defesa latina

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ENTREVISTA JAIRO CÂNDIDO Diretor-titular do Comdefesa “O que interessa ao Brasil não é de interesse apenas do governo, mas também da indústria.” ano 3 nº 8 R$ 14,90 Acordo bilateral Glonass, sistema russo de navegação por satélite, acompanha venda de armamentos SISTEMA ASTROS

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Revista Militar

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Page 1: Defesa Latina

1DEFESA LATINA

ENTREVISTA

JAIRO CÂNDIDODiretor-titular do Comdefesa

“O que interessa ao Brasil não é de interesse apenas do governo, mas também da indústria.”

ano 3 nº 8 R$ 14,90

Acordo bilateralGlonass, sistema russo de navegação por

satélite, acompanha venda de armamentos

SISTEMA ASTROS

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3DEFESA LATINA

Nos anos 1970, a indústria de defesa do Brasil ganhou destaque no comércio internacional. Abriu-se um período de excelentes re-ceitas, apogeu da tecnologia brasileira e, segundo executivos que atuaram na promoção do produto nacional, convívio pouco profis-sional entre as empresas que disputavam mercados. Principalmente as de maior expressão. Era cada uma por si e a falta de ética predo-minava. Até que veio a crise mundial pós-Guerra Fria e quase todas se desmantelaram.Naquela ocasião, não havia política de Estado para o setor. Hoje, quando o governo trata o segmento como indispensável ao desen-volvimento do país, o cabo de guerra, que parecia extinto, surpre-ende e desagrada. Se uma entre dez concorrências não for arreba-tada pelos grupos dominantes, logo são impetrados processos judi-ciais questionando a vencedora e pondo em dúvida a competência do governo na elaboração de requisitos em licitações. Há casos que levaram ao cancelamento da concorrên-cia, com equipamento similar adquirido no exterior.Eis um desafio que compete ao governo superar, adotan-do medidas rigorosas e requisitos que não deixem brechas a dúvidas nos resultados licitatórios, sob pena de enfrentar dificulda-des recorrentes para disciplinar o segmento estratégico. Exemplos po-dem ser seguidos: basta observar o processo nos países desenvolvidos, onde indústrias maduras se afinam com o interesse nacional.Uma autoridade de alta patente militar, cujo nome é preservado a pedido, elencou para DEFESA LATINA uma série de vícios e res-trições que envolvem a indústria de defesa. Ao final, sugeriu à re-vista dar o recado: a indústria precisa olhar com objetividade os interesses do Brasil, e não apenas os seus próprios, e “contribuir efetivamente no processo de modernização das Forças Armadas e de reorganização do setor produtivo”.As entidades que trabalham na formulação do novo parque de de-fesa brasileiro têm colaborado, oferecendo sugestões de alto con-teúdo e valor estratégico. É fundamental, portanto, a união das empresas, pois o que está na mira é o bem do país.Recado dado

Mirian Paglia CostaEditora

Abaixo os vícios históricos da indústria

Mar

inha

do

Bras

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4 DEFESA LATINA

DEFESA LATINA

Ano 3 Nº 8

Editora

Mirian Paglia CostaMTB Nº 12.637

[email protected]

Diretor de Redação

Cosme Degenar [email protected]

Diretora de Marketing e Publicidade

Helena Maria [email protected]

Diretor de Arte

Yves Ribeiro Filho

Conselho Editorial

João Lins de Albuquerque, Maura Sylvia Pasculli de Curci,

Tenente-brigadeiro Sérgio Xavier Ferolla

Impressão

Assahi

Distribuição

Fernando ChinagliaDistribuidora Ltda.

DEFESA LATINA é uma publicação da Editora de Cultura Ltda.

Endereço para correspondênciaAvenida Sapopemba, 2.722, 1º andarCEP 03345-000 – São Paulo, SP – Brasil

Telefone: 55 11 2894-5100e-mail: [email protected]

Empresa associada à

Todos os direitos reservados. Permitida a reprodução de trechos desde que citadas autoria e fonte. O

conteúdo dos anúncios é de responsabilidade dos respectivos anunciantes. Todas as informações e opiniões são de responsabilidade dos respectivos autores, não refletindo a opinião da Editora de

Cultura, publicadora desta revista.

3 EDITORIAL 6 RADAR 10 COMÉRCIO BILATERAL Os russos estão chegando! Com armamentos e sistema de de navegação por satélite (Glonass), que compete com o GPS norte-americano, os russos se apresentam como parceiros em defesa e outros campos 26 EXÉRCITO A força da nossa força O Exército Brasileiro se apronta para estar à altura do novo papel do país no mundo 28 CAPA Projeto Astros 2020 o novo sistema de apoio de fogo do Exército será elevado do nível tático para o nível estratégico, e a empresa Avibras poderá voltar às glórias passadas. 36 OPERAÇÕES DE PAZ Unifil: novas etapas da diplomacia solidária Pela terceira vez consecutiva, a Marinha do Brasil assume a liderança das forças navais da ONU na missão de paz do Líbano. 40 INDÚSTRIA DE DEFESA O panorama agora é outro Jairo Cândido, diretor-titular do Comdefesa, Departamento da Indústria de Defesa da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), situa o novo momento de destaque do Brasil no mundo 48 AERONÁUTICA A voz e a visão da experiência Uma ampla análise da Arma pelo tenente-brigadeiro Aprígio Eduardo de Moura Azevedo, que afirma: “Não faz guerra quem depende do outro”. 54 HOMENAGEM Um homem chamado Neiva Brasil perde José Carlos de Barros Neiva, líder de uma das mais antigas fábricas de aeronaves da América do Sul, hoje pertencente ao Grupo Embraer. 56 PROGRAMA ANTÁRTICO Canteiro de obras no gelo Operantar 31 animou verão ao sul do planeta com desmontagem de estruturas da Estação Comandante Ferraz, montagem de módulos e pesquisas, enquanto a nova base começa a ser desenhada 60 ARTIGO O incompreendido legado tecnológico militar brasileiro O risco de cometer antigos erros no momento de retomada da indústria de defesa brasileira. 62 EFEMÉRIDES Aiab 20 anos, rumo à maioridade

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Avib

rasSistema Astros:

Tiro de foguete AV-SS-60

Fragata Constituição, atual navio capitânia da Força-Tarefa Marítima da Missão de Paz da ONU no Líbano

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Para enviar mensagens à revista, e-mail: [email protected].

Por razões de espaço ou clareza, poderão ser publicadas resumidamente.

Ficou muito bom [o número 7].Texto correto e diagramação leve.Parabéns.Paulo CruzCampo Grande (MS)

Obrigado pela revista. As matérias são ótimas.Adenir VianaFlorianópolis (SC)

Ao agradecer pela especial consideração de enviar-me um exemplar da conceituada revista DEFESA LATINA, parabenizo os integrantes da equipe pela qualidade gráfica e, sobretudo, pelos temas interessantes e atuais abordados.Maj Brig Ar Luis Antônio Pinto MachadoComandante do II ComarRecife (PE)

Arevista DEFESA LATINA publica informações variadas e inte-ressantes a respeito da aviação brasileira, destacando neste número [7] a nossa Base Aérea.Grato e vida longa para a nossa revista. Heitor Freire Campo Grande (MS)

Parabéns pelas revistas DEFESA LATINA nº 6 e 7.Alto padrão.BRAVO ZULU!Um grande abraço.Vice-almirante Savio Almeida NogueiraDiretor, Diretoria do Pessoal Militar da Marinha

Fazia meio século que faltava ao Brasil uma biografia moderna e bem pesquisada do Patrono da Força Aérea Brasileira e criador do Correio Aéreo Nacional, o Briga-deiro Eduardo Gomes. Nesta obra, o herói dos 18 do Forte aparece de corpo e alma, com sua capacidade de líder civil e militar e sua perso-nalidade de benfeitor dos neces-sitados. Um homem admirável, que arriscou tudo, inclusive a vida e a carreira, a serviço da Pátria.

EDITORA DE CULTURALIVROS qUE DURAM

Trajetória de um herói

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DE ACORDO com informações do jornal Correio Braziliense, está pronta a estrutura do banco nacional de DNA de criminosos, fundamental para modernizar as investigações no Brasil. Para que entre em funcionamento, falta apenas a assinatura da presidente Dilma Rousseff. Con-siderada uma aliada poderosa da polícia e amplamente usada no exterior, até mesmo para elu-cidação de casos arquivados, a ferramenta já poderia ter apon-tado os autores de diversos deli-tos, segundo o jornal, pois o de-creto que regulamenta a lei de criação do cadastro nacional de DNA, se encontra na Casa Civil desde dezembro de 2012.Pela legislação em vigor, é obri-gatória a identificação genéti-ca de condenados por crimes hediondos ou crimes violentos contra a pessoa, como homicí-

Brasil terá banco de DNA do crime

dio, extorsão mediante seques-tro e estupro. Suspeitos também poderão ter o material biológi-co recolhido por determinação judicial. No entanto, isso tudo só se tornará operacional após a publicação das regras contidas no decreto.Depois de assinada a regulamen-tação, a Polícia Federal passará a gerenciar o banco genético na-cional, encarregando-se de cru-zar dados de DNA colhidos nos estados – 15 deles já têm estrutu-ra pronta para isso – com os con-tidos no sistema. Se houver coin-cidência, a PF se comunicará com os encarregados da investigação local. Bancos genéticos desse tipo estão em uso em 30 países, e a ferramenta é considerada ur-gente para o Brasil não apenas pelos altos índices de violência, mas também pela questão da impunidade. Segundo o Conse-

Arquitetura do Codis nos EUA: Agência nacional (NDIS) centraliza as agências dos estados (SDIS) e dos municípios (LDIS), um modelo de sistema federativo aplicável ao Brasil

NO DIA 5 DE FEVEREIRO, o comandante militar do Oeste, general João Francisco Ferreira, participou da solenidade de implantação do núcleo do 9º Grupamento Logístico (Nu 9º Gpt Log), realizada no 18º Batalhão Logístico (18º B Log), primeiro Grupamento Logístico implantado em um Comando Militar de Área. Na ocasião, foi oficializada também a assunção do comando do núcleo pelo coronel Aloísio Lamim, que foi subcomandante do Batalhão de Infantaria da Força de Paz (Brabatt) do Brasil no Haiti. O Nu 9º Gpt Log é originário do Escalão Logístico da 9ª Região Militar (9ª RM), que enquadra as organizações militares logísti-cas dessa região: o 9º Batalhão de Suprimento, o Parque Regional de Manutenção/9 e o 18º Batalhão Logístico.Inicialmente, o núcleo ficará subordinado à 9ª RM, ocupando as insta-lações do 18º B Log. Depois, em 2015, terá instalações próprias a serem construídas na área do complexo logístico do 18º B Log e do Parque Regional de Manutenção/9. De acordo com o noticiário divulgado pelo Exército, essa novidade atende à Portaria 212/12 do Estado-Maior do Exército, que aprova a diretriz para implantação do projeto piloto de separação dos ramos administrativo e logístico da força terrestre.

EB: Separando Logística de

Administração

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QUANDO FEZ seu primeiro voo com o ACS 100 Sora, em junho de 2008, a ACS Aviation, de São José dos Campos, marcou 2013 como o ano em que estaria fabricando pelo menos 10 aviões do tipo, destinados sobretudo ao mercado norte-americano. Pois esta é a mesma data em que o pequeno, leve e moderno modelo esportivo deverá se transformar no primeiro avião elétrico brasileiro, no qua-dro do Projeto Veículo Elétrico (VE) da Itaipu Binacional e parceiros. Para isso, a Itaipu, uma das maiores geradoras de energia limpa e renovável do mundo, fechou acordo com a ACS em novembro do ano passado, interessada em agregar conhecimento sobre mate-riais compostos e resistentes para redução do peso dos protótipos, pois know-how em motores elétricos ela já detém.De acordo com o engenheiro Celso Novais, coordenador do Projeto VE, o Brasil quer sair na frente na produção de aviões elétricos no mundo com tecnologia aeronáutica própria, assim como já faz com automóveis, caminhões leves, ônibus e pretende fazer com o veí-culo leve sobre trilhos (VLT) – todos com tração elétrica e, por isso, chamados de “veículos verdes”.Depois que técnicos do Projeto VE acompanharam testes com o Sora em São José dos Campos e levantaram informações sobre a potência necessária para o avião decolar e taxiar na pista, começou, já em Itai-pu, a construção em bancada da estrutura elétrica a ser incorporada ao protótipo. Se tudo der certo, o primeiro avião elétrico brasileiro – e, segundo Novais, da América Latina – vai decolar da pista de Itaipu, na margem paraguaia da usina, em agosto de 2013.“O nosso avião terá as mesmas características dos mais avançados produtos que estão sendo feitos no mundo. Porque, neste segmen-to, todos estão começando e não tem ninguém que esteja muito à frente. Portando, nós poderemos também ser uma das referências”, destacou Novais. “No mundo, apenas a Nasa possui um projeto si-milar. E posso garantir que estamos em pé de igualdade com eles”.Além do avião, o Projeto VE também já iniciou estudos para desen-volver o primeiro VLT elétrico do Brasil. Hoje, o único VLT produzido no país, pela cearense Bom Sinal, tem motor a diesel e biodiesel.

Pioneirismo em veículos elétricosO ACS 100 Sora a combustão logo será elétrico

ACS

Avia

tion

lho Nacional do Ministério Pú-blico, menos de 20% dos crimes de homicídio terminam com al-guém denunciado. Ou seja, mais de 80% dos inquéritos acabam arquivados no Brasil.O Sistema Combinado de Índices de DNA (Codis, em inglês), base de dados criada pela polícia fe-deral dos Estados Unidos, o FBI, foi doado pelos norte-america-nos às agências brasileiras que tenham interessse em adotá-lo como software operacional, a exemplo do que já ocorreu em outros países. Como o Brasil tem estrutura federativa, as unida-des forenses dos municípios e dos estados brasileiros se multi-plicariam até cobrir todo o país, todas elas se ligando ao órgão central. Nos EUA, o sistema Co-dis está presente em 45 estados, abrangendo mais de 90% da po-pulação norte-americana.

General João Francisco Ferreira

ACS

Avia

tion

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O MINISTRO das Relações Ex-teriores, Antonio Patriota, e o coordenador residente do Sistema ONU no Brasil, Jorge Chediek, inauguraram em 9 de dezembro do ano passado a Casa das Nações Unidas - Com-plexo Sérgio Vieira de Mello.

Com isso, toma corpo um pro-jeto que teve início há quatro décadas, quando o governo do Distrito Federal cedeu o terreno de 150m x 150m para a implan-tação do complexo da ONU, que ressalta a relevância do país no cenário mundial de cooperação internacional, segundo Chediek. Nos primeiros anos da década de 2000, o Pnud lançou concurso de arquitetura para selecionar o projeto da sede local da ONU, a ser implantada no Setor de Em-baixadas Norte. A proposta ven-cedora, dos escritórios liderados por Lúcio Gomes Machado (FAU/Mackenzie, 1969) e Paulo Bruna (FAU/ USP, 1964), chegou a ter sua construção iniciada na épo-ca, mas, pouco tempo depois, dificuldades financeiras levaram à suspensão do projeto. Agora readequado, o programa cons-trutivo dá ênfase ao desempe-nho ambiental, favorecendo ilu-minação e ventilação naturais.“A Casa da ONU vai ser uma espécie de âncora e vai atrair outras embaixadas a construir escritórios aqui. É uma região privilegiada pela proximida-de com as estruturas gover-namentais”, defende o admi-nistrador regional de Brasília, Messias de Souza, entusiasma-do com a ideia de Chediek de criar um Parque das Nações Unidas, abrangendo outras agências da ONU, como a Or-ganização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organiza-ção Mundial da Saúde (OMS), cujas sedes estão implantadas em áreas contíguas à da nova sede da entidade no Brasil.

ONU constrói sede em Brasília

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O ministro Antonio Patriota e o coordenador do Sistema ONU no Brasil, Jorge Chediek, inauguram placa que homenageia Sérgio

Vieira de Mello

Primeiro prédio da sede da Organização das Nações Unidas em Brasília

Trata-se da primeira edificação da projetada sede da Organi-zação das Nações Unidas no Brasil, na qual deverão operar o Programa das Nações Uni-das para o Desenvolvimento (Pnud), o Centro Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo, conhecido pela sigla do inglês IPC-IG, o Protocolo de Montreal e o Departamento de Segurança da ONU (UNDSS). No futuro, após a construção dos outros prédios, ficarão lá todas as agências e programas da ONU presentes na capital fede-ral. Com área de 3.135 metros quadrados, a construção do primeiro módulo foi estimada em pouco mais de 5 milhões de dólares, sendo 2/3 provenien-tes de dívida paga pelo gover-no brasileiro à entidade e o res-tante pela própria ONU, que já mantém outras 60 sedes como essa espalhadas pelo mundo.

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processo de articulação envolve ainda outros órgãos, como An-visa, Corpo de Bombeiros, De-fesa Civil e concessionárias de energia. Para tanto, serão cria-dos dois centros de comando nacionais, em Brasília e em Belo Horizonte, que serão interliga-dos aos centros de controle das demais cidades-sedes.Foi anunciado no dia 27, dessa vez pelo Ministério do Esporte, o início da fase virtual de treina-mento dos voluntários inscritos para trabalhar nos grandes even-tos, marcado para março. Os 7 mil jovens do Programa Brasil Voluntário serão treinados por meio de um software que é um

jogo com conteúdos sobre histó-ria do Brasil e das Copas, cultura local e informações turísticas das cidades-sedes, como localização de marcos importantes, data de fundação, personagens de des-taque, noções básicas de inglês e de espanhol, técnicas de re-cepção e orientação aos turistas, além de iniciativas públicas de esporte e ações de voluntariado.

Encerrada a fase de treinamen-to virtual, os participantes se-rão avaliados e os selecionados participarão de treinamentos específicos nas seis cidades: Belo Horizonte, Brasília, For-taleza, Recife, Rio de Janeiro e Salvador. Mais adiante, serão treinadas e selecionadas outras 4,9 mil pessoas, que poderão participar do evento de aber-tura, em Brasília, e de encer-ramento do torneio, no Rio de Janeiro. Antes disso, ao longo de 2012, cerca de 500 policiais federais, civis e militares dos estados-sedes foram treinados na capital federal por policiais norte-americanos, graças a

par ceria entre o Ministério da Justiça e o governo dos Estados Unidos, em 13 cursos abran-gendo gestão de segurança em grandes eventos, sistema de comando de incidentes, gestão em controle de fronteiras, se-gurança de autoridades, riscos químicos, biológicos, radioló-gicos e nucleares entre outras disciplinas.

NO DIA 25 de janeiro, foram ini-ciados os trabalhos de audiência pública do Ministério da Justiça no auditório da Agência Espa-cial Brasileira, em Brasília, para as tratativas de aquisição de sis-temas de alta tecnologia para os grandes eventos esportivos que ocorrerão no Brasil – Jorna-da Mundial da Juventude (que deverá ter a presença do novo papa) e Copa das Confederações, em 2013, Copa do Mundo de Fu-tebol de 2014 e Olimpíadas de 2016. Foram seis dias de audi-ência, com intensa participação de um significativo elenco de empresas interessadas, encer-rados já no primeiro dia de fe-vereiro. Na ocasião, a Secretaria Especial de Grandes Eventos Es-portivos apresentou o processo de compras e foi divulgado o projeto da Polícia Federal, que pretende adquirir um centro de sistema de comando e controle. O orçamento federal para se-gurança em grandes eventos é R$1,8 bilhão, sendo que R$1,1 bilhão é apenas do Ministério da Justiça. A integração entre os órgãos de segurança do go-verno federal e dos estados é um dos principais objetivos da secretaria. Responsável pela integração das polícias dos estados cujas ca-pitais sediarão os jogos da Copa com as Polícias Federal e Rodo-viária Federal e com a Força Na-cional de Segurança Pública, a Secretaria Extraordinária de Se-gurança para Grandes Eventos tem ainda por missão promover a interação com as polícias es-trangeiras, como a Interpol. O

Grandes eventos: equipamentos e equipes

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12 DEFESA LATINA 12 DEFESA LATINA

“A REPúBLICA ISLâMICA do Irã enviou um macaco ao espaço a bordo de uma biocápsula de fabricação própria. Trata-se do prelúdio para o envio de humanos ao espaço”, anunciou no dia 28 de janeiro em seu website a Agência Noticiosa da Re-pública do Irã (Irna, na sigla inglesa). A notícia, com imagens levadas ao ar pela televisão estatal do país, detonou uma cor-rida entre agências e veículos da imprensa internacional para verificar a verdade do fato. Muitos, entre eles algumas fontes dos EUA, garantiram que se tratava de mentira, o que não evitou que fontes do governo aventassem a possibilidade de o foguete iraniano servir a mísseis de longo alcance. Outros divulgaram que o Irã havia mostrado um macaco escuro pri-meiro e depois um cinza com uma mancha vermelha no su-percílio, alegando que bastaria isso para duvidar do anúncio. O Irã veio a público para confirmar o êxito da operação. Se-gundo a Agência Reuters, a cápsula atingiu 120 quilômetros de altura e voltou com sua carga intacta. O lançamento não foi o primeiro. De acordo com a Agência France Presse, o Irã colocou seu primeiro satélite em órbita em 2009. No ano se-guinte, um lançamento suborbital conduziu um roedor, duas tartarugas e alguns invertebrados. Em setembro de 2011, o pretendido lançamento de um macaco fracassou. O governo iraniano continua afirmando que seu programa nuclear é pa-cífico. O mesmo não afirma a Coreia do Norte, que lançou um foguete de longo alcance em dezembro de 2012 e realizou seu terceiro teste nuclear em fevereiro passado. Os EUA,em resposta, determinaram mais arrocho econômico ao país, ao passo que o governo de Pyongyang declarou que não recuará de sua política nuclear em troca de concessões econômicas.

Visto na TV: o foguete Kavoshgar, que teria levado um macaco ao espaço.

Irã lança macaco ao espaço

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13DEFESA LATINA

Brasil desponta em modelagem climáticaA FUNDAçãO de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fa-pesp), organizou um workshop na capital paulista para anunciar uma importante conquista: o Modelo Brasileiro do Sistema Ter-restre (BESM, sigla de Brazilian Earth System Model), com o qual contribui para as discussões mundiais sobre o futuro climático do planeta. Foi no dia 19 de fevereiro, quando, diante de um convi-dado muito especial, o professor Guy Brasseur, diretor do Centro de Serviços Climáticos (CSC) da Alemanha e ex-diretor do Centro Nacional de Pesquisas Atmosféricas (NCAR) dos Estados Unidos, pesquisadores dos programas da área de mudanças climáticas, biodiversidade e bioenergia, apoiados pela agência de fomento, participaram da apresentação do modelo, que vinha sendo desen-volvido desde 2008 por cientistas do Centro de Ciências do Sistema Terrestre (CCST) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e pelo Programa Fapesp de Pesquisa em Mudanças Climáticas Glo-bais (PFPMCG). Participam também dos trabalhos a Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais (Rede Clima) e o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Mudanças Climáti-cas (INCT-MC).Por seu ineditismo, as informações produzidas pelo modelo climá-tico brasileiro devem ser incorporadas ao AR5 – quinta edição do relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), com lançamento previsto para o segundo semestre –, dando ao Brasil o título de primeiro país da América Latina e único do Hemisfério Sul, depois que a Austrália adotou a modelagem britâ-nica, a contribuir para os modelos de mudanças climáticas globais produzidos pela Organização das Nações Unidas (ONU).O projeto produzirá informações sobre fenômenos climáticos tro-picais do continente sul-americano e do Brasil em especial, ainda insuficientemente conhecidos na comunidade internacional. Entre eles, contam-se a variação de temperatura das águas do Atlântico Sul e o desmatamento da Amazônia, do Cerrado e de outros bio-mas brasileiros, que podem trazer consequências climáticas conti-nentais e até globais. No âmbito interno, o BESM permitirá aprimo-rar a capacidade de previsão do tempo e da ocorrência de eventos climáticos extremos, além de contribuir para a formação de uma nova e mais numerosa geração de pesquisadores capaz de produzir ciência de qualidade na área.Toda a matemática relativa às previsões é processada no supercom-putador Tupã, máquina de R$ 50 milhões adquirida com verbas do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e da Fapesp.

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A PRESIDENTE da República, Dilma Rousseff, que já havia prestigiado o corte simbólico da primeira chapa de aço para construção do casco do submari-no brasileiro, o S-BR1, da classe Scorpène, participou de um novo marco no Programa de Desenvol-vimento de Submarinos (Prosub): a inauguração da Unidade de Fa-bricação de Estruturas Metálicas

Cabral, além de autoridades civis e militares do Brasil e da França, já que o empreendimento resul-ta do Consórcio Baía de Sepeti-ba, formado pela empresa fran-cesa Direction des Constructions Navales et Services (DCNS) e a construtora brasileira Odebrecht.A Ufem é uma obra com 55 mil metros quadrados de área cons-truída, composta de prédio prin-cipal, almoxarifado, paiol de In-flamáveis, central de utilidades e área de administração, além de 29 mil metros quadrados de área pavimentada. Mais de 5 mil pes-soas trabalharam no canteiro de obras da unidade, considerada um marco na execução do Prosub, que constitui o mais importante proje-to em desenvolvimento pela Ma-rinha. O complexo levou três anos para ser aprontado.De acordo com as autoridades da Marinha, o processo de constru-

(Ufem), em Itaguaí (RJ), no dia 1º de março. Participaram tam-bém da solenidade o ministro da Defesa, Celso Amorim, o embai-xador da França no Brasil, Bru-no Delaye, os comandantes da Marinha, almirante Julio Soares de Moura Neto, da Aeronáutica, Juniti Saito, brigadeiro do Exérci-to, general Enzo Peri e o gover-nador do Rio de Janeiro, Sérgio

Inaugurado o ninho dos submarinos brasileiros

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“Indústria da defesa é sobretudo a indústria do conhecimento”, afirmou Dilma ao inaugurar a Unidade Ufem, em Itaguaí (RJ)

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15DEFESA LATINA

Projeto Vant da PF em criseDEPOIS DE 20 meses paradas, as aeronaves do Projeto Vant do De-partamento de Polícia Federal (PF) voltaram a funcionar em dezem-bro 2012 e janeiro 2013, mas voaram um total que não chegou a 100 horas – menos de uma hora diária na média – e basicamente para treinamentos dos pilotos, denunciou em 20 de fevereiro a Agência Fenapef, isto é, da Federação Nacional dos Policiais Federais. Segun-do apurado pelos repórteres da agência, a decolagem das aerona-ves somente foi possível devido a um acordo entre o Ministério da Justiça e o fabricante, Israel Aerospace Industries (IAI), para que a prestação de serviços de manutenção das aeronaves não tripuladas fossem realizadas sem ônus para o DPF.O problema começou em 2011, quando o Tribunal de Contas da União (TCU) iniciou investigações sobre alegadas irregularidades no andamento do Projeto Vant da Polícia Federal e anunciou que con-tratos e atividades correlacionadas seriam auditados pela corte. Em maio de 2012, a direção-geral do DPF determinou o sobrestamento de todo o projeto, incluindo novas aquisições de aeronaves e equi-pamentos, formação de tripulações, compra de softwares específi-cos de imageamento e outras ações essenciais ao programa.“De lá para cá, o Vant da PF morre à míngua”, diz a matéria, que também registra: “Agora, com a proximidade das eleições de 2014, o governo iniciou a pressão para que, de qualquer maneira, o Vant do DPF volte a voar, mesmo que precariamente e sem produzir nada”. No período de paralisação, as aeronaves permaneceram mais dentro dos hangares de São Miguel do Iguaçu (PR) do que no ar. A revista IstoÉ, em sua edição de 28 de setembro do ano passado, já havia denunciado a situação, relatando que haveria conflito de interesses envolvendo a direção da PF e o Comando da Aeronáutica em relação ao projeto.O problema, segundo uma fonte da Agência Fenapef, é que, em curto e médio prazos, não há condições mínimas para os drones da PF, os Heron I, se tornarem plenamente operacionais, porque falta-riam instalações físicas, pilotos, autorização de uso de frequências, links de satélites e autorizações de sobrevoos. “O pior é que, pelo que tudo indica, o que seria mais uma ferramenta a ser utilizada pelo DPF para patrulhar as fronteiras e garantir a segurança dos jogos nas cidades da Copa do Mundo de 2014 pode se transformar em um grande fiasco”, conclui a reportagem.

ção dos submarinos se inicia na Nuclebras Equipamentos Pesa-dos (Nuclep), que domina a tec-nologia de fabricação de cascos resistentes para produção em série de submarinos. Com pro-cessos próprios de soldagem e fabricação, a empresa inaugurou em 1993 o Tamoio, primeiro sub-mersível produzido no país, e fa-bricou mais três: Tapajó, Timbira e Tikuna. Em seguida, as seções são transferidas para a Ufem agora inaugurada, onde rece-bem estruturas, equipamentos e componentes internos. Assim equipadas, as seções são deslo-cadas para o estaleiro, onde é executado o acabamento final e feita a união das seções. De-pois de pronto, o submarino é submetido às provas de cais e de mar. Nesse andamento, caberá à Itaguaí Construções Navais (ICN), constituída pelas mesmas em-presas, ocupar o estaleiro com exclusividade para fabricar os cinco submarinos previstos pelo contrato França-Brasil.O conjunto Ufem-base naval-estaleiro está orçado em R$ 7,8 bilhões, com desembolsos até 2017, ano em que deverá entrar em operação o primeiro dos sub-marinos convencionais, ao passo que o cronograma do nuclear indica apronto para 2023, com mais dois anos de testes antes da entrada em operação. Em para-lelo, no Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP), desenvolve-se a parte nuclear do projeto, que não envolve tecno-logia francesa. O Prosub foi orça-do em R$ 15 bilhões, R$ 4 bilhões a mais do que o orçamento des-tinado à aquisição dos 36 caças para a Força Aérea Brasileira do Projeto FX-2.

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16 DEFESA LATINA

Treinadores da Marinha dos EUA em reformaEMPRESA INTERNACIONAL especializada em defesa eletrônica e sistemas eletro-ópticos, a israelense Elbit Systems comemorou, no início de março, a contratação de sua subsidiária norte-americana M7 Aerospace como provedora de suporte logístico (CLS) para as aeronaves de treinamento T-34C, T-44A e T-44C, T-6A e T-6B da Marinha dos Estados Unidos. Os trabalhos, que terão duração de cinco anos, estão avaliados em cerca de US$ 50 milhões. O negócio é, na verdade, uma subcontratação feita pela BAE Systems, que conquistou o projeto licitado pelo Naval Air Systems Command (Navair). Além da parte a ser executada pela M7 Aerospace, o programa envolve inspeção, reparação e modificações em mais de 300 aeronaves do Navair e poderá chegar a US$ 400 milhões. As equipes trabalharão em três bases aéreas da Marinha: Corpus Christi, no Texas; Pensacola, na Flórida; e Whiting Field, também na Flórida.

O amarelinho T-34 da Marinha dos Estados Unidos, voando em

companhia de um avião da Força Aérea norte-americana

Um Nobel asiático

SAMUEL Yen-liang Yin, dono do Grupo Ruentex de investimentos e uma das maiores fortunas de Taiwan, lançou no final de janei-ro o Prêmio Tang, logo apelida-do de “Prêmio Nobel da Ásia”. Enquanto o Nobel sueco entrega anualmente US$ 1,2 milhão aos premiados nas áreas de física, química, fisiologia ou medicina, literatura e paz, o Tang dará bienalmente US$ 1,7 milhão a personalidades ou instituições de qualquer nacionalidade com destaque em desenvolvimento sustentável, ciências biofarma-cêuticas, sinologia (exceto lite-ratura chinesa) e direito, áreas consideradas fundamentais para o desenvolvimento social da hu-manidade. O futuro do prêmio, denominado a partir da brilhan-te Dinastia Tang (628-907 E.c.), será garantido com um fundo de US$ 101 milhões, doação à Tang Prize Foundation, instituída pelo bilionário, que pretende dar visi-bilidade a Taiwan na comunida-de científica mundial.A Academia Sínica, a mais emi-nente instituição de pesquisa do país, indicará os candidatos e anunciará a premiação inau-gural em 18 de junho de 2014. Quem sabe agora o Brasil, que jamais emplacou um Nobel, melhore suas chances de reco-nhecimento científico? W

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:comércio bilateral

João Lins de Albuquerque

Depois de décadas de afastamento, a dinâmica da cooperação Rússia-Brasil se amplia na área da defesa

A bandeira do comando supremo

das Forças Armadas da Federação Russa

e o símbolo do país, o urso, em

versão militar

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NA COMÉDIA de guerra Os russos estão chegando! (EUA, 1966), um comandante soviético, desejando visitar os Estados Unidos, encalha de propósito seu submarino pró-ximo à costa norte-americana, mas não consegue ajuda para fazer seu passeio: apavorados, os habitantes da região acreditam

tratar-se de uma invasão russa, e por pouco o incidente não de-semboca na Terceira Guerra Mun-dial. Assim eram, nas décadas de 1960 e 1970, o preconceito e o te-mor ocidental diante da ameaça militar soviética. Tão grandes que até argumentos surreais como esse geraram, em Hollywood,

centenas de filmes de guerra e espionagem demonizando a en-tão União das Repúblicas Socialis-tas Soviéticas (URSS), seu regime comunista e seu poder nuclear.Hoje, embora alguns ainda conti-nuem alimentando certa descon-fiança dos russos, a situação real mudou extraordinariamente. Por

um lado, a própria Rússia deixou de ser a todo-poderosa União Soviética, que dividia a liderança do mundo com os EUA. Por ou-tro, no contexto da nova ordem mundial – leia-se globalização –, mesmo os países da antiga Cor-tina de Ferro disputam participa-ção no mercado, assim como a

China, que, com seu “capitalismo de Estado”, se tornou parceira de destaque do Brasil. No país, são exemplos disso também o desen-volvimento das relações com a Federação Russa e com a Ucrânia após o colapso do comunismo.Vale lembrar que são de 2003 o primeiro pacto de transfe-rência tecnológica e militar do Brasil com a Rússa e de 2005 a assinatura da Aliança Estratégi-ca Brasil-Rússia, firmada pelos presidentes Vladimir Putin e Luiz Inácio Lula da Silva, quan-do da visita do brasileiro a Mos-cou. Em 2006, Brasil e Ucrânia juntaram-se com o objetivo de reativar o Centro Espacial de Alcântara e ganhar dinheiro com lançamentos de fogue-tes. A passagem pelo Brasil do primeiro-ministro da Rússia,

Bateria S-300

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Dmitri Medvedev, em fevereiro, inaugurou uma fase que pre-tende ser ainda mais significati-va na dinâmica dessas relações.

Carne, soja e mísseisQualificados por Moscou e Bra-sília como “relações amistosas e mutuamente benéficas”, esses laços renderam quase US$ 7 bi-lhões somente em 2012, embora a exportações brasileiras de carne e soja para os russos estejam pre-judicadas. Não constitui surpresa, porém, que a percepção russa, no momento, seja de que essa coo-peração bilateral poderá ser ain-da mais intensa e profícua. Sobre-tudo, segundo analistas, na área tecno-militar, como sinaliza o con-trato para fornecimento ao Brasil de sistemas de defesa antiaérea, totalizando cerca de US$ 1 bilhão.Cada vez mais próximos em ter-mos políticos – vide a recusa de uma solução militar para a cri-se da Síria, a defesa de maior participação dos países emer-gentes em órgãos do Fundo Monetário Internacional (FMI) e até o projeto de criação de um Banco de Desenvolvimento dos BRICs –, os dois governos querem agora promover inves-timentos conjuntos e ampliar, de facto, o valor agregado do comércio bilateral, hoje ainda concentrado mais em produtos básicos e commodities, sobre-tudo no caso brasileiro. Não é por acaso que os observadores do comércio exterior não hesi-tam em dizer que o Brasil está comprando tecnologia de defe-sa para tentar vender produtos

primários, isto é, convencer os russos levantar as restrições fi-tossanitárias impostas à carne nacional. Assim foi entendido o alcance das negociações bi-laterais de 20 de fevereiro de 2013, mantidas no Distrito Fe-deral entre a presidente Dilma Rousseff e o primeiro-ministro Dmitri Medvedev e por eles próprios definidos como algo que deverá favorecer de forma equilibrada as duas nações.Nos debates da Comissão de Alto Nível Brasil-Rússia, reunião comandada pelo primeiro-mi-nistro russo e pelo vice-presi-dente Michel Temer, o futuro da cooperação no campo energéti-co, inclusive nuclear, foi um dos temas de maior repercussão. O Brasil convidou a Rússia a parti-cipar como fornecedora de equi-pamentos ou de assessoria técni-

ca no processo de construção do futuro reator nuclear brasileiro multipropósito, cujo projeto vem sendo desenvolvido pela Marinha. Referindo-se às novas possibilidades de intercâmbio, Andrei Beloussov, ministro rus-so do Desenvolvimento Econô-mico, aposta na possibilidade de os dois países iniciarem em futuro próximo a cooperação em áreas tecnologicamente sofisticadas. Nesse sentido, os investidores russos têm planos para implementar no Brasil pro-jetos cujo valor varia de € 200 milhões a € 1 bilhão. Pretendem cooperar em construção de usi-nas hidrelétricas e fotovoltaicas, produção de hidrocarbonetos, assim como investir nas áreas de informática, biotecnolo-gia e produtos farmacêuticos.Apesar do cenário encorajador,

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Brasil deve adquirir três sistemas de mísseis de defesa aérea Pantsir S-1

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é no campo da defesa que re-sidem as maiores expectativas. Os equipamentos de defesa a serem comprados pelo Brasil, calculados em muitos milhões de dólares, envolvem aquisi-ções de três baterias de alta tecnologia e médio alcance do sistema de mísseis de defesa aé-rea Pantsir S-1, com capacidade para atingir de 3 a 15, e duas baterias do sistema de curto al-cance dos mísseis portáteis Igla, capazes de destruir aviões de combate em pleno voo, a partir de qualquer direção.De acordo com o chefe do Esta-do-Maior Conjunto das Forças Armadas (EMFA), general José Carlos de Nardi, que iniciou as negociações com os russos um mês antes do encontro dos mandatários em Brasília, a en-trega dos equipamentos deve

ocorrer 18 meses após a assi-natura do contrato, cuja elabo-ração demora de três a quatro meses – ou seja, algo em torno de dezembro de 2014.O Brasil exige que empresas nacio-nais participem do fornecimento de componentes – como blinda-dos lançadores – e sejam também beneficiárias da transferência tec-nológica, principalmente no que se refere aos sistemas de inteligên-cia, detecção e disparos contra al-vos aéreos. Também será formada uma joint venture para produção dos misseis Igla-S. Estão ligadas ao negócio as empresas Odebre-cht Defesa e Tecnologia, Embraer Defesa e Segurança, Avibras Ae-roespacial, Mectron e Logitech.Mas haverá offset mesmo? Ao responder se a Rússia es-taria pronta a admitir que os industriais brasileiros tenham

acesso a tecnologias da sua in-dústria militar e aos respecti-vos métodos de treinamento, Medvedev sugeriu a criação de joint-ventures, justificando: “No mercado de armamentos, a Rús-sia é um dos atores básicos. Se desenvolvermos a cooperação em qualquer área, incluindo a esfera técnico-militar, estare-mos prontos a compartilhar as tecnologias; mas este processo deve ser mutuamente vantajo-so. Não vale a pena entregar a tecnologia e perder o dinheiro”. Para evitar entregar o outro e perder o cliente, o russo sugeriu a criação de joint ventures, “em-presas conjuntas que podem ser úteis para ambos os países”. E completou: “Se os nossos parcei-ros brasileiros tiverem algumas ideias a esse respeito, estamos prontos a analisá-las”.

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O sistema de defesa aérea Pantsir-S1 montado sobre tanque, Buk-M1-2 e Tor-M2E-1

Sukhoi Su-35S, que os russos acreditam poder voltar ao

programa de aquisição de caças FX-2 para a Força Aérea Brasileira

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O BOM FUTURO DA COOPERAÇÃO RUSSO-BRASILEIRAPara o Centro de Análise de Comércio Internacional de Mate-rial de Guerra (Cacimg), instituição russa que estuda o volume de produção, exportação e importação de produtos bélicos no mundo, o Brasil poderia transformar-se oportunamente num dos grandes parceiros dos russos no âmbito da defesa. Sinal disso é que ele comprou nos últimos oito anos armas de guer-ra procedentes de 14 países, gastando mais de US$ 2,7 bilhões.

Entre 2003 e 2010, indica o Cacimg, o Brasil importou US$ 14,63 bilhões em armamentos, principalmente no âmbito de programas de cooperação de longo prazo com dois países europeus: França e Itália. No mesmo período, entretanto, o maior exportador para o Brasil continuou sendo os EUA, com vendas correspondentes a 24% do mercado e portfólio de en-comendas avaliado em mais de US$ 1 bilhão. Em seguida vem a França, com vendas de US$ 459 milhões ou 17% de partici-pação no mercado. Dividem o restante do espaço Alemanha, Espanha e Israel, com cerca de 15,6% de participação e vendas que chegam a US$ 430 milhões.

A Rússia, que tem grandes aspirações ao sul da linha do Equa-dor, vendeu apenas US$ 145 milhões ao mercado brasileiro e sua carteira de pedidos é de US$ 270 milhões. Mesmo assim, considera que, “se tudo der certo”, vai multiplicar várias vezes suas cifras de exportação. “Rússia e Brasil têm pela frente um futuro brilhante”, disse Medvedev durante sua visita. “O co-mércio com o Brasil, nosso parceiro estratégico, é de cerca de US$ 6 bilhões e gostaríamos de chegar aos 10 bilhões.”

Mesmo faturando quatro vezes menos que os EUA, a Rússia continua como o segundo maior exportador de armas do mun-do. Em 2012, conseguiu vender mais de US$ 15 bilhões em ar-mamentos para os quatro cantos do planeta. Embora Moscou tenha sofrido alguns reveses nas exportações, como a perda de contratos com Líbia e Síria, as autoridades russas susten-tam que a indústria bélica do país continua próspera. Recen-temente, dois países emergentes, China e Índia, ampliaram suas verbas para a compra de armas russas, enquanto antigos parceiros, como Argélia, Venezuela, Vietnã e Indonésia, conti-nuaram mantendo sua fidelidade. No ano passado, a indústria armamentista russa foi fortalecida por clientes como Azerbai-jão, Iraque e até EUA, interessados em comprar helicópteros (a bons preços) para o Afeganistão.

As armas russas mais vendidas entre 2008 e 2012, de acordo com a revista Forbes, foram os sistemas de mísseis antiaéreos, os blindados e os caças. Em 2012, a empresa russa Rosoboro-nexport, única estatal autorizada a negociar produtos de defe-sa e de tecnologia dual, assinou contrato de US$ 600 milhões com a China para entrega de 52 helicópteros do tipo MI-171 E.

Tudo isso, sem contar a venda de navios e equipamentos navais de guerra.

Troca com trocoEscrevendo sobre os novos hori-zontes da cooperação russo-bra-sileira, o jornal Pravda apontou um “futuro luminoso” para os negócios entabulados entre Brasí-lia e Moscou. Não se trata apenas de um exercício de rearmamento, assinalou o diário, mas da criação de um novo cronograma de de-fesa aeroespacial do Brasil com participação russa. Uma exposição sobre tal possibilidade foi feita para o Brasil por um instituto de pesquisa científica do conglome-rado de empresas de defesa antia-érea Almaz-Antey. O projeto pro-põe, em resumo, que o território brasileiro seja dividido em cinco distritos de defesa aérea usando apenas armas russas em três níveis: de alto, médio e curto alcance – re-presentando, respectivamente, os sistemas S-300; várias modificações dos sistemas Buk, de médio alcan-ce; e Tor-M2, que rastreia simul-taneamente até 48 alvos e pode disparar mísseis simultaneamente contra quatro deles. Este último é considerado o mais sofisticado dos sistemas de defesa antiaérea de curto e médio alcance da Rússia.A questão, indagou o Pravda, é saber se o Brasil disporá dos re-cursos necessários para levar o projeto adiante. O diário lem-brou que, antes de visitar Mos-cou, em dezembro de 2012, a presidente Dilma Rousseff pas-sou por Paris, onde anunciou o congelamento de US$ 5 bilhões destinados à compra de 36 ca-ças de superioridade aérea, o chamado Projeto FX-2, em que concorrem a francesa Dassault, com o Rafale; a norte-americana Boeing, com o F/A-18 Super Hor-net; e a sueca Saab, com o JAS

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39 Grippen. O russo SU-35M, da Sukhoi, não ficou entre os candi-datos potenciais. Mas, com as no-vas negociações bilaterais, pelo fato de a Rússia concordar em transferir tecnologia militar para o Brasil, as autoridades de Mos-cou acreditam na abertura de no-vas oportunidades para a partici-pação de seu caça na licitação. A esperança russa foi acesa sobre-tudo porque, durante sua visita a Moscou, a presidente brasileira teria assegurado não haver nada decidido sobre o Projeto FX-2.Também o Brasil volta olhos para caminhos fechados em ou-tros tempos. No caso, a venda de jatos brasileiros à Rússia. A esse respeito, aliás, a Embraer já teria conseguido o certificado para negociar o jato regional E-190 com o mercado russo, A intenção da empresa brasileira é colocar cerca de 150 aeronaves lá até 2020. Na tentativa ante-

O Igla-S, lançador portátil de mísseis

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Tor-M2E, nova geração de sistema de mísseis terra-ar da Rússia

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rior, o Brasil teria sugerido que, se a Sukhoi vencesse o concur-so, Moscou se comprometeria a comprar aeronaves regionais produzidas pela Embraer. A Rússia, no entanto, não aceitou a proposta, pois pretendia lan-çar uma aeronave do gênero, o Sukhoi Super Jet. Agora, o qua-dro teria mudado: Moscou anun-ciou que a Rússia está disposta a comprar aeronaves médias no exterior, o que voltou a habilitar a brasileira Embraer e sua con-corrente canadense, Bombardier.A visita de Medvedev ao Brasil rendeu ainda a assinatura de um contrato para instalação de uma central quântico-óptica e a inauguração de uma estação de rastreamento do Glonass (sigla para Global Navigation Satellite Systems ou, em russo translitera-do, Globalnaya Navigatsionnaya Sputnikovaya Sistema), o sistema russo de navegação global por satélite, concorrente do conhe-cido GPS norte-americano e do Galileo europeu. O Glonass, com

uma constelação de 24 satélites, cobre todo o território do pla-neta desde 2011 e é o mais caro programa da Agência Espacial da Federação Russa. Em compa-ração com os outros sistemas, a vantagem do Glonass é ser gra-tuito na resolução máxima, em decímetros. No caso do sistema norte-americano, há notícias de que os EUA vão adotar a cobran-ça de uma tarifa de precisão, que seria introduzida ainda em 2013.A instalação da base do Glonass na Universidade de Brasília (UnB) e a transferência da tecnologia russa colocariam o Brasil, se-gundo os técnicos russos, num importante patamar de conheci-mento nesse setor, beneficiando grandemente a pesquisa aeroes-pacial. Seria também útil na pre-venção de catástrofes aéreas.

O outro lado da moedaMais útil para o Brasil seria, no momento, resolver a catástrofe do embargo da carne pela Fe-deração Russa, que era o maior importador mundial de carne bovina do Brasil, e o segundo de carne suína. Aliás, há quem diga que a venda de armamento an-tiaéreo ao Brasil teria sido uma troca oferecida pela Rússia para reabrir o mercado da carne bra-sileira naquele país. Segundo o vice-presidente Michel Temer, as tratativas para isso entre o Mi-nistério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e as autoridades russas foram “extre-mamente favoráveis”. No final de 2012, a vigilância veterinária russa fechou seu mercado à carne

de animais que receberam adição de ractopamina, aditivo que me-lhora a conversão alimentar e o ganho de peso do gado de corte.Os russos garantem que a libe-ração das importações da soja brasileira, que também sofreram restrições, depende apenas de questões burocráticas a serem resolvidas em curto prazo. Já a liberação das carnes depende-rá ainda de análise das missões técnicas que farão inspeções no Brasil. Antes disso, caberá ao país demonstrar seu interesse pelo assunto, fazendo as fiscalizações indispensáveis. Afinal, ninguém quer que aconteça agora o que aconteceu na última missão da Defesa Sanitária russa, quando, de 20 frigoríficos inspecionados, apenas dois foram aprovados.Além de defesa e agricultura, a pauta russo-brasileira alcançou vários temas. Na área de ener-gia, foram definidas intenções em torno de exploração de pe-tróleo e gás natural na Bacia do Solimões; construção de usinas hidrelétricas em Sinop, São Ma-noel e Sobradinho; intercâmbio de experiências em projetos de transmissão de energia; e coo-peração técnica em projetos de eficiência energética, redução do consumo, fontes renováveis e inovação. Esportes e educação também foram contemplados, vi-sando a gestão de grandes even-tos a serem celebrados no Brasil e na Rússia, além de aperfeiçoa-mento e intercâmbio de atletas. Por fim, em educação, foi acer-tada a adesão da Rússia ao pro-grama Ciência sem Fronteiras.

A presidente Dilma Rousseff com o primeiro-ministro russo Dmitri Medvedev em Brasília

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exército

O EXÉRCITO Brasileiro (EB) está passando por um processo de transformação, iniciado a partir da percepção da necessidade de ampliação das capacidades de proteção ao Estado brasileiro, coerente com sua mis-são constitucional e de acordo com a política na-cional de defesa e com a estratégia nacional de defesa. No momento em que o País busca ampliar sua influência no cenário internacional, a fim de convergir esforços para ampliar sua capa-cidade de atuação e atender às demandas do Estado compatíveis com a Era do Conhecimento, o Exército Brasileiro desenvolveu um programa que foi desdobra-do em Projetos Estratégicos. Com foco nessa proposição e alinhado com o planejamento estratégico do Exército, foram definidos os principais projetos indutores da transformação da Arma, neces-sários à consecução dos objetivos estabelecidos: Sisfron, Proteger, Guarani, Defesa Cibernética, Defe-sa Antiaérea, Astros 2020 e Recop, que serão apresentados a seguir.

O Sisfron (Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras) é um projeto integrado de sen-soriamento, de apoio à decisão e de emprego operacional, com vistas a fortalecer a presença

e a capacidade de ação do Estado na faixa de fronteira, além de redu-zir problemas próprios dessas áreas e fortalecer a interoperabilidade, as operações interagências e a cooperação regional.

O projeto piloto está sendo im-plantado no Comando Militar do Oeste, na região de Dourados, Mato Grosso do Sul.O projeto Proteger (Sistema Inte-grado de Proteção de Estruturas Estratégicas Terrestres) foi conce-bido para proteção das estrutu-ras estratégicas terrestres do País, como instalações, serviços, bens e sistemas, cuja interrupção ou des-truição podem impactar o Estado e a sociedade nos campos social, ambiental, econômico e político, com repercussão nacional ou in-ternacional.O projeto Guarani consiste no de-senvolvimento e na produção de

uma nova família de blindados sobre rodas, a fim de transformar as unidades de Infantaria moto-rizada em mecanizada e de mo-dernizar as unidades de Cavalaria mecanizada. Tal projeto trará no-vas oportunidades de desenvol-vimento tecnológico à indústria nacional. A Defesa Cibernética é a área estratégica sob responsabilidade do Exército Brasileiro, segundo a Estratégia Nacional de Defe-sa. Para tanto, o projeto Defesa Cibernética visa prover o País de capacitação tecnológica, pas-sando pelos recursos humanos, pelo desenvolvimento de dou-trina de proteção de ativos e de estruturas do ciberespaço, pela operacionalização de sistemas de segurança da informação e pelo incentivo à produção nacional no setor de defesa cibernética. Res-salta-se que, a partir desse proje-to, foi criado o primeiro antivírus nacional, o AvWare Defesa-BR.Integrado ao Proteger, o projeto Defesa Antiaérea busca capacitar a Força Terrestre para defender as estruturas terrestres do País de ameaças provenientes do espaço.

A força da nossa ForçaExecutando um amplo projeto de transformação, o Exército Brasileiro se apronta para estar à altura do novo papel do país no mundo

Comando do Exército

Exposição de armas do Exército

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PROJETOS ESTRATÉGICOS DO EXÉRCITO

SISFRON: Projeto-piloto na 4ª Brigada de Cavalaria Mecanizada (Dourados-MS) com meios optrônicos (monóculo de visão terrestre, imageador termal); radar de vigilância terrestre Sentir M-20 e radar de vigilância Saber M-60; Vant – categorias 0, 1 e 2 (similar ao Hermes 90); Software C2 em Combate; material individual e coletivo; material de guerra eletrônica, como radares, sensores e infovia; viaturas especializadas e não especializadas; embarcações fluviais para vigilância; novas organizações militares na faixa de fronteira, como o 9º Batalhão de Comunicações, Pelotão de Comunicações de Brigada, Centro de Monitoramento de Fronteira, Centro Regional de Monitoramento, criação de pelotões e esquadrões de fronteira (antigos destacamentos).

PROTEGER: Implantação do Sistema de Comando de Operações Terrestres e Interagências (SisCoti), integrado por centros de C2 (CCoti fixo, em Brasília, e móveis, C Mil A, RM/DE e Bda) para emprego dual; melhoria e ampliação do Sistema C3I, melhorias no Programa Pacificador e integração Hermes; apoio na reestruturação do CC2FTer (Coter); aquisição de produtos de defesa (Prode); aquisição de licenças de software Hermes para os C Mil A; apoio à capacitação de OM de Com; modernização de equipamentos e sistemas de detecção, análise e descontaminação para o sistema de DQBRN (Defesa química, biológica, radiológica e nuclear); modernização de equipamentos operacionais com emprego dual.

DEFESA CIBERNÉTICA: Criação do Centro de Defesa Cibernética; capacitação de RH; antivírus Defesa-BR; RDS, Rádio Definido por Software; computador de alto desempenho (IME); laboratórios de TIC (Aman e EsPCEx); simulador de guerra cibernética (CComGEx).

GUARANI: Experimentação doutrinária na 15ª Brigada de Infantaria Motorizada (Cascavel-PR) – projeto piloto; plataforma do veículo; sistemas de armas plataforma (torre); sistema de C2; obtenção de munições; adequação das instalações de aquartelamentos, sistema de simulação, sistema de logística integrada (SLI).

DEFESA ANTIAÉREA Centro de Operações de Artilharia Antiaérea (COAAe) de seção e de bateria, grupo e brigada (a serem desenvolvidos); míssil terra-ar; radar Saber M-60 e radar de vigilância; aquisição de viaturas operacionais; baterias de míssil de média altura e de baixa altura; sistema de C2 e SLI.

ASTROS 2020: Desenvolvimento de míssil AV-TM 300 (alcance 300 km); foguetes guiados com precisão quatro vezes superior aos atuais SS-40.Avibras; modernização do 6º Grupo de Mísseis e Foguetes (GMF); criação de outro grupo GMF, do Centro de Instrução e de um Centro de Logística no “Forte Santa Bárbara” (Formosa-GO).

RECOP: Nova linha de fuzis IA2-Imbel (5.56 e 7,62); morteiro 120 mm; arma leve anticarro; míssil MMS 1.2 AC; embarcações; lanchas de patrulha fluvial; viaturas operacionais; material aeroterrestre; equipamentos para a artilharia; equipamentos de visão noturna.

Para tal, reequipará as organiza-ções militares de Artilharia An-tiaérea do Exército, por meio da aquisição de novos armamentos, da modernização dos existentes, do desenvolvimento de itens es-pecíficos, realizado pela Indústria Nacional de Defesa, e pela capa-citação de pessoal e implantação de um sistema logístico integra-do.Com o objetivo de aumentar o alcance das armas estratégicas de Artilharia, dando maior poder de dissuasão em nível global, foi concebido o projeto Astros 2020, que dotará unidades de meios suficientes para proporcionar à Força Terrestre a capacidade de prover apoio de fogo de longo alcance, com grande precisão e letalidade.Finalmente, o Recop (Recupera-ção da Capacidade Operacional da Força Terrestre) visa dotar as unidades operacionais de mate-rial de emprego militar impres-cindível ao seu pleno emprego operacional, a fim de atender às exigências constitucionais de de-fesa da Pátria e de Garantia da Lei e da Ordem e, também, às

missões atribuídas ao Ministério da Defesa. É, portanto, um pro-jeto orientado para a moderniza-ção da Força Terrestre brasileira.Os Projetos Estratégicos do Exér-cito têm por finalidade, também, ampliar a capacidade operati-va da Força Terrestre, de modo a torná-la tão eficiente quanto

requer o Brasil em seu processo de crescimento econômico e de reconhecimento e projeção in-ternacional. Além desse objetivo, os Projetos estão voltados para a melhoria dos setores de Ciência, Tecnologia e Inovação, com resul-tados importantes para o setor industrial brasileiro.

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capa

NA DÉCADA de 1970, quando os brasileiros eram o terceiro maior com-prador mundial de petróleo do Iraque, a balança comercial pendia to-talmente para o lado dos iraquianos, que nada compravam do Brasil. A subida estratosférica dos preços do barril em 1973, como protesto dos produtores árabes contra o apoio norte-americano a Israel na Guerra do Yom Kippur, o governo brasileiro propôs reciprocidade comercial ao Iraque. Afinal, o barril havia saltado de US$ 2,50 para inviáveis US$ 10,50. Em cinco meses, de outubro de 1973 a março de 1974, o aumen-to chegou a 400%, o que geraria longa recessão nos países ocidentais, desestabilizando a economia mundial. Comandava a Petrobras naque-le período o futuro presidente, general Ernesto Geisel, que apostou na

extração de petróleo da plataforma submarina e conduziu a aproxima-ção com o Iraque, além de iniciar a busca de alternativas energéticas via projeto de usina nuclear negociado com a Alemanha e uso do álco-ol como combustível. Ainda em 1973, foi inaugurado um escritório da Petrobras International (Braspetro) em Bagdá, após acordo com a esta-tal Iraq National Oil Company. Egito e Líbia também firmaram acordos para pesquisa de novas jazidas em seus territórios.

Em 1979, no ocaso do governo Geisel, uma delegação brasileira aterrissou em Bagdá para nego-ciar. Na comitiva estavam dois industriais da área de defesa: os engenheiros José Luiz Whitaker Ribeiro, presidente da Engesa, e João Verdi Carvalho Leite, presi-dente da Avibras Aeroespacial. No cômputo geral, o resultado foi animador. João Verdi assinou con-

trato de US$500 milhões para for-necer um sistema de artilharia de lançamento múltiplo de fogue-tes, que ainda se achava nas pran-chetas de sua empresa. Whitaker Ribeiro, por sua vez, fechou negó-cio para fornecer o blindado so-bre rodas Cascavel, que havia sido lançado na Líbia cinco anos antes. Para tirar o produto do papel, a Avibras investiu em novas instala-ções industriais e linhas de mon-tagem. Em dois anos, a primeira versão do sistema Astros foi fina-lizada com a colaboração do Exér-cito Brasileiro. O sistema Astros é usado para saturação de área e apoio de fogo, disparando raja-das múltiplas de foguetes sobre o alvo, a distâncias de 30 e 60 qui-lômetros. Testado em combate na guerra Irã-Iraque (1980-1988), seu desempenho foi extraordiná-rio. Na Guerra do Golfo, em 1991, repetiu o sucesso anterior, agora nas mãos do exército da Arábia

O novo lançador múltiplo de foguetes da Avibras visa dar ao Exército Brasileiro um sistema de defesa moderno, capaz de apoio de fogo de longo alcance, com elevada precisão e letalidade

Cosme Degenar Drumond

8/05/2012: Reunião de coordenação do projeto estratégico Astros 2020 no 6º Grupo de Lançadores Múltiplos de Foguetes e Campo

de Instrução de Formosa, em Goiás

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Saudita, que se associou às for-ças ocidentais, compostas por 29 países sob a liderança dos Estados Unidos, reagindo à invasão do Kuwait pelo Iraque do ex-aliado Saddam Hussein (1937-2006).A alta qualidade tecnológica e o excelente desempenho do As-tros beneficiaram a Avibras com novos clientes no Oriente Médio. Por anos a fio, ela foi a única in-dústria do país convidada a par-ticipar dos encontros anuais da Association United States Army (AUSA), ao qual só compare-ciam potenciais fornecedores do exército dos EUA. Assediada por empresas estrangeiras para de-senvolvimentos conjuntos e até para estabelecimento de joint-ventures, a Avibras manteve-se como indústria genuinamente de capital brasileiro. Hoje, seu princi-pal produto é operado no Brasil, em países do Golfo e no Sudeste Asiático, carreando para a em-presa prestígio internacional.

Passados mais de trinta anos daquela venda pioneira em Bagdá, a Avi-bras volta a se destacar com o sistema Astros. Para tanto, a presidente Dilma Rousseff autorizou, no final de janeiro de 2011, um crédito de R$ 45 milhões, objetivando dar início ao programa de aquisição do sistema Astros 2020. Na composição do projeto estratégico, o Exército pretende implantar uma infraestrutura operacional formada por duas unidades de mísseis e foguetes, um centro de instrução de Artilharia, logística, bateria de busca de alvos, depósitos de munições e base de administração. Tudo assentado no Campo de Instrução de Formosa, em Goiás, para as operações com mísseis e foguetes. O 6º Grupo de Lan-çadores Múltiplos de Foguetes, unidade de primeira linha do Exército naquele estado, será transformado em 6º Grupo de Mísseis e Foguetes. Dois armamentos serão desenvolvidos: um foguete guiado, com base na concepção do SS-40 do Astros, e um míssil tático de cruzeiro com alcance de 300 quilômetros. Nessa configuração, o projeto já chamou a atenção em nível global, de acordo com o blogue norte-americano De-fense Industry Daily, que comentou: “Com tal alcance (...) ele irá rivali-zar com a combinação MLRS/ATACMS dos Estados Unidos”, isto é, por extenso, Multiple Launch Rocket System/Army Tactil Missile System. As duas unidades de mísseis e foguetes serão estruturadas com comando e estado-maior, uma bateria comando e três baterias de mísseis e fo-guetes equipadas com viaturas e materiais ainda em desenvolvimento.De acordo com o novo conceito, o projeto Astros 2020 poderá disparar foguetes e mísseis táticos de cruzeiro a partir da plataforma de um novo veículo lançador múltiplo, versão MK-6. A estrutura funcionará integrada à preparação do tiro, recebimento e análise da missão, comando e contro-le, trajetória de voo e controle de danos. A Avibras está desenvolvendo o

Foguetes ar-terra

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míssil tático de cruzeiro de 300 quilômetros de alcance, o AV-TM, o fogue-te guiado, com ogiva para transportar e derrubar dezenas de granadas sobre o alvo, e as novas viaturas lançadoras, remuniciadoras, de comando e controle, de meteorologia e de apoio ao solo. No caso do AV-TM300, a cabeça de guerra carregará dois mísseis para cumprir seu objetivo ideal, que é uma instalação estratégica: refinarias, usinas geradoras de energia, centrais de telecomunicações, concentrações de tropa, depósitos, por-tos, bases militares, complexos industriais. O projeto de engenharia, os protótipos, os testes e a definição dos insumos agregados estão sendo conduzidos pela empresa, com apoio e acompanhamento do Exército.A nova configuração da arma brasileira entrará num mercado lotado de concorrentes, mas com um às na manga: os países que já usam o As-tros. Nas previsões da Avibras e do Exército, o Astros 2020 deverá gerar novos empregos na região paulista de funcionamento da empresa, em Formosa e em Brasília. A formação de profissionais com capacitação em tecnologias de ponta é outro destaque do projeto. A estrutura físico mi-litar do projeto ficará concentrada na área norte do Campo de Formo-sa, denominada Forte de Santa Bárbara, em homenagem à padroeira dos artilheiros. Suas etapas de desenvolvimento tiveram início em 2012, devendo ser concluídas em 2018.Com o Astros 2020, o atual sistema de apoio de fogo do Exército será elevado do nível tático para o nível estratégico. Sua funcionalidade se dará de forma coordenada com a Marinha e a Força Aérea, tanto na defesa do litoral quanto do espaço aéreo brasileiro. Com o diferencial de ser todo digital, o sistema oferece ainda a possibilidade de integrar o veículo aéreo não-tripulado (Vant) Falcão, que a Avibras está desen-volvendo e poderá servir para ampliar o reconhecimento da arma.

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Ansat-10, primeira antena profissional brasileira de 10 metros de diâmetro desenvolvida para atender ao Sistema de Telecomunicações

pelo Satélite Brasileiro e para ampliações do Intelsat

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Os livros de culinária ensinam receitas para fazer bons pra-tos. Enfatizam que a prática é essencial na arte dos chefs. O mesmo é válido também para os setores da economia que lidam com tecnologia de ponta. A Avibras Aeroespacial sabe o que isso quer dizer. Empresa do setor de defesa inteiramen-te brasileira, ela foi criada em abril de 1961 e, voltada para a inovação no setor aeronáutico, lançou a primeira aeronave de treinamento militar construída com material composto no Brasil, o Projeto Falcão, que foi adquirido pela Força Aérea Brasileira. Depois, diversificou sua linha de produtos, traba-lhando em conjunto com o Centro Técnico Aeroespacial (CTA) no desenvolvimento de diversos foguetes de sondagem e alcançou sucesso internacional de vendas já nos anos 1980, impulsionada pela guerra Irã-Iraque (1980-1988). Na ocasião, lançou o sistema de artilharia de saturação de área Astros II, adquirido pelo Iraque. O produto, que se tornou um de seus maiores êxitos, apresentou uma particularidade única, desen-volvida junto com engenheiros do Exército: podia operar três calibres diferentes sobre a mesma plataforma.

A Avibras foi fundada em São José dos Campos pelo saudoso engenheiro aeronáutico João Verdi Carvalho Leite. A trajetó-ria de sucesso da empresa, hoje com mais uma planta na ci-dade natal e instalações também em Jacareí e Lorena, é bem conhecida. Entretanto, ela enfrentou dificuldades financeiras e crises agudas. Entrou na década de 1990, por exemplo, car-regando uma concordata. Depois, a recessão internacional e os recorrentes planos anti-inflacionários do Brasil repercuti-ram negativamente na sua produção. Outro conflito interna-cional, a Guerra do Golfo (1990-1991), ajudou-a a recuperar a saúde e a ampliar suas estratégias de mercado.

Em 2008, já sem seu principal executivo – João Verdi faleceu em 24 de janeiro em acidente aeronáutico –, a Avibras voltou a se destacar nos cenários brasileiro e mundial, apresentando um portfólio de produtos de alta qualidade entre sistemas de defesa ar-terra e terra-terra, veículos aéreos não tripulados e mísseis com software e hardware desenvolvidos, projeta-dos e integrados na própria empresa. Dominando diversos campos tecnológicos, como telecomunicações, química, ele-trônica, transporte, pesquisa espacial e sistemas para defesa, ela tem uma divisão que produz veículos especiais para uso militar e civil, além de prestar serviços no setor de qualidade.

Para conhecer a fase moderna da Avibras, DEFESA LATINA entrevistou o presidente da empresa, engenheiro eletrônico Sami Youssef Hassuani, no dia 2 de fevereiro. Dois dias antes, ele havia assumido a presidência da Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança (Abimde).

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Inovar e produzirO senhor poderia fazer um resumo do modelo de gestão adotado pela Avibras após o desaparecimento de seu fun-dador e principal acionista? Após o acidente, o mercado dizia que a empresa, umbilicalmente vinculada à pessoa do engenhei-ro João Verdi, teria seu futuro comprometido. Por ser uma em-presa familiar, de um único dono, houve o comentário. Porém, a Avibras sempre foi totalmente profissional. Nossos métodos e processos são absolutamente de governança. O Verdi era, de fato, o melhor engenheiro da compa-nhia, seu melhor vendedor e um visionário de coragem. Era de um talento único. Um grande desafio se originou e uma pergunta ficou no ar: como substituí-lo se ele era insubstituível?O desafio seria fazer a transição na companhia. Afinal, durante 46 anos, ele havia sido o único presidente da empresa e seu me-lhor projetista e vendedor. Na impossibilidade de encontrar no Brasil alguém igual a ele, os exe-cutivos mais antigos e experien-tes reuniram-se e decidiram que, tendo cada um herdado uma parte do talento dele, em con-junto, poderíamos administrar a empresa. Alguém teria que ser o presidente. Eu era o vice e assumi interinamente a função. Assim, criamos um grupo de cerca de 25 pessoas e cada qual assumiu sua responsabilidade de cumprir da melhor maneira possível as fun-ções do Verdi, cada um imprimin-do seu estilo pessoal. Eliminada

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a comparação, um novo modelo de gestão surgiu e deu certo. A figura de João Verdi na empresa está preservada. Ninguém ocu-pou a cadeira, a mesa ou mesmo a vaga dele no estacionamento. A transição na empresa teve um efeito multiplicador extraordiná-rio. Cada um se sentiu como uma parte do Verdi. O mercado, clien-tes e fornecedores sentiram a empresa ressurgir à moda do seu criador. Em cada um de nós há um pouco da ousadia do Verdi. Quando vejo as obras de expan-são que estamos realizando... A ousadia não é do atual presiden-te da empresa, mas do vice-presi-dente Operacional, Flávio Cunha, que herdou do Verdi essa visão de investir em plantas industriais para aumentar a produtividade, produzir mais, vender mais e au-mentar o faturamento da empre-sa. À frente do setor Comercial, posso dizer que tenho a mesma ousadia. Quando lançamos o de-senvolvimento de um míssil novo, como o TM de 300 quilômetros de alcance, a ousadia é do diretor de Engenharia de Sistemas. Esse é o modelo atual da Avibras. Tudo está preservado, e estamos inves-tindo em tecnologias, novos pro-dutos, expansão do parque indus-trial e, obviamente, em vendas.

Como era a Avibras quando o senhor chegou à empre-sa, em 1984, e como foi sua atuação na companhia? Na década de 1980, a Avibras esta-va em crescimento. Ela partiu de

150 funcionários e chegou a ter 7 mil empregados. Hoje, temos 1.100. Quando entrei, eram 3.500 e havia muitos contratos e pro-gramas em andamento. O Verdi era um empreendedor nato e teve a visão de que a empresa precisaria de novos talentos para continuar crescendo. O ITA for-mava engenheiros, quase todos contratados pelos bancos para trabalhat no sistema financeiro – um verdadeiro desastre para a engenharia brasileira. O Verdi cobriu a proposta dos bancos, quebrou esse ciclo e contratou 53 engenheiros da minha turma de 100 formandos, que foram alocados em diferentes áreas da empresa. Eu entrei para a Quali-dade, setor interessante e crítico na empresa, mas para o qual eu não tinha vocação. Em seis meses, passei para Ensaios de Engenha-ria em Campo. Nessa atividade, fiz os primeiros contatos com clientes e vi que tinha vocação para o Comercial. Mas fiquei na área puramente técnica por mais cinco anos, quando então passei para a área responsável por trei-namentos e assistência técnica no exterior, atuando mais com rada-res, já que sou engenheiro eletrô-nico, interfaceando com o cliente em operações de campo. Nes-sa época, aprendi muito sobre doutrina militar em contato com militares no Brasil e no exterior, uma vez que não existiam cur-sos formais nessa área para civis. Na sequência, entrei para Apoio Técnico a Vendas, passei para

Vendas, gerência de vendas e ge-rente do escritório da Avibras no Oriente Médio. Depois, fui para a Diretoria Comercial adjunta, de onde passei a vice-presidente Comercial estatutário. Com a au-sência do Verdi, fui conduzido pelos acionistas à presidência da empresa, após 25 anos de Avi-bras. Em janeiro de 2014, com-pletarei trinta anos de Avibras.

Em 1987, a Avibras conquis-tou US$ 1 bilhão em vendas. Então, o seu trabalho contri-buiu para esse desempenho financeiro. Eu era parte do gru-po. Estava ainda na execução, e não na ponta das vendas. A Avi-bras exportou naquele ano US$ 350 milhões, US$ 1 bilhão em va-lores atuais, superando Volkswa-gen, Embraer, Petrobras e outras empresas brasileiras. Esse núme-ro, hoje, é relativamente grande. Naquela época, com as condições macroeconômicas brasileiras, era um número extraordinário.

O senhor conheceu o tem-po crítico de demandas. que comparação faz daquele pe-ríodo com o de hoje, consi-derando-se os desafios tec-nológicos? Hoje, o mundo está diferente de trinta anos atrás. Mesmo assim, a gente não pode negar o passado, tem que apren-der com ele. O aprendizado do passado é fundamental na atua-ção de hoje. O que vem do pas-sado é a busca do conhecimento integrado, a gestão do conheci-

Com a globalização, a empresa tem que interagir com o mundo sem se afastar das premissas fundamentais, única forma de ela se manter independente e competitiva.

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mento, e não apenas a gestão de programas. Gestão de programas é seguir regrinhas na execução de programas – melhores práti-cas. A gestão do conhecimento é você registrar tudo o que deu certo em procedimentos internos e continuar inovando. Lá atrás, a gente aprendeu que é essencial investir em tecnologia nacional com independência. Parece sim-ples, mas é difícil de ser cumpri-do. O que mudou no mundo? Hoje, você tem que ter parceiros, não dá para viver sozinho nem se dar ao luxo de verticalizar tudo. Com a globalização, a empresa tem que interagir com o mundo sem se afastar das premissas fun-damentais, única forma de ela se manter independente e com-petitiva. É preciso fazer escolhas certas para manter tecnologias críticas dentro de casa, evitando o falso conforto de subcontratá-las de empresas estrangeiras.

Recentemente, grupos inter-nacionais compraram peque-nas empresas brasileiras de base tecnológica, trouxeram suas para o Bra-sil e dominaram o mercado. A empresa adquirida acabou desaparecendo... É. Toda vez que uma empresa de base tec-nológica é comprada por empre-sa estrangeira com a declarada intenção de transferência de know how para o Brasil, se inicia, apesar de parecer contraditório, um ciclo terminal para a que foi adquirida. Nesse momento, a

empresa passa a receber capital e técnicas sofisticadas de produ-ção, deixando de inovar e gerar conhecimento no Brasil. Poderá ter sucesso comercial, porém, não terá mais conhecimento para andar sozinha e competir global-mente. É preciso cautela com es-sas opções de falso conforto.

O que causou a queda de de-sempenho da Avibras no pas-sado? Foi a mudança da polí-tica mundial ou foram razões brasileiras? O que causou as crises agudas da Avibras é simples de explicar. Vamos comparar com um exemplo atual. A indústria automotiva se desaqueceu, e o governo interveio para regular o setor e aumentar a demanda com redução de impostos. Quando há uma desregulação da economia em determinado setor, o gover-

no deve fazer uma intervenção positiva para ajudar o setor a caminhar. Na década de 1990, a Avibras enfrentou planos econô-micos que causaram dificuldades tremendas às nossas receitas de exportação. Depois, veio o fim da Guerra Fria. Uma quantidade tre-menda de material excedente foi despejada no mercado interna-cional a baixo custo, diminuindo a demanda por material novo du-rante vários anos. Não vou entrar em detalhes, mas tivemos con-junturas econômicas nacionais e internacionais muito adversas, e nenhum auxílio foi dado à in-dústria de defesa. Hoje, felizmen-te, o cenário poderá ser outro.

Nos EUA e na Europa, os go-vernos ajudaram suas indús-trias estratégicas e conduzi-ram o setor para a normalida-

O Sistema Astros na linha de produção

Disparo de foguete ar-terra

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de, mesmo com as demandas abaixo das praticadas em anos anteriores... Não há mi-lagres para conjunturas adversas. Os governos dos EUA e da Euro-pa sempre priorizaram a saúde financeira de suas empresas de defesa, uma vez que elas repre-sentam o que de melhor existe no país em inovação e desenvol-vimento tecnológico autônomo. Este setor pode iniciar um novo ciclo de desenvolvimento indus-trial no país após uma recessão.

A indiferença do governo bra-sileiro pelo setor de defesa é histórica. Isso ocasionou um enfraquecimento da indús-tria e das Forças Armadas que deixou a soberania nacional vulnerável... Este é um assunto em que não posso opinar. A área industrial está pronta a somar com o governo e pode ser uma grande alavanca para iniciarmos um novo ciclo industrial, baseado em inovação e conhecimento. So-fremos muito com o passado, po-rém, o Brasil vive outro cenário, completamente diferente.

O complicado cenário brasi-leiro obrigou as maiores em-presas do setor a hibernar. que solução a Avibras adotou enquanto esperava por tem-pos melhores? Quase todas as empresas do setor, infelizmente, foram levadas à falência, tendo desaparecido. Nós fizemos um pouco diferente. Crise aguda im-plica conduta de guerra. O que isso quer dizer? A empresa precisa reduzir custos, porém preservando as pessoas-chaves, sua tecnologia e suas plantas industriais. Dessa maneira, reduzindo o nível de fun-cionamento a um ponto suportá-

vel, sem perder a capacitação, a empresa poderá voltar ao merca-do quando a tempestade passar. Assim conseguimos cruzar as cri-ses e voltamos a inovar, produzir e vender. Nos últimos dez anos, a Avibras investiu forte em eletrô-nica digital, comando e controle, link por satélites, GPS, softwares, guiagem de vant e de mísseis. O portfólio ficou mais robusto, e as bases foram conservadas.

Na fase atual, qual evento deu à Avibras condições de retomar a produção? Foi uma combinação de dois eventos. Primeiro, os contratos de expor-tação, pois não se pode apenas fazer projeto e inovar. É preciso produzir. Uma empresa do tama-nho da Avibras precisa produzir. Quem vive de projeto é birô de design. O segundo evento en-volveu o governo e as Forças Armadas, que compraram novos desenvolvimentos e pequenos lotes para possibilitar o lança-mento de novos produtos. Quan-do esses dois eventos caminham juntos, temos a combinação de eficiência máxima e a garantia de perpetuidade da empresa.

O Brasil amadureceu no cam-po político – refiro-me especi-ficamente ao setor de defesa. Isso procede? Estamos no cami-nho certo. Não temos ainda uma rotina de trabalho estável, pois o país está criando os mecanismos legais para isso. Há um esforço na busca de soluções, que não se desenvolvem da noite para o dia. Mas não podemos tardar para resolver essas questões. O Bra-sil pensa grande. Porém, hoje, o mundo vê o Brasil como grande, e aí é preciso responder e desempe-

nhar à altura. O setor de defesa é peça importante nesta nova pos-tura internacional do Brasil e po-deria ser mais bem explorado. O setor está pronto para participar.

qual foi o faturamento da Avibras em 2012? Foi de R$ 200 milhões. Os contratos assinados formam uma carteira em torno de R$ 2 bilhões. Só isso nos garan-te dobrar o faturamento de 2012, independentemente do mais que possamos ter. Nosso planejamen-to é chegar a R$ 600 milhões de receita anual em poucos anos.

A Avibras é uma empresa re-conhecidamente estratégica? Tenho certeza de que o governo reconhece a Avibras como em-presa estratégica, com capacida-de de atuar numa mobilização nacional. A indústria é parte da capacidade de mobilização de um país, mas faltam os mecanis-mos formais de reconhecimento dessa condição. As Forças Arma-das e o Ministério da Defesa tra-balham para que o setor indus-trial receba mais apoio. A meta é transformar tudo isso num processo nacional, com os meca-nismos legais de apoio de que a indústria necessita, como acesso a crédito e continuidade de or-çamentos. Chegaremos lá. Para isso, estamos todos trabalhando junto com o governo.

Pode-se deduzir que o horizon-te é promissor para a indústria de defesa? Sem dúvida. Para a Avibras, em particular, vejo um futuro brilhante. A indústria pri-vada é como bicicleta; se você não pedalar, cai. Hoje, temos um am-biente melhor, porém, ainda te-mos muito trabalho pela frente.

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João Lins de Albuquerque

HÁ MAIS de um quarto de século, o Brasil vem mostrando interesse em assumir uma cadeira perma-nente no Conselho de Seguran-ça, órgão supremo da Organi-zação das Nações Unidas (ONU). Além das incansáveis gestões políticas diplomáticas e nessa di-reção, o governo brasileiro, com corajosa persistência, engajou de forma expressiva suas Forças Ar-madas na agenda da ONU. Obje-tivo: converter-se num membro-chave do programa de opera-ções de paz das Nações Unidas.Após participações desde 1948 até a década de 1980 – modestas, mas nem por isso inglórias –, o

Brasil pôde assumir com relativo sucesso, no início dos anos 1990, o comando militar das operações da ONU em Moçambique (Onu-moz) e Angola (Unavem). Em 1995, o Exército brasileiro enviou mais de 1.000 homens ao territó-

Operações de paz

Unifil: novas etapas da diplomacia solidária

rio angolano. Em seguida, entre 1999 e 2006, passou a coordenar as operações militares das missões Untaet / Umiset no Timor-Leste, cujo governo, via Administração Transitória Civil, esteve a cargo do brasileiro Sérgio Vieira de Mello, tragicamente morto em atentado no Iraque em de 2003.No Haiti desde 2004, o Brasil ampliou seu status de mero con-tribuinte de tropas e assumiu o comando do conjunto da Minus-tah, a Missão Militar Multinacio-nal da ONU para a estabilização do país caribenho, encabeçando um efetivo de mais de 6.800 mili-tares provenientes de 17 nações. No total, desde 1948, o Brasil, participou de aproximadamente 30 operações de paz das Nações Unidas, tendo contribuído com mais de 32 mil capacetes azuis em quase oito décadas. E essa históri-ca trajetória continua crescendo. Agora, no Líbano, o Brasil assume posição de grande destaque nos esforços internacionais pela pre-servação da paz e da segurança no Oriente Médio e, pela tercei-ra vez consecutiva, um almirante brasileiro assumiu, em 19 de feve-reiro de 2013, a Força-Tarefa Ma-rítima (FTM) da Força Interina das Nações Unidas no Líbano (Unifil), uma das mais importantes opera-ções da ONU no pós-Guerra Fria.A solenidade de transferência de cargo foi realizada no cais do porto de Beirute, ao lado da fra-

gata Constituição (F-42), a nova capitânia da Maritime Task-Force da Unifil. O contra-almirante Wagner Lopes de Moraes Zami-th, comandante da Operação Líbano II, que mobilizou a fra-gata Liberal, passou o comando ao contra-almirante José de An-drade Bandeira Leandro, que se emocionou ao assumir. “É um orgulho imenso poder contri-buir com nosso país, o Brasil, e ser um braço avançado de nosso poder naval no Líbano”, disse.

Caçando armas no marComparada com outras missões, a do Líbano é bastante especial e simbólica, porque, pela primeira vez na história, existe um com-ponente naval em uma Missão de Paz da ONU. O recurso foi solicitado pelas próprias autori-dades libanesas, visando evitar o abastecimento de rebeldes com armas transportadas por mar. E o Brasil, também pela primeira vez, ocupa a posição de coman-do, que vinha sendo exercida exclusivamente por países-mem-bros da Organização do Tratado do Atlântico Norte, a Otan. Este fato é marcante para a Marinha e seus integrantes, pois contribui de forma significativa para elevar o nome do Brasil no cenário dos esforços internacionais para a paz e a segurança no Oriente Médio.Criada pela Resolução 425 do Conselho de Segurança e adotada

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dos entre israelenses e membros do Hezbollah, organização pa-ramilitar islâmica com bastante força na política libanesa.A participação do Brasil nessa missão foi aprovada pela Câma-ra dos Deputados em dezembro de 2010. Em setembro de 2011, o Congresso Nacional autorizou a Marinha a enviar sua primeira força-tarefa, assegurando o ro-dízio dos navios de guerra bra-sileiros no litoral libanês. Em 17 de outubro de 2012, a Comissão Mista de Orçamento da Câmara dos Deputados aprovou R$ 93 milhões para a Arma continu-ar sua missão no Líbano. Desde 2012 – a pedido do Conselho de Segurança da ONU –, o Brasil

passou a comandar a Força-Ta-refa Marítima, que conta ainda com navios da Alemanha, Ban-gladesh, Grécia, Turquia e Indo-nésia. Já a operação completa reúne 35 países, mobiliza mais de 13 mil militares e policiais e cerca de 1.000 funcionários ci-vis, nacionais e internacionais.

Em clima de guerraDo lado brasileiro, participam da operação cerca de 250 mili-tares, entre oficiais, praças, fu-zileiros navais e mergulhadores de combate, além de médicos, enfermeiros e dentistas. Duran-te seu primeiro ano liderando a FTM, os brasileiros operaram a fragata União (F-45), equipada

em 19 de março de 1978, a Unifil foi estabelecida inicialmente para confirmar a retirada das forças israelenses do sul do Líbano, que havia sido invadido cinco dias an-tes, devolver a paz à região, man-ter a segurança internacional e, ainda, assistir o governo libanês na retomada de sua soberania e autoridade nacional. Ao ser cria-da, contava com 6 mil militares, tendo alcançado 7 mil em 1982.Em 2006, após a Segunda Guer-ra do Líbano, a missão teve seu mandato ampliado e foi reforça-da por novos contingentes. Além de impedir a entrada de armas ilegais na região, outra ação – que não tem participação brasi-leira – é evitar confrontos arma-

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com o helicóptero Super Lynx (AH-11) e a metralhadora FN Herstal M3M calibre, cumprindo 196 dias de patrulhamento no mar, 1.115 contatos interroga-dos, 939 inspeções navais solici-tadas pela Marinha do Líbano e 820 atividades aéreas reportadas.Tendo sido a capitânia da Opera-ção Líbano 1, a União estabeleceu o padrão em termos de equipa-mento e equipagem para as mis-sões seguintes. Assim, a fragata Liberal (F-43) assumiu a Opera-ção Líbano 2 em abril de 2012 e se despediu em 16 de janeiro de 2013. Atuou com 29 oficiais e 250 praças em quatro departamentos – armamento, operações, máqui-nas e intendência –, mais um gru-po de 9 militares do Destacamen-to de Mergulhadores de Comba-te, para prontidão em caso de conflito, e outro de 19 fuzileiros navais, designado para suporte à segurança da embarcação. Todos foram preparados psicologica-mente para enfrentar o ambiente de tensão, dada a real possibilida-de de envolvimento em combate. Por isso, a embarcação recebeu também aparato tecnológico de comunicação, explicou o capitão de fragata José Luiz Ferreira Ca-nela, comandante do navio antes do embarque. “Foi solicitado um

esquema de antenas via satélite para que a nossa tripulação tenha acesso à internet e possa conver-sar com sua família. Isso motiva o grupo e faz com que o trabalho fique menos estressante”.Durante sua permanência no Oriente Médio, a segunda fra-gata brasileira interceptou 661 navios para interrogação na área de operações marítimas, inspecio-nou 266 navios mercantes e rea-lizou 120 dias de patrulhamento, sendo 107 no comando das Ope-rações de Interdição Marítima, perfazendo 20.030 milhas náuti-cas no total. Na região de Naqou-ra, na costa sul do Líbano, sede da Unifil, os capacetes azuis brasilei-ros avaliaram 532 atividades aé-reas detectadas. Para substituir a Liberal, a Marinha destacou a fra-gata Constituição (F-42), que con-tinuará sendo o principal meio da esquadra internacional da Unifil, com retorno ao Rio de Janeiro previsto para agosto de 2013.Até lá, a Missão de Paz da ONU no Líbano, que nunca deixou de ser complexa, tende a ficar mais difícil. Com a escalada da crise Síria, as tensões contaminaram toda a região, tendo já registra-do mais de 70 mil mortes desde janeiro de 2012. Essa situação pode afetar a percepção do

Brasil e dos outros 34 países in-tegrantes da Unifil. De fato, já em julho do ano passado, o vice-almirante Luiz Henrique Caro-li, que foi comandante-geral da FTM na Operação Líbano 1, alertou para o risco de o Líbano “ser tragado pela guerra civil do país vizinho”, pois abriga muitos grupos pró-Assad, com destaque para os radicais do Hezbollah. Se acaso o Líbano entrasse em guerra, a situação geopolítica de toda a região afetaria seria-mente o trabalho da ONU.

Paz sob novo paradigmaAté 2005, cerca 110 países partici-pavam nas operações de paz das Nações Unidas, com mais de 70 mil homens. Nessa época, o Brasil ocupava a 14º lugar na lista dos contribuintes com tropas de paz.Na década de 1957-1967, a contribuição brasileira mais significativa foi o saudoso Ba-talhão do Suez, que se uniu a outros 6.300 integrantes da Infantaria Internacional envia-dos para o Sinai e para a Faixa de Gaza no âmbito da Força de Emergência das Nações Unidas (Unef 1), quando o presidente do Egito, Gamal Abdel Nasser, quase provocou uma guerra mundial ao nacionalizar o Ca-

Os contra-almirantes brasileiros, comandantes da FTM nas Operações Líbano 1, 2 e 3: Caroli e Zamith recebem homenagem da Unifil ao encerrar suas missões, enquanto Leandro dá início à sua

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nal do Suez, até então perten-cente à Grã-Bretanha.Desde aquela época, o Brasil já fazia a diferença: foi o único país sul-americano a manter sua contribuição até o final de toda a operação. Já nos anos 2000, a atuação brasileira nas missões de paz torna-se mais abrangente e robusta, adquirindo caráter mul-tifacetado. O quadro seguinte é marcado pela presença brasileira no comando de operações milita-res complexas, seguida de maior sofisticação na presença de suas tropas a serviço do Departamento de Operações de Paz das Nações Unidas (DPKO). O Brasil ampliou seu raio de ação, ganhando o res-peito do Conselho de Segurança e da comunidade internacional.Mas o que anima o Brasil a enca-rar todos esses desafios em áreas e condições tão difíceis? Segura-mente, não é apenas a conquista de uma cadeira permanente no Conselho de Segurança – da qual é merecedor –, mas um novo para-digma de solução de conflitos in-traestatais. A proposta é interven-cionista, com foco em desenvolvi-mento social e direitos humanos e passou a ser chamada de “diplo-

macia solidária”. Isso inclui, de um lado, cuidados com agricultura, saúde, educação e cultura da paz; e, de outro, produção de estrutu-ras inovadoras em áreas como a luta contra a fome e a exploração.O diplomata Celso Amorim, hoje ministro da Defesa, reconheceu há tempos a adesão do Brasil à Diplomacia Solidária ao declarar que o país se comprometeu de forma profunda com o Haiti, po-lítica e emocionalmente – e isso, disse ele, no longo prazo. De acor-do com os teóricos, a presença brasileira em Porto Príncipe tem todas as características do novo paradigma. O jurista Pedro Ferra-racio Charbel enumera: “o Brasil e os países envolvidos na Minustah (I) não possuem vínculos passados

de colonização ou intervenção no país e assumem (II) um compro-metimento a longo prazo para além de abordagens estritamente securitárias, o qual (III) não é ad-vindo de interesses materiais e/ou estratégicos, sendo (IV) pautado na solidariedade, (V) na legitimi-dade conferida pelas Nações Uni-das e (VI) em uma identidade la-tino-americana compartilhada”. Tudo indica que o Brasil “se en-tregou à paz” à luz de critérios que extrapolam os meros inte-resses do Estado. E isso – sem exageros – poderia ser aplica-do também ao desempenho e aos objetivos do Brasil na Mis-são de Paz do Líbano, país com o qual os brasileiros têm gran-de afinidade.

Um batalhão para construir e reconstruir infraestrutura no Haiti:

gestos da Diplomacia Solidária

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Historicamente, o Brasil sempre se mostrou dependente do mercado internacional para atender às demandas de suas Forças Armadas. Acomodado anos a fio sobre um mesmo modelo político, o país enfrentou resistências internas quando, recente-mente, mudou seu pensamento estratégico. O Ministério da Defesa, por exemplo, criado em 1999, levou anos para se consolidar na estrutura do Estado. Ainda hoje está se montando paulatinamente. Contudo, a defesa nacional já é observada com outros olhos no Brasil. A indústria de defesa brasileira, enfim, integrou-se ao pro-cesso de transformação do país nesse campo, resultado de um movimento conjunto desenvolvido por entidades representativas da sociedade.

Ainda falta muito para ser completada a tarefa de prover o país de uma indústria de defesa moderna, eficiente e autônoma, mas o importante é que tal processo está se desenvolvendo e afastando cada vez mais o perigo de o Brasil estar com sua soberania em situação vulnerável. O Comdefesa, Departamento da Indústria de Defesa da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), contribuiu ativamente para essa evolução. Criado em 2007 no seio da Fiesp, o órgão é composto por um colegiado de 50 diretores, empresários ativos no ramo, e coordenado pelo diretor-titular, o presidente do Grupo Inbra, Jairo Cândido. Ao lado de outras instituições do país, concebe propostas de reorganização do setor e as encaminha ao governo no modo sugestão. No último 28 de fevereiro, DEFESA LATINA procurou o empre-sário Jairo Cândido para discutir o panorama setorial, e ele concedeu esta entre-vista a Cosme Degenar Drumond.

O panorama agora é outro

indústria de defesa

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Jairo Cândido:

“É a indústria que transforma conhecimento em economia,

emprego e dinheiro”

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Até 2006, não havia comitê da indústria de defesa na estrutura da Fiesp. que mo-tivação levou à criação do Comdefesa? Muito obrigado pela oportunidade de conversar com você e com sua grande rede de leitores. Há sete anos, o se-tor de defesa tinha chegado ao ponto menor de sua representa-ção e importância econômica no Brasil. Então, começamos a fazer um trabalho de valorização das Forças Armadas e de reconstru-ção do segmento de defesa. Nas Forças Armadas está a perspecti-va da segurança nacional. A re-lação do Brasil com o mundo, no Atlântico Sul, na América Latina, África, na inserção com os Brics como sexta economia do mun-do, sua estrutura de poder de dissuasão, o comando das forças de paz do Haiti, tudo isso repre-senta a relevância que o país conquistou no cenário interna-cional. As Forças Armadas passa-ram a se estruturar de maneira mais visível para os brasileiros. Elas operam também em ativi-dades civis, em obras públicas, no atendimento social às po-pulações carentes e isoladas do país, nas calamidades. Esse tipo de atuação, se comparado com o de seis anos atrás, avançou mais. Hoje, no Brasil, o quadro é dife-rente. A verdade é que as For-ças Armadas sempre receberam avaliações altas e significativas da sociedade; são a segunda ins-tituição mais bem avaliada pelos brasileiros. Portanto, estávamos certos na Fiesp quando entende-mos que esse pilar precisava ser reforçado. Por outro lado, a so-berania nacional é exercida com conhecimento, suporte tecnoló-

gico e equipamentos produzi-dos no país. Dentro dessa lógica, a indústria de defesa haveria de crescer. Chegou-se então à máxi-ma: “O Brasil não compra mais; está aberto à transferência de tecnologia”. É apenas uma má-xima, mas é algo que desejamos.

O que falta para concretizar esse ideal? Falta criar todo o arcabouço de legislação e de organização do setor, inclusive no campo empresarial. O Brasil começou a fazer ações nessa área e foram iniciados alguns movimentos econômicos, como o Prosub e o HXBR, de helicóp-teros. Outros movimentos estão acontecendo. Isso foi suficiente para despertar um segmento que era formado por pequenas empresas e atraiu também o interesse dos grandes grupos. Esse interesse ainda não está organizado. Em nossa visão, precisa ser vocacionado.

Como é essa vocação? O setor industrial precisa se vo-cacionar para o que vai real-mente produzir. Defesa não é uma estrutura que possa virar análise de franchising, que em qualquer lugar trata do mesmo assunto. Não é assim. O poderio econômico não está atrelado ao poderio de conhecimento, e nem tudo que é conhecimento se compra. É preciso trabalhar com a capacidade instalada do Brasil e fazer as coisas se desen-volverem. Existe um período de ajustes entre as empresas mais capitalizadas ou maiores e a grande massa do conhecimento que está depositada nas peque-nas e médias empresas. Talvez

seja este, hoje, o grande tra-balho, o grande momento que estamos vivendo.

Certamente ocorrem pro-blemas... Com determinadas consequências. Por exemplo: os grandes programas obriga-toriamente devem incluir con-trapartidas de offset e trans-ferência de tecnologias. É uma imposição legal, não é vontade apenas. Às vezes, o negócio passa ao largo disso. Pergunta-mos o por quê, e algumas au-toridades se aborrecem. Mas o assunto tem que ser tratado, porque é lei. Compras acima de R$ 5 milhões têm que ter offset e alguém precisa explicar como a contrapartida está sendo fei-ta. A lei precisa ser cumprida.

De que maneira? De maneira lógica. Mas esse tecido tem que ser organizado. No submarino, no Prosub, há a lógica do offset, que nem agrada nem desagrada a indústria. Quando o contrato foi negociado, aquela era a ló-gica do momento. A indústria reclama por não ter sido chama-da no momento da negociação para dizer o que queria como transferência de tecnologia. Nesses casos, o que interessa ao Brasil não é de interesse apenas do governo; mas também da in-dústria. Por quê? Porque é a in-dústria que vai operar o conhe-cimento e fazer dele economia, emprego e dinheiro.

É o que está acontecendo? Muito diferente ocorreu no HXBR, o programa dos helicóp-teros para as Forças Armadas. Os 22 processos de transferên-

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cia de tecnologia estão atraindo investimentos e, consequente-mente, dando empregos, crian-do negócios e conhecimentos no Brasil. Não é que o Prosub não esteja dando contribuições. Mas trata-se de uma estrutura bem mais difícil de ser levada avante, de ser conduzida.

A indústria então ocupa posição fundamental nes-ses processos? Toda vez que o Brasil quer comprar, que vai em busca de algo, a indústria mostra uma posição muito cla-ra: qual é o nosso papel nesse programa? Assim é a nossa ex-pectativa com o F-X e com os novos programas. Por exemplo,

o programa Proteger, que está para acontecer agora em 15 de março, e o Sisfron, que já fez o projeto-piloto, contemplam atividades nacionais. Existe a tentativa de arrasto tecnoló-gico. Porém, não conseguimos entender a lógica do desen-volvimento industrial no Bra-sil. Nas áreas em que estamos prontos, o Brasil ainda compra fora. Então, há um desbalance-amento na lógica. Está faltando uma câmara, um comitê de alta sensibilidade e de altos interes-ses nacionais do Brasil, entre a indústria, as Forças Armadas e os ministérios científicos – o Mi-nistério da Defesa, o Ministério de Desenvolvimento, Indústria

e Comércio, o Ministério da Ci-ência e Tecnologia, nessa linha. Não uma comissão para ficar criando embargos, problemas, mas para discutir substantiva-mente como é que o processo deve ser feito.

Como obter essas facilida-des tão importantes? Pelo exercício do trabalho. Andamos muito e logramos pontos extre-mamente importantes. A lei nº 12.598/2012 criou a indústria de defesa, o produto estratégico e toda uma disciplina, como a participação do capital estran-geiro no Brasil. Deu autonomia às Forças Armadas para escolher a indústria brasileira e com ela

A indústria quer uma lógica orçamentária.

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O F-5 da Northrop virou F-5BR: história do caça Tiger II na FAB começou em 1975 com reconstrução totalmente projetada e executada no Brasil

FAB

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Beng

t Nym

an

trabalhar o desenvolvimento dos produtos de interesse nacio-nal. Isso é um avanço de séculos. Estamos com o regulamento da lei na Casa Civil, pronto para ser assinado pela presidente da República. Esperamos que o Se-nado vote a Retid, o Regime Es-pecial Tributário para a Indústria de Defesa, que é a repercussão econômica da lei. Então, avança-mos bastante. A reorganização da Emenda 93, do Ministério da Defesa, um ministério novo, que tinha pouca estrutura de meios, de efetivos, de quantidade, de trabalho... Esperamos que se possa organizar o Ministério, porque nele está depositada a guarda da soberania nacional. Com a lei, estará muito mais na mão do Ministério da Defe-sa a outorga da capacidade da indústria nacional e a maneira como o assunto deve seguir e acontecer no país.

Vive-se uma fase de ajus-tes? Mas é uma fase tão boa, excepcional, como não se via há anos! Porque, se temos que ajustar, é sinal de que as coisas estão acontecendo. Eu reputo tudo isso como um trabalho importante da Federação das Indústrias, um trabalho forte do Comdefesa e da diretoria da Fiesp. Hoje, temos outras fede-rações, a Firjan, Fiemg, Fiergs, envolvidas nesse assunto que está dando frutos. Uma série de atividades está caminhando. O momento é propício. No pas-sado, a indústria disputava um mercado que praticamente não

existia. Agora, ela precisa se or-ganizar, somar, pois o mercado de defesa é pouco competitivo e complementar. Por isso, as empresas têm que passar por certa organização.

Fortes grupos empresariais de outras áreas estão inte-ressados no mercado de de-fesa, atraídos pelas novas demandas das Forças Arma-das. Como o senhor vê essa situação? A falta de trabalho nos vários segmentos, nas ou-tras indústrias, resulta em certa competição desorganizada. Se-tores absolutamente definidos numa área de atuação acabam tendo apetite para trabalhar em setores que não são sua área específica. Isso é ruim, é bom? Acho que é falta de ple-na utilização da capacidade da indústria de defesa. Na hora em que tudo estiver carregado, es-tiver trabalhando, não haverá sobra de tempo para incursões e procuras fora do foco princi-pal. Esta é a lógica com que tra-balhamos institucionalmente dentro da defesa.

O setor de defesa cresceu? Cresceu absurdamente. Vou dar um exemplo de cabeça: no orça-mento do ano passado, a verba do Exército era de cerca de R$ 800 milhões. Durante o exercí-cio e dentro dos programas e desenvolvimentos, executou R$ 2,4 bilhões. Isso é maravilhoso. Investiu-se três vezes mais do que o previsto. Mas como aconteceu? O que não faz parte do progra-

ma original chega como progra-ma adicional e nem sempre é pautado ou discutido previamen-te. O que isso quer dizer? Que o parque fabril de caminhões ven-deu lotes de caminhões que não estavam previstos originalmente no orçamento. Isso é bom, por-que resultou em desenvolvimen-to no país, movimentou toda a estrutura de carrocerias, meios, as indústrias de transformação. Entretanto, não era um progra-ma previsto, e as empresas não estavam preparadas para aten-der. Clamamos por organização. Por que um programa voltado a determinada atividade não es-tava no orçamento? A indústria quer uma lógica orçamentária. Que venha o desenvolvimento nas três Forças. Mas, naturalmen-te, tudo deve ser mensurado e conhecido para que a indústria possa ter maior preparo. De um dia para o outro, não temos con-dição de estar preparados. Só po-demos nos preparar se tivermos prévio conhecimento para nos organizar. É preciso compensar os desequilíbrios. É maravilhoso que tenha sido investido o triplo do orçamento previsto. Mas não pudemos conhecer os programas antes da execução. Talvez uma parte pequena do segmento tenha tido conhecimento. Isso mostra falta de discussão ampla.

qual a sua expectativa em relação à regulamentação da lei, que está para ser assina-da? Acho que essa lei vai auto-rizar o Ministério da Defesa, por exemplo, a criar mecanismos.

Que venha o desenvolvimento nas três Forças.

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Hoje, temos uma estrutura de produtos controlados com lógi-ca, certa organização e informa-ção de como se pode fazer, de como as coisas devem acontecer. Agora, se tem o produto de de-fesa. Mas quem vai dizer o que é produto de defesa? A lei diz de maneira genérica. Mas alguém terá de dizer o que é efetiva-mente um produto de defesa, porque, na hora em que isso for dito, será preciso haver uma regra para comprar, para fazer, para produzir, para o produto existir dentro do território na-cional e ser mobilizável. Terá que haver regra de aplicação. O pro-duto de defesa pode ser aplicado inclusive no meio civil, não é só privativo das Forças Armadas...

Ainda não há definição do que é produto de defesa? O produto de defesa é muito cla-ro. Por si só, traz a amarração definida no nível estratégico. Mas terá de ser nominado, ter determinada regra, inclusive de conduta. E haverá de ser tratado dentro das empresas de maneira diferenciada, com compromisso de fornecimento constante, para que amanhã não deixe de estar na pratelei-ra ou de existir. Para que não aconteça como no fardamen-to, que aparece da China, da Índia, de tudo quanto é lugar. A empresa precisa se organizar. Na hora em que surge a grande compra, o Brasil precisa parar de comprar de representante e começar a privilegiar sua in-dústria. A indústria de trans-

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O Comdefesa é um fórum de alto nível com função institucional. Mensalmente, realiza uma sessão plenária na capital paulista para analisar e discutir temas na sua área, que é da maior relevância para o país. As sugestões que emergem das suas sessões visam agregar importância à indústria de defesa e ao próprio órgão, pois se ajustam perfeitamente ao ideal de reorganização e rees-truturação da defesa nacional.

Mas muita água ainda vai passar por baixo dessa ponte. O mais im-portante é que a moldura está ganhando forma e as ações continu-am. No momento, por exemplo, o Comdefesa trabalha em conjunto com a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), no pre-paro da proposta de um Fundo Garantidor de Transferência de Tec-nologia, iniciativa de apoio à indústria já existente em muitos países.

Segundo Maura Curci, gerente do Comdefesa, em projetos de en-vergadura, a indústria corre o risco de não ver o objetivo se conso-lidar, por falta de recursos para a fase final, de desenvolvimento, produção pré-série ou capacitação de pessoal. Isso diz respeito à maioria das integrantes do setor, pois o processo é caro e a em-presa precisa pagar royalties ao parceiro estrangeiro. A ideia do fundo em questão é viabilizar a conclusão do processo. A ABDI e

o Comdefesa pretendem sugerir ao governo a criação do fundo garantidor, justificando: “A nossa indústria precisa inovar e conquistar mais altos patamares tecnológicos. A medi-da dará à indústria um grande impulso”. E o assunto já ganhou o apoio da indústria, que entende a necessidade de contar com um ins-trumento desse porte em atividades de pes-quisa, desenvolvimento e inovação.

Outro tema da pauta do Comdefesa é o orça-mento público. O departamento está pesqui-sando para embasar uma análise a esse res-peito. Pretende propor ao governo investir

mais no segmento de defesa. Os orçamentos das Forças Armadas estão mais concentrados em custeio da máquina administrativa. “Sabemos que os recursos orçamentários são escassos, mas espera-mos obter resultados de médio prazo em benefício da indústria de defesa”, diz Maura Curci.

Financiar a transferência de tecnologias

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formação no Brasil sofre ter-rivelmente a concorrência do produto externo representado, que chega em contêineres. A campanha em favor do produ-to de defesa nacional precisará ser incessante para que o Brasil compre de suas fábricas.

Como dirigente do Comdefe-sa, como o senhor vê o cami-nhar dessas medidas? Tudo é muito difícil, mas terá de se impor. Se alguém me perguntar se alguma autoridade no Brasil tem vontade diferente dos an-seios da indústria brasileira, eu respondo que não. Mas o fazer acontecer é realmente difícil. Há os interesses econômicos, os custos, as formas, as produtivi-dades, o preparo da indústria nacional, enfim, todo esse arca-bouço e o acreditar nesse forne-cimento todos os anos. A gente tem histórico de problemas pas-sados. Graças a Deus, isto está se reduzindo. De quinze anos para cá, os governos estão tomando um caminho mais correto e as coisas estão melhorando. Mas, se alguém me perguntar se exis-te uma autoridade que encam-pe o assunto, eu digo que não há ninguém. Se a indústria não encabeçar, como encabeçou em tantas outras tarefas, nada acontece. Não é fácil.

A indústria brasileira tem de se organizar, certamente... A partir das federações. Temos que colocá-la como player nes-ses fornecimentos e não admitir outro. A lei autoriza isso. Basta

o Ministério da Defesa se orga-nizar e criar o arcabouço legal. E não venham dizer que isso é reserva de mercado, porque não é. Todas as nações do mun-do fazem assim. Precisamos nos suprir de meios, não só meios de guerra, técnicos, científicos, de alto conteúdo tecnológico, mas de todos, através da indús-tria brasileira, que tem efetiva-mente de ser chamada. Isso está na lei, de maneira inteligente, uma lei na qual começamos a trabalhar há seis anos. Altos ofi-ciais dos mais altos postos das três Armas trabalharam conos-co no embrião dessas leis. Ofi-ciais brilhantes, que inclusive já deixaram as Forças, mas con-

Chegou a hora. O princípio, o arcabouço está aí.

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tinuam trabalhando conosco. Portanto, eu entendo que esta-mos numa linha de propositura que precisamos continuar se-guindo. A lei saiu. Agora, o ato do ministro da Defesa vai com-plementar tudo. Da mesma for-ma que o ministro da Fazenda baixa portarias, resoluções, um monte de medidas, o Ministério da Defesa, com base nessa lei, também deverá baixar uma sé-rie de instruções e regulamen-tos. Chegou a hora. O princípio, o arcabouço está aí. Depende da competência da indústria e do governo fazer acontecer.E as compras de oportunida-de, como o senhor vê essa questão? Isso é muito ruim. Em-

Diferentes peles do F-5BR, um exemplo de offset bem-sucedido

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bora o Brasil tenha feito negócios que a gente pode até reconhecer como eco nomicamente bons, do ponto de vista da indústria, eles não deixaram e não deixam nada em tecnologia, mão de obra, oportunidades de negócios, ven-das, mercado, conhecimentos. Esse tipo de negócio suga o nos-so dinheiro e o leva lá para fora. Por melhor que seja a compra, do ponto de vista da indústria, ela deixa sempre um gosto amargo na boca. A compra via FMS [Foreign Military Sales] ainda temos que entender. Mas de que adianta a aeronave ser ótima se não podemos apertar um parafuso dela? Isso vai continu-ar? Por melhor que seja o produto, é preciso an-tes discutir o negócio.

Nesse caso, os pro-dutos são pura cai-xa-preta. Isso tem que ser revisto, preci-sa ser analisado.

Como o senhor dis-se, o governo está sensível ao setor. É possível estabele-cer um prazo para colher re-sultados concretos? Nós, que estamos ligados ao setor há mui-tos anos, sempre ouvimos falar que as Forças tinham planos de longo prazo, mas nunca vimos os planos. Hoje, os planos es-tão aí, de curto, médio e longo prazo. Se são ousados ou não... a gente pelo menos conhece. Por exemplo: o Mirage vai pa-

rar de voar neste ano. O F-5 foi retrofitado e voa mais algum tempo; cobre aquela área cen-tral crítica. A solução do fighter tem que acontecer ou o Brasil não terá condição de defender o espaço aéreo. O programa foi discutido e colocado para a so-ciedade. Quanto às perspectivas, elas são boas. O Brasil está num tamanho organizado. Vemos o interesse do mercado mundial pelo Brasil. Mas não é só pelo

atrativo do mercado brasileiro; é também pela pouca demanda no mercado de origem deles. De qualquer maneira, onde exis-tem oportunidades de negócios hoje? No Brasil. É preciso que as oportunidades sejam contem-pladas pela indústria brasileira. É aquela máxima. Se for feito através de empresa brasileira, tudo bem. Eu recebo muitos profissionais que ainda não acre-ditam que a regra será imposta.

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Para encerrar, o senhor po-deria falar sobre a parte do talento humano? O Brasil é uma terra de talentos, de ho-mens e mulheres extremamen-te competentes, de autodida-tas, uma terra realmente muito diferenciada. Talvez não tenha-mos gente pronta, mas apron-tar essas pessoas é fácil. A for-mação acelerada de engenhei-ros, a troca de conhecimentos entre o Brasil e os países mais

avançados, a opor-tunidade e a facilita-ção para que a gente contrate mão de obra com conhecimento externo, que estava ociosa, tudo isso é absolutamente possí-vel. O maior exemplo do talento brasileiro é a Embraer. Muitos estrangeiros traba-lharam nos primeiros grandes programas de desenvolvimento da companhia.

A Marinha, com a construção naval,

também trouxe profissio-nais do exterior... Nessa mes-ma análise, podemos incluir a estrutura do nosso reator nu-clear. Os talentos estão na físi-ca, química, matemática, enfim, na engenharia de maneira ge-ral. Temos talentos médicos em todas as áreas, talentos no jor-nalismo, empresários altamen-te talentosos e capazes. Isso é uma grande verdade. O Brasil é uma terra de oportunidades.

Se for através de empresa brasileira, tudo bem.

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HISTÓRIAaeronáutica

“O sábio é notado sem se exibir; renuncia a si mesmo e nunca é esquecido”, disse Lao-Tse. O tenente-brigadeiro Aprígio Eduardo de Moura Azevedo é um desses. Ele pas-sou 46 anos na Força Aérea. Aviador militar, voou mais de 6 mil horas, cerca de um terço delas como piloto de caça. Foi instrutor de voo, oficial de Estado-Maior, presi-dente da Comissão Coordenadora do Programa Aeronave de Combate e da Comissão Aeronáutica Brasileira nos Es-tados Unidos, chefiou o IV Comando Aéreo Regional e o gabinete do Comandante da Aeronáutica. Como oficial de quatro estrelas, esteve à frente da Secretaria de Finanças e do Estado-Maior da Aeronáutica, onde completou seu tempo de serviço.Sua despedida ocorre entre homenagens de amigos e companheiros da caserna e do meio civil, pois o brigadei-ro Azevedo é dessas pessoas inesquecíveis. Casa cultura admirável com modos de fidalgo, tendo a modéstia en-tranhada na personalidade. No dia 4 de março, foi home-nageado em almoço na Federação das Indústrias do Esta-do de São Paulo (Fiesp). Entusiasta da indústria brasileira, disse na ocasião que, na última década, a Arma contratou R$ 9,5 bilhões somente em investimentos. Sobre o Plano Estratégico Militar da Aeronáutica 2010-2031, assinalou que os focos são “a pesquisa e o desenvolvimento cien-tífico e tecnológico, a fim de tornar a indústria de defesa cada vez mais moderna e atualizada”.Dias antes, ele concedera entrevista a DEFESA LATINA, cuja equipe lhe dá os parabéns pela brilhante carreira mi-litar, augurando-lhe felicidades na nova etapa.

A voz e a visão da experiênciaAo despedir-se da Força Aérea, o brigadeiro Azevedo realiza uma análise da Arma em tempos de transformação

O que o motivou a ingressar na Força Aérea? A vontade de voar. Aqueles que, como eu, ti-veram o privilégio de viver em Natal (RN), admirando o ir e vir das aeronaves sediadas na Base Aérea, o Trampolim da Vitória de tantas tradições, receberam forte influência para o despertar da vocação aeronáutica. Assim foi no meu tempo de adolescen-te, enquanto cursava a quarta série ginasial no Colégio Maris-ta. Pelas janelas da sala de aula, via encantado o voo dos impo-nentes B-26 Intruder rumando para as áreas de instrução. Tam-bém recebi decisivo incentivo da família, que me levou a prestar concurso para a Escola Prepa-ratória de Cadetes do Ar, onde ingressei na turma de 1967. Éra-mos 412 pré-cadetes, oriundos de todos os cantos do Brasil, sob o comando do inesquecível brigadeiro João Camarão Telles Ribeiro. A Escola de Barbacena (MG) sempre foi e continuará sendo um dos melhores centros de ensino do país. Ali, apren-demos muito, de Aristóteles a Kant, de Sun Tzu a Clausewitz. Crescemos como seres humanos, conhecemos a caserna e juramos compromisso ao Brasil, se preci-so, “com sacrifício da própria vida”. Agradeço todos os dias à Força Aérea Brasileira por ter-me acolhido, quase menino de calças curtas, proporcionando-me ampliação dos horizontes, conformando minha postura em sólidos princípios éticos e valores morais, burilando as lições de vida que trazia de casa, forjando o militar devotado ao serviço.

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Como era a Força Aérea no seu tempo de jovem tenen-te? Vibrante, assim como é hoje! O final da década de 60 e os anos 70 representaram, para o Minis-tério da Aeronáutica de então, momentos de profundas trans-formações na esfera administra-tiva, fruto do Decreto-Lei 200/67, que agregava importantes evo-luções à burocracia do Estado, com os naturais reflexos na ins-tituição. Assim ocorria também nas demais áreas de atividades, como Pesquisa e Desenvolvimen-to – basta lembrar o primeiro voo da aeronave Bandeirante, no Centro Técnico Aeroespacial (CTA), em 1968, que desaguou na criação da Embraer, em 1969, representando o início do pro-cesso de consolidação da base industrial aeronáutica no país. Do mesmo modo, configurou-se grande avanço no campo opera-cional, em face da incorporação de equipamentos modernos, dentre outros, os C-130 Hércules, os C-115 Buffalo, os HS 748 Avro, aprimorando os meios de trans-porte logístico; os T-37, jatos bi-motores usados na instrução dos cadetes. No âmbito da aviação de caça, chegaram três impor-tantes vetores. Os AT-26 Xavante, primeiros jatos de combate fabri-cados pela Embraer sob licença da italiana Aermacchi (MB-326) para treinamento avançado, ser-vindo de transição para os france-ses Mirage III, que vinham conso-lidar a doutrina de Defesa Aérea, tarefa dos “Dijon Boys”, que re-alizaram um magnífico trabalho, complementando, com o “braço armado”, a estrutura inicial do

Sistema (Integrado) de Defesa Aérea e Controle do Tráfego Aé-reo, solução genuinamente bra-sileira, que naqueles anos dava os primeiros passos. Chegaram ainda os F-5 Tiger, revigorando o espírito dos combatentes – espe-cialmente do Primeiro Grupo da Aviação de Caça e do Esquadrão Pampa –, tão bem inoculado em nossas veias pelos queridos ve-teranos do “Senta a Pua”, que deixaram marcas indeléveis de coragem, audácia e bravura nos céus da Itália na Segunda Guerra Mundial. Vale recordar ainda as aeronaves P-16, do Primeiro Gru-

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Brigadeiro Aprígio Eduardo de Moura Azevedo: “Não faz guerra quem depende do outro, mas sim quem domina a novidade”

po de Aviação Embarcada, para emprego no recém-adquirido porta-aviões Minas Gerais. Reno-vava-se, desse modo, o poder de combate da Força Aérea.

Além dos novos meios, o que havia? Nas outras esferas de competência, desenvolviam-se intensos trabalhos: as escolas de formação e pós-formação pro-moviam a discussão acadêmica de temas doutrinários, que re-sultaram na evolução das ativi-dades de preparo para emprego eficaz e efetivo da Força quando necessário. A indústria aeronáu-

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tica passou a receber incentivos importantes. Além da criação da Embraer, o Programa AM-X, que, ao estabelecer os mecanismos do Programa Industrial Comple-mentar (PIC), buscava fortalecer e consolidar o parque industrial de defesa, hoje claramente definido como prioridade na Estratégia Nacional de Defesa. Eis alguns motivos por que rotulo aquele tempo como vibrante. Cabe um preito de gratidão aos líderes e comandantes de cuja maestria redundou obra de tal magnitude.

Como avalia a instituição em termos de desenvolvimento material? Com o mesmo espí-rito de entusiasmo. Este é mais um momento de transformação. Olhando pelo prisma do desen-volvimento material, verifica-se a absorção de novas tecnologias, embaladas no coração e nas asas dos equipamentos recentemente incorporados ao acervo da Força. Basta examinar alguns destes: o A-29 Super Tucano, que prote-ge nossas fronteiras da Região Amazônica e do Centro-Oeste.

Certamente, seu impecável de-sempenho em operações de com-bate real foi fundamental para a recente decisão do Departamen-to de Defesa dos Estados Unidos, que depositou na Embraer uma ordem inicial de compra de 20 aeronaves para emprego na zona conflagrada do Afeganistão. Houve a aquisição dos helicópte-ros EC-725, da Helibras/Eurocop-ter, que consolida a capacidade de fabricação de aeronaves de asas rotativas no Brasil. E temos os AH-2 Sabre, concebidos para emprego em missões de ataque e já em operação na Base Aérea de Porto Velho (RO); e os H-60 Black Hawk, que fortalecem as unidades de busca, salvamento e resgate. No campo da aviação de transporte, os C-105 Amazonas, ao render os C-115 Buffalo, rece-beram a incumbência de continu-ar prestando suporte aos Pelotões de Fronteira do Exército Brasileiro e transportando esperança e le-nitivo para as populações menos assistidas, especialmente aquelas dos longínquos rincões amazôni-cos. Agrego a este cenário o enor-me desafio do desenvolvimento da nova aeronave de transporte e reabastecimento em voo, o KC-390, a ser produzido pela Embra-er. Não menos importante são os trabalhos de modernização das aeronaves F-5M Tiger, A-1M e P-3 Orion, que vêm revigorar a capa-cidade de emprego e de pronta-resposta da Força Aérea Brasileira.

E quanto à operacionali-dade? Deixamos para trás os saudosos tempos dos cachecóis esvoaçantes e dos ponteiros e

relógios, que emolduraram com glamour a história da aviação. Adentramos o vertiginoso mun-do digital, dos armamentos inte-ligentes, como as bombas guia-das, os mísseis BVR, os de auto-defesa de quinta geração, os an-tirradiação, entre outros, sinali-zando que estamos mantendo posição “na ala do século XXI”. Já quanto à operacionalidade, a qualificação neste atributo é incontestável, verificando-se a atuação competente e segura da Força, tanto nos exercícios internacionais, em destaque a Cruzex, quanto em operações internas e conjuntas, como as Ágatas, estas, com uso de aero-naves remotamente pilotadas (ARP), cuja doutrina operacional foi plenamente absorvida pela unidade aérea de emprego. Tais ações têm fortalecido o contro-le das fronteiras na luta contra o crime transnacional, o flagelo das drogas, o contrabando de ar-mas. Desses eventos, extrai-se a convicção de que a operacionali-dade da Força Aérea alcança ní-veis de excelência, sendo garan-tia, nos céus, para a defesa dos interesses do Estado brasileiro.

O senhor falou em “transpor-tar esperança e lenitivo”... Sim. O tema das contribuições sociais faz parte do DNA da Força Aérea, porquanto, desde os pri-mórdios, destaca-se sua intensa participação nas ações voltadas à integração do país, consubstan-ciadas nas atividades do Correio Aéreo Nacional (CAN), que é mo-tivo de apreço e admiração do povo brasileiro. Noutra via, me-

O brigadeiro Azevedo em cerimônia na Academia da Força Aérea de Pirassununga no início do ano letivo de 2013

AFA

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rece registro a atuação da Força em situações de calamidades, de-sastres naturais ou emergências dentro e fora do país, a exemplo dos terremotos no Haiti e no Chi-le, das enchentes e secas na Ama-zônia e da recente tragédia em Santa Maria. Neste último caso, a FAB se fez presente incondi-cionalmente, integrando verda-deira corrente de solidariedade e ajuda humanitária, intentando amenizar o sofrimento das pesso-as e famílias atingidas pelo infor-túnio. Nesse mesmo sentido, vale enfatizar o trabalho de apoio às comunidades indígenas e ribei-rinhas que vivem em locais de difícil acesso, principalmente na Região Amazônica, levando em suas asas medicamentos, alimen-tos, socorro médico e, sobretudo, dignidade, que se materializa na presença do Estado. A propósito, penso ser oportuno render uma homenagem aos homens e mu-lheres integrantes da Comissão de Aeroportos da Amazônia (Co-mara), organização do Comando da Aeronáutica responsável, des-de 1956, pelos serviços de enge-nharia e construção de mais de uma centena de pistas de pouso naquela região, enfrentando im-pensáveis desafios.

quais as suas expectativas quanto ao futuro da Força Aérea? As melhores possíveis. Certamente, deparando com desafios, como é natural em to-das as atividades, mas sempre colhendo conquistas, fruto do incessante trabalho dos que en-vergam o azul, sob a respeitada e serena liderança do coman-

dante, o tenente-brigadeiro Ju-niti Saito. Penso ser esta uma vi-são fácil de verificar, dada a con-sistência dos Planos Estratégicos, abrangendo um período de vin-te anos à frente e apontando rumos seguros para o futuro. Nesse contexto, constata-se um conjunto de ações no campo operacional – a sequência do reaparelhamento, as aquisições e modernizações dos sistemas d’armas (aeronaves e artefatos bélicos), em especial o Projeto FX-2, que trará o almejado e imprescindível aprimoramento tecnológico e de combate para a aviação de caça. No setor lo-gístico, há a racionalização dos processos de provisão e de con-tratação dos meios de suporte, estudando-se as possibilidades das parcerias público-privadas, privilegiando-se a economia de recursos e a reorganização da estrutura administrativa. No campo de pesquisa e desenvol-vimento, estamos focando ener-gia nos projetos estratégicos espaciais, em especial olhando a família de foguetes lançadores de cargas úteis, como os satéli-tes geoestacionários e de órbi-ta baixa. Ressalte-se que essa competência já foi adquirida e materializada nos lançamentos dos VSB-30 em parceria com entidades da Alemanha, Sué-cia e Noruega. Sem esquecer o campo da defesa e do controle do tráfego aéreo, cada vez mais integrados e fortes, em franca preparação para os eventos da Copa das Confederações 2013, da Copa do Mundo 2014 e da Olimpíada 2016. A relevância

quando 1º tenente a bordo de um jato AT-26 Xavante

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da área do pessoal se reflete na constante evolução de ações de apoio a homens e mulheres, militares e civis que dão vida à instituição. A área de economia e finanças assegura eficácia e confiabilidade aos atos e fatos administrativos concernentes à execução orçamentária. E temos no campo do ensino a menina dos olhos da instituição, como de todas as instituições que pre-zam seu bem mais precioso, as pessoas. São elas o instrumento vital à perpetuidade da Força Aérea, seus valores e princípios de conduta. Nessa área, continu-am a evoluir os conteúdos pro-gramáticos, em sincronia com os avanços do conhecimento e das tecnologias. Daí nossa tradicio-nal Escola de Engenharia, o ITA, estar ampliando sua capacidade de absorção de estudantes, ob-jetivando dobrar o contingente atual no horizonte de três anos.Considero essas razões bastantes para embasar minha absoluta confiança nos promissores desti-nos da Força Aérea, sinalização

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depoimento

de um futuro que é motivo de jú-bilo para aqueles que têm o privi-légio de participar dessa constru-ção com suas ações no presente.

qual o legado da Força Aé-rea para o senhor? O com-promisso incondicional com o Brasil, que se mantém incó-lume, geração após geração, desde os precursores, abnega-dos brasileiros que persegui-ram com obstinação, despren-dimento, paciência, coragem, atitude, amor e sonhos apa-rentemente inatingíveis. Lem-bro Alberto Santos-Dumont, o Pai da Aviação, Patrono da Aeronáutica Brasileira, que no auge do sucesso em Paris, em 1901, quando consultado se pretendia naturalizar-se fran-cês, disse: “A França continua-

rá a ser minha segunda Pátria. (...) mas o Brasil precisa de mim, para difundi-lo entre os povos do mundo. Nasci brasileiro. Lá quero morrer”. Eis um exube-rante exemplo de cidadania e amor às origens. Recordo Au-gusto Severo de Albuquerque Maranhão, parlamentar nor-destino, figura intrépida que, em 1902, ofertou a vida ten-tando provar suas teses sobre a dirigibilidade dos balões. Penso em Eduardo Gomes, o soldado-cidadão, devotado às causas do seu tempo, um dos criadores do Correio Aéreo Militar [depois Nacional], jun-tamente com personalidades marcantes como Nelson Freire Lavenère-Wanderley, o histo-riador, e Casemiro Montene-gro Filho, fundador do Centro

Técnico de Aeronáutica (CTA) e do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Reverencio Nero Moura, herói de guerra, junto com os companheiros do Primeiro Grupo de Aviação de Caça, na campanha da Itália. Em continuidade harmônica de propósitos, agregam-se nu-merosos outros líderes. Com todos aprendi muito. Deles levo o melhor que uma vida dedicada a servir ao Brasil po-deria almejar como recompen-sa: a sensação de que, segundo traduzia Immanuel Kant, “há duas coisas belas no universo: um céu estrelado sobre nos-sas cabeças e o sentimento do dever cumprido no coração”.

Gostaria de acrescentar algo? Um agradecimento especial à DEFESA LATINA, pela oportu-nidade de falar da Força Aérea Brasileira, expressando minha reverência à instituição que me acolheu carinhosamente e à pro-fissão que escolhi como projeto de vida. Também renovo minha confiança nas gerações do pre-sente e do futuro. A corrida de bastões continua no inexorável curso da história, permanecen-do “as asas que protegem o País” em muito boas mãos.

Ao assumir, em 2012, a chefia do Estado-Maior da Aeronáutica (Emaer).Ao lado, com o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito, ao receber a Medalha Militar por serviço prestados à pátria, em janeiro de 2008

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NA HISTóRIA do desenvolvimen-to da aviação no Brasil, José Car-los de Barros Neiva é um nome de destaque. Durante cerca de 35 anos, liderou uma das mais anti-gas e conhecidas fábricas de aero-naves da América do Sul. Gerou empregos, desenvolveu merca-dos, superou limites e promoveu a construção aeronáutica. Piloto, projetista, empreendedor, visio-nário determinado e realista, con-cretizou muitos de seus sonhos com sucesso, apesar das dificul-dades enfrentadas pela indústria do setor ao longo dos anos. Tanto amava as aeronaves que às vezes o chamavam de “Aeroneiva”.Tive o imenso prazer de conhe-cer o bravo pioneiro e sua ado-rável esposa, Eda Ida. Vi o bri-lho nos seus olhos enquanto ele falava sobre aviões. Pareceu-me estar diante de um menino cheio de vontade e garra. Aos 89 anos, Neiva projetava uma

homenagem

Um homem chamado NeivaA saga de um grande pioneiro da moderna construção aeronáutica brasileira

Ana Rita Aranha Ferraciolli

aeronave de fácil acesso para pilotos com pouca mobilidade e flexibilidade motora – mais um projeto inovador. Publicitária e produtora audiovisual, gravei imagens e áudio do mestre.Olhar penetrante, observador, rápido no raciocínio, firme e amigo, Neiva me emprestou sua vida e seus sonhos para que eu viabilizasse o meu, de con-tar a história de um brasileiro para os brasileiros em forma de documentário. Sem titubear, autorizou-me a retratar sua tra-jetória de construtor aeronáu-tico, iniciada após o fim da Se-gunda Guerra Mundial, quando as poucas indústrias de aviões do Brasil não resistiam à crise e encerravam suas atividades.Neiva nasceu em 1924 numa paróquia do Cambuci, bairro da capital paulista, onde seu tio era vigário. Com 15 anos, fez seu primeiro voo no Ae-

roclube de Manguinhos, no Rio de Janeiro, em um bipla-no Moth inglês. Queria ser engenheiro aeronáutico, mas estudou física. Aos 24 anos, com o pai e auxiliares, cons-truiu numa garagem aluga-da junto ao aeroclube, uma aeronave de projeto alemão que ele mesmo desenhara. Era o planador Monitor, fei-to de madeira e revestido de tela, como as aeronaves leves da época. Logo veio outro, o Neiva B Monitor, apelidado de “Neivão”, que seria adquirido em lote de vinte pelo Ministé-rio da Aeronáutica para dis-tribuição, sem instrumentos, a aeroclubes do país. Alguns remanescentes ainda voam. Passo seguinte, construiu um planador de uso desportivo, o BN-1, destaque no Campeona-to Mundial de Voo a Vela, na França, em 1956.

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Neiva P-56C Paulistinha

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Sonhos e realidadeEm 1954, ele havia fundado a So-ciedade Construção Aeronáutica Neiva Ltda. no Rio de Janeiro para fabricar planadores. Dois anos depois, instalou a empresa em Botucatu (SP), onde, com apoio da Aeronáutica, obteve licença da Companhia Aeronáutica Pau-lista (CAP), falida em 1949, para fabricar o legendário Paulistinha. Neiva não se limitou a reproduzir o projeto: alterou janelas, portas, capô, tanque de combustível, motor (colocou um Lycoming de 100 hp) e tamanho da aerona-ve, que batizou de Neiva P-56 Paulistinha. Sucesso total. Foram fabricadas 270 unidades, distribu-ídas a aeroclubes, à Força Aérea Brasileira e a países vizinhos. Até hoje, a célebre aeronave forma e treina pilotos civis e militares.Em 1961, engenheiros da Aero-náutica fizeram um estudo pros-pectivo de dez anos para nortear o setor. Publicada a instrução de incentivo industrial, o primeiro requerimento para um avião de treinamento básico para a FAB foi emitido. A vencedora foi a Neiva, com o projeto B-621.A companhia abriu escritório em São José dos Campos. Junto com o projetista húngaro Joseph Ko-vacs, radicado no Brasil, Neiva

criou o Universal, monomotor biplace lado a lado de duplo co-mando, com trem de pouso re-trátil, comando elétrico, freio a disco, estrutura e revestimentos metálicos, ainda grandes novida-des na ocasião. De excelente de-sempenho e fácil operação, tinha motor Lycoming de 290 hp. Na FAB, recebeu a designação T-25. Voa ainda hoje na instrução bá-sica dos cadetes da Aeronáutica em Pirassununga (SP). O Univer-sal e o Regente, projeto seguinte da Neiva, foram as primeiras ae-ronaves metálicas feitas no Brasil.Quatro modelos de aeronaves ocuparam Neiva nos anos 1960: o Universal, duas versões do Regen-te e o T-23 Uirapuru, da indústria Aerotec, de instrução básica militar e civil. Em 1968, esses aviões foram se exibir numa feira argentina. Em Buenos Aires, pernoitaram numa base militar. No dia seguinte, voa-riam para o evento, a 3 quilôme-

tros de distância, mas, pela ma-nhã, os organizadores decidiram levá-los pelas ruas da cidade, lide-rados por batedores. E assim foi. Misturados a ônibus e automóveis, motores ligados e hélices girando, eles ajudaram o tremendo buzi-naço provocado na capital porte-nha por causa da inédita manobra de “cobrinha” em via pública.A Neiva produziu 150 unidades do T-25 Universal e 100 do Re-gente, que garantiram cresci-mento à indústria e empregos re-gulares: 680 pessoas trabalharam nas duas instalações da empresa. Em 1974, a Embraer, criada cinco anos antes, obteve licença para fabricação da linha Piper norte-americana. A Neiva trabalhou para a estatal, produzindo com-ponentes estruturais e unidades dos modelos Carioca, Corisco e Tupi. Mais tarde, passou a produ-zir também o Embraer-200 Ipane-ma, de aplicação agrícola.Em 1979, a empresa abriu seu ca-pital, transformada em Indústria Aeronáutica Neiva S.A. No ano seguinte, premida pelas dificul-dades de mercado, sobretudo a concorrência de aeronaves im-portadas e a alta carga tributária, a companhia foi absorvida pela Embraer, a mando do Ministério da Aeronáutica. A empresa de José Carlos de Barros Neiva havia produzido mais de 500 aerona-ves até aquele momento e seu executivo retirou-se para a re-gião de São Sebastião, no litoral paulista. Lá faleceu no dia 9 de fevereiro, aos 89 anos. Seu nome batiza ainda um setor produtivo da Embraer, que inovou no mer-cado mundial com o Ipanema movido a etanol. E permanecerá vivo na história da indústria ae-ronáutica do Brasil.

José Carlos de Barros Neiva em 2013 e, abaixo, junto do planador “Neivão”

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UMA PÉSSIMA notícia sobre o acidente na base brasileira na An-tártica veio à tona no último dia 13 de fevereiro, atrapalhando o ambiente positivo da Operação Antártica em curso, a Operan-tar 31. A Justiça Militar da União aceitou denúncia contra Luciano Gomes Medeiros, primeiro-sar-gento da Marinha, acusado de provocar o incêndio. Ele respon-derá por homicídio culposo (sem intenção de matar) dos dois mi-litares falecidos na ocasião e por dano à instalação militar – dois outros marinheiros foram libe-rados “por falta de indícios de participação no crime”, de acor-do com a denúncia do Ministério Público Militar. Pensar que possa ter havido crime nessa situação, ainda que por negligência ou im-perícia, era até aqui inimaginável.Conforme apurou a repórter Débora Zampier, da Agência Brasil, a denúncia do Ministé-rio Público Militar alega que o sargento Medeiros, responsável pela transferência de óleo diesel entre os tanques de alimentação dos geradores da base, deixou o posto para participar da festa de despedida de uma pesquisadora sem encerrar a operação. Com isso, concluiu a perícia, houve escape do óleo, que, em conta-to com o gerador quente, foi a principal causa do incêndio. O saldo da alegada negligência fo-ram duas mortes e a destruição

da base brasileira, com prejuízo orçado em R$ R$ 24,6 milhões. O interrogatório do acusado e a oitiva de seis testemunhas ocor-reram no dia 28 de fevereiro, mas nada virá a público, devido ao caráter sigiloso do processo, determinado pela Justiça por estarem envolvidas questões de segurança nacional.Enquanto isso, a nova base antár-tica brasileira vai tomando forma nas pranchetas dos arquitetos dispostos a participar do concurso internacional aberto no dia 28 de fevereiro último pela Marinha, em conjunto com o Instituto dos Ar-quitetos do Brasil (IAB). O dia 14 de março, de acordo com o edital, será o deadline para inscrição dos projetos, que podem ser assinados por profissionais nacionais ou es-trangeiros – estes, associados a es-critórios de arquitetura brasileiros.

Beleza e tecnologiaDe acordo com o comandante da Marinha, almirante Júlio So-ares de Moura Neto, o objetivo do concurso é debater inovações tecnológicas com os arquitetos. “ Queremos trabalhar com os melhores profissionais e com a mais moderna tecnologia. A base do Brasil será referência”, disse. Por sua vez, o presidente do IAB, Sérgio Magalhães, ga-rante que a nova base brasileira será um cruzamento de beleza, conforto e alta tecnologia, mui-to diferente da obsoleta estru-tura de Ferraz, velha de quase três décadas.Além da busca de uma solução sofisticada, tanto do ponto de vista tecnológico quanto do

Canteiro de obras no geloSargento da Marinha será processado em sigilo pela destruição da Estação Comandante Ferraz, que começará a ser reconstruída no próximo verão antártico

A base Comandante Ferraz destruída pelo incêndio: cientistas

do Ibama fazem a supervisão da desmontagem para reduzir o

impacto ambiental

NApOc Ary Rongel: o “Gigante Vermelho” participa da intensa 31ª

Operação Antártica, cujo canteiro de obras recebe curiosos pinguins

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programa antártico

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construtivo e espacial, o Brasil pretende que a Estação Antár-tica incorpore os mais avança-dos requisitos ambientais. Para tanto, os arquitetos interessa-dos – mais de 100 – assistiram a um seminário sobre o concurso realizado na sede do IAB, no qual receberam orientações do Ministério do Meio Ambiente (MMA), apresentadas pela ana-lista ambiental Jaqueline Leal Madruga, sobre as limitações para construir na Antártica. O projeto deverá ter a menor área construída possível para atender a todas as necessidades da es-tação. “A área é muito restrita, vocês terão que ser quase má-gicos”, disse Jaqueline aos pro-

fissionais presentes. Ela explicou ainda que qualquer impacto gerado na Antártica demanda avaliação do Ibama e também dos países que compõem o Pro-tocolo de Madri sobre preserva-ção ambiental na ocupação da Antártica para fins de pesquisa.De acordo com o cronograma do concurso, o resultado será divulgado no dia 15 de abril e as obras para a nova base mili-tar, orçadas em R$ 100 milhões, deverão ser iniciadas em janei-ro de 2014, com inauguração prevista para fevereiro de 2015.Agora em março, com o final do verão antártico 2012-2013, as equipes de pesquisa vão retornar a suas respectivas universidades.

Enquanto trabalhavam na região, fosse nos navios brasileiros deslo-cados para a Baía do Almiranta-do, fosse nas bases da Argentina e do Chile, técnicos e militares do Arsenal da Marinha e fuzileiros navais providenciavam a remo-ção dos escombros da base incen-diada – calculados em 800 tone-ladas – e instalavam os módulos

Criosfera 1: grupo do Inpe com o primeiro módulo científico brasileiro no interior do Continente Antártico

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Da esquerda: o o comandante da Marinha, almirante Julio Soares de Moura Neto; o secretário de Políticas e Programas de Pesquisa do

Ministério de Ciência e Tecnologia, professor Carlos Nobre; e o presidente do IAB, arquiteto Sérgio Magalhães no lançamento do concurso

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emergenciais adquiridos por R$ 14 milhões da Canada Resources. Houve muita movimentação de máquinas no período, seguindo-se o plano de desmonte, elabo-rado por equipes do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT), da Companhia Ambiental do Estado de São Pau-lo (Cetesb) e do Ibama por solici-tação do MMA, coordenador do Grupo de Avaliação Ambiental (GAAm) do Programa Antártico Brasileiro. A estação provisória, feita com os módulos, fica no lo-cal do heliponto de Ferraz. Tudo foi feito sob a supervisão de téc-nicos do Ibama, que zelam pela higidez ambiental da região ocu-pada pelo Brasil.Também trabalharam no local técnicos da empresa Oi, respon-sáveis pela construção e instala-ção dos equipamentos de teleco-municação da estação. A parceria entre a empresa e a Marinha prevê que um único módulo con-centre todos os equipamentos de comunicação, como antenas com sistema anticongelante, modems com chaveamento, roteadores, terminais para gerenciamento da estação e antenas de transmissão e recepção de sinais de telefonia móvel. O investimento poderá chegar a R$ 4 milhões. “A gente doou a estação e também não fará cobrança pelo serviço”, ga-rantiu Francisco Valim, presiden-te da Oi, que despachou técnicos e equipamentos para a Antártica em janeiro, torcendo para que as condições climáticas permitissem inaugurar o sistema ainda duran-te a atual Operação Antártica.Como se vê, as atividades da Operantar 31 foram extenuan-tes, tomando três turnos do dia. “Tratores, guindastes, em-

Inpe em novas mediçõesEMBORA concentrasse grande parte das pesquisas brasileiras na Antártica, a base incendiada não era a única estação de tra-balhos científicos do país, que são feitos também em navios de pesquisa e em acampamentos isolados. Um desses locais fica a 2.500 quilômetros da Estação Comandante Ferraz, no rumo sul, e foi inaugurado em janeiro de 2012, pouco antes do incêndio. Trata-se do módulo de pesquisa Criosfera 1. Totalmente auto-matizado, ele coleta dados meteorológicos, de química atmos-férica e também de dióxido de carbono, entre outros estudos, envolvendo sete instituições acadêmicas do país.A 670 quilômetros do Polo Sul, o Criosfera 1 faz parte do progra-ma antártico do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe),

que já tem cerca de 30 anos. Atualmente, seus três projetos locais agrupam es-tudos sobre dinâmica da atmosfera, camada de ozô-nio, meteorologia, gases de efeito estufa, radiação ultravioleta, transporte de poluição, oceanografia, interação oceano-atmos-fera e relação Sol-Terra. O Criosfera 1 usa apenas sol e

vento para suprir a energia necessária aos equipamentos e envia dados ao Inpe durante o ano todoO Inpe havia lançado pouco antes, em novembro de 2012, outro equipamento na Antártica: uma boia meteo-oceano-gráfica. Ela fica na Ilha Deception e coleta dados oceano-gráficos em águas rasas como parte do projeto Interações Oceano-Atmosfera-Zona Costeira em Microescala (Intercep-tion). Com 700 quilos e 2 metros de diâmetro, a boia abriga sensores e uma plataforma (PCD-Argos) que permite receber os dados medidos praticamente em tempo real. De acordo com o diretor do Inpe, Leonel Perondi, o sistema foi total-mente construído e integrado por uma empresa brasileira, a Neuron Eletrônica, que é parceira do instituto em projetos de instrumentação oceanográfica e participou do programa do satélite sino-brasileiro (CBERS 1 e 2), entre outros.A área de estudo da boia é o cume de um vulcão ativo que fica pouco acima do nível do mar em Port Foster, um ambien-te geotectônico que impacta a circulação oceânica e a atmos-fera adjacente.

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pilhadeiras e tesouras-mecâni-cas circulam pela faixa de terra movimentando contêineres, recolhendo escombros – trânsi-to por vezes interrompido pela passagem de um curioso pin-guim pelo canteiro. Soldadores quebram chapas de aço quei-madas pelo fogo, que serão co-locadas em contêineres para o embarque no navio Germania, locado pela Marinha para fazer o translado dos entulhos”, des-creveram os repórteres Jeffer-son Botega e Guilherme Mazui, do jornal gaúcho Zero Hora. A azáfama envolveu 200 homens quando somados os contingen-tes dos navios fundeados na baía. Do argentino Bahia San Blas desceram 39 contêineres com os módulos emergenciais.

“Em dois dias, com uso de guin-dastes, balsas, esquis e trato-res, todos os módulos foram posicionados em terra”, regis-traram. Montados os módulos, fica de pé a estação provisória, prevista para durar muitos anos e servir às necessidades da pes-quisa e de abrigo aos 15 mili-tares que permanecem o ano todo no local, garantindo a ma-nutenção das estruturas e pre-parando os trabalhos de cada verão antártico.Tanto trabalho sustenta o com-promisso assumido pelo ministro da Defesa, Celso Amorim, que afirmou: “Nós estaremos presen-tes na Antártica todo esse tempo, o Brasil não se afastou da Antár-tica”. E o motivo é estratégico, afirmou o ministro Marco Antonio

Raupp, da Ciência, Tecnologia e Inovação. Estratégico, explicou, “pelas pesquisas das condições da Antártica e pelo conhecimento atmosférico e oceânico, que in-fluenciam a vida aqui na América do Sul e no Brasil, mas também devido ao tratado para ocupação da Antártica por todos os países do mundo. Temos que fazer pes-quisas lá para mantermos direito a ter uma posição na Antártica”.

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Imagem da Nasa mostra os rios da antártica

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artigo

O BRASIL vive agora o terceiro ciclo do sonho de se tornar uma potência militar. O primeiro ciclo ocorreu nos anos 1930, o segun-do, data dos 1960, mas continua-mos sem compreender o legado do período que deveria ter sido de grande e verdadeiro apren-dizado – as décadas de 1970 e 1980, quando nos tornamos exportadores de itens que iam desde peças de fardamento, mu-nições e aviões até veículos blin-dados sobre rodas, exportados a mais de vinte países. Sobram hoje muitos erros e alguns acer-tos, visto que somos um país que pensa, em nível governamental, num horizonte de quatro anos e, em nível militar, de dois.O conhecimento que nos per-mitiu atingir um estágio inte-ressante e promissor surgiu, em grande parte, da área militar, na qual se desenvolveram diversos projetos. Estes culminaram em protótipos, que, repassados à indústria privada, entraram em produção seriada para uso inter-no e exportação. Seus notórios êxitos de venda tiveram apoio dos governos daqueles anos. De-pois, em momento mais delica-do, faltou à indústria um apoio crucial para os destinos do setor: o apoio interno.O histórico do desenvolvimento tecnológico nacional poderia ter sido muitíssimo bem aproveita-

do, pois não perdemos o princi-pal de nossa capacitação: o fator humano. Mais uma vez, porém, estamos errando por desconhe-cimento do passado recente, quando, em muitos casos, tí-nhamos produto nacional supe-rior aos adquiridos de segunda mão de Europa e EUA. E o pior é que, hoje, acreditamos que de-terminados produtos se tornam nacionais só pelo fato de serem montados no país. Assim, con-fundimos de novo europeização com modernização, como na dé-cada de 1920.Estamos criando conglomerados de defesa que reúnem empresas sem tradição nesse campo, embo-ra excelentes em outros. Tais com-panhias acabam se associando a

conglomerados estrangeiros es-pecializados na área, que querem vender produtos, e não nos ensi-nar a fazê-los. O risco é continuar-mos na terrível dependência em que estamos nesta área, tão vital para nosso futuro. Nada contra parcerias, que até são bem-vin-das. Ocorre que empresas estran-geiras estão adquirindo pequenas empresas brasileiras de importân-cia estratégica, mas seus projetos e produtos acabam absorvidos ou até anulados pelo comprador, que os vê como concorrentes. Isso é preocupante.Vale destacar que o progresso tecnológico de uma nação é o que determina, em grande par-te, sua capacidade econômica. Ambas as áreas são determinan-

O incompreendido legado tecnológico militar brasileiro

Astros II da Avibrás, o grande sucesso da indústria brasileira... ...e o caminhão militar Terex UAI M1-50, o maior dos fabricados no país

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tes para gerar os recursos que sustentam forças competentes, bem armadas e com a dimensão necessária para garantir os inte-resses do país. Por isso, não se pode medir o poder de uma na-ção unicamente pelo tamanho ou pela competência de suas forças armadas. Pesa na balança também uma base econômica forte, com capacidade de produ-zir e sustentar setores industriais ou comerciais necessários ao do-mínio e à independência tecno-lógica de ponta, que muita das vezes não pode ser adquirida ou repassada em sua totalidade.Dominamos fragmentos de co-nhecimentos, que, na maioria das vezes, não se encaixam no conjunto do que está sendo

desenvolvido. Em muitos ca-sos, prestigiamos a indústria estrangeira em detrimento da nacional, adquirindo itens que poderiam muito bem ser de-senvolvidos e fabricados local-mente. Claro que isso com os investimentos e a garantia de compras mínimas, até porque os empresários vivem de lucros, e não da crença de estar ajudan-do a nação.Importarmos equipamentos usa -dos ou novos a baixo custo, tidos como compras de ocasião, mas com extensos contratos de ma-nutenção, que não agregam em transferência de tecnologia. Pelo contrário, nos tornam meros usu-ários desses produtos, até que, uma década depois, obsoletos,

eles sejam descartados pura e sim-plesmente, como vem ocorrendo.Compramos, em muitos casos, para atender ao momento. É o que estamos a ver em rela-ção aos grandes eventos que em breve ocorrerão no país. Os prazos para as aquisições ne-cessárias são curtos e impedem que a indústria nacional e os centros de pesquisas civis e mili-tares deem as respostas de que tanto precisamos na área de defesa. Teria sido possível gerar empregos, conhecimentos e di-visas para o país, mas... Daí o sé-rio risco de, daqui a vinte anos, estarmos criando o quarto ci-clo. Mais uma vez, sem termos aprendido com os outros três.Até quando?

Astros II da Avibrás, o grande sucesso da indústria brasileira... ...e o caminhão militar Terex UAI M1-50, o maior dos fabricados no país

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mercial, segundo a Organização para a Cooperação e o Desen-volvimento Econômico (OCDE).Tendo iniciado sua trajetória com apenas dez associadas, a associa-ção congrega hoje 52 e mais três sócios honorários: o Departamen-to de Ciência e Tecnologia do Co-mando da Aeronáutica, a Agên-cia Espacial Brasileira (AEB) e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Representativa, ela integra desde 2001 o Inter-national Coordinating Council of Aerospace Industries Association, que congrega associações con-gêneres de EUA Canadá, Europa, Japão e Rússia, atuando em ques-tões de aeronavegabilidade, con-trole de tráfego aéreo, seguran-ça, meio-ambiente e uso de veí-culos civis não tripulados (Vants), junto à Organização da Aviação Civil Internacional. Em 2011, suas associadas fatu-raram US$ 6,8 bilhões, sendo R$ 5,1 bilhões em exportação. Elas garantem mais de 23 mil empregos diretos e significativa massa de colaboradores tercei-rizados. Os dados de 2012 ain-da não foram anunciados, mas, segundo expectativa do setor, devem atingir o previsto, pou-co acima de US$ 7 bilhões. Para 2013, espera crescer 6% sobre o resultado do ano anterior.

efemérides

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Rumo à maioridade

EM 1993, a indústria aeroespacial brasileira passava por sérias dificulda-des em razão da crise econômica internacional contemporânea do fim da Guerra Fria, robustecida pela Guerra do Golfo. No Brasil, o cenário político era também de turbulência; o vice-presidente da República Ita-mar Franco assumira o cargo supremo após o impeachment de Fernan-do Collor por esquema de corrupção e tráfico de influência. Nesse ano, em 18 de março, um grupo de dirigentes do setor reuniu-se em São José dos Campos (SP) e fundou a Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil (AIAB) para defender a debilitada atividade junto ao governo.Não é difícil imaginar o tamanho do repto lançado à nova asso-ciação. O segmento, que faturava US$ 750 milhões/ano, caiu para menos de US$ 300 milhões. Seus quadros, antes com 14 mil empre-gados foram enxugados para menos da metade. Maior indústria aeronáutica do Cone Sul, a Embraer estava ameaçada por uma dí-vida gigantesca. De seus fornecedores brasileiros, muitos haviam deixado de existir. Jamais se vira crise igual aquela. O governo co-brava proibitivos 9% ao ano pelos financiamentos concedidos ao setor, enquanto nos EUA, os juros não passavam de 1% ao ano. Para piorar, aeronaves importadas não pagavam impostos no Bra-sil, desequilibrando a concorrência.O setor em dificuldade teria que andar com as próprias pernas. A Embraer, que pertencia ao Estado, desenvolvia um novo produto: o jato regional ERJ-145. A AIAB reforçava o lobby em favor da indústria que, para se manter atualizada tecnologicamente, carecia de investi-mentos constantes. Mas os recursos não apareceram. Somente com a privatização da empresa, realizada em 7 de dezembro de 1994, o setor aeroespacial ganhou sobrevida e veio a se reorganizar. No ano seguinte, o novo jato regional brasileiro foi apresentado ao merca-do. Em dezembro de 1996, ocorreram as duas primeiras entregues da produção em série, que cresceria como fermento em bolo. Havia uma nova etapa vitoriosa à vista. A AIAB contribuiu para a retomada do setor com atividades rela-cionadas a concepção, produção, comercialização e assistência pós-venda de produtos, além de prestar serviços técnicos especializa-dos. Hoje, quando o mercado aeroespacial é o terceiro do mundo, o setor local prospera, apresentando-se como o único segmento de alta tecnologia do Brasil com resultados positivos na balança co-

20 anos:

Embr

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