[a] ignorância no atacado - quem tem medo de que nossos jovens saibam

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pdfcrowd.com open in browser PRO version Are you a developer? Try out the HTML to PDF API Ignorância no atacado - Quem tem medo de que nossos jovens entendam Filosofia e Sociologia? Por LEJEUNE MATO GROSSO XAVIER DE CARVALHO Sociólogo, professor de Sociologia e Ciência Política da Universidade Metodista de Piracicaba – Unimep e presidente da Federação Nacional dos Sociólogos – Brasil – FNSB Na edição 164 da revista Época, o Sr. Olavo de Carvalho, um de seus colunistas, no artigo intitulado "Filósofos a Granel", desferiu ataques à luta que a Federação Nacional de Sociólogos desenvolve para aprovar no Senado o Projeto de Lei 9/00 do deputado Padre Roque (PT/PR), que dá nova redação ao artigo 36 da LDB, que prevê que todas as escolas de Ensino Médio no Brasil assegurem a seus educandos o direito de adquirir conhecimentos de Filosofia e Sociologia. A maioria dos senadores, inclusive, já se posicionou de público favoravelmente ao Projeto. O artigo mencionado faz ataques eivados de pobre ironia. Questiona o ensino das duas disciplinas. Mas de que argumentos o articulista se utiliza? Nenhum, ao que se pode depreender. Ele se propõe a discutir desde já quem irá lecionar essas duas disciplinas ou ainda o que será lecionado. É como se tivéssemos que fazer uma escolha entre o bom e o ótimo, e se não podemos ter um ensino ótimo, nem o bom deveríamos ter. Isso é uma falácia. Esse filósofo articulista apenas deixa claro que existe um medo do ensino dessas disciplinas. Mas qual medo? Por que nossos jovens não podem ter acesso a determinados conhecimentos, a eles e à maioria do povo negados em nossas escolas? A resposta é óbvia. Sabemos que quanto mais ignorante for a nossa juventude, melhor será para as elites que dominam este país há séculos. Fazer com que nossa juventude reflita sobre temas tão importantes como a ética, a política, a moral, os costumes, porque existem pobres e ricos, modos de produção, é algo que, no conceito desse articulista deve

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Ignorância no atacado - Quem tem medo de que nossos jovens entendamFilosofia e Sociologia?

Por LEJEUNE MATOGROSSO XAVIER DECARVALHO

Sociólogo,professor deSociologia e CiênciaPolítica daUniversidadeMetodista dePiracicaba –Unimep epresidente daFederação Nacionaldos Sociólogos –Brasil – FNSB

Na edição 164 da revista Época, o Sr. Olavo de Carvalho, um de seus colunistas, no artigointitulado "Filósofos a Granel", desferiu ataques à luta que a Federação Nacional deSociólogos desenvolve para aprovar no Senado o Projeto de Lei 9/00 do deputado PadreRoque (PT/PR), que dá nova redação ao artigo 36 da LDB, que prevê que todas as escolasde Ensino Médio no Brasil assegurem a seus educandos o direito de adquirir conhecimentosde Filosofia e Sociologia. A maioria dos senadores, inclusive, já se posicionou de públicofavoravelmente ao Projeto.

O artigo mencionado faz ataques eivados de pobre ironia. Questiona o ensino das duasdisciplinas. Mas de que argumentos o articulista se utiliza? Nenhum, ao que se podedepreender. Ele se propõe a discutir desde já quem irá lecionar essas duas disciplinas ouainda o que será lecionado. É como se tivéssemos que fazer uma escolha entre o bom e oótimo, e se não podemos ter um ensino ótimo, nem o bom deveríamos ter. Isso é umafalácia. Esse filósofo articulista apenas deixa claro que existe um medo do ensino dessasdisciplinas. Mas qual medo? Por que nossos jovens não podem ter acesso a determinadosconhecimentos, a eles e à maioria do povo negados em nossas escolas?

A resposta é óbvia. Sabemos que quanto mais ignorante for a nossa juventude, melhor serápara as elites que dominam este país há séculos. Fazer com que nossa juventude reflitasobre temas tão importantes como a ética, a política, a moral, os costumes, porqueexistem pobres e ricos, modos de produção, é algo que, no conceito desse articulista deve

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ficar restrito a uma minoria de iluminados. Na Idade Média, o saber só poderia serapropriado por filhos dos nobres e ainda assim, isso ocorria apenas em mosteiros e abadias.Ao povo, como sempre, nega-se a possibilidade do acesso ao conhecimento. É isso o quepropõe o tal filósofo?

No Brasil, certas melhorias no ensino sempre ficaram restritas à boa vontade de certosgovernantes mais progressistas. Desde o início da República no século XIX, a Sociologia e aFilosofia sempre fizeram parte dos currículos das escolas de Ensino Médio (antigo 2º grau).Vários Estados brasileiros já adotam as duas disciplinas em suas escolas, seja por exigênciada sua Constituição Estadual, seja por Lei aprovada pela Assembléia Legislativa ou aindapor decisão da Secretaria de Educação. Estudar essas disciplinas não era novidade paramilhões de jovens. Na verdade, nossa juventude só deixou de estudar essas matériasdepois que o regime militar de 1964 as substituiu por Educação Moral e Cívica e OSPB, detão triste memória, numa tentativa de impor uma visão unívoca e distorcida da realidade.

Há hoje uma tendência a incentivar que as pessoas possuam um pensamento lógico eracional, que facilite a elas decifrar o mundo em que vivem e que saibam responder o queSofia descobriu em seu mundo: de onde viemos e para onde vamos? Por que as coisas sãoassim? Poderiam ser diferentes?

É claro que se o Senado aprovar o PL 9/00, a ser votado no dia 28 de agosto, significará oinício de uma etapa para a educação nacional e a realização de um antigo sonho de todosos que defendem um ensino médio progressista, científico e humanista. E não estamossozinhos nessa luta. Entidades de cientistas, professores, sociólogos, estudantes, jovens,sindicalistas e tantas outras também estão conosco nessa caminhada. Os obscurantistas,que gostam do período das trevas e dela devem se sentir órfãos defenderão o contráriocom todas as suas armas.

Achamos uma lástima que um filósofo dito aristotélico e kantiano ao invés de estar falandode "filósofos a granel", acabe por pregar a ignorância no atacado.

LEJEUNE MATO GROSSO XAVIER DE CARVALHO