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ÁGUAS DE ANGOLA: PILAR ESSENCIAL DE UMA NATUREZA SEM IGUAL 1

MAURÍCIO WALDMAN 2

A República de Angola é uma nação que obrigatoriamente se inscreve na pauta das avaliações do continente africano e da conjuntura mundial.

Note-se que a posição geográfica do país, a cavaleiro das passagens entre grandes massas oceânicas e conectando a África Central com as plagas da parte Austral do continente, constitui por si só, um aspecto a ser levado em consideração (Figura 1).

Por outro lado, mais que tudo são as inumeráveis riquezas naturais do país que contam para um relevante destaque para Angola. No final das contas a sociedade moderna se confronta com uma grave crise ambiental, agregada a um contexto no qual a economia global requisita matérias-primas cujos estoques escasseiam cada vez mais.

Retenha-se que o subsolo angolano resguarda 35 de um elenco de 45 minérios tidos como indispensáveis ao mundo contemporâneo, e no geral, em proporções abundantes. Neste acervo, três itens se destacam: diamantes (2ª produção africana e 5ª mundial), petróleo (2º produtor da África Negra) e gás natural (1º no continente).

No mais, levantamentos fornecidos pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) indicam Angola com uma das seletas nações onde as atividades humanas podem avançar sem temer o comprometimento da capacidade de suporte do meio natural.

Ou seja: o país abriga considerável superavit ecológico, potencial natural que permitiria a continuidade de taxas aceleradas de expansão econômica, e em paralelo, universalizar boas condições de vida para o conjunto da população. Assim, o quadro natural augura grandes expectativas para Angola.

Porém, estes não são os únicos pontos a serem levados em consideração. Note-se que poucos fazem ideia do prodigioso capital hídrico angolano. Num mundo em que o acesso à água, insumo natural vital e fundamental, indispensável à vida em si mesma, é cada vez mais gravado pelo fantasma das torneiras secas, Angola desponta como possível provedor internacional de água doce.

Isto porque além da abundante rede hidrográfica, a disponibilidade angolana do líquido por habitante está entre as mais altas do mundo. Ao mesmo tempo, a especialíssima

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configuração geográfica das águas de superfície de Angola garante ao país influente papel geopolítico.

FIGURA 1: A República de Angola destacada em vermelho no globo, com o continente africano ao centro.

Recorde-se que no tocante à África Austral, há uma problemática hídrica bastante acentuada. Uma nota essencial é que 70% das águas regionais são compartilhadas por no mínimo dois Estados soberanos e que no conjunto, a região vive quadro de acelerada penúria de água.

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Nesse panorama, as regiões planálticas de Angola (Figura 2), situadas no centro do país, captadoras das precipitações pluviais e caracteristicamente úmidas, constituem menção obrigatória.

FIGURA 2: Tomada das encostas das verdejantes regiões planálticas de Angola nas cercanias de Lubango

Particularmente o Planalto de Huambo, conhecido como caixa d’água de Angola, é uma impressionante obra natural. Nesta região situam-se as nascentes do caudaloso rio Cuanza (curso 100% angolano), assim como dos rios Ocavango, Zambeze, Cuvelai, Cunene e de numerosos tributários da margem esquerda do rio Congo, cujos fluxos banham os países vizinhos.

Graças a este valioso patrimônio hidrológico, somado à imensidão territorial do país, altas médias de pluviometria, diferentes patamares do relevo, diversos tipos de solo e regimes climáticos predominantemente tropicais, o meio natural angolano esbanja notável diversidade.

Assim sendo, a fauna e flora de Angola são com justiça fator que destacam o país na paisagem biológica do Planeta. Mesmo para um padrão africano, continente conhecido pela pujança faunística e florística, a biodiversidade angolana é sem igual.

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A título de exemplificação, a vegetação angolana apresenta mais de 5.000 espécies de plantas, das quais 1.260 são endêmicas. Isto é: totalmente exclusivas de Angola. Isso sem contar que o acervo florístico não foi inteiramente pesquisado, aguardando por mais descobertas e investigações científicas.

No que concerne aos mamíferos, o país concentra um dos maiores contingentes da África: não menos que 275 espécies registradas. Por sua vez, a população de aves perfila 872 espécies catalogadas. Acredita-se que Angola seja o lar de 92% da avifauna da África Austral.

Para além dos ecossistemas terrestres, uma miríade de seres vivos pulula no meio aquático. Com efeito, a densa rede hidrográfica é habitat de centenas de espécies. Compartilhando a ictiofauna por todo o país, mais de vinte rios deságuam na costa. Muitos outros escoam em todas as direções a partir do Planalto do Huambo.

Estes cursos fluviais também irrigam matas ribeirinhas, alagadiços e zonas estuarinas, áreas vitais para a cadeia alimentar. Desta maneira, várias populações de mamíferos, répteis, anfíbios e peixes povoam os rios, lagos e águas costeiras de Angola.

Mesmo nas extensões do Deserto Namibe, cortado pelo rio Cunene no Sul de Angola, exibe peculiaridades extraordinárias. A planta Welwitschia mirabilis (Figura 3) é, por exemplo, um fóssil vivo, capaz de viver por mil anos ou mais a partir de uma organização metabólica única.

Desse modo, com tão numeroso cabedal de formas de vida, seria óbvio imaginar que a natureza figure entre os símbolos da nação angolana. Este é o caso da palanca preta gigante (Figura 4), representação emblemática da identidade nacional.

A palanca preta é um magnífico antílope endêmico de Angola. A silhueta característica deste animal com sua galhada curva foi adotada como logo da empresa Transportes Aéreos de Angola (TAAG), companhia aérea oficial, assim como da Federação Angolana de Futebol (FAF). Carinhosamente, a voz do povo de igual modo se refere à seleção nacional de futebol como “palanca preta”.

Contudo, nem tudo é alegria e tranquilidade. A dura luta anticolonial, que somou 14 anos de enfrentamento armado (1961-1975) e a longa guerra civil subsequente, uma prolongada e fratricida conflagração de 27 anos (1975-2002), cobraram pesada quota de sacrifícios à vida selvagem.

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FIGURA 3: Um exemplar da Welwitschia em pleno deserto Namibe

FIGURA 4: A famosíssima palanca preta, fotografada na Província de Malanje.

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Neste cenário, um dado preocupante é que dezenas de sítios foram minados por todo o país. Acredita-se que no ano de 2004 permaneciam ativos cerca de cinco milhões desses engenhos explosivos. Tal herança dos anos de conflito colocou Angola, na aurora da pacificação política, dentre os dez países mais minados do mundo.

Obviamente, além da população civil, ações bélicas diretas provocaram danos e mortandade na população animal. Entre suas vítimas, figuram as próprias manadas da palanca preta, cujos rebanhos diminuíram drasticamente. E foi por muito pouco que essa belíssima espécie não se extinguiu para sempre.

Contudo, a situação de paz suscita renovado otimismo na conservação e recuperação do ambiente natural. Na questão ambiental, como noutras frentes da reconstrução do país, Angola demonstra disposição em sepultar a adversidade com esperanças.

Assim, o ministério do ambiente encetou uma somatória de ações visando ampliar o plantel de espécies ameaçadas. A desativação das minas fez retroagirem os danos às pessoas e ao ambiente natural. O reforço do patrulhamento nos parques nacionais, que ocupam 6,6% da área do país, ensejou a redução da caça ilegal e o adensamento dos bosques.

Essas medidas são acompanhadas de iniciativas inéditas como a Operação Arca de Noé. Contando com a generosidade das nações africanas vizinhas, uma logística sem precedentes trouxe para Angola dezenas de elefantes, gnus, rinocerontes, girafas, avestruzes, antílopes e cheetas, transportados por meio de contêineres especialmente desenhados para esse fim.

Tudo isso mostra quão grandemente a paz tem seu quinhão de repercussões positivas. E também o quanto a reconstrução caminha, em Angola, ombro a ombro da meta da preservação ambiental, que na história deste corajoso país associa-se com o resgate de uma comunidade de destino, africana na forma e nacional no conteúdo.

Patrimônio único na sua majestade, a biodiversidade angolana é um legado a ser preservado, para benefício desta e das futuras gerações de angolanos. E também, para o conjunto da Humanidade.

Que assim seja!

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1 Águas de Angola: Pilar essencial de uma natureza sem igual é um artigo digital primeiramente disponibilizado na home-page do Instituto Portal Afro em 31 de Maio de 2016. A presente edição deste texto foi masterizada em Junho de 2017 pela Editora Kotev para fins de acesso livre na Internet (Kotev ©). Levemente ampliado e incluindo novas imagens, o texto incorpora regras atualmente vigentes quanto à norma culta da língua portuguesa, cautelas de estilo e normatizações editoriais inerentes ao formato PDF. 2 Maurício Waldman é jornalista, consultor, editor, professor universitário e antropólogo africanista. Na trajetória de Waldman constam: graduação em Sociologia (USP, 1982), mestrado em Antropologia (USP, 1997), doutorado em Geografia (USP, 2006) e três pós-doutorados: Geociências (UNICAMP, 2011), Relações Internacionais (USP, 2013) e Meio Ambiente (PNPD-CAPES, 2015). Nesta trajetória, o mestrado do autor foi desenvolvido na área de concentração pertinente à África e o segundo Pós-Doutorado, teve por foco as águas doces de Angola e do continente africano, particularmente a África Austral. Waldman atuou como consultor internacional da Câmara de Comércio Afro-Brasileira e professor nos cursos de difusão cultural do Centro de Estudos Africanos da USP (CEA-USP). Maurício Waldman responde pela autoria de dezenas de artigos e textos científicos centrados no temário de África & Africanidades, publicados pela revista África (CEA-USP), Jornal Cultura (Luanda, Angola), revista Brasil-Angola Magazine (São Paulo) e Portal Instituto Afro (São Paulo). Waldman é autor de Africanidade, Espaço e Tradição: A Topologia do Imaginário Espacial Tradicional Africano na fala griotsobre Sundjata Keita do Mali (Revista África, coedição CEA-USP - Editora Humanitas, 1997-1998), paper considerado internacionalmente relevante pelo CNRS - Centre National de la Recherche Scientifique (França). Waldman também é coautor de Memória D’África: A temática africana em sala de aula (Cortez Editora, 2007), obra de referência no campo africanista.

Mais Informação: Portal do Professor Maurício Waldman: www.mw.pro.br

Currículo Lattes-CNPq: http://lattes.cnpq.br/3749636915642474

Wikipedia English edition: http://en.wikipedia.org/wiki/Mauricio_Waldman

Contato email: [email protected]

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SAIBA MAIS SOBRE AS ÁGUAS DE ANGOLA

http://kotev.com.br/?product=aguas-de-angola-debate-estrategico-e-multilateral

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SAIBA MAIS SOBRE ÁFRICA & AFRICANIDADES

http://kotev.com.br/?product_cat=africa

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