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Resolução do CL sobre a caracterização dos chamados Estados Operários Burocratizados 29 julho 2011 Desde as discussões para a Conferência do CL, aprofundamos a discussão sobre os chamados Estados operários burocratizados, e encontramos vários problemas teóricos. Por exemplo: - como explicar o caso da China, onde o capitalismo foi completamente restaurado desde a década de 1990, mantendo o mesmo aparato estatal formado desde 1949? - como explicar o fato que a expropriação da burguesia nos países do Leste Europeu não foi acompanhado de destruição do aparato estatal burguês (exército, parlamento, burocracia) instituído após 1945 sob a ocupação soviética, e dirigido por frentes populares? - o mesmo problema sob outro ângulo: como o capitalismo foi restaurado nesss estados em 1989-1991 sem destruir o aparato estatal existente, considerado como "estado operário deformado"? - como é possível estabelecer estados operários sem intervenção da classe operária organizada, ou ainda a esmagando, como aconteceu na China e na Polônia? Todas essas questões nos levaram a rediscutir o conceito de Estado Operário Degenerado ou Deformado, usados pela maioria das correntes trotskistas. Não conseguimos ainda chegar a uma análise nem uma caracterização completas, e ainda estamos estudando e discutindo isso. Mas, durante a discussão, chegamos a alguns pontos, que serão a base da nossa futura posição: a) a burocracia não é uma classe dominante, porque ela tem uma base superestrutural, e não es´ta enraizada nas relações de produção. Por isso mesmo, a longo prazo, o interesse da burocracia é restaurar o capitalismo e se tornar burguesia b) a economia da URSS e dos chamados Estados Operários Deformados não é capitalista, porque não funciona segundo as leis do mercado, e sim pela planificação burocrática c) a planificação burocrática não é uma forma de propriedade proletária ou

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Page 1: CL PÓS RACHA - Resoluções e Notas

Resolução do CL sobre a caracterização dos chamados Estados Operários Burocratizados29 julho 2011

Desde as discussões para a Conferência do CL, aprofundamos a discussão sobre os chamados Estados operários burocratizados, e encontramos vários problemas teóricos. Por exemplo:

- como explicar o caso da China, onde o capitalismo foi completamente restaurado desde a década de 1990, mantendo o mesmo aparato estatal formado desde 1949?

- como explicar o fato que a expropriação da burguesia nos países do Leste Europeu não foi acompanhado de destruição do aparato estatal burguês (exército, parlamento, burocracia) instituído após 1945 sob a ocupação soviética, e dirigido por frentes populares?

- o mesmo problema sob outro ângulo: como o capitalismo foi restaurado nesss estados em 1989-1991 sem destruir o aparato estatal existente, considerado como "estado operário deformado"?

- como é possível estabelecer estados operários sem intervenção da classe operária organizada, ou ainda a esmagando, como aconteceu na China e na Polônia?

Todas essas questões nos levaram a rediscutir o conceito de Estado Operário Degenerado ou Deformado, usados pela maioria das correntes trotskistas. Não conseguimos ainda chegar a uma análise nem uma caracterização completas, e ainda estamos estudando e discutindo isso. Mas, durante a discussão, chegamos a alguns pontos, que serão a base da nossa futura posição:

a) a burocracia não é uma classe dominante, porque ela tem uma base superestrutural, e não es´ta enraizada nas relações de produção. Por isso mesmo, a longo prazo, o interesse da burocracia é restaurar o capitalismo e se tornar burguesia

b) a economia da URSS e dos chamados Estados Operários Deformados não é capitalista, porque não funciona segundo as leis do mercado, e sim pela  planificação burocrática

c) a planificação burocrática não é uma forma de propriedade proletária ou socialista. A forma de propriedade socialista é a planificação controlada por comissões de fábrica e sovietes. A planificação burocrática, no começo do processo de industrialização pesada, é progressiva em relação ao capitalismo, mas não consegue absorver e organizar bases produtivas mais avançadas.  A partir da revolução microeletrônica (década de 60 e1970), a planificação burocrática atingiu o seu limite de eficiência na produção, e então se tornou regressiva em relação ao capitalismo. A única solução seria estabelecer a planificação socialista controlada pelos comitês operários, o que não aconteceu.

d) Devido ao caráter da planificação burocrática, a revolução contra a burocracia é social(muda as relações de produção) e não somente política. Para a revolução contra a burocracia ser vitoriosa, deve destruir o aparato estatal e criar outro, baseado nos sovietes e no armamento do povo.

e) Apoiamos todas as lutas contra a burocracia, inclusive por demandas democráticas, a menos que tenham um caráter abertamente pró-capitalista. Em todo caso onde for realmente possível lutar pela diferenciação política do movimento, levando ao surgimento de uma ala antirrestauracionista, não defendemos a repressão contra a base (que temos que ganhar para a perspectiva da revolução), e sim somente contra a sua direção. Nós só defendemos a repressão contra um movimento inteiro, incluindo a sua base, se o movimento se organizar abertamente em torno de um programa reacionário (xenofobia, racismo etc).

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Resolução do CL sobre a herança que reivindicamos do espartaquismo24 agosto 2011

Depois da ruptura com a TBI, noso pequeno coletivo fez uma extensa reavaliação do papel do espartaquismo, a corrente política que surgiu com a Liga Espartaquista/EUA, e que é reivindicada hoje também pela LQI (LQB no Brasil), TBI e RR.

Nós consideramos que o espartaquismo, até a década de 1970, foi uma corrente revolucionária (mas não a única corrente revolucionária, como as correntes que o reivindicam dizem). Por isso, a nossa ruptura com a TBI não significa o abandono de todas as posições do espartaquismo.

As posições-chave que reivindicamos do espartaquismo são:- a caracterização do Estado surgido da revolução cubana como "Estado Operário Deformado" (essa posição deve ser entendida no contexto da nossa Resolução sobre os chamados Estados Operários Burocratizados), que rompia tanto com o sectarismo do Comitê Internacional da Quarta Internacional, que dizia que Cuba permanecia um estado burguês numa formação social capitalista, tanto quanto com o centrismo do SU, que considerava a direção cubana, pelo fato de ter expropriado a burguesia, como revolucionária e trotskista inconsciente.

- a defesa do integracionismo revolucionário, programa formulado por Richard e Clara Fraser, do SWP, que defendia a luta dos trabalhadores negros em conjunto com os trabalhadores brancos, para a sua integração numa sociedade socialista, rompendo com o separatismo negro e com o integracionismo reformista de Martin Luther King. A intervenção da Liga Espartaquista no movimento pelos direitos civis foi o ponto alto de sua luta no movimento de massas.

 As posições-chave que rejeitamos do espartaquismo são:

- A sua stalinofilia, já visível no seu não posicionamento diante da ocupação da Tchecoslováquia pela URSS em 1968, mas descarada nos anos 1980. A Liga Espartaquista e a TBI abriram mão, na prática, da luta pela revolução operária contra a burocracia. Em vez disso, acreditaram que a burocracia é que iria defender os chamados Estados Operários burocratizados. O maior resultado dessa concepção foi o seu apoio ao golpe que impôs a Lei Marcial na Polônia em 1981, destruindo todas as formas de organização operárias. Naquela situação, só se justificava a repressão sobre a direção pró-capitalista do Solidariedade, e não sobre a sua base operária, que era a principal força que poderia derrubar a burocracia de forma revolucionária.

- A bizarra concepção de que a "teoria gera o programa", exatamente ao contrário da tese marxista ("Sem teoria revolucionária, não há movimento revolucionário", Lênin). Essa concepção leva a organização a se tornar uma "guardiã" dogmática do programa, não o adaptando às mudanças da luta de classes, e vendo em toda divergência inimigos potenciais, seja em outras organizações, seja dentro de si mesma.

Esse é o nosso balanço sobre as posições políticas do espartaquismo. O processo histórico concreto de degeneração das correntes espartaquistas é muito complexo, e ainda estamos estudando os detalhes.

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Resolução do Coletivo Lênin sobre a questão da Internacional15 de setembro de 2011

Como resultado do nosso balanço sobre o espartaquismo, e sobre as tarefas específicas para a reorganização do partido mundial da revolução socialista, o Coletivo Lênin declara a sua nova linha sobre a questão da internacional:

1. Nós defendemos que, depois da Segunda Guerra Mundial, a única organização internacional existente era a Quarta Internacional. Por isso, era obrigatório o trabalho dos comunistas dentro dela.

  Depois da ruptura em 1953, surgiram dezenas de correntes internacionais trotskistas. Para nós, o acordo sobre a política e a tática que deveria ter sido adotada, na época, em relação a estas correntes não é precondição para a fusão entre grupos revolucionários hoje. O que realmente importa são as posições programáticas.

   Por exemplo, negamos a tese do SU de que a direção cubana seja revolucionária, a tese lambertista de que as forças produtivas pararam de se desenvolver e que, portanto um programa democrático pode substituir o programa de transição, a tese espartaquista de que o programa gera teoria, a concepção morenista de "revolução de fevereiro" etc.

2. Nós rejeitamos a ideologia da continuidade da Quarta Internacional, que é usada pelas organizações que vieram do Comitê Internacional para dizer que só existe uma corrente revolucionária, e todas as outras são centristas ou reformistas.

3. A partir da década de 1960, por causa da radicalização da luta de classes em escala mundial, surgiram novas correntes revolucionárias (a esquerda do guevarismo e do maoísmo, algumas correntes estudantis orientadas para a classe trabalhadora etc).

    Por causa do pouco peso do trotskismo no movimento operário, a maioria dessas correntes nunca se organizou internacionalmente. 

    O que distingue estas correntes das reformistas e centristas é que elas defendem abertamente a luta pela revolução socialista, sem nenhuma etapa intermediária, em consequência disso rompem com o programa mínimo, levantando bandeiras anticapitalistas, e que defendem que a ditadura do proletariado deve ser exercida por organismos de poder direto dos trabalhadores (e a necessidade de uma revolução, nos países sob domínio da burocracia, para estabelecer o poder direto dos trabalhadores). 

  Hoje, portanto, existe uma pluralidade de correntes revolucionárias. A construção da Internacional só vai acontecer quando levar essa pluralidade em conta.

4. Levando as teses anteriores em conta, o CL resolve:

a) Não chamar mais "Pela refundação da Quarta Internacional", porque isso significaria tentar voltar atrás no tempo, e não permitiria a unidade com os grupos revolucionários vindos de outras tradições.

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  Depois da crise de 1951-1953, seria infrutífera qualquer tentativa de "refundar a Quarta Internacional", ignorando os erros de concepção presentes desde a fundação (avaliação de um colapso iminente do capitalismo, fruto da estagnação do desenvolvimento das forças produtivas, consequente impossibilidade da política reformista da socialdemocracia, tese sobre a derrubada iminente do stalinismo pela revolução mundial). Hoje em dia, a política de "refundar a Quarta Internacional" só pode levar a fusões de poucos e pequenos grupos nacionais sem base no movimento de massas, uma caricatura de internacional.

Em vez disso, nossa palavra de ordem será Por uma nova Internacional Comunista Revolucionária, Pelo Partido Mundial da Revolução Socialista"

b) Não se centralizar por nenhuma corrente internacional atual, porque  nenhuma delas tem o "monopólio" da política revolucionária.

Em vez disso, devemos colaborar com várias correntes internacionais revolucionárias, para criar fóruns conjuntos onde possa se avançar para fusões rumo à nova Internacional.

c) Em escala nacional e internacional, lutar pela unidade dos revolucionários em partidos leninistas com direito a tendências.

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Nota sobre a LER-QI16 de novembro de 2011Essa nota é uma autocrítica de algumas posições sectárias que tínhamos sobre a LER-QI.

Nota sobre a LER-QI

A LER é uma ruptura do morenismo (LIT), principalmente com a sua estratégia de "revolução de fevereiro". Mas, apesar de manter posições fundamentalmente revolucionárias, não conseguiu superar várias concepções oportunistas do PSTU, que impedem a nossa fusão com eles, a não ser que eles (ou nós) mudem muito da política. 

Mais informação sobre isso pode ser encontrada no nosso texto Podemos construir um partido revolucionário com a LER?, mesmo que o texto seja marcado por algumas posições sectárias que tínhamos na época, por influência da TBI, por exemplo:

- defender o golpe militar polonês de 1981, que foi contra a base operária do solidariedade e destruiu os comitês de greve, como se fosse uma ação necessária para defender o estado operário polonês

- defendíamos a ocupação soviética no Afeganistão, que derrubou uma frente popular para criar um governo completamente controlado pela burocracia stalinista. Durante as discussões com a LC, mudamos a nossa posição para que o movimento de massas afegão expulse as tropas soviéticas! Nenhum campo militar com os mujehedins fundamentalistas!

- rejeitávamos completamente a luta pelas cotas, posição que já mudamos dentro do Movimento Hora de Lutar, que construímos na UFRJ em 2010-2011

- considerávamos a China como estado operário, posição que rejeitamos hoje, o que tinha sérias consequências políticas (por exemplo, a gente era contra a independência do Tibete). Hoje, achamos que o capitalismo foi restaurado na China entre 1989-1992, e o país hoje é subimperialista, exercendo dominação colonial sobre as suas minorias nacionais e em alguns países africanos, para onde ela exporta capital. Ainda estamos finalizando o nosso novo documento, com a nossa autocrítica sobre a questão dos estados operários

O pior do documento é que ele não diz claramente que, apesar dessas posições, a LER é uma organização revolucionária. A gente estava reproduzindo a lógica estilo TBI de que só existe uma organização revolucionária no mundo, a nossa. Se nós não podemos fundir com eles imediatamente, é por causa das posições herdadas do morenismo, como a stalinofobia brutal, o regime sem tendências permanentes e o uso de palavras de ordem democráticas como eixo político, que iriam impedir o funcionamento da organização, já que essas diferenças apareceriam toda hora de novo. Mas podemos colaborar com eles em lutas e frentes no movimento.

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Novo programa do Coletivo Lênin18 de novembro de 2011Introdução

Este é o novo programa do Coletivo Lênin, que estamos lançando depois de um ano da nossa ruptura com a TBI, e após um longo processo de autocrítica de algumas das nossas posições anteriores. Ele contém as nossas posições básicas na luta pela construção do partido revolucionário. 

Existem algumas mudanças em relação ao programa anterior. Principalmente retiramos do programa algumas "cascas de banana" sectárias da TBI. Elas se tratam de:

- posições táticas (como em que situação votar em partidos operários, qual deve ser a palavra de ordem sobre imigração etc). Essas posições não são fundamentais, e torná-las "questão de princípio", ao colocá-las no programa, é uma maneira de impedir a fusão com outros grupos revolucionários.

- análises de situações específicas (por exemplo, Guerra das Malvinas, Guerra dos Seis Dias etc). Como disse Marx, "o concreto é a soma de múltiplas determinações" (Introdução à crítica da economia política). Por isso, grupos com o mesmo programa pode avaliar diferente quais são as determinantes numa situação específica e, por isso, tirar políticas diferentes. Mais uma vez, o recurso de colocar essas caracterizações no programa é uma forma de reafirmar que a organização que faz isso "sempre esteve certa", e que as outras devem adotar todas as posições que ela já teve para fundir com a mesma.

Nós colocamos no programa novo um ponto específico sobre a intervenção no movimento de massas. Acreditamos que isso não existia no programa anterior por influência do abstencionismo da TBI. 

Também tiramos todas as formulações diretamente teóricas do programa, por achar que elas não conseguiram ser explicadas adequadamente no documento. Por isso, quando um militante está entrando no CL, usamos como base para a discussão teórica os nossos livretos. Assim, o programa fica mais curto e focado somente nas questões políticas. Existem antecedentes históricos para essa forma de escrever o programa, por exemplo os programas do Partido Operário Francês, escrito por Marx, o programa da LCI brasileira e os "onze pontos" para a fundação da Quarta Internacional.

Finalmente, convidamos todas as organizações revolucionárias a estudarem o nosso programa, criticá-lo e discutir com a gente. Esse debate é uma das necessidades para a construção do partido revolucionário. 

Revolução permanente x Etapismo

Nos últimos séculos, o capitalismo se consolidou como sistema econômico mundial, principalmente através da divisão internacional do trabalho. Vivemos na época do imperialismo – época do declínio capitalista. A experiência deste século demonstrou que as burguesias nacionais do mundo neocolonial são incapazes de completar as tarefas históricas da revolução democráticoburguesa, como a reforma agrária e a soberania nacional. Não há, em geral, nenhum caminho aberto para o desenvolvimento capitalista independente nestes países. 

Nos países neocoloniais, as realizações das revoluções burguesas clássicas só podem ser

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conquistadas através do esmagamento das relações capitalistas de propriedade, separando-os do mercado mundial imperialista, e estabelecendo a propriedade da classe trabalhadora (ou seja, coletivizada). 

Países como o Brasil, a Índia, e a África do Sul são dependentes do imperialismo, mas têm uma autonomia relativa. O nível da sua acumulação interna de capital, e a fusão deste capital nacional com o capital imperialista define o seu caráter como subimperialista. Geralmente, eles estão envolvidos, de forma dependente e associada, com o imperialismo, na exportação de capital em suas regiões (no caso do Brasil, a América do Sul e a África lusófona). Nestes casos de opressão subimperialista, somos contra as tropas do Brasil, como no Haiti, e a expropriação de seus investimentos, como no setor petroleiro boliviano. Nos casos de conflito com o imperialismo (muito improváveis, devido à cooperação antagônica com as metrópoles), defendemos os países subimperialistas, porque são nações dependentes.

Defendemos todos os partidos e regimes dos países semicoloniais e subimperialistas contra o imperialismo, sem dar nenhum apoio político a essas direções.     

Defendemos a autodeterminação de todos os povos, ou seja, o seu direito de se organizarem politicamente da forma que quiserem, inclusive o direito à separação. 

Defendemos o direito de emigração para todas as pessoas do mundo, e que os imigrantes tenham plenos direitos de cidadania nos países onde vivem.  

Intervenção no movimento

Defendemos a intervenção no movimento sindical, popular e estudantil com um programa que combine reivindicações democráticas e socialistas, com a intenção de colocar em evidência a falha do sistema capitalista de dar as garantias as necessidades mais básicas da classe trabalhadora.

Procuramos participar de todas as entidades de base e de todas as centrais em que elas participem, formando chapas com o programa acima.

Fazemos frentes únicas, ou seja, unidade na ação com outras correntes, com todos os setores do movimento, na luta por reivindicações imediatas que beneficiem a classe trabalhadora. Sem perder de vista a necessidade de sempre se dar um passo a frente, com o objetivo central de se diferenciar das demais organizações reformistas e centristas, mostrando às suas bases as contradições que suas direções carregam entre seu programa político e sua atuação prática.

Nós fazemos blocos com programa (como chapas sindicais, movimentos, blocos dentro de movimentos específicos, como o movimento contra a guerra imperialista etc) somente com outras correntes revolucionárias, porque formar blocos com centristas ou reformistas significaria rebaixar o programa para o setor.

Não formamos nem participamos de blocos com partidos burgueses, ou seja, frentes populares, nem nas eleições nem no movimento, porque isso significa abrir mão da independência de classe e adotar o programa da burguesia. 

Em todas essas situações, somos a favor da plena democracia operária, com total liberdade de expressão para as correntes e indivíduos. 

Procuramos enraizar o programa comunista na classe trabalhadora através da construção de colaterais programáticas nos movimentos. Tais formações devem participar ativamente de todas as

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lutas por reformas parciais e melhoras na situação dos trabalhadores e sempre colocar em pauta reivindicações socialistas.

Utilizamos do voto crítico em eleições onde não seja possível ou produtivo participar com uma chapa própria. Essa tática tem como mesmo objetivo a de frente única: de mostrar às bases de organizações de esquerda não revolucionárias a insuficiência do programa defendido por suas direções diante das contradições do sistema capitalista. Somente uma organização que lute pela revolução e tomada do poder pelos trabalhadores é capaz de guiar a classe trabalhadora para a vitória.

Somos contra qualquer tipo de intervenção do Estado no movimento, de qualquer forma, e contra o uso da justiça burguesa contra outras correntes do movimento dos trabalhadores. 

Opressões específicas

No Brasil, a luta pelo poder dos trabalhadores está completamente ligada à luta pela libertação negra. Os negros brasileiros são uma casta de cor, segregada nos setores mais inferiores da sociedade e se concentram, sobretudo, na classe operária, particularmente nos setores estratégicos do proletariado industrial e no exército industrial de reserva (a massa de desempregados). O racismo, historicamente, foi o maior obstáculo para a ação política dos setores mais oprimidos da classe, em todos os movimentos. Considerados responsáveis pelo atraso do país, pela ideologia do branqueamento, as lutas do proletariado negro têm um potencial revolucionário decisivo. 

Na luta dos negros, existem três estratégias distintas (que também estão presentes, de forma um pouco diferente, no movimento de mulheres). Uma é o integracionismo reformista, que tem o objetivo de dar aos negros direitos e oportunidades iguais dentro do capitalismo. A segunda é o separatismo ou nacionalismo negro, que defende que os negros são uma nação que deve se separar na sociedade branca. A terceira estratégia, que nós revindicamos, é o integracionismo revolucionário, que considera que o integracionismo reformista só atende a uma minoria, sendo incapaz de dar igualdade à grande maioria dos negros e que o separatismo é uma utopia reacionária. Para os integracionistas revolucionários, a igualdade racial só pode ser alcançada com a destruição do capitalismo, que alimenta o racismo, através da luta revolucionária integrada dos trabalhadores de todas as raças.  

Um aspecto da questão negra muito em evidência recentemente é a opressão religiosa sofrida pelos seguidores de cultos africanos e afrobrasileiros. Como marxistas, defendemos a liberdade de crença e a completa separação entre Estado e religião e mantemos a posição comunista de defesa do materialismo e da ciência, assim como do combate ao uso da religião para aumentar o conformismo entre os oprimidos. Porém, defendemos, inclusive militarmente, os locais de culto e os seguidores das religiões oprimidas.

A opressão das mulheres é enraizada materialmente na existência da família nuclear, a unidade básica e indispensável da organização social burguesa, e também na repressão sexual, que só serve como um dos aspectos que mantém a classe trabalhadora sob controle na sociedade capitalista e que afeta principalmente o sexo feminino. A luta pela igualdade social completa para as mulheres é de importância estratégica em todos os países do globo. Ela inclui a luta pela socialização do trabalho doméstico, que só pode ser realizada numa economia planificada, pelos direitos democráticos da mulher, incluindo a legalização do aborto e libertação sexual, e pela integração das mulheres no movimento operário.

Uma forma de opressão especial relacionada ao machismo é a que é experimentada pelos homossexuais, que são perseguidos por não conseguirem se adaptar aos papéis sexuais ditados pelo

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''estado normal'' da família nuclear e se diferenciarem do padrão moralista de relações sexuais. A vanguarda comunista deve defender os direitos democráticos dos(as) homossexuais e opor-se a todas e quaisquer medidas discriminatórias contra eles(as).

Partido Revolucionário e Nova Internacional

Defendemos a construção no Brasil de um partido revolucionário dos trabalhadores.  Seu regime organizativo interno deve ser o centralismo democrático, ou seja, a organização deverá ser constituída por núcleos com direito de tendências, com total liberdade de discussão e unidade de ação tática e estratégica. Para se enraizar no setores mais explorados da classe trabalhadora, esse partido precisa ter maioria de mulheres e negros na sua composição.

Esse partido só poderá ser construído se for em conjunto com uma luta pela construção de uma internacional comunista revolucionária, que leve em consideração a existência de uma pluralidade de novas correntes revolucionárias. Esta internacional deverá ser o partido mundial da revolução onde as diversas organizações nacionais se integram numa política revolucionária conjunta.

O objetivo do partido revolucionário deve ser a luta pela revolução socialista, uma insurreição armada dirigida pela classe trabalhadora, para destruir o estado burguês e estabelecer o governo direto dos trabalhadores, através de suas assembleias de base, como forma de abrir o caminho para o socialismo. 

Defensismo Revolucionário

A restauração do capitalismo na URSS, no Leste Europeu, China e Vietnam foi uma derrota histórica para os trabalhadores a nível mundial. As mobilizações que ocorreram contra a burocracia nos anos 80 e 90, pela ausência de uma direção revolucionária, foram canalizadas pelo imperialismo.

Consideramos que foi progressiva a expropriação econômica e política da burguesia, por isso defendemos incondicionalmente os Estados Cubanos e Norte Coreano contra a restauração do poder e propriedade da burguesia.

Os comunistas têm que ser contra todos os movimentos controlados por setores prócapitalistas, em geral aliados do imperialismo. Para isso defendemos a unidade com setores stalinistas ainda contrários à restauração.

Porém, na defesa desses estados, deve ficar claro que nossa tarefa principal é a luta por uma nova revolução que tome o poder das mãos da burocracia estatal para finalmente criar um governo direto dos trabalhadores com planificação econômicas sob controle operário. Por isso somos a favor de todas as mobilizações contra a burocracia quando não tem um conteúdo prócapitalista e são sim progressivos, como nos 50, 60 e 70 na Hungria, Tchecoslováquia e Polônia. Nessas mobilizações devemos construir partidos revolucionários.

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Balanço das discussões do Coletivo Lênin com o Espaço Socialista18 de abril de 2012

O Espaço Socialista é uma pequena organização marxista revolucionária do estado de São Paulo, que está presente principalmente no movimento sindical de professores, bancários e servidores do judiciário. Foi formada por companheiros expulsos do PSTU em 1999, por discordâncias com o regime burocrático do partido e sobre o balanço dos chamados Estados Operários Burocratizados. Eles formaram um grupo de estudos, que começou a se tornar uma organização em 1999-2000, o que se consolidou em 2004.

As principais posições políticas do Espaço Socialista estão no site deles

http://www.espacosocialista.org/

Balanço das discussões do Coletivo Lênin com o Espaço Socialista

No dia 31/03, militantes do CL foram a Santo André, para reunirem com o Espaço Socialista. O objetivo era ver se existem acordos políticos suficientes para iniciar discussões sobre a fusão entre as duas organizações.

Desde a nossa ruptura com as posições sectárias da TBI, em 2010, passamos a procurar a colaboração e a discussão com outros grupos revolucionários, com o objetivo de avançar na construção do Partido Revolucionário dos Trabalhadores, como seção de uma Nova Internacional Comunista Revolucionária, que são os nossos objetivos estratégicos.

Foram horas de discussão gravada. Aqui, vamos mostrar os pontos mais importantes:

Em primeiro lugar, vimos que existem acordos importantes sobre o capitalismo e a estratégia revolucionária:

Os dois grupos reconhecem que o capitalismo está em uma crise estrutural desde a década de 1970, mesmo que haja diferenças teóricas sobre o significado e as consequências da crise (diferenças que podem existir numa organização comum).

Os dois grupos reconhecem que o fim da União Soviética e a destruição do bloco stalinista levaram a um salto qualitativo da crise de direção. Desde a década de 1990, o que existe é uma crise das alternativas socialistas (ES), crise do movimento dos trabalhadores (CL). Mesmo que ainda existam direções oportunistas que devem ser combatidas, o giro à direita e a destruição da referência socialista no movimento dos trabalhadores criaram uma situação em que a maior tarefa dos revolucionários é reconstruir a consciência de classes e socialista no movimento.

Os dois grupos reconhecem que a situação política mundial, apesar de permanecer definida pela crise da alternativa socialista, está marcada por uma nova fase de lutas, onde se abrem novas possibilidades de intervenção para os revolucionários, a partir da Primavera Árabe.

Os dois grupos defendem a concepção leninista de partido, com direito a tendências e crítica pública, o que é rejeitado pela maioria da esquerda, e criticam os erros políticos substituístas dos bolcheviques durante a revolução russa (tratar os sovietes como “correias de transmissão” do partido, dizer que a ditadura do proletariado tem que ser exercida pelo partido).

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Os dois grupos defendem a formação de uma Nova Internacional, em que haja pluralidade política, para unificar todas as correntes revolucionárias, rejeitando as teorias de que alguma das correntes internacionais atuais é a única “certa” e o pólo para reconstruir a Quarta Internacional.

Diante desses acordos, começamos a discutir as nossas divergências:

Sobre a questão dos estados burocráticos

O ES defende que a antiga URSS depois do stalinismo, os antigos países do Leste Europeu e China, além de Cuba e Coreia do Norte nos dias de hoje, não podem ser caracterizados como Estados Operários, porque a classe operária não está no poder, e sim a casta burocrática (essa é a posição majoritária do CL, existe uma minoria que mantém a caracterização de Estado Operário Deformado para esses casos).

Nós explicamos que ainda estamos elaborando sobre o assunto, mas que a posição majoritária do CL é a de que os estados onde a burguesia foi expropriada burocraticamente, sem processos revolucionários, não podem ser considerados estados operários, nem mesmo deformados. Para nós, a maior prova disso é que a restauração do capitalismo foi feita sem destruir o aparato estatal (parlamento, forçar armadas, justiça), simplesmente tirando o partido stalinista do controle do Estado.

Provisoriamente, nós chamamos esses países de Estados de Transição, seguindo o conceito de Nicos Poulantzas. Nos casos como Cuba, China (até o fim da Revolução Cultural) e Iugoslávia, nós mantemos que são ou eram estados operários deformados, porque existiam características de autoorganização das massas (comitês de defesa da revolução, exército popular, controle operário etc, dependendo do caso). E mantemos que a formação social desses países é ou foi híbrida, assim como Trotsky definiu em Revolução Traída.

Os companheiros do ES explicaram a sua posição para nós. Francamente, ela nos pareceu incoerente, uma mistura da posição trotskista ortodoxa (porque o ES reconhece que a burocracia não era uma classe, e sim uma casta, e vê que a expropriação da burguesia permite conquistas impossíveis dentro do capitalismo), da teoria do Capitalismo de Estado (dois companheiros disseram que a lei do valor funcionava na URSS e países semelhantes), da Teoria de István Meszáros (porque os companheiros negam que existia capitalismo, mas afirmam que existia capital) e do coletivismo burocrático, formulado, entre outras pessoas, por Max Schachtman (o ES fala de novas relações sociais, o que poderia ser interpretado como relações de produção de uma nova sociedade de classes).

Ficou claro que não temos acordo no plano teórico. Mas percebemos que a formulação dos companheiros é mais exata do que a formulação trotskista ortodoxa, e vimos que eles, ao considerarem que a expropriação da burguesia é progressiva, não colocam um sinal de igual entre os regimes burocráticos e o capitalismo, como Toni Cliff e Hal Draper fizeram. As posições do ES sobre Cuba nos mostram que os companheiros têm acordo conosco sobre a necessidade de lutar contra as tentativas de restauração do capitalismo através de invasão imperialista ou golpes e movimentos reacionários internos.

Caracterização do PT, da CUT e do governo do PT com a direita tradicional

Os companheiros do ES caracterizam a CUT como uma central totalmente estatizada, financiada pelo Estado, que age como correia de transmissão do capital no movimento, se opõe à organização dos trabalhadores, e integrada principalmente pelos dirigentes burocratizados dos sindicatos.

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Coerente com essa caracterização da CUT, os companheiros consideram que o PT é um partido burguês, sem vida orgânica, que tem a sua base social nos setores desorganizados da classe através dos seus programas assistenciais. E, também coerentemente, consideram que o governo do PT não pode ser caracterizado como uma Frente Popular, porque não existe contradição real com setores da burguesia em torno de tarefas antiimperialistas, antifascistas, democráticas etc.

Nós achamos que provavelmente as caracterizações do ES estão certas mas, antes de mudar as nossas, precisamos esclarecer três pontos:

quais são as consequências políticas de considerar o PT um partido burguês, em vez de operário como funciona o relacionamento entre a base da CUT e a sua burocracia qual deve ser a nossa política diante dos ataques do bloco PSDB-DEM ao PT e seu governo

Os companheiros já nos mandaram materiais sobre essas questões, que vamos responder nas próximas semanas.

Polêmica sobre a “revolução democrática” no Egito

Na sua Conferência mais recente, o ES definiu a derrubada de Mubarak, no Egito, como uma revolução democrática. Para nós, esse é um “flashback” do morenismo na política do ES. A teoria da revolução democrática formulada por Moreno é uma forma disfarçada de revolução por etapas. Para nós, no período do imperialismo, a conquista da democracia (terra para os camponeses, independência nacional, desmilitarização da sociedade, igualdade racial e de gênero etc) nos países atrasado, só pode acontecer através da revolução socialista. Por isso, caracterizar o processo no Egito como revolução democrática é duplamente errado: não é uma revolução, porque não mudou a classe que está no poder, e não é democrática, porque o governo pós-Mubarak é uma ditadura militar.

Para nós, o fato de alguns companheiros do ES usarem essa formulação não é isolado, e sim parte de uma compreensão de que a Convergência Socialista era uma organização revolucionária. Não negamos que o PSTU hoje em dia está muito mais à direita que a CS (por exemplo, a CS defendia candidaturas realmente classistas nas eleições, coisa que o PSTU não faz mais, apoiando em várias situações as candidaturas de classe média do PSOL), mas consideramos que o morenismo foi, desde a década de 1960, a ala direita do Secretariado Unificado da Quarta Internacional. Em vez de combater as concepções centristas do SU sobre Cuba e a luta armada a partir de um ponto de vista marxista, o PST argentino e sua fração no SU fizeram críticas direitistas. Por isso, diziam que a maioria do SU era ultraesquerdista.

A questão das revoluções democráticas é uma divergência séria, que deve ser debatida a fundo pelos companheiros do ES.

Linha sindical

Os companheiros explicaram a sua linha sindical, mostrando os exemplos do Judiciário Estadual e APEOESP, onde têm as intervenções mais importantes. O ES tem uma orientação correta de priorizar o trabalho de base e a unidade entre as categorias de trabalhadores de um mesmo ramo, colocando em segundo plano a disputa do aparato. Além disso, têm uma política concreta para combater a burocratização. Dito isso, eles falaram que não têm uma linha rígida para demarcar em quais chapas participar, e que isso depende da correlação de forças na categoria.

Nós precisamos mesmo reavaliar a nossa linha sindical, porque é um dos terrenos em que ainda não fizemos um balanço das consequências da política sectária da TBI. O estudo da posições do ES,

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junto com uma reavaliação da política aplicada pelos trotskistas nos sindicatos na época de Trotsky (a TBI considera que a política do SWP supervisionada pelo próprio Trotsky tinha desvios de direita!) vai nos dar a oportunidade de fazer esse balanço.

Os companheiros do ES e nós chegamos a um acordo sobre a questão da intervenção na CUT: isso só é útil na situação em que estiver acontecendo um ascenso que passe pelas instâncias da CUT, o que é praticamente impossível, já que toda a política de integração da CUT ao Estado faz justamente com que ela impeça os processos de luta mais amplos.

O ES nos convidou a assinar a tese deles para o Congresso da CONLUTAS (também assinada pelo Grupo Práxis e pelo MR). A nossa avaliação da tese também contará bastante para o balanço. Além disso, passaremos a buscar uma intervenção conjunta no movimento sindical bancário, onde as duas organizações têm militantes.

Conclusão

A discussão foi até melhor do que a gente esperava, o ES se mostrou uma organização viva, sempre tensionada por diferenças políticas (ao contrário de várias seitas burocratizadas que existem por aí), com uma orientação para a organização dos trabalhadores muito saudável.

É claro que as discussões estão apenas começando, por exemplo, falta discutirmos sobre a tese para a CONLUTAS, sobre a questão das greves policiais, sobre como deve ser a luta por uma nova internacional, avaliação da situação econômica mundial e brasileira etc. Mas vimos que existem acordos políticos suficientes que nos permitem avançar numa intervenção conjunta, enquanto tentamos chegar a uma síntese das nossas divergências, com o objetivo de fundir as organizações revolucionárias rumo à construção do Partido Revolucionário dos Trabalhadores.

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Quem é negro no Brasil?19 de novembro de 2012

IdentidadeJorge Aragão

Elevador é quase um temploExemplo pra minar teu sonoSai desse compromissoNão vai no de serviçoSe o social tem dono, não vai...Quem cede a vez não quer vitóriaSomos herança da memóriaTemos a cor da noiteFilhos de todo açoiteFato real de nossa história(2x)Se o preto de alma branca pra vocêÉ o exemplo da dignidadeNão nos ajuda, só nos faz sofrerNem resgata nossa identidade

Quem é negro no Brasil?

Um dos argumentos mais tradicionais da direita contra a própria existência do movimento negro é o de que, no Brasil, não existem raças, e que todo o debate sobre o racismo é "importado" dos EUA, onde realmente existe uma divisão racial. Ao mesmo tempo, alguns setores do movimento negro usam a lógica que a gente poderia dar o apelido de "passou de branco é preto", caindo na armadilha dos setores de direita, já que a grande maioria das pessoas que "passaram de branco" não se reconhecem como negras. Isso faz essas pessoas (talvez 30% da população do Brasil, segundo o IBGE) acharem que o movimento negro está totalmente fora da realidade do país. Esse tipo de argumento é constantemente usado para atacar as cotas, e todas as formas de luta contra o racismo.

Para nós, do Coletivo Lênin, o racismo tem um papel fundamental para a manutenção do capitalismo no Brasil. A superexploração e o preconceito contra os negros divide os trabalhadores, deixando mais fácil que todos eles sejam mais explorados ao mesmo tempo. A resposta à questão de como definir quem é negro no Brasil é essencial para entendermos o papel do racismo no país.

E, na verdade, o critério do "passou de branco é preto" é a "tradução" do critério americano de "uma gota de sangue". Nos EUA, em que existiu uma segregação legaldos negros, com proibição de casamentos interraciais até a década de 1960, o que definia alguma pessoa como negra era a sua linhagem. Nos EUA, portanto, a questão negra é étnica, acima de tudo.

No Brasil é completamente diferente, por dois motivos. O primeiro é que os negros nunca foram uma pequena minoria, como nos EUA. A grande maioria do povo brasileiro tem algum ascendente negro. Houve uma miscigenação muito grande, que impede que critérios "puros" sejam usados pra classificar as pessoas. O segundo motivo é quenunca existiu segregação racial aberta e legal no Brasil, apesar de algumas poucas exceções. Muito pelo contrário, toda a segregação no Brasil sempre foi feita com eufemismos e indiretas ("boa aparência", "elevador de serviço", "favelados"). 

Esses dois motivos impedem que exista uma consciência clara do racismo na grande maioria do

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povo, inclusive nos negros. E são a explicação fundamental para a ausência de movimentos de massas abertamente ligados à questão negra no Brasil, diferente dos EUA e de países como a África do Sul. 

Dito isso, então temos que perguntar: então, o que define alguém ser negro no Brasil. E qual papel essas condições têm no desenvolvimento da luta contra o racismo?

No Brasil, diferente dos EUA, o modelo principal foi o embranquecimento, e não asegregação.

Como desde cedo existiu uma grande quantidade de negros no Brasil (que era uma exigência do modo de produção escravista colonial), sempre aconteceu uma miscigenação muito forte da população. A estratégia das elites sempre foi jogar esses miscigenados (que vivem em condições sociais e econômicas quase iguais à dos negros) contra os negros, dizendo que eles são "brancos" como a elite (e portanto não "mereciam" o tratamento brutal dado aos escravos). O principal instrumento para isso era a negação, estigmatização e satanização da cultura negra (cortes de cabelo, roupas, religião, música, comida etc). Os miscigenados, que não têm a aparência com todos os traços dos negros africanos, passavam a ser aceitos, desde que tivessem "alma branca". De uma forma hipócrita, as classes dominantes brasileiras fingem que usam o critério oposto ao dos EUA, ou seja, "passou de negro é branco".

Então, existem duas formas de ser negro no Brasil. Uma delas é ter a aparência física (fenótipo, como diria a biologia) de um negro africano (uns 10% da população, segundo o IBGE). Nesse caso, a pessoa está sujeita à discriminação em qualquer lugar que for. A outra é sendo como cerca de 30% dos brasileiros hoje (os "pardos" do IBGE), mas assumindo parcial ou totalmente a cultura negra (praticando o candomblé ou a umbanda, usando dreadlocks, ouvindo funk ou pagode, jogando capoeira etc etc etc).

Nós dissemos várias vezes, quando os racistas dizem que é impossível dizer quem é negro no Brasil, que a polícia não tem dúvida nenhuma na hora de dar uma dura. Depois dessa explicação, podemos dizer quem a polícia escolhe na hora de dar uma dura: uma pessoa com a aparência de africano ou uma pessoa miscigenada que esteja ostentando as marcas da cultura africana.

Ou seja, a polícia não vai dar dura no cara de cabelo enrolado que está saindo de um concerto de piano, mas vai dar num que estiver saindo do pagode ou, mas provável, de um baile funk. Não vai dar dura numa pessoa de pele morena com uma bíblia na mão, mas certamente vai dar num cara com contra-egum. Não vai dar dura numa mulher de cabelo alisado, mas vai dar numa de dread. Não vai dar dura num cara de lábios grossos e nariz achatado que faça esgrima, mas vai dar num que jogue capoeira.

Qual a consequência política disso?

A maior consequência de todos é pressão constante para o embranquecimento cultural do povo. Diferente dos EUA, em que já existe uma parte da população que é vista por todos como negra, no Brasil é preciso todo um trabalho político e ideológico pra desembranquecer as pessoas. Então, a luta dos negros e de todos os trabalhadores contra o racismo tem um aspecto cultural inseparável, que o movimento e as organizações são obrigadas a levar em conta.  A classe dominante tenta convencer os trabalhadores a fingirem que são brancos para sofrer menos racismo, negando a sua identidade, isolando e se jogando contra as necessidades dos negros. Pelo contrário, o papel dos revolucionários é lutar politicamente e ideologicamente para os trabalhadores assumirem a sua identidade e lutarem contra o racismo que prega o embranquecimento.  

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Só podemos eliminar o racismo quando os trabalhadores negros romperem com a ideologia do embranquecimento, e convencerem os trabalhadores brancos da necessidade da luta contra o racismo, para unir os trabalhadores e isolar a classe dominante brasileira, fundamentalmente branca.