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UNIVERSIDADE POTIGUAR – UNP PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
CURSO DE PSICOLOGIA
JOANA DARQUE UMBELINO MENDES
ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO NA COMUNIDADE DA ÁFRICA – NATAL/RN
NATAL 2007
JOANA DARQUE UMBELINO MENDES
ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO NA COMUNIDADE DA ÁFRICA – NATAL/RN
Monografia apresentada a Universidade Potiguar-UnP, como requisito avaliativo de aprendizagem da disciplina Trabalho de Conclusão do Curso. ORIENTADOR: Profa. Msc. Candida Maria Bezerra Dantas
NATAL
2007
JOANA DARQUE UMBELINO. MENDES
ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO NA COMUNIDADE DA ÁFRICA-
Monografia apresentada à Universidade Potiguar - UnP, como requisito avaliativo da disciplina Trabalho de Conclusão de Curso, sob orientação da professora Cândida Maria Bezerra Dantas.
Aprovada em de novembro de 2006.
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________________________
Profa. Ms Candida Maria Bezerra Dantas
UnP (Orientadora)
_______________________________________________________
Prof.MsJader Ferreira Leite
UnP (Leitor)
_______________________________________________________
Rachel de Medeiros Manso
Psicóloga do PAIF
HOMENAGENS ADMINISTRATIVAS
Chanceler
Prof. Paulo Vasconcelos de Paula
Reitor
Prof.Manuel Pereira dos Santos
Vice-Reitor
Prof. Mizael Araújo Barreto
Pró-Reitora de Graduação
Profa. Sâmela Soraya de Oliveira
Diretora do Curso de Psicologia
Profa. Roberta Barzaghai
DEDICATÓRIA
Ao meu esposo e filhos, às minhas adoráveis
netinhas, aos meus pais in memorian, aos meus
irmãos, genro e nora, aos amigos de todas as horas,
à minha orientadora e, em especial, à Comunidade
da África, e a todos àqueles que contribuíram com
apoio e carinho na realização deste trabalho.
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a DEUS pela vida, pela coragem e determinação no decorrer
desta pesquisa, ajudando-me a eliminar barreiras e dificuldades.
Em especial, ao meu esposo Nilton Mendes pelo apoio incondicional, incentivando-me
nos momentos mais difíceis e, sobretudo, pela paciência e tolerância das horas ausentes.
Aos meus filhos, razão maior desta conquista, por terem contribuído com o seu afeto e
compreensão, instigando-me para que eu chegasse ao término deste trabalho.
A minha amiga Ana Valeska .pela amizade, apoio e incentivo e, sobretudo, pela troca
de experiências e conhecimentos.
In memorian, aos meus pais Francisco Umbelino (Pindoba) e Maria Estela..pela vida,
pelo amor, pela lição de vida.
A minha terapeuta Margit Alverga pelas mudanças que trouxe à minha vida.
À minha orientadora, Cândida Maria Bezerra Dantas, pelo incansável apoio e
orientações precisas no decorrer desta pesquisa.
Ao professor Jader Ferreira Leite pela capacidade de despertar em seus alunos a
sensibilidade, tornando-os capazes de perceber o sujeito em sua individualidade.
Aos professores pelo incentivo e orientações dispensadas nos momentos certos, ao
longo do Curso
Aos meus amigos, que, de algum modo, contribuíram para a conclusão deste trabalho.
À direção e funcionários do Curso de Psicologia pelo apoio recebido.
À minha querida amiga do Curso Andréia Palito pela amizade, apoio e
companheirismo.
RESUMO
O presente trabalho se constitui uma reflexão sobre a atuação do psicólogo na
Comunidade da África, Natal/RN. Para tal proposta, foram realizadas entrevistas
semidirigidas com o psicólogo da Universidade do PAIF (Programa de Assistência Integral a
Família), além da observação e da fundamentação teórica que nos deu suporte para tal prática.
Os instrumentos de coleta e a análise dos dados coletados nos possibilitaram compreender que
a atuação do psicólogo nesses espaços requer uma postura voltada para as reais necessidades
do contexto inserido, levando em consideração os diversos fatores que podem influenciar a
vida em comunidade.
Palavras chave: Atuação do psicólogo em comunidade, Psicologia Comunitária, e
Psicologia Social.
ABSTRACT
The present work constitutes a reflection on the performance of the psychologist in the
community of Africa, Natal/RN. For such proposal partially directed interviews with the
psychologist of the Basic unit of Africa had been carried out, as well as two psychologists of
the PAIF (Program of Integral Assistance to Family).There were also used techniques of
observation, based on theoretical foundations, which gave us the support to proceed with the
practice. The instruments of collection and analysis of data enabled us to understand that the
performance of the psychologist in these areas must take into account not only the real
necessities of the context, but also the different factors that can influence life in community.
Keywords: Performance of the psychologist in a community, communitarian psychology,
social psychology.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................. 09
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA..................................................................................... 10
2.1 O CONTEXTO DE SURGIMENTO DA PSICOLOGIA COMUNITÁRIA...................... 10
2.2 AMERICA LATINA............................................................................................................ 11
2.3 CONTEXTO SOCIAL BRASILEIRO................................................................................. 12
2.4 A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA NO BRASIL............................................................... 16
3 PROCEDIMENTO METADOLÓGICO......................................................................... 24
3.1 CARACTERIZAÇÃO DO CAMPO DE PESQUISA E PÚBLICO ALVO........................ 24
4 ANÁLISE DOS DADOS.................................................................................................... 25
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................. 30
REFERÊNCIAS................................................................................................................. 31
ANEXOS............................................................................................................................. 32
1 INTRODUÇÃO
A inserção do psicólogo em comunidades se deu mais na década de 1960 e 1970. Foi
nesse cenário histórico, que a emergência de atuação em Psicologia Comunitária se fez
necessária diante das circunstâncias da época. Circunstâncias essas de natureza política,
econômica, social e cultural que possibilitaram um olhar para esse campo. Esse novo espaço
da Psicologia se constitui uma tentativa no sentido de responder à preocupação em se colocar
a saúde mental em uma perspectiva preventiva e inerente a vida social. É nesse contexto que o
trabalho aqui apresentado discute a atuação do psicólogo na Comunidade da África, os seus
desafios, limites e questionamentos.
Para o desenvolvimento desta proposta de pesquisa, utilizamos, para coleta de dados, a
observação, entrevistas semidirigidas e revisão bibliográfica que nos possibilitou, ao longo do
trabalho, um suporte teórico.
Foi conhecendo a atuação do psicólogo nesses espaços que pudemos perceber a
importância de sua atuação para a sociedade. Esse campo tem se mostrado, cada vez mais,
reconhecido, comprometido e procurado nas esferas sociais. O “lugar” de atuação do
psicólogo comunitário é abstrato, no sentido de que qualquer lugar se configura como espaço
para acolhimento e escuta; seja por meio do atendimento individual, visita domiciliar, grupos
terapêuticos, entre outras atividades, portanto, o que importa no trabalho do psicólogo
comunitário é a postura contextualizada para o espaço de atuação, não priorizando um
ambiente específico. Isso é fazer social, é fazer comunitário.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 O COTEXTO DO SURGIMENTO DA PSICOLOGIA COMUNITÁRIA
É necessário caracterizar a Psicologia Comunitária diante dos aspectos sociais,
culturais, econômicos e políticos de determinados espaços históricos, portanto ao se pensar na
Psicologia Comunitária nos remetemos ao trabalho de Moreno (1908), em Viena, no qual
improvisam ações dramáticas com crianças, realizadas muitas vezes na rua em busca de se
criarem normas para que uma sociedade infantil fosse respeitada pelos adultos. Essa prática se
constitui como as primeiras experiências que se aproximam às idéias da Psicologia
Comunitária. Essas atividades criaram a base para as técnicas psicodramáticas que
conhecemos hoje (VASCONCELOS, 1985).
Outra experiência que também trouxe reflexões para estudo foi a de Wilhelm Reich
(1929), que funda centros de higiene sexual, visando o aconselhamento sexual, bem como as
questões ligadas à higiene individual (VASCONCELOS, 1985).
Em meados do mesmo século XIX, como ressalta Vasconcelos (1985), vários
movimentos influenciaram o nascimento da psicologia comunitária. Entre eles podemos citar
a reformulação dos conceitos estabelecidos referentes à saúde mental e da própria psiquiatria.
Esses movimentos visavam uma reestruturação dos modelos vigentes dos hospitais
psiquiátricos. Surgem, então, grupos de discussão e de atividades com os pacientes e também
espaços entre os profissionais. Essa experiência possibilitou o nascimento de comunidades
terapêuticas que futuramente possibilitariam o “surgimento” das psicoterapias de grupo. É
interessante ressaltar que essa reformulação não permaneceu apenas dentro dos muros dos
hospitais psiquiátricos, mas se expandiu para a comunidade.
A psiquiatria comunitária surgiu nos Estados Unidos, em meados do séc. XIX, e foi
como movimento da psiquiatria democrática, vanguardeada por Basaglia na Itália, que ganha
força e estruturação. Esse trabalho visava à adoção de um modelo de comunidade terapêutica
que permitia um fluxo livre para os pacientes entre seu espaço de tratamento e o meio social.
Foram também feitos trabalhos de mobilização e esclarecimento da população e dos
movimentos sociais. Essas experiências se expandiram por diversas cidades do país. O
posicionamento revolucionário de Basaglia foi de encontro à ideologia dominante, onde o
“louco” era visto como ameaça a sociedade e no qual a própria psiquiatria acabava
reproduzindo e mantendo esse pensamento e comportamento acerca da “doença mental”
(VASCONCELOS, 1985).
Outra influência importante para o aparecimento da Psicologia Comunitária foi a
Medicina Comunitária. Mesmo tendo se configurado, para dar assistência aos “pobres” que
não podiam ter acesso à medicina sofisticada e cara, na década de 1960, essa área de
conhecimento possibilitou um olhar para a comunidade, existindo assim uma tentativa de
atuação para uma população menos favorecida da sociedade.
2.2 AMÉRICA LATINA
Na América latina, podemos apontar os movimentos de bairros, comunidades
eclesiais de base, movimentos femininos, dentre outros, como construções possíveis de ações
comunitárias. Esses movimentos se lançaram na tarefa de construir laços e ações
comunitárias. Nessas experiências, além das lutas e reivindicações materiais e políticas, da
prática da educação popular, as atividades incluem várias questões relacionadas à saúde
mental. Dessa forma, podemos lembrar as creches comunitárias, atividades de lazer, esporte,
cultura, etc. Essas iniciativas têm como característica básica a autonomia, o que possibilitou,
mais tarde, que o Estado desenvolvesse programas comunitárias (VASCONCELOS, 1985).
O progressivo assalariamento, o achatamento da renda e a conseqüente criação de
condições para uma politização crescente dos profissionais de saúde e saúde mental se
configuraram como outros processos que contribuíram para o aparecimento da Psicologia
Comunitária. Por outro lado, começaram a surgir às ações e movimentos representativos das
categorias profissionais, onde aparecem, entre suas reinvidicações e discussões, temas ligados
a serviços de saúde mais racionalizados e adequados às condições de vida da população. As
ações desses profissionais, nos espaços acadêmicos e nos próprios serviços de saúde,
possibilitaram a criação de espaços para algumas experiências inovadoras de grande
importância. (VASCONCELOS, 1985).
A psicologia Comunitária, na América Latina nasceu, segundo Pedro (2002), como
uma importante reação à colonização das idéias liberais presentes na psicologia. As
preocupações sociais e a própria negação de um sujeito individualizante foram questões
relevantes para a fundação da psicologia comunitária na América Latina, conforme aponta
Andery (1984 Apud PRADO 2002). Dessa forma, a psicologia comunitária tem sido um
“espaço” de reflexões sobre a própria ciência psicológica e com seus compromissos sociais,
éticos e políticos.
Na PCLA (Psicologia Comunitária na América Latina), a partir do ideal do coletivo,
a comunidade é vista como um conjunto de atividades, discursos e práticas, capaz de criar
autenticidade identitária (a identidade verdadeiramente humana). É possível o
desenvolvimento de uma comunidade ou de relação comunitária com inclusão, sem
evidenciar, no então, que qualquer processo de criação de um consenso implique
necessariamente num processo de exclusão .
Para Pierson (Apud NASCIUTTI, 1996) as comunidades surgem pelo fato de seus
indivíduos viverem em simbiose, ou seja, viverem juntos num mesmo habitat com suas
semelhanças e diferenças, e da competição cooperativa em que se empenham.
No Brasil, segundo Nasciutti (1996) quando se fala em estudos comunitários, a
associação imediata que se faz é de que se trata comumente de comunidades desfavorecidas,
carentes, favelas. Essa associação tem alguma razão de ser devido aos trabalhos publicados,
principalmente nas áreas de sociologia e serviços sociais, referindo-se a estudos em
comunidades carentes. Mas é preciso saber que trabalhos em comunidade não se restringem
somente aos espaços acima citados.
A comunidade ainda, de acordo o autor acima, se caracteriza pela distribuição em
espaços, de indivíduos, instituições e atividades, configurando-se como unidade de vida em
comunidade social, ação coletiva e de controle social formal. As instituições se colocam como
espaço de mediação entre o que é de ordem do social e de ordem do individual, havendo,
assim, a nítida inter-relação e interdependência entre instituição e comunidade.
2.3 CONTEXTO SOCIAL BRASILEIRO
No Brasil, os problemas de ordem social têm se constituído em estudos freqüentes no
âmbito sócio-político, a nível nacional e internacional, levando o governo a adotar políticas
públicas com o objetivo de melhor o quadro de pobreza e, conseqüentemente, os problemas
sociais decorrentes da mesma. As instituições de ensino têm importado conhecimentos,
propondo aos currículos acadêmicos a implantação da Psicologia Comunitária.
Outro fator que vem marcando a implantação da Psicologia Comunitária no Brasil
são os movimentos populares. Dessa forma, não podemos deixar de apontar o trabalho de
Paulo Freire na década de 1960, conhecido como Educação Popular que visava à
alfabetização de adultos, como instrumento de conscientização e responsabilidade cidadã
(LANE, 1996).
Diante desses trabalhos educativos e populares, é que psicólogos, dentre outros
profissionais, iniciam uma ocupação nos diversos espaços comunitários, visando à educação
popular. Na década 1970, a atuação do psicólogo não estava restrita a especialidades de
natureza teórico/prática em Psicologia Comunitária. Foi dessa maneira, atuando no sentido de
prevenção da saúde mental, junto a psiquiatras e assistentes sociais, bem como propagando
uma educação popular que a Psicologia Social e a Psicologia Comunitária ganham espaço e
possibilidades de construções.
Resgatando o contexto da década de 1960, podemos apontar como fator que
contribuiu para o surgimento da Psicologia Comunitária no Brasil o golpe militar de 1964. Os
espaços sociais exerciam forte repressão à liberdade do indivíduo no sentido de exercer seus
direitos e deveres. Nesse contexto de repressão, muitos profissionais se questionaram, entre
eles os psicólogos, acerca dos serviços oferecidos à população. Diante desse contexto,
eclodem diversas manifestações contra a postura governamental. É nos espaços acadêmicos
que emergiram essas questões referentes à teoria e prática psicológica comunitária.
Freitas (1996) ressalta que é nesse cenário de acontecimentos políticos e econômicos
da década de sessenta que a Psicologia é reconhecida como profissão oficial no Brasil pela lei
nº4119 de 27/08/62. É a partir desse momento, que se dar a inserção do psicólogo em diversos
espaços sociais, com o objetivo de tornar a Psicologia mais próxima da população.
Ainda, conforme Freitas (1996), os modelos teóricos e metodológicos importados
dos Estados Unidos e da Europa norteiam a formação dos futuros psicólogos brasileiros,
voltados a uma prática clínica tradicional em empresas e instituições educacionais de classe
média ou alta.
É diante desse contexto, que a atuação dos psicólogos desempenha um papel político
e social junto aos setores sociais. É argumentando que o psicólogo começa a voltar-se para
uma atuação com responsabilidade social. Essa atuação utilizou várias áreas de conhecimento,
ainda utilizadas atualmente, como: Sociologia, Antropologia, Educação Popular, dentre
outras. Não podemos negar a intenção de deselitizar a profissão do psicólogo e inseri-lo nos
diversos âmbitos da sociedade. Com essa atividade, os profissionais de psicologia começaram
a marcar novos espaços através de práticas que demandam sair dos consultórios, empresas e
escolas para ir à comunidade, favelas, associações de bairros, dentre outras instâncias. Esse
trabalho além de visar o desenvolvimento de uma Psicologia ampla e de acesso à população
mais pobre, também se caracteriza pelos aspectos sócio-político-cultural.
A década de 1970 mostra que os trabalhos desenvolvidos em comunidade advogam
uma deselitização e aproximação da psicologia à realidade da população, gerando um
confronto com os modelos vigentes. Essa visão de uma Psicologia a-histórica sobre a
dinâmica social não deixou de ter seu espaço na sociedade, contudo surgiram
questionamentos acerca dessa Psicologia.
Na década de 1980, conforme Freitas (1998), é que as práticas da psicologia em
comunidade começam a ganhar espaço, através de discussões significativas em debates
científicos, ampliando-se os relatos de experiências práticas na comunidade. É nesse cenário,
que o termo Psicologia Comunitária se difunde nos diversos estratos sociais, criando-se
oficialmente a possibilidade do psicólogo se inserir na saúde pública. É interessante ressaltar,
que devido a uma formação veiculada, quer diretamente ou indiretamente ao modelo clínico
tradicional, que esse profissional leva em sua bagagem teórica/prática um modelo importado e
descontextualizado da realidade em que vai atuar. Não podemos ocultar a importância da
Associação Brasileira de Psicologia Social (ABRAPSO), criada em julho 1980, abrindo
espaços para debates e construções possíveis para a Psicologia como: conferências,
congressos, simpósios dentre outros meios de divulgação e reflexão da prática em Psicologia
Social
Já na década de 1990, ampliam-se os espaços de trabalho dos psicólogos e com essas
demandas surge também a necessidade de contextualizar a prática profissional.
Freitas (1998) nos traz os diferentes trabalhos realizados em comunidade, nas últimas
três décadas, em nosso país. Partindo dos resultados apresentados pelo autor, pode-se perceber
que os psicólogos que atuam em comunidade se caracterizam por possuir varias formações,
entre elas: Psicanálise, Gestalt, Psicologia Social, Behaviorismo entre outras; trabalham na
universidade, enfocando os problemas de âmbito social; desenvolvem atividades em unidades
de saúde, hospitais, escolas, sindicatos e outros estabelecimentos.
É necessário, conforme ressalta Freitas (1998), não só ampliar os espaços de atuação
da Psicologia Comunitária, mas, primordialmente, refletir sobre os fundamentos filosóficos,
epistemológicos e metodológicos de tal prática, de modo que possam buscar alternativas
possíveis ao invés de reproduzir modelos psicologizantes, reducionistas e tradicionais. A
Psicologia Comunitária precisa utilizar uma postura crítica e histórica, a qual possibilite
trabalhar questões ligadas à ideologia, aos processos de formação de consciência, à
construção de identidade social, as relações cotidianas e processos grupais, às expressões e
construções culturais e populares, bem como a linguagem, a emoção e a afetividade. V
Vasconcelos (1985) ressalta que os psicólogos comunitários não são “donos” dos
espaços de trabalho de sua atuação, pois nesses espaços sejam eles instituições escolares,
hospitais, empresas, atuam também profissionais de outros campos, como o psicólogo clínico.
Dessa forma, o trabalho que o psicólogo comunitário desenvolve, integrará os aspectos
sociais, além dos psíquicos e orgânicos, divididos aqui pela postura didática, visando o ser em
sua totalidade. Esse profissional tem como objetivo atender as classes populares, buscando
desenvolver uma participação comunitária efetiva em seus processos individuais e coletivos.
Enfocando o trabalho do psicólogo comunitário como profissional de saúde mental,
como nos traz Vasconcelos (1985), podemos observar que a própria estruturação e dinâmica
do Sistema Único de Saúde (SUS) vai influenciar a prática de tal profissional. Um sistema
que visa em seu bojo à universalização com o objetivo primordial a efetivação do SUS, deve
incluir nesse cenário os projetos de prevenção e promoção de saúde em que o psicólogo
comunitário ganha uma participação mais envolvente.
É importante ressaltar que, na década de noventa, a expressão “psicologia da
comunidade” é mais utilizada que “psicologia na comunidade”. Isso quer dizer que no início
recebeu essa denominação devido ao contexto econômico, político e cultural que fazia da
psicologia uma profissão elitizada e para ir de encontro a esse modelo de atuação, os
profissionais da área de psicologia iniciaram trabalhos nas comunidades com o intuito de estar
mais próximo da população. Foi na década de 1990, que a expressão da passa para na,
referindo-se às práticas ligadas às questões da saúde precisamente. Como destaca Gomes
(1999), essa ambigüidade de termos para definir essa área de conhecimento proveniente da
psicologia social, não deve ser vista com fragilidade, mas como dificuldades próprias da
estruturação de um campo do saber. Podemos apontar que a Psicologia Comunitária inclui
estudos que vem sendo desenvolvidos no campo da Psicologia Social, aplicada às
comunidades, a saúde mental, a psicologia no desenvolvimento comunitário, entre outros
âmbitos de conhecimentos.
Não podemos, também, deixar de ressaltar que além da própria “dificuldade” em
estruturar esse campo de conhecimento teórico/prático, o próprio tema comunidade precisa
ser analisado para que seja possível construir e/ou reconstruir possibilidades para essa área de
conhecimento. Dessa maneira, a comunidade precisa ser compreendida como um grupo social
que possui uma organização própria, que compartilha o mesmo espaço físico e psicológico,
como também de objetivos comuns derivados de crenças, valores e comportamentos. “Um
espaço privilegiado da práxis da Psicologia Social” (GOMES 1999, p.3).
2.4 A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA NO BRASIL
Andrey (1996) nos coloca que a expressão comunidade vem sendo utilizada para
referenciar a instrumentalização de conhecimentos e técnicas psicológicas que possam vir
contribuir para uma qualidade de vida individual e social. É através de atuações nesses
espaços sociais, próximo ao cotidiano das pessoas, que se criam canais de expressões.
Para Góes (2003) a Psicologia Comunitária é uma área da Psicologia Social, voltada
para a compreensão da atividade comunitária como atividade social comunicativa
(consciente), própria do modo de vida (objetiva e subjetiva) da comunidade e que abrange seu
sistema de relação e representação, modo de apropriação do espaço da comunidade, ou seja, a
identidade pessoal e social, a consciência, o sentido de comunidade e os valores e sentidos ai
implicados. Seu objetivo é o desenvolvimento do sujeito na comunidade, no sentido de
aprofundamento da consciência de seus moradores com relação ao modo de vida da
comunidade, através de um trabalho interdisciplinar voltado para a organização e
desenvolvimento dos grupos da própria comunidade.
Outro conceito importante e necessário à compreensão da Psicologia Comunitária,
segundo Góes (2003), é o conceito de comunidade, seu objetivo e material de trabalho e o
campo de atuação. O termo comunidade, utilizado hoje em dia na Psicologia Social, é
bastante elástico, capaz de incluir em seu espaço desde um pequeno grupo social, um bairro,
uma vila, uma escola, um hospital, um sindicato, uma associação de moradores, uma
organização não governamental. Enfim, as definições de comunidade têm sido, cada vez mais,
abrangentes.
Vygotsky (apud GOES, 2003), relata que a Psicologia Comunitária estuda os
significados e sentidos. Além disso, estuda o modo como o sistema de significados, sentidos e
sentimentos se encontram nas atividades comunitárias e nas condições gerais de vida dos
moradores na comunidade, no município e no conjunto da sociedade. Seu campo de atuação é
a comunidade, um espaço geográfico que também é social e econômico, significativo e básico
da vida em sociedade.
A atividade comunitária é o eixo em que se realiza e se desenvolve a Psicologia,
Comunitária. É, portanto, o processo pelo qual o indivíduo se apropria da realidade (da
própria vida em comunidade), transformando a comunidade e aprofundando sua consciência
no mundo.
Nesse sentido, pode-se dizer que a Psicologia Comunitária é um conjunto de
interações entre o indivíduo ou grupo e as condições objetivas da comunidade e do município
em uma prática coletiva e solidária em benefício desta e dos seus moradores.
Dessa forma, estudar o modo de vida da comunidade, é poder compreender as reais
necessidades dos moradores e a importância do compromisso que o psicólogo comunitário
tem com a comunidade em que atua. A Psicologia Comunitária preocupa-se com as condições
psicossociais da vida da comunidade (interna e externa) que impedem aos moradores
construírem-se como sujeitos de sua comunidade e as condições que os fazem sujeitos dela,
ao mesmo tempo em que, no ato de compreender e compartilhar a vida comunitária com seus
residentes, trabalhar com eles, a partir dessas mesmas condições, na esperança da autonomia e
liberdade dos próprios moradores (GÓES 2003).
O problema central, então, não é a relação entre saúde e enfermidade, prevenção e
tratamento, mas sim a construção do morador como sujeito da realidade, segundo Lane (1987
apud GÓES 2003).
Essa construção de sujeito da comunidade está implicada na compreensão do morador
responsável pela realidade histórico-social na qual vive e também na capacidade de
transformá-la em seu próprio benefício, e de toda a coletividade. Por conhecer seu valor e seu
poder pessoal o morador é sujeito, e como tal se descobre, capaz de influir no sistema de ação
histórica, individual, coletiva e social. O sujeito, aqui considerado, surge da atividade de
superação das condições sociais em que vive como conseqüência do desenvolvimento de sua
prática social local.
Para Vygotsky, Freire e Lane (apud GÓES 2003), o indivíduo ao transformar a
realidade se apropria, cada vez mais, dela e, por conseguinte, passa a conhecê-la muito mais,
tornando-se assim sujeito de sua história, de sua realidade, percebendo-se responsável e
também mediador em sua relação com o mundo.
Dessa maneira, no momento que esse sujeito for construir seu lugar de vida, irá
descobri-lo, conquistá-lo. Na apropriação, mediante uma prática coletiva de cooperação, o
sujeito ou morador consegue rasgar o véu que o impede a conscientização e embota sua
capacidade de aprofundar sua consciência no mundo. Sua prática, sua vida passa a ter mais
sentido tanto para ele, quanto para os demais, tornando-se mais consciente da sua relação com
o mundo (GÓES, 2003).
Para o autor acima, o psicólogo comunitário deve tentar trazer esse sujeito à luz da
consciência, no sentido de não se tornar massa de manobra, ou seja, ter seu valor pessoal,
valorizado e respeitado. Reconhecemos que nossa concepção de Psicologia Comunitária
contém também valores arraigados nas ciências sociais acerca do desenvolvimento humano e
social em nosso povo, como numa ideologia de mudança social radical.
Porém, isso não invalida o pensar científico nas ciências humanas e sociais, pois
sabemos o lugar e a ideologia que esses valores ocupam em nosso compromisso social. De
acordo com Freire (apud GÓES 2003) os sentidos últimos da Psicologia Comunitária é uma
contínua busca de humanização por parte dos moradores de uma comunidade, pois esta nos
parece ser a locação do sujeito por reconhecer-se incompleto, incapaz de superar-se como ser
humano que de fato o é.
Góes (2003) aceita a complexidade na composição teórica da análise da constituição
do sujeito, que pressupõe, ao mesmo tempo, a intersubjetividade constitutiva e a singularidade
do sujeito, pois somente assim será possível superar a concepção do sujeito abstrato, tanto do
modelo universal quanto do modelo das diferenças individuais, ambos presentes
tradicionalmente na psicologia.
A concepção de constituição do sujeito que não desconsidera a individualidade nem a
singularidade, mas que, também, atribui novos significados, quais sejam, a individualidade
como uma conjugação que envolve elementos de convergência e divergência, semelhanças e
diferenças, aproximação e afastamento, em relação ao outro, e o sujeito como uma
composição não harmônica dessas tensões e sínteses a partir do funcionamento intersubjetivo,
a constituição do sujeito na sua singularidade, a qual envolve diferenças e semelhanças frente
a outros movimentos de aproximação.
Mesmo com a contribuição crescente de vários autores, ainda temos muito que fazer
para um maior entendimento da relação sujeito comunidade e da relação entre atividade
comunitária e consciência do modo de vida do lugar, bem como para uma maior compreensão
e desenvolvimento do sujeito comunitário, enfim, contribuir para o fortalecimento da
Psicologia Comunitária como campo de atuação da psicologia, trabalho esse centrado no
desenvolvimento do sujeito na comunidade (GÓES, 1996).
É preciso compreender o sentido e o significado conceitual, histórico, social e cultural
da comunidade para poder refletir os pontos significativos, pois dessa maneira pode-se
repensar o campo da psicologia nesse cenário de trabalho, como nos mostra Rio (1987 Apud
GÓES, 2003, p.79).
Comunidade é um grupo humano, vivendo em área geográfica contígua,
caracterizada. por um trauma de relação e contatos íntimos, possuindo a mesma
tradição e os mesmo interesses, mais a consciência da participação em idéias e
valores comuns, ressaltam nessa conceituação o aspecto geográfico, isto é base
territorial, o agregado populacional que atravessa todos os processos de nascimento,
morte e migração; o aspecto psicosocial, isto é, o sistema de relação de expectativa
de comportamento, atitudes entre os grupos participantes; o aspecto cultural, isto é,
os valores e idéias. Cada um desses aspectos liga a comunidade a um conjunto mais
amplo no qual se encontra inserida.(RIO, 1987. p.59).
Góes (2003) descreve que é preciso aceitar a força dos grupos, a sua capacidade de
transformar e entregar o indivíduo e a comunidade. O pequeno grupo onde as internações são
face a face, propicia o aparecimento de um clima psicossocial, favorável ao crescimento
individual, grupal e social.
Para Góes (2003) o pequeno grupo popular é aquele em que o objeto de trabalho são
as condições psicossociais do grupo e a transformação destas pelo próprio grupo, sejam elas
individuais ou sociais, o grupo, nesse caso, é trabalhado nas suas forças internas e
interacionais com o meio sócio econômico e político. Ou seja, as forças interacionais e
internas cuidam dos componentes de estruturação, organização e desenvolvimento dos
membros e do próprio grupo como um todo.
Em suma, pode-se pensar que a Psicologia Comunitária, como nos relata Andrey
(1996) deve ser pensada, considerando os fatores sociais, econômicos, culturais, políticos e
suas influências no desenvolvimento e na modificação de comportamentos e intervenções,
visando a promoção e a prevenção individual e coletiva; que visam à melhoria da
competência social e o trabalho inserindo nos contextos sociais, adotando assim uma postura
flexível que possibilite uma atuação mais contextualizada, onde é necessário àqueles que
delas necessitam, e não, apenas, aos que procuram posturas inovadoras diante das
diversidades; estimulando a comunidade a participar do desenvolvimento e execução dos
programas propostos; problemas de saúde/doença de forma contextualizada; por meio de uma
educação popular, bem como pela promoção e facilitação das reformas sociais.
Diante dos temas principais que marcam o pensamento atual dos profissionais da área
da Psicologia Comunitária, podemos ressaltá-la, como aquela que busca uma aproximação das
classes populares, que estimula a construção de idéias e posições diante da vida e do outras
circunstâncias. Essas construções caminham na tentativa de “libertar” os indivíduos de
pensamentos rígidos, a-históricos, a-críticos, possibilitando um processo de autonomia e
libertação. Portanto, ao se pensar em psicologia na comunidade,é necessário refletir sobre sua
real função, como ressalta Spink:
Insistir, de um lado, em uma identidade única é cercear o crescimento,
vestir-se a camisa-de-força do modelo hegemônico. Admitir, por outro lado, a
existência de múltiplas identidades é aceitar a fragmentação e a possibilidade de
implosão, e ser forçado a buscar um novo modelo de formação profissional.
Modelo que, a partir de um núcleo comum, talvez histórico, encaminhe para
especializações que respondam aos múltiplos modelos identificados nas
representações que os psicólogos têm de sua atividade. (SPINK, 2003.p.131).
Dessa forma, precisamos visualizar os processos que estão por traz da “realidade”
estudada, para que seja possível observar os fatores sociais culturais, econômicos, políticos e
ideológicos que influenciam determinada área analisada e os indivíduos nela inseridos,
contribuindo, assim, para a melhoria da qualidade de vida.. Dessa maneira, podemos utilizar
os conhecimentos teóricos e práticos como fonte de reflexão e construção possível de um
campo de atuação efetiva, respaldando o seu compromisso social.
De acordo com Freitas (1998) a inserção do psicólogo na comunidade pressupõe que
estejamos falando sobre uma relação entre dois pontos. De um lado a existência de um
profissional com formação e conhecimentos adquiridos. De outro lado, a comunidade com sua
dinâmica e características próprias, inserida em um contexto geo-sócio-politico e vivendo em
um tempo histórico determinado. Dessa forma, tanto o profissional quanto a comunidade
podem ter modos e ações diferentes, que são orientados por visões de mundo e de homem
nem sempre coincidentes e conciliáveis.
Freitas (1998) nos coloca que tem havido diferentes motivos que têm orientado a
inserção do psicólogo na comunidade, dentre os quais podemos destacar:
-Década de 1970, aproximadamente, a inserção de profissionais nos bairros
periféricos, e favelas, tentando negar sua origem cultural e de classe;
-Outra forma de inserção foi através de trabalho de comunidade, voltado para os
menos favorecidos;
- A inserção guiada pela curiosidade em conhecer as populações mais desfavorecidas;
- A inserção orientada pelo compromisso de trabalho, possibilitando mudança das
condições de vida existente.
Os modos de intervenção citados acima têm como objetivo uma postura de
preocupação com a comunidade. Existem, também, conforme destaca Freitas (1998), modos
de intervenção por meio dos objetivos norteadores e modos intervencionistas. Cada forma
apresenta suas particularidades.
Outro ponto fundamental colocado pelo autor é sobre as estratégias e instrumentos
utilizados pelo psicólogo quando se unem na comunidade. Nesse sentido, o trabalho de
entrada do psicólogo, na comunidade, depende de:
- Contatos e conhecimentos que realiza quando se depara com a realidade concreta dos
espaços popular;
- Intermediários individuais e/ou coletivos que buscam o profissional de psicologia
com a expectativa de que ele faça algum tipo de atendimento individua;
- Tentativa que o próprio profissional de psicologia faz de se fazer conhecer
juntamente com a comunidade ou aos seus representantes sobre o serviço de que se dispõe.
Depois que o profissional está inserido na comunidade, inicia-se um processo contínuo
para obtenção de informações e interações, ou seja, por um lado o profissional estará
exercendo suas atividades e por outro estará sendo observado, registrado e avaliado pelos
moradores daquele lugar.
Freitas (1998) nos coloca que são vários os instrumentos utilizados ao se inserir
nesses espaços, entre eles:
-As entrevistas que muitas vezes são feitas de forma coletiva, fora de um ambiente
controlado, com um número variável de participantes do início ao fim;
-Conversas informais que podem ser realizadas em diversos lugares, como bares,
ponto de ônibus, padarias, caminhando nas ruas, cujos conteúdos vão possibilitar o
levantamento de indícios sobre a dinâmica existente na comunidade e sobre o tipo de
interação e vínculo, que os moradores vão estabelecendo;
-Visita as casas, para participar de alguma festividade ou reunião importante;
-Registros de acontecimentos e/ ou episódios significativos em diários de campo;
-Recuperação da história através de fontes várias, como pessoas significativas,
lideranças formais e informais, representantes de entidades, igrejas e templos, entre outros;
-Resgate de documentos do saber popular e também o uso de fotográfico;
-Encontros não programados, reuniões imprevistas e debates repentinos acontecidos
no seio dos grupos formais e também informais;
Já com relação às estratégias, o autor coloca alguns pontos pertinentes como:
-Coleta de informações sobre a vida das pessoas, condições de moradia e
sobrevivência, recuperação histórica da comunidade;
-Identificação de necessidades e problemáticas vivenciadas pela comunidade, no seu
cotidiano, em temas de processos psicossociais que afetam os seus indivíduos;
-Detecção de modos alternativos de enfrentamento e resolução, encontrados pelos
moradores;
-Discussão conjunta com a própria comunidade e seus representantes, sobre
alternativas, decisões e estratégias;
-Constituição de grupos para realização de alternativas e ,também, de uma avaliação
contínua dos caminhos postulados.
Segundo Freitas (1998) o ganho de uma postura profissional que considere os aspectos
citados é de encontro de possibilidades para que a própria comunidade construa relações
solidárias e humanas. O papel do psicólogo em termos de se apropriar das informações, das
dinâmicas presenciadas e compartilhadas e do próprio contexto comunitário tem fundamental
importância para uma prática efetiva e contextualizada.
Com relação ao campo de atuação da Psicologia Comunitária, segundo Vasconcelos
(1985) os psicólogos comunitários não são donos de campos de trabalho onde eles sozinhos
atuam. Eles vão estar em espaços no qual já existem psicólogos, desenvolvendo suas
atividades, bem como outros profissionais. O que dá identidade ao psicólogo comunitário em
relação aos seus colegas tradicionais é uma forma de atuar própria, voltada para as
necessidades da comunidade. O primeiro espaço de atuação da Psicologia Comunitária nos
pede uma visão mais crítica e ampla do campo de atuação, uma abordagem mais preventiva,
manipulando variáveis sociais e institucionais. Ela reivindica uma ação participativa dos
moradores (usuários) e funcionários das instituições na resolução dos problemas surgidos.
Ainda de acordo com Freitas (1998), os diferentes trabalhos realizados em
comunidades brasileiras, nestas últimas três décadas, tiveram uma repercussão muito grande
de diversidade, quanto à formação dos psicólogos envolvidos, os instrumentos utilizados e as
problemáticas apresentadas. Dessa forma, os psicólogos que atuam em comunidade se
caracterizam por possuir diferentes formações entre elas a psicanálise, gestalt, psicologia
social americana ou crítico-histórica, sensacionalismo entre outras, trabalham em
universidades desenvolvendo projetos de pesquisas e estágios no qual trabalham
problemáticas de âmbito social com professores particulares, desenvolvendo atividades em
outros espaços como escolas, sindicatos, hospitais, instituições de saúde entre outros.
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
3.1 CARACTERIZAÇÃO DO CAMPO DE PESQUISA E PÚBLICO ALVO
O trabalho proposto foi realizado na Comunidade da África, situada no bairro da
Redinha, em Natal, capital do Rio Grande do Norte. Para a coleta dos dados utilizamos a
observação e entrevista semidirigida que nos possibilitou conhecer a realidade estudada.
Entrevistamos o psicólogo da Unidade Básica da África, bem como duas psicólogas do PAIF.
Também participamos de grupos de trabalho desenvolvidos na unidade de saúde, realizados
com adolescentes, observando como se dá o trabalho do psicólogo na comunidade.
Para análise dos dados, utilizamos a fundamentação teórica para discussão dos dados
coletados e da observação realizada, que nos possibilitou a descrição e reflexão da realidade
estudada.
4 ANÁLISE DOS DADOS
O trabalho realizado na Comunidade da África, situada no Bairro da Redinha, em
Natal, capital do RN foi de fundamental importância para a construção teórica/prática dos
envolvidos.
Foram realizados quatro encontros que possibilitaram levantar reflexões significativas
acerca do trabalho do psicólogo na comunidade. Um dos pontos que chamou a nossa atenção,
previamente, foi que o psicólogo não possui um lugar “certo” para a realização de suas
atividades, ele atua em muitos espaços, dando-lhe uma forma própria de atuar, voltada para os
interesses e possibilidades da própria comunidade. Como destaca Vasconcelos (1985) os
psicólogos comunitários não possuem um espaço definido de atuação, eles são chamados para
atuar nas diversos contextos sociais, podendo ser escolas, empresas ou qualquer outra
instituição .
Pudemos observar na prática, quando da entrevistada 1, que o trabalho no PAIF
(Programa de Assistência Integral à Família), a atuação do psicólogo comunitário ocorre em
qualquer espaço, até mesmo na rua. O espaço, portanto, é subjetivo, não existido, assim,
quatro paredes para a Psicologia Comunitária .O próprio referencial teórico aponta para a
importância de se pensar no campo de atuação do psicólogo comunitário, a comunidade, esse
espaços geográfico, social e econômico como destaca Vygotsky (Apud GÓES ,2003).
Como nos relata o profissional de psicologia que trabalha em comunidade, além de ter
a Unidade Básica de Saúde como apoio, realiza também visitas domiciliares, a grupos de
idosos e adolescentes como coloca em sua expressão:
Pode ser onde for. Pode ser no posto, pode ser na sala de espera, na rua, em
uma caminhada pela comunidade, visitando as escolas, enfim, em várias situações, é
um contexto bem diverso.(J.L)
O psicólogo que atua na Unidade Básica de Saúde, explica que tal instituição funciona
como aparato, como base de suas atividades. Na Unidade desenvolve atendimentos
individuais, não possuindo uma sala própria, mas utilizando os espaços disponíveis, podendo
ser a sala de um médico, a própria sala de espera como também outros ambientes da Unidade.
Na primeira visita realizada à comunidade, já podemos perceber, através de uma
reunião que tinha por tema ‘O futuro da comunidade da África e reurbanização’ tem como
finalidade “despertar” o interesse dos moradores através de uma participação crítica
consciente e responsável, observado não apenas no campo pessoal, restrita à sua vida, mas
sobretudo à da comunidade. Esse encontro reúne adolescentes do bairro e ocorre de 15 em 15
dias, aproximadamente.
Góes (2003) ressalta a importância dos grupos como espaços onde são trabalhadas as
forças internas e suas relações como o meio sócio-econômico-político. Pudemos perceber que
esse grupo possibilita aos seus participantes reconhecer seu papel ativo na realidade histórico-
social em que vive, e de que são capazes de transformá-la em seu próprio beneficio de toda a
coletividade. O morador é sujeito e, portanto, se “descobre” capaz de influir no sistema de
ação histórico, de ordem individual, coletiva e social.
É interessante pontuar que os temas trabalhados no grupo também são apontados pelos
próprios participantes. Nesse primeiro encontro, os adolescentes colocaram como assuntos a
serem refletidos a questão da prostituição, drogas, aborto, protagonismo. Dessa forma, o
psicólogo comunitário busca na própria comunidade temas que dizem de sua realidade,
constituindo-se numa prática contextualizada, na medida em que parte dos próprios
indivíduos as questões referentes ao seu meio social.
O segundo encontro também foi realizado com o grupo de adolescentes, e possibilitou
compreender, que a cada encontro, mesmo tendo o mesmo grupo de participantes, surgem
questões “novas” que falam de aspectos da realidade em que vivem. É interessante porque a
medida que essas questões surgem o psicólogo pode conhecer um pouco mais dessa realidade,
bem como de pessoas, estratégias e instrumentos para os próximos encontros. Como nos
aponta Freitas (1998) são vários os instrumentos e estratégias que respalda o trabalho do
psicólogo e entre eles temos as entrevistas, as conversas informais, discussão conjunta com a
própria comunidade entre outros.
As entrevistas realizadas possibilitaram a compreensão sobre a prática comunitária,
exercida pelo psicólogo. A diferença que se pode observar é mais precisamente na visão de
homem, de sujeito, de comunidade, de mundo e dos demais campos de atuação do psicólogo .
A psicologia compreende o homem como ser histórico, responsável e autônomo com
capacidade para intervir de alguma forma na sua história, na comunidade. O psicólogo
comunitário visa proporcionar espaços para que essas pessoas de comunidade reflitam,
conversem e discutam os dilemas que aparecem em suas vidas, e que, a partir dessas
reflexões, possam criar uma rede de encaminhamentos dessas ações como ressalta o psicólogo
J.L. A Psicologia Comunitária é, portanto, uma área de Psicologia Social, que visa
compreender esse espaço comunitário com suas reais dificuldades, seus progressos,
influências e, questionamentos, considerando os aspectos que perpassam tal vivência. Para
Góes (2003) o objetivo de Psicologia Comunitária é o desenvolvimento do sujeito na
comunidade, visando aprofundamento de sua consciência e dos seus moradores em relação ao
estilo de vida, através de um trabalho interdisciplinar, voltado para a organização e o
desenvolvimento dos grupos e da própria comunidade. A própria fala do psicólogo J.L
expressa essa postura.
‘Eu acho que a psicologia comunitária tem uma especificidade porque ela
vai ter que entender o sujeito de forma a que existe algo que os liga, que os conecta,
seja em função daquele espaço geográfico, do que é demandando dela nesse espaço,
uma identidade comum, uma identidade coletiva que atravessa a vida daquelas
pessoas e que aquele espaço tem potencialidade, tem força de mobilizar algumas
coisas, energias, para que aquele espaço seja algum espaço que lhes garanta uma
vida digna, pautada no respeito, tendo acesso a uma condição de vida mais segura,
com aparelhos sociais, saúde, educação, renda, então eu acho que a psicologia
comunitária tem esse lugar de possibilitar as pessoas de se enxergarem como atores
fundamentais desse processo de conquista dessas condições de vida aí.’( Entrevistado
J.L).
No dia do terceiro encontro, conhecemos a comunidade, pois acompanhamos a
estagiária de psicologia que trabalha na Unidade Básica de Saúde e, a quem foi solicitado
fazer uma visita domiciliar. Enquanto a estagiária realizava esse atendimento, caminhávamos
pelas ruas, conhecendo um pouco a comunidade. Com relação ao atendimento as questões
levantadas foram: depressão, dependência do álcool, “destruição familiar’, e desemprego.
Pudemos perceber o quanto as questões sociais, econômicas, políticas e culturais perpassam a
vida em sociedade. É ai que o psicólogo comunitário pensa seu trabalho, conforme nos coloca
Andery (1996), onde a Psicologia Comunitária deve ser pensada, levando em consideração os
fatores sociais, econômicos, culturais, políticos, como citados anteriormente, e suas
influências no desenvolvimento e na modificação do comportamento. As intervenções visam,
dessa forma, a melhoria da competência social, sempre construindo uma postura
contextualizada.
Para possibilitar uma melhor compreensão do trabalho do psicólogo na comunidade,
além de participar dos grupos existentes com adolescentes, caminhar pelo bairro, conhecer
profissionais, que atuam nas instituições de saúde, realizamos uma entrevista semidirigida
com duas psicólogas atuam no PAIF. e com o psicólogo que trabalha na Unidade Básica de
Saúde na comunidade da África. É nesse sentido, que a Psicologia Comunitária se preocupa
com as condições psicossociais da vida em comunidade, objetivando uma crítica positiva,
consciente e participativa dos membros envolvidos.Outro ponto importante no trabalho
comunitário é a relação estabelecida entre a realidade que muitos espaços sociais apresentam,
e que diz respeito a questões econômicas, políticas culturais e sociais.O psicólogo JL nos
aponta que muitos dos questionamentos estão ligados a questões do modo de vida, das
condições de vida de cada indivíduo de falta de oportunidade de trabalho, moradia.Tudo isso,
além de outros fatores, interferem no sofrimento e também na forma como as pessoas
explicam esse sofrimento.Tudo isso nos mostra a complexidade da vida e de como a
psicologia olha e atende essa demanda. Uma postura colocada pela entrevistada 02 e 01 é que
o importante é o olhar para o indivíduo, visando oferecer atendimento de qualidade é poder
ouvir a dor do outro, respeitando-o e tentando ajudá-lo de coração aberto.
Pudemos perceber também que estar diante de questões de ordem sócio-econômica-
política, ligadas, necessariamente, à sobrevivência, é algo complexo de se pensar, pois a
psicologia, como sabemos, desde sua legitimação como profissão, vem se dedicando a um
público seleto e, á medida que foi conquistando novos espaços, os subsídios teóricos não
foram mais dando conta. Portanto, esses novos espaços se configuraram como ‘novos
olhares’, novos acolhimentos, contemplando a diversidade. Como experiência, pudemos
observar que essas questões precisam ser olhadas, pensadas e discutidas para que seja
repensada a atuação do psicólogo nesse espaço. Com isso, não queremos dizer que estamos
diante de algo diferente, mas, de espaços, indivíduos e subjetividades que nos pedem um olhar
contextualizado. Quando nos reportamos a essa realidade como algo complexo é por acreditar
que ainda estamos no caminho para compreender tais questões, de modo a embasar e
contextualizar a nossa prática. Sentimos, então, uma necessidade de lidar com tais questões.
Também sabemos que não encontraremos respostas prontas para tal realidade, mas
uma construção continua do saber/fazer da psicologia.
A entrevistada 02 nos confirma tal explanação, na medida em que coloca que esse é
um trabalho muito difícil, quando você escuta um indivíduo falar que não tem um teto para se
abrigar, nem o alimento para saciar a sua fome, e fala que o buraco é mais embaixo e relata,
ainda, que se comove com algumas realidades que encontra. Outros pontos a destacar são as
dificuldades que os psicólogos encontram na comunidade, o número elevado de pessoas que
chegam ao atendimento, configurando-se em uma alta demanda a ser atendida por uma equipe
pequena para tal acolhimento, bem como a própria locomoção dentro da comunidade, os
profissionais, os modelos de atenção, a falta de mobilização das pessoas da comunidade, em
prol da próprio espaço.
A prática realizada durante essa pesquisa, possibilitou reflexões significativas sobre o
trabalho do psicólogo comunitário. Pudemos perceber que a atuação não segue um espaço
pré-determinado visando uma escuta, um olhar em acolhimento desses indivíduos, de modo a
proporcionar que cada indivíduo seja sujeito de sua própria história, como nos fala GÓES
(2003), é poder possibilitar aos moradores rasgar o véu que os impede de ter uma consciência
crítica perante a vida. A valorização e o respeito para tal proposta de trabalho se fazem
necessária durante a graduação, oportunizando aos estudantes usufruírem disciplinas que
ofereçam um arsenal teórico/prático (reflexão desses espaços comunitários),com toda sua
problemática, dificuldades e conquistas. Como relata a entrevistada 02 que acredita ser de
fundamental importância a inclusão, na grade curricular, de disciplinas de cunho social para
dar suporte ao trabalho na comunidade.
5 CONSIDERAÇOES FINAIS
Diante dessa rica experiência, focada no trabalho comunitário, podemos apontar
algumas reflexões realizadas com base na revisão bibliográfica e da observação prática. Para
tal proposta, acreditamos, conforme coloca Nasciutti (1991) que a comunidade se configura
como espaço onde transitam indivíduos, possuidor de instituições e atividades que
caracterizam a vida coletiva. Nesses espaços, as instituições se colocam como mediadoras
entre o que é de ordem social e individual, havendo, portanto, uma interdependência. Nesse
contexto, as ações da Unidade Básica de Saúde com o PAIF, bem como outros espaços sociais
configuram-se como mediadores de atuações, mas não, necessariamente, a única possibilidade
de trabalho. Para isso, é necessário um conhecimento desse espaço de atuação, visando
compreender a realidade concreta dos espaços populares e planejar ações e serviços
contextualizados com a realidade concreta. Outro ponto é poder, através de contatos com a
comunidade, sejam estes por meio de grupos, entrevistas, conversas informais e visitas;
conhecer um pouco sobre essa população. Achamos interessante a atuação dos grupos de
idosos e adolescentes nos encontros realizados pelos psicólogos pesquisadores e o psicólogo
da comunidade.
Conhecer a atuação do psicólogo na Comunidade da África nos possibilitou
compreender que trabalhar em Psicologia Comunitária, é fazer parte da comunidade e com
isso conhecer a realidade e pensar constantemente numa atuação, cada vez mais, efetiva
diante dos obstáculos e das condições de vida da população. É poder pensar que antes de tudo
somos seres sociais, históricos, culturais e precisamos, portanto, contemplar tais aspectos na
prática cotidiana.
REFERÊNCIAS
ANDREY, Alberto A. “Psicologia na comunidade.” In: LANE, Sílvia e CODO, Wardelers
(orgs.), psicologia social: o homem em movimento, São Paulo, Brasiliense, 1984.
FREITAS, Mário de Fátima Quintal. Novas práticas e velhos olhares em psicologia
comunitária, uma condição possível. In: Psicologia - Reflexões (im) pertinentes Lídio de
Souza et ali (org). São Paulo:casa do psicólogo, 1998.
FREITAS, Maria de Fátima Quintal. Psicologia na comunidade, psicologia da comunidade e
psicologia social comunitária – práticas da psicologia em comunidade nas décadas de 60 a 90,
no Brasil. IN: Campos, Regina F. (org.). Psicologia social comunitária: da solidariedade à
autonomia, RJ, Vozes, 1996
GÓES, Cezar W. de Lima. Psicologia Comunitária. Fortaleza, CE: 2003.
GOMES, Antônio M. de Araújo. Psicologia Comunitária: Uma abordagem conceitual.
Psicologia: teoria e prática. 1999, 1(2).
LANE, Silva T. M. A psicologia social e uma nova concepção do homem para a psicologia.
IN: Campos, Regina F. (org.) Psicologia social comunitária: da solidariedade à
autonomia, Rio de Janeiro, Vozes, 1996.
SCHERER, A.E. A Constituição do eu e do outro pela interpelação da língua pela língua
na história do sujeito. Disponível em www.discurso.ufrgs.br/sead/doc/lingua/scherer.pdf.
Acessado dia 17/05/2006, às 10:30.
VASCONCELOS, Eduardo Mourão. O que é Psicologia Comunitária, 2 ºed. São
Paulo:Brasiliense, 1986.
NASCIUTTI, Jacyara C. Rochael. et al Psicologia Social Comunitária: A instituição como
via de acesso, Ed. Vozes, Rio de Janeiro, 1996, pg. 100.
ANEXO -II
ENCONTROS REALIZADOS NA COMUNIDADE DA ÁFRICA
• PRIMEIRO ENCONTRO
Chegamos à Comunidade da África às 14:00 horas e fomos direto para o posto de
saúde local , onde fomos apresentadas à equipe, que constava de uma agente de saúde, uma
estagiaria de serviço social, duas estagiárias de psicologia e o psicólogo da comunidade que
fez a abertura da reunião que, neste dia, teve como tema:“O futuro da Comunidade da África
e a reurbanização”. Em seguida, ele foi fazer atendimentos clínicos individuais, retornando
para o encerramento da reunião. Nessa reunião, com grupo de jovens, refletiu-se sobre a
importância da reurbanização da comunidade para todos os indivíduos que convivem nela.
As discussões foram bastante relevantes, no sentido que suscitou possibilidades de reflexões a
todos os envolvidos.
Nesse encontro houve a participação de dezessete (17) adolescentes que discutiram
sobre o tema, sendo também convidada a agente social do Projeto África Viva . Ela mostrou
em mapa e comentou todas as mudanças que estão previstas no projeto. Esclareceu as dúvidas
sobre quem vai ser beneficiado. Ela esta responsável pela área de geração de emprego em
renda usou o espaço para realizar um questionário com os adolescentes sobre grau de
escolaridade de interesse em recursos de capacitação. Caso consigam professor e material
para os cursos os freqüentadores do grupo terão prioridades.
Depois de toda exploração pela agente comunitária o psicólogo do Posto de Saúde
encerrou, sorteando uma entrada para o cinema e pediu sugestão para os temas dos próximos
encontros; Eles sugeriram prostituição, novas drogas, protagonismo juvenil, aborto, ética.O
que pudemos observar, é que o psicólogo comunitário, ele busca soluções para o sofrimento e
necessidade do indivíduo da comunidade, que sofreu com a falta de alterações e interesse por
parte dos governantes.os.
• SEGUNDO ENCONTRO
O segundo encontro ocorreu novamente com a participação do grupo de adolescentes.
Participaram dezessete (17) adolescentes, agentes de saúde, o psicólogo da Unidade e a
assistente social do projeto “África Viva”. Inicialmente foi feita uma dinâmica de
entrosamento em que as pessoas se juntavam em dupla, conversavam brevemente para se
conhecerem um pouco e, em seguida, um apresentava o outro para o grande grupo.Após esse
momento, foi realizada uma atividade para descontração do grupo. Em circulo, os
adolescentes deveriam fazer, para seu companheiro da direita, uma mímica, orientando o que
este deveria fazer. Ao final, quando todos haviam expressado suas mímicas, orientamos para
que o outro parceiro da dupla reproduzisse a mímica que havia determinado para seu vizinho.
Todos riram muito e o clima ficou bem descontraído. Em seguida, foi feito um levantamento
de expectativas de cada componente. surgindo muitas questões como, por exemplo, o
desemprego; a família; a independência do adolescente. Concluído o debate,o psicólogo
marcou a data da próxima reunião. O encerramento foi marcado por sorteios de brindes e
servido um lanche aos participantes.
• TERCEIRO ENCONTRO
Não participei da reunião com os adolescentes, preferi conhecer a comunidade.
Caminhei pelas ruas, acompanhada da estagiária em psicologia, que, por sua vez, teria de
fazer um atendimento domiciliar. Enquanto a estagiária realizava o atendimento, continuei a
caminhada, passando em frente ao Clube de Mães.Lá entrei e fui conversar um pouco com as
mães que se encontravam ali. Percebi que as ações desenvolvidas por desse grupo possibilita,
além de um trabalho de artes e lazer, uma forma de renda para as famílias.
Quando a psicóloga acabou o atendimento, encontramo-nos e retornamos ao Posto de
Saúde.
• QUARTO ENCONTRO
No dia 23 de agosto de 2006, estive no PAIF para realizar uma entrevista com as
psicólogas desse programa. Quando lá cheguei, uma das psicólogas estava, fazendo um
atendimento e pediu para que eu a esperasse. Enquanto esperava pude ouvir e observar o
atendimento que ela fazia. Foi interessante poder participar desse momento , porque ele me
comprovou as teorias de que o atendimento feito em comunidade pode ocorrer em diversos
lugares, onde o que importa é ouvir e ajudar esse sujeito. A psicóloga atuava de forma
objetiva, direta, orientando à senhora que a procurava, inclusive convidando o filho dessa
senhora a participar de um encontro do serviço de psicologia do programa. Em seguida, fui
convidada pelas psicólogas para ir a sala do ambulatório onde atuam, onde ocorreu a nossa
entrevista. A entrevista se deu de forma bastante informal, com a presença das duas
psicólogas e bastante troca de informações entre elas, já que uma das psicólogas tem
formação na área de dois anos e atua na comunidade há nove meses, a outra, formada há
apenas há seis meses e com atuação na comunidade de apenas quatro meses. Foi
extremamente importante esse encontro pela riqueza de informações obtidas através da
entrevista, constituindo-se, portanto, uma boa fonte de dados.
ANEXO III
ENTREVISTAS
ENTREVISTA 01 (R.L.M: Psicólogo em atuação na Comunidade da África).
Data: 23.08.06
Entrevistado : R.L.M
Idade: 23 anos
Tempo de formação: 6 meses
ETR - Há quanto tempo está trabalhando na Comunidade da África?
ETO-1- Dois meses
ETR- Quais são as atividades que você desenvolve na comunidade?
ETO-1- Aqui na comunidade, a gente desenvolve atividades de Plantão Psicológico na casa,
atendimentos a grupos, que aqui funcionam com crianças, idosos e mulheres, atendimento em
visita domiciliar, é isso.
ETR-E como se dá seu trabalho com outros profissionais na comunidade?
ETO-1- Costumamos fazer baterias com as outras instituições da comunidade, com o posto
de saúde, a delegacia, a escola... a gente procura trabalhar junto... A gente visa sempre está
trabalhando junto...No dia 30,31 vai ter uma atividade com adolescentes pelo Posto de Saúde
e a gente vai participar. A gente sempre chama outros profissionais para os acontecimentos
aqui. As escolas também... Há sempre uma busca de parceria, a gente junta forças já que a
gente trabalha em prol das mesmas pessoas, atendendo ao mesmo público.
ETR - Como a comunidade vê, aceita o trabalho do psicólogo comunitário?
ETO-1- No caso do PAIF, por mais que eu esteja aqui há pouco tempo, o que eu percebo é
que ele já tem uma boa consolidação na comunidade, as pessoas já procuram a casa, o CRAS
(Centro de Referência da Assistência Social) que é referência para eles. Esse atendimento que
eu estava fazendo agora... a pessoa chega na comunidade e toma conhecimento que a favela
da África tem um programa, tem psicólogo que trabalha com o social, eles vêm então procurar
ajuda, ou seja, já tem essa consolidação com o pessoal.
ETR - Então o trabalho é realmente realizado em equipe?
ETO-1- Exato, exato. As visitas domiciliares, normalmente, acontecem com uma assistente
social e uma psicóloga. Se for uma coisa mais especifica o psicólogo pode atender sozinho,
mas geralmente atende com o assistente social. Nos grupos também, são os dois.
ETR- Há alguma dificuldade nesse trabalho?
ETO-1- No trabalho comunitário a maior dificuldade é o número de pessoas que a gente tem
que atender, porque a gente não pode fechar as portas. A demanda é muito grande e a equipe é
pequena... A questão maior é essa... Principalmente em grupo de crianças...(risos). São quase
100 crianças cadastradas.
ETR- Como o psicólogo se adequa diante da vida difícil pela qual a comunidade passa,
apresentando graves problemas sociais e busca a remissão dos sofrimentos da comunidade?
ETO-1- Pra mim o primeiro passo é olhar aquela pessoa, né? Dá atenção a aquela pessoa que
independente das dificuldades, são pessoas dignas que merecem um atendimento de
qualidade. Então, eu acho que a gente precisa olhar para elas e dar o melhor da gente, dando
qualidade nesse trabalho.
ETR-O que levou você a atuar na comunidade?
ETO-1- A minha entrada na Psicologia Social se deu porque eu sou recém formada e na
cidade de Natal há uma abertura das políticas publicas, é aonde tem mais psicólogo inserido
hoje, eu acho que é nas políticas sociais.
ETR - Existe local específico de atuação para o psicólogo comunitário?
Lugar específico?... Atua em qualquer lugar, a rua é lugar de atuação. O espaço é subjetivo,
não existem quatro paredes na Psicologia Comunitária.
ERT- Como você definiria o psicólogo na comunidade?
ETO-1- Uma pessoa que tem que querer ficar, muito... Não é fácil, porque a gente se esbarra
com questões com a pobreza e a fome, e a gente tem que driblar tudo isso e olhar para esse ser
humano... Muitas vezes, eles vêm para o PAIF para os acontecimentos que a gente faz por
causa do lanche.
ENTREVISTA 02 –(A.J. Psicólogo em atuação na Comunidade da África)
Idade: 26 anos
Tempo de formação: Dois anos
ETR - Há quanto tempo está trabalhando na Comunidade da África?
ETO-2- Nove meses.
ETR- Há alguma dificuldade no trabalho do psicólogo comunitário?
ETO-2- É um trabalho muito difícil... Você... só ouvir aquela pessoa quando ela quer uma
cama para dormir, uma comida... O buraco é mais em baixo. Eu já cheguei a ir para uma visita
domiciliar e chegar aqui e me acabar de chorar, entendeu? É um esforço... Tem que arregaçar
as mangas e trabalhar.
ETR - Poderia colocar o que faz o psicólogo que atua com o trabalho social com família?
ETO-2- A gente trabalha com jovem, criança, adulto tipo mulher e idoso. Falando da
psicologia, porque o resto é a casa quem faz, que oferece. Falando de crianças, a gente não faz
um trabalho terapêutico com elas, porque a gente não tem como, são muitas crianças e a gente
não tem como fazer um atendimento clínico. Mas teve um acontecimento no grupo passado
aonde às crianças brigaram, tiveram briga corporal mesmo, então a gente teve a necessidade
de tirar essas crianças, são nove crianças, e aí a gente fez um novo grupo e vai trabalhar
clinicamente com elas o respeito da violência e do limite... A gente foi a casa delas hoje, a
gente viu que elas são agressivas com os pais... A gente vê que tem muita criança na
comunidade sem fazer nada, andando nas calçadas, ficam até na frente da delegacia, mexendo
com adulto que é o pessoal da delegacia, que vê roubo, droga, entrada disso. E dar até medo
de dizer que tá perdido, que se ninguém fizer nada por elas esta perdido, o futuro deles é
incerto mesmo.
ETR - Como você chegou realmente para atuar aqui na comunidade?
ETO-2- Eu estou aqui há nove meses.Como eu cheguei aqui?... Quando chegue, eu não
estava preparada, porque eu não havia estudado Psicologia Comunitária, tinha visto a Social
na universidade, mas a teoria é uma coisa e a prática é totalmente diferente, né? Lá ta tudo
bonitinho. Mas eu acho que de comunidade para comunidade muda.
ETR - Você acha que deve ter uma disciplina de Psicologia Comunitária na grade curricular?
ETO-2- Com certeza. Exclusivo. Porque na minha graduação eu não queria social para mim
mas vim para comunidade da áfrica e é uma coisa totalmente diferente, né? É uma coisa muito
rica, você aprende a cada dia, você repensa a sua vida, seus valores.
ETR - Como se dá o campo da Psicologia Comunitária, qual é o campo que ele encontra na
comunidade?
ETO-2- Tem abertura, tá começando a ter. pelo menos. Quando eu cheguei aqui no ano
passado vinha uma pessoa para cá e não tinha nem para onde encaminhar. Encaminhava para
o posto da Redinha tava lotado. Encaminhava para o posto da África também lotado. Então o
que eu estou vendo de uns dois meses para cá, é que vieram psicólogos querendo montar
grupos, fazer atendimentos clínico, tem Jader, mais outro psicólogo lá, todas as pessoas
encaminhadas estão sendo atendidas... Então... não sei se é porque a comunidade teve esse
processo né? passou pela urbanização, hoje têm mais psicólogos trabalhando aqui, está sendo
uma porta. Esta se abrindo, pelo menos aqui na África.
ETR - Como definiria o psicólogo na comunidade?
ETO-2- É ouvir a dor do outro, respeitá-la e tentar ajudar, da melhor formas possível, de
coração aberto
ENTREVISTA 03-(J. L: Psicólogo em atuação na Comunidade da África)
Idade: 33 anos
Tempo de formação: Dois anos
ETR - Há quanto tempo trabalha na Comunidade da África?
ETO-3 - Há um ano. Agora mesmo em setembro, completa um ano.
ETR-- Qual são as atividades desenvolvidas lá?
ETO-3 - Atendimento individual aos usuários, que geralmente são pessoas encaminhadas
pelo médico ou por demanda espontânea, faço atendimento a um grupo com adolescentes,
com duas estagiárias de psicologia, a gente acompanha esse grupo mensalmente, tem também
um grupo de idosos, fazemos reuniões. A gente ta pensando também fazer um trabalho
articulado com o PAIF, a gente pensa em fazer alguma atividade junta, em parceria como o
grupo de mulheres e tem também o profissaneado, que é o programa de urbanização da
África, e a gente tenta fazer algum trabalho junto também, em parceria com essa equipe e,
recentemente estou com alunos estagiários que fazem visitas domiciliares e atendimento na
unidade e também na sala de espera, eu supervisiono essas atividades.
ETR-- Quais as expectativas frente ao trabalho do psicólogo pela comunidade?
ETO-3- Eu nem saberia lhe dizer qual é a expectativa da comunidade ao psicólogo. Acho que
ainda existe uma certa idéia do psicólogo como aquele profissional que é uma espécie de
médico, que, muitas vezes, as pessoas estão angustiadas, com um sofrimento e esperam uma
solução imediata, uma resposta urgente, para o mal-estar delas, para o sofrimento. Acho que o
psicólogo ainda está nesse sentido, nesse modelo clínico.
ETR-- O que você poderia apontar como diferença, se é que existe, dos outros meios de
atuação da psicologia para a Psicologia Comunitária?
ETO-3 - Eu acho que é a visão de homem, de sujeito, de mundo, de comunidade. Eu acho
que isso dá uma certa diferença no sentido de como ela conduz as suas atividades de acordo
com essa visão. Se ela entende o homem como sendo um sujeito histórico, responsável, com
autonomia de intervir de alguma forma na sua história, na comunidade, então ela vai fazer
atividades que valorizem isso, com procedimentos teóricos, metodológicos que considerem
esse sujeito histórico, que ele assuma esse papel importante na mudança das comunidades,
fazer o trabalho de chamá-lo a assumir essa autonomia, essa questão da participação.
ETR - Quais os objetivos do psicólogo atuando na comunidade?
ETO-3 - Eu acho que é um pouco isso que eu falei, de ajudar as pessoas em reflexões para
que elas conversem, discutam os dilemas que aparecem em sua vida, para que possam, a partir
daí, criar uma rede, e é aí que eu acho que o profissional é importante no sentido de ajudá-lo a
criar uma rede de encaminhamento dessas ações, ver quais são os outros atores sociais, que
outras instituições, podem ser convocados para participar desse processo.
ETR - Há alguma dificuldade nesse trabalho?
ETO-3 - Há. Muita. Muita mesmo. Por onde as pessoas caminham, os profissionais que têm
lá, os modelos que se têm na comunidade de intervenção são muito assistencialistas, ainda
tem uma visão das pessoas como algo muito carente, muito precário, falta de pessoas que
precisam ser preenchidos essa falta. A África tem sido, desde que eu escuto falar da África,
alvo de políticas, de programas que são instalados lá, seja de políticas publicas, seja da
iniciativa privada, então sempre tem algum projeto, alguma novidade, algum profissional de
alguma ONG que vai trabalhar lá. Eu, pelo menos, avalio um certo descompasso disso, a
população, em algumas situações, ainda é meio alheia, meio desacreditada. Eu vejo assim,
que algumas atividades que eu acompanho do programa de urbanização, ainda vejo uma
ausência de mobilização da comunidade em alguns encontros, que poucos aparecem, em
algumas não apareceu ninguém, e eu acho que grande parte disso tudo é dado pela forma
como o projeto é gerido, como a equipe chega lá.
ETR - Como você, psicólogo, se adequa diante dessa vida difícil, da pobreza, dos problemas
sociais, do sofrimento dessa comunidade?
ETO-3 - Por exemplo, né?, nos atendimentos que eu faço, percebo, claramente, no olhar que
eu tenho, que aqueles questionamentos estão muito ligados a questões do modo de vida, das
condições de vida mesmo, de uma falta de oportunidade de trabalho, de moradia, de
condições, mesmo, de vida, influenciando na maneira como está esse sofrimento e também
como as pessoas explicam esse sofrimento. Elas partem de uma espécie de sintoma e vão
alargando os seus olhares até perceber o que esta por detrás disso. E é aí onde a gente vê a
nossa limitação, de não ficar no “especialismo”, a gente se sente impossibilitado por uma
coisa que extrapola a assistência psicológica. Ele é importante porque ali ela tem a
oportunidade de pensar sobre aquilo, de encontrar soluções para algum problema e aí em
alguns casos eu encaminho para algum programa social.
ETR - Você, como psicólogo, tem alguma dificuldade de lidar com a família?
ETO-3 - Não. Assim, o que se vê com relação a família na unidade são queixas de crianças e
adolescentes que vêm encaminhados pela escola e que chegam com a mãe. Ai a gente tenta
trabalhar com a criança, com a mãe, como o adolescente. Mas é um trabalho difícil, a coisa
não acontece como eu gostaria.
ETR - Existe lugar específico do psicólogo na comunidade?
ETO-3 - Não. Pode ser onde for. Pode no posto, na sala de espera, na rua, em caminhada pela
comunidade, visitando as escolas, enfim, em várias situações, é um contexto bem diverso.
ETR - Como você definiria o psicólogo comunitário?
ETO-3 - Eu acho que a psicologia comunitária tem uma especificidade, porque ela vai ter que
entender o sujeito da forma como ele existe e algo que os ligue, que os conecta, seja em
função daquele espaço geográfico, demandando dele, nesse espaço, uma identidade comum,
uma identidade coletiva que atravessa a vida daquelas pessoas e que aquele espaço tem
potencialidades, tem força de mobilizar algumas coisas, energias para que aquele espaço seja
o espaço que lhe garanta uma vida digna, pautada no respeito, tendo acesso à uma condição
de vida mais segura, com aparelhos sociais, saúde, educação, renda. Então, eu acho que a
Psicologia Comunitária tem esse lugar de possibilitar as pessoas de se enxergarem como
atores fundamentais desse processo de conquista dessas condições de vida.
ETR - Desde quando começou em comunidade?
ETO-3 - Eu comecei a trabalhar em comunidade em 1998, num programa de assistência do
INCRA, junto a assentamentos de reforma agrária e foi ai que eu vi a necessidade de ter um
olhar que pudesse me ajudar nesse trabalho e foi aí que eu encontrei a Psicologia
Comunitária. Embora eu tenha uma formação clínica, aquele modelo clínico, individual de
atendimento isolado. Mas, durante a minha graduação, fiz estágio nessa área da Psicologia
Comunitária, as questões que envolviam o social me chamaram a atenção, então eu fui me
envolvendo com essas questões e fui tomando gosto.
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