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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO ADOÇÃO POR CASAIS HOMOAFETIVOS CRISTIANE SCHMIDT DECLARAÇÃO “DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PUBLICA EXAMINADORA”. ITAJAÍ (sc), 07 de junho de 2011. ___________________________________________ Professora Orientadora: Cláudia Regina Althoff Figueiredo UNIVALI – Campus Itajaí-SC

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

ADOÇÃO POR CASAIS HOMOAFETIVOS

CRISTIANE SCHMIDT

DECLARAÇÃO

“DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PUBLICA EXAMINADORA”.

ITAJAÍ (sc), 07 de junho de 2011.

___________________________________________ Professora Orientadora: Cláudia Regina Althoff Figueiredo

UNIVALI – Campus Itajaí-SC

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

ADOÇÃO POR CASAIS HOMOAFETIVOS

CRISTIANE SCHMIDT

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel

em Direito. Orientador: Professora Dra. Cláudia Regina Althoff Figueiredo

Itajaí , Junho de 2011

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AGRADECIMENTO

A Deus pela dádiva da vida, por ser ele criador de tudo existente e por todo ensinamento adquirido.

Ao meu pai Sidnei, a mais profunda gratidão pela lição de vida e pelo mais puro amor.

A minha mãe, por toda sabedoria partilhada e todo carinho prestado. Obrigado por estar sempre ao meu

lado.

Ao meu irmão, pela cumplicidade dos momentos vividos lado a lado.

Ao meu namorado Leonardo, por compartilhar comigo todas as angústias e sofrimentos e por

sempre me mostrar o lado bom das coisas.

A minha orientadora Cláudia, que esteve sempre ao meu lado, me ensinando os caminhos a percorrer no

presente trabalho, agindo sempre com muita paciência e compreensão.

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DEDICATÓRIA

Dedico o presente trabalho a toda minha família que foi minha base de conhecimento, respeito e

educação adquiridos desde que nasci. A vocês, pai, mãe e irmão, agradeço de coração por todos

momentos vividos juntos e por estarem sempre ao meu lado quando mais precisei.

Obrigado querida família.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí , Junho de 2011

Cristiane Schmidt Graduanda

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Cristiane Schmidt, sob o título “Adoção

por Casais Homoafetivos”, foi submetida em 07 de junho de 2011 à banca

examinadora composta pelos seguintes professores: Dra. Cláudia Regina Althoff

Figueiredo (orientadora e presidente da banca), Msc. Ana Lúcia Pedroni (membro) e

Msc. Antonio Carlos Cabral (membro) aprovada com a nota [nota] ([nota Extenso]).

Itajaí , Junho de 2011

Cláudia Regina Althoff Figueiredo Orientador a e Presidente da Banca

Maria Cláudia da Silva Antunes de Souza Coordenação da Monografia

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ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ADI Art.

Ação Direta de Inconstitucionalidade Artigo

CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002 CC/1916 Código Civil Brasileiro de 1916 CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 ECA Estatuto da Criança e do Adolescente STF Supremo Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça TJRS Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Adoção

Para Maria Berenice Dias1 a adoção “é um ato jurídico em sentido estrito, cuja

eficácia está condicionada à chancela judicial”.

Adotante

Conforme De Plácido e Silva2, adotante é “pessoa que adotou, isto é, tomou ou

aceitou uma outra como seu filho. Pai adotivo, mãe adotiva.

Afeto

Entende-se com esse termo, no uso comum, as emoções positivas que se referem a

pessoas e que não têm o caráter dominante e totalitário da paixão.3

Analogia

Segundo Sérgio Sérvulo da Cunha4 é a “relação existente entre dois fatos que, pelo

seus pontos de contato, permite aplicar a um a mesma regra incidente no outro”.

Dignidade da Pessoa Humana

De acordo com Ingo Sarlet5, Dignidade da Pessoa Humana é “a qualidade intrínseca

e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e

consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, em

complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra

todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir

as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e

1 DIAS, Maria Berenice. Manual do direito das famílias . 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2006. p.385 2 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 28. ed. Rio de janeiro: Forense, 2009. p.69. 3 ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia . 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p.21. 4 CUNHA, Sérgio Sérvulo da. Dicionário compacto de direito. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p.19. 5 SARLET, Ingo,in, DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. 4. ed. São

Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p.102-103.

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8

promover sua participação ativa e corresponsável nos destemidos da própria

existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.”

Família

Segundo Maria Helena Diniz6 “família é o grupo fechado de pessoas, composto por

pais e filhos e, para efeitos limitados, de outros parentes, unidos pela convivência, e

afeto numa mesma economia e sob uma mesma direção”.

Homossexualidade

Segundo De Plácido e Silva7 é “expressão que se refere à atração ou à manutenção

de relações sexuais entre indivíduos do mesmo sexo”.

Igualdade

Segundo De Plácido e Silva8, igualdade é “designação dada ao princípio jurídico

instituído constitucionalmente, em virtude do qual todas as pessoas, sem distinção

de sexo ou nacionalidade, de classe ou posição, de religião ou de fortuna, têm

perante a lei os mesmos direitos e as mesmas obrigações”.

Princípio

Conforme Sávio Bittencourt9 “um princípio é uma norma jurídica emanada do corpo

geral das regras, que aponta para o objetivo maior de um determinado diploma

jurídico. É uma espécie de “moral da história”, a mensagem principal que um grupo

de regras dá à sociedade, sempre apontando para a proteção de um determinado

bem jurídico da sociedade. Assim, o princípio assume uma importância vital para o

direito, porque ele condiciona a interpretação das outras regras jurídicas”.

6 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : direito de família. 24. ed. São Paulo:

Saraiva, 2010. p.17. 7 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico . p.688. 8 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico . p.689. 9 BITTENCOURT, Sávio. A nova lei de adoção ; do abandono à garantia do direito à convivência

familiar e comunitária. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p.35.

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9

Princípio da Afetividade

De acordo com Paulo Lôbo10 “é o princípio que fundamenta o direito de família na

estabilidade das relações socioafetivas e na comunhão da vida, com primazia sobre

as considerações de caráter patrimonial ou biológico”.

Sociedade de fato

Segundo De Plácido e Silva11 “é a que se forma do acordo entre duas ou mais

pessoas para a exploração de negócios em comum, sem atender às formalidades

legais de registro de contrato e de firma”.

Solidariedade

Segundo Erhard Denniger12, a solidariedade significa “um vínculo de sentimento

racionalmente guiado, limitado e autodeterminado que compele à oferta de ajuda,

apoiando-se em uma mínima similitude de certos interesses e objetivos, de forma a

manter a diferença entre os parceiros na solidariedade”.

União Estável

Segundo Sérgio Sérvulo da Cunha13 é “a convivência entre duas pessoas,

semelhante à que se estabelece entre cônjuges”.

10 LOBO, Paulo. Direito civil; famílias. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.47. 11 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. p.1304. 12 DENNIGER, Erhard, in, LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.39. 13 CUNHA, Sérgio Sérvulo da. Dicionário compacto do direito . 4.ed. São Paulo: Saraiva,

2005.p.271

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SUMÁRIO

RESUMO.......................................................................................... XII

INTRODUÇÃO .................................................................................. 13

CAPÍTULO 1 ........................................ ............................................. 17

DA FAMÍLIA ........................................ .............................................. 17

1.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A FAMÍLIA .......... .............................. 17

1.2 CONCEITO DE FAMÍLIA ........................... .................................................... 22

1.3 PRINCÍPIOS DO DIREITO DE FAMÍLIA .............. ......................................... 25

1.3.1 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ................................................ 26

1.3.2 PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE FAMILIAR ......................................................... 28

1.3.3 PRINCÍPIO DA IGUALDADE E RESPEITO À DIFERENÇA ......................................... 31

1.3.4 PRINCÍPIO DO PLURALISMO DAS ENTIDADES FAMILIARES .................................. 35

1.3.5 PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE ............................................................................ 37

1.3.6 PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE .................. 41

1.3.7 PRINCÍPIO DA LIBERDADE ............................................................................... 42

1.4 MODALIDADES DE FAMÍLIA ........................ ............................................... 45

1.4.1 CASAMENTO .................................................................................................. 46

1.4.2 ENTIDADES FAMILIARES ................................................................................. 47

1.4.3 UNIÃO ESTÁVEL ............................................................................................ 49

1.4.3.1 Pressupostos de Ordem Subjetiva: ..................................................................53

1.4.3.2 Pressupostos de Ordem Objetiva: ....................................................................55

1.4.4 FAMÍLIA MONOPARENTAL ............................................................................... 62

CAPÍTULO 2 ........................................ ............................................. 65

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xi

DA ADOÇÃO ......................................... ........................................... 65

2.1 CONCEITO E FINALIDADE ......................... ................................................. 65

2.2 REQUISITOS ................................................................................................. 71

2.3 MODALIDADES DA ADOÇÃO ......................... ............................................. 75

2.3.1 ADOÇÃO INTUITU PERSONAE ........................................................................... 76

2.3.2 ADOÇÃO “ À BRASILEIRA ” ................................................. .............................. 77

2.4 EFEITOS PESSOAIS E PATRIMONIAIS ............... ....................................... 77

2.4.1 EFEITOS DE ORDEM PESSOAL ........................................................................ 78

2.4.2 EFEITOS DE ORDEM PATRIMONIAL .................................................................. 80

CAPÍTULO 3 ........................................ ............................................. 84

DA ADOÇÃO HOMOPARENTAL ............................ ......................... 84

3.1 FAMÍLIA HOMOAFETIVA ........................... .................................................. 85

3.1.1 OMISSÃO LEGAL ............................................................................................ 87

3.1.2 AMPARO LEGAL ............................................................................................. 88

3.2 ADOÇÃO HOMOPARENTAL ........................... ............................................. 92

3.2.1 CÓDIGO CIVIL DE 2002 E ECA ..................................................................... 100

3.3 AVANÇOS JURISPRUDENCIAIS ...................... ......................................... 102

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................. .............................. 110

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ..................... .................... 117

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RESUMO

A presente monografia busca investigar se há, no ordenamento

jurídico brasileiro, a possibilidade jurídica de adoção por pares homoafetivos. Os

objetivos são averiguados através da doutrina e de jurisprudência quanto ao tema.

As hipóteses trazidas foram duas, sendo as seguintes: não é juridicamente possível

a adoção por casais homoafetivos, pois conforme ordenamento jurídico, para

caracterizar-se uma entidade familiar é preciso diversidade de sexo, portanto casal

homoafetivo não constitui entidade familiar, e dessa forma, não pode adotar. A

segunda que, é função fundamental do instituto da adoção o benefício do menor,

devendo ser essa concedida apenas quando não restar dúvidas das reais vantagens

ao adotando. Para tanto, estuda-se no primeiro capítulo a família de um modo geral,

destacando-se suas considerações gerais, bem como conceito, finalidade,

modalidades e os princípios que dão embasamento legal para a existência da

mesma. O segundo capítulo trata do instituto da adoção, averiguando seu conceito,

bem como sua finalidade, seus requisitos, modalidades e efeitos. Por sua vez, o

terceiro capítulo estuda sobre a adoção homoparental, averiguando se essa é

possível ou não no atual sistema jurídico. Para a presente investigação, adotou-se o

método indutivo, operacionalizando com as técnicas do referente, das categorias

aqui propostas, bem como de conceitos trazidos por doutrinadores e do exame

bibliográfico, resultando o presente trabalho em uma fonte de pesquisa para

estudiosos e operadores do direito.

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto a averiguação da

possibilidade jurídica da adoção por casais homoafetivos no Direito Civil Brasileiro,

analisando assim se essa modalidade de adoção é constitucional ou não.

A averiguação de tal tema terá como embasamento legal a

Nova Lei de Adoção (Lei n. 12.010), a Constituição da República Federativa do

Brasil (CRFB/88), o Código Civil de 2002 (CC/2002), o Estatuto da Criança e do

Adolescente (ECA), bem como o entendimento jurisprudencial e doutrinário sobre o

tema.

No que tange aos objetivos do presente trabalho, seu objetivo

institucional é produzir uma monografia de conclusão de curso para a obtenção do

título de bacharel em direito. Por sua vez, o objetivo geral é verificar a possibilidade

jurídica da Adoção Homoafetiva no Direito Brasileiro. E por último, o presente

trabalho possui como objetivos específicos averiguar se união homoafetiva forma

entidade familiar; verificar se através da união homoafetiva há o benefício do menor

e; analisar o amparo jurídico que casais homoafetivos possuem para suas relações.

Trata-se de um assunto interessante e atual, apresentando

este forte relevância social, não podendo os cidadãos dessa forma se esquivarem

do assunto, pois este faz parte da realidade e experiência na sociedade. Ao

contrário disso, mesmo o presente assunto gerar muitas discussões, deve-se

debater sobre ele, tentando assim chegar a sociedade, juntamente com os

julgadores, em um consenso. Consenso não do que é melhor para a sociedade em

si, mas sim, do que é o melhor interesse para a criança ou adolescente.

Para tanto, pretende-se analisar o tema sem discriminação ao

próximo, levando-se em consideração os principais princípios do direito de família e

da CRFB/88 como sustentação para tal modalidade de adoção, e como já citado,

utilizando todo o tipo de embasamento legal possível.

Busca-se principalmente através dos princípios da Igualdade e

da Liberdade, inseridos na CRFB/88 em seu artigo 3º, incisos I e IV, o amparo legal

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14

para as relações homoafetivas, para que estas sejam reconhecidas perante o

Estado, fazendo com que seus componentes possam fazer jus à possibilidade de

adotar.

A presente monografia encontra-se dividida em três capítulos,

sendo o 1º destinado ao estudo da família de um modo geral, analisando assim

quais transformações a mesma vem passando, que modalidades de família se

encontram presentes no dia-a-dia, e quais destas modalidades são consideradas

como entidades familiares pela CRFB/88 em seu artigo 226, recebendo dessa forma

o amparo do Estado. Ainda mais, trata de uma maneira bem objetiva dos principais

princípios de direito de família, os quais são determinantes no âmbito familiar,

fazendo valer, em casos concretos, os direitos do ser humano.

No Capítulo 2 o enfoque do trabalho é no Instituto da Adoção.

Busca averiguar que instituto é esse, qual sua finalidade, bom como os requisitos

necessários que o pretendente deve preencher para poder se candidatar à adoção.

Da mesma forma trata sobre os efeitos de cunho pessoal e os de cunho patrimonial

sofridos pela adoção. Por último analisa as modalidades da mesma presentes na

sociedade.

No Capítulo 3, o objeto de estudo é a adoção homoparental,

foco principal deste trabalho. Este por sua vez busca averiguar de uma maneira

sucinta um pouco do preconceito ao homossexualismo, para assim posteriormente,

obter-se a análise da possibilidade jurídica de adoção por casais formados por

pessoas do mesmo sexo. Trata desse modo, da família homoafetiva, questionando

se ela poderia ou não ser inserida no rol das famílias que compõe o artigo 226 da

CRFB/88, como sendo uma entidade familiar. Busca também o amparo legal trazido

a essas relações homoafetivas, assim como também menciona a omissão legal

direcionada a esses relacionamentos. Mais tarde entra-se no assunto principal do

presente trabalho, que é a adoção por pares homossexuais. Busca-se então, a

averiguação se há ou não a possibilidade jurídica de homoafetivos entrarem

conjuntamente na esfera judicial pretendendo uma adoção de criança ou

adolescente. Juntamente neste capítulo há a demonstração de avanços

jurisprudenciais, trazidos pela vasta jurisprudência, apontando-se que em alguns

casos concretos esta modalidade de adoção vem sendo admitida.

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15

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

considerações finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados,

seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a adoção

por pares homoafetivos.

Dessa forma, após a evolução do conteúdo, as considerações

finais tentarão buscar uma resposta satisfatória para esse questionamento que é o

objetivo da presente monografia.

Ressalta-se ainda que o intuito da pesquisa não é criticar ou

defender a adoção por casais homoafetivos, mas apenas verificar a sua

possibilidade jurídica diante da esfera judicial brasileira, analisando com base nos

princípios do direito de família e em cada caso concreto se em tais casos ocorrerá o

melhor interesse da criança, cujo qual é o objetivo principal do instituto da adoção, e

analisando da mesma forma se nestes casos são respeitados os direitos do seres

humanos.

Assim, espera-se ao final tentar esclarecer dúvidas sobre o

tema, para que assim se possa tentar entender mais sobre a adoção por

homossexuais, e como a mesma pode refletir na sociedade, buscando por exemplo,

o que ela poderá vir a acarretar.

Em linhas gerais e amplas é nesse universo que se

desenvolverá a pesquisa.

Para a presente monografia foram levantadas duas hipóteses

de pesquisa.

A primeira que, não é juridicamente possível a adoção por

casais homoafetivos, pois conforme ordenamento jurídico, para caracterizar-se uma

entidade familiar é preciso diversidade de sexo, portanto casal homoafetivo não

constitui entidade familiar, logo, não pode adotar.

A segunda que, é função fundamental do instituto da Adoção o

benefício do menor, devendo ser essa concedida apenas quando não restar dúvidas

das reais vantagens ao adotando.

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16

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de

Investigação14 foi utilizado o Método Indutivo15, na Fase de Tratamento de Dados o

Método Cartesiano16, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente

Monografia é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas

do Referente17, da Categoria18, do Conceito Operacional19 e da Pesquisa

Bibliográfica20.

14 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente

estabelecido [...]. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 11 ed. Florianópolis: Conceito Editorial; Millennium Editora, 2008. p. 83.

15 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 86.

16 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica . 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.

17 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 54.

18 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 25.

19 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 37.

20 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 209.

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CAPÍTULO 1

DA FAMÍLIA

O primeiro capítulo título da presente monografia tem por

objetivo averiguar a conceituação de família no âmbito geral e, ainda falar de sua

origem, ou seja, de onde a mesma provém. Ainda, vai buscar toda base

principiológica norteadora do direito de família, analisando os principais princípios

deste direito.

Busca-se também definições as modalidades familiares,

enumerando as mesmas para assim se obter um breve estudo delas.

Busca-se este conhecimento através de definições e conceitos

trazidos por doutrinadores citados no decorrer do trabalho.

Este capítulo se desenvolve com base na grande

transformação que a família atual vem sofrendo nos últimos tempos, tentando assim,

realizar os melhores conceitos e definições para família e familiares dos tempos

modernos, objetivando dessa maneira, trazer uma explicação do que mudou da

família antiga para a atual.

1.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A FAMÍLIA

A família vem sofrendo diversas alterações na sua estrutura

com o passar dos tempos. Não é novidade que a estrutura familiar hoje é bem

diferente da que se tinha antigamente. As mudanças na sociedade e na estrutura de

vida vêm ocorrendo, acarretando assim, uma série de transformações dia após dia

e na forma do ser humano ver e sentir as coisas.

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18

O Código Civil de 1916 apenas protegia e reconhecia a família

que adivinha do casamento. Este era o único modelo que recebia reconhecimento e

proteção do ordenamento jurídico.21

Assim, até a CRFB/88, a família só tinha seu reconhecimento

pelo Estado, através do casamento, que unia homem e mulher para assim

constituírem uma família com base nos princípios matrimoniais.

Porém com a CRFB/88 a visão de família passou a ser

reconhecida de uma forma mais aberta e com uma certa pluralidade, assim sendo

vista nas suas mais variadas formações, pois esta passou a ter fundamento na

dignidade da pessoa humana, bem como, na liberdade das pessoas estarem

formando uma família em concordância com seus desejos.22

Estudando sobre a origem da família vê-se que a família antiga

era patriarcal e matrimonializada. Assim, a família tinha na pessoa do pai o chefe, de

tal forma que as pessoas e as coisas estavam sob domínio do pater famílias, o que

evidentemente atribuía à família uma concepção patriarcal, como já dito

anteriormente, e de unidade econômica, religiosa, política, jurisdicional, regida pela

lei da desigualdade, a fim de possibilitar apenas os interesses dominantes do seu

chefe sob os demais entes familiares.23

Sobre o tema Liane Maria Busnello Thomé24 afirma o seguinte:

A família matrimonializada se formava para cumprir um papel social da época, sendo chefiada e administrada pelo homem, por meio do poder marital sobre a mulher e o poder familiar sobre os filhos menores de idade e as relações afetivas que se formavam à margem do casamento também ficavam à margem da proteção do Estado.

Afirma Paulo Lôbo25 que “o triunfo da família patriarcal é um

dos traços da civilização incipiente sobre possíveis formas grupais ou matriarcais de

família anteriores.” E ainda, conclui Engels26: 21 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e mediação Familiar . Porto

Alegre: Livraria do advogado, 2010. p.17. 22 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e mediação familiar . p.17. 23 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . São Paulo: Atlas, 2009.

p.63. 24 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e mediação familiar . p.21.

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Essa família seria baseada no domínio do homem com a expressa finalidade de procriar filhos de paternidade incontestável, e esta paternidade é exigida porque os filhos devem entrar na posse da fortuna paterna por sucessão. Foi a primeira forma de família fundada sobre condições não naturais, mas econômicas, a saber: o triunfo da propriedade individual sobre compropriedade espontânea primitiva.

Sabe-se que na sociedade conservadora de antigamente, a

família tinha uma formação extensiva, era uma verdadeira comunidade rural,

integrada por todos os parentes, formando unidade de produção, com amplo

incentivo à procriação. Sendo uma entidade patrimonializada, seus entes eram a

força de trabalho. Quanto maior ficasse a família, maiores seriam as condições de

sobrevivência a todos. Assim, o núcleo familiar era disposto de um perfil

hierarquizado e patriarcal.27

Após a Revolução Industrial, acabou a prevalência do caráter

produtivo e reprodutivo da família. Migrou esta para cidades onde passaram a

conviver seus entes em espaços menores, fazendo com que assim os membros se

aproximassem cada vez mais, sendo mais prestigiado o vínculo afetivo que envolvia

seus integrantes.28

Portanto, entende-se que a família originou-se de uma família

matrimonializada e patriarcal, tendo como predominante interesse o do homem, que

ocupava o cargo de chefe perante seus componentes, sendo de uma real certeza

que a supremacia de seus interesses na condução da relação conjugal eram

incontestáveis.29

Antes da CRFB/88, o poder marital, o poder paterno e, ainda, o

poder da sociedade heterossexual, eram os poderes mais levados em conta. Hoje,

25 LOBO, Paulo, in, TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.64. 26 ENGELS, in, TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.64. 27 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.26. 28 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.26. 29 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.64.

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outros valores e princípios devem ser considerados. Os laços e os vínculos

familiares devem ser reconstruídos sob novas bases.30

Existe atualmente um novo conceito para a família, esta agora

formada por laços de afeto, amor e carinho. O afeto passou a ser tão valorado que

atualmente é o que mais leva-se em conta na estrutura familiar.31

O afeto e outros sentimentos entre as pessoas é o que está

prevalecendo quanto se trata de estrutura familiar, e dessa forma, as famílias vêm

se formando de uma maneira bem diversificada. Sobre o tema, Giselda Hironaka32

que nos ensina a seguinte lição:

Não importa a posição que o indivíduo ocupa na família, ou qual a espécie de grupamento familiar a que ele pertence- o que importa é pertencer ao seu âmago, é estar naquele idealizado lugar onde é possível integrar sentimentos, esperanças, valores e se sentir, por isso, a caminho da realização de seu projeto de felicidade.

Conforme ensinamento do doutrinador Silvio Venosa33, a

unidade familiar sob prisma social e jurídico, não mais tem como base o matrimonio,

e sim, a nova família se estrutura independentemente do casamento. As grandes

transformações fizeram-se mais presentes em nosso país na segunda metade do

século XX, cabendo à ciência acompanha-lás de perto. Agora, casais homoafetivos

vão paulatinamente ganhando reconhecimento judicial e legislativo. Assim sendo, os

paradigmas do direito de família são diametralmente modificados.

Ensinando ainda Silvio Venosa34:

O direito de família, ramo do direito civil com características peculiares, é integrado pelo conjunto de normas que regulam as relações jurídicas familiares, orientado por elevados interesses morais e bem-estar social. O Código Civil de 2002 procura fornecer uma nova compreensão de família, adaptada ao novo século, embora tenha ainda com passos tímidos neste sentido. Seguindo o que já determina a Constituição de 1988, o atual estatuto procura estabelecer a mais completa igualdade jurídica dos cônjuges, e dos

30 DIAS, Maria Berenice. Manual do direito das famílias . p.26. 31 DIAS, Maria Berenice. Manual do direito das famílias . p.26. 32 HIRONAKA, Giselda, in, DIAS, Maria Berenice. Manual do direito das famílias . p.25. 33 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil : direito de família. 10.ed. São Paulo: Atlas, 2010. p.06. 34 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil : direito de família. p.10

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companheiros, do homem e da mulher. Da mesma forma, o vigente diploma civil contempla o princípio da igualdade jurídica de todos os filhos, independentemente de sua origem.

A família reveste-se por alguns caracteres, sendo eles

agrupados em caráter biológico, caráter psicológico, caráter econômico, caráter

religioso, caráter político e, caráter jurídico.35

O caráter biológico se dá pelo fato de ser a família um

agrupamento natural. Pode-se dizer que o ser humano nasce, cresce em uma

família, até mais tarde casar-se e formar a sua própria.

Analisa-se da mesma forma o caráter psicológico devido a

estar contido nela um elemento espiritual que é o amor. Este é o que une a família.

Sabe-se também que a família é um grupo dentro do qual

homem e mulher, mutuamente e juntamente com o seu afeto, se munem de

elementos essenciais à sua realização material, espiritual e intelectual. Neste caso é

que encontra-se contido o elemento econômico.

Ainda, por ser uma instituição, é assim um ser eminentemente

ético ou moral, muito por influência do Cristianismo. Fato que revela o caráter

religioso da família.

A família é ainda revestida de caráter político, uma vez que é

protegida pelo Estado. O Estado protege cada pessoa integrante da família fazendo

com essas recebam uma real segurança no âmbito do convívio familiar.

Finalmente, deve-se o caráter jurídico à família por ter ela sua

estrutura orgânica regulamentada por normas jurídicas.

Restam-se claras as mudanças que estão ocorrendo no direito

de família, ou seja, caminha-se para uma conceituação mais ampla e abrangente do

que se trata família.

35 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : direito de família. p.13-15.

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1.2 CONCEITO DE FAMÍLIA

O CC/2002 não oferece um conceito unitário do que vem a ser

família. Em seus artigos 1.829 e 1.839, trata sobre a linha sucessória, atribuindo à

família um sentido amplo, abrangendo este os parentes em linha reta que são os

pais, filhos e netos, e em linha colateral, que são os parentes até o quarto grau,

sendo estes, os irmãos, tios, sobrinhos e primos. Tem-se também em um sentido

estrito a família nuclear, constituída esta por pais e filhos, assim como dispõe o

artigo 1.568 do CC/2002.36

Na busca de uma conceituação para família, Maria Helena

Diniz 37 traz um sentido técnico da palavra:

Família é o grupo fechado de pessoas, composto dos pais e filhos e, para efeitos limitados, de outros parentes, unidos pela convivência, e afeto numa mesma economia e sob a mesma direção.

Paulo Nader38, pronunciando-se a respeito do conceito de

família, traz a seguinte definição, dizendo que “ família é uma instituição social,

composta por mais de uma pessoa física, que se irmanam no propósito de

desenvolver, entre si, a solidariedade nos planos assistencial e da convivência ou

simplesmente descendem uma da outra ou de um tronco comum”.

Assim, como já delineado, mas com outras palavras, pode-se

afirmar que a família é um grupo de pessoas que trabalham e convivem para uma

mesma expectativa de vida, caminhando os membros em um mesmo

direcionamento.

De uma maneira mais sucinta, o Direito Civil moderno, ou seja,

após o CC/2002 apresenta sua definição, considerando componentes da família as

pessoas que são unidas por uma relação conjugal ou de parentesco.39

36 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

p.04. 37 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : direito de família. p.17. 38 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.03. 39 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil : direito de família. p. 01.

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Vê-se que a última definição já limita a família a ser formada

apenas por pessoas que estão ligadas por um grau de parentesco, ou, por uma

relação conjugal.

Outra definição que pode ser trazida para o referente trabalho é

a de Adauto Suannes40, dizendo que, família é “ uma expressão que deve abranger

pelo menos aquelas duas pessoas que se unem com o propósito de manutenção

desse vínculo afetivo, independente de serem de sexo diverso, tenham ou não

prole”.

A definição trazida por Suannes deixa em aberto a

possibilidade de haver a equiparação da família homoafetiva à entidade familiar da

união estável. Essa questão de não ser necessária a procriação refere-se também a

família monoparental, contida na leitura do artigo 226, parágrafo 4º da CRFB/88.

No que tange a sua estrutura e finalidade, a família é um grupo

social sui generis, dotada de interesses morais, afetivos e ainda, econômicos.

Assim, antes de ser jurídica, a família é uma instituição de conteúdo moral,

sociológico e biológico, voltada a interesses sociais da maior importância.41

Alex Weill42 ainda afirma que “o seu papel é relevante para a

criação da prole, equilíbrio emocional de seus membros e para a formação da

sociedade”.

Ao tratar sobre os modelos de famílias existentes, ressalta-se

que ao lado da família tradicional, aquela instituída pelo matrimônio, há outros

modelos, como por exemplo a união estável e a família monoparental. Forças

sociais existentes lutam pelo reconhecimento ainda das uniões homoafetivas,

buscando que estas sejam inseridas no âmbito social como sendo uma entidade

familiar.43 Nada mais justo, uma vez que a relação homoafetiva é revestida de afeto,

este que uma vez vem sendo o alicerce da família no momento atual.

40 SUANNES, Adauto, in, TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.87. 41 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.05. 42 WEILL, Alex, in, NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.05. 43 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.04.

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A este respeito Maria Berenice Dias44 indaga que “como a

família é uma relação da ordem da solidariedade, tem o afeto como pressuposto.

Portanto, todas as espécies de vínculos que tenham por base o afeto são

merecedoras da proteção do Estado”.

A CRFB/88 mudou completamente o paradigma do direito de

família. Deixou de considerar o casamento como requisito indispensável à formação

de família, passando a considerar o amor familiar como requisito indispensável na

constituição da família protegida. Pelo artigo 226 da CRFB/88 entende-se que as

hipóteses de família possíveis são aquelas que derivam do casamento civil, união

estável e família monoparental. Mesmo então que o CC/1916 pouco levasse em

conta o amor existente na relação, dando proteção apenas à família oriunda de

casamento civil, isso agora com a CRFB/88 deixou de ser aceitável.45

Nesse sentido afirma Maria Berenice Dias 46, que:

A compreensão do que constitui a família contemporânea supõe a identificação do elemento que autorize reconhecer a origem do relacionamento das pessoas- elemento que é o afeto, ou seja, o envolvimento emocional que leva a subtrair um relacionamento do campo obrigacional para trazê-lo ao âmbito familiar.

Analisa-se como base de toda mudança da atualidade a

CRFB/88, e os princípios do direito de família com suas aplicações nos casos

concretos. Assim como a figura do matrimônio não é mais a única cabível ao

conceito de família, direitos da pessoa humana ,como por exemplo, direito à

liberdade, à igualdade, e ainda, direitos que dizem respeito a busca de uma

realização pessoal, estão recebendo preponderância no âmbito do direito familiar,

como se verá no decorrer do trabalho, mudando-se as formas das entidades

familiares. Subsistem outros elementos concretizadores de um lar familiar como

poderá verificar-se.

44 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. p.129. 45 VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade : da possibilidade jurídica do

casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. São Paulo: Método, 2008. p.196-197.

46 DIAS, Maria Berenice, in, VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade . p.197.

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Necessário entender-se agora, que a família está se

construindo sobre novos alicerces sendo eles o afeto, a solidariedade, e ainda, o

simples desejo de estar junto. A família da atualidade encontra seu fundamento nas

vivencias do presente, e destas muito mais dizem respeito o carinho, assistência

mútua, solidariedade, convivência, e afeto existentes entre seus membros, que nada

mais é que o amor familiar, entre outras características fundamentais do âmbito

familiar.

1.3 PRINCÍPIOS DO DIREITO DE FAMÍLIA

Alguns dos Princípios Constitucionais são norteadores do

Direito de Família. Passa-se em breve a fazer uma análise dos mesmos.

A família, como já dito anteriormente, se baseia e orienta-se

sob estes princípios do direito de família tais quais são da Dignidade da Pessoa

Humana, Afetividade, Solidariedade Familiar, entre outros que ver-se-á a seguir.

Mas e o que vem a ser um princípio? Na visão de Sávio

Bittencourt47:

Um princípio é uma norma jurídica emanada do corpo geral das regras, que aponta para o objetivo maior de um determinado diploma jurídico. É uma espécie de “moral da história”, a mensagem principal que um grupo de regras dá à sociedade, sempre apontando para a proteção de um determinado bem jurídico da sociedade. Assim, o princípio assume uma importância vital para o direito, porque ele condiciona a interpretação das outras regras jurídicas.

Como pontua Paulo Lôbo48:

O princípio, por seu turno, indica suporte fático hipotético, necessariamente indeterminado e aberto, dependendo a incidência dele da mediação concretizadora do intérprete, por sua vez orientado pela regra instrumental da equidade, entendida segundo formulação grega clássica, sempre atual, de justiça do caso concreto.

A consagração da força normativa dos princípios

constitucionais explícitos e implícitos foi um dos maiores avanços do direito 47 BITTENCOURT, Sávio. A nova lei de adoção : do abandono à garantia do direito à convivência

familiar e comunitária. p.35. 48 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.35.

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brasileiro, principalmente após a CRFB/88, pois houve a superação do efeito

meramente simbólico que a doutrina tradicional trazia à eles.49

Com as inúmeras mudanças e inovações do novo milênio,

busca-se através dos princípios do direito de família a esperança de conseguir-se a

solução para conflitos dessa nova fase vivida, como por exemplo a libertação

sexual.50

Na concepção de Paulo Lôbo51 os princípios inerentes ao

direito de família são agrupados de uma forma em que se dividem em princípios

fundamentais, fazendo parte deste grupo o princípio da dignidade da pessoa

humana e o princípio da solidariedade, e por sua vez o grupo dos princípios gerais,

onde são encontrados os princípios da igualdade, liberdade, afetividade, convivência

familiar e do melhor interesse da criança.

Assim, alguns dos princípios que regem o novo direito de

família estão expostos a seguir.

1.3.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

O princípio da dignidade da pessoa humana é o maior,

fundador do Estado Democrático de Direito, sendo encontrado no inciso III do 1º

artigo da CRFB/88,52 seguindo de norte para o sistema jurídico.53

Ao inserir no artigo 1º da CRFB/88 o princípio da dignidade da

pessoa humana nos direitos fundamentais, o que o constituinte quis, sem a menor

sombra de dúvida, foi direcionar a República e o Estado a um único objetivo: garantir

a proteção e a promoção da dignidade da pessoa humana.54

49 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.34. 50 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : direito de família. p.18. 51 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.36-37. 52 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.52. 53 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva ; o preconceito e a justiça. p.102. 54 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.34.

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Indaga sobre o assunto Liane Maria Busnello Thomé55 dizendo

que:

A pessoa humana é a base da própria existência do Estado Democrático de Direito brasileiro e ao mesmo tempo fim permanente de todas as ações, devendo ser respeitada, tutelada e assegurada a possibilidade de concretização do desenvolvimento integral de suas potencialidades.

O princípio que aqui trata-se tem seu fundamento na garantia

que cada pessoa tem de formar sua família sob os princípios da solidariedade,

isonomia, pluralidade familiar, liberdade e autonomia de vontade.56

Em concordância com o que foi dito acima, é neste mesmo

sentido que Rodrigo da Cunha Pereira57 se manifesta, dizendo que este “é um

macroprincípio do qual se irradiam todos os demais: liberdade, autonomia privada,

cidadania, igualdade e solidariedade, uma coleção de princípios éticos”.

Nesse contexto, a dignidade referente a tal princípio deve ser

compreendida e entendida como uma qualidade intrínseca e também indissociável

de todo e qualquer ser humano e, por tal motivo, irrenunciável e inalienável, posto

consubstanciar-se num elemento que qualifica o ser humano, bem como a sua

situação de ser superior aos demais seres. Assim, o respeito e a proteção à

dignidade da pessoa humana devem se constituir num dos principais objetivos do

Estado Democrático de Direito.58

Ingo Sarlet59, também se refere à dignidade da pessoa humana

como sendo uma qualidade intrínseca ao preceituar que:

Dignidade da pessoa humana é a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, em complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições

55 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e mediação familiar . p.43. 56 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e mediação familiar . p.43-44 57 PEREIRA, Rodrigo da Cunha, in, DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.52. 58 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p. 31. 59 SARLET, Ingo, in, DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva ; o preconceito e a justiça. p.102-103.

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existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destemidos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.

Ensina sobre o tema também Kant60:

No reino dos fins tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço, pode-se por em vez dela qualquer outra como equivalente; mas quando uma coisa está acima de todo o preço, e, portanto, não permite equivalente, então tem ela dignidade.

Assim, qualquer ato, conduta ou atitude que equipare a pessoa

a uma coisa disponível ou a algum objeto, estaria violando o princípio da dignidade

da pessoa humana.61

A pessoa humana merece ser tratada com consideração e

respeito, isso independente de sua crença, nível intelectual ou social, assim como

referente à sua opção sexual. O fato de ser humano já basta por si só a garantia de

sua dignidade.62

Entende-se portanto que, este princípio tem por objetivo, no

âmbito do direito de família, dar a mesma igualdade para todas as pessoas, bem

como para todas as entidades familiares, sendo indigno tratamento diferenciado as

várias formas de filiação ou ainda, aos vários tipos de família.63 Significa ainda dizer

que cada pessoa merece que suas escolhas e desejos sejam respeitados.

1.3.2 Princípio da Solidariedade Familiar

A solidariedade advém do princípio da dignidade da pessoa

humana, representando mais do que tudo, a possibilidade do ser humano colocar-se

no lugar do próximo, buscando o bem comum. É como se fosse uma partilha,

partilhando o que nos pertence com o outro e não apenas dar o que é do outro. Mais

60 KANT, Immanoel, in, LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.37. 61 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.37. 62 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e a mediação familiar . p.47. 63 PEREIRA, Rodrigo da Cunha, in, DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.53.

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do que tudo, é desejar o bem do outro, para assim alcançar o bem comum. Dessa

forma, a solidariedade se manifesta quando as pessoas respeitam umas as outras.64

A solidariedade pode ser identificada na família como sendo

uma relação que provém de um amparo recíproco, principalmente quando se passa

por momentos de crise no seio familiar. O afeto, a assistência, o respeito, que são os

principais sentimentos envolventes da solidariedade familiar, quando entram na

seara do Poder Judiciário, devem ser compreendidos, ou ainda, traduzidos em

valores e condutas e, conseqüentemente, em direitos e deveres devem ser estes

transformados.65

No que tange ao ambiente familiar Liane Maria Busnello

Thomé66 ensina:

É no ambiente privado da família que as primeiras noções de solidariedade se desenvolvem no ser humano. No reconhecimento e respeito dos cônjuges entre si e no respeito e proteção aos filhos é que a solidariedade se constrói, de forma singular, espontânea e permanente.

Um exemplo que se tem do princípio da solidariedade na

família, é a imposição que se faz aos parentes da obrigação de prestar alimentos

uns aos outros.67

Leciona Erhard Denninger68 que:

A solidariedade, como categoria ética e moral que se projetou para o mundo jurídico, significa um vínculo de sentimento racionalmente guiado, limitado e auto-determinado que compele à oferta de ajuda, apoiando-se em uma mínima similitude de certos interesses e objetivos, de forma a manter a diferença entre os parceiros na solidariedade.

64 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e a mediação familiar . p.56. 65 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.75 66 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e a mediação familiar . p.57. 67 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.56. 68 DENNINGER, Erhard, in, LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.39.

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Para Paulo Bonavides69 o referido princípio serve como

oxigênio da Constituição, não apenas dela, conferindo unidade de sentido e

auferindo a valoração da ordem normativa constitucional.

Assim sendo, este princípio, tem origem nos vínculos afetivos,

dispondo de conteúdo ético, contendo seu significado no seu próprio nome

solidariedade, compreendendo a reciprocidade. 70

Reciprocidade essa, que consiste no ato de prestar auxílio,

ajuda, amparo, e ainda, assistência moral e material para todos os entes familiares.

Neste contexto, Paulo Lobo71 ensina sobre a solidariedade do

núcleo familiar, devendo essa ser entendida como “solidariedade recíproca dos

cônjuges e companheiros, principalmente quanto à assistência moral e material”.

Juntamente falando sobre o princípio da Solidariedade e da

dignidade da pessoa humana, este já citado anteriormente, Paulo Lôbo72, ainda faz

a seguinte referência:

A solidariedade e a Dignidade da Pessoa Humana são os dois hemisférios indissociáveis do núcleo essencial irredutível da organização social, política e cultural e do ordenamento jurídico brasileiro. De um lado o valor da pessoa humana enquanto tal, e os deveres de todos para com sua realização existencial, nomeadamente do grupo familiar; de outro lado, os deveres de cada pessoa humana com as demais, na construção harmônica de suas dignidades. O principio da solidariedade é o grande marco paradigmático que caracteriza a transformação do Estado liberal e individualista, do século XIX, em Estado democrático e social, com suas vicissitudes e desafios, que o conturbado século XX nos legou. É a superação do individualismo jurídico pela função social dos direitos.

Agora, referente à solidariedade em relação aos filhos,

importante ressaltar que esta corresponde à exigência da pessoa ser cuidada até

69 BONAVIDES, Paulo, in, LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.40. 70 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.56. 71 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.41. 72 LOBO, Paulo, in, TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.75-76

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alcançar a idade adulta, ou seja, de ser mantida, instruída e educada por sua família

para sua plena formação social.73

De uma forma ou de outra, de suma importância é a

solidariedade no seio familiar.

Observa-se a solidariedade no âmbito familiar vivida entre os

componentes da família, sendo pais, irmãos, avós, parentes, sejam estes

consanguíneos ou socioafetivos. Seu desenvolvimento se dá através do respeito, da

assistência mútua, companheirismo, na divisão de sonhos e no próprio bem estar

comum, tendo seu papel fundamental na união dos componentes da família.74

A propósito, explica Paulo Nader75 que “quando a solidariedade

cessa, a família se revela em crise, fato este que pode ser superado, recorrendo-se

aos mecanismos internos de aproximação.”

Basicamente, o princípio da solidariedade familiar, diz respeito

à cooperação, ou ainda, ao comprometimento mútuo, que deve ter um ente familiar

com o outro componente de sua família, para que assim, estes, possam constituir

um verdadeiro lar.

1.3.3 Princípio da Igualdade e respeito à diferença

A igualdade que aqui se fala, vem prevista no preâmbulo da Lei

Maior, ou seja, a CRFB/88, em seu artigo 3º, inciso IV preceituando que a mesma

tem por objetivo “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,

cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”76, e ainda, encontra sua base

legal também em seu artigo 5º, caput ao prescrever que “todos são iguais perante a

lei, sem distinção de qualquer natureza [...]”77.

73 BIANCA, C.Massimo, in, LOBO, Paulo. Direito civil: famílias. p.41. 74 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e a mediação familiar . p.57. 75 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p. 05. 76 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). 45.ed. São Paulo:

Saraiva,2011. 77 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). 45.ed. São Paulo: Saraiva,

2011.

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A igualdade é, da mesma forma, contemplada, pela Declaração

Universal dos Direitos Humanos, mais precisamente em seus artigos 1º e 2º78, e

nesse sentido, João Batista Herkenhoff79 diz o seguinte em relação ao artigo 2º:

O artigo consagra assim a absoluta igualdade de todos os seres humanos para gozar dos direitos e das liberdades que a Declaração Universal assegura. O artigo II, neste seu primeiro parágrafo, contempla o artigo I. [...] A cláusula ‘sem distinção de qualquer espécie’, no início do parágrafo, e a cláusula ‘ou qualquer outra condição’, no final do parágrafo, são cláusulas generalizadoras de maior importância. Essas cláusulas, a meu ver, proíbem todas as discriminações, mesmo àquelas não enunciadas no texto. Assim, atentam contra os Direitos Humanos as discriminações contra o homossexual, contra o aidético [...]. Todas as discriminações, mesmo veladas, que visem rotular pessoas afrontam os Direitos Humanos. Nenhuma exclusão ou marginalização de seres humanos pode ser tolerada.

Observa-se assim, que em relação ao homossexualismo, tanto

os heterossexuais como os homossexuais devem receber um tratamento igualitário

pelo direito, acabando dessa forma com a impossibilidade de se reconhecer uma

identidade de casal para os parceiros homossexuais, bem como, o direito que os

mesmos têm à paternidade por via da adoção. Assim, conforme tratamento de

igualdade imposto pela CRFB/88, às uniões homossexuais, devem ser atribuídos os

mesmos direitos que se resguardam aos casais heterossexuais, quando assim

demonstrarem uma vida familiar, podendo desse modo, os mesmos fazerem jus, da

possibilidade de incluir no seu seio familiar, através do instituto da adoção, crianças.

Sendo isso concebido a eles, estar-se-á diante de um tratamento igualitário.

Significa também dizer, que não conceber a um número expressivo de pessoas a

possibilidade das mesmas exercerem uma função de titular em uma relação jurídica

com fundamento no afeto, tendo tal ato a justificativa na opção sexual escolhida por

ela, mostra-se claramente um tratamento desigualitário.80

78 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.57. 79 HERKENHOFF, João Batista, in, TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações

homoparentais . p.57. 80 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.57-58.

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Tal princípio busca, igualar homem e mulher, filhos, e ainda,

entidades familiares. E nenhum princípio provocou tão profunda transformação no

direito de família como este.81

Conforme Paulo Lôbo82: “o princípio da igualdade está

expressamente contido na Constituição, designadamente nos preceitos que tratam

das três principais situações nas quais a desigualdade de direitos foi a constante

histórica: os cônjuges, os filhos e as entidades familiares”.

Assim, fazendo uma análise do enunciado do parágrafo 5º do

art.226 da CRFB/88, este diz respeito que os direitos e deveres referentes à

sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher, assim

colocando um fim ao poder marital. Este sentido de sociedade conjugal torna-se

mais amplo, pois abrange ainda a igualdade de direitos e deveres aos companheiros

da união estável. Por sua vez, o parágrafo 6º do art.227, da CRFB/88, faz referência

à máxima igualdade entre os filhos, estes havidos ou não da relação de casamento,

ou adoção. E ainda, o caput do art.226, tutela e protege a família, não fazendo

restrição a qualquer espécie ou tipo, como fizeram as Constituições Brasileiras,

anteriores a 1988, em relação à exclusividade do casamento, fazendo com que

somente este tivesse seu reconhecimento como família.83

A lição de Paulo Lôbo é no sentido de que, a igualdade não

pode apagar ou desconsiderar as diferenças naturais e culturais existentes entre as

pessoas e as entidades, afinal, homem e mulher são diferentes, pais e filhos

também são diferentes; criança, adulto e idoso são diferentes. Assim ainda, como os

diversos tipos de família são diferentes: a família matrimonial, ou seja, aquela

oriunda do casamento, a união estável, a família monoparental, e todas as demais

entidades familiares, possuem características diferentes umas das outras. No

entanto, as diferenças existentes, citadas acima, não podem resultar em um

81 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.42. 82 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.43. 83 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.43.

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tratamento desigualitário, pois cada membro familiar individualizado deve ser tratado

com respeito.84

Todavia, a afirmação de Paulo Lôbo85 é no sentido de que: “as

diferenças não podem legitimar tratamento jurídico assimétrico ou desigual, no que

consernir com a base comum dos direitos e deveres, ou com o núcleo intangível da

dignidade de cada membro da família”.

Anthony Giddens86, refere-se ao tema expondo o seguinte:

Uma ordem democrática [incluindo a democratização da vida pessoal] não implica um processo genérico de ‘nivelar por baixo’, mas em vez disso promove a elaboração da individualidade.

Nesse sentido, muito oportuna é a explicação de Maria Celina

Bodin de Morais87 afirmando:

O fundamento jurídico da dignidade humana manifesta-se, em primeiro lugar, no princípio da igualdade, no direito de não receber qualquer tratamento discriminatório, do direito de ter direitos iguais aos de todos os demais, a igualdade formal, segunda a qual todos são iguais perante o ordenamento jurídico. Já a igualdade substancial prevê a necessidade de tratar as pessoas quando desiguais em conformidade com suas desigualdades, passando essa a ser uma formulação mais avançada da igualdade de direitos.

Entende-se, que a concepção dos Direitos Humanos, pois aqui

aponta-se que direito à igualdade é um direito humano, tem sua base na dignidade

da pessoa humana, princípio este fundamental, a qual por sua vez impõe o

reconhecimento e o respeito que deve-se ter em relação à diversidade e à

pluralidade existentes na humanidade, de tal modo que é indiscutível o respeito às

diferenças que deve se ter com os serem humanos, pois estas sempre existiram e

sempre irão existir, e se quer a humanidade caminhar para um destino mais justo e

igualitário, necessário se faz começando a respeitar a dignidade da pessoa.88

84 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.44. 85 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.44. 86 GIDDENS, Anthony, in, LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.44. 87 MORAES, Maria Celina Bodin de, in, THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa

humana e mediação familiar . p.69. 88 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.56-57.

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1.3.4 Princípio do Pluralismo das Entidades Familia res

Para uma melhor compreensão da principiologia do direito de

família contemporâneo, importante é ter-se em mente, que a vida mudou, a

realidade socioeconômica transformou valores e concepções. Dessa forma, melhor

poderá se entender o direito de família moderno, levando-se em consideração a

ética, cidadania, inclusão social, afeto, cuidado, solidariedade, igualdade e

dignidade, pois estes constituem hodiernamente o corpo da proposição para uma

correta compreensão deste direito.89

Não há mais aquele conceito unitário de família que advinha

somente do casamento. A CRFB/88 trouxe para o mundo jurídico o que já existia no

mundo dos fatos, ou seja, os outros tipos de relações entre pessoas, não advindas

do matrimônio. Assim, a CRFB/88 reconheceu como entidade familiar as uniões

entre mulheres e homens e ainda as comunidades formadas por qualquer dos pais e

seus descendentes.90

Pela profunda mudança do arquétipo de família, instituído pela

CRFB/88, pode-se visualizar a pluralidade dos arranjos familiares e de sua

característica eudemonista.91

Ana Carla Harmatiuk Matos92 expõe seu ponto de vista em

relação a essa família eudemonista:

A repersonalização das relações familiares significa sair daquela idéia de patrimônio como orientador da família, onde esta se forma pela afetividade e não mais exclusivamente pelo vínculo jurídico formal que une as pessoas. [...] Uma das conseqüências práticas da repersonalização vem a ser a nova concepção de família, espalhando a idéia básica de família eudemonista, ou seja, direcionada à realização dos indivíduos que a compõe.

Neste mesmo contexto, Carlos Cavalcanti de Albuquerque

Filho afirma o seguinte:93

89 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.74 90 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e a mediação familiar . p.60. 91 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.79 92 MATOS, Ana Carla Harmatiuk. As famílias não fundadas no casamento e a condição feminina .

Rio de janeiro: Renovar, 2000. p.104-105.

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Desde a Constituição Federal as estruturas familiares adquiriram novos contornos. Nas condições anteriores, somente o casamento merecia reconhecimento e proteção. Os demais vínculos familiares eram condenados à invisibilidade. A partir do momento em que as uniões matrimonializadas deixaram de ser reconhecidas como única base da sociedade, aumentou o espectro da família. O princípio do pluralismo das entidades familiares é encarado como reconhecimento, pelo Estado, da existência de várias possibilidades de arranjos familiares.

Assim, mais uma vez percebe-se que a diversidade de

entidades familiares somente foi aceita após a CRFB/88, e que este princípio da

pluralidade de entidades familiares veio para quebrar de vez com o único

reconhecimento e proteção ao casamento, fazendo com que todas as entidades

familiares possam ser entendidas como a formação de uma família.94

Pontua Maria Berenice Dias95 que as uniões extramatrimoniais

não eram consideradas de natureza familiar, e por este motivo, encontravam abrigo

somente no direito obrigacional, sendo as mesmas tratadas como sociedades de

fato. Mesmo que não indicadas de uma forma expressa, outras entidades familiares

como por exemplo as uniões homossexuais e as uniões estáveis paralelas, de uma

forma preconceituosa nominadas de “concubinato adulterino”, são unidades afetivas,

assim merecendo ser abrigadas sob o manto do direito das famílias.

Indica ainda Maria Berenice Dias96 que:

Excluir do âmbito da juridicidade entidades familiares que se compõem a partir de um elo de afetividade e que geram comprometimento mútuo e envolvimento pessoal e patrimonial é simplesmente chancelar o enriquecimento injustificado, é ser conivente com a injustiça.

Assim, diante da aplicação do princípio da pluralidade das

formas de família, que adveio da CRFB/88, tornou-se imperioso o tratamento tutelar

a todos os grupos, que pelo afeto, apresentam-se como uma família; dessa forma, a

93 ALBUQUERQUE FILHO, Carlos Cavalcanti de, in, DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das

famílias . p.57. 94 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.80. 95 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.57. 96 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.57.

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união entre pessoas de um mesmo sexo não pode ser excluída do laço social e

tampouco pode haver sua exclusão do instituto da adoção.97

Neste sentido afirma Liane Maria Busnello Thomé98:

A família é composta por seres humanos e deve ser reconhecida e protegida nas diversas formas afetivas vividas, independente de escolha sexual, pois só assim se protegem cidadãos que vivem estes diferentes modelos familiares.

Entende-se que o princípio da pluralidade de famílias insere no

mundo jurídico outras entidades que não seja aquela oriunda do casamento. Porém,

porque não inserir também na CRFB/88 em seu artigo 226 as relações

homoafetivas?

Essas relações como as outras merecem respeito uma vez

formadas com base no afeto, solidariedade, entre outras características

fundamentais para concretização de uma entidade familiar. Uma vez respeitando

essas diferenças, que dizem respeito por exemplo, à opção sexual de cada ser

humano, será respeitado a dignidade da pessoa humana.

Esse desejo em que há no ser humano de se relacionar

afetivamente, buscando dessa forma a sua própria felicidade, traz para nossa

realidade social a reconstituição do bloco familiar em novas famílias.99

1.3.5 Princípio da Afetividade

Neste momento passa-se ao estudo do afeto, que até então, no

presente trabalho, encontra-se citado diversas vezes, por ser ele característica

buscada nas relações familiares atuais. Dessa forma, este princípio parte do

pressuposto que o afeto entre os entes familiares é o que mais importa para a

constituição de uma família.

Como já demonstrado no presente trabalho, o paradigma de

família mudou, uma vez que esta passou de uma entidade fechada, à existência

97 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoaparentais . p.80 98 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e a mediação familiar . p.65. 99 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e a mediação familiar . p.67.

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somente em razão do amor entre os cônjuges ou companheiros. Atualmente, é o

afeto que faz com que duas pessoas queiram manter uma união estável, sendo

assim, a felicidade de cada membro passou a ter maior relevância para a

sociedade.100

O artigo 226, parágrafo 8º da CRFB/88, bem como o princípio

da dignidade da pessoa humana alçam a afetividade à condição de princípio jurídico.

Atualmente há portanto a necessidade de cada membro buscar a realização da

personalidade em razão de qualquer concepção preestabelecida de entidade

familiar. Por essa razão, a família apenas faz sentido para o direito no momento que

é veículo funcionalizador que promove a dignidade das pessoas, onde o afeto

tornou-se um valor jurídico de suma importância.101

Paulo Lôbo102 ao conceituar o princípio da afetividade, afirma

que: “é o princípio que fundamenta o direito de família na estabilidade das relações

socioafetivas e na comunhão da vida, com primazia sobre as considerações de

caráter patrimonial ou biológico.”

Com todas as transformações sociais, a família acabou

modificando-se, assim caminhando para uma divisão de funções em razão da

capacidade individual.103 Referente a essas transformações, afirma Silvana

Carbonera104 que “as transformações foram sentidas plenamente com a

constitucionalização de um modelo de família eudemonista e igualitário, com maior

espaço para o afeto e a realização individual.”

Quanto ao tema, pondera Paulo Roberto Vecchiatti 105:

100 VECCHIATII, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade : da possibilidade jurídica do

casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. p.220. 101 PEREIRA, Rodrigo da Cunha, in, VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade :

da possibilidade jurídica do casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. p.220.

102 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.47. 103 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.60. 104 CARBONERA, Silvana, in, DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.60. 105 VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade : da possibilidade jurídica do

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Essa evolução social quanto à compreensão da família elevou o afeto à condição de princípio jurídico oriundo da dignidade da pessoa humana no que tange às relações familiares, visto que estas, para garantirem o direito à felicidade e uma vida digna (inerentes à dignidade humana), precisam ser pautadas pelo afeto e não por meras formalidades como a do casamento civil. Assim, o princípio do afeto é um princípio constitucional implícito, decorrente da dignidade da pessoa humana e, ainda, da própria união estável, que tem nele o principal elemento para reconhecimento do status jurídico-familiar de uniões não-matrimonializadas.

Confirma-se assim que, o afeto consta como princípio jurídico,

pois este decorre do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Os

indivíduos da forma mais variada, como por exemplo através do afeto, buscam a

realização de sua felicidade e de uma vida digna, condições estas que são inerentes

à dignidade humana. Mesmo sendo implícito, é um princípio constitucional, pois

advém da dignidade da pessoa humana.

Complementa Paulo Lôbo106:

O princípio da afetividade especializa, no âmbito familiar, os princípios constitucionais fundamentais da dignidade da pessoa humana (art. 1, III) e da solidariedade (art.3, I), e entrelaça-se com os princípios da convivência familiar e da igualdade entre os cônjuges, os companheiros e filhos, que ressaltam a natureza cultural e não exclusivamente biológica da família.

Assim, complementando o ensinamento de Paulo Lôbo, afirma

Claude Lévi-Strauss107 que a evolução da família “expressa a passagem do fato

natural da consangüinidade para o fato cultural da afinidade”.

Na lição de Belmiro Pedro Welter108, com a consagração que o

afeto obteve como direito fundamental, resta enfraquecida a resistência dos juristas

que não admitem a igualdade entre filhos biológicos e socioafetivos.

Paulo Lôbo109 ainda, faz uma indicação de quatro fundamentos

essenciais do princípio da afetividade na CRFB/88:

casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. p.221.

106 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.48. 107 LÉVI-STRAUSS, Claude, in, LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.48. 108 WELTER, Belmiro Pedro, in, DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.60.

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a) Todos os filhos são iguais independentemente de sua origem (art.227, parágrafo 6º);

b) A adoção, como escolha afetiva, alçou-se integralmente ao plano da igualdade de direitos (art.227 parágrafos 5º e 6º);

c) A comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, incluindo-se os adotivos, tem a mesma dignidade da família constitucionalmente protegida (art.226, parágrafo 4º);

d) A convivência familiar (e não a origem biológica) é prioridade absoluta assegurada à criança e ao adolescente (art.227).

Após a análise do princípio da afetividade trazida por

doutrinadores, e utilizando-se dos princípios fundamentais da CRFB/88, resta claro

que como prioridade para caracterização de uma família hoje em dia, o afeto é

componente principal, e não mais o simples vínculo sanguíneo ou civil. Neste

sentido, reafirma Paulo Lôbo110 que “o afeto não é fruto da biologia. Os laços de

afeto e solidariedade derivam da convivência familiar, não do sangue”.

Considera-se portanto, que hoje só pode haver o entendimento

da família por meio da dignidade da pessoa humana, a qual é a base da nossa

CRFB/88, e mais, considerando de igual forma que a valorização da afetividade nas

entidades familiares decorrem da dignidade da pessoa humana, tornando dessa

forma, impossível de negar que essa afetividade tem condição de princípio jurídico-

constitucional, mesmo que implícito.111

O princípio que aqui estudou-se melhor é analisado juntamente

ao princípio da solidariedade, uma vez que, são os vínculos afetivos que dão origem

a solidariedade familiar estudada anteriormente. Assim sendo, o afeto é o

sentimento que liga um indivíduo ao outro numa família e é ele que faz brotar uma

solidariedade mútua no seio familiar. Sendo respeitado o princípio da afetividade no

âmbito das relações familiares está sendo consequentemente respeitada a

dignidade da pessoa humana.

109 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.48. 110 LOBO, Paulo, in, DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.60. 111 VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade : da possibilidade jurídica do

casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. p.222.

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1.3.6 Princípio do melhor interesse da criança e do adolescente

O princípio referido, presente no direito brasileiro, encontra

fundamento no art. 227 da CRFB/88, estabelecendo que é dever da família, da

sociedade e ainda, do Estado garantir à criança e ao adolescente, com total

prioridade, os direitos enunciados no mesmo artigo.112

Tal princípio, visa assim, como o nome já diz, o melhor

interesse da criança e do adolescente, fazendo com que todos seus interesses

sejam tratados com prioridade pelo Estado, pela sociedade, e ainda, pela família,

tanto na elaboração como na aplicação dos direitos que dizem respeito às mesmas,

crianças e adolescentes.113

Pelo motivo da criança ou adolescente se encontrar numa

situação de fragilidade, por conta de seu processo de amadurecimento e,

conseguinte, formação de sua personalidade, é que o mesmo merece uma situação

de destaque no ambiente familiar.

Sobre o tema, as palavras de Rosana Amara Girardi Fachin114

são as seguintes:

De acordo com a Constituição, o modelo institucional de família é atenuado para residir na relação entre pais e filhos o poder paternal, que está centrado na idéia de proteção. A paridade de direitos e deveres tanto do pai quanto da mãe está em assegurar aos filhos todos os cuidados necessários para o desenvolvimento de suas potencialidades para a educação, formação moral e profissional.

O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente

busca também garantir que o menor permaneça durante o seu desenvolvimento no

lar conjugal, recebendo gestos de amor, carinho e atenção, reveladores de toda

alegria que sua presença possa representar para a família, os quais irão também

112 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.55. 113 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.53. 114 FACHIN, Rosana Amara Girardi, in, TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações

homoparentais . p.97.

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servir de alicerce de seu sistema de valores e de sua maneira de proceder com os

demais.115

Neste contexto, busca-se muitas vezes a manutenção das

crianças no seio da família natural, mas o que ocorre em algumas ocasiões, é que

isso pode não ser o melhor para a criança, pois pode não atender os interesses da

mesma. Neste caso deve ocorrer a destituição do poder familiar, para assegurar

seus direitos, devendo a mesma ser entregue a adoção, o que muitas vezes,

dependendo das circunstancias, é melhor para a criança.116

Sobre a convivência familiar, manifesta-se Paulo Lôbo117

dizendo que “o direito a convivência familiar não está ligado à origem biológica da

família. Não é um dado, é uma relação construída no afeto, não derivando dos laços

de sangue”.

Assim, o que deve prevalecer é o direito à dignidade e ao

desenvolvimento integral da criança, porém muitas vezes, estes não são

assegurados pela família, fazendo assim com que haja a necessidade da

intervenção do Estado, para que este possa afastar a criança de seus genitores e

assim levá-la para adoção, ou junto, das famílias substitutas.118

1.3.7 Princípio da Liberdade

Os princípios da liberdade e o da igualdade foram os primeiros

a serem reconhecidos como direitos humanos fundamentais, integrando assim, os

mesmos, a primeira geração de direitos a garantir o respeito à dignidade da pessoa

humana.119 Seu fundamento legal encontra-se no inciso I do artigo 3º da CRFB/88,

assim como no artigo 5º caput, também da CRFB/88.

Antigamente, quando predominava na família a voz do homem,

ou seja, do pai de família, ou ainda, quando a única forma de família possível era

115 TORRES, Aimebere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.97. 116 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.58. 117 LOBO, Paulo, in, DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.58. 118 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.58. 119 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.53.

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aquela obtida através do matrimônio, o direito de família não dirigia a liberdade aos

seus membros, não podendo os mesmos contrariar o modelo dito como matrimonial

e patriarcal da época. Essa não prática da liberdade se transcrevia sob diversas

formas como por exemplo, de ser a mulher dependente do marido, sem ter liberdade

de expressão; de seus filhos serem submetidos ao poder do pai; a não possibilidade

de construção de uma entidade familiar distinta da que advinha do matrimônio; a não

possibilidade também de se dissolver o casamento quando a vida do casal tornava-

se insuportável e; a não possibilidade de construir estado de filiação fora do

casamento. Mais tarde porém, o paradigma de família se alterou, ampliando dessa

forma o exercício de liberdade de seus membros, fazendo-se valer a democracia

familiar nas questões pertinentes à família. Observou-se essa mudança na

concessão de liberdade para as pessoas, através por exemplo do Estatuto da

Mulher Casada, que emancipou a mulher quase que de uma maneira total do poder

de seu marido (Estatuto de 1962); e da Lei do Divórcio de 1977, dispondo de

possibilidade na indissolubilidade do casamento, havendo a permissão ainda de se

construir novas famílias posteriormente. No entanto, a grande mudança veio mesmo

com a CRFB/88 que salientou existirem outras entidades familiares além da formada

pelo matrimônio, assim como deu igualdade a todos os filhos, não existindo mais

filhos ilegítimos. Em geral, com a CRFB/88 abriu-se para a pessoa a liberdade de

escolha em seu projeto de vida familiar, dando dessa forma um espaço maior para

as escolhas afetivas dos membros. Assim, o princípio que aqui trata-se, está

definitivamente ligado ao princípio da igualdade.120

Nas palavras de Liane Maria Busnello Thomé121, “a liberdade

de amar, de formar uma família revela o mais íntimo e o mais privado dos

sentimentos humanos, que é a manifestação do querer, sem condição ou

expectativa”.

Assim, encontra sua fundamentação este princípio na

perspectiva que cada ser humano tem em ter uma vida privada, íntima, podendo

praticar o livre exercício da vida privada. Ainda mais, a liberdade significa a

realização, sem que haja a interferência de qualquer tipo, as escolhas pessoais do

120 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.46-47. 121 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e mediação familiar . p.79.

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ser humano, podendo este realizar o seu projeto de vida do modo que melhor lhe

convir.122

Em relação ao tema, Paulo Lôbo123 preceitua que:

O princípio da liberdade diz respeito ao livre poder de escolha ou autonomia de constituição, realização e extinção de entidade familiar, sem imposição ou restrições externas de parentes, da sociedade ou do legislador; à livre aquisição e administração do patrimônio familiar; ao livre planejamento familiar; à livre definição de modelos educacionais, dos valores culturais e religiosos; à livre formação dos filhos, desde que respeitadas suas dignidades como pessoas humanas; à liberdade de agir, assentada no respeito à integridade física, mental e moral.

À luz da CRFB/88, duas são as principais vertentes que o

princípio da liberdade na família apresenta, sendo elas: a liberdade da entidade

familiar, diante da sociedade e do Estado, e ainda, a liberdade de cada membro

diante dos outros membros e da própria entidade familiar. Assim a realização da

liberdade se dá através da constituição, manutenção e extinção da entidade familiar,

e ainda, no planejamento familiar que é de livre decisão do casal, conforme artigo

226, parágrafo 7º da CRFB/88. Mais ainda, a liberdade se realiza na garantia contra

a violência, exploração e opressão no seio familiar e, na organização familiar mais

democrática, solidária e participativa.124

Paulo Bonavides125 se manifesta da seguinte maneira quanto

ao tema:

A liberdade é um bem imprescritível, existe na consciência da humanidade, na memória de todos os povos e de nada adianta violentar a sua liberdade, pois, quem um dia já respirou a liberdade, mais cedo ou mais tarde passará dela o esquife de tirania e o povo voltará a ser livre, como é de sua natureza e de sua índole.

122 MORAES, Maria Celina Bodin de, in, THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa

humana e mediação familiar . p.79-80. 123 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.46. 124 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.47. 125 BONAVIDES, Paulo, in, THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e

mediação familiar . p.80.

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Assim, enfatizando o que já se foi dito, tal princípio almeja o

direito à liberdade que cada ser humano possui, pois tal liberdade é de sua própria

natureza.

Dessa forma, todos têm a liberdade de escolher o seu

companheiro, seja este do sexo que for, bem como, o tipo de entidade que quiser

para constituir sua família. Assim, diante do princípio que aqui discute-se, é

assegurado a todo pessoa o direito a constituir uma relação conjugal, uma união

estável hétero ou homossexual, como também, se tem a liberdade de dissolver

estas mesmas relações que se formaram, bem como se formar uma nova estrutura

familiar de convívio.126

Reconhecer ao próximo, entendendo suas diferentes formas de

amar exige uma busca constante do próprio ser humano em si mesmo, do respeito

as demais pessoas e da sabedoria que o direito não tem a fornecer uma resposta

pronta, mas se constrói nos casos do dia-a-dia.127

Entende-se portanto que o exercício da liberdade é direito de

cada ser humano, podendo este obter a realização de uma vida plena, buscando

sua felicidade na vida afetiva, entre as outras maneiras que lhe convir.

1.4 MODALIDADES DE FAMÍLIA

Até a CRFB/88, a única modalidade de família aceita era a

oriunda do casamento.128

Porém, após a CRFB/88, e levando-se em conta o momento

atual, inegáveis são as modificações que vêm ocorrendo na estrutura familiar. Os

valores mudaram, assim como da mesma forma os juristas e os legisladores

tornaram-se parte dessa mudança, fazendo valer novas decisões com base numa

visão mais moderna referente ao direito de família. Novas formas de família são

agora inseridas no meio social, dando prevalência ao afeto como justificativa da

formação de uma entidade familiar.

126 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.53-54. 127 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e mediação familiar . p.83. 128 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.05-06.

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Viu-se já, que de grande influencia é o princípio da pluralidade

famílias, dando a possibilidade da inserção de novos arranjos familiares no meio

social. Dessa forma, ou seja, com essa mudança do arquétipo de família, instituído

pela CRFB/88, novas formas de famílias tornam-se possíveis de terem seus direitos

garantidos. Sobre o assunto em questão, importante se torna a consideração de

Aimbere Francisco Torres129 ao ressaltar que:

A aplicabilidade do princípio constitucional da pluralidade das formas de família, instituído com a Constituição de 1988, permitiu ao Direito de Família entrar em compasso com a realidade dos fatos sociais, ao romper com o arquétipo de que o casamento era o único instituto gerador e legitimador da família brasileira.

Assim como já analisou-se sobre os princípios que regem o

direito de família e as considerações gerais sobre esta, agora analisa-se as

modalidades familiares existentes na sociedade, trazendo seus traços marcantes,

suas características assim como o seu modo de vida.

1.4.1 Casamento

Como definição de casamento tem-se o conhecimento de Silvio

Venosa130, o qual pontua que:

O casamento é o centro do direito de família. Dele irradiam suas normas fundamentais. Sua importância, como negócio jurídico formal, vai desde as formalidades que antecedem sua celebração, passando pelo ato material de conclusão até os efeitos do negócio que deságuam nas relações entre os cônjuges, os deveres recíprocos, a criação e assistência material e espiritual recíproca e da prole etc.

Através da definição que nos dá o doutrinador, entende-se que,

o casamento é um negócio jurídico de suma importância para o Direito de Família,

do qual consequentemente surgem os direitos e deveres da sociedade conjugal.

Da mesma forma que o casamento, negócio jurídico que dá

margem a família considerada legítima, é ato pessoal é solene também, sendo

pessoal no sentido que, cabe somente aos nubentes a manifestação da sua

129 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.80. 130 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil : direito de família. p.25.

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vontade. A lei reveste o casamento de uma série de formalidades perante o Estado

que são de sua própria essência para garantir a publicidade, outorgando com isso

garantia de validade ao ato. Essa solenidade se inicia com os editais,

desenvolvendo-se na cerimônia de realização e prossegue em sua inscrição no

registro público.131

Conforme ainda Silvio Venosa132, outra característica

fundamental do casamento é: “a diversidade de sexos. Não há casamento senão na

união de duas pessoas de sexo oposto”.

Indica Silvio Rodrigues133, em sua ilustríssima obra de direito

de família, que três são as finalidades do casamento, sendo elas: a disciplinação das

relações sexuais entre os cônjuges, a proteção à prole, e ainda, a mútua assistência.

O mesmo autor citado acima, ao fazer uma análise de cada

finalidade, pontua que dentro da união que advém do casamento, propõem-se os

cônjuges à uma satisfação do desejo sexual, o que ressalta ainda o autor, que é

normal. A aproximação entre homem e mulher e o natural convívio entre os mesmos,

suscita o desenvolvimento de sentimentos afetivos recíprocos, dos quais nasce o

dever de prestar mútua assistência. Da união sexual, ainda, resulta a prole, cuja

sobrevivência e educação dependem da atenção dos pais. Assim, resulta-se que os

fins do casamento citados anteriormente, estão intimamente ligados à natureza

humana.134

1.4.2 Entidades Familiares

Ensina Paulo Lôbo135 que “várias áreas do conhecimento, que

têm a família como objeto de estudo e investigação, identificam uma linha tendencial

de expansão do que se considera entidade ou unidade familiar.”

131 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil : direito de família. p.26-27. 132 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil : direito de família. p.27. 133 RODRIGUES, Silvio. Direito civil : direito de família. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p.22. 134 RODRIGUES, Silvio. Direito de família . p.23 135 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.56.

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Orlando Gomes136 manifesta-se sobre o tema afirmando que

são unidades de convivência encontradas na experiência brasileira atual, entre

outras:

a) Homem e mulher, com vínculo de casamento, com filhos biológicos.

b) Homem e mulher, com vínculo de casamento, com filhos biológicos e filhos não biológicos, ou somente com filhos não biológicos.

c) Homem e mulher, sem casamento, com filhos biológicos (união estável).

d) Homem e mulher, sem casamento, com filhos biológicos e não biológicos ou apenas não biológicos (união estável)

e) Pai ou mãe e filhos biológicos (entidade monoparental)

f) Pai ou mãe e filhos biológicos e adotivos, ou apenas adotivos (entidade monoparental)

g) União de parentes e pessoas que convivem em interdependência afetiva, sem pai ou mãe que a chefie, como no caso de grupo de irmãos, após falecimento ou abandono dos pais, ou de avós e netos, ou de tios e sobrinhos.

h) Pessoas sem laços de parentesco que passam a conviver em caráter permanente, com laços de afetividade e de ajuda mútua, sem finalidade sexual ou econômica.

i) Uniões homossexuais, de caráter afetivo e sexual.

j) Uniões concubinárias, quando houver impedimento para casar de um ou de ambos companheiros, com ou sem filhos.

k) Comunidade afetiva formada com “filhos de criação”, segundo generosa e solidária tradição brasileira, sem laços de filiação natural ou adotiva regular, incluindo, nas famílias recompostas, as relações constituídas entre padrastos e madrastas e respectivos enteados, quando realizem os requisitos da posse de estado de filiação.

Recorrendo ainda à narrativa de Paulo Lôbo137, as hipóteses

previstas até a letra “f” estão previstas na CRFB/88, nos três tipos de entidades

136 GOMES, Orlando, in, LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.56.

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familiares, sendo estas, casamento, união estável e entidade monoparental. O que

resta saber, e se as hipóteses previstas da letra “g” até a última estão ou não

tuteladas pela ordem jurídica brasileira.

O objetivo de todas as entidades familiares é o mesmo, a

formação de família. Isso serve para diferi-lás de outros grupos formados apenas por

amizade, relações religiosas, ou ainda, outros tipos de relacionamentos afetivos.138

Ainda, para que todos os tipos citados anteriormente sejam

reconhecidos como entidades familiares, há de ter todas elas características comuns

como a afetividade, como fundamento e finalidade da entidade; estabilidade,

excluindo o relacionamento apenas casual ou o descompromisso; e a convivência

pública, ou seja, ato pelo qual a entidade mostra-se em público. Fundamentais que

estas estejam presentes para a concretização de uma entidade familiar, ou seja,

características que caminham na formação de uma família. Necessária se faz a

presença destas características para que estas relações sejam definidas como

entidades familiares, podendo-se assim diferencia-las das demais relações com

base no afeto como por exemplo relações de amizade, relacionamentos de trabalho

ou até mesmo relações religiosas.139

1.4.3 União Estável

As Constituições anteriores a 1988, pautaram seus textos no

sentido de proteger somente àquela família constituída sob casamento civil,

silenciando sobre a proteção da família de fato.140

Assim como também, o CC/1916 também não regulava a união

estável. Não atribuía a mesma o conceito de ser uma entidade familiar. O Código

supracitado, foi elaborado em um momento dominado pelo sentimento religioso, que

situava o matrimônio como sacramento. As uniões extramatrimoniais eram vistas

como relações absolutamente marginalizadas. Torna-se normal tal Código não

137 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.57. 138 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.58. 139 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.57. 140 AZEVEDO, Paulo Villaça. Estatuto da família de fato . 2.ed. São Paulo:Atlas, 2002. p.267.

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dispor sobre a união estável, já que a única maneira que enxergava-se a família era

na figura do casamento.141

A regulamentação da união estável antes do CC/2002 adveio

com a Lei n.8.971, de 29 de dezembro de 1994, sendo esta a primeira

regulamentação que tratava da união estável. Esta, definiu como “companheiros” o

homem e mulher que mantinham união devidamente comprovada, no estado de

solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, por um período maior de

cinco anos, ou com prole (concubinato puro). Posteriormente, a Lei 9.278, de 10 de

maio de 1996 alterou de forma significativa o conceito trazido pela Lei anterior,

omitindo os requisitos de natureza pessoal, o tempo de convivência entre homem e

mulher e ainda a existência de prole.142

Faz-se uma reflexão sobre o concubinato, indagando que duas

são as espécies que se destacam do sentido da palavra “concubinato”: concubinato

puro e concubinato impuro .143

Paulo Villaça Azevedo144 entende que se deve considerar puro

o concubinato quando:

ele se apresenta com os aludidos elementos do conceito expendido, ou seja, como união duradoura, sem casamento, entre homem e mulher, constituindo-se a família de fato, sem detrimento da família legítima.

Dessa forma, verifica-se que a atual união estável nada mais é

do que o antigo casamento de fato, que ocorria na antiguidade, tendo como sua

base o amor, o respeito e a família.

Agora, fazendo uma reflexão a respeito do que vem a ser o

concubinato impuro, o mesmo autor manifesta-se dizendo:

Tenha-se que o concubinato será impuro se for adulterino, incestuoso ou desleal (relativamente a outra união de fato), como o

141 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p. 493 142 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. 7. ed. São Paulo:

Saraiva, 2010. p.583. 143 AZEVEDO, Paulo Villaça. Estatuto da família de fato . p.190. 144 AZEVEDO, Paulo Villaça. Estatuto da família de fato . p.190.

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de um homem casado ou concubinado que mantenha, paralelamente a seu lar, outro de fato. 145

Assim, o mesmo autor tem seu ponto te vista a partir de que, o

primeiro, ou seja, concubinato puro ou concubinato, simplesmente, merece proteção

completa pelo Estado, e ainda, faz jus à regulamentação legal; enquanto que o

segundo, concubinato impuro ou concubinagem, não deve merecer apoio algum de

órgãos públicos e, até mesmo, da sociedade.

Carlos Roberto Gonçalves146 refere-se à Lei 9.278/96 dizendo

que esta trazia em seu 1º artigo que se “ considera entidade familiar a convivência

duradoura, pública e contínua, de um homem e de uma mulher, estabelecida com o

objetivo de constituição de família”.

Outro fator importante que a Lei acarretou é que houve a

substituição da expressão “companheiros” pela expressão “conviventes”.147

Comentando a Lei 9.278/96, Álvaro Villaça Azevedo148, afirma

que:

É certo que o parágrafo 3º do art.226 da Constituição Federal também não especifica nesse sentido; contudo, ambos os dispositivos legais apontam o objetivo de constituição familiar, o que impede que exista concubinato impuro (contra o casamento pré-existente de um dos concubinatos ou em situação incestuosa) ou concubinato desleal (em concorrência com outro concubinato puro).

A conclusão que faz-se a respeito disso é que, o sistema da Lei

9.278 não permitia que houvesse, simultaneamente, casamento e união estável, ou

de mais de uma união estável.

No que tange a atualidade referente à união estável, esclarece

Paulo Nader149 ao dizer:

145 AZEVEDO, Paulo Villaça. Estatuto da família de fato . p.190. 146 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.583-584. 147 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.584. 148 AZEVEDO, Alvaro Villaça, in, GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de

família. p.584. 149 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.498.

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No atual nível de evolução legislativa, a união estável e o concubinato distinguem-se em um ponto fundamental: naquela, o homem e a mulher são pessoas livres e podem se casar ou, pelo menos um deles, separado de fato ou formalmente, enquanto no concubinato há outros impedimentos matrimoniais.

Já em relação ao que os dois têm em comum, é que em ambos

os casos, as relações entre os casais não são eventuais. Dessa forma, os dois

casos distinguem-se das relações eventuais, onde não há a existência de

compromisso entre o casal, mas sim, meros interesses entre eles, com muita

frequência, interesses de ordem sexual. Nestas, o elo existente entra homem e

mulher, não chega a constituir uma comunhão de vida.150

O CC/2002 fez uma significativa mudança, inserindo o título

referente à união estável no livro de família, motivo pelo qual, restaram-se

revogadas as Leis n. 8.971/94 e n. 9.278/96 que anteriormente tratavam da união

estável. 151

A união estável, diferente do que ocorre no casamento, não se

estabelece através de um documento, mediante celebração de negócio jurídico.

Essa instituição concretiza-se sim na ordem de como os fatos vão ocorrendo,

mediante as relações de vida do casal. Mais ainda, seu vínculo jurídico se forma

pelos acontecimentos ocorridos na vida do casal.152

Quanto ao tema, Antonio Carlos Mathias Coltro153, citado por

Carlos Roberto Gonçalves, aduz que a união de fato se instaura “ a partir do instante

em que resolvem seus integrantes iniciar a convivência, como se fossem casados,

renovando dia a dia tal conduta, e recheando-a de afinidade e afeição, com vistas à

manutenção da intensidade”.

À luz do artigo 1.723 do CC/2002, é necessário, para a

configuração da entidade familiar que aqui trata-se, o concurso de alguns

150 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.498. 151 GONÇALVES, Direito civil brasileiro : direito de família. p.585. 152 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.498. 153 COLTRO, Antonio Carlos Mathias, in, GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro :

direito de família. p.588.

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requisitos.154 Tais requisitos desdobram-se em subjetivos e objetivos, podendo-se

enquadrá-los da seguinte forma: a)convivência more uxório; b)affectio maritalis:

sendo este o ânimo ou objetivo de constituir família; (pressupostos de ordem

subjetiva). Enquanto que os pressupostos de ordem objetiva são os seguintes: a)

diversidade de sexo; b)notoriedade; c) estabilidade ou duração prolongada; d)

continuidade; e)inexistência de impedimentos matrimoniais; e por fim f)relação

monogâmica.155

Pontua-se cada um dos elementos necessários para a

configuração da união estável a partir de agora.

1.4.3.1 Pressupostos de Ordem Subjetiva:

A convivência “more uxório” diz respeito a uma assistência

mútua que é necessária existir entre o casal. Assistência essa que deve ser material,

moral e espiritual, de uma forma em que haja uma troca e soma na vida em

conjunto. Dizem mais respeito às manifestações de carinho, atenção para gestos de

sentimento, ou seja, resumidamente, dizem respeito aos componentes que

constroem os alicerces de um bom e estruturado relacionamento afetivo.156

Sobre o assunto, Maria Helena Diniz157 traz a seguinte

ponderação:

A convivência more uxório deve ser notória, os companheiros deverão tratar-se, socialmente, como marido e mulher, aplicando-se a teoria da aparência, revelando a intetio de constituir família, traduzida por uma comunhão de vida e de interesses, mesmo que não haja prole comum (TJSP, Ap.167.994-1, j.10-9-1991)

O legislador não apontou expressamente no artigo 1.723 do

CC/2002 a coabitação ou vida em comum sob o mesmo teto entre o casal como um

dos requisitos, porém, tal elemento é de suma importância, pois constitui uma

marcante característica da união estável158. Sobre a questão, pondera Zeno

154 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.499. 155 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.588-589. 156 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.589. 157 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : direito de família. p.386. 158 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.589.

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Veloso159 dizendo que “essa entidade familiar decorre desse fato, da aparência de

casamento, e essa aparência é o elemento objetivo da relação, a mostra, o sinal

exterior, a fachada, o fator de demonstração inequívoca da constituição de uma

família”.

Entretanto, Carlos Roberto Gonçalves160 faz referência à

Súmula 382 do STF, observando que há nela entendimento diverso do doutrinário,

uma vez que a mesma dispõe que “a vida em comum, sob o mesmo teto, more

uxório, não é indispensável à caracterização do concubinato”.

O outro elemento subjetivo trata-se da “affectio maritalis”, ou

seja, o ânimo ou objetivo de constituir família.

Além de outros elementos como por exemplo o afeto, é

indispensável que exista entre o casal este elemento espiritual caracterizado pelo

ânimo, a intenção de constituir uma família.161

Importante que o requisito aqui tratado exige a constituição de

família, uma vez que não basta para a configuração da entidade familiar (união

estável) o simples animus, ou seja, apenas o objetivo de constituir, até porque,

explica Regina Beatriz Tavares da Silva162 que “ já que, se assim fosse, o mero

namoro ou noivado, em que há somente o objetivo de formação familiar, seria

equiparado à união estável”.

Referente aos elementos subjetivos que aqui esgotam-se,

torna-se muitas vezes difícil de se obter provas dos mesmos, pelo fato de que estes

são indícios de uma situação de vida conjugal, como por exemplo, exposição do

casal em festas, eventos sociais, empreendimentos em parceria, etc.163 Dessa forma

estes são mais difíceis de se verificar.

159 VELOSO, Zeno, in, GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família.

p.589. 160 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.589. 161 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.591. 162 SILVA, Regina Beatriz Tavares da, in, GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro :

direito de família. p.591. 163 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.592.

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1.4.3.2 Pressupostos de Ordem Objetiva:

Analisa-se a partir de agora os pressupostos de ordem

objetiva.

Tratando-se da diversidade de sexos, essa é imposta pela

CRFB/88 em seu artigo 226, parágrafo 3º preceituando que “para efeito da proteção

do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade

familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”164.

Da mesma forma o CC/2002, em seu artigo 1.723 exige o

requisito de diversidade de sexos expondo:

Art. 1.723 É reconhecida como entidade familiar a união estável entre homem e mulher, configurada na convivência pública, continua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.165

O grande debate do momento é se as relações homoafetivas

poderiam vir a se equiparar à união estável, sendo de igual forma reconhecida como

uma entidade familiar.

No que tange ao assunto, para que ocorra o avanço de

reconhecimento diante da esfera jurídica das mesmas, o ponto de partida é a

remoção do obstáculo previsto pela CRFB/88.166

Entretanto, já há entendimentos jurisprudenciais a favor das

uniões homossexuais. Entre seus fundamentos por exemplo indica-se o inciso IV do

art.3º da CRFB/88, excluindo este qualquer tipo de preconceito, até mesmo em

relação ao sexo. Da mesma forma vale mencionar, como argumento contrário à

exigência diversidade de sexos, a situação da entidade formada pelo pai ou mãe e

filhos, esta sendo conhecida como família monoparental, pois essa assim como a

união estável, também tem seu reconhecimento como entidade familiar dado pela

164 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). 45.ed. São Paulo: Saraiva,

2011. 165 BRASIL. Código Civil (2002) . 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2006. 166 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.500.

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CRFB/88 em seu art. 226, parágrafo 4º. Ou seja, isso significa dizer que o

ordenamento jurídico verificou como família aquela comunidade que não se destina

à procriação, mas sim, encontra-se fundada somente na solidariedade e no afeto

existente entre cada um de seus componentes.167

A respeito do tema, Carlos Roberto Gonçalves168 faz menção a

situações que a jurisprudência têm se direcionado à necessidade de atribuir um

verdadeiro estatuto de cidadania às uniões estáveis homoafetivas. Relata o autor

que a Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

Tem reconhecido a união entre homossexuais como possíveis de ser abarcada dentro do conceito de entidade familiar; sob a forma de união estável homoafetiva, ao fundamento de que a ausência de lei específica sobre o tema não implica ausência de direitos, pois existem mecanismos para suprir as lacunas legais, aplicando-se aos casos concretos a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito, em consonância com os preceitos constitucionais (art. 4º LICC).

Tratando-se dessas decisões que julgam a favor da

possibilidade de reconhecimento das uniões homossexuais como sendo entidades

familiares equiparadas a união estável, abaixo se cita-se algumas:

Constitui união estável a relação fática entre duas mulheres, configurada na convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com objetivo de constituir verdadeira família, observados os deveres de lealdade, respeito e mútua assistência. (TJRS, Ap. 70.005.488.812, 7ª Câm.Cív.,rel. Des José Carlos Teixeira Giorgis)

Reconhecida como entidade familiar, merecedora da proteção estatal, a união formada por pessoas do mesmo sexo, com características de duração, publicidade, continuidade e intenção de constituir família, decorrência inafastável é a possibilidade de que seus companheiros possam adotar. (TJRS, Ap.70.013.801.592, 7ª Câm. Cív,. Rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos, j. 5-4-2006)

Vê-se que a primeira decisão citada acima trata da

equiparação de união homafetiva à união estável, uma vez que a segunda equipara

a união homoafetiva à uma entidade familiar, podendo esta por sua vez fazer jus do

instituto da adoção. Ambas decisões foram tomadas levando-se em conta os

167 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.500-501. 168 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.593-594.

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requisitos necessários para a configuração da união estável, bem como os deveres

que os companheiros tem um para com o outro. Os requisitos faltantes assim como

os deveres dos companheiros são tratados no decorrer do trabalho.

O segundo requisito objetivo diz respeito à notoriedade. Exigido

pelo CC/2002, também em seu artigo 1.723, este requisito diz respeito à publicidade

necessária para a configuração da união estável em relação à convivência do casal.

Em poucas palavras define-se que a convivência não pode ser

somente contínua e duradoura, mas é necessário que ela seja, de igual forma,

pública.169

Requer-se portanto que o casal apresente-se em público,

como se fossem marido e mulher (more uxório) para que, dessa forma, haja a

configuração do requisito “notoriedade”, uma vez que relações baseadas em sigilo,

segredo, ou clandestinas como também conhecidas, não configuram união

estável.170

Como terceiro requisito objetivo encontra-se a estabilidade ou

duração prolongada.

Este requisito é a palavra “duradoura” que encontra-se no

artigo 1.723 do CC/2002. Seria mais para que os companheiros tenham um

relacionamento duradouro, que se estenda no tempo, que tal requisito é imposto.

Nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves171 “malgrado a lei

não estabeleça um prazo determinado de duração para a configuração da entidade

familiar, a estabilidade da relação é indispensável”.

Importante informar que a Lei n. 8.971/94 exigia o prazo de

cinco anos de convivência, ou prole para que houvesse a configuração da união

169 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.594. 170 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.594-595. 171 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.595.

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estável. Porém a Lei n. 9.278/96 omitiu este tempo mínimo de convivência e a

existência da prole.172

Por mais que não haja um prazo estabelecido pelo novo

diploma, existe um prazo implícito com certeza para a verificação de cada caso

concreto. Como pode haver um relacionamento baseado no afeto, ser público,

duradouro e contínuo se não for prolongado? Tem que haver algum tempo

necessário para que se indique que naquele caso estamos diante de uma entidade

familiar. Isso na opinião de Zeno Veloso173.

No que tange ao requisito de continuidade, este diz respeito a

mais uma exigência imposta pelo artigo 1.723 do CC/2002.

Uma vez que o casamento é um vínculo conjugal formalmente

documentado, a união estável por sua vez é um fato jurídico, um comportamento ou

ainda, uma conduta. Sua solidez é demonstrada pelo seu caráter contínuo no

relacionamento, ou seja, na continuidade da relação do casal.174

Paulo Nader175 faz uma importante consideração sobre o tema:

A continuidade da convivência não significa que a união não comporte separação de fato transitória ou passageira, ocorrência que não chega a ser incomum na vida de pessoas casadas. Ocorrendo a separação de fato, o caso deve ser avaliado em sua singularidade. Se a separação efetivou-se, já caracterizada a união estável, o fato não será descaracterizador, apenas motivo para a dissolução da entidade familiar.

Nesse contexto, Euclides de Oliveira176 afirma que todavia:

Se o rompimento for sério, perdurando por tempo que denote efetiva quebra de vida em comum, então se estará rompendo o elo próprio de uma união estável. Se já havia tempo suficiente para sua caracterização, a quebra da convivência será causa da dissolução, à semelhança do que se dá no casamento. Se não havia tempo

172 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.595. 173 VELOSO, Zeno, in, GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família.

p.595. 174 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.596. 175 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.503. 176 OLIVEIRA, Euclides de, in, GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de

família. p.596-597.

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bastante, que se pudesse qualificar como “duradouro”, então sequer estaria configurada a união estável, ficando na pendência de uma eventual reconciliação, com recontagem do tempo a partir do reinício da convivência, tanto para fins de duração como para sua futura continuidade.

Analisa-se neste momento ao requisito que diz respeito à

inexistência de impedimentos matrimoniais.

O CC/2002, em seu artigo 1.723, parágrafo 1º, veda a

constituição de união estável caso ocorram os impedimentos previstos no artigo

1.521, de igual forma do CC/2002.

Dessa forma, homem e mulher se sujeitam aos impedimentos

contidos no artigo 1.521 do Código Civil.177

Uma ressalva importante é que se a pessoa encontrar-se

separada de fato, extrajudicial ou judicialmente, não se aplicará o artigo 1.521 inciso

VI.178

Maria Helena Diniz179 faz referencia ao assunto dizendo que “

as causas suspensivas do artigo 1.523 do CC/2002 não impedirão a caracterização

da união estável” (CC/2002, art.1.723, parágrafo 2º).

Por último basta analisar o requisito faltante que é o da relação

monogâmica. Esta por sua vez objetiva um vínculo único entre os companheiros em

face ao caráter monogâmico da relação. Significa dizer que o companheiro não

poderá ter fora da relação outra união estável. Assim como também não se admite

de forma alguma, que pessoa casada venha constituir uma união estável fora de seu

casamento. Nada a impede disso se for separada.180

Como finalização, entende-se que a união estável gira em

torno de alguns deveres recíprocos entre os companheiros tais como lealdade,

177 NADER, Paulo. Curso de Direito civil : direito de família. p.502. 178 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : direito de família. p.383. 179 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito civil brasileiro : direito de família. p.383. 180 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.598.

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respeito, assistência, e guarda, sustento e educação dos filhos, estes previstos pelo

CC/2002 em seu artigo 1.724.

O companheiro uma vez dentro de uma relação de união

estável, deve agir com lealdade, correspondendo dessa forma à confiança do

outro.181

Relativo ao respeito, este objetiva considerar a individualidade

do outro, respeitando e aceitando dessa forma as suas limitações. Há uma

intercomunicação entre o dever de respeitar o companheiro com o dever de ser leal

ao mesmo, uma vez que o companheiro que para o seu parceiro dirige insinuações

ou ofensas está praticando o ato de ser desleal para com o outro, da mesma

desrespeitando-o.182

O dever de assistência existe justamente para fazer cumprir-se

a obrigação de auxílio recíproco. Dessa forma possuem os companheiros o dever de

mútua assistência tanto num plano espiritual como num plano material. Esse plano

material inclui por exemplo o provimento das necessidades do lar. Já no que tange

ao plano espiritual, este diz respeito a uma contribuição mútua que deve existir entre

os companheiros para que estes vivam bem com sua moral e espírito, assim

concretizando-se a assistência moral e espiritual.183

Mais ainda, uma vez que a assistência desse plano imaterial

implica na solidariedade que deve haver entre os companheiros em todos os

momentos da vida, a assistência material implica na questão de dar assistência ao

companheiro no âmbito patrimonial e ainda das obrigações alimentares.184

Paulo Nader185 faz uma importante referência a essa questão

da assistência dizendo que “claro está que o grau de assistência ao necessitado

depende das possibilidades do consorte. Pode-se afirmar que prevalece, aqui, o

mesmo binômio que orienta a prestação alimentar: necessidade- possibilidade”.

181 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.505. 182 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.506. 183 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.601-602. 184 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.602. 185 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p. 506.

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Guarda, sustento e educação dos filhos entram como outros

deveres dos pais, porém estes para com os filhos.

A questão da guarda dos filhos é assim como dever, direito

também dos pais. Uma vez que houver a separação, entende-se que a guarda será

dada àquele que melhor detiver condições para exercê-la, em consonância com o

artigo 1.584 do CC/2002.186

Há a obrigação de sustentar os filhos menores, assim como

dar-lhes orientação moral e educacional, mesmo ocorrendo a ruptura da união

estável. Importante observar que a obrigação de sustento dos filhos menores

decorre do poder familiar, e este independe de casamento dos pais e da

subsistência da união conjugal ou estável.187

A questão do fornecimento de educação para os filhos não

inclui somente aquele referente ao ensino escolar, mas como também o cuidado e

zelo para que eles crescem e desenvolvam-se em um ambiente sadio, tendo dessa

forma formação cultural e moral digna.188

Nesse sentido afirma Liane Maria Busnello Thomé189:

O poder familiar hoje é visto como um dever dos pais em relação aos filhos menores de idade, e esse dever não é limitado à educação e cuidados físicos, mas se estende para proporcionar maior poder de decisão dos filhos sobre seus atos, considerando seu melhor interesse, sua idade e capacidade de entendimento, desenvolvendo um ser humano mais inteiro, independente e responsável por suas atitudes.

Vê-se assim, que o direcionamento que os pais devem dar

para seus filhos não dizem respeito apenas à uma orientação “financeira”, pagando-

lhes pelo sustento da vida. Dizem respeito sim, a muito mais do que isso, como por

exemplo uma orientação moral e educacional para os atos da vida, fazendo que este

ser humano se desenvolva e torne-se um dia responsável por suas atitudes.

186 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.602. 187 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.602. 188 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.602. 189 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e mediação familiar . p.19.

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1.4.4 Família Monoparental

A família Monoparental recebeu tutela explícita da CRFB/88.

Em seu art.226, parágrafo 4º, a CRFB/88 190 define que:

Art.226

A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

[...]

4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

Assim, define-se esta entidade familiar como aquela que é

integrada por apenas um dos pais e seus filhos menores.191

Sobre o tema, Maria Berenice Dias 192 observa que: “tais

entidades familiares receberam em sede doutrinária o nome de família

monoparental, como forma de ressaltar a presença de somente um dos pais na

titularidade do vínculo familiar.”

Essa família, diferentemente do que ocorre com o casamento e

a união estável, não é revestida de estatuto jurídico próprio, com direitos e deveres

específicos. As regras que são aplicadas a essa entidade familiar é, enquanto

composta por apenas um dos pais e seus filhos, são as atinentes às relações de

parentesco, principalmente da filiação e do exercício do poder familiar, que neste

ponto são as mesmas as outras entidades familiares.193

Cai sobre essa entidade familiar, sem qualquer tipo de

distinção ou discriminação, as mesmas normas de direito de família nas relações

recíprocas entre pais e filhos, aplicáveis ao casamento e à união estável,

considerando apenas o fato diferente que é a formação por apenas um dos pais.

Quando os filhos atingem a maioridade, ou ainda, são emancipados, deixa assim de 190 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (198 8). 45.ed. São Paulo: Saraiva,

2011. 191 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.66. 192 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.44. 193 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.67.

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existir o poder familiar, reduzindo-se assim a entidade monoparental apenas às

relações de parentesco, inclusive quanto ao direito aos alimentos, em caso de

conflito.194

Buscou-se através do 1º capítulo averiguar quais

transformações ocorreram com o instituto familiar para assim chegar na família dos

tempos atuais. Neste estudo, restou-se claro que a família contemporânea está

fundada sob novas bases, sendo o seu principal elemento o amor familiar existente

entre seus entes.

Compreende-se de tal modo que, a afetividade, a liberdade e,

ainda, a igualdade são os fundamentos da família moderna.

No que tange a família moderna, esta está constituída pelos

laços da afetividade tais quais representam significante valor no âmbito familiar.

Sabe-se ainda que, o afeto não provém da biologia, mas sim, de um laço, um elo,

criado entre um ser humano e outro, sejam eles homem e mulher, ou ainda, ambos

do mesmo sexo. Assim este princípio, da afetividade, ocupou seu espaço no âmbito

do direito de família, fazendo valer seus fundamentos, e predominantemente

observado ele é quando o assunto é família.

No que tange a igualdade, garantida está se encontra como

direito fundamental, objetivando a CRFB/88, em seu artigo 3º, inciso IV, a promoção

do bem estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade ou

quaisquer outras formas de discriminação. Portanto, a igualdade entre as pessoas

no tocante a elas mesmas ou inerentes a assuntos familiares, deve ser respeitada.

Respeitar as diferenças um dos outros é respeitar acima de tudo a si mesmo. Assim,

diferentes famílias existem e sempre irão existir, o que importa é que, estas sejam

formadas acima de tudo por amor, afeto, carinho, respeito, solidariedade,

reciprocidade, sendo tais características relevantes quanto ao assunto.

Já a liberdade vem disposta no artigo 3º, inciso I da CRFB/88,

sendo dito que a constituição de uma sociedade livre justa e solidária é um dos

objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil.

194 LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p.67.

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Tem-se assim a liberdade, como bem mais precioso que o ser

humano pode ter, não sendo justo extinguir isso do mesmo. Um tratamento justo e

livre, é dar ao ser humano o direito de fazer suas próprias escolhas, sendo elas

inerentes a opção sexual, ao modo de vida vivido, ou até mesmo ao tipo de

felicidade que se busca. Cada qual à sua maneira é livre para ser feliz como bem

deseja ou como lhe convém.

Ressalta-se ainda, que ambos os direitos, tanto de liberdade

como de igualdade, vem da mesma forma previstos pelo artigo 5º da CRFB/88

preceituando que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer

natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a

inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à

propriedade [...]”195.

Basta portanto que cumpra-se os direitos das pessoas, fazendo

com que o ser humano possa se valer de tais princípios constitucionais, assim sendo

respeitada, acima de tudo, a dignidade da pessoa humana.

Assim como estudou-se sobre as considerações da família de

um modo geral neste capítulo 1º, passa-se no 2º capítulo ao estudo do instituto da

adoção, para assim mais tarde obter-se o resultado da possibilidade jurídica ou não

da adoção por casais homoafetivos no sistema jurídico brasileiro.

195 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (198 8). 45.ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

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CAPÍTULO 2

DA ADOÇÃO

O segundo capítulo objetiva a verificação do instituto “adoção”,

buscando dessa forma sua finalidade, seus aspectos legais, requisitos e, ainda, suas

modalidades. Pretende-se com isso entender mais sobre tal instituto, para assim,

mais tarde, verificar a possibilidade da adoção por casais homoafetivos.

2.1 CONCEITO E FINALIDADE

Primeiramente tratar-se-á de uma visão histórica, levando em

consideração todos os aspectos da adoção até o momento, e algumas das

evoluções que este instituto passou até então.

Em se tratando de sua origem, Silvio Rodrigues196 afirma que

tal instituto certamente surgiu para assegurar a continuação da família, referente às

pessoas sem filhos. Numa mesma linha de pensamento, Fustel de Coulanges197 diz

que “no direito romano, a adoção era amplamente utilizada para promover a falta de

filhos e para perpetuar o culto dos deuses familiares”.

Em relação a esta última afirmação, trata-se daquelas famílias

que se extinguem, não tendo posteriormente quem as lembre, ou ainda, significa

dizer que essas famílias, não tendo mais quem cultue sua memória e a de seus

maiores, buscam através da adoção suprir essa necessidade de ter um filho.

Assim era antigamente, a religião obrigava o homem a casar e

ter filhos, para que estes pudessem mais tarde cultuar a memória dos antepassados

comuns. Essa mesma religião, veio por meio da adoção, oferecer um último recurso

196 RODRIGUES, Silvio. Direito civil : direito de família. p. 335. 197 COULANGES, Fustel, in, LOBO, Paulo. Direito civil : famílias. p. 253.

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para estas famílias sem filhos, para assim essas evitarem a desgraça pela morte

sem descendentes.198

Não há nenhum outro instituto jurídico que supera o conteúdo

social e humanitário da adoção, uma vez que o mesmo, além de uma relação

jurídica, constitui mais, abrangendo um elo de afetividade, visando substituir o elo

geneticamente designado pela natureza.199

Referente ao instituto da adoção, Maria Berenice Dias200

pondera:

O Código Civil de 1916 chamava de simples a adoção tanto de maiores como de menores. Só podia adotar quem não tivesse filhos. A adoção era levada a efeito por escritura pública, e o vínculo de parentesco limitava-se ao adotante e ao adotado.

Com a Lei 4.655/1965, houve a admissão de mais uma

modalidade de adoção, a então chamada, legitimidade adotiva. Esta, dependia de

decisão judicial, era irrevogável, e fazia cessar o vínculo de parentesco com a

família natural.201

Sobre o tema, esclarece Aimbere Francisco Torres202:

A nova modalidade de adoção (legitimação adotiva) somente era permitida a quem fosse realmente casado e dependia de decisão judicial; era irrevogável e fazia cessar o vínculo de parentesco com a família natural, com exceção dos impedimentos matrimoniais.

Ocorre, que o Código de Menores (Lei 6.697/79), revogou

expressamente a Lei 4.655, estabelecendo duas espécies de adoção: a simples,

prevista nos arts. 27º e 28º, e a plena, contida nos arts. 29º a 37º. A adoção simples

se destinava a menor em situação irregular (artigo 2º); e aos maiores de idade se

efetivava a adoção pela Lei Civil, com as modificações instituídas pelo Código de

Menores. Já referente a adoção plena, a mesma atribuía a situação de filho ao

198 COULANGES, Fustel, in, RODRIGUES, Silvio. Direito civil : direito de família. p. 336. 199 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.317. 200 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.384. 201 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.384. 202TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.106

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adotado, desligando-se o mesmo de qualquer laço com os pais ou parentes

biológicos, conforme previsto no artigo 29º do Código de menores, estendendo o

vínculo de parentesco à família dos adotantes, de tal sorte que o nome dos

ascendentes passou a constar no registro de nascimento do adotado, independente

isso, do consentimento expresso dos avós.203

Da mesma forma, muito válido é o esclarecimento de Caio

Mário da Silva Pereira204, enfocando que além da adoção pelo Código Civil,

sucederam no ordenamento jurídico nacional duas modalidades de adoção quando

era da vigência do Código de Menores, assim sendo elas, a “simples”, prevista no

art. 27º, relativa esta ao menor em situação irregular, a qual dependia de autorização

judicial, e a adoção “plena”, regulada pelo mesmo Código, nos seus artigos 29º a 37º

e 107º a 109º.

Vale também o esclarecimento de Silvio Rodrigues205 sobre o

tema em questão:

[...] as adoções eram diversas e na realidade o eram. A adoção simples, disciplinada pelo Código Civil, criava um parentesco civil entre adotante, parentesco que se circunscrevia a essas duas pessoas, não se apagando jamais os indícios de como esse parentesco se constituirá. Ela era revogável pela vontade concordante das partes e não extinguia os direitos e deveres resultantes do parentesco natural. A adoção plena, ao contrário, apagava todos os sinais de parentesco natural do adotado, que entrava na família do adotante como se fosse filho de sangue. Seu assento de nascimento era alterado, os nomes dos genitores e avós paternos substituídos, de modo que, para o mundo, aquele parentesco passa a ser o único existente.

Tânia da Silva Pereira206 explica sobre o tema indicando que “o

Código de Menores (L. 6.697/1979) substituiu a legitimação adotiva pela adoção

plena, mas manteve o mesmo espírito”.

Dessa forma, a adoção plena passou a ser interpretada como

sendo uma versão “moderna” da legitimação adotiva, sendo certo que a adoção civil 203 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.106 204 PEREIRA, Caio Mário da silva. Instituições de direito civil : direito de família. 14.ed. Rio de

Janeiro: Forense, 2004. p.391. 205 RODRIGUES, Silvio. Direito civil : direito de família. p.338. 206 PEREIRA, Tania da Silva, in, DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p. 384.

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ou comum, tratada no início deste subtítulo, era prevista no CC/1916, como sendo a

adoção tradicional.207

Vale ainda lembrar, que a CRFB/88, mais especificamente em

seu artigo 227º, parágrafo 6º, estabeleceu um novo arquétipo para a adoção, sendo

proibido qualquer forma ou tipo de discriminação relativas à filiação, ou seja,

vedaram-se distinções entre os filhos, sendo estes, legítimos ou ilegítimos, naturais

ou adotivos. Todos passaram a ter os mesmos direitos. Dessa forma, o que

prevaleceu foi o princípio da igualdade, o qual faz parte do direito de família,

introduzido pela norma constitucional de 1988, impondo dessa forma, uma completa

e absoluta igualdade jurídica no tratamento a ser dado aos filhos sejam eles

biológicos ou adotivos.208

No dia 13 de julho de 1990, surge no cenário jurídico o Estatuto

da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), conhecido como ECA.209

Com a entrada em vigor do ECA, um novo regulamento se deu

para a adoção no país.210

Por hora, importante ressaltar, que o Código Civil vigente,

instituiu o sistema de adoção plena, mantendo a orientação do ECA.211

No que tange a atual disciplina da adoção, esta é regida pela

Lei n.12.010/2009. De apenas sete artigos, a Lei introduziu diversas alterações no

ECA, revogou expressamente dez artigos do Código Civil referentes à adoção,

sendo eles do 1.620 ao 1.629, e deu uma nova redação a outros dois artigos, que

são o 1.618 e o 1.619. Assim também conferiu nova redação ao artigo 1.732 do CC,

entre outras mudanças.212

207 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoperentais . p.106 208 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.107 209 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.107. 210 PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições do direito civil : direito de família. p.392. 211 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.108. 212 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.368.

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As mudanças trazidas pela nova Lei de Adoção com as

adequações no ECA, sem dúvida objetivam agilizar a adoção de menores e também

possibilitar a rapidez no retorno das crianças que se encontram no programa de

acolhimento familiar ou institucional.213

Em busca de uma conceituação para instituto da adoção, boa

parte dos autores procuram enfatizar a criação de um vínculo especial de

parentesco, chamando-o de parentesco civil, para dessa forma, diferi-lo, do natural.

Mais ainda, outros definem como sendo um ato jurídico entre pessoas que cria

relações fictícias e puramente civis de paternidade e filiação entre as mesmas.214

Buscando da mesma forma uma definição para o instituto,

Maria Berenice Dias215 nos traz o seguinte conceito: “a adoção é um ato jurídico em

sentido estrito, cuja eficácia está condicionada à chancela judicial”.

Maria Berenice Dias216 ainda afirma que este ato jurídico “cria

um vínculo fictício de paternidade-maternidade-filiação entre pessoas estranhas,

análogo ao que resulta da filiação biológica”.

Não importando tanto aqui apenas um conceito, importante é

saber que, a adoção é uma realidade da sociedade, sendo essa um ato jurídico que

estabelece vínculo de filiação.

O que causa vontade em uma determinada pessoa de adotar

uma criança ou adolescente, não necessariamente será a mesma causa de vontade

da outra. Embora sejam as causas diferentes, não se pode dessa forma distinguir ou

até mesmo quantificar os laços de afeto formados entre filhos criados por aqueles

que o adotaram e entre filhos criados pelos pais de sangue. 217

213 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.369. 214 SILVA FILHO, Artur Marques da. Adoção. 2. ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2009. p.71. 215 DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.385. 216 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias . p.385. 217 SILVA FILHO, Artur Marques da. Adoção . p.73

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Fazendo-se uma análise do ECA referente à adoção, observa-

se que esta deve fundar-se em motivos legítimos e apresentar uma real vantagem

ao adotando, conforme estipula o artigo 43 do Estatuto.

Assim como também estipula o artigo 29 do ECA que, “não se

deferirá colocação em família substituta a pessoa que revele, por qualquer modo,

incompatibilidade com a natureza da medida ou não ofereça ambiente familiar

adequado”218.

Importante assim se faz a análise da família que será a

substituta, averiguando sua real condição de vida e que tipo de ambiente familiar

tem a mesma a proporcionar para o adotado.

De suma importância é que a adoção busca não apenas suprir

a necessidade e vontade do casal em poder criar um filho, e nem somente a da

criança em poder crescer em uma família substituta, ela é mais do que isso, pois

visa resolver um problema social encarado pela sociedade no dia a dia. Dessa

forma, a adoção não busca apenas atender interesses particulares, mas também os

da coletividade.219

A adoção é revestida de algumas características.

Primeiramente é ato negocial indivisível, ou seja, existe a impossibilidade de adotar

alguém apenas para determinados fins. Uma vez que há o parentesco civil, este irá

produzir inteiramente os efeitos previstos no ordenamento.220

A adoção é também irrevogável. Significa que sendo atendidos

todos os requisitos legais e o pedido de adoção sendo autorizado pelo juiz, a filiação

civil que se cria se torna imutável. O arrependimento que possa vir posteriormente

não é capaz de dissolver o vínculo formado. No que tange a este assunto, vale

lembrar que o CC/1916, em seus artigos 373 e 374, previa a dissolução do vínculo,

porém, isso na atual legislação não é mais possível.221

218 Estatuto da Criança e do Adolescente : Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Atual com a Lei

Nacional de Adoção (Lei 12.010, de 03.08.2009). São Paulo: Revista dos Tribunais,2009. 219 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.317. 220 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.322. 221 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.322.

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Possui também como outra característica, validade erga

omnes. Seus efeitos jurídicos não ficam restritos aos pais e filhos, mas como

também atingem a todos os parentes dos adotantes, como também aos órgãos

públicos, ao fisco e a previdência.222

Entende-se, após a análise do conceito e finalidade do instituto

da adoção que este reveste-se de uma certa formalidade do início até o final. Busca

ele não somente suprir uma carência afetiva dos pais em não poder ter filhos, ou

diferentemente disso, através da adoção obter a chance de ser pai novamente, por

um novo meio, mas sim sua principal busca é no melhor interesse para a criança e o

adolescente. As reais condições de vida que a criança irá ter após ser adotada é

assunto completamente relevante para o instituto, uma vez que são essas que

importam para boa criação e desenvolvimento da criança.

Além disso, não se pode esquecer que cada ato de adoção

resulta em um problema social resolvido . Há milhares de crianças querendo e

precisando ser adotadas, não se podendo fechar os olhos para essa realidade.

Acaba que torna-se uma preocupação social o rumo que essas situações irão tomar

até para um melhor desenvolvimento do país, diga-se de passagem.

Necessário torna-se a partir de agora a compreensão dos

requisitos para adoção, para que com isso haja um melhor entendimento do instituto.

2.2 REQUISITOS

Tratar-se-á a partir de agora dos requisitos pessoais que

devem estar presentes na pessoa do adotante.

De uma maneira geral tais requisitos dizem respeito a uma

idade mínima para poder adotar, uma diferença de idade entre adotante e adotado,

bem como algumas proibições e certas limitações.

Importante se ressaltar que nesta análise deve-se evitar

qualquer tipo de discriminação a respeito do estado civil do adotante, estando a

222 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.322.

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adoção ao alcance de pessoa solteira, casada, viúva, em união estável, separada ou

ainda divorciada.

Primeiramente, conforme Paulo Nader223 “o requisito

fundamental para a efetivação da adoptio é que ofereça as condições necessárias

ao pleno desenvolvimento, material e moral, do filho.”

Trata-se dessa forma de um valor-guia da adoção associado à

filosofia do “melhor interesse para a criança”, sendo avaliadas as reais condições de

vida do adotante como, suas condições econômicas, ser este uma pessoa (as) de

boa índole, capaz de fornecer para o adotado um lar bem estruturado, para que

assim a criança possa crescer diante de um convívio com equilíbrio emocional, bem

como uma vida saudável. A confirmação dessas vantagens em potencial para o

adotado devem ser feitas por meio de análise de uma equipe interprofissional,

formada por psicólogos, psicanalistas, pedagogos e assistentes sociais.224

Sobre os requisitos necessários para que a adoção se

concretize, faz-se uma introdução apontada por Sávio Bittencourt225 dizendo:

Podem adotar os maiores de 18 anos, casados ou solteiros, sendo necessária uma diferença de dezesseis anos entre adotante e adotado. Para a adoção em conjunto por duas pessoas é necessário que estas estejam casadas ou vivam em união estável. Caso o estágio de convivência da criança com o casal tenha se dado durante a constância do casamento ou união estável é permitida a adoção por estes adultos, ainda que separados ou divorciados, sendo neste caso obrigatória a regulação prévia de visitas e alimentos. Não se permite a adoção de descendentes, como avôs biológicos da criança, por exemplo, nem irmãos.

O primeiro requisito portanto é o da capacidade. A pessoa do

adotante deve ser plenamente capaz, tendo essa no mínimo a idade de dezoito

anos, conforme estipula o caput do artigo 42 do ECA.226

223 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.326. 224 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.326. 225 BITTENCOURT, Sávio. A nova lei de adoção : do abandono à garantia do direito à convivência

familiar e comunitária. p.126. 226 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p. 327.

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Sobre o requisito, Carlos Roberto Gonçalves227 ainda completa

falando sobre a nova redação trazida pela Lei n.12.010/2009: “podem adotar os

maiores de 18 (dezoito) anos, independentemente do estado civil”.

O estado civil, o sexo, nem tão pouco a nacionalidade influem

na capacidade da pessoa na hora de adotar. Porém o que se torna indispensável é o

que o adotante tenha condições morais e materiais para desempenhar sua função

de pai, promovendo à criança um bom ambiente familiar.228

Aponta-se a diferença de idade que deve haver entre adotante

e adotado como outro requisito necessário. Pelo artigo 1.619 do CC/2002 o adotante

deve ser pelo menos dezesseis anos mais velho que o adotando. Necessário se faz

este requisito para que o adotante possa cumprir bem seu papel de pai, podendo

desempenhar corretamente o exercício do poder familiar. Caso o adotante seja um

casal, somente se faz necessário que um dos cônjuges ou conviventes tenha esses

dezesseis anos a mais que o adotando.229 Ainda mais, essa diferença de idade se

traduz na importância de ter o adotante uma experiência de vida maior que o

adotando, para que assim possa lhe ensinar sobre a vida, orientando-o conforme

necessário.230

Na busca de proteção para a figura do adotando, e com o

intuito também de evitar fraudes, o ECA estabelece certas restrições para adotar.231

Estabelece por exemplo em seu artigo 42, parágrafo 1º a

proibição de adoção por ascendentes ou irmãos do adotando. No entanto, tal

impedimento não vem estipulado pelo Código Civil. No que tange aos descendentes,

destes nada é relatado uma vez que não haveria a possibilidade pelo simples fato da

diferença de idade.232

227 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.371. 228 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.371. 229 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : direito de família. p.526. 230 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.328. 231 SILVA FILHO, Artur da. Adoção . p.89. 232 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.329.

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No que tange à proibição dos ascendentes e irmãos, a

justificativa encontra-se no fato de já haver um vínculo natural de parentesco.233 Não

pode ser concebível que um indivíduo possa ser ao mesmo tempo avô biológico e

pai adotivo, ou ainda, irmão biológico e pai adotivo, haveria uma confusão em

relação ao parentesco. Importante é voltar-se para a questão que nem os avós nem

os irmãos necessitam abdicar de sua relação com o adotando, uma vez que podem

de igual forma desenvolver vínculos afetivos e prestar assistência para com seu

parente consanguíneo.234

Porém importante ressaltar a situação de não haver

impedimento na adoção pelos tios do adotando. Assim, não há impedimento legal,

ou até mesmo na própria natureza da adoção impedindo a adoção entre tios e

sobrinhos.235

Da mesma forma o ECA, em seu artigo 39, parágrafo 2º, proíbe

expressamente a adoção por procuração. Com essa proibição, há uma exigência do

estatuto para que o interessado se apresente perante o juiz. A adoção deve ser vista

como um ato pessoal, fazendo-se absolutamente necessário o contato da pessoa

interessada, ou pessoas, com o magistrado e seus auxiliares. Trata-se de um

elemento fundamental essa presença que deve haver por parte do adotante em

juízo.236

Ainda como impedimento, há o previsto pelo artigo 44 do ECA.

Este estabelece uma proibição temporária para o adotante tutor ou curador. Ou seja,

a proibição é enquanto o mesmo não prestar contas de sua administração e as tiver

aprovadas, não pode adotar o pupilo ou curatelado.237

Dessa forma a Lei não impede a adoção por parte do tutor ou

curador, ela apenas faz a exigência de uma prévia prestação de contas e o

pagamento de eventual débito. A justificativa dessa proibição reside no fato de se

233 SILVA FILHO, Artur da. Adoção . p.96 234 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.329-330. 235 LOBO, Paulo, in, GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.375. 236 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil : direito de família. p.288. 237 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil : direito de família. p.291.

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pretender evitar qualquer lesão que possa vir a ocorrer aos direitos patrimoniais dos

menores ou interditados.238

Nessa mesma linha de pensamento, Silvo de Salvo Venosa239

se manifesta dizendo “a proibição, de origem histórica muito antiga, é intuitiva: visa

impedir que, com a adoção, o administrador de bens alheios se locuplete

indevidamente”.

Após breve estudo sobre os requisitos necessários que a

pessoa deve preencher para concorrer à adoção, de vasta sabedoria é o

ensinamento de Enézio de Deus Silva Júnior240 pronunciando-se sobre aquele que é

o requisito mais relevante:

O requisito mais relevante é que a colocação, em família substituta, somente seja deferida, havendo reais vantagens para o adotando e que seja fundada em motivos legítimos. A verificação, por parte do(a) juiz(a), torna-se destarte, deveras subjetiva, ficando, ao seu livre convencimento, estabelecer o que é melhor para as partes. Dos arts. 39 a 52 do ECA (com todas as modificações determinadas pela Lei 12.010/09), entre as exigências legais que de alguns deles se depreendem, a constante no art. 43, com efeito, é a mais relevante: “a adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos”. Em direção semelhante, o art. 1.625 do Código Civil prevê que “somente será admitida a adoção que constituir efetivo benefício para o adotando”.

Esse apontamento supracitado, ressalta aquela questão já

mencionada sobre o valor-guia da adoção, devendo esta buscar o melhor interesse

para a criança. Tal análise deverá ser feita por uma equipe de profissionais,

buscando as reais condições em que os pretendentes vivem e que tipo de vida os

mesmos irão oferecer para o menor.

2.3 MODALIDADES DA ADOÇÃO

Observa-se a partir desse momento algumas das modalidades

de adoção. Importante ressaltar que além das que serão foco do estudo, existem

238 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.330. 239 VENOSA, Silvo de Salvo. Direito civil : direito de família. p.291. 240 SILVA JUNIOR, Enézio de Deus. A possibilidade jurídica de adoção por casais

homossexuais . 4. ed. Curitiba: Juruá, 2010. p.114.

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ainda a adoção póstuma, adoção internacional e adoção tardia, como sendo

modalidades também.

2.3.1 Adoção intuitu personae

Nesta modalidade de adoção, há entre os pais do adotando e

os adotantes um prévio acordo, estipulando que estes adotem a criança.241

Precisarão cumprir os mesmos requisitos objetivos da adoção,

impostos pela Lei, os interessados a adotar alguém por esta forma, pois não poderia

ser concedido de forma alguma o direito de adotar à alguém que não cumpre os

requisitos legais. Cada caso é um caso e deve ser analisado de acordo com as suas

características, pois muitas vezes a genitora escolhe uma boa família a quem se

destinará o filho.242

Essa modalidade de adoção não pode ser considerada por si

só um instituto falho ou ruim. Ocorre que, diferente do que ocorre na adoção regular

esta modalidade traz um elemento que tanto pode ser benéfico como maléfico para

a nova situação de vida da criança ou adolescente bem como para a vida dos

adotantes. Essa situação justamente é que a família natural irá conhecer a nova

família da criança, muitas vezes podendo saber onde a mesma vive, como está

vivendo, fato este que poderia acarretar problemas para os pais biológicos haja vista

que pode haver uma certa dificuldade no desligamento dos mesmos com a criança.

Pode até mais tarde surgir a vontade de ver a criança e até mesmo apresentar-se.

Não estariam os pais impossibilitados de cometer tal feito pois os mesmos saberiam

onde a criança mora.243

Sobre essa modalidade ainda, essa difere-se da adoção à

brasileira pois existe nesse caso a intervenção do Estado, que analisará se a família

que tem a pretensão de adotar possui mesmo as condições necessárias de fornecer

para o adotando seu pleno desenvolvimento. Importante ainda sobre a modalidade

aqui estudada é que esta dispensa o prévio cadastro, o que não dispensa a

241 SILVA FILHO, Artur Marques da. Adoção . p.137. 242 SILVA FILHO, Artur Marques da. Adoção . p.137-138. 243 SILVA FILHO, Artur Marques da. Adoção . p.138.

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avaliação por equipe interprofissional. Com certeza é levada em questão o que é da

vontade dos pais biológicos, que serão ouvidos perante o Promotor de Justiça e irá

consentir ou não a respeito da adoção. Finalizando, neste caso não é uma

destituição do poder familiar mas sim há a extinção deste poder.244

2.3.2 Adoção “à brasileira”

A adoção à brasileira é também conhecida como adoção direta.

É aquela em que um casal registra como seu, um filho de outrem. Caso ocorrendo

esse tipo de adoção, importante relatar que os pais supostamente “adotivos” podem

ser penalmente responsabilizados, uma vez que o Código Penal em seu artigo 242

prevê tal ato como crime.245

A diferença entre a adoção intuitu personae, estudada

anteriormente, a adoção à brasileira, está justamente no fato de naquela ocorrer

uma verdadeira adoção legal, uma vez que neste caso ocorre um crime.246

Porém, importante se faz mencionar que na maioria dos casos

que chegam à justiça tratando dessa modalidade de adoção, acaba ocorrendo o

perdão judicial, isso pelo fato de ser encarado como um ato de piedade.247

Nesse sentido afirma Carlos Roberto Gonçalves248 que

“embora tal fato constitua, em tese, uma das modalidades do crime de falsidade

ideológica, na esfera criminal tais casais eram absolvidos pela inexistência de dolo

específico”.

2.4 EFEITOS PESSOAIS E PATRIMONIAIS

No momento em que a adoção se efetiva, a mesma passa a

produzir seus efeitos jurídicos.

244 SILVA FILHO, Artur Marques da. Adoção . p.138-139. 245 SILVA FILHO, Artur Marques da. Adoção . p.139. 246 SILVA FILHO, Artur Marques da. Adoção . p.140. 247 SILVA FILHO, Artur Marques da. Adoção . p.142. 248 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.367.

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Sobre o tema ensina Carlos Roberto Gonçalves249 que:

Os principais efeitos da adoção podem ser de ordem pessoal e patrimonial. Os de ordem pessoal dizem respeito ao parentesco, ao poder familiar e ao nome; os de ordem patrimonial concernem aos alimentos e ao direito sucessório.

Para uma melhor compreensão dos efeitos trazidos pelo

instituto da adoção passa-se agora a uma análise destes, primeiramente os de

ordem pessoal e posteriormente os de ordem patrimonial.

2.4.1 Efeitos de Ordem Pessoal

Levando-se em conta os efeitos pessoais, afirma Paulo

Nader250 que “o efeito básico da adoção é o vínculo de filiação que se instaura entre

adotante e adotado”.

Primeiramente então analisa-se o rompimento automático que

há do vínculo de parentesco com a família de origem, ressalvados os impedimentos

matrimoniais constantes no vigente CC/2002 em seu artigo 1.626, de uma forma que

os pais de natureza não irão mais poder exigir qualquer notícia da criança ou do

adolescente, nem mesmo quando este tornar-se maior de idade. Dessa forma, os

vínculos de filiação existentes antes da adoção cessam com a inscrição da mesma

no Registro Civil. Importante ainda ressaltar que nem mesmo no caso de morte do

adotante poderá ser restabelecido o poder familiar dos pais biológicos perante a

criança ou adolescente.251

Assim, cortam-se definitivamente os laços do adotado com sua

família biológica e criam-se novos laços de parentesco civil entre adotado e família

adotante.

249 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.386. 250 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p. 336 251 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : direito de família. p.532.

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Consequentemente, o efeito básico da adoção é o

estabelecimento de verdadeiros laços de parentesco civil entre adotado e adotante. 252

Esse é portanto o principal efeito da adoção, a promoção de

uma completa integração da criança adotada com a sua família nova, na qual é

recebida na total condição de filho, sendo-lhe assegurados os mesmos direitos e

deveres dos filhos consanguíneos, incluindo os sucessórios. Dessa forma a criança

desliga-se completamente e irrevogavelmente da família de sangue, salvo para fins

de impedimentos para o casamento.253

Ensina Silvio de Salvo Venosa254 que “a adoção estatutária

pressupõe perfeita integração do adotado em sua nova família, com ruptura de seus

vínculos biológicos com os pais e parentes naturais”.

Ademais, a este respeito, oportuna a citação do art. 41 do Eca

que prevê que “a adoção atribui a condição de filho ao adotando, com os mesmos

direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais

e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais”255.

Analisa-se agora o efeito de poder familiar que o pai adotivo

exerce sobre a criança adotada.

Há uma equiparação entre o filho adotivo para com o filho

consanguíneo com a adoção. Isso inclui a uma equiparação em todos os sentidos,

ficando este filho adotivo sujeito ao poder familiar que agora o adotante exerce sobre

o mesmo. Significa dizer que há uma transferência de poder familiar do pai natural

para o adotante. Portanto dessa forma, estipulado no artigo 1.635 encontra-se, que

com a adoção extingue-se o poder familiar dos pais biológicos.256

252 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.336. 253 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.386. 254 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil : direito de família. p.297. 255 Estatuto da Criança e do Adolescente : Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Atual com a Lei

Nacional de Adoção (Lei 12.010, de 03.08.2009). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. 256 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.336.

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Há também outro efeito da adoção, este de cunho pessoal. Diz

respeito este a questão do nome do adotando.

Sabia é a lição de Carlos Roberto Gonçalves257 sobre o tema:

No tocante ao nome, prescreve o art.47, parágrafo 5º, do ECA, com redação que lhe foi dada pela Lei n.12.010/2009: “ a sentença conferirá ao adotado o nome do adotante e, a pedido de qualquer deles, poderá determinar a modificação do prenome”. Acrescenta o parágrafo 6º: “caso a modificação de prenome seja requerida pelo adotante, é obrigatória a oitiva do adotando, observado o disposto nos parágrafos 1º e 2º do art.28 desta Lei”. Nesse caso, são observados, ainda, o estágio de desenvolvimento da criança ou adolescente e seu grau de compreensão sobre as implicações da medida, bem como seu consentimento em audiência se se tratar de maior de doze anos. O sobrenome dos pais adotantes é direito do adotando. Mas se acentua a correta finalidade da norma em apreço quando os adotantes já têm outros filhos, biológicos ou adotados. Neste caso, o sobrenome deve ser comum, para não gerar discriminação, vedada constitucionalmente.

Entende-se que, a lei busca igualdade entre o filho adotado e o

filho consanguíneo, sendo através dos efeitos da adoção isso perfeitamente

perceptível. Porém a única ressalva que há é quanto à questão dos impedimentos

matrimoniais.

Quanto a essa questão, ensina Silvio de Salvo Venosa258:

Embora a lei iguale todos os direitos do adotado e insira-o integralmente na família do adotante, ressalva os impedimentos matrimoniais. O impedimento matrimonial, por força do parentesco biológico, é irremovível na esteira de razões morais, éticas e genéticas. Nessa diapasão, os impedimentos atingem o adotado com relação a ambas as famílias, a adotante e a biológica.

Abaixo analisa-se os efeitos de ordem patrimonial os quais

dizem respeito ao direito sucessório e aos alimentos.

2.4.2 Efeitos de Ordem Patrimonial

Os efeitos de ordem patrimonial dizem respeito aos alimentos e

ao direito sucessório.259

257 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.389. 258 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil : direito de família. p.298.

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Os alimentos primeiramente são devidos reciprocamente entre

adotante e adotado, pois uma vez que há o vínculo de parentesco civil gerado pela

adoção estes se tornam parentes. Nos mesmos casos em que são devidos os

alimentos de pai biológico para filho são agora devidos de pai adotivo para filho

adotivo. Fazem jus a esses direitos os adotados quando menores, assim como da

mesma forma sendo maiores e não podendo prover o próprio sustento. Da mesma

forma corresponde a obrigação de prestarem essa assistência quando forem

capazes economicamente e necessitarem os pais.260

Da mesma forma o filho adotivo concorre, em igualdade de

condições com os filhos de sangue no que tange ao direito sucessório. Em relação

ao filho adotivo Maria Helena Diniz261 ainda completa “herdando, em concorrência

com o cônjuge sobrevivente ou convivente do falecido, na qualidade de descendente

do autor da herança (CC/2002 arts. 1.829, I, e 1.790, I e II), afastando da sucessão

todos os demais herdeiros do adotante que não tenham qualidade de filho.” (RT,

161:180; RF, 119:118)

Mais específico sobre o assunto é ainda o ECA em seu artigo

41, parágrafo 2º que preceitua: “É recíproco o direito sucessório entre adotado, seus

descendentes, o adotante, seus ascendentes, descendentes e colaterais até o 4º

grau, observada a ordem de vocação hereditária”.262

Assim como o filho adotivo concorre para efeitos de direitos

sucessórios com o filho biológico, este também pode ser deserdado. Isso ocorre

quando houver as hipóteses legais contidas no artigo 1.962 do CC/2002.263

Silvio de Salvo Venosa264 faz um breve ensinamento sobre

estes efeitos materiais:

259 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.389. 260 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.390. 261 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : direito de família. p.535-536. 262 Estatuto da Criança e do Adolescente : Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Atual. Com a Lei

nacional da adoção (Lei 12.010, de 03.08.2009). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. 263 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : Direito de família. p.390. 264 VENOSA, Silvio de. Direito civil : direito de família. p.298.

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Quanto aos efeitos materiais, considera-se que o adotado passa a ser herdeiro do adotante, sem qualquer discriminação, e o direito a alimentos também se coloca entre ambos de forma recíproca. Nesses aspectos, desvincula-se totalmente o adotado da família biológica.

Por último, sobre os efeitos advindos da adoção, estabelece

Maria Helena Diniz265:

Os efeitos pessoais e patrimoniais da adoção operam ex nunc, pois têm início com o trânsito em julgado da sentença, salvo se o adotante vier a falecer no curso do procedimento, caso em que terá força retroativa à data do óbito, produzindo efeito ex tunc (CC, art. 1.628, 1ª parte) e, consequentemente, o adotado, na qualidade de filho, será considerado seu herdeiro. Com isso, permitida está a adoção post mortem ou póstuma, desde que à época do falecimento do adotante já houvesse procedimento de adoção em andamento, requerido por ele, ao manifestar sua vontade. Será necessário, para que tal adoção não seja concedida, prova cabal de que o adotante, já falecido, não mais pretendia adotar.

Através do segundo capítulo, observou-se a real importância

do instituto da Adoção no direito de família brasileiro.

Entendeu-se que o instituto busca primeiramente a satisfação

da criança ou adolescente em um verdadeiro lar. É nelas em que se pensa em

primeiro lugar, observando-se dessa forma se a adoção almejada por determinada

pessoa traz reais benefícios à vida da criança ou adolescente. Isso significa afirmar

que, a adoção não tem como intuito principal a satisfação de indivíduos tornarem-se

pais pelas vias judiciais, mas sim, seu principal objetivo é encontrar um verdadeiro

lar para crianças e adolescentes que necessitam de um, fazendo com que estes

cresçam com dignidade em uma família, e que dessa forma não fiquem à mercê de

uma boa criação.

Além de sua finalidade e conceito trazido pelos doutrinadores

citados, estudou-se os requisitos necessários que a pessoa pretendente à adotar

deve preencher para que faça jus à possibilidade de adotar uma criança. De igual

forma observou-se algumas das modalidades da adoção existentes no sistema

jurídico brasileiro. E por último, e não menos importante, observou-se os efeitos de

265 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro : direito de família. p.537.

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ordem pessoal e de ordem patrimonial que refletem na vida das pessoas envolvidas

na relação adotiva.

Importante este breve estudo para que assim no terceiro

capítulo possa-se fazer uma análise se os homossexuais estão aptos a adotar.

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CAPÍTULO 3

DA ADOÇÃO HOMOPARENTAL

O terceiro capítulo busca averiguar a história do

homossexualismo no Brasil e como essas relações entre pessoas do mesmo sexo

se dão na atualidade.

Necessária se faz essa busca para assim, mais tarde analisar a

possibilidade jurídica de adoção por casais formados por pessoas de mesmo sexo.

Tão antiga como a heterossexualidade é a homossexualidade,

sendo essa uma forma de relacionamento presente no cotidiano. Diante de tal fato,

visível é, que o homossexual sofre um imenso preconceito perante a sociedade,

nunca sendo a homossexualidade aceita, mas sim, meramente tolerada.

Roger Raupp Rios266, reafirma essa questão dizendo: “a

discriminação contra homossexuais é uma histórica, universal, notória e

inquestionável realidade social”.

Fato visível é que a discriminação contra as relações

homoafetivas é um fruto de uma cultura que vem de geração em geração, que

estabeleceu como certas as relações heterossexuais, impondo dessa forma aos

homossexuais um tratamento desigual e uma exclusão perante a sociedade. Ainda,

suas manifestações de afeto em público sofrem constrangimentos desnecessários

que só fazem cada vez mais aumentar o preconceito. Dessa forma, os

homossexuais são vistos, em uma sociedade que elegeu como arquétipo a

heterossexualidade, como pessoas marginalizadas.267

Entendendo-se um pouco mais sobre como se dá o

homossexualismo no mundo atual, passa-se agora a uma reflexão sobre a família

266 RIOS, Roger Raupp, in, DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça.

p.29. 267 TORRES, Aimbere Franscisco. Adoção nas relações homoparentais . p.10-11.

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homoafetiva, suas considerações essenciais, bem como características e

possibilidade. Isso para mais tarde fazer-se uma ligação com a real possibilidade

jurídica de adoção por estes casais que tanto preconceito sofrem na sociedade.

3.1 FAMÍLIA HOMOAFETIVA

Não há dúvidas que as relações homossexuais sempre foram e

sempre serão um tema que gera inúmeras inquietações entre a sociedade, assim

como diversas divergências nas formas de pensamento sobre o assunto.

Para muitos, aos que toleram, o afeto entre as pessoas de

sexo igual significa a luta por sua felicidade, a valorização do que é belo, sem levar

em consideração o sexo, e ainda, a liberdade de fazer suas próprias escolhas.

Porém para conservadores, essa realidade já é vista como promiscuidade, uma

forma repugnante de ser, tornando-se assim algo devasso.268

As relações homossexuais estão condenadas à

clandestinidade por não fazerem parte do modelo convencional imposto aos seres

humanos.269 Porém incontroverso é o fato de que o conceito de família expandiu-se.

A mais clara e radical transformação dos últimos tempos vislumbra-se ao ler o artigo

226 da CRFB/88 que insere sob proteção do Estado não somente a relação advinda

do matrimônio mas também a união estável e a chamada família monoparental. 270Dessa forma não é mais exigida, para se considerar uma entidade familiar, a

presença de casal heterossexual na relação, ou ainda, também não se torna mais

exigível o objetivo de procriação.271

Resta claro que estes elementos não mais são precisos para a

concretização de uma entidade familiar.

Maria Berenice Dias272 se manifesta sobre o assunto dizendo

que “como prole ou capacidade procriativa não são mais essenciais para que o

268 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.07. 269 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. p.128. 270 LOBO, Paulo, in, DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. p.128. 271 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. p.128. 272 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. p.128.

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relacionamento de duas pessoas mereça a proteção legal, não se justifica deixar ao

desabrigo do conceito de família a convivência entre duas pessoas do mesmo sexo”.

Para Paulo Lôbo273 “a família atual parte de princípios básicos,

de conteúdo instável, segundo as circunstancias históricas, culturais e políticas,

sendo esses princípios a liberdade, a igualdade, a solidariedade e a afetividade”.

Cada ser humano busca sua realização pessoal e também

através do afeto almeja construir sua própria família. Essas escolhas da pessoa

devem ser preservadas e protegidas à luz do princípio da dignidade da pessoa

humana, pois respeitar a dignidade da pessoa humana é respeitar os seus direitos

de escolha, liberdade, seu direito de buscar através do afeto construir uma

verdadeira família, e assim torna-la igual perante as demais.

Nessa linha de pensamento Liane Maria Busnello Thomé274

afirma o seguinte:

A família que se busca e se quer promover é aquela representada pelo espaço de realização existencial da pessoa humana, um lugar de afeto, de liberdade, respeito, e de reconhecimento da dignidade de cada um de seus membros, o que significa também reconhecer que o afeto, a liberdade, o respeito, a solidariedade e a dignidade não estão presentes em todas as famílias brasileiras. No entanto, essa família, reconhecida pela Constituição Federal de 1988, oferece o caminho para o legislador e todos os envolvidos nas questões relacionadas à mesma, a busca de soluções aos conflitos familiares com base nos princípios estabelecidos pela Carta Magna.

Por derivarem do sentimento de afeto, solidariedade, respeito e

assistência mútua, as relações homossexuais devem sim ser consideradas

entidades familiares, uma vez que preenchem os requisitos observados em uma

família moderna.275

Como complemento tem-se a lição de Maria Berenice Dias276

dizendo:

273 LOBO, Paulo, in, THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e mediação

familiar . p.25. 274 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e mediação familiar . p.27. 275 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.84. 276 DIAS, Maria Berenice, in, TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais .

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Não há como fugir da analogia com as demais relações que têm o afeto por causa e, assim, reconhecer a existência de uma entidade familiar à semelhança do casamento e união estável. O óbice constitucional, estabelecendo a distinção de sexos ao definir a união estável, não impede o uso dessa forma integrativa de um fato existente e não regulamentado no sistema jurídico. A identidade sexual não serve de justificativa para que seja buscado qualquer outro ramo do direito que não o direito de famílias. Ao fazer uso dos princípios gerais do direito, o aplicador deve abeberar-se nos princípios introduzidos pela Constituição como norteadores do Estado Democrático de Direito. Assim, quer a determinação de respeito à dignidade da pessoa humana, quer a necessidade de se obedecer ao princípio da liberdade a da igualdade impõem que as uniões homoafetivas sejam inseridas no âmbito de proteção como entidade familiar. Igualmente, quando necessário se faz a invocação dos costumes para a colmatar as lacunas da lei, imperioso que se invoquem os costumes atuais, que, cada vez mais vêm respeitando e emprestando visibilidade aos relacionamentos das pessoas do mesmo sexo.

O fato é simplesmente que a família evoluiu para um estágio de

relações mais autênticas, buscando a realização pessoal de cada membro.

Dessa forma, por serem dotadas pelo mesmo amor familiar que

existe nas relações heteroafetivas, as relações homoafetivas configuram sim

verdadeiras entidades familiares, portanto merecem a mesma proteção oferecida

pelo direito de família aos casais heteroafetivos. Justificasse tal proteção merecida

às relações homossexuais pelo fato de ser o amor familiar o elemento essencial

para a configuração de uma família contemporânea.277

3.1.1 Omissão Legal

O silêncio da lei está presente sempre que a questão é as

relações homoafetivas levando em consideração que essas não possuem previsão

legal alguma. A consequência dessa omissão é a afronta que se faz aos direitos

humanos, uma vez que restringe a pessoa de sua liberdade quanto à opção sexual.

Para tanto, é preciso ter-se em mente que há outra opção de vida existente, diversa

daquela que é tida como arquétipo da sociedade, e é isso que deve ser levado em

conta. Não assegurar garantias e direitos às pessoas que vivem em uma relação

com pessoa do mesmo sexo significa infringir o princípio da igualdade inserido na

p.84.

277 VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade . p.230.

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CRFB/88. Significa dessa maneira, uma forma discriminatória de agir, 278 pois neste

caso o que se está fazendo é discriminar uma pessoa pela sua opção sexual de

vida.

Em consequência da sociedade ter estabelecido como

arquétipo a heterossexualidade os homossexuais, mesmo sendo seres humanos,

ficam sem previsão de suas relações pelo ordenamento jurídico. Assim estes não

têm o direito de se unirem como família e, por conseguinte, não possuem a

possibilidade de adotar.279

Porém mesmo não havendo previsão legal para as relações

homossexuais, basta que o ser humano enxergue a forma com que a CRFB/88

enfatizou sobre vetar discriminações de qualquer ordem.280

3.1.2 Amparo Legal

A omissão escancarada do legislador a respeito das relações

homoafetivas, teve finalmente seu fim com a edição da Lei 11.340/2006, conhecida

como Lei Maria da Penha. De uma maneira um tanto expressa, estipula a Lei em

seu artigo 2º que: “toda mulher, independentemente da classe, raça, etnia,

orientação sexual [...] goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana

[...]”281. Ainda mais, no parágrafo único do artigo 5º da Lei, há a reiteração de que

independem de orientação sexual todas as situações que configuram violência

doméstica e familiar. A questão que se torna oportuna é a seguinte: Onde mais

ocorre violência doméstica senão no seio familiar? É justamente no âmbito familiar

que ocorrem as violências domésticas. Assim, como a proteção tem alcance aos

fatos ocorridos no ambiente doméstico, significa dizer que as uniões homossexuais

são consideradas entidades familiares.282

278 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. p.132. 279 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.14. 280 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. p.133. 281 Lei Maria Da Penha : 11.340 de 7 de Agosto de 2006. Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso

em: 07 de jun. de 2011. 282 ALVES, Leonardo Barreto Moreira, in, DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e

a justiça. p.141.

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Sobre o tema Paulo Roberto Vecchiatii Pondera 283:

A partir do momento em que se concebe a formação de uma família como direito fundamental inerente à pessoa humana, o art. 2º da Lei Maria da Penha reconheceu expressamente que as pessoas homossexuais têm o direito de formarem famílias homoafetivas e, consequentemente, de terem suas famílias homoafetivas reconhecidas e protegidas pelo Direito de Família. Ademais, quando o parágrafo único do art.5º da referida lei enunciou que as relações pessoais dispostas no mesmo independem de orientação sexual, ele reconheceu expressamente o status jurídico-familiar das uniões homoafetivas, alcançando-as expressamente à condição de entidades familiares, embora não tenha regulado seus efeitos na esfera cível.

Maria Berenice Dias284 ainda completa:

Ao afirmar a Lei que está sob o seu abrigo a mulher, sem distinguir sua orientação sexual, está assegurada proteção tanto às lésbicas, como às travestis, às transexuais e aos transgêneros com identidade social feminina e que mantêm relação íntima de afeto em ambiente familiar ou de convívio. Em todos esses relacionamentos, as situações de violência contra o gênero feminino justificam especial proteção.

Dessa forma há um novo conceito de família trazido pela Lei

Maria da Penha, conceito este que engloba na esfera de proteção do Estado todas

as relações tratadas acima. Não há dessa forma mais como negar que estas

relações constituem sim uma família.285

Em outras palavras, a Lei quis trazer um novo entendimento de

família, instituindo que esta deve ser compreendida como uma comunidade formada

por pessoas que podem ser ou apenas se considerar aparentada das demais,

unidas estas por laços naturais, por afinidade, ou ainda vontade expressa. Traz

assim a Lei a noção de que família não é aquela constituída por imposição da Lei,

mas sim, constituída pela vontade de seus integrantes.286

283 VECCHIATTI, Paulo Roberto. Manual da homoafetividade . p.236-237. 284 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. p.141. 285 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. p.142. 286 ALVES, Leonardo Barreto Moreira, in, THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa

humana e mediação familiar . p.67.

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A proteção jurídica se faz necessária, uma vez que as novas

relações inseridas no contexto da atualidade podem vir a representar a oportunidade

de proteção aos interesses das crianças e adolescentes, necessitando que haja

acordos que objetivem assegurar relações promissoras e estáveis para ambos: os

pais e os filhos afetivos.287

O amparo legal ao homossexual quanto às questões

pertinentes as suas relações também se vê esboçado pelos artigos 1º, inciso III,

artigo 3º, incisos I e IV, e artigo 5º caput, da CRFB/88.

O artigo 1º, em seu inciso III da CRFB/88 vem falando que a

República Federativa Do Brasil que constitui-se em Estado Democrático de Direitos

tem como fundamento a Dignidade da Pessoa Humana.

Uma vez que a dignidade da pessoa humana exige que sejam

respeitadas suas liberdades e suas vontades288, nada mais justo do que respeitar

sua escolha sexual e a vontade de constituir sua própria família, gozando dessa

forma de inteira proteção do Estado, como as demais entidades familiares.

Por sua vez o artigo 3º, inciso IV da CRFB/88 objetiva

“promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e

quaisquer formas de discriminação”289 tratando dessa forma do direito à igualdade

do ser humano.

Em relação à igualdade, também estabelece o artigo 5º, caput,

da CRFB/88:

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes [...]290

287 BRAUNER, Maria Cláudia Crespo, in, THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa

humana e mediação familiar . p.68. 288 MOTTA, Carlos Dias, in, THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e a

mediação familiar . p.80. 289 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (198 8). 45.ed. São Paulo: Saraiva,

2011. 290 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (198 8). 45.ed. São Paulo: Saraiva,

2011.

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São nos termos direito à liberdade e direito à igualdade que se

encontra escancarado o amparo aos homossexuais, consequentemente às suas

relações. Uma vez que não há o respeito à liberdade da pessoa em poder fazer sua

opção sexual e ao de ser visto e tratado como igual perante os demais, há o

descumprimento de uma norma constitucional.

Tratando sobre a igualdade ainda, vale lembrar o ensinamento

de Maria Celina Bodin de Moraes291 que lembra Boaventura de Souza, dizendo “ as

pessoas e os grupos sociais têm o direito a ser iguais quando a diferença os

inferioriza, e o direito a serem diferentes quando a igualdade os descaracteriza”.

No que tange ao direito à liberdade, este como já dito

anteriormente, encontra-se contido da mesma forma no artigo 5º, caput da CRFB/88.

O mesmo também vem previsto como objetivo fundamental

pelo inciso I, do artigo 3º da CRFB/88, objetivando a constituição de uma sociedade

livre, justa e solidária.292 Assim tal artigo enfatiza o princípio da liberdade.

O mais íntimo sentimento que pode haver em um ser humano é

a liberdade de amar, de constituir uma família293. Negando-se essa estamos ferindo

o princípio da liberdade inserido na CRFB/88.

Por conseguinte ressalta-se que, o ordenamento jurídico não

aceita qualquer tipo de discriminação para com o próximo, assim não se admite

discriminação das relações homoafetivas em relação às relações heteroafetivas,

uma vez que se essa discriminação for existente, há a afronta aos princípios da

isonomia e da dignidade da pessoa humana.294

Assim, no que se refere ao amparo legal, entende-se que há

uma nova Lei que conceitua as relações homoafetivas como entidades familiares,

291 MORAES, Maria Celina Bodin de, in, THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana

e mediação familiar. p.69. 292 MOTTA, Carlos Dias, in, THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e mediação

familiar. p.79. 293 THOMÉ, Liane Maria Busnello. Dignidade da pessoa humana e mediação familiar. p.79. 294 VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade : da possibilidade jurídica do

casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. p.196.

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sendo essa a Lei Maria da Penha. Uma vez isso determinado, estas não estão mais

à mercê de proteção e segurança estatal.

Amparados da mesma forma encontram-se os homossexuais

por meio dos artigos 1º, inciso III, 3º, incisos I e IV e 5º caput da CRFB/88, uma vez

quando são respeitados seus direitos à liberdade, à igualdade, não há tratamento

discriminatório entre os mesmos, assim cumprindo-se o respeito à dignidade

humana.

3.2 ADOÇÃO HOMOPARENTAL

Como não há previsão legal em relação aos relacionamentos

homoafetivos, não existe da mesma forma previsão, autorizando ou negando, a

adoção por casais homoafetivos.295

Porém a jurisprudência tem atendido ao desejo das pessoas

com orientação sexual divergente da heterossexual em tornarem-se pais e mães296.

Isso pois, a adoção por homossexual individualmente vem sido autorizada, mediante

uma cuidadosa análise psicossocial por equipe interdisciplinar que possa verificar na

relação que está por vir o melhor interesse do adotando297.

Necessário se faz a análise de que a orientação sexual não é

óbice para ser candidato à adoção, não havendo uma se quer palavra no direito

brasileiro que permita uma interpretação diversa dessa concluída. Pelo contrário, é

vedado qualquer tipo de discriminação, por exemplo, contra pessoas que tenham

orientação sexual diferente da heterossexual. Entende-se portanto, que o problema

não está na Lei, mas sim, se existe este problema, o mesmo se encontra puramente

na cabeça e nos corações das pessoas.298

295 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. p.212. 296 BITTENCOURT, Sávio. A nova lei da adoção: do abandono ao direito à convivência familiar e

comunitária. p.145. 297 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.372. 298 BITTENCOURT, Sávio. A nova lei de adoção :do abandono ao direito à convivência familiar e

comunitária. p.145.

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O que deve atender a adoção em primeiro lugar, é o melhor

interesse para a criança ou adolescente, levando-se em conta se o pretendente

possui um estilo de vida compatível com a educação e criação de uma criança, e se

o seu comportamento é adequado e equilibrado, restando-se claro que pouco

importa verificar se o pretendente é homo ou heterossexual. Essa questão de proibir

a adoção apenas pelo fato da orientação sexual do pretendente torna-se um ato

preconceituoso e de discriminação.299

Sobre o assunto, Sávio Bittencourt300 faz uma indagação:

Não são homoafetivas as pessoas que atiraram seus filhos pelas janelas ou nas ruas, rios, lagoas, como a mídia nos informou, nos últimos tempos. Não são homoafetivas as pessoas que alugam seus filhos para uso abjeto de adultos pervertidos e tarados, como revelou à sociedade a CPI da pedofilia. Os gays ou os não gays podem ser boas ou más companhias para as crianças, dependendo de fatores não vinculados obrigatoriamente à sua orientação sexual. O que importa para a criança é o cuidado, que traduz o afeto que se tem por ela. Num país de crianças abandonadas em abrigos, aos milhares, se dar ao luxo macabro do preconceito, além de criminoso, é burrice.

Porém, a adoção por homossexual solteiro não é o foco

principal do trabalho aqui presente, e sim, a adoção por casais homossexuais,

assunto que gera mais polêmica ainda.

De acordo com o direito brasileiro, o casal homoafetivo não

está autorizado a adotar visto que, a Lei Civil refere-se unicamente aos casais

ligados pelo matrimônio, ou seja, pelo casamento, e união estável, uma vez que

estes, de acordo com a CRFB/88 se formam entre homem e mulher, de acordo com

o artigo 226, parágrafo 3º.301

A este propósito pronuncia-se Carlos Roberto Gonçalves302

dizendo que “a Lei Nacional da Adoção não prevê a adoção por casais

299 BITTENCOURT, Sávio. A nova lei de adoção :do abandono ao direito à convivência familiar e

comunitária. p.146. 300 BITTENCOURT, Sávio. A nova lei de adoção :do abandono ao direito à convivência familiar e

comunitária. p.146. 301 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.331. 302 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro : direito de família. p.372.

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homossexuais porque a união estável só é permitida entre homem e mulher (CC,

art.1.723; CF, art. 226, parágrafo 3º)”.

Pois aí é que está o grande problema. A doutrina e

jurisprudência têm entendido que a união estável é a relação entre homem e mulher,

vivendo como se fossem casados, sendo que a CRFB/88 faz a previsão que a Lei

deve facilitar sua conversão em casamento. Dessa forma, como não há a previsão

de casamento por duas pessoas de sexo igual, não poderia ter a existência de união

estável para um casal homoafetivo, logo, aos mesmos não seria concedida a

oportunidade de adotar.303

Porém o que vem acontecendo muito seguido na prática, é que

apenas um dos companheiros, do casal homoafetivo, faz o pedido da adoção,

tornando-se um pai ou uma mãe, dependendo do sexo do casal, solteiro. Sendo

assim, a pessoa que pretende adotar finge que não tem um parceiro fixo, a justiça

ignora, por não saber, o afeto existente naquela unidade familiar e concede a

adoção. Ocorre porém que essa pessoa que foi omitida da relação mais tarde

integra o núcleo de convivência do adotando, desenvolvendo um relacionamento

com a criança, acabando assim influenciando na criação da mesma. E é justamente

nessa questão que a sociedade deve se perguntar: o que é melhor para o interesse

da criança?304

Pode-se afirmar que o interesse da criança consiste na

concessão de sua adoção pelo casal homoafetivo em conjunto, visto que, ela será

criada pelo casal e não unicamente por um só homoafetivo. Isso pois, em caso de

separação da união, serão preservados os direitos à criança de alimentos, visitação

e guarda. Caso contrário, havendo adoção unilateral, aquele que não adotou, mas

que embora tenha convivido com a criança e constituído laços afetivos com a

mesma, terá um difícil trabalho de comprovar sua ligação emocional com a criança,

havendo a dificuldade de obtenção ao direito de visitas. Em se tratando do âmbito

jurídico, este que não adotou é um estranho para a criança, havendo possíveis

303 BITTENCOURT, Sávio. A nova lei de adoção : do abandono ao direito à convivência familiar e

comunitária. p.146. 304 BITTENCOURT, Sávio. A nova lei de adoção : do abandono ao direito à convivência familiar e

comunitária. p.147.

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complicações no plano dos direitos do menor. Isso com certeza não seria um real

interesse para a criança, uma vez que ocorreria um afastamento indesejado de uma

pessoa querida, até que todas as questões pertinentes à provas do relacionamento

pudessem restar esclarecidas e resolvidas.305

Quanto à questão de problemas na busca dos direitos do

adotando, torna-se pertinente o esclarecimento de Aimbere Francisco Torres306:

Com isso, o adotando somente poderá buscar eventuais direitos, como, por exemplo, alimentos ou sucessórios, em face do adotante, sendo juridicamente impossível ao adotado obter qualquer direito daquele que também o reconhece como pai ou mãe, o que evidentemente trará prejuízos ao menor, notadamente quanto aos aspectos patrimoniais.

Verifica-se assim, que na hipótese de haver separação entre o

casal homoafetivo, aquele homoafetivo que não adotou, não deveria a princípio

alimentos ao adotado, visto que não tem vínculo de parentesco com o menor.

Haveria assim, da mesma forma, um trabalho árduo em comprovar o vínculo do

homoafetivo com a criança e o vínculo do relacionamento dos companheiros307.

Torna-se perfeitamente visível o prejuízo mais uma vez para a criança, em vez de

estar sendo visado seu benefício.

Por estas razões aqui expostas, fica demonstrado que o melhor

interesse da criança reside na concessão de sua adoção pelo casal homoafetivo,

uma vez que são os dois que irão criar a mesma. Considerando então que não há

óbices constitucionais a esta interpretação, a melhor decisão aqui encontra-se, por

visar o melhor interesse do adotado.308 Caberá dessa forma, aos órgãos auxiliares

do judiciário, contidos por psicólogos, pedagogos, assistentes sociais e psicanalistas

verificar o grau de responsabilidade que os pretendentes à adoção possuem, assim

como a verificação da sua capacidade de fornecer um verdadeiro lar ao adotado,

305 BITTENCOURT, Sávio. A nova lei da adoção : do abandono ao direito à convivência familiar e

comunitária. p.147-148. 306 TORRES, Aimbere Francisco. Adoção nas relações homoparentais . p.111. 307 BITTENCOURT, Sávio. A nova lei de adoção : do abandono ao direito à convivência familiar e

comunitária. p.148. 308 BITTENCOURT, Sávio. A nova lei de adoção : do abandono ao direito à convivência familiar e

comunitária. p.148.

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sem expô-lo de forma alguma a situações adversas no ambiente em que insere-

se.309

A adoção por pessoas homossexuais ,solteiros ou casais, é

conteúdo de muita polemica de igual forma pelas questões a seguir.

Em vistas de um desenvolvimento sadio do adotando, há a

preocupação da sociedade em relação à aceitação da adoção por parte de um

indivíduo homossexual ou um casal homoafetivo.310

Pessoas que se opõem a essa situação sustentam o fato, sem

nenhuma prova concreta, de que adoção advinda por pessoas “assim”, ou seja, por

pessoas que tiveram sua opção sexual mantida em forma de homossexualidade ao

invés da heterossexualidade, colocaria em risco o desenvolvimento da criança ou

adolescente adotado, uma vez que este seria influenciado, direta ou indiretamente,

pelos seus pais adotivos no sentido de seguir também pela escolha da

homossexualidade. Nada mais nada menos, alegam os opositores que essa adoção

traria total prejuízo para o adotando no sentido de que faltaria a figura de pai e a

figura de mãe no seio familiar, prejudicando dessa forma a criança na sua formação

natural, conseqüentemente, haveria uma tendência desta criança tornar-se

homossexual da mesma forma que os pais adotivos. Porém tal tese é falha, pois lhe

falta lógica. Pelo simples fato de haver a preocupação em o menor se tornar

homossexual e não heterossexual, já mostra que não há a aceitação por parte

destes da homossexualidade como sendo natural. Advém aqui a situação de a

homossexualidade ser tratada como doença, porém a mesma não é, uma vez que a

Organização Mundial da Saúde classificou a homossexualidade como sendo umas

das livres manifestações da sexualidade humana. Dessa forma já caí por terra a

primeira tese que encara de frente o entendimento contrário à adoção por casais

homossexuais, uma vez que a mesma baseia-se em dados cientificamente

equivocados e sem fundamento311.

309 NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.333. 310 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. p.218. 311 VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade . p.537-538-539.

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A mesma teoria encontra-se infundada no momento que volta-

se para o pensamento de que há crianças que foram criadas por heterossexuais e

tornaram-se homossexuais, ou seja, criadas no ambiente dito como “adequado”,

assim como há crianças criadas por homossexuais que tornaram-se heterossexuais.

Assim resta-se clara a queda da teoria por dois motivos, sendo eles: primeiramente

porque a homossexualidade é uma livre manifestação da sexualidade humana,

sendo ela tão normal como a heterossexualidade. Tal posicionamento advém da

ciência médica mundial, já constatou-se tal fato. Posteriormente porque diversos são

os casos de crianças que são criadas por pais de determinada escolha sexual,

escolhendo elas mais tarde por orientação sexual diversa dos pais. Dessa forma

percebe-se que a sexualidade daqueles que criam nada influi no desenvolvimento

sexual da criança312.

Existem estudos que mostram a importância das presenças

masculina e feminina na criação do menor, no seu amadurecimento e equilíbrio,

sem, no entanto, comprovar cientificamente a sua imprescindibilidade. Quanto a este

aspecto, Paulo Lobo313 faz referencia dizendo:

Não há fundamentação científica para esse argumento, pois pesquisas e estudos nos campos da psicologia infantil e da psicanálise demonstram que as crianças que foram criadas na convivência familiar de casais homossexuais apresentaram o mesmo desenvolvimento psicológico, mental e afetivo das que foram adotadas por homem e mulher casados.

Maria Berenice Dias aponta ainda como motivo de apreensão

que a sociedade tem em relação à adoção por pessoas homoafetivas, sendo casais

ou pessoas solteiras, a questão da criança adotada ser alvo de repúdio no ambiente

em que vive, ou ainda, vítima de discriminação por parte de vizinhos, colegas de

aula. Porém tal questão encontra-se colocada para escanteio por quem realmente

estuda as questões pertinentes às famílias314.

Nesse sentido também é importante mencionar a questão da

afronta ao princípio da proteção integral ao menor, decorrente da proibição da

312 VECCHIATTI, Paulo Roberto. Manual da homoafetividade . p.539. 313 LOBO, Paulo, in, NADER, Paulo. Curso de direito civil : direito de família. p.333. 314 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. p.218-219.

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adoção por casais homoafetivos. Isso pois, uma vez negado à casais homoafetivos

o direito da adoção, não permite aos menores, possíveis adotados, de serem criados

por pessoas que se encontram dispostas a fornecer uma boa criação, oferta de

carinho, amor, respeito, solidariedade, deixando de possibilitá-las o desenvolvimento

de suas potencialidades. Observa-se de tal forma que, tal negativa condena essas

crianças a uma infância e/ou adolescência infeliz, não podendo as mesmas ter a

oportunidade de uma criação digna.315

De igual forma, o indeferimento de adoção em conjunta, por

casal homoafetivo, será afronta ao princípio da integral proteção ao menor no

sentido que se a adoção for concedida a apenas um componente do casal, somente

com este a criança terá vínculo jurídico, o que poderá trazer prejuízos para o menor,

como já estudou-se anteriormente. Explica-se isso através do fato de que em uma

futura separação do casal, este que não adotou conjuntamente não terá a obrigação

de prestar auxílio financeiro ao adotando, assim como também este companheiro

que não consta como pai adotivo poderá encontrar dificuldades de manter um

contato com a criança, visitá-la, e assim fazer parte de sua convivência. Justamente

neste sentido é que encontram-se os prejuízos para a criança, uma vez que esta

não poderá usufruir da ajuda financeira prestada pelo pai que não encontra-se como

adotante, e perdendo o vínculo de convívio com este. Dessa forma ficam assim

evidenciados tanto o prejuízo econômico para o adotando como o prejuízo

psicológico, respectivamente.316

Há a manifestação de Viviane Girardi317 quanto ao assunto em

questão:

Entende-se que a não-concessão da adoção conjunta aos homossexuais pode, muitas vezes, interferir nos melhores interesses da criança, pois a realidade social aponta para formação de um vínculo entre adotando e o parceiro do adotante. Mas tais situações reais não encontram proteção jurídica que assegure a manutenção

315 VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade : da possibilidade jurídica do

casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. p.549. 316 VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade: da possibilidade jurídica do

casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. p.549-550. 317 GIRARDI, Viviane, in, VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade : da

possibilidade jurídica do casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. p.549.

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ou reflexos jurídicos oriundos desse vínculo afetivo formado pelo companheiro do adotante, em que pese a constatação na maioria dos casos, analisados de vínculos emocionais fortes estabelecidos entre criança e companheiro(a) do pai ou mãe adotante. Vínculos afetivos estes que possuem a mesma natureza dos vínculos emocionais das relações entre pais e filhos heterossexuais.

Em sentido à favor da adoção por casais homoafetivos, tem-se

o pensamento de Paulo Roberto Vecchiatti318 ensinando:

[...]cumpre deferir a adoção a casais homoafetivos pela obviedade de que terão as crianças e adolescentes uma vida muito melhor se criados(as) por um casal disposto a lhes fornecer amor, respeito e solidariedade, aprendendo, inclusive, a importância desses valores, do que se criados em instituições públicas, que por melhor que sejam jamais poderão fornecer um ambiente propício ao desenvolvimento da individualidade da pessoa em crescimento.

Contrariando essa possibilidade de deferimento a casais

homossexuais quanto à possibilidade de adotarem, tem-se como síntese conclusiva,

do exposto no presente capítulo, a ponderação de Roger Raupp Rios319 dizendo

que:

[...]tem-se alegado contra a possibilidade de adoção por casais homossexuais argumentos de variada matriz, tais como (1)perigo potencial de a criança sofrer violência sexual, (2) o risco de influenciar-se a orientação sexual da criança pela do adotante, (3) a incapacidade de homossexuais serem bons pais e (4) a possível dificuldade de inserção social da criança em virtude da orientação sexual do adotante.

No entanto, demonstrou-se no presente subtítulo que, a

adoção é somente deferida quando representa uma real vantagem ao adotando,

neste caso, cai por terra a situação de a criança sofrer violência sexual, pois, no

caso de deferimento, com certeza são averiguados todos os fatos em relação àquele

casal que pretende adotar, ou seja, é averiguado sua índole, bem como seu tipo de

vida, caráter, etc. Em relação a segunda tese de oposição a possibilidade de casais

adotarem, a mesma também ficou comprovada no presente subtítulo que é falha,

visto que há crianças que foram criadas por casais heterossexuais e tornaram-se 318 VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da homoafetividade : da possibilidade jurídica do

casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. p.552. 319 RIOS, Roger Raupp, in, VECCHIATTI, Paulo Roberto. Manual da homoaftividade : da

possibilidade jurídica do casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. p. 540-541.

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mais tarde homossexuais, bem como, crianças que foram criadas por casais

homossexuais e mais tarde se tornaram heterossexuais. Da mesma forma, alegar

que pais homossexuais não seriam bons pais, torna-se um argumento sem lógica,

visto que comprovou-se no presente trabalho que crianças criadas por

homossexuais possuem o mesmo desenvolvimento psicológico, mental e afetivo das

que foram criadas por homem e mulher. Ressalta-se novamente, a questão da

investigação, através de uma equipe interprofissional, para averiguar a vida do

casal, tendo em vista assim, a obtenção da resposta para as seguintes perguntas:

Está este casal apto a criar esta criança? Encontra-se apto a fornecer uma boa

criação para a mesma? Com isso já entende-se que ter como argumento a tese que

pais homossexuais não seriam bons pais, também tornou-se uma tese falha, diante

de todo o exposto no subtítulo presente. Por fim, a questão da dificuldade de

inserção social da criança em virtude da orientação sexual do adotante, em parte é

verdade, porém caí por terra por quem estuda realmente o direito de família, uma

vez que encontra nele o fundamento de haver a possibilidade jurídica de adoção por

casais homoafetivos com base em princípios do direito de família e na CRFB/88. E

ainda, ressalta-se que é nesta questão da inserção social, que encontra-se inserido

o preconceito da sociedade, uma vez que boa parte dela vê tal questão de uma

maneira completamente discriminatória. Prática que, não pode ser admitida em uma

sociedade que tem como base princípios inseridos na CRFB/88 que se opõem a tal

discriminação.320

Analisa-se abaixo o CC/2002 e o Estatuto da Criança e do

Adolescente verificando que previsão legal estes trazem para a adoção

homoparental.

3.2.1 Código Civil de 2002 e ECA

O CC/2002, como da mesma forma o ECA, não trazem

qualquer restrição ao sexo, estado civil ou orientação sexual do adotante, tendo

todos a faculdade de adotarem, não importando dessa forma a opção de vida da

320 VECCHIATTI, Paulo Roberto. Manual da homoafetividade : da possibilidade jurídica do

casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. p.539-540-541.

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pessoa que pretende adotar. Pelo fato de existir essa ausência de impedimentos,

deve-se ter em vista o princípio trazido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente,

que admite a adoção em casos em que esta se fundamente em motivos legítimos e

que apresente reais vantagens ao adotando.321

Nesse sentido, para uma melhor compreensão, lê-se o artigo

43 do ECA dizendo “a adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para

o adotando e fundar-se em motivos legítimos”322, bem como o artigo 1.625 do

CC/2002 que trata do mesmo assunto preceituando “ somente será admitida a

adoção que constituir efetivo benefício para o adotando”323.

No entanto, por mais que não há vedação alguma encontrada

na Lei, existem aqueles que tentam de alguma forma se opor a essa situação, como

por exemplo referindo-se a questão que o ECA traz no que diz respeito ao registro

de nascimento. Sustentam assim o fato, de que pais de mesmo sexo não poderiam

constar como pais no registro de nascimento. Porém tal tese não é de forte

convencimento, uma vez que existem os casos em que o registro é levado a efeito

apenas pela mãe, não significando de forma alguma que o filho não tem um genitor.

Da mesma forma, ou seja, como oposição à questão da possibilidade de casais

formados pelo mesmo sexo poderem adotar, há aqueles que remetem a situação de

que a procriação é ato privativo de um homem e uma mulher. Porém com a

evolução da engenharia genética, novas técnicas encontram-se no mercado, como a

de reprodução assistida, concluindo-se que hoje em dia não se torna mais

necessário existir um par para se ter um filho.324

Nesse sentido, abordando a inexistência de proibição legal à

adoção por homossexuais no ECA, o que igualmente ocorre no CC/2002, afirma

José Luiz Mônaco da Silva325, Promotor de Justiça do Estado de São Paulo:

321 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. p. 213-214. 322 Estatuto da Criança e do Adolescente : Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Atual. Com a Lei

nacional de adoção (Lei 12.010, de 03.08.2009). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. 323 BRASIL. Código Civil (2002) . 2.ed. São Paulo: Saraiva,2006. 324 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva: o preconceito e a justiça. p. 214. 325 SILVA, José Luiz Mônaco da, in, VECCHIATTI, Paulo Roberto. Manual da homoafetividade : da

possibilidade jurídica do casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. p.544.

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O Estatuto da Criança e do Adolescente não contém dispositivo legal tratando da adoção pleiteada por homossexuais. Por causa dessa omissão, é possível que alguns estudiosos entendam inviável a adoção por homossexuais. A nosso ver o homossexual tem o direito de adotar um menor, salvo se não preencher os requisitos estabelecidos em lei. Aliás, ‘se um homossexual não pudesse adotar uma criança ou um adolescente, o princípio da igualdade perante a lei estaria abertamente violado. E mais: apesar da omissão legal, o ECA não veda, implícita ou explicitamente a adoção por homossexuais, o que importa, no substancial, é a idoneidade moral do candidato e a sua capacitação para assumir os encargos decorrentes de uma paternidade (ou maternidade) adotiva’.

Porém, mesmo não havendo previsão alguma por parte do

CC/2002 e do ECA, muito embora também não haja vedação, o direito à adoção por

casais do mesmo sexo tem fundamento de ordem constitucional, uma vez que não

conceder aos homossexuais o direito à paternidade torna-se um desrespeito aos

princípios da dignidade da pessoa humana, bem como da liberdade e igualdade. O

fundamento é da mesma forma encontrado analisando-se o princípio da proteção

integral resguardado a todas as crianças e adolescentes. Princípios estes que

devem ser respeitados para que assim sejam resguardados os direitos do ser

humano, tanto no que diz respeito ao casal homoafetivo como no que diz respeito ao

menor.326

Dessa forma conclui-se que mesmo que o ECA e o CC/2002

não tragam nenhuma previsão quanto à adoção por casais homoafetivos, eles

também de forma alguma trazem algum tipo de vedação ao mesmo assunto,

podendo-se fazer uma análise de tal assunto com base nos princípios

constitucionais como da proteção integral, trazido as crianças e adolescentes, bem

como o princípio da dignidade da pessoa humana.

3.3 AVANÇOS JURISPRUDENCIAIS

Resistiu a jurisprudência quanto à adoção por casais

homoafetivos, porém , tal prática não foi eterna.

326 DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva : o preconceito e a justiça. p. 215-216.

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A decisão pioneira foi a dada pela Jurisprudência do Rio

Grande do Sul, ao conferir a adoção à um casal de lésbicas. Aponta-se abaixo a

decisão:

Adoção. Casal formado por duas pessoas de mesmo sexo. Possibilidade. Reconhecida como entidade familiar, merecedora da proteção estatal, a união formada por pessoas do mesmo sexo, com características de duração, publicidade, continuidade e intenção de constituir família, decorrência inafastável é a possibilidade de que seus componentes possam adotar. Os estudos especializados não apontam qualquer inconveniente em que crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais importando a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga aos seus cuidadores. É hora de abandonar de vez preconceitos e atitudes hipócritas desprovidas de base científica, adotando-se uma postura de forma defesa da absoluta prioridade que constitucionalmente é assegurada aos direitos das crianças e adolescentes (art.227 da CF). Caso em que o laudo especializado comprova saudável vínculo existente entre crianças e as adotantes. Negaram provimento. Unânime (TJRS, AC70013801592,7ª Câm. Cív.,j.05.04.2006, rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos). 327

Vale lembrar, que a sessão histórica, que ocorreu no dia

05.04.2006, como já citado acima, além do relator, contou ainda no seu julgamento

com o Desembargador Ricardo Raupp Ruschell e a Desembargadora Maria

Berenice Dias.328

Ademais, sobre a decisão Maria Berenice Dias329 se pronuncia

dizendo que as crianças:

Têm duas mães e a justiça não pode negar isso [...]. O vínculo de filiação afetivo, e não o biológico, vem sendo privilegiado pela jurisprudência. O direito à convivência familiar constitui prioridade absoluta [...]. A pretensão da adotante é dar aos filhos a segurança de que terão direitos. A negativa apenas deixaria crianças ao desabrigo de um vínculo de filiação que já existe.

Da mesma ocorreu adoção por um casal de homens, em

Catanduva (SP). Estes obtiveram a adoção conjuntamente de uma menina, porém

327 SILVA JÚNIOR, Enézio de Deus. A possibilidade jurídica de adoção por casais

homossexuais . p.173. 328 SILVA JÚNIOR, Enézio de Deus. A possibilidade jurídica de adoção por casais

homossexuais . p.173. 329 DIAS, Maria Berenice In SILVA JÚNIOR, Enézio de Deus. A possibilidade jurídica de adoção

por casais homossexuais . p.173.

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inicialmente, a menor havia sido adotada por apenas um dos companheiros,

ocorrendo tal fato em março de 2005. Porém, posteriormente a justiça veio a atender

o pedido por parte do outro companheiro, para este efetuar seu papel de pai com a

criança, cuja qual já era criada por este junto com o outro companheiro. Em relação

com este caso de Catanduva, a mídia informou que foi o primeiro no Estado que a

justiça deu o direito de adotar a um casal de homoafetivos, sendo o terceiro do

Brasil.330

Importante ressaltar o entendimento do STJ quanto ao tema:

EMENTA DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. ADOÇÃO DE MENORES POR CASAL HOMOSSEXUAL. SITUAÇÃO JÁ CONSOLIDADA. ESTABILIDADE DA FAMÍLIA. PRESENÇA DE FORTES VÍNCULOS AFETIVOS ENTRE OS MENORES E A REQUERENTE. IMPRESCINDIBILIDADE DA PREVALÊNCIA DOS INTERESSES DOS MENORES. RELATÓRIO DA ASSISTENTE SOCIAL FAVORÁVEL AO PEDIDO. REAIS VANTAGENS PARA OS ADOTANDOS. ARTIGOS 1º DA LEI 12.010/99 E 43 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DOA ADOLESCENTE. DEFERIMENTO DA MEDIDA.

1. A questão diz respeito à possibilidade de adoção de crianças por parte de requerente que vive em união homoafetiva com companheira que antes já adotara os mesmos filhos, circunstancia a particularizar o caso em julgamento. 2. Em um mundo pós-moderno de velocidade instantânea da informação, sem fronteiras ou barreiras, sobretudo as culturais e as relativas aos costumes, onde a sociedade transforma-se velozmente, a interpretação da lei deve levar em conta, sempre que possível, os postulados maiores do direito universal. 3. O artigo 1º da Lei 12.010/99 prevê a “garantia do direito à convivência familiar a todas as crianças e adolescentes”. Por sua vez, o artigo 43 do ECA estabelece que “a adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotante a fundar-se em motivos legítimos”. 4. Mister observar a imprescindibilidade da prevalência dos interesses dos menores sobre quaisquer outros, até porque está em jogo o próprio direito de filiação, do qual decorrem as mais diversas conseqüências que refletem por toda a vida de qualquer indivíduo. 5. A matéria relativa à possibilidade de adoção de menores por casais homossexuais vincula-se obrigatoriamente à necessidade de verificar qual é a melhor solução a ser dada para a proteção dos direitos das crianças, pois são questões indissociáveis entre si. 6. Os diversos e respeitados estudos especializados sobre o tema, fundados em fortes bases científicas (realizados na Universidade de Virgínia, na Universidade de Valência, na Academia Americana de Pediatria), “não indicam qualquer inconveniente em que crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais

330 BITTENCOURT, Sávio. A nova lei de adoção : do abandono ao direito à convivência familiar e

comunitária. p.149.

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importando a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga a seus cuidadores”. 7. Existência de consistente relatório social elaborado por assistente social favorável ao pedido da requerente, ante a constatação da estabilidade da família. Acórdão que se posiciona a favor do pedido, bem como parecer do Ministério Público Federal pelo acolhimento da tese autoral. 8. É incontroverso que existem fortes vínculos afetivos entre a recorrida e os menores sendo a afetividade o aspecto preponderante a ser sopesado numa situação como a que ora se coloca em julgamento. 9. Se os estudos científicos não sinalizam qualquer prejuízo de qualquer natureza para as crianças, se elas vêm sendo criadas com amor e se cabe ao Estado, ao mesmo tempo, assegurar seus direitos, o deferimento da adoção é medida que se impõe. 10. O Judiciário não pode fechar os olhos para a realidade fenomênica. Vale dizer, no plano da realidade, são ambas, a requerente e sua companheira, responsáveis pela criação e educação dos dois infantes, de modo que elas, solidariamente, compete a responsabilidade. 11. Não se pode olvidar que se trata de situação fática consolidada, pois as crianças já chamam as duas mulheres de mães e são cuidadas por ambas como filhos. Existe dupla maternidade desde o nascimento das crianças, e não houve qualquer prejuízo em suas criações. 12. Com o deferimento da adoção, fica preservado o direito de convívio dos filhos com a requerente no caso de separação ou falecimento de sua companheira. Asseguram-se os direitos relativos a alimentos e sucessão, viabilizando-se ainda, a inclusão dos adotandos em convênios de saúde da requerente e no ensino básico e superior, por ela ser professora universitária. 13. A adoção, antes de mais nada, representa em ato de amor, desprendimento. Quando efetivada com o objetivo de atender aos interesses do menor, é um gesto de humanidade. Hipótese em que ainda se foi além, pretendendo-se a adoção de dois menores, irmãos biológicos, quando, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça. Que criou, em 29 de Abril de 008, o Cadastro Nacional de Adoção, 86% das pessoas que desejavam adotar limitavam sua intenção a apenas uma criança. 14. Por qualquer ângulo que se analise a questão, seja em relação à situação fática consolidada, seja no tocante à expressa previsão legal de primazia à proteção integral das crianças, chega-se à conclusão de que, no caso dos autos, há mais do que reais vantagens para s adotandos, conforme preceitua o artigo 43 do ECA. Na verdade, ocorrerá verdadeiro prejuízo aos menores caso não deferida a medida. 15. Recurso especial improvido.

Decisão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da QUARTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, por unanimidade, conhecer do recurso especial e negar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Honildo Amaral de Mello Castro

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106

(Desembargador convovado do TJ/AP), Aldir Passarinho Junior e João Otávio de Noronha votaram com o Sr. Ministro Relator.331

Palavras de Resgate

DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Acórdão

Resp 889852/RS

RECURSO ESPECIAL

2006/0209137-4

Relator (a)

Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO (1140)

Órgão Julgador

T4- QUARTA TURMA

Data da Publicação/ Fonte

DJe 10/08/2010

Data do Julgamento

27/04/2010

Verifica-se agora, o mais novo entendimento em relação ao

tema, ressaltando o posicionamento do STF quanto às questões pertinentes as

relações homoafetivas, uma vez que dia 05/05/2011 este promoveu uma Ação

Direta de Inconstitucionalidade (ADI) fazendo referência a igualar as relações

homoafetivas à união estável prevista pela CRFB/88.

331 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 889852 / RS. Disponível em: <http://www.stj.jus.br

/SCON/pesquisar.jsp?newsession=yes&tipo_visualizacao=RESUMO&b=ACOR&livre=adoção de menores por casal homossexual>. Acesso em: 28 abr. 2011.

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Dessa forma verifica-se abaixo notícia veiculada na mídia a

respeito da ADI (4.277) do STF, Ação Declaratória de Inconstitucionalidade:

BRASÍLIA - Os casais homossexuais têm os mesmos direitos e deveres que a legislação brasileira já estabelece para os casais heterossexuais. A partir da decisão de hoje do Supremo Tribunal Federal (STF), o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo será permitido e as uniões homoafetivas passam a ser tratadas como um novo tipo de família.

O julgamento do Supremo, que aprovou por unanimidade o reconhecimento legal da união homoafetiva, torna praticamente automáticos os direitos que hoje são obtidos com dificuldades na Justiça e põe fim à discriminação legal dos homossexuais. 'O reconhecimento, portanto, pelo tribunal, hoje, desses direitos, responde a um grupo de pessoas que durante longo tempo foram humilhadas, cujos direitos foram ignorados, cuja dignidade foi ofendida, cuja identidade foi denegada e cuja liberdade foi oprimida', afirmou a ministra Ellen Gracie.

Pela decisão do Supremo, os homossexuais passam a ter reconhecido o direito de receber pensão alimentícia, ter acesso à herança de seu companheiro em caso de morte, podem ser incluídos como dependentes nos planos de saúde, poderão adotar filhos e registrá-los em seus nomes, dentre outros direitos.

As uniões homoafetivas serão colocadas com a decisão do tribunal ao lado dos três tipos de família já reconhecidos pela Constituição: a família convencional formada com o casamento, a família decorrente da união estável e a família formada, por exemplo, pela mãe solteira e seus filhos. E como entidade familiar, as uniões de pessoas do mesmo sexo passam a merecer a mesma proteção do Estado.

Facilidade. A decisão do STF deve simplificar a extensão desses direitos. Por ser uma decisão em duas ações diretas de inconstitucionalidade - uma de autoria do governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, e outra pela vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat -, o entendimento do STF deve ser seguido por todos os tribunais do país.

Os casais homossexuais estarão submetidos às mesmas obrigações e cautelas impostas para os casais heterossexuais. Por exemplo: para ter direito à pensão por morte, terá de comprovar que mantinha com o companheiro que morreu uma união em regime estável.

Pela legislação atual e por decisões de alguns tribunais, as uniões de pessoas de mesmo sexo eram tratadas como uma sociedade de fato, como se fosse um negócio. Assim, em caso de separação, não havia direito a pensão, por exemplo. E a partilha de bens era feita

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medindo-se o esforço de cada um para a formação do patrimônio adquirido.332

Sobre a ADI 4277 ainda tem-se:

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgarem a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, reconheceram a união estável para casais do mesmo sexo. As ações foram ajuizadas na Corte, respectivamente, pela Procuradoria-Geral da República e pelo governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral.

O julgamento começou na tarde de ontem (4), quando o relator das ações, ministro Ayres Britto, votou no sentido de dar interpretação conforme a Constituição Federal para excluir qualquer significado do artigo 1.723 do Código Civil que impeça o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar.

O ministro Ayres Britto argumentou que o artigo 3º, inciso IV, da CF veda qualquer discriminação em virtude de sexo, raça, cor e que, nesse sentido, ninguém pode ser diminuído ou discriminado em função de sua preferência sexual. “O sexo das pessoas, salvo disposição contrária, não se presta para desigualação jurídica”, observou o ministro, para concluir que qualquer depreciação da união estável homoafetiva colide, portanto, com o inciso IV do artigo 3º da CF.

Os ministros Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Cezar Peluso, bem como as ministras Cármen Lúcia Antunes Rocha e Ellen Gracie, acompanharam o entendimento do ministro Ayres Britto, pela procedência das ações e com efeito vinculante, no sentido de dar interpretação conforme a Constituição Federal para excluir qualquer significado do artigo 1.723 do Código Civil que impeça o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar.

Na sessão de quarta-feira, antes do relator, falaram os autores das duas ações – o procurador-geral da República e o governador do Estado do Rio de Janeiro, por meio de seu representante –, o advogado-geral da União e advogados de diversas entidades, admitidas como amici curiae (amigos da Corte).

Ações

A ADI 4277 foi protocolada na Corte inicialmente como ADPF 178. A ação buscou a declaração de reconhecimento da união entre

332 RECONDO, Felipe. STF reconhece união homoafetiva por unanimidade. Estadão . Notícias. 5 mai.

2011. Disponível em: < http://www.estadao.com.br/noticias/geral,casais-gays-poderao-adotar-filhos-e-registra-los,715492,0.htm>. Acesso em: 10 mai. 2011.

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pessoas do mesmo sexo como entidade familiar. Pediu, também, que os mesmos direitos e deveres dos companheiros nas uniões estáveis fossem estendidos aos companheiros nas uniões entre pessoas do mesmo sexo.

Já na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, o governo do Estado do Rio de Janeiro (RJ) alegou que o não reconhecimento da união homoafetiva contraria preceitos fundamentais como igualdade, liberdade (da qual decorre a autonomia da vontade) e o princípio da dignidade da pessoa humana, todos da Constituição Federal. Com esse argumento, pediu que o STF aplicasse o regime jurídico das uniões estáveis, previsto no artigo 1.723 do Código Civil, às uniões homoafetivas de funcionários públicos civis do Rio de Janeiro.333

O STF promoveu nada mais que uma “interpretação conforme”,

ou seja, conforme à CRFB/88, referente ao seu artigo 3º inciso IV, para dessa forma

excluir qualquer significado do art. 1.723 do CC/2002. Isso pois, acredita que não

equiparar as uniões homoafetivas às relações de união estável estaria sendo ferindo

o princípio disposto no artigo 3º inciso IV, ou seja, o princípio da igualdade.

Diante de todo o exposto no presente trabalho, se passa agora

as considerações finais.

333 BRASÍLIA. Supremo reconhece união homoafetiva. Notícias STF . Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=178931> . Acesso em: 10 mai. 2011.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa buscou verificar a possibilidade de adoção por

casais homoafetivos no sistema jurídico brasileiro.

Todo ser humano almeja um tratamento digno e igualitário,

sendo este respeitoso aos seus desejos individuais e sua essência.

Para tanto estudou-se no primeiro capítulo o novo conceito de

família na atualidade, buscando ainda os princípios que guiam essa “nova família”.

Da mesma forma verificou-se as modalidades de família que se

encontram no atual ordenamento jurídico.

Assim entendeu-se do primeiro capítulo que a família passou e

ainda passa por diversas mudanças, sendo destinada a ela um novo conceito, este

por sua vez mais amplo, e ainda, uma nova formação sendo vista sob um novo

paradigma. Há quem ache que a família está perdendo seu prestígio, assim como

vem deixando de lado suas características essenciais. Porém errado é pensar dessa

forma, uma vez que um mundo novo exige uma nova cara para a família atual.

Constatou-se que princípios como o da afetividade, pluralidade

de famílias e o da solidariedade estão dando essa nova cara à família de que tanto

se falou no decorrer do trabalho, fazendo com que esta seja aceita pela sociedade

de uma maneira mais abrangente, ou seja, sendo considerada nas suas mais

diversas formas. Grande destaque da mesma forma se deu aos princípios da

dignidade da pessoa humana, liberdade e igualdade, sendo estes de toda certeza os

fornecedores do embasamento legal à busca da felicidade de cada indivíduo, à

formação de uma família diferenciada, e à realização de sonhos pessoais.

Neste sentido, é nestes princípios constitucionais citados

acima, que indivíduos buscam o fundamento para a realização de um ser com

vontade e desejos próprios.

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Dessa forma, visou-se um tratamento igualitário ao ser

humano, tratando-os de uma maneira desigual, pois os indivíduos são diferentes um

dos outros não esquecendo-se, no entanto, que todos são oriundos de direitos e

deveres.

Referente a tal questão, ficou constatado no decorrer do

trabalho tal fato pois, uma vez que as pessoas humanas são diferentes umas das

outras, possuem vontades e desejos diferenciados, e mesmo que este diferente seja

diverso do que para a sociedade seja o “normal”, este diferente deve ter com toda

certeza seu espaço no âmbito do direito familiar, podendo estas mesmas pessoas

constituírem uma família diversa das previstas pela CRFB/88 em seu artigo 226

(casamento, união estável e família monoparental), e assim gozarem de direitos e

deveres da mesma forma. Respeitar o próximo é respeitar a dignidade da pessoa

humana.

O segundo capítulo destinou-se a tratar sobre o instituto da

adoção, suas principais características, sua finalidade, bem como algumas de suas

modalidades e seus efeitos.

Verificou-se no capítulo que, o instituto da adoção não existe

apenas para suprir a necessidade e vontade do casal em poder criar um filho como

sendo seu, e nem somente a da criança em poder crescer em uma família

substituta, isso pois, além desses intuitos, a adoção visa também resolver um

problema social encarado no dia a dia pela sociedade.

Cientificou-se no entanto que, a adoção somente será deferida

caso haja reais vantagens ao adotando, sendo dessa forma visado em primeiro lugar

o benefício deste. Caso contrário, não haverá o deferimento da mesma.

Tais benefícios aos menores foram averiguados através do

ambiente familiar em que a criança poderá vir a crescer, da mesma forma

analisando se a vida do casal seria compatível com as necessidades materiais e

imateriais da criança, sendo neste âmbito abrangido tanto a situação financeira do

casal, em poder fornecer estudo, condições habitacionais, etc, como a prestação de

carinho, amor, aconchego a ser dado para essa criança ou adolescente que está

entrando em uma nova família.

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Por fim, no terceiro capítulo estudou-se o foco principal do

presente trabalho, ou seja, a adoção homoparental.

Averiguou-se a sua possibilidade jurídica através da possível

formação de uma família homoafetiva, do amparo legal que a CRFB/88 traz através

de princípios constitucionais, assim como também através da omissão legal que o

CC/2002 e o ECA trazem em relação a essa possiblidade.

Assim entendeu-se no capítulo que, mesmo nos dias atuais em

que o ser humano já está mais apto a aderir novas idéias de vida, como por

exemplo, a aceitação com normalidade à formação de pares homoafetivos, estes

ainda sofrem um preconceito muito grande na sociedade, sendo vistos muitas vezes

como pessoas marginais, deturpadas ou até doentes.

Porém com o estudo que foi aprofundado, viu-se que este fato

não é bem assim. Estes por sua vez são pessoas como as demais, sujeitas a

direitos e deveres, e isso poderá ser compreendido de forma melhor após a

sociedade deixar um preconceito de lado e se aprofundar melhor dos fatos.

Viu-se que a omissão legal no que diz respeito às relações

homoafetivas encontra-se ainda presente no ordenamento jurídico, podendo-se ter

essa visão através do CC/2002, que nada relata a respeito das mesmas, pelo ECA e

ainda, pela CRFB/88 em seu artigo 226 que por sua vez prevê as famílias possíveis

e nada prevê sobre os relacionamentos homoafetivos. Dessa forma entendeu-se

que casal homoafetivo não seria casal, uma vez que para ser casal o CC/2002 exige

diversidade de sexo, não podendo estes desse modo, constituir família, e

consequentemente adotar. Tal fato ficou claramente exposto no artigo 226 da

CRFB/88 que prevê os tipos de famílias possíveis, sendo elas, casamento civil,

união estável e família monoparental. Dúvida não restou-se que a CRFB/88 foi

inovadora, pois deu um grande passo inserindo em sua carta a união estável e ainda

a família monoparental, não havendo dessa forma mais a necessidade da presença

de casal heterossexual para ser considerada entidade familiar, e consequentemente

não necessitando de procriação para ser uma família. No entanto, inovadora foi essa

atitude, porém as relações homoafetivas continuaram sem ganhar previsão alguma

pela CRFB/88.

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No entanto constatou-se no capítulo terceiro que, mesmo

havendo essa omissão legal por parte do ordenamento jurídico, as relações

homoafetivas podem sim ser consideradas entidades familiares, sendo estas

denominadas de família homoafetiva, uma vez que estas relações derivam do

sentimento de afeto, solidariedade, respeito e assistência mútua, preenchendo

dessa forma os requisitos que são observados na família moderna.

O amparo legal que se trouxe aos casais homoafetivos quanto

às questões pertinentes as suas relações, está inserido na CRFB/88, mais

precisamente nos artigos 1º(inciso III) artigo 3º(incisos I e IV) e artigo 5º (caput),

sendo eles respectivamente os princípios da: dignidade da pessoa humana; da

liberdade; da igualdade; e novamente no artigo 5º liberdade e igualdade inseridas.

Assim como estudou-se, o ser humano deve ser livre para

fazer suas escolhas, sendo tratado de forma igual mesmo que estas escolhas sejam

diferentes das dos demais, como por exemplo, escolha diversa na opção sexual de

vida. Esta não deve ser óbice para não haver o respeito dos direitos e deveres do

ser humano, pois caso contrário, estariam sendo feridos os princípios constitucionais

relatados anteriormente e acima de tudo haveria o desrespeito à dignidade da

pessoa humana.

Cientificou-se em relação à adoção homoparental, que mesmo

não havendo previsão legal para esta, a jurisprudência tem decidido em favor dela.

Entendeu-se que o que vem sendo analisado pelos julgadores

é justamente se há no caso concreto o melhor interesse da criança, havendo dessa

forma benefício para a mesma, ou ainda, se a relação homoparental preenche os

requisitos necessários à concretização da união estável.

Relatou-se que a oposição nesse sentido encontra seu

fundamento na possibilidade de a criança ou adolescente vir a ser mais tarde

homossexual como os pais, porém ficou comprovada no trabalho que tal tese é

falha, na medida em que há comprovado que muitas crianças que são criadas por

heterossexuais tornam-se homossexuais, assim como há homossexuais criando

crianças que escolhem mais tarde pela opção sexual diversa desta.

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Assim como cientificou-se que a presença masculina e

feminina na criação do menor é importante, a mesma não apareceu no trabalho

como sendo algo imprescindível, assim ficando comprovado que crianças criadas na

convivência de homoafetivos possuem o mesmo desenvolvimento psicológico,

mental e afetivo das crianças que foram criadas por homem e mulher.

O que deve sim prevalecer é a análise em cada caso concreto

pelos julgadores, averiguando estes o melhor benefício para o menor, e que tipo de

relação o casal desenvolve. Constatou-se que torna-se oportuno a averiguação de

tais fatos por meio de profissionais como psicólogos, psicanalistas, pedagogos e

assistentes sociais.

Finda a análise dos capítulos que foram estudados, retomam-

se as duas hipóteses básicas da pesquisa:

Primeira hipótese: Não é juridicamente possível a adoção por

casais homoafetivos, pois conforme ordenamento jurídico, para caracterizar-se uma

entidade familiar é preciso diversidade de sexo, portanto casal homoafetivo não

constitui entidade familiar, assim, não podendo adotar.

Parcialmente confirmada. Fato verdadeiro é que o

ordenamento jurídico exige diversidade de sexo para a concretização de entidade

familiar. Portanto, o CC/2002, assim como o ECA não fazem previsão legal alguma

as relações homoafetivas, ficando estas a mercê de amparo, ou ainda, se

subentendendo que as mesmas não possuem o direito efetivo de adotarem.

Porém é justamente na CRFB/88 que julgadores estão se

baseando para fornecer decisões favoráveis a casais homoafetivos, concedendo-

lhes um tratamento mais justo e igualitário, como por exemplo, dando aos mesmos a

concessão da dádiva de serem pais, como ainda outros direitos merecidos. Assim

aqueles que têm como embasamento legal os princípios constitucionais, podem

promover uma decisão favorável aos casais formados por pessoas do mesmo sexo,

realizando o sonho dos mesmos constituírem família e até a permissão de adotar.

Julgados que entendem neste sentido foram os citados no

trabalho, como por exemplo a decisão do TJRS que promoveu a um casal de duas

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mulheres a benção da adoção de uma menina, assim como também o julgado do

STJ superando-se em seu entendimento.

Importante ressaltar a mais nova manifestação nesse sentido

do STF, o qual promoveu uma interpretação conforme, afirmando que casais

homoafetivos possuem os mesmos direitos que casais heterossexuais, tendo como

embasamento o artigo 3º inciso IV da CRFB/88.

A interpretação conforme foi justamente no sentido de

promover o que vem previsto no artigo 3º inciso IV da CRFB para todas as pessoas,

independente de opção sexual, assim igualando as relações homoafetivas à união

estável, prevista pela CRFB/88.

Assim entende-se que a adoção homoparental é possível sim,

pois seu fundamento encontra-se disposto na CRFB/88, bem como em princípios

como o da afetividade, solidariedade e pluralidade de famílias.

Segunda hipótese: É função fundamental do instituto da

adoção o benefício do menor, devendo ser essa concedida apenas quando não

restar dúvidas das reais vantagens ao adotando.

Confirmada. A função fundamental do instituto da adoção sem

dúvida alguma é o benefício do menor, e esta apenas deve ser concedida quando

não se restar dúvidas das reais vantagens ao adotando.

Essa situação tem preponderância no âmbito da adoção, uma

vez que é justamente nessa situação que muitas decisões favoráveis à adoção

homoaprental se baseiam, sendo essas de uma real vantagem para o adotante,

levando-se dessa forma em conta que muito melhor para o menor se torna estar

numa família que lhe dê amor, carinho, atenção, assistência do que jogado nas ruas

ou até em abrigos, onde não haverá o crescimento do menor em um seio familiar.

Para tanto verificou-se no trabalho que justamente para essa

análise é necessário um grupo de profissionais para averiguarem de perto essa

situação, ou seja, as reais condições materiais e morais que um casal de

homoafeivos tem a fornecer a uma criança ou adolescente.

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Por todo o exposto, ficou demonstrado que casais

homoafetivos têm o mesmo direito a concorrer à adoção como casais

heterossexuais, uma vez que dessa forma será respeitada a dignidade da pessoa

humana.

Mesmo com a inovadora “interpretação conforme” do STF (ADI

4.277) ainda falta para que os homoafetivos possam fazer jus a todos os seus

direitos no sistema jurídico brasileiro. Porém mesmo faltando, tal decisão servirá de

embasamento para muitas decisões daqui para a frente por ser tal interpretação da

mais pura justiça. Negar apreciação do poder judiciário para relações fundadas no

afeto, torna-se ato completamente discriminatório.

Assim, conclui-se que cada caso é um caso específico,

devendo cada um ser analisado pelos julgadores em sua concretude. Ou seja,

analisando-se as vantagens ao adotando e o tipo de relação afetiva em que se

encontra o casal de homossexuais.

Mais importante é ter-se em mente que o preconceito deve ser

deixado de lado, abrindo-se assim os olhos para a solução de um problema social, e

não a alimentação de uma discriminação com o próximo.

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