interesse em resolver questões
significativas para sua própria vida pessoal e coletiva. (ibid).
34
Como não se vai criar uma nova disciplina para
educar sobre o patrimônio e este não deve ser trabalhado
somente nas disciplinas de historia, devemos trabalhar,
portanto, a interdisciplinaridade da Educação Patrimonial nos
currículos escolares.
A educação patrimonial nada mais é doque uma proposta interdisciplinar deensino voltada para questões atinentesao patrimônio cultural. Compreendedesde a inclusão, nos currículosescolares de todos os níveis deensino, de temáticas ou conteúdosprogramáticos que versem sobre oconhecimento e a conservação dopatrimônio histórico, até a realizaçãode cursos de aperfeiçoamento eextensão para os educadores e acomunidade em geral, a fim de lhespropiciar informações acerca do acervocultural, de forma a habilitá-los adespertar, nos educandos e nasociedade, o senso de preservação damemória histórica e o consequenteinteresse pelo tema. (ORIÁ, 2005).
Uma dificuldade encontrada para efetivar a prática
da educação patrimonial é a de que os currículos escolares
estão engessados não permitindo, ou permitindo o mínimo, de
adequações para o desenvolvimento da transversalidade que,
pasmem, encontra-se nos PCN’s mas não encontram espaço na sala
de aula. Isto se dá devido a sobrecarga dos currículos, com
disciplinas que competem por tempo na sala de aula.
A transversalidade mantém uma íntima relação com a
interdisciplinaridade pois, juntas, são maneiras de se
35
trabalhar o conhecimento buscando uma reintegração de aspectos
que ficaram isolados uns dos outros pelo tratamento
disciplinar.
Segundo os PCN’s, interdisciplinaridade e
transversalidade são:
A interdisciplinaridade questiona asegmentação entre os diferentes camposde conhecimento produzido por umaabordagem que não leva em conta ainter-relação e a influência entreeles – questiona a visãocompartimentada (disciplinar) darealidade sobre a qual a escola, talcomo é conhecida, historicamente seconstitui. Refere-se, portanto, a umarelação entre disciplinas. Atransversalidade diz respeito àpossibilidade de se estabelecer, naprática educativa, uma relação entreaprender na realidade e da realidadede conhecimentos teoricamentesistematizados (aprender sobre arealidade) e as questões da vida real(aprender na realidade e da realidade)(PCN, 1997).
Devemos destacar que os PCN’s inovaram ao trazer
maneiras de se trabalhar a transversalidade e a
interdisciplinaridade nos currículos escolares, ressaltando
que a temática da Educação Patrimonial está prevista nos PCN’s
para o ensino de História, apesar de pouco explanado.
Por isto ressalta-se a importância deste trabalho
nas escolas, propondo aos profissionais da educação,
principalmente aqueles diretamente ligados àquela comunidade
escolar, a necessidade da temática Educação Patrimonial nos
36
currículos escolares como forma de pulsão da comunidade
escolar e circundante nas práticas de valorização e
preservação do patrimônio histórico e cultural.
Para tratar a Educação Patrimonial na escola, na
prática cotidiana com os alunos, devemos levar em conta alguns
pontos relevantes na compreensão do conteúdo, principalmente,
neste caso, a Percepção e a Memória. (GRUNBERG)
Quando falamos em percepção, estamos afirmando que
o desenvolvimento da habilidade de observação e interpretação
de objetos auxilia na compreensão do mundo. Aprender através
do olhar não é necessariamente simples, mas é uma
possibilidade de enriquecer a experiência do conhecimento do
mundo material. Grumberg (1999) afirma que o professor se
propõe a efetuar um trabalho com os alunos utilizando um bem
histórico-cultural deve definir de maneira objetiva a
atividade proposta. O tipo de observação leva o interesse do
aluno a descobrir e relacionar, a deduzir e comparar, utilizar
o raciocínio, a pensar. No caso da memória, devemos ter em
mente que ela é indispensável no processo de aprendizado.
Vivemos por ela. O importante para nós fica marcado e
registrado para sempre. A memória modifica o nível de
percepção, pois lembramos o que nos interessa.
37
3 OS MUSEUS COMO ESPAÇOS DE MEMÓRIA
A Memória é, basicamente, uma lembrança de algo
recente e marcante, sendo parte do passado. Se nos referirmos
à memória coletiva – neste momento, excluindo a individual –
poderíamos afirmar que a mesma é útil para a construção
historiográfica de uma região? De certo que sim.
Segundo Paim (2010) memória é pensada como seleção
e sempre seleciona os eventos de forma individual.
Esquecimento e lembrança formam um par inseparável, pois uma
se opõe ao outro, ao ponto que também se complementa.
Observando que a memória é uma seleção e esta é uma escolha
individual ou convencionada em grupo, estaremos sempre apagando
algum acontecimento para valorizar, registrar ou até mesmo
legitimar outro.
Para rememorar algo não basta apenas uma lembrança
individual, mas sim que ela seja coletiva, mesmo que se trate
de experiências vividas individualmente. As lembranças são
sociais (PAIM, 2010).
38
O conhecimento do passado se organiza,ordena o tempo, se localizacronologicamente. Portanto, a funçãoda memória é trazer novamente à vida oque já foi vivido. A memória possui umpapel criativo. Ao rememorar estamoscriando novamente o já vivido, portanto, a função da memória é dereconstrução. Porém, a memória nãoobedece uma ordem temporal, é semprepermeada por idas e vindas. Lembramoso que aconteceu ontem e dali, afrações de segundos, voltamos àinfância e ao acontecido novamente.Esse ir e vir no tempo da memóriaacontece incontáveis vezes durante umdia. (PAIM, 2010).
De qualquer forma, a relação entre memória e
história é controversa. Enquanto que para alguns uma depende
da outra, para outros elas são distantes e, até mesmo,
incomunicáveis. A explicação que se tem para isto vem de
longe, desde o início da modernidade capitalista, quando a
História ganha o status de ciência e tenta afastar de si tudo
que possa ser subjetivo ou incentivado por valores,
experiências e sentimentos. A visão correta não existe. Cada
historiador deve pensar a respeito e seguir uma tendência.
E como abordar estas questões de patrimônio e
memória de maneira que excite o interesse do aluno? Como
auxiliar na construção de identidades a partir do
reconhecimento destas memórias? Uma das ferramentas que
existem, muito uteis, são os museus, centros de memória. Esses
espaços representam a história e a memória de uma comunidade
ou região, todavia nem todas as cidades possuem um acerto
organizado e detalhado para pesquisa e visitação. No Caso de
39
Cascavel – CE, cidade tricentenária, apesar de toda uma
riqueza histórica ainda não possuímos, reconhecidos, os nossos
patrimônios culturais, a nossa memória, nossa identidade. Isto
muito tem a ver com o descuido do poder público em preservar e
valorizar, educar sobre a cultura local. Sempre vendo o
“antigo” como ultrapassado e sendo, portanto, necessária sua
remoção.
Mesmo sem um museu ou centro de memória, Cascavel
possui um centro histórico com casas e igrejas datadas do
século XVIII que, aos poucos, vem recebendo novos olhares e
tendo sua posse, enquanto bem público reclamada por quem passa
a reconhecer ali os valores e a cultura da cidade.
3.1 DESAFIOS DA RELAÇÃO MUSEU-ESCOLA
Antes de darmos inicio aqui, devemos fazer algumas
observações necessárias ao bom entendimento do conteúdo.
Primeiro, que todos os museus são formados com o intuito de
apresentar uma visão, seja do vencedor ou do vencido, é
construído para fazer rememorar as glórias de alguns e
esquecer as derrotas de outros, ou ao contrário, avivar as
derrotas em detrimento das glórias. O discurso do vencido
sobre o do vencedor.
Almeida (1997) afirma que:
40
As exposições museológicas sãodiscursos criados com intenção decomunicar ideias, conceitos einformações ao público visitante,tendo como veículo específico osobjetos. A ação educativa em museusvisa ampliar as possibilidades deaproveitamento pedagógico dos acervos,para que o visitante acentue seuespírito crítico em relação à suarealidade e daqueles que estão à suavolta.
Museus são instituições sem fins lucrativos que
adquire, preserva, documenta, pesquisa e comunica para
educação e lazer. Atuam nas diversas áreas em todas as
ciências e artes, e mantidos por governos, sejam municipais,
estaduais ou federais e, também, pela iniciativa privada.
Os museus da iniciativa privada são os que
representam melhor a questão de construir um discurso do
vencedor.
Almeida (1997) informa que em nosso país, a ação
educativa em instituições museológicas foram disseminadas a
partir da década de 1920, quando os museus passaram o possuir
o perfil de agente empenhado no complemento do ensino escolar,
sendo esta uma proposta técnico-pedagógica liderada por
Fernando de Azevedo.
É importante ressaltar que embora as escolas
procurem os museus com a intenção de utilizá-los como
complementos ou ilustrações das questões tratadas em sala de
41
aula, estes espaços ultrapassam este uso, podendo proporcionar
também uma experiência que, em si, pode gerar motivação,
curiosidade e questionamento por parte do estudante. Uma
visita ao museu e aos espaços de memória pode proporcionar
aprendizagem tanto quando em sala de aula, ou até mais.
Almeida afirma:
Consideramos que os museus têmpotencial para provocar umaexperiência de aprendizagem que vaialém da simples complementaridade doensino escolar e que ocorre por meiode estratégias e métodos diferentesdaqueles utilizados na escola.(ALMEIDA, 1997)
Segundo o olhar de Almeida (1997) a educação em
museus visa à preservação do patrimônio cultural e natural,
através da participação crítica de toda a população. A ação
educativa é parte integrante dos processos de comunicação
museológica e deve ser coerente com o discurso expositivo.
A gama de estratégias que o educador pode usar a
partir do museu é diversa. Várias linhas de estudo foram
desenvolvidas para o universo escolar, entre elas a Educação
Patrimonial. Almeida (1997) considera o método da educação
para o patrimônio a mais apropriada para a ação educativa em
museus e espaços de memória, por levar em conta os ganhos
emocionais da aprendizagem e por lançar o olhar a partir da
especificidade do museu – a cultura material.
42
Alguns museus brasileiros utilizam a metodologia da
educação patrimonial em sua ação educativa há tempos. Como já
afirmamos, de acordo com Grunberg (1995) a Educação
Patrimonial é definida como o “ensino centrado nos bens
culturais, com metodologia que toma estes bens como ponto de
partida para desenvolver a tarefa pedagógica, que considera os
bens culturais como fonte primária de ensino”.
A partir deste ponto de vista, a Educação
Patrimonial objetiva colocar o museu como “(1) parte da vida
comunitária; (2) local onde se preserva a memória cultural e
(3) local onde se educa permanentemente pela fonte de imagens,
ideias e testemunhos da capacidade criadora do homem em seu
processo evolutivo…” (ALENCAR, 1987).
A proposta de Educação Patrimonial prevê a
percepção/ observação, motivação, memória e emoção. Sem esses
elementos fica difícil o envolvimento afetivo e o interesse do
visitante, necessários para que a aprendizagem ocorra. Tendo
como paradigma os museus, metodologicamente a Educação
Patrimonial propõe três etapas: identificação do bem cultural
(observação e análise); registro do bem cultural (atividades
de registro da identificação) e valorização e resgate
(interpretação e comunicação do observado e registrado).
43
CONCLUSÃO
Após uma leitura edificante sobre a temática da
Educação Patrimonial, e revendo conceitos de memória,
identidade, cultura e diversidade, é possível perceber a
prática da Educação Patrimonial como instrumento de elevada
importância para o desenvolvimento, na sociedade, de um
sentimento de pertencimento e, por consequência, uma prática
de proteção e valorização dos bens históricos e culturais de
uma determinada sociedade.
O uso de museus, espaços de memória, visitas à
prédios históricos, comunidades indígenas, quilombolas,
espaços de manifestações culturais como dança, música e
artesanato farão desenvolver no estudante um pensamento
crítico quanto o contexto histórico em que a manifestação ou o
44
monumento surge, assim como a sua importância para a
manutenção da identidade social, seja individual ou coletiva.
É importante perceber que não se deve, apenas,
levar o estudante ao espaço de memória. É primordial que antes
o educador proceda com uma explicação, adequada e
contextualizada, objetivando “preparar o terreno” para que o
estudante já tenha uma prévia percepção da necessidade de se
constituir o bem histórico e cultural como ícone identitário
e, a partir deste novo olhar, notar a necessidade de
desenvolver uma ação de revitalização, proteção e uso do
patrimônio com o objetivo de fazer permanecer vivo na
comunidade o ideal de conjunto.
Faz-se importante, também, perceber as diferenças
pontuais do patrimônio, pois cada tipo de bem histórico
cultural necessita de uma prática protecionista peculiar. Não
se pode utilizar os mesmos métodos de proteção dos bens da
dimensão pedra e cal – os patrimônios materiais – para a
salvaguarda dos bens imateriais, sejam quaisquer das
manifestações populares.
Assim sendo, podemos concluir que a Educação
Patrimonial deve constituir uma prática frequente na sala de
aula, devendo, até mesmo, ser tratada como um tema transversal
de mesma importância como os demais tratados nos PCNs, tais
como o meio ambiente e a educação sexual. Para constituir a
valorização e preservação dos patrimônios históricos e
culturais, devemos fazer da Educação Patrimonial uma prática
cotidiana e, de certa forma, automática.