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REVOLUÇÃO INDUSTRIAL INGLESA AO IMPERIALISMOTRANSCRIPT
Da Revolução Industrial Inglesa ao Imperialismo
A respeito do pioneirismo inglês, ressalta Hobsbawm o fato de ter sido a Grã-
Bretanha um dos países que mais radicalmente rompeu com todas as épocas anteriores
da história humana: a mais completa eliminação do campesinato; uma proporção de
homens e mulheres que ganham a vida unicamente com o trabalho assalariado maior
que em qualquer outra parte; a urbanização mais cedo e provavelmente maior que em
todos os outros lugares. Conseqüentemente, a Grã-Bretanha foi também o país em que
as divisões de classe eram mais simplificadas que em outras partes (classe trabalhadora
e classes médias).
Também ressalta-se, a partir de relatos de estrangeiros, que a aristocracia inglesa
como diferente das de outros países, pois que era muito mais “burguesas” que “nobres”
mesmo na metade do século XVIII.
Tais constatações demonstram de que forma a Inglaterra fundamentou sua
industrialização em uma sociedade basicamente capitalista em que as disputas de ordens
são simplificadas pela divisão social em duas classes centrais: a burguesia e o
proletariado1.
Alguns fatores foram de grande relevância ao pioneirismo inglês no
desenvolvimento industrial. Entre tais fatores foram: a concentração de trabalhadores
urbanos assalariados, a acumulação primitiva de capital, uma simplificação de classes
em duas classes principais – burguesia e proletariado, além de um setor social com
conhecimentos técnicos suficientes na aplicação de conhecimentos ao processo
produtivo.
O autor contesta de início diferentes teorias que buscam explicar o pioneirismo
inglês na indústria, para tanto combate teorias pautadas por fatores climáticos, geografia
e distribuição de recursos naturais, pois que tais aspectos estão dentro de um dado
quadro econômico, social e institucional. Também desacredita naquelas que explicam
1 Marx analisa de que forma o capitalismo consistiu numa importante revolução em relação à sociedade
de ordens medieval e numa simplificação em duas classes principais e contrastantes: a dos burgueses
detentores dos meios de produção e a do proletariado que vendem sua força de trabalho dentro das
relações sociais de produção que mantém o sistema.
de acordo com: o problema da população, um acidente histórico ou fatores puramente
políticos2.
No entanto, cabe a pergunta: qual a razão da Inglaterra que foi a pioneira no
desenvolvimento das condições sociais propícias à uma revolução industrial ter sido
ultrapassada por demais potências européias?
Para responder a tal formulação cabe a análise da idéia de inovação. Nesse
sentido, a idéia de inovação dentro da análise tanto da industrialização inglesa como
também no de decadência em relação à denominada Segunda Revolução Industrial pode
ser compreendida.
Ainda para o entendimento da industrialização, o autor, ao descrever diferentes
opiniões, demonstra a importância de um fator que costumeiramente é negligenciado,
tal seria o papel do governo.
Sabe-se que até o início do século do XIX, o comércio foi uma atividade muito
mais compensadora que a manufatura, tendo inclusive maior prestígio político.
Conforme se detém do livro de Hobsbawm a maior participação da camada dos
“industriais” foi fundamental ao processo de industrialização inglesa, apoiada por
políticas que incentivavam a produção industrial interna, como a restrição à importação
de manufaturas negociadas pelos comerciantes com os territórios orientais.
Percebe-se, pois, a importância de se ter os interesses das classes envolvidas com
as manufaturas dentre as pautas de políticas de governo, já que dentro da Inglaterra era
indubitável o contraste entre os ricos comerciantes e a classe em ascensão voltada à
produção manufatureira nacional.
O monopólio inglês na produção de produtos manufaturados a partir do domínio
exclusivo da tecnologia industrial pôde explicar o desenvolvimento do país como uma
potência política e econômica que permitiu, inclusive, o imperialismo como política
internacional.
2 Vide Álvaro Vieira Pinto que trata extensivamente sobre o conceito de tecnologia e inovação técnica
com críticas à tecnologia como ideologia.
A compreensão da inovação tecnológica como fator dinâmico de criação de
monopólios, ainda que momentâneos, fundamentais à criação de assimetrias3, podem
ser também analisados pelo contraste entre a 1ª Revolução Industrial (tendo como
vanguarda a Inglaterra) e a denominada 2ª Revolução Industrial em que se tem a
superação da Inglaterra por demais potências como os EUA e a Alemanha.
As seguintes passagens do livro elucidam melhor o que fora no início a inovação
na Revolução Industrial inglesa: “Pelo contrário as inovações científicas abundavam e
eram rapidamente aplicadas a problemas práticos pelos cientistas que ainda se
recusavam a fazer a ulterior distinção entre o pensamento ‘puro’ e o ‘aplicado’”; “A
novidade não estava nas inovações, e sim na presteza com que homens práticos
dispunham a utilizar a ciência e a tecnologia desde muito disponíveis e a seu alcance; e
no amplo mercado que se abria às mercadorias, À medida que os preços e os custos
caíam rapidamente. Não estava no florescimento o gênio inventivo individual, e sim na
situação prática que fazia voltar o pensamento humano para problemas solúveis”
No capítulo “O começo do declínio” ao tratar da denominada segunda revolução
industrial, assim a descreve quanto a seus aspectos “tecnológicos”4 : “Os maiores
triunfos tecnológicos da fase arcaica da industrialização, a estrada de ferro e o barco à
vapor, eram pré-científicos ou, pelo menos apenas semi-científicos, nesse sentido”; “Por
conseguinte, os principais progressos técnicos da segunda metade do século XIX foram
essencialmente científicos; ou seja, exigiam como mínimo indispensável para invenções
originais algum conhecimento das novas evoluções no campo da ciência pura, um
processo muito mais organizado de experimentação científica e de comprovação prática,
para aperfeiçoamento daquelas invenções, e uma ligação cada vez mais estreita e
contínua entre industriais, tecnologistas e cientistas profissionais e instituições
científicas”; “ Cada vez mais, a ciência sugeria não só soluções como problemas (...)”.
Nesse sentido, percebe-se uma forte mudança no eixo da inovação que passa por
uma separação maior entre tecnologia “pura” e “aplicada”, com uma maior
3 Perspectiva teórica adotada por Silva Possas, aqui compreendido como vantagens comparativas entre os
países na disputa de mercados.
4 Aqui compreendido no sentido de inovação técnica de acordo com a classificação de Álvaro Vieira
Pinto.
predominância do estudo científico como base ao desenvolvimento da inovação, antes
(na 1ª Revolução Industrial) mais ligada à técnica5.
Por fim, na tentativa de entender a superação da Inglaterra no processo da 2ª
Revolução Industrial são explicitados diferentes fatores, dos quais destacamos a
insistência da política clássica do laissez-faire e a falta um desenvolvimento propulsor
de inovações que pudessem competir com as demais potências da época, sobretudo, os
EUA pós-1ª Guerra Mundial.
Sobre isso, é de grande contribuição a análise proposta por Silva Possas em seu
texto Concorrência e Inovação, onde destaca-se a competição como um processo
dinâmico de disputa por mercados em que a inovação assume o papel de um conceito-
chave. Importante, é que a própria compreensão dinâmica dos fatores envolvidos na
disputa e alterados pela inovação, como discutidos pela autora, tem um sentido muito
próprio que não é o de mudança previsível ou como o desenvolvido pela Física
(evolução contida num sistema teórico), mas num processo em que muda-se inclusive o
próprio mercado em que se disputa na medida em que surgem as inovações, ou seja, a
cada mudança muda-se não só o quadro anterior como os próprios critérios de pensar as
mudanças pelas inovações.
Quando a partir do que foi exposto, observa-se na Inglaterra do século XX uma
incapacidade em incorporar mudanças e alterar políticas, pode ser demonstrado a
ineficiência da política de Estado liberal clássica seguida à todo o momento como um
apego quase de fé à uma racionalidade (construída desde o início da industrialização)
que se diluiu quando foi preciso uma maior atuação do Estado na promoção de um
plano de desenvolvido capaz de competir com os demais. Talvez, a 2ª Revolução
Industrial tenha exigido de forma muito mais intensa a participação ativa do Estado, na
medida em que a própria inovação tecnológica já não poderia sair do exercício empírico
e técnico dos homens isolados, mas antes tornara-se uma atividade profissional que
prescindia de uma estrutura de base científica,de conhecimento mais geral, capaz de
fornecer compreensões teóricas mais rápidas que o aprendizado empírico por tentativa e
erro.
5 Vide o sentido da palavra engineer que compreendia como elucidado por Hobsbawm tanto o engenheiro
quanto o técnico operador in: Da Revolução Industrial Inglesa ao Imperialismo, 5ªed., Rio de Janeiro,
Forense Universitária, 2003, p. 58.
Mas, se é possível visualizar a “superação” da Inglaterra a partir da idéia de
competitividade e criação de assimetrias de mercado decorrente da inovação, também
importa visualizar a concepção de Hobsbawm a respeito da relação entre a obtenção de
lucro e a inovação tecnológica: “O enigma está na relação entre a obtenção de lucro e a
inovação tecnológica. Supõe-se com freqüência que uma economia de iniciativa privada
tende automaticamente para a inovação, mas isto é uma inverdade. Ela só tende para o
lucro. Ela só revolucionará as atividades econômicas no caso de esperar maiores lucros
com a revolução do que sem ela” 6.
Como descrito, a política do laissez-faire não poderia permitir uma visualização
mais ampla de uma política voltada para lucro, a partir da inovação que se exigia, já que
somente o Estado poderia compreender um planejamento a longo prazo ou que fosse
mais sistêmico, na construção de uma infra-estrutura anterior que permitisse a inovação.
Quer dizer, não há a tendência automática à inovação, mas tão só aos lucros, não sendo
possível visualizar a obtenção de lucro ao fim do investimento não se investiria. O
autor, nessa linha, inclusive demonstra como os ingleses na primeira revolução
industrial ao investir em transporte ferroviário estavam num período de grande
concentração de riqueza e empolgação para investir, constatando o mesmo fato durante
a 2ª Revolução Industrial dentre os norte-americanos, mas não mais dentre os ingleses.
Portanto, acredita-se que uma abordagem crítica a partir da teoria de Marx (que
nos parece seguida por Hobsbawn) pode ser acompanhada pela postura teórica assumida
por Silva Possas no trato do tema: Concorrência e Inovação, a fim de um maior
entendimento da esfera da inovação analisada tanto no quadro da Revolução Industrial
quanto na competitividade internacional e a superação da Inglaterra no processo da 2ª
Revolução Industrial.
6 HOBSBAWM, Eric J. Da Revolução Industrial Inglesa ao Imperialismo, 5ªed., Rio de Janeiro, Forense
Universitária, 2003, p. 39.