as iniciativas sociais e desenvolvimento sustentável na ... · pdf fileexperiences that...
TRANSCRIPT
GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 16, pp. 87 - 109, 2004
AS INICIATIVAS SOCIAIS E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVELNA AMAZÔNIA1
Neli Aparecida de Mello*
* Doutora em Geografia e pesquisadora do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília e da UMR Territoires etMondialisation dans les pays du Sud (ENS/IRD).
RESUMO:O presente artigo aborda iniciativas sociais e as atuais condições de sua realização na granderegião amazônica, englobando as “Amazônias” dos diversos países signatários do Tratado deCooperação Amazônica. O primeiro aspecto da abordagem é a valorização das políticas territoriaispúblicas, no contexto regional, relacionadas à conservação e uso sustentável dos recursos naturaisrenováveis; a demarcação, registro, homologação de territórios indígenas; formação de capacidadeslocais e iniciativas em projetos de assentamentos rurais.Como base metodológica, a análise é fundamentada na matriz ETPR (Estado – tendência – pressão– resposta), do PNUMA e IUCN, buscando ressaltar as pressões, tendências e respostas. No entanto,antecedeu a esta, a análise das informações das iniciativas sociais, orientando-se na visualizaçãode cada projeto, dos atores envolvidos, dos meios utilizados e resultados obtidos, agregando-sea esta dinâmica os níveis e locais de realização dos mesmos.A estrutura do texto, em 3 partes, ressalta que o assunto é profundamente interrelacionado, ondecausas resultam em conseqüências as quais se transformam em novas causas. A primeira partetrata de uma caracterização geral do contexto regional e como as situações nacionais o impulsionam,analisando-se a favorabilidade ou o contexto desfavorável à situação encontrada e suas causasdiretas e indiretas. A segunda parte analisa as iniciativas efetivadas por atores relevantes e asexperiências que tiveram sucesso e as oportunidades que as mesmas puderam ou ainda podemgerar. Por último, o questionamento suscitado pela problemática da consolidação, continuidade eviabilidade política do processo.
PALAVRAS-CHAVE:Grande Amazônia , iniciativas sociais, políticas territoriais de conservação e sustentabilidade.
ABSTRACT:The present article approaches social initiatives and the current conditions of its accomplishmentsin the great Amazon region, including the various “Amazonias” of the diverse signatory countries ofthe Treat on Amazonian Cooperation. The first aspect of the approach is the valuation of the publicterritorial politics, in the regional context, related to the conservation and sustainable use of therenewable natural resources; the land marking, registration, homologation of aboriginal territories;formation of local capacities and initiatives in projects of agricultural nestings.As methodological basis, the analysis is founded on the matrix ETPR (Portuguese abbreviation of“State - Tendency - Pressure - Reply), of PNUMA and IUCN, searching to stand out the
88 - GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 16, 2004 MELLO, N. A.
pressures, trends and answers. However, preceding this, the analysis of the information of thesocial initiatives, orienting themselves in the visualization of each project, of the involved actors,the used ways and gotten results, being added to this dynamics, the levels and places ofaccomplishment.The structure of the text, in 3 parts, stands out that the subject is deeply inter-related, wherecauses results in consequences which transform into new causes. The first part describes with ageneral characterization of the regional context and how the national situations stimulate it,analyzing the tendency or the favorable context to the joined situation and its direct and indirectcauses. The second part analyzes the initiatives accomplished for excellent actors and theexperiences that had had success and the chances that the same ones had still been able or cangenerate. Finally, the issue raised by the problematic of the consolidation, continuity, and politicsviability of the process.which goes from the rural (local) to the urban (portion immersed in metropolis), passing through theindustrial (neighborhood), can not council the lived dimension.KEY WORDS:Bacia Amazônica, social initiatives, territorial politics of conservation and sustainability.
De qual Amazônia se fala? De qual pontode vista? Ecológico, social, econômico oupolítico? Fala-se aqui da região de importânciaestratégica e de seu posicionamento entre oglobal e o local. Na “grande amazônia” vivemcerca de 30 milhões de pessoas, com umagrande diversidade social, cultural e étnica, oque demanda a construção de uma visãoestratégica de longo prazo, através de umesforço integrado de todos os setores sociaisda região.
Não se trata de fazer um balanço dosvários acordos de cooperação, nem do próprioTratado, mas de ver qual o capital socialconstruído e suas reais possibilidades de ir emfrente, de superar os desafios colocados pelaglobalização e pela geopolítica. As conjunturaslocal, nacional e mundial mudaram radicalmenteao longo dos vinte e cinco anos de assinaturado Tratado. Novas institucionalidades foramcriadas. Novos atores integram o cenário. Asociedade organizada conquistou espaços deatuação anteriormente inacessíveis e agepressionando governos e estados; suapresença tornou-se pré-requisito para qualqueratividade, em praticamente todos os setoreseconômicos e políticos.
Apesar da conquista democrática,inúmeros desafios ainda devem ser enfrentados.Entre os principais desafios encontra-se anecessidade de transformar as relações entresociedade e Estado, que muitas vezes se fazemna base do clientelismo, e, acima de tudo, deformar o capital social. Nas sociedades latino-americanas, altamente desiguais esegmentadas, muitas vezes a pobreza é o únicoponto de convergência. Constituem-se, alémdos segmentos dominantes, por um conjuntode atores sociais, oriundos de diversas culturase etnias, bem diferenciados, onde grupos rurais(colonos, campesinos, mulheres, sem-terra,etc.) agregam-se aos urbanos (sem-teto,favelados, etc) e a grupos indígenascompletamente excluídos do processo dedesenvolvimento.
Outro grande desafio é o político porqueas perspectivas sobre a “Grande Amazônia”decorrem dos olhares nacionais, próprios decada um dos países. Do ponto de vista político,a determinação soberana dos países sobre osterritórios amazônicos não se discute. Apesarda nacionalização das Amazônias, alguns acordosregionais se articulam, associando, emcomposições diferentes, os distintos países daBacia Amazônica. Da mesma maneira, o
As iniciativas sociais e desenvolvimento sustentável na Amazônia, pp. 87 - 109 89
tratamento regional de alguns dos seusproblemas e de suas políticas públicas pode seridentificado. Não apenas os esforçosdesenvolvidos no âmbito do Tratado deCooperação Amazônica ou da UNAMAZ, masalgumas posições conjuntas foram definidas aolongo das últimas décadas, como bemexemplificam a Plataforma de Tlateloco (1991),os critérios e indicadores de monitoramentoflorestal estabelecidos pelo processo deTaparopoto (1995).
O novo modelo, baseado em princípios desustentabil idade, tem que se articularregionalmente. A mobilização social é requisitofundamental, assim como comprometer-se coma consolidação do capital social existente, acooperação e confiança na participação dosbeneficiários em sua própria gestão,potencializando-se o uso da riqueza ambientale cultural, fortalecendo a institucionalidadepública e privada, se transformando assim, emmecanismo qualitativo de inserção mundial.
I - O contexto regional, as situaçõesamazônicas e os desafios
O principal aspecto a ser destacado nestecontexto regional é a heterogeneidade desituações amazônicas, tanto do ponto de vistada diversidade geográfica e social quanto desua superfície. Caso seja a área da bacia doRio Amazonas e as sub-bacias de todos seusafluentes, a Guiana, a Guiana Francesa e oSuriname não são amazônicos, já que seus riosnão fazem parte da bacia, ao mesmo tempo emque parte dos Andes é incluída. Se for oecossistema a referência, a região é definidapelo domínio da hiléia amazônica, ou seja, pelafloresta tropical úmida com altas temperaturas,os Andes são desconsiderados, enquanto asGuianas são incluídas (Aragón, 2002). Dequalquer forma, há uma concordância a respeitode que a Região Amazônica constitui-se numabacia hidrográfica e em um bioma internacional,além de uma das mais importantes regiões domundo por sua alta diversidade biológica.
A Amazônia “Andina”, segundo Usselmann(2003), correspondente a toda a vertente
oriental dos Andes e difere substancialmenteda Amazônia Brasileira. Aparece muito maisdispersa e com grandes variações de altura etem sido também campo de colonizaçõesantigas, organizadas no século XIX e, maisrecentemente, por estrangeiros: no Peru, osalemães; na Bolívia, os japoneses. NessaAmazônia “Andina” ocorre ainda um forteprocesso de migração, das terras altas para osvales, dos agricultores seguindo os grandesvales e os rios que são os eixos de penetração.O movimento, acelerou com a criação e aconstrução de estradas, e atingiu tanto as terrasaltas e as capitais desses países, como tambémas cidades ou as redes de cidades recentes.Observa-se a forte ocorrência de frentespioneiras em busca de terras novas, e tambémde cultivos ilícitos como a coca que é muitoconhecida. Igualmente, a procura de outrosprodutos naturais como o petróleo e o gás puropara a exportação.
Na Amazônia brasileira, o processo demaior impacto é o de desmatamento, decorrentetambém da dinâmica de frente pioneira. Em2002, os índices de desmatamento na FlorestaTropical atingiram o recorde, tendo sidodesmatados 25.500 km², sendo esta a segundataxa mais alta desde o início dos anos 19902 .Apesar de serem inúmeras as causas dodesmatamento, há amplo reconhecimento deque a expansão da fronteira agrícola, conduzidapela produção de soja e criação de gado, é umade suas principais causas. Isto pode serreferenciado pelo aumento de produção destaoléoginosa, no mesmo ano, que atingiu níveisrecordes, com aumento de produção, em relaçãoao ano anterior, de 40 para 50 milhões detoneladas. O significativo impacto ambiental degrandes extensões ocupadas com monocultivoscomerciais se dá em detrimento do ambientenatural amazônico e das populações tradicionaisregionais com conhecimento e práticassustentáveis. A Amazônia Legal Brasileiraoferece vantagens competitivas fundamentadasnas vastas extensões de terra a preços baixos,uma fronteira agrícola muito dinâmica e umaambiciosa política de infra-estrutura para drenara produção.
90 - GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 16, 2004 MELLO, N. A.
No embate do jogo de idéias, de forçaspolíticas para a escolha de modelo(s) para o seudesenvolvimento, ela se torna, espaço detensões, locus dos conflitos entre os que a vêemcomo um dos lugares-chave das “mudançasglobais” e, entre outros, que a tomam como umadas últimas fronteiras de expansão econômicae territorial. Desde meados da década de 1990,este território, em permanente construção, temsido o lugar onde proliferam experiências
voltadas para a sustentabil idade, com oaumento da governança, reconhecimento denovas territorialidades, gestão ambiental,conservação da biodiversidade e recursosgenéticos, negociações de conflitos. Mas, aomesmo tempo, lá continuam sendoimplementados numerosos programas deinvestimentos que criam condições de rápidastransformações.
As políticas do Governo Federal brasileiro perseguem duas metas prioritárias, paradoxais:de um lado, aumentar as exportações – para gerar excedentes e pagar as dívidas – e do outro,conservar a Amazônia por meio de um modelo de desenvolvimento sustentável. Na Amazôniaperuana – departamentos de Amazonas, Loreto, Ucayali, Madre de Dios - a política territorial é ade exploração dos recursos naturais do solo e sub-solo, a manutenção das comunidades indígenase a gestão de áreas protegidas. Mas, o governo peruano sempre priorizou o “povoamento” daregião, construindo-lhe infra-estruturas, implementando projetos de colonização para aumentaras superfícies agrícolas, responsáveis por um desmatamento de mais de 300 mil hectares/ano.As concessões petroleiras – um milhão de hectares para cada uma das grandes empresas –oferecem excelentes perspectivas, sendo o gás de Camisea o mais prometedor, em evidenteconflito com o cumprimento das normas ambientais, tema pelo qual se batem as organizaçõesambientalistas e indígenas.
Na Bolívia – departamentos de Pando, Beni e Santa Cruz – o processo de integraçãonacional se repetiu como no Brasil e Peru, especialmente por meio das infra-estruturas viárias.Entretanto, um ordenamento territorial baseado na proteção resultou da pressão de gruposindígenas e ambientalistas: no departamento de Beni, um conjunto organizado de territóriosindígenas se interligam com áreas de proteção formadas por parques regionais, refúgios de vidasilvestre, reserva da biosfera. Apesar da participação social neste aspecto, conflitos territoriaissão originados do processo de ocupação com a coca, produção importante para a populaçãolocal. No Equador, a Amazônia ocupa quase metade do país, com apenas 5% da população. Ofácil acesso, a partir de Quito, contrasta com as dificuldades encontradas nas outras Amazônias.A política territorial de sucessivos governos, e o apoio à exploração de petróleo e gás, quecontribuem fortemente para o PIB nacional, e a construção de oleodutos tem sido prioridade.Áreas de concessão atingem mais de 2,5 milhões de hectares, destacando-se entre elas as jazidasdo Lago Agrio, na bacia do Aguarico, contra 2 milhões para proteção e representam graves ameaçaspara o meio ambiente. As empresas privadas pouco respeitam as reservas indígenas e as áreasprotegidas. As experiências participativas e as redes de solidariedade são muito importantes noEquador e podem ser vistas como modelo para outros países. A Amazônia colombiana é a menoscontrolada, visto o grau de isolamento em relação ao próprio país. Suas fronteiras e territóriosamazônicos são pouco controlados pelo Estado e há indícios de autogestão política e de que aprodução da coca começa a se deslocar para o norte amazônico, notadamente no limite com aVenezuela. Os departamentos amazônicos de Bolívar e Amazonas, na Venezuela atualmentepriorizam a gestão dos recursos naturais, conquanto nos anos 1970 fosse a colonização alicerçadana doutrina de segurança nacional. Parques, reservas e áreas protegidas foram criadas desdeentão. Apesar disto, o ordenamento não supera o isolamento e a condição marginal do território
As iniciativas sociais e desenvolvimento sustentável na Amazônia, pp. 87 - 109 91
do Amazonas. Conflitos se multiplicam entre pecuaristas e comunidades indígenas, enquanto aoligarquia de comerciantes se beneficia do monopólio das transações com o Estado. A integraçãocom o Brasil se densifica, baseadas no asfaltamento da BR-173 (Manaus-Caracas), com a centralhidroelétrica de Guri.
Este choque de idéias reflete as condiçõesda globalização, simultaneamente econômica eambiental. As condições dos diferentes grupossociais na Amazônia não foram alteradas. Osbenefícios da exploração dos recursos naturaisnão foram socializados. Por isso, é vital continuarbuscando apoio e estímulo à continuidade dasexperiências alternativas.
Ocorrem também múltiplas visões.Pasquis et al (2003) mostrou a multiplicidade devisões, o mosaico de interesses e de propostasde desenvolvimento sustentável no Brasil. Cadaator tem sua própria definição do que é, e decomo deve ser o processo de desenvolvimentona Região. A única concordância entre os maisdiferentes segmentos sociais e setoreseconômicos é a respeito das culpas dosgovernos (federal, principalmente, e estadual).Culpa de ter optado por políticasdesenvolvimentistas, as quais destruíramrelações sociais tradicionais em função da forteimigração, pela invasão de territórios nãoreconhecidos, mas vitais para seus povos; porter incentivado novos habitantes, comconhecimentos, costumes e práticasinadequadas ao novo ambiente; por terincentivado a migração, sem as condições deinfra-estrutura para a produção.
Também à exceção desta unanimidade,outra, mais conceitual foi identificada: todos ossegmentos se autodefinem como construtoresdo novo modelo de desenvolvimentosustentável. Para os produtores de soja epecuaristas, desenvolvimento sustentável é tercondições de escoar sua produção. Osmadeireiros consideram o manejo florestalinteressante, mas muito exigente e, portanto,inviável. Haveria que ser mais flexível, mesmoque, na realidade eles não cumpram o que foiprojetado. Para os governos locais, o interesseno desenvolvimento sustentável está articuladoà viabil ização de novos recursos, com
investimentos externos. E assim, poder-se-ialistar indefinidamente todos os segmentospresentes.
No âmbito do movimento social, aabordagem dos princípios de desenvolvimentosustentável que se queira, está estritamenterelacionado ao seu modo de vida: os indígenasainda reivindicam fortemente a demarcação deseus territórios; as cooperativas demandammeios de produção e de comercialização;associações ambientalistas priorizam, entreoutros requerimentos, por formas sustentáveisde produção ou pela conservação de áreas ede recursos naturais.
Conquanto o setor público se debate comuma capacidade extremamente restrita, asempresas madeireiras estão inseridas na cadeiade produção da madeira, dispondo de meiospara comercializar seus produtos e possuirm umrelativo conhecimento do mercado.
Na Amazônia Andina, as empresaspetrolíferas praticamente não têm cumprido comas legislações existentes em todos os paísesda região. É o resultado de um sistemaeconômico destrutivo do meio ambiente quefacilita licenças de operação, sem considerar osprincípios humanos e sociais básicos dos povosindígenas. Há companhias petrolíferas nosterritórios Huaorani (província de Pastaza,Equador) e já foram autorizados váriasconcessões: Petroecuador, 14 a Vintage; 16 aRepsol-YPF; 21 a Kerr MacGee; 31 a PérezCompac. Os impactos são bastante complexos,considerando-se as práticas habituais deassistencialismo, divisão, cooptação entrecomunidades, povos e organizações. O objetivode reduzir ou superar os conflitos é fundamentalpara assegurar as garantias do novo território,como as de proteção da natureza. A presençada vida humana, dos representantes dos povos
92 - GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 16, 2004 MELLO, N. A.
indígenas, tem contribuído para que promoveruma melhor forma de superação de conflitos.
I.1 - O contexto, o conceito e os métodos
A compreensão do que seja iniciativasocial exige a retomada do conceito de capitalsocial.
O conceito de iniciativa social e os métodosde estudos.
Não há consenso acerca do conceito decapital social, seja no âmbito da academia, sejano das instituições. A CEPAL (2001) consideracapital social como o conjunto de relaçõessociais baseadas na confiança, comcomportamentos de cooperação e reciprocidade.Para diversos pesquisadores como Fukuyama(2001), fundamenta-se em valores quepromovam a cooperação social. Norman Uphofflembra que o capital social é uma reserva (stock)que produz um fluxo de benefícios e uma açãocoletiva mutuamente proveitosa. GuilhermoSunkel, complementa o conceito de Durston,Robison, Siles e Schmid e considera que o mesmoinclui a participação em redes, a reciprocidade,a confiança, as normas sociais, a pró-atividade.Vê o capital social como uma visão positiva dacapacidade para superar as limitações dapobreza; como uma premissa que permite oestabelecimento de critérios orientados aofortalecimento da integração social. Putnam, umdos maiores pesquisadores do tema (in Couto,2003) considera que o capital social écaracterizado pelo grau de confiança existenteentre os atores sociais de uma sociedade, asnormas de comportamento praticadascoletivamente e o nível de associativismo. Esteselementos são considerados a riqueza e afortaleza do tecido social interno de umasociedade. A coesão, os componentes quepodem resistir aos embates de interesses noprocesso de desenvolvimento.
O capital social é, portanto, subjetivo. Sãovalores e atitudes que influenciam as pessoasque se relacionam entre si e tem capacidadepara resgatar a cultura local e reproduzi-la deforma dinâmica e a beneficio de todos.
Inúmeros outros autores poderiam serrelembrados, adotamos para fins deste estudoo de Anthony Bebbington, que admite o enfoqueprincipal que se refere às organizaçõescampesinas nos processos de intensificação daprodução agrícola, o uso de recursos eestratégias de vida. Considera que o capitalsocial está fundamentado nas redes sociais enas formas associativas da sociedade civil, epode ter efeitos nas funções do mercado egovernamentais.
Portanto, alguns aspectos do capital socialestão relacionados com a capacidade específicade mobilização de grupos de determinadosrecursos e com redes de relações sociais. Sãoestes comportamentos que permitem o ganhode poder das ações orientadas a incrementar,a capacidade de mobilização de um grupo,expandindo e fortalecendo o alcance das redesnas quais os membros de um grupo participam,promovendo a cooperação deste grupo comoutros, mediante a conexão de suas redes.
Além da diversidade de conceitos quevem sendo estabelecidos para definir capitalsocial, em algumas instituições multilaterais,como o PNUD, inclui-se a definição de ativosocial. Considera-o como o resultado eficaz emultiplicador dos investimentos das políticaspúblicas ou privadas de caráter social e se opõeá prática de obtenção de resultados apenaspassivos e compensatórios. O ativo social é oresultado que gera produtos alavancadores dedesenvolvimento, com garantia de retornohumano, social, econômico e ambiental para asgerações futuras, pautado na dignidade e najustiça social.
Quanto ao método, optou-se por analisariniciativas voltadas ao ordenamento territorial,assentamentos humanos e assuntos indígenas,destacando entre eles o zoneamento ecológico-econômico, a conservação e o uso sustentáveldos recursos naturais renováveis, a diversidadecultural e os direitos territoriais indígenas, oapoio às capacidades locais, projetos emassentamentos rurais. A análise adota aseqüência estado / tendência / pressões /respostas da matriz da IUCN.
As iniciativas sociais e desenvolvimento sustentável na Amazônia, pp. 87 - 109 93
II- As iniciativas
Experiências valiosas, resultantes dadiversidade cultural existente na América Latina,estão sendo construídas. A análise a seguirpauta-se na matriz ETPR e considera asiniciativas sociais realizadas por diferentesatores na região amazônica, as organizaçõesnão governamentais e governamentais,comunidades indígenas e outros tipos decomunidades locais e suas redes, setor privado,cujos recursos podem ter tido origem emdoações ou empréstimos, por agências decooperação bilateral ou multilateral, ou aindaem fundos nacionais setoriais. Essasorganizações são partícipes em debatesrelacionados aos temas amazônicos,transformando a maneira de fazer política econstituindo equipes governamentais, ouconcorrendo a cargos eletivos. Sãorepresentativos de segmentos sociais locais(indígenas, extrativistas, seringueiros, etc.),cooperativas de pequenos produtores que seunem a ambientalistas locais, nacionais einternacionais criando um espaço denegociações. A organização e participaçãodestes grupos sociais em processos políticoscontraria grupos dominantes e os potencializacomo atores principais do desenvolvimento.
a) EstadoA situação da participação social é
bastante diferenciada no contexto de AméricaLatina. Com a consolidação do processodemocrático não há um só Conselho (federal,estadual ou local) que não inclua a sociedadecivil, a qual, depende, no entanto, de apoiofinanceiro para sua mobilização.
A descentralização se constituiu em umadas reformas políticas mais presentes, sejaporque resultam de processos internos dedemocratização dos sistemas políticosnacionais, seja pela pressão de organismosinternacionais, seja por ambos. Em vários paísesa descentralização administrativa trouxe em seubojo a participação social. Em países como oBrasil, Bolívia, Peru e Colômbia essa reformaprosperou em alguns setores como o deserviços, os relativos à gestão ambiental,
deixando às localidades parte de suascompetências. Os resultados deste processosão muito diversificados e, dependendo dacomposição dos governos locais, da importânciado setor florestal na economia dos municípios,origina contradições e conflitos.
A transferência de responsabilidade pelagestão dos recursos naturais foi conseqüênciaindireta do processo de descentralização,resultou parcialmente das lutas regionais paraassegurar que as regiões florestais sebeneficiassem do aproveitamento da madeira,e, foi também uma resposta ao crescenteconsenso internacional a favor da maiorparticipação local em manejo de recursosflorestais (Kaimowitz, 2000).
Na Bolívia, as leis de Participação Popular(nº 1551) e de descentralização administrativa(nº 1654), regulamentaram o procedimento departicipação das organizações sociais. Elasforam reconhecidas como Organização Territorialde Base (OTB), tanto as comunidades indígenas,campesinas, sindicatos agrários ou comitêsurbanos participam dos “Comitês de vigilância”para fiscalizar as ações dos prefeitos e conselhosmunicipais e sobre o uso das finanças. Adescentralização induziu modificações nocentralismo do Estado. Formularam-se políticasflorestais departamentais, impulsionada pelatendência internacional de promover maiorparticipação comunitária no manejo de recursose na gestão das áreas protegidas. Em 1996aprova-se a nova lei florestal (nº 1700), queestabeleceu o “regime florestal nacional”, quepermite concessões a companhias privadas porum período de 40 anos, renováveis a cada cincoanos. Manteve-se o direito exclusivo dos povosindígenas na exploração dentro de seusterritórios, assim como dos proprietáriosindividuais, dentro de suas propriedades.
No Brasil, União, Estados e Municípios sãoconsiderados membros da Federação e possuemautonomia para elaborar suas Leis Orgânicas.Cada nível de governo possui os três poderes,e pode criar Conselhos com participaçãopopular. Castro (1996) ao analisar o processode descentralização, iniciado em 1988 no país,considera que o mesmo reverteu a tendência
94 - GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 16, 2004 MELLO, N. A.
centralista do regime militar (1964-1984) e vêmpromovendo o fortalecimento financeiro deEstados e Municípios em decorrência datransferência direta de responsabilidades erecursos federais. Em vários setores, comosaúde e educação, a descentralização é efetiva.No entanto, quanto à gestão local dos recursosnaturais a mesma é incipiente, se debatendoentre interpretações diferenciadas dascompetências administrativas e osdesinteresses locais (Mello, 2002). Nãoobstante, a difusão de experiências realizadaspor ONG’s e cooperação internacional vemalterando gradualmente este processo: asmesmas requerem, em seus programas, oenvolvimento das municipalidades na gestão deseus próprios recursos. Estas foram estimuladasa constituir secretarias ou departamentos demeio ambiente, em suas estruturasgovernamentais ($$$ poderia vir o mapa dosconselhos brasileiros). Mas, em função dosistema federativo, as políticas estaduais sãoextremamente variáveis e suas estratégias,diretrizes e prioridades podem apontar emdireções opostas.
A participação social mantém-se entrealtos e baixos. O nível de institucionalização dasorganizações sociais brasileiras éextremamente variado, indo desde o mais baixonível de organização à estruturas profissionais.Contudo, cerca de 70% funcionam com menosde U$ 10 mil por ano, só um grupo de eliteacessa o circuito internacional e os fundospúblicos. Quase não há relação ou apoio com osetor privado, há falta de confiança entre ambosos setores.
Esta situação parece repetir-se, nocontexto dos outros paises amazônicos e nãose distingue enormemente da brasileira.
No Peru, o Directório Ambiental (2003)elenca 193 organizações ambientaiscadastradas e executoras de projetos em Limae 191 nas províncias.
A participação vem decrescendosensivelmente e está reduzindo o seu poder deinfluência (Crespo, 2002). Em 1992 eramaproximadamente 2000 organizações chamadas
de ambientalistas, das quais 1450 participaramdo Fórum de ONG’s durante a Rio 92. Em 1995,apenas 725 ONG’s e 260 agênciasgovernamentais ambientais de controle efiscalização. Elas estiveram presentes naconstituição do quadro legal: lei das águas(1997), lei de crimes ambientais (1998), códigoflorestal; Agenda 21 (+ de 500 ONG’scontribuíram, lideradas pelas ambientalistas).Em 2002 apenas 430 ONG’s estariamparticipando em Joannesburgo. Suasabordagens se caracterizam pelo:
i) Foco temático das ONG’s na AgendaVerde baseada na proteção dabiodiversidade, uso sustentável da água,educação ambiental (nesta houve umprocesso de feminilização da temática). Háinclusão de temáticas voltadas para osproblemas urbanos e dejetos. Para elas, osproblemas mais sérios são: a)desmatamento e queimadas, b) dejetos esaneamento, c) contaminação das nascentese poluição da costa. Uma agenda que setorna cada dia mais complexa (OGM, pobreza,etc).
ii) O sócio-ambientalismo é poucocontraditório, pois considera que aconvergência beneficia apenas o movimentosocial tradicional. Ocorreu um grandecrescimento na institucionalização dasnetworks: Mata Atlântica; pró-Cerrados, GTA,Rios Limpos.
iii) Há uma comunidade ambientalistasegmentada em setores de negócios,movimento social, setor público. Encaram umambientalismo de resultados e a justiçaambiental.
A cooperação internacional ainda tem sidoum dos pilares da descentralização da gestãoflorestal para Estados e Municípios amazônicos,especialmente através do PPG7 (SPRN) e doPNMA (PED), que permite a adoção de novasestratégias para enfrentar os problemasambientais, por meio de parcerias entregovernos (federal, estadual e municipal), o setor
As iniciativas sociais e desenvolvimento sustentável na Amazônia, pp. 87 - 109 95
privado e a sociedade civil. Da mesma maneira,os Fundos setoriais: o Fundo Nacional de MeioAmbiente, e uma série de fundos para promoçãode biodiversidade, dentre eles o Funbio, criadocom recursos do GEF e administrado pelaFundação Getúlio Vargas, os novos fundoscriados pelo Banco Axial. Para a América Latina,o Fundo de Biodiversidade da América Latina,criado pelo Internacional Finance Corporation doBIRD é um dos balcões de financiamento. Noentanto, quando o financiamento chega, ospaíses têm que se adaptarem às guidelines dosdoadores (Alemanha em primeiro, Canadáproeminente, USA).
Outra estratégia que se repetiu pelaAmérica do Sul, com financiamento do PNUD eBIRD, foi a implementação de foros popularespara a elaboração do Plano de DesenvolvimentoLocal Sustentável (PDLIS). Um balanço de suaimplementação mostra saldos negativos epositivos: alguns municípios transformaram oplano em sua política local, com resultadosconcretos; outros se serviram do mesmo comoespaço de oposição aos governos locais,bloqueando realizações. No Brasil, um dosprogramas nacionais que incentivou aparticipação popular na elaboração de políticaspúblicas foi o Comunidade Ativa (nos doismandatos de Fernando Henrique Cardoso, entre1995 e 2002).
Além das estratégias governamentais,uma das maneiras de convencer asmunicipalidades a investirem no setor florestalé por meio de acordos de cooperação.Geralmente as ONG’s são os atores mais abertose aceitam, ou até mesmo procuram, trabalharcom os governos locais. Estas organizaçõesprestam assessorias a projetos alternativos dedesenvolvimento e promovem atividades deeducação ambiental e capacitação técnica afuncionários municipais. As empresas privadastambém mostram interesse por este tipo decooperação desde que signifique oportunidadesde negócios. Algumas municipalidadesdesenvolvem projetos de reflorestamento eimplementação de sistemas agroflorestais comempresas madeireiras privadas.
Apesar da atribuição às municipalidades(Lei nº 9985) tenha atribuído o poder de criarunidades de conservação de uso sustentável ede proteção integral, a criação de ReservasFlorestais Municipais é pouco utilizada pelosprefeitos municipais no Brasil. Na Amazôniabrasileira, vários projetos foram apresentados,normalmente por grupos de base quedependem da floresta para seu sustento, maspoucos foram os resultados concretos, visto quehá uma predominância da influência dos setoresdominantes da região (madeireiros, pecuaristas,etc) que vêem os extrativistas e pequenosagricultores como obstáculos à expansão desuas atividades. Normalmente há oposiçõesmunicipais à criação de parques nacionais oudemarcação de terras indígenas, comargumentos de que as mesmas impedem o usoprodutivo da terra e o crescimento econômicolocal. São conflitos territoriais de uso queenvolve distintos níveis de governo.
b) Tendências
Pode-se considerar que a década de 90foi o período áureo da expansão e influênciadas idéias ambientais, de desenvolvimentosustentável e de participação. Novos atoresparticiparam na definição de políticas,reivindicando, mas, especialmente definindonovos modelos por meio de experiências locais.Lançaram idéias que recolocam localmente aspreocupações mundiais sobre o meio ambiente,desenvolvimento sustentável, proteção dabiodiversidade, das florestas, do patrimônionatural.
Ampliaram-se os discursos a favor dapreservação, da conservação e do usosustentável. As políticas nacionais ganharamvisibilidade com a definição de prioridadeestratégica para a resolução dos problemas dedegradação do meio ambiente e de mudançados modelos de desenvolvimento. A participaçãosocial nos processos decisórios foiexponencialmente estimulada depois da(s)ditadura(s), ampliando o poder de influência deatores diversos, desde sindicatos rurais ou
96 - GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 16, 2004 MELLO, N. A.
urbanos, associações comunitárias eprofissionais, indígenas e campesinas.
Ao contrário de todas as expectativas, noBrasil, por exemplo, dois fatores políticos maisglobais conturbaram profundamente a nascenteação do capital social: a util ização domecanismo de medidas provisórias pelaPresidência da República e a utilização dodiscurso da sustentabil idadeindiscriminadamente. Esses fatores têmprejudicado, colocado uma cortina de fumaça,em iniciativas que realmente poderiamcontribuir para modificar o status quo, osmodelos de desenvolvimento que incorporaterras novas, sobretudo em áreas de floresta,sem atribuir-lhes seu real valor. Mesmo asatividades mais impactantes, como a exploraçãoseletiva de madeira, o avanço de áreas deplantio de soja, ou de pecuarização estão“convencidos” de que promovem umdesenvolvimento com sustentabilidade.
Outras dificuldades se agregam,colocando em questão a real viabilidade demudanças mais amplas e significativas.
Diferentes estratégias têm sido traçadaspara a utilização do mesmo território, pelosgovernos nacionais da Grande Amazônia. Deum lado, continuam sendo implementadaspolíticas de ampliação de infra-estruturaseconômicas. De outro, separadamente, aspolíticas de inclusão social e de gestãoambiental, não considerando as conseqüênciasde uma sobre a outra.
Estas tendências indicariam que osespaços destinados à conservação eexperimentação de modelos sustentáveisestariam destinados a competir com os espaçosde produção intensiva que estão sendointegrados pelo avanço capitalista. Nestacompetição, os espaços de preservação sereduzirão a ilhas isoladas, que poderão serinvadidas para a posse de terra ou mesmo paraa apropriação dos recursos naturais, comoocorrem nas áreas protegidas da Mata Atlânticaou dos Cerrados brasileiros.
As experiências, políticas e açõesdemonstrativas que estão sendo geradas como
resultados de programas ambientais sãoprocessos extremamente lentos, que cobremsuperfícies menores, e são vistas apenas comoalternativas, criando dois modelos deorganização espacial: experiências marginaissustentáveis em poucos locais, por vezes,integradas aos mercados nacional e local, emmuitos casos com recursos, tecnologias e formasde gestão também internacionais, enquantooutras áreas, sobretudo as produtoras de soja,são inseridas na competição do mercadomundial.
Na Bolívia, as regulações florestaisocorrem simultaneamente ao processo dedescentralização, com a transferência demaiores responsabilidades para as autoridadeslocais, embora muitas etapas como o sistemade fiscalização em florestas públicas e controleda exploração ilegal continuem sendoresponsabilidade do governo central, mesmoque haja uma certa participação das Prefeituras.Várias atividades foram transferidas aosgovernos municipais e regulamentados algunstipos de unidades florestais: as UFM (unidadesforestales municipales, em 1997), que garante orecebimento das patentes florestais, caso omunicípio as instalem; assim como asassociações sociais do lugar (ASL) podemdesenvolver operações florestais em pequenaescala, em até 20% das florestas públicas. Aomesmo tempo, muitas vezes ocorremsuperposições de demandas (Unidadesflorestais municipais) com áreas definidas pelaReforma Agrária (INRA).
Avanços e dificuldades se intercalam: adescentralização desencadeou um intensoprocesso, no nível local, de mobilização derecursos e capacidades vinculadas à gestão derecursos florestais. Líderes locais (indígenas,camponeses / colonos) têm concorrido a cargoseletivos.
Da mesma maneira, a população podeparticipar do planejamento do investimentopúblico e da fiscalização do gasto. Isto forçouum processo de negociação com grupos antesmarginalizados pelas elites locais, muitas vezesdefendendo as demandas territoriais de gruposindígenas. Pode-se dizer que a descentralização
As iniciativas sociais e desenvolvimento sustentável na Amazônia, pp. 87 - 109 97
tem apoiado indiretamente a conservação(ainda que esta não seja sua meta explicita).Por outro lado, se a elite local tem interessesna produção de forma não sustentável, quequerem aceder às áreas florestais para extraçãode madeiras, o efeito pode ser desastroso.
A lenta implementação das políticas degestão florestal e diferentes tipos de conflitosde uso, também contribuem para as dificuldadesreais de mudança de modelo. O processo dedelimitação e determinação do apoio financeiropara as reservas municipais é lento eburocrático. As associações carecem dehabilidades administrativas e contábeis paraadministrar eficientemente; os produtorescarecem de uma tradição associativa. Pode-sedizer que a formação de capital social ainda éinsuficiente, havendo dependência de apoio, deassistência técnica e financeira da cooperaçãointernacional e de projetos florestais com ONG.
c) Pressões – Ameaças
Um dos perigos da descentralização paraos setores de conservação e uso sustentáveldos recursos naturais renováveis é a tendênciainequívoca de que a prioridade é para ummodelo de desenvolvimento de curto prazo, quenão privilegia a manutenção dos ecossistemasem pé.
O forte componente político do setorambiental, ao envolver a participação dedistintos grupos sociais, ao colocar emquestionamento a forma de acesso aosrecursos, intensifica os conflitos de interesse,com fortes repercussões locais. Os dirigenteslocais são, muitas vezes, representantes dosinteresses econômicos dominantes ou estão aeles associados, traduzindo-se em umageneralizada falta de vontade política depromover a gestão florestal ou mesmo oordenamento dos territórios. Suas políticas setraduzem na pressão a instituições de créditopara a agricultura e pecuária; no empenho embuscar assistência técnica em agências federaisde fomento e pesquisa, em incentivar aprodução que coloque em marcha o comérciode insumos e equipamentos agrícolas.
A Amazônia brasileira se distingue comoa última fronteira de expansão, como o último“reservatório” de terras e de recursos naturais.O avanço agrícola e florestal é simultâneo: amadeira é usada à medida que se incorporamnovas terras para a agricultura e pecuária.Segundo Vianna (1999) a expansão da fronteirase caracteriza por três cinturões simultâneos:o madeireiro, o da pecuária e finalmente, o dasoja, um, efetivamente contribuindo para ainstalação e consolidação do outro. Nestecontexto, o discurso de proteção e usosustentável dos recursos encontra respaldoapenas junto a grupos excluídos do processodominante. Pode-se caracterizar, assim, umcírculo vicioso no processo de degradação:primeiro, chegam as madeireiras, que retiramas espécies de maior valor e empobrecem afloresta, em seguida, estas terras são ocupadaspela pecuária, ou apenas pela rizicultura, que“amansa” a terra, e, num terceiro momentocomeçam a produção de grãos, a soja emparticular. Aos poucos esta terra foi exaurida(agrotóxicos, erosões, perda generalizada dabiodiversidade, etc) obrigando aos produtoresum novo deslocamento, mais longe, onde asterras possuem ainda baixo preço. Retoma-seo mesmo ciclo da destruição.
As políticas públicas de infra-estruturapossuem, ainda, maior poder econômico e demodificação territorial, ambiental e social. Osantigos programas Brasil em Ação e AvançaBrasil se caracterizaram por marginalizar, aindamais, o setor ambiental, ao reduzir seuorçamento a menos de 6% do total deinvestimentos (Mello, 2002). No PPA 2004-2007esta tendência é contraditória: praticamente asmesmas grandes obras descritas no AvançaBrasil continuam sendo previstas, ainda que oPlano Amazônia Sustentável (PAS) dopresidente Lula, tenha acenado a cinco dosEstados amazônicos em um “redesenho”institucional visando superar a dispersão,desconexão e conflito entre diferentes políticase projetos e, acima de tudo colocando apopulação como centro dos investimentosgovernamentais na região. Esse Planopromoveria o “desenvolvimento ambiental com
98 - GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 16, 2004 MELLO, N. A.
inclusão social”, servindo-se do conhecimentoda população como a base do desenvolvimentoregional. Dessa maneira, aprovou acontinuidade do Programa Amazônia Solidáriacomo forma de luta e solidariedade contra aexclusão. Como há contradições entre o PAS eo PPA, ressaltadas por deputados da própriabase de sustentação do governo, seránecessário, na revisão do PPA.
Implantadas estas obras e modelizando-se as tendências, deverá continuar aincorporação de novas áreas com o desperdíciode recursos naturais. Repetindo-se o processocom as mesmas variáveis, é bastante provávelque a pressão, tanto sobre novas áreas, aindapouco alteradas, como em regiões onde asdinâmicas de ocupação do espaço já resultaramem modificações dos ecossistemas amazônicos,seja ainda mais intensiva. A relação custo-benefício é mais vantajosa na incorporação denovas áreas da floresta nativa, pois o custo dederrubada da floresta primária é mais reduzidoque o custo de limpeza das áreas de capoeirasou de áreas que já se encontram alteradas. Istosignifica novos desmatamentos, voltados,sobretudo para a produção da soja, movida peladinâmica do mercado internacional.
A produção de soja tem como destinoprincipal o consumo animal e, portanto, interfereno consumo mundial de carnes. O complexoprodutivo está organizado de maneira muitoeficiente e envolve uma grande diversidade equantidade de atores, observando-seclaramente que não se trata mais apenas deuma cadeia produtiva. É preciso considerartambém atores sociais, econômicos e políticosque não estão, necessariamente, diretamenteenvolvidos na produção e comercialização dasoja. Cada ator tem um papel essencial e umpeso específico no funcionamento na cadeia. Aprodução do grão é apenas uma da série deatividades que foram se desenvolvendo paraapoiar essa dinâmica: indústrias, traders,empresas de pesquisa, estruturas logísticas,revendas, corretores, empresas deplanejamento agrícola, bancos, empresas deinformações... Impressionante o número de
atividades desenvolvidas assim como o impactoeconômico nas regiões produtoras.
Na Amazônia Andina, os perigos e riscosligados à exploração petroleira têm sidodenunciados freqüentemente. Destaca-se quea valorização desta região ocorreu após adescoberta destes recursos não-renováveis.Infelizmente há coincidência territorial quantoà localização das jazidas e a de terrasindígenas. A sociedade está mobilizada, masas políticas emanadas do Estado“desenvolvimentista” colocam em risco umasérie de áreas declaradas como protegidas: aReserva faunística Cuyabeno, criada em 1979,no Equador. Da mesma maneira as comunidadesindígenas de nacionalidade Sionas e Secoyas ea comunidade Kichwa de Zancudococha yBocana Del Cuyabeno. Na Bolívia, a Reserva daBiosfera e Território Indígena Pilón Lajas, oParque Amboró y el Madidi. A gestão das áreasprotegidas enfrenta uma série de conflitos, poisas empresas dirigem-se aos mais altos escalõesde governo para aprovar os projetos deexploração sísmica, de dutos e de exploraçãopetroleira dentro de áreas protegidas eterritórios indígenas, buscando se reduzir aomínimo o cumprimento das exigênciasambientais e sociais e sem respeitar os planosde manejo ou zoneamento. O gasoduto Brasil-Bolívia também é objeto de contestação pelospovos Chiquitanos e Ayoreos. Outros gasodutostambém são objeto de contestação: no Peru,paralelo ao rio Marañon e a política degasodutos transcordilheira, da SOTE (Sistemade gasodutos transequatoriano) do Equador.
d) Respostas
Apesar da força econômica dominante edas inúmeras dificuldades já relacionadas,concluir que não há possibilidade de mudançaseria impedir que o próprio capital socialconstituído se exprimisse. Os avançosidentificados, ainda que sejam marginais, nãosão poucos e são altamente significativos parao prosseguimento das mudanças.
Podem-se buscar alternativas para asdificuldades financeiras ou de gestão. Os
As iniciativas sociais e desenvolvimento sustentável na Amazônia, pp. 87 - 109 99
Na Amazônia Boliviana, Pacheco (2001) ressalta que o processo de municipalização e departicipação popular, em implementação desde 1994, conseguiu alguns resultados. Um estudorealizado pelo CIFOR, em parceria com o projeto BOLFOR, o CEDLA e a Fundação Terra, comrecursos da USAID mostrou:
1) Florestas: aproveitamento seletivo com quatro espécies (mara, cedro, roble, ochoó)representou 60% da madeira produzida entre 1985 e 1996;
2) Desmatamento: uma taxa anual de 0,4% entre metade dos anos 80 e a metade dosanos 90 em função da agricultura mecanizada, principalmente soja, ou outros cultivos deexportação; a expansão da pecuária e a agricultura em pequena escala;
3) estrutura fundiária: demandas indígenas chegam a 22,3 milhões de ha para seremreconhecidas como terras comunitárias de origem (TCO), dos quais cinco milhões têm potencialflorestal. Cerca de três milhões tinham sido tituladas até início dos anos 2000.
4) Apesar dos PLUS (Planos de uso do solo), realizados sob a responsabilidade dasprefeituras departamentais, em escala 1:250.000, serem obrigatórios, não são suficientementedetalhados para as necessidades municipais. Maior esforço foi da prefeitura de Santa Cruz(meados dos anos 90) em conjunto com a porção norte dos municípios Santa Rosa e San Carlose apoio da GTZ. O Projeto de Manejo sustentável dos recursos naturais (MASRENA) continuou otrabalho, alterando muito pouco os esforços desenvolvidos anteriormente. Até 2001, MASRENAapoiou 5 municípios na formulação dos PLOT (Planos de Ordenamento Territorial): Cabezas,Yapacani, Santa Rosa, San Carlos e Charagua.
5) cConflitos fundiários e de gestão no estabelecimento de novas áreas protegidas pelosgovernos municipais. Há superposições de áreas indígenas e áreas protegidas. Há restrições àsatividades madeireiras, que acabam se mantendo dentro da ilegalidade e da informalidade.Com a consolidação do Sistema Nacional de Áreas Protegidas (SNAP) os governos municipaisencontram uma realidade difícil de ser revertida frente a grupos de interesses locais, mas acabampor tentar obter alguns benefícios com a atração de fundos externos e de cooperação técnica.
Entre seus diferentes resultados se destacam os fortalecimentos institucionais do setor, adefinição de abordagens ambientais e sustentáveis, o crescimento da qualidade e do volumede comercialização de produtos madeireiros e não madeireiros; o apoio à certificação florestal,à criação das UFM e a gestão pelos ASL, o apoio aos planos de manejo florestal nos territórioscomunitários de origem (TCO). Cursos de capacitação, manual técnicos e assistência técnicatambém fizeram parte do Programa, assim como o sistema de alerta de incêndios florestais e omonitoramento do desmatamento entre 1993 e 2000.
O BOLFOR continua. Sua nova fase se estrutura em 3 unidades: apoio ao setor público,ao setor florestal comunitário (ASLs, TCOs, etc.) e unidade de pesquisa florestal aplicada. Aestratégia para o desenvolvimento integral da floresta amazônica, estudo que destacabasicamente as possibilidades de comercialização dos produtos amazônicos e destinado àorganismos financeiros. Este programa foi de fundamental importância para a política depreservação da Amazônia boliviana, por meio do manejo florestal sustentável e proteção dabiodiversidade.
governos locais podem mitigar a falta derecursos com a associação a atores externos,organismos de outra esfera de governo,organizações não governamentais, agências decooperação internacional ou bilateral. Ao mesmo
tempo, a conjuntura local boliviana contribuiubastante: não há fortes vetores de pressõesligadas às infra-estruturas rodoviárias, não há“corredores de exportação” para a madeira, odesmatamento é menos significativo.
100 - GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 16, 2004 MELLO, N. A.
No Brasil a participação popular foiapoiada financeiramente por meio de projetosgovernamentais financiados com recursosgerenciados pelo BIRD e BID, e através decooperação técnica. O PPG7 conseguiu abrangerdiversas municipalidades da Amazônia atravésdos Projetos demonstrativos, investindo emexperiências produtivas e de manejo compopulações locais. Mais de 200 projetos foramaprovados e implementados, com metas queabordaram a geração de renda, o fortalecimentoda base de subsistência das comunidadesbeneficiadas, a utilização sustentável dosrecursos naturais e a capacitação gerencial deentidades de pequenos produtores daAmazônia e da Mata Atlântica.
A experiência do PDA suscitou a criaçãodos Projetos Demonstrativos dos PovosIndígenas (PDPI), especificamente para associedades indígenas. O Projeto de Apoio aoManejo Florestal Sustentável na Amazônia(ProManejo) e o Projeto Manejo dos RecursosNaturais da Várzea (ProVárzea) estão apoiandoiniciativas de manejo comunitário dos recursosnaturais. E o Projeto Negócios Sustentáveis estáinvestindo na viabilização de negócios baseadosno uso sustentável da biodiversidade brasileira.
Outro Programa que contribui paraexperiências diferenciadas e com a participaçãoda sociedade local foi o PNMA, com doisfinanciamentos do Banco Mundial, um em 1991a 1996, e o outro a partir de 2000, através dosprojetos de execução descentralizada. Estespequenos projetos visavam o manejo e autilização de produtos não madeiráveis, aimplementação de sistemas agroflorestais.
A presença de movimentos sociais bemorganizados e articulados constituem umimportante balanço de poder frente aos grandesinteresses econômicos existentes sobre aregião e afetam as políticas municipais.Obviamente os estratos mais pobres dapopulação enfrentam imensas dificuldades paraeleger seus representantes. Isto quer dizer quemuito ainda resta a fazer. É preciso investirpesadamente na formação e capacitação dessaspopulações. Só assim elas poderão ter acesso
ao governo municipal para apresentar suasdemandas e, para que as mesmas possam seratendidas é necessária ainda maiororganização, pois um movimento forte é umcontrapeso ao poder excessivo dosgovernantes, mas é preciso não esquecer quequem tem o poder legal e político constituídosão os governantes e podem, se quiserem,bloquear iniciativas de grupos sociais de base.Outro fator que determina o rumo das políticasmunicipais é a relação entre níveis de governo.Independentemente da filiação partidária, todomunicípio recebe as transferências estaduais efederais.
Outras formas de resposta foramrealizadas pelo Centro de Extensão Humanitáriae Intercâmbio Intercultural (CHOICE) que, hámais de 20 anos vem realizando mundialmenteprojetos de desenvolvimento comunitário, quese iniciam após demandas das comunidades. Aidentidade social e o acesso a recursos sãoessenciais para um efetivo funcionamento social(Mayfield, 2003). Um dos bons resultados desteCentro na Amazônia ocorreu na Bolívia com oprograma “Mi Escuelita”, visando o ensino dehabilidades para a sobrevivência das criançasnos povoados rurais.
III - Experiências bem sucedidas eoportunidades
É impossível falar de experiências bemsucedidas sem falar no crescimento das redesde solidariedade e das redes técnicas. Aevolução das redes não se fez sentir apenasna forma de sua expansão capilar, deorganização, mas também na alteração do seuperfil. A cada dia elas se profissionalizam maise mais na prestação de serviços, com aincorporação de profissionais com altaqualificação. Elas têm assumido não apenas opapel de assessoria junto a instituiçõesgovernamentais, especialmente da áreaambiental, mas também de participação nagestão de projetos e programas.
Bebbington (2003) considera exemplosde comunidades da Bolívia, Peru e Equadorcomo “ilhas de intensificação sustentável”, onde
As iniciativas sociais e desenvolvimento sustentável na Amazônia, pp. 87 - 109 101
os círculos da pobreza, degradação e migraçãoforam transformados em círculos virtuosos. Paraele, os círculos sinérgicos de organizaçõessociais promovem o crescimento, a acumulação,a intensificação e a recuperação de recursosdegradados. Esse processo tem tido maiorinfluência em regiões pobres, onde a construçãodo capital social vem sendo muito incentivada.
Pesquisadores, peritos de cooperação eagências ambientais têm se preocupado emconhecer quem são, onde estão, e o que fazemestas redes3 .
As agências de cooperação, citando entreelas, a União Européia, os institutos de pesquisafranceses e britânicos, incentivam projetos deidentificação das mesmas tanto quanto suasrepresentações regionais mantêm vínculosconstantes com organizações nãogovernamentais dos países onde estãoinstalados. A GTZ - Equador investe emlevantamento minucioso sobre as redeslocalizadas nos países amazônicos, conta, atéo momento, com 15 internacionais; 4 na Bolívia;15 no Brasil; 3 na Colômbia; 7 no Equador, 5 noPeru. Outros ainda poderiam ser citados. Ogrande desafio é conseguir manter todo essearsenal atualizado, já que organizações sociaispodem ser criadas da noite para o dia, bem comotambém podem ser encerradas. É quaseimpossível mensurar a dinâmica neste setor.
Redes vinculadas aos acordosinternacionais ou mesmo outras com perfil deativista como o Greenpeace, ou ainda aquelasque se consolidam por meio da implantação deprojetos. A mobilização por meio de redesamplia a capacidade de influência e investimentode muitas organizações locais. Neste sentidopode ser enfatizado, por exemplo, que asgrandes redes internacionais acabam tambémse nacionalizando, como a WWF nos mostra, comseus comitês diretivos nacionais. A IUCN-SUR,instalada em Quito desde 1991, é formada por90 membros institucionais, entre os quais,Estados, agências de governo, organizaçõesnão governamentais e filiadas, e, possui, naregião, cerca de 800 cientistas e expertsvoluntários nas Comissões. A TNC, a CI, oGreenpeace, todos eles possuem escritórios ou
representações nos países amazônicos. Comabordagens conservacionistas e dedesenvolvimento sustentável, todas estas redesparticipam de programas de conservaçãoambiental, de manejo de florestas, de recursosgenéticos, desertificação, recursos marinhos ecosteiros.
No Brasil, a Rede do Grupo de TrabalhoAmazônico (GTA), que foi constituído com cercade 120 organizações no início de implementaçãodo PPG-7 hoje possui 513 organizaçõesintegradas ao trabalho político de pressão,negociação e desenvolvimento de experiências.O PPG-7 pode ser visto como um experimento,uma alternativa multilateral, em pequena escala,de gestão compartilhada de um programa quebusca sustentabil idade. O Programa temanalisado o grau de complexidade e dedificuldade para que as experiências possam,de fato, influenciar políticas (Mello, 2002).Normalmente este é um aspecto que esta forada governabil idade dos programas,demandando esforços sistemáticos emdiferentes áreas de atuação, mas há resultadosimportantes como o licenciamento ambiental empropriedade rural, iniciado pela FEMA do MatoGrosso que serviu de modelo para as políticasde monitoramento, licenciamento e controle deoutros Estados amazônicos. No entanto, otempo de maturação é longo, e lento e osargumentos devem ser convincentes. Aexpansão das demarcações de terras indígenasfoi outro bom resultado. Iniciado com uma metade delimitar 44 áreas indígenas em 1996, oprojeto identificou 93 áreas, demarcou eregularizou 149 áreas, homologando 29 milhõesde hectares por decreto presidencial.
Um grande apoio ao desenvolvimento dasredes, no Brasil, foi o FNMA que financiou, entre1990 e 2001, mais de 300 projetos nas áreasde extensão florestal; gestão integrada deáreas protegidas; manejo sustentável da florae fauna; uso sustentável dos recursospesqueiros; educação ambiental; Amazôniasustentável; qualidade ambiental, gestãointegrada de resíduos sólidos. Foram asprimeiras experiências de financiamento Estado– sociedade civil, tanto ONG individualmente
102 - GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 16, 2004 MELLO, N. A.
como as que se organizaram nas Redes (MataAtlântica, do Cerrado, GTA, Semi-áridonordestino, Fórum Brasileiro de ONG emovimentos sociais, etc) com o Fundo servindo-se de recursos de um empréstimo do BancoInteramericano. Extremamente lento no início efuncionando como um balcão aberto de projetos,ao longo destes 11 anos o Fundo se estruturoue redefiniu suas diretrizes, passando a apoiar,ao mesmo tempo, projetos que contribuíam paraa concretização da política nacional de meioambiente, e projetos originados das demandassociais.
Redes semelhantes encontram-se nosoutros países da bacia amazônica e tornam-separceiras de organizações locais para estimularo desenvolvimento de projetos.
A iniciativa MAP (Madre de Dios, Acre,Pando), na tríplice fronteira Bolívia – Brasil – Perumerece destaque por ser um fórum de discussãoentre grupos interessados em colaboraçãobinacional e trinacional. Por ser uma região queocupa 300 mil km2, 750 mil pessoas e que poderáainda ter um incremento populacional entre46%, no Acre, a 56% em 62% no Peru e 112%
na Bolívia. Há cerca de 5 milhões de hectaresde concessões madeireiras. Em 2002,praticamente toda a madeira comercializadaresultou do desmate ilegal em Rondônia e Acre;do manejo no departamento de Pando e daexploração tradicional no departamento deMadre de Dios. A mobilização existente nascomunidades regionais objetiva a produçãoflorestal sustentável, partindo do seu potencialflorestal (madeireiro, não-madeireiro e deserviços ambientais) em benefício eqüitativo dapopulação. Mas existe insuficiente pesquisasobre as espécies madeireiras (espéciestradicionais, nobres e não tradicionais), ciclosde corte, comportamento e ecologia dasespécies. A análise integral da região das açõese monitoramento entre os três países éimportante para otimizar a atividade madeireirana região aumentando a economia local eencontrando caminhos que ajudem a minimizaros prejuízos futuros e maximizar o uso dorecurso madeira.
O significativo neste processo é quemuitas destas experiências citadas estão sendorequisitadas para servirem de exemplos paraalternativas de políticas públicas.
Na Bolívia, as centrais indígenas têm obtido mais facilmente financiamentos para seusprojetos. A Confederação Indígena do Oriente Boliviano – CIDOB é a central mais reconhecida,possuindo representações na maior parte das cidades como Cobija, Riberalta, Trinidad, San Ignácio.
No Brasil, os conflitos estão vinculados especialmente ao processo da propriedade daterra e de demarcação de territórios indígenas, quilombolas ou extrativistas. Na porção amazônicado país existem aproximadamente 400 grupos indígenas, cuja maioria já possui seus territóriosdemarcados. Apesar desse avanço, existem ainda alguns grupos que dependem desse processo.Entretanto, a demarcação não é suficiente para estancar invasões ou usos inadequados.
A diversidade de culturas e sua integração tem sido objeto de infindáveis discussões, umavez que afeta a própria existência das sociedades indígenas, suas relações com a sociedadenão-índia, no que diz respeito principalmente às interações econômicas. O modelo integracionista,sem levar em conta as especificidades de cada comunidade, tem gerado a desestruturação sócio-política e elevado o grau de dependência dos índios em relação a bens que eles não têm comoproduzir em relação às tecnologias, em detrimento de seus conhecimentos, suas formas própriasde organização, de tomada de decisão e de suas formas próprias de sobrevivência. Monoculturade arroz nas Terras Indígenas Xavante, extração de borracha nas Terras Indígenas Munduruku,extração de castanha e madeira nas Terras Indígenas Kayapó, extração de madeira no Sul dopaís e implantação de pastagens em localidades da Amazônia Legal.
No extremo norte, em Roraima, são encontrados os macuxis, ingaricós, tauarepangues,uapixangas, patamonas e yanomamis. Em alguns dos Estados amazônicos, milhares de índios,
As iniciativas sociais e desenvolvimento sustentável na Amazônia, pp. 87 - 109 103
entre eles, os guaranis/kaiowás, terenas, caiabis, vivem pressionados pelo espaço reduzidode que dispõem.
No Peru, os grupos Shipibo, Conibo e Jivaros vivem em comunidades camponesas comterritórios bem delimitados.
No Equador, etnias importantes como os Shuars (de língua jivaro), os Quíchuas, osHuaoranis, os Cofans se distribuem entre montanhas e floresta. A Confederação de nacionalidadesindígenas do Equador – CONAIE exerce uma pressão constante para o recebimento de títulos depropriedades, tendo já beneficiado os Shuars. As concessões petrolíferas coincidem com as áreasprotegidas (2 milhões de hectares) que também são impactadas pelas áreas abertas à colonizaçãoagrícola (2,5 milhões de hectares), com milhares de colonos, que lutam pelo seu direito de cultivar.
Na Colômbia são 70 mil índios do tronco Arauak e Karib, que possuem uma certa autonomiae obtiveram em 1992 a delimitação de vastas reservas (os resguardos) extendidos sobre doisterços da Amazônia colombiana (18 milhões de hectares).
É importante lembrar que mesmo tendosucesso nas parcerias, as experiênciaspromovem também aprendizados e métodos denegociação, planejamento e aplicação demétodos de gestão de recursos naturais maisabertos e mais eficazes.
Contudo, dois problemas são iminentes:a) a falta de sustentabilidade econômica efinanceira, pois, por se tratar de recursosexternos à região, o risco de não dispor decondições de continuidade do mesmo; e b) faltade sustentabilidade política, pois por se tratarde um programa de cooperação, não possuiforça suficiente para modificar o modeloinsustentável imposto à região. As açõesestruturantes realizadas, em especial porgovernos e também pelo setor privado precisamincorporar estes resultados.
Outro aspecto que pode fragilizar asações de desenvolvimento sustentável são asdecisões privadas, vinculadas aos mercadosnacionais e especialmente o internacional. Nocaso da Amazônia brasileira, especialmente asoja; na Andina, o petróleo.
O quadro abaixo sintetiza o repertório dosprojetos identificados nas Amazônias dosdiferentes países do Tratado de CooperaçãoAmazônica e evidencia as temáticas quenormalmente são abordadas nos projetos e osatores envolvidos. Ao lado desta caracterização,os resultados obtidos, as lições aprendidas e oâmbito das ações.
Algumas conclusões
A Amazônia é diversa, é plural. Àpluralidade da natureza associa-se adiversidade social e cultural. Da mesma maneira,a diversidade de visões políticas. Pensá-la nosingular é liquidá-la. Reduzir seu capital, suaspotencialidades e capacidades a merosreprodutores de modelos externos,convencionais, orientados pelo imediatismodemonstraria uma grande perda. Impossívelpensar em um único modelo para substituir oatual. O grande desafio é investir nofortalecimento dos laços entre os países e povosem interesses que sejam comuns para sevisualizar os caminhos que permitam alçar à umaoutra condição humana, a população da região.Mas, não há mais tempo para esperar. Urgemmudanças concretas. Muitas delas jácomeçaram...
A inserção da região no processo deglobalização, financeiro e econômico, se fezaguçando a pobreza e as contradições. Seguidosgovernos não conseguiram sequer reduzir apobreza e promover condições de cidadaniapara suas populações marginais. Se estasvertentes da globalização acentuam as difíceiscondições da população amazônica, outrosfortes aspectos da mundialização também sefazem presentes na região induzindo-a avalorização de seus atributos. As tendênciasmundiais de conservação do meio ambientefortalecem os mecanismos de aproveitamento
104 - GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 16, 2004 MELLO, N. A.
Qu
ad
ro-s
ínte
se
Áre
aP
rog
ram
áti
ca:
Ord
en
am
en
toT
err
ito
ria
l,A
sse
nta
me
nto
sh
um
an
os
eA
ssu
nto
sIn
díg
en
as
Te
ma
se
Su
b-
tem
as
Co
nse
rva
ção
eU
soS
ust
en
táv
el
do
sR
ec
urs
os
Na
tura
isre
no
vá
ve
is(c
orr
ed
ore
se
coló
gic
os,
ge
stã
o,
eco
turi
smo
,e
tc).
Div
ers
ida
de
cult
ura
le
dir
eit
os
terr
ito
ria
isd
os
po
vo
sin
díg
en
as
(de
ma
rca
ção
,re
gis
tro
,h
om
olo
ga
ção
de
seu
ste
rrit
óri
os)
Ap
oio
àfo
rma
ção
de
cap
aci
da
de
slo
ca
is(i
ncl
uin
do
form
açã
od
elí
de
res
ind
íge
na
s)
Inic
iati
va
se
mp
roje
tos
de
asse
nta
men
tos
rura
is
Pro
jeto
sso
bre
qu
est
õe
se
con
ôm
ica
se
soci
ais
de
com
un
ida
de
se
xtr
ati
vis
tas
Ato
res
en
vo
lvid
os
Fu
nd
açõ
es
(ale
mã
s,e
sta
du
nid
en
ses,
no
rue
gu
esa
s);
Mu
nic
ípio
s,p
refe
itu
ras,
ma
nco
mu
nid
ad
es,
pre
fect
ura
sd
ed
ep
art
am
en
tos;
Líd
ere
sp
olí
tico
s,re
pre
sen
tan
tes
com
un
ida
de
sin
díg
en
as,
As
so
cia
çõ
es
ind
íge
na
s;
Ag
ên
cia
sm
ult
ila
tera
ise
bil
ate
rais
(PN
UD
,C
E,
DA
NID
A,
IIC
D,
US
AID
,B
IRD
,IT
TO
,IC
LE
I,H
IVO
S,
TN
C,
WW
F,A
gê
nci
ad
eC
oo
pe
raçã
oe
De
sen
vo
lvim
en
tod
oC
an
ad
á-A
CD
I);
Un
ive
rsid
ad
es
din
am
arq
ue
sas,
no
rte
-am
eri
can
as;
Inst
itu
içõ
es
ere
de
sd
eca
pa
cita
ção
loca
is,
na
cio
na
ise
inte
rna
cio
na
is;
Inst
itu
içõ
es
de
pe
squ
isa
cie
ntí
fica
;
Ag
ên
cia
sd
ed
ese
nv
olv
ime
nto
eco
nô
mic
olo
cais
;
Ce
ntr
os
de
pla
ne
jam
en
ton
aci
on
ais
An
áli
sed
aIn
form
açã
o
Ma
iori
ad
os
pro
gra
ma
ssã
oe
mp
arc
eri
as
en
tre
ass
oci
açõ
es
loca
is,
pre
feit
ura
s,e
mco
ord
en
açõ
es
reg
ion
ais
;
Inv
est
ime
nto
tam
bé
me
mp
roce
sso
sp
rod
uti
vo
slo
cais
vis
an
do
me
rca
do
na
cio
na
lo
uin
tern
aci
on
al,
com
ob
jeti
vo
sd
en
ov
as
op
ort
un
ida
de
se
con
ôm
ica
s;
Ev
olu
ção
de
pro
jeto
se
lab
ora
do
sco
mp
ou
cap
art
icip
açã
olo
cal
pa
ram
eto
do
log
ias
qu
ep
erm
ite
mid
en
tifi
car
as
ne
cess
ida
de
se
asp
ira
çõe
sd
as
po
pu
laçõ
es
do
lug
ar;
Vá
rio
sfo
ros
fora
mcr
iad
os
com
oin
stâ
nci
ap
olí
tica
ep
rop
osi
tiv
aa
pó
s1
99
2;
Inv
est
ime
nto
se
xte
rno
se
mq
ua
seto
do
so
sp
aís
es
am
azô
nic
os,
em
pro
cess
os
de
fort
ale
cim
en
toe
con
soli
da
ção
de
lid
era
nça
s,g
ov
ern
os
loca
is,
cie
nti
sta
sso
cia
ise
fun
cio
ná
rio
sp
úb
lico
s;
Ca
pa
cita
ção
de
ag
en
tes
flo
rest
ais
;p
rofe
sso
res
ind
íge
na
s,a
ge
nte
sd
esa
úd
e,
ag
en
tes
de
san
ea
me
nto
;
Me
lho
ria
de
inst
rum
en
tos
de
ge
stã
oso
cia
l,d
eco
ntr
ole
em
on
ito
ram
en
toa
mb
ien
tal
com
ap
rev
en
ção
de
incê
nd
ios
(ale
rta
sv
erd
ee
am
are
lo;
gru
po
sv
olu
ntá
rio
s,p
rod
uto
sca
pa
cita
do
sn
ou
sod
até
cnic
ad
efo
go
,e
tc.)
,o
lice
nci
am
en
tod
ea
tiv
ida
de
sp
rod
uti
va
se
mp
rop
rie
da
de
sru
rais
;
Sín
tese
do
sre
sult
ad
os
Terr
as
ind
íge
na
sd
em
arc
ad
as,
pa
rtic
ipa
ção
do
sin
díg
en
as
em
pla
no
sd
eo
rde
na
me
nto
terr
ito
ria
le
ma
ne
jod
ese
us
terr
itó
rio
se
con
soli
da
ção
da
ad
min
istr
açã
oin
díg
en
aso
bfl
ore
sta
tro
pic
al
(21
milh
õe
sd
eh
ect
are
sn
aC
olô
mb
ia;
22
,3m
ilh
õe
sd
eh
asã
od
em
an
da
do
sn
aB
olí
via
,5
00
mil
hõ
es
no
Bra
sil)
;
Re
du
ção
do
índ
ice
de
qu
eim
ad
as
ed
esm
ata
me
nto
em
alg
un
sE
sta
do
sa
ma
zôn
ico
sb
rasi
leir
os;
Ofi
cin
as
itin
era
nte
s;
Form
açã
od
eR
ed
es
de
inte
rcâ
mb
io;
Ela
bo
raçã
od
eco
nju
nto
sd
em
ate
ria
ise
du
cati
vo
se
cart
ilha
sso
bre
ou
sod
efe
rra
me
nta
ste
cno
lóg
ica
s;
Dif
usã
od
ep
ráti
cas
rela
cio
na
da
sco
mo
fort
ale
cim
en
tod
as
de
mo
cra
cia
sp
art
icip
ati
va
,co
ma
me
lho
ria
da
qu
alid
ad
ed
ev
ida
da
po
pu
laçã
o;
da
inte
gra
ção
soci
al
ed
od
ese
nv
olv
ime
nto
sust
en
táv
el;
Ma
isd
e3
00
ex
pe
riê
nci
as
fin
an
cia
da
sp
elo
FN
MA
em
ais
de
20
0p
elo
PP
G7
,n
oB
rasi
l;
Liç
õe
sa
pre
nd
ida
s
Am
aio
ria
ab
solu
tad
os
pro
gra
ma
se
pro
jeto
sfo
ram
de
sen
vo
lvid
os
com
fin
an
cia
me
nto
so
ud
oa
ção
inte
rna
cio
na
is,
oq
ue
au
me
nta
ori
sco
de
de
smo
bil
iza
ção
ere
du
ção
do
nív
el
de
pa
rtic
ipa
ção
da
sco
mu
nid
ad
es
loca
ise
ma
tiv
ida
de
sse
me
lha
nte
sp
ara
ofu
turo
pró
xim
o;
Mu
ito
sd
ess
es
pro
gra
ma
so
up
roje
tos
serv
ira
mco
mo
fon
ted
ein
spir
açã
oe
mo
de
lop
ara
os
go
ve
rno
se
soci
ed
ad
eci
vil
org
an
iza
da
ap
rese
nta
rem
os
seu
s,p
ara
as
me
sma
sfo
nte
sfi
na
nce
ira
so
ue
mn
ov
as;
Are
tro
ali
me
nta
ção
eo
refo
rço
da
se
xp
eri
ên
cia
sp
osi
tiv
as
en
tre
pro
gra
ma
se
pro
jeto
s:o
qu
efo
ia
pre
nd
ido
em
um
,p
od
ese
rvir
com
od
eg
rau
pa
rau
mo
utr
o;
Nív
el4
(I,
R,
SR
,N)
Inte
rna
cio
na
l=
5
Re
gio
na
l=
3
Bo
lívia
=1
4
Bra
sil
=2
2
Co
lôm
bia
=4
Eq
ua
do
r=
1
Pe
ru=
2
Gu
ian
ae
Su
rin
am
e=
2
As iniciativas sociais e desenvolvimento sustentável na Amazônia, pp. 87 - 109 105
Co
nti
nu
aç
ão
do
Qu
ad
ro-s
ínte
se
Te
ma
se
Su
b-
tem
as
Zo
ne
am
en
toE
co
lóg
ico
Eco
nô
mic
o(d
ive
rsa
se
sc
ala
s)
Ato
res
en
vo
lvid
os
Org
an
iza
çõe
sd
aso
cie
da
de
civ
illo
cais
,n
aci
on
ais
ein
tern
aci
on
ais
eco
op
era
tiv
as,
Min
isté
rio
s,a
uta
rqu
ias
fed
era
is,
go
ve
rno
se
sta
du
ais
;se
cre
tari
as
est
ad
ua
is,
Co
ns
elh
os
na
cio
na
isq
ue
po
ssu
em
aso
cie
da
de
rep
rese
nta
da
po
rse
us
me
mb
ros;
Ba
nco
sp
riv
ad
os,
Fu
nd
os
Na
cio
na
isd
em
eio
am
bie
nte
ein
ve
stim
en
toso
cia
l.
An
áli
sed
aIn
form
açã
o
Inst
itu
cio
na
liza
ção
de
esp
aço
sd
eco
nfl
uê
nci
ad
ein
icia
tiv
as
soci
ais
ed
ea
rtic
ula
ção
en
tre
seto
res
pú
blic
os
ep
riv
ad
oa
nív
el
loca
l,re
sult
an
tes
da
de
sce
ntr
ali
zaçã
oa
dm
inis
tra
tiv
a(B
olí
via
,B
rasi
l,C
olô
mb
ia,
Pe
ru,
Eq
ua
do
r,C
olô
mb
ia);
Co
mp
osi
ção
ed
ifu
são
de
ba
ses
de
da
do
sd
as
red
es
reg
ion
ais
ed
as
ON
G;
Pro
jeto
sd
ee
xp
lora
ção
ma
de
ire
ira
ep
rod
uçã
osu
ste
ntá
ve
le
stim
ula
ram
ae
xp
an
são
de
áre
as
de
flo
rest
as
pú
bli
cas;
En
vo
lvim
en
tod
ap
op
ula
ção
fem
inin
ae
ma
lte
rna
tiv
as
eco
nô
mic
as
pa
rao
de
sen
vo
lvim
en
tolo
cal,
no
ap
rov
eit
am
en
tod
em
até
ria
sp
rim
as
an
tes
ine
xp
lora
da
s,tr
an
sfo
rma
nd
o-a
se
mn
ov
os
pro
du
tos;
Cri
açã
od
en
ov
as
rese
rva
se
xtr
ati
vis
tas
(no
Bra
sil)
;
Cri
açã
od
eca
na
isd
eco
mu
nic
açã
o(r
ád
ios
loca
is)
vis
an
do
ate
nd
er
com
un
ida
de
sis
ola
da
s;
Pe
rig
os,
con
tra
diç
õe
sd
ep
olí
tica
se
risc
os;
Ga
sod
uto
s(g
ás
na
tura
le
pe
tró
leo
no
Pe
ru,
Bo
lívia
,E
qu
ad
or)
qu
ee
stã
ose
nd
oco
nst
ruíd
os
en
tre
cam
po
sd
eg
ás
ati
ng
em
po
vo
sin
díg
en
as.
Sín
tese
do
sre
sult
ad
os
Div
ers
ific
açã
od
as
fon
tes
de
fin
an
cia
me
nto
pa
raa
se
xp
eri
ên
cia
sg
ov
ern
am
en
tais
em
pa
rce
ria
sco
ma
soci
ed
ad
ete
msi
do
fin
an
cia
da
sp
elo
GE
F,C
E;
Re
ali
zaçã
od
ed
ive
rso
sP
lan
os
de
De
sen
vo
lvim
en
toL
oca
lS
ust
en
táv
el
(DLI
S),
ma
sre
du
zid
as
ex
pe
riê
nci
as
de
pro
jeto
se
mce
ntr
os
urb
an
os
am
azô
nic
os;
Ca
mp
an
ha
sd
em
ob
iliz
açã
oe
nv
olv
en
do
com
un
ida
de
s,p
rofi
ssio
na
is,
vis
an
do
blo
qu
ea
rp
roce
sso
s,le
iso
ua
tiv
ida
de
sd
eri
sco
pa
rao
me
ioa
mb
ien
te,
po
pu
laçõ
es
tra
dic
ion
ais
,in
díg
en
as,
etc
.N
orm
alm
en
tee
sta
sca
mp
an
ha
ssã
oco
ord
en
ad
as
pe
loG
ree
np
ea
ce,
Am
igo
sd
aTe
rra
ou
WW
Fe
com
gra
nd
ere
pe
rcu
ssã
o;
Ca
mp
an
ha
sn
aci
on
ais
ein
tern
aci
on
ais
de
com
ba
tea
bio
pir
ata
ria
;
4I
=in
tern
aci
on
al
R=
reg
ion
al
(os
8p
aís
es)
SR
=su
bre
gio
na
l(2
a7
pa
íse
s)N
=n
aci
on
al
106 - GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 16, 2004 MELLO, N. A.
das oportunidades de valorização dabiodiversidade, de prestação de serviços aoambiente global, de uso e manejo sustentávelde seus recursos naturais. O capital socialduramente construído e potencialidadeshumanas permitem vislumbrar alternativaspossíveis, apesar do imenso desafio a superarquanto às extremas condições de pobreza,indigência e de enfraquecimento das culturas.
Contrapõe-se a estas tendências, aexploração imediata e inadequada dos recursosnaturais, o avanço da fronteira agrícola e aconversão florestal, o desmatamento,estimulados pelos baixos preços da terra, pelainexistência (ou a fraca ocorrência) de infra-estruturas de transportes e comunicação, peloisolamento, pela falta de mercado a produtoslocais. Há forte pressão sobre áreas protegidase ecossistemas ainda pouco conhecidos, áreasindígenas e populações tradicionais em favor daseconomias dominantes.
A valorização do conhecimento tradicionaljá tem sido um dos aspectos relativamente bemabordado no âmbito das iniciativas sociaisexistentes, apontando para o seuaprimoramento em novos projetos, novosinvestimentos e/ou financiamentos nacionais ouinternacionais.
No entanto, apesar da quantidade ediversidade de iniciativas da sociedade, estasse encontram ainda em uma fase embrionária,de experimentação piloto. O indicado é quesejam integradas e articuladas dentro doprocesso político e econômico nacional eregional. Isto significa transformá-las empolíticas nacionais, em cada um dos países, jáque as experiências e projetos são muitos, mastratam do assunto de maneira pontual. Inserircomo elemento estratégico de uma políticapública implica em mecanismos deimplementação continuada, de articulação comoutras políticas – econômica, sobretudo.
Muito trabalho já foi concretizado, seja poriniciativas de uma ou outra representação dasociedade organizada, seja por meio das redesde solidariedade e técnicas, normalmente comapoio financeiro de instituições públicas, deorganismos bilaterais ou multilaterais, agênciasde cooperação. Ao longo das últimas décadasformaram-se alianças estratégicas entre estesdiversos setores, e experimentou-se aimplementação de ações por meio de parceriasnunca antes imaginadas. Isto requercontinuidade, requer seu fortalecimento. Requerinvestimento na formação, na capacitação e naampliação das realizações. Requer que asassociações que participam do processo sejammais fortes, mais consolidadas. Já analisamosque o seu nível de institucionalização é bastantediverso. É preciso implantá-las maisconsistentemente, induzindo-as a realizar seuregistro, de maneira que possam aceder aosfundos públicos e que possam constituir suasequipes permanentes. É preciso incluí-las emarticulações e negociações com o setor privado,de maneira a construir uma confiança mútua,hoje inexistente.
Mas, ao mesmo tempo, é preciso ter muitocuidado com o risco que representa, nesteprocesso, a dependência dos bancos definanciamento e desenvolvimento. Parte docrescimento da participação ocorreu em funçãode condicionalidades e exigências dosorganismos financiadores, como o BID e BIRD,que exigiam – e financiavam – a presença derepresentações da sociedade. Uma mudança dedirecionamento nestes organismos poderepresentar a redução drástica ou umrompimento com a participação social. Caso nãoocorra o fortalecimento advindo da própriasociedade e dos Estados, pode-se “estar àmercê das decisões” políticas e econômicas queafetam as condições do desenvolvimento.Evidentemente os avanços da democracia naAmérica Latina e nos países amazônicos sãouma segurança à participação, mas não sãoinfalíveis.
As iniciativas sociais e desenvolvimento sustentável na Amazônia, pp. 87 - 109 107
1 A base do presente artigo foi o estudo realizadopara a IUCN e a OTCA, com recursos do BancoMundial, que objetivou contribuir para a elaboraçãodo Plano estratégico 2004 – 2010 da Organizaçãoe para o desenvolvimento da iniciativa AmazôniaSustentável no Terceiro Milênio. Concorreram paraeste estudo diversos pesquisadores e organizaçõesque disponibilizaram sua própria rede de trabalhopara a obtenção de informações imprescindíveis,aos quais a autora agradece. Entre eles não sepode deixar de mencionar: Laetícia B. Perrier,Laurent Lacroix, Enrique Herrera, Ronald Calderon,Pierre Gondard, Patrícia Molina, Pablo Pacheco,Claudia Mayer, Dania Quirola, Luz Marina Arevalo,Francisco Ruiz, Richard Pasquis, Luciana Machado,Flora Cerqueira. Algumas instituições prestaramtambém ajuda fundamental: Fórum Carajás, RedeSUSAM, Fórum Boliviano de Meio Ambiente eDesenvolvimento (Fobomade), Cepad
Notas2
Dados anunciados pelo Governo Federal em 25 deJunho de 2003.
3 CHARNOVITZ “in” Courrier de la Planète (2001:78)que considera 1775 o ano a partir do qual dos“individus ayant des intérêts communs ont créédes ONG orientées sur des thématiques nationalespour influencer les prises de décisions politiques”.Este autor estabelece períodos para mostrar ocrescimento do poder de influência das ONG sobrea governança mundial. Nestes termos sete períodosmarcantes são: a) a emergência, que ocorre entre1775 e 1918; b) o engajamento, de 1919 a 1934;c) o desengajamento, de 1935 a 1944; d) aformalização, de 1945 a 1949; e) limitação, de 1950a 1971; f ) de 1972 a 1991, o período deintensificação e g) a partir de 1992, com a tomadado poder, quando na Conferência do Rio havia maisONG que governos.
Bibliografia
ATRIA, Raúl (CEPAL) et all.Capital social yreducción de la pobreza en América Latina y elCaribe : en busca de un nuevo paradigma.Comisión Económica para América Latina y elCaribe - Cepal e Michigan State University.Santiago de Chile, Publicaciones de las NacionesUnidas, enero 2003.
ARAGÓN, Luis E. Há futuro para odesenvolvimento sustentável na Amazônia?Disponível em: www.mdic.gov.br/tecnologia/revistas/ artigos/Coletanea5/02LuisAragon.pdf.visitado em 14 de dezembro de 2004.
BOLFOR, Proyeto de Manejo Forestal Sostenible.Site http://bolfor.chemonics.net, visitado em 03de março de 2004.
BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Avaliaçãoe identificação de ações prioritárias para aconservação, utilização sustentável e repartiçãodos benefícios da biodiversidade na Amazôniabrasileira. Brasília : MMA/SBF, 2001.
CASTRO, Edna (organizadora). Anais do SimpósioAmazônia, Cidades e Geopolítica das águas.Projeto MEGAM. Belém: NAEA/UFPA, 22 a 25 dejunho de 2003, 226 p. 1 CD
CASTRO, Ina E. de. Solidariedade territorial erepresentação. Novas questões para o pactofederativo brasileiro. Território, Rio de Janeiro, vol.1, n° 2, p.33-42, 1996.
COLÔMBIA. Ministerio de Ambiente, “Vivienda yDesarrollo Territorial. Bases Conceptuales yMetodológicas“. In Diseño de la línea base deinformación ambiental sobre los recursosnaturales y el médio ambiente em la Amazôniacolombiana. Bogotá: Instituto Amazônico deInvestigaciones Científicas, 2003.
CORPORACIÓN ANDINA DE FOMENTO. Políticaspara la gestión ambiental y social de lasoperaciones de CAF. La sesión del CPNC de fecha12/12/2000 (mimeo).
CRESPO, Samira. “O movimento ambientalistabrasileiro pós Rio 92 – Tendências eperspectivas”. In FELDMAN, Fabio (ed.). Rio + 10Brasil ; uma década de transformações. Rio deJaneiro: ISER – Instituto de Estudos da Religião;Ministério de Meio Ambiente; Fórum Brasileirode Mudanças Climáticas. 2002.
108 - GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 16, 2004 MELLO, N. A.
DOUROJEANNI, Marc; PÁDUA, Maria Tereza J.Biodiversidade, a hora decisiva. Curitiba: Editorada UFPR, 2001.
DROULERS, Martine. L’Amazonie vers undéveloppement durable. Paris: Armand Colin/SEJER. 2004.
HERBAS, Gabriel. Diez años de desarrollosostenible em Bolívia: uma mirada crítica.Fobomade (Foro Boliviano sobre MédioAmbiente y Desarrollo).http://www.fobomade.org.bo. Acessado em 20 de fevereiro de 2004.
MALDIDIER, Christophe. “Le local, le nationalet l’international dans la gestion des forêtstropicales: une aire protégée au Nicaragua”. InVERDEAUX, François (ed.). La fôret-monde enquestion. Recomposition du rapport des sociétésà la forêt dans les pays du Sud. Bondy: Editionsde l’Aube, Institut de recherche pour ledéveloppement, 1999. p.83-96. (Cahiers dessciences humaines, nouvelle série n° 9).
MELLO, Neli Aparecida de. Políticas públicasterritoriais na Amazônia Brasileira: conflitos entreconservação ambiental e desenvolvimento – 1970a 2000. Tese de doutorado. Departamento deGeografia.Universidade de São Paulo eUniversité de Paris X – Nanterre.Setembro.2002.
ORGANIZAÇÃO DO TRATADO DE COOPERAÇÃOAMAZôNICA. Plano Estratégico 2003-2010.Secretaria Permanente, novembro.2003(mimeo).
PACHECO, Pablo. “Municipalidades y participaciónlocal em la gestión forestal en Bolívia”. InFERROUKHI, Lyès (editor). La gestíon forestalmunicipal em América Latina. Center forInternational Forestry Research.(CIFOR) eCentro Internacional de Investigaciones parael Desarollo e Oficina Regional para AméricaLatina y el Caribe de CIID. Costa Rica. 2003(acessado em 21.02.2004 no site http://www.cifor.cgiar.org
PASQUIS, Richard et al (coord). “As Amazônias:um mosaico de visões sobre a região”, Estudorealizado para o Banco Mundial. Maio de 2003.Co-autoria. Site. www.atmos.ggf.br
PROGRAMA PILOTO PARA A PROTEÇÃO DASFLORESTAS TROPICAIS DO BRASIL. Construindoa sustentabilidade: lições aprendidas no ProgramaPiloto. Brasília: Ministério do Meio Ambiente/Secretaria de Coordenação da Amazônia, SérieTextos para Discussão n° 1, junho de 2002, 25p.
TONI, Fabiano. “La gestión forestal en losmunicípios de la Amazônia Brasileña”. InFERROUKHI, Lyès (editor). La gestíon forestalmunicipal em América Latina. Center forInternational Forestry Research.(CIFOR) e CentroInternacional de Investigaciones para elDesarollo e Oficina Regional para América Latinay el Caribe de CIID. Costa Rica. 2003 (acessadoem 21.02.2004 no site http://www.cifor.cgiar.org
USSELMAN, Pierre. O Estado atual das pesquisasfrancesas nos países da bacia amazônica.Seminário META, setembro. 2003.
VIANNA, Gilney et al. Relatório da ComissãoExterna da Câmara dos Deputados, destinada aaveriguar a aquisição de madeireiras, serrarias eextensas porções de terras na Amazônia pormadeireiras asiáticas. Brasília, Câmara dosDeputados, dezembro de 1999.
Sites visitados:
http://www.iwokroma.org
http://www.flec.kvl.dk/FOMABO/
http://www.cepad.org
http://www.iadb.org/
http://www.worldbank.org
http://greenpeace.org
http://rits.org.br
http://sinchi.org.co
http://www.censat.org/Red_Juan.htm
http:// www.coama.org.co/
http:// www.unii.net/confeniae/espanol
http://civicus.org
http://lidema.org.bo
http:// www.cidob-bo.org/
As iniciativas sociais e desenvolvimento sustentável na Amazônia, pp. 87 - 109 109
ASL – Associações sociais do lugarBID – Banco Interamericano doDesenvolvimento
BIRD – Banco Mundial
CAF – Coopération Andina de Fomento
GEF – Global Environment FacilitiesFNMA – Fundo Nacional de Meio Ambiente
FUNBIO – Fundo Brasileiro para aBiodiversidade
PDA – Subprograma de ProjetosDemonstrativos – tipo A
Glossário
PDPI – Subprograma de ProjetosDemonstrativos para Populações Indígenas
PED – Programa de Execução Descentralizada
PNMA – Programa Nacional de Meio AmbientePPG7 – Programa Piloto para Proteção dasFlorestas Tropicais Brasileiras
SNAP – Sistema Nacional de Áreas Protegidas(Bolívia)
SPRN - Subprograma de Política de RecursosNaturais do PPG7
TCO – Territórios comunitários de origemUFM – Unidades Florestais Municipais
UNAMAZ - União das Universidades Amazônicas
Trabalho enviado em maio de 2004.
Trabalho aceito em agosto de 2004.