augusto thompson - quem são os criminosos - o crime e os criminosos - entes políticos (2007)
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ISBN 85-7387- 964-5
I I 97885738796 4 3
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Amílton BUUlO ele Cezar Hober!o BitCL\ ."c
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35
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AUGUSTO de Diu'i!o F'Cl1u! c
f'rocllrlli!or do Es!([t!n do Rio de JOlleiru,
Crim iI! il I.
o Crirne e o Criminoso: Entes Políticos
2ª edição
LUMEN JURIS Rio de Janeiro
2007
2007
Editorial Lumen Jur: teb.
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r mpresso no Brasil Prinfed in Brasil
"Por que é qlle ell me colo
"Como um monge medieval que tivesse passado (I vida inteira no deserto pelejol1do contra o demónio e lim dia
corno a notícia de que o diabo nrlo existe. "
f\FFONSO Rorvl/\NO DE SANT' ANNA
AUTOR
~ Norma Penal em Branco e Retrocrtil'idade HisíÔriL'() do Di/'c'i!u C'rillli!lu! {:f\'o-Brusiíeiro
- lV/C/fluol de jJara de - Q Advogado de Defeso !l
FICÇÃO:
Capítulo 1 - A Cifra Negra .......................... , ............................... .
Capítulo 2 - A Inconsistência da Criminologia Tradicional.......... 21
Capítulo 3- A Discriminação da Justiça Penal...... ......... .............. 45
4 O Verdadeiro Conteúdo do Direito Penal Corretivo ...................... .......................... ................. 95
5 - Conclusões .................................. ..... ....................... 127
I _. I 8.149 elo Juiz Verani)........... 141
II- Procuradores Reclamam das Pressões.... ................. ...... 152 m - Superpopulação Prisional ................................... · .... ·.... 156 IV·- O Malogro do Sistema Penitenciário Sueco ............. · .. · 158 V -- Um Caso de Medida de Segurança Detentiva ......... ..... 165 VI -- Pena de Morte, Prisão Cautelar e Cia. Ilimitada .......... 171
Referências Bibliográficas ............. ... ...... .......... ... ...... ...... ............. 175
ix
"Eu ser esta {ante do que tcr ([qllc{a velho illada soúre tudo, "
E
Raul Seixas
Thompson - Acho que ultimJ.mente minha convlvcncÍa com vocês tem sido intensa. Eu não saberia dizer se nas biritas intermináveis que tomamos a filosofia é um pretexto pra cachaça ou o inverso. O certo é que vocês epistemologizaram meu botequim.
Rosa - Thompson, não seja mentiroso. Você semprc gostou de cachaça e filosofia. Talvez não estivesse acostumado é com o boteco como um lugar pra gente negar as "certezas científicas", O boteco sempre foi () território da eloqüência fácil, onde se trocam as receitas do senso comum, ou do senso comum teórico, como se as últi
as grandes verdades da ciência. Kant é que di,scutindo com os percalços de sua pesquisa sobre o júri te perple-xo eom a implosão constante dos conceitos que você supõe con-fiáveis.
Kan! - Pô, eu que não tenho nenhuma para o terror como incendiário ... Vá pra mim, o pensamento
meus - também. cientista antro-
Poderiam, entuo, eom a leal frente ao leitor, sobre livro.
converSH. foi o do consumo dc duas Forestier tinto. Seriam necessélrias mais
xi
xii
tcm que cwtodevorar··sc, . T,~m que 1111er-mú di () cercam. que há muitas verda-
(k.~. nilp Glbcl1l
p~\rtiuu CLl
S slema. l:u que pra 1111111
dcvorando as semprlê
a mudar é um jurista que a
velhas conv'
d~\s na escola de direito saher" dns tribunais. é um jurista em
"!udila" no campo do direito, também como um
destruir as
tramos no e mOllGlitízar instrumentos
cfosse dominClnte elc, Em seu discurso parece que o é coisa centralizada e de uma elite CJue detém os pri-sócio-económicos. Como se nuo houvesse d eI ou
da classe dominante se o caso é de elites ou de entre as mesmas, resistência dos dominados etc.
r -- É verdade que sou um J em e como eliz o Nelson vai abandonando LI
entrando el11 outros dom sta, Nesta acho que tenho mesmo uma illcli a pensar por OpOS
refletir com mais matizes. Fundamentar certas que anoto. Afinal, isto seria pensar teoricamente de um modo sante, Mas há razões para a forma deste livro. Eu não sou um sociólo-go, um cientista um metodólogo, um de como vocês, Venho certas coisas com voracidade mas, ao mesmo tempo, com cautelas. pra evitar uma incli Inclusive um de í que me deixasse enfastiado, paralisa-do pra intervir sobre o mCl! dia-a-dia, que se passa cm grande na esfera elo !las jurídicas. Eu lenho coisas pra dizer, pra
StlO os criminoso,\'? Crinu! crinri!1(Js(l:~': ('flfc'S xiii
mudar e não vou deix:lr de fazê-lo porque não sou um súbio moderno, E lssÍemais do direito -
Eu que pra outns pessoas, Acho
não estou me avocando urna missão e muito
tlutrd . . t ~ . t l c 'I) ',\[TU-ISSO que ear~\C[enza o eonco: es ru ura- l. ::;-
tórios; j Llstapondo a mais plausível. fvlas a minha é outra, é
, , a especialmente stificar para , JUizes, ,
que fundamenta a e o tratamento ele entIda-
des como o o Cri
E antes que eu me acusam de simplificar
nante, sistema etc.,
I a que. dou ú que llão tenho urna vi são
sempre t'xpressa uma ao K. - Não fui eu quem Calou que você não stra a d~s
dcll1liné\dos. Acho. que há uma a você considerar a clJ-. ". . .\ 1·' 'c . d' rhr VilQem económICa um lllchcador seQuro e l e 111ltlVO no . L; , (
cO;1ta da da ~ e das estratégias de tratamos do Brasil, que uma
estamos dié1l1te de uma sociedade de fundada no
que que de acordo COI11 uma ideologia
. . ld·1 I t d 'os cid'lel'íOS perante a contrato SOCial, que a Igua ac e (e () os. . ~ ( . lei, porque lhes a igualdade perante o merc:ld~), Ol;de todas as
são de conversuo a padrões econoJ11ICos? Penso que
xiv
em nosso pJís a justiçJ se concebe, se representJ, não como um servÍ-de forma pública e mas como
que assuma os missos" necessúrios, nem sempre de caráter económico. O ideal bur-
da a!dade não se realizaria , nfío só porque essa inexiste por num sistema de e
desde o início CO;110 mas porque nos concebemos e lima sociedade de s, ele e de hierarquias, eIXO
é mas não O processo de aplicaçélo da lei no Brasil nada mais faria, po1'1<,1I1-
to, do que referendar sistematicamente esta desigualdade que entre nós ,i
ica que recobre ;t
nfio ideal é o de "nos locupletarmos todos" ...
R. Pois é, Kant, acho que esse viés analítico é muito significativo. Aqui, não somente a sociedade se divide em explorados e exploradores, em opressores e oprimidos, mas nós também assimilamos o ideal burguês de igualdade, de forma muito complicada. Quer dizer, os do direito aprendem este ideal na faculdade, na medida cm que importam uma cultura jurídica européia. Contudo, confliw com essa ideologia setorial uma macro-ideologia relativa ii totalidade social onde nos percebemos como desiguais, como investidos ou não de certos vilégios. Por aceitamos a lei como emanação de um poder que não é o nosso, que é o poder dos poderosos. ainda, opomos ao ideal europeu de cidadania a representaçélo de uma socie-dade hierarquizada como coisa natural.
T - E vocês acham que não percebo essa O por a mil+ha Lln;ilise sobre a "cifra
ela mostra que há outros e outras normas que não são as ionais do
resolvendo 0:-,
de resolver os
aprendidas na as recitadas direito lhes interessa utilizar LI da
. Esta forma na cifra negra, é,inclusi
Crinle e criminosos: entes xv
R. - Thompson, certamente mais a conversar, , a essas alturas, trouxemos o nossa discussão.
ele agora lendo seu trabalho confira a de nossa refle-xão. Kant e eu que este livro tem uma virtude funcla-
: ele contra o uso dos illsti-e não contra o seu abuso. E se a
ess;1 outro diretor de sistema
penitenciário - você é do Desipc - ou cm escolas de Direito, ou em cursos da OAB, anda dizendo estas coisas'?
A
A CI
"Então lhe trollxeram os escribas e os fariseus lima 111ul qt!C fura Clll adultério c :1 puscranl no
6. lJiziClIl1 i:,lO os tLntlilHJo () acusar. Porém Jesus abaixando-se, o dedo na terra.
7. E como eles perseveravam em fazer-lhe perguntas, ergueuse Jesus e disse-lhes: O que de vós outros está sem
o que a 8. E tornando a abaix,tr-se, escrevia na terra. 9. Mas eles ouvindo·o, foram saindo um a um, sendo os
mais velhos os E ficou só Jesus, e a mulher, que estava no me.io, cm
10. Enti'ío ergueu·se Jesus, e disse· lhe: Mulher. onde estão os (!1te te aellSitV:llll') te condenou')
II. ela: Senhor. Enti'ío disse Jcsus: Nem eu tampouco te condenarei. Vai e não peques mais:'
Silo JOcl(), 8, Novo Testamento I
do vcl visualizá-lo como um
em si mesmo, tornou natural c, de pronto, abriu oportu-
I. B SACRADA. Vers:lu de pl'. Antonio Pereira de Figueiredo. São Paulo, AlIléricus, 1950.
1
nidade para a criação de uma ciência que tivesse por objeto específico
u seu estudo, a minologia.
O novo ramo do conhecimento do delito
como de tudo CJue lhe anda ú
sando a í Daí, em sua aI iSt,lS escreveram,
escrevem e V;)O escrever incontáveis obras, em todas as línguas, , medi classi
icadas fórmulas matemáticas, teo
rias, , conclusões -- ah, conclusôes em avalanche, ainda que inconsistentes ou contraditórias - tudo envelopado cm atmosfera grave, scca, para UlTlCt
ve rdudei r{f ciêncio, mi nal ch::ntn)
definido conseguiu-se, cm boa medida, barrar seu à lllvasão do interesse ou da curiosidade daqueles que vivenciam a realidade concreta das infrações penais - isto é, o comum dos mortais - porque havidos como carentes da formação indispensável que lhes autorize a penetração em tão complexa disciplina. Conquistada a prerrogativa de contemplar o crime em "esplêndido Ísolamento",2 os especialistas atribUÍram-se o direito de reservar um espaço de sua exclusiva competência, rejeitadas intromissões indébitas a quem não ostentasse suficiente qualificação p~a merecer o título de criminólogo, Afinal, o templo do sábio-técnico deve cerrar as portas à entrada da ignorância do vulgo, a
quem cabe apenas suportar a catadupa generosa e cachoante do saber científico, que esguicha da boca erudita dos sacerdotes,
tardou a surgir um movimento de rebeldia contra fortaleza assim hermética, puderam os criminólogos gravitar em torno às suas fantasias com desenvoltura e na segurança do proprietário que não teme esbulhos quanto ao terreno cuidadosamente cercado c defendido.
2. CHRISTIE, Nils, Prcfácio do London, Tavíslock Pub" 1968,
. SC({lIdinol'inll SI/Idies iii
sâo os criminosos: Crime e 3
Aliás, a criminologia seguiu, pura e simplesmente, o exemplo da irmã mais velha, Jpsiquíatria,
Talvez passJr, e logo, à dos erros deste engendrJmento, Isso, contudo, estaria ent .kl.i)acor
do com a forma pela qual se deu o levantamento daqueles S o curso natural das coisas, partindo do dado que se apresen-tou como a ponta de verdade a ser
A pJrtir de meados do nosso século, algumas pesquisas ram evidenciar a existência de discrepância entre o número de crimes constantes das estatÍsticüs oficiais e a realidade escondida por trás dele, Observou-se que, embora os índices da ordem formal indiquem existir uma considerável quantidade de infrações, o total dos delitos de fato prat , A reduz.ida minoria das viul cimento A brecha os [rados denominou-se "clÍ' il
expressão que logo se firmou, enquanto ômel10 muito comum.
Para bem compreender a questão, impõe-se lembrar que criminoso, em sentido formal, é o indivíduo condenado pela justíça sobretudo se for recolhido à prisão, fazendo jus, dessa maneira, ao rótulo de delinqüente por parte do grupo social. De outro lado, cabe
recordar que, da prática do delito à condenacão do autor indo um pouco adiante, até seu encarceramento) há um obrinatório caminho a , b
ser percorrido, o qual oferece como etapas marcantes as seguintes: a) ser o fato relatado LI polícia; b) se relatado, ser registrado; c) se trado, ser investigado; d) se investigado, gerar um inquérito; se
o inquérito, dar origem a uma denúncia por parte do promotor; f) denunciado, redundar em condenação pelo g) se, havendo condenação e expedido o mandado de prisão, a polí-
cia vamente o executa. Estigmatizada como criminoso a suportar a
conceitos e tratamento diferenciado por elemento
será a pessoa que, além de haver cm abstrato em norma
indicadas e termina confinada numa penitenciária. Se alguém
viola um escapa de lido pnl' criminoso.
na este
idadns<ls demonstrar que Cll c;\da uma
fascs n.:ferida:.; ocorrc Ullla cntre o Ullivcr:;o dditos
o número dos qUL' a ordem oficial. H~.
P()I descumpasso 110 CIC!!/'{j ( ifra
n:ío ter os dados que ,Ipenas
ínfima la dos crimes a receber npe sendo que destes tão-somente uma minoria leva os autores ao cárce-
lit:lr dd ifra negra.
honestamente através de um exame
em nossa viua: de nós é de assegurar jamais haver come-
tido sequer llm único ilícito até o dia de Lembremos que concorrer de qualquer modo para
sua prúti ca) os ::ttos a arrolados
do de vista ideal: comprar de cuntrabandista uÍs-de levar
sem
suficiente provisão de fundos; de dív cometer adultério;
atestado médico gn sem paralelo, para usar ex mais ; jogar no no
buquemêiquer; sendo funcionário (inclusive juiz e char num dado sentido para atender a pcdido de
e crinlinosos: Cl1rcs 5
assinar lista ele presença à auja por ausente; etc., . etc.
de ern conse seremos cap(u~es ele nos j u inOCC1l1 de todo delito'! pr()va\'l~ll1lcllte - cntre este:s,
dizer, n~ío se encontra o autor ckstas línlus. descritas constitui crime c,
S()S, n a maioria. de nós nunca teve nenhuma fafo delituoso sequer relatado à
o conforto da ci fra ncgra. antos abortos !cVàUOS a c to ao
conhecimento das autoriuades? E fUl'tos em relacionadas com a
lesões freqüência através de entre víti-
mas e ; os roubos (a vítima, por medo ou por julgar uma de prefere não comunicar o fato Zl ; a acidentes de trânsito, e assim por diante'!
a própria polícia conduz o lesado a concorrer para o da cifra negra, já para evitar que as estatísticas demonstrem com toda a crueza a enormidade das práticas o que em dúvida sua em sufocante plctora de casos que a esmaga no
Nem se que escapa ao fenômeno da cifra negra um to como o homicídio. entre parentes
por melO do emprego de veneno ou de ficam no por certidões de óbito inexatas ou des
por médicos que se basearam em ln de familiares da vítima'?
"Nos Estados e ainda no a de uma
vítima conduziu à de muitas outras que
sido ass,lssinadas uma a lima, enterradas c, aparentemente, nunca dadas como Histórias se com som-bria acerca de corpos encontrados enterrados cm isolados. de homicídios cm massa por empregados ou
6
guardas de prisão tanto quanto por anarquistas ou por políticos extrernistas."3
da mortos,
foram executados pelos Quantas pessoas encontradas
a no sentido de terem natural, quando, cm
Veja-se, a
a de morte
"Uma após outra, oito mulheres idosas, cada qual vivendo sozinha na mesma rua cm Manhattan, foram encontradas mortas durante a e venl0 ele I havia
li duas das s
m morrer, ainda mais duas."4
a alcoolismo. ando Ulll
a lí ltil muI a as havia matado a todas e
Sobretudo ingleses e americanos têm investigado e tentado a mensuração da cifra negra neste primeiro passo (relato à polícia), procurando quantificá-la, ao menos, aproximadamente, concentrando as pesquisas nas três pontas do fenômeno mais propícias para tal finali dade. Para isso, realizam inquirições com respeito a grupos, os mais numerosos possíveis da população, indagando, por meio de formulcl- .-/
adequadamente preparados, quantas vezes caela uma das pessoas já praticou (pólo ativo) ou foi vítima (pólo passivo), ou de alguma forma tomou conhecimento (pólo neutro) de delitos que não rarn a ser relatados à polícia. A elos dados élssÍm obtidos com nas oficiais tornou possível a inferência de algumas conclusões que, se ser tomadas como fornecem, de qualquer sorte, uma idéia da extensão do tema.
RADZINOWICZ. Leon Hamilton Lid., 1977. p.
4. Id., p.
CrOl1'11r
sao os cril71l!1(J,I,'()S? Cl'ime e (TI.'11I170\,{.IS. 7
Em Nova Iorque, por exemplo, ocorrem pelo menos duas vezes mais ais do que as que são objeto de relato. Em Filadélfia, cinco. Na Alemanha, em termos de aborto, a é de 500 para um; cm matéria de crimes sexuais, de 10 para um; no que toca a homicídios, entre três ou seis para um; e no caso dos crimes contra o património, de oito a lO para cada um. Na Inglaterra, ;1S mais modestas vas indicam que o total dos delitos cados deve ser superior a quatro sendo certo que metade ao conhecimento das autoridades. Em termos de homicídio:
"Algumas estimativas v50 ao ponto de afirmar que somente um homicídio em cclda três ou dos
outras quc a rel
se a ainda mais precário em face pobreza das próprias estatísticas oficiais, resulta difícil dimensionar o espaço escuro onde se abriga a delinqUência n50 relatada. Contudo, valendo-me dos 43 anos que me ligam ao cotidiano criminal, sou levado a concluir que as estimativas anteriormente referidas são por demais reduzidas para o panorama brasileiro. À minha experiência, somo a intuição de policiais, promotores, juízes, advogados, com dedicação de muitos anos na área da administração da justiça, os quais, por mim consultados, manifestaram a mesma impressão. Creio que, ainda numa previsão
cautelosa, no mínimo dois da globalidade das condutas delituosas de fato adotadas não chegam à ciência da polícia.
Crimes Mas Não Registrados
Por vezes, a notícia de um fato lO da !11 o que
/
8
deve estar r, e
bera social, possível
razões
duros que for independentemente do
e que lhe ordenam for-mal um procedimento criminal contra o autor de um delho, desde que este, de alguma lhe ao conhecimento,
de uma os COll Í1.os
com o dos jurisdi Mostra-se vi,'ive!, em inúmeros casos, compor os interes
ses do criminoso e da vítima por meio de um trabalho de persuasão, de apelo à mútua compreensão, de desarmamento dos espíritos; por que desprezar essa via para obedecer cegamente ao texto frio das
registrando o fato, expondo o agente ativo aos riscos de um processo criminal e cortando, praticamente, a possibilidade de o sujeito passivo ter seu prejuízo indenizado? (A lei penal empresta nenhum valor - de fato, apesar de sua retórica não admitir isso com franqueza - ao ressarcimento do dano, de maneira que se tiver de enfrentar uma acusação já formalizada o criminoso se recusará a reparar a lesão causada, pois que a providência em nada melhorará sua posição.)
Ademais, a existência do registro vai determinar, necessariamente, uma série de atividades por parte dos servidores da polícia; evitálo, pois, representa economia de trabalho e de gastos - meta de absoluta prioridade numa delegacia policial, sempre assoberbada com quase insuportável quantidade de casos,
Lesões corporais entre parentes (sobretudo marido e mulher, pais e filhos, amigos ou colegas), mero uso de tóxicos, furtos em super-mercados, crimes contra o património de forma etc., embora levados à mesa da autoridade de dia, e embora consubsc
slio os cril1únosos? CriJJ7e
tanciem verdadeiramente delitos negra, por falta de
Neste passo, por
implica a cri
exame
resvalam para a cifra
opera gozam de tanta ou
absolutórias. efeito, a o criminoso da trilha Cc única via) capaz de conduzi-lo à da Naturalmente, como em todo e qualquer julgamento, o episódio e o autor são encara-dos da subjetiva do julgador, que os por meio cÍl;
a
crim oculta.
Importante motivação a engrossar a hipótese, encontramo-Ia no espírito de corpo dos membros da instituição policial. Quem traba:ha no ramo sabe que, a qualquer momento, pode encontrar-se env.olvld.o em evento no qual se veja apontado como infrator de algum dISpOSItivo penal. Semelhante expectativa é inerente à profissão. Como a própria polícia apura os delitos atribuídos a policiais, compreende-se que tal circunstância crie uma atitude de protecionismo dos colegas que atuam como autoridade repressora relativamente aos colegas que são acusados, uma vez que as posições, num amanhã próximo e provável, poderão estar invertidas. Vigora, então, uma forte coesão funcionai, sendo considerados aqueles que recusam endossá-la como maus companheiros, traidores da classe, indignos de pertencer a seus quadros, condenados a viver em ostracismo e, até, em regime de pe!'seguição. Ora, a maneira mais expedita de inviabiliza~'-s~ a pumçao do autor de um delito é de registrar o fato cnmll1Oso. Uma forma atenuada, ou habilidosa, largamente de executar a manobra consiste em:
"Instaurar sindicância administrativa sumária e ~vo~ar.o inquérito para a Corregedoria de Polícia são as pn~clpals providências que a polícia toma para investigar cnmes e
10
arbitrariedades em que figuram policiais como autores ou envolvidos. "6
Em vez do no I ele a-se para uma disci inar, que correrá no âmbito interno da Secretaria de
Segurança, obviada assim a submissão do problema à do Mi o Público e do Juiz.
xam de ser de vanta-gens, dinheiro) e de prevaricação (atendimento a de pessoas poderosas, chefes, colegas, amigos, protetares e por aí afora).
o mero do evento um mCI-
piente no rumo de sua exposição ao claro. Se a ele faltar a conseqüêncÍa de uma investigação com êxito, o fato que mereceu um lampejo de luz retroage à escuridão. Com enorme incidência, verifica-se a ausência de qualquer investigação com respeito a delitos que foram objeto de registro. Este é o caso de absoluta predominância no concernente aos crimes contra o patrimônio. Já por causa do elevadíssimo número em que ocorrem, já parque em geral fornecem diminutos elementos a permitir um simples vislumbre de elucidação, tendem a jazer esquecidos no mofo dos livros de ocorrências. Quem já foi vítima de furto ou de roubo - de automóvel, de valores que possuía na casa assaltada, de bens partados na condução ou na rua - sabe que, mesmo ficando em cÍma dos funci a fornecer apoio, meios, gratificações etc., dificilmente a real de uma investigação sistemática, cui-dadosa, ou mesmo interessada. A maioria das pessoas, por tomar conhecimento de tal circunstância, desanima de sequer tentar provocar algum nos deteti ves formalmente encarregados no caso, o qual só será por pura questão de sorte.
6. SILVA, J. Paulo da & BRAGA. Ronaldo . .Ioma! do Brasil, Rio de Janeiro, 198 I. 12 cad., p. 22.
selo os crinlinosos? CriUie e crinllnosos: entes
Embora o problema seja mundial, dificilmente se encontram dados elucidativos a a título de exemplo aleatório, para o quadro a
TIPO ou INCIDENTE
Homicídio
Suicídio
rncêndio doloso Furto de automóvel Lesão corporal grave Roubo Estelionato Crimes sexuais graves Lesões corporais leves Furto não-residencial Cadáveres encontrados Furto em residência Furto simples Vandalismo Perda de coisas
Todos os tipos juntos
Fonte: Cidade de Kansas - maio/novembro de 1
PORCENTAGEM
100
70,4 65,5 64,4 62,6 59,6 59 41,8 36,3 35,7 30,0 18,4 6,8 0,9
7. Apud CHAIKEN, Jan M ; GREENWOOD, Peter W. & PETERSILIA, Joan. Criminology Review Yearbook. 1 :711-41, 1979. . ,
motivaram Se crimes a ser relata-
e, que certamente muitas das não obtêm sucesso, fica fácil avaliar a
que ostenta o mundo da criminalidade oficial relativamente ao universo da
Crimes
de Processo Penal polícia a possibilidade de arquivar autos de inquérito. Naquela época, pois, a faixa de acomodação viável de ser conseguida na delegacia estreitava-se entre a ciência do fato e seu registro.
Depois, com força irresistível, surgiu uma prática que, como verdadeiro direito costumeiro, veio a suplantar e revogar a norma escrita. Por ela, tornou-se possível à polícia deixar de instaurar inquérito com referência a fatos delituosos, mesmo que tenham sido objeto de relato, registro e investigação. Abriu-se, pois, à revelia do.--Código, uma oportunidade a mais de perda entre a globalidade dos crimes efetivamente perpetrados e aqueles a serem iluminados pelo facho das estatísticas oficiais. Conhece-se o uso ern causa pelos nomes de acaute!wnento ou arquivamento de sindicâncias. Verifica-se ocorrer, aqui, mais uma hipótese de transferência para a polícia do julgamento da causa, espécie de delegação manifestamente contrária a toda a sistemática de nossa legislação. até, com a atribuição de um poder mais discricionário ao delegado do que aquele conferido a promotores e juízes, uma vez que se dispensam maiores formalidades na citada solução, inclusive no relativo à motivação justificadora da medida. Reiteradas vezes, o despacho terminativo do feito restringe-se a um lacônico e imotivado "Acautele-se", de sorte que ao delegado se poupa o trabalho incômodo de armar uma convincente süstentação em amparo ao decidido,
silo os' crilninosos? CriJl1e e crinú!1()so,s': entes
coisa a que estão obrigados os membros do Poder Judiciário
A moda para o escuro.
vazadouro de do claro
Para comprovar a acaso fosse insuficiente o testcmunbo de bastaria lembrar um
vendo-se frustrada em na busca de melhoria de vencimentos, que chamou de . se não () aumento reívindica-
seriam instaurados inquéritos para todos os eventos objeto de registro, ou seja, obedecendo literalmente à determinação da lei, aban-donaria o aos aeautelamenlos. Atender a e1 a sol
os por obedecerem à (ou olhando de outro por recusarem a agir fora da lei). De outro lado, caso nascessem inquéritos de todos os registros, o judiciário estaria afogado em uma semana, mortalmente paralisado, sem sequer espaço físico para amontoar a avalanche de papel que para lá jorraria das delegacias.
Na base do arquivamento de sindicâncias predomina, com incidência largamente superior, a corrupção e a prevaricação, embora, por vezes, expresse o sincero convencimento de que, naquela hipótese específica, inexistiu um verdadeiro delito ou, mais freqUentemente, que o indiciado refoge ao estereótipo de um típico criminoso, fazendo jus, dessa maneira, a um ato de complacência e compreensão.
Novidade mais recente que os acautelamentos, os autos de resistência contribuem para o incremento da cifra negra, suprindo-a de um contingente de delitos graves, perpetrados por policiais. Emprega-se o expediente como fórmula de suprimir ao exame do Judiciário homicídios e lesões corporais praticados pelos agentes da ordem pública quando matam OLl ferem supostos meliantes no exercício (também presumido) da atividade repressiva. Em episódios dessa na~ureza, a autoridade de plantão limita-se a lavrar um termo no qual regIstra que o sujeito ativo da infração agiu em estado de legítima defes.a, c(~n:ede-lhe liberdade e procede à confecção de um simulacro de lI1~uento, no qual se limita a tomar as declarações dos policiais envolvldos~no
14
caso. Obviamente, apenas uma única versão fica consicrnada no feito b ,
exatamente a que favorece a posição do agressor Oll dos agressores. algum outro magistrado levanta a voz para demonstrar a ile-
galidade do procedimento em pauta, a judiciária ollvi-moucos, preferindo encarar a questão numa perspectiva pragmáti
ca, e se acomodar com a solução quc simplifica e facilita as coisas. para o exemplo concreto no APÊNDICE 1.
se os policiais cobram de maneira tão exaltada o direito de dispor da vida jurisdicionados, a recusa a tal prerrogativa por
dos promotores e juízes poderia gerar um estremecimento nos laços que ligam as respectivas instituições, algo que se considera muito prejudicial ao bom funcionamento da máquina repressora como um todo. O que o sistema deseja é vê-las agir em perfeita harmonia e entrosamento. a a, "a a
do de bí Jorge Elefante i estourada na mesma hora em que o Secretário de Segurança, general Waldyr Muniz, e o comandante da PM, coronel Nilton Cerqueira, acabavam de almoçar no 12º BPM, em Níterói, eom 27 delegados do interior, 13 comandantes de quartéis da PM, sete juízes e dois promotores, convocados para a reunião a fim de 'sanar qualquer divergência entre a PM, a Polícia Civil e a Justiça. '
........................................................................................................
Na reunião, Nilton Cerqueira disse que a PM desenvolve um trabalho 'em defesa dos direitos humanos e cristãos'. 'A união faz a força', disse o general Muniz."8
Crimes Cujos Inquéritos São Arquivados pelo Ministério Público
Muitos dos inquéritos instaurados terminam sem que a polícia logre elucidar a autoria dos crimes em apuração, sendo, nesse caso,
8. O Rio de 27 jan. 1982, p. 11.
S{{O os' cril71inos{).f;: CriJne e cr;',11iI10,I,'OS:
l'emetidos a Juízo sem a indicação do culpado. Em tais hipóteses, outra alternativa falta ao Promotor senão a de pedir o arquivamento do feito. I-louve o delito, disso há certeza; porém, por falta de tos, torna-se inviável processar - e, condenar - o crimino-so, o qual, fica oculto à sombra da cifra negra.
Outras razões, como veremos adiante, podem levar o Promotor ~l
renúncia quanto a movimentar uma penal contra alguém. Por ora, contudo, chamar a para o já referido: delitos de existência comprovada, mas autores, não ter sido levan-tada a autoria, não são considerados criminosos ordem formal, ficando de fora das estatísticas oficiais. É que o dado a seguir fornecido desacredita a alegação, por vezes sustentada pelos defensores da criminologia tradicional, de que a cifra negra só mostra relevância
a de mínima a, sendo ele delitos graves, como, por
lUdo o mais vimos sustenbndo fosse a desrazüo do a só do ria tal efeito:
o para (lémonstrar
detclmina-
"O Departamento de Polícia Especializada (DPE) admitiu ontem que existem atualmente cinco mil inquéritos de crimes de morte san solução, todos a cargo da Delegacia de Homicídios. Esta estatística - apontando uma média de um mil homicídios por ano foi feita considerando apenas os anos que se seguiram à fusão dos antigos Estado do Rio e Guanabara .
Estes números constam do relatório sobre as atividades da Delegacia de Homicídios durante o ano que passou, encaminhado pelo delegado Arnaldo Campana ao diretor do DPE, que remeteu ao Secretário de Segurança, general Edmundo Mllrge1. 9
Somente entre 1975 e 1980, alguns milhares de assassinos engordaram as hostes da cifra negra. Como, no mesmo período, as
por homi não a casa das centenas,
9. O GLOBO, Rio de Janeiro, 15 ago. 1980, p. ! 2.
16
torna-se crimes relativamente às como é o caso do mais enfaticamente
separa o universo dos num dei
merecem as real
formal assim pela ordem
à penitenciária),
na elos que identificados que servem ínfima da totalidade?
Além dos processos em que o próprio de um culpado hipótese em que se vê
Iram pUf . r de uma e outro de acentuada no tante ú
aquilatação do valor probante dos elementos carreados aos autos. Por isso mesmo, ainda quando a polícia dá o caso por resolvido, considerando haver descoberto a autoria do crime, ao promotor ocorre pedir o arquivamento do feito, por lhe parecer serem os indícios reunidos insuficientes para gerar sequer um princípio de convicção.
Percebemos aqui que também ao promotor se faculta uma oportunidade de julgamento do caso, uma vez que decidir aquilo a ser considerado como indícios s~~ficientes ou insuficientes exige uma consideração valorativa sobre o conteúdo do processo. Como em todo o julgamento, a matéria será enfocada através do subjetivismo de quem a examina, uma vez que inexiste a possibilidade de alguém adotar uma posição inteiramente desinteressada frente a qualquer problema relativo à espécie humana. Por outro lado, em área tão fluida como essa, inexiste fórmula apta a limitar de maneira rígida e exclusiva os verdadeiros motivos aceitáveis no sentido de autorizar a solução do arquivamento. Necessariamente, espaço para a manifestação da atividade discricionária quem vai decidir a matéria.
Como conseqüência, embora sustentando a posição por meio de um discurso dissimulador, muitas vezes o promotor reqller o arquivamento por entender que o apontado autor não um verda-
17
cieiro ainda que do e de ser o indiciado seu
Tudo isso de fato concretizados e os aparecem na claridade da ordem
formal - para cOnlradizer a realidade do r
Na ondc há
acerca da conveniência da
do !''lIi!li Poder
no concernente ao
a denúncia. recursos nesse e se resolvem no àmbito interno da instituição.
manipulação dessa faixa de poder, como sempre acontece fora dos
lei, influenciando-se o
m, são se busca aliviar a sobrecar-ga de serviço das Varas Criminais, ou porque o promotor discorda da criminalização de certos fatos, ou porque se apieda de alguns acusados, ou porque, naquele dia, se reconciliou com a namorada e deseja expressar sua satisfação por meio de uma atitude de magnanimidade, ou por mil outros motivos que nada têm a ver com a efetiva existência de um delito praticado por uma pessoa perfeitamente identificada.
O que, de resto, não representa nada novo no front ocidental: ./
"Noventa e nove de cada 100 pessoas detidas por acusação de delítos graves, na maior cidade da nação (Nova Iorque), jamais vão para uma prisão estadual e mais de 80 não são sequer denunciadas como criminosas."lo
Claro, também a corrupção e os pedidos e ordens podem intluir no ânimo do promotor para conduzi-lo à decisão entre o arquivamento e a denúncia - embora a primeira causa seja infreqUente (o pape! do
corrupto, o sistema designou a polícia para desempenhá-lo).
10. THE NEW YORK TIMES, aplld Tlle Atlanta Journal, Georgia, USA, 5 jan. 1981, p.9A.
! i
,.l 'j
18
Quanto à ÍndícÍo de seu alcance na
CriU1eS que em
Instaur,lda a
"Tudo
são absolver."
o processo terá de pros-terminativa do Juiz. Às demolls-
em sentido
a crer que houve o cnme e o acusado é seu aquela certeza
capaz de uma por que me na contingência de
muitas vezes esconde tal fórmula o verdadeiro motivo que levou o Juiz a livrar o réu de uma pena, sendo tãosomente. como a mais e cómoda maneira de
Àtrás do biombo, podem estar o de a.
sistência das afirmativas da criminologia positivista, a qual se alimenta quase que exclusivamente de pesquisas realizadas sobre os membros das populações prisionais. Àdiante, atrevo-me a pensar. ~ .
Condenado o réu a urna pena Juiz expede uma ordem (mandado de que efetue a captura do condenado.
de que nào surs'is, o determinando à polícia
. Pois .bem, existem no país mais de mil mandados por cum-pnr. ConsIderando que contamos com cerca de 120 mil encarcerados, constata-se haver muito mais condenados soltos do que dentro das p~ni.tenciárias, ou ainda: a população prisional representa uma parcela d1l1l1nuta no que concerne aos criminosos assim etiquetados pela ordem formal, os quais, por seu turno, configuram reduzido número da cri rní total.
Àlgumas evidentes conseqüências decorrem da existência da cifra negra, como anota, por exemplo, Sir Leon Radznowicz: II a) representa a substância do crime, enquanto as estatísticas oficiais são tão-somente sua sombra; b) torna extremamente difícil descobrir os verdadeiros caminhos e composição da criminalidade; c) restring~ e distorce nosso conhecimento a respeito dos criminosos; d) as atItudes d~sociedade com relação ao crime e à punição são inevitavelmente irrealistas; ,e) impõe-se como o maior fator no enfraquecimento de qualquer efeito intimidativo que a punição ou o tratamento dos criminosos pudesse ter; f) provavelmente, o sistema não tem o menor interesse em tentar diminuir a cifra pois a polícia, os promotores, o Judiciário e os estabelecimentos prisionais sucumbi~'iam se tivessem que lidar com todos os que, realmente, praticam mfrações penais.
Também a ONU já afirmou que os estudos acerca da crimínaJi-dade oculta em xeque as tradicionais relativas ao problema da delinqUência. Estas doses de
! ! . 0v cit., pp, 52-4.
20
de modo a demonstrar que toda l~(ILL!" de e
Capitulo II
A CRIMINOLOGIA
TRADICIONAL
"O conhecillli'nto r('!l{ç'{{.')1 tl.\'sinlÍ!u os' coj,,>'{f,\'
I1cn/llurt de perdae/c. (f
i,\'so, o conhecilllento SenljJre lilll de.'lconhe-cimento. Por outro !ado, é sel!Jpre que visa, nwfdosa, insidiosa e ag.ressÊvCl/l1ente,
indiv(duos, coisas, situaç6es. "
Michel Foucault l
Três postulados seguram todo o edifício da construção criminológico-positivista: l. O crime é um fenômeno naturaL O estudo do crime deve ser realizado através do mesmo processo de conhecimento usado para as ciências naturais. 3. Pela observação e pesquisa dos minosos, assim identificados oficialmente, é possível desvendar as causas do crime e extirpá-las da sociedade.
Submetidas a uma crítica que prescinde de maior profundidade, tais afirmações se esboroam, deixando à mostra o miolo nelas contido: um saber promovido pelo poder dominante, permeado de conteúdo político. Tratemos de examiná-las, olhando-as pelo avesso.
l. CADERNOS DA PUe. A verdade e as fórmas jurídicas. Rio de Janeiro, 1978, p. 19.
21
22
o Crime Não é um Fenômeno Natural
para posicií).tHlf o crime corno ci em reconhecer-lhe a natura!", isto é, que vel como. um ser em si mesmo.
vistas a tal mister, impunha-se recusar o na fase do Direito Penal de acordo com o qual, na elegante sentença do scu mais completo e coerente mestre, Francesco Carrara: "O crime é um ente jurídico." Aceitar a concepção delito como alguma coisa dependente da legislação importaria em empurrá-lo para o mundo das normas, e este, obviamente, constitui regaço uado para aninhar uma natural. Dentro da
a onde nasceu a crim as
ou tra.
CGmo incomu ma deJas com
por
O objeto da ciência positiva tem que ser, de modo estável, definido, absoluto. Ora, a definição das infrações pelos preceitos legais caracteriza-se pela fluidez, pela mutabilidade, pela extraordinária variação em função de sua colocação em termos de tempo/espaço. Agir de uma certa maneira pode ser crime hoje e aqui, mas pode ser lícito hoje lá ou tê-lo sido aqui ontem ou vir a sê-lo aqui. amanhã. Como observou um autor: "Uma criminalidade que é regulada em parte pela cronologia, em parte pela longitude, não se presta facilmente para uma discussão científica."2
A rigor, se por cientifica queremos dizer cientifica-natural, não se presta de jeito nenhum.
Somente conceituando o crime em total independência quanto leis é que se poderia elegê-lo como objeto próprio de uma disciplina ex ata.
No de atender a esse pressuposto incontáveis tentati-vas foram feitas, e continuam a sê-lo, na busca de apresentar lima
de delito.
2. ELLIS, Havelock. The Criminal. Londres, $. cd., 19 J 4. p. 2.
os crinzinosos? Crirlle e Cri!11ino:üJs: ente};
muito talento, resmas de papel e de tinta do em causa. Desde
dos
uma profusão cada crimi que se
preza adota no que concerne ao O fato indiscutível é ínexistir a mais longínqua ou remota esperança de consenso a
o que parece comprovar a presença de
l:m fico i para cevar experirnentaI. Nesse passo, os psicólogos obtiveram mais sucesso, ou foram mais o elemento metafísico "alma" na de
tude dessa
dela descartar
em o contas,
normativa. que tira da iI idéia de
lei que só em virlado
i.
Trau. B Silveira. Süo
24
outros, cuja criminalidade é criminosos em todos os
resultariam
que se possa chamar atribuído por uma lei "6
U<"-,LlIJ':L{A;;' de superar o relativo à conceituação do crime como "fenômeno natural", a maior parte dos criminólogos adota impassível postura: concorda quanto a estar num beco sem saída, conforma-se, elimina das cogitações qualquer preocupação relativamente ao ponto, mas persiste com afinco na tarefa de trabalhar no edifício da criminologia positivista - que flutua no éter, à falta de alicerces.
Assim, criminologiza-se numa espécie de colorido balão solto no espaço, carente de vínculos que o liguem ao chão da realidade.
.Quadro singular o da criminologia: ciência natural que não dispõe de um objeto de estudo precisamente definido.
o Estudo do Crime Pode Ser Realizado Através do Mesmo Processo de Conhecimento
Usado as Ciências Naturais
do das tentativas de conformar o crime à condi-de fenómeno natural, nem por um instante ocorreu qualquer vaci-
6. BRUNO, AníhaL Direito Penal. 2. ed. Rio de Janeiro, Forense, s,d. tomo I, 'p. 269.
sua
slio os crhnillOSOS? CriJne e critninosos: entes 001.1111"']\' 25
com referência à escolha científica:
"Uma sol ciências naturais mcnto da
das do :~;tatlls ele objetos
a serem na
método das sob o argu-
o avanço obtido na química, física, astronomia, biologia encheu o homem
para a buscasse usar o mesmo conduto no concernente ao novo campo que se abria, aquele em que o principal objeto de estudo era o próprio homem, enquanto ser político. A assimilação deu-se de forma tão decidida que se projetou, até mesmo, na nomenclatura escolhida: v.g., à sociologia apelidou-se defísica social.
Não parece difícil, porém, apontar o erro básico que macula tal postura.
Quanto ciências naturais, o homem assume a posição de sujei-to e a matéria de seu interesse oferece-se corno objeto, algo à sua frente, autónoma com respeito ao investigador. (Advirta-se estarmos procurando simplificar a explanação, pois, em verdade, em nenhum domínio do conhecimento se identificará alguma coisa que seja inteiramente objeto relativamente a um homem sujeito: ambos estão no mesmo mundo e, de alguma forma, interagem).8 No caso das ciências sociais, torna-se evidente a impossibilidade de realizar a cisão sujeito x objeto, haja vista estar o homem, de forma principal, nos dois pólos
7, SANTOS, Juarez Cirino dos. A da Rio de Janeiro, Forense, 1979, p. 16.
8, A da nm,b""A'''' María Alice Máximo, coIbida oralmente.
26
da relação. "O homem é, a um só tempo, sujeito e objeto das relações . ,')
m
humana são funde com o
di sociedade." I o
desenvolvimento c trL1nsfor-em que se desdobra a ex istência
S, um que se con-cito que o conhece: não a ser
ela natureza e as ciências da
Com efeito, o sucesso do método ou positivo medularmente, da neutralidade e desinteresse por parte do sujeito
cln elo estu-c
vel encontrar neutralidade por parte do cientista enquanto trabalha no terreno das ciências humanas?
"A questão da neutralidade do conhecimento científico (produto de um instrumental técnico, neutro), ou de sua objetívidade (relativa a dados objetivamente verificados), depende, portanto, da imparcialidade de um sujeito que como parte de s~u próprio objetó." II
"A questão, agora, é esta: corno é possível a imparcialidade do sujeito, se este, como sujeito, é, também, do objeto investigado?" 12
o cientista está encarnado num homem, situado numa dada na qual ocupa um determinado lugar específico em
aos outros indivíduos, com se relacionando politicamente, vincu-
9, SANTOS, Juarez Cirino dos. 10. Id., íb. I I. leL 1. 12.ld.,
p. I
.v{ío os criJlÚnOS05'! Cri/11e c cri"ú!losos: enTes
lado a grupos que se formam em funçã,o da distribuição inigualitária da da propriedade, do status, das recompensas etc .
ser - ou, para usar s elucidativa, ser político - é-lhe impossível toda essa gama de
a ponto de o meio a que como alguma coisa que não lhe diz e, forma, observá-lo com a distância necessária para fazê-lo um objeto alienado de seus interesses: "... como se uma ameba saltasse da làmi-na de um para o visor, c do visor para a lâmina, tentando observar a si própria".13 Só na mais das será viáVtl conceber alguém capaz de enxergar o grupo humano sem fazê-lo através da intermediação de representações de valor, as quais estarão meadas da influência da posição do sujeito no que concerne ao conflito de entre as chtsses Em suma, na h;i um
resultado grupos ante adas qu ainda que se pretenda cientista, sofrerá a influência do oeu relativamente ao jogo do poder, quando procurar refletir sobre a reali-dade na qual está imersa. .
Importante papel desempenha, na construção das ciências sociais de cunho positivista, a ideologia adotada pelas classes superiores. Esse "conjünto de idéias, crenças e princípios, mais ou menos sinceramente professados, mas que não correspondem aos I apresentado como fruto da atividade espiritual, mas, em verdade, decorrente da ligação do espírito humano a rnúltiplas formas e pressuposições materiais e, sobretudo, leva pessoas do grupo dominante a impor como verdadeiro aquilo que ajuda à continuidade do status quo social e, à manutenção de suas e Anexar o atributo "científico" à importa em a sobremaneira, inclusive de um que a torna indene aos de todos os do título de - a
13. GOLDTHORPE, .1.E. c Social. Trad. Cabral.
Rio. Zahar, I pp,31 LT L 14. CUV1LLIER, Armam!. \'ocoblllârio do, Tl~(1. 010 .
de 01 íveira e J, g, Damasceno Penna. São Paulo, NacIOnal, 1961, p. 7 f.
28
dor dos elementos de
ser de re,lcionári o.
da ciél1cizl, ou a sociais, nas socied
conheci-
articu
diz Foucault: "O ítico não está ausente do saber; ele é (ramado com o saber."1
Penso que ficarão stradas as afirmações alinhadas, não apenas por forç:a do tópico seguinte, mas, especialmente, quando cui-
da concernente ao caráter di da criminal.
Na medida em que quanto a definir e ficar o eto da disci ma - o crime como natural _. a crimi-
nologia renunciou a el como o ponto básico ele suas investi-
IS. Juarcz Cirino dos, 0/). cito p, 25, 16. FOUCi\ULT, Michel. Vigiar e jJllnir. Trad.
Vozes. 1977. p, ~2, M. PUl1dG Vassalo, is.
StlO os crilJlinos{;s? Crinlf? e crinúnoso.y: entes 29
a H lassirica-(p!e recusava revestir ;\ concreticidade
para se lhe reconbt:cer a ljllalidadc de o de uma ciCncía V;l.
obstáculo. manobra no sentido ele altCl'm !la subs-
Sé: l1l fazc-l () fOlTnél decl;1rada em lU b.:órico e verbal, o conteúdo da C!'Im!
Certo de que sem material para a de um trabalho de laboratório ficmia difícil o novu ramo elo conhl2cilllcnto com ,)S
louros da de "ciência", o por baixo da mesa, de sorte a oferecer coisa utilizóvel
na pe"sqllis~1
resumida: a doença é um mal, realizando-se muitas das suas illvestigações sobre o corpo do doente; o crime é um mal, logo, por anal possível seria investigá-lo por meio do corpo dos seus portadores, os
, criminosos. O achado era, como o comprova todo o or [-
mento da criminologia, de alcance extraordinário. Criminoso é um homem, e homem é algo concreto, real, existente no mundo
descritível, classificável, . Contando com um
com a entidade delito, inada a o de objeto de uma clcncia
Claro, desnecessário seria eliminar ostensivamente da nova objeto "crime". mas seria considerado como um ser de
ao e. por via deste último. se faria a naturalística daquele.
Eis a verdade: a criminologia positivista, o fato mediante uma retórica sofisticada e tomou para seu o criminoso, com o que, se livrou de enfrentar a difi-culdade ele transformar um ente político o crime -- em ser natural.
dev o problema permane-é quem pratica um ilícito penal, somente sabendo-
30
se o que é crime seria possível reconhecer em alguém a qualidade de
nesses termos, voltaríamos à estaca zero. verdadeiro modelo de
entretecido dc conteúdo
o beco sem saída em encalhada a se as coisas colocadas ele franca:
O que é em sentido isto é, não-normativo ou - Não sabemos. - E quem é crimi - É quem pratica crime.
as não SabClTlU'-) u que é crime. o recemhecimento
romper a das barreiras que, ele uutro qualquer saída para a aventura do novo ramo do
conhecimento. A ideologia, fazendo as vezes de Sócrates nos diálogos de Platão, guiou os cientistas à tranqüilidade do porto em que desejavam atracar, usando uma lógica aparentemente razoável:
Ideologia - Que é crime, cm sentido concreto? - Não sabemos. Por mostra-se impossível
tomá-lo como objeto de uma ciência natural. Ideologia - não é crime o ato praticado pelo criminoso?
- Sim, corresponde à verdade. criminoso não é real?
- De fato, não há como negá-lo: são homens e,
o criminoso pode servir de objeto a uma cia natural.
- Mas como encontraremos o criminoso, para exa-miná-lo cientificamente, se o que crime?
Tal desconhecimento não que se encontre o Já ficou assentado que
ao crime, não é verdade?
31
então prossigamos, meus Se eu lhes pedir que me mostrem um me CO!1-
-- A uma
ica.
se nós queremos encontrar o aonde
é lá que os criminosos estão recolhidos. Ideologia Como vêem, vocês já conheciam a resposta correta,
. üs vezes ocorrem no sistema Ideologia Não contesto tais possibilidades. Trata-se, porém, de
hipóteses raras e a ciência deve desprezar as exceções na sistemati
zação do seu saber. E aí os criminólogos, de Lobroso, Ferri, Garofalo até os mais
modernos e enciclopédicos autores, docemente convencidos por tal alaaravia que se alimenta tão apenas do senso comum, avançaram sobre as ~opulações prisionais, ou, na melhor das hipóteses, sobre os
/ indivíduos oficialmente designados como criminosos, para, em funda análise a que os submeteram, construírem sedutoras e brilhan-
tes teorias científico-criminológicas. Na medida em que a ciência, por meio da conspicuidade dos
abonou cientificamente o reconhecimento do o de cri-formal rotula como
32
/\ cirra a nu, defi!li í i vo, tI ma anteriormente r,~;gi ao
para se resguarda da análise,
positi vamente . Talvez um
". recebe-a com entusiasmo casa ü perfeição com a por ela
vl'rcla ~
ti a lei
cnCOI1-
em clcs-
ao lodo -por escondida no
pode ser mais ilustrativo
bas i 11 ~l le'()rJ' ,'I elc} C011tl','\10 S'l')C J' ;II', ( j . c., . coe as as pessoas são Iguais perante a lei; por
é algo mau em si, soas. más; daí, nada mais do que mall! festação típica das
concluir que o cnme é urna
ernpresta sua la ao asserto cm
os crinllnosos~? C/filIe' c crinli!l()5;oS:
os
CUl1l0 Cil:;klo
quc a maioria dos prc:;os única conclusão ~1
característico do enCi\['cerUIl1C!HO.
p;tr:l c:;tudo
o criminoso constrói-se pela
33
o normativo) operadas pelo atuar discrimina-criminal.
Muito pior a emenda que o soneto. Sem embargo a llloslTOll~SC fecunda, dando a
extremamente úteis para o político. Vejamos isso. O direito criminal enraizado na idéia do contrato
búsico desse de
to caberia uma única pena, todo estranhas as características
Beccaria amava tais
leis executadas ú cuJar exalamente os inconvenientes de uma
aI teria de
) 7 BECCARIA. de, nos deli/o" (' dus jJeI70S, Trac!. Paulo M, Oliveira. s. 1" Ec!. de Ouro, 1965, p. 35,
34
" ... o se mede pelo causado à e não sensibilidade do "18
Ao margem de d na leis:
"A mcira que leis fixar as penas ele cada delito e que () direito de fazer as
s não residir senão na do , qUt;;
toda a sociedade por um contrato social. 19
"Resulta, ai dos precedente-mente, que os juízes dos crimes não podem ter o direito de
as leis penais, a razão mesma de que não são
SL~ () for um raciocínio a mais, ou se o fizer por conta própria, tudo se torna incerto e obscuro. "21
"Quando as leis forem fixas e literais, quando só confiarem ao magistrado a missão de examinar os atos dos cidadãos, para decidir se tais atos são conformes ou contrários à lei escri ta ... ,,22
Dentro de um regime natureza, a diversificação da aplica-: ção da justiça em função do status do criminoso acarretava embáraços, problemas, o risco de evidenciar de forma ostensiva que as eventuais inequanimidades praticadas resultavam aluar discriminatório do aparelho repressor.
Obviamente, os donos do poder jamais tiveram a inten-ção de se ver feridos por suas armas. Afina] de contas:
i8. Id., p. 37. 19. Id .. p. 20. Id., p. 39.
1 Id., p. 40 22. Id., p. 140
selo os critnil1osos? Critne e crinúnosos: entes
"Um sistema penal deve ser mento para r diferencialmente
como um Ínstruidades, não para
a todas. "23
, seri conciliar o discurso fi iluminismo com os fins pragmáticos a serem extraídos da
, sem colocar em demasiada evidência sua interessa-damentc di
Subordinada a lei a um lS1110 inelástico no que concerne ao tratamento Li todas as pessoas, o atuar
a deixaria a descoberto diante dos olhos do Como solucionar o impasse? Aí troou a voz da ciência. Como vimos, em virtude da inconsistência de sua
para
da
va
o quadro de dificuldades nesta existente, maleabilizando a amarração das sanções a cada ação proibida.
Transpirando autoridade, posto que ornada do título subli-me de ciência, a criminol sentiu-se suficientemente forte para invadir o campo do direito penal.
Houve resistência por parte dos juristas (Escola Clássica). uma vez que as soluções propugnadas pelos invasores (Escola Positivista) pareciam incompatíveis com os pressupostos onde partiam
. os princípios do direito penal do social. encontrando uma de compromisso através da qual se as duas
melhor seria conseguem conviver enquanto
ser mais absurdo que da reserva com o da
23. FOUCAULT, Michcl. op. cit. p. 82.
to, há evidentes e de
36
D~lS penas retrihutivas com CU]]] elcrnel1(os !iornl,\tivos na
l1l',mo III cc éll1 i ÍSla ~- i'undamc!1to tlV1Stc\ com u li
cIsmo O caSLllllcnt" foi n~:di/~HJo :. 111:1S vIngou
porque alUui1cnt~~ CUl1clonal
i\ cnmmoso ares de sabichona recebc pronto e ver à parceira, prestigiando-lhe os padrôes de atuação.
Dê]
Do dctcnni]a
, apLsar
'-~S( Lido o dos
Ou, em lermos : a justiça condena os membros das pobres da população e os envia para a penitenciária; a crimi-
nologia vai aos pesquisa-lhes a e cumunica à a mais relevante característica do
abonada sua eSl1lera~se em sekcionar os para o
encarceramento; eom a de ondas de indivíduos miseráveis ~IS
os CrI ali eneastel as mãos ele con-tentamento e sentenciam: confirmado, cada vez mais crime é ( co : o repressor, ciência
bem meu árduo mister~ atesta que estou Na rneclida construindo o estereótipo do delin-
através dessa de uma ciência com a j
24. FOUCAULT, Michcl. ClllÍemo\' do PUC. Op. cir., p. ('x.
37
cada vez menos se dj da pClld 0'111
lêlr CU]1l ()
coutra /WS{[S que
na ln a a uma norma ]c
ZÜ() suficiente p~l!·~l o mediel:ls repre mlivíduos a
"Tocb a do século XIX passa a ser 111 controle, rü10 Umto sobre se. o que fizeram os mdivídllOS cstú cm c"onf\)rmidadc ou não com a lei, mas ao nível do que fazer. do que ~;lO capazes de Llzcr, do que estão a fazer, do que estJO na iminência de fazer."25
erradicar o mal do mundo. Criminosos, porém, para ela são as pessoas a quem a ordem ofi-
ciaI semelhante rótulo, como vimos. Sem inebriados vapores elas retortas fumegantes, os criminólogos desapercebem-se de tão sin a verdade e se aventuram nas mais
tas e variadas teorias a respeito da do delito. A matéria oportuniza uma vastidão de campo capaz de
de a sorte, fantasias desen-obras anado com o
resu mo das di versifiea-causas do crime - o ponto de das correntes que riscam a arena da crimí-
que, em realid todas tomam por base um mesmÍsSll110 o conceito de de que se não tem nada de "natural", ou de , ou de "científi-co", urna vez que estritamente, ao do aparelho repressor na oficiaL
25. Id, p. 67.
38 '
Em meia dúzia de palavras é possível traçar a resenha das tais correntes - embora os pobres universitários percam no mínimo um semestre inteiro para conseguir uma pequena
a dos seus quiméricos Os da
deais a ser seguidas resultar () delito de de certos indivíduos
VIve bido o resultado
eclética). Para os
LISO elo (não há segundas intenções no
de um
Daí ;\ criminoso nato". a dos
nossos dias. O epígono da escola variou um pouco a respeito da exata identificação do tal defeito, ficando mais conhecido, porém, por pretender que poderia ser diagnosticado através do encontro de certas características morfológicas, tais como testa estreita, zigomas salientes" orelhas em couve-flor e por aí afora. Na esteira de tal visão, surge, maIS tarde, a explicação de que o delito resultaria do funcionamento anormal das glândulas internas (endocrinologistas). Nos nossos aparece a teoria genética, pela qual a existência de um Y a mais na composição cromossomas impele o portador, infal mente, Ú
perpetração de A propósito, não resisto a transcrever alguns trechos de que saudou entre nós o surgimento de teoria:
Lombroso, o autor livro O Delinquente, acaba de ver comprovada sua tese de que o crime é, na maioria
sâo os crillú!losos? Crillle e criminosos: enles
anos depois da teoria lombrosiana, a vou, no laboratório, que existenl pessoas
à de todos os crirnes.
o Leonidio Hibeíro diz que deveria haver uma revolu-mundial em ao invés de se
de a um trabalho de associais:
dos Ylo de elementos
como se faz com os e cancerosos -cou -- a sociedade deveria dedicar-se ao estudo da personalidade dos anormais, a fim de apurar as razões que os levaram à prática
anti-sociais, o facilitaria a defesa dos seus 8ltos interesses e, ao mesmo tratan-
no lO da
l' , U1Z,
irresponsável (no sentido da conscientização e dos efeitos) entre pessoas sãs, contribuindo para o aumento da criminalidade em todo o Universo.
Pois a verdade é que o crime (reiterado) é produto da anomalia genética que condiciona malformações físicas, e todas as taras que deságuam na infração e no delito."26
Para os adeptos de , fundador da sociologia criminal, o /' mundo ao homem, no qual ele se cria_e v o ambiente que o cerca, os fatores em que imerso, seriam as condições determinantes no sentido de arrastar alguém, íncoercivelmente, à prática de ilícitos. As posteriores a esse pomo de vista atingiram construções extraordinariamente sofisticadas,
das quais, talvez porque pejadas de altas de sabor hermético, ainda apaixonam os estudiosos hodiernos - tais
diferencial, da anomia etc. Encampa a o forma de
26, O JORNAL, Rio de Janeiro, I ou!. 1969.
40
alo nascerem certas pessoas com
nll1l n veremos adiante, ela está infensa ii
contrúrio lidS suas duas f\lrInadolas, de glândulas
u-
A impugnação a elas também se nu campo da natural, embora de forma um pouco diferente da já citada, Ao encontrar nas
uma popul caracterizada pela pobreza, pela ignorância, por se originar de famílias desorganiz.adas, por pertencer a minorias étnicas, os criminais concluíram solenemente: ii
za, a ignorância, o ser originário de famílias degradadas, o pertencer a mi eis as causas do crime. que a verificação de campo três por cento o número relativo de del
Para que determinantes,
Mais cómoda revela-se a ecléticos. conducentes ü eclosão das condutas s veí.rias causas de cada natureza, ainda estas se mostram falhas na hora da com-
ê sempre para uma tábua de sa]va-aumentar o número de fatores eaus,lis com ante-
riormente não indicadas. Tal ani ser ampliado e o foi -- até tornar inviável a contraprova . Atentemos para ,\ palavra de um dos mais autores da corrente:
,<,'tlO os crimiu()S(Js? Crin7C e crinlfilOSOS: entes 41
";\ i que são reconhecidos fenômeno illlli
série; de um crime
llÚO seriam criminos,ls
car nada na de ordem ca" se consegue retirar dela. Se as causas são tantas c tão diversifica
termina-se retornando ii estaca zero, por concluir ser o crime o do imponderável.
Creio que se me permitirá repetir, a essa altura, o antes afirmado: o fundamento da criminologia amesquinha-se a uma arenga empolada, que cm torno de um núcleo cuja essên-
de mero senso comum. cri
exatamente isso, ao dizer: sem o
da o mento
riência faz o crim
de acordo com a sabedoria se condensou cm dois
lcado do meio para o c "Tal pai, tal filho" (Der
que na base da expc"A ocasião
desencadeamento do II veit vom
27. SEFUCJ, Ernst. Mallllo! di' Armcnio Amado, 1957. v, I, p, 314.
Trad, Guilherme de Oliveira. Coimbra,
42
da hereditariedade
a em crll1ll causa pasmo que
do delito, tenha
du crime, se vamos buscá-las a
o descnvolvimen-
comum <l
tão s 111-
aSSlm ordem ofici do criminoSll
dificuldade cm ser idemificaclas: J. "a - uma conclusão que pare-
28.
uu absurdn,,:!iJ do J1lccanÍs-
u das normas s, com-
de conhecimento da realidade e
cimento. a mêUS
tivas do mundo até o 'senso comum , ~lS vezes chanlado
Dennis. Tavístod: Pub .. 1968, p.
igioso, etc. Como modo de dornina
lhe
a per-
tariaassim,
lhe criminul. London.
.VelO os cri/Hlnos'os? Crin1e e crinzillOSOS: ente!';
todo conhecimento é em alguma medida uma forma de submetimento."30
o grande papel ela ideologia é convencer os de que, dominadores a que os submetem, devem
dócil e disciplinadamente:
"Por esse pra comer, por esse chão para dormir A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir Por me deixar respirar, por me deixar Deus lhe pague ...
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir a qlle a
:\0. CUNHA, Rosa Maria Cardoso da. O carúter retórico Porto Alegre, Síntese, 1979, p. 20.
que cair
31. CI-HCO BUARQUE DE HOLANDA. Deus lhe pague.
da
lU
e nel77 () será
acrescento r: niio deve sê· f(} e, sobrc[uc!o, n(/o del'c pensar que ~, "
A maioria das pessoas acredita piamente, sem dúvidas ou questionamento, em certas "crenç~as jurídicas", inculcadas de maneIra pela ideologia, tais como: "1. Que existe um legisla-dor racional nelo um sistema jurídico coerente, económico,
etc, 2, Que o ordenamento não contradições e redundâncias e, o direito penal não exibe lacunas, 3, Que a ordem justa c os
4. Que o julgador é, axiologicamente, neutro enquanto dec não há o na apl da
I, LE DESIR DE PUNIR.. Pans, p, II.
45
46
Justiça. 5. Que o julgador, no direito penal, busca a verdade real e não o elo ponto de vista valorativo."2
Verdadeiros arrolados, até que se
assertivas, por total
acabado da indústria
judiciário, para estu-
porém, como o demonstra a com a realidade.
resulta da ele dois momentos: a produção das leis (legisladores), mais sua
aparelho servindo de matéria-prima para a manufatura os do povo.
Busquemos analisar cada uma das fases referidas para, por fim, verificarmos' que valor pode ser atribuído à etiqueta de "criminoso",
apl a pessoas ordem
- "Deixe-me prossegui!; disse Colin. Você neIo se arruma mais aos domingos e não se barbeia mais todas as manhãs.
- Isso não é wn crime, disse Nicolas. - Isso é um crime, disse Colin. "
Boris Vian 3
Ingenuamente, tendem os cidadãos a,encarar as leis como mandamentos baixados por um poder transcendente, que as decreta com superior neutralidade e imparcialidade, verdadeiras revelações que um ente sagrado se digna a propiciar ao povo. Algo aureolado de um halo dívino, provindo de origens mágicas ou astrais, ditado por entidades supraterrenas, de natureza misteriosa. "A lei é a lei", diz-se religiosamente, e estamos conversados.
Ora, a ordem jurídica resulta da atividade humana, elaborada que é por um legislador, isto é, por um ou mais indivíduos de carne e
2. Rosa Maria Cardoso da. O carâter do da If'!'nllnn/lp
Síntese, 1979, p. 1 18. DES JOURS, Paris, Union Gen. Editions, 1980, p. 130.
.';;clO os crinúnosos( C'riJne e cril1úno:u)s: ente.1)
partilha de todas as que e ama, ça, tronco e vezes ao dia.
a milit::lr, de estatuir as normas
comuns aos seus semelhantes, que possui cabe-
pura idealização ético-
dita as leis a classe
do sta/ils CfUO
Tais considerações aplicam-se, às normas definidoras de crimes Penal e leis as orientadoras da pela qual se declarará alguém de Processo leis Aqui, mais do que em outro ramo do
de passar por cima dessa realidade si e criminoso não são entidades
ser vistas como /vontade cio slaclor
a crença na embuchá-Ios com um
o resultado da a tarefa de consolidar em
dos grupos idealística que envolve
devemos
Na medida em que se obscurece a crueza de tais enearticul voando-a por meio de uma retórica
obter a adesão camadas finalidade de manter ditos
a regras proem estado
usá-la por
i.
48
de de no sentido de eoartar tentativas de
A lei, sem dúvida de
no Penal relativo
aos ü cri-
imn resllmir a um
bens ou direitos de uma pessoa para outra, sem o mento da"4
mais cantil, uma vez que vivem, na maioria
E o que é um negócio, sobretudo um bom negócio, mais que tudo um excelente negócio?
. ,Po~ieria u:na sociedade negocista sancionar com castigo os negó~IOS? ~na, entao, o da classe negocista punir os negócios, lmpedlfldo, des.s~rte, que tal classe praticasse os fatos que se constituem em sua atlvldade precípua?
vez de adotar aquele modelo, preferiu a lei estilhacá-Io em . figuras delituosas, pois, na medida em que rompe a'vincula-
dl:'et,a da regra ética com a norma jurídica, oportunidade para subtraIr a a I . , -' c s que, se etIvamente, nao lhe ll1teressa per-turbar.
A oratória jurídico-liberal, como seria de esperar, enxerga as coisas do m~do muito e dispõe de munição, em seu infi71ito arsenal retÓrIco, para justificar plenamente a solução codificada: somente a precisa do comportamento proibido satisfaz à garantia da reserva legal ("não há crime sem lei anterior que o defina").
4. CHAPMAN, Denllis. anel lhe lhe CrÍll1 inai. London. Tavistock Pub., 1968, p. 72.
49.
Eu mesmo
vago, inconcusso ser
de um preceito a irlcertcza dos sobre a conduta que lhes é defesa, ao mesmo em que fica
I
do , se infiltra em os
centes ou não, quando subjugados às ditaduras e regimes assemelhados. A sufocação, o ambiente trevoso, o fazer ou não fazer transmudado em tortura permanente, assustadora e paralisante, o dia-a-dia repassado daquele terror mórbido que Kafka tão bem sabe transmitir em O processo."s
Ufa! Por tudo a o Código preferido, à encampação de um conceito abrangente de lesão ao património, parti-lo num rol de definições, cada qual delimitando com rigor dado. comportamento específico (tipos penai tais como furto, estelionato, apropriação indébita, roubo, etc. Só minoso o indivíduo que observar no mundo fálico uma conduta precisamente adequada ao modelo abstrato prefixado em um daqueles da lei. Ocorrendo descoincidência cm algum ponto, o delito,
por ausência de tipicidade. Por con ia, se alguém para si um bem ou
direito do património de outrem, sem completa ciência ou pleno
REVISTA DE DIREITO DA em bronco e relroof;vidade
DO ESTADO. Lei Rio de Janeiro, 19:236, 1968.
50
consentimento do último, mas, apesar disso, sua conduta não se exatamente das condutas tas na lei,
de delito, cm face da
cubre as que contrariam a norma moral apresentada como razão
de ser da dos contra o património: em easo vo, observemos se a ;Írea o por mero acaso,
Toda vez o se dá pelo aos objetos em si ou facilmente se encontrará cia entre o do ativo e algum dos na lei penal. A tirada no roubo, a apropriação do dinheiro da firma pelo empregado-cobradór, e assim por diante, docilmente se adequa-1710 aos modelos 111 dos infra
conlra os símse modifica
kbdes em qualquer dos
registrados no Código e, ausente a famosa tipicidade, torna-se inviável qualificar a ação como crime. Isso é que permite permanecerem fora da área penal hipóteses como as de jogadas de bolsa de valores; não-pagamento de empréstimos estatais obtidos mediante oferecimento de garantias ÍnexÍstentes ou de valor muito inferior àquele por que foram avaliadas; recebimento de subsídios governamentais em contradição com o fim a que se destinam; concorrências de cartas marcadas; jogos contábeis; transações fictícias entre firmas de um mesmo con-glomerado; triangulares; especulação através da de mercadorias; evasão de impostos; subida artificial de preços; esmagamento de empresas concorrentes, de sorte a obter o domínio do mercado e imposição de condições escorchantes; fraudes ao consumidor; anúncios falsos; enfim, toda a imensa gama de operações a permitir a de lucros e que caracterizam a retirada de bens e direitos dos outros (em , largas da população) con-tra a vontade deles e sem que tenham conhecimento de estarem sendo defraudados. Tais contudo, revelam a se amol-darem a dos
Sabendo que os membros das classes a lidar com as coisas em (objetos, dinheiro) e as pessoas das classes
StlO os crinzinoso,Ç? Crilll(~ e crinzinosos: entes 51
média e alta com seus símbolos (títulos, papéis), percebe-se com nÍtidez que espécie de ladrões mais provavelmente cairão na teia do apa-relho de criminal e qnais os que incólumes seus buracos.6
Penso valer a pena submeter à ise a in elo art. 17! do Código Penal - ionato - pois oferece tal delito excelente material
para etar o tema ora abordado. Reza o em causa:
para si ou para outrem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento."
Levando "lO da letra o comando a
comércio lima vez que cm todu erro
crc nüo visa a outra sn senão a daquele resultado, pelo entorpecimento da capacidade de percepção do.'ô ~Jlnidores. Talvez por isso os comentadores, em geral, costumam criticar a fórmula legal do estelionato, por a considerarem ampla em demasia: "fraude" seria expressão vaga, de limites imprecisos, capaz de abarcar LIma enorme variedade de atos, muitos dos quais, por certo, não estavam nas cogitações do legislador ao instituir o delito. Se o anúncio da televisão e, depois, o vendedor da loja me afirmam que dada mercadoria é tanto a melhor como a mais barata que existe
/' -na praça e por isso a compro, vindo mais tarde a constatar que nao era uma coisa nem outra, parece que fui "induzido em erro" "mediante artifício", ou fui vítima ele estelionato. Para a sociedade burguesa, como salta aos olhos, qualificar fato dessa natureza como crime representaria um insuportável despautério.
Aí, apela-se para a capacidade inventiva dos juristas, a fim de
dar um jeitinho na questão. , , Sem se fazerem de rogados, vêm eles e declaram: espera la, ha
fraudes e fraudes, umas puníveis com pena de reclusão, outras não. E prosseguem. há fraudes s e fraudes civis, somente o
(). Cf. CHAPMAN, Dennis, op. cit., passim.
52
rÓLulo de cnmlllOSOS Lll1~',H11-Se ~h
lllais de estabelece L
um tipo ele I:,) I
membros ebs d J1l n lHes, A III ioria, po
uinte : () problema llOS t rmo
de fUiílbmclltal coincidem o delito ii u outro s:to uma rebeldia cuntnl ii ordem jurídí
ambos num fato exterior ao a título de dolo ou culpa, /\ única
elo
li
men(o do forçada, restiflilio
nulidade do só deve recorrer ii pena da ordem j não se obter com
outros meios de isto é, com os meios próprios do direito civil (ou de outro ramo do direito que não o penal),""
Essa maneira de faz em
dC;nlicas nu sua em razão do tipo de
De pela jado princípio da mundo abstrato das
mente para classificá-Ias de criminosas ou não
que as da rompe-se o feste
não se resolve no
matéria tal idéia representa inquestionável absurdo: o definido,;, crime em abstrato é o que é, uma com caracteres
inteiramente na norma
7, HUNGRIA, Nél,üil, Comelllúrios (lO
v. 2, p, ln, S. ld., ib,
Peno!. Rio de Janeiro, Forense. I ')'i
I
S("lO (JS ( rlu:lu()sos? Crime t! criulino:úJ,v: {'nies 53
sem qu uer desses caracteres ou com o acréscimo ele nutros que nela inexi,;tam. vl:nto, do mundo cuncreto (l !ccem ,\s cin:un"U'ínc' confrontacl() com casu livo. dir-se·á: ()
mciro reqm ahstraLO JÜO é
elemento do que o tipo do cste] ÍonaLo
ele seus cuntornos. Onde
sarcir o dano na área civil. Qual a "rebeldia ú ordem jurídica"
alarme social? Ou, dito de outro modo, qual
da
rato relevante para o sistema formal-institucional, numa estratificada em classes verticalmente hierarqu ? dos membros das camadas superiores podem merecer podem vezes até irritar (individual
porque não põem cm risco o Sf{{IllS quo c, carecem da c
ponto de fazer jus aos go (visão de gru ,Incla mais i llferiores da sociedade
de a
de esta sim, causana e
ai aos estratos
Uma atitu-em face
das conseqüências indesejadas que daí decorreriam, desde a quebra da solidmiedade do grupo até a demonstração de que as pessoas gradas não são melhores, nem mais nem que ~\S das classes inferiores. Isso ocasionaria um ll~\ distância institucional que separa as classes e poderia elar lugar a lllovimentos de insubordinação, E, nos regimes de poder, "a,c~rrup-
dos dominadores é muito menos dramática que a insurrelçao dos'
54
domínados".9 Ademais, a ideologia convence ser o crime coisa típica das pessoas Um indivíduo rico, pois, a ser considerado por seus pares como imoral, imerecedor de con-
do de penúria.
duro homem nunca, contudo, eapaz de merecer as atrozes
do quem dis
quem vive em estapasso, pois, aparece com mais clareza, ainda, a
que a existência de delito (fraude penal) ou de não do estelionaUirio em termos
no nua, te
m autor de estel apanhado, não dispõe de patrimônio para indenizar o prejuízo e, por outro lado, seu golpe contra uma empresa alarma e perturba a ordem instituída. Já o dono de frigorífico que oculta a mercadoria cm manobra altista, se chega a ser objeto de alguma sanção, o será em área extrapenal: pode suportar os ónus da multa fiscal ("O Estado só deve recorrer à pena quando a conservação da ordem jurídica não se possa o~t~r com outros meios de reClção, isto é, os meios próprios do direito clv:1 ~~ de ou.tro ramo do direito que não o penal"); e o "alarma SOCIal ,quer dJzcr, o alarma da classe superior, foi mínimo, uma vez q:le a ação atingiu apenas os segmentos da população para quem faz dIferença pagar mais 2 ou 3 reais por um quilo de carne.
Equivocado, por tudo isso, está o dito popular ao dizer: quem rouba pouco é ladrão, quem rouba muito é financista. O certo seria, se quem rouba .- pouco ou muito - se situa na classe baixa, é ladrão: sc pertence à classe alta, é financista. .
Porque, afinal de contas, não são os comportamentos (delitos) que contam, uma vez que o importante, de fato, para o eht
9. SYKES, Gresham M. The 1972, p. 53.
o( New Princcton Ul1. Prcss.
sâo o.v criminosus;; Crinle crinlfllOS(}S: ente:'; 55
justi criminal, reside na posição social do autor. Como sugere . " .c s nao Austin Turk, o status elo é jJCSSO'l -
mas pelo que são. Acerca do cabe
'rar uma manobra elo atuantes no campo
criminólogos, e cidadãos comuns.
~cofari'nho branco" rUJln, eis que
para desrnasca~ U,-",:>,"J"" de bons pro
angelicalmente -stas,
"crimes de da lelra da
vvhite collar crill1es; -- em bom a versão
deveria ser "crimes de e Basicamente, estão assim conceituados:
tal como defini~
livro de Sutherland haja ca central deste tipo de fato é seu caráter classista. Por isso, Heller (I967) o denomina Kavalliers-delict ou delito de cavalheiros. Este caráter parece ser o elemento que contribui para dar a esses estudos, depois denominados das mais variadas formas (delitos económicos, delitos ocupacionais, delitos de enriqueci~ mento, deI inqüência de negócios), sua verdadeira importância em criminologia ... "11
Empolgados pela perspectiva de colher nas malhas da justiça os ';grandes" criminosos, revertendo dessa maneira o quadro cansativamente repetido de só eonternplar os cardumes de sardinhas que aparecem como resultado da aparatosa manipulação do arrastão oficial, os penalistas se excitam. Escrevem, pesquisam, estudam e até pretendem agir, com vistas a tal propósito. o de certa forma uma penitência reequilibradora da consciência, que encontram
10. Cito mcmorw. II. CASTRO, LoIa Jc. para lInJa
sobre eri-
I1lCS colarinho branco na América Latina. RCl'ista
Janeiro, 25:89, 1979.
ícia, ele entrada da ce de acesso fácil ~l
quecritninrtl c0l1tr~1
lada. ri
de
em tais áreas, elimina-se a forma mais qual a autorida-de toma da de crimes, dando início a seu para o mente
esquema de da a a intestinos através da sol porque crimes não são ali
tendem a
os membros da classe alta rarissima-quando constatam ter por
Há, desenvolvido e funcionaL todo um ser ~lcio!ladas dentro da e:-,fera i ntern~l
de resolver
uma vez que as roturas üs regras vistas como manobras inerentes inevilá-
12. M!AILLE, :'\lichci. rml",',I" critic(/ {/(J Direito. Coimbra, s. cd .. 1079.
57
veis de um todos os COns()c'iOs
clube dus j<1
que do
popu
da escada cnc~l1ni à ltu d,] ordem
outros lindo que: \l me mo
para () escuro da cifra negra. se ocorrer de o caso
i l;di vi cI cul í stico
.I11 1<..lil::.\l11
lL. l, . c
membros riencia de muitos anos
11n1
enxergar os criminais vanta-
da ideologia preponderante. Perigo real de punição para os infratores de colarinho e
quase não há. De outra
, nas salas ele aula, nos
néW; coturno, colhe () sistema
urn !1adora. Por tal via, instala-se nos de di midac\cs
no amparo à sua ati súditos a crença de que a
distribu concreta de vanta-
sas, tudo ficará elo dos Com isso, desvia-se
de defeitos meramente do ma, evitalldo que constate a realidade de ser intrínseca ús
estruturas a i As deI
obedecem :1 esse
que o vitima. de velhas, contra a
58
Sistema "O regime em que vocês vivern é o melhor que jii houve ou que em qualquer istiu."
POl.'(} -- '"l\1as um grupo de pessoas tem carecemos até do que comer."
Sistcnw -- porque há certos elementos bando o do SíilCO
Povo - "Mas ... " Sisienw "Calma, 1 Vamos fazer uma peza,
vamos esmagar a Povo "Iv1as ... "
os
Sistema "O que precisamos é de mais combater os grandões necessitamos de mais liberdade de ação. Olha aí, vamos cortar um
força, de maior dessas boba-
de (odas as
bacharelescas, Em lhas do melhor
'() di/cm o me que." Sistema - "Quem diz isso são os subversivos! Mas não tem
nada, vamos aproveitar os novos poderes de que nos estamos munindo para, logo de saída, tirar de circulação os detratores do regime - que é o melhor que já houve ou que pode em qualquer tempo existir."
Naturalmente, há sempre a oportunidade de arranjar uns bodes expiatórios para assegurar certa credibilidade intenções manifestadas. Agarram-se alguns i uos provenientes das camadas média ou baixa que, comportando-se de maneira igualou assemelhada aos
senhores das altas lograram ajuntar alguma riqueza de monta e se em exibição no pelouri
pública, Ou, o que é muito mais freqUente, descobrem-se que dispõem
de um ou dois carros, e de 10 ou mil de
as condi monta uma fortuna
através do de membros da classe
para descarnos da virtu
de entender a
59
Quantos honestos policiais, competentes promotores, magistrados idealistas se prestam a funcionar como instrumentos
convencidos de estar ndo como do não que nunca, nunca, nunca, concretamente,
obter sucesso, nO ele um
insetos? Ah, a miopia da classe
(S[ ou hOlfver ln!!
aos homens de
Manuel Puig l3
Como resultado ela descoberta da cifra negra, surgiu a indagação: a repartição dos delitos entre o claro e o escuro se dá aleatoriamente
'01I obedece a uma tendência sistemática?
Pal"l 'llnuns a divisão ocorreria meramente em função da c é ~ " 1+ f , O;;tros, porém, não sendo "crentes da , ' eles,cOI: l.am
que a em causa estar a certos pnnclp,JOs~
C I apontaJ os
omprovac a a v de diferenciação, em
defeituosa tara da balança criminal costuma
PUIG, TvlanucL o do mulher urm:I/(/, cd Trad. Rio
J ancíro. 19RO. 14. CHAPlv1AN. Dennis, 017. dr" p, <)9,
60
Levando Clll L'cm/a que a
no 1
maior do
i1l0Il1el1l0s distÍnl\)s
citos did:tll conLlld\l, que: I
anteriormente, (')
(c lo (k: ingresso
du Ltto (dê a indici IIl11 delito
) elo cri-
nerabilidade do a ser submetido a violências e arbitra-riedades.
Na fase policial, os elementos Cla: na judicial, o fator sub (/ torna-se an
e d c os h c c
como isso acontecc,
lUaior
Ue duas forma Ullla concreta vio] ü iei pcnal ú da ícia ciência, ele resto, decisiva em termos de fazer fUI1-
Clonar a UIIW da repressão: 1. scus vêem o delito; ou
S({O oS crinúnoslJs? ('rinlC (;' crÚniJ1osus.' entes
) s:lo
\10.
c 1 ,dcrttldos por aI que 1 tLlnsm i
ln que ucon(l i1~11l1
maior facilidade de ll:lllPO,
des
lei maiores com rapidez ao a aos logradouros
extremamente dev8ssáveis dados tipos de
61
gam populares, cuja franquia se permite a
quase () mundo e onde a te de eOllt~\r com a
fave-COl1-
I
lllde l:i, como
d~l i n
62
da banda rica da
zonas urbanizadas, os trabalham apenas
ÁS classes média c alta tendem a paSS<lf a maÍor do em locttis víduos
elidas
o
vada~ . jogam, comem nas próprias resldcncJas ou nas casas uns dos outros ou nas vivendas de campo ou nos cl ou cm restnurantes e casas noturnas ele etc.: vem-se manccern
do !llOrrU, di / !lOS C praças, andam a pe ou usam transportes coletivos, freqücntam escolas públ icas, trabalham pelas ruas ou em massa (como na fábrica), lidam direlamente com o público, reúnem-se nas esquinas.
" Comprecnde-s~, por tais circunstâncias, haver muito mais proba-bIlIdades de serem os delitos dos miseráveis "vistos" pela polícia do que aqueles perpetrados pela de posição social mais elevada.
Como conseqüência, idênticos comportamentos, dependendo da classe a c!ue pertencer o sujeito, mostrarão varia~:ões quanto a gerar o reconheclmento de ser
Por exemplo: um jovem, meio bêbado, outro. causando-lhe lesões eorporaí.s. o j' t . a o se concretlza na rua ou no boteco, quer porque se presente, quer porque, estando próxima, foi atraída pelo alarido, a polícia pode comparecer ao local logo cm ida. Nesse caso, prende o agressor para conduzi-lo à e autuá-lo em "Viu" o crime e, para o claro. Se o mes-
contudo, acontece numa casa de de
se for para mocorra, ~t
que o autor receba (\
.\'60 os crinúno.\'os? Crime e crinlinosos: entes
Muito contribui para a discriminação em causa a imunidade ins-titucional os cidadãos ao rclato de
vá ficar rnais claro ao elo vale a pena aproveitar a mente, aqui.
referi-lo, ainda que resumida··
Por o crime como algo típico do pec::soal da arraia 111 os das camadas bem não conse-guem visualizar seus lá o que fizerem - como delin-
. Para enfrentar de atos elementos do próprio meio - inobstanle no como delitos - mantêm todo um mecanismo de defesa que se realiza e
dentro de suas estritas de sorte a poder dispensar da
:.l ordc o reI ismo da su
sobretudo amiu(Jada, de existirem nos estra-tos sociais de cima poria em xeque a visão maniqueísta ela ideologia que se deseja esposada, no que esta sustenta quanto a ser a sociedade formada de bons varões (os vencedores, os ricos) e homens maus (a ralé, a gentalha). Valendo-se de uma justiça privada, realizada no seu próprio âmbito, logram os grupos qualificados manter razoável disciplina, independenternente de recurso aos organismos oficiais. Como decorr§j1cia, eventuais trapaças praticadas nas empresas são resolvi-das mediante a inclenização do dano e a demissão simples anota-
estigmatízantes) do autor, se é boa social. Ao aluno que agride o companheiro, machucando-o, aplica-se uma suspensão ou se pede aos responsáveis que () transfiram para outra escola, Se se trata de estabelecimento particular: O rapaz que estupra ou tenta estuprar a amigui as discussões e con das famílias recebe a de para Europa ou Estados Unidos, onde terá de o tempo suficiente se purificar. O clube grã-fino aplicará uma até a em caso de
aos rapazes que arrombaram de onde furtaram pares de certamente inadmissível para resolver o caso do que
de uma mulher no meio da rua, embora em ambas as hipóteses,
64
IVO, il cl1l1fí uraclo delito: 1'11 (l
de cunho \adu
pela rl1 casos grav~s, o ChC!Ill~UllCl1t()
arredura da com mil!":' cClnstilJ1ci e eficiência.
nos de Ul1!.iII11Cnto que param os indivíduos para documentos c submetê-los ~l revistas s eias que constituem rica fonte de ai elas estatísticas relal i
do JÍutor ao Construido pela
o primeiro básico da imagem do criminoso que represensi mcsma como já mos, di! a seu baix~1'status social. Pedindo a uma pessoa que descre-
ta para
de um deli teremos, em da respos-la, o retrato preciso de um da classe social in , de tal sorte se tende a estabelecer i n tercftmbio en Ire e crime ;\ teoria outro mérito nã() teve senão o de dar cunho científico a esse sentimento do senso comum. AIos sinais mor-
do "criminoso nato", descritos o pai ela crimi liL
casavam-se harmoniosamente com referentes aos párias da sociedade italiana da Ao que o criminoso é, caractc-
lermos da noso.
o l'nvo]venc!o
abre-se facilmente a idade de 0\
p,lra dizer: o é, i eamente, cri mi
irncnto de uma quantidade muito maior de deli!(" miserável do que remediados e ricos COI1'\
'Os 65
la neeessúri criJl)(;, de que uidall10s
vem
scnl ido vídu con ídcr:ldus como rnillS prupensos ,1 cksrc A lll, ao p:cr,lrc ou abcrdarl:iJ1 11 nos QUlI1S, us policiais ()Ilar~() acordo com :l idéi,l suem a respeito quem criminosu. A maior Ciscali dados grupos do que r,:lati amvntc a uutros vai rmllWl' uma taxa divcrsa (::Illrc eles quanto ~i de infralOrcs que:; fic.:arão idos na cifra negra. As estatísticas ofici cm de:;corrênela, ()stentar~o um tímero elevado de criminosos oriundos das
lJ';iSSCS
do dia-a-dia, que todos conhecenl t,dvez aprovem, o não da análise muito
e clarificador a Importante
do ponto cm exame. ele rotina na da segurança
se denomina de "batida batizada com nomes arrastão" ,
. a -flor" , c a r n Li \' a 1" ,
arco-íris" ,
"opera~~ão adeus üs
por aí afora. diligência, a uma úrea dcnsamente Obturadas
os moradores de se retirar do foi pI com todos
a contar com a número de viaturas, um
to, sofisticado sistema de Isolado o 1.') invade os
no cerco as
local at6 o lér-
'1 j de serviço IS, COl!lO afirma .bmes T. a adola um esli o (e _ ' f . ·t j'()I'Ç"l de OClIllaçao nas nas zonas das cla,se, altas, enquanto \lIlCI0na como UIll, .e
:\rc'as hahil:td:ls genle de baixa renda (cito de 111ern"lria).
66
igindo documentos comprovadores de ocu lícita,
armas c t6x em aberto. sas cm fl sua 1
de mue", em das par,] uma gemo um
desde a
de bens de maior valor, apreendendo a mandado de
süo atochadas nos nele sempre cabe e
onde se submeterão a Ulnêl tria-ou dois labuta investi que
dos antecedentes dos deti através de con-aos registros policiais, até "hábeis" interrogatórios .- um verda
deiro pandemônio, com gritos lancinantes, berros tonitroantes, porra-das para todo () lado, ordens no espa\'o, uma arrnosl'enl absurdamente histéri assisti ii mais de
s:10 I nqlll'lcls c(\n! as quais nad:l
llledi
média número em tangidas até a cadeia, apenas 20 ou 30 alt remanescem. De
qualquer sorte, porém, tais batidas determinam como efeito a trazida para o claro de um certo número de crimes e criminosos até então na sombra da cifra negra: tráfico de entorpecentes, posse de armas, receptação, contrabando, furtos, roubos, falsificação, vadiagem, pessoas condenadas ou com prisão preventiva decretada etc. Quer dizer: a submissão de um grupamento humano a uma operação do tipo em pauta cria condições para estreitar a faixa escura de sua criminalidade oculta.
Ora, tais so sao e só se executam, contra as áreas de habitação das populações miseráveis, as favelas:
"O delinqUente é identificado pelo fato de ser favelado antes de sê-lo ato de que é acusado. Na favela habita boa
pobres dos centros urbanos e que de
slio os crinúl1osos? Crinze e crilninoso.\': enles
maioria os moradores das favelas nua são delinqi.ientes mas são tratados enquanto tais pela polícia e justiça."16
natural que os morros e favelas consi~
derados como redutos de
verdade, esses fatos em torno da [ra determinados grupos sociais, o que
consignifica a
de uma classe sobre a olltra."18
A ninguém ocorreria empregar o mesmo método de choque nas zonas residenciais das classes média e alta. Cercar e vasculhar todos
de um r;1o do ou da urbanizada do !'vléicr z déid tcÍral1lenlc inconcebível.
n:sultados li tais locais. Daria lugar ü descoberta ele i
criminal menor, igualou maior que a observada nas favelas? A imunidade institucional, assegurada em nome do direito à privacidade e das garantias individuais insculpidas na Constituição e na legislação ordinária guarda-chuva que não protege os segmentos mais humildes do povo impede que se possa estabelecer um cotejo esclarecedor.
2. O segundo traço fundamental para a composição do estereótipo do delinqüente fornece-o, ainda, a ideologia do contrato social. Arma-se o ilogismo de acordo com a seguinte racionalização: a sociedade é irrepreensivelmente justa; se h{l pessoas capazes-êie lhe desrespeitar as regras bL'ísicas as normas será reconhecer que tais pessoas são anormais, isto é, diferem essencia-il1lcnte dos demais componentes do grupo social; por serem entes anormais,
16. RAl\1ALHO. p. I
17. leL. p. 170. 18. ld .. p. 171.
constituem, em conjunto, uma cabendo admitir que seu
o verdadeiro substrato "desvio" e "desviante", tão ao da criminolo-
o mundo do Janeiro, Graal, I
68
1:\
de grupo tão
m Jl1 () S (1; Ó
elemento para ;\
os Cnmll1(lSOS
: l~, num '1 L
Os dois fatores são vistos cumo elementos de um mesmo circlll-
t alimenta o o serve de ,Feedback .0, I' realimenta () outro e a.,-;slm diante.
sempre que existir ú na
ser feita desde
iro marClll1l'
nal filcij Cieará. !l()
identi Por seu tumo, a
ç.a em reconhecer o r
como ce1'-
Como a da j se com o que o acusado pam atentar cuidaclosamente para () que ele é. F aí a figura típica de um membro da a social aliada iI
no boletim de antecedentes a decisiva no \crc-
dieto do caso.
agora, a outra por melO da (omar conhecimento de UIll crime não o
(\ provocar a dn infrator, Ullla vel: que
nesse sentido tende a desanimar a ida ados
cm q ue i tes de um prucesso
69
a
ra, a fonte de crimes ú formal reduz-se, quase que cXc!llsivumcn(c, ú vítima, testemunhas pessoas a clas li por
. Considerando que tuna eventual falta de do ksado a co]allo!',H' com dccl
quc a a doutrina llOmbeteiem a ck estarem limitados a mínimas hipóteses os casos em a vontade do lesado
'udicar. e muito menos 1 r, a alividade do Trata-se de pura que encontra mínima na
concreta. De a participação ativa do do quer em j pesa bastante quanto ii sorte do
E ai no diz a do evento ma silenciar, probabilidade
de o rato deixar de ter ing:resso no que o levaria à luz do reconhecimento oficizil. A pnwa disso encontramo-la em certas i ra-
o autor, os demais pes mas. tes-da bi do
llO
enormes cOllti
não os "viu", ii falta de um lesado que ao conhecimento da pol irão ocultar-se na f<tixa escura da
criminalidade. A alternativa aberta ús vítimas, testemunhas c correlatas,
entre referir ou omitir a notícia da i à autoridade, gera, para elas, a c1ade de "julgar" () delito e o deli Esposando a
,II'
ii 1
70
ideol a dominante, que a imagem que um "verdadeiro criminoso" influenciará
quem não criminoso". No lÍltimo caso, a tendênci
a em outra sede que não a A continuidade repetitiva desse modo de r faz nas
estatísticas oficiais uma predominância de acusados pertencentes às classes inferiores, o que realimenta a concepção ideológica relativa ao lil minoso Ull1to quallto tabelas e dos crim nól
beher nUnl:1 cas~1 lentam mas
pela seguranca da casa. Correspondendo os jovens à idéia que o dono do estabele~imento tem a respeito do que seja um delinqüente, provavelmente a polícia será chamada a intervir, pois se considera de toda a conveniência que sejam punidos ou, pelo menos, ganhem um registro oficial pelo delito praticado, a fim de sé coartar prossigam na única atividade que essa categoria especial de indivíduos pode observar: perpetrar crimes. Tal registro, num amanhã que se profetiza próximo e inevitável, ajudará que sejam reconhecidos como "criminososrnesmos" da classe baixa + vida sa manchada). Se, são brancos, estudam em bons
a famílias bem e o taberneiro o res-pelo restaurante do Club ou o proprietário da boate
da preferirá comunicar-se com os dos meninos travessos, para obter a do para que
se impõe, a deve da disciplina familiar, uma vez que, mais obviamente representaria rematado absurdo macular a vida de que não são "verda-deiramente crim , como tudo está a indicar, com uma vexatória. No dos dois últimos a iva em ouir;1
ia também não dará a a ausência de stm, vai assegurar a cada nova diabrura a certeza de scrClll
os crlJnillosos? CrillJe
"não verdadeiros criminosos" alta +
o comércio de
mais as destas do que as concretizadas por quem
aparenta pertencer às classes média e alta. E, naquele caso, agarrado o Se u um não-este--
da de c similares ~ ou fora do âmbito cruel de uma delegacia, uma vez que representaria rematada ausência de bom senso submeter à ação da delegacia uma eriaturà que, como entrando pelos olhos da cara, nelO é um
meliante. Mesmo na hipótese de reincidência, bastante comum, dispensar-se-á o apelo à polícia: "É a terceira ou quarta vez que pegamos essa moça surrupiando coisas; mas é claro que não é uma criminosa, é filha de um médico, estuda na PUC, a família é gente finíssima, cheia de grana, tá na cara que é um caso de doença -é que se diz mesmo? - ah, sim, cleptomania."
Certa indaguei ele um de dado válido com , entre os larápios que
apareciam na loja, os que seriam verdadeiramente dignos de ir para a e os não-criminosos, a merecerem ser da à A foi imediata: "Se a pessoa não furtar, é porque o caso é de c não de crime."
Via Dennis
os executivos senio!' de um núme-ro de comerciais I acerca da grupos (e casas
ítica relati à das ladras de do que cabe con-
72
cluir
c. que admite que inrimidt\da através dé\
entrevistadus abordam está
nWllto L'XC 1 USl :l1!ll'n-
que ii
forma. de
4. Tanto também os têm sua visão a pelas crenças
minaI intensamente permeada da Pressionados a aliviar a imensa caroa ele to
l1:Io só de sua repartição como do próprio Judiciário, são leva-dos a selecionar os casos que aparecem, de sorte a evitar que muitos deles prossigam no rumo de uma apuração completa e atinjam as varas com vistas a uma E o guia mais adequa-do para tal adivinhar, se consubs-tancia no exame da figura do indiciado: ou não ao estereó-tipo do meliante? ademais, que a final a tal to ao menos formalmente, ao membro da classe média hierarquia da estrutura da máquina repressora uma le 11 do herói grego: nem da dus
filtragem, de acentuada vista para o incremento da prática dos
, a ocupar na semelhélll-
que adota para emilir sua decis:lo constroell1-
fornecidos dominante. Entrc (\
19. CIIAPMAN, Dennis. Ii!). cit., p. 72.
(' crimil1usos: c//Íe,\ 73
t\) do crí\lUlo do morro dos acacos o do dl_~" possibil1"
11
Imelo CO!110 U
raUlda cum hoa \untade c escolho dois
ln~ltérj
l)uÍ.\ '()vens meio
carro esporte, tudo está a convencer
lida de mulheres
o aulom(Ívc! bem
os rapazes não elos". Daí, os patrulheiros, o der 111avratura do aulo de
o delegado hesitam em
dos e se solicita a
como uma vez que devolvam seus
Telefona-se para a casa s. Das duas ele
são. li bertados os
dos
e que duas outras, emocionadas c irritadas, recusam segtllr o
em pouco, ii icialos do estudante e a mãe do executivo. Pessoas hém compareço, na idade filhos emociona a todos há
finíssimas. Chamado JS , tam-
promessas de Mais uma o caso e dá-lo por encerrado. Os
estão mai" do que convencidos de lurmal do ,)S s, os tl'lltam vencer a resistência da mcnto definitivo: "A senhora não vê que é
74
esses moços queriam realmente roubar as bolsas? São umas ninharias os minha senhora. Foi tudo um porre mal tomado, nada
mais. Isso acontccer com qualquer um. Os pais estão prontos a indenizar a scnhora susto e aborrecimento. Vamos ter um pouco de hUl11aniJade' Com alguma conversa acabou-se a um acordo. As
com o conversando
presos arrancarem a capanga de um homem. Um preto, o outro sarará,
sem os dentes da Cheiravam a úlcool. recém-saídos do serviço militar. Levaram uns e pcscoções, enquan-to eram eonduzidos ao cartório, para a autuação na forma da lei. Eram evidentemente "verdadeiros crimi , o que ainda mais
to dos antecedentes: já tinha est<ídD inicrnado na Funah,,:m.
nha. s~rias dificuldades para Ir vaga
onde estacionar o carro no centro. Alguém lhe su procurar o guardador da garagem de dada repartição pública, pois ele poderia "quebrar o galho". Seguindo o alvitre, o Doutor A. contacta o guardador, aceita o preço solicitado, recebe um cartão de autorização onde constam dados que o beneficiário sabe serem falsos, e passa a usufruir da tranqUilidade de dispor de lugar certo para guardar o automóvel. Meses depois é intimado a comparecer ao distrito policial. A falcatrua do guardador fora descoberta. O Doutor A. e mais uma dúzia de pessoas de alta responsabilidade e inatacável gabarito moral e intelectual estavam envolvidos no easo, como usuários de documentos falsos. Convencido de que criminoso no episódio fora o guardador, não se constituindo mais do que em leviandade a conduta dos o delegado conduz o inquérito de tal maneira que, ao chegar a Juízo, o promotor, recebera pedidos de várias pessoas de suas move a penal contra o guardador, mas exclui da denúneia os demais indiciados. Na hipótese, inexistiu qualquer oferecimento de a quem que As autoridades tão-somente buscaram evitar a submissão de pessoas de bem - obvi mente não eram - ao vexame de se verem no foro criminal.
Sü() os crinúnosos? Crinu! e crinúl1osos: en/c,\'
Incapacidade do Agente Quanto a se Beneficiar da Corrupção ou da Prevaricação
75
No processo ele a que são submetidas as práticas cri-com o vo de livrar de os
centes às castas e destinar à punição formal aqueles oriundos da ralé, i emprego de variados filtros. De uma
esse cuidado assegura ma de erros -' nào se vá misturar um de por alguma falha, com o joio a ser do na lixeira penitenciária. De outra parte, como a c1ireção discriminatória realmente dcsejada deve ficar escondida atrás de uma cortina de ambigüidades, o emprego de variados e sucessivos dialisadores na administração da justiça permite a manutenção, formal, da crença na
e santa, cxata-
mente não a
con10 o faziam ~IS que antecederam na história. Como lembra James T. Carey: "As leis criminais revelam-se por si mesmas como instrumento de dominação. A legislação dirige-se abertamente contra as classes mais baixas."
Causaria enorme constrangimento editar um texto legal como o a seguir transcrito:
"Das pessoas ql1e são escusas de haver pena vil - para que saiba, quais devem ser relevados de haver pena de açoites, ou degredo com baraço e pregão, por razão de privilégios, ou linhagem, mandamos que não sejam executadas as tais penas em os Escudeiros dos Prelados, e dos Fidalgos, e de outras pessoas que costumam trazer Escudeiros a cavalo, ora o cavalo seja do Escudeiro, ora de seu Senhor, nem em moços de Estribeira nossos, ou da Rainha, Príncipe, Infantes, Duques, Mestres, Marqueses, Prelados, ou de qualquer do nosso Conselho, nem em pajens de Fidalgos, que por tais estiverem assentados em nossOS livros, nem em ou seus filhos, nem nos Procuradores das nem em e Pilotos de Navios da que andarem em navios nossos, ou de cem , ou daí para ainda não nossos nem dos amos, ou colaços dos nossos Desembargadores, ou de
76
de ou daí para nem nas pessoas que provarem, que costumam sempre ter cavalo de estada sua
c isto que ou fi lhos de os Mercadores que tratan::m com para címa."20
Naturalmente, a democracia do Estado dades de classe se di
mas várias
de chtí
aI uma.
enfocado neste itern oferece excelsas vantagens, mesmo que, por sua causa, a máquil1a da justi-ça criminal a permanente increpação de desonestidade e hipocri-sia. ao reverso do que
serve ele úl íl na
prestígio Dinheiro, importância, poder são os atributos que mais agudamente extremam os grupos superiores dos inferiores numa sociedade dividida. Autorizando a que tais predicados ajam com eficácia na tarefa de batear a ganga criminal, obter-se-á uma separação bastante perfeita entre o metal de valor e o reles cascalho. Sob esse priS111a, por conseguinte, o dado discriminatório em pauta se harmoniza com e complementa eficientemente o trabalho desenvolvido pelos outros anteriormente examinados.
Como a principal peneirada incumbe à polícia realizar, e como, para que o fator em causa funcione a contento, impõe-se do operador aptidão para se deixar comprar e/ou intimidar em larga escala, fica fácil compreender que, para o sistema, só interessa contar com uma polícia tanto venal quanto submissa ao jogo das pressões.
Assim, a pretensão de reformara polícia, purificá-la, aperfeiçoála, dignificá-la, transformá-la num órgão reta, honesto, equilibrado, traduz aspiração ingênua, desligada da realidade.
Somente sendo corrupta e prevaricadora, a polícia satisfará as expectativas nela depositadas pelo sistema.
20. ORDENAÇÕES FILIPINAS, Livro 5, título I capur.
do
c
77
o
União Soviética ou a Coréia
em que o Estado se mas os usa para favorecer
elementos e fica deles detém a hegemonia. O que, de resto, aguça
aperfeiçoa a capacidade selctiva do de segurança. A , em de ser considerada
se mostra,
lirar até em l1lai~; um inslrumento auxíl io na stotus C/IIO.
A podridão policial, apresenta-a como questão fruto dos defeitos e vícios dos indivíduos que, no momento, exercem a atividade repressora. E sustenta que basta sanear e aprimorar os funcionais para que o órgão comece a desempenhar suas atribuições de forma lirnpa, justa e correta - quando então todos viveremos no melhor dos mundos. Ciclicamente, promove campanhas de depuração nas hostes policiais, aplica mais recursos no setor, aprimora equipamentos garantindo que, logo, logo, a perfeição será atingida e aÍ...
Por meio da manobra diversionista, convence a população de que o problema da distribuição de uma justiça criminal profundamente viciada e deteriorada decorre de mero acidente, de má administra-
ou, ainda, porque de um povo que não presta fica inviável imaginar que se possa recrutar gente de bem para compor o corpo policial ("cada povo tem a polícia que mas que medidas enérgicas estão sendo levadas a cabo e, daqui a pouco, teremos um organismo puro, eficiente e equânime. Com isso, as pessoas deixam de questionar a validade do próprio sistema, esgotando suas as em brados de revolta contra a polícia que atuall71cntc existe.
2. t. KONDER, Leandro. Introdução Rio de Janeiro, Graal, 1979.
78
Enquanto se atenta para o que se pretende seja um caso de mau a que o
fundamentos do sistema. L~Ii11(:ntável é que pcssoas de bons
a trucidar as fOf11<ldas de aos altares da purifi
holocausto se concede como
embar-que costu
verdadeiros bodes de existir da
cm alterar a si Lá se vão escri-a pagar por um estado de coi-
sas continuará o mesmo, e dentro do mellte a atorcs, pois tal imprescindível para que descmpenhem seus papéis de acordo com o roteiro da pcça. Ademais, os corpos sacrificados pertcncem a membros das
fcrimcs, o li ue o Crl me até cicnti
do acusado implica último.
d
altamente favoráveis para o
Enfocado do ponto de vista formal, o fato não encontra explicação.
De acordo com a letra da lei, afora desimportantes, nenhum espaço está previsto para a atuação de causídico no inquérito. Por obedecer ao denominado "procedimento inquisitorial", a autoridade que o conduz age da maneira que melhor lhe aprouver na co/eta dos elementos de prová, descabendo vaza, em plano legal, para a intervenção da defesa nessa fase. O equilíbrio de ações entre as partes (princípio do contraditório) vigora quando o feito tem curso já em JUIZO. O delegado, na atividade preliminar, dirige seu trabalho como lhe parecer mais acertado, dispensado de fornecer explicações ou deferir requerimentos das partes e de seus patronos.
Inobstante tal circunstância, raro é o caso em que uma pessoa de médias posses para cima deixa de se fazer acompanhar de advogado na polícia.
Por reservado de para ser
o ser nido de acordo com as . impedir que o constituinte sofra e
os crinlillO,YO,S' ( CrinlC e crúJ1ino,yos: entes 79
arbitrariedades; manipular convenientemente os frutos de pedidos de pistolões e do fornecimento de a quem e
Examinemos a
remetemos o leitor i't 80.
Os policiais mente ar com o a fazê-lo direramente com a parte. Inspira conhece melhor as regras do . representa um de certa ou muita conduz a transação sem vacilações e riscos (coisa inevitável quando se trata com um , conhece as I i em que pode ser atendi-
de sorte a eL\s
di de si
estarem todos em coínina pena severa.
de
Quem funciona na área penal conhece sobejamente a importância da presença do advogado no inquérito. Da simples leitura dos autos, com um pouco de prática, distingue-se, sem possibilidade de erro, os casos em que o indiciado deixou de contar com ela.
Como, porém, oficialmente, inexiste um papel definido para o advogado na policial, que, por suposição, seguirá os mesmos rumos com ou sem a interveniência de causídico (a lei presume, também, o respeito da polícia aos direitos de todos os indiciados), a Assistência Judiciária, instituição encarregada de prover a dos réus , não prevê de advogado para assisti-los nas delegacias. Com vez, executa-se o jogo duplo da
da igualdade de todos (no plano se desequilibra a posição dos membros das
à dos indivíduos bem situados
Trata-se de mais uma está
o sistema está atingindo seus objetivos.
80
mais eslÍ-l11ulado ficará ()
indefeso estará o D30-nos notícias os
ia de os U acreditar que ()
E no nos,>o caso'?
sociaL
para a Rússia ou a China ficilmcnLL' comunistas são fornecidas por fontes desa-
A m~lioria avassaladora dos delitos elucidados o com base na confissão do autor. () da concentra-se
do indiciado ou O resto da atividade 1-
núcleo. elementos contra si mesmo, o trabalho subse-
demonstrar a veracidade sua por isso ou por a confissão inocorre.
to central cap~lz de fornecer um sentido coordenado ao 1I1VCS
l o tenderá a se , os adorando dirc-
81
ma rOl,) de que cio
de !'Clrma quase' absoluta, nbtcr :1 con
Ct~l S cm coagir.
lidade d,) O reslo e()nsuhsC1l1l:t~1 l11ero
a l11V1
delitos
Quanto aos dois itens, há uma direta deles com o nível social a que o indiciado e com económica. Tendo recursos, poderá contratar um bom qual não só saberá eficientemente para garantir a cliente como, também, por sua . rcceio aos ais ele virem a ser emprego da tortura. De outro lado, no círculo de conhecinlcntos dos familiares elo se tal se dá llum padrão de das em
que estiver sendo autor, à para mexer-se
contra a violência, uma vez que, de qu uer se reconhece formalmente como Trat,lI1-
de um elemento izado,
ciai que, dessa abusar de esclarecimento do se 1
dos métodos q II e cone! li zi ram ao sucessu ela i J1 vcs( i cm face da prova da cul pa e!o
82
embora raramente ou nunca se reconheça expressamente, todo o mundo concorda em que a única via que se mostra segura para
de um delito é a da que, por . Com
examinar um processo, um são minuciosa do detalhando
todos os elementos para autoridades não se sensibilizam 110 sentÍo motivo que levou o deI inqüente a se
auto-acusar? A não ser um que outra razão será 1 como válida para icar uma confissão intei-ramente comprometedora? Afora raríssimas exceções, as declarações auto-incriminadoras só ser concebidas como fruto de exercícío
caV:l
i vamcnl de q ue Li lou de tortura, encontramo-la os dias na maior parte dos processos criminais, que constituem massa de trabalho do dia-a-dia do foro: confissão pormenorizada na delegacia e negativa enfática no interrogatório em juízo, explicando o réu a discrepância pelo fato de haver sofrido sevícias na polícia. Na maioria das hipóteses, duvido que alguém tenha dúvidas a respeito da veracidade da . A preocupação, contu-
do promotor e do juiz desliga-se de tal circunstância para se CC)!1-
centrar na verificação de existir no processo dados comprobatórios de encerrarem as declarações um conteúdo de verdade.
Limitam-se a indagar: há contra o acusado somente a confissão, de outros elementos demonstrativos de que o nela
descrito é verossímil, ou casa-se com outros elementos de prova? Assim, por exemplo, se o delinqUente contou na polícia que fur-
tou isso ou aquilo e que vendeu coisas a fulano de ou as empenhou na Caixa Económica, e a realmente encontra e apreende os objetos no destino indicado, tem-se por seguro que a con-fissão só pode ser verdadeira, de outro
da res mediante o conteúdo de verdade do )
, limita-se o julgador a expressar seu COI1-
83
a absurda, mas que ocorre na
nio samentc parte de ll1(lgistrados
rem o llnico adeqmh para tais casos, no scntido de que: ° acusado é culpado, pois sua confissão está confirmada por t:ircunstâncias que lhe comprovam a veracidade; mas dita confissão evidentemente foi conseguida mediante mento da vontade
icinis que a arrancaram, \) cmprego da tortura
!l1
reitt:.rada c o cndusso dos tribunais. Illstituci\lllaIJzanclosc, funciona com maior eficiência. Às vezes, nem é necessário à polícia bater: a certeza de que a violência no interrogatório ocorre sem maiores rebuços, sem possibilidade de ser coartada e sem perspectiva de gerar qualquer responsabilidade para seus autores, leva o indiciado miserável, mesmo antes de sofrer concretamente a aplicação de sevÍcias (maus-tratos sempre há, tais como berros, ameaças, empurrões, cascudos), a relatar todos os pecados de sua vida.
S que dos milhares de delitos patrimoniais cometidos, air;da dos que chegam a ser objeto de registro (a maioria não é), praticamente nenhum Gera uma investigação específica. Não há meios b " ~
para realizá-Ia. Serão os casos (inclusive, com freqUência, os não-registrados) deslindados quando, preso um ladrão por qualquer motivo, for submetido a "hábil interrogatório" - corriqueira, que encerra manifesta ironia, mas que é encarada com absoluto cinismo por todo o mundo, que não provoca nenhuma verdadeira repulsa. Aí, o ladrão confessa 10, 20, 40 delitos, e os casos que estavam adormecidos no bolor das são trazidos à tona e
como de "'l de êxito",
as não sucedem ao relato do Relativamente ao ora nem se cuida muito
de disfarçar por meio de complicadas ambigüidades e construções
mostra-se de fáeil
com bas"tem que
ele indivíduos e náo a outras - c aí ocorre algo pos-da Essa
se enraíza no mesmo elemento qUl:, fun-eomo de na do
crirninal: a classe social dc onde Ern virtude ela de em que ficam os poli-
s -- cobra-se-lhes a solução dos casos, ainda que 11, oficial
a autoria do crime e fazer boa prova quando recebem vantagens elo criminoso. Nessa área, a corrupção torna-se muito difícil de ser combatida. Aqueles que poderiam puni-la reconhecem: sem o emprego da violência, a maioria das investigações fica fadada ao insucesso; porém, por outro lado, não podem do policial que use a violência, pois formalmente está ela vedada. Para desespero, sobretudo dos promotores, à vista de uns autos de inquérito que transitam da polícia para juízo .e;' vice-versa, por meses e anos a fio, sem que se consiga recolher quaisquer elementos conspícuos de prova, descabe uma ação formal capaz de pôr cobro ü inépcia do investigador, embora, como se pode perceber sem muito esfoí'ço, comprado para não descobrir nada.
A corrupção, como já verificamos, aproveita a quem dispõe de recursos e todos sabemos quem dispõe ele recursos numa sociedade capitalista.
Sem embargo de reconhecer na confissão do indiciado o ponto mais importante quanto à eficácia da violência policial, cabe lembrar que não está ela limitada exclusivamente a essa questão. As invasões de .. casas, a detenção e, às vezes, a tortura de testemunhas, o falseamento dos fatos, o seqUestro de parentes do indiciado, a em flagrante por vadiagem (contravenção inafiançável) como recurso
to em contra frutam.
,",'tio os criminoso,)''! Crinlc crill1inoso,L' ente,)' 85
de coisas em desacordo de toda uma séric de
de um c1climais uI
em face do baixo St{ltus social de que des-
a de chamar a para uma interessante manobra inventada para ou o esclarecimento de certos crimes que nilo interessa esclarecer, mas com base na silivo de s
Refiro-me iI pela de, promotor público para acompanhar certos
ado ta-se tal
que, em rica ou faz-se mister a presença moralizadora do promotor, a fim de que seja viável chegar a bom termo a investigação. Geralmente, são escolhidos para desempenhar tais missões os membros do Ministério Público mais afamados em termos de responsabilidade e reputação.
À primeira vista, a medida afigura-se altamente positiva. Tenho para mim, contudo, que, quando se determina a um corre
to promotor que participe do trabalho policial, objetiva-se, precisamente, não solucionar o caso, contando-se com a presença da ilustre figura tão-somente para respaldar o insucesso.
Na verdade, a presença do promotor serve para assegurar, primordialmente, a interdição ao emprego da violência na investigação. E, 'sem violência, ou não se apura nada, ou o que se apura padece de pobreza franciscana em termm: de prova - tudo a benefício do culpado. Quer dizer: o promotor funciona como garantia de que a lei vai ser respeitada; ora, quem se beneficia do respeito à lei é o indiciado, uma vez qtíe a polícia costuma mostrar rotunda ineficiência quando se dispõe a trabalhar estritamente dentro da legalidade. Com a presença do promotor, o indiciado faz até economia, lÍm vez que não precisa pagar aos investigadores para que respeitem a leí. Isso, aliás, origina uma indisfarçável má vontade por parte dos agentes encarregados d~ c~so: não conseguem dele tirar proveito pessoal nem conseguem elUCIda-lo.
86
E resmungam, enquanto fracassam: "Com esse cara aí, como é que Se me meter o cacete em dois ou
lava resolvido há muito tempo, mas o é cheio de com ele para eu à moda - ih, o Então quc se Ele que se vire.
r:.; o inocente promotor não que sua se em última como forma de
so ele I LIXO - exatarl.1ente ao contr6rio do que
participação no o crimino-
De acordo com a estrutura formal do aparelho repressor, ~,~re () a llvacla do
esta!lsob o
mia a Na rcal é a l'Cl','1 C'jllCll1 "t
faixa de atuação dos promotores e juízes, a estes concedida mínima possibilidade de se insurgir contra tal controle.
Formalmente, o sistema clama por LIma polícia honesta, branda e equânime. De fato, exige que seja corrupta, violenta e parcial.
Observemos os mecanismos através dos quais se torna viável levar a máquina repressora a atuar concretamente dentro dos padrões esperados e a vomitar, ao mesmo tempo, um sermão em que sustenta exatamente o contrário do que faz.
~ecrutarn-se os promotores e magistrados dos estratos superiores da SOCIedade, enquanto os policiais, sobretudo os que desempenham o papel de lidar diretamente com a descoberta e dos delinqüentes, das camadas mais baixas; àqueles se fornecem recompensas (status, vencimentos) equivalentes aos dos membros da alta classe média; a estes, os do operariado qualificado; os primeiros merecem uma prote~~o institucional quanto a seus defendidos por uma llldevassabIlIdade quase sagrada; aos segundos se vota um desprezo temperado de complacência, que vezes pode
do para
ou por são poupa-U"'''f''"ét,,.,,,, de se comportar desavergonhada-
süo os crinúl1o,\'o!>'! Cri!llt! (' cri/nino,vos: en/ex 87
mente no concernente à aplicação de uma justiça parcial e classista; a massa dos policiais é retirada da ralé social, cabe-lhes a
de suportar, de forma altamente nantc, os ónus
dores das pu n'
dores penmmeccr intocados.
entre os autores devem purgar as , merecem de tais
Aos domi por sua cm ii que devem ostentar e, até, em razão do autoconceito, repugna mãos em atividades indignas. Que as executem, os que não prestam. Postura, de resto, sempre repetida na história do homem, como o comprova a posição social dos indivíduos destacados para exercer as atividacles de carrascos, dos cam-
do chuço da dOl11ina-r que
, daria risco de passar a"atuar como organismo capaz de autodireção e, nesse caso, geraria o enorme perigo de poder vir a ferir a quem a criou e a usa. Por isso mesmo, persistiremos assistindo à condenação e reprovação - verbal - dos abusos e podridão da polícia, no mesmo passo em que se adotam - concretamente - as medidas necessárias no sentido de perseverar naqueles predicados.
Submetendo o universo dos delitos ao crivo seletivo da visibilidade da infração, ela influência do estereótipo do criminoscv,das conseqüências ela corrupção e ela prevaricação, do emprego de violência,
a polícia separar com enorme eficácia, do ponto de vista do sistema, os delinqüentes a serem esmagados nas engrenagens da justiça relativamente às pessoas que devem estar imunes à trituração.
Exatamente ao reverso do que apregoa a ideologia, é a polícia quem controla e comanda a atividade do Judiciário, pois este só trabalha com o material concedido por aquela. Graças a pode o Judi-cÚ'irio manter uma de e pureza, urna vez que a parte ostensivamente se realiza temente à sua e JUIzes inteiramente com ao papel a desempenhar. Afinal, seria um contra-senso desprezar a possibilida..:
88
de de usar eventuais
até
a justiça parcial e a) a prerrogativa atribuída ao juiz de decidir a causa em função do seu "livre convencimento"; b) a regra do in dubio pro reo, isto é, só pode condenar quando estiver absolutamente seguro a respeito da culpabilidade do acus'ado, pois, ocorrendo alguma hesitação, deve inclinar-se pela absolvição,
Descontada a forma impressionista da apresentação, as duas máximas resumem-se, na prática, a garantir um poder discricionúrio e amplo ao juiz no julgamento, /'
Em que consiste, afinal de contas, a famosa "certeza lega]"? Em algo que só tem existência no subjetivismo de quem profere; decisão terminativa, Qualquer pessoa que atua junto ao aparelho judiciúrio sabe, perfeitamente, que fica muito mais f,kil vaticinar o resultado de um processo através do dado "qual o juiz que vai julgú-Io" do que fazer a previsão em função do fator "qual a prova constante dos autos?", O caráter corporativo da magistratura, armação hierárquica em pirâmide cujo cimo é ocupado pelo Supremo Tribunal, para onde são designados ministros nomeados pelo Presidente da República, o sistema de promoções, no qual desempenha papel decisivo ainda o Poder Executivo, tudo se combina de sorte a dar lugar à uniformidade quanto a um certo aspeçto das decisões, ao mesmo tempo em que permite, quanto a outros, caracterizarem-se pela incerteza e ausência de
89
incrustados no campo A t;refa básica na apreciação de um processo criminal diz 1'esao exame da nele contida, Por busca-se reproduzir um
do
rcu ~ muito grande a do grau de perfeição , de ser " na operação, haja vista que os seres humanos envolvlClos l~um epls~dio criminal tendem a ter sua capacidade de senso-percepçao prejUdIcada pela emoção, pelo tipo de relacionam~nto ~om, as partes, pela maneira de olhar o~ mundo, pelas crenças llTaClOnalS que adotam, enfim, por uma de empecilhos que dificu:tam a ~pre,ensão da verdade dos fatos na sua pureza objetiva, Além dISSO, o luncJOname~to da memória, no que atende à evocação, traduz, como o ate:ta a PSI
cologia, uma reconstrução voluntária do passado, consclC~te ou inconscientemente distorcida em função de uma de condICionamentos deformadores a que está submetido o indivíduo, O ambiente do tribunal também tensões emocionais nos depoentes, que, com freqüência, sofrem bloqueios e terminam dizendo coisas que nem estavam na sua intenção dizer nem guardam correspondênCia com a verdade do que se passou, A prática forense cunhou LIma bastélllte si 0nificativa a respeito da precariedade das declarações prestadas nos l~rocessos: "A prova testemunhal é a prostituta elas provas," Nesse caso, a imensa maioria das sentenças se apóia sobre um bordel.
. E o que é dúvida, o que é certeza plena? Há dúvida quando há uma possibilidade em dez de que a acusa-
, 1 I' "O I' 'a OSsl'bl'j'Idade é de uma para não seja vere ele eIra! II quanc o esse p " cem? Ou para mil?
90
Em uma lidade, ainda veraz. Minha
Por a a
incerteza. Na estará livre de
as , uma vez que o material sobre r um de certeza -- ou,
- mas tão apCIl<lS dc
011
objeto, ou, ao contrário, da
mcnos, de certe/o
objeto.
se resulta da vista do dêlCJuele CJue viu ()
Por
sJo q alru OU CICI1-
ou llão séÍo
uma certeza extrínseca.'·22 senil0 ele
Tal circunstância está reconhecida de resto .' " c I . cessu'tJ qu ~ t' ;o-' , • ., plOplld el pro-, " ~', . e ou 10. ndO pode ser o sentIdo do intrincado aranhol de I ecm sos por ela cUIdadosamente elaborado
,~, vDiant~ ~a dificuldade de extrair da p;'ova do processo uma real cei teza, o JUIZ tende a deslocar o objeto de i c" , -I .. ' menos dúbi-l " .. paI d sec e
" c para ele, se ahgura mais palpável mais concret'\-mente apreensível' a fiuu" I· d . ' < o . ,'. . b. I d (O dcusa o. E aqUI relcvo especial ganha
que subJeuvamente alimentado um criminoso.
. .rOUVET, Tmílé de
há
um que conduz o juiz
Paris, E. Vilte, 1949, v, I. p, 1
,v/ío os' crinllnosos? (:rimc crinzinosos: entes 91
mas opções eticamente comprometidas que, por sua vez, já cm escolhas probatórias valorativamcntc determina-
das. Assim, no discurso j , () critério de é
anto ü ia entre os cfetivamente ocorridos e os juízos decisórios, sabemos que a lhe o verossímil e não o verdadeiro, Nilo c',;{io mente ditos que se provam. as afirma-
de sua existência e da a partir desta o juiz resgata o que
e constrói a
"Assim, no processo penal, não existe demonstração da Em ambas as instf\n-
Na forma da o deveria examillar a prova do pro·-cesso para concluir se está demonstrada a existência do delito e sua autoria por parte do réu. Atingida tal certeza, então se preocuparia com as condições pessoais do culpado, para o efeito de escolher a pena a ser aplicada. Na prática, porém, há uma inversão na operação:
o exame da pessoa do réu, a ver se corresponde ao estereótipo do clelinqliente, para depois verificar-se se os autos fornecem elementos razoáveis para amparar a decisão sugerida pela convicção previamente ·Para tal convicção, a fonte de certeza reside em algo extrínsecoü prova do fato, pois sobre a prova relativa ü personalidade do acusado. E, então, um dado uma importância
: seus antecedentes. A existência ele anteriores cnml-funciona como o verdadeiro fundamento em que se vaI basear a
certeza do Mesmo o aeusado a
l~ curioso observar corno se tem em ainda há
Rosa Maria Cardoso da. op. ciL, p. I 1.
até
92
ASSlnl, apesar de tecnicamente de antecedentes."
a existência de um conceito de fora dos limites pela
o fato de ter transi-tada cm j por delito anterior. O que é uma defini-
jurídica de reincidência, da qual não se consegue entender como
o acusado só se compreende ade-
rência dos magistrados ao estereótipo do criminoso definido pela ideologia: indivíduo da baixa classe sociaL com folha de antecedentes rnanchada.
Configurado o tipo abstrato do deJinqüente, basta encontrar sua confissão no inquérito policial: dissipadas estão as dúvidas que poderiam torturar o espírito do juiz, e este condena de consciência tranqUila. O móvel da decisão vincula-se muito menos ao fato em si ou à sua prova; o importante é saber se aquele indivíduo deve ou não ir para a cadeia. Não interessa o que fez, mas o que é.
Outro fator de fecundas conseqüências para a distribuição discri-minatória da justiça está representado pela atuação do
O processo, em JUÍzo, reveste a forma de um duelo. Do lado da está o promotor, às vezes ajudado por causídico contratado
vítima ou seus parentes para funcionar como assistente. Da outra parte, obrigatoriamente, terá de haver um advogado a exercer a defesa do réu. O resultado da pugna dependerá, em da combati-vidade, experiência e força dos trocados pelos rios. O sistema encontra similar na ldade Média:
"Outro tipo de I que, não sendo duelo-vingança, nem dllelo-meio-de-prova, não se confllnde~ também, com o duelo de
93
examinavam se os lidadores se tidas as
ita ele
VéU "os I são de Os promotores são servidores públicos,
concurso, em geral bem-remunerados, gozando de elevad? ~·tCltl~S social, tudo concorrendo para que sejam recrutados entre proflssIon~s de médio a bom nível. Os advogados contratáveis pelos acusados sao profissionais autónomos, cuja sobrevivência depende, em grande parte, da obtenção de resultados favoráveis nas causas e:11 que atuam, escalonando-se, informalmente, em razão de suas qualIdades, .desde aqueles pouco dotados (mas baratos) até algu..!).S verdadeiros lUJ11mares (porém caros). Aos réus carentes de recursos . contratar ad~ogado particular, o Estado os defensores públIcos - esco1l21clo.s ~e maneira semelhante aos promotores, mas com ganhos e çoes mte-
riores a estes. . . aqui, embora de fato ocorra algum desnível, pode-:,c admitIr
que, os campeões um certo eqUlI. em termos de força. Dadas circunstâncias, todavia, drastIcamente
o quadro. -Já anotamos, anteriormente, que o indiciado que pode contratar
adVOGado conta com sua atívidade desde a fase policial o que nunca b
26.-'ITIOMPSON, Augusto P. EscQrço histórico do díreiro criminal Rio de Janeiro, Editora Liber Juris, 19R2, pp. 53-54.
Y4
facilitando o que o cliente da defensoria
ça a terreno no ilíbrio de Isso vai acentuar-se, de maneir<l brutal. em seguida. A grande massa de réus que a íci,\
um tipo
barra tribunais constitui-se de honorários ainda ao mais modesto ou
Com isso, a clientela dos defensores Fica-lhe, literalmente impossível dedicar cuj-
a cada um dos casos que são postos sob sua responsaconversar COI11
CJua pruva guem re;Jliz~lr: os aIos s - J
l1111nhas, alegações orais e escritas - sucedem-se numa torrente insuportável, que não consegue ser acompanhada, mesmo em plano meramente formal, pelos massacrados defensores. Para resolver o problema, o jeito é apelar para o concurso de - estudantes de direito - no sentido de lhes cometer a maior parte das atividacles na defesa dos réus Corriqueiramente, o passa a exercer
uma fiscalização sobre o trabalho dos estudantes, ]imi tando-se a chancelá-los com natura em e defesas, com o que atende, formalmente, à constitucional da "ampla defe-sa" a todos os Em nada foi
uma vez que a ocasional boa - ou até o e o de estudante - é insuficiente para permitir o desenvolvimento
de uma Triste verdade que com absoluta segurança: a
maioria dos réus é sem ou, o que dá no mesmo, com um mero simulacro de defesa.
Por tudo 95 das camadas nalizadas da
dicional recebe decidido amparo a do fato.
que cega nClscença, depois' mil dos anciãos, que pensnva pr()fundal71enle, teve 1:01/0
idéia. Ele era () mClior doutor entre esse povo, seu e tll7ho um espírito filosófico e . assim a idéia de curar Nunez de suas peculiaridades. Um dia, quando faco!J se
ele voltou afolar no caso de • • 0. /7al'" !'ll·l·}1 o caso é claro. Examine I L Lf'
Considero muito ele ser curado. _ É o que sempre supus - disse o velho Yacob. __ com o - () doutor cego.
é que () ataca?
Ah! - disse o - Isto -
Edaí?- o
e que existem no caso de
Süo movem e, em
constante de
-E
96
-- Creio cml! !JasfOlIfe certeza que. para curá-h) por bosto-nos IIIIW e
saber renw~'cr esses irritontes. luento/mente :;
smlio e será fim cidadüo admircíve/. eéils ciência.! eXc!(//1l011 () velho
imediataJ/lente cOJl/wlicar (l SilOS e.\'I)C-
com as cores vistosas do progresso e da benemerência, por isso endossado ingenuamente por liberais e homens de boa vontade, atua, de fato, como eficiente ferramenta da opressflo/repressão, a fornecer-lhe meios tão duros e cruéis quanto os castigos empregados pelo direito penal retributivo. Pior: na medida em que oculta o verdadeiro objetivo atn1s da fraseolonia da
. . b
ressocwhzação do delinqUente, cega as pessoas quanto à violência dos métodos empregados, dificultando, assim, o surgimento de movimen
resistência contra eles, Os instrumentos inventados como aptos para atender a tais pro
pósitos ambivalentes são a penitenciária, o manicômio judiciário e o internato para menores, com um desdobramento posterior constituído pelo denominado "tratamento em comunidade", cujos precursores foram o livramento condicional, a suspensão condicional e a liberdade
ada. A incapacidade de alcançarem as instituições fechadas os fins a
que se propõem encontra-se hoje comprovada de maneira irrebatível, embora ainda haja batalhões de e que cOI1ti~
I FROMM, Erich. Psíc{//uílise da suciedade 3. cd. Trad. L A. Bahia e Giasone Rebuá. Rio de Janeiro, Zahar, s.d., pp. 190-1.
97
meta-
sistéma viu-se do fracasso dos cíta-
a mesma c evitar o desmascaramento dos reais
a cm
niio tinha (l menor idéia do que significavam latitu
de que er(lm
em variados nomes: ção, cura, educação, reeducação, reabilitação, regeneração, emenda e outras tantas, o que parece indicar, por um lado, que ninguém sabe precisar exatamente aquilo que se visa a conseguir, e, de outro lado, que o verdadeiro desígnio a ser alcançado se oculta sob o véu dessa
rica prolixidade. De qualquer sorte, o tratamento penitenciário aponta-se como o
alvo principal a ser atingido pela pena prisionaL Principal, mas não exclusivo. A seu lado, alinham-se outros, menos altissonantes no plano verbal, mas cobrados com severo rigor: punição retributiva pelo mal causado com o crime; prevenção da prática de novas através da intimidação (particular e geral); e separação do indivíduo relativamente à comunidade livre, Havendo atrito operacional entre estes fins e aquele alardeado como meta precípua, inadmite-se o
fício de uns em homenagem ao outro.
2. A é de Rupert Cross em PlIllíshmellf. Prísol1 (md lhe PlIb/ic. Londoll,
Steves and Sons, 1971, p. 165. 3. A matéria deste n. 2 contém um resumo da obra de minha autoria, A
lencíâríLl. 5;[ cd. Rio de Jancíro, Forense, 1993. 4. CARROL, Lewis. Alice's Adventures in Wonder/(ll1d. Oxford, Uno Press, 1976,
p.l1.
98
A combi dos objetivos dificuldade de ser ainda no plano meramente
retributivamente é E os
A falta de penitenci
uma ada ao tratamento em duas
correntes: uma, aproximan o trabalho reeu i1 ativi m é d i c a ; o II t r a , a sim i 1 a 11 d o - o p r ~lt 1 C a s e LI li C a c i o Il is.
mente. em terreno Uio indefinido e fi há urna forte ten-dência para as co do que resulta o
teórico da condução da vida prisional, com grande freqUên-cia, a aparência de um colorido coquetel, cujo conteúdo pouco tem a ver com os materiais que, , o . E se olvida uma Clrcu lâilcia relevante quanto ao dcft~it() de L10
é, sofrer, em nume ela retríbu () paciente/aluno durante o desenvolvimento do processo curatí:o/didéltico. Só mesmo o penitenciarista, que nem é doutor nem professor, pode ser capaz de encarar a sério a estrambótica incumbência que lhe é proposta.
Gravame de maior envergadura, porém, na rota da satisfa-ção do alvo apresentado como o mais importante. É que ao lado das metas formais atribuídas à prisão - as quais, como parece evidente, testilham entre si -- há ainda objetivos outros por alcançar concomitantemente: impedir que o preso fuja e fazer com que sil ordem intramuros J inauaoem "sses b b \...,' ~ ,
nam-se segurança e disciplina). Em doutrinárias, informais são rigor pela sociedade, razão que os a se transformar, em verdade, na finalidade centra-/. dos estabelecimentos Para
se, predominantemente, os controles do mundo livre, no sentido de fiscalizar-lhes uma exata consecução, no mesrno passo ern que aque-les demonstram frouxa no que aos
Bernard Shaw CROSS. Steves aml Sons. 1971. p. 47.
PUI/ishelllcnf, Prisoll mu! Puhlic.
selo os criJninosos CriOlC e crÍnlÍ!lo.\'os,' entes 99 .
vos formais. Observe-se, verbi gratia, a assiduidade com que retorüs vezes de 101lf'O pessoas que mal saÍ
ram exatamente por. haverem ídênti-cos aos que as levaram a ser A reíncid(~ncia presl~me-se que entre do que não há certeza por falta de est,ltÍS-
número, porém, que se considerar como muito face dos dados de outros
com o mais rico c sofisticado sistema do munJo, mais de A .recidiva implica a prova incontestável de
a falhou no como na meta intimidação): submetido ao tratamcnto, com freqüêncía por vários, muitos anos, o indivíduo continuou tão criminoso como antes. O fato,
ostensivas ou mani
assimilado com hiJi Illlltilll. u! homicídio intramuros dand()
lugar, muitas vezes, a verdadeiros escândalos públicos. Movimentamse os de comunicação social, a matéria ganha manchetes de primeira página dos jornais e o horário nobre das de televisão. Os episódios são investigados com a finalidade de apurar responsabilidades e disso resultam punições formais (demissões, processos cri ou informais desmoralização dos culpados). Ora, nunca ninguém se lembrou de adotar medidas semelhantes para o caso da 1:9l1cidência do egresso da prisão indivíduo submetido ao trabalho curativo/reeducativo elo tratamento penitenciário que comete nova i i1 entretanto, prova de que a i quanto ao alvo apresentado oficialmente como o mais importante c, logo, seria curial identificar
pelo insucesso, se tal é a medida adotada no diz res-na dos fins informais de seguran-
vê-se
ele, Ir
um me de asfixiante cerceamento à da disciplina "preço alto que se paga pela
100
do (e'l
ma requer ()
d~lde, ~t ~1111ocunfi;HH:;~~1~ ~lt)
coerente FeLl
do aUlodisccmÍmenlo, (1<, de
I ira\'or:íYel
d com uma
que a lilliI i-
c!,;
(cdu" os fins
íolítica uper(1-infnrmais
ser ati concumitantel s() resla saerificlr tlllS cm uutros, Pelos motivus ,1lL1S -apon
livre para soas, ou não em reconhecer a manifesta
Dois al a controles do de quc tal troles forem
de livre,
fornece mínima segurança v s que os C()l1-
dife-
;\ i fechada "não é uma miniatura da sociedade livre. mas uma sociedade delltro de uma sociedade",') uma VC7 que nela foram alteradas, drasl numerosas elo mundo extramuros:
JONES. H,)W;lrd' Crime ({/Ir! lhe 1'('110/ 3, ccL Londol1. lJn, Tutorial Prcss. s.d" p, 24"+.
,SYKES, CJreslJaIll, up, cÍí" p, 4i:l, í-\, FOX. Vemoll. Prisol1 nar)' I'roblcms, ln' JOHNSTON; SAVrrZ & WOLF-
GANO, orgs, Tile !'lIllishmcl1l ([1Ir! Corrcclioi1, 2, cd, York. John Wi af1(! Sons, s,lI" p. :19,+.
,){IU (JS cTinúnosos! Crill)( .. ' e c'}'inú!iosoS. eníes IIH
"N:t vida vil. o cidadão é, geralmente, membro de uma
la, um nl1;:\ ,de
ilIIU CC111l níd
permanente, con.línuu c,
cm contraste.
da 111cnt,; resultantes da muradia numa
embora cm
reI compu!sórí;lS
local de
s, que "treinar homens pare ti vida livre
os a de II se tão absurdo "como 12
para uma corrida ficando na cama por O uso da da liberdade humana deu lugar ZI
como é dinaria este. eOn1l1l11ente acontece, desenvolveria um mal, chi concreta dos
ndendo esse fato,
nificado da vida intramuros não muros e celas e trancas. Os
<). SYKES. Grcsh~l111. ()jl (ir., p, 75, 1o, CHAPMAN, Dcnnis. (1), (·il., Pi', 201. 203.
mas, como infor-
dos se iram en\'ol idos.
1 I. CROSS, Rup,:rL "IJ, !'ÍI. p, ! C" . 1 Thomas M, Osbornc iljmrl SUT1-IERLi\i'JD & CRESSEY. PrinciJJes
I e J'li71I1IO-
V crsflO francc,sa do Inslituto de Direito dn de
Paris. Ed, Cujas. 1966, p, 51 J,
102
comunitárias são de . fundamental, se se las no modo real ele
Pois é
a caractcrística marcante da a tentativa mai extremada
captá-
ele um grupamenlo mano a um de controle total. As regula-estendendo-se a todo o c;:lmpo ele individual, a
lfincÍa constante, a do nas mãos de uns pou-cos, o abismo entre os que li-dade de si de tudo concorre pare identificar no caso um Acrescente-se que a ali - presos, soaI da direção -, vê-se comprimida numa área física angusta, as pessoas viver numa intimidade esl onde a conduta de
"Nuo é ~1 rba os indivíduos mas u
'ndo cm cOlldi-que Illl ln na vida 1 que illgrcssd
dade peculiar submete-se a um processo dc assimilação, a que Donald Clemer 15 batizou com o nome particular de prisonizaçclo. O pri mei ro passo, e o mais obviamente integrativo, diz com o status do novo membro: transforma-se, de um golpe, numa figura anónima de um grupo subordinado; traja as roupas características elo grupo; é interro
descobre que os custodiadores são toeloas classes e graus de autoridade dos funcionários:
usando ou não a gíria local, apreende-lhe o acostuma-se (l
comer apressadamente e a obter alimentos através elos truques emprepelos lhes estão próximos; adquire -novos hábitos sexuais: ria de todos; olha com rancor I"OS;
do de diversificadas e deve administrar por ele -
uma
cÍl" p. 14.
JOHNSTON, SAV!TZ ol P!llIisfll)/Cnr (/1Ir! Correcrioll. pp. 47 t)·N3.
o ele que o meio ambiente
e de difícil da atitude
(j,y crilninosos? CriJne e criJllinu,Yos: entes 103
na vida civil -, do que lhe resulla "adotar do mundo".!6 A da e clis-
ilimitado sobre Vcda-se-lllc
Cumo de um elas. O preso está (inal' J
as minuciosarnen devem provir dos
rimcntar () sentimento serem corretas ou uma obediência cega, que leva ao automatismo da conduta, habituan
ele. E
ObVl:J!llcntc
di ;,111 o modo de vida nada surpreendente, a grande maioria dos egressos dos estabelecimentos carcerários tende a retornar a eles, pois se transforma em clientela crónica da instituição fechada.
A incapacidade regeneradora da prisão, como se resulta de condições ínsitas na própria illStítuição, ao contrário da desculpa
pela qual se justifica a insistência na sua manutenção, de que os fracassos constatados da sua história - em todos os em todos os lugares -- decorrem de meras circunstâncias conjunturais, sobretudo pela precariedade dos recursos alocados ao setor. Não é
ste a mcnor de resol-
tica concordam em do tratamento
necessário resolver, preliminarmente, o problema da superpopulação . Acontece que tal insol A
de quem estudou o
1(1. i\ nbservaçilo é Tania Maria Dahmer Pereiral colhida
104
sistema CE
vagas
do Estado de Süo
o País tem cerca ue 60 mil
viabilizar o conseguíssemos nosso sistema úrio ao da
metamorfosear os criminosos em nüo-crimi colhidas por Jonatham
e mesmo nas galeras és nocivo és um estorvo, és um tUlnO/: ..
Se pensas que pensas, estás redondamente enganado e com.o disse o DI: Eiras vem chegando aijunto com o delegado para te levw: .. "17
.Caracterizados por pertinaz repugnância quanto a se submeter pacificamente à injustiça das estruturas sociais, impermeáveis à catequese da ideologia, dotados de teimosa resistência aos castigos infligidos aos transgressores das normas penais, destoando com freqüência da conduta desejada pelo sistema, uma categoria de infratores gera uma preocupação - verdadeira dor de cabeça aos mantenedores do slatus quo; os criminosos multi-reincidentes. À proposta ele vida que se lhes faz, no sentido de renunciar de forma quase absoluta ao usufruto das amenidades do mundo, ~t possibilidade de realização como seres humanos, reagem vigorosamente, às ferozmente, na
17, CHICO BUARQUE DE HOLANDA, Hino de f)UrlIl1,
105
ini-maIs
tendem a
revela o grupo, Insuficientes mostram-se, para an comum dos !lO manto de uma
desu-
mano e O discurso de como lógico e
as penas, embora dirigidas precipuamente à recuperação ainda um expiatório, de punição
o não pode ser estes
gos, ao praticá-los em contradição com as normas legais; corno, porém, a permanência tais seres em meio à comunidade livre acarretaria gravames para a última, pondo em risco a própria seguran~a pública, tornou-se forçoso encontrar uma solução que atendesse as duas ordens de interesses: defender a paz social, de um lado, e, de outro, fazê-lo independentemente da submissão de irresponsáveis às dores das sanções criminais .
./
"As medidas de segurança justificam-se porque necessárias à defesa da ordem jurídico-social contra o crime, Alguns autores não se satisfazem com essa justificação e procuram aprofundar a pesquisa em busca de apoio ético-jurídico. Mas deve-se ponderar que a ordem jurídico-social é um valor é legítimo de~e12der pelos meios necessários, embora estes impliquem em restnçao a direitos individuais, desde que esses meios sejam empregados, com as garantias pelo Direito, Essa necessidade de
de um valor IJrimordial para a coexistência humana basta a justificação jurídica e ética na medida de
"18
18, BRUNO, Aníbal, o[l, cit" v, 3, p, 287.
106
No que concerne ao delinqUente multi-reincidente, a justificativa panl excluí-lo do c8mpo ela pena para medidas de segurança mostrou-se um foi apelar para ()
Ea fornecer o
na viável assimilá-los aos irres-
26 - É isento de pena o que, por mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao
da ou da inteiramente incapaz de entender fato ou de dctefl1l in de aconlu
os mul I1C dos ri pena, foral!l para o redil das medidas de segurança. Porque estas, corno
se reconhece na justificação que lhes acompanhou a criação, podem importar "em restrição a direitos individuais", compreende-se que disponham de força para determinar o sacrifício da liberdade de seus beneficiários. Daí, não deve causar nenhuma surpresa que a legislação
a previsão de medidas de segurança detentivas - haja vista tratarse de mero corolário das colocações antes feitas.
Em princípio, no plano teórico, essa detenção há que ocorrer em outro tipo de estabelecimento01ue não os penitenciários, pois não são penas. Destinaram-se, então, os manicómios (novo nome dos hospícios) para os multi-reincidentes.
A éonseqüência mais importante - ou grave - a se retirar da inidentificação entre penas e medidas de segurança, com base na idéia de que estas ditadas a de scus contemplados, é que:
de segurança nc7a se estende a sistema de que cerca a área de penas.
tratemos de descobrir que de carne se esconde debaixo do angu da retórica atinente ao em causa.
107
"Multi-Reincidentes
"Da terra, de um rar
uma de aviões no ar. Mas fora de rota. O avião se encontre 'fora de
pode 'louco' do ponto de vista dos louca
pria 'Fora de é um critério cl 'Desviado da rota' é um critério ontológico. Um dois
juízos ao longo de diferentes . É ele fundamental r 'fora de
fica que se encontre necessariamente 'na rota'. porcos de Gerasa. Não é obrigatório que a pessoa 'fora de fOl,,mação' esteja mais 'na rota' do que a formação. Não há neceSSIdade de idealizar alguém só porque ele foi classificado de 'fora de formação'. Não há necessidade de também persuadir a pessoa nessas condições de que a cura consiste em voltar ~l formação."19
o arcabouço jurídico autorizativo do internamento compulsório dos doentes mentais que praticaram infrações penais escora-se, por inteiro no conceito de doença mental que em edifício estranho a; direito, qual seja, o da psiquiatria. Ai surge a primeira .dificuldade: nada pode ser mais fluido que a definição de normalIdade e
anormalidade em sede psiquiátrica. . A •
Os juristas, cheios pudor, tomam as afirmações da Cle!1Clél
vizinha como verdades absolutas, ignorando - ou fingindo ignorar. - a perplexidade que grassa naquela área a respeito da validade dos dwg-nústicos de seus cultores. Como su um de seus
Il). LAING. R.D. A Vozes, 1974, p. 88.
da Trad. Aurca B. Weissemberg.
108
ao status quo
"N,l do como
lk seus respeitavelmente
dispôs a instrumentar."20
o l:onceito de saber dcsinte-é
instrumento contra os
Mesmo a esquizofrenia, que aparece aos olhos dos leigos como enfermidade de cuja realidade ninguém pode duvidar e sobre a qual se pensa que a psiquiatria detém profundo conhecimento e domínio, não merece ser vista assim por eminentes estudiosos da disciplina:
"Não existe 'condição esquizofrênica', mas a etiqueta é um fato social e o fato social é uma ocorrência politica. Este acontecimento político, ocorrendo na ordem cívica da sociedade, impõe definições e conseqüências à pessoa assim definida. É uma prescrição social que racionaliza um conjunto de SOCIaIS, por meio das quais a pessoa é anexada por outros, que possuem san-
legal, poderes médicos e obrigação moral para se tornarem responsáveis pela pessoa etiquetada. Esta é introduzida não só no papel, como na carreira de pela ação combinada de uma
20. SERRA, Antonio A. & PEREIRA, Cristina Rnuter. A psiquiatria como discurso polífico e os carreirisw,l" da indisciplina. Rio ele Janeiro, Achia:mé/Socii. 1979. pp. 12·3. .
109
do como exame como
"O esquizofrénico é alguém que estranhas expe-riências e/ou age de maneira estranha, do ponto de vista habitual
aos seus parentes e a nós ... Que o paciente diagnosticado esteja sofrendo de um proces-
so patológico é um fato, ou uma hipótese, uma suposição ~u u~ juízo. Considerá-lo um fato é inequivocamente falso. Conslderalo uma hipótese é legítimo. É desnecessário fazer a suposição, ou o juízo. O psiquiatra, adotando uma clínica nS} da pessoa pré-diagnosticada, a quem já contempla e ouve como a um paciente, inclina-se a crel' que se encontra diante do 'fato' da esquizofrenia. como se sua existência um fat.o e;st~lhelecido. Precisa então descobrir a causa, ou fatores etlOlog1cos múltiplos, para calcular a prognose e estahelecer o tratamento. O âmago da doença coloca-se então fora da agéncia da pessc;a. Isto é, a doença é considerada um processo a que a pesso.a esta .suJe;ta, seja ele genético, constitucional, endógeno, orgâniCO, pSlcolorrico ou uma mistura de todos.,,22 b '
21. LA] NO, R.D., op. cit., p. 90·1. 22. Id., p. 79.
1W A
Agora, imagine-se o que dizer a respeito da sociopatía - cuja nomenclatura tern variado bizarramente no tempo -, a qual se projeta de maneira tão intensa no campo criminal, uma vez que empresta caráter ao de! de
Trata-se de patologia· e cura impossível.
A identifi dificuldade se realiza fora da muI ti-reincidente.
Frente a esse estranho q idéia de que:
mal, medicina:
fica difíci 1 de aceitar a
"Como veremos, o que está em jogo é a busca, por parte da medicina de um de ús de cor; social, ii
Nesta l1i tôri a, vamos uma extremamente semelhante à da criminologia, com a diferença, porém, de possuir a protegê-la o escudo de uma disciplina mais tradicional e, em sua maior parte, classificável como ciência natural - a medicina. De outro lado, em compensação, nem sequer desenvolveu uma armação sofisticada, estagiando, ainda, lá pelas concepções preconeeituosas de Lombroso, amarrando-se a idéia do sociopata à do criminoso nato.
O nome tem mudado através dos tempos: desde monomaníaco (Esquirol), louco moral, sandeu com impulsos perversos, desvairado moral inato, louco sem delírio, até portador de personalidade psicop;hica, portador de personalidade anti-social e, finalmente, sociopata. Afirma a psiquiatria que a enfermidade se caracteriza por uma patologia dos sentimentos e da vontade, sem comprometimento ou perturbação do entendimento, definindo-se em função de procedimentos sociológicos que rompem uma faixa média que se tem em mente: aqueles que sofrem ou fazem sofrer a sociedade" (Kurt Schneider). A pessoa nasce com o mal e dele jamais se livrará. Além disso, ou por causa disso, inexiste tratamento eficaz para
23. SERRRA, Antonio A. & PEREIRA, Cristina Rantcr, op. cit., p. 4 J.
111
complementar a explanação com o excerto:
e
Destas facilmente é infe-
o que
menta o ~lS leis:
"O comportamento da personalidade sociopata impede o ajustamento psicossocial e vai da estranheza à criminalidade,
com un, deli
!l1oslr:Ul1 a!itude de Se' i
Quem não enxerga aí a medical ização do conceito de criminoso nato, habitual ou por tendência, da criminologia positivista?
E, nesse caso, como deixar de estender ao terreno da psiquiatria todos os argumentos antes alinhados a respeito da inconsistência
daquela espécie de criminologia? _ ~ . b) Lá, como aqui, o esteio onde se apóia toda a construçao teonca
(chamada de "científica") é, sempre, a aceitação da sociedade existente COI12,9 padrão de perfeição e, pois, de nor~n~lidade: devendo ser consid~rados desviantes (criminosos, para a cnmmologla, loucos, para a PSI
quiatria) os indivíduos que se insurgem contra suas regras e estruturas:
"Evidentemente a psiquiatria como toma as leis da sociedade como norma da qual se constitui cm patologia."26
a de poder qualquer desvio
O reconhecimento da justiça da sociedade atual, a não ser para quem tem interesse em como ou quem padeça de
24. ld., p. 25. Id., 26.ld.,
112
nu
1l10Samcllte extravasa minha COl
quialria." A outra de V. Exa. haver reconhecido que se trata de um deI
diagnostico-o como doente e o assumo; porém com os instrumentos de
ista" de uma Por isso, sou levado a falar
pela boca dos próprios psiquiatras acerca do caráter acicntífico da psiquiatria:
"É que a psiquiatria apresentou-se e firmou-se como um saber científico, ou seja, como algo que falava de uma realidade (vagamente, a "mente humana") com as garantias do método científico."f\o embarcar na medicina, a psiquiatria passou a auferir os lucros da credibilidade científica desta, tornando-se por tabela legítima. Da mesma forma que a outra, a psiquiatria tratou de se propor corno um método de conhecimento de algo que se passava além das conseqüências sofridas que as anomalias fisiológico-anatômicas provocavam. O que a medicina afirmava apoiada na dissecação dos corpos, nas análises de laboratório ou na observação dos doentes a psiquiatria (de contrabando) mou como derivado igualmente da observação e da análise das funções cerebrais. Só que uma defasagem permaneceu sutilmente pois o progresso da medicina foi a ponto de devas-
"rIo os crirninosos? CrÍlne e crilnínosos: entes' 113
A essa
á das mo hUl1lanit(lrio das mel!"
Acontece que às medidas de segurança não se fixa data certa para seu término, podendo, inclusive, revestir caráter de perpetuidade.
O deli
q raias; disso, dela não cm , ser superior a 30 anos (Código Penal, arL 75). Finalmente, ao completar o prazo da sanção imposta, o condenado será necessariamente posto em liberdade, independentemente da opinião de qualquer pessoa a respeito da inconveniência da soltura.
Dessarte, se um indivíduo pratica um assalto (furto mediante violência contra a pessoa) e é tido por sadio mentalmente, est<:1 sujeito a uma pena de quatro a 10 anos de reclusão. Ainda que o julgador entenda de lhe aplicar a sanção no grau máximo, o condenado pode contar por seguro qLH.\ no dia em que completar 10 anos de prisão, será devolvido à liberdade poúco importando se isso agrada ao juiz, ao diretor da cadeia, ao Presidente da República ou a quem quer que seja.
Já com relação ao que está tolhido da liberdade em virtude de submissão a medida de segurança, o quadro revela-se muito diverso.
O juiz, ao determinar a internação do irresponsável, não marca data certa para o término da providência, porque, na forma do Código Carl. 97, 9 12): "A internação, ou tratamento ambulatorial, por tempo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada,
28. Id., pp. 11-2.
1I4
mediante perícia médica, a cessação de periculosidade. O prazo mÍnimo deverá ser de 1 (um) a 3 (três) anos."
Recolhido ao o feliz de medida de segu-rança só libertado se e quando o juiz achar que o momenlo azado. Caso nunca tal o indivíduo perma-necerá até morrer.
Para decidir se a periculosidade, vale-se de um exame
culosidade", no qual vezes coadjuvado por psicólogo. mental se marca pela dubiedade, elo laudo de "cessação de periculosidade"!
de cessação de
O de pericuJosidade inorerece problema: o direito presume de maneira
ou a lei, desprezadas colaborações extrajurídicas. Como
já vimos, porém, aplicada a medida de segurança de internação, ela só será revogada se e quando se apurar que desapareceu o estado perigoso do paciente. Aqui, a psiquiatria volta a dominar. Cabe-lhe a palavra decisiva. Os juízes curvam-se ao prognóstico da ciência e de seus especialistas. Quer dizer: o problema do internado desloca-se da instância judicial para a médica, onde se inadmitem o atuar das garantias que cercam o funcionamento da justiça. Não há advogado para defender, nem recursos, nem tribunais, para onde apelar, nem formalidades a observar - o psiquiatra merece confiança total, é dono da verdade. Se sentencia: continua ao juiz incumbe, na prática, prorrogar o prazo da internação, que pode protrair-se até a perpetuidade.
"na prática", porque o juiz, legalmente, não está adstrito à conclusão das perícias. No caso de laudo psiquiátrico, porém, em rarÍssimas o magistrado ousará lançar mão de tal prerrogativa: se o fizer, pode vir a ser tachado de louco.)
Que isso ocorra -- o internado nos exa-mes de de de periculosidade
em se tratando de ual.' """. uma vez que a
não tem tratamento nem cura. De fato, a
entes 115
que cessou a periculosidade representa - embora, em geral, ninguém atenção a isto a demonstração de que o diagnóstico inicial
menos do ponto de vista a da liberdade por do sociopata constitui-se cm
Isso resolve uma importante para o ao mesmo em que ostenta a no território da
_. onde avulta a da de pena determinada na cuja duração não em caso algum, ser superior a 30 anos de uma fórmula para manter em confinamento tuo (em nome da ciência) os indivíduos mais rebeldes, que arrostam a dureza das sanções repressivas sem deixar quebrar o espírito de insubmissão.
A terceira a de todo esse o controle
sobrc rnétodos do tratamento do que au o.
das concorda-se operadores (autoridades prisionais) submetidos à ciário, pois, embora aureoladas de um sentido regenerador, conservam as penas caráter expiatório e, logo, devem ser controlados para que não extravasem os limites desejados pela lei:
"Esse esquema é puramente formal, mas é importante porque fixa para o Estado os limites da punição (a pena não pode ser maior ou diversa da que está prevista na lei) e estabelece para O réu a aarantia de não ser atinaido senão nos limites dos ditéitos
b b
diminuídos pela Que direitos são Em princípio, apenas a perda da liberdade e a dos direitos necessariamente afetados por ela."29
O apelo à idéia do conteúdo suficiente para autorizar os ,-"Ue'"')U}
os processos que lhes parecerem mais
da pena carece de força arbitrariamente
29. FRAGOSO, Heleno; Yolanda & SUSSEKIND, Elisabeth. presos. Rio de Janeiro, Forense, 1980, p. 3.
116
sobre a para mudar
humano."3u
Rêlativamente ás de
ele limitar os aos internos que o
é o documento de , ele 1 "31
diferente. porque, sendo em
as
de
estando, expungidas de qualquer traço retaliativo ou de fornecem a ilidade de que não
exime de intervir, em virtude de escrúpulos que merecem o ,aplauso dos doutos. Afinal, ao saber científico não cabe ficar submetido à ingerência das leis e de seus fiscais. Dessa forma, os executores das medidas de segurança detêm um poder sobre seus pacientes m amplo e desaçaimado, ainda, que o do carcereiro sobre os presos.
No hospital psiquiátrico ~ cujas características, como mostra Goffmal1,32 são idênticas às da penitenciária -, o uso de recursos que ilegalmente podem ser aplicados na prisão: a camisade-força, o choque elétrico, sobretudo o consumo de medicamentos que, causando a intoxicação da vítima, suprimem-lhe a capacidade de autovolição (em gíria, conhecidos como sossega-leão). O criminoso renitente, por sua incrível capacidade de à conformação, constitui tragédia para a administração prisional, eis que não se deixa venccr através dos meios repressivos de emprego naquele tipo de estabelecimento. Mas, para o manicómio, a coisa torna-se mais fácil: basta ministrar-lhe doses de sossega-leão e,
30. ld., p. 38. 31. Id., ib. 32. GOFFMAN, Ervíng, Memicômios, e cO/1\'entos. Trad. Dante M, Leite. São
Paulo. 1974.
S(/() O~'i crinlino:'}"()s? Crilne 117
manter a em nível su com-
como um buneco sem alma. Bern, em último assunto foi
sentes, das medidas de segurança, a tornar teúdo ali Assim ocorre, V.g., quando os se
de abrir vagas. Alguns p.p. internados há muito demons-
tram uma certa exaustão quanto à potencialidade de rebeldia contra o ordenamento disciplinar do mento fechado e, por isso,
a 11
O infrator cerceado em sua I causa da doença; não fosse a doença, nada justificaria que continuasse preso; mas, se é doente, como admitir que vá para a prisão comum?
Na medida, porém, em que a psiquiatria fornece o respaldo cient(flco, a justiça, de alma lavada, adere à proposição e a sust.enta com seu poder: é então que pegamos em flagrante a falta de sene?ade de toda essa intrincada novela das medidas de segurança. Por melO desse jogo de cabra-cega, torna-se possível trancafiar na cadeia, em caráter de perpetuidade, inúmeras pessoas - apesar de o comando do art. 75 do Código Penal proibir penas superiores a 3~O anos.
A título de exemplo, transcrevo no APENDICE VI um caso ~lu.e é típico e freqüente, no qual toda a inconsistência da colocação medIco-jurídica a respeito da sociopatia fulgura com clareza ~e cegar.
Em suma: porque as medidas de segurança são aplicadas a benefício do aaente porque não têm sentido de punição, estão liberadas das
b ' . t garantias legais que cercam a imposição das penas. Porque o Soclopa a é um doente, faz ao privilégio da medida de segura.nça. Com~, todavia, para ele não há cura nem tratamento, deve cumpn-Ia ~la pemtenciáría, onde provavelmente permanecerá até o fim de seus dIas.
. . d 1't erendo e entenclen-Sorte a do cnmmoso que perpetrou o e 1 o qu . , . . 1" d " . t ção" das med1das de do-lhe o carater delttuoso, pOIS se Ivra a pj o e . l'
. .., . data certa para saIr de a. segurança: VaI para a pemtenclana com uma
118
em
no concernente à metidos ii a encontrar uma fórmula alternativa que, tos
consiste em em à sociedade livre, sob que lhes a as si lecn metamorfoseá-los de desviantes em não-desviantes.
.j ndicada para
A respeito, permito-me produzir resenha que fiz acerca das
tuti ao de reabilitação em instituições fecha-
das -- é tão ineficiente quanto este, não sendo levado mais a sério que o hiperbólico blablablá que defendia o último. Os dados oferecidos como prova da eficácia do primeiro são tão manipulados
ressaltam-se os sucessos, obscurecem-se os fracassos - quanto o eram os da recuperação nas organizações fechadas. A fórmula ~e proseJitismo é idêntica à que se usou quanto à tranca terapêutlca: um superentusiasmo inicial, usualmente baseado em pequeno número de relatórios otimistas sobre casos singulares - e, naturalmente, muito discurso literário. Submetido o regime a estudos sistemáticos, nada confirma as assertivas inaugur~s. Em outras palavras: o 'tratamento comuniuirÍo' que, ndo se alega, substitui a 'terapêutica em confinamento', não tem sido mais que um slogan, com pouco ou nenhum conteúdo de realida-
sendo sua capacidade reabilitadora tão aleatória e nominal quanto a antes atribuída ao tratamento institucional. Outro ponto de sintomática semelhança entre os na estra-
defesa para da resso-
trilha o mesmo caminho a ante o impacto da com a
selo os criminv,yos? Crin1e e critnil1osos: entes 119
acercou inicialmente: ainda não produziu os seus inevitáveis resultados positivos não concederam os recursos de
O erro não é do mas de sua , como antes, não se toma qualquer para
conceder os tais recursos, para rncnsurá-los ou para saber se são e se, de fato, acaso fornecidos, trallsformariam em
derrota. A dos indiví-duos submetidos a c a
incremento, quer em à
ao exigível. Um vigilante de probation atende, às vezes, a 200 liberados; em de 10 minutos
'lnltamento em
Outro precisa ser diz alegação de estar demonstrada a superioridade da terapêutica comunitária através das estatísticas relativas à taxa de reincidência. Em primeiro lugar, os levantamentos até aqui oferecidos pela propaganda desprisonizadora são marcantemente inconsistentes e inadequados, apresentando-se aleatórios, falhos, incompletos, freqüentemente tendenciosos e, às vezes, desenganadamente manipulados. Em segundo lugar, não parece ser essa espécie de demonstração a mais apropriada para assegl]J./ar que a solução do tratamento em comunidade é melhor que a do tratament-o em estabelecimentos fechados. Cumpre lembrar que não são escólhidos ao acaso os indivíduos destinados àquele: exatamente o contrário se dá, como, aliás, não só reconhecem como fazem questão de proclamar enfaticamente os fautores da despri-
lI~U'-'U'J, ou é feita uma cuidadosa descobrir !-,',,,J0'JU0 que demonstrem 'aptidão' para o regime aberto, cir
apurada tendo em conta serem menos ruins, menos autores de atos menos etc. esses des-
uma taxa de menor relatÍvamente aos companheiros considerados 'inaptos' - restando muito difícil
120
avaliar em que medida a troca de causal na estórl:t,
se a cO!l1unidm!c é cm
Abunda a intelectualmente sério para demonstrar a
entra como coeficiente
vlll-se
cornunítáría, Ao disso, ladeia-se o cerne do
nfio o vizinho e as famílias atendem prontamente e voluntariamente às necessidades dos membros com problema - ou seja, eleva-se a correção comunitária a nma nova panacéia terapêutica ..
Três elementos básicos sustentam o programa de desprisonização: 1 º - interesse em resguardar os internados da destruição de sua humanidade essencial, ameaça sempre presente em face dos efeitos corruptores da instituição fechada; 2º - promessa de reabilitação, via tratamento comunitário; 3º -- a existência (alega-
de uma tolerância crescente, por parte da sociedade, em conviver com e cuidar dos membros desviantes, Quanto ao último, cabe indagar de onde veio tal tolerância, o que não é e, muito menos, provado de qualquer maneira. Parece mais certo reconhecer que não foi a tolerância surgida no povo que justificou a mudança da política a ser adotada mas que a da política é que deu lugar a um conhecimento a respeito da alegada (mas não demonstrada) modificação na tolerância comunitária, De concreto tem-se, em verdade, os protestos vociferantes dos cidadãos ante as decisões de libertar criminosos ou deixar soltos na rua, sob mínima ou nenhuma supervisão, doentes mentais -'-'w~v,~" dificilmente conciliáveis com a idéia de se haverem tor
nado tolerantes com a presença dos desviados,
121
dos em
maIS
mento que deve-
E a del no das comunidades miseráveis, começar a gerar pânico, levan
do as populações a adotar a prática de fazer justiça pelas próp:'ias mãos? Quem guardará os desviantes contra os vizinhos? Em face de tal questão, não seria de levar em conta, além da proteção que a instituição fechada oferece em favor da comunidade contra o desviante, o resguardo que oferece em favor do desviante contra
a comunidade? Para finalizar: verifica-se que a desprisonização, na prática,
tem mínima semelhança com o discurso liberal que a defend~ e, embora provavelmente fora da intenção de seus autores, tem.sldo usada como uma camuflagem ideológica para obter economIa de custos mascarada de benevolência e tolerância, Por certo, uma dada de liberados tem condi~~ão de volt~r a viver no meio de onde saiu sem causar traumas. Alll1al de contas, muitos daqueles submetidos a processo pelas , oficiais de controle social são escassamente distinguíveIs dos vizinhos que estão abandonados e, pois, podem ser expelidos d~s , . . - ' 'ldl'Cl'Oll,ol'S Porém para mUl-ll1stttmçoes sem rISCOS < c<, , ,_
, . . t Cl' '11 a substltUlçao da tos outros eX-ll1ternos ou mternos cm po en . c,, ., , , " de desViados ,
internacão representa um mcremento <lOS , .' h b" Com is'so se instaura um estilo neofeudal de contróle: os a}-
122
lantes de tais guetos ~o as da poHcia será não a de , prevenir ou
o crime em seu interior, mas a de evitar que transborde seus limites."33
Em que consiste, afinal de contas, o direito corretivo? Qual seu verd,ldeiro conteúdo? os curar os· mentais que praticaram fatos previstos como crimes; educar os menores portadores de desvio de conduta - trovejarão os juristas, criminólogos, psiquiatras, penitencíatistas e todos os
() é bem outro. O jogo da violência, no antigo direito penal, era jogado franca
mente: "eu tenho o poder; eu dito as regras; quem desobedecer, tratarei de triturar na roda ou esquartejar em praça pública."
O desobediente pagava com o corpo os atas de rebeldia. A violência, agora, atua disfarçadamente e, a título de amparar o insubordinado, se permite transformá-lo em objeto de um trabalho de adaptação. Como conseqüência, porque pretende "tratá-lo", arroga-se o direito de invadir-lhe o próprio eu, de alterar-lhe a personalidade, de executar uma tarefa que viola o mais íntimo de todos os direitos do ser humano: o de ser ele próprio.
"O afrouxamento da severidade penal no decorrer dos últimos séculos é um fenômeno bem conhecido dos historiadores do direito. Entretanto, foi visto, durante.muito tempo, de forma geral, como se fosse fenômeno quantitativo: menos crueldade, menos sofrimento, mais suavidade, mais respeito e 'huma-
. Na tais se concomitantes
33. REVISTA DE DIREITO PENAL, Rio de Janeiro, Forense, 27: 114-6,1980.
ao deslocamento do objeto da ação punitiva. Redução de i dade? Talvez. Mudança de objetivo, certamente.
123
Se não é mais ao corpo suas formas mai s dos
que abriram, que ainda não se encerrou - é inscrita na Pois não é mais o corpo, é a alma. À que tripudia sobre o deve suceder um que atue, profundamente, sobre o o a as disposições."34
o crime autoriza a ação punitiva, que busca a manutenção do de aI como criminoso, muito
cujo ista unia o não é mais castigo, mas alguma coisa a ser operada cientificamente em prol do condenado, desnecessário se faz apurar se infringiu a norma penal. Basta a constatação de que precisa de tratamento, e o socorro oficial lhe prestado - até pela vida toda, se for necessário.
Cada vez mais, a justiça criminal escorrega da sede judiciária para outras esferas, as quais, por serem cientificas, desnecessitam de
justificação legal para se pôr em ação:
"Resumindo: desde que funciona o novO sistema penal ( ... ) um processo global levou os juízes a julgar coisa bem divel~sa do que crimes: foram levados em suas sentenças a fazer cO.lsa diferente de julgar: e o poder de julgar foi, em transfendo a instâncias que não são as dos da A operação penal inteira de elementos e extrajurí-
dicos."36
34. POUCAULT. Michel. , ap. cit., p. 20. 35. POUCAULT, Michel. A verdade e 36. FOUCAULT, Michel. e punir, op. cit., p. 25.
ap. cit., p. 68.
124
so instâncias
do proces-
o
De resto, na medida em se com referên-de duras repressoras aos seme··
os juízes sentir-se aliviados:
lllente, damos um vcrcdito,
urn
E:
"A justiça criminal de hoje em dia só funciona e só se justifica por essa perpétua referência a outra coisa que não é ela mesma, por essa .incessante reinscrição nos sistemas não-jurídicos. Ela está votada a essa requalificação pelo saber.
Sob a suavidade ampliada dos castigos, podemos então verificar um deslocamento de seu ponto de aplicação; e através desse deslocamento, todo um campo de objetos recentes, todo um novo me da verdade e uma quantidade de papéis até então inéditos no exercício da justiça criminal. Um saber, técnicas, discursos 'científicos' se formam e se entrelaçam com a prática do poder de punir."39
o tratamento penitenciário, as medidas de seguranca a medícali-~ "
zação na execução das o emprego de métodos psico-psi-
37. leI., p. 24. 38. Id., p. 25. 39. Id., pp. 25-6.
e cl'i111l'J70.\'OS: cnles 125
de sentimentos generosos muitas vezes, que o crime é uma e que o criminoso é um
Essa forma de vcr as coisas gera duas ex!rem~r-
mente s a manutenção do status quo, razão por que merece os aplausos do sistema: fortalece a idéia ele à sociedade, para ser
falra
em extensão ilimitadas, pacificamente às normas opressoras.
ar, de maneira que reagem a se sul1n1eter
e
"A vida, meu caro é sempre mais ampla que a doutrina; a vida não é para ser espremida dçntro dos limites de nenhuma doutrina,"
"H:t na socicdnde russa quc: tcm a cnragcln úe cllfrcn!~lr o rnundo:
"N a It:í I i ,',do
rcs Marx c c toda a corrente social-democrática alemã, falam com tão profundo desprezo, Sem dúvida, isso é um erro, pois é nesse proletariado, e não nas camadas burguesas da cl asse trabal hadora, que residem toda a razão e a força da futura Revolução Social."
Bakul1in
Criminoso é: a) o indivíduo que age em contradição com a lei penai; e b) sofre oficial.
A omissão no termo b elimina a concreticidade da definição, conduzindo a um conceito ideal de válido no mundo das metafísicas.
O infrator que, por se haver extraviado em do
percurso que conduz ao claro da ordem negra não é criminoso, nem seu ato constitui crime:
127
128
que I1fío tenha sido criada lei e que se assinala nos
Por isso mt~S1110, de passagem, trabalhar com uma entida-de do { "criminosos dc colarinho branco"
a de pessoas bem e onde ocorre - a título de
ceI' rele vo par,L o exame do \10
tasia para se descartar de ver submetida a exame a
1.
"De ~mportância crítíea - embora geralmente subestimada -é que 'crime', 'o criminoso' e outros conceitos que devemos cliscutir são definidos pela organização política da sociedade. O cnme é definido pela lei e as atividades do sistema de justica cri~11lna~ (aqu~las instituições que a sociedade faz responsáveis pela l~entlfIcaça~, apreensão e lida com que se pensa tenham VIOlado a leI em parte, reguladas lei - e a lei é criação de um processo político. O legislador o dos Estados (ou se nega a político do Estado
como um corpo leis cri
dade política quando rio é também político' (no mesmo duos acusados de violar a lei. A polícia, tion, e outros órgãos
. . de. Sistema penal c sistema social: LI
crlll1lnal como de um mesmo processo. Trad. Rel'lsra de Direito Pellal, Rio de Janeiro, Forense, 30: 12, 19R I.
aprova
no ramo do
Por ISSO fica fáci! entender ii demon
que, mera
s, básico princípio político: o de ~l tirania dos grupos dominantes.
neutros
129
indivíduus yc/cs nem a
~lS inferio-risco um
das estas quer pela lei, quer de da ci negra. fnexistem diversidades ontológicas entre condutas criminosa e
não-criminosa. Também não se encontram divergências essenciais entre criminoso e não-criminoso. O dado distintivo entre tais categorias decorre, exclusivamente, de uma visão axiologicamente dirigida e
parciaL' A explicação do comportamento criminoso nada tem de diferen-
te da relacionada com o comportamento não-criminoso. Como acentua J amcs T. Carey, porque as pessoas agem como o fazem e porque certas condutas são definidas como criminosas, consubstanciam dois
problemas distintos. Idênticas apresentadas como negativas ao se I
rem a um criminoso, ganharão sentido positivo se estiverem vincula-
das a uma prestigiada pela ordem vigente.
Por exemplo: Refere Cressey que a máfia de seus membros lealdade,
espírito de equipe, honestidade para com a associação, coragem em
SILVER, lsidore. TI/e Crime-COI/Iro! Estahlishment. New Jerscy, EUA, Prcntiec
Halllnc., 1974. p. 7.
130
face da adversidade, dureza. Ora, que outras qualidades cobra uma muftinacionaJ de seus executivos?
de de luta e ausên-cia de vista mesmo à custa
e abater, ainda
de alguém: é inflexível, frio, entranh:.ls na de mas com os 'amigos, com os na hora de gastar -
indústria? Por que não de um descrição de um altruísta capitão de assaltante?
ele é
Quem assassinou maior quantidade de inde mas: o homicida famigerado ou o festejado piloto do bombardeiro de guerra?
A elevação de certos comportamentos à classificação de crimes e, sobretudo, a designação de certos indivíduos para serem oficialmente considerados criminosos estão diretamente ligadas com a hierarquização social e o esforço de manutenção do status quo que interessa às classes dominantes.
Tal circunstância, de resto, pode ser surpreendida nas comunidades mais rudimentares, como anotou Malinowskr"em seus estudos sobre as populações primitivas da Melanésia:
3. 4.
"Assim, em conexão com o meiro objeto que chamou nossa atenção - a canoa nativa se nos depararam a lei, a ordem priviléaÍos definidos e um bem desenvolvido sistema de , b
"4
"Seja lá como a maneira em que funciona, é uma rnaneira de o statlls quo, um método de Íne-
R io de Janeiro, Graal, I p. lO7. Broníslaw. CrÍme ond Custom Ín London,
Baul, J 978. p. 21 ..
qualidades novas."s
A
e impedir a
opressoras; a das massas
outras
criminosa, de da luta
as
':No mais lato sentido, pode-se afirmar que todos os crimes são crimes políticos, uma vez que todas as proibições com san-ções penais representam a defesa de um dado de ou de no o social
Reitero a declaração que abre o livro: trata-se de uma reportagem.
Em face da circunstância, fornecidos os dados resultantes do trabalho investigatório, incumbe deixar à elaboração de eada um as conclusões a tirar. Seria eu desastrado se quisesse fechá-lo por meio de opinativas colocações pessoais. .
Nada impede, porém e acredito até que faça parte da técnica jornalística -, terminar o relato com alguns tópicos provocadores e desafiantes, os quais devem estar codimentados por exposição desordenada, incoerente e, às vezes, contraditória. o toque excitante, sem o qual inexiste reportagem que se preze.
I
o incremento da onda de crimes ou a modifi-das estruturas sociais·
The Politicai Criminal. New York, The Free Press, 1974.
132
o cOllletil11cnto de (kli
nürÚL 1i
lC~t lnu
llLilmcnh: (k'l1omillada
/\ '\mda 1 rallsf
estas_ 0\1
numa
limitar-se i\ idéia ele p:lssdr do
o
hierarquizada ou
manter-se sem serú viável abolir a
Mas não é a
deve ser visto como ":llivid:ldc ()-
nesta nossa
) " d
quem bc
iS!:l P,lril () soei
de que tipo hoje, conceber uma socie
sem estar dividida em ou dividida cm
, classista ou hierárquica que inve/]-
11
Sem istência elas entidades crime e criminoso se tem
mostrado parel a da ordem social vigen--te, Além das razões s ao longo deste caberia chamar a
para as alinhadas sinteticamente a seguir:
Juarcl. Ciril1(J dns, A mdicu/. Rio cie Janeiro, Forense,
os ('!"!núnnsos? CrinIC e crirniJloyos: enTes' 133
fll nc i Oiwr COllH)
cI iní'crioll's_ cri m I1()S(h, A di CUSJO
de mesma classe,
dimenlos de urn cotidi:H1() concentram sua assim qualifi pela
cu
tos por C,lUsa exige tratamento c
-- o si s í e rn {l
natureza aos clcmen-
134
A que se pode pedir socorro nesse mister? A burocracia, naturalmente. Como a burocracia do Estado sai mais barato para as camadas
do que a da indústria e todos contribuem, os custos ao de sorte a a maior pmcela da imensa miJo-ele-obra da de colarinho e gravata.
E que ficar a ue burocráti-
III
Reconheço a funcionalidade que o crime tem representado para o
no futuro? Üu o nosso tempo é o momento')
Com respeito aos criminosos classificados como "políticos" ou "propriamente políticos" ou "políticos reconhecidos como tais pela ordem oficial", o Estado industrial aperfeiçoou e aguçou sua resposta, tanto que vem obtendo vitórias e sucessos no seu enfrentamento. Somente quem não tem "olhos de ver" deixa de perceber a neutralização a que estão condenados os movimentos revolucionários tradicionalístas, como os partidos comunistas ocidentais ou os dissidentes da China. De outra parte, as que optaram pela luta armada foram destroçadas - v.g., grupo Baadcn-Mcinhot", Brigadas Vermelhas, Exército Simbíonês, Tupamaros, Sendero Luminoso.
Em contrapartida, a criminalidade apelidada de "comum" ou "ordinária" só fez e só faz aumentar, em quantidade e violência, sem que se encontre fórmula - sequer esperança de fórmula - apta a lhe estiolar o desenvolvimento.
Em que consiste o fator de diversificação dos resultados colhidos pelo sistema na contra o crime" numa e noutra
sabe está em que, à o busca o combate no terreno nas que favorecem o Üs "cri-
, recrutados em maioria da classe média para cima,
135
necessitam burocrática e tecnicamente para
Ora,
menos do ponto dc vista
caracterizam-se as elo banditismo comum con-industrial de tra a ordem social. positivamente, o
ausência de vocação para - quanto mais para pelejar __ nas áe:uas ela anarquia. Aliás, não será este oceano "o único túmulo
digno cl~ um almirante" técnico-burocrático? Ponco i se o mel
caso, mitente contra o status qilO. Por isso, é político c por isso é tratado politicamente pelos detentores do poder. Vale lembrar: a História se
constrói tanto de atos quanto de fatos. Com referência a acontecimentos afastados da realidade em que
estamos imersos, que podemos contemplar a uma distância sl:ficic:lt.e para permitir uma visão razoavelmente descompromissada, fIca facIl compreender a questão. Quanto às tropelias dos bandos de ros, pelo fim do século passado,):1o interior do Nordeste: por exel~plo, a maioria de nós, moradores dos centros urbanos elo fmal d~ sec~lo
. aÍlrmatIva provavelmente sem malOres a
de que:
eles travavam uma luta de classes. lnconscientemente, não
mas uma luta de classes. 10
No que dias de
10. Rui. Brasileira, 1978, p. 166.
que, ao
nas metrópoles nos estuprar, matar,
5. cd. Rio de Janeiro, Civil
136
, destruir, dallific~lL :tm Irm·'ando illilU II/lu de
dO cnco:,{ar u carro para ir ,íllillla minha mul () de: lcmo cncontruc () P;lraibínha ou o POS,\O lido ÍLico do
() CjU;t!110 cunLÍu!a dos tílti
Os sitiados começam a sÍti;lr?
de ousadia.
S;lO outros, agora, os que vive:m dos por
aos vadia.
lhes
vai a noite e
II. Ic!, ib.
é rico. pois o povo decbrado guerra de extermínio."11
li
diria
JSS\),
clus j)t1T11cirus, sou
cobrada por um
atrás de
(os
Teles: fOlllcccr um último
(JS criJniJ)()sns? Cri!}!(' e crinlino,)'()s: eliTes 137
dado ú medi! que :l1'recadei reiterada com 1111-
!1USOS margll1,lls quc tem marcado minha vida -- dado que costunw l'iclr ('b:-;clI do na quem prcleciui1(\ subre
haVl'r )IlVér~;;\ alxcrLt clin:ta com
Ao PCl1S;L sobretudo no concernente
aos donos de !idade í!1te CD t re a morte o a tal
ia" que caracterizaria () dos criminosos não jJ"S",:1 de cen..:brina nascida do :-;ellSO cumum ntclcetu,lÍs. Com uma
LI falar o
indivíduos urna detcr-ordem social da s6
i nl~r
até seus ó ilustres cm uma VIa de
e haverão de mentos que os vão deixar estupcfatos.
eonseguirão entender o que lhes parece irracional cm seu como, por exemplo, por que ceream a prática da sub-
património alheio de uma constel de alos nada na aquisição dos
torná-los mais vulnerúveis ú perseguI , causar e maj()r severidade elos que o roubo funciona, apenas, car explosões de confronto enraivecido contra um sistema que teima em lado de fora de suas amcnidades.
O criminoso não é não é besta não é fera insen-sível, nuo nenhuma di qmlllto a outro ser humano - afora a indómita rebeldia o leva a lutar contra os com crueldade a crueza com é desde () vcntrê ela llÜle.
A de acerca da plebe que fez rebentar a Revolu-
merece ser lembrada:
138
"Porque há 25 milhões deles, a quem, contudo, nós agrupade obscura unidade compendiosa, monstruosa
mas de hei ou mais humana-'as
ver8s que dadc delas tem o seu com a sua pele e se a
acha-se coberta
... que cada unidade dessas massas é um hornem milagroso, exatamcnte como tu és; lutando, com visão ou com cegueira, pelo seu reino infinito (esta vida, que ele pU5sui uma vez só, no meio elas , com unn centelha da divi aquilo que tu alma imortal, dele!
um o governo, lidar estas massas; mesmo o único ponto e problema de governo, e todos os outros pontos meras ninharias acidentais, superficialidades e golpes de vento! Porque digam o que disserem as cartas de privilégio, o uso e os costumes, a lei comum e a especial, as massas contam uns tantos milhões de unidades; feitas, segundo todas as aparências, por Deus - a quem, como se proclama, pertence esta Terra. Alem disso, o povo não é isento de ferocidade; tem nervos e indignação." 12
* Bem, agora é fazer bom proveito da reportagem; ou desprezá-Ia;
ou marcar o palpite na loteria da História de que marchamos para uma (salutar?) cambalhota
12. CARL YLE, Thomas. História da Francesa. 2, ed. Trad. Antonio Ruas. São Paulo, Melhoramentos, 1961, p. 44.
I
"iVCSle,\' ccnútério\' gerois Juí l!!Orte iso!tu/o
Indefiro o arquivamento a Fundamentou-se o ilustre em que "os
em estrito cumprimento do dever legal e não é curial que sobre eles palre , em nada contribu para o combate à violência e entrave ao aumento de criminalidade", concluindo, afir-ma que "denunciar estes ais é o mesmo inibir a atividade
de aís que arriscam suas no combate ao cri me", Injustificável, sob lodos
1\1 i de propor. na
do sistema
do sistema punitivo. são em a sua danosa e a sua ínfima social devem ser desde
reconhecidas e Isso não ocorrer, de matar julgamento, é bom que se
141
142
dever de matar. Marques:
E no processo do Júri, pela de da
" o cumprimento de dever legal. Salvo no caso de
guerra ou revolução, nem ao soldado não pode ser reconhecida a justificativa. Tampouco ao agente da autoridade pública, ou ao policial em serviço. Quando há resistência à ordem legal de prisão, cabe ao executor usar dos meios necessários para defenderse ou para vencer a resistência, consoante o disposto no art. 292, do C PP. Evidente é, no entanto, que matar não se encontra entre esses meios necessários. A ocorrência de homicídio, em casos dessa natureza, pode encontrar jusfificativa na legítima ou no estado de necessidade, nunca, porém, no estrito cumpri-mento de dever legal" (Tratado Direito Penal, pp. , v. 4).
que a própria versão dos policiais não se apresenta nítida nos autos. Afirmam todos monocordiamente, que a foi
durante a troca de tentou fuga, invadindo as de Manoel Alberiques e senhora Mirian Wanderley Oliveira sendo encontrado em um terreno
ocorre-a entrar correndo cozinha e o muro (fls. A vítima,
crimino.yos? Crilne e crinJinosos,' elites 143
fugindo quando foi atingida. Observe-se que o cfetuado da direita para a de diante para trás e de baL\.D para cima
localizando-se a ferida de entrada "na metude direita da frontal, a 15 mm da causa do io direito" e a
O tórax na linear de tonalidade avermelhada.
do auto de exame aliada ao que se vê no laudo de local indica, sem muita di
21 - o corpo caído ao muro --, que a vítima, tentava
pujar o muro ao ser ati ., . _ . de ser ificada como marglllaJ, a Vitima nao pOSS'Ul
qualquer anotação em sua t'olha penal (fls. 78). E Manoel Alberiqu~s (fls. , cuja filha era noiva da vítima, informa que a conhecJa "desde idade", tratava-se de pessoa traba e que "nunca
) 'l ,j(, a conduta da vítima, S( ti lL L 00
que a casa"
A conduta dos pol militares extravasou, bem se os limi-tes da sua atuação legai, empregando força não consentida a pretexto de ter encontrado resistência. O policial, como qualquer cidadão, deve reagir quando é agredido injustamente. Tal circunstância, p01:ém,. deve ficar exaustivamente demonstrada através do processo constltuclOnalmente estabelecido para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.
Saliente-se, ainda, que, mesmo no Código Penal Italial1~ ~~mo se sabe, de inspiração fascista -, que prevê, no seu art. 53, a Just:flcativa autônoma de "1 'uso legittimo della armi", exige-se a necessldade desse uso, respeitando-se o princípio da proporcionalidade. .
Acolhendo as lições de Manzini, Bataglini, Bettiol, MaggIOre, Antolisei e Pannain, o professor Heitor Júnior, abrilhanta o Ministério Público do Estado do Rio, disserta:
"Adotando o ensinamento da melhor doutrina, , . dência não encon-data que a matéria a maXJlna pru .,
trando o uso de arma por de que . 1 ~ ou morte do a ocaSIOnar esoes venha
salvo a de excesso ausente outra forma de lograr a captura, por
144
\10 do leu!!
11 qUt~:
'~ir o [unbito udcntc ê
i'unciuil;írio o preso que , so porque leria <1 C(inclellií-lo á morle Ídto da o que seria m011S-truoso,"
\)'
autores dos disparos sequer do
desde ciais -já
i na condUla dos poli-
A poJ dever que lhe
lizar o tradicional
o
um cidadãos.
em heróis -, como se vê na s, "homicídio -- estrito cumprimento de dever
deixou de lavrar o auto e sequer deu-se ao
de res
em f1a-
ver e , instalando o medo e a insegurança nos
que as vítimas desse o o homicídio no
am, quase sempre, cidadãos das classes marginalizadas e
no sern e para
São os deserdados da lei, nascidos para cumprir um desti-sobre os quais se por isso
reeer instrumento'
de
com o
o ilu Promotor de
do tipo, sem que, com ela
l.
o na
minaI da Comarca da tal - I Silva.
o
145
icial em de
146
Filho, sob o fundamento de que inexistiu crime na ação que do estar com-
da favela nesta cidade,
ao vislumbrarem três em atitudes suspei deles tentaram se aproximar, ocasião
em que f~ram recebidos a bala, travando-se, então, cerrado tiroteio. Os ll1ch
disparavam seus
da da
das meninges" (fls. 48v.).
Tangentemente à matéria fática, baseia-se o Dr. Juiz fundamentaln:ente,. no depoimento do ManoeI Alberiques que 'informa ter ouvIdo. d:sp~ros após a vítima entrar correndo pela porta da sala de sua res~dencla, sair pela cozinha e galgar o muro (fls. 37).
Dla.nte desta ~ssertíva, e considerando que o disparo fora efetuado de baIXO para CIma (fls. 48v.), o ilustre Dr. Juiz, invocando o laudo d~ .10caI (tls. 21/31), conclui que tudo - verbis - "indica, sem muita dI.fIc,:ldade, que a vítima, provavelmente, tentava pular o muro ao ser atmgJda. "
mente, o ún ponto destoante do Inquérito reside no n:o.men,~o em que os tiros foram trocados, dado que enquanto os poli-CIaIS ailrmam que a vítima adentrou pela d S' M'~ I ' . . o 1. dnoe apos o tJrotelO, este afirma que o mesmo Ocorreu "minutos
que ~~ versão policiais também neste ponto 1~1ere-Em se prevalecesse a narrativa Sr.
da o fato
com
silo os crinú!1o'\'{),)' Crime e crinú!1o.l,'os: entes
existência de qualquer disparo, durante ou ter a vítima passado sobre seu Ímóvel.
Por outro do Dr. Juiz no sentido de que a vítiar o muro ao ser atingida" não nos
([ WIW porque, como teriam e a duas porque a vítima tombara - verbis --
ii abertura destinada ao ão", não razoável admitir-se tivesse ela por pular U:ll cerca de
mo tinha a seu ele local, fls. 21
uma de cerca ele
111, e fundamentalmente em face do que se contém no rito policial, parece-nos devidamente comprovado nos autos terem os policiais agido em conformidade com o Direito, na medida em que
escorreita o anjUI
~lr que para a propo-situra de ação penal reside na presença de elementos de convicção indicadores da autoria e da existência de conduta adequável a tipo penaL Estes elementos, contudo, devem referir-se não apenas a wn fato aparentemente típico, mas, sobretudo, a uma ação penalmente reprovável. E, se tais elementos indicam que a conduta questionada se posiciona ao agasalho da sistemática jurídica, não se h;:1 que cogitar de deflagração de ação penal pelo Ministério Público, ainda que presente a de tipícidade.
Demais, no entendimento de que a mecânica de ade-do fato à norma incriminadora deve processar-se com
não apenas aos formais do tipo, mas em conta, também, o subjetívismo da conduta cogitada.
Pesem, embora, respeitáveis posicionamentos em contrário, temos que a pretensão de se retirar do tipo qualquer alcance do tivo, consoante o magistral Mezger em seu tipo em estrito On
Ein Lehrbuch), em à simpli-ficada de Beling, em seu Die Lehre von deve ceder passo ao campo vale dizer, ao necessário do da conhecimento este que há de se operar simultaneamente à pesquisa da norma
148
C1SOS, tratou
ico i'nsltu desc!1vol-
mio do cntendimento bjJjdadc da doutrina que faz a torno
na
ricdadc com o da tc, se assinalou.
o em face do que
verificando que o caso em tela encerrava ta com o direito de causa
acerto, se houve o Dr.
te,
a admitir, da descriminantc e da o certo é
entre o Magistrado e o Promotor de Justiça quanto a doutrinário não servir de óbice à concessão da
nada havendo que o o reconhecer que LI hipótese melhor se à exc!udente rotulada por defesa do que a invocada pelo Dr. Promotor de J llstiça.
os crÍIIl/nn.'-:os? Criuu) (' Crillli!loS(l.\: cn/es 149
de seu divCf<;;lS outras cOllsi-
Enlclltk n Ilustrc d\) Tr: hu 1 do
do proccsco L'omu a fasc da in~;tru
Promotor de . entretanto, o culto colega
por da lei cm caso de fuga strado trecho do citado autoe em
\'crbis -- "Ampliar o âmbito da exeludcme c
assim, ainda ise judicial. É a institu
Não vemos como se possa éldmitir os cis que parte de uma
150
que são responsáveis pela justiça criminal não pode murchar e secar, e atrofiar-se".
A aI
penal, deixou de fazê-lo por entender que os elementos do inquérito indicavam terem os policiais agido ao amparo de causa excIudente de antijuridicidade, portanto, em perfeita harmonia com o direito.
Com o arquivamento, não pretendeu a homologação 'da arbitrariedade e da violência policiais', nem a 'legalização da impunidade', incompatibilizando-se com os princípios do 'Estado de Direito Democrático' .
Ao contrário. Com o arquivamento, o que e violência contra os transformando-os em que
quando foram recebidos a bala por Cely e seus companheiros, transmudando-se de vítimas de tentativa de homicídio para autores de crime doloso contra a vida.
Com o arquivamento, a Democrático', porque a e isto não mereceu a
a descabelada e até abusiva con-tra quem as peças informativas nada revelaram em termos de mento pela ausência de do face a ope-rância de causa excludente de
i51
não ter sido
Rio de Janeiro, 9 de janeiro de 1981
Evandro
As:;ístenle do ProclIrudo/"-Geral dli
"APROVO O PJiRECER ..
Rio de Janeiro, 28 de janeiro de 1981
Nelson Pccegueíro do Amaral Procurador-Geral da Justiça"
"
II
*
em que diz estarem todos revoltados com o fato de não terem independência no acompanhamento de inquéritos, apesar de ingressarem na carreira por concurso público.
Segundo a mesma fonte, a revolta aumentou depois do afastamento do inquérito e posterior assassinato em Recife do procurador
Jorge de Melo e Silva, o denunciante do escândalo da mandioca, mas a queixa contra a falta independência é antiga. O procurador Osvaldo por exemplo, afirma estar lutando há 10 anos contra a censura que o procurador sofre na redação do seu parecer.
e
Ele diz que "a censura além de quem o parecer, tem o condão de embretá-Jo, submetendo-o ao aprovo ou não de uma única pessoa, que passa a ser censor e juiz". pessoa, segu.ndo Degrazia, é o procurador-geral da Repúhl nomeado e SUjeIto a ser demitido a qualquer momento pelo idente da
Maria Tereza. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 14 mar. 1932,! cad .. p. 3 ..
152
Em Nova Lei
deve ilibada".
saber
te da Assoei Nacional dos Procuradores da República, Henrique que a classe está revolta
a morte do
um milhões. Os cinco procuradores confirmaram que não é a que um integrante do Ministério Público sofre pressões.
Banco Cidade
Outro episódio recente também envolv~ um escândalo financeiro. início do ano passado, a Polícia Federal concluiu um inquérito que apurou de fiscal e remessa ilegal de dólares para o exterior, a partir de um clandestino ligado ao Banco Cidade, que funcionava em São Paulo, sem autorização do Banco
A partir do momento em o inquérito chegou à Justiça Federal, a procuradora Márcia Dometila de Carvalho passou a pedir providências ao Banco Central, para que entrasse nas à Receita Federal, para a obtenção de provas dos crimes de fiscal.
Desde o da República na época, Firmino Ferreira chefe do Ministério Público em São Paulo, Benevídes de Carvalho, para que afastasse a procu-radora do inquérito. Este fato foi denunciado por Célio de Carvalho,
154
sou ir n São Paulo afastar
o ue a denúncia dos v no
lbrahim Abadi -resolver o caso o
nitivamente.
o outros mornentos de tensão. Foi o
e
bl v
recebeu a incumbência de emitir parecer no processo em que a União, por intermédio da Funai, e o Grupo Slaviero (indústria e comércio de madeiras) disputavam a propriedade da reserva pinheiral de Mangueirinha - 7 mil e 200 hectares de terras cobertas de araucária brasiliensis - área avaliada em mais de Cr$ 3 bilhões.
Logo que o procurador manifestou o entendimento de que era da União a propriedade da reserva, um colega seu informou que ele estava sendo pressionado por Firtnino Paz a dar parecer em favor do Grupo Slaviero. Para adiar o parecer, João Serra Azul tirou líeença e disse que esperava a de Firmino Paz para assumir o cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal, o que só veio a acontecer em 1981.
No final da parecer contra informação na L.1J\JL,ct.
tava: "O está entre a cruz e a o processo sobre a
Carlos CoI iDe] Uni
lum Eo
ou dava um Ao
Guimar?ies ao parlamentar aproveitara um programa partidária para fazer declarações acusando
no entanto, o
não
155
na
e, Ulisses
o a divulgar doutrina
o Govemo@ftprátíca de a
cil
construída para vale dizer estamos com excesso populacional da ordem de 3.800 homens.
públicas do interior, estão recolhidos 7.200 homens, em excesso populacional, que deveriam estar recolhidos a presídios da Secretaria da Justiça, mas presídios que não existem.
Não vamos apontar falhas e culpas do passado, até porque isso não resolve o problema: vamos constatar uma realidade que existe, e que pode ser detectada através destes números.
Há um excesso populacional, portanto, da ordem de 11 mil só na área da da Justiça.
Sabendo-se que uma
depende uma tipicamente izada, e de alto custo, para o número de 500 presos
vamos relacionar este recentes que o Estado de São Paulo está -', as penitenciárias de Pi uí e de Araraquara, com capacidade para 500 cada uma, portanto, o total de um mil, custaram ao Estado a soma global de 200
de ou 200 bilhões de antigos.
PIMENTEL, ManoeJ Pedro, Brasil Rotório, jul. 1976, pp. 30-1
156
,\'ào os critninasos? CrinlC e crhuil1osos: 157
Vale dizer que, para 200 milhões de de lima vaga em
mil cruzei o custo da que da mil dó]
que um emprego industrial cria 10 empregos i retos, é rentável, que o custo maior de LI vaga de pre-sídio é inteiramente ocioso da
Este de 22 para cada uma,
morreu, nl,lS
mento bem grande, de mais de teríamos ainda válidos para C:1l11-
prir em São Paulo 30 mil mandados de prisão, o qU,e der~andana a construção de 60 penitenciárias para 500 presos a razao de 100 milhões de cruzeiros cada uma. . '
Se todo o orçamento do Brasil fosse colocado a servl~o dess~s construções, como solução tradicional do problema do cnme, n~s ainda não teríamos resolvido o problema, porque os mandados de pnsão crescem à razão de um mil por mês, demandando construção de duas penitenciárias por mês, o que se fosse possível, em termos económicos, não seria possível em termos de con em termos de engenharia.
"A litação penitenciáría."
v
Para os criminalistas estrangeiros, que vêm encarando a Suécia como um laboratório de reforma experimental do sistema presidiário, o fracasso das tentativas de reabilitação, na Suécia, tem minado seu empenho em exercer pressões no sentido de obter uma legislação cri-minal de caráter reabilitador nos seus próprios países.
desolador", disse um visitante, perito em prisões de um país do Oeste da Europa. "Em meu país, ainda estamos na Idade Média, se compararmos a assistência que se aos detentos na Suécia. Mesmo nas melhores oportunidades nos é difícil convencer o governo a prestar melhor assistência aOs presidiários. Atualmente há um clamor crescente por lei e ordem, e nós nem podemos citar os suecos como excmplo e argumento para nossa causa de um tratamento
liberal para os presos."
Há 3.300 nas qual for o dia do ano - um número
de habitantes. que possui somente
das penas é de 100 dias.
NEW YORK 1972.
"~fJUUU~,""v por O Estado de S(IO Paulo. São Paulo. ouL
158
.\'ÜO os criJllino:·;os? C~rifl1e e crinúnosos: entes
Todos os prisioneiros têm quartos individuais que aparentam alojamentos de universitários -, sendo 'o termo cela recebido com repulsa.
Sem
condenados a penas inferiores a um ano é enviada a sem muros ou cercas, e os conde-nados manter empregos, o dia, nas cidades próximas.
distante 120 quilômetros ele Estocolmo, os detentos recebem salários ao mercado de trabalho "lá fora" ou podem freqüentar escolas. Essa prisão-albergue oferece inst~l.ações para banhos de sauna, natação, esquiagem e espaço para a pratica de
Estocoimo -, há mais nos campos cional, psiquiátrico e de treinamento profissional do qu~ ~m ~stabelecimentos semelhantes situados em outros países. As pnsoes lechadas preparam, ainda, visitas conjugais pelo menos uma vez por semana_ e concedem uma licença mensal de três dias para todos, com exceçao de alguns poucos presidiários de alta periculosídade.
É rara a violência nas prisões. Quase não se ouve falar de ataques homossexuais. Os guardas, desarmados, teriam de chamar a polícia 10C'ál em caso de ocorrer um improvável motim.
Um funcionário do presídio de Norrkoping relatou a ocorrência de uma invasão de um grupo armado que libertou um detento. m que conseguiram entrar", disse ele, "nós não pu~emo.s nada:.a não ser ficar parados e assistir à fuga do preso no mtenor ~e ~lm cau.o
Foi bom que os não portas~em armas, pOlS ISSO tena aumentado o risco de vida eles."
A tolerância do sistema sueco é, em um reflexo do baixo índice de violência criminal. Somente 1 das 10 mil que
são cona,en f1 °O passam de tos, e os u.
violen"J sso
ser icado fato de tensões raciais e étn~cas .em uma sociedade tão homogênea como li nossa", disse Lars Bolm, dlre-
tor do de trabalho c treinamento da Admi
cede
sediado cm "Isso em guerra por
uma arma de tenciárias também pro-
há muito aceita - com acentuada-- de que conden:\dos deve ser dado tra-das últimos anos iriam pro-
as mais da da e nos Estados Unidos.
Central dos Presidiários, que de reivindicações que
nhou
é dirigida por toda a
solí-
tra-balhadores.
Embora não esteja ansioso por ver a organ emergindo como um sindicato com plena capacidade, Henrik Martinsson, que preside a Administração Nacional de Presídios, requereu salários equiparados - determinados pelo mercado para todos os detentos. Esse sistema já existe em diversas instituições. São também tomadas medidas visando manter os condenados em prédios próximos a :;uas
a fim dê' que mantenham seus e no sentido de lhes possibilitar a obtenção de emprego tão Jogo am postos em liberdade.
Interpretações Diferem
Por que, então, o alto índice de retorno à prisão? Entre de detentos que tinham sido condenados ante-
riormente - entrevistados por funcionários e críticos - muitos concordaram em que a sociedade sueca, tanto quanto qualquer outra,
de ex-presidiários. Afora esse consenso, as v,<,,",,,,-,., diferem amplamente, e o fato parece perturbar
I ao processo criminal.
en/es 161
"A maioria das os como se todos nós andássemos com máscaras em nossas faces e com
, disse Lasse líder da Central dos Presidiários. "Os Não i dificuldade em obter empregos."
nd, que está detido em manifestou que no seu entender "as
têm tremenda
sües são bastante aceitávei , mas certamente não dissuadem do crime", e disse: "Você se habitua à vida do Não acho que as prisões possam reabilitar a maioria das Qualquer reabilitação
principalmente, dos vínculos do recluso com a sociedade lá
atual sentença deve-se a diz que abandonará o crime para isso".
por roubo· ua
por fraude. Aos 47 anos, ele "porque estou ficando velho demais
Programas Ineficazes
Urn detento norte-americano, cumprindo pena de anos e meio por introdução de narcóticos, disse que julga os programas de reabilitação empregados na Suécia tão ineficazes como os que se empregam nos EUA, onde também cumpriu
"A grande diferença, comparando-se a Suécia com os é que os indivíduos aqui são muito passivos", explicou. "Não há aquela raiva e violência que se vê nas prisões norte-americanas. Aqui, eles
muito bem convencer os detentos de que a vida na não é tão terrível assim. Dessa forma, isso é um simples parque de di versões."
"Veja esses indivíduos", ele continuou, apontando para um grupo que passava. "Todos eles já estiveram aqui anteriormente.
deles já estão inclusive planejando voltar. Eles não têm mais nada lá rara."
162
acreditam que as tido mais sucesso na reabil
se infiltr~lll1 nas prisões, através de . E temos éstado totalmente
para o Somente há pouco tempo foi aberta a primeira instituição peni
tenciária para tratamento de presos viciados, em caráter voluntário.
rela-
de progt-amas de levou os tanto os ligados como os desligados do sistema, a insistir em que as prisões sejam usadas somente para proteger a sociedade dos criminosos mais violentos. Henrik Martinsson, diretor do sistema penitenciário, disse que gostaria de ver algumas prisões desatívadas e uma redução de 50% na população carcerária, fazendo com que pequenos furtos, roubos sem uso de armas e o crime de dirigir sob embriaguez sejam punidos com I11uItas ao invés de reclusão.
Jar! antigo do nou um importante crítico das instituições
das sejam abolidas e que o desenvolvido em contato com a sociedade indivíduo a exercer maior
Conservador, que se tor-
a fim de obrigar o em público. "Nós
de mais burocratas. mas uma rede de vo-
insistem na abol do sistema - exceto das classes ricas. bastante
163
do fato da violência criminal, tais críticos têm até um culto de personalidade, romanceado, em torno dos mais conhecidos Em
a csse Clark Olofsson, um como um dos mais
com sas, e tornou-se de um
de caráter biográfico.
e tem suas cartas e publicados com I 1 t·e '1111'\ ,c> outra Ele já L.uas vezes, uma (U1'an c ( '-'
mediante arrombamento da "Enquanto eu for não haverá outra forma de eu me aturar que não seja pela ca de atos
minosos", escreveu artigo recente, apresentando uma
"..c'.'~'" para te r .
Na maior parte dos países desenvolvidos do Ocidente, as tentativas de recuperação de criminosos têm sido abandonadas se não na teoria, o foram na prática -,- numa tentativa do governo para contraba
as severas reclamações do público, alarmado com a escalada do crime e a superlotação dos sistemas penitenciários.
Nos Estados Unidos havia mais de 283 mil detentos nas prisões estaduais e federais no início do ano um aumento de 13% errt rela-ção a de 1 Os membros do têm repetidarnente ouvido denúncias de superpopulação, instalações, lon-gos períodos de espe~a por julgamento .e
Mas os leglsladores estaduais,
substancialmente a Na Grã-Bretanha, um projeto de lei aprovado em julho estipula
de prisão composta de dois O cumpri-maior ele
uma
pena iria dis-
da principalmente
164
maiS
o governo ampliando os horários de IÍvros
está que em
para terroristas e criminosos iberdade 10 mil condenados
para muÍtos crimes IncnOS
um uma de .reformas, inclusive
permitindo que os detentos ha e methor;~() ti condi
para reabllllar uma popu
10.266 - Rio de Janeiro, 13 de setembro de 1977. Exmo. Sr. Juiz de Direito da Vara de Execuções Criminais do Estado do Rio de
Janeiro. Os abaixo-assinados, peritos encarregados do exame de srmidade
mental em FRANCISCO DE SOUZA PEIXOTO - RG nº 88.562 -
dão a seguir o laudo respectivo. IDENTIFICAÇAo: -- FRANCISCO MARIA PEREIRA DE
SOUZA PEIXOTO ou MARIA PEREIRA SOUZA PEIXOTO ou FRANCISCO MARIA PEREIRA DE SOUZA, branco, solteiro, de 38 anos de iclade, nascido em 7/l /l brasileiro, natUl~al cio católico, instrução secundária, internado no Manicómio
Judiciário Heitor Carrilho.
O periciado vem
HISTÓRICO
submetido a exames de de 1959.
mental
neste Manicómio Judiciário a Ao todo foram 10 os exames, que se converteram em 10 laudos,
o primeiro deles realizado em 1959, por solicitação do Juízo da llª
165
166
em foi de maconha.
eis outros foram para
de
da
ele arma e
de macoo de
No primeiro exame realizado em nosso serviço os peritos, depois de fazerem um estudo primoroso da personalidade do periciado, fir-
tam. cor~clusões diversas, pois o feito em 1960 diz que Francisco Mana nao tem condições de ser posto em liberdade, face à sua deformação de caráter, enquanto o realizado em 1961 recomenda liberdade vigiada c~n: indicação de comparecer a um serviço especializado, sob responsabIlIdade de um familiar.
A primeira perícia solicitada pela 14il Vara Criminal resultou nas mesmas conclusões dos exames anteriores responsabilidade, pois os peritos assinalarri: é claramente uma ~ersonalidad~~psicopática, mentiroso, dissimulado, cínico, que atraves de uma atItude exterior estudada, procura simpatias em torno de si para melhor obter seus entretanto
delitos são todos o atual ~ produto mesmo, de uma tábua sui gene-
anormalnitidamente psícóti~
ca, detectada atual.
sâo os crilninosos? Crinie e crinlinosos: ente,')'
um especialista menos de 20 dias antes do delito
à com o mesmo forçando o sorri-so no curso do diéílogo, com o campo ideativo se limitando aos
de é vítima de tudo o que acontece no Manicômio, acusando funcionários e outros internos de serem desonestos e maconheiros, ao contrário dele que é 'homem sério e honesto'. Não tem
agressivos que nas sua de de relacionar-se ao nível afetivo. Procura superar essa deficiência através de atitudes artificiais, estudadas, de mímica, sorriso e verbalização, simuladoras de reação emocional. Juízo crítico comprometido. Memória sem alterações.
O paciente revela não se encontrar nunca triste, nem mesmo pelo fato de estar internado e condenado: 'isto é um hábito, a gente se acostmna' ... "
Termina por concluir pelo diagnóstico de personalidade psicopática com traços predominantes de caráter paranóide.
Um eletroencefalo!Yrama em 4/7/77 não revelou anor-"" malidades de bioeletrogênese cerebral.
volta a ser o psicopata de tudo e de
procura assumir ati tu-retratando-se como vítima da vida e dos demais interna-
com a finalidade de nos examinadores.
168
para rnclhúr nos convencer de que é um (ornar
n as personalidades são personalidades anormais que, por sua anormalIdade, sofrem ou fazem sofrer os outros. personalidades q:le ~empre ch~gam, em qualquer situação vital, em qualquer circunstancIa, a conflItos externos ou internos. 'O psicopata é um indivÍduo. que, por si embora não se tenha em conta as circunstâncias SOCiaiS, é uma personalidade estranha, afastada do termo médio' (K. Schneider).
não são doentes mentais, psicóticos. A expressão tamb.ém não tern mais curso. É, uma variaçüo ano1'-
mal de p~rsonalldade. Conseqüentemente, o que se h21 de fazer no que diZ respeito ao tratamento não pode ser o preconizado para os mentazs. O m,élnllsel'o e' d't"'1 " .. ". I ICI e ex] oe normas s. O que hoje quase não se bilidacte de educar, em ou pequena medida, os indi i-dade anormal no de melhorar seu caráter. Até pouco tempo a maioria dos identificava o psicopata com;} . ~~. in.divíduo para ser modificado educação e o tratamento. 111l1elpalmente ao da 'psicologia' robusteceu-se a nova atitude, adotada pelo próprio Klages ao que certa-mente os , podem ser tratados e o são: se se quer, até !)odem ser S empre que seentender como tal seu deslocamento para
silo os crirninosos 169
e
acreditam per-
tratar Contando com enormes dificuldades, de toda ordem, em todos estes anos vem procurando dar assistência a esquizofrênicos, psicóticos, maníacos-depressivos, paralíticos etc., usando as técnicas mais avançadas mercê da ultrapassagem de grandes obstáculos, como já se acentuou.
A falta em nosso meio de uma casa de custódia e tratamento tem trazido para nosso hospital nurneroslssimos psicopatas para cumprimento de medidas de segurança. Esta situ j:ll1ormal é uma das principais causas do desvirtuamento gradual dos objetivos iniciais elo manicômio judiciário.
Os psicopatas trazem problemas disciplinares, administrativos de toda ordem, q ue, com o correr dos tempos, foram enorme monta, sobrepujando os demais. l-foje, sem medo de errar ou ser acusado de podemos fazer esta afirmação: o manicómio não cumpre suas finalidades de acordo com os mais avançados métodos da psiquiatria porque teve que sofrer no tempo uma verdadeira adap-
para cobrir a falta da casa de custódia e tratamento. O resultado é que os doentes mentais, sen.YU strictu, não são bem atendidos como tal, porque ainda temos que usar métodos coercitivos' rígidos veis aos É impossível LI uma casa ser, a só hos-pital e casa de custódia e tratamento.
170
Defendendo a tese da inutilidade Grulhe
"Não queremos discu!ir-- e casas de custódia tratamento
Senhor Diretor-Geral, Face conclusões do laudo de Exame de Verificação de Cessação
de Periculosidade efetuado no apenado FRANCISCO MARIA PEREIRA DE SOUZA PEIXOTO, RG. nº no Manieômio Judiciário Heitor Carrilho, onde se acha recolhido, solicito a V.Sa., determinar providências no sentido de ser o mesmo recolhido às dependênc~as penais desse Departamento, se possível no INSTITUTO PENAL CANDIDO MENDES, na Ilha
Outrossim, esclareço a V. Sa. que este Juízo, nesta data, àquele nosocômÍo, determinando a do apenado em tela a essa Diretoria-Geral. anexo, do laudo do exame do nado.
de de da
G. THOMPSON -Ao llmº Sr. Dr. AUGUSTO MM. do
VI
Alegoria (com adereços e sem harmol1ia)
Atirada para o meio do palco, a violência criminal transforma-se no objeto único da concentração de todos os projetores disponíveis no teatro. Em cena, apenas ela recebe o banho intenso das luzes. O resto é penumbra, às vezes escuridão absoluta. Surpreen?ida, ofuscada pelos faróis, sem conhecer o papel a desempenhar, a atnz estrela se contorce canhestramente, salta, uiva, range os dentes e espuma de ódio, na tentativa frustrada de romper o cerco brilhante que a envolve. Cada movimJ;mto, tragi-ridículo de que se reveste, excita enorme atenção do público e, por conseqüência, maior empenho dos donos do espetácul0 no sentido de em e singularmente.
Ora! Eis que 'quer abandonar a ribalta! Cumpre coartar tão Apertem o cerco! Que metida a
cortem-se-lhe os as mãos, dêem-lhe freqüentes .. mas não a matem! Para que a
preservar-lhe a vida, a os guinchos al.ucinantes. ':'amos, umas cutiladas a mais as cabriolas do corpo mutilado, os reverberos rubros do sangue a tam de maneira
TRIBUNA DO
acrescem em a iman-os sentidos dos
Rio de Janeiro, OAB, fev. 1980. p. 2.
172
:;Olll br~l, ill
dH -~
()
cstú ali,
posseiros da casa mais enraivecida e revolta entope as enchendo os olhos, entorpecem o lar, o rebaixamento da 1 morte, maior franquia para a tortura", seguida: "Tudo urro
na
a pena de em
num
voe ex a:;~ a essa maldita que socorJ\~m'r com , com c
das fi las primeira:; não se 11 o ] e no corpo, que rola
teia, c dú arrancos c gira, irisado no vermelho os novos agressores,
negro manto e catadura. " não O sacrifício desse trabalho cabe só a
iea atende a pronta uI malvada o olho.
risca o ar com os cotocos sangui ,) Olhd () resultado da ]oteca l ".
vol-
Em b~lslidores insuspeitados, ,d ív fi llall1lente ci1Con!t<lc!il fui
173
rall1
SlUI
muito pcns:lr, resolvera o Cllcenaremos olltra
cump;íl1!Jciros, com-
Dos delitos e das penas, Trac!, 1977.
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