declaração política da 12ª feira regional de sementes e da biodiversidade

Upload: lucas-matos

Post on 10-Oct-2015

16 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • Declarao Poltica da 12 Feira Regional de Sementes e da Biodiversidade

    Sementes crioulas, construindo a nossa autonomia. Sob essa bandeira, mais de 2mil agricultores e agricultoras familiares, adultos e jovens, participaram, em Rio Azul,no dia 07 de setembro de 2014, da 12 Feira Regional de Sementes Crioulas e daAgrobiodiversidade. A Feira foi convocada pelas organizaes e lideranas daagricultura familiar da regio Centro-Sul do Paran e Planalto Norte de Santa Catarinaarticuladas no Coletivo Triunfo, sendo acolhida pelo Sindicato dos TrabalhadoresRurais de Rio Azul, com o apoio da Prefeitura do municpio.

    Nossa feira uma expresso da organizao da luta da agricultura familiar peladefesa e conservao das sementes crioulas e raas nativas de animais, entendidascomo base de nossa autonomia tcnica, econmica e cultural. Em nossa regio, essadefesa realizada desde as propriedades, passando por organizaes comunitrias enos municpios. Essa ao est articulada como tema de luta poltica h mais de 20anos como reao ao massivo processo de extino das variedades e raas. Essa lutapela agrobiodiversidade encontra seu fundamento nas prticas herdadas de nossosantepassados. Mas elas apontam tambm para a garantia de uma agricultura maispromissora, que assegure a gerao de renda e autonomia diante das ameaasimpostas pelo agronegcio. Em nome desse futuro assistimos em nossa feira umamarcada mobilizao da juventude rural manifestando-se em defesa daagrobiodiversidade e da agroecologia.

    Diante das ameaas desagregadoras que o agronegcio faz pesar sobre o patrimniogentico e sobre a prosperidade e autonomia da agricultura familiar, e visando aofortalecimento do movimento de resistncia e de inovao agroecolgica que seirradia desde as comunidades ao conjunto da regio, os agricultores e agricultorasfamiliares e as organizaes participantes da 12 Feira das Sementes Crioulas e daBiodiversidade declaram o seguinte:

    1. As sementes e as raas animais crioulos so um patrimnio da Humanidade econstituem um componente histrico vital da agricultura familiar e dos povostradicionais cultivadores. Denunciamos as tentativas do agronegcio de seapropriar e desmantelar esse patrimnio, tornando a agricultura familiardependente dos pacotes tecnolgicos por ele produzidos, retirando-lhe suaautonomia e sua prpria condio de existncia. Mantemos nossa firmedisposio de continuar lutando pela instituio de polticas e programaspblicos que fortaleam a identidade sociocultural da agricultura familiar,

  • defendam e estimulem a conservao da agrobiobiverdidade, sua livreutilizao e circulao. Nesse sentido, nos posicionamos firmemente emoposio a qualquer tipo de registro ou normativa que limite a diversidade e apermanente evoluo dos recursos genticos conservados e adaptados pelasfamlias agricultoras.

    2. A expanso do agronegcio impe tambm mudanas nas dietas alimentaresno campo e nas cidades, gerando a perda de espcies, variedades econhecimentos tradicionais essenciais para assegurar a soberania alimentar denosso povo. Esse processo tem levado expanso do uso de espcies,variedades e raas no adaptadas e com isso a crescente dependncia deagroqumicos, ao mesmo tempo em que deixa de ser valorizado imensopatrimnio da agrobiodiversidade em nossa regio.

    3. Ao defender e praticar uma agricultura produtora de alimentos saudveis,manifestamos nossa inquietao e repdio ao acelerado crescimento do uso deagrotxicos e sementes transgnicas nos cultivos de nossa regio. Nossasexperincias de produo agrcola em bases de sustentabilidadesocioambiental confirmam o que vem sendo verificado no mundo inteiro e jdemonstraram que esses produtos disseminados pelo agronegcio constituemuma permanente ameaa de contaminao das lavouras das famlias que tmprocurado se desvencilhar das amarras dos pacotes tecnolgicos, inviabilizandoas alternativas autnomas de manejo tcnico, de trabalho e de gerao derenda que temos construdo ao longo dos anos. Ao mesmo tempo em quedefendemos a criao de reas livres de transgnicos e agrotxicos, exigimosque as empresas do agronegcio, que geram lucros privados e prejuzospblicos com esse tipo de contaminao, sejam responsabilizadas civil ecriminalmente. Para isso, cobramos do Ministrio Pblico nas esferas estadual efederal a criao de um grupo de trabalho para enfrentar esse problema dacontaminao por agrotxicos e transgnicos com ampla participao dasociedade civil. Expressamos nosso apoio instituio do Programa Nacionalde Reduo do Uso de Agrotxicos, aprovado pela Comisso Nacional deAgroecologia e Produo Orgnica. Nessa mesma linha, conclamamos osmunicpios de nossa regio a estabelecerem leis que restrinjam ou probam ouso de agrotxicos e transgnicos, a exemplo de municpios de outras regiesdo Brasil.

  • 4. Expressamos nosso reconhecimento ao papel positivo que tm desempenhadoos programas governamentais de compra direta da agricultura familiar, tanto oPrograma de Aquisio de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA) como oPrograma Nacional de Alimentao Escolar (PNAE). Tanto em nossa regio,como no conjunto do pas, esses programas demonstraram-se comoferramentas inovadoras e potentes para o fortalecimento da agriculturafamiliar, favorecendo a construo de mercados locais, nos quais agricultorese agricultoras e suas associaes vendem sua diversidade produtiva e geramrendas prprias remuneradoras em condies de autonomia. Ao mesmo tempoem que expressamos tal reconhecimento, externamos tambm nossapreocupao incitao promovida pelas foras do agronegcio para lanardescrdito sobre esses programas e, tambm por esta via, conspirar contra oprogresso da agricultura familiar. Defendemos firmemente no apenas acontinuidade do PAA e do PNAE, fortalecendo as organizaes da agriculturafamiliar, como tambm sua rpida ampliao, tanto do ponto de vistaoramentrio como da cobertura social. Nesse caso, acentuamos a necessidadede continuidade e ampliao do PAA-Sementes como instrumento de promooda conservao e uso das sementes crioulas, e de defesa da agriculturafamiliar contra o avano do agronegcio e dos prejuzos econmicos,ambientais e para a sade das famlias agricultoras e dos consumidores queele implica.

    5. Constatamos e denunciamos que a disseminao do modelo produtivo doagronegcio em nossa regio tem resultado em ameaa e desestmulo aofuturo da ocupao econmica dos jovens rurais como profissionais daagricultura familiar. Trata-se de uma ameaa reproduo futura da prpriainstituio da agricultura familiar. Face a tal conjuntura, propomos a formulaoe execuo efetiva de um Plano Nacional de Apoio Juventude e Sucessona Agricultura Familiar, que associe, notadamente, programas de reformaagrria e de acesso terra, moradia, ao crdito, a diferentes nveis deformao profissional e que favorea tambm a ampliao dos servios deinfraestrutura (energia, telefonia, internet) e de lazer no meio rural. Cobramostambm a criao de um Programa Nacional Bolsa de Estudo ao Jovem daAgricultura Familiar, como incentivo ao jovem, de 18 a 29 anos, paraimplementar projetos agroecolgicos em suas propriedades e comunidades.

    6. Finalmente, e com particular nfase, reconhecemos o papel essencial einsubstituvel que tm desempenhado as mulheres agricultoras na reproduo

  • e no fortalecimento da agricultura familiar, como agentes da produo, daconservao e defesa da biodiversidade, como gestoras de diferentes fontesde renda e como promotoras de inovaes tcnicas e esteio da seguranaalimentar das famlias. Requeremos polticas e programas pblicos quereconheam a identidade scio-cultural e econmica prpria da mulheragricultora e lhes garantam os instrumentos legais e normativos para seudesempenho autnomo como profissional da agricultura familiar. Ao mesmotempo, conclamamos as organizaes da agricultura familiar de nossa regio aassegurar a participao protagnica das mulheres agricultoras em suasdirees e programas de atividade.

    Ao realizar a 12 Feira Regional das Sementes Crioulas e da Agrobiodiversidadereafirmamos nosso compromisso e nossa disposio para continuar na luta peladefesa e fortalecimento da agricultura familiar, com base nos princpios daagroecologia. Temos exercitado esse caminho em nossas propriedades ecomunidades e temos reconhecido nele a boa alternativa para um futuro de equilbriosocioambiental e de prosperidade para nossas famlias, adultos e jovens. Temoscerteza de que esse tambm o caminho para assegurar a satisfao dasdemandas e necessidades da populao por um alimento saudvel em suas mesas.

    Rio Azul-Pr, 07/09/2014