capitulo 4 - linguagem denotativa e conotativa

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Comunicao e Expresso

Captulo 4 Professor: Edson

LINGUAGEM DENOTATIVA E LINGUAGEM CONOTATIVA: QUANDO E POR QUE AS UTILIZAMOS

Voc j pensou na importncia que as palavras ou as frases tm quando queremos expressar uma idia ou escrever um texto? Pois , ao escrever ou falar, valemo-nos do significado das palavras, para propositalmente mostrarmos a nossa inteno. Se quisermos ser objetivos no que redigimos ou falamos, precisamos utilizar uma linguagem denotativa, a palavra ou sentena empregada est na sua significao usual, literal, referindo-se a uma realidade concreta ou imaginria. Por exemplo, a publicao da seguinte manchete no jornal: NO CHOVE NO NORDESTE H DOIS MESES. O verbo chover est sendo empregado numa linguagem denotativa, pois a sua significao literal, refere-se precipitao pluviomtrica ou, trocando em midos, gua que cai do cu. Agora, se quisermos evocar idias por intermdio da emoo ou subjetividade, temos a linguagem conotativa, que corresponde a uma transferncia do significado usual para um sentido figurado. Quando isso acontece, as figuras enriquecem o texto ou discurso. Por exemplo, se lermos em um site de relacionamento a seguinte frase: NO CHOVE EM MINHA HORTA H ALGUM TEMPO., o verbo chover, aqui, no est num sentido literal, mas figurativo, porque o seu significado no d a idia de chuva propriamente dita, mas de que faz algum tempo que uma pessoa que no tem nenhum relacionamento com algum.

Portanto, as palavras, expresses e enunciados da lngua atuam em dois planos distintos: a linguagem denotativa e a linguagem conotativa. Vejamos cada uma delas com mais detalhes, para saber quando e por que as usamos.

Captulo 4 Professor: Edson

Linguagem denotativaLeia o texto abaixo.

H alguns anos, o Dr. Johnson O Connor, do Laboratrio de Engenharia Humana, de Boston, e do Instituto de Tecnologia, de Hoboken, Nova Jersey, submeteu a um teste de vocabulrio cem alunos de um curso de formao de dirigentes de empresas industriais, os executivos. Cinco anos mais tarde, verificou que os dez por cento que havia revelado maior conhecimento ocupavam cargos de direo, ao passo que dos vinte e cinco por cento mais fracos nenhum alcanara igual posio. Isso no prova, entretanto, que, para vencer na vida, basta ter um bom vocabulrio; outras qualidades se fazem, evidentemente, necessrias. Mas parece no restar dvida de que, dispondo de palavras suficientes e adequadas expresso do pensamento de maneira clara, fiel e precisa, estamos em melhores condies de assimilar conceitos, de refletir, de escolher, de julgar, do que outros cujo acervo lxico seja insuficiente ou medocre para tarefa vital da comunicao. Pensamento e expresso so interdependentes, tanto certo que as palavras so o revestimento das idias e que, sem elas, praticamente impossvel pensar. Como pensar que amanh tenho uma aula s 8 horas, se no prefiguro mentalmente essa atividade por meio dessas ou outras palavras equivalentes? No h como se pensar no nada. A prpria clareza das idias (se que a temos sem palavras) est intimamente relacionada com a clareza e a preciso das expresses que as traduzem. As prprias impresses colhidas em contato com o mundo fsico, atravs da experincia sensvel, so tanto mais vivas quanto mais capazes de serem traduzidas em palavras e sem impresses vivas no haver expresso eficaz. um crculo vicioso, sem dvida: ... nossos hbitos lingusticos afetam e so igualmente afetados pelo nosso comportamento, pelos nossos hbitos fsicos e mentais normais, tais como a observao, a percepo, os sentimentos, a emoo, a imaginao. De forma que um vocabulrio escasso e inadequado, incapaz de veicular impresses e concepes, mina o prprio desenvolvimento mental, tolhe a imaginao e o poder criador, limitando a capacidade de observar, compreender e at mesmo de sentir. (...) Portanto, quanto mais variado e ativo o vocabulrio disponvel, tanto mais claro, tanto mais profundo e acurado o processo mental da reflexo. Reciprocamente, quanto mais escasso e impreciso, tanto mais dependentes estamos do grunhido, do grito ou do gesto, formas rudimentares de comunicao capazes de traduzir apenas expanses instintivas dos primitivos, dos infantes e... dos irracionais. (GARCIA, Othon M. Comunicao em Prosa Moderna. 8 ed. Rio de Janeiro: Fundao Getlio Vargas, 1980, p. 155-56).

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Otton M. Garcia, nesse texto, trata sobre a importncia de termos um vocabulrio amplo, pois quanto mais palavras conhecermos, mais condies teremos de nos expressar quando comunicamos. Todavia, se tivermos um vocabulrio escasso e inadequado, teremos grandes dificuldades em expor nossas idias e compreender o que outras pessoas dizem. Para expor essa temtica da importncia do vocabulrio, Garcia utilizou-se de uma estatstica feita nos Estados Unidos, comprovando que aquelas pessoas que tinham revelado um maior vocabulrio se tornaram chefes de seus setores, no entanto, entre aqueles que tinham um vocabulrio muito limitado,

nenhum chegou a ocupar tal posto. As palavras usadas no texto por Garcia, para desenvolver este assunto, so, na sua grande maioria, abstratas, tais como conhecimento, posio, qualidade, pensamento, expresso etc., pois fazem referncia a conceitos, preservando seu sentido literal. Portanto, h linguagem denotativa quando tomamos a palavra no seu sentido usual ou literal, isto , naquele que lhe atribuem os dicionrios; seu sentido objetivo, explcito. Ela designa ou denota determinado objeto, referindo-se a um nico sentido. Voc se lembra do texto Para quem no dorme de touca, cuja personagem entendia tudo literalmente? Segundo o entendimento dessa

personagem, a linguagem tem somente uma forma de expresso. Todavia, isso no verdade, pois ela pode ser conotativa tambm.

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Linguagem ConotativaAlm do sentido literal, cada palavra remete a inmeros outros sentidos virtuais, conotativos, que so apenas sugeridos, evocando outras idias associadas de ordem abstrata, subjetiva. Leia o poema abaixo. No Corpo De que vale tentar reconstruir com palavras o que o vero levou entre nuvens e risos junto com o jornal velho pelos ares? O sonho na boca, o incndio na cama, o apelo na noite agora so apenas esta contrao (este claro) de maxilar dentro do rosto A poesia o presente Ferreira Gullar

Ao lermos esse poema, percebemos que as palavras no tm um sentido literal, mas figurativo. O eu-lrico compara seu passado a um jornal velho levado pelo vento. O seu passado apenas uma memria. Ele comea a reviver esse passado na segunda estrofe, principalmente a sua vivncia amorosa (incndio na cama, o apelo na noite). Disso, o que ficou no momento (agora) so apenas as boas lembranas, que lhes trazem um sorriso estampado no rosto ((este claro) de maxilar dentro do rosto). muito comum encontrarmos a linguagem conotativa em textos literrios, pois eles tm uma preocupao essencialmente esttica. No entanto, a encontramos tambm em propagandas, textos jornalsticos, histrias em

quadrinhos, charges e em outros gneros textuais. Pois, por meio dessa linguagem se exploram diversos significados de uma palavra, causando o interesse do leitor para a manchete ou provocando o riso e o duplo sentido. Veja esta propaganda a seguir:Captulo 4 Professor: Edson

O outdoor da Assistncia Funeral SINAF Como arrumar uma coroa utiliza-se tanto o verbo como o substantivo no seu sentido conotativo (arrumar = conseguir, coroa = senhora idosa) e para contribuir com esse sentido colocada a imagem de um senhor idoso e jovial (um coroa esperto) ao lado da mensagem escrita. Porm, com o auxlio da imagem (este senhor idoso) atrelada ao nome do produto (Assistncia Funeral) se faz uma outra leitura: o verbo arrumar e o substantivo coroa passam a ter seu sentido original, denotativo (conseguir enfeite de flores utilizados em funerais). preciso que o destinatrio tenha um conhecimento lingustico e cultural para perceber a brincadeira irnica feita na mensagem publicitria como um recurso suavizador do assunto

(morte) delicado para ns ocidentais. A ambiguidade suaviza e dissimula a mensagem, mas os dados precisam estar armazenados na memria do pblico alvo para que ele reconhea o jogo da mensagem. Os provrbios ou ditos

populares so tambm um outro exemplo de explorao da linguagem no seu uso conotativo. Assim,

"Quem est na chuva para se

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molhar" equivale a "Quando algum opta por uma determinada experincia, deve assumir todas as regras e consequncias decorrentes dessa experincia". Do mesmo modo, "Casa de ferreiro, espeto de pau" significa O que a pessoa faz fora de casa, para os outros, no faz em casa, para si mesma. Leia, agora, este texto jornalstico.

A seca est de volta

Um dia, em janeiro passado, anunciada pelo pau darco que no floriu, pelo jabuti que no ps, pelo pssaro Joo-de-barro que fez sua casa com a porta virada para o nascente, a seca reapareceu no Nordeste e plantou-se em Irec, na Bahia. Dali, espalhou-se pelo centro do Estado: consumiu terras de Ibitiba, Ibipeba, Jussara, Brumado, Barra do Mendes e de mais 140 municpios. Com duas semanas, tomou Xique-Xique da influncia do rio So Francisco. Depois saltou para o norte de Minas Gerais e apoderou-se de Janaba, Espinosa, Mato Verde, Porteirinha, Vrzea de Palma e de mais de 35 cidades. Ento retrocedeu, cortou o sul da Bahia e insinuou-se pelo sudeste do Piau. Dormiu por muitas noites em So Raimundo Nonato. Acordou de outras tantas em So Joo do Piau, Simplcio Mendes, Paulistana, Jaics e Picos, onde era aguardada pelo antroplogo popular Joo Feliciano da Silva Rego que, em dezembro do ano passado, no dia de Santa Luzia, fizera a experincia das trs pedrinhas de sal e sentenciara para os incrdulos: - A seca est chegando. Ela ocupou Afrnio, Parnamirim, Bodoc, Trindade e Salgueiro, no oeste de Pernambuco, e reduziu metade o movimento comercial na rotineira feira de gado de Ouricuri. Foi vista chegando em dias de maro no oeste do Rio Grande do Norte, onde permanece no Vale do Sirid, e noCaptulo 4 Professor: Edson

sudoeste do Cear, na regio dos Inhamus, onde encontrou bom abrigo. Trilhou depois os caminhos sertanejos da Paraba e estimulou agricultores a invadir trs cidades. Alastrou-se em seguida pelo oeste de Alagoas e est agora crescendo lentamente no nordeste de Sergipe. J engoliu at hoje 811 mil quilmetros quadrados de 736 municpios, 222 dos quais considerados irrecuperveis em termos de produo agrcola. E atinge direta e indiretamente 12 milhes de pessoas. NOBLAT. Ricardo. A arte de fazer um jornal dirio. So Paulo: Contexto, 2003. p.102-03

Nesse texto vemos que o objetivo do jornalista Ricardo Noblat escrever sobre a seca que devastou o Nordeste brasileiro. Para isso, ele no se utilizou da linguagem denotativa, mas conotativa. Ele procura personificar a seca, ou seja, ele atribui aes humanas para um elemento que no humano. Essa personificao ocorre mediante uma escolha cuidadosa dos verbos (reapareceu, plantou-se, espalhou-se, consumiu, saltou, apoderou-se, retrocedeu, cortou, dormiu, acordou, ocupou, trilhou, engoliu etc.). Alm disso, observamos que o termo seca s aparece uma vez no ttulo e duas no corpo do texto (uma no primeiro pargrafo e a outra na fala do antroplogo popular), ele procura nome-la por figuras verbais que remetem seca. Noblat recorre, tambm, aos pronomes (o pronome pessoal ela e o reflexivo se), que ajudam a reforar no leitor a idia de um ser dotado de vontade prpria, que escolhe os caminhos por onde passar na sua viagem de destruio. Embora se espere um carter mais objetivo, mais literal, em um texto jornalstico, a inteno de Noblat foi a de permitir que os leitores pudessem construir uma imagem dos efeitos da passagem da seca pela regio. Para isso, precisava atribuir a esse fenmeno um comportamento quase humano, algo que s pode ser obtido pela explorao do uso figurado de vrios termos. O resultado um texto quase potico que nos permite visualizar as cidades flageladas e imaginar o sofrimento de tantas pessoas afetadas.

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Portanto, a conotao a significao subjetiva e figurada da palavra; ocorre quando um termo evoca outras realidades por associaes que ele provoca. O quadro abaixo sintetiza as diferenas fundamentais entre denotao e conotao:

DENOTAO palavra com significao restrita palavra com sentido comum do dicionrio palavra usada de modo automatizado linguagem comum

CONOTAO palavra com significao ampla palavra cujos sentidos extrapolam o sentido comum palavra usada de modo criativo linguagem rica e expressiva

Exemplos de conotao e denotao. Nas receitas a seguir, as palavras tm, na primeira, um sentido objetivo, explcito, constante; foram usadas denotativamente. Na segunda, apresentam mltiplos sentidos, foram usadas conotativamente. Observa-se que os verbos que ocorrem tanto em uma quanto em outra - dissolver, cortar, juntar, servir, retirar, reservar - so aqueles que costumam ocorrer nas receitas; entretanto, o que faz a diferena so as palavras com as quais os verbos combinam, combinaes esperadas no texto 1, combinaes inusitadas no texto 2. Vejam a seguir e compreendam melhor o que acabamos de expor.

TEXTO I Bolo de arroz 3 xcaras de arroz 1 colher (sopa) de manteiga 1 gema 1 frango 1 cebola picada Receita

TEXTO II

Ingredientes 2 conflitos de geraes 4 esperanas perdidas 3 litros de sangue fervido 5 sonhos erticos

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1colher (sopa) de molho ingls 1colher (sopa) de farinha de trigo 1 xcara de creme de leite Salsa picadinha Prepare o arroz branco, bem solto. Ao mesmo tempo, faa o frango ao molho, bem temperado e saboroso. Quando pronto, retire os pedaos, desosse e desfie. Reserve. Quando o arroz estiver pronto, junte a gema, a manteiga, coloque numa forma de buraco e leve ao forno. No caldo que sobrou do frango, junte a cebola, o molho ingls, a farinha de trigo e leve ao fogo para engrossar. Retire do fogo e junte o creme de leite. Vire o arroz, j assado, num prato. Coloque o frango no meio e despeje por cima o molho. Sirva quente. (Terezinha Terra)

2 canes dos Beatles Modo de preparar Dissolva os sonhos erticos nos dois litros de sangue fervido e deixe gelar seu corao. Leve a mistura ao fogo, adicionando dois conflitos de geraes s esperanas perdidas. Corte tudo em pedacinhos e repita com as canes dos Beatles o mesmo processo usado com os sonhos erticos, mas desta vez deixe ferver um pouco mais e mexa at dissolver. Parte do sangue pode ser substituda por suco de groselha, mas os resultados no sero os mesmos. Sirva o poema simples ou com iluses. (Nicolas Behr)

Fonte: (http://acd.ufrj.br/~pead/tema04/denotacaoeconotacao.html)

Leia o poema Profundamente de Manuel Bandeira. Observe que ele trabalha com um termo de forma denotativa e conotativa. Procure verificar que termo esse? Profundamente

Captulo 4 Professor: Edson

Quando ontem adormeci Na noite de So Joo Havia alegria e rumor Vozes cantigas e risos Ao p das fogueiras acesas. No meio da noite despertei No ouvi mais vozes nem risos Apenas bales Passavam errantes Silenciosamente Apenas de vez em quando O rudo de um bonde Cortava o silncio Como um tnel. Onde estavam os que h pouco Danavam Cantavam E riam Ao p das fogueiras acesas? Estavam todos dormindo Estavam todos deitados Dormindo Profundamente.

Quando eu tinha seis anos No pude ver o fim da festa de So Joo Porque adormeci.

Hoje no ouo mais as vozes daquele tempo Minha av Meu av Totnio Rodrigues Tomsia Rosa Onde esto todos eles? Esto todos dormindo Esto todos deitados Dormindo Profundamente.

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Voc conseguiu achar qual o termo? Sobre o que fala o poema?

Interpretando o poema, pode-se dizer que o eu-lrico se apresenta em dois tempos distintos: o passado (quando tinha seis anos) e o presente (hoje); bem destacados pelos advrbios que aparecem no incio da 1 (ontem) e da 6 (hoje) estrofes, respectivamente. O incio do texto mostra algumas lembranas do eu-lrico vividas na noite de So Joo, quando ele tinha seis anos e no pde ver o final da festa, porque tinha adormecido. Ento, ao acordar (possivelmente, no meio da madrugada), toda a alegria produzida pelas msicas, risadas e brincadeiras do cotidiano das pessoas daquela poca tinha desaparecido, porque todos da casa estavam dormindo profundamente (no sentido literal - denotativo). No entanto, a partir da 5 estrofe, percebe-se a mudana de tempo e a mesma angstia vivida pelo eu-lrico de no ouvir mais as vozes daquele tempo e se questiona at perceber que eles no estavam mais l, pois haviam morrido (dormido profundamente no sentindo conotativo). interessante a brincadeira que o poeta faz com as palavras em seu sentido denotativo e conotativo (dormir profundamente- 4 e 7 estrofes); percebe-se, portanto, que se trata de um bom entendedor das palavras que o cercam e que, mediante um vocabulrio simples, consegue atingir temas to profundos como a morte e a saudade. Portanto, ao analisarmos um texto, temos que observar bem o significado das palavras, a fim de depreendermos os sentidos que esto nele presentes. O que nos ajudar muito entendermos se a palavra tem um sentido conotativo ou literal ser o contexto, conforme vimos nos captulos anteriores.

Captulo 4 Professor: Edson