compêndio de ensaios jurídico: temas de direitos reais - v. 1, n. 1
DESCRIPTION
Tradicionalmente, o Direito é reproduzido por meio de “doutrinas”, que constituem o pensamento de pessoas reconhecidas pela comunidade jurídica em trabalhar, academicamente, determinados assuntos. Assim, o saber jurídico sempre foi concebido como algo dogmático. É possível, à luz da tradicional visão empregada, afirmar que o Direito é um campo no qual não se incluem somente as instituições legais, as ordens legais, as decisões legais; mas, ainda, são computados tudo aquilo que os especialistas em leis dizem acerca das mencionadas instituições, ordens e decisões, materializando, comumente, uma “meta direito”. No Direito, a construção do conhecimento advém da interpretação de leis e as pessoas autorizadas a interpretar as leis são os juristas.Contudo, o alvorecer acadêmico que é presenciado pelos Operadores do Direito, que se debruçam no desenvolvimento de pesquisas, passa a conceber o conhecimento de maneira prática, utilizando as experiências empíricas e o contorno regional como elementos indissociáveis para a compreensão do Direito. Ultrapassa-se a tradicional visão do conhecimento jurídico como algo dogmático, buscando conferir molduras acadêmicas, por meio do emprego de métodos científicos. Neste aspecto, o Compêndio de Ensaios Jurídico objetiva disponibilizar para a comunidade interessada uma coletânea de trabalhos, reflexões e inquietações produzida durante a formação acadêmica do autor. Debruçando-se especificamente sobre a temática de Direitos Reais, o presente busca trazer para o debate uma série de assuntos contemporâneos e que reclamam maiores reflexões.TRANSCRIPT
TAUÃ LIMA VERDAN
RANGEL
COMPÊNDIO DE ENSAIOS
JURÍDICOS:
TEMAS DE DIREITOS REAIS
V.
01
N.
01
COMPÊNDIO DE ENSAIOS JURÍDICOS:
TEMAS DE DIREITOS REAIS
(V. 01, N. 01)
Capa: Lasar Segall, Favela (1954-1955).
ISBN: 978-1516930845
Editoração, padronização e formatação de texto
Tauã Lima Verdan Rangel
Projeto Gráfico e capa
Tauã Lima Verdan Rangel
Conteúdo, citações e referências bibliográficas
O autor
É de inteira responsabilidade do autor os conceitos aqui
apresentados. Reprodução dos textos autorizada
mediante citação da fonte.
A P R E S E N T A Ç Ã O
Tradicionalmente, o Direito é reproduzido por
meio de “doutrinas”, que constituem o pensamento de
pessoas reconhecidas pela comunidade jurídica em
trabalhar, academicamente, determinados assuntos.
Assim, o saber jurídico sempre foi concebido como algo
dogmático. É possível, à luz da tradicional visão
empregada, afirmar que o Direito é um campo no qual
não se incluem somente as instituições legais, as ordens
legais, as decisões legais; mas, ainda, são computados
tudo aquilo que os especialistas em leis dizem acerca das
mencionadas instituições, ordens e decisões,
materializando, comumente, uma “meta direito”. No
Direito, a construção do conhecimento advém da
interpretação de leis e as pessoas autorizadas a
interpretar as leis são os juristas.
Contudo, o alvorecer acadêmico que é
presenciado pelos Operadores do Direito, que se
debruçam no desenvolvimento de pesquisas, passa a
conceber o conhecimento de maneira prática, utilizando
as experiências empíricas e o contorno regional como
elementos indissociáveis para a compreensão do Direito.
Ultrapassa-se a tradicional visão do conhecimento
jurídico como algo dogmático, buscando conferir
molduras acadêmicas, por meio do emprego de métodos
científicos. Neste aspecto, o Compêndio de Ensaios
Jurídico objetiva disponibilizar para a comunidade
interessada uma coletânea de trabalhos, reflexões e
inquietações produzida durante a formação acadêmica do
autor. Debruçando-se especificamente sobre a temática
de Direitos Reais, o presente busca trazer para o debate
uma série de assuntos contemporâneos e que reclamam
maiores reflexões.
Boa leitura!
Tauã Lima Verdan Rangel
5
S U M Á R I O
Análise do instituto da acessão nos Direitos Reais:
apontamentos iniciais ......................................................... 06
Modos de aquisição da propriedade móvel: abordagem
didática do assunto .............................................................. 53
Modos de perda da propriedade: breve análise do
tema ..................................................................................... 96
Apontamentos às restrições ao direito de propriedade em
virtude de interesse social ................................................... 148
6
ANÁLISE DO INSTITUTO DA ACESSÃO NOS
DIREITOS REAIS: APONTAMENTOS INICIAIS
Resumo: Em uma primeira plana, quadra colocar em
destaque que o instituto da acessão é considerado
como modo originário de aquisição de propriedade,
uma vez que o proprietário de determinado bem passa
a adquirir a titularidade de tudo que adere à sua
propriedade. Neste sentido, verifica-se que, em
decorrência da acessão contínua, uma coisa é
incorporada, ou mesmo unida, materialmente a outra,
em estado permanente. Em termos conceituais, vale
grifar que a acessão, como modo originário de
aquisição de propriedade, pode ocorrer de duas formas
distintas, a saber: natural ou artificial. Na primeira
espécie, a união ou a incorporação quando se dá é
fruto de acontecimento natural, ou seja, a coisa
acedente, naturalmente, adere à coisa acedida, é a
7
chamada accessio cedit principali, é fruto da atuação
das forças da natureza, sobre as quais o ser humano
não detêm qualquer controle. Figuram como
modalidades de acessão natural: a formação de ilhas, o
aluvião, a avulsão e o abandono de álveo constituem
caso desse tipo de acessão, pois se produzem de modo
espontâneo, sem a presença de qualquer ação
antrópica. A segunda espécie, também denominada de
industrial, é decorrente da atuação humana, razão
pela qual são contabilizados como exemplos as
plantações e construções de obras.
Palavras-chaves: Acessão. Aquisição Originária.
Propriedade.
Sumário: 1 Considerações Iniciais; 2 O Instituto da
Acessão nos Direitos Reais: Apontamentos Iniciais; 3
Da Acessão por Formação de Ilhas; 4 Da Acessão por
Formação de Aluvião; 5 Da Acessão por Formação de
Avulsão; 6 Da Acessão por Formação de Álveo
Abandonado; 7 Da Acessão por Plantações e
Construções: Acessão Artificial.
8
1CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Ab initio, ao se atribuir uma abordagem sobre o
tema em pauta, imprescindível se revela o exame da
Ciência Jurídica, assim como as suas diversas
ramificações, a partir de um prisma cingido pelas
maciças alterações que passaram a influenciar seu
arcabouço. Nesta linha de raciocínio, ao se observar os
aspecto de mutabilidade que passaram a alicerçar o
Direito, é viável salientar que não mais subsiste a visão
da ciência em comento como algo pétreo e hermético,
indiferente ao sucedâneo de situações inauguradas pela
sociedade. Como resultante do acinzelado, constata-se
que não mais vigora a imutabilidade dos cânons que no
pretérito orientavam o Direito, a imutabilidade
substancialmente é suplantada pelos anseios e carências
vivenciados pela sociedade.
Nessa trilha de apresentação, “é cogente a
necessidade de adotar como prisma de avaliação o
brocardo jurídico 'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde
está a sociedade, está o Direito', tornando explícita e
cristalina a relação de interdependência que esse
9
binômio mantém”1. oportunamente, o emprego da
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,
como axioma maior de sustentação é mecanismo
necessário, notadamente, quando se tem, como objeto de
ambição, a adequação do texto genérico e abstrato das
normas que integram o arcabouço pátrio às nuances e
complexidades que influenciam a realidade moderna.
Ao lado disso, há que se citar o voto magistral voto
proferido pelo Ministro Eros Grau, ao apreciar a Ação de
Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF, “o
direito é um organismo vivo, peculiar porém porque não
envelhece, nem permanece jovem, pois é contemporâneo
à realidade. O direito é um dinamismo. Essa, a sua força,
o seu fascínio, a sua beleza”2. Aduz, ainda, o mencionado
ministro, destacando, com grossos traços e contorno bem
definidos, que:
1 VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do
Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun.
2009. Disponível no sítio eletrônico: <http://jornal.jurid.com.br>.
Acesso em: 18 jan. 2012. 2 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. [...]. Acórdão em Ação de
Descumprimento de Preceito Fundamental nº. 46-DF. ABRAED –
Associação Brasileira das Empresas de Distribuição e Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT. Relator para o Acórdão:
Ministro Eros Grau. DJe nº. 35, 25 fev. 2010. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/>. Acesso em: 18 jan. 2012.
10
É do presente, na vida real, que se toma as
forças que lhe conferem vida. E a realidade
social é o presente; o presente é vida --- e
vida é movimento. Assim, o significado
válidos dos textos é variável no tempo e no
espaço, histórica e culturalmente. A
interpretação do direito não é mera dedução
dele, mas sim processo de contínua
adaptação de seus textos normativos à
realidade e seus conflitos3.
Ainda nesse sedimento de edificação, pode-se
evidenciar que a concepção pós-positivista que passou a
permear o Direito, ofertou, por via de consequência, uma
rotunda independência dos estudiosos e profissionais da
Ciência Jurídica. Aliás, há que se citar o entendimento
de Verdan, “esta doutrina é o ponto culminante de uma
progressiva evolução acerca do valor atribuído aos
princípios em face da legislação”4. Desta sorte, a partir
de uma análise mais acurada dos preceitos que abalizam
o assunto em destaque, infere-se que o ponto central da
3 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. [...]. Acórdão em Ação de
Descumprimento de Preceito Fundamental nº. 46-DF. ABRAED –
Associação Brasileira das Empresas de Distribuição e Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT. Relator para o Acórdão:
Ministro Eros Grau. DJe nº. 35, 25 fev. 2010. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/>. Acesso em: 18 jan. 2012. 4 VERDAN, 2009, s.p.
11
corrente pós-positivista cinge-se à valoração da robusta
tábua principiológica que Direito e, por conseguinte, o
arcabouço normativo passando a figurar, nesta tela,
como normas de cunho vinculante, flâmulas hasteadas a
serem adotadas na aplicação e interpretação do conteúdo
das leis.
Gize-se, por necessário, a brilhante manifestação
apresentada pelo Ministro Marco Aurélio, que, ao
abordar acerca das linhas interpretativas que devem
orientar a aplicação da Constituição Cidadã, expôs:
Nessa linha de entendimento é que se torna
necessário salientar que a missão do
Supremo, a quem compete, repita-se, a
guarda da Constituição, é precipuamente a
de zelar pela interpretação que se conceda à
Carta a maior eficácia possível, diante da
realidade circundante. Dessa forma, urge o
resgate da interpretação constitucional,
para que se evolua de uma interpretação
retrospectiva e alheia às transformações
sociais, passando-se a realizar a
interpretação que aproveite o passado, não
para repeti-lo, mas para captar de sua
essência lições para a posteridade. O
horizonte histórico deve servir como fase na
realização da compreensão do intérprete5.
5 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. [...]. Acórdão em Ação de
Descumprimento de Preceito Fundamental nº. 46-DF. ABRAED –
Associação Brasileira das Empresas de Distribuição e Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT. Relator para o Acórdão:
12
Nessa toada, os princípios jurídicos são erigidos à
condição de elementos que trazem em seu âmago a
propriedade de oferecer uma abrangência ampla,
contemplando, de maneira única, as diversas espécies
normativas que integram o ordenamento pátrio. Em
razão do apresentado tais mandamentos passam a
figurar como super-normas, isto é, “preceitos que
exprimem valor e, por tal fato, são como pontos de
referências para as demais, que desdobram de seu
conteúdo”6. Os dogmas jurídicos se desdobram em
verdadeiros pilares sobre os quais o arcabouço teórico
que compõe o Direito se estrutura, segundo a brilhante
exposição de Tovar7. Por óbvio, essa concepção deve ser
estendida a interpretação das normas que dão substrato
de edificação à ramificação Civilista da Ciência Jurídica,
mormente o princípio da função social da propriedade, no
Ministro Eros Grau. DJe nº. 35, 25 fev. 2010. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/>. Acesso em: 18 jan. 2012. 6 VERDAN, 2009, s.p. 7 TOVAR, Leonardo Zehuri. O Papel dos Princípios no Ordenamento
Jurídico. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 696, 1 jun. 2005.
Disponível no site: <http://jus2.uol.com.br>. Acesso em: 18 jan. 2012.
13
que pertine ao instituto da usucapião e seus múltiplos
desdobramentos.
2 O INSTITUTO DA ACESSÃO NOS DIREITOS
REAIS: APONTAMENTOS INICIAIS
Em uma primeira plana, quadra colocar em
destaque que o instituto da acessão é considerado como
modo originário de aquisição de propriedade, uma vez
que o proprietário de determinado bem passa a adquirir
a titularidade de tudo que adere à sua propriedade.
Neste sentido, verifica-se que, em decorrência da acessão
contínua, uma coisa é incorporada, ou mesmo unida,
materialmente a outra, em estado permanente. Assim, “o
proprietário da coisa principal adquire a propriedade da
coisa acessória que se lhe uniu ou incorporou”8-9. Vale
ressaltar que tal situação pode ser derivada tanto da
ação antrópica como por causa natural.
8 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direitos
Reais. 7 ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011, p. 386. 9 Neste sentido: VENOSA, Sílvio Salvo. Direito Civil: Direitos
Reais. 10 ed. São Paulo: Editora Atlas, 2010, p. 196: “Pelo princípio,
passa a pertencer ao dono da coisa principal o que se adere a ela.
Obedece-se à regra geral segundo a qual o acessório segue o
principal”.
14
Nesse passo, evidencia-se a existência dos
requisitos caracterizadores do instituto em tela, a saber:
a) a união ou incorporação entre duas coisas, separadas
até então; b) o aspecto acessório da coisa unida ou
incorporada, quando comparada com a coisa principal10.
Cuida salientar o acréscimo ocorrido entre duas coisas
corporifica uma nova entidade, surgindo do exterior da
coisa, invariavelmente, passando a integrá-la, quer seja
juridicamente, quer seja fisicamente. Ainda nesta senda,
impende destacar, com grossos traços, que, em restando
configurada que as duas em pertencendo as duas coisas
originárias ao mesmo proprietário, não há que falar na
ocorrência do instituto em exposição.
Em termos conceituais, vale grifar que a acessão,
como modo originário de aquisição de propriedade, pode
ocorrer de duas formas distintas, a saber: natural ou
10 Neste sentido: DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil
Brasileiro: Direito das Coisas. V. 4. São Paulo: Editora Saraiva,
2011, p. 151: “Em todas essas formas de acessão há necessidade de
dois requisitos: a) a conjunção entre duas coisas, até então
separadas; e b) o caráter acessório de uma dessas coisas, em
confronto com a outra. A coisa acedida é a principal, e a acedente, a
acessória”.
15
artificial11. Na primeira espécie, a união ou a
incorporação quando se dá é fruto de acontecimento
natural, ou seja, a coisa acedente, naturalmente, adere à
coisa acedida, é a chamada accessio cedit principali. “A
formação de ilhas, o aluvião, a avulsão e o abandono de
álveo constituem caso desse tipo de acessão, pois se
produzem de modo espontâneo sem que haja qualquer
intervenção humana”12. A segunda espécie, também
denominada de industrial, é resultada da ação antrópica,
ou seja, a acessão é decorrente do trabalho humano,
razão pela qual são contabilizados como exemplos as
plantações e construções de obras.
3 DA ACESSÃO POR FORMAÇÃO DE ILHAS
Enumerada pelo Código Civil vigente, em seu
artigo 1.248, inc. I13, como forma de acessão, a formação
11 Neste sentido: FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 274: “A acessão se
qualifica como natural ou artificial, dependendo da constatação da
participação ou não da atividade humana para a efetivação da
aquisição originária. A acessão natural invariavelmente decorre de
um evento da natureza, fato jurídico stricto sensu, cujas modalidades
são a formação de ilhas, a aluvião, a avulsão e o abandono de álveo”. 12 DINIZ, 2011, p. 151. 13 BRASIL. Lei Nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o
Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso
16
de ilha no leito de rio, considerado pela legislação pátria
como não navegável, dá ensejo à propriedade dos
titulares das margens ribeirinhas, na proporção de suas
testadas14. É denominado como insula in flumine nata.
No mais, saliente-se, por oportuno, que a formação da
ilha só terá o condão de beneficiar um particular quando,
em decorrência de fenômeno natural, surgir um pedaço
de terra, em rio não navegável. Ao lado do entalhado,
pode-se, ainda, citar as lições de Venosa, notadamente
quando, em altos alaridos, pontua que:
O fenômeno pode decorrer da sedimentação
paulatina que faz nascer a ilha ou pelo
rebaixamento das águas que coloca o solo à
mostra no leito do rio. As ilhas formadas no
meio do rio são consideradas acréscimos aos
terrenos ribeirinhos. Divide-se o rio pela
linha da metade do álveo, fracionando-se a
ilhas em duas partes15.
Há, ainda, duas situações passíveis de ocorrerem,
em se tratando de formação de ilhas. A primeira dá conta
da possibilidade que, em surgindo a ilha entre a linha
em: 18 jan. 2012: Art. 1.248. A acessão pode dar-se: I - por formação
de ilhas; 14 Neste sentido: FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 388: “Pertencerá
aos proprietários ribeirinhos fronteiros, se formada no meio do rio”. 15 VENOSA, 2010, p. 197.
17
mediana do rio e uma das margens, a formação não
beneficiará os ribeirinhos que tenham propriedade do
lado oposto à acessão, aproveitando tão somente os do
mesmo lado do surgimento. Outra hipótese, trazida à
baila por Diniz16-17, dá conta de, em abrindo o braço do
rio a terra, a ilha resultante continuará a pertencer aos
proprietários cujas áreas derem ensejo a acessão.
Todavia, tal situação não vigorará, caso o rio seja público,
eis que a ilha passará a pertencer ao domínio público,
sendo devidamente indenizado o proprietário, nos termos
que dispõe o parágrafo único do art. 24 do Código de
Águas18.
Ademais, gize-se, que em restando configurada a
formação de ilha em rio navegável, a acessão ocorrente
16 DINIZ, 2011, p. 154. 17 Neste sentido: FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 389: “Não há
acessão se a ilha origina-se de um trato de terra destacado do
terreno (continua a pertencer ao proprietário), bem como se a ilha
surgir do desdobramento de um novo braço do rio, pois o terreno
ilhado continua a pertencer a seu dono”. 18 BRASIL. Decreto Nº. 26.643, de 10 de Julho de 1934. Decreta
o Código de Águas. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>.
Acesso em: 18 jan. 2012: Art. 24. As ilhas ou ilhotas, que se
formarem, pelo desdobramento de um novo braço de corrente,
pertencem aos proprietários dos terrenos, a custa dos quais se
formaram. Parágrafo único. Se a corrente, porém, é navegável ou
flutuável, eles poderão entrar para o domínio público, mediante
prévia indenização.
18
aproveitará pessoa jurídica de Direito Público, uma vez
que as águas navegáveis são consideradas pública, como
bem arrazoa a redação do art. 2º do Código das Águas19.
De igual modo, há que se frisar, com supedâneo no art.
20, inc. IV, da Constituição Federal de 198820, que as
ilhas fluviais e lacustres que estejam localizadas em zona
fronteiriça com outros países, assim como as ilhas
oceânicas, são consideradas como pertencentes à União.
4 DA ACESSÃO POR FORMAÇÃO DE ALUVIÃO
Consagrada no ordenamento jurídico brasileiro
como uma das modalidades de acessão, a formação de
aluvião encontra descanso no inc. II do art. 1.248 do
19 BRASIL. Decreto Nº. 26.643, de 10 de Julho de 1934. Decreta
o Código de Águas. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>.
Acesso em: 18 jan. 2012: Art. 2º São águas públicas de uso comum:
[omissis] b) as correntes, canais, lagos e lagoas navegáveis ou
flutuáveis; 20 Idem. Constituição (1988). Constituição (da) República
Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 18 jan. 2012: Art. 20.
São bens da União: [omissis] IV as ilhas fluviais e lacustres nas
zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas
oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede
de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a
unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II.
19
Código Civil. Em linhas meramente conceituais,
considera-se a substancialização da aluvião quando há
um acréscimo paulatino de terras às margens de um rio
ou de uma corrente, por intermédio de imperceptíveis e
lentos depósitos ou aterros tidos como naturais ou
proveniente dos desvios das águas. Impende frisar que
mencionados acréscimos importam em aquisição de
propriedade por parte do proprietário do imóvel acedido.
Novamente, ressoa como norte a ser observado o
princípio que o acessório segue o principal.
Neste passo, necessário se faz trazer a lume uma
singela distinção entre aluvião própria e a imprópria. A
primeira consiste no “acréscimo paulatino de terras que o
rio deixa naturalmente nos terrenos ribeirinhos”21. Já a
segunda é “o acréscimo que se forma quando parte do
álveo (superfície que as águas não cobrem – leito do rio)
descobre-se em razão do afastamento das águas
correntes (aluvião imprópria), muitas vezes como
consequências de lesões ambientais”22. Em suma, a
primeira espécie decorre de acréscimos à porção da terra
21 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 389. 22 Ibid.
20
enquanto que a segunda é fruto do afastamento das
águas23.
Ao lado do apresentado, necessário se faz trazer à
colação o art. 1.250 do Código Civil vigente que assim
verbaliza: “Os acréscimos formados, sucessiva e
imperceptivelmente por depósitos e aterros naturais ao
longo das margens das correntes, ou pelo desvio das
águas destas, pertencem aos donos dos terrenos
marginais, sem indenização”. Neste sentido, ainda, tendo
como pilar de estruturação as disposições contidas nos
arts. 16 e 17 do Código das Águas, verifica-se que tais
ponderações não vigoram quando os acréscimos se
formarem às margens de águas públicas ou dominiais.
Em restando configurada tal hipótese, considera-se a
aluvião como bem público dominial, caso não esteja
destinado ao uso comum ou se não pertencer ao domínio
particular.
No que concerne à propriedade da aluvião
formada, o parágrafo único do art. 1.250 do Estatuto de
23 Neste sentido: DINIZ, 2011, p. 155: “Será própria a aluvião
quando o acréscimo se forma pelos depósitos ou aterros naturais nos
terrenos marginais do rio. E imprópria quando tal acréscimo se
forma em razão do afastamento das águas que descobrem parte do
álveo”.
21
2002 destaca que, em ocorrendo a formação da aluvião
em frente a prédios pertencentes a proprietários
distintos, a divisão será feita entre eles, observando-se,
em proporção, à testada que cada um dos prédios
apresentava sobre a antiga margem. “E o proprietário do
imóvel de onde saíram as porções de terra, que, por fato
da natureza, se acrescentaram ao de outro, não terá
direito a nenhuma indenização”24, vez que o evento que
deu azo à acessão ocorreu de modo lento e vagaroso,
impossibilitando a apreciação da quantidade acrecida no
acedido. Quadra, também, pôr ênfase que o proprietário
que se beneficiar com a aluvião proveniente do
deslocamento das águas de um rio, não será obrigado a
ressarcir aquele que suportou o refluxo. Cuida destacar
que este suportará sozinho o dano25.
Dispunha o art. 539 do Código Civil de 191626 que,
em se tratando do fenômeno de águas dormentes, como
24 DINIZ, 2011, p. 155. 25 FARIAS & ROSENVALD, 2011, p. 389. 26 BRASIL. Lei Nº. 3.071, de 1º de Janeiro de 1916. Código Civil
dos Estados Unidos do Brasil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 18 jan. 2012: Art. 539. Os
donos de terrenos que confiem com águas dormentes, como as de
lagos e tanques, não adquirem o solo descoberto pela retração delas,
nem perdem o que elas invadirem.
22
ocorre em lagos e tanques, não haverá a materialização
do fenômeno da aluvião, porquanto os acréscimos são
proveniente de fluxos hídricos correntes27. Tal fato se dá,
repita-se, porque o acréscimo de sedimento não é
paulatino ou lento, constituído por depósito de materiais
arrastados com a corrente, opondo-se, deste modo, a
concepção de acessão. Há que se evidenciar que o mesmo
não vigora se o lago pertencer ao domínio particular,
restando configurada a aquisição de propriedade por
formação de aluvião. Outrossim, os proprietários que têm
suas propriedades invadidas por águas dormentes ou,
ainda, de forma temporária também não perderão sua
propriedade, como ocorre, por exemplo, nos fenômenos
naturais de enchentes28.
Por derradeiro, faz-se premente ponderar que a
aluvião é fenômeno de cunho natural, ou seja, decorre da
atuação da própria natureza, logo, não comporta
produção artificial, fruto da atuação antrópica. Nesta
esteira, acena como razoável trazer à colação que não dá
corpo à aluvião os aterros feitos artificialmente ou
mesmo os acréscimos de terra decorrente da ação dos
27 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 389. 28 VENOSA, 2010, p. 199.
23
ribeirinhos, com o escopo de modificar as medições de
suas propriedades. Em restando configurado o dano a
terceiro, devido à mencionada atuação, o proprietário
deverá ressarcir àquele.
5 DA ACESSÃO POR FORMAÇÃO DE AVULSÃO
Elencado no redação do art. 1.248, inc. III, do
Código Civil vigente, a acessão em decorrência da
avulsão tem como aspecto preponderante a ser observado
o deslocamento repentino de determinada porção de
terra, em razão da atuação das forças naturais, que dá de
forma violenta. Neste sentido, inclusive, impera trazer à
baila a redação do art. 1.251 do Estatuto Civilista de
2002, que assim entalha:
Art. 1.251. Quando, por força natural
violenta, uma porção de terra se destacar de
um prédio e se juntar a outro, o dono deste
adquirirá a propriedade do acréscimo, se
indenizar o dono do primeiro ou, sem
indenização, se, em um ano, ninguém
houver reclamado. Parágrafo único.
Recusando-se ao pagamento de indenização,
o dono do prédio a que se juntou a porção de
24
terra deverá aquiescer a que se remova a
parte acrescida29.
Consoante se depreende da redação do dispositivo
ora aludido, denota-se que a avulsão consiste no
desprendimento, por força natural, abrupta e violenta, de
uma determinada porção e reconhecível de um prédio,
que se junta ao terreno de outro proprietário, ocorrendo,
por conseguinte, a consolidação de duas coisas em uma.
Segundo Rodrigues, ocorre avulsão quando, “por força
natural violenta uma porção de terra se destaca de um
prédio e se junta a outro”30.
Por oportuno, há que se citar a redação do art. 19
do Código de Águas, que traz em sua redação o requisito
reconhecibilidade do objeto que se une a propriedade de
outrem, quando assim dicciona: “Art. 19. Verifica-se a
'avulsão' quando a força súbita da corrente arrancar uma
parte considerável e reconhecível de um prédio,
29 BRASIL. Lei Nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o
Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso
em: 18 jan. 2012. 30 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 5.
São Paulo: Editora Saraiva, 2009, p. 101.
25
arrojando-a sobre outro prédio”31. Há que se evidenciar
que o fenômeno da avulsão ocorre em correntes de
grandes e rápidos caudais. O direito pátrio tem em conta
apenas a aderência natural, não se admitindo ações
antrópicas para a configuração da acessão por avulsão.
Consoante leciona Venosa, “a situação ocorre não apenas
quando há aumento da extensão de área, mas também
quando há superposição de terreno, acrescendo seu
volume”32.
O proprietário que é beneficiado pelo súbito
deslocamento de terra tão-somente consolidará a
titularidade sobre a coisa acrescida, caso o proprietário
desfalcado mantenha-se inerte em exercer o direito de
exigir a sua parte desfalcada. Para tanto, a legislação
vigente fixa, prazo decadencial, a contagem de um (01)
ano, a contar da data do fenômeno ocorrido, ou seja, o
deslocamento do prédio33. Vale registrar que a porção de
31 BRASIL. Decreto Nº. 26.643, de 10 de Julho de 1934. Decreta
o Código de Águas. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>.
Acesso em: 18 jan. 2012. 32 VENOSA, 2010, p. 200. 33 Neste sentido: DINIZ, 2011, p. 157: “O dono do imóvel que sofra a
avulsão tem, portanto, o prazo de decadência de um ano (CC, art.
1.251, in fine; Código das Águas, art. 20) para reclamar o fato; se não
o fizer dentro desse lapso de tempo perderá o direito de receber a
26
terra desgarrada contínua a ser pertencente a seu
proprietário, até que deflua o lapso temporal decadencial
assinalado em lei. “Note-se que, no prazo decadencial, o
titular do prédio acrescido terá o direito potestativo de
optar entre aquiescer que se remova a parte acrescida ou
indenizar o dono da propriedade do qual se destacara a
porção de terra”34.
A indenização, no caso da acessão em comento,
representa hipótese real de responsabilidade objetivo,
porquanto o ressarcimento dá-se independentemente da
culpa do novo proprietário. Trata-se, em tal caso, de
repúdio ao enriquecimento ilícito por parte do
proprietário que tem acrescida em sua propriedade área
que outrora pertencia a outrem. Por óbvio, uma vez
optando pela indenização, o antigo proprietário perde as
acessões que se destacaram de seu terreno; todavia, em
sendo a escolha pela retomada, não subsiste qualquer
dominial a ser discutida, vez que retorna a coisa ao
estado anterior. Defluindo o lapso temporal de um ano, e
indenização e o proprietário do prédio favorecido adquirirá a
propriedade do acréscimo, sem efetuar qualquer pagamento”. 34 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 390.
27
permanecendo silente o proprietário perdente, a terra é
incorporada de maneira gratuita e definitiva ao domínio.
Insta destacar, ainda, que a avulsão só tem
configuração quando se tratar de uma porção de terra.
Deste modo, demais objetos destacados de um imóvel e
levados por força violenta a outro terreno, sem aderência
ao prédio, são considerados coisas perdidas, portanto,
deve o proprietário restituí-los, aplicando-se, em tal
situação às regências do instituto da descoberta. “O art.
543 do Código Civil de 1916 combinado com o art. 21 do
Código das Águas prescrevia que, quando a avulsão fosse
alusiva a coisa insuscetível de aderência natural, aplicar-
se-ia o disposto quanto às coisas achadas”35.
6 DA ACESSÃO POR ÁLVEO ABANDONADO
Inicialmente, em termos meramente conceituais,
pode-se apresentar álveo como “a superfície que as águas
cobrem sem transbordar para o solo natural e
ordinariamente enxuto”, como bem arrazoa o art. 9º do
Código das Águas. Desta feita, considera-se ocorrente a
35 DINIZ, 2011, p. 157.
28
acessão por álveo abandonado (alveo derelictus) quando
há um permanente e total abandono do fluxo das águas
em um leito, pertencente a propriedade particular, ou
seja, rio considerado não navegável. Deve-se pontuar que
o álveo fica inteiramente descoberto, passando, por
consequência, a pertencer aos proprietários ribeirinhos
de ambas as margens36, observando-se as mesmas regras
estabelecidas no tocante à formação de ilhas. Assim,
frise-se que o fenômeno do álveo abandonado tem assento
quando o rio seca, de forma permanente, ou mesmo seu
curso é desviado, em decorrência de fenômeno natural.
Evidencia-se que “ocorrendo desvio da corrente de
água, os proprietários das terras por onde as águas
naturalmente abrem novo curso não têm direito à
indenização, idêntica solução do Direito Romano. Trata-
se de caso fortuito”37. Contudo, em restando
consubstanciado o desvio do fluxo natural das águas, por
meio artificial, obviamente a perda do terreno deverá ser
alvo de indenização, visto que o abandono do álveo não se
deu de forma natural, mas sim em decorrência da ação
antrópica. “Se a mudança da corrente se fez por utilidade
36 Neste sentido: FARIAS & ROSENVALD, 2011, p. 390. 37 VENOSA, 2010, p. 201.
29
pública, o prédio ocupado pelo novo álveo deve ser
indenizado, e o álveo abandonado passa a pertencer ao
expropriante para que se compense da despesa feita”38,
como bem apresenta o art. 27 do Decreto Nº. 26.
643/1934. Neste sentido, há que transcrever o
entendimento jurisprudencial que acena:
Ementa: Processo Civil. Agravo no Recurso
Especial. Ação de divisão. Desvio do curso do
rio. Utilidade pública. Álveo abandonado.
Propriedade do Estado. Código de Águas, art.
27. Litigância de má-fé. Atentado à verdade
dos fatos. Reexame de prova. Prova do
prejuízo e julgamento extra petita.
Prequestionamento. Ausência. - Se o rio teve
seu curso alterado por ingerência do Poder
Público, e não por fato exclusivo da natureza,
pertence ao expropriante a fração de terra
correspondente ao álveo abandonado. [...]
(Superior Tribunal de Justiça. Órgão
Julgador: Terceira Turma. AgRg no REsp
431698/SP. Rel. Ministra Nancy Andrighi.
Julgado em 27.08.2002. Publicado no DJ
30.09.2002, p. 259) (grifo nosso)
Conquanto a concepção de álveo abandonado,
enquanto forma de acessão, esteja atrelada ao abandono,
de modo permanente, do antigo leito do rio, subsiste a
38 BRASIL. Decreto Nº. 26.643, de 10 de Julho de 1934. Decreta
o Código de Águas. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>.
Acesso em: 18 jan. 2012.
30
possibilidade de que o fluxo hídrico retorne, em
decorrência das forças naturais, ao seu curso inicial. Tal
hipótese decorrerá de suas situações distintas, a saber: a
primeira se dá quando há o desvio de maneira natural,
passando, em razão disso, a recompor a situação
dominial anterior, isto é, os proprietários dos terrenos
invadidos pelo novo curso do fluxo hídrico voltam a sê-lo,
inexistindo o dever de indenização; a segunda situação
possível decorre da ação humana, ou seja, o abandono do
álveo é fruto da intervenção antrópica, por meio da qual
o rio retorna a seu antigo leito, continuando a pertencer
ao expropriante. Todavia, nesta última possibilidade,
nada impede que “os antigos donos, preferindo obter de
volta suas propriedades, resolvam indenizar o Estado”39.
Arrazoa, ainda, o art. 26 do Código das Águas:
Art. 26. O álveo abandonado da corrente
pública pertence aos proprietários
ribeirinhos das duas margens, sem que
tenham direito a indenização alguma os
donos dos terrenos por onde as águas
abrigarem novo curso. Parágrafo único.
Retornando o rio ao seu antigo leito, o
abandonado volta aos seus antigos donos,
39 DINIZ, 2011, p. 159.
31
salvo a hipótese do artigo seguinte, a não
ser que esses donos indenizem ao Estado40.
7 DA ACESSÃO POR PLANTAÇÕES E
CONSTRUÇÕES: ACESSÃO ARTIFICIAL
Em contraposição às modalidades espancadas até
o presente momento, as plantações e construções são
consideradas como espécies do gênero acessão artificial,
porquanto é resultante da ação antrópica e não da
natureza. Em similar substrato, colhe-se o entendimento
de Diniz, em especial quando destaca que “as acessões
artificiais são as que derivam de um comportamento
ativo do homem, dentre elas as semeaduras, plantações e
construções de obras”41. Ora, por tais lições, denota-se
que ação humana é o aspecto caracterizador das
denominadas acessões artificiais; repita-se, inexiste a
atuação da natureza.
Ao lado do esposado, há que se pontuar que “o
fenômeno da acessão artificial de móvel a imóvel é
40 BRASIL. Decreto Nº. 26.643, de 10 de Julho de 1934. Decreta o
Código de Águas. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>.
Acesso em: 18 jan. 2012. 41 DINIZ, 2011, p. 159.
32
verificado nas hipóteses de realização de construções e
plantações, quando a titularidade das sementes,
plantações e materiais de construção não coincidir com a
do terreno em que aqueles bens acedem”42. Por mais uma
vez, subsiste no tema em testilha a prevalência do
princípio que o acessório segue o principal. Logo, em
sendo o solo reconhecido como a coisa principal, também
nomeada de acedida, tudo que for incorporado a sua
superfície passará a pertencer ao proprietário,
integrando essencialmente.
Nessa senda, pode-se considerar como presunção a
premissa de que toda construção e/ou plantação erigida
no terreno foi feita pelo proprietário, comportando,
obviamente, a produção de prova contrária, como bem
dicciona o art. 1.253 do Código Civil: “Art. 1.253. Toda
construção ou plantação existente em um terreno
presume-se feita pelo proprietário e à sua custa, até que
se prove o contrário”43. Ora, há que se reconhecer, em
razão de tais preceitos que a presunção existente, no caso
42 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 391. 43 BRASIL. Lei Nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o
Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso
em: 18 jan. 2012.
33
em tela, é relativa, sendo elidida, por exemplo, com a
demonstração que explicite relação contratual mantida
com o proprietário da área acedida.
No mais, há que se aclarar que as acessões
artificiais em nada se confundem com as benfeitorias.
Estas encontram-se inclusas na classe de coisas
acessórias, disciplinadas pelo art. 96 do Código Civil
vigente, sendo apresentadas, comumente, como obras ou
mesmo despesas estruturadas com o escopo de conservá-
la (sendo nomeada como benfeitoria necessária), melhorá-
la (chamada de benfeitoria útil) ou ainda trazer beleza
(denominada de benfeitoria voluptuária). De outra
banda, impera evidenciar que as acessões artificiais
substancializam modos de aquisição de propriedade
imobiliária, de forma originária, uma vez que criam
coisas novas que se aderem a propriedade já existente.
Além disso, calha sustar que as benfeitorias
efetuadas no imóvel com o intuito de facilitar/viabilizar o
uso do imóvel, bem como adequar o imóvel à atividade
desenvolvida não se coaduna com a concepção de
benfeitoria necessária, mas sim a acessão. “Logo, as
edificações feitas pela locatária sobre o terreno locado
34
não constituem benfeitoria atributiva de direito de
indenização, mas sim acessão”44. Desta forma, que, em
subsistindo a possibilidade versada acima, o locatário,
por exemplo, não terá direito a retenção ou mesmo ao
percebimento de indenização pelas acessões erigidas,
podendo tão somente proceder a retirada do que lá foi
colocando, atentando-se que tal ato não poderá afetar a
estrutura ou substância da propriedade preexistente. No
tocante ao tema, há que se trazer à colação os seguintes
precedentes jurisprudenciais:
Ementa: Apelação Cível. Locação. Ação de
despejo. Indenização. Benfeitorias. Cláusula
que veda a retenção e/ou indenização.
ACESSÃO. Inviável proceder a pretensão
reparatória da locatária, uma vez que
realizou edificações apenas no intuito de
viabilizar seu estabelecimento comercial, no
imóvel locado. Precedentes. Negaram
provimento ao apelo. Unânime. (Tribunal de
Justiça do Estado do Rio Grande do Sul –
Décima Quinta Câmara Cível/ Apelação
Cível Nº. 70044508141/ Rel. Desembargador
Otávio Augusto de Freitas Barcellos/
Julgado em 14.12.2011) (destaque nosso)
44 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Órgão Julgador:
Décima Quinta Câmara Cível. Apelação Cível Nº. 70044508141.
Relator Desembargador Otávio Augusto de Freitas Barcellos.
Julgado em 14.12.2011. Disponível em: <www.tjrs.jus.br>. Acesso
em: 18 jan. 2012.
35
Ementa: Locação. Despejo retomada.
Terreno. Fins comerciais. Estacionamento
de veículos. Benfeitorias. Acessões.
Indenização. Retenção. Descabimento. [...].
Na espécie, em verdade, não se tratam de
benfeitorias, mas de acessões, pois a locação
foi de um terreno sem construções. Acessões
não dão direito de retenção do imóvel.
Construções efetuadas pelo locatário apenas
para adaptar o imóvel ao comércio nele a ser
exercido devem ser retiradas e não
indenizadas pelo locador. [...]. Recurso
Desprovido. (Tribunal de Justiça do Estado
do Rio Grande do Sul – Décima Quinta
Câmara Cível/ Apelação Cível Nº
70012539979/ Rel. Desembargador Ricardo
Raupp Ruschel/ Julgado em 26.10.2005)
(destaque nosso)
Em contraponto ao expendido, por necessário, faz-
se imprescindível trazer à colação o entendimento
consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça no qual as
acessões só serão equiparadas às benfeitorias, no que
concerne ao percebimento de indenização, se restar
demonstrada a boa fé do possuidor. Vale realçar que, por
este entendimento, o possuidor de boa fé, inclusive,
poderá se valer do direito de retenção do bem, enquanto
não houver o pagamento da verba indenizatória a que faz
jus. "O direito à indenização só se admite nos casos em
que há boa fé do possuidor e seu fundamento sustenta-se
36
na proibição do Ordenamento Jurídico ao enriquecimento
sem causa do proprietário, em prejuízo do possuidor de
boa fé"45. Neste caminho, impõe transcrever o seguinte
precedente:
Ementa: Acessão. Construções. Posse de
boa-fé. Retenção. O possuidor de boa-fé tem
direito à retenção do bem enquanto não
indenizado pelas construções (acessões)
erguidas sobre o imóvel. Precedentes.
Recurso conhecido e provido. (Superior
Tribunal de Justiça – Quarta Turma/
Recurso Especial nº 430.810/MS/ Relator
Ministro. Ruy Rosado de Aguiar/ Publicado
no DJ em 18.11.2002). (destaque nosso)
Ainda no que tange ao instituto em apreciação,
faz-se necessário trazer à colação as situações peculiares
consagradas pelo ordenamento jurídico e que consistem
nas presunções em que, comprovadamente, as
semeaduras, plantações e construções não pertencem ao
dono do solo a que se incorporam. Para tanto, impõe
dispensar uma análise as três hipóteses albergadas pela
legislação pátria:
45 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Órgão Julgador:
Primeira Turma. REsp 245.758/PE. Relator Ministro José Delgado.
Julgado em: 11.04.2000. Publicado no DJ em 15 mai. 2000, p.144.
Disponível em: <http://www.stf.jus.br/>. Acesso em: 18 jan. 2012.
37
A. Semeadura, plantação ou construção em terreno
próprio com sementes, plantas ou materiais
alheios:
Encontra-se consagrada tal hipótese na redação do
art. 1.254 do Código Civil e dá corpo, por mais uma vez,
ao preceito da gravitação, no qual a coisa acessória segue
a principal. Em ocorrendo tal situação, há que se
reconhecer que aquele que utilizou de sementes, plantas
ou materiais alheios não perderá a propriedade sobre a
plantação ou construção erigida em sua propriedade.
Ora, arrimando-se em aspectos irradiados pelo interesse
social, não há qualquer utilidade em se destruir a
semeadura, plantação ou construção.
Nesse sentido, inclusive, coaduna com o exposto o
entendimento de Farias & Rosenvald, notadamente
quando acinzelam que “a resposta dada pelo legislador
consiste na aquisição da construção ou plantação por
parte do proprietário do terreno, face à impossibilidade
natural da restituição dos materiais e plantas sem
38
estrago ou deterioração”46. Todavia, impera evidenciar
que o dono da coisa acedida deverá indenizar ao
proprietário das sementes, plantas ou materiais
utilizados, com o escopo de combater o enriquecimento
ilícito. “Pagando-se o valor dos materiais e sementes
deixa de haver locupletamento ilícito do proprietário;
contudo se houver qualquer prejuízo ao dono dos
materiais ou das plantas, superior àquele valor, o mesmo
não será ressarcido ante a boa-fé do outro interessado”47.
Mister se faz arrazoar que o terceiro deverá
demonstrar a sua condição dos materiais de construção,
plantas e sementes, que foram, de maneira indevida,
utilizados, a fim de que possa ser indenizado. Tal fato
decorre, logicamente, em razão da presunção relativa que
salvaguarda o titular do terreno, como bem espanca o
art. 1.253 do Código Civil, citado alhures. Se, porventura,
o possuidor agiu de boa-fé ao plantar ou construir em seu
terreno, em razão de ignorar que aludidos materiais
pertenciam a terceira pessoa, indenizará ao verdadeiro
proprietário o valor dos materiais, sementes ou plantas.
46 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 393. 47DINIZ, 2011, p. 160.
39
Em tal situação, a indenização está adstrita tão somente
ao que foi perdido.
Entrementes, em restando devidamente
demonstrado que o proprietário agiu de má-fé, deverá,
além de ressarcir ao terceiro com os valores dos
materiais, sementes ou plantas, também responderá por
perdas e danos48. Ofertando o sedimento legal, impõe
trazer à colação a redação do art. 1.254 do Estatuto
Civilista vigente, que assim dispõe: “Art. 1.254. Aquele
que semeia, planta ou edifica em terreno próprio com
sementes, plantas ou materiais alheios, adquire a
propriedade destes; mas fica obrigado a pagar-lhes o
valor, além de responder por perdas e danos, se agiu de
má-fé”49.
Contudo, caso os materiais e as plantas não
tenham sido incorporados ao solo, a norma contida no
48 Neste sentido: VENOSA, Sílvio de Salvo. Código Civil
Interpretado. São Paulo: Editora Atlas, 2010, p. 1.132: “A primeira
hipótese é solucionada pelo art. 1.254. Aquele que semeia, planta ou
edifica em terreno próprio com sementes, plantas ou materiais
alheios adquire sua propriedade, mas deve pagar o valor das coisas
alheias utilizadas. Se estiver de má-fé, além da indenização
deverá pagar perdas e danos”. 49 BRASIL. Lei Nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o
Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso
em: 18 jan. 2012.
40
dispositivo supra não terá aplicação, porquanto tais bens
passarão a ser definidos como pertenças e não mais como
acessões, aplicando-se, por conseguinte, as regras
contidas no art. 93 do Estatuto Civilista. Tal fato se dá
em razão de manterem sua autonomia e individualidade,
podendo ser reivindicados pelo real proprietário, sem que
isso possa afetar a coisa principal.
B. Semeadura, plantação ou construção em
terreno alheio com sementes, plantas ou materiais
próprios:
No tocante à edificação/construção, semeadura ou
plantação, formas de acessão artificial, em terreno
alheio, o regime jurídico da indenização (diversa do
regimento jurídico das benfeitorias), assim encontra-se
regulada no atual Código Civil: “Art. 1.255. Aquele que
semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em
proveito do proprietário, as sementes, plantas e
construções; se procedeu de boa-fé, terá direito a
41
indenização”50. Ora, verifica-se que a regra insculpida
acena no sentido de que “o simples fato de construção,
semeadura ou plantação constitui a acessão e esta
produz, de pleno direito, a aquisição da propriedade da
coisa acedida em favor do proprietário do solo, a quem
fica pertencendo, ex vi legis”51.
Ao lado disso, saliente-se que pela redação do
dispositivo em tela, o semeador, o plantador ou o
construtor em terreno alheio perde para o proprietário as
coisas, com direito a receber a competente indenização,
caso tenha agido com boa-fé. Neste mesmo sentido,
averbe-se que a perda da coisa acedida para o dono do
solo, não tem o condão, por si só, de retirar o direito do
terceiro, que agiu orientado pela boa fé, à verba
indenizatória, que deverá ser fixada observando-se o
valor patrimonial da coisa acedida. “O credor do direito à
indenização (ex-dono da coisa acedida) não tem garantia
real derivada de seu crédito, nem a lei lhe garante direito
50 BRASIL. Lei Nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o
Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso
em: 18 jan. 2012 51 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código
Civil Comentado, 7 ed. (rev., ampl. e atual. Até 25.8.2009). São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 971.
42
de retenção, mesmo porque não seria o caso dessa
providência”52. No caso em apreço, impõe negritar que o
direito à percepção da indenização é meramente
obrigacional; não é real, nem decorrente da posse53.
Noutra perspectiva, em sendo devidamente
consubstanciada a má-fé do responsável pela acessão,
impera realçar que nada receberá a título de
indenização. Ora, depreende-se do escopo contido na
norma em testilha que o fito salvaguardado é evitar o
enriquecimento ilícito do proprietário, assim como do
dono dos materiais empregados na acessão artificial,
para que de sua atuação indevida não possa colher
nenhum fruto nem perceber a indenização.
52 NERY JÚNIOR; NERY, 2009, p. 271. 53 Neste sentido: RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. [...]
1. Não há falar em direito de propriedade (direito real) com relação à
construção edificada em terreno de terceiro (mãe do companheiro),
pois a acessão é forma de aquisição de propriedade e o proprietário
do solo será o proprietário da coisa acedida. 2. Imperativo consignar,
expressamente, que o direito de postular indenização contra o
proprietário do terreno, previsto no art. 1.255 do CCB, de natureza
pessoal e obrigacional, somente poderá ser exercido por aquele que
ressarciu o outro, ficando sub-rogado nos direitos e ações respectivos.
[...]. Negaram Provimento à Apelação. Acórdão Proferido em
Apelação Cível Nº 70044315240. Relator: Desembargador Luiz
Felipe Brasil Santos. DJ 19 nov. 2011. Disponível em:
<http://www.tjrs.jus.br/>. Acesso em: 18 jan. 2012.
43
O Código Civil de 2002, apresentando uma nova
realidade, mitigou o clássico preceito que orientava o
estudo da acessão, como modo de aquisição originária,
como restou consagrado na redação do parágrafo único do
art. 1.255. Verifica-se, em um contato primitivo com a
estruturo do dispositivo supra, que há uma derrogação do
axioma que o solo figura como coisa principal e todo o
resto acedido se recobre com o status de acessório. Insta
evidenciar que se trata “do modelo jurídico da acessão
inversa, lastreada na função social, que, aliás, já fazia
parte do anteprojeto do Código Civil de Orlando Gomes
(art. 442)”54.
É imprescindível compreender que determinadas
edificações tornam-se mais rotundas, a partir de uma
ótica socioeconômica, do que as áreas sobre as quais
foram erigidas. No mais, o diploma regulador combate o
proprietário desidioso que se beneficia do sacrifício feito
pelo construtor de boa-fé, nada fazendo para impedir a
acessão. Deste modo, em inexistindo oposição por parte
do proprietário do solo, restará a este tão somente a
percepção de quantun indenizatório, a ser pago pelo
54 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 396.
44
terceiro de boa-fé que edificou a construção, valores estes
arbitrados pelo juiz, em situação que não reste
possibilitada a construção de uma avença.
Por derradeiro a expressão “exceder
consideravelmente o valor do terreno”, contida no
parágrafo único do art. 1.255 do Códex de 2002, é
conceito jurídico revestido de indeterminabilidade, que
será devidamente preenchido pelo julgador, atentando-se
para as circunstâncias singulares do caso concreto
colocado em apreciação. Quadra avultar que as balizas
que fixam os pontos limítrofes da expressão mencionada
alhures não se adstringe tão somente a preceitos e
dogmas econômicos que recubram a acessão, estando, de
igual maneira, alicerçada nos valores sociais que possam
influir na edificação.
C. Semeadura, plantação ou construção em terreno
alheio com sementes, plantas ou materiais próprios,
com comportamento de má-fé de ambas as partes:
A terceira situação consagrada no Ordenamento
Jurídico Pátrio trata da situação em que se verifica a
45
presença de má-fé tanto do possuidor quanto do
proprietário, há uma bilateralidade. Em tal situação, o
proprietário da coisa principal manterá sua propriedade,
todavia, como forma de reprimenda pelo comportamento
desidioso, deverá indenizar o possuidor, também de má-
fé, das sementes, plantas ou materiais. “A má-fé bilateral
será encarada nos efeitos como se fosse a boa-fé de quem
realizou a acessão, eis que nada poderá o proprietário
dele reclamar, por ter anuído ao seu comportamento, já
que não impugnou judicialmente ou extrajudicialmente a
realização das obras”55, conquanto tivesse ciência das
mesmas.
Na hipótese vertida no art. 1.256, dispositivo que
disciplina tal situação, o proprietário não terá direito de
vindicar indenização, devendo, de outra banda, indenizar
o possuidor, atentando-se para o valor atualizado da
acessão artificial. Como aduz Diniz, “presume-se má-fé
no proprietário quando o trabalhado de construção ou
lavoura se fez em sua presença e sem sua impugnação
(art. 1.256, parágrafo único). Caso em que se entende que
55 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 397.
46
o edificador ou lavrador se encontrava de boa-fé, dado o
consentimento tácito do dono da terra”56.
7.1 Construções em Imóvel Alheio
Ainda no que concerne ao estudo das acessões
artificiais, infere-se que os arts. 1.258 e 1.259 do Estatuto
Civilista inovou, maciçamente, invocando o princípio
constitucional da função social da propriedade. Os
dispositivos ora mencionados, tal como ocorre na redação
do parágrafo único do art. 1.255, apresentaram exceções
ao brocardo superficies solo cedit, jungindo-se tão
somente às construções. O art. 1.258 prestigia a boa-fé do
construtor, evitando, por conseguinte, a demolição de
construção de valor considerável, que, porventura,
invadiu pequena área (1/20) do proprietário vizinho,
desde que o proprietário beneficiado proceda a
indenização ao vizinho do solo invadido, atentando-se,
inclusive, para a possível desvalorização da área
remanescente.
56 DINIZ, 2011, p. 163.
47
Entremente, se restou demonstrada a má-fé do
proprietário beneficiado ao erigir sua edificação, dicciona
o parágrafo único do art. 1.258 do Código Civil que esse
deverá indenizar, a fim de que obtenha a propriedade,
com o décuplo do valor relativa a perdas e danos, caso
tivesse atuado com boa-fé. “Tratando-se de
comportamento ardiloso do possuidor, o legislador não se
contenta com qualquer construção em solo alheio, mas
apenas aquela que exceda consideravelmente o valor e
não se puder demolir sem grave prejuízo para a
edificação”57. Neste sentido, colhe-se da redação do
dispositivo em destaque:
Art. 1.258. Se a construção, feita
parcialmente em solo próprio, invade solo
alheio em proporção não superior à
vigésima parte deste, adquire o construtor
de boa-fé a propriedade da parte do solo
invadido, se o valor da construção exceder o
dessa parte, e responde por indenização que
represente, também, o valor da área
perdida e a desvalorização da área
remanescente. Parágrafo único. Pagando
em décuplo as perdas e danos previstos
neste artigo, o construtor de má-fé adquire
a propriedade da parte do solo que invadiu,
se em proporção à vigésima parte deste e o
57 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 398.
48
valor da construção exceder
consideravelmente o dessa parte e não se
puder demolir a porção invasora sem grave
prejuízo para a construção58.
Importante realçar, ainda, que no tema entelado,
há que se trazer a lume a redação do enunciado 318 do
Conselho de Justiça Federal que dispõe: “O direito à
aquisição da propriedade do solo em favor do construtor
de má-fé (art. 1.258, parágrafo único) somente é viável
quando, além dos requisitos explícitos previstos em lei,
houver necessidade de proteger terceiros de boa-fé”. Vale
salientar que o teor do enunciado supra apenas ressoa a
realidade de muitos assentamentos irregulares, nos
quais essas pequenas invasões (5% do solo vizinho) é algo
costumeiro, em razão das ausências de marcos
reguladores ou escassez de informações sobre a própria
área.
Vale arrazoar que, em ambas as hipóteses
previstas no art. 1.258 do Código Civil, há uma pequena
desapropriação, no que pertine ao interesse privado,
restando salvaguardado tão somente o direito do
58 BRASIL. Lei Nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o
Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso
em: 18 jan. 2012.
49
proprietário vizinho à percepção de indenização, em
razão das perdas e danos suportados. O dispositivo em
destaque dá corpo a um conciliador de interesses
privados com a função social da propriedade, axioma
norteador do Ordenamento Jurídico, ambicionando pôr
termo em exequíveis controvérsias existentes entre
vizinhos, assim com manutenir a construção
estruturada.
Ressoando em mesmo sentido, o art. 1.259 do
Estatuto Civil de 200259 permite ainda mais, isto é,
viabiliza a anexação de áreas edificadas que extrapolem
a metragem de 1/20 do terreno vizinho, em prol do
proprietário beneficiado. “Mas esta norma se diferencia
do dispositivo anterior em dois aspectos: apenas pode ser
utilizada em prol de boa-fé e nas perdas e danos pagos
ao proprietário prejudicado, somar-se-á ao valor da área
invadida e desvalorização do remanescente outra
59 BRASIL. Lei Nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o
Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso
em: 18 jan. 2012: Art. 1.259. Se o construtor estiver de boa-fé, e a
invasão do solo alheio exceder a vigésima parte deste, adquire a
propriedade da parte do solo invadido, e responde por perdas e danos
que abranjam o valor que a invasão acrescer à construção, mais o da
área perdida e o da desvalorização da área remanescente; se de má-
fé, é obrigado a demolir o que nele construiu, pagando as perdas e
danos apurados, que serão devidos em dobro.
50
indenização”60, devendo esta ser quantificada pelo valor
que a invasão acrescentar à construção. Assim, o
acréscimo deverá ser computado no cálculo indenizatório
a ser elaborado. Entretanto, como bem arvora a parte
final do artigo em comento, em sendo a edificação
maculada pela má-fé do vizinho beneficiado, este será
obrigado a demolir o que foi erigido na área, arcando,
inclusive, com as perdas e danos apurados, os quais serão
devidos em dobro.
REFERÊNCIAS:
BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da)
República Federativa do Brasil. Brasília: Senado
Federal, 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 18 jan. 2012.
_________. Decreto Nº. 26.643, de 10 de Julho de
1934. Decreta o Código de Águas. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 18 jan. 2012.
_________. Lei Nº. 3.071, de 1º de Janeiro de 1916.
Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 18 jan.
2012.
60 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 400.
51
_________. Lei Nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002.
Institui o Código Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 18 jan. 2012.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil
Brasileiro: Direito das Coisas. V. 04. São Paulo: Editora
Saraiva, 2011
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson.
Direitos Reais. 7 ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen
Juris, 2011.
GAMA, Ricardo Rodrigues. Dicionário Básico
Jurídico. 1 ed. Campinas: Editora Russel, 2006.
HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles; FR
ANCO, Francisco Manoel de Mello. Minidicionário
Houaiss da Língua Portuguesa. 2 ed. (rev. e aum.).
Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2004.
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade.
Código Civil Comentado. 7 ed. (rev., ampl. e atual. até
25.8.2009). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2009.
POLITO, André Guilherme. Dicionário de Sinônimos
e Antônimos. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2005.
RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil: Direito das
Coisas. v. 5. São Paulo: Editora Saraiva, 2009.
TOVAR, Leonardo Zehuri. O Papel dos Princípios no
Ordenamento Jurídico. Jus Navigandi, Teresina, ano
52
10, n. 696, 1 jun. 2005. Disponível no site:
<http://jus2.uol.com.br>. Acesso em: 18 jan. 2012.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Código Civil Interpretado.
São Paulo: Editora Atlas, 2010.
_________. Direito Civil: Direitos Reais. 10 ed. São
Paulo: Editora Atlas, 2010.
VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário
do Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas,
Bauru, 22 jun. 2009. Disponível em:
<http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em: 18 jan. 2012.
53
MODOS DE AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE
MÓVEL: ABORDAGEM DIDÁTICA DO ASSUNTO
Resumo: Ao examinar os modos de aquisição de
propriedade móvel, impende ter em mente as
ponderações concernentes aos bens móveis, cujas
lições encontram-se insculpidas a partir do art. 82 do
Código Civil. Especificamente, os bens móveis são
aqueles passíveis de movimento próprio, ou ainda de
remoção decorrente de força alheia, sem que haja
alteração da substância ou da destinação econômica-
social. Nesse passo, em razão do advento da
industrialização e o aumento do consumismo,
mormente nas últimas décadas, os bens móveis
passam a gozam de importância maior. Todavia,
conquanto os maiores cuidados do legislador tenham-
se estabelecidos em favor dos bens imóveis, calha
evidenciar, com efeito, que aos bens móveis restou o
54
rotundo papel de fomentar a circulação de riquezas,
fomentar a dinâmica das interações sociais.
Doutrinariamente, os modos de aquisição de
propriedade móvel são agrupados em duas esferas
distintas, uma considerado originária e outra
derivada. A primeira compreende a usucapião e a
ocupação, havendo a presença do aspecto de inexistir a
presença do aspecto volitivo de transmissibilidade; já o
segundo grupamento alberga a especificação,
comistão, adjunção, a confusão e a tradição,
perfazendo-se apenas com a presença do aspecto
volitivo de transmissibilidade.
Palavras-chaves: Propriedade Móvel. Aquisição.
Código Civil.
Sumário: 1 Argumentos Introdutórios; 2 Da
Ocupação: 2.1 Da Ocupação Propriamente Dita; 2.2
Da Caça; 2.3 Da Pesca; 3 Da Invenção ou da
Descoberta; 4 Do Achado de Tesouro; 5 Da
Especificação; 6 Da Confusão, Comistão e Adjunção; 7
Da Usucapião de Coisa Móvel; 8 Da Tradição..
55
1 ARGUMENTOS INTRODUTÓRIOS
Ab initio, imprescindível se faz trazer a lume que a
compreensão de bens móveis está adstrita às concepções
insculpidas na parte geral do Código Civil vigente,
notadamente a partir do art. 82. Em uma linguagem
meramente conceitual, tem-se como bem, em sentido
lato, “toda coisa, corpórea ou incorpórea, da esfera
econômica ou moral tais como: imóvel, móvel, direito,
ação, crédito etc., suscetível de uma apropriação ilegal. É
tudo aquilo que é propriedade de alguém”61.
Especificamente, os bens móveis são aqueles passíveis de
movimento próprio, ou ainda de remoção decorrente de
força alheia, sem que haja alteração da substância ou da
destinação econômica-social.
Nesse passo, em razão do advento da
industrialização e o aumento do consumismo, mormente
nas últimas décadas, os bens móveis passam a gozam de
importância maior. “Avulta a proeminência dos
chamados bens de consumo, cada vez mais transitórios e
61 GAMA, Ricardo Rodrigues. Dicionário Básico Jurídico.
Campinas: Russel Editores, 2006, p. 60.
56
descartáveis, mais vitais para a subsistência do homem
atual. No entanto, ainda reside no imóvel a vitalidade da
economia privada e a soberania dos povos”62. Todavia,
conquanto os maiores cuidados do legislador tenham-se
estabelecidos em favor dos bens imóveis, calha
evidenciar, com efeito, que aos bens móveis restou o
rotundo papel de fomentar a circulação de riquezas,
fomentar a dinâmica das interações sociais.
Doutrinariamente, os modos de aquisição de
propriedade móvel são agrupados em duas esferas
distintas, uma considerado originária e outra derivada. A
primeira compreende a usucapião e a ocupação, havendo
a presença do aspecto de inexistir a presença do aspecto
volitivo de transmissibilidade. O segundo grupamento,
por seu turno, alberga os seguintes modos de aquisição
de propriedade móvel: a especificação, comistão,
adjunção, a confusão e a tradição. Tais institutos só se
perfazem em razão da presença do aspecto volitivo de
transmissibilidade.
62 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direitos Reais. 10 ed.
São Paulo: Editora Atlas, 2010, p. 240.
57
2 DA OCUPAÇÃO
Inicialmente, ao examinar o tema em testilha,
cogente se revela ponderar que, ao contrário do que
ocorreu no Código Civil de 1916, o Estatuto vigente não
dispensou previsão minuciosa acerca da matéria. Tratou-
se de uma visão concisa dispensada pelo legislador ao
espancar o assunto em comento. À luz de tais
argumentos, quadra salientar que o Diploma Civilista
revogado tratava da ocupação em três modalidades
distintas, a saber: a ocupação propriamente dita (ou
stricto sensu), incidindo sobre a res nullius e a res
derelictae; a invenção, compreendendo as coisas perdidas;
e tesouro, como espécie de aquisição sobre coisas
ocultadas.
Entrementes, a Lei Substantiva Civil de 2002, de
maneira distinta, concentrou o campo de atuação do
instituto em estudo a tão somente um dispositivo, que
versa a respeito da ocupação propriamente dita sobre
coisas sem dono. “Com efeito, a invenção foi suprimida
dos modos aquisitivos de propriedade mobiliária, pois a
perda da posse de um objeto na induz necessariamente à
58
perda da propriedade”63. A invenção passou a ser tratada
sob a epígrafe “descoberta” e encontra-se alocada no
capítulo da propriedade, em sua parte geral. De igual
maneira, a legislação em vigor nomeou o tesouro como
“achado de tesouro”, não sendo mais visto como uma
espécie de ocupação, porquanto recebe previsão
autônoma.
Desta sorte, no formato conferido pelo Código em
vigor, a ocupação incidirá sobre seres vivos e coisas
inanimadas, albergando animais, sob a forma da caça e
da pesca, assim como sobre substâncias minerais,
vegetais ou mesmo animais lançados às faixas de areia
pelo mar. Igualmente, serão apropriados pelos primeiros
ocupantes, o dinheiro e quaisquer objetos abandonados
por seus proprietários.
2.1 Da Ocupação Propriamente Dita
Por excelência, a ocupação afigura-se como modo
originário de aquisição de propriedade mobiliária, por
meio do qual alguém, de forma imediata, se apropria de
63 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direitos
Reais. 7 ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011, p. 414.
59
coisas sem dono, quer seja porque nunca foram
apropriadas (res nullius), quer seja foram abandonadas
pelos seus proprietários (res derelictae). Inclusive, o
Código Civil vigente, ao dispor sobre o tema em comento,
na redação do art. 1.263, utiliza a locução coisa sem dono,
englobando as duas realidades supra apresentadas.
Insta salientar que, nos primórdios das sociedades
humanas, as coisas, a princípio, não tinham dono, sendo
apropriadas pelos primeiros ocupantes. Ressoando tal
entendimento, “o Direito Romano cristalizou a ideia de
que a res nullius pertence naturalmente ao primeiro
tomador. A coisa é sem dono porque nunca o teve ou
porque houve abandono por parte do titular (res
derelicta)”64. Assim, a apreensão da coisa, com a intenção
do ocupante em tê-la como própria, tem o condão de
efetivar a propriedade. Ao lado disso, por se afigurar
dotado de didática, há que se trazer à colação a redação
do art. 593 do Código Civil de 1916 que, ao abordar
acerca das coisas sem dono, assim enumerava:
Art. 593. São coisas sem dono e sujeitas à
apropriação:
64 VENOSA, 2010, p. 242.
60
I - Os animais bravios, enquanto entregues
à sua natural liberdade.
II - Os mansos e domesticados que não
forem assinalados, se tiverem perdido o
hábito de voltar ao lugar onde costumam
recolher-se, salvo a hipótese do art. 596.
III - Os enxames de abelhas, anteriormente
apropriados, se o dono da colmeia, a que
pertenciam, os não reclamar
imediatamente.
IV - As pedras, conchas e outras
substâncias minerais, vegetais ou animais
arrojadas às praias pelo mar, se não
apresentarem sinal de domínio anterior65.
Cuida pontuar, a partir do sedimento ofertado pelo
dispositivo supra, que a expressão “animais bravios” não
são todos os selvagens, porquanto estes podem ter sido,
em momento pretérito, apropriados por alguém. Deste
modo, serão considerados como coisas de ninguém o
animal que não estiver subordinado a qualquer senhoria.
Ao lado disso, pondere-se que, em se tratando de animais
marcados a fogo ou mesmo com qualquer sinal que
possibilite a identificação de seu proprietário, vigora a
presunção de propriedade. “Se não assinalados, são
apropriáveis aqueles que perderam o hábito de retornar
65 BRASIL. Lei Nº. 3.071, de 1º de Janeiro de 1916. Código Civil
dos Estados Unidos do Brasil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 04 fev. 2012.
61
ao lugar do dono. Este, porém, não perde sua
propriedade, enquanto estiver à procura deles”66. Anote-
se, por necessário, que é prescindível a procura contínua,
porquanto a apreciação da situação concreta acenará o
verdadeiro animus do proprietário do animal, no que
concerne ao estado de permanente e atual estado de
busca.
Outrossim, também serão considerados como res
nullius, os enxames de abelha, se seu apicultor não os
reclamar imediatamente, havendo como conditio sine
qua non que a colmeia se transfira se um lugar para o
outro. Quadra evidenciar que, em razão de seus aspectos
caracterizadores, os enxames de abelha são considerados
universalidades de fato. Como coisas de ninguém são
considerada as colmeias selvagens, que nunca foram
assenhoreadas. O último inciso do dispositivo ora citado,
fixa também que os objetos lançados ao mar serão
considerados como res nullius, se não houver qualquer
signo de identificação, logo, mercadorias alijadas de
navios que trazem consigo sinal, não poderão ser
ocupadas.
66 VENOSA, 2010, p. 243.
62
Por derradeiro, serão passíveis de ocupação as
coisas abandonadas por seus proprietários, porquanto o
abandono traz consigo ato de renúncia. Em razão disso, a
res derelictae será passível de apropriação, como modo
originário de aquisição da propriedade. Diniz aduz que
“não se requer a existência de uma declaração expressa
do dono; basta que se deduza, inequivocamente, o seu
propósito de abandonar o bem do seu comportamento em
relação a esse mesmo bem”67. Nesse passo, aquele que
deixa determinado bem em lugar público ou terreno
baldio ou mesmo abandona-o em um cesto para lixo,
acena a renúncia.
2.2 Da Caça
Atividade que rememora aos primórdios da
humanidade, a caça figurou como a atividade principal
dos núcleos primitivos. Em consonância com o que
leciona Gama, caçar é a “busca de animais silvestres, de
qualquer porte, para aprisioná-los ou matá-los”68. Trata-
67 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro:
Direito das Coisas. V. 04. São Paulo: Editora Saraiva, 2011, p. 333. 68 GAMA, 2006, p. 72.
63
se de matéria abarcada por legislação específica, qual
seja: o Código de Caça (Lei Nº.5.197/1967), além de leis
esparsas e regramentos administrativos dos órgãos
competentes. Enquanto modalidade de aquisição de
propriedade, a caça tem assento tanto em terras públicas
como em particulares, desde que, neste caso, haja licença
do proprietário. O Códex Civil vigente não dispensou
previsão em seus dispositivos acerca de tal matéria,
sendo necessário, em razão disso, trazer à baila as
disposições contidas no Estatuto de 1916.
Pertencerá, nos termos que dispõe o art. 595 da
Lei Substantiva Civil69 revogada, ao caçador o animal
por ele apreendido ou ainda ferido, ainda que outrem
tenha apanhado, desde que o caçador tenha ido ao seu
encalço. Em ingressando o animal ferido em terreno
alheio, se o proprietário não permitir o ingresso do
caçador, terá aquele expelir ou ainda entregar a caça.
Caso quede-se inerte, terá o caçador a receber do
69 BRASIL. Lei Nº. 3.071, de 1º de Janeiro de 1916. Código Civil
dos Estados Unidos do Brasil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 04 fev. 2012: “Art. 595.
Pertence ao caçador o animal por ele apreendido. Se o Caçador for no
encalço do animal e o tiver ferido, este lhe pertencerá, embora
outrem o tenha apreendido”.
64
proprietário indenização, em razão da recusa de entregar
o objeto, porquanto, como exposto alhures, a caça é forma
de aquisição de propriedade.
Entrementes, anote-se, por oportuno, não poderá o
caçador ingressar na propriedade de outrem, sem que
esse consinta; se assim agir, para o proprietário perderá
a caça, respondendo por dano que tenha causado. “O
Código resguardou o pleno exercício da propriedade
imóvel. O ingresso de estranho, sem autorização, sempre
será ponto de discórdia”70. Há que assinalar, com efeito,
que a entrada de estranho em terra alheia, sem que haja
autorização do proprietário, caracteriza esbulho ou
turbação à posse, permitindo o emprego da legítima
defesa ou o desforço imediato. Outrossim, é defeso ao
caçador armar alçapões e armadilhas em terreno alheio;
entretanto, em havendo autorização do proprietário, o
animal apreendido pertencerá ao caçador.
Vale salientar que o exercício da caça, ainda que
seja empreendido nos limites da propriedade, deverá,
obrigatoriamente, observar as disposições
administrativas, porquanto, em razão dos preceitos
70 VENOSA, 2010, p. 244.
65
constitucionais alusivos ao meio-ambiente, há que se
promover a preservação das espécies. Logo, o exercício da
caça não é considerado livre, mas sim regulamentado
pelo Ente Estatal. No mais, a caça permitida em
propriedade particular poderá ser alvo de arrendamento,
limitando-se a prática a determinadas espécies, bem
como o quantitativo de animais que poderão ser alvo de
tal atividade. Por derradeiro, quando o animal for
considerado como perigoso, o encalço empreendido, com o
escopo de promover a matança, não afigura como caça,
mas sim estado de necessidade.
2.3 Da Pesca
Conquanto não tenha sido tratado no Código Civil
vigente, mas sim matéria de legislação específica, a pesca
afigura como modo de aquisição de propriedade
mobiliária, devendo, ergo, ser alvo de análise. Assim, a
pesca consiste no ato de apanhar peixes em curso de
água, mares, lagos. Como aduz Diniz, “o exercício da
pesca é lícito tanto em águas públicas como em
particulares, desde que haja consentimento de seu dono e
66
observância das normas disciplinares”71. Nesta esteira,
colhe-se, que se consideram como de domínio público os
animais e a vegetação encontrada em águas dominiais.
Doutra banda, subsistirá a necessidade de licença
expressa ou tácita do proprietário, quando se tratar de
águas particulares, compreendendo tanto a pesca
desportiva como a profissional.
Na atualidade, há que se reconhecer que a pesca,
enquanto atividade, é dotada de importância econômica,
porquanto figura como mecanismo de sobrevivência e
subsistência de muitos povos. Há que se aclarar que
aquele que pesca em piscina, açude ou vasca, com a
concordância do proprietário, não ocupa, ao reverso,
detém relação contratual. O Código de 191672, ao versar
acerca do tema, estabelecia que pertencia ao pescador o
peixe que pescar e o que for por ele arpoado, ou ainda
farpado em perseguição, mesmo que outrem o apanhe.
Todavia, prosseguia o revogado diploma, aquele que
71 DINIZ, 2011, p. 335. 72 BRASIL. Lei Nº. 3.071, de 1º de Janeiro de 1916. Código Civil
dos Estados Unidos do Brasil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 04 fev. 2012: “Art. 600.
Pertence ao pescador o peixe, que pescar, e o que o arpoado, ou
farpado, perseguir, embora outrem o colha”.
67
apanhasse o peixe, sem a permissão do proprietário da
área, perderia para ele o peixe, ainda que o apanhasse,
respondendo, inclusive, pelos danos decorrentes de tal
prática.
Observando as normativas de cunho
administrativo, o ribeirinho poderá pescar do lado em
que habita, até o meio das águas do fluxo, regramento
expresso no art.602 do Diploma Civilista revogado.
Configura ilícito, pescar em águas alheias ou dominicais,
sem que haja autorização, bem como é defeso a pesca
predatória, visto que é imprescindível, em razão do
princípio constitucional do meio-ambiente
ecologicamente equilibrado, a reprodução das espécies.
3 DA INVENÇÃO OU DA DESCOBERTA
O instituto em tela, denominado no Estatuto de
1916 de “achada de coisas perdidas”, consiste no achado
de coisa móvel perdida pelo proprietário, subsistindo a
obrigação de restituí-la a seu dono ou legítimo possuidor.
Frise-se que a perda da coisa não tem o condão de
acarretar a perda da propriedade, distinguindo-se, via de
consequência, da ocupação de coisas sem dono ou
68
abandonadas. Denomina-se inventor aquele que encontra
coisas perdidas, mas que possuem dono. “Não o
conhecendo, o descobridor fará tudo por encontrá-lo,
comunicando o fato aos conhecidos, consultando anúncios
em jornais, publicando avisos pela imprensa, divulgando
em rádio ou TV etc”73.
Ainda assim, em não sendo encontrado o
proprietário da coisa perdida, deverá o inventor entregá-
la à autoridade competente do lugar, que dispensará os
esforços necessários para publicizar tal fato, valendo-se
da imprensa escrita e falada e outros meios hábeis de
comunicação, nos termos em que preceitua o art. 1.236
da Lei Substantiva Civil. Quadra negritar que, em
havendo a violação do disposto no artigo em comento,
restará perpetrada a conduta delituosa prevista no inc. II
do parágrafo único do art. 169 do Código Penal.
Mister se faz avultar que a descoberta, ou
invenção, não é modalidade de aquisição da propriedade
mobiliária, mantendo-se operante os princípios romanos
que tutelavam a matéria. Assim, no atual Ordenamento
Jurídico, o descobridor nunca poderá a coisa achada. “O
73 DINIZ, 2011, p. 335.
69
inventor teria apenas direito a recompensa e indenização
pela guarda e transporte da coisa, se o dono da coisa não
preferisse abandoná-la […]. A essa recompensa dá-se o
nome de achádego”74. Tão-somente em situação de
abandono que o inventor poderia adquirir a propriedade
da coisa, porquanto esta se tornaria derelictae
(abandonada). O Diploma de 1916 estatuía que, se
defluído o lapso de seis meses da notificação à
autoridade, sem que se apresentasse o dono, da quantia
obtida, do valor seriam deduzidas as despesas e a
recompensa do inventor, pertencendo o remanescente ao
Estado (ou ao Distrito Federal ou Território, conforme o
local em que se der a descoberta).
Cuida destacar que o art. 1.237 do Código de
200275 mudou parcialmente o enfoque, minorando lapso
temporal para sessenta dias, a contar da divulgação da
74 VENOSA, 2010, p. 246. 75 BRASIL. Lei Nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o
Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso
em: 04 fev. 2012: “Art. 1.237. Decorridos sessenta dias da divulgação
da notícia pela imprensa, ou do edital, não se apresentando quem
comprove a propriedade sobre a coisa, será esta vendida em hasta
pública e, deduzidas do preço as despesas, mais a recompensa do
descobridor, pertencerá o remanescente ao Município em cuja
circunscrição se deparou o objeto perdido. Parágrafo único. Sendo
de diminuto valor, poderá o Município abandonar a coisa em favor
de quem a achou”.
70
notícia pela imprensa, ou do edital, não se apresentando
que possa comprovar a propriedade sobre a coisa, esta
será vendida em hasta pública. Consoante se infere das
disposições entalhadas, não subsistirá a
imprescindibilidade da publicação de edital, bastando
apenas o defluxo do lapso temporal em apreço, contando-
se da divulgação da notícia pelo veículo midiático.
“Deduzidas do preço as despesas, mas a recompensa do
descobridor, o achádego, o remanescente pertencerá ao
Município em cuja circunscrição se deparou o objeto
perdido”76. Vale anotar que se o valor da coisa for
diminuto, nada impede que o Município ou Distrito ou
Território abandone a res em favor do inventor, passando
este a deter a propriedade.
Atendo-se em aspectos objetivos, o Código Civil
vigente, em seu art. 1.234, fixou-se que o quantum do
achádego será em um montante não inferior a cinco por
cento de valor da coisa achada, assim como ressarcindo-
se o inventor pelas despesas atinentes à conservação e o
transporte da coisa, havendo a faculdade do proprietário
abandoná-la. Por óbvio, o montante da recompensa será
76 VENOSA, 2010, p. 246.
71
estabelecido levando-se em consideração o esforço
empregado pelo inventor para encontrar o dono ou o
legítima proprietário, bem como as possibilidades que
este teria de encontrar a coisa e a situação econômica de
ambas as figuras, consoante reza o parágrafo único do
dispositivo supra.
Enfatize-se, com efeito, que as regras aplicáveis ao
tema em exame albergam tanto a atividade espontânea
como a fortuita do descobridor. Logo, aquele que se
lançar à procura da coisa perdida, quer seja em busca de
aventura, quer seja visando obter recompensa, ou mesmo
encontrando-a fortuitamente, fará jus ao percebimento
do achádego. Todavia, não subsistirá a possibilidade de
pleitear tal quantia, se o proprietário preferir abandoná-
la, exceto o direito de adquirir a propriedade da res
derelictae. Calha, também, arrazoar que tais disposições
não serão aplicáveis àquele que foi contratado pelo
proprietário da coisa perdida para achá-la, vigorando, em
tal situação, uma relação de cunho contratual. “Por outro
lado, o descobridor responderá por todos os prejuízos que
causou, dolosamente, ao proprietário ou possuidor
legítimo, pagando-lhe uma indenização por perdas e
72
danos, abrangendo dano emergente e lucro cessante”77.
Em havendo a presença de culpa simples, não há o dever
de reparar.
Em havendo dúvidas quanto ao titular da coisa,
deverá o inventor entregá-la à autoridade, competindo ao
magistrado decidir acerca da questão. Nesse sedimento,
também, nada impede que o descobridor exerça o direito
de retenção, com o escopo de receber a quantia alusiva ao
achádego, desde que tenha agido de boa-fé. Não poderá
fazê-lo, acresça-se, se já tiver entregado à autoridade
competente a coisa achada. Em sendo a res de fácil
deterioração, caberá ao juiz determinar sua venda,
inclusive tem-se que “age de boa-fé aquele que, em vez de
entregar a coisa deteriorável, vende-a, entregando o
valor ao dono ou à autoridade competente, impedindo
sua perda”78. Contudo, se tiver agido de má-fé ao
apreender a coisa, não restará materializado o instituto
versado, mas sim condutas de cunho delituoso, a saber:
furto ou mesmo apropriação indébito.
À guisa de finalização, vale frisar que, em se
tratando da situação posta em exame, aplicar-se-ão as
77 DINIZ, 2011, p. 337. 78 VENOSA, 2010, p. 248.
73
disposições contidas no Código de Processo Civil, a partir
do art. 1.170 usque 1.176, sendo a coisa, como dito
algures, entregue à autoridade competente (judiciária ou
policial). No que concerne ao procedimento, que deverá
ser instaurado por portaria ou auto de arrecadação, será
competente o Juízo do local em que a coisa foi achada. No
mais, viabiliza o art. 1.174 do Estatuto de Ritos Civis que
o invento procede a adjudicação da coisa, se, porventura,
o proprietário preferir abandoná-la.
4 DO ACHADO DE TESOURO
Em linhas conceituais, há que arrazoar que
tesouro consiste em “conjunto de riquezas de qualquer
tipo guardadas ou escondidas. Depósito antigo de moedas
ou de coisas preciosas. Objeto precioso descoberto de
modo inesperado”79. Acresça-se, por necessário, que a
identidade do verdadeiro proprietário do tesouro achado
deve ser desconhecido, pois, se a propriedade puder ser
identificada por qualquer titular, não há que se falar em
achado de tesouro. Insta pôr em destaque que o objeto é
79 GAMA, 2006, p. 364.
74
pode ser encontrado tanto em bem imóvel quanto em
móvel. Igualmente, para se ter substanciado o achado de
tesouro independe de pluralidade de preciosidades, sendo
suficiente uma moeda antiga, para restar caracterizado o
tesouro.
Depreende-se do arrazoado, até o momento, os
aspectos caracterizadores do instituto em tela, a saber: a)
o depósito das preciosidades deve ser fruto da realização
da força humana, estando, por conseguinte, excluídos os
acúmulos de tesouro oriundos da força da natureza; b) o
depósito deve estar enterrado ou oculto, tanto em um
bem imóvel como móvel, o que ocorre em escavações de
prédios soterrados ou mesmo muito antigos; c)
desconhecer que é o verdadeiro proprietário do achado,
sendo inclusive utilizado pelo Código vigente a locução de
cujo dono não haja memória. Nesta última hipótese,
basta a ausência da prova de titularidade, porquanto,
repita-se, podendo ser justificada a propriedade, inexiste
achado de tesouro. Diniz, ao espancar acerca dos
requisitos para a constituição do achado de tesouro,
registra que o encontro deve ser meramente casual, logo,
“não há que se falar em tesouro se se penetrar em
75
terreno alheio, intencionalmente, para efetuar pesquisas
nesse sentido”80.
Impera anotar que, em sendo o tesouro achado em
prédio alheio, nas modelagens especificadas pelo art.
1.264 do Códex Civilista, deverá ser dividido ente o
proprietário do prédio e o inventor. A figura do inventor,
no caso em apreço, compreende também aqueles que,
quando da achada, se encontravam no prédio, em razão
da posse direta exercida, derivada de uma relação
jurídica existente com o proprietário, ou também, o
funcionário do proprietário do prédio que, casualmente,
encontrou o depósito de preciosidade, quando exercia
outras funções. Em existindo várias pessoas, a divisão
dar-se-á tão somente entre o proprietário do prédio e
quem achou a preciosidade primeiro.
Há que se observar que o achado deve se dar de
maneira casual, porquanto, se houve a contratação para
tal fito, inoperante é o regramento estatuído no
dispositivo supra, vez que resta consubstanciada relação
negocial. Aliás, tal esclarecimento resta burilado na
redação do art. 1.265 que hasteia, como premissa, o
80 DINIZ, 2011, p. 338.
76
ideário de que, por inteiro, pertencerá ao proprietário do
prédio, se por ele for achado, ou ainda se tal achada for
proveniente de pesquisa por ele ordenada, ou ainda por
terceiro não autorizado. Nesse sedimento, também, “se o
descobridor penetrar no prédio alheio com o propósito
deliberado de encontrar o tesouro, contra a vontade do
proprietário, não terá direito a nada, pois não se permite
a obtenção de vantagem quando do esbulho”81.
No tema em debate, figura como conditio sine qua
non não somente a descoberta, mas sim o achado. O
tesouro exige a posse por parte de quem o achou, visto
que é plenamente possível que o indivíduo descubra a
existência de determinada preciosidade em área
específica, sem ter conhecimento de sua localização
pormenorizada. Venosa salienta que “se é o proprietário
do prédio quem encontra o tesouro, existe acessão.
Adquire a propriedade da coisa achada porque está em
seu domínio”82. No mais, devidamente tipificado no
Código Penal brasileiro, reputa-se crime ao descobridor
que se apropria do tesouro sem entregar ao proprietário o
quinhão a que ele cabe, como bem assinala o art. 169,
81 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 417. 82 VENOSA, 2010, p. 250.
77
parágrafo único, do Código Penal: “Art. 169: (omissis)
parágrafo único: (omissis) I – quem acha tesouro em
prédio alheio e se apropria, no todo ou em parte, da quota
a que tem direito o proprietário do prédio”83.
De pouca aplicação na atual realidade, o art. 1.266
do Diploma Civilista estabelece se a preciosidade for
encontrada em terreno aforado, este será igualmente
partilhado entre aquele que achou e o foreiro ou
enfiteuta (titular do domínio útil) ou, se este último for o
descobridor, pertencerá a ele por inteiro. Convém aduzir,
também, que o titular do domínio direto (denominado de
“senhorio direto”) nenhum direito terá sobre o tesouro
achado. Outrossim, “se o terreno é objeto de usufruto ou
locação, ao usufrutuário, ou locatário, nenhum direito
assiste em relação ao tesouro casualmente encontrado
por outrem”84. Compete ao nu-proprietário e ao locador, o
direito à metade desse tesouro, encontrado de maneira
casual. Por derradeiro, caberá tão-somente usufrutuário
o direito à parte do tesouro encontrado por outrem, se o
83 BRASIL. Decreto-Lei Nº. 2.848, de 07 de Dezembro de 1940.
Código Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso
em: 04 fev. 2012. 84 DINIZ, 2011, p. 339.
78
instituto do usufruto recair sobre a universalidade ou
ainda quota-parte dos bens.
5 DA ESPECIFICAÇÃO
De natureza controvertida no passado, a
especificação foi classificada no Estatuto Civil vigente
como modalidade de aquisição da propriedade móvel,
decorrente da manipulação da matéria-prima. “É modo
originário de aquisição da propriedade mobiliária que se
dá mediante a transformação de matéria-prima em
espécie nova por meio do trabalho do especificador”85.
Vale salientar que o instituto em tela passou a gozar de
importância proeminente, em razão da criatividade
humana. São exemplos costumeiros da manipulação o
couro em calçados, o barro em escultura, o ferro em
utensílios, a pedra em instrumentos etc. Ora, denota-se
que o instituto da especificação é decorrente do trabalho
do ser humano.
Denota-se no instituto em tela a valoração do
trabalho humano sobre a matéria-prima, sendo
85 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 417.
79
revestido, em razão disso de uma grande importância
social. A novidade implementada deverá ser analisada,
tendo como axioma maciço, “o prisma econômico; a nova
espécie deve advir de uma alteração importante, feita
pela capacidade criadora do homem, ou seja, de suas
atividades artesanais, artísticas ou pelo desenvolvimento
de indústrias”86.
Cuida gizar que o instituto em tela não é
considerado como uma forma de acessão, porquanto este
exige a junção de uma coisa à outra, enquanto a
especificação consiste na transformação de matéria-
prima em espécie nova. “Há quem a considere como uma
espécie de acessão, porém não se pode acolher esse
entendimento porque acessão requer união ou
incorporação de uma coisa a outra, o que não ocorre na
especificação, que é a transformação definitiva da
matéria-prima em espécie nova, por meio de ato
humano”87.
Ao lado disso, impende realçar que o instituto em
comento exige, como requisitos caracterizadores, a
presença de: a) a matéria-prima alvo de transformação
86 DINIZ, 2011, p. 342. 87 Ibid, p. 341.
80
não seja pertencente ao especificador, mesmo que em
parte; b) que a substância especificada seja transformada
em espécie nova, maciçamente diversa da antiga, em
razão do trabalho do especificador sobre a matéria-
prima. Logo, por tal compreensão, não há que se
considerar aquele que coloca a moldura ou ainda o
restaurador como especificador, posto que a obra de arte
não teve sua natureza modificada em razão do agir
antrópico.
Com efeito, em sendo a matéria-prima pertencente
ao especificador, a titularidade do bem especificado dele
será. Subsistirá tal disposição se parte da matéria
manipulada pertencer ao especificador e não for possível
a devolução do produto obtido a gênese original, como
obtempera a redação do art. 1.269 do Código Civil. Como
bem assinala Venosa2988, obviamente, deverá o
especificador indenizar o proprietário da substância alvo
da transformação. Entretanto, negrite-se, se a substância
puder ser revertida ao status quo ante deverá ser
restituída ao proprietário da matéria-prima.
88 VENOSA, 2010, p. 252.
81
O mesmo ocorrerá se restar configurado que o
especificador obrou com má-fé, a novidade ficará com a
matéria da substância alvo da transformação. Impõe
elucidar que a má-fé traz à baila conduta intencional do
indivíduo em especificar matéria alheia, mesmo tendo
conhecimento de tal fato. Com propriedade, lecionam
Farias & Rosenvald “nada obstante, encontrando-se de
má-fé o especificador, a coisa nova pertencerá ao dono da
matéria-prima, não podendo aquele pleitear nem ao
menos a indenização pelo trabalho executado”, eis que o
pagamento da verba indenizatória serviria como insumo
à malícia e ao enriquecimento ilícito, nos termos em que
consagra o art. 1.271, §1º, in fine, do Código Civil.
De outro giro, em sendo o valor da mão de obra
superior, em demasia, ao valor da matéria-prima, mesmo
que havendo má-fé por parte do especificador, a novidade
a este pertencerá, devendo, tão somente, indenizar o
proprietário da substância por seu valor, como anota o
§2º do art. 1.271 do Estatuto de 2002. Sobreleva, na
hipótese em testilha, o axioma da preservação da coisa,
notadamente quando se tratam de produções de cunho
artístico (pinturas, gravações, esculturas). Ao versar
82
sobre o assunto em epígrafe, preleciona Diniz, com
propriedade, no sentido de “segundo o §2º do art. 1.270,
se o material for inteiramente pertencente a outrem,
podendo ou não ser reduzido à forma precedente, estando
ou não o especificador de boa-fé, excedendo-se o preço da
mão de obra consideravelmente ao valor da matéria-
prima”89.
6 DA CONFUSÃO, COMISTÃO E ADJUNÇÃO
Em uma primeira plana, insta realçar que três são
as espécies de aquisição originária de coisa móvel que
recebem a aplicação de disposições normativas
semelhantes pelo Estatuto de 2002, porquanto “em todas
elas coisas que pertencem a proprietários distintos
culminam por se interpenetrar ou mesclar, formando
uma só coisa, sem que se possa separá-las sem
deterioração”90. A doutrina considera as três formas como
espécies de acessão de coisa móvel a móvel. Nesse jaez,
“a doutrina entende essas três modalidades como formas
89 DINIZ, 2011, p. 343. 90 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 419.
83
de acessão de móvel a móvel”91. Todavia, há
entendimento diverso, como o construído por Diniz92, que
apresenta tão somente a comistão e a confusão como
espécie de acessão, enquanto a adjunção dá corpo a uma
união. Em todas as espécies, o principal aspecto
característico estrutura-se na mescla de bens móveis
pertencentes a proprietários diversos, que se dá de
maneira involuntária. Cuida destacar que a mistura
ocorrida não poderá dar ensejo a uma coisa nova, pois,
estar-se-ia diante de uma especificação.
Em linhas meramente conceituais, tem-se por
comistão como a “mistura de substâncias sólidas. Uma
das maneiras de aquisição da propriedade móvel, por
acessão da coisa misturada”93. A partir do substrato em
testilha, faz-se necessário ponderar que o instituto em
estudo também é denominado pela doutrina de “mistura”
e ocorre com a mescla de coisas sólidas ou secas, sem que
a união produza uma coisa nova, subsistindo a natureza
originária das substâncias. Ao lado do exposto, Farias &
Rosenvald lecionam que a comistão “é a mistura de
91 VENOSA, 2010, p. 253. 92 DINIZ, 2011, p. 344. 93 GAMA, 2006, p. 95.
84
coisas secas ou sólidas, pertencentes a diferentes donos,
sem que possam ser separados e sem que se produza
coisa nova, mantendo-se a natureza originária das
mesmas”94. Exemplo citado, comumente, dá conta da
mistura de duas qualidades distintas de grão, como café
ou arroz, sem que isso produza uma nova espécie. Ora, a
mistura ocorrida mantém a propriedade dos grãos, não
há qualquer alteração na substância.
Por seu turno, a confusão é apresentada como
“forma de acessão que ocorre pela mistura de substâncias
líquidas ou liquefeitas. Mistura de outras matérias de
natureza diversa, pertencentes a diversos donos”95. A
partir do cotejo das informações colhidas, tem-se que, tal
como ocorre no instituto supra, há a manutenção da
essência originárias das substâncias líquidas ou
liquefeitas mescladas. O exemplo comum apresentado é a
mistura de vinhos de duas espécies distintas ou mesmo
de álcool e gasolina. Entretanto, “se for possível a
separação, líquidos de densidades diferentes, como óleo e
94 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 419. 95 GAMA, 2006, p. 103.
85
vinagre, por exemplo, as coisas voltam aos respectivos
donos”96.
Por derradeiro, a adjunção é descrita como
“mistura de coisas da mesma espécie originariamente
pertencentes a vários donos. Modo de acessão de algum
bem móvel, pela agregação deste a outro, passando
ambos a formar um todo”97. Trata-se de uma justaposição
de uma coisa a outra, que não mais possibilita que haja o
destaque da coisa acessória da principal, sem que isso
acarrete a deterioração da coisa. São citados,
hodiernamente, pela doutrina como exemplo o decalque
afixado em uma roupa ou, ainda, a peça soldada ao
motor, em ambos os casos a retirada acarreta a
deterioração do bem principal. Em todas essas situações
apresentas há a justaposição da coisa acessória (o
decalque e a peça) ao bem principal (a roupa e o motor).
Vale salientar que as hipóteses em destaque se dão, via
de regra, de maneira involuntária ou fortuita. Trata-se
de acontecimento que é alheio à vontade dos
proprietários das coisas mescladas ou mesmo por ação de
terceiros, que atuam de boa-fé, o art. 1272, e seus
96 VENOSA, 2010, p. 253. 97 GAMA, 2006, p. 24.
86
parágrafos, apresentam as regras estruturadas pelo
legislador a serem aplicadas. Em sendo possível a
separação das coisas móveis mescladas, sem que isso
acarrete a deterioração, viabilizando que cada um dos
proprietários identifique o que lhe pertence, dicciona o
caput do dispositivo supra que cada um continuará a ter
o domínio sobre a mesma coisa que lhe pertencia, antes
da ocorrência da mistura. Percebe-se, desta feita, que há
o afastamento da incidência da norma, no que tange à
regra estatuída no art. 1.217 que alude ao
estabelecimento de condomínio entre os vários titulares.
Sendo configurada a impossibilidade da separação,
ou esta se revelar demasiadamente dispendiosa, o §1º do
art. 1.272 estabelece a manutenção de condomínio
forçado, ou denominado condomínio pro indiviso,
mantendo cada um dos titulares o seu quinhão
proporcional sobre a substância mesclada. Contudo, fixa
o §2º do art. 1.272, que se uma das coisas puder ser
considerada como principal, “o respectivo dono sê-lo-á do
todo, indenizando os outros proprietários pelo valor das
coisas acessórias”98. Quadra salientar que, em
98 DINIZ, 2011, p. 344.
87
decorrência das particularidades que emolduram o
instituto da adjunção, só será permitida a propriedade
exclusiva caso um dos objetos puder ser considerado
como principal em relação ao outro; não sendo possível,
vigorará a regra do condomínio forçado99.
Entrementes, se o fenômeno decorrer da vontade
dos proprietários das coisas móveis, não serão aplicáveis
as disposições contidas a partir do art. 1.272 do Diploma
Substantivo Civil, mas sim incumbirá aos proprietários
fixarem o regime aplicável à partilha, regulando-se pelos
preceitos contratuais100. Com efeito, se uma das
modalidades abordadas até o momento for exteriorizada
por um ato unilateral, eivado de má-fé, subsistirá para a
parte inocente o direito potestativo de obter a
propriedade sobre o todo mesclado, englobando-se a
mistura e a justaposição, devendo ressarcir o valor da
parte que não lhe pertencia, abatendo-se a indenização
devida pelo ato ilícito. Todavia, ainda nesta linha, nada
impede que o inocente renuncie “à propriedade da coisa
99 VENOSA, 2010, p. 253. 100 Neste sentido: DINIZ, 2011, p. 344: “Se tal mescla for intencional,
feita com o expresso consentimento dos proprietários das coisas
misturadas, eles mesmos deverão decidir a quem pertencerá o
produto da mistura”.
88
móvel, recebendo ressarcimento pelo ato de abdicar do
que lhe pertencia, acrescido de perdas e danos (art. 1.273
do CC)101.
7 DA USUCAPIÃO DE COISA MÓVEL
A usucapião consiste em modo de aquisição
originária de bens móveis compartilhando dos mesmos
fundamentos do instituto em tela, no que concerne aos
bens imóveis, qual seja: ofertar juridicidade a uma
situação de fato. A usucapião, em sua modalidade
ordinária, ocorrerá quando a posse for exercida com
animus domini, de modo manso e pacífico, pelo período
de três anos, de maneira ininterrupta e sem oposição.
Com efeito, pondera Verdan “é necessário que fique
comprovada a posse, pelo período mínimo de três anos,
devendo-se demonstrar, também, que esta é mansa e
101 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 420. Neste sentido: VENOSA,
2010, p. 254: “Sempre que ocorrer má-fé no campo jurídico, existe a
possibilidade de indenização por perdas e danos. Evidente que, se o
agente mescla matéria toda ela alheia, responde pelo valor mais
perdas e danos com base no princípio geral da culpa”.
89
ininterrupta, e com fundamento em justo título”102. Neste
sentido, inclusive, colhe-se entendimento jurisprudencial
que serve como substrato:
Ementa: Processual Civil. Apelação
cível. Usucapião de bem móvel.
Requisitos. Preenchimento.
Manutenção da decisão.- A declaração de
aquisição da propriedade de bem móvel por
usucapião exige a comprovação de posse
mansa e ininterrupta o bem por no mínimo
três anos, se com base em justo título; se
não houver justo título, o prazo é elevado
para cinco anos. - Preenchidos tais
pressupostos, a manutenção da sentença,
que julga procedente o pedido, é medida que
se impõe. (Tribunal de Justiça do Estado de
Minas Gerais – Nona Câmara Cível/
Apelação Cível Nº 2.0000.00.494159-9/000/
Rel. Desembargador Tarcísio Martins
Costa/ Julgado em 01.04.2008/ Publicado
em 19.04.2008)
Exige-se, ainda, para a configuração da
modalidade em destaque a existência boa-fé e justo
título. Doutra banda, a usucapião extraordinária exige o
exercício da posse com animus domini por período de
102 VERDAN, Tauã Lima. O Instituto da Usucapião: Breves
Apontamentos. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 13 out.
2011. Disponível em: <http://jornal.jurid.com.br/materias/doutrina-
civil/instituto-usucapiao-breves-apontamentos1>. Acesso em: 04 fev.
2012.
90
cinco anos, dispensando-se o justo título e a boa-fé do
usucapiente. Neste alamiré, leciona Rodrigues,
destacando que “de outro, a usucapião extraordinária,
que demanda o período mais amplo de cinco anos, em que
basta a prova da posse mansa e pacífica durante aquele
intervalo, posto que a lei presume, de maneira
irrefragável, o justo título e a boa-fé”103.
8 DA TRADIÇÃO
Afigura como modo derivado de aquisição de
propriedade o instituto da tradição, consubstanciando-se
por meio da entrega de bem móvel pelo transmitente ao
adquirente, com a intenção de transferir-lhe a
propriedade, em decorrência de negócio jurídico firmado,
com o competente título translativo. Gama define
tradição como “ato de transmitir ou entregar uma coisa a
quem a adquiriu”104. Colhe-se, ainda, a ponderação de
Diniz no sentido que “o contrato por si só, não é apto para
transferir o domínio, contém apenas um direito pessoal;
103 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil: Direito das Coisas. v. 5.
São Paulo: Editora Saraiva, 2009, p. 194-195. 104 GAMA, 2006, p. 370.
91
só com a tradição é que essa declaração translativa de
vontade se transforma em direito real”105.
Ao lado disso, insta pontuar que, comumente, a
doutrina, ao tratar do tema em destaque, apresenta três
modalidades de tradição: a) tradição real, que é a
efetiva entrega material da coisa ao adquirente pelo
alienante, mesmo que por procuradores ou núncios; b)
tradição simbólica, que é meramente representativa,
não ocorrendo a entrega material da res, como, por
exemplo, a entrega das chaves de um veículo ao
adquirente; c) tradição consensual ou ficta é a
decorrente de acordo de vontade das partes, por colocação
de cláusula contratual, sem que haja qualquer alteração
no mundo dos fatos. Esta última hipótese contempla
tanto o constituto possessório como a tradição brevi
manu.
No que concerne ao constituto possessório, denota-
se que o proprietário de determinado bem promove sua
alienação a outrem, entretanto, permanece como
possuidor direto. Infere-se que há uma inversão no título
da posse, porquanto alguém que possuía, em outrora, em
105 DINIZ, 2011, p. 345.
92
nome próprio, passa a possuir em nome alheio. Verifica-
se, no instituto em exame, a alteração tão somente do
animus, porquanto era originariamente era proprietário
e, após a tradição, passa a possui a outro título, como
locatário, à guisa de exemplificação. Por seu turno, a
tradição brevi manu é o contrário do que se passa no
constituto possessório, posto que aquele que possuía o
imóvel em nome alheio passa a possuí-lo como
proprietário, sem que seja aferida a tradição material da
coisa, eis que o objeto prosseguirá em poder do possuidor
primevo.
Além das situações espancadas acima, o art. 1.267,
em seu parágrafo único, do Código Civil, traz à tona uma
terceira situação, consistente na hipótese em que o
transmitente cede ao adquirente o direito à restituição
da coisa. Trata-se de situação comum, pois compreende
casos em que o alienante já havia feito a transmissão da
posse direta da coisa, ao tempo em que avença negócio
jurídico que abarque dispositivo de propriedade. Em
altos alaridos, o caput do art. 1.268 do Estatuto de 2002
estabelece que as aquisições negociais observarão o
preceito nemo plus iuris, ou seja, ninguém poderá
93
proceder a transferência a outrem mais direito do que
possui. “De fato, neste princípio geral se funda o sistema
geral da tradição da propriedade, pois sempre se
pressupõe um vínculo jurídico entre o sujeito que
transmite e aquele que adquire o direito real”106.
Entretanto, em sendo realizada a tradição de
qualquer bem móvel em leilão ou ainda estabelecimento
comercial, observando-se os aspectos caracterizadores
próprios da relação jurídica, nos termos do art. 1.268 do
Código Civil, o terceiro de boa-fé não perderá o bem,
restando ao real proprietário aforar ação indenizatória
em face do alienante. Ora, constata-se que a Legislação
Civil valora, por mais uma vez, os preceitos irradiados
pela teoria da aparência, salvaguardando aquele que
agiu pautado em boa-fé subjetiva, que, em razão da
indução das circunstâncias que emolduram a situação
fática, incidiu em erro escusável.
Em harmonia com o emanado pelo §1º do art. 1.268
do Código Civil, caso o adquirente estiver de boa-fé e o
alienante, posteriormente, vier a adquirir a propriedade,
considera-se realizada a transferência, desde que o
106 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 427.
94
momento em que se operou a tradição. Noutro turno, fixa
o §2º do art. 1.268 do Código Civil que não haverá
transferência de propriedade, quando o título que serve
de substrato for proveniente de um negócio jurídico nulo.
Tal fato decorre da premissa basilar que a tradição
requer a presença do elemento subjetivo das partes, ou
seja, a manifestação da vontade que se exterioriza no
contrato entabulado. Logo, em não sendo verificada a
presença da vontade das partes, a tradição não é hábil
para operar a transferência da propriedade.
REFERÊNCIAS:
BRASIL. Decreto-Lei Nº. 2.848, de 07 de Dezembro
de 1940. Código Penal. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 04 fev. 2012.
_________. Lei Nº. 3.071, de 1º de Janeiro de 1916.
Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 04 fev.
2012.
_________. Lei Nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002.
Institui o Código Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 04 fev. 2012.
95
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil
Brasileiro: Direito das Coisas. V. 04. São Paulo: Editora
Saraiva, 2011
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson.
Direitos Reais. 7 ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen
Juris, 2011.
GAMA, Ricardo Rodrigues. Dicionário Básico
Jurídico. 1 ed. Campinas: Editora Russel, 2006.
HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles; FR
ANCO, Francisco Manoel de Mello. Minidicionário
Houaiss da Língua Portuguesa. 2 ed. (rev. e aum.).
Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2004.
POLITO, André Guilherme. Dicionário de Sinônimos
e Antônimos. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2005.
RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil: Direito das
Coisas. v. 5. São Paulo: Editora Saraiva, 2009.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direitos
Reais. 10 ed. São Paulo: Editora Atlas, 2010.
VERDAN, Tauã Lima. O Instituto da Usucapião: Breves
Apontamentos. Jurid Publicações Eletrônicas,
Bauru, 13 out. 2011. Disponível em:
<http://jornal.jurid.com.br/materias/doutrina-
civil/instituto-usucapiao-breves-apontamentos1>. Acesso
em: 04 fev. 2012
96
MODOS DE PERDA DA PROPRIEDADE: BREVE
ANÁLISE DO TEMA
Resumo: Um dos aspectos preponderantes a ser
destacado, no que concerne ao estudo da
propriedade, está atrelado à perpetuidade. Em uma
linha conceitual, pode-se considerar que a Lei
Substantiva Civil vigente, ressoando o entendimento
consolidado no Estatuto de 1916, alicerçou a perda
da propriedade em duas espécies distintas. A
primeira é fruto de ato voluntário, ou seja, há a
presença do elemento volitivo do proprietário, que se
manifestação por meio de um comportamento
comissivo ou omissivo. Assim, afiguram como
exemplos a serem apresentados no caso em tela: a
alienação, o abandono e a renúncia, previsto no art.
1.275, incs. I a III, do Códex de 2002. Noutra toada, a
segunda espécie é denominada involuntária, visto
97
que não há qualquer manifestação do proprietário,
sendo inexistente o elemento volitivo. Nesta espécie,
a perda da propriedade está associada a fatos
relativos a objetos, atuando como claros exemplos,
consagrados pela legislação vigente, o perecimento e
a desapropriação.
Palavras-chaves: Propriedade. Perda. Código Civil.
Sumário: 1 Ponderações Preliminares; 2 Da Perda
da Propriedade por Alienação; 3 Da Perda da
Propriedade por Renúncia; 4 Da Perda da
Propriedade por Abandono; 5 Da Perda da
Propriedade por Perecimento; 6 Da Perda da
Propriedade por Desapropriação: 6.1 Da
Desapropriação Administrativa; 6.2 Da
Desapropriação Judicial baseada na Posse Pro
Labore ou Posse-Trabalho; 7 Outras Formas de
Perda da Propriedade: 7.1 Da Arrematação; 7.2 Da
Adjudicação; 7.3 Da Propriedade Resolúvel; 7.4 Do
Confisco; 7.5 Da Requisição.
98
1 PONDERAÇÕES PRELIMINARES
Ao examinar, inicialmente, a propriedade, dentro
do Direito Civil, denota-se que um dos aspectos
preponderantes a ser destacado está atrelado à
perpetuidade. Ora, denota-se que, a princípio, a
propriedade é considerada como irrevogável, sendo
transmitida aos sucessores, em decorrência do que
articula o preceito da saisine, dogma elencado no art.
1.784 do Código Civil e que atua como flâmula
desfraldada. Desta sorte, infere-se que a morte, enquanto
fenômeno com consequências no mundo jurídico, tem o
condão de acarretar a perda da propriedade, que é
transmitida do de cujus para seu lastro sucessório,
observando-se, obviamente, as peculiaridades das
situações concretas apresentadas. Neste sentido,
inclusive, há que se trazer à baila as lições apresentadas
por Diniz, quando põe em evidência que “dado o caráter
de perpetuidade do domínio, este remanescerá na pessoa
de seu titular ou de seus sucessores causa mortis de
99
modo indefinido ou até que por um meio legal seja
afastado do seu patrimônio”107.
Em uma linha conceitual, pode-se considerar que a
Lei Substantiva Civil vigente, ressoando o entendimento
consolidado no Estatuto de 1916, alicerçou a perda da
propriedade em duas espécies distintas. A primeira é
fruto de ato voluntário, ou seja, há a presença do
elemento volitivo do proprietário, que se manifestação
por meio de um comportamento comissivo ou omissivo.
Assim, afiguram como exemplos a serem apresentados no
caso em tela: a alienação, o abandono e a renúncia,
previsto no art. 1.275, incs. I a III, do Códex de 2002.
Noutra toada, a segunda espécie é denominada
involuntária, visto que não há qualquer manifestação do
proprietário, sendo inexistente o elemento volitivo. Nesta
espécie, a perda da propriedade está associada a fatos
relativos a objetos, atuando como claros exemplos,
consagrados pela legislação vigente, o perecimento e a
desapropriação. Ao lado disso, há que se trazer a lume a
construção doutrinária apresentada por Farias &
Rosenvald:
107 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro,:
Direito das Coisas. V. 04. São Paulo: Editora Saraiva, 2011, p. 194.
100
No Código Civil de 2002, perde-se a
propriedade voluntariamente por alienação,
abandono e renúncia (art. 1.275, I, II e III,
do CC). A outro giro, perde-se a propriedade
involuntariamente, pelo perecimento e
desapropriação (art. 1.275, IV e V, do CC).
As hipóteses de extinção da propriedade,
independentes da vontade de seu titular,
serão excepcionais no sistema108.
Quadra, ainda, colocar em relevo que o art. 1.275
da Lei Nº. 10.406109, de 10 de Janeiro de 2002, que
institui o Código Civil, refere-se tanto à perda da
propriedade imobiliária como da mobiliária, trazendo
inovação ao Ordenamento Jurídico, visto que o revogado
Diploma Civilista, ao espancar o tema no art. 584,
manteve-se adstrito tão somente à primeira. No mais,
vale salientar que o rol apresentado no caput do art.
1.275, não se trata de numerus clausus, mas sim é
meramente exemplificativo, comportando outras
espécies, que são apresentadas por leis extravagantes,
108 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nélson. Direitos
Reais. 7 ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011, p. 402. 109 BRASIL. Lei Nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o
Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso
em: 22 jan. 2012.
101
bem como em outros dispositivos da própria Lei
Específica.
Claros exemplos das ponderações aduzidas, até o
momento, são a usucapião e a acessão, que “não são
apenas modos originários de aquisição da propriedade,
mas também modos de perda da propriedade para aquele
proprietário desidioso, que não cuidou de resguardar a
sua posse”110, no tocante à primeiro. Assim como para aquele que
teve a coisa, considerada como acessória, unida ou
incorporada à propriedade do titular do bem principal111,
em relação à segunda.
2 DA PERDA DA PROPRIEDADE POR
ALIENAÇÃO
Consagrada no inciso I do art. 1.275 do Código de
2002, a alienação é apresentada como o negócio jurídico,
por meio do qual o proprietário, gozando da autonomia
privada que dispõe, gratuita (através da doação) ou
110 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 402. 111 Neste sentido: DINIZ, 2011, p. 194-195: “A acessão (CC, arts.
1.248 a 1.259), que se dá pela união ou incorporação de uma coisa a
outra pertencente a outrem, acarretando a aquisição de domínio
desse último e perda para o proprietário que sofre as consequências
da acessão”.
102
onerosamente (mediante venda, dação em pagamento ou
permuta), transfere a outro o direito que detém sobre
determinada coisa, imóvel ou móvel. Em igual
sedimento, colhe-se que a alienação “é uma forma de
extinção subjetiva do domínio, em que o titular desse
direito, por vontade própria, transmite a outrem seu
direito sobre a coisa. É a transmissão de um direito de
um patrimônio a outro”112. Aliás, do vocábulo “alienar”
infere-se justamente tal acepção, tornando a coisa alheia.
Aqui, cabe ressaltar o instituto em exame é reservado tão
somente às transmissões consideradas como voluntárias,
frutos de um negócio jurídico bilateral, há a presença do
elemento subjetivo, consistente na manifestação de
vontade do proprietário da coisa.
A alienação, enquanto forma de transmissão, é
constituída de elementos que integram sua natureza, a
saber: a) a existência de um direito de posse do titular; b)
a manifestação do mencionado direito, externado por
meio da vontade do proprietário em transmiti-lo a
outrem; c) a aceitação à vontade do proprietário
primitivo, substanciada por meio da aceitação do
112 DINIZ, 2011, p. 196.
103
indivíduo beneficiado com a transferência; d) a existência
de liame entre a perda do direito para o proprietário
primitivo e sua aquisição pelo beneficiado; e, e) a
contemporaneidade entre os atos de perda e aquisição de
propriedade, assim como a dependência existente entre
os mencionados, sendo decorrentes da mesma causa
jurídica, ou seja, a perda e aquisição da propriedade do
bem, móvel ou imóvel, é fruto do mesmo negócio.
Consoante aduz Venosa113, o preceito que vigora
na espécie em destaque é que o proprietário não poderá
transmitir mais direitos do que é detentor. Cuida
arrazoar que, em se tratando de alienação de coisa
imóvel, necessária se faz revestir tal ato da solenidade
carecida, consistente, notadamente quando o bem
ultrapassa o quantum de trinta salários mínimos, na
escritura pública, para que haja o aperfeiçoamento do
entabulado. Ao lado disso, insta trazer à colação a
redação do art. 108 do Estatuto Civilista, que assim
verbaliza:
113 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direitos Reais, 10ª ed.
São Paulo: Editora Atlas, 2010, p. 164-165.
104
Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a
escritura pública é essencial à validade dos
negócios jurídicos que visem à constituição,
transferência, modificação ou renúncia de
direitos reais sobre imóveis de valor
superior a trinta vezes o maior salário-
mínimo vigente no País114.
Assim, em decorrência da alienação conter em seu
âmago o ideário de transmissibilidade, não se verifica
ínterim em que o bem seja despido de titularização, logo,
em se tratando de bens imóveis, este não se tornará res
nullius. Há uma automaticidade, vez que enquanto o
alienante perde a propriedade, esta é ganhada pelo
adquirente da coisa. Como bem salienta Farias &
Rosenvald, “daí a importância da aferição da existência,
validade e eficácia do negócio jurídico transmissivo,
ainda que não haja eficácia real”115.
Em oposição ao exposto, o efeito oriundo da perda
da propriedade pela alienação estará sempre
subordinado à tradição, como inclusive se infere da
redação do art. 1.226 do Código Civil, “Art. 1.226. Os
direitos reais sobre coisas móveis, quando constituídos,
114 BRASIL. Lei Nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o
Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso
em: 22 jan. 2012. 115 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 404.
105
ou transmitidos por ato entre vivos, só se adquirem com
a tradição”. De igual modo, “na compra e venda de bens
móveis, a aquisição da propriedade se faz mediante
simples tradição do bem. Assim, para fins de
demonstração da propriedade sobre veículo automotor,
basta que a parte demonstre tê-lo em sua posse, a título
de operação de compra e venda”116. Obviamente, excetua-
se a tal redação os aviões e navios, que necessitam de
registro para que a alienação possa restar aperfeiçoada.
Por derradeiro, calha salientar que tão somente
inexistirá a alienação sem o consentimento do
proprietário do bem, quando restar demonstrada a
presença de cláusula de retrovenda, na qual o alienante
pode exercer o direito de recobrar a coisa imóvel,
atentando-se para o prazo decadencial fixado na lei, qual
seja: 03 (três) anos, a contar do registro, como bem
entalha o art. 505 da Lei Civilista. “O proprietário estará
em situação de sujeição, pois o vendedor poderá
116 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Órgão Julgador:
Décima Sexta Câmara Cível. Apelação Cível Nº. 70034531475.
Relator: Desembargador Paulo Sérgio Scarparo. Julgado em:
18.03.2010. Disponível em: <//www.tjrs.jus.br>. Acesso em: 22 jan.
2012.
106
unilateralmente alterar a sua esfera jurídica sem
qualquer possibilidade de oposição”117.
3 DA PERDA DA PROPRIEDADE POR RENÚNCIA
Em linhas inaugurais, tem-se que a renúncia é um
negócio jurídico unilateral, por meio do qual o
proprietário da coisa declara, formal e explicitamente, o
intento de despojar-se da propriedade. Assim, infere-se
que, em oposição ao instituto da alienação, na renúncia
nada é transmitido a ninguém, tão somente há a
abdicação do direito real existente, sendo a coisa
convertida em res nullius. Ao lado disso, pontua Diniz, “a
renúncia (CC, art. 1.275, II) é um ato unilateral, pelo
qual o proprietário declara, expressamente, o seu intuito
de abrir mão de seu direito sobre a coisa, em favor de
terceira pessoa que não precisa manifestar sua
aceitação”.De igual maneira, pode-se trazer à colação as
ponderações apresentadas por Luciano de Camargo
Penteado118:
117 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 404. 118 PENTEADO, Luciano de Camargo. Direito das Coisas. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 304-305.
107
A renúncia é negócio jurídico unilateral não
receptício. Daí que seus efeitos dependam
de declaração de vontade jurídico-negocial
expressa, a qual não depende de outra
vontade para produzir seus efeitos
específicos. (…) A renúncia tem por efeito
tornar o bem sem dono, isto é res nullius.
Deste modo, perde a titularidade subjetiva,
convertendo-se em bem vago que,
preenchidos os pressupostos, poderá ser
arrecadado. Assim como a alienação, a
renúncia só produz efeitos quando levada a
registro no CRI competente (CC 1.275
parágrafo único).
A renúncia, para restar devidamente
caracterizada, segundo Farias & Rosenvald119, não
poderá ser consolidada em favor de outrem, sob pena de
corporificar o instituto da doação, tratando-se,
obviamente, de uma alienação gratuita. Deste modo,
desde que não subsista qualquer prejuízo a terceiros, é
sempre possível a renúncia aos direitos incidentes sobre
um imóvel. Insta, ainda nesta senda, evidenciar que, em
decorrência da gravidade que o instituto em comento
possui, como também as consequências produzidas, é
exigida a sua formalização, por meio de escritura pública,
nos moldes preceituados no art. 108 do Código Civil
119 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 404.
108
vigente. Nesta trilha, “o Código de 2002, todavia, no art.
108, dispõe que a escritura pública é essencial também
para a renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor
superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no
país”120.
Ademais, não se pode olvidar que, antes do
registro do ato renunciativo, o proprietário poderá
desconstituir a abdicação, mantendo a coisa para si ou
mesmo alienando-o a terceira pessoa. Em razão da
renúncia acarretar a perda jurídica da propriedade
imobiliária, não subsiste qualquer óbice que o
renunciante se mantenha na posse do bem, exercendo o
poder fático sobre a coisa, sem que haja qualquer
alteração. Nestes termos, “a modalidade de renúncia à
propriedade imobiliária que acarreta imediata aquisição
patrimonial para o novo proprietário é a renúncia à
herança (art. 1.804, parágrafo único, do CC)”121.
Para tanto, gize-se que o quinhão alvo da
renúncia, por parte do herdeiro, será transferido ao
acervo hereditário, em favor dos demais coerdeiros da
mesma classe, sendo necessária a formalização, quer seja
120 VENOSA, 2010, p. 267. 121 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 405.
109
por meio de escritura pública, quer seja por meio de
declarações que instruirão o processo de inventário,
sendo levado ao registro imobiliário, ao final, quando do
registro do formal de partilha. Sobre a renúncia da
herança, cumpre trazer à baila lição de Orlando Gomes:
Renúncia é o negócio jurídico unilateral pelo
qual o herdeiro declara não aceitar a
herança. [...] A renúncia é retratável, mas
somente se proveniente de violência, erro ou
dolo. Não há, portanto, liberdade de revogá-
la. [...] A impugnação por erro é censurável,
por atentar contra o interesse público que
quer a estabilidade das transmissões
hereditárias. A renúncia tem eficácia
retroativa. Tem-se o renunciante como se
jamais fora chamado a sucessão.
Consequentemente, os herdeiros do
renunciante não o representam. Ninguém
sucede ao renunciante por direito de
representação. Mas, se ele for o único
legítimo de sua classe ou se todos os outros
da mesma classe renunciarem à herança,
poderão os filhos vir a sucessão, por direito
próprio. [...] Se são renunciantes todos os
filhos do auctor sucessionis, seus
descendentes de primeiro grau herdam por
cabeça, dividindo-se a herança, por exemplo,
entre dez netos do mesmo de cujus, tendo o
primeiro dois filhos, o segundo, três, e o
terceiro, cinco, e não em três partes. [...] A
renúncia não é translativa. Por outras
palavras, não importa transmissão de bens
110
ou direitos. Não se confunde, enfim, com a
cessão de herança. É ato abdicativo122.
Além disso, faz-se carecido salientar que, em sendo
a renúncia praticada tão somente em favor de um dos
herdeiros, em detrimento do demais, estar-se-á diante de
uma cessão de herança, que não é portadora de aspecto
abdicativo, mas sim translativo, dando corpo à alienação.
Id est, concede-se a denominação de cessão de direitos ao
negócio jurídico de alienação dos bens incorpóreos ou
mesmo de uma universalidade de bens corpóreos, que se
encontram em processo de divisão. “A renúncia
propriamente dita é a abdicativa, também chamada de
pura e simples, e é aquela em favor do monte. A renúncia
dita translativa equivale à verdadeira cessão de direitos
hereditários”123.
Nessa trilha, cuida arrazoar que, em decorrência
da formalidade que reveste o instituto em tela,
considera-se que sua aplicação não se estende a perda da
122 GOMES, Orlando. Sucessões. 7 ed. Rio de Janeiro: Editora
Forense, 1998, p. 22-24. 123 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Órgão Julgador:
Oitava Câmara Cível. Agravo de Instrumento Nº 70007963267.
Relator: Desembargadora Catarina Rita Krieger Martins. Julgado
em 20.05.2004. Disponível em: <//www.tjrs.jus.br>. Acesso em: 22
jan. 2012.
111
propriedade sobre bens móveis. Excetua-se ao exposto, o
patrimônio mobiliário que se encontra no direito
hereditário, podendo ser alvo da abdicação do herdeiro.
Em se tratando de objetos móveis, contumaz é a prática
do abandono.
4 DA PERDA DA PROPRIEDADE POR
ABANDONO
Também denominado de derrelicção ou derelição, o
abandono é descrito como o ato material por meio do qual
o proprietário da coisa se desfaz do bem, porque não quer
mais ser seu dono. Em razão do abandono não ser um ato
expresso, a exemplo do que é a renúncia e a alienação, a
materialização de tal instituto é fruto de atos exteriores
que demonstram a explícita intenção de abandonar a
coisa. Já se decidiu, inclusive, que o simples desprezo
físico pela coisa, caso não esteja acompanhado de sinais
evidentes de abdicar da coisa, não é suficiente para
consubstanciar o abandono. “Em outras palavras, o mero
desuso não importa em abandono; fundamental é a
conjugação ao elemento psíquico, na perquirição do real
112
interesse do titular de se desfazer da propriedade”124.
Nesta linha, também, ensina Luciano de Camargo
Penteado125:
Outra forma de perda da propriedade é o
abandono. Por esta modalidade perde-se a
propriedade sem que tenha que falar em
negócio jurídico. Para sua configuração
basta uma intenção inequívoca de não
conservar mais o bem no patrimônio do
abandonante, manifestada por algum ato,
mesmo que seja a perda da posse com
intenção de definitividade.
Além disso, faz-se necessário salientar, como
aspecto caracterizador, é que o abandono constitui
negócio jurídico unilateral, tal como a renúncia, estando
adstrito à esfera jurídica do abandonante. No mais, a
manifestação da vontade daquele que abandona é não
receptícia, porquanto não está direcionada a outra
pessoa, logo, independe de manifestação da vontade para
que o negócio jurídico possa existir e, por consequência,
cumprir o fito a que se propõe. Com efeito, o proprietário
goza da faculdade de usar a coisa sobre a qual recai seu
124 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 406. 125 PENTEADO, 2008, p. 305.
113
direito, estando englobada em tal acepção a possibilidade
de não-utilizar.
Nessa trilha, faz-se necessário pontuar que o
abandono não se presume, ao contrário, sua
demonstração é imprescindível para restar configurado o
instituto do abandono. Um fato que traz bastante
interesse concerne à faculdade consagrada na redação do
art. 1.276126 do Código Civil, diccionando que o imóvel
abandonado será alvo de arrecadação, como se bem vago
fosse, e, transcorrido o período de três anos fixados na
legislação, passará a integrar a propriedade do Município
ou do Distrito Federal, se estiver alocado na zona urbano;
entretanto, em estando localizado na zona rural, será
arrecadado pela União.
126 BRASIL. Lei Nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o
Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso
em: 22 jan. 2012: “Art. 1.276. O imóvel urbano que o proprietário
abandonar, com a intenção de não mais o conservar em seu
patrimônio, e que se não encontrar na posse de outrem, poderá ser
arrecadado, como bem vago, e passar, três anos depois, à
propriedade do Município ou à do Distrito Federal, se se achar nas
respectivas circunscrições: § 1o O imóvel situado na zona rural,
abandonado nas mesmas circunstâncias, poderá ser arrecadado,
como bem vago, e passar, três anos depois, à propriedade da União,
onde quer que ele se localize.”
114
Imperioso se revela que o dispositivo legal não traz
à lume qual o regramento para aferimento da localização
como sendo urbano ou rural, sendo aceito, “por sintonia
com o instituto da usucapião (art. 191 da CF) e da
tributação (IPTU ou ITR), parece-nos ser a localização do
imóvel o fato distintivo para determinar a competência
da União ou do Município para o procedimento da
arrecadação”127. Assim, guardando congruência com o
entalhado, imprescindível será a análise do Plano
Diretor Urbano, a fim de se constatar a localização do
imóvel abandonado, considerando, por exclusão, sua
localização na zona rural, quando então a arrecadação
será da União.
Outra celeuma existente, no que tange ao assunto
em tela, junge-se ao momento em que verifica a perda da
propriedade imobiliária, em decorrência do abandono.
“Alguns autores defendem a manutenção da propriedade
em nome do abandonante até o momento de sua
arrecadação pelo Poder Público, podendo reivindicá-la
quando bem lhe aprouver”128. Desta feita, enquanto a
arrecadação não se concretizar, o particular conservará a
127 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 407. 128 Ibid.
115
titularidade, podendo, inclusive, transmitir a
propriedade do bem imóvel a outrem.
Ao lado disso, como bem pontua Washington de
Barros Monteiro129, no que tange ao processo de
abandono, denota-se dois momentos distintos, quais
sejam: há inicialmente a perda da propriedade, em razão
do abandono, e, posteriormente, opera-se a sua
arrecadação pelo Estado, momento em que a coisa,
outrora sem dono, se converte em propriedade pública.
Logo, segundo o entendimento explicitado alhures, até
que haja a eventual a apropriação do bem abandonado
pelo Poder Público, após o defluxo do lapso fixado em lei,
o imóvel, alvo do abandono, torna-se res nullius.
Vale salientar que o abandono dispensa a
formalidade do registro, todavia, a eficácia da perda da
propriedade, em relação à coletividade, só ocorrerá
quando houver alteração no Registro Geral de Imóveis,
passando a constar o nome do novo proprietário. Assim,
para que haja eficácia erga omnes é imprescindível tal
formalidade, porquanto, durante o período em que não se
consumar, o abandono não terá eficácia completa, sendo
129 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil, 23
ed. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 169.
116
considerado como proprietário do imóvel aquele que
constar dos assentamentos do registro.
Outra questão que merece ser espancada está
adstrita à premissa de que, em razão do decurso do
tempo por si só não transferir o imóvel abandonado ao
domínio, sendo necessário, como visto acima, a
arrecadação, não há qualquer óbice que particular possa
completar tempo hábil de posse que autorize à usucapião,
utilizando-se da desídia conjunta do abandonante e do
Ente Estatal. A prescrição aquisitiva só será
interrompida, após iniciado o procedimento de
arrecadação. “Ou seja, sendo a coisa ainda registrada em
nome do particular, contra ele e os demais litisconsortes
a ação será direcionada, eis que ainda não está a
propriedade submetida à regra da imprescritibilidade
dos bens públicos”130, cuja disposição encontra-se inserta
na redação do art. 102 do Código Civil. Segundo Venosa,
“o Estado deve intervir para arrecadar bem abandonado,
se ninguém exerce a posse. Embora em curso o processo
130 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 407-408.
117
de arrecadação do Estado, pode ocorrer a prescrição
aquisitiva pelo particular”131.
Ademais, impõe destacar que o caput do art. 1.276
do Estatuto de 2002 alberga em sua redação, em
ressonância aos dispositivos constitucionais,
notadamente a dignidade da pessoa humana e a função
social da propriedade, a premissa que o imóvel
abandonado só será alvo de arrecadação se não estiver
em posse de outrem. Logo, por tal previsão, constata-se
não basta tão somente a demonstração de que o
abandonante não mais deseja o bem para si, porquanto
“a posse de terceiros sobre o bem é fator suficiente para
conceder função social à propriedade e determinar a
exclusão da pretensão à titularidade pelo Poder
Público”132. Neste sentido, já se decidiu:
Ementa: Apelação Cível. Propriedade e
Direitos Reais sobre coisas alheias. Ação
Reivindicatória. Improcedência. Abandono
do Imóvel pelos proprietários. Inexistência
de Interesse pela área, a qual inclusive
serviu de lixão por longos anos.
Ajuizamento da Ação Dominial quando já
consolidada a ocupação por várias famílias e
131 VENOSA, 2010, p. 267. 132 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 408.
118
fulminado, pelo decurso do tempo, o direito
de propriedade. Descaso que gerou invasão
sistemática do terreno. Processo de
favelização consolidado. De regra, o
proprietário tem direito de reaver a coisa
do poder de quem quer que injustamente a
possua. Todavia, o direito de propriedade
não é absoluto, podendo, em
situações excepcionais, perecer, como no
caso de evidente abandono por seu titular.
Hipótese em que o não-exercício dos poderes
dominiais propiciou a instalação sistemática
de diversas famílias sobre o imóvel, com
desmembramento da área em vários lotes e
instalação de luz, água e esgoto, tudo a
evidenciar a consolidação do processo de
favelização da área. Situação estabilizada
sobre o imóvel que inviabiliza o
acolhimento da pretensão reivindicatória.
Precedente do Superior Tribunal de
Justiça. Preliminares rejeitadas e recurso
de apelação desprovido. (Tribunal de
Justiça do Estado do Rio Grande do Sul –
Décima Oitava Câmara Cível/ Apelação
Cível Nº. 70034617597/ Relator:
Desembargador Pedro Celsa Dal Prá/
Julgado em 02.12.2010) (destaque nosso)
Impõe colocar em destaque, também, que subsiste,
a partir do entalhado no §2º do art. 1.276, uma presunção
de absoluta de abandono, quando restar consubstanciado
a conjugação do desuso, por parte do proprietário, e o
inadimplemento os tributos reais. Logo, em subsistindo a
inércia do proprietário em promover o pagamento dos
119
tributos incidentes, aliado ao abandono do bem, o
procedimento de arrecadação, por parte do Ente Estatal
(Município/Distrito Federal ou União) será medida de
reafirmação dos preceitos de socialidade, sem que possa o
abandonante manejar oposição, porquanto restará
modelada a presunção absoluta que dá conta o
dispositivo supra. Destarte, verifica-se pela dicção do
acimado, repita-se, a valorização do emprego da
propriedade como elemento de potencialização da
dignidade do indivíduo.
5 DA PERDA DA PROPRIEDADE POR
PERECIMENTO
Ab initio, importa evidenciar que o perecimento
constitui modalidade involuntária de perda da
propriedade, porquanto, em decorrência da força da
natureza ou de ação antrópica, não mais subsiste o
direito, em decorrência de lhe faltar o objeto. No caso em
tela, vigora o antigo adágio “perecendo o objeto, perece o
direito”. Cumpre avultar que, para a materialização do
instituto do perecimento, é imprescindível que o fato
120
material alcance a substância da coisa de forma completa
ou, ainda, causando o desproveito das qualidades
estruturantes ou do valor econômico que a res possui.
Consoante Diniz distingue em seus argumentos,
“esse perecimento pode decorrer de ato involuntário, se
resultam de acontecimentos naturais, como: terremoto,
raio, incêndio etc., ou de ato voluntário do titular do
domínio, como no caso de destruição”133.
Ao lado do acinzelado, valendo-se, ainda, do
entendimento doutrinário construído alhures, que, em
subsistindo a devastação do prédio, quando ocorre, por
exemplo, incêndio, não há um perecimento total, mas
apenas parcial, que conservará o direito de propriedade.
Como bem destaca Nascimento, “onde resta terreno a
propriedade subsiste. Assim, se a construção do edifício
desaparece, por implosão ou queda, o domínio persiste
sobre terreno e não há que se falar em perda da
propriedade”134. Logo, por tal dicção, verifica-se que o
perecimento não se confunde com destruição ou
133 DINIZ, 2011, p. 200. 134 NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro do. Direitos Reais
Limitados. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2004, p.
174.
121
demolição. O imóvel não é destruído, mas sim o bem
acessório a ele agregado e que, comumente, traz
vantagem econômica ao proprietário. De outro turno, em
restando consubstanciada a demolição, o prédio vem a
ser desmanchado, entrementes o terreno permanece,
ainda que tenha sofrido desvalorização econômica.
Ainda como reflexo dos preceitos alocados na Carta
Constitucional de 1988, verifica-se a possibilidade do
perecimento jurídico da propriedade. Nesta hipótese, o
objeto sobre o qual o direito real incide ainda existe,
todavia, em decorrência de uma determinada situação,
há a desnaturação da coisa, culminando na perda da
propriedade. Tal exemplo é verificável normalmente
quando, em terrenos particulares de grande extensão, se
estruturam favelas ou mesmo conjuntos de moradias.
Nesta situação, ainda que o bem exista, qual seja: o
terreno alvo da invasão, denota-se que sua natureza
primária não mais subsiste, em razão das alterações dos
aspectos característicos iniciais, porquanto a realidade
fática colocada em apreciação teve o condão de provocar a
desnaturação da coisa, ocasionado o perecimento. Neste
sentido, há que se trazer à colação o entendimento
122
jurisprudencial consolidado pelo Superior Tribunal de
Justiça, ao apreciar matéria similar:
Ementa: Civil e Processual. Ação
Reivindicatória. Terrenos de loteamento
situados em área favelizada. Perecimento
do Direito de Propriedade. Abandono. CC,
arts. 524, 589, 77 e 78. Matéria de Fato.
Reexame. Impossibilidade. Súmula N. 7-
STJ. I. O direito de propriedade assegurado
no art. 524 do Código Civil anterior não é
absoluto, ocorrendo a sua perda em face do
abandono de terrenos de loteamento que
não chegou a ser concretamente
implantado, e que foi paulatinamente
favelizado ao longo do tempo, com a
desfiguração das frações e arruamento
originariamente previstos, consolidada, no
local, uma nova realidade social e
urbanística, consubstanciando a hipótese
prevista nos arts. 589 c/c 77 e 78, da mesma
lei substantiva. II. “A pretensão de simples
reexame de prova não enseja recurso
especial” - Súmula n. 7-STJ. III. Recurso
especial não conhecido. (Superior Tribunal
de Justiça – Quarta Turma/REsp
75.659/SP/ Relator: Ministro Aldir
Passarinho Júnior/ Julgado em 21.06.2005/
Publicado no DJ em 29.08.2005, p. 344)
(destaque nosso)
123
6 DA PERDA DA PROPRIEDADE POR
DESAPROPRIAÇÃO
6.1 Da Desapropriação Administrativa
A desapropriação por necessidade de utilidade
pública ou interesse social é descrita como modalidade
especial de perda da propriedade. Tal fato se deve em
razão de pertencer ao âmbito do direito público, sendo
espancada pela Constituição Federal e regulamentada
por normas administrativas, processuais e civis.
Obviamente, respeitando os entendimentos doutrinários
e jurisprudenciais distintos, há que se reconhecer a
desapropriação como uma situação especial que tem o
condão de causar a perda da propriedade, porquanto esta
é transferida, por necessidade ou utilidade pública ao
Ente Estatal.
A situação entelada encontra respaldo do interesse
da coletividade que se sobrepõe aos interesses
individuais, dentre estes a propriedade, em
determinadas hipóteses. Cuida ressaltar que a
desapropriação é considerada como a forma mais
124
drástica da manifestação do “poder de império”, isto é, da
soberania, em âmbito interno, exercida pelo Estado, no
que concerne à sua atuação sobre os bens existentes no
território nacional. Todavia, é necessário que seja
exercido dentro dos limites contornados pelas garantias
constitucionais.
Venosa entende “tratar-se de modo originário de
aquisição da propriedade, porque é desprezado o título
anterior. O título gerado no procedimento administrativo
ou no processo expropriatório é registrável por força
própria. É dispensada a existência de registro
anterior”135. Em inexistindo matrícula do imóvel no
Registro Geral de Imóveis, esta será feita, em
decorrência do registro do título expropriatório.
Considerando que se trata de modo originário de
aquisição da propriedade, cuida salientar o marcha
processual pode se desenvolver sem que a Administração
tenha conhecimento quem seja o proprietário do bem
expropriado. Há que se evidenciar que, no processo
expropriatório, não existe discussão de domínio, mas tão
apenas do quantum a ser pago pelo bem desapropriado.
135 VENOSA, 2010, p. 269.
125
Os bens incorporados à Fazenda Pública não podem
figurar como objeto de reivindicação, ainda que haja
nulidade do processo de desapropriação.
Implica, ainda, traçar que a desapropriação não se
confunde com o instituto da alienação, porque se trata de
transferência, dotada de cunho compulsório, em
decorrência de ato unilateral da Administração Pública.
Trata-se de modalidade de perda da propriedade, a partir
de uma ótica civilista. No mais, qualquer bem é passível
de desapropriação, incluindo-se o subsolo e o espaço
aéreo, assim como os pertencentes a Administração,
observando que a União poderá desapropriar bens que
pertençam aos Estados, Distrito Federal e Municípios e
Estados poderão desapropriar bens pertencentes à
Municipalidade. Mister se faz pontuar que os imóveis
rurais de pequeno e médio porte não são suscetíveis de
desapropriação, com o escopo de promoção da reforma
agrária, desde que seja a única do proprietário. Assim, a
propriedade rural produtiva não será alvo de
desapropriação.
A desapropriação pode ser dividida nas seguintes
espécies: a) por razões de utilidade pública para
126
satisfazer interesses coletivos, previsto no art. 5º do
Decreto-Lei Nº 3.365/1941; b) necessidade pública, por
questões urgentes de segurança e salubridade pública; c)
interesse social para fins de reforma agrária, preceituada
no art. 184 da Constituição Federal. Verifica-se que o
instituto em comento se dá duas formas distintas. Uma
das formas é a que caminha pela via administrativa, na
qual o Ente Estatal expressa o interesse na
desapropriação. Caso a desapropriação se dê de forma
regular, também denominada direta, confecciona-se um
ato administrativo de desapropriação, mediante, via de
regra, ao pagamento de indenização em dinheiro. A outra
é a judicial, ocorrendo quando não há acordo com o
proprietário sobre o valor da oferta, movendo-se a ação
contra o titular da propriedade, a fim de que o julgador
fixe o numerário a ser pago. “Mediante depósito prévio de
importância tida como razoável pelo expropriante e
declaração de urgência, poderá ele se imitir na posse
provisória do bem, mesmo antes da citação ou do
transcurso da lide”136.
136 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 412.
127
Entrementes, caso a desapropriação se dê sem as
observâncias das exigências legais, não se promulgando o
decreto expropriatório competente ou mesmo o não
pagamento da indenização, ter-se-á a denominada
desapropriação indireta, que consiste em um esbulho e
ilícito administrativo. Nesta situação, o expropriado
gozará de legitimidade para ajuizar a pretensão de
reintegração de posse, ou ainda receberá a indenização
correspondente ao valor do bem, quando restar
devidamente demonstrado que a obra pública já encontra
em andamento, prevalecendo, obviamente, o interesse
social em detrimento do particular.
Já se decidiu que “a desapropriação indireta
caracteriza-se como sendo o fato pelo qual a
Administração Pública se apropria de bem particular,
sem a observância dos requisitos para sua
desapropriação, como a declaração e indenização
prévia”137. Note-se que a desapropriação indireta é ato
manifestamente ilícito, proveniente do apossamento
137 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Órgão Julgador:
Quarta Câmara Cível. Apelação Cível Nº. 70043508308. Relator:
Desembargador José Luiz Reis de Azambuja. Julgado em:
23.11.2011. Disponível em: <www.tjrs.jus.br>. Acesso em: 28 jan.
2012.
128
administrativo sem o devido processo legal e, conforme o
autor José Carlos de Moraes Salles:
[…] não importa que tenha sido editada a
competente declaração de utilidade pública
ou de interesse social: se o desapossamento
ocorreu sem o respectivo processo de
desapropriação, o ato do Poder Público é
ilícito. Essa ilicitude só não se verificará na
hipótese de o proprietário do bem haver
consentido em que o desapossamento
ocorresse, sem acordo ou sem o
correspondente processo judicial, visando,
assim, colaborar com a Administração. Nem
por isso, entretanto, perderá o direito a uma
justa indenização, ainda que a posteriori138.
Outra modalidade do instituto em comento é
desapropriação-sanção, decorrente de uma pena ao
proprietário inadimplente, na função social afixada pelo
Município, encontrando previsão legal no art. 182, §4º, da
Constituição Federal e art.8º da Lei Nº. 10.257/2001. Tal
como ocorre na desapropriação com o escopo da reforma
agrária, a indenização a ser paga pela desapropriação-
sanção será por títulos e não em dinheiro. Isto é, em
situação de falta de pagamento do IPTU, a
138 SALLES, José Carlos de Moraes. A Desapropriação à luz da
doutrina e da jurisprudência. 6 ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2009, p. 733.
129
Municipalidade poderá desapropriar o imóvel, como
forma de punição ao antigo proprietário que não
observou a função social estabelecida pelo Ente Estatal.
6.2 Da Desapropriação Judicial baseada na Posse
Pro Labore
Situação peculiar consagrada na redação dos §§4º
e5º do art. 1.228 do Código Civil de 2002 alude ao ideário
que o proprietário poderá ser privado da coisa, caso o
imóvel objeto da reivindicação consistir em extensa área,
na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos,
de um determinado número de pessoas e estas tiverem
realizado obras e serviços considerados de interesse
social e econômico relevante. Vale salientar que
mencionadas realizações podem se dar de maneira
individual como coletiva. Denota-se que a valorização da
construção ou mesmo plantação supere à da propriedade,
assim como comprovação da boa-fé daqueles que nela se
encontram instalados, tratando-se, com efeito, de
requisito de caracterização do próprio instituto. No mais,
caberá ao magistrado, fixar a justa indenização a ser
130
paga ao proprietário primitivo, em razão da perda da
propriedade.
Diniz, ao abordar o tema, descreve que o instituto
em telas, para alguns doutrinadores, daria corpo a uma
“usucapião onerosa”, já que os “possuidores-
usucapientes” ficariam condicionados ao pagamento de
um quantum, a título de indenização, a ser arbitrado
pelo juiz. “No entanto, o desideratum do novel Código
Civil parece ter sido a configuração de uma
desapropriação judicial pela posse qualificada, pois, ante
a colisão do direito de propriedade com o princípio da
função social da propriedade, privilegiou-se o
segundo”139. Por mais uma vez, verifica-se que, no
sopesar do direito à propriedade e os princípios
constitucionais da função social da propriedade e da
dignidade da pessoa humana, os corolários afiguram
dotado de maciça relevância, tratando-se de verdadeiros
pavilhões que regem a interpretação do texto legal e sua
amoldagem ao caso concreto.
Ora, por um viés pós-positivista, inovou o
Ordenamento Jurídico ao assegurar, notadamente no
139 DINIZ, 2011, p. 212.
131
caso em testilha, que só há que subsistir proteção legal se
a propriedade é produtiva, atende aos preceitos
socioeconômicos, mediante um aproveitamento racional e
adequado, representado por serviços e obras dotados de
relevância. Aliás, há que se citar o entendimento de
Verdan, notadamente quando destaca que “esta doutrina
[pós-positivista] é o ponto culminante de uma
progressiva evolução acerca do valor atribuído aos
princípios em face da legislação”140. O que há de ser
preponderado, no caso em destaque, é o alcance e
potencialização dos princípios que salvaguardam a
dignidade da pessoa humana, o que se dá, comumente,
com condições mínimas de sobrevivência.
Quadra evidenciar que a posse, na desapropriação
judicial, é maciçamente qualificada, em razão do valor
laborativo de um número considerável de pessoas,
devendo, obviamente, a quantidade ser apurada, a partir
de um critério estruturado na extensão da área possuída,
em decorrência da realização de obras, loteamentos ou
140 VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do
Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun.
2009. Disponível em: <http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em: 28 jan.
2012.
132
ainda serviços produtivos. Atua, ainda, como mecanismo
qualificador o fato de haver, na área, a construção de
residência, de prédio destinado ao lazer ou ao ensino ou
mesmo empresa, ou seja, urbanização. Com isso, afere-se
as vantagens e proveitos que o trabalho empregado na
área trará à coletividade, o que, por vezes, acarreta na
geração de empregos, potencialização da produção
agrícola e estabelecimento de habitações para a
população de baixa-renda. Assim, reafirmam-se os
dogmas já explicitados, assim como alardeia-se os
aspectos de humanização que devem afetar a
propriedade.
7 OUTRAS FORMAS DE PERDA DA
PROPRIEDADE
Como fora descrito alhures, os modos de perda da
propriedade não se encontram taxativamente previsto na
redação do art. 1.275 do Código Civil, tratando-se, na
realidade, de um rol meramente exemplificativo,
comportando, por extensão, demais situações previstas
no Ordenamento Jurídico. Entre os diversos exemplos
133
previstos, cuida-se analisar a arrematação, a
adjudicação, a propriedade resolúvel, o confisco e a
requisição.
7.1 Da Arrematação
Considerada como uma forma de perda da
propriedade, a arrematação é descrita como modo de
transferência, forçada, de bens penhorados para a
satisfação do direito creditício do exequente. Para tanto,
procede-se a penhora dos bens que a parte executada
possui. Ao lado do exposto, há que se arrazoar que
“é realizada por meio de alienação judicial, na qual bens
precisam ser transformados em dinheiro para que se
efetue o pagamento do credor. Se estes bens a serem
transferidos forem imóveis, será através de praça, porém
se forem móveis será por meio de leilão”141. Assim, infere-
se que há a supressão do elemento subjetivo do
proprietário, consistente em sua manifestação de
141 SANTOS, Maiara Amaral dos. A Evicção de Bens adquiridos em
Hasta Pública e a Responsabilidade sobre seus riscos. In: Revista
Eletrônica do Curso de Direito da Universidade Federal de
Santa Maria, 2006, v. 02, n. 03, p. 01-12. Disponível em:
<http://www.ufsm.br>. Acesso em: 28 jan. 2012, p. 05.
134
vontade em concordar, ou não, já que há verdadeira
expropriação.
Quadra frisar que a transferência do bem
arrematado se dá por meio do pagamento da quantia
certa, por parte do arrematante que visa ter a
propriedade destes. Ao lado disse, mister se faz salientar
que os atos executórios que precedem a arrematação são
realizados por órgão jurisdicional, através da atuação
direta do magistrado. Logo, o aspecto primordial a ser
evidenciado tange à premissa de constituir a
arrematação verdadeira expropriação realizada pelo
Estado, sendo considerado como ato de natureza coativa,
dando-se em hasta pública, por meio do leilão (quando o
bem for móvel) ou praça (quando o bem for imóvel).
Já se decidiu que “a arrematação possui natureza
jurídica de venda, o que torna legítimo considerar o valor
dos bens arrematados judicialmente como seu valor
venal”142. No mais, como é cediço, a carta de arrematação
é o documento que configura título formal de aquisição
142 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Órgão Julgador:
Primeira Câmara Cível. Apelação Cível Nº. 70046032942. Relator:
Desembargador Jorge Maraschin dos Santos. Julgado em
07.12.2011. Disponível em: <www.tjrs.jus.br>. Acesso em: 28 jan.
2012.
135
da propriedade arrematada, sendo hábil para proceder a
transcrição ou mesmo o registro do bem que foi
arrematado. A respeito do tema, há que se citar a lição do
ilustre Araken de Assis: “O título formal habilita o
arrematante à aquisição do domínio mediante a
transcrição ou registro (art. 167, I, n. 26, da Lei
6.015/1973)”143.
7.2 Da Adjudicação
Em uma primeira plana, tem que se salientar que
a adjudicação é descrita como o ato judicial por meio do
que se declara e se estabelece que a propriedade de
determinada coisa (englobando tanto bem móvel como
imóvel) se transfere do proprietário primevo para o
credor, sendo o primeiro denominado transmitente e o
segundo adquirente. Este assumirá todos os direitos que
recaem sobre a coisa, podendo usar, dispor, gozar e frui
do bem. Vale salientar que o instituto da adjudicação é
verificável durante a fase executória de um processo, por
meio da qual o credor ambiciona a satisfação do crédito,
143 ASSIS, Araken de. Manual da Execução. 12. ed. rev. atual. e
ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 841.
136
por meio de coisa diversa da que lhe é devida. Trata-se
de um instituto afeto à ramificação processual do Direito,
previsto a partir do art. 647 do Estatuto de Ritos Civis
Pátrio.
Ao lado disso, cuida pontuar que o instituto em
comento é considerado como mecanismo singelo que tem
o condão de acarretar a expropriação patrimonial,
consistente na transferência da propriedade e da posse
de bem que se encontre penhorado ao
adquirente/adjudicante. Ademais, vale realçar que o
escopo primordial da adjudicação é a satisfação do
crédito vindicado pela parte exequente. Não subsiste, em
razão das ponderações aduzidas, constatar que o assunto
em tela dá corpo a um modo de perda da propriedade,
que a lei autoriza aos credores, com o intuito de receber o
crédito exequendo.
Como bem salienta Aragão, “a adjudicação é um
ato executório com caráter expropriatório, através do
qual o bem que está penhorado é retirado
compulsoriamente do patrimônio do executado e
137
incorporado ao patrimônio do exequente”144, sendo
necessária a manifestação do adjudicante para que possa
ocorrer a satisfação do crédito existente, o que se dá por
meio do recebimento de coisa distinta da que era devida.
Em igual sentido dicciona José Frederico Marques,
segundo o qual o instituto em destaque é um modo de
expropriação, conforme se verifica do excerto: “A
adjudicação é ato executivo de expropriação em que o
credor figura como adquirente de bem ou bens
penhorados”145.
7.3 Da Propriedade Resolúvel
O art. 1.359 do Estatuto Civilista vigente trata de
outra modalidade de perda da propriedade, quando trata
da propriedade resolúvel. “A propriedade é resolúvel,
quando o negócio jurídico que a constitui subordina
expressamente sua duração ao implemento de condição
144 ARAGÃO, Valdenir Cardoso. Origem, evolução histórica e
natureza da adjudicação no processo civil de acordo com a Lei
11.382/06. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 51, 31/03/2008.
Disponível em <http://www.ambito-juridico.com.br>. Acesso em: 28
jan. 2012. 145 MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual
Civil. 9 ed. Atualização por Ovídio Rocha Barros Sandoval.
Campinas: Editora Millennium, 2003, p. 217.
138
resolutiva ou advento do termo”146. Logo, em
sendo constatado o evento futuro e certo – ou incerto,
quando se tratar de condição resolutiva -, o proprietário
perderá o domínio, não sendo possível oposição contra o
novo proprietário. Ao lado disso, faz-se necessário
acrescer que a propriedade resolúvel é aquele que está
sujeita à condição ou termo, oriundo de convenção
firmada entre as partes ou decorrente da redação da lei,
ou ainda, de um fato jurídico superveniente.
Neste bastião, a propriedade resolúvel é
considerada como aquela que, no momento de sua
constituição, apresenta uma causa que tem o condão de
encerrar, compreendendo tanto um termo extintivo como
uma condição resolutória ou revogável. Logo,
consubstanciada a causa extintiva, a propriedade é
resolvida, id est, será extinto o direito a que ela abarca,
não detendo mais eficácia. Nesta senda, o instituto em
comento é a propriedade que tem sua própria
constituição uma condição que a encerrará em um dado
momento futuro.
146 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 403.
139
Trata-se de uma situação dotada de
excepcionalidade, porquanto a propriedade é revestida
dos aspectos característicos de perpetuidade do domínio.
Ao lado disso, é imprescindível que a cláusula que
consagra a resolução seja registrada no órgão
competente, sob pena de não produzir efeitos erga omnes.
Como exemplo do expendido, pode-se trazer à colação o
entendimento jurisprudencial, que acena no seguinte
sentido:
Ementa: Agravo de Instrumento. Alienação
Fiduciária. Incidente de Impenhorabilidade.
A devedora fiduciária não possui
legitimidade para alegar a
impenhorabilidade do bem dado em
garantia porquanto “A alienação fiduciária
em garantia expressa negócio jurídico em
que o adquirente de um bem móvel
transfere - sob condição resolutiva - ao
credor que financia a dívida, o domínio do
bem adquirido. Permanece, apenas, com a
posse direta. Em ocorrendo inadimplência
do financiado, consolida-se a propriedade
resolúvel" (REsp 47.047-1/SP, Rel. Min.
Humberto Gomes de Barros). Recurso
Improvido em Decisão Monocrática.
(Tribunal de Justiça do Estado do Rio
Grande do Sul – Décima Quarta Câmara
Cível/ Agravo de Instrumento Nº.
70045023421/ Relator: Desembargadora
Judith dos Santos Mottecy/ Julgado em
21.09.2011) (destaque nosso)
140
7.4 Do Confisco
A Constituição Federal, em seu art. 243147, traz
expressamente a possibilidade do proprietário perder sua
propriedade, quando for constatado o cultivo de plantas
psicotrópicas. Quando preceitua o dispositivo
constitucional que as glebas de qualquer região do país
onde for encontrado o cultivo ilegal de plantas
psicotrópicas serão imediatamente expropriadas, deixou
claro que a partir do momento em que fica comprovada a
existência do citado cultivo, podem ser tomadas as
devidas providências para a desapropriação da área
cultivada. Em tais situações, a responsabilidade do
proprietário é considerada como objetiva, não dependendo,
por consequência, da presença do elemento subjetivo para
que haja a configuração da conduta. “É objetiva a
147 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República
Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 28 jan. 2012:
“Art. 243. As glebas de qualquer região do País onde forem
localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas serão
imediatamente expropriadas e especificamente destinadas ao
assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e
medicamentosos, sem qualquer indenização ao proprietário e sem
prejuízo de outras sanções previstas em lei”.
141
responsabilidade do proprietário de terras destinadas
para o plantio de espécies psicotrópicas, sendo em
consequência irrelevante a existência ou inexistência de
culpa na utilização criminosa”148.
Insta pontuar que se considera como irrelevante a
circunstância de o proprietário eventualmente não saber
do cultivo ilegal realizado no imóvel, e para ele não
contribuir mediante conduta comissiva. Deveras, há de
se reconhecer que o expropriado, no mínimo, contribuiu
com a sua omissão, ao não adotar os cuidados de
vigilância, de forma a ensejar o uso ilícito da terra. No
mais, há que salientar, ainda, que a perda da
propriedade não está adstrita tão somete a área em que
as plantas psicotrópicas eram cultivadas, mas sim toda a
propriedade. Ao lado disso, figuram como requisitos para
a materialização do instituto em tela a presença do
trinômio: a constatação da materialidade do crime
(cultivo ilegal de planta psicotrópica); a identificação dos
148 BRASIL. Tribunal Regional da Quinta Região. Órgão
Julgador: Tribunal Pleno. AR nº 4.842 – PE. Relator:
Desembargador Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima. Julgado
em: 21.09.2005. Publicado em: 28.10.2005. Disponível em:
<http://www.trf5.jus.br> . Acesso em: 28 jan. 2012.
142
imóveis onde foram localizados os plantios e a
titularidade destes.
Além disso, perfilhando o entendimento construído
por Diniz, não há que se confundir o confisco entalhado
no art. 243 da Carta de Outubro como uma forma de
desapropriação, eis que esta é caracterizada pelo
pagamento de uma indenização referente à área, o que
não ocorre no caso do confisco. “Ante a utilização ilegal
da propriedade, será ela confiscada e destinada ao
assentamento de colonos e ao cultivo de produtos
alimentícios e medicamentos”149. Aliás, extrai-se tal
concepção do Decreto Nº. 577, de 24 de junho de 1992,
que dispõe sobre a expropriação das glebas, onde forem
encontradas culturas ilegais de plantas psicotrópicas e
dá outras providências150, traz em seu art. 7º tal
premissa, passando a área confiscada a incorporar o
patrimônio da União.
149 DINIZ, 2011, p. 195. 150 BRASIL. Decreto Nº 577, de 24 de junho de 1992. Dispõe sobre a
expropriação das glebas, onde forem encontradas culturas ilegais de
plantas psicotrópicas, e dá outras providencias. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 28 jan. 2012.
143
7.5 Da Requisição
Em um comento introdutório, tem-se que a
requisição é o ato por meio do qual o Estado, em proveito
de um interesse público, de modo unilateral e executório,
constitui determinado indivíduo na obrigação de prestar-
lhe serviço ou, transitoriamente, ceder-lhe o uso de uma
coisa, obrigando-se, em contrapartida, a indenizar os
prejuízos acarretados ao obrigado, provenientes de tal
medida. O Códex de 2002 traz em seus dispositivos
permissivos para que a autoridade competente, utilize,
de maneira provisória, propriedade particular, até onde o
bem público exigir. Vale salientar que tais possibilidades
encontram-se agasalhadas em determinados contextos, a
exemplo de situações de perigo iminente, como é o caso
de guerras ou comoções intestinas.
De igual modo, o art. 1.228, §3º, ao abordar a
possibilidade de requisição, também permitiu a
utilização da propriedade particular para promoção da
atividade urbanística, como ocorre, por exemplo, na
necessidade de estabelecer traçado viário, parcelamento
do solo e equipamentos urbanos, materializando-se como
144
instrumento coadjuvante da estrutura da política urbana
habitacional popular. Outrossim, admite-se também a
requisição da propriedade particular, de modo
transitório, para intervir no domínio econômico ou
facilitar a prestação de serviço público. Em todas as
situações apresentadas, repita-se, o proprietário da coisa
terá direito a perceber indenização. “Nos demais casos o
proprietário será previamente indenizado e, se recusar
essa indenização, consignar-se-lhe-á judicialmente o
valor. Idêntica disposição é encontrada na Constituição
Federal”151.
Há que realçar, também, que em determinadas
situações a requisição será considerada como definitiva,
quando tiver por objeto bens de consumo, pois não como
proceder a devolução da coisa. Como expendido acima, a
requisição também se assenta na prestação de serviços,
distinguindo-se da desapropriação que está adstrita
apenas a bens. Outro aspecto a ser sublinhado concerne
ao fato da requisição ser dotada de auto executoriedade,
ao passo que a desapropriação depende de acordo ou, na
impossibilidade deste, de procedimento judicial.
151 DINIZ, 2011, p. 210.
145
REFERÊNCIAS:
ARAGÃO, Valdenir Cardoso. Origem, evolução histórica
e natureza da adjudicação no processo civil de acordo
com a Lei 11.382/06. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande,
51, 31/03/2008. Disponível em <http://www.ambito-
juridico.com.br>. Acesso em: 28 jan. 2012.
ASSIS, Araken de. Manual da Execução. 12. ed. rev.
atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2009.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da)
República Federativa do Brasil. Brasília: Senado
Federal, 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 28 jan. 2012.
_________. Decreto Nº 577, de 24 de junho de 1992.
Dispõe sobre a expropriação das glebas, onde forem
encontradas culturas ilegais de plantas psicotrópicas, e
dá outras providencias. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 28 jan. 2012.
_________. Lei Nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002.
Institui o Código Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 28 jan. 2012.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil
Brasileiro: Direito das Coisas. V. 04. São Paulo: Editora
Saraiva, 2011
146
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson.
Direitos Reais. 7 ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen
Juris, 2011.
GAMA, Ricardo Rodrigues. Dicionário Básico
Jurídico. 1 ed. Campinas: Editora Russel, 2006.
GOMES, Orlando. Sucessões, 7ª ed. Rio de Janeiro:
Editora Forense, 1998.
HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles; FR
ANCO, Francisco Manoel de Mello. Minidicionário
Houaiss da Língua Portuguesa. 2 ed. (rev. e aum.).
Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2004.
MARQUES, José Frederico. Manual de Direito
Processual Civil. 9 ed. Atualização por Ovídio Rocha
Barros Sandoval. Campinas: Editora Millennium, 2003.
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito
Civil. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 1989 .
NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro do. Direitos
Reais Limitados. Porto Alegre: Editora Livraria do
Advogado, 2004.
PENTEADO, Luciano de Camargo. Direito das Coisas.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.
POLITO, André Guilherme. Dicionário de Sinônimos
e Antônimos. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2005.
147
SALLES, José Carlos de Moraes. A Desapropriação à
luz da doutrina e da jurisprudência. 6ª ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
SANTOS, Maiara Amaral dos. A Evicção de Bens
adquiridos em Hasta Pública e a Responsabilidade sobre
seus riscos. In: Revista Eletrônica do Curso de
Direito da Universidade Federal de Santa Maria,
2006, v. 02, n. 03, p. 01-12. Disponível em:
<http://www.ufsm.br>. Acesso em: 28 jan. 2012.
TOVAR, Leonardo Zehuri. O Papel dos Princípios no
Ordenamento Jurídico. Jus Navigandi, Teresina, ano
10, n. 696, 1 jun. 2005. Disponível no site:
<http://jus2.uol.com.br>. Acesso em: 22 jan. 2012.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direitos
Reais. 10 ed. São Paulo: Editora Atlas, 2010.
VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário
do Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas,
Bauru, 22 jun. 2009. Disponível em:
<http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em: 22 jan. 2012.
148
APONTAMENTOS ÀS RESTRIÇÕES AO DIREITO
DE PROPRIEDADE EM VIRTUDE DE INTERESSE
SOCIAL
Resumo: O objetivo do artigo em tela repousa na análise
das restrições ao direito de propriedade em virtude de
interesse social, pautando-se, para tanto, nas hipóteses
de restrições constitucionais e eleitoral, tal como as
limitações ao direito de propriedade rural e de natureza
militar. Há que se reconhecer o tema concernente à
intervenção do Estado na propriedade decorre da
evolução do perfil do Estado no cenário contemporâneo.
Tal fato deriva da premissa que o Ente Estatal não tem
suas ações limitadas tão somente à manutenção da
segurança externa e da paz interna, suprindo, via de
consequência, as ações individuais. O norte que tem
orientado essa relação é a da supremacia do interesse
público sobre o particular, constituindo verdadeiro
postulado político da intervenção do Estado na
propriedade. Os métodos de pesquisa pretendidos neste
149
artigo partem de uma pesquisa qualitativa, ancorada em
revisão bibliográfica e análise dos diplomas legais
pertinentes à temática. O artigo encontra-se estruturado
nos seguintes eixos: (i) apresentação geral do painel das
limitações à propriedade, a partir da edificação da figura
do Estado intervencionista, pautado na concreção da
supremacia do interesse público; (ii) restrições
constitucionais; (iii) limitações ao direito de propriedade
rural; (iv) limitações de natureza militar; (v) restrição em
razão da legislação eleitoral. A conclusão alcançada, após
o exame do posicionamento doutrinário e a legislação
orientadora acerca da temática, está alicerçada na
restrição ao direito de propriedade como mecanismo
imprescindível para a promoção e concreção da
supremacia do interesse público.
Palavras-chaves: Direito de Propriedade. Restrições.
Limitações à Propriedade.
Sumário: 1 Comentários Introdutórios: Fundamento das
Limitações à Propriedade; 2 Restrições Constitucionais;
3 Restrições Administrativas; 4 Limitações ao Direito de
Propriedade Rural; 5 Limitações de Natureza Militar; 6
Restrição em razão da Legislação Eleitoral
150
1 COMENTÁRIOS INTRODUTÓRIOS:
FUNDAMENTO DAS LIMITAÇÕES À
PROPRIEDADE
Em uma primeira plana, o tema concernente à
intervenção do Estado na propriedade decorre da
evolução do perfil do Estado no cenário contemporâneo.
Tal fato deriva da premissa que o Ente Estatal não tem
suas ações limitadas tão somente à manutenção da
segurança externa e da paz interna, suprindo, via de
consequência, as ações individuais. “Muito mais do que
isso, o Estado deve perceber e concretizar as aspirações
coletivas, exercendo papel de funda conotação social”152,
como obtempera José dos Santos Carvalho Filho. Nesta
esteira, durante o curso evolutivo da sociedade, o Estado
do século XIX não apresentava essa preocupação; ao
reverso, a doutrina do laissez feire assegurava ampla
liberdade aos indivíduos e considerava intocáveis os seus
direitos, mas, concomitantemente, permitia que os
abismos sociais se tornassem, cada vez mais, profundos,
colocando em exposição os inevitáveis conflitos oriundos
152 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito
Administrativo. 24 ed, rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Editora
Lumen Juris, 2011, p. 711.
151
da desigualdade, provenientes das distintas camadas
sociais.
Quadra pontuar que essa forma de Estado deu
origem ao Estado de Bem-estar, o qual utiliza de seu
poder supremo e coercitivo para suavizar, por meio de
uma intervenção decidida, algumas das consequências
consideradas mais penosas da desigualdade econômica.
“O bem-estar social é o bem comum, o bem do povo em
geral, expresso sob todas as formas de satisfação das
necessidades comunitárias”153, compreendo, aliás, as
exigências materiais e espirituais dos indivíduos
coletivamente considerados. Com realce, são as
necessidades consideradas vitais da comunidade, dos
grupos, das classes que constituem a sociedade.
Abandonando, paulatinamente, a posição de indiferente
distância, o Estado contemporâneo passa a assumir a
tarefar de garantir a prestação dos serviços
fundamentais e ampliando seu espectro social,
objetivando a materialização da proteção da sociedade
vista como um todo, e não mais como uma resultante do
somatório de individualidades.
153 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro,
38 ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2012, p. 661.
152
Neste sentido, inclusive, o Ministro Luiz Fux,
ao apreciar o Agravo Regimental no Recurso
Extraordinário com Agravo N° 672.579/RJ, firmou
entendimento que “ainda que seja de aplicação imediata
e incondicional a norma constitucional que estabeleça
direitos fundamentais, não pode o Ente Estatal
beneficiar-se de sua inércia em não regulamentar, em sua
esfera de competência, a aplicação de direito
constitucionalmente garantido”154. Desta feita, para
consubstanciar a novel feição adotada pelo Estado,
restou necessário que esse passasse a se imiscuir nas
relações dotadas de aspecto privado. “Para propiciar esse
bem-estar social o Poder Público pode intervir na
propriedade privada e nas atividades econômicas das
empresas, nos limites da competência constitucional
atribuída”155, por meio de normas legais e atos de
154 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em
Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo N°
672.579/RJ. Agravo regimental no recurso extraordinário com
agravo. Direito administrativo. Servidor público. Adicional noturno.
Regime de plantão semanal. Necessário reexame da legislação
infraconstitucional. Análise do contexto fático-probatório.
Impossibilidade. Incidência da súmula 279 do STF. Agravo
regimental desprovido. Órgão Julgador: Primeira Turma. Relator:
Ministro Luiz Fux. Julgado em 29 mai. 2012. Publicado em 19 jun.
2012. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 30 dez. 2014. 155 MEIRELLES, 2012, p. 662.
153
essência administrativa adequados aos objetivos contidos
na intervenção dos entes estatais.
Com efeito, nem sempre o Estado
intervencionista ostenta aspectos positivos, todavia, é
considerado melhor tolerar a hipertrofia com vistas à
defesa social do que assistir à sua ineficácia e
desinteresse diante dos conflitos produzidos pelos
distintos grupamentos sociais. Neste jaez, justamente, é
que se situa o dilema moderno na relação existente entre
o Estado e o indivíduo, porquanto para que possa atender
os reclamos globais da sociedade e captar as exigências
inerentes ao interesse público, é carecido que o Estado
atinja alguns interesses individuais. Ao lado disso, o
norte que tem orientado essa relação é a da supremacia
do interesse público sobre o particular, constituindo
verdadeiro postulado político da intervenção do Estado
na propriedade. “O princípio constitucional da
supremacia do interesse público, como modernamente
compreendido, impõe ao administrador ponderar, diante
do caso concreto, o conflito de interesses entre o público e
o privado, a fim de definir, à luz da proporcionalidade,
qual direito deve prevalecer sobre os demais”156.
156 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão proferido em
Recurso em Mandado de Segurança N° 27.428/GO. Administrativo.
Servidor público. Determinação de abertura de conta corrente em
154
2 RESTRIÇÕES CONSTITUCIONAIS
Em um primeiro momento, cuida explicitar
que a Constituição da República Federativa do Brasil de
1988157, em seu artigo 5º, inciso XXII, ao assegurar o
direito de propriedade, considerou a questão de suas
restrições, reaparecendo de forma analítica no artigo 170,
cujo fito maior está assentado na realização do
desenvolvimento nacional e da justiça social com base
nos seguintes corolários: liberdade de iniciativa;
valorização do trabalho como condição de dignidade da
pessoa humana, função social da propriedade, harmonia
e solidariedade entre as categorias sociais de produção;
repressão não só ao abuso do poder econômico,
caracterizado pelo domínio dos mercados, como também
a eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos
lucros e expansão das oportunidades de empregos
instituição financeira pré-determinada. Recebimento de proventos.
Possibilidade. Recurso ordinário improvido. Órgão Julgador: Quinta
Turma. Relator: Ministro Jorge Mussi. Julgado em 03 mar. 2011.
Publicado em 14 mar. 2011. Disponível em: <www.stj.jus.br>. Acesso
em 30 dez. 2014. 157 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República
Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014
155
produtivos. Maria Helena Diniz158 aponta que em tudo
isso há limitações ao direito de propriedade.
Em seu artigo 5º, inciso XXIV, o Texto
Constitucional aduz, ainda, sobre a desapropriação por
necessidade ou utilidade pública e por interesse social,
mediante prévia e justa indenização em dinheiro.
Igualmente, o artigo 182, §3º, estabelece que as
desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com
prévia e justa indenização. Já o §4º, inciso III, do
dispositivo retrocitado, autoriza o Poder Público
Municipal, visando ao atendimento da política urbana,
mediante lei específica, a exigir do solo urbano não
utilizado que promove seu aproveitamento sob pena de
desapropriação com pagamento em títulos de dívida
pública. E ante a necessidade de se realizar o
planejamento da reforma agrária prescreve no artigo 184
do Texto Constitucional que a União poderá promover a
desapropriação por interesse social de propriedade
territorial rural, com o pagamento em títulos de dívida
agrária, inclusive com a inserção de cláusula com
preservação de valor real, resgatáveis no ínterim de vinte
anos, a partir do segundo ano de sua emissão, sendo
158 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro:
Direito das Coisas. v. 04. 26 ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011, p.
280.
156
insuscetíveis de usucapião para fins de reforma agrária
os casos domiciliados no artigo 185159.
O inciso XXV do artigo 5º da Carta Magna
anota, ainda, acerca da utilização da propriedade
particular pelo Estado, em caso de perigo iminente ou em
circunstâncias excepcionais, estando assegurado ao
proprietário o pagamento da competente indenização. A
hipótese em comento materializa requisição que não
sacrifica o domínio em seu conjunto, porquanto é dotada
de caráter essencialmente temporário do uso do bem. “O
poder público, mediante lei, poderá exigir do dono do solo
urbano inutilizado que o aproveite sob pena de
parcelamento ou edificação compulsórios e de imposto
sobre a propriedade predial e territorial urbano
progressivo no tempo”160, objetivando acelerar o
desenvolvimento urbanístico.
159 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República
Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014. Art. 185.
São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária: I -
a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde
que seu proprietário não possua outra; II - a propriedade produtiva.
Parágrafo único. A lei garantirá tratamento especial à propriedade
produtiva e fixará normas para o cumprimento dos requisitos
relativos a sua função social. 160 DINIZ, 2011, p. 280.
157
3 LIMITAÇÕES AO DIREITO DE PROPRIEDADE
RURAL
A Lei nº 4.504, de 30 de Novembro de 1964161,
que dispõe sobre o Estatuto da Terra, e dá outras
providências, é responsável pela introdução de uma série
de inovações que objetivam dar melhor aproveitamento
às terras, procurando distribuí-las, de maneira a atender
aos princípios da justiça social e ao aumento de sua
produtividade. Criaram-se, nessa seara, limitações ao
direito de propriedade não apenas ao extinguir, de modo
gradativo, as formas de ocupação e exploração da terra
contrárias à sua função social, mas também ao
estabelecer normas sobre a alienação dos terrenos rurais.
“A Constituição Federal de 1988, art. 191 e parágrafo
único, e o Código Civil, art. 1.239, contemplam a
aquisição de imóvel particular rural, por meio de
usucapião pro labore, limitando o direito do proprietário
que o abandonou”162.
Oportunamente, cuida assinalar que o
instituto da servidão administrativa ambiental foi
161 BRASIL. Lei nº 4.504, de 30 de Novembro de 1964. Dispõe
sobre o Estatuto da Terra, e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014. 162 DINIZ, 2011, p. 287.
158
introduzido no ordenamento jurídico vigente pela Lei nº
12.651, de 25 de Maio de 2012163, que dispõe sobre a
proteção da vegetação nativa; altera as Leis nos 6.938, de
31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996,
e 11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis
nos 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de
abril de 1989, e a Medida Provisória no 2.166-67, de 24 de
agosto de 2001; e dá outras providências, ao introduzir o
artigo 9º-A Lei nº. 6.938, de 31 de agosto de 1981164, que
dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus
fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras
providências. Consoante a dicção do dispositivo legal ora
mencionado, o proprietária ou possuidor de imóvel,
pessoa natural ou jurídica, pode, por instrumento público
ou particular ou por termo administrativo firmado
perante órgão integrante do Sisnama, limitar o uso de
toda a sua propriedade ou de parte dela para preservar,
163 BRASIL. Lei nº 12.651, de 25 de Maio de 2012. Dispõe sobre a
proteção da vegetação nativa; altera as Leis nos 6.938, de 31 de
agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de
dezembro de 2006; revoga as Leis nos 4.771, de 15 de setembro de
1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória no 2.166-
67, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências. Disponível
em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014. 164 Idem. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispõe sobre a
Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de
formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014.
159
conservar ou recuperar os recursos ambientais
existentes, instituindo servidão ambiental.
Cuida ponderar que, em conformidade com as
lições apresentadas por Édis Milaré, “a servidão
ambiental é um dos instrumentos da Política Nacional do
Meio Ambiente e envolve, basicamente, a renúncia
voluntária do proprietário rural, ao direito de uso,
exploração ou supressão dos recursos naturais existentes
em determinado prédio particular”165. Quadra frisar,
ainda, que a própria legislação estabelece, de maneira
clara, a estrutura e os requisitos da servidão ambiental,
sendo interessante destacar que a servidão pode ser
onerosa ou gratuita, temporária ou perpétua, conforme
haja ou não remuneração e haja ou não fixação de tempo
de vigência166. Em relação aos caracteres do instituto em
comento, é interessante frisar que deve obedecer ao prazo
mínimo de 15 (quinze) anos na servidão ambiental
temporária167, não sendo possível aplicá-la às áreas de
165 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 9 ed., rev., atual. e ampl.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais Ltda., 2014, p. 882. 166 Neste sentido: BRASIL. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de
1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e
mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez.
2014. Art. 9o-B. A servidão ambiental poderá ser onerosa ou
gratuita, temporária ou perpétua. 167 Neste sentido: Ibid. Art. 9o-B. [omissis] §1o O prazo mínimo da
servidão ambiental temporária é de 15 (quinze) anos.
160
preservação permanente e de reserva legal168. Há que se
observar, oportunamente, que a limitação ao uso ou
exploração da vegetação da área sob a servidão instituída
em relação aos recursos florestais deve ser, no mínimo, a
mesma afixada para reserva legal169. Igualmente, quadra
anotar que a servidão ambiental deve ser averbada no
registro de imóveis competente. Em se tratando de
compensação de reserva legal, a servidão deve ser
averbada na matrícula de todos os imóveis envolvidos.
4 LIMITAÇÕES DE NATUREZA MILITAR
De plano, ao se examinar as limitações
decorrentes de natureza militar, quadra explicitar que o
ordenamento jurídico comina cinco situações distintas. A
primeira encontra guarida no Decreto-Lei nº 4.812, de 08
de Outubro de 1942170, que dispõe sobre a requisição de
168 Neste sentido: Ibid. Art. 9o-B. [omissis] §2o A servidão ambiental
perpétua equivale, para fins creditícios, tributários e de acesso aos
recursos de fundos públicos, à Reserva Particular do Patrimônio
Natural - RPPN, definida no art. 21 da Lei no 9.985, de 18 de julho
de 2000. 169 Neste sentido: Ibid. Art. 9o-A. [omissis] §3o A restrição ao uso ou
à exploração da vegetação da área sob servidão ambiental deve ser,
no mínimo, a mesma estabelecida para a Reserva Legal. 170 Idem . Decreto-Lei nº 4.812, de 08 de Outubro de 1942.
Dispõe sobre a requisição de bens imóveis e móveis, necessários às
forças armadas e à defesa passiva da população, e dá outras
161
bens imóveis e móveis, necessários às forças armadas e à
defesa passiva da população, e dá outras providências. A
legislação em comento afixa que as requisições em tais
situações poderão compreender as coisas móveis, os
serviços pessoais e a ocupação temporária de propriedade
particular, as quais forem efetivamente necessárias à
promoção da defesa e da segurança nacional, observadas
as formalidades cominadas no diploma
supramencionado, sendo cabível o pagamento da
competente indenização. Com clareza ofuscante, reza o
artigo 15 da lei multicitada que:
Art. 15. Estão sujeitos à requisição: 1 - o alojamento e o acantonamento das
tropas nas casas de residência de
particulares; 2 - a alimentação diária das tropas alojadas
nas habitações particulares, na proporção
dos recursos dos seus proprietários ou
moradores; 3 - os víveres, forragens, combustíveis,
meios de iluminação e objetos necessários
para o alojamento das tropas; 4 - a utilização dos meios de atrelagem e de
transporte de qualquer espécie, inclusive
navios para tráfego marítimo, fluvial e
lacustre; os caminhos de ferro e os
aparelhos e material de transporte aéreo,
tudo com seu pessoal e suas instalações e
dependências; os combustíveis, as matas, e
as fortes de força motora de qualquer
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso
em 30 dez. 2014.
162
espécie, todos os materiais, mercadorias e
objetos acumulados para o emprego na
exploração e extensão de linhas de
transporte de qualquer gênero; 5 - o material, as máquinas, as ferramentas
necessárias à construção, reparação e
demolição de obras e vias de comunicação,
segundo as exigência do serviço militar; 6 - as instalações industriais de qualquer
categoria, as empresas agrícolas, de minas
ou jazidas de minérios ou combustíveis,
instalações de força hidráulica ou elétrica,
empresas de abastecimento de água, luz e
gás, todas com seu pessoal, material,
instalações complementares e dependências; 7 - os guias, mensageiros, condutores de
veículos hipomoveis e automóveis, assim
como os operários e serventes necessários à
execução dos trabalhos de interesse militar
ou da defesa passiva antiaérea; 8 - a ocupação dos hospitais com todo seu
pessoal, instalações, dependências
instrumentos e medicamentos; 9 - o tratamento dos doentes e feridos em
casas da particulares, assim como objetos de
curativos e os instrumentos de medicina e
cirurgia existentes no comércio; 10 - as matérias primas, peças isoladas,
objetos fabricados, instalações, ferramentas,
máquinas necessárias à transformação,
fabricação e ao conserto do material
necessário às forças de terra, mar e ar e à
defesa passiva; 11 - as redes telefônicas e telegráficas,
com ou sem fios assim como seu material
sobressalente e respectivo pessoal; 12 - os materiais, objetos, instrumentos e
matérias primas necessários aos serviços da
defesa passiva antiaérea; 13 - a ocupação temporária da
propriedade; e 14 - tudo quanto, embora não indicado nos
números acima, for necessário ao serviço de
163
defesa da Nação e à manutenção da ordem e
do moral da população civil. (destacou-se).
A segunda hipótese encontra respaldo,
segundo Maria Helena Diniz171, na Lei nº 6.634, de 02 de
Maio de 1979172, que dispõe sobre a faixa de fronteira,
altera o Decreto-lei nº 1.135, de 3 de dezembro de 1970, e
dá outras providências. Com efeito, ao se conferir uma
interpretação aos artigos 1º e 2º do diploma
supramencionado, verifica-se a prescrição de que as
transações de imóveis particulares situados na faixa de
cento e cinquenta (150) quilômetros ao longo da fronteira
do território nacional, sendo que essa porção territorial
passa a ser denominada de faixa de fronteira. Exceto com
anuência expressa do Conselho de Segurança Nacional,
será vedada, na faixa de fronteira, a prática de atos
concernentes: (i) alienação e concessão de terras públicas,
abertura de vias transporte e instalação de meios de
comunicação destinados à exploração de serviços de
radiodifusão de sons ou radiodifusão de sons e imagens;
(ii) construção de pontes, estradas internacionais e
campos de pouso; (iii) estabelecimento ou exploração de
171 DINIZ, 2011, p. 288. 172 BRASIL. Lei nº 6.634, de 02 de Maio de 1979. Dispõe sobre a
faixa de fronteira, altera o Decreto-lei nº 1.135, de 3 de dezembro de
1970, e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014.
164
indústrias que interessem à segurança nacional, assim
relacionadas em decreto do Poder Executivo; (iv)
instalação de empresas que se dedicarem às seguintes
atividades: (1) pesquisa, lavra, exploração e
aproveitamento de recursos minerais, salvo aqueles de
imediata aplicação na construção civil; (2) colonização e
loteamentos rurais; (v) transações com imóvel rural, que
impliquem a obtenção, por estrangeiro, do domínio, da
posse ou de qualquer direito real sobre o imóvel; e (vi)
participação, a qualquer título, de estrangeiro, pessoa
natural ou jurídica, em pessoa jurídica que seja titular de
direito sobre imóvel rural
É possível, oportunamente, fazer menção, a
título de terceira hipótese, ao Decreto-Lei nº 3.437, de 17
de Julho de 1941173, que dispõe sobre o aforamento de
terrenos e a construção de edifícios em terrenos das
fortificações, cominando que, na 1ª zona de 15 braças (33
metros) em torno das fortificações, nenhum aforamento
de terreno será concedido e nenhuma construção civil ou
pública autorizada, considerando-se nulas as
propriedades porventura existentes, sem ônus para o
173 BRASIL. Decreto-Lei nº 3.437, de 17 de Julho de 1941.
Dispõe sobre o aforamento de terrenos e a construção de edifícios em
terrenos das fortificações. Disponível em:
<http://www2.camara.leg.br>. Acesso em 30 dez. 2014.
165
Estado. Prevê, igualmente, o diploma legal em exame
que na 2ª zona de 600 braças (1.320 metros) serão
observadas as seguintes disposições: (i) nenhum novo
aforamento de terreno será concedido; (ii) nenhuma
construção ou reconstrução será permitida fora dos
gabaritos determinados pelo Ministério da Guerra (atual
Ministério da Defesa) , que também poderá promover a
desapropriação do imóvel, caso o terreno seja necessário
às obras da Organização da Defesa da Costa; e (iii)
qualquer construção ou reconstrução em andamento, ou
já autorizada, será sustada.
A quarta hipótese compreende a requisição de
bens destinados ao transporte aéreo, regulado pelo
Decreto-Lei 4.008, de 12 de Janeiro de 1942174, que
dispõe sobre requisição de bens destinados ao transporte
aéreo. Por derradeiro, a última hipótese é abarcada pela
Lei nº 6.442, de 26 de Setembro de 1977175, que dispõe
sobre áreas de proteção para o funcionamento das
estações radiogoniométricas de alta frequência do
174 BRASIL. Decreto-Lei 4.008, de 12 de Janeiro de 1942. Dispõe
sobre requisição de bens destinados ao transporte aéreo. Disponível
em: < http://legis.senado.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014. 175 Idem. Lei nº 6.442, de 26 de Setembro de 1977. Dispõe sobre
áreas de proteção para o funcionamento das estações
radiogoniométricas de alta frequência do Ministério da Marinha e de
radiomonitoragem do Ministério das Comunicações. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014.
166
Ministério da Marinha e de radiomonitoragem do
Ministério das Comunicações. Trata-se de hipótese
responsável por estabelecer que nas áreas
compreendidas pelas estações radiogoniométricas de alta
freqüência do Ministério da Defesa (Comando da
Marinha) e de radiomonitoragem do Ministério das
Comunicações, bem como nas faixas de terra com 1.000m
(hum mil metros) de largura, contíguas aos limites
dessas estações, a instalação de meios de transmissão de
qualquer espécie e a edificação de prédios e de estruturas
metálicas só serão permitidas após o assentimento do
Ministério da Defesa (Comando da Marinha) ou
Ministério das Comunicações, de acordo com a
subordinação da estação.
5 RESTRIÇÃO EM RAZÃO DA LEGISLAÇÃO
ELEITORAL
Ao analisar, por fim, a temática das restrições
ao direito de propriedade no ordenamento jurídico
vigente, cuida reconhecer, ainda, a hipótese consagrada
na Lei nº 4.737, de 15 de Julho de 1965, que institui o
167
Código Eleitoral, estabelece, no artigo 135, §3º176, que a
propriedade particular deve ser cedida obrigatória e
gratuitamente para o funcionamento das mesas
receptoras, nos dias da eleição. Trata-se de possibilidade
do Poder Público requisitar propriedades particulares, as
quais deverão ser cedidas obrigatória e gratuitamente
para o funcionamento das mesas receptoras, nos dias da
eleição, e, posteriormente à ocupação, caso sejam
verificados danos, estes serão devidamente reparados
pecuniariamente. Denota-se, dessa maneira, que a
restrição cominada na legislação eleitoral objetiva
assegurar espaços propícios para o desenvolvimento
regular da eleição.
REFERÊNCIAS:
BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da)
República Federativa do Brasil. Brasília: Senado
Federal, 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014
176 BRASIL. Lei nº 4.737, de 15 de Julho de 1965. Institui o
Código Eleitoral. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>.
Acesso em 30 dez. 2014. Art. 135. Funcionarão as mesas receptoras
nos lugares designados pelos juízes eleitorais 60 (sessenta) dias
antes da eleição, publicando-se a designação. [omissis] § 3º A
propriedade particular será obrigatória e gratuitamente cedida para
esse fim.
168
__________. Decreto-Lei nº 3.437, de 17 de Julho de
1941. Dispõe sobre o aforamento de terrenos e a
construção de edifícios em terrenos das fortificações.
Disponível em: <http://www2.camara.leg.br>. Acesso em
30 dez. 2014.
__________. Decreto-Lei 4.008, de 12 de Janeiro de
1942. Dispõe sobre requisição de bens destinados ao
transporte aéreo. Disponível em:
<http://legis.senado.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014.
__________. Decreto-Lei nº 4.812, de 08 de Outubro
de 1942. Dispõe sobre a requisição de bens imóveis e
móveis, necessários às forças armadas e à defesa passiva
da população, e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014.
__________. Lei nº 4.504, de 30 de Novembro de 1964.
Dispõe sobre o Estatuto da Terra, e dá outras
providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014.
__________. Lei nº 4.737, de 15 de Julho de 1965.
Institui o Código Eleitoral. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014.
__________. Lei nº 6.634, de 02 de Maio de 1979.
Dispõe sobre a faixa de fronteira, altera o Decreto-lei nº
1.135, de 3 de dezembro de 1970, e dá outras
providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014.
__________. Lei nº 6.442, de 26 de Setembro de 1977.
Dispõe sobre áreas de proteção para o funcionamento das
estações radiogoniométricas de alta frequência do
Ministério da Marinha e de radiomonitoragem do
169
Ministério das Comunicações. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014.
__________. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981.
Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus
fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras
providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 dez. 2014.
__________. Lei nº 12.651, de 25 de Maio de 2012.
Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as
Leis nos 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de
dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006;
revoga as Leis nos 4.771, de 15 de setembro de 1965, e
7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória
no 2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e dá outras
providências. Disponível em: <www.planalto.gov.br>.
Acesso em 30 dez. 2014.
__________. Superior Tribunal de Justiça. Disponível
em: <www.stj.jus.br>. Acesso em 30 dez. 2014.
__________. Supremo Tribunal Federal. Disponível
em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 30 dez. 2014.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de
Direito Administrativo. 24 ed, rev., atual. e ampl. Rio
de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil
Brasileiro: Direito das Coisas. v. 04. 26 ed. São Paulo:
Editora Saraiva, 2011.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo
Brasileiro, 38 ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2012.
170
MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 9 ed., rev., atual.
e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais Ltda.,
2014.