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Carlos Alberto Sardenberg: Enterrar de novo o populismo A Petrobras não quebrou apenas por corrupção. A causa maior é a péssima administração, consequência daqueles “princípios” estatistas Por: Augusto Nunes 29/04/2016 às 11:26 Publicado no Globo Os governos petistas sempre tiveram como meta fortalecer as estatais como o melhor meio de combater as propostas de privatização, reais ou imaginárias. Importante esta última ressalva porque, a rigor, privatizar a Petrobras nunca entrou na pauta política brasileira. Mas isso não importava. Defender as estatais, eis o discurso básico do PT. O partido também procurou desmontar a tese implantada no governo FHC, segundo a qual as companhias públicas deveriam ser administradas profissionalmente, quase como se fossem privadas, por executivos e quadros técnicos do setor. Isso, dizia Lula, era neoliberalismo. Seria colocar as estatais a serviço do mercado e dos interesses privados. Vai daí, as estatais deveriam ser administradas pelos quadros partidários, pelos companheiros, para que fossem encaminhadas na direção correta. Essa direção era: ampliar as atividades e o alcance das estatais; objetivos políticos e sociais eram mais importantes que lucros ou valor de mercado; comprar e contratar no mercado nacional, mesmo que a preços mais caros. Fizeram isso, com requintes de populismo, como o de entregar a administração de recursos humanos da Petrobras a representantes dos sindicatos de petroleiros. Quebraram a estatal. Vamos falar francamente: a Petrobras só não está em pedido de recuperação judicial porque é estatal. Todo mundo espera que, em algum momento, o governo imprima dinheiro para capitalizar a empresa. A companhia tem problemas em todos os lados, inclusive de excesso de pessoal e de pessoal mais bem remunerado que no mercado. (Aliás, a ideia era exatamente essa). A Petrobras não quebrou apenas por corrupção. A causa maior é a péssima administração, consequência daqueles “princípios” estatistas.

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Economy & Finance


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Page 1: Carlos alberto sardenberg

Carlos Alberto Sardenberg:

Enterrar de novo o populismo

A Petrobras não quebrou apenas por corrupção. A causa maior é a péssima administração,

consequência daqueles “princípios” estatistas

Por: Augusto Nunes 29/04/2016 às 11:26

Publicado no Globo

Os governos petistas sempre tiveram como meta fortalecer as estatais como o melhor meio de

combater as propostas de privatização, reais ou imaginárias. Importante esta última ressalva

porque, a rigor, privatizar a Petrobras nunca entrou na pauta política brasileira.

Mas isso não importava. Defender as estatais, eis o discurso básico do PT. O partido também

procurou desmontar a tese implantada no governo FHC, segundo a qual as companhias públicas

deveriam ser administradas profissionalmente, quase como se fossem privadas, por executivos e

quadros técnicos do setor.

Isso, dizia Lula, era neoliberalismo. Seria colocar as estatais a serviço do mercado e dos interesses

privados.

Vai daí, as estatais deveriam ser administradas pelos quadros partidários, pelos companheiros,

para que fossem encaminhadas na direção correta.

Essa direção era: ampliar as atividades e o alcance das estatais; objetivos políticos e sociais eram

mais importantes que lucros ou valor de mercado; comprar e contratar no mercado nacional,

mesmo que a preços mais caros.

Fizeram isso, com requintes de populismo, como o de entregar a administração de recursos

humanos da Petrobras a representantes dos sindicatos de petroleiros.

Quebraram a estatal. Vamos falar francamente: a Petrobras só não está em pedido de recuperação

judicial porque é estatal. Todo mundo espera que, em algum momento, o governo imprima

dinheiro para capitalizar a empresa.

A companhia tem problemas em todos os lados, inclusive de excesso de pessoal e de pessoal mais

bem remunerado que no mercado. (Aliás, a ideia era exatamente essa).

A Petrobras não quebrou apenas por corrupção. A causa maior é a péssima administração,

consequência daqueles “princípios” estatistas.

Page 2: Carlos alberto sardenberg

Por isso estamos falando do assunto. O estatismo tem sido dominante entre nós. E ainda hoje,

muita gente partilha daquelas ideias implantadas pelo PT. Diz esse pessoal: a coisa saiu mal por

causa da incompetência dos governos Lula e Dilma, e não porque a tese seja errada.

Esse é o grande risco que corremos. O modelo populista está errado, a doutrina estatista é origem

do fracasso. Nem um gênio da gestão empresarial conseguiria evitar o desastre da Petrobras nesse

processo em que foi lançada por Lula.

Vai daí que será preciso aproveitar a oportunidade para fazer o contrário, em tudo. Citamos mais

a Petrobras porque é o caso mais notável. Imaginemos uma teoria conspirativa: um presidente

neoliberal que tivesse a ideia macabra de quebrar a Petrobras para poder fechá-la e, assim, coloca-

se uma equipe talhada para produzir o desastre.

Pois não teria conseguido fazer o que a gestão petista aprontou.

Hoje, por exemplo, seria impossível privatizar a Petrobras — a menos que se vendesse a preço de

banana. E por falar nisso, a ação da Petrobras não está mesmo valendo menos que um cacho de

bananas?

Mas é possível — e absolutamente necessário — vender pedaços da Petrobras e privatizar um

monte de ativos. E o que sobrar deve, sim, ser administrado por quadros do mercado, com regras

de gestão privada.

O presidente da companhia também deveria ser procurado no mercado, inclusive no mercado

internacional. Qual o problema de se colocar um executivo chinês ou norueguês tomando conta

da Petrobras, conforme programas aprovados pelos conselhos?

Isso vale para as demais estatais quebradas, como a Eletrobrás.

E mais um programa de privatização não envergonhada. Quando percebeu que não tinha mais

dinheiro nem competência para arrumar aeroportos, estradas, portos etc., o governo petista

resolveu concedê-los à iniciativa privada. Mas como era feio privatizar, colocaram um monte de

regras que tornaram o negócio menos atraente e mais caro para os concessionários.

Por isso, isso andou mal.

Fazendo o contrário, aqui há uma hipótese de rápida retomada de negócios. Muitas empresas

médias, nacionais e estrangeiras, estão prontas para tomar o negócio das empreiteiras apanhadas

na Lava-Jato. O que não funciona é privatizar e dizer que o concessionário não pode ganhar

dinheiro ou só pode ganhar quanto o governo autorizar.

Page 3: Carlos alberto sardenberg

Tudo isso vale também para os bancos públicos. Todo o mercado desconfia que estão em situação

pior do que no final dos anos 90, quando o governo FHC precisou colocar um monte de dinheiro

no BB e na Caixa.

A contrapartida foi a gestão profissional nesses bancos, também desmontada pelos governos

petistas. Quebraram de novo.

A tristeza disso é que os governos Lula/Dilma estragaram o que estava pronto e funcionando. O

que traz um certo ânimo é que sabemos o que precisa fazer: é só repetir a combinação

privatização/profissionalização/equilíbrio das contas públicas.

O país já havia conseguido enterrar o populismo estatizante. Ressuscitou. Agora é preciso corrigir

o desastre e colocar esse populismo numa cova bem profunda, em algum cemitério privado, claro.