a formação dos formadores: um encontro com as práticas

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO FACULDADE DE EDUCAÇÃO A formação dos formadores: um encontro com as práticas discursivas de sujeitos tutores e professores Adriana Barbosa Soares Rio de Janeiro 2012

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Page 1: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

A formação dos formadores: um encontro com as práticas

discursivas de sujeitos tutores e professores

Adriana Barbosa Soares

Rio de Janeiro

2012

Page 2: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

A formação dos formadores: um encontro com as práticas

discursivas de sujeitos tutores e professores

Adriana Barbosa Soares

Dissertação apresentada à Faculdade de Educação da

Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte

dos requisitos necessários à obtenção do título de

Mestre em Educação. Linha de pesquisa: Currículo e

Linguagem

Orientador: Profª. Dr ª. Ludmila Thomé de Andrade

Rio de Janeiro

2012

Page 3: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

Adriana Barbosa Soares

A formação dos formadores: um encontro com as práticas discursivas de sujeitos tutores

e professores

Dissertação apresentada à Faculdade de Educação da

Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte

dos requisitos necessários à obtenção do título de

Mestre em Educação. Linha de pesquisa: Currículo e

Linguagem

Banca Examinadora

______________________________________________

Profª. Drª. Ludmila Thomé de Andrade – Orientadora

Universidade Federal do Rio de Janeiro

______________________________________________

Profª. Drª. Carmen Diolinda da Silva Sanches Sampaio

Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

______________________________________________

Prof°. Drª. Ana Maria Ferreira da Costa Monteiro.

Universidade Federal do Rio de Janeiro

______________________________________________

Prof°. Drª. Daniela de Oliveira Guimarães

Universidade Federal do Rio de Janeiro

______________________________________________

Prof°. Drª. Adrianne Ogêda Guedes

Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

Page 4: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

(...) a leitura da palavra é sempre precedida da leitura de mundo. E aprender a ler, a

escrever, alfabetizar-se é, antes de mais nada, aprender a ler o mundo (...)

Paulo Freire

Page 5: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

Com o tempo descobriu que escrever seria

o mesmo que carregar água na peneira...

O menino aprendeu a usar as palavras.

Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.

E começou a fazer peraltagens...

A mãe falou:

Meu filho você vai ser poeta.

Você vai carregar água na peneira a vida toda...

Você vai encher os

vazios com as suas

peraltagens

e algumas pessoas

vão te amar por seus

despropósitos...

Manoel de Barros

A todos os educadores que enchem as escolas com suas peraltagens, que em

diversos momentos carregam água na peneira.

Page 6: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

Agradecimentos

À Professora Ludmila Thomé, minha orientadora, que me abriu as portas do campo da

linguagem, e que tem na interlocução uma ferramenta na sua arte de ensinar;

À Professora Ana Maria Monteiro, uma interlocutora que apresentou o campo da

formação de professores, os saberes docentes, nos convidando sempre a refletir sobre

nossas ações e fazeres;

Aos Professores do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal

do Rio de Janeiro, pelo trabalho realizado, contribuindo com a minha formação como

pesquisadora do campo da Educação. Em especial à Professora Patrícia Corsino que me

iniciou nas leituras de Walter Benjamin;

Agradeço, também, à Solange e sua equipe, profissionais da Secretaria do PPGE/UFRJ,

pelo cuidado, atenção e acolhida, sempre prontos para contribuir;

Aos colegas do PPPGE, em especial aos companheiros do LEDUC, interlocutores

atentos e acolhedores;

À Mônica Pinheiro por seu incentivo, disponibilidade e generosidade no compartilhar

conhecimentos e experiências de forma única e singular;

Aos interlocutores que carregamos e nos constituem ao longo da vida, em especial

amigos e colegas da antiga Diretoria de Educação Fundamental da Secretaria Municipal

de Educação da Cidade do Rio de Janeiro, grupo que contribuiu com tantas

aprendizagens constituídas na interlocução com professores das diferentes áreas de

conhecimento. Um agradecimento especial a Ana Lúcia de Moraes Barros, Cláudia

Martins, Evanilda Negreiros e Maria de Fátima Barcellos, que muito me incentivaram

para a realização deste trabalho.

Um agradecimento fraterno e especial a minha grande amiga Ana Paula Taveira,

companheira de todas as horas, que me ensina todos os dias que é na interlocução que

nos constituímos;

Page 7: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

A todos os professores e funcionários da Escola Municipal Dr. Álvaro Alberto que

contribuíram de forma altamente generosa para que eu pudesse me tornar uma

Orientadora Educacional, meus sinceros agradecimentos a cada um de vocês;

A minha companheira Rosângela que ao longo desses anos, na parceria, fazendo a arte

de elaborar as práticas da formação continuada de professores, embarca comigo em

“viagens” que nós não sabemos aonde vão chegar, mas com seus “saberes da

experiência” ao aportar, observa, pensa e age, na parceria, no compartilhar, buscando

mais um novo plano de viagem;

A minha amiga Hilda Peixoto que me apresenta que escola também se faz na arte de

fazer à mão;

As minhas mais novas companheiras de trabalho, jornada que estou a iniciar no Colégio

de Aplicação, que já de início demonstram que parcerias acontecem no ato das relações;

A minha mãe Edmé e meu pai Edinôr, incentivadores incansáveis, parceiros de todas as

horas, que me ensinaram que na vida há sempre a possibilidade de começar de novo;

Aos meus irmãos, Leonardo, Luciana, Monica e Ivana, amigos-irmãos incansáveis nos

incentivos e nas escutas;

Aos meus queridos amigos, incansáveis nos incentivos e acolhimentos;

A minha grande e bela família Soares, a origem de tudo;

A Marco Antonio, companheiro que me ensina a todo momento, pelo ato de conviver

que as nossas conquistas e construções acontecem com incentivo, parceria e amor. Você

é meu mar, meu amor, meu mar;

A todos os professores, com os quais trabalho e já trabalhei, agradeço os diálogos sobre

as “suas salas de aula”, um “fazer” que muitas vezes expõe e propõe tantos desafios;

A todos os formadores que contribuíram de forma contundente e marcante na minha

formação continuada como formadora de professores, em particular Regina Célia que

me apresentou e foi uma grande educadora em meu percurso como formadora.

Page 8: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

RESUMO

SOARES, Adriana Barbosa. A formação dos formadores: um encontro com as

práticas discursivas de sujeitos tutores e professores. 172 p. Rio de Janeiro, 2012.

Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade Federal

do Rio de Janeiro, 2012

O objetivo desta dissertação consistiu em pesquisar o campo da formação continuada,

com foco nos sujeitos que ainda estão nos bastidores desse campo – formadores e

tutores-formadores. O campo de investigação foi o Programa Pró-Letramento de

Alfabetização e Linguagem, realizado com os municípios pertencentes ao Estado do Rio

de Janeiro. Organizado pelo Ministério da Educação, em parceria com as Universidades,

por meio da Rede Nacional de Formação de Professores, o programa cria espaços de

formação continuada para tutores-formadores e para professores dos anos iniciais do

ensino fundamental. A pesquisa se propôs a investigar, em um primeiro momento, o

planejamento da formação continuada de tutores-formadores, elaborado nas reuniões

dos formadores do LEDUC/FE/UFRJ. Em uma segunda instância, analisei os encontros

da formação continuada para tutores-formadores e ainda um terceiro espaço, a formação

continuada para professores dos anos iniciais, com foco no tutor-formador. Em cada

espaço constituído de formação continuada, o objetivo consistia em identificar as

possíveis interlocuções, constituídas a partir do planejamento dos formadores.

Compreendendo os caminhos que constituem a pesquisa qualitativa em educação, os

autores de referência dessa pesquisa foram Mikhail Bakhtin (1926, 1997, 2003) e

Walter Benjamin (1995), que se revelaram autores fundamentais na construção teórico-

metodológica de todo o trabalho. A estes, acresceu-se uma perspectiva discursiva da

linguagem, que propõe um olhar para o campo da formação de professores no que se

refere aos enunciados constituídos no ato da formação pelos discursos expressos por

formadores, tutores-formadores e professores. O encontro de indícios presentes nas

interlocuções, constituídas no ato da formação continuada, em um primeiro momento,

entre formador e tutores-formadores, e, em um segundo momento, entre tutor-formador

e professores do ensino fundamental, se realiza, indicando que há um caminho de

investigação sobre esses espaços. Os temas analisados, selecionados pelos formadores

de professores, apresentam sinalizações que contribuem na construção da posição dos

sujeitos integrantes desse espaço. Pistas indicaram que tais interlocuções anunciam um

campo de investigação sobre os saberes dos formadores e dos tutores-formadores e a

construção de um currículo para a formação desses profissionais.

Palavras- Chave: Formação Continuada de Professores Alfabetizadores. Formador de

Professor. Alfabetização. Letramento. Discursos.

Page 9: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

ABSTRACT

SOARES, Adriana Barbosa. The training of trainers: an encounter with the

discursive practices of subject tutors and teachers. 172 p. Rio de Janeiro, 2012.

Dissertation (Master in Education)- Faculdade de Educação, Universidade Federal do

Rio de Janeiro, 2012

The goal of this dissertation consisted in researching the field of continuing education,

with a focus on subjects that are still behind the scenes of this field -trainers and -tutor-

teachers. The field of research was the Pro-literacy of Literacy and Language,

performed with the municipalities belonging to the State of Rio de Janeiro. Organized

by the Ministry of Education, in partnership with universities, through the National

Network of Teacher Training, the program creates spaces of continuing training for

trainers and tutor-teachers of the first grades of elementary school. The research set out

to investigate, at first, the planning of continuing education of tutor-teachers, prepared

during the meetings of the teachers from LEDUC/FE/UFRJ. In a second instance, the

meetings for continued training for trainers and tutors were analyzed-yet a third space,

the continuing training for teachers from the first grades, with a focus on tutor-teachers.

In each space consisting of continuing training, the goal was to identify possible

interlocutions, constituted from the planning of the trainers. Understanding the paths

which constitute the qualitative research in education, the reference authors of this

research were Mikhail Bakhtin (1926, 1997, 2003) and Walter Benjamin (1995), who

proved to be fundamental authors in the theoretical-methodological construction of this

entire work. To these, a discursive perspective of language was added, which offers a

view into the field of teacher training in respect of statements made in the act of training

by the speeches expressed by trainers, tutor-teachers and teachers. The gathering of

evidence present in the interlocutions established at the continuing education act, at a

first moment, between trainer and tutors-trainers, and, at a second moment, between

tutor-teacher and elementary school teachers, is carried out, indicating that there is a

path of investigation into these spaces. The themes analyzed, selected by teacher-

trainers, are signs that contribute to the construction of the position of the subject

members of that space. Clues indicated that such interlocutions announce a field of

research on the knowledge of trainers and tutor-teachers and the construction of a

syllabus for the training of these professionals.

Keywords: Continuing Training of Literacy Teachers. Teacher trainer. Literacy.

Literacy Program. Discourse.

Page 10: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

SUMÁRIO

1 PUXANDO OS FIOS NA CONSTRUÇÃO DO BORDADO: TECENDO O

OBJETO

12

1.1 Os caminhos da formação continuada de uma formadora: fios que se

tecem

13

1.1.1 As tramas tecidas nas experiências profissionais 15

1.1.2 Aproximações com o campo de pesquisa e o percurso na construção do

objeto

19

1.1.3 Contornos e desenhos do objeto da pesquisa 24

1.2 As nuances em torno dos processos de alfabetização: os tons dos

professores, as cores dos métodos e as possíveis laçadas dos formadores

26

1.2.1 A arte de exercitar um olhar exotópico sobre os processos 29

1.2.2 O fio do formador 36

1.2.3 Provisórios arremates... Fios soltos para novas tramas nos encontros da

formação continuada... Juntando os fios...

42

1.3 O programa do Pró-letramento: mais um fio na trama da formação

continuada de professores dos anos iniciais do ensino fundamental

44

1.3.1 Uma breve apresentação sobre a Rede de Formação e o Programa Pró-

Letramento

48

1.3.2 Compreendendo a estrutura do Programa do Pró-Letramento 51

1.3.3 O processo de formação continuada 54

1.4 O percurso da pesquisa 56

2 CAMINHOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS: TECENDO OS

BORDADOS E CRIANDO POSSÍVEIS LAÇADAS

58

2.1 Mikhail Bakhtin: encontrando com o fio da exotopia na interlocução com

sujeitos

59

2.2 Carlo Ginzburg: rastros e indícios de uma trama: os desafios do

paradigma indiciário

70

2.3 Walter Benjamin: alguns indícios nas narrativas das experiências dos

sujeitos

74

Page 11: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

2.3.1 Algumas nuances benjaminianas – narrativas e experiências 77

2.3.2 Reminiscências sobre encontros de formação continuada 82

3 O CAMPO DA FORMAÇÃO CONTINUADA: AS DIFERENTES PARTES

DE UM BORDADO

89

3.1 Apresentando os contornos e desenhos do campo da pesquisa 90

3.2 A formadora Luiza 97

3.2.1 Quantos nomes recebe um tutor-formador? 104

3.2.2 Interlocuções sobre formação, formador, práticas 108

3.2.3 Memórias, cadernos, lembranças da escola, registros... reminiscências em

encontros de formação

113

3.2.4 Memórias da entrada na escola 119

3.2.5 A função do tutor-formador 122

3.3 A Tutora-Formadora 127

3.3.1 O primeiro encontro: apresentações, memórias, registros, cadernos 138

3.3.2 Papel da escola, função do professor, alfabetizar e letrar 142

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 150

5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 156

ANEXO – Planejamento da Semana de Formação do Pró-Letramento 160

Page 12: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 O mural de lembranças dos tutores-formadores............................................114

Figura 2 Os cadernos ornamentados.............................................................................115

Figura 3 O fazer à mão dos tutores-formadores...........................................................116

Figura 4 Os sentidos e singularidades de cada tutor-formador....................................117

Figura 5 O lugar da formação do Pró-Letramento em Queimados..............................131

Figura 6 O espaço interno – materiais para uso dos professores..................................132

Figura 7 O espaço para exposição de trabalhos dos professores..................................133

Figura 8 Produções dos professores na formação do Pró-Letramento.........................133

Figura 9 Grupo de professores assistindo a um vídeo na formação.............................132

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Calendário das reuniões.................................................................................93

Quadro 2 Planejamento da primeira semana.................................................................99

Quadro 3 Planejamento da segunda semana................................................................100

Quadro 4 Planejamento da terceira semana.................................................................101

Quadro 5 Nomeação atribuída ao tutor-formador........................................................107

Quadro 6 Planejamento da tutora-formadora...............................................................135

Page 13: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

12

1 PUXANDO OS FIOS NA CONSTRUÇÃO DO BORDADO: TECENDO O

OBJETO

Linha clara, para começar o dia. Delicado do traço cor da luz, que ela ia

passando entre os fios estendidos, enquanto lá fora a claridade da manhã

desenhava o horizonte. (COLASANTI, 2004).

A experiência que passa de pessoa a pessoa é a fonte a que recorrem todos os

narradores (BENJAMIN, 1994:198). Ao narrá-las aqui, considero que essa narrativa

cria representações para além do conhecimento científico mensurável, apresenta

significados culturais, passados muitas vezes nas tradições construídas nos espaços de

formação. Sendo assim, apoiada em Benjamin (1994:198), considero que cada

profissional que construiu experiências em espaços de formação pode ser considerado

um viajante que tem muito a contar.

Para iniciar este trabalho, que está vinculado ao Laboratório de Estudos da

Linguagem, Leitura, Escrita e Educação – LEDUC –, que pertence ao Programa de Pós-

Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de

Janeiro, apresento como objetivo central investigar um tutor-formador do Programa

Pró-letramento1 em suas práticas discursivas, buscando indícios do campo do seu

letramento profissional constituídos por meio dos enunciados nos/pelos discursos a

partir das participações em espaços de formação continuada. Decido, então, em um

primeiro momento, compartilhar fragmentos de memórias sobre trabalho em espaços da

formação continuada para professores do ensino público, considerando que essa

1Programa Pró-Letramento é um programa do Ministério da Educação que consiste em organizar

formações continuadas para professores dos anos iniciais do ensino fundamental no que se refere ao

campo da leitura, escrita e matemática. Este acontece em parceria com universidades que integram a Rede

Nacional de Formação Continuada buscando a adesão de estados e municípios.

Page 14: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

13

apresentação pode ser ponto de partida pertinente para desenhar a relevância do projeto

aqui apresentado.

1.1 Os caminhos da formação continuada de uma formadora: fios que se tecem

Constituí a minha formação inicial a partir destas escolhas: tornei-me professora

dos anos iniciais do ensino fundamental e graduei-me em Pedagogia, com especialidade

em orientação educacional. Optei, assim, por um dos grandes desafios que permeavam a

Educação em meados dos anos 80 e início dos anos 90: a importância de superar os

altos índices de repetência e a convocação para que nós, educadores, ensinássemos

todos a ler e a escrever – tema recorrente no cotidiano das salas de aula. Os ecos dessas

discussões reverberam desde então no compromisso com uma educação que ensine os

alunos a ler e a escrever.

Meu encontro profissional com a docência aconteceu de forma significativa na

entrada para a rede municipal do Rio de Janeiro. O trabalho com grupos ainda não

alfabetizados e rotulados pela escola como “alunos com problemas de aprendizagem” se

constituía em um princípio de organização das turmas. A entrada para o campo

profissional exigiu de mim não somente ter um compromisso com os processos

escolares dos alunos, como também marcar posições políticas sobre as expectativas de

aprendizagem dos alunos e ensiná-los a ler e a escrever o mundo, parafraseando Paulo

Freire (1996).

As experiências profissionais se ampliaram e, paralelamente, um novo lugar se

inaugurou, quando entrei para a rede municipal de Duque de Caxias, na função de

orientadora educacional. A necessidade e a urgência de considerar o diálogo com os

docentes para o desenvolvimento do trabalho da orientação educacional tornou-se algo

Page 15: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

14

imprescindível. Em conversas, escutava suas impressões, angústias, conquistas,

dúvidas, enfim, discursos que constituíam o universo de um outro personagem que

compõe a cena da sala de aula: o professor.

O movimento de escuta me convocou a dialogar com os temas que

apresentavam. Questões em torno da importância de espaços para estudos e

planejamentos no cotidiano das escolas se faziam presentes de forma constante em seus

discursos. Há espaços para professores refletirem e dialogarem sobre suas práticas

escolares no cotidiano da escola? Como a escola trabalha com os desafios vividos pelos

professores no que se refere aos processos de ensino e aprendizagem dos alunos? Quem

são os interlocutores dos professores no diálogo sobre os desafios vividos? Como

trabalhar com e sobre os discursos dos professores?

Essas questões são os desafios que me acompanham em minha trajetória

profissional, apontando não somente necessidades de respostas, mas também

provocações para novas perguntas e criando novos espaços de estudos, como o interesse

pelo campo da formação de professores.

Proponho, então, uma aproximação com a epígrafe de Colasanti (2004) ao

reconhecer o ato de tecer ao tear uma possível representação do ato de narrar memórias

da minha formação inicial e do começo da carreira profissional. A narrativa evoca um

mar de imagens, lembranças, memórias de um tempo vivido. Ao escrevê-las, acontece

como em um bordado: as linhas, fragmentos da memória, vão se tecendo; o texto vai se

formando.

A trama do bordado cria desenhos nos desafios no processo de alfabetização,

realça fios como os compromissos sociais no ato da docência, marca nuances ao

reconhecer a importância da alfabetização, recria novos contornos ao reconhecer os

Page 16: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

15

discursos dos professores, deixa fios soltos ao considerar os desafios para a formação

dos docentes nos contextos escolares. O ato de tecer tramas ao tear se torna uma

imagem representativa do ato de narrar fragmentos de memórias sobre o percurso

profissional no campo da formação de professores. As narrativas de algumas

experiências, dentre tantas constituídas ao longo da carreira, são fundamentais ao

diálogo a que me proponho realizar entre tais narrativas e o objeto de investigação.

1.1.1 As tramas tecidas nas experiências profissionais

Trabalhei desde 1997 no departamento pedagógico, na Secretaria Municipal de

Educação do Rio de Janeiro – SME/RJ. Paralelamente, desde 1995, trabalhava como

orientadora educacional da rede municipal de Duque de Caxias em escola de ensino

fundamental. Atualmente sou orientadora educacional do Colégio de Aplicação da

Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Ao escolher narrar alguns fragmentos de memórias nas ações de formação com

os docentes, aproximo-me das narrativas e as tomo como constituintes das minhas

experiências profissionais. Dentre elas, apresento as que se relacionam com o objeto de

pesquisa: o tutor-formador de professores.

Segundo Benjamin (1994), o ato de narrar fragmentos de memórias organiza e

inicia a formação de uma cadeia da tradição, cujos acontecimentos narrados serão

transmitidos de geração a geração, tecendo-se, então, uma rede de narrativas. Sendo

assim, as reminiscências que compartilharei nesta pesquisa comporão um dos tantos fios

que formam a cadeia de tradição das práticas na formação de professores.

Na SME/RJ, nos anos 2000, formou-se um grupo com os profissionais de

diferentes equipes do departamento pedagógico com o objetivo de realizar encontros

com os professores dos anos iniciais do ensino fundamental. A proposta para essa ação

Page 17: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

16

consistia em discutir com os professores dos anos iniciais do ensino fundamental os

processos de alfabetização, leitura e escrita.

A convocação para tal ação provocou a necessidade de um deslocamento da

posição de professora, integrante de uma equipe, para o lugar de responsável por um

grupo de professores em formação. O cotidiano dos professores começava a se tornar

um desafio no que se refere a compreender e a investigar o universo das salas de aula a

partir de um lugar externo: a posição de formadora de professores.

No decorrer do trabalho de formação de professores, iam-se configurando

elementos que indicavam ações das formações. Dentre eles, a heterogeneidade dos

contextos escolares; as demandas que os professores apresentavam sobre o processo de

aprendizagem dos alunos e os questionamentos sobre os conhecimentos apresentados

nas pautas das formações.

O processo no trabalho da formação continuada consistia em três partes: em um

primeiro momento, encontros para planejar as formações dos professores; em um

segundo momento, a realização dos encontros; e, finalmente, o retorno para o grupo de

formadores da SME/RJ, apresentando cada um o processo de seu grupo de docentes.

Recordo-me do grupo pelo qual fui responsável. Expressava de forma constante

o não atendimento às suas expectativas nas atividades trabalhadas nos encontros.

Questionava os conhecimentos abordados e as relações destes com os processos de

aprendizagem dos alunos. A presença de falas sobre as questões das “dificuldades de

aprendizagem” dos alunos acontecia de forma recorrente.

Essas reflexões indicavam um descompasso entre as propostas elaboradas pela

equipe da SME/RJ e as necessidades e anseios dos docentes no que se refere ao

universo das salas de aula sobre os conhecimentos de alfabetização, leitura e escrita. Em

outras palavras, os conhecimentos julgados fundamentais pela SME/RJ na composição

Page 18: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

17

dos encontros para os professores alfabetizadores encontravam-se em dissonância com

os que os docentes consideravam importantes para o desenvolvimento do trabalho com

os alunos no cotidiano escolar. Questionamentos me acompanham nesse percurso,

dentre eles: Como os professores trabalhavam com os conhecimentos científicos

apresentados nos espaços de formação de professores? Como os formadores de

professores trabalhavam com os saberes trazidos pelos docentes em seus planejamentos

para as ações de formação continuada?

Paralelamente, a atuação como orientadora educacional no cotidiano escolar se

caracterizava por uma proximidade com os professores, especialmente os que

trabalhavam com o processo inicial da alfabetização. Os interesses expressos por eles

ofereciam um terreno fértil para conversas sobre o cotidiano da sala de aula. Buscava

compreendê-los com uma escuta sensível sobre as atividades e dificuldades que

relatavam. Contudo, naquele momento, apesar da escuta atenta, ainda compreendia que,

para atender aos professores, seria necessário “ensinar” determinados conteúdos para

todos. Sendo assim, planejava encontros com eles com as informações, que, a meu ver,

“supostamente” desconheciam.

A participação dos docentes nos encontros para estudos no ambiente escolar se

transparecia em: silêncios, discordâncias, recusas, angústias, parciais aceitações. Tais

atitudes eram evidenciadas, muitas vezes, de forma hostil pelos responsáveis dos

encontros. O trabalho com esses professores se tornava um grande desafio para mim, a

orientadora educacional, convocando-me a encontrar caminhos de aproximação com

suas práticas e, de alguma forma, reconhecendo o tema da alfabetização como uma

possibilidade de interlocução.

Com esses desafios constituindo as minhas reflexões, inicio uma busca por um

curso de especialização com o objetivo de estudar o tema alfabetização. Encontro o

Page 19: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

18

Curso de Especialização Saberes e Práticas da Educação Básica, focalizado sobre o

tema curricular da Alfabetização, Leitura e Escrita, oferecido a professores do ensino

básico das escolas públicas, na Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio

de Janeiro – LEDUC2 – CESPEB

3. Encontro, então, um espaço para refletir e discutir as

práticas sobre o ensino da leitura e da escrita com os docentes do ensino público.

No decorrer dos encontros, revelaram-se indagações sobre as diferentes posições

discursivas constituídas no espaço da sala de aula. Reflexões como: O que falam os

professores? Para quem falam? Em paralelo com reflexões sobre: O que propõem as

professoras/formadoras nas aulas? Como encaminham as propostas considerando os

professores sujeitos interlocutores daquele espaço? O que dizem a partir das falas dos

professores? Reflexões sobre esses sujeitos, seus discursos e posicionamentos na arena

da sala de aula foram revelando, pouco a pouco, meu lugar de formadora de professores.

Nesse espaço, encontro um grupo de professoras/pesquisadoras que reconhece

academicamente professores e formadores de professores como sujeitos fundamentais

na constituição dos espaços de formação continuada.

Ao participar dessa especialização, descubro um modo de formar professores

que me encanta. A busca por um diálogo com e para os docentes é um dos princípios

que organizam esse curso de especialização. O processo de formação continuada

considera a perspectiva discursiva como uma das suas âncoras. Assim, o foco de meus

estudos construídos ao longo dessa formação se desloca da posição de professora para o

lugar de formadora de professores. Encontro nos estudos acadêmicos o reconhecimento

sobre a posição de formador de professor, função que já realizava, contudo, sem a

validação da posição profissional deste sujeito.

2 O Laboratório de Estudos de Linguagem, Leitura, Escrita e Educação – LEDUC - pertence à Faculdade

de Educação da UFRJ e está vinculado à Linha de Pesquisa Currículo e Linguagem, do Programa de Pós-

Graduação.

3 O curso de especialização para professores do ensino público – CESPEB - de Alfabetização, Leitura e

Escrita é realizado pela Faculdade de Educação da UFRJ.

Page 20: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

19

1.1.2 Aproximações com o campo de pesquisa e o percurso na construção do objeto

Até aqui reconheço, nas minhas memórias e reflexões, reminiscências

(BENJAMIN, 1994) de um tempo histórico em que constituí meu percurso profissional.

Ao narrar minhas memórias profissionais, crio novos sentidos e significados sobre as

situações profissionais, ganhando, então, contornos e limites na construção do problema

de pesquisa sobre o tutor-formador.

Considero que se faz importante, em um primeiro momento, antes de refletir

sobre questões que circulam em torno de tal profissional, ainda que breve, apontar

questões em torno do campo da formação continuada dos professores. Kramer, sobre

esse tema, afirma que:

(...) diversos são os termos que circulam nas redes públicas ou privadas, nas

creches, pré-escolas e escolas: “formação permanente” (nome mais antigo),

“formação continuada” (consagrado pela lei), “formação em serviço”

(denominação que preferimos por sua clareza, por se referir à formação de profissionais que já trabalham), “capacitação” (que traz a ideia de dar algo

para aqueles que seriam incapazes) ou “reciclagem” (de todos, o pior, por

sugerir que os profissionais podem se descartar da história passada, da

experiência vivida e começar tudo de novo).(KRAMER, 2008:218).

Identificar nomeações que constituem o campo permite marcar algumas das

perspectivas e terminologias utilizadas na esfera da formação docente. Ainda que cada

uma se situe em um tempo e em um contexto histórico distinto, a permanência das

nomeações é recorrente nas diferentes redes públicas de ensino. A diversidade de

nomeações parece exigir a escolha por um dos termos, e, assim, escolho o termo

“formação continuada” por este estar mais fortemente presente na legislação (LDB

9394/96).

As minhas experiências profissionais apontam que o formador de professor é

uma função presente e atuante nos cotidianos das gestões públicas, embora sem um

Page 21: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

20

lugar constituído de forma profissional. Esse profissional está nas instâncias da rede

pública de ensino, convidado e/ou convocado para realizar ações com os professores,

ainda que não exista um reconhecimento profissional e uma formação continuada que

contribuam para o desenvolvimento da função.

Na busca por compreender melhor as práticas dos profissionais que trabalham

com professores, Andrade (1997) nos provoca com o título de seu texto – Procura-se

um Formador – anunciando que, naquele período da década de 1990, já se fazia

necessário buscar tal profissional.

Nesse mesmo artigo, a autora aponta, ainda, que cabe aos formadores, aos

“professores inovadores”, que assumem trabalhos de formação continuada nas

secretarias de educação, a tarefa de se responsabilizar por mais esse espaço dentre tantas

ações que já realizam. Refere-se aos profissionais que trabalham nas secretarias de

educação, reconhecendo-os como responsáveis pela formação dos professores e indica

que o aprofundamento dos estudos se torna responsabilidade de cada um.

A escuta atenta sobre os discursos que docentes realizavam nos encontros de

formação continuada me instigou a identificar os temas recorrentes no campo da

formação. Colocava-me diversas questões sobre o campo, como: Quem são os

profissionais que trabalham nas formações continuadas dos professores? Quem são os

responsáveis pela formação desses formadores de professores? Há temas e/ou conceitos

que são específicos para uma formação de formadores de professores? Quais temas e

conceitos são fundamentais para esse processo?

A aproximação com o Programa Pró-Letramento, criado pelo Ministério da

Educação em parceria com as universidades públicas - que têm como objetivo

contribuir, nas instâncias municipais, para a melhoria da qualidade dos processos de

ensino e de aprendizagem -, surgiu ao identificar a previsão na estrutura e organização

Page 22: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

21

do Programa a formação continuada para tutores. Esses profissionais têm a

responsabilidade de realizar a formação continuada para os professores dos anos iniciais

do ensino fundamental nas instâncias municipais.

O documento que estabelece os fundamentos teóricos atribuídos ao tutor, que

compõe o material do curso - intitulado Alfabetização e Linguagem. Formação de

Professores: Fundamentos para um Trabalho de Tutoria (Brasil, 2007) –, apresenta

como uma das atribuições para o profissional identificar o papel do orientador de

estudos como formador de professores e articulador do processo formativo. Para além

das terminologias criadas para nomear o profissional, o documento atribui ao tutor a

responsabilidade de realizar as ações de formação continuada para os professores dos

anos iniciais do ensino fundamental.

Um projeto de pesquisa exige contornos e limites. Dessa forma, então, situo-me

no campo da formação continuada dos professores dos anos inicias com a proposta de

investigar o processo de formação continuada realizado pelo Programa Pró-Letramento,

com o foco na formação continuada dos tutores.

Inicialmente, destaco que há uma preocupação em torno das nomeações que são

atribuídas a esse profissional. O documento que aborda os fundamentos para o trabalho

de tutoria apresenta diferentes terminologias para a função. Segundo Orofino (2010),

são estas: professor orientador, tutor, orientador de estudos, professor orientador,

formador, articulador, organizador e coordenador, educador e líder. A constatação

desse fato exige que neste trabalho se estabeleça a nomeação que será utilizada.

Coloco em cena mais uma vez o texto de Andrade (1997) - Procura-se um

Formador - por concordar com a sua hipótese de que os professores alçados a

formadores são os profissionais que realizam as ações de formação continuada para os

professores do ensino fundamental nas redes publicas de ensino. Constato que os tutores

Page 23: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

22

do Programa Pró-Letramento são professores das redes públicas que são alçados a

formadores, ainda que não recebam essa titulação. Segundo Snoeckx (2003), não há

uma formação prévia para o desempenho da função. Constroem-se as práticas de

formador simultaneamente às suas atividades relativas ao seu serviço e desempenha sua

função com o público adulto, os profissionais a serem formados. Porém, os conteúdos e

procedimentos de que se tratam nestas interações são destinados ao público infantil

(SNOECKX, 2003:31). Não se abordam modos de formação profissionais.

Identifico, então, que esse profissional, formador, tem aproximações com os

tutores que são matriculados no Programa Pró-Letramento. Decido designá-lo com o

título de tutor-formador. Diante de tantas ações para atender aos programas de

formação continuada dos governos, construo o objeto desta pesquisa, que designo como

o tutor-formador, e, assim, se instaura um sujeito de suma importância para os

processos de qualificação das práticas nos anos iniciais do ensino fundamental, que é

originalmente um professor.

Na elaboração dos espaços de formação continuada, professores e tutores-

formadores ocupam funções diferenciadas, mas de igual importância. Em virtude disso,

a pertinência desta pesquisa consiste em oferecer visibilidade a um profissional que

ainda está nos bastidores dos estudos acadêmicos, profissional de suma relevância para

as políticas públicas na formação continuada, ainda pouco analisado do ponto de vista

da pesquisa acadêmica.

Ao identificá-lo como sujeito de minha pesquisa, inserido em um Programa de

Formação para Professores dos anos iniciais do ensino fundamental – Pró-letramento –

faz-se necessário que se estabeleçam contornos e limites sobre o campo de investigação.

Instigada pelas experiências profissionais em torno dos conhecimentos

constituídos nos espaços de formação continuada entre professor e formador, as falas

Page 24: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

23

que cada um expressa no decorrer dos encontros se constituem como um campo de

interesse. As questões propostas por Andrade em outro de seus textos representam

algumas das tantas indagações que atravessam minhas reflexões:

Perguntamo-nos sobre os necessários ajustes a serem efetuados na relação

entre formadores e formados. Quais serão os diálogos possíveis? As

preocupações de cada um são equivalentes quando se trata da língua? Quais

são as representações que cada um faz do outro, seu interlocutor? Que

caminhos há ainda a ser trilhados para a formação docente sobre o ensino da

língua? (ANDRADE, 2007:127).

Reconhecer as constituições dos encontros da formação continuada,

identificando um interlocutor materializado e constituidor de uma identidade – o tutor-

formador - aproxima as observações que já circulavam minhas práticas na formação,

como formadora de professores.

Buscava, com uma escuta atenta, ouvir as falas dos professores sobre os

cotidianos de suas salas de aula e dialogar com elas, no entanto tantas perguntas e

situações ficavam sem respostas. Será que poderia existir um acabamento para cada

encontro, em que cada docente se sentisse contemplado e respondido em seus anseios?

Andrade (2007) afirma que, ao assumir uma concepção bakhtiniana para a

formação de professores, surge a necessidade de uma análise sobre os interlocutores que

constituem o espaço enunciativo. Ocupam lugares sócio-históricos distintos e

estabelecem no espaço enunciativo trocas de saberes. Assim, ao se estabelecer um

espaço no qual a linguagem se constitui e é constituída pelos interlocutores por meio

dos saberes que cada um carrega, cria-se um espaço discursivo na formação continuada

dos professores.

Nessa perspectiva, em diálogo com as questões abordadas por Andrade (2007),

estabelecem-se, como problema de pesquisa a ser enfrentado, questões em torno das

interlocuções constituídas nos espaços de formação continuada, desvelando alguns

enunciados constituídos/estabelecidos por professores e formadores nos

espaços/encontros de formação continuada.

Page 25: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

24

1.1.3 Contornos e desenhos do objeto da pesquisa

Para enfrentar tantas questões recorrentes nos encontros nas formações

continuadas, faz-se necessário indicar alguns contornos iniciais sobre o tema. As

dificuldades e entraves em torno da aprendizagem da leitura e da escrita apontadas por

Soares (2001) nos anos de 1980 anunciavam que as ideologias do dom, da deficiência

cultural e das diferenças culturais eram utilizadas para justificar o fracasso escolar.

Essas ideologias ainda deixam rastros em expressões como: incapacidade para

ajustar-se ao contexto escolar, a “pobreza cultural” criando desvantagens para os menos

favorecidos, o fracasso acontece pelas diferenças culturais entre os sujeitos, ou seja,

quem tem acesso aos bens culturais é beneficiado.

Mortatti (2010), em seus estudos, nos afirma que, desde o final do século XIX,

as ações coletivas voltadas para as garantias dos direitos sociais, políticas públicas eram

implementadas na busca de inserir os não alfabetizados na cultura escrita e também de

criar meios eficientes para implementar as ações de inclusão. A autora ainda continua e

nos apresenta que essas posições eram apresentadas como aspectos neutros e técnicos,

correspondendo à verdade científica e inquestionável.

As questões em torno das justificativas sobre a não aprendizagem da leitura e da

escrita, a luta pelos direitos de acesso e permanência na escola e a discussão sobre os

conhecimentos teóricos como recursos técnicos para a superação das dificuldades

encontradas nas escolas são temas recorrentes nos encontros de formação continuada

dos professores dos anos iniciais do ensino fundamental.

Assim, busco identificar as interlocuções entre os sujeitos participantes do

espaço da formação continuada – professores e tutor-formador -, desenhando alguns

Page 26: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

25

contornos possíveis sobre os temas mais recorrentes no espaço, com destaque para as

discussões sobre processo de aprendizagem da leitura e da escrita. (ANDRADE, 2010).

A proposta consiste em investigar o campo da formação continuada abordando

do ponto de vista do tutor-formador, profissional que tem sido convocado a ser um

interlocutor no processo de formação continuada. Soligo, Grandin, Alexandrino (2008)

o definem da seguinte forma:

Professor-formador é, em geral, recrutado entre os professores presentes nos

sistemas educativos e não recebeu; portanto, formação específica para a

tarefa. Esta circunstância torna relevante conhecer os percursos percorridos

pelo profissional em sua ação e os elementos que os constituem. (2008: 64)

A ausência de um reconhecimento por parte das redes públicas de ensino, apesar

das demandas constantes de um trabalho com a formação continuada, implica não

considerar o trabalho que é realizado por esses profissionais. Andrade também

contribui para a discussão no seguinte fragmento:

Mas deveríamos considerar a presença de um terceiro personagem da

formação, o formador, um interlocutor que age como uma espécie de

narrador-autor, que constrói os sentidos desta cena. Entretanto, sua posição não é frequentemente problematizada, e não falar de sua contribuição, da

especificidade de sua presença, é considerar a cena endogenamente, natural

ato de comunicação sobre a escola. (ANDRADE, 2009: 7).

A proposta de investigação desta pesquisa consiste em identificar a constituição

das interlocuções entre tutor-formador e os professores, buscando identificar alguns

indícios presentes nas diferentes instâncias dos espaços da formação continuada: as

reuniões para elaborar o planejamento da formação continuada para os tutores-

formadores, os encontros de formação continuada dos tutores-formadores e os encontros

de formação do tutor com os professores nos municípios.

Assim, esta pesquisa trata a investigação dos discursos constituídos pelo tutor-

formador no ato da sua formação continuada, identificando alguns possíveis indícios

Page 27: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

26

constituídos em sua participação em espaços dessa formação, sobre conhecimentos do

campo do letramento e alfabetização.

O seu objetivo geral pode ser resumido por investigar um tutor-formador do

Programa Pró-Letramento em suas práticas discursivas, buscando indícios do campo do

letramento e alfabetização constituídos no/pelo discurso a partir das participações em

espaços de formação continuada. Já os objetivos específicos podem se expressar por:

1. Identificar possíveis indícios no discurso do tutor-formador sobre a sua

participação no espaço de formação continuada promovido pelo LEDUC;

2. Analisar os posicionamentos do tutor-formador a partir das interlocuções

constituídas com os professores no espaço da formação continuada;

3. Identificar os conteúdos sobre letramento e alfabetização abordados no

planejamento da formação continuada para tutores do programa Pró-Letramento

realizado pelo LEDUC.

1.2 As nuances em torno dos processos de alfabetização: os tons dos professores, as

cores dos métodos e as possíveis laçadas dos formadores

Se era forte demais o sol, e no jardim pendiam as pétalas, a moça colocava na

laçadeira grossos fios cinzentos do algodão mais felpudo... Mas se durante

muitos dias o vento e o frio brigavam com as folhas e espantavam os

pássaros, bastava a moça tecer com seus belos fios dourados para que o sol voltasse a acalmar a natureza. (COLASANTI, 2004).

A complexidade em torno do processo de alfabetização tem desafios em torno da

“não alfabetização” de crianças e jovens, angústias e dúvidas experimentadas pelos

docentes face à diversidade de situações presentes no universo social e cultural ao qual

os alunos pertencem. O professor, em seu cotidiano escolar, enfrenta dilemas e

situações complexas no que se refere ao processo de alfabetização desses sujeitos.

A passagem acima, retirada do conto da Moça Tecelã, remete a bordados,

emaranhados de fios, iniciados e inacabados, linhas ainda soltas, laçadas já feitas,

Page 28: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

27

tramas que podem ser compreendidas por diferentes formas. Quais fios puxar quando

temos um campo de estudos e pesquisas sobre o tema?

A obrigatoriedade legal do acesso e permanência de crianças na escola,

marcando a responsabilidade do sistema público de ensino, tanto pela entrada como

também pela qualidade, na aprendizagem dos sujeitos que iniciam a escolarização, fatos

previstos pela legislação. Esse é um fio que se faz necessário e urgente a sua

discussão, apesar das recorrentes discussões no campo sobre o tema.

Dentre tantos fios e tramas, busco compreender alguns contornos do desenho

indicado por pontos e laçadas que compõem a aprendizagem e o ensino da leitura e da

escrita de crianças. Esta, por sua vez, também tem a sua complexidade, e também se faz

necessário uma definição mais próxima. Soares (2011) escreveu um texto intitulado As

muitas facetas da alfabetização em 1985, sobre os contornos do processo de

alfabetização, marcando, já naquele momento, a necessidade de se reconhecer o enfoque

sobre “mecânica” do ler, mas também a necessidade de se considerar as determinantes

sociais inerentes aos sujeitos, focos desse processo. Iniciava-se a discussão sobre o

conceito de letramento, apesar de ainda ter essa nomeação de alfabetização.

Naquele momento, o campo já anunciava situações referentes tanto ao ensino da

leitura e da escrita quanto em relação ao contexto em que o sujeito está inserido;

singularidades das formas de ensinar; as formas de o sujeito aprender e os

conhecimentos constituídos.

A ideia é de retomar o tema, não para simplesmente ratificar as marcas

anteriores, mas para recuperá-lo, buscando interfaces com o campo da formação, mais

especificamente da formação continuada dos professores dos anos iniciais do ensino

fundamental, responsáveis pelo início do processo de alfabetização. Esses profissionais

são, em alguns espaços, conhecidos como professores alfabetizadores.

Page 29: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

28

Estudos e pesquisas apontam aspectos que atravessam os espaços da formação

continuada. Alguns desses atravessamentos são apresentados pelos docentes e

expressos por meio da emoção, lamentos, manifestações recorrentes nesses espaços.

Falas como: “os alunos chegam no 3º ano do ensino fundamental sem estar alfabetizado,

como trabalhar com eles?; “O que vou ensinar: os conteúdos ou a leitura e a escrita?”;

“Será que nesses encontros vou ter respostas para as minhas perguntas sobre o que fazer

com os alunos que não estão lendo e escrevendo?”; “Por que as crianças hoje não estão

se alfabetizando?”.

Algumas dessas questões são recorrentes, há um certo tempo, minhas

experiências profissionais no exercício da docência em turmas de alfabetização na rede

pública municipal do Rio de Janeiro e em trabalhos realizados na formação de

professores alfabetizadores, como formadora de professores.

Ao marcar a posição de professora e de formadora de professores, reconheço um

trançado construído por diferentes fios e tramas: experiências referentes ao ensino da

leitura e escrita criadas com nuances singulares sobre as relações constituídas nas salas

de aula entre alunos e professores; laçadas produzidas nas atividades criadas pelos

docentes e realizadas pelos alunos; texturas diversas nas interlocuções tecidas pelos

professores nos encontros de formação continuada sobre suas experiências; arremates,

ainda que provisórios, dos formadores de professores ao expressarem temas e marcarem

posições. Para desembaraçar essa trama puxo o fio do diálogo.

Bakhtin (1997:295) afirma que “é no diálogo real que a alternância dos sujeitos

falantes é observada de modo mais direto e evidente; os enunciados dos interlocutores

(parceiros do diálogo), a que chamamos de réplicas, alternam-se regularmente nele”.

Desse modo, os diálogos são, “por sua clareza e simplicidade, a forma clássica da

comunicação verbal”.

Page 30: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

29

Considerar os diálogos construídos no campo de alfabetização, estabelecidos em

diferentes lugares e de diferentes posições, exige uma aproximação com os enunciados

que são emitidos pelos sujeitos constituidores desse campo, valorizando a “forma

clássica da comunicação verbal”. (BAKHTIN, 2003). Professores, pesquisadores e

formadores de professores têm tecido sobre o campo da alfabetização tramas com

enunciados e apontam que há uma insistente recorrência de alguns.

Bakhtin (1997:280) ainda nos assinala que “a língua efetua-se em forma de

enunciados (orais e escritos), concretos e únicos, que emanam dos integrantes duma ou

doutra esfera da atividade humana”. Assim, os fios que compõem as tramas do processo

de aprender a ler e escrever são feitos de enunciados, tecidos nas salas de aula, em

encontros de formação continuada, nas pesquisas, e que, ao se entrelaçarem, formam

bordados constituidores do campo da alfabetização e do campo da formação de

professores.

A busca exige não somente nomeá-los e identificá-los, mas, sobretudo, encontrar

pontos de entrelaces entre os enunciados da pesquisa e o cotidiano escolar, fios soltos

no que se refere às escolhas possíveis sobre os caminhos e as perspectivas da

alfabetização, nuances ainda não percebidas ao considerar a voz do formador de

professores, arremates possíveis na busca por apontar questões que precisam ser

consideradas na aproximação com o campo da formação continuada, na posição de

formador de professores. Esses são desafios a que me proponho anunciar, como

pesquisadora, nesse texto.

1.2.1 A arte de exercitar um olhar exotópico sobre os processos

Recordar; relembrar; desafios; projetos; práticas, tanto na docência, como na

formação de professores: tudo me remete ao que Prado & Soligo (2007) apresentam

como a arte de pôr em movimento na seguinte passagem:

Page 31: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

30

Recordar pode ser compreendido como vitalizar, oxigenar, reavivar as

memórias guardadas. É a “arte” de pôr em movimento as idéias, as

impressões e conhecimentos disponíveis. E esse movimento é o que torna

possível ao homem expor suas memórias, narrar suas histórias. (2007: 52).

Evocar nas minhas memórias de professora alfabetizadora e de formadora de

professores tem como intenção identificar experiências que me constituem como

profissional e simultaneamente criar um novo lugar, o de pesquisadora, que agora

ocupo, considerando as diferentes posições que compõem a minha trajetória

profissional.

Por essas lembranças em circulação nesse texto, estabelecem-se novos sentidos,

criam-se momentos singulares de escuta e, ao escrevê-las, se instaura a oportunidade de

anunciar alguns contornos possíveis constituídos nesse processo. “Os processos de

formação de professores se modelam na tensão entre as experiências na docência e os

percursos de formação” (SOUZA, 2007:1). Portanto o ato de narrar marca, ainda que

provisoriamente, novos sentidos sobre as experiências docentes.

Escolho narrar alguns fragmentos do meu memorial, e o movimento de

(re)encontrá-los apontará alguns contornos de meus “excedentes de visão” (BAKHTIN,

2003) sobre os lugares de professora das séries iniciais e de formadora de professores.

Tenho como proposta identificar alguns indícios (GINZBURG, 1989) sobre o ensino e a

aprendizagem da leitura e da escrita constituídos nesses espaços. Situar-me nessas

posições, ver o mundo com as diretrizes axiológicas desses lugares e voltar à posição de

pesquisadora, criando narrativas com uma provisoriedade concludente dos horizontes

que se descortinam a partir desse movimento consiste o exercício da exotopia

bakhtiniana a que me proponho fazer nesse texto (BAKHTIN, 2003).

Ir até essas lembranças, identificar-me com elas, entendê-las, traduzi-las e

transmiti-las, apontando algumas das tantas alteridades possíveis incide em um

movimento denso e singular (AMORIM, 2004: 26). Sendo assim, me coloco diante

Page 32: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

31

desse desafio considerando a possibilidade de apresentar alguns indícios constituídos

dentro da infinidade de excedentes de visão possíveis de serem identificados a partir da

releitura dos fragmentos.

Considero que esse movimento provoca tanto a possibilidade de marcar alguns

indícios (GINZBURG, 1989) que me constituem no que se refere ao campo da

alfabetização, como também marcar as interfaces dessas experiências com os estudos e

pesquisas na área.

O fragmento a seguir se refere ao início da docência, ao chegar à rede pública

municipal do Rio de Janeiro:

Na chegada à escola municipal do município do Rio de Janeiro temas como

os entraves no contexto escolar, a burocracia do sistema público de ensino, as

dificuldades de ensinar os alunos a ler e escrever se apresentaram com cores

e formas. Ao conhecer os alunos da turma 101 da 1ª série (ano de 1994), as

dimensões dos temas recorrentes em minha formação inicial como fracasso

escolar, responsabilidade social, contexto cultural e social dos alunos

ganharam nome e sobrenome.

A importância de contextualizar o trabalho pedagógico que realizava com e para aquelas crianças se tornou um desafio. Nesse momento sou tomada por

um turbilhão de questões: Quem são eles? O que sabem? De onde vem? O

que esperam daquele ano letivo? Que histórias contam sobre seu cotidiano?

Em paralelo, angústias se tornavam duvidas palpáveis em meus pensamentos:

O que vou ensinar? Como vou ensinar? Que método utilizar? Como

organizar um trabalho de alfabetização com e para aqueles alunos?

(SOARES, 2008)

O fragmento apresenta o lugar de professora de uma rede pública municipal. Os

questionamentos rememoram as angústias experimentadas sobre as decisões na escolha

das formas de trabalhar com os alunos. Os questionamentos foram propulsores de uma

busca por estudos e leituras sobre um cotidiano complexo e diverso em um sistema

público de ensino. Ainda que não soubesse da importância do ato, reconhecia a

importância de fazer perguntas sobre o contexto no qual estava inserida.

Outro ponto a destacar dessa passagem consiste na própria ação de narrar. Souza

nos provoca com a seguinte afirmativa:

Page 33: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

32

A narrativa torna possível desvendar modelos e princípios que estruturam

discursos pedagógicos que compõem o agir e o pensar docente e

cristalizações da e sobre a prática. Isto porque o ato de lembrar e narrar

possibilita ao ator reconstruir experiências, refletir sobre dispositivos

formativos e criar espaço para uma compreensão da sua própria prática.

(2007:3).

O ato de narrar realça a importância de refletir sobre as experiências Dessa

posição, não somente reconheço como também compreendo e marco indícios

(GINZBURG, 1989) que são constituídos nas minhas práticas. Esse espaço possibilita a

compreensão de novos sentidos e significados, reconhecendo-os como dispositivos

formativos.

Um tema recorrente presente no fragmento acima consiste na discussão sobre os

métodos de alfabetização. Mortatti (2010) e Soares (2007) apresentam a discussão e a

nomeiam como a “querela dos métodos”. Reconhecem em seus estudos que havia um

movimento de marcar o “moderno” e desqualificar o dito “tradicional”, ou melhor, o já

instituído. Mortatti nos apresenta essa discussão no seguinte trecho:

A face mais visível dessas discussões se foi configurando na questão dos métodos de alfabetização4 ou “querela dos métodos”, como passou a ser

denominada. Em diferentes momentos históricos, diferentes sujeitos movidos

por diferentes urgências sociais e políticas, sempre alegando se basear nas

mais “modernas verdades científicas”, passaram a apresentar versões de seu

presente e de seu passado (recente), acusando de “antigos” e “tradicionais” os

métodos então utilizados e propondo em sua substituição “novos” e

“revolucionários” métodos (de alfabetização). (MORTATTI, 2010:94).

Essa discussão anuncia tensões na disputa entre conhecimentos nomeados como

“tradicionais” e “novos”. A intenção de desqualificar conhecimentos ditos “antigos”

para que prevalecesse os conhecimentos “mais recentes” se instalava como um

movimento presente no campo. A perspectiva histórica da alfabetização no Brasil

4 Os métodos de alfabetização, como se sabe, podem ser classificados em dois tipos básicos: sintético (da

“parte” para o “todo”) e analítico (do “todo” para a “parte”). Dependendo do que foi considerada a

unidade lingüística a partir da qual se devia iniciar o ensino da leitura e escrita e do que se considerou

“todo” ou “parte", ao longo da história da alfabetização no Brasil, foi-se sedimentando a seguinte

subdivisão classificatória desses métodos: métodos sintéticos (de marcha sintética): alfabético, fônico,

silábico; e métodos analíticos (de marcha analítica): palavração, sentenciação, historieta, conto.

(MORTATTI, 2010: 330).

Page 34: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

33

caracteriza-se, portanto, como um movimento complexo, marcado pela recorrência

discursiva da mudança, indicativa da tensão constante entre permanência e rupturas

(MORTATTI, 2010:330). Quem são os interlocutores que marcam esses enunciados?

Diferentes profissionais em diferentes posições participam dessa discussão. Há

pesquisadores que demarcaram seus lugares e consequentemente suas escolhas teóricas;

formadores de professores, tanto nas universidades como nas instâncias dos sistemas

públicos de ensino, que leram as pesquisas e expressaram em seus encontros de

formação com professores suas compreensões e posições. Docentes que, de alguma

forma, buscaram estudos e se deparam com essas discussões e também realizaram suas

escolhas, tanto em leituras como nos encontros de formação.

Cada sujeito, representante desses diferentes lugares, é reconhecido como

interlocutor desse processo. Sendo assim, cada um revela em seus enunciados

(BAKHTIN, 2003) suas opções, marcando a presença da diversidade e das

similaridades. Vale destacar que não há discursos homogêneos e consensuais no campo.

Existem opções teóricas, linhas de pesquisa, enfim, campos de estudos que se

aproximam e outros mais afastados. Apesar de os sistemas públicos, na figura de seus

gestores, apontarem e escolherem uma opção teórica como “verdade única”, o campo da

alfabetização expressa em suas produções científicas as disputas e tensões sobre os

diferentes modos de compreensão e elaboração no que se refere aos processos de ler e

escrever.

Em consequência da dicotomia entre o “novo” e o “antigo”, cada perspectiva

teórica que se instala tem a necessidade de se constituir negando e desqualificando a

anterior e/ou a vigente. A escolha de determinada perspectiva instaura a necessidade de

se recusar o arcabouço teórico construído até então. Esse é um movimento que está

presente no campo da alfabetização. Reconhecê-lo implica identificá-lo como um

Page 35: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

34

movimento constituidor do campo, mas também apontar que dúvidas e questionamentos

sobre que escolhas metodológicas realizar tornaram-se constantes e corriqueiras entre

professores.

Essa ação se torna mais incisiva quando as escolhas teórico-metodológicas que

gestores públicos realizam, de algum modo, se vinculam a uma linha de estudos e

pesquisas. A gestão estabelece para aquele sistema público de ensino uma “verdade

única”, instituindo uma relação entre a opção política vigente daquele governo a

determinada linha teórica. (MORTATTI, 2010).

Esse movimento de ruptura com que é “antigo”, em prol de um “novo”, foi

provocando, nos cotidianos das escolas, de algum modo, uma insegurança nos

professores sobre os conceitos e experiências apreendidos até ali. Atravessam os

cotidianos escolares temas que são marcados pela dicotomia entre o “tradicional” e o

“moderno” e se atrela à dualidade do “certo” e do “errado”. Para além de generalizar a

questão, faz-se urgente reconhecer os impactos dessas disputas nos planejamentos dos

professores e nos encontros de formação continuada de professores.

Trabalhar com a dualidade de “tradicional” e “moderno” a princípio reduz as

práticas em alfabetização, e Mortatti nos afirma que há diversos modelos teóricos que

explicam os processos de alfabetização e nos apresenta os que elencou como principais:

(...) a história da alfabetização no Brasil se caracteriza (...) pela recorrência

discursiva da mudança, indicativa da tensão constante entre permanências e

rupturas, diretamente relacionadas a disputas da hegemonia de projetos

políticos e educacionais e de um sentido moderno para alfabetização (...) a

luta pela democratização da educação centrou-se na defesa do direito à

escolarização para todos, da universalização do ensino e da maior

participação da comunidade na gestão da escola (...) no inicio da década de 1980 (...) passou-se a questionar o ensino e a aprendizagem iniciais da leitura

e escrita, já que nessa etapa e de escolarização se concentra(va) a maioria da

população brasileira pobre que fracassa(va) na escola pública e em relação à

qual se deveriam focalizar ações públicas (...) a partir de então foram

engendrados e/ou adotados por pesquisadores brasileiros pelo menos três

modelos teóricos principais de explicação para os problemas da alfabetização

no Brasil, os quais podem ser denominados, sinteticamente, construtivismo,

interacionismo lingüístico e letramento. (MORTATTI, 2010: 332).

Page 36: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

35

O foco em estudos e pesquisas sobre o fracasso na alfabetização nas redes

públicas de ensino no início da década de 1980 já anunciava o foco sobre o ensino e a

aprendizagem de crianças na fase inicial da leitura e da escrita. A busca por mapear

esses modelos e apresentá-los propicia encontrar indícios (GINZBURG, 1989) no que

se refere às práticas em alfabetização, na busca de compreender com que enunciados

(BAKHTIN, 2003) docentes dialogam, tanto no que se refere aos que estão

experimentando em suas salas de aula, como também sobre saberes que construíram

sobre o tema nos encontros da formação continuada de professores.

Faz-se necessário observar que não há um modelo puro de ensino, há nuances,

aproximações, que de alguma forma estão presentes nas atividades realizadas nas salas

de aula. Esses modelos teóricos convivem simultaneamente e estão presentes

atualmente nas práticas das salas de aula. Trazê-los para esse texto se faz importante e

necessário para que possamos entender com que modelos dialogam os professores. Há

referenciais teóricos que subsidiam suas práticas, apesar de estes não reconhecerem suas

nomeações e constituições.

Eu gostaria ainda de analisar que as apropriações desses modelos foram

diferentes entre si; sendo assim, podemos ponderar sobre as singularidades dessas

apropriações e marcar esses modelos no plural, ou seja, construtivismos,

interacionismos linguísticos e letramentos (MORTATTI, 2010).

Encontrar os estudos sobre o campo no que se refere aos modelos teóricos que

podem estar presentes nas práticas de professores alfabetizadores cria a possibilidade de

compreender os enunciados que esses constituem nos encontros de formação

continuada.

Page 37: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

36

1.2.2 O fio do formador

Puxo mais um dos fios de lembranças como formadora de professores

alfabetizadores, e (re)encontro, então, mais um fragmento:

Recordo-me dos diálogos com os professores as falas sobre os conteúdos dos

planejamentos das atividades para os alunos. Esses verbalizavam suas

propostas da seguinte forma: “quando o aluno não sabe, volto tudo, começo do início, vogais, junções e depois fonemas simples”; “Tenho atividades para

quem está no inicio, com as vogais, no meio com os fonemas simples e para

quem já está nas dificuldades”; “Trabalho com fonemas simples e depois as

dificuldades”; “Na sala de aula sou eu quem decide, sou tradicional, lá eu

faço o que acho certo para meus alunos aprenderem a ler e escrever”. Essas

são algumas das tantas falas que faziam parte dos encontros de formação

continuada. Essas se tornaram referências para que eu pudesse organizar os

encontros, problematizando a relação entre esses saberes e os conhecimentos

científicos construídos pelo campo. Considerava ser esse um desafio para o

trabalho na formação, pois precisava considerar os saberes daqueles

docentes, suas experiências e também apontar os estudos que estavam

acontecendo no campo. Contudo, ainda naquele momento, como formadora, acreditava que havia necessidade de que os professores “acreditassem” na

opção teórico-metodológica com a qual estava trabalhando, pois seria o

melhor caminho a ser seguido, ou seja, buscava indicar e marcar a minha

opção teórica como “única verdade possível”. (SOARES, 2008).

O trecho acima apresenta enunciados (BAKHTIN, 2003) que professores

expressaram em encontros de formação e ressalta as provocações que esses

desencadearam nas minhas ações enquanto formadora. Bakhtin (1997: 291) nos escreve

que “a compreensão de uma fala viva, de um enunciado vivo é sempre acompanhada de

uma atitude responsiva ativa e toda compreensão é prenhe de resposta e, de uma forma

ou de outra, forçosamente a produz: o ouvinte torna-se o locutor”.

No texto, os diálogos realizados entre mim e os professores criou um espaço em

que enunciados são expressos, considerando a alternância de posições, em alguns

momentos ouvinte, em outros, locutora. Compreensões foram feitas e respostas

elaboradas. Considero que somente agora, desse lugar, posso compreender que essas

falas vivas iniciaram a busca por compreender os enunciados que são ditos pelos

professores nos espaços de formação continuada, principalmente o teor que os constitui.

Bakhtin ainda continua, afirmando que:

Page 38: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

37

a compreensão responsiva ativa do que foi ouvido pode realizar-se

diretamente como um ato, pode permanecer, por certo lapso de tempo,

compreensão responsiva muda, de uma compreensão responsiva de ação

retardada: cedo ou tarde, o que foi ouvido e compreendido de modo ativo

encontrará um eco no discurso ou no comportamento subseqüente do ouvinte.

(1997: 291).

O ato responsivo apontado pelo autor se distingue tanto pelas diferentes

possibilidades de compreender responsivamente o outro quanto considerar os ecos

dessas respostas, tanto para o locutor como para o ouvinte. Manifesta-se, então, uma

relação de reciprocidade entre os participantes do diálogo.

Nesse ato cria-se um espaço de constituição de saberes que se realiza a partir da

emissão dos enunciados dos sujeitos, pois a compreensão responsiva ativa provoca em

cada sujeito a elaboração de uma resposta, independentemente da sua forma e seu teor.

Esses enunciados tornam-se, então, constituidores dos saberes que cada

participante do diálogo está apresentando a cada enunciado emitido, não podendo mais

se distinguir o que seria de cada um. Cabe ainda revelar que a cada novo encontro com

esses enunciados se criarão novos sentidos e consequentemente outros significados.

Faz-se pertinente observar que os enunciados elaborados para e nos encontros de

formação continuada são constituidores da minha prática enquanto formadora. Sendo

assim, minha formação, nessa posição, acontecia no ato de ser formadora.

O fragmento ainda nos provoca apresentando indícios (GINZBURG, 1989) de

modelos teóricos enunciados pelos docentes. Aborda a questão do “professor

tradicional” como um profissional preocupado com os conteúdos e as formas de ensinar.

Implicado nesse discurso revela-se a importância que professores apontam em construir

planejamentos considerando um caminho definido. Por que alguns docentes insistem em

marcar em seus enunciados as “formas de fazer” com os alunos?

Para dialogar, coloco no foco a perspectiva histórica da alfabetização, em

especial o período que foi abordado por Mortatti (2010) como revolução conceitual.

Page 39: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

38

Houve um deslocamento da discussão sobre o processo de alfabetização, que até então

se ancorava sobre o ensino, mais especificamente sobre os métodos de alfabetização,

para as questões que envolviam as formas de aprendizagem e as compreensões que as

crianças realizam sobre a língua, no que se refere à aprendizagem da leitura e da escrita.

A procura por responder a questão sobre como as crianças aprendem a ler e

escrever, apresentada pela pesquisadora Emília Ferreiro5 marca indelevelmente as

pesquisas e estudos do campo sobre o tema. Os resultados questionavam as concepções

de alfabetização centradas no ensino e na utilização de métodos e cartilhas como

recurso principal e central do processo de aprender a ler e escrever (MORTATTI,

2010). Apontavam os limites epistemológicos dos métodos de alfabetização que até

então eram utilizados nos processos de ensino da leitura e da escrita

A chegada do construtivismo no Brasil aconteceu de forma concomitante com as

novas urgências políticas e sociais que propunham mudanças na educação a fim de

enfrentar a questão do fracasso escolar na alfabetização instalado em nossas escolas há

algumas décadas.

A chegada de avaliações externas nacionais, como SAEB6, e internacionais

(PISA)7, apontando e denunciando alunos que não foram alfabetizados depois de um

tempo de escolarização (4, 6 e 8 anos de escolaridade) e os altos índices de evasão e

repetências foram divulgados para a sociedade (SOARES, 2004).

5Emilia Ferreiro se tornou umas das referências no campo da alfabetização no que se refere à investigação dos processos de aquisição e elaboração de conhecimento pela criança. As pesquisas concentram o foco

nos mecanismos cognitivos relacionados à leitura e à escrita. 6 SAEB – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica; PISA – Programa Internacional de

Avaliação de Estudantes. 7O PISA (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) é um projeto comparativo de

avaliação, desenvolvido pela OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico),

destinado à avaliação de estudantes de 15 (quinze) anos de idade. As avaliações abrangem os

domínios de Leitura, Matemática e Ciências, numa apreciação ampla dos conhecimentos, habilidades

e competências inseridos em diversos contextos sociais, sendo aplicadas a cada três anos.

Page 40: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

39

Dentro do campo, as disputas entre as diferentes correntes existiam. No entanto,

a opção teórico-metodológica pela perspectiva construtivista e o anúncio como uma

“verdade única” para o ensino da leitura e da escrita marcaram o domínio dessa

perspectiva para alguns gestores do sistema público de ensino. Soares escreve que,

como ocorreu nos Estados Unidos, também no Brasil, nas décadas de 1980 e 1990 o

domínio hegemônico, na área da alfabetização, do paradigma cognitivista se difundiu

sob a discutível denominação de construtivismo (posteriormente, socioconstrutivismo)

(2004:10).

A hegemonia construtivista se constituiu em um marco no campo de estudos da

alfabetização. Em sua criação, não havia a pretensão de apontar e/ou se tornar um

método de ensino e, por isso, não previa uma didática de ensino da leitura e escrita.

Decorre desse modelo teórico o que foi denominado como desmetodização da

alfabetização. (MORTATTI, 2010:332). Isso ocorre em consequência de didáticas

utilizadas até então pautadas em métodos objetivos e diretivos e com atividades

estruturadas.

Inicia-se no país a divulgação e a aposta, por parte dos pesquisadores, em uma

aprendizagem espontânea que se estabelecia na exposição a situações de leitura e de

escrita resultar em aprendizagem. (MORAIS, 2006).

Mortatti (2006) nos escreve que a consequência da “revolução conceitual”

consiste na “desmetodização da alfabetização”. As questões de ordem didática foram

colocadas em segundo plano em detrimento de compreender sobre os processos de

aprendizagem da leitura e da escrita dos alunos.

Soares também se pronuncia sobre a questão e nos apresenta o neologismo

desinvenção para nomear “a perda da especificidade do processo de alfabetização que

Page 41: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

40

tem ocorrido na escola brasileira ao longo das duas últimas décadas”. (2004: 8). Essa

desinvenção está pautada na falta de uma forma sistematizada de aquisição do código.

Tanto a questão da “desmetodização da alfabetização” (MORTATTI, 2010)

como na desinvenção (SOARES, 2004) coloca no foco a discussão sobre a ausência de

uma didática para ensinar a ler e escrever. Instaura-se, então, um certo espontaneísmo,

com atividades menos estruturadas marcando e docentes se questionando sobre a

validação de seus saberes. Essa fala está presente em discursos que são recorrentes em

encontros de formação de professores.

Outra nuance presente no campo da alfabetização no que se refere a modelos

teóricos consiste na perspectiva do letramento, apresentando a importância das práticas

sociais da leitura e da escrita. Entro mais uma vez ainda em diálogo com Soares, que

apresenta o conceito na seguinte passagem:

o sentido que tem letramento, palavra que criamos traduzindo “ao pé da

letra” o inglês literacy: letra-, do latim littera, e o sufixo –mento, que

denota o resultado de uma ação (como, por exemplo, em ferimento, resultado

da ação de ferir). Letramento é, pois, o resultado da ação de ensinar ou de

aprender a ler e escrever: o estado ou a condição que adquire um grupo social

ou um indivíduo como consequência de ter-se apropriado da escrita.

(SOARES, 2010: 18).

Essa discussão se revela ampla e com diferentes possibilidades de

encaminhamentos. Reconhecendo os limites desse texto, decido realizar um recorte

sobre a questão do letramento no que se refere à aproximação com a alfabetização,

provocando um certo esvaziamento referente à aquisição do código escrito.

Ao se estabelecer uma relação entre as questões em torno dos métodos de

alfabetização e o uso da leitura e da escrita em práticas sociais, provocou-se, de alguma

forma, um enfraquecimento nos aspectos referentes às formas de ensinar a aquisição do

código. A ênfase das produções científicas consiste em ressaltar a importância de

Page 42: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

41

oferecer às crianças textos que estivessem presente no contexto social e indica que o

importante seria apontar os usos e as práticas dos mesmos.

O fato de sujeitos conviverem de forma intensa com materiais escritos que

circulam nas práticas sociais se colocou em um primeiro plano em relação ao processo

de aprendizagem do sistema convencional da escrita. Situou-se, assim, em um segundo

plano, a aquisição do código. Soares ratifica essa perspectiva quando diz que a

discussão do letramento surge enraizada no conceito de alfabetização, o que tem levado

(...) a uma inadequada e inconveniente fusão de dois processos, com prevalência do

conceito de letramento (...). (2004: 8).

As consequências desse enraizamento contribuíram para que continuasse a

prevalecer o uso da leitura e da escrita no contexto social, apontando para um certo

espontaneísmo e um discurso recorrente de que o simples fato de trabalhar com textos

presentes nas práticas sociais ensinaria as crianças a ler e escrever. Colabora na

continuidade de discutir de forma ampla os encaminhamentos para a aquisição do

código e apresenta poucas sistematizações sobre as “formas de fazer”.

Realçar os enunciados (BAKHTIN, 1997) presentes no campo, tanto por parte

das pesquisas como sobre o modelo construtivista de aprendizagem, a “desmetodização

da alfabetização”, o letramento, que são expressos pelos professores ao exporem as

experiências tem como proposta apontar algumas das tantas possíveis interlocuções que

docentes possam ter realizado sobre o tema do ensino da leitura e da escrita são

enunciados.

O exercício de exotopia na posição de formadora se revelou como proposta

encontrar indícios (GINZBURG, 1989) que me constituíram enquanto profissional do

campo e ainda identificar os enunciados e as possíveis interlocuções com o campo de

estudos e pesquisas.

Page 43: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

42

1.2.3 Provisórios arremates... Fios soltos para novas tramas nos encontros da formação

continuada... Juntando os fios...

Remeto-me, então, ao início deste texto, onde marco o desejo de não somente

nomear, mas a possibilidade de encontrar os entrelaces entre enunciados (BAKHTIN,

1997) da pesquisa e o cotidiano da formação continuada de professores. Ao abordar as

questões em torno da alfabetização, no que se refere à querela dos métodos

(MORTATTI, 2009), à chegada do construtivismo (SOARES, 2004), à desmetodização

da alfabetização (SOARES, 2004), à desinvenção da alfabetização (SOARES, 2004) e

ao letramento, perspectivas que marcaram de forma decisiva o campo da alfabetização.

Tramas foram construídas. Ao longo do texto, aponto que há entrelaces ao

identificar as experiências tanto na docência como na prática como formadora de

professores com os estudos do campo. São enunciados constituídos na e sobre as

práticas que encontram réplicas (BAKHTIN, 2003) nas pesquisas e nos estudos do

campo.

Nos encontros de formação continuada bordados são tecidos na interlocução

entre professores, formadores de professores e pesquisadores. Entretanto, ainda precisa

ser reconhecida pelos sujeitos participantes e produtores nesse campo.

Ao identificar os enunciados, logo se apresentam as posições que cada sujeito

ocupa. Há uma alternância de posições, em alguns momentos a posição de ouvinte, em

outros, locutora. Compreensões responsivas e réplicas são elaboradas. Considero que,

somente agora, deste lugar, posso compreender que essas falas vivas iniciaram um

processo de busca por compreender os enunciados que são ditos pelos professores nos

espaços de formação continuada.

O tema da alfabetização se faz de diferentes fios, dentre eles os que se referem a

perspectivas de ensinar a ler e escrever que são realçados nas cores expressas pelas

Page 44: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

43

aprendizagens das crianças. Em diferentes momentos dos encontros de alfabetização,

professores enunciam as tramas que esses fios tecem em suas salas de aula, em alguns

momentos bordados que se iniciam, em outros, pontos que insistem em não se laçar.

Cabe, então, questionar sobre a possibilidade de que docentes possam expressar

suas práticas. Criar espaços em que estes possam elaborá-las e anunciá-las se apresenta

como um recurso que permite ao sujeito elaborar formas de realizá-las, compartilhá-las

e simultaneamente identificá-las como constituidoras de seu processo de formação.

Ainda em se tratando dos métodos de alfabetização, tema recorrente nos

encontros de alfabetização, ainda existem fios soltos, caminhos e perspectivas que ainda

precisam ser discutidos.

O encontro do campo das pesquisas com as práticas docentes por meio da

discussão de temas cria um bordado tecido pelos fios dos conhecimentos científicos e

das prática dos professores. Em algum momento, não tão preciso, formam uma trama,

não sendo mais possível identificar onde está cada fio. Cada professor gera então

enunciados que são constituídos nas interlocuções, produzindo novos sentidos e

significados. Esses produzirão réplicas que encontrarão ecos nas suas salas de aula,

constituindo novos sentidos, novas narrativas, novos significados.

Essa trama tem na sua tessitura uma forma infinita, pois esses ecos retornarão

nos discursos dos profissionais envolvidos, professores, pesquisadores e formadores de

professores, criando novos enunciados e, de alguma forma, criando novas tramas.

Contudo vale ainda ressaltar que, apesar da apresentação, de alguma forma, de

um movimento circular, não cabe a condição da perspectiva de consensos no campo, ou

seja, essa tessitura se tece nas tensões e disputas de sentidos, identificando que cada

sujeito possa contribuir para essa tessitura.

Page 45: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

44

Há arremates que considero provocações sobre discussão da especificidade na

alfabetização no que se refere: à querela dos métodos (MORTATTI, 2009), à chegada

do construtivismo (SOARES, 2004), à desmetodização da alfabetização (SOARES,

2004), à desinvenção da alfabetização (SOARES, 2004) e ao letramento. Que

aproximações foram feitas pelos docentes sobre os temas? Como essas discussões foram

abordadas nos interiores das escolas? Tais temas foram discutidos em encontros de

formação continuada? Como foram debatidos? Como os formadores de professores se

aproximaram da discussão? Que sentidos e significados construíram? Quem “escutou”

as possíveis interlocuções que foram constituídas pelos formadores?

Essas perguntas são indícios (GINZBURG, 2011) que ainda não serão

respondidos nesse texto, contudo apresenta ainda em formas de questões temas para

próximas escritas, marcando as tessituras infinitas desse bordado. Porém ainda cabe

marcar que são réplicas (BAKHTIN, 2003) que faço na interlocução com o tema,

assinalando possíveis ecos com os formadores de professor.

1.3 O programa do Pró-letramento: mais um fio na trama da formação continuada

de professores dos anos iniciais do ensino fundamental

No Brasil, o discurso em favor da educação popular é antigo: precedeu mesmo a proclamação da República. Já em 1882, Rui Barbosa, baseado em

exaustivo diagnóstico da realidade brasileira da época, denunciava a

vergonhosa precariedade do ensino para o povo no Brasil e apresentava

propostas de multiplicação de escolas e de melhoria qualitativa do ensino.

(SOARES, 2004: 8).

Aprender a ler, escrever e contar, escolas para todos, democratização de ensino,

acesso aos bens culturais, enfim, discursos como esses que ainda se fazem presentes no

cenário educacional brasileiro são marcados nessa epígrafe. Soares (2004) aborda em

seu texto temas que já se faziam presentes no século XIX em seu texto escrito no ano de

Page 46: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

45

1986. Trata-se do livro Linguagem e escola: uma perspectiva social, obra que se tornou

referência na discussão sobre o fracasso escolar na aprendizagem da língua materna.

A abordagem sobre o tema da alfabetização tornou-se, de lá para cá, um campo

de estudos e pesquisas repleto de possibilidades em diferentes caminhos investigativos.

Ao relembrar essas discussões, recorrentes nos anos 80, recordo-me das palavras de

Freire (2002) nos afirmando que a leitura de mundo precede a leitura da palavra.

Naquele período, cursando uma graduação em Pedagogia, com tantas ideias e um longo

caminho a percorrer, compreendia que a aproximação com o cotidiano escolar

exercendo a profissão se fazia necessário e importante para que aquelas palavras

ganhassem identidade, ou melhor, identidades.

A aproximação com o cotidiano escolar se transformava em realidade,

ganhando nomes, sobrenomes, localidades e tempo. O trabalho na docência e uma

aproximação com as falas dos docentes, na busca constante sobre a perspectiva de um

trabalho que dialogasse com os saberes que cada professor carregava em suas

experiências se tornavam uma proposta, objetivos perseguidos cotidianamente em

minhas atuações profissionais.

Desse modo, as práticas com a formação continuada de professores adquirem

um contorno especial, constituindo-se um campo de aspirações para pesquisas e

estudos. Há uma passagem teórica que, quando li pela primeira vez, nomeava intuições

que rondavam meus pensamentos sobre espaço da formação docente:

Na universidade, produzem-se conhecimentos que valem muito em qualquer

espaço da sociedade. Quando estes migram para o espaço de qualquer

instância da formação continuada para que possam ter entrada nesta

comunicação formadora, passam, porém, necessariamente, por um processo

de atravessamento, em que são permeados por outros saberes, trazidos da

escola, pelos professores. Atravessados, eles não serão mais os mesmos: serão agora furados. Tais furos, necessários, não são aleatórios, como o de

uma bala perdida. São furos achados, cada um ponto exato a ser descoberto,

resultado de uma busca. A vontade de transmitir a alguém o seu saber cria

uma relação específica com o próprio saber e com o outro em questão. Há um

Page 47: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

46

desejo de se construir este interlocutor em seus moldes, de influenciá-lo, de

argumentar na direção de fazer com que ele perceba que o conhecimento

transmitido pode lhe alterar a visão de sua prática. Neste sentido, busca-se a

medida exata na comunicação para que se produzam no conhecimento os

furos precisos, e preciosos, que serão constitutivos dos sujeitos na interação

em questão. (ANDRADE, 2007: 128).

A identificação com as palavras da autora revela a importância da comunicação

entre os sujeitos, na elaboração que cada docente constitui sobre os conhecimentos

teóricos a que têm acesso e o espaço de formação continuada como um lugar de

constituição de conhecimentos.

A importância tanto dos conhecimentos elaborados na universidade como os

constituídos pelos docentes e o reconhecimento que há uma produção que cada docente

realiza a partir do contato com os conhecimentos da universidade se revela uma

descoberta desafiadora.

A aproximação com o Programa do Pró-Letramento se tornou uma realidade em

virtude da estrutura e da organização que o programa estabelece para sua realização. Por

meio do Instituto de Matemática, a Faculdade de Educação foi convocada e a

representação aconteceria pelo LEDUC. O planejamento e as ações de formação

continuada para professores dos anos iniciais do ensino fundamental das redes públicas

de ensino seriam realizadas pelo grupo de pesquisa que se ancorava na perspectiva

discursiva da linguagem. O interesse em me aproximar dessa perspectiva da formação

se instalou.

Em virtude dos limites e contornos dessa pesquisa, cabe destacar que este texto

tem como objetivo uma breve contextualização do Programa Pró-Letramento,

apresentando o processo inicial de convite e a apresentação para os estados e municípios

do programa até a chegada aos espaços locais para o trabalho com os docentes dos anos

iniciais do ensino fundamental.

Page 48: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

47

Cabe ainda lembrar que há riscos de estabelecer esses limites na escolha de

apresentar esse breve histórico sobre um programa amplo e com diferentes

possibilidades de caminhos, contudo se faz necessário que se apresente, ainda que

previamente, a estrutura do campo de pesquisa. O presente trabalho tem como foco o

Pró-Letramento de Alfabetização e Linguagem.

Encontrei uma aproximação com o trabalho de Orofino (2010)8 que tem como

título Tecendo os Fios da Rede: o Programa Pró-Letramento e a Tutoria na Formação

Continuada de Professores Alfabetizadores da Educação Básica. A autora realiza sua

pesquisa de mestrado sobre o programa Pró-Letramento com o objetivo de compreender

os principais aspectos relacionados à concepção e à gestão do programa, marcando as

perspectivas teóricas e metodológicas que delimitaram a constituição do programa para

fundamentar o trabalho dos professores alfabetizadores (OROFINO, 2010).

Destaco a leitura como fundamental para a compreensão sobre a criação do

programa, os caminhos e as decisões da política pública sobre o tema formação

continuada, sua organização e estrutura, e contornos sobre um dos personagens do

programa: o professor orientador de estudo/tutor.

Orofino (2010) explicita um percurso repleto de disputas e tensões no campo das

políticas públicas apresentando um trabalho de fôlego sobre os meandros, percursos e

decisões sobre a formação continuada de professores e os sentidos que foram tomando

essas posições e trajetórias das políticas públicas.

Apresenta em seu trabalho alguns referenciais sobre os estudos da educação a

distância, o contexto das reformas educacionais, marcando com uma certa cronologia os

fatos e decisões políticas até chegar ao edital de constituição da Rede Nacional de

Formação Continuada. Prossegue com os estudos dos fascículos e apontando alguns

8 O trabalho foi defendido no ano de 2010 - LEDUC/FE/UFRJ.

Page 49: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

48

pontos constituidores sobre perfil do profissional que se tornava professor orientador de

estudos/tutor.

1.3.1 Uma breve apresentação sobre a Rede de Formação e o Programa Pró-letramento

A formação do professor é um tema recorrente no campo de estudos e pesquisas,

ainda que, até o final dos anos 1990, o tema da formação docente estivesse muito

vinculado ao campo de estudos da Didática. (ANDRÉ, 2011). No que se refere à

legislação, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB 9394/96 - determina, sobre a

formação continuada, que:

Art.67. Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da

educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos

de carreira do magistério público.

II – aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento

periódico remunerado para esse fim. (LDB 9394/96).

Dessa forma, a determinação da lei sobre a importância e, consequentemente, a

necessidade dessas ações fica explicitada na legislação. Contudo, ainda que a LDB

9394/96 determine sobre a formação continuada, Orofino (2010) ressalta a necessidade

de documentos posteriores, com objetivo de estabelecer normatizações determinadas no

nível federal, tanto no Conselho Nacional de Educação (CNE) como no Ministério da

Educação. Nesse momento, criavam-se também, previstos na LDB9394/96, novos

espaços institucionais para a formação docente (os institutos superiores de educação e as

escolas normais superiores), prosseguindo, então, com a reforma da formação de

professores dos anos iniciais do ensino fundamental.

Segundo a autora, as recomendações apresentadas na LDB 9394/96 indicavam

que “o lugar da formação de professores na sua carreira docente deveria ser

encaminhado para o profissionalismo”. (OROFINO, 2010: 68). Dessa forma, o governo

cria uma lógica que fundamenta a formação dos professores que consiste na certificação

Page 50: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

49

e na avaliação do desempenho dos professores na busca de marcar esse

profissionalismo.

O processo acarreta a criação de documentos, legislações, programas, enfim,

ações políticas tanto para a formação inicial como para continuada do professor dos

anos iniciais do ensino fundamental. Nessa perspectiva, houve a criação, nos anos de

1990, do Programa de Formação de Professores Alfabetizadores (PROFA) e dos

Parâmetros Curriculares em Ação (PCN em Ação), como iniciativas de formação

continuada de professores realizadas em parceria com o MEC, as secretarias estaduais e

municipais de educação e com as universidades.

O documento que apresentada a trajetória das formações continuadas se inicia

com a publicação do edital N° 01/2003 da SEIF - Secretaria de Educação Infantil e

Fundamental do Ministério da Educação, documento que apresenta as diretrizes,

viabilizando o encaminhamento de propostas das universidades para o Ministério da

Educação que tivessem interesse em participar dos centros de formação continuada,

desenvolvimento de tecnologia e prestação de serviços para as redes públicas de ensino,

apresentando o início da construção da Rede Nacional de Centros de Pesquisa e

Desenvolvimento da Educação (Rede), constituída no âmbito do Sistema Nacional de

Certificação e Formação Continuada de Professores da Educação Básica (BRASIL,

2005).

A Rede Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento da Educação Básica inicia seu

processo de constituição a partir de dezembro de 2003. Composta por universidades

com equipe de pesquisadores responsáveis tanto pelas ações de formação continuada

como também pela criação de materiais didáticos pedagógicos para a formação dos

docentes. Cria-se uma articulação entre as universidades e as redes públicas de ensino e

Page 51: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

50

um espaço de formação continuada tanto para os professores orientadores/tutores como

para os professores cursistas.

Vale, então, apresentar os objetivos da Rede de Formação que foram

apresentados no documento:

1. Institucionalizar o atendimento da demanda de formação continuada;

2. Desenvolver uma concepção de sistema de formação em que a

autonomia se construa pela colaboração, e a flexibilidade encontre seus

contornos na articulação e na interação;

3. Contribuir com a qualificação da ação docente no sentido de garantir

uma aprendizagem efetiva e uma escola de qualidade para todos;

4. Contribuir com o desenvolvimento da autonomia intelectual e

profissional dos docentes; 5. Desencadear uma dinâmica de interação entre os saberes pedagógicos

produzidos pelos Centros, no desenvolvimento da formação docente, e pelos

professores dos sistemas de ensino, em sua prática docente;

6. Subsidiar a reflexão permanente na e sobre a prática docente, com o

exercício da crítica do sentido e da gênese da sociedade, da cultura, da

educação e do conhecimento, e o aprofundamento da articulação entre os

componentes curriculares e a realidade sócio-histórica;

7. Institucionalizar e fortalecer o trabalho coletivo como meio de

reflexão teórica e construção da prática pedagógica. (Brasil, 2005)

Os objetivos marcam que há responsabilidades tanto para o MEC como também

da Rede de Formação e consequentemente das universidades parceiras no processo e na

formalização da formação continuada dos professores. O documento explicita que

deverá “contribuir com o desenvolvimento da autonomia intelectual e profissional dos

docentes e subsidiar a reflexão permanente na e sobre a prática docente.” (BRASIL,

2005).

Uma das ações da Rede Nacional de Formação Continuada inseriu o programa

Pró-Letramento, nomeado pelo Ministério da Educação como Mobilização pela

qualidade da Educação (OROFINO, 2010).

Houve, então, um processo de seleção, e os centros das universidades

selecionados para o trabalho na área de conhecimento de Alfabetização e Linguagem

são os seguintes: Universidade Federal de Minas Gerais - Centro de alfabetização,

leitura e escrita (CEALE), Universidade Federal de Pernambuco - Centro de estudos em

Page 52: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

51

educação e linguagem (CEEL) , Universidade Estadual de Campinas - Centro de

formação do instituto da linguagem (CEFIEL), Universidade de Brasília - Centro de

formação continuada de professores (CEFORM) e Universidade Estadual de Ponta

Grossa - Centro de formação continuada, desenvolvimento de tecnologia e prestação de

serviços para as redes públicas de ensino (CEFORTEC). (OROFINO, 2010).

Diante desse quadro, vale ressaltar que há de se compreender de forma mais

específica a estrutura dos materiais do programa, os profissionais que o constituem e a

dinâmica que se faz necessária para que o trabalho se realize.

1.3.2 Compreendendo a estrutura do Programa do Pró-Letramento

O “Pró-Letramento - Mobilização pela Qualidade da Educação” é um programa

de formação continuada de professores que objetiva a melhoria da qualidade da

aprendizagem das crianças dos anos iniciais do ensino fundamental em Língua

Portuguesa e Matemática.

O programa destina-se a professores de escolas públicas que estão em exercício

no primeiro segmento do ensino fundamental e se desenvolve na modalidade

semipresencial (atividades presenciais e a distância). A realização acontece em parceria

com o Ministério da Educação – MEC, as Universidades que compõem a Rede

Nacional de Formação Continuada de Professores e a participação de estados e

municípios, por meio da adesão voluntária ao programa.

A formação continuada relacionada ao campo da Alfabetização e Linguagem

elenca os seguintes objetivos com vistas à melhoria da qualidade da aprendizagem dos

alunos:

1. Oferecer suporte à ação pedagógica dos professores dos anos/séries

iniciais do ensino fundamental, contribuindo para elevar a qualidade do

ensino e da aprendizagem de Língua Portuguesa e Matemática;

2. Propor situações que incentivem a reflexão e a construção do

conhecimento como processo contínuo de formação docente;

Page 53: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

52

3. Desenvolver conhecimentos que possibilitem a compreensão da

Matemática e da linguagem e seus processos de ensino e aprendizagem;

4. Contribuir para que se desenvolva nas escolas uma cultura de formação

continuada;

5. Desencadear ações de formação continuada em rede, envolvendo

Universidades, Secretarias de Educação e Escolas Públicas dos Sistemas

de Ensino. (BRASIL, 2010: 2).

O Programa desenvolve os conteúdos de Alfabetização e Linguagem e

apresenta-os em 8 fascículos, constituindo um único exemplar que se organiza da

seguinte forma: 1) Capacidades linguísticas da alfabetização e avaliação; 2)

Alfabetização e letramento: questão sobre avaliação; 3) A organização do tempo

pedagógico e o planejamento de ensino; 4) Organização e uso da biblioteca escolar e

das salas de leitura; 5) O lúdico na sala de aula: projetos e jogos; 6) O livro didático em

sala de aula: algumas reflexões; 7) Modos de falar/Modos de Escrever; 8) Fascículo

complementar.

O programa apresenta em seu Guia Geral9 os profissionais que deverão

participar desse trabalho. Nomeia-os da seguinte forma:

Professor cursista - profissional que está vinculado a uma rede pública de

ensino nos anos iniciais do ensino fundamental e receberá as aulas.

Professor orientador de estudos/tutor – profissional que deverá ter vínculo

com a rede pública e tem como uma das suas funções participar da formação

de tutores e organizar e dinamizar as turmas dos professores cursistas.

O formador de professor tutor - profissional que deve estar vinculado a um

centro que compõe a Rede Nacional de Formação Continuada ou a uma

universidade parceira no desenvolvimento do Pró-Letramento. Dentre as

funções, cabe ao formador participar da preparação da formação dos

orientadores/tutores, com o Centro/Universidade e também ministrar o curso

de preparação dos orientadores/tutores. (BRASIL, 2005)

Em cada rede de ensino, faz-se necessário um coordenador geral, profissional da

Secretaria da Educação, com a função de acompanhar e dinamizar o programa, na

instância de seu município; participar das reuniões e dos encontros agendados pelo

9 As funções atribuídas aos profissionais integrantes do Programa Pró-Letramento são apresentadas no

documento nomeado como Guia Geral.

Page 54: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

53

MEC e/ou pelas universidades; prestar informações sobre o andamento do programa no

município; subsidiar as ações dos tutores; tomar decisões de caráter administrativo e

logístico; garantir condições materiais e institucionais para o desenvolvimento do

programa.

O programa acontece em três fases: 1ª) adesão dos municípios e estados, 2ª)

etapa de revezamento e 3ª) etapa de retorno.

Na primeira fase, o MEC e as Universidades realizam a divulgação do Programa

nos estados e municípios - os contatos formalizando a adesão por meio de um contrato

de cooperação. Após a confirmação do contrato de adesão e o registro dos tutores,

formam-se os grupos que participarão da formação continuada para o desenvolvimento

da função de tutoria.

Simultaneamente a essa organização, os municípios adquirem a permissão para

que os professores cursistas que são vinculados ao sistema de ensino e trabalham em

classes das séries iniciais do ensino fundamental possam também realizar suas

inscrições.

Inicia-se, então, uma trama de formação da seguinte forma: os centros de

formação terão pesquisadores que serão os formadores dos professores orientadores de

estudos/tutores. Esses profissionais receberão a formação e estarão aptos a iniciar o

processo de formação continuada em seus municípios. Organizam-se, então, grupos de

professores que deverão reunir-se com o tutor, em encontros semanais ou quinzenais,

para discutir os textos lidos, criar e refletir sobre atividades e planejar futuras ações.

A segunda etapa, denominada de “revezamento”, conta com os mesmos tutores

da etapa anterior. Nessa fase os professores cursistas que participaram da formação em

alfabetização e linguagem realizarão a formação em Matemática e vice-versa.

Page 55: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

54

Na terceira etapa, denominada retorno, os municípios que não participaram da

primeira etapa do programa recebem a visita do MEC para serem convidados a

participar do Programa do Pró-Letramento.

O início do programa no Estado do Rio de Janeiro aconteceu no ano de 2006 em

parceria com a Secretaria Estadual de Educação e gestores municipais. Na área de

Alfabetização e Linguagem, foi coordenado, naquele momento pelo Centro de Estudos

em Educação de Pernambuco (CEEL)10

da Universidade Federal de Pernambuco

(UFPE), que foi criado em 2004. O centro tem como um dos seus objetivos a formação

continuada de professores de língua portuguesa para os diferentes níveis de ensino de

língua materna (OROFINO, 2010).

A coordenação da formação continuada no estado do Rio de Janeiro ficou a

cargo da Secretaria Estadual de Educação. Esta tinha como função ser a articuladora

entre a universidade e as secretarias municipais de educação com o objetivo de

promover os encontros de formação dos tutores em parceria com os centros de formação

(OROFINO, 2010).

1.3.3 O processo de formação continuada

O Pró-Letramento é um programa de formação continuada para professores das

séries iniciais do ensino fundamental e visa à melhoria da qualidade do ensino da leitura

e da escrita. O programa é realizado pelo MEC11

em parceria com universidades que

integram a Rede Nacional de Formação Continuada e com adesão dos estados e

10 O CEEL desenvolve pesquisas sobre o ensino da Língua Portuguesa, atua na formação de professores

de Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e Educação de Jovens e Adultos, além de

participar de programas em avaliação e produção de material didático. Dedica-se, ainda, a prestar

assessoria a diversas secretarias de educação e a divulgar os trabalhos realizados por meio de publicações

em livros, revistas, boletins e eventos científicos. (OROFINO, 2010). 11 Ministério da Educação - MEC é o órgão do governo que tem a responsabilidade de elaborar e

coordenar este programa. (http://portal.mec.gov.br/).

Page 56: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

55

municípios. Dele podem participar todos os professores que estão em exercício nas

séries iniciais do ensino fundamental das escolas públicas.

A adesão dos municípios, apresentando seus tutores, inicia o processo em que a

universidade, por meio de seus centros de formação, inicia o trabalho de planejamento

da formação dos tutores, prossegue com a formação dos mesmos, que se desdobra em

cada município com as turmas que esses tutores terão de professores cursistas.

Os centros têm a função de organizar as formações para o Professor Orientador

de Estudos/Tutor. Essa formação acontece em três momentos, cada um com 40 horas de

formação, perfazendo um total de 120 horas de formação que são realizadas pelos

formadores do centro de formação para os tutores das redes públicas. A formação

continuada para os tutores acontece ao longo de uma semana em um município que é

escolhido pela Secretaria Estadual de Educação e o MEC. (OROFINO, 2010).

A primeira semana de formação para os professores orientadores de

estudos/tutor acontece antes dos encontros locais para os professores. A proposta

consiste em que os tutores possam se organizar para dar início ao processo. Os dois

outros momentos acontecem simultaneamente às formações que tutores realizam com os

professores cursistas.

A proposta apresentada pelo Programa Pró-Letramento tem em sua estrutura um

campo fértil de possibilidades de investigação. Assim, ao encontrar um campo que se

organiza por diferentes instâncias da formação continuada constituídas pelos sujeitos,

personagens importantes desse processo, formadores, tutores e professores, é um

desafio na investigação desta pesquisa.

Page 57: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

56

1.4 O percurso da pesquisa

A proposta dessa pesquisa consiste em investigar o campo da formação

continuada em três instâncias: reuniões entre os formadores para planejar a formação

continuada para tutores-formadores, os encontros de formação continuada para tutores-

formadores e a formação continuada para professores do ensino fundamental. O

objetivo é identificar indícios de interlocuções que possam vir a se constituir no ato da

formação continuada em cada espaço construído para a realização do processo.

Para a realização desse percurso, trago, no primeiro capítulo, uma aproximação

com o objeto por meio da escrita de fragmentos da minha memória com o objetivo de

justificar a aproximação com o campo da formação continuada e a escolha dos sujeitos

da pesquisa – formadores e tutores-formadores. A decisão por esse tema revela a

aproximação com o campo da alfabetização e letramento, temas recorrentes em práticas

de formação continuada e em estudos de investigação sobre o tema. O campo se

constitui de um universo de caminhos, exigindo um recorte sobre o campo. Os estudos

de Soares (2004), Mortatti (2009), Andrade (1997, 2007, 2009, 2011) e Goulart (2006)

contribuem para a aproximação com a discussão sobre alfabetização e letramento,

apontando todo o processo de investigação sobre a temática nomeada pelas autoras entre

o “antigo” e o “moderno”. Na construção desse capítulo, a proposta de anunciar a

aproximação com o campo de pesquisa revela a importância de apresentação do campo

de investigação, ainda que de forma breve, o Programa Pró-Letramento do Ministério da

Educação. A proposta apresentada pelo programa consiste em organizar e estruturar

formações continuadas para tutores-formadores e professores dos anos iniciais do

ensino fundamental.

Page 58: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

57

No segundo capítulo, busco construir uma interlocução com autores com o

objetivo de construir uma trama teórico-metodológica que possa auxiliar o meu olhar de

pesquisadora sobre o campo da pesquisa. Encontrei nos autores centrais desse estudo

(Bakhtin e Benjamin) sustentação para compreender a linguagem como constitutiva dos

sujeitos; a pesquisa como linguagem e a metodologia como um exercício de aproximar

as interlocuções constituídas nas práticas de formação continuada de possíveis indícios

sobre possíveis saberes construídos por formadores e tutores-formadores.

No terceiro capítulo, entro no campo buscando identificar indícios sobre as

interlocuções constituídas ao longo dos encontros de formação continuada entre

formadores e tutores-formadores e, em uma segunda instância, entre os tutores-

formadores e os professores. O encontro de indícios constituídos no ato da interlocução

entre os personagens integrantes desse espaço acontece por meio dos discursos

constituídos nesse espaço.

Nas considerações finais, apresento que as interlocuções que são constituídas ao

longo dos encontros de formação continuada criam possibilidades de investigação sobre

diferentes caminhos, dentre eles indícios de constituição de possíveis saberes dos

formadores e dos tutores professores.

Page 59: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

58

2 CAMINHOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS: TECENDO OS BORDADOS

E CRIANDO POSSÍVEIS LAÇADAS

Quando contemplo no todo um homem situado fora e diante de mim, nossos

horizontes concretos efetivamente vivenciáveis não coincidem. Porque em

qualquer situação ou proximidade que esse outro que contemplo possa estar em relação a mim, sempre verei e saberei algo que ele, da sua posição fora e

diante de mim, não pode ver: as partes de seu corpo inacessíveis ao seu

próprio olhar... o mundo atrás dele, toda uma série de objetos e relações que,

em função dessa ou daquela relação de reciprocidade entre nós, são

acessíveis a mim e inacessíveis a ele. (BAKHTIN, 2006: 21).

Ao encontrar essas palavras, mergulho sobre os conceitos bakhtinianos, sem,

contudo, ter a pretensão de esgotá-los, muito menos de marcá-los como únicos e

absolutos. No entanto, a primeira vez que li verei e saberei algo que ele, da sua posição

fora e diante de mim, não pode ver, essas palavras despertaram o reconhecimento dos

tantos diálogos ao longo de meu percurso profissional em trabalhos realizados com

formação continuada de professores do ensino público. Conversas com e sobre

professores são parte da minha história profissional, no campo da formação no qual

estou inserida.

O encontro com um autor que apresenta teoricamente que há situações que me

são inacessíveis e afirma que somente o outro poderá completar-me com o seu olhar,

desvela uma perspectiva que, até então, me era inacessível. Conheço e aprendo sobre

movimentos singulares de marcar e ser marcado pelo outro.

Ao considerar esse princípio sobre a relação entre sujeitos, instaura-se a

possibilidade de compreender alguns, dentre tantos, contornos dos discursos que são

constituídos entre professores e tutores-formadores, nas formações continuadas para

professores dos anos iniciais do ensino fundamental, fato que tem me acompanhado ao

longo do meu percurso profissional.

Page 60: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

59

2.1 Mikhail Bakhtin: encontrando com o fio da exotopia na interlocução com

sujeitos

As leituras dos textos de Bakhtin foram desvelando um teórico que não somente

marcava os discursos, com um foco restrito na linguística, ao contrário, contextualizava

os sujeitos, imbricado no contexto histórico e na constituição dos discursos. Sendo

assim, a proposta da escrita desse texto consiste em marcar os conceitos bakhtinianos

que auxiliam a compreender o processo de interlocuções constituídas nas formações

continuadas para professores dos anos iniciais do ensino fundamental a partir dos

conceitos de enunciação, a de outrem e exotopia.

O deslocamento de posição, de responsável pela formação continuada para o

lugar de pesquisadora do campo me desafiou a criar um distanciamento dessa posição e

encontrar um lugar onde eu possa contemplá-las, desnaturalizá-las, admitindo e

identificando partes que até então me eram inacessíveis. Retomá-las, marcá-las,

compreendê-las nas suas singularidades e, consequentemente, apresentá-las e

ressignificá-las neste texto de pesquisa torna-se um desafio deste trabalho (AMORIM,

2004).

Entrar na leitura sobre a perspectiva teórica apontada pelo autor me remete a

pensá-la como uma trama que se tece a cada movimento de busca de compreender e

analisar a linguagem, não como algo fragmentado em palavras, frases e orações, mas em

algo que se constitui e é constituído pelos sujeitos. Desse ponto de vista, há riscos de

escolher alguns conceitos, contudo, pelos limites do texto dissertativo, reconheço as

demarcações e o desafio de realizá-lo.

Discursos se constituem com e sobre os sujeitos pela linguagem (BAKHTIN,

2003). Esse princípio nos aponta que a língua, segundo a concepção bakhtiniana,

Page 61: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

60

acontece em função da constituição da comunicação verbal entre sujeitos. A elaboração

da linguagem acontece com os sujeitos e para os mesmos, marcados pelas relações

sociais e pelos contornos e traços singulares de cada um. Essa perspectiva nos propõe

perceber que há atravessamentos na constituição dessa linguagem, no que se refere a

aspectos sociais, históricos, culturais e ideológicos, onde os sujeitos estão imersos

(AMORIM, 2004). Portanto, existe aqui mais um, dentre tantos movimentos

simultâneos, que nos propõe as leituras de Bakhtin, pois, ao mesmo tempo em que esse

sujeito é atravessado, também é produtor desses atravessamentos.

A aproximação do conceito de linguagem nos sugere a pensar a fala na forma

concreta dos enunciados dos sujeitos. Para Bakhtin, a unidade real da comunicação

verbal é o enunciado. A fala só existe, na realidade, na forma concreta dos enunciados

de um indivíduo: do sujeito de um discurso-fala. O discurso se molda sempre à forma

do enunciado que pertence a um sujeito falante e não pode existir fora dessa forma

(1997:293). Sendo assim, os atos de fala são únicos e singulares, são marcados pelo

contexto no qual estão inseridos e pelos interlocutores que produzem tantos outros

enunciados. Cada enunciado constituído cria um novo enunciado, desse modo, inicia-se

uma trama de enunciados com uma infinidade de possibilidades futuras de novas

criações.

A constituição dos discursos dos sujeitos tem nos enunciados a sua unidade, e

estes são fundamentais para a compreensão e análise dos discursos que são produzidos

nos diferentes contextos nos quais são produzidos.

As esferas de discurso (GRILLO, 2006) relacionadas ao campo da formação

continuada de docentes brasileiros podem ser compreendidas a partir dos discursos,

como uma das suas nuances. Considerá-los sugere que precisamos não somente

Page 62: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

61

reconhecê-los, mas também os sujeitos seus produtores e, consequentemente, a sucessão

de enunciados que serão produzidos a partir de uma emissão focalizada, ou não, de

tantos outros.

Os discursos se organizam por meio de enunciados. Estes são elos de

comunicação construídos por fatores linguísticos e vinculados às situações da vida,

formando uma unidade (BAKHTIN, 2003). Os enunciados são parte constitutiva dos

discursos, ou seja, é por meio dos enunciados que estes são expressos. Logo, estão

imersos nas significações constitutivas do espaço social.

A comunicação entre sujeitos implica reconhecer que há alternância dos sujeitos

falantes (BAKHTIN, 2003). Há um movimento de falas que implica admitir que estes

enunciados são entremeados tanto pelos enunciados do outro quanto pelo contexto no

qual está inserido, como também pelos enunciados que este constituiu ao longo da sua

trajetória.

Conceber enunciados de forma viva e contextualizada implica assumir as

interlocuções entre sujeitos, ou seja, identificar que há um ir e vir de enunciados que são

produzidos na comunicação verbal entre os sujeitos. Bakhtin (2003) ainda nos aponta

que esta resposta pode não estar explícita no discurso, mas também imersa nos silêncios

e nos atos repletos de sentidos e significados que são constituídos no ato de cada

comunicação verbal.

Pautando-nos na metáfora do bordado, os fios que tecem o conceito de

comunicação verbal são de diferentes texturas e tons. Os enunciados apresentam marcas

singulares constituídas por cada sujeito, cada ato enunciativo se compõe de nuances e

sutilezas singulares, e os atravessamentos do contexto sócio-histórico contribuem para a

constituição dos sentidos elaborados e expressos nos discursos. Ouso ainda dizer que se

constroem bordados que são tecidos a cada enunciado constituído na alternância de falas

Page 63: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

62

que marcam os campos sociais e suas esferas de comunicação (GRILLO, 2006), e um

desses campos se constitui no espaço da formação continuada.

As fronteiras dos enunciados são constituídas na alternância das falas entre os

sujeitos. Cada discurso expresso cria a possibilidade de não somente se identificar os

enunciados como também dispor de seus sentidos, apropriando-se e constituindo novos

significados. Assim uma trama com os enunciados constituídos pelos diferentes sujeitos

se tece.

A busca por compreender o campo da formação continuada de professores a

partir da pequena trama traçada até aqui provoca a reflexão sobre o movimento de

discursos que são elaborados nesse espaço constituído por professores e tutores-

formadores (ANDRADE, 2009). Se, nos discursos, os enunciados constituídos por cada

sujeito participante se apresentam como a unidade de comunicação, os sentidos e

significados se constituem profundamente imersos no contexto no qual ambos estão

inseridos, cada um dos sujeitos das díades representando os lugares que ocupam naquele

espaço profissional, e a perspectiva histórica que cada sujeito acumula ao longo da sua

trajetória se constitui no ato da formação continuada (BAKHTIN, 2003). Conceber a

perspectiva discursiva do discurso significa considerar este movimento complexo de

interlocução.

Portanto, ao admitir que discursos são constituídos de enunciados e impregnados

de sentidos construídos ao longo do percurso profissional, revela-se, então, a construção

de uma rede de interlocuções discursivas entre sujeitos que marca cada um na sua

singularidade, ao mesmo tempo em que constitui a perspectiva histórica da qual são

participantes e construtores.

A busca por compreender fragmentos dos discursos construídos entre

professores e tutores-formadores objetivando identificar as marcas discursivas que os

Page 64: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

63

profissionais responsáveis por estas formações constroem no ato de cada formação se

tornou algo que coloquei um foco de observação.

A cada movimento discursivo, constituições de discursos acontecem na

singularidade de cada sujeito, mas também na coletividade de cada grupo, sendo assim,

as marcas discursivas são construídas no individual e no coletivo, marcando-os como

sujeitos históricos, situados em seu tempo e espaço (ANDRADE, 2007).

A leitura do campo da formação continuada sob essas lentes bakhtinianas

instaura a possibilidade de compreender, via discursos, as práticas constituídas nos

espaços da formação continuada entre tutores-formadores e professores: suas

interlocuções, os sentidos produzidos, silêncios e gestos, algumas das marcas

constituidoras dos diálogos entre esses sujeitos.

O encontro com esse filósofo da linguagem marca também a possibilidade de

identificar referenciais centrados no sujeito inserido no contexto que constrói a sua

história, focalizando a realidade humana, reconhecendo as suas implicações na busca de

alternativas de superação dos dilemas existenciais, que são infindáveis diante da

possibilidade de identificar enunciados nos discursos emitidos.

Ao colocar o foco sobre as experiências no campo da formação de professores,

mais especificamente sobre professores do ensino público, logo se revelam as posições

dos principais mediadores responsáveis pelos encontros, os tutores-formadores,

profissionais provisoriamente deslocados da ação docente, que se situam como

planejadores e avaliadores, para pensar sobre o ato de ensinar a adultos.

As relações estabelecidas entre tutores-formadores e professores se torna foco

de investigação desta pesquisa por identificar que no ato da formação continuada há

uma infinidade de diálogos que se constituem, singularidades que são construídas a cada

formação.

Page 65: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

64

Chego, então, aos discursos. Busco identificar, descrever e compreender o que

dizem os formadores? E os tutores-formadores? Que temas podem ser encontrados

tratados em seus discursos? Quem são seus interlocutores pretendidos? De que, para que

e para quem falam?

Segundo Bakhtin (1926), no discurso verbal, os enunciados são imbricados na

vida, não podendo ser dissociados, com risco de perder sua significação. A vida está

estreitamente ligada ao discurso do sujeito, reconhecendo-se, então, que não há discurso

fora do contexto social. Sendo assim, os enunciados são marcados pelo contexto social

no qual estão inseridos.

Desse modo, esses sujeitos, professores e tutores-formadores, participantes das

formações, imersos nos contextos e em seus próprios atos de produção de discursos,

imbricados nas relações, constituem-se nesse espaço-tempo. A cada ação de formação

continuada, os enunciados ganham corpo, e os contornos são construídos no movimento

discursivo que se estabelece entre esses sujeitos, apontando novos sentidos e

significados singulares.

Bakhtin (1926) nos aponta, ainda, que a constituição do discurso verbal acontece

a partir de enunciados verbais e extraverbais. Os verbais, embora estejam diretamente

relacionados às questões estritamente linguísticas do discurso, contudo, só construirão

sua completude ao serem contextualizados numa situação da vida. Nesse momento,

passam a ser identificados como enunciados extraverbais. São fundamentais para

caracterizar o contexto no qual o discurso está ao mesmo tempo imerso e sendo

constituído. Desse modo, ao se estabelecer a emissão do discurso verbal, faz-se

necessário considerar tanto as questões linguísticas, como também todo o contexto no

qual está sendo produzido.

Page 66: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

65

Cada ato de fala está impregnado de aspectos extraverbais presentes na vida de

cada sujeito que constitui a cena do discurso. Os ditos e não ditos, acentos apreciativos,

gestos, subjetividades, estão impregnados de sentidos que são construídos no e sobre o

contexto (BAKHTIN, 1926). O autor afirma que o “contexto extraverbal” é marcado

por aspectos que não são necessariamente expressos verbalmente nos enunciados. A

situação se caracteriza por dimensões que são compartilhadas, compreendidas, avaliadas

entre os interlocutores, construindo, então, pressupostos na e sobre a realidade social.

Todo esse processo acontece sem que os sujeitos precisem construir enunciados verbais

para apresentá-los.

Vale considerar, então, que há falas, palavras enunciadas, mas também gestos,

expressões, discordâncias, disputas, silêncios, movimentos de corpo, a organização do

espaço, os recursos disponíveis, as diferentes interações ou não interações, uma

infinidade de marcas, pois cada movimento constituído provoca no outro uma reação, e

não há controle sobre essas ações, sendo assim, o imprevisível está presente e faz parte

das constituições que são estabelecidas.

Os enunciados extraverbais do discurso (BAKHTIN, 1926) são compartilhados

por aqueles que pertencem a um mesmo grupo social, uma profissão, uma classe. Sendo

assim, há, no espaço da formação continuada para professores, pressupostos comuns,

partilhados entre professores e tutores-formadores que não exigem formulações verbais

explícitas, aspectos que se incorporaram aos objetos e às situações que organizam o

espaço da formação continuada. Portanto, os discursos enunciados e as interlocuções

que se manifestam revelam uma rede de sentidos, tecendo uma trama infinita de

significados, partilhados entre professores e tutores-formadores.

Ao considerar que a constituição do discurso acontece na interação entre

sujeitos, compõe-se uma rede com enunciados verbais e extraverbais que está para além

Page 67: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

66

do seu tempo. Essa composição faz parte de um contexto histórico maior, pois são

considerados não somente os enunciados constituídos no tempo presente, mas também

aqueles que o precederam. Torna-se, portanto, fundamental considerar a perspectiva

histórica na qual esse processo está inserido.

A teoria bakhtiniana propõe uma articulação entre sujeito, tempo e espaço, e

uma das vias de apresentação, das permanências e das marcas da constituição histórica,

social e cultural realiza-se por meio do diálogo. Portanto, constitui-se uma das formas

mais importantes de interação verbal (MARCHEZAN, 2006: 117). Ao trazer para este

texto as questões em torno do diálogo, revela-se a possibilidade de compreender tanto

as questões em torno do que está marcado no “contexto extraverbal”, quanto o que está

sendo expresso a cada enunciado.

Ao aproximar o foco sobre os discursos constituídos na formação de professor,

reconheço que eles acontecem também por via do diálogo entre professores e tutores-

formadores. A palavra diálogo, na perspectiva bakhtiniana, se apresenta como uma

reação do eu ao outro, como “reação da palavra à palavra de outrem” (MARCHEZAN,

2006). É no diálogo real que esta alternância dos sujeitos falantes é observada de modo

mais direto e evidente. (BAKHTIN, 1997: 295).

Cabe ainda ressaltar que os diálogos estão imersos em valores, contextos

socioculturais, tensões, disputas, discordâncias, mas também atravessados por

entendimentos, réplicas, reflexões, situações reveladas no e sobre contexto social.

(AMORIM, 2004).

Os diálogos, nessa perspectiva, provocam que cada sujeito, participante do

espaço discursivo, se altere em relação à posição do outro. Simultaneamente, eu e o

outro vivenciamos o ato de se alterar. Eu me altero a partir dos enunciados que se

constituem nos diálogos que estabeleço com o outro. No movimento discursivo que se

Page 68: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

67

estabelece entre o eu e o outro, há um compartilhar de sentidos e significados, um

partilhar de palavras que são do outro e que a cada diálogo as tomo e faço uso,

tornando-as minhas. Se me constituo na interlocução com o outro, e esta se elabora por

enunciados, o diálogo cria a movimentação desse espaço discursivo.

Os enunciados que são revelados por cada sujeito, participantes do espaço

discursivo da formação continuada, são constituídos não somente pelos sentidos que são

anunciados no ato da enunciação, mas também pelos significados que eles carregam na

interlocução com tantos outros sujeitos, ou seja, vozes de tantos outros que constituem

os discursos de cada sujeito participante do espaço discursivo. Isso está relacionado ao

conceito de polifonia, explicitado por Bezerra: “no que se refere à convivência e à

interação, em um mesmo espaço, de uma multiplicidade de vozes e consciências

independentes e imiscíveis, vozes e consciências equipotentes.” (BEZERRA, 2008:

195).

O discurso que cada sujeito do espaço discursivo da formação continuada

constitui tem em seu corpo diferentes vozes que compõem os enunciados. A

constituição do discurso acontece com e pelos enunciados do outro. Se o diálogo é o

movimento que cria a interlocução, do lugar que cada um fala, há também a presença de

uma infinidade de vozes que cada um carrega pela participação em diferentes processos

discursivos que foram sendo construídos ao longo da sua trajetória profissional.

Amorim (2004: 26) ressalta que “todo trabalho de pesquisa seria uma tradução

do que é estranho para o que é familiar”. A construção da estranheza sobre o objeto

acontece ao se reconhecer a necessidade e a importância de construir um distanciamento

sobre objeto da pesquisa, sem, contudo, perder a proximidade.

A autora propõe que o pesquisador mergulhe no campo, construindo esse olhar

de estranhamento sobre o objeto. Identifico a importância desse ato, considerando a

Page 69: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

68

trama construída a partir dos referenciais bakhtinianos, a seriedade de estranhá-los e a

responsabilidade por apresentá-los. Ao retornar, de posse desses dados, devo torná-los

visíveis, desvelando ao campo de estudos, com os limites, mas também com as

potencialidades constituídas por mim, pesquisadora desse campo.

O percurso descrito acima se fundamenta no movimento exotópico proposto por

Bakhtin na seguinte passagem:

O excedente da minha visão contém em germe a forma acabada do outro,

cujo desabrochar requer que eu lhe complete o horizonte sem lhe tirar a

originalidade. Devo identificar-me com o outro e ver o mundo através de seu

sistema de valores, tal como ele o vê; devo colocar-me em seu lugar, e

depois, de volta ao meu lugar, completar seu horizonte com tudo o que se

descobre do lugar que ocupo, fora dele; devo emoldurá-lo, criar-lhe um

ambiente que o acabe, mediante o excedente de minha visão, de meu saber,

de meu desejo e de meu sentimento". (BAKHTIN, 1997: 45).

Ao colocar o foco nas minhas experiências profissionais, mais precisamente no

trabalho que realizava, encontro a posição discursiva: o tutor-formador. Tenho, então, a

necessidade de assinalar o deslocamento de posição que está sendo constituído desde o

início deste texto, o lugar de pesquisadora.

Considero que essa possibilidade se tornou possível a partir do diálogo com o

conceito de excedente de visão proposto por Bakhtin (1997). Ir ao encontro do outro,

ver o mundo com os seus olhos, nas subjetividades, nas interações, nos silêncios, nas

falas, enfim, nas posições discursivas expressas nos espaços de formações continuadas

dos professores; retornar ao meu lugar e oferecer ao outro um olhar inteiro que só é

possível do lugar que eu ocupo. Esse é o desafio que me coloco na construção do lugar

de pesquisadora que faço com esta pesquisa por meio do conceito de exotopia proposto

por Bakhtin.

Contudo, ao considerar o conceito de exotopia como um encaminhamento

metodológico de pesquisa, uma condição imprescindível ao processo está no

movimento que o pesquisador realiza: entrar no país do outro (AMORIM, 2004). Ao

Page 70: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

69

abrir esta porta, descortina-se uma infinidade de diálogos que serão construídos,

reconhecendo nas alteridades que serão constituídas, por mim, enquanto pesquisadora,

mas também com os sujeitos da pesquisa.

Nesse movimento, vale marcar o que Amorim (2004) chama de estranheza do

objeto, pois há de construir um distanciamento do objeto, dando-se a oportunidade de

construir perplexidades, surpresas, admirações, interrogações, desnaturalizando o que

está instituído como “normal” daquele espaço. A autora propõe ainda sermos

simultaneamente hóspedes e anfitriões, pois, em um primeiro momento, o pesquisador é

acolhido pelo outro, no entanto, em um segundo momento, será anfitrião, pois será ele

que irá apresentar aquele país do seu ponto de vista na autoria do seu texto de pesquisa

(AMORIM, 2004).

Ao entrar no país da formação continuada para professores do ensino

fundamental das redes públicas, desvela-se um universo de perspectivas, movimentos,

enunciações, diálogos que se constituem na especificidade de cada ano de escolaridade

no qual o professor ensina. Simultaneamente a esses sujeitos, há os tutores-formadores,

aqueles que são os responsáveis por encaminhar as ações da formação. Instaura-se,

então, um processo de interlocução atravessado por tensões, disputas, conhecimentos,

experiências, relações de forças.

Ao considerarmos a diversidade e a singularidade do discurso, não podemos nos

esquecer de examinar as forças desiguais que os produzem e atravessam. É nessa arena

que se constitui o espaço da formação continuada. A escrita desta dissertação me desafia

a identificar os excedentes de visão do outro que está inacessível a ele. O texto, então,

busca marcar essas descobertas e assinalar esses excedentes.

O pesquisador, ao entrar no país do outro (AMORIM, 2004), acessa o outro

naquilo que está inacessível a ele, e essa possibilidade cria um movimento exotópico de

Page 71: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

70

diferentes acabamentos provisórios, pois cada discurso proferido sobre o que está

inacessível ao outro irá revelar diferentes interlocuções, criando um movimento

exotópico infinito.

Contudo, faz-se necessário reconhecer que esse movimento acontece de forma

única e singular, pois as interlocuções que são possíveis nesse movimento estão

marcadas pela autoria do pesquisador que criou uma dentre tantas formas e caminhos de

apresentar os dados coletado nesse campo. Cada discurso proferido está imerso em

sentidos e significados que são construídos no ato de observar e, consequentemente, de

apresentar os sujeitos da pesquisa.

2.2 Carlo Ginzburg: rastros e indícios de uma trama: os desafios do paradigma

indiciário

Aproximar a trama tecida entre enunciado, discurso e exotopia - conceitos

bakhtinianos - ao campo da formação continuada de professores tornou-se um desafio

na escrita deste texto dissertativo. Relacioná-los implica considerar a necessidade de

compreender que os discursos constituídos nesse espaço a partir dos temas das

formações continuadas estarão mergulhados no contexto histórico e social no qual esse

processo está imerso.

Instigada a perceber nuances, tons, texturas, cores com as quais são tecidos os

fios dos discursos dos sujeitos participantes da formação torna-se uma forma, dentre

tantas possíveis, de pesquisar. Entretanto, para perceber as cores, há de se ter um

caminho, um percurso. De que cores, nuances e texturas são marcados os discursos

constituídos nas formações continuadas entre professores e tutores-formadores? Como

selecionar, escolher essas constituições? Que procedimento utilizar?

Page 72: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

71

A necessidade de uma escolha metodológica me aproxima do paradigma

indiciário de Ginzburg, que nos apresenta uma base para pensar o modelo

epistemológico. O autor propõe a seguinte reflexão:

é preciso não se basear, como normalmente se faz, em características mais

vistosas, portanto mais facilmente imitáveis, dos quadros... é necessário

examinar os pormenores mais negligenciáveis, e menos influenciados pelas

características da escola a que o pintor pertencia... traços presentes nas

originais, mas não nas cópias. (GINZBURG, 1989: 144).

No trecho acima, Morelli aponta a possibilidade de que se procure não as

características aparentes, mas sim os pormenores negligenciados. O autor nos convida a

olhar não somente o que está aparente para todos, mas sim características e traços não

tão evidentes. Ginzburg, ao trazer Morelli para pensar sobre o campo epistemológico,

nos aproxima para pensar sobre que marcas, aspectos, formas que a priori não seriam

considerados, mas que, a partir do paradigma indiciário, haveria a necessidade e a

importância de ser observado e evidenciado.

O paradigma indiciário consiste em um método investigativo centrado nos

pormenores, nos resíduos, nos rastros mais tímidos, considerados reveladores, que

pareciam sinais considerados irrelevantes ao olhar. Ginzburg nos afirma que:

Esse conceito poderia funcionar como uma espécie de atalho, um atalho que comportasse a ideia de sempre começar novamente, trabalhando nos

resultados, em hipóteses, e então tentar complicá-las, deixando o processo

evidente para o leitor, e assim por diante. Defendo que devemos tentar

trabalhar nesse sentido. (GINZBURG, 1989: 144).

Considerar a perspectiva do paradigma indiciário admite reconhecer a dúvida,

como um interlocutor, problematizar os temas, informar os caminhos, mesmo os

abandonos, explicitar a incerteza, o que está sendo reconhecido e o que poderá se tornar

provisório no momento seguinte; as sinuosidades do processo de investigação do

pesquisador, identificando que estes “bastidores” devem ser explicitados no decorrer do

Page 73: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

72

processo. Compreender o processo investigativo como um processo vivo que se tece e é

tecido ao ser realizado consiste no desafio.

O paradigma indiciário contribui na medida em que considera os rastros e as

singulares no campo da investigação. Nessa perspectiva, se desvelam os não ditos, o

que não está aparente, as contradições, pausas, silêncios, negações, ou seja, pelos

indícios, é possível compreender atitudes, mudanças e mecanismos criados pelos

sujeitos como forma de mediação com a realidade. Se a realidade é opaca, existem

zonas privilegiadas – sinais, indícios que permitem decifrá-la. “(...) Essa idéia constitui

o ponto essencial do paradigma indiciário”. (GINZBURG, 1989: 145).

Ao observar, marcar, escarafunchar os interiores das formações continuadas para

professores, deparamo-nos, em um primeiro momento, com as práticas de formadores

em uma primeira instância e os tutores-formadores em uma segunda instância. Estas são

constituídas por diferentes aspectos, dentre eles os discursos dos sujeitos participantes.

Tenho como proposta tornar visíveis indícios, sinais, que permitem olhar no e sobre o

ato da formação, os discursos constituídos entre formadores e tutores-formadores e, em

um segundo momento, entre tutor-formador e professores, indícios aparentemente

invisíveis aos sujeitos participantes daquele espaço.

Esse paradigma revela um conjunto de elementos ditos imponderáveis, como

palavras, silêncios, pressupostos teóricos, experiências, enfim, discursos que nos

instiguem a marcar esses indícios. Levá-los em conta nesta pesquisa expressa

compreender, por meio dos discursos, os enunciados produzidos nas formações

continuadas, analisando, por meio das práticas dessa formação, as interlocuções nos

infinitos discursos que são constituídos entre formadores, tutores-formadores e

professores.

Page 74: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

73

Ao considerar a perspectiva do paradigma indiciário como um caminho possível,

criando não somente uma forma de encaminhar as escolhas, mas também assinalando as

escolhas sobre o campo empírico, essa escolha teórico-metodológica também estabelece

pontos de relações com a abordagem bakhtiniana.

Esses saberes não estão organizados e acabados, ao contrário, estão imersos nos

discursos, fragmentados, podendo ser revelados nos rastros, pormenores, indícios

constituidores desses discursos. Esses precisam se tornar visíveis para o campo de

estudos sobre esse sujeito tutor-formador.

Há marcas que são recorrentes nas formações continuadas para professores.

Imersos nesse espaço discursivo, há temas que são abordados pelo tutor-formador que

provocam enunciados diversos e com diferentes significados.

Os aportes teóricos entre o paradigma indiciário e as contribuições bakhtinianas

convergem para a produção de uma nova possibilidade de olhar as práticas nas

formações continuadas, no que se refere à função do tutor-formador. A proposta

consiste em apontar possíveis contornos sobre a função do tutor-formador no que se

refere aos enunciados que estão presentes nos discursos que são constituídos nos

espaços das formações continuadas.

Dessa forma, o diálogo com Ginzburg (1989) possibilitou a aproximação de uma

metodologia investigativa para uma pesquisa que se preocupou não com a identificação

e interpretação dos significados, mas com a pluralidade das possíveis significações

constituídas.

O que considerar nas observações sobre de campo da formação continuada para

professores dos anos iniciais do ensino fundamental? Que contornos delinear sobre

esses discursos? Como são construídos os critérios que serão utilizados para selecionar

Page 75: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

74

os fragmentos, fios do campo empírico? São alguns indícios das análises possíveis sobre

esse campo.

2.3 Walter Benjamin: alguns indícios nas narrativas das experiências dos sujeitos

Um dia, Guilherme Augusto escutou sua mãe e seu pai conversando sobre Dona Antonia.

- Coitada da velhinha – disse sua mãe.

- Por que ela é coitada? – perguntou Guilherme Augusto. - Porque ela perdeu a memória – respondeu seu pai.

- Também, não é para menos – disse sua mãe. – Afinal ela já tem quase noventa e seis anos.

- O que é uma memória – perguntou Guilherme Augusto. Ele vivia fazendo perguntas.

- É algo de que você se lembre – respondeu o pai

(Fox, 1995)

Provocada pelos escritos de Walter Benjamin, surgem lampejos de lembranças,

como flashes de imagens, inundando meus pensamentos por meio de sons, sabores,

formas, textos, histórias em diferentes momentos. Dentre tantas, uma história em

especial me acompanhou durante os estudos: Guilherme Augusto Araújo Fernandes.

Esse menino, que não era tão velho assim com a sua célebre pergunta O que é

uma memória? mobilizou-me a pensar sobre as memórias. Relembro então, situações

guardadas em um tempo, que ao serem trazidas para este texto ganham consistência e

forma. A história é um objeto de uma construção cujo lugar não é o tempo homogêneo

e vazio, mas um tempo saturado de “agoras” (BENJAMIN, 1994:229).

O reconhecimento do tempo histórico, não somente pelas suas causalidades

lineares apresentadas por meio de uma ordenação cronológica de fatos históricos, mas

também pela compreensão em termos da intensidade das situações, provoca uma

reflexão sobre a importância, a consistência e as implicações das lembranças para o

coletivo.

Os “agoras” apresentados por Benjamin são manifestações das raízes de nossas

lembranças em saltos e recortes que desconstroem a perspectiva linear e evolucionista

Page 76: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

75

da história oficial. Apontar a importância dos fragmentos, identificando as origens,

independente da localização em um tempo linear reafirma que ao se articular

historicamente o passado não significa conhecê-lo “como ele de fato foi”. Significa

apropriar-se de uma reminiscência, tal como ela relampeja no momento de um perigo

(BENJAMIN,1994:224).

Portanto, em meu caminho profissional, identifico em algumas práticas sentidos

que construí a partir de suas origens e que ao serem trazidas para o tempo presente são

marcadas por novos significados. As reminiscências (BENJAMIN, 1994) das práticas

escolares e seus relatos nos propõem não somente admitir sua importância em seus

saberes e intensidades, mas também a identificá-las como uma ação que diz respeito ao

coletivo.

Ao me aproximar das lembranças de encontros com professores dos anos

iniciais, enquanto formadora de professores, as que insistem em permanecer de forma

recorrente são as falas dos docentes. Manifestavam-se por meio das emoções sobre

desafios enfrentados no cotidiano das escolas, em suas salas de aula.

Identifico então nas memórias enquanto formadora de professores os “agoras”

dos professores como constituidores de meu percurso profissional. Percebo que as falas

dos professores, naquele momento, se tornavam reflexões indicando a necessidade de

encontrar respostas e criação de um outro momento para uma nova possibilidade de

abordá-los.

Esse movimento acontecia ainda de forma intuitiva, acreditava que precisava

responder aos professores, enquanto formadora do grupo. Contudo, percebo que já

havia indícios (GINZBURG, 1989) de um reconhecimento da qualidade e da

consistência sobre as falas que os docentes expressavam nos encontros. De alguma

forma, após o encontro, continuava dialogando com eles.

Page 77: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

76

Prado e Soligo (2007) assinalam que as conversas cotidianas dos professores,

algo que acontece de forma espontânea entre os profissionais, revelam intensidades e a

possibilidade de se tornarem temas para textos escritos tratando sobre o que pensam,

sentem, aprendem e fazem em seu cotidiano nas salas de aula.

Ao me deparar com essas falas e considerá-las nas suas intensidades, identifico a

possibilidade de compreendê-las em seus conteúdos e valorizações, tanto para os

próprios professores, como também para os tutores-formadores.

Ainda que não seja algo explícito, esses relatos são de alguma forma,

reconhecidos, identificados tanto pelos emissores/professores, quanto pelos

ouvintes/professores e/ou tutores-formadores como referenciais para pensar sobre as

próprias práticas. De alguma forma, nos encontros de professores, em espaços internos e

externos à escola, há uma expectativa sobre a realização desses relatos e que servem

quase como balizadores, oferecendo referências sobre a participação dos profissionais

nos encontros.

Benjamin nos afirma que a reminiscência funda a cadeia da tradição, que

transmite os acontecimentos de geração a geração (1994:221). Ressaltar o conceito de

reminiscência neste texto tem como objetivo estabelecer uma relação entre os relatos

que docentes expressam nos encontros de formação continuada, as elaborações

constituídas por professores e tutores-formadores e as possíveis compreensões que esses

estabelecem sobre os relatos que são constituídos no ato da formação.

Tais relações, à luz dos conceitos benjaminianos, se constituem como as

narrativas das memórias tecidas com as falas dos docentes, algo que se torna recorrente

nos encontros de formação continuada. Proponho, então, um diálogo com os conceitos

benjaminianos de experiência e narrativa e o campo da formação continuada dos

professores, no que se refere às falas que os docentes realizam nos encontros de

Page 78: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

77

formação continuada e seus impactos na constituição dos conhecimentos dos

formadores de professores.

Considero que há um fecundo terreno sobre essas falas, tanto no que se refere

aos professores no sentido de qualificá-las no ato de compartilhar, como para os tutores-

formadores, ao considerá-las como constituidoras de suas práticas. Ouso, assim, propor

que se possam compreendê-las como experiências de narrativas: dos docentes e dos

formadores de professores.

2.3.1 Algumas nuances benjaminianas – narrativas e experiências

As experiências sempre foram comunicadas às novas gerações. De forma

concisa, com autoridade da velhice, em provérbios; de forma prolixa, com a

loquacidade, em histórias; muitas vezes como narrativas de países

longínquos, diante da lareira, contadas a pais e netos. (BENJAMIN,

1994:114)

O encontro com os escritos benjaminianos convocaram-me a pensar sobre as

tantas experiências que constituí ao longo de meu percurso profissional, como os tantos

professores que contribuíram na minha formação. Inicio um diálogo com os conceitos

do autor, buscando identificar as aproximações com o que os docentes falam e

simultaneamente ao que é transmitido para as novas gerações.

A experiência da arte de narrar está em vias de extinção. São cada vez mais

raras as pessoas que sabem narrar devidamente (BENJAMIN, 1994:197). A reflexão

provoca a análise do impacto dos que viveram a primeira guerra mundial e seus efeitos

nos sujeitos. Benjamin exalta, ainda, que combatentes voltavam mudos do campo de

batalha... mais pobres em experiências comunicáveis (BENJAMIN, 1994:198). O que

havia para ser comunicado após uma catástrofe humana como uma guerra mundial?

Ao considerar que há uma diminuição das experiências, o filósofo reconhece que

não há o que ser contado, o que transmitir. O que existem são informações que são

Page 79: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

78

acumuladas nos e sobre contextos sociais, indicando um imediatismo dos fatos e uma

não preocupação com as possíveis elaborações dessas situações. Sendo assim, o tempo e

o espaço para as compreensões e reflexões sobre os fatos estavam em processo de

declínio. O mesmo autor também afirma que há uma subtração nas experiências a serem

comunicadas e diz que essa pobreza não é mais privada, mas de toda a humanidade

(BENJAMIN,1994:115).

O autor realiza uma crítica severa aos modelos da modernidade vigentes no

início do século XX. Sua abordagem analisa que a sociedade estabelece um predomínio

do acúmulo de informações em detrimento das narrativas tecidas nas rodas dos

trabalhos manuais, que fundavam nas reminiscências (BENJAMIN, 1994). As perdas

sociais dessa escolha, de acordo com o autor, acarretavam o empobrecimento das

experiências e o enfraquecimento das tradições culturais.

Benjamin (1994) assinala que de alguma forma houve uma cisão entre sujeito e

coletivo. A perspectiva progressista, ou melhor, de evolução histórica, instaurou novos

paradigmas e situações sociais que ratificavam essa visão, dentre eles: a

industrialização, a produção em série, a valorização da técnica, o acúmulo de

informações, a mercantilização dos valores. Nessa perspectiva, não havia espaço e

tempo para se considerar as histórias que são contadas e as marcas que cada uma

imprimia.

As experiências precisam ser consideradas e compartilhadas, pois os fatos que

cada sujeito experimenta, ainda que adquiram um caráter privado na sua constituição,

são gerados numa dada experiência coletiva (BENJAMIN, 1994). Há então um

descompasso que se estabelece, com o declínio das experiências e o predomínio das

informações. Konder coloca no foco a discussão e nos propõe reflexões sobre os

conceitos de experiências e vivências:

Page 80: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

79

“Erfahrung” é o conhecimento obtido através de uma experiência que se

acumula, que se prolonga, que se desdobra, como numa viagem (e viajar, em

alemão, é fahren); o sujeito integrado numa comunidade dispõe de critérios

que lhe permitem ir sedimentando as coisas, com o tempo.

“Erlebnis” é a vivencia do indivíduo privado, isolado; e a impressão forte,

que precisa ser assimilada as pressas, que produz efeitos imediatos.

“Erfahrung é o produto do trabalho e “Erlebnis é a fantasmagoria do ocioso.

(KONDER, 1989:72)

O conceito de experiência (KONDER, 1989) torna visível a importância da

elaboração dos conhecimentos admitindo que a cada transmissão se ressignifiquem,

criando então novos sentidos. As narrativas, ao serem comunicadas, instauram um

resgate da temporalidade em suas origens, desvelam suas intensidades, fundando a

cadeia da tradição.

As experiências que são narradas revelam as raízes das tradições que emergem

em cada movimento de contá-las. No coletivo, ao serem compartilhadas instaura-se um

comprometimento entre os sujeitos, cria-se um espaço de re-elaboração dos significados

tanto para quem conta como para quem ouve. Sendo assim, cada narrativa não

comunicada enfraquece a rede das narrativas das experiências, levando a diminuição da

rede da tradição histórica.

Diante desse fato, o que predomina e ganha espaço social são as informações.

Konder (1989) então nos apresenta o conceito de vivência como algo que está na

superfície, no tempo presente, o que está imediatamente ao nosso alcance, com as

comoções do primeiro momento. A apropriação da vivência acontece de forma

instantânea, sem preocupações com a continuidade, com a extensão do que foi dito.

Benjamin (1994) aponta a substituição das narrativas pelas informações do instante

presente e essa perspectiva prevê o consumo, a necessidade de um armazenamento de

fatos, de objetos por si.

Nesse tempo contemporâneo, as vivências (KONDER, 1989) são uma constante,

situações presentes, surgidas no imediato, não havendo espaços para compreensões e

Page 81: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

80

elaborações sobre o vivido. A relação somente com o que está na superfície do vivido

impede que sujeitos possam olhar para frente e os convida a se contentar com o pouco

que está sendo oferecido. O autor considera esse fenômeno a nova barbárie

(BENJAMIN, 1994:116).

Benjamin (1994) nos propõe trabalhar com e sobre esse empobrecimento e

observa que há brechas para superação, pois muitos foram os homens implacáveis que

operaram a partir de uma tábula rasa (BENJAMIN, 1994:116).

A superação consiste na observação das brechas, de olhar para as fissuras

instaurando um espaço criativo e desvelando então novos significados, novos caminhos,

novos sentidos. Benjamin (1994) nomeia esse fenômeno, apontando-o como uma nova

perspectiva positiva sobre o conceito de barbárie.

Identifico que uma das brechas (BENJAMIN, 1994) possíveis consiste na criação

simultânea de espaços e tempos para realizar as narrativas. Ao serem transmitidas às

novas gerações, serão reelaboradas, ganhando novos sentidos e significados. Esse

movimento convoca o outro, criando elos na e sobre as transmissões e, com isso, tece

novas tramas nesta grande rede de narrativa de experiências.

O autor nos provoca ainda com as seguintes questões: Há algo ainda a ser

transmitido? O que desejamos deixar para as próximas gerações? Há legados a

comunicar? E continua: qual é o valor de todo o nosso patrimônio cultural, se a

experiência não mais o vincula a nós? (BENJAMIN, 1994:115). Há uma exigência de

um olhar mais apurado sobre os temas das narrativas, as intensidades do que está sendo

narrado, o vigor e as elaborações do que é transmitido. O ato de compartilhar

experiências instaura um processo de elaboração e ressignificação que são marcados no

ato de partilhar no coletivo, fato que contribui significativamente para a constituição de

novos sentidos e significados.

Page 82: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

81

A narrativa, que durante tanto tempo floresceu num meio artesão – no campo, no

mar e na cidade –, é ela própria, num certo sentido, uma forma artesanal de

comunicação (BENJAMIN, 1994:205). Essa perspectiva artesanal apresenta a

possibilidade da continuidade, pois a cada movimento de “fazer com as mãos” surgia a

possibilidade de comunicar ao outro as experiências, imprimindo na narrativa a marca

do narrador, como a mão do oleiro na argila do vaso (BENJAMIN, 1994:205). Ao nos

aproximarmos das narrativas, encontramos as marcas que cada sujeito constitui sobre o

narrado e a criação como um fenômeno do humano.

No contexto contemporâneo, a diminuição das experiências influenciou também

sobre a arte de dar conselhos (BENJAMIN, 1994), situação em extinção. Se as

experiências não estão sendo transmitidas, não há espaços para que as pessoas possam

elaborar e expressar seus conhecimentos, sendo assim, não há espaços para compartilhar

elaborações que em última instância se transformam em conselhos. E para que serve dar

conselhos?

Benjamin nos afirma que aconselhar é menos responder a uma pergunta que fazer

uma sugestão sobre a continuação de uma história que está sendo narrada

(BENJAMIN,1994:200). Contudo, como continuar narrativas senão há histórias a

serem contadas? Para que a arte de dar conselhos retorne, precisamos ter experiências

para serem narradas e sujeitos que estejam envolvidos com o coletivo para dar

continuidade a essa arte.

As experiências (BENJAMIN, 1994) precisam ser comunicadas às novas gerações,

como histórias que são contadas. Para o autor, as experiências se constituem de

narrativas, e menciona que há narradores que ainda podem comunicar as experiências

acumuladas para as novas gerações (BENJAMIN, 1996). Quem são os narradores? O

Page 83: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

82

que narram? Como narram? Narradores são sujeitos que tornam possível o

compartilhar das experiências ao coletivo, criando espaços de intercâmbio dessas ideias.

Ao ressaltar os conceitos de experiência e narrativa diante do amplo campo teórico

do autor, identifico a possibilidade de aproximar esses conceitos e o campo da formação

continuada para professores do ensino fundamental das séries iniciais, mas

especificamente no que se refere às falas dos professores nos encontros e os impactos

destas para o formador de professores na constituição de seus saberes.

Considero que se faz necessário investigar o que há de narrativas de experiências

e/ou de vivências nos encontros de formação continuada, considerando alguns indícios

de um artesanal, de alguma forma ali instalado, tanto pelos professores, como pelos

tutores-formadores.

2.3.2 Reminiscências sobre encontros de formação continuada

Considerar as falas que professores expressam em encontros de formação

continuada instiga uma análise tanto dos temas das exposições, como também do ato de

compartilhar que se estabelece a cada encontro. Identificá-las em suas intensidades, o

vigor e a potência, marca a importância da transmissão no ato de realizá-la.

Kramer (2008) considera que para Benjamin as experiências se organizam como

um traço cultural, enraizado na tradição, manifestando o valor da arte de narrá-las.

Considero oportuno aproximar os conceitos benjaminianos de experiência e narrativa

do campo da formação continuada, buscando um encontro com as falas dos docentes e

dos tutores-formadores. Considero que essa possibilidade estabelece uma aproximação

com o campo, especialmente da posição do tutor-formador, sujeito responsável pelos

encontros de professores, que de alguma forma ainda está à margem nas pesquisas do

campo.

Page 84: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

83

Cabe ainda ressaltar que a participação de professores nos encontros

expressando de alguma forma suas opiniões é algo corriqueiro no campo, contudo,

ainda se torna algo embrionário no que se refere a considerações e às implicações dessas

participações, tanto para contribuir para os estudos sobre formação de professores,

como para os tutores-formadores.

Provocados por referenciais benjaminianos, são suscitadas as seguintes reflexões

sobre as falas dos docentes em encontros de formação continuada: o que falam os

professores nos encontros de formação continuada? Ou seria melhor, o que narram os

professores nesses encontros? Há espaços para essas falas? Criam-se oportunidades

para possíveis elaborações sobre as falas dos docentes? Quais são os sentidos

compartilhados quando um professor expressa seus desafios e seus sucessos em

encontros de formação continuada? Ao expressarem suas práticas escolares estarão

constituindo narrativas de experiências docentes na perspectiva benjaminiana ou

expressando vivências do cotidiano escolar?

Na outra posição, o tutor-formador escuta as falas dos professores. Elas também

provocam ponderações e análises: nos encontros de formação continuada, o que

docentes expressam em suas falas? Tutores-formadores criam espaços de falas para

docentes nos encontros de formação continuada? Como as falas dos docentes são

identificadas e elaboradas pelos tutores-formadores? Tutores-formadores também

expressam suas falas, ou seria melhor, narram sobre as práticas com os professores?

Como tutores-formadores de professores observam as falas dos docentes? Há espaços

para tutores-formadores elaborarem suas falas?

Há ainda algo que provoca possíveis análises: quando docentes expressam suas

falas sobre suas práticas, seriam experiências e/ou vivências que esses profissionais

relatam? Há necessidade de nomeá-las? Quem poderia fazê-lo? Em que medida essas

Page 85: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

84

falas contribuem para a formação dos tutores-formadores? Seriam elas narrativas de

experiências docentes?

Para além de respondê-las, considero que tanto as referentes aos professores

como as relativas ao formador de professor são pontos de partida para pensar sobre

essas falas dos docentes e dos formadores no que se refere ao vigor, às suas

intensidades, os sentidos e significados que constroem ao serem partilhadas e a relação

dessas com as práticas dos formadores de professores.

O ato de partilhar práticas escolares realizado por professores em espaços de

formação continuada se apresenta com tênues limites entre falas que expressam suas

práticas e desabafos emocionados de situações do cotidiano escolar. Há temas presentes

dos diferentes campos do conhecimento, emoções e sentimentos sobre os desafios do

cotidiano escolar, implicações e atravessamentos das práticas escolares, para citar

somente algumas considerações presentes nessas falas. Ainda que não se alcance as

respostas a tantas questões há que se ter um diálogo sobre elas, reconhecendo o

movimento recorrente de participação dos docentes nos encontros.

Benjamin propõe reflexões ao se referir ao fenômeno da comunicação e nos

aponta críticas sobre algo que já se instalava no início do século XX que seria o

acúmulo de informações, fenômeno que se estabelecia de forma imediata e contundente.

Contribui para o diálogo com a seguinte reflexão:

a informação aspira a uma verificação imediata. Antes de mais nada, ela

precisa ser compreensível “em si e para si”(...) é indispensável que a

informação seja plausível (...) somos pobres em histórias surpreendentes. A

razão é que os fatos já nos chegam acompanhados de explicações.

(BENJAMIN, 1994:203)

As informações ainda hoje ocupam um espaço social em virtude da rapidez com

que as transformações acontecem, provocando uma necessidade de atualização, quase

que instantânea. Nesse sentido, ganharam espaço e marcaram uma lógica de se

Page 86: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

85

compreender o fato por si, apresentações e esclarecimentos acontecendo de forma

simultânea. As informações são lançadas para o coletivo como objetos que são

produzidos em série, sem tempo e espaço de elaboração tornando seu acúmulo um

fenômeno recorrente. A presença do efêmero na comunicação dos fatos aponta para o

movimento do passageiro, da novidade presente a todo instante.

Em contraposição a esse fato, realizando críticas severas à sociedade que de

alguma forma privilegia as informações em detrimento das narrativas, Benjamin aponta

a seguinte reflexão, articulando as memórias, tradições e narrativas:

A reminiscência funda a cadeia da tradição, que transmite os conhecimentos

de geração a geração (...) Ela tece a rede que em ultima instância todas as

histórias constituem entre si, uma se articula a outra. (1994:211)

As memórias são lembranças comunicadas pelas gerações quando se considera

que há o que ser participado. Esse movimento provoca o partilhar das reminiscências,

narrativas que são constituídas a cada comunicação. Nessa ação criam-se novas

elaborações com outros e novos sentidos e significados. Inaugura-se a rede tecida a cada

narrativa partilhada, fundando tradições culturais e históricas. Sujeitos constroem elos

no e com o coletivo

Com essas reflexões, aponta-se para uma distinção entre informações e

narrativas. No que se refere às informações, há a sede do novo, indicando que o que

vale está no momento presente, no instante. Articula-se a essa referência pensar que

pelo acúmulo de informações a sociedade possa construir o seu progresso. Essas

transformações são ocasionadas pelo progresso, não apresentando preocupações com o

que foi instituído, com as tradições culturais constituídas até então.

Em contrapartida, as narrativas indicam que, no ato de compartilhá-las, instaura-

se uma conexão entre os sujeitos marcando que cada história narrada apresenta novos

sentidos sobre o narrado. Cada movimento de recontá-las acontece pelos sentidos que

Page 87: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

86

cada uma possui simultaneamente, as escolhas que sujeitos realizam e os elos com esse

coletivo, desse modo são tecidas as narrativas. Em ultima instância, funda a cadeia da

tradição, que transmite os conhecimentos de geração a geração (BENJAMIN, 1994). A

possibilidade de investigação sobre as fronteiras nos encontros com docentes busca

indícios (GINZBURG, 1989) dos atravessamentos que constituem essas falas dos

professores, as aproximações e distanciamentos com os conceitos benjaminianos.

Benjamin (1994), então, nos afirma que a felicidade está não no tesouro, mas na

possibilidade de cavar a terra. O fato de identificar essas falas em um texto de pesquisa

cria a possibilidade de revolvê-las, não somente os temas presentes em cada uma, mas

também o ato de identificá-las como algo que contribui e constitui os encontros de

formação continuada. Nesse sentido, considero que a presença da constituição das

narrativas tanto de professores como para tutores-formadores ressalta a possibilidade de

uma felicidade, com um quê de marcar as elaborações e narrações dos sujeitos, do

humano presente ali.

Surgem, ainda, diferentes expectativas tanto para o docente, quanto para tutor-

formador, sobre as falas dos professores sobre suas práticas. Há informações e/ou

narrativas? Se há somente informações, cabe então pensar em torná-las narrativas de

experiências docentes? Em que medida essa discussão contribui na constituição das

práticas dos tutores-formadores?

Benjamin marca que a experiência que passa de pessoa a pessoa é a fonte a que

recorrem todos os narradores (1994:198). O ato de compartilhar práticas escolares

presente em tantos encontros de formação continuada parece acontecer em alguns

momentos à revelia de quem o coordena.

Instaura-se, então, a cada encontro de formação continuada, uma fonte de práticas

escolares e que. de alguma forma. professores não somente se identificam como

Page 88: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

87

também se apropriam de tais falas, ou melhor, das narrativas. A importância que

tutores-formadores possam recorrer a tais fontes como os narradores o faziam se torna

algo quase que imprescindível para os encontros de formação continuada que pretendem

constituir espaços para se elaborarem narrativas das experiências docentes.

A afirmação do autor ao nos propor que contar histórias sempre foi a arte de

contá-las de novo, e ela se perde quando as histórias não são mais conservadas (..).

Quanto mais o ouvinte se esquece de si mesmo, mais profundamente se grava nele o

que é ouvido (BENJAMIN, 1994:205). Desse modo, nos encontros de formação

continuada, se faz necessário propor a criação de espaços em que docentes sejam, não

somente ouvidos, mas também considerados em suas narrativas. É preciso considerar

que há um acervo, uma fonte em que as experiências são guardadas, contudo, se faz

necessário que elas sejam novamente colocadas diante da lareira... fiando e/ou tecendo

(BENJAMIN, 1994:205) cada narrativa das experiências compartilhadas.

As situações que são narradas nos encontros, o ato de considerá-las e colocá-las

no foco, analisando-as e consequentemente recriando-as, já anuncia que ganharam

corpo e forma. Assim, quando docentes compartilham suas práticas escolares, narrando

para o coletivo, na perspectiva benjaminiana, está implicando o outro na história,

marcando de forma mais decisiva não somente a experiência em si, mas também a

intensidade presente no ato de compartilhar as narrativas.

Benjamin (1994) nos propõe escovar a história a contrapelo, inaugurando a

possibilidade de colocar essas narrativas no foco, desconstruindo a direção e a

linearidade propostas pela história oficial. Dessa forma, serão encontrados sentidos e

significados, nas ruínas, nos estilhaços, contribuindo para trazer para o presente

resquícios de um passado que no presente podem se tornar “agoras”, que ao serem

narrados ganham novos sentidos e contornos.

Page 89: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

88

Os encontros de formação continuada estão, em muitos momentos, relacionados

às ações das políticas públicas, principalmente nas instâncias das secretarias estaduais e

municipais. Nessa perspectiva, vale ressaltar que há algumas propostas de formação que

são baseadas em princípios de repasses (ANDRADE, 2010) e, desse modo, a

transmissão das informações é algo que estrutura e fundamenta os princípios

organizacionais dos encontros. O fato de repassar informações já indica o trabalho na

formação continuada.

Sendo assim, há um enfraquecimento da arte de narrar, pois o que está sendo

priorizado são as informações e a quantidade que cada docente possa armazenar.

Quando chegar em sua sala de aula, terá a oportunidade de colocar na prática tudo

aquilo que armazenou. Nesse sentido, não há o que narrar. A prioridade está no instante

da informação no acúmulo que cada um possa fazer sobre cada encontro. O que está

sendo priorizado nos encontros de formação continuada: informações que precisam ser

acumuladas ou experiências para serem narradas? E docentes tem o que narrar ou se

sentem autorizados somente a informar?

Tenho como proposta buscar indícios sobre as aproximações e os afastamentos

que essas reflexões têm do campo da formação continuada de docentes, marcar

possíveis indícios presentes nas narrativas no que se refere a temas propostos e ressaltar

suas intensidades, colocando no foco o ato de compartilhá-las. Considero que o ato de

marcá-las, identificá-las, aponta a possibilidade de se tornarem narrativas das

experiências docentes.

Ao tecer com mais esse fio o referencial teórico, considero que as experiências

compartilhadas nos espaços de formação continuada se compõem, dentre tantos fios,

das narrativas de experiências. Ao comunicá-las, tecem-se novas redes constituindo as

novas tradições.

Page 90: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

89

3 O CAMPO DA FORMAÇÃO CONTINUADA: AS DIFERENTES PARTES DE

UM BORDADO

Tempos atrás me deu vontade de fazer um livro do princípio ao fim. Movida

pela mesma curiosidade que desde pequena vem abrindo o meu caminho:

fazer-pra-ver-como-é-que-é-fazer. Mas eu só queria fazer o livro se ele fosse

feito à mão... tudo que eu andava querendo escrever naquela hora tinha a

ver com fazer à mão: eu queria falar do meu eu - artesã; e queria lembrar a

marca que outros artesãos me deixaram; eu queria voltar atrás na minha

vida pra reencontrar o pano bordado, a terra cavada, o barro moldado, e

queria juntar eles todos numa pequenininha homenagem feito à mão... quanto mais a tecnologia se impõe, mais rédea eu vou dando pro meu gosto

de fazer à mão. (BOJUNGA, 2005:7)

Aproximo o ofício do pesquisador com o do artesão, descrito anteriormente, com a

sensibilidade que cabe aos escritores, em especial, a Lygia Bojunga, artesã-escritora

que tem como uma das suas marcas a simplicidade de escolher palavras que retratam os

dilemas e conflitos humanos com sensibilidade e frescor. O encontro com a autora, nas

palavras fazer à mão, me remete a associar o que tenho como objetivo realizar nesse

capítulo: a arte de narrar os caminhos que foram percorridos ao longo da pesquisa para

marcar os fios, mas também o rigor, para tecer a trama do bordado.

Ao assumir a posição de pesquisadora, inaugura-se um lugar singular, constituído

na relação com sujeitos da pesquisa, apontando um quê de artesão, ofício que se faz na

delicadeza e com ações singulares. Assim, investigar se torna algo que exige delicadeza

para perceber os atos singulares dos sujeitos participantes, mas também rigor e precisão

para materializar os contornos e desenhos do bordado que se iniciava com o processo de

formação continuada.

Remeto-me novamente a Colasanti (2004), citada no início deste trabalho com suas

linhas e fios que se entremeavam no tear da Moça Tecelã, que tecia e destecia os

bordados construídos em suas experiências sobre o viver. Aproximo o lugar de

pesquisadora da ação de tecer, um ato singular, feito à mão.

Page 91: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

90

3.1 Apresentando os contornos e desenhos do campo da pesquisa

Um texto de pesquisa, feito à mão, se propõe a apresentar alguns, dos tantos fios,

que constituem os saberes dos tutores-formadores. Estabelece-se um desafio de não

somente apresentar alguns dos fios, mas também identificar possíveis tramas, pequenos

pontos, linhas ainda soltas, bordados ainda por fazer, constituições de saberes que são

entremeados das experiências pessoais de cada profissional, com a sua própria formação

e também no próprio ato de realizar a formação continuada para professores dos anos

iniciais.

A pesquisa consiste em investigar o percurso de planejamento e ação do processo

de formação dos tutores-formadores do programa Pró-letramento e, para isso, decido

acompanhar o processo de formação continuada, investigando, desde as reuniões para

elaboração do planejamento para a formação dos tutores-formadores, os encontros de

formação continuada desses profissionais, até a escolha de um tutor-formador para

acompanhar o processo de formação continuada desse sujeito com seu grupo de

professores dos anos iniciais do ensino fundamental em uma rede municipal.

O programa prevê que as equipes de formadores tenham como um dos objetivos

elaborar o planejamento da formação continuada para os tutores-formadores. Minha

entrada no campo inicialmente realizou-se pela participação nas reuniões para

planejamento da formação continuada para tutores-formadores. Foram quinze reuniões,

nas quais observava as discussões e realizava registros em um caderno de anotações.

Em um primeiro momento, meu interesse voltou-se para analisar as produções em

power-point utilizadas de forma recorrente em encontros de professores. Esse é um

recurso didático utilizado pelas formadoras que marca a autoria sobre as produções

teóricas a serem apresentadas aos professores.

Page 92: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

91

Em uma das considerações sobre os recursos do power-point, as formadoras

apontaram que os tutores-formadores sempre solicitavam os slides. Após a exposição,

identificamos que havia um caminho de investigação no que se refere aos modos de

apropriação construídos pelos tutores-formadores, quando de posse de um recurso que

não havia sido construído por ele. Como esses textos visuais de power-point, preparados

pelos formadores, eram retextualizados pelos tutores-formadores em reaproximação

feita junto aos professores?

A proposta então consistia perceber indícios do processo de apropriação por parte

dos tutores-formadores, buscando identificar que intervenções realizavam a partir da

posse do material. Que apropriações sobre o material eram feitas? Havia alguma

intervenção no material? Havia utilização do material nos encontros que realizavam

com seu grupo de professores?

A cada reunião que participava identificava por meio dos objetivos e atividades

abordados no planejamento que a proposta da formação continuada para os tutores-

formadores consistia em criar espaços de interlocução entre os sujeitos participantes

daquele espaço: formadoras e tutores-formadores.

Ao observar a preocupação por parte do grupo de formadores em organizar e

planejar uma formação continuada para um grupo de sujeitos que tem como função a

formação continuada de docentes dos anos iniciais do ensino fundamental, instigou-me

a buscar desvelar os caminhos percorridos nesse processo. Como seria organizado o

planejamento? Que provocações enunciativas seriam propostas pelo grupo de

formadoras com o objetivo de criar espaços de interlocuções?

Logo as perguntas se tornaram recorrentes em minhas anotações. Considerando os

objetivos e os temas propostos para a formação continuada para os tutores-formadores,

como eles abordariam tais conhecimentos com seu grupo de professores? Quais

Page 93: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

92

enunciados propostos na formação continuada para tutores-formadores poderiam se

desvelar nos encontros do tutor-formador com seu grupo? Como aconteceria tal

situação? Quais indícios sobre enunciados abordados nos planejamentos dos formadores

poderiam ser identificados tanto no ato da formação continuada entre formadores e

tutores-formadores, como também na formação elaborada pelo tutor-formador para os

professores dos anos iniciais do ensino fundamental?

Ao sentir-me provocada a observar o espaço da formação continuada, as possíveis

interlocuções entre sujeitos criaram um novo percurso de investigação e marcaram a

desistência de investigar material pedagógico organizado em power-point.

Com a proposta de perceber o processo de formação decido, então, participar das

reuniões das formadoras e passo a observar as discussões que realizam com o objetivo

de elaborar o planejamento da formação dos tutores-formadores do programa Pró-

Letramento.

O LEDUC se responsabilizou pela formação dos tutores-formadores para os

municípios do Estado do Rio de Janeiro e para um grupo do Estado de Minas Gerais

cujos encontros se localizaram em Montes Claros. A equipe de formadoras atendeu a

esses dois grupos, reunindo-se para elaborar o mesmo planejamento. O grupo de

formadoras tinha o seguinte perfil: uma doutoranda em educação formada em Letras

com mestrado em Letras, uma mestre em Educação e duas doutorandas em Educação,

formadas em Pedagogia com mestrado em Educação. A exigência do MEC para estas

formadoras de ter ligação com a universidade foi um critério de seleção para as

formadoras, privilegiando-se mestres e doutores.

As reuniões aconteciam para elaborar de forma coletiva o planejamento para os

tutores-formadores. O quadro 1 apresenta os encontros e as semanas de formação

continuada para os tutores-formadores do programa.

Page 94: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

93

Reuniões para elaboração dos planejamentos

das formações continuadas para os tutores-

formadores do Programa do Pró-Letramento

Datas das Formações Continuadas para

Tutores-Formadores

Reunião – 06/08/2010

Reunião – 09/09/2010

Reunião – 17/09/2010

Reunião – 01/10/2010

Reunião – 18/10/2010

Reunião – 25/10/2010

Reunião – 12/11/2010

Reunião – 19/11/2010

Reunião – 03/12/2010 Formação Continuada de Tutores-Formadores –

13 a 17 dezembro de 2010

Reunião – 15/02/2011

Reunião – 22/02/2011

Reunião – 14/03/2011 Formação Continuada de Tutores-Formadores -

21 a 25 de março de 2011

Reunião – 09/04/2011

Reunião – 16/04/2011

Reunião – 14/05/2011 Formação Continuada de Tutores-Formadores

- 16 a 20 de maio de 2011

Quadro 1: Calendário das reuniões dos formadores universitários

A formação organizada pelo LEDUC para os tutores-formadores dos municípios

que participam do programa de Pró-letramento constituiu-se de três momentos que

aconteceram da seguinte forma: carga de 40h em uma semana corrida nos meses de

dezembro de 2010, março e maio de 2011, perfazendo um total de 120h, das quais

acompanhei 30h, com gravações em torno de 28h.

No decorrer das reuniões das formadoras, o grupo foi paulatinamente

construindo o planejamento para o trabalho com os tutores-formadoras. O planejamento

da formação continuada para os tutores-formadores do Programa Pró-letramento

Page 95: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

94

aconteceu de forma coletiva, entre formadoras e coordenadoras que elaboram e

organizaram o material didático pedagógico que seria utilizado nos encontros.

As fontes para a pesquisa foram gravações, power-points, materiais impressos

como textos literários e pedagógicos, fotos, planejamentos, tanto da formação elaborado

pelas formadoras do LEDUC para os tutores-formadores, como também os que o tutor-

formador utilizaria em seus encontros de formação continuada com os docentes.

A anotação que vem a seguir de alguma forma materializa as primeiras impressões

do primeiro encontro em que iniciei as minhas observações. Aponto alguns indícios

como as subjetividades presentes nas reuniões e as trocas no ato do planejamento.

“Conversas, sussurros, ansiedades, sorrisos, ideias diversas e entusiasmadas,

alguns dos tantos sentimentos e ações presentes no encontro dos formadores,

grupo responsável pela formação dos tutores do Programa do Pró-Letramento

de Linguagem. Esses são vinculados ao LEDUC/FE/UFRJ, grupo que se

tornou o responsável pela formação dos municípios pertencentes ao Estado

do Rio de Janeiro e por um grupo de tutores de Montes Claros-MG.

Cada uma com ideias, sugestões, planos, livros, vídeos, materiais que pulavam das bolsas pedagógicas e eram apresentados com um grande

entusiasmo para o grupo de forma a contribuir para o planejamento da

formação dos tutores-formadores.

A reunião se inicia, agora formalmente com a direção das coordenadoras do

grupo. Digo isso por reconhecer que as trocas que estavam sendo feitas entre

as formadoras já anunciavam os encaminhamentos, ideias, sugestões,

recursos pedagógicos de diferentes ordens que poderiam contribuir para

dinamizar os objetivos propostos.

Em um primeiro momento relembravam o encontro anterior, com os tópicos

que haviam sido discutidos sobre o planejamento da formação de tutores e

indicavam as pendências que ficaram de ser realizadas por cada componente do grupo. A partir desse momento, na retomada das tarefas que cada

formador se responsabilizou em providenciar para o desenvolvimento do

planejamento do trabalho se encaminhavam novas discussões e se tomavam

as decisões para a construção do planejamento. A responsabilidade de

registrar as decisões na formalização do planejamento eram as

coordenadoras.

Esse planejamento estava acontecendo, mas naquele momento o grupo ainda

não tinha conhecimento de quando se iniciaria a formação. Dessa forma,

havia também notícias sobre o caminho que o processo burocrático perseguia

para alcançar o objetivo de realizar a formação. (Caderno de anotações)

O interesse consiste em trabalhar com o planejamento que esses formadores

construíram para o trabalho na formação continuada, buscando perceber os enunciados

propostos pelos formadores para os encontros de formação dos tutores-formadores,

Page 96: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

95

observando tanto o documento planejamento como as ações que se desenvolveram

desse planejamento no ato da formação.

A proposta da pesquisa consiste em identificar indícios de enunciados constituídos

nos encontros de formação continuada, entre formadores e tutores-formadores e as

repercussões nos encontros de formação continuada dos professores cursistas,

identificando indícios dos enunciados do planejamento e dos encontros de formação dos

tutores-formadores

Dentro da diversidade dos trinta e um municípios representados, havia a

necessidade de se aproximar de um contexto para poder identificar essas possíveis

interlocuções, sendo assim se fazia necessário escolher um tutor-formador. A formação

continuada para os professores aconteceria semanalmente. Dessa forma, um critério que

se impõe é a distância: teria que ser um município próximo ao município do Rio de

Janeiro pela necessidade da frequência a todos os encontros.

Um outro critério que se fez presente foi a formação do tutor-formador,

decidindo-se que deveria ser um pedagogo profissional formado para o trabalho com a

formação de professores. Essas considerações foram realizadas antes do que seria o

primeiro encontro do pesquisador com o campo da pesquisa.

A escolha de sujeito da pesquisa aconteceu no primeiro encontro promovido

pelo LEDUC, na abertura da formação continuada para os tutores-formadores do

Programa Pró-Letramento. Houve uma breve apresentação da minha pesquisa para o

grupo de tutores-formadores e, logo após, uma tutora do município de Queimados/RJ se

propôs a participar da pesquisa. Em uma conversa mais próxima, foi percebido que ela

preenchia o único requisito, a formação em Pedagogia: era Orientadora Educacional.

Dessa forma preenchia o critério da distância e da formação, pois o município está

localizado na baixada fluminense, próximo à cidade do Rio de Janeiro.

Page 97: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

96

As observações de uma tutora-formadora do Programa Pró-Letramento em seus

encontros de formação continuada para professores das séries iniciais do ensino

fundamental aconteceriam, então, no município de Queimados no Estado do Rio de

Janeiro. Os encontros iniciaram-se em abril de 2011 e finalizaram-se em agosto de

2011. Os encontros aconteciam uma vez por semana com três horas de duração. Ao

todo, foram 15 encontros dos quais participei de 11, perfazendo 33 horas de gravação,

aproximadamente. Durante os encontros produzi escritas pontuais em meu caderno de

anotações e também coletei os materiais pedagógicos utilizados pela tutora-formadora

nos encontros, como: power-points, fotos, planejamentos, gravações, textos, livros e os

fascículos do programa.

Outro dado que complementa o conjunto de enunciados realizado para minha

análise para identificar possíveis indícios da formação continuada realizada pelo

LEDUC na prática do tutor-formador foi uma entrevista semiestruturada com a tutora-

formadora. Nesta, escolhi objetivos expressos nos planejamentos da formação elaborada

pelo LEDUC que estiveram em diálogo com as práticas discursivas da tutora-formadora

na constituição do espaço da formação continuada com os professores dos anos iniciais

do ensino fundamental.

A complexidade do campo empírico das pesquisas em educação é algo que é

marcado na descrição metodológica apontada pelos autores do campo. Com isso se faz

necessário compor tipos de investigação, buscando contornar o campo empírico,

apresentando um maior rigor metodológico na análise dos dados e considerações finais.

Sendo assim, esta pesquisa se apresenta como um estudo de caso que considera

que há a interação entre pesquisador e sujeito da pesquisa, constitutivos do processo, e o

discurso presente no espaço da formação continuada, processo que está sendo

construído no percurso do trabalho. Busca também analisar aspectos discursivos da

Page 98: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

97

formação continuada, tendo em vista os deslocamentos subjetivos que possam ocorrer

nesse processo. Focalizo um único sujeito tutor-formador e destaco alguns enunciados

produzidos nos contextos de formação de tutores-formadores e de formação de

professores mediados por este tutor-formador.

3.2 A formadora Luiza

Os tutores-formadores se dividiram em dois grupos. A proposta de compreender

as subjetividades presentes nos enunciados singulares expressos no ato da formação

continuada de cada grupo exige a escolha por um dos grupos. A imersão em um dos

grupos tem como objetivo identificar alguns indícios das interlocuções constituídas no

espaço da formação do tutor-formador e os desdobramentos do processo nos encontros

deste tutor-formador com seu grupo de professores.

Dirijo-me à formadora e coloco a possibilidade da minha participação em seu

grupo. Tenho de imediato a sua aceitação. Sou mais uma vez apresentada ao grupo de

tutores-formadores, anunciando mais uma vez o foco da pesquisa.

Luíza, a formadora, é mestre em Letras, e naquele momento (2010), doutoranda

em Educação, com um foco para a formação de professores. Em sua apresentação breve

para o grupo, ressaltou suas experiências tanto como docente como também na

formação de professores da rede pública municipal. Em sua apresentação, marca suas

experiências, atuações profissionais, expectativas e intenções sobre a formação

continuada que se iniciava.

O grupo de tutores-formadores se apresenta e expressa suas dúvidas,

considerações, compartilha desafios e as expectativas, tanto sobre o processo de

formação em que estavam inseridos, como sobre a formação com o grupo de

Page 99: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

98

professores. Em meu caderno de anotações, faço alguns registros sobre esse momento

inicial:

O grupo tem uma grande expectativa sobre os conhecimentos que serão

apresentados na semana de formação;

-Há uma intenção dos tutores-formadores de que a formação continuada para

os professores transformem os baixos índices de alfabetização nos

municípios. Vale destacar que eles não utilizam a expressão “fracasso

escolar”;

-Há tutores-formadores preocupados com a formação dos professores na

escola e com a solidão dos professores; -Há uma crença de , com essa formação para os professores, os problemas

serão solucionados. (caderno de anotações)

Nas apresentações, os tutores-formadores revelam questões sobre a alfabetização

das crianças e jovens enfrentadas em seus cotidianos, nos municípios. Há indícios

presentes nas minhas anotações, que nos revelam que há indicativos sobre os percursos

no processo de leitura e escrita das crianças e jovens, discursos recorrentes entre os

tutores-formadores nesse primeiro momento da formação. Havia expectativas de que

encontrassem soluções para suas questões de ensino, e o espaço que se iniciava se

apresentava como um lugar que poderia revelar caminhos para alcançar a tão esperada

transformação das realidades locais sobre ler e escrever.

Após as apresentações iniciais, o planejamento12

, documento construído

coletivamente pelas formadoras para a formação continuada dos tutores-formadores,

ganha a dimensão do fazer. As propostas que até então eram intenções ganham corpo e

forma, no ato da formação continuada. Os quadros que vêm a seguir apresentam um

resumo dos temas, conceitos e atividades propostos e realizados pela formadora para as

três semanas de formação continuada para tutores:

12 O planejamento da primeira semana de formação na íntegra encontra-se no anexo.

Page 100: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

99

Semana da Formação

Propostas Sistematizadas

1º dia – 13/12

Leitura literária

Levantamento dos conceitos prévios sobre linguagem/ escrita/ensino

Ornamentação dos cadernos de registros/marca simbólica do cuidado com a

aprendizagem /Identidade e importância do registro

Escrita das memórias de professora alfabetizadora/Mural de lembranças

Síntese coletiva

2º dia – 14/12

Leitura literária

Síntese do dia anterior

Discussão sobre o papel de tutor/formador Aprofundamento teórico dos conceitos de formação/formador/tutor

Exploração dos fascículos/ Diagnóstico sobre as referencias teóricas dos tutores

Alfabetização e Letramento – discussão teórica

3º dia – 15/12 .

Síntese do dia anterior

Leitura literária

Tema do dia - Letramento e Cultura Escrita

Discutir as práticas pedagógicas focalizadas na linguagem como interação

verbal

EGLE

Construção de um glossário de emoções

4º dia – 16/12

Leitura literária

Síntese do dia anterior Conceitos sobre leitura

Concepção de alfabetização do ponto de vista linguístico-discursivo

Apresentação das concepções de leitura nos livros didáticos

Discussão sobre a apropriação do sistema de escrita

5º dia – 17/12

Leitura literária Síntese do dia anterior

Discussão sobre literatura infantil de qualidade para conhecer e ampliar as

práticas de leitura no trabalho docente

Viabilizar o exercício de estudo coletivo entre os tutores com vistas à

homologia de processos com os professores em seus respectivos municípios –

tema literatura

Avaliar a formação, o formador, as condições materiais e autoavaliação

Elencar as principais questões em uma lista de "conteúdos" trabalhados nos dias

da formação

Quadro 2: Planejamento da primeira semana

Page 101: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

100

O quadro 3 é referente à segunda semana de formação continuada para tutores-

formadores:

Semana de Formação Propostas Sistematizadas

1º dia – 21/03/2012

Leitura Literária

Discussão sobre os processos vividos com a formação dos professores

Modos de falar e modos de escrever

Interlocuções e produção de gêneros orais e escritos.

PPT Ana Luiza Smolka e Cecília Goulart

Síntese dos conteúdos trabalhados

Apresentação da pauta do dia seguinte

2º dia – 22/03/2012

Leitura Literária

PPT da Eglê para que as professoras/tutoras, em grupo, comentem sobre os

textos dos alunos. Discussão coletiva dos conceitos de Oralidade – conceitos trazidos pelo grupo

PPT Nelita Bortolotto

Síntese da formação vivenciada sobre oralidade e do material do PL.

Problematização do que está instituído como opção metodológica. .

Escrita individual sobre a experiência de cada tutor com a leitura/literatura -

Composição de uma colcha de retalhos com os trechos das experiências leitoras.

Avaliação do dia

3º dia – 23/03/2012

Leitura Literária

PPT PNBE

Análise de diferentes livros literários

Discussão sobre Biblioteca Escolar e Atividades de Leitura

PPT - Aporte teórico: o Lúdico

PPT – Jogos de Linguagem Avaliação do dia

4º dia – 24/03/2012

Leitura Literária

Discussão sobre os sentidos e os significados das palavras – o uso do dicionário

na sala de aula

Análise dos projetos de jogos apresentados no Fascículo 5

Avaliação da Formação

5º dia – 25/03/2012

Leitura Literária

Palestra Ludmila Thomé de Andrade: “Os gêneros discursivos da formação

docente: da oralidade à escrita”

Quadro 3: Planejamento da segunda semana

Page 102: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

101

O quadro 4 é referente à terceira semana de formação continuada para tutores-

formadores:

Semana de Formação Propostas Sistematizadas

1º dia – 16/05/2012

Leitura Literária

Dispor vários portadores de texto e refletir sobre as formas de escolhas que

fazemos observando, objetivos, os critérios utilizados, a motivação, etc, a fim de

problematizar as formas de escolhas. #Eixos de reflexão: Gêneros produzidos

no trabalho de alfabetização/Objetivos pedagógicos na escolha dos

suportes/Livro didático e Planejamento/Escolha naturalizada do livro

didático/Suporte e esfera

Análise de livros de alfabetização PPT - “Cartilha de alfabetização”

PPT - PNLD - Histórico do PNLD Discussão sobre critérios de escolha dos livros didáticos de Língua

Portuguesa/Alfabetização adotados nas cidades dos tutores. Proposta para os

tutores: apresentação uma proposta de apresentação do fascículo para os

professores de seu município.

Refletir sobre: conhecimentos selecionados no livro didático, práticas

pedagógicas na alfabetização, práticas de avaliação e as expectativas da

produção de texto do aluno contidas nos livros didáticos

Escrita de memórias de livros didáticos para composição de um painel 2º dia – 17/05/2012

Leitura Literária

Análise da organização dos cadernos como alternativa DIDÁTICA

PPT – Planejamento Cipriano Luckesi

Eixos de reflexão para o formador: reflexão sobre o ato de planejar como um

ato decisório político, científico e técnico; distinção entre o Projeto pedagógico, planejamento curricular institucional, planejamento de ensino e planejamento

escolar (pedagógico, curricular e do ensino); macro políticas públicas de

educação, a fim de garantir o contexto de análise das políticas de avaliação

como Provinha Brasil e Avaliações Internacionais

Fascículo 3 - Tempo de leitura e escrita na escola. Reflexão - O que se lê na

escola? O que se escreve? Para que se lê? Para que se escreve? Quando? Para

quem? Com quem? Em que condições, lê-se e escreve-se na escola?

Reflexão sobre o tempo de leitura e escrita na sala de aula e na escola a partir da

realização de um Projeto.

Eixos de reflexão para tutores:

O que é avaliação? O que compreendemos por avaliação? Avaliar é comparar? Avaliar é possível? Como avaliar? É colocar o indivíduo em caixas que não lhe

servem? Existe avaliação justa? Como produzir uma avaliação justa em uma

sociedade injusta?

Apresentação das dimensões da avaliação pelo Formador as diferentes

dimensões da avaliação: de políticas públicas; de sistema educacional; de

projetos; de currículo e de aprendizagem. As tensões dos exames externos de

um estado avaliador, considerando suas múltiplas dimensões: técnica, política,

sociocultural, pedagógica e seus desdobramentos no ”chão da escola

3º dia – 18/05/2012

Leitura Literária

Apreciação e análise de escritas de crianças

Análise da Provinha Brasil e descritores

Eixos de reflexão para o formador

4º dia – 19/05/2012

Leitura Literária Síntese dos estudos realizados

Estudo do fascículo complementar com debate e apresentação das

sínteses/esquemas no blocão, o formador faz um levantamento das questões

abordadas na formação através da discussão de conceitos e procedimentos

Planejamento do Seminário Final

Elaboração de projetos para serem apresentados no seminário e apresentação

dos projetos

Page 103: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

102

Escrita individual sobre a experiência de cada tutor com a formação

Composição de “algum” suporte coletivo com os textos produzidos.

Avaliação da formação Quadro 4: Planejamento da terceira semana

Os quadros contêm o resumo do planejamento com pautas diárias com temas,

conceitos e atividades abordados nas três semanas de formação continuada para os

tutores-formadores. Decido então trabalhar com os temas abordados no primeiro

quadro, que se refere à primeira semana de formação.

Bakhtin (2003) afirma que enunciados constituídos no vigor da enunciação e do

contexto nos quais estão inseridos produzem interlocuções em um movimento de ir-e-

vir e são criadas no ato, a cada enunciado expresso. Nessa perspectiva o planejamento

se constitui em um documento enunciativo provocador e instaurador de enunciados.

Cada proposta, ao ser enunciada por cada tutor-formador, produz sentidos e significados

no espaço da formação continuada gerando novas interlocuções, tecendo tramas

infindáveis de enunciados. O planejamento instaurador de enunciados cria e estabelece

tantas tramas enunciativas quanto forem possíveis sobre os temas abordados.

Reconhecendo que há limites e contornos que deverão ser realizados nesta

pesquisa, seleciono alguns do temas expostos no planejamento para dialogar sobre os

indícios observados no que se refere a conhecimentos dos tutores-formadores,

memórias, formação do tutor-formador.

A formadora, logo após a apresentação, propõe que o grupo se manifeste sobre

os temas: linguagem, escrita e ensino. A formadora então coloca a proposta escrita no

quadro por meio das seguintes questões:

Para você o que é linguagem? Qual é a sua compreensão sobre linguagem

escrita? Quando se alfabetiza ensina-se o português? Por quê? O que é

ensinar português para brasileiros?

Page 104: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

103

Um dos enunciados apresentados pela formadora chama minha atenção: o que é

ensinar português para brasileiros? A pergunta cria conversas paralelas e burburinhos

entre os tutores-formadores, embora não compartilhem com o coletivo essas conversas.

Parece que há a intenção de provocar uma reflexão sobre os sujeitos que

constituem as salas de aula e a perspectiva sobre os conhecimentos que cada

profissional possui sobre ensinar a ler e escrever para sujeitos que tem a língua

portuguesa como sua língua materna.

Goulart (2006) analisa a questão da alfabetização da seguinte forma:

O letramento deve ser interpretado como algo mais geral do que a

competência para a escrita – nesse sentido, ser letrado é ser competente para

participar de uma determinada forma de discurso, sabendo-se ou não ler e

escrever; e a escolarização parece fornecer competência para falar sobre o

falar, sobre questões, sobre respostas, isto é, a competência de uma

metalinguagem. (2006:451)

Ao abordar a questão, colocando na cena a discussão sobre ensinar o português

para quem já o possui como sua língua materna foi criada uma outra possibilidade de

discutir as questões em torno do letramento e da alfabetização, recorrentes em encontros

de formação continuada. Cada sujeito falante da língua possui conhecimentos sobre essa

língua, que não dependem exclusivamente da aprendizagem escolar da leitura e da

escrita.

Vale ressaltar que não se trata de minimizar ou até desconsiderar a função da

escola, ao contrário, ao reconhecer crianças e jovens como sujeitos que constituem e são

constituídos pela linguagem, a escola cria situações de aprendizagem que os considere

como sujeitos portadores de conhecimentos em busca da tão esperada leitura e escrita.

Mesmo que as questões apresentadas pela formadora neste primeiro momento

não tenham suscitado discussões e desdobramentos no coletivo do grupo, o tema

provocou nesta pesquisadora a convocação de possibilidades discursivas, pois percebi

que cada enunciado era portador da interpelação de vozes, de alteridades sobre as

Page 105: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

104

perspectivas das abordagens que seriam desenvolvidos ao longo da formação

continuada.

3.2.1 Quantos nomes recebe um tutor-formador?

As discussões sobre a função de ser tutor-formador no campo de estudos e

pesquisas em nosso país ainda acontece de forma tímida, não estando no foco da

investigação. Contudo, em alguns países como a França, Bélgica ou Suíça, por exemplo,

a discussão está instalada e há estudos sobre o tema como tem nos comunicado

Marguerite Altet, Léopold Paquay, Philippe Perrenoud13

.

Nesses estudos, afirmam que ainda são fluidas as questões em torno das

atribuições e da profissionalização. Vale ainda destacar que em tempos de reformas

educacionais, os profissionais educadores são convocados a colocar em funcionamento

planejamentos com os quais não necessariamente concordam aceitam e sequer

compreendem. Há conquistas no que se refere a constar nos quadros dos cargos a

função de formador, porém os desafios ainda permanecem, no que diz respeito ao

simbólico para seus processos de profissionalização. A presença do formador nos

estudos e pesquisas é uma realidade nesses países nas redes públicas de ensino.

Nos cotidianos das redes públicas do Brasil, as formações continuadas para

docentes parecem ainda se dar sob bases que passam à revelia das pesquisas e estudos,

indicando que há profissionais que trabalham com os professores, sendo convidados

para realizarem cursos, oficinas, projetos, enfim, trabalhos relacionados à formação do

professor. Em virtude dessas demandas, perguntas e questões acontecem, talvez ainda

13 Esses autores trabalham numa integração intencional e publicam suas pesquisas em contextos de países

diversos com frequência bastante intensa.

Page 106: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

105

sem respostas. De qualquer modo, vale instalar o debate no âmbito da discussão desta

dissertação. Altet (2003) contribui:

Basta ser um professor experiente reconhecido para se tornar um “formador

profissional”? A experiência de ensino e mesmo a especialização pedagógica

são suficientes para legitimar a função de formador de professores? São

necessárias outras especializações? Há uma transferência sistemática de

competências de um ofício a outro? Será que essa “dupla identidade” é profissional? (2003:55)

As questões anunciadas pela autora apontam para temas como a formação do

profissional, a identidade profissional, as competências para realizar a função, temas

que ainda em nosso país têm estudos apenas iniciais. Uma iniciativa que vem

apresentando publicações constantes e instigantes pertence ao GEPEC – Grupo de

Estudos e Pesquisas em Educação Continuada da Faculdade de Educação da

Universidade de Campinas. Não apenas para respondê-las, aponto-as nos limites deste

texto com o objetivo de contribuir com mais um fio sobre a discussão. O debate sobre a

função do tutor-formador foi tema que esteve presente no planejamento da formação

continuada. A formadora inicia a discussão convidando o grupo a se manifestar sobre as

nomeações que recebe a função de formador que desempenha e o diálogo segue no

fragmento selecionado:

Luiza – Está trabalhando com formação de professores, que nomes são esses

me diz? Mandem mensagens de ideias aí, você já ouviu falar... eh.. ((ruídos))

professor ruídos Vamos lá! A formadora está escrevendo no papel pardo as

falas dos participantes

Tutora-Formadora A – professor

Tutora-Formadora B– mediador

Tutora-Formadora C– conciliador Luiza- Vamos lá! ruídos Que nomes são esses ruídos Professor, que mais, ...

Tutora-Formadora A – mediador

Tutora-Formadora D- Orientador

Tutora-Formadora E- Formador

Luiza – Que mais,...

Luiza – Tutor ruídos Isso

Luiza- Alguém lembra de mais alguma silêncio

Luiza - Tem mais coisa silêncio

Tutora-Formadora D – Pacificador silêncio

Luiza- Engraçado né, a um tempo atrás com certeza esse nosso século

fizeram a mesma pergunta muito provavelmente uma ou duas palavras apareceriam, quantas outras que foram sumindo, sumindo que dizia, na

Page 107: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

106

verdade participa de uma novas demandas, de novas pessoas de novos

estudos que vem sendo apresentados quando o assunto teórico vai depender

de quem encontrar no dia a dia de sala de aula, no dia a dia do processo de

formação. E como vocês tem uma responsabilidade muito grande porque

vocês são tutores ruídos problematizar o que ruídos o que vocês se

sentem formadores e tutores? E eu sei que vocês estão um pouquinho

cansados, pra pedir escrita agora, né? Pra vocês, mais, vocês podem usar o

caderno de vocês, sem menor problema, nós gostaríamos que vocês

respondessem essa perguntinha aqui no caderno de vocês ruídos.

Luiza - Como vocês se vêem no papel de formador, papel de tutor, como

é que vocês se vêem nesse papel, não precisa ruídos muito simples é pra

escrever no caderno de vocês como vocês se vêem no papel de formador

no papel de tutor, vou botar aqui na minha ruídos pronto oh como vocês

se vêem nesse papel como vocês acham na verdade que é a função.

A expressão sobre a nomeação da função é realizada pelo grupo, indicando

diferentes formas de nomear suas funções. Não há referências ou considerações sobre o

tema, a formadora propõe a escrita e o grupo realiza a atividade.

O silêncio se instala no grupo, há marcas apontadas na transcrição quando o

grupo se restringe a participar, apontando somente as nomeações. A contextualização

sobre o tema talvez se apresente como um dos indícios para os silêncios presentes nesse

momento do encontro. Um caminho possível de compreensão está na identificação da

forma, no mínimo, pouco profissional que o trabalho que esse sujeito realiza.

O Programa Pró-Letramento apresenta a função de tutor no documento

Formação de Professores: Fundamentos para um Trabalho de Tutoria (BRASIL, 2007).

Orofino (2010) apresenta as diferentes nomeações que são atribuídas ao tutor-formador

no quadro 5:

Page 108: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

107

“Na área de alfabetização e Linguagem, a estrutura do Pró-Letramento

está alicerçada em material produzido pelos Centros da Rede de

Formação (...) os quais serão objeto de estudos dos professores(...) sob a

coordenação de um professor orientador (tutor) (p.6) professor orientador(tutor)

(...) “sua ação será eminentemente uma ação de formação que estamos

utilizando a nomenclatura orientador de estudos em substituição à

expressão tutor” (p.6)

“Esses professores orientadores (às vezes chamados tutores (...) (p.18)

“Como orientador de estudo, você passa a constituir uma “rede”...) (p.6)

orientador de estudos

“Nessa “rede”, especial importância tem seu papel enquanto orientador

de estudos (...) (p.6.)

“É com esse objetivo- de contribuir para sua preparação para em relação

ao trabalho de orientador de estudos (...) (p.6)

(...) “ é o processo de troca entre o professor orientador e o professor

em formação(...)(p.13)

professor orientador (...) “o professor orientador, na educação de adultos, se vê mais como

um recurso de aprendizagem, do que como um expert de conteúdo(...)

(p.14)

(...) “é importante que você, como formador de professores(...) (p.11)

formador

(...) “buscar resolver problemas que possivelmente vem enfrentando em

seu trabalho de formador” (p. 11)

(...) “consigo mesmo, com o grupo e o formador” (p.26)

“ O trabalho do formador como alguém sensibilizado” (...) (p.28)

“ Porém, como professor formador nesse processo”(...) p. 31

(...) “o formador colabora se assume uma posição de interlocutor” (...)

“Em sua função de formador, não” (...) (p.36)

(...) “ o professor orientador trabalhará como um dos articuladores de

uma “rede”(...) (p.17) articulador

“ contribuir com você, enquanto organizador e coordenador de um processo de formação(...) (p.8)

organizador e coordenador

“Para tanto, são requeridas de você, enquanto educador e professor orientador(...) (p.18)

educador

(...) é necessária a existência de uma liderança que articule o funcionamento (...) (p.16) líder

(...) “ o líder (professor orientador” (...) (p.33)

“Como mediador nesse processo, você assumirá (...) (p.19) mediador

(...) atuando como intérprete do curso junto ao aluno(...) (p.19) intérprete

(...) “sobre o sentido de ser „ formador/tutor’ ”(...) (p.35) formador/tutor

O professor orientador, na educação de adultos, se vê mais como um

recurso de aprendizagem do que um expert em conteúdos . (p. 140) recurso de aprendizagem

Quadro 5: Nomeações atribuídas ao tutor-formador

Para cada nomeação, há atribuições que são colocadas para o tutor-formador

vinculando as funções à própria nomeação, ou seja, o tutor-formador, ao ser designado

por todas as nomenclaturas citadas, acumula em suas atribuições todos os significados e

sentidos que cada terminologia carrega. Assim, com o término do programa, não há

indicações de continuidade do trabalho, a decisão fica a cargo de cada município.

Page 109: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

108

A função do tutor-formador não é prevista nos quadros oficiais das redes

públicas, ou seja, não há concurso público para esse cargo. Para ser tutor-formador do

Programa Pró-Letramento é necessário ser professor vinculado à rede pública de ensino.

É um professor que é alçado à função de formador (ANDRADE, 1997). Vale ainda

destacar que não há indicativos presentes no documento para continuidade do trabalho

nas redes municipais locais, ao término do Programa Pró-Letramento, não há formações

previstas para a formação continuada dos tutores-formadores.

Identifico que a formadora prossegue com a proposta, marcando de forma

enfática para o grupo, de forma repetitiva, a importância da responsabilidade e a

função do tutor, do formador. Luíza apresenta um tema que, talvez, nesse momento,

ainda se estabeleça como algo inacessível ao grupo. A formadora conhece e enxerga não

só no sentido para onde o tutor-formador olha e enxerga, mas também em outro sentido,

que ainda é inacessível a ele (BAKHTIN, 2003:12).

3.2.2 Interlocuções sobre formação, formador, práticas

De acordo com Andrade (2009), é preciso compreender os processos realizados

nos espaços de formação, contextualizando as interlocuções que são constituídas a partir

dos temas e atividades apresentados, em nosso caso, pelo planejamento da formação

continuada para os tutores-formadores.

O ato de enunciação das propostas instaura seus próprios contornos, formas e

intensidades distintas e variáveis de acordo com o contexto no qual estão inseridas.

(BAKHTIN, 2003). Assim, a cada movimento de enunciar, realizado tanto pela

formadora Luíza, como pelo grupo de tutores-formadores, tecem-se tramas, pontos,

laçadas, subjetividades, constituídas na interlocução entre os sujeitos. Esse processo cria

Page 110: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

109

alteridades tanto para os conhecimentos que estão sendo constituídos no ato da

formação, como para os participantes que são os interlocutores e produtores desse

conhecimento (ANDRADE, 2009).

O fragmento que se apresenta logo a seguir expressa as tantas alteridades que

são constituídas, como as interlocuções que são elaboradas a cada movimento

discursivo apresentado. Vale ainda apresentar que o texto teórico que serviu de base

para a discussão foi o de Soligo & Prado (2008) Quem forma quem, afinal?:

Luiza – De Rosaura e Guilherme sobre quem forma quem, o que você

poderia ir destacando, alguém gostaria de falar, agente poderia ir

sistematizando esse texto aqui.

Tutora-Formadora A - Acho a idéia interessante o relato do professor que é

ele que faz a frase ruídos, aí eu achei muito interessante o relato que ele faz,

ele faz relação aos alunos, ele e o aluno, ele pode pensar nisso também

em relação a nós enquanto tutores ruídos, aí eu deparei com o parágrafo da

formação dele, da, da fala dele que é o último parágrafo que diz assim: - As paisagens dos horizontes não se dão as conquistas, por quem nunca, porque

nunca estão lá, é a morada do caminhando só existe quem sabe olhar mas isso

é radical. Na sala de aula os alunos são meus parceiros entre aspas,

geralmente eles me seguem e compreendem que sou mais experiente no

mesmo caminho, mas nem sempre é assim que habita a nossa dupla. Para se

caminhar juntos com honestidade é preciso confiar um no outro, por isso

muitas vezes, muitas vezes eu paro e escuto as sinalizações que eles ruídos ou

que outras vezes ruídos. Não existe caminhante solitário, desde o viajante

conhecido guiado pelas estrelas, leva com a confiança dos sentidos dado ao

seu coração. Quem forma quem afinal? ruídos

Luiza - Vamos só tentar organizar. O tempo na verdade, ele traz pra gente a perspectiva da formação, não é isso? E essa perspectiva da formação, ele

acaba que, entrando em três grandes focos, que é: a questão da autoformação,

não é isso? Vamos lá, vamos ajudar, quem é que leu aí?

Tutora-Formadora A – Cooperação, autoformação, cooperação silêncio. A

formadora está registrando no papel pardo o que o grupo fala

Luiza – E? ruídos Oi, não ruídos Hein gente... ruídos Formação continua

ruídos A partir da perspectiva da auto-formação, ele coloca você como

uma professora ruídos que quando partindo da idéia do sujeito, toda

formação é o que? É uma auto-formação, porque o sujeito interage com

aquela fórmula de, é, é de conhecer, de crescer, de se desenvolver.

Tutora-Formadora B - É ruídos buscar respostas, né, investir na formação e

buscar respostas ruídos Luiza – Você vai buscar, e essa busca geralmente ela é motivada por quê?

Tutora-Formadora Lina– É bem isso, até conversávamos na hora do

almoço sobre isso, que olhar pra trás, se auto-avaliar e pensar nas suas

ações do cotidiano, geralmente nos inquieta. Essas inquietações as coisas

que nós não temos respostas, as coisas que nós não sabemos ainda fazer,

eu acho que deflagra essa autoformação, essa auto-avaliação.

Luiza – Vamos lá, reflexão... a partir... A formadora está registrando no

papel pardo o que o grupo fala

Tutora-Formadora Lina– da inquietação

Luiza – da prática, não é isso? Como está aqui prática mais concepções

teóricas, assim, é que na verdade você diz o texto, com vocês entram em

Page 111: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

110

contato com o dia a dia, é, vocês entram em contato com essa prática do

texto você diz assim, mais não é uma prática sozinha concorda?

Vozes – Claro. Mas é uma não total participação

Luiza – Sim. Mas essa direção é que dá uma inquietação.

Tutora-Formadora Lina– Isso.

Luiza - E essa inquietação... ao olhar pra essa prática, enfim, é o que vai

te levar

Tutora-Formadora Lina– A buscar teoria, conceituação, pra utilizar essa

prática, é isso silêncio. Nesse silêncio a formadora escreve no papel pardo o que grupo está falando sobre o texto

Luiza – Então... Agora uma coisa que quero dizer, é que quando ruídos na

verdade, existem conhecimentos, ninguém faz uma reflexão da prática do

nada, ninguém olha pra prática e diz, olhei pra prática, e só olhei pra

prática e por isso cheguei a uma reflexão Alguns tutores-formadores falam juntos. Pelo olhar decidem quem vai falar e

a voz feminina D fala primeiro e depois a voz feminina D.

Tutora-Formadora B - Oh, eu penso assim, oh ruídos se eu consigo refletir

alguma coisa é porque alguma coisa me incomoda, eu não estou satisfeita

com alguma coisa, aí você vai refletir, você tá inquieta, aí você busca a teoria

até reciclar tudo e transformar Tutora-Formadora Lina – o que eu penso é que toda prática está

impregnada de uma teoria mesmo que eu não saiba qual é e a gente

conversava na hora do almoço, e eu dizia o seguinte, eu acho, que o que faz

a diferença entre a ação de um bom tutor, vamos dizer assim, de um bom

formador, é a capacidade, o conhecimento teórico que ele tem, mesmo

que ele não saiba, é, ta muito delineado na cabeça dele que caminho é

esse que ele está fazendo ele tem algum conhecimento, esse conhecimento

vai inquietá-lo porque quando essa prática começa a não corresponder,

aquilo que ele acredita de concepção, de idéia, então tem alguma coisa

errada, né, então se tem alguma coisa errada, o que eu tenho que fazer

né? Que caminhos que eu tenho que buscar? Como é que eu vou intervir,

nessa realidade? Aí eu me reporto lá nas minhas concepções, nas minhas

idéias, nas teorias, nos teóricos, não sei lá onde, pra poder referendar,

então é uma coisa assim, eu achei o texto maravilhoso, eu comecei a ler,

apesar de fome e cansaço e tal, ta ali pensando, mas eu achei sensacional essa

coisa de tá pensando a formação como auto-formação, porque na

verdade nós somos sujeito o tempo todo, e se isso, isso inclusive não pode

partir de fora, isso tem que partir de mim né, isso tem que partir do meu

olhar sobre a minha prática, de querer buscar, de querer fazer diferente, de

querer entender que concepção é essa que talvez, que eu estou embasada,

mais que eu não sei bem o que é, então quando todas essas coisas ficam

mais claras, eu acho que fica mais fácil fazer a prática, mesmo que a

gente não acerte sempre. Tutora-Formadora C – Porque tem gente que só consegue fazer aquilo no

quadro percebido, se a gente não aceitar a gente não consegue convencer. Luiza – ruídos Ninguém acredita naquilo que você não sabe nem o que que é

né? O conhecimento nos trás uma segurança, uma confiança, então conhecer-

se, conhecer seu aluno, conhecer a prática, o método, o conteúdo, tudo as

concepções, que permeiam essa crença em si, que permeiam e que

impulsionam a agir assim ou de tal forma, levam a ter uma postura, e essa

postura é uma postura de ação, não é uma postura passiva. Nós estamos

agindo o tempo todo ruídos a questão do ato responsável, né? Temos a

responsabilidade, estamos aqui na verdade, é, uma relação, é, que é infinda

pro mundo, está a fim de se relacionar, de interagir, linguagem é interação.

Por isso que ontem eu falei pra vocês , gente vamos a ampliar o leque da linguagem, embora eu entenda que vocês tão colocando a linguagem como

comunicação partindo do pressuposto que realmente comunicação seria

interação, mais a palavra interação ela trás a idéia de inter ação, da ação que

acontece em si. A comunicação trás ainda ruídos como se alguém fosse

Page 112: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

111

detectar o outro, a comunicação das ideias do outro, e isso não é bem dessa

forma que acontece, se fosse assim gente, nós teríamos resolvido todos os

problemas ruídos e não estaríamos aqui, sabe porque? Seria fácil, eu

comunicaria, vocês sairiam daqui, repetiriam, e chegariam lá na ponta, e lá na

ponta o professor repetiria tal qual e as coisas não funcionariam, mais não é

assim que acontece, apropriar-se, construir nessas situações ruídos no

contexto Bakhtin fala uma coisa que é interessante, que palavras que são

lidas elas não são sempre as mesmas, eu posso repetir exatamente a mesma

frase ou a mesma palavra, mais ela jamais será a mesma, o contexto será outro, mesmo que os interlocutores sejam os mesmos, o já é outro, oh, o

segundo já passou, oh, o que a gente tá vivendo agora é um novo segundo, e

um novo segundo, e um novo segundo isso ele não se repetiam nesse sentido.

ruídos –

As interlocuções que são destacas nesse fragmento são transcritas da gravação

do segundo dia da semana de formação. A proposta descrita no planejamento consistia

em aprofundar teoricamente os conceitos de formação, formador e tutor a partir do texto

Soligo & Prado (2008) Quem forma quem?.

As interlocuções constituídas de enunciados tecem tramas em um movimento

infindável de construção de sentidos e significados.

As tramas se teciam com o movimento enunciativo expresso nas interlocuções

elaboradas no ato da formação. Como no destaque do extrato:

(...) a formação como autoformação (...) avaliar e pensar nas suas ações do

cotidiano (...) essas inquietações as coisas que nós não temos respostas, as coisas que nós não sabemos ainda fazer deflagra essa autoformação (...) essa

inquietação (...) ao olhar pra essa prática, enfim, é o que vai te levar(...) a

buscar teoria, conceituação, pra utilizar essa prática, é isso (...) uma reflexão

da prática (...) ação de um bom tutor (...) Que caminhos que eu tenho que

buscar? Como é que eu vou intervir, nessa realidade? Aí eu me reporto lá nas

minhas concepções, nas minhas idéias, nas teorias, nos teóricos, não sei lá

onde, pra poder referendar, então é uma coisa assim (...)

Cada enunciado realizado por cada tutor-formador presente no espaço cria

tramas enunciativas. Contudo há uma infinidade de pontos e bordados. Uma

possibilidade pode ser encontrada no destaque dos diferentes contornos da formação

docente.

As inquietações experimentadas pelos sujeitos, tutores-formadores, são pontos

de partida para a busca de respostas sobre as dúvidas que se apresentam nas práticas. Há

Page 113: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

112

movimento discursivo apresentado sobre as práticas, buscando a interlocução com as

concepções teóricas presentes nas práticas.

Os diálogos constituídos nesse fragmento desvelam indícios das vozes presentes

a cada enunciado expresso. Bezerra (2008) descreve o processo da polifonia afirmando

que eu me projeto no outro que também se projeta em mim, que afirmamos um para o

outro a existência de multiplicidade de “eu”, de duas multiplicidades de infinitos que

convivem e dialogam em pé de igualdade (BEZERRA, 2008:194).

Identificar as projeções que são constituídas nos espaços da formação

continuada sugere que são infinitos os conhecimentos que cada um carrega em si.

Sujeitos constituem e são constituídos por um outro, tutores-formadores e formadora

tecem tramas infindáveis de enunciados a carregando infindáveis vozes nesses

discursos.

Kramer afirma que a palavra é produto da interação locutor-ouvinte, é ponte

entre o eu e os outros, é o território comum do locutor e do interlocutor. Sempre há um

auditório social em jogo, sempre há diálogo (KRAMER, 1993:74). Assim, as palavras

que constituem não somente esse fragmento, mas os tantos diálogos que foram

constituídos ao longo da semana, criaram diferentes espaços de interlocuções com

palavras que se constituíram no ato da formação, atravessadas pelo contexto social que

formadora e tutores-formadores compõem.

Na alternância de falas entre a formadora e os tutores-formadores se produzem

enunciados, que se assemelham a fios que tecem tramas com nuances e tons singulares.

Contudo, há fios que permanecem soltos, palavras expressas sem uma interlocução

aparente e imediata. As constituições elaboradas nesse espaço são contextualizadas em

um espaço e tempo, porém ao considerar essa perspectiva não há como dar conta de

todas as interlocuções possíveis para o tema em destaque.

Page 114: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

113

Vale ainda considerar que o silêncio é umas constituições do espaço da

formação continuada, sendo uma interlocução que exige atenção, pois o não falar é uma

forma de falar sobre o tema.

3.2.3 Memórias, cadernos, lembranças da escola, registros... reminiscências em

encontros de formação

O tema memórias foi planejado com a proposta de duas atividades: a

ornamentação do caderno de registro e a construção de um mural de lembranças. A

apresentação para o grupo aconteceu de forma simultânea. Dessa forma, no momento de

compartilhar com o coletivo as produções, alguns decidiram falar sobre o caderno e

outros abordaram as lembranças da entrada na escola.

O desafio de analisar as interlocuções que se elaboram nos espaços de formação

continuada considerando como tema as memórias, como atividade do planejamento com

o objetivo de partilhar experiências individuais apontando uma visão coletiva da

história da profissão, pelas histórias subjetivas, revelando a nossa implicação ativa no

seu percurso (Planejamento da semana de formação) ganha forma com atividade de

construir um mural de lembranças da escola.

Benjamin observa que a reminiscência funda a cadeia da tradição, que

transmite os acontecimentos de geração a geração (BENJAMIN, 1994:221). A foto

apresentada a seguir marca o início da construção do mural das lembranças. Para além

do que cada um narrou e registrou sobre suas lembranças da escola, as reminiscências

contadas pelos tutores-formadores iniciam a constituição da tradição das narrativas nos

encontros da formação continuada para tutores-formadores.

A história é um objeto de uma construção cujo lugar não é o tempo homogêneo e

vazio, mas um tempo saturado de “agoras” (BENJAMIN, 1994:229). O convite que

Page 115: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

114

Luiza realiza ao propor a escrita de lembranças da escola marca que essas

reminiscências dos tutores-formadores são constituídos de “agoras”. Ao retomá-las no

encontro marca e funda a cadeia da tradição, pois a cada narrativa singular expressa por

eles, se reconhece o coletivo que as constitui.

Figura 1: O mural de lembranças dos tutores-formadores

Segundo Bakhtin (1926), os discursos verbais são atravessados pelo contexto

social no qual cada sujeito, tutor-formador, está inserido. A formadora Luíza, quando

Page 116: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

115

apresenta a proposta de ornamentação dos cadernos, seguido do registro sobre o papel

do tutor-formador na primeira página do caderno, inicia a temática sobre a função que

cada um irá desempenhar. O convite consiste em marcar a posição do tutor-formador

nos encontros da formação continuada.

Figura 2: Os cadernos ornamentados dos tutores-formadores

Page 117: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

116

Figura 3: O fazer à mão do tutores-formadores

Page 118: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

117

Figura 4: Os sentidos e singularidades de cada tutor-formador

A confecção do caderno se aproximava da perspectiva benjaminiana de que a

arte de contar histórias era feita quando as pessoas fiavam e/ou teciam quando ouviam

histórias (BENJAMIN, 1994). Nesse caso, estavam a ornamentar um caderno de

anotações simbolizando a arte de fazer à mão tão marcada nos textos de Benjamin. Para

o autor, a arte de trabalhar com as mãos, o artesão, aproximava os homens das

narrativas e consequentemente constituía as histórias. A observação de que a confecção

do caderno criou espaços discursivos entre os tutores-formadores simultaneamente à

arte de ornamentar um caderno de registros.

Instaura-se no grupo um clima de fazer à mão ao mesmo tempo em que as

narrativas tomam os espaços das conversas e dos burburinhos nos pequenos grupos. Os

cadernos criam um espaço de constituição por meio da ação de fazer e cada ornamento

tem significado e sentidos que são singulares:

Page 119: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

118

Tutora-Formadora A – Eu pensei que a vida da gente é uma colcha de

retalhos, a gente vai construindo e, e enquanto a gente vai fazendo o

caderno, vocês podem olhar que ele não tem começo nem fim né, a vida da

gente é assim o tempo todo, e aí eu falei, não, ficou legal, tá tudo

recortadinho representando a vida, aí eu peguei no botão, porque às vezes a

gente precisa abrir casas e fechar casas na vida da gente, então é por isso que

os botõezinhos estão aqui.

Vozes misturadas ruídos. O grupo fez comentários. Muitas vozes de forma

simultânea. Luiza – Olha a colega quer mostrar o dela também

Tutora-Formadora B – Eu só ruídos do caderno, porque o que eu achei

legal o caderno ruídos mas só achei mais legal que durante a confecção, aí eu

fui pegando ruídos aqui, aí a outra me deu um lacinho ali, eu peguei um

botão ali com ela, aí tipo assim, eu acho que nessa construção do caderno é

uma construção de várias coisas, cada um trouxe um pouquinho pra

compor isso aqui, na verdade o caderno é uma construção minha que

outras pessoas estão participando ruídos e risos

.

Um enunciado concreto como um todo significativo compreende duas partes: a

parte percebida ou realizada em palavras e a parte presumida que está presente no

contexto social (BAKHTIN, 1926:5). Há indícios presentes nos discursos que tem um

sentido presumido e cada interlocutor representa nas palavras esse presumido, como na

expressão a vida da gente é uma colcha de retalhos, apresenta indícios que não estão

presentes no discurso verbal, mas parece serem contemplados no caderno, pelo ato de

confeccioná-lo.

As narrativas passadas de pessoa a pessoa são a fonte a que recorrem todos os

narradores (BENJAMIN, 1994:198). Ao retomá-las, institui-se o valor das narrativas

nos espaços de formação continuada. Ambos, tutores-formadores e formadora, narram

sobre a função do tutor-formador, considerando que há um outro presente, e esse outro é

o professor.

Prado & Soligo (2007) nos convidam a pensar que se faz urgente e necessário

convencer os professores de que suas conversas cotidianas podem se tornar conteúdos

em textos que apresentem saberes constituídos sobre o universo de seu trabalho. Há nas

narrativas dos tutores-formadores conhecimentos sobre a formação continuada de

Page 120: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

119

professores, do ponto de vista de quem realiza, contribuindo com mais um fio na

instituição do espaço da formação continuada do tutor-formador.

3.2.4 Memórias da entrada na escola

O fragmento a seguir se refere ao tema sobre a memória em que tutores-

formadores abordam a questão:

Luiza - Olha só a folhinha do seu cabelo, que vestido foi que você escolheu?

Tutora-Formadora C – Com seis anos, eu sabia que todo mundo tinha ido a

escola com aquela idade e eu não tinha ido ainda, com sete anos quando fui

pra escola e eu achava que eu ia encontrar ou ligar conhecimentos como

aquele que minha mãe me apresentou né? Cheio de coisas novas e, foi

bem risos diferente. Foi muito diferente eu tive que formatar pra depois

copiar, e eu que aprendi a escrever tanto na escola eu já tinha aquela não

escrita que a professora Ludmila colocou ontem ruídos Tutora-Formadora D – ruídos Aí ela justificou, eu até pedi que ela falasse,

naquele instante que ela falou ali, eu também entrei pra escola com sete anos,

mas eu também já fui pra escola alfabetizada, e assim é, meu avô ele tinha

um cavalete que eu copiava ruídos e meu avô, graças a Deus eu ruídos era

um universo mágico né, criança quer fazer, e ruídos todos os ruídos dos

meus primos eu queria fazer, ele desenhava muito, muito, fazia muito,

meu avô fazia coisas e mais coisas pra gente e tudo ia usar, já utilizado, e

quando eu fui pra escola, a primeira coisa que a minha professora fez, foi

pedir a minha mãe pra esconder a cartilha de mim, porque eu já tava, já tinha

quase terminado a cartilha, quando ela pegou a cartilha pra corrigir a primeira

lição ruídos que ela viu que eu já tinha quase que praticamente a cartilha pronta, e aí eu ganhei nova cartilha, ela tomou pra si a primeira risos foi

gente, é foi horrível, ela tomou aquela cartilha de mim e falou essa aqui você

não vai usar mais, você não pode usar a cartilha ruídos e pediu pra minha

mãe esconder de mim, botar o mais alto possível ruídos

Tutora-Formadora E – Meninas, meninas, levantem os cadernos, por favor,

cada um com o seu, a colega aqui não ta aparecendo, vem pra cá por favor.

Foto com os cadernos

Tutora-Formadora F – O meu caderno a palavra assim ruídos e risos eu era

muito moleca ruídos quando minha mãe me colocou na escola, ela me

colocou numa escola voz muito baixa eu tinha cinco anos, e eu aprendia

ruídos rapidamente e eu queria brincar, lá não queriam que eu

brincasse, essa escola era uma escola velha de telha, tinha uma, uma voz muito baixa e eu demorava a copiar porque eu queria brincar voz baixa e o

mais interessante é que na minha sala tinha uma senhora que também tava se

alfabetizando voz baixa A minha mãe ficou ruídos com a escola e essa escola

quando eu cheguei lá eles colocaram já na segunda série, eu pulei, porque eu

já tava adiantada por um lado né, e a professora me perguntou se eu não

queria ir para terceira série, eu tava com sete anos ela falou assim pra mim,

quantos anos você tem? Ela foi perguntando para as crianças do primeiro

ano, aí eu falei assim eu não sei, eu não tinha nem noção, eu tava tão assim,

tão encantada com a escola também né, aí eu peguei e falei pra ela, eu não

sei, aí eu pensei assim, vou chegar em casa e perguntar a minha mãe quando

foi que eu nasci e quantos anos eu tenho, eu não tinha noção. Aí minha mãe

Page 121: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

120

me falou com uma musiquinha né, sete, sete, meia oito, sete e sete, meia oito,

aí eu cheguei lá e falei pra professora eu tenho sete anos, aí ela olhou assim

pra mim em cada perna voz baixa ela falou isso em cada perna. Outra que

marcou muito também nessa escola foi quando não e sei se é do tempo de

vocês? Tem uma música chamada quem não conhece Severina chique que

comprou uma... nossa eu aprendi essa música assim, né, e eu fui conversar

com o coleguinha e ela voz baixa ela falou que não podia falar naquele

momento porque ela tinha uma pilha de caderno pra corrigir. Aí eu peguei,

ruídos fui falar com a minha colega da música, aí ela na mesma hora, levanta, pode ir pro quadro, fulano, e o colega do lado pode sentar agora, e eu tive que

ficar assim até o final da aula. O meu colega saiu e eu tive que assumir o

lugar dele, eu chorava ruídos sabe, então essa escola ela me marcou muito,

porém a poucos anos, e eu consegui um contrato na rede e eu fui dar aula

nessa mesma escola ruídos inclusive, a minha professora, é minha amiga

no conselho de classe vozes misturadas então, é assim né,eu fiz muita

besteira também voz muito baixa mais é buscando e supervisando que eu

cresci como profissional, agora muitas vozes

Luiza – É uma certa consciência de que nós não fomos suficientes, nós nos

formamos a cada dia ruídos é isso que nos mostra o crescer, progresso,

sabe, ruídos teve uma vez lá que me perguntaram ruídos você não se incomoda das pessoas ficarem falando, tratando como um pobre, a utopia,

ruídos se utopia é acreditar no outro, é saber, é ter consciência da plenitude

do ser humano, e até que ele nos mostre a aprender ruídos da nossa vida, que

é ter essa crença que todos somos capazes de aprender, então eu concordo

com isso ruídos então, e é justamente essa crença e aí fica tão bonito ver,

é, ouvir, taí o relato de vocês né, eu não acredito em fracasso escolar , eu

não acredito, é, tai, então ruídos eu acredito no poder de transformação

Tutora-Formadora I – Eu, eu sou muito engraçada quanto ao professor

em sala de aula, e eu, eu acho que eu não tive a oportunidade, dessa fase,

porque eu me alfabetizei com dois a três anos, eu tinha duas malucas de

tias que estavam fazendo trabalho ruídos época ruídos eu, minha irmã e minha prima, e quando entrei na escola, em 68, com seis anos eu fui pra

primeira série e na época tinha adaptação em alfabetização, quer dizer, com

15 anos eu terminei o segundo grau e estava na primeira faculdade, aí eu

não tive aquele momento, enquanto os outros estavam brincando, minhas

colegas falavam assim, eu não agüento, no começo do ano que tem pouco

aluno, ruídos eu faço tudo que é brincadeira e palhaçada, mas levando

ao aluno, puxando por ele né, que se solte também, aí de primeira mão

quando me vêem assim, as crianças até tem medo, mas outro dia ruídos na

direção, aí eu tava lá no computador, ai a professora chegou lá e falou assim,

oh, Isabel a André quer te falar uma coisa, aí eu parei de fazer o que tava

fazendo e olhei pra ele, aí ele falou assim, eu gosto tanto de você, eu queria

muito que você fosse minha professora. Porque eu fui na sala dele uma das vezes que ela teve que se ausentar, e, ele sentiu. Ele tava numa fase assim de

transição, e ele precisa disso, então tem aquele negócio, que eu cheguei na

obrigação, eu cheguei na escola com a obrigação né, eu não tive aquela fase

((ruídos)) não, eu sou uma palhaça, o pessoal morre de rir comigo

Luiza – ruídos memória que as vezes ruídos são caminhos extremos né,

prazerosos demais, ou de alguma forma, marcante pelo lado negativo,

também ruídos falando, que aí sim elas acabam ficando ruídos marcado

ruídos

A escolha do fragmento está atrelada à perspectiva benjaminiana da arte de

narrar histórias, afirmando que contar histórias sempre foi a arte de contá-las de novo, e

ela se perde quando as histórias não são mais conservadas. Quanto mais o ouvinte se

Page 122: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

121

esquece de si mesmo, mais profundamente se grava nele o que é ouvido (BENJAMIN,

1994:205).

As narrativas apresentadas pelos tutores-formadores se compõem de lembranças

entremeadas pela emoção das recordações que são evocadas do passado para o “agora”

do espaço de formação. As emoções tomam conta das narrativas, criando uma ponte

entre o passado-presente, indicando um futuro. Há nas narrativas um movimento de

tutores-formadores que revela com as expressões e movimentos corporais de

posse/conquistas suas experiências.

O coletivo, então, inicia a narrativa e cada um que compartilhava suas memórias,

os burburinhos, as conversas paralelas, tomavam o espaço. Expressões de aproximação

se estabeleciam entre os tutores-formadores. Instaurava-se um clima de pertencimento.

Segundo Konder (1989), as experiências são constituídas de conhecimentos que

são acumulados e desdobrados a cada movimento que o sujeito de elaboração realiza

sobre a experiência. As narrativas das experiências são uma das possibilidades para que

o sujeito possa não somente constituí-la como também contribuir na constituição do

coletivo na cadeia da tradição.

As experiências (BENJAMIN, 1994) comunicadas nos espaços da formação

continuada para tutores-formadores, além de serem transmitidas a outros sujeitos que

compartilham o espaço, inaugura um lugar em que cada sujeito tem a possibilidade de

elaborar as experiências que lhe atravessam em seu percurso profissional. Essa

perspectiva contribui para que esse tutor-formador, ao pensar sobre os encontros de

formação continuada para os professores tenha como fundamento a importância das

narrativas das experiências.

Ainda em diálogo com Benjamin (1996), o autor nos convoca a pensar sobre as

narrativas nos questionando sobre quem são eles e o que narram. Considerando que os

Page 123: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

122

espaços de formação de tutores-formadores são escassos, pergunto-me: Quem são os

tutores-formadores? O que narram? Como narram? Consideram que devem ser

compartilhadas suas experiências como tutores-formadores ou como professores?

Trazer essa reflexão para o campo da formação continuada provoca diferentes e

diversas considerações. Dentre elas, a questão de marcar a importância de narrar nos

espaços de formação como uma ação que institui o espaço e se aproxima da fundação da

cadeia da tradição. A memória, ao ser resgatada do passado, evoca os ecos das vozes

que foram emudecidas, e a partir desse resgate é que poderá se realizar o encontro

secreto que está marcado entre as gerações precedentes e a nossa (KRAMER, 1993:49).

As escolhas feitas ao narrar às memórias se constroem a partir das partes

escolhidas: relação entre a narrativa e o que nela se revela faz com que suscite

interpretações e não explicações – não é o que explica que conta, mas o que a partir dela

se pode interpretar (PRADO & SOLIGO, 2007:48).

Benjamin afirma que não há interesse em transmitir o “puro em si” da coisa

narrada como uma informação ou um relatório. A narrativa é um mergulho na vida do

narrador para em seguida retirá-la dele. Assim se imprime na narrativa a marca do

narrador, como a mão do oleiro na argila do vaso (BENJAMIN, 1994:205).

3.2.5 A função do tutor-formador

Andrade (2009) considera com relevância o personagem presente na cena da

formação, cuja identidade ainda recebeu poucas análises pela pesquisa – trata-se do

formador. Identifico que essa figura do formador se aproxima do tutor-formador,

profissional que ainda está nos bastidores das pesquisas e estudos na formação no

Brasil.

Page 124: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

123

A formadora tem como objetivo reconhecer a escrita como um procedimento de

formação, elencar as diversas concepções de "formação" e "formador" que estão

circulando no grupo. A seguir, apresentam-se os diálogos que são constituídos sobre o

tema:

Tutor-Formador– Ser formador é ser responsável por um processo de

mudança interno e externo, uma mudança que deve começar em mim, e

se estender até o outro. Ser formador é ser alguém que provoca dúvidas

e inquietação mais também estende sua mão e convida a caminhar com

solidez. Enfim, ser tutor formador é sobre tudo ser alguém que direciona

o olhar e focaliza ruídos corrente de trabalho e continua para que ele dê

cada vez mais frutos

Tutora-Formadora A –ruído existe a formação, né, que nasce o tempo inteiro, eu acho que formando e informando, mais o que vem ser o bom

formador mesmo, tutor ruídos é uma coisa com intencionalidade, aí, é

nessa intencionalidade, que tá o que você precisa identificar né, a gente

precisa identificar em qual é a minha intencionalidade como formador. É

minha intencionalidade na ruídos qual é a intencionalidade, é nisso que eu me

foco, como formador intencional.

Luiza – É existe uma passagem ruídos que fala sobre essa formação

intencional ruídos exatamente, exatamente como você está falando, da

formação profissional. A formação profissional ela tem um caráter

intencional ruídos na verdade o objetivo de você é, possui poucas habilidades

tais ruídos fazendo com que você seja capaz de se identificar com sua própria

função, e se nós pensarmos em formação de professores, nós estamos pensando exatamente em, em ressignificar, a profissão né, de ser professor,

de professar, aí mais uma vez a gente recupera né, aí a idéia de metáfora do

aluno, em que cada palavra do aluno, que mais uma vez o Guilherme e a

Rosaura é recuperam assim que fantasiosamente nós temos assim é, é muito

comum ouvir entre os professores que a palavra aluno, dele varia de aluno,

que seria também testemunho, a como objeto de negação e o nulo de ruídos

mais eles se dão, que muito pelo contrário, que é particípio de um verbo que

é o verbo ruídos Alegre, alegre, isso ruídos Que é o verbo dar, alimentar, dar-

se-á, dar alimento, amamentar, ta ligado a essa idéia mesmo de alimentar o

outro, e nesse processo de alimentar, mais uma vez se tem a idéia de como

você ao outro ruídos você não só aprende né, mais ensina o outro a cuidar de você também, não é isso? Essa perspectiva, uma mãe, quanto uma mãe, um

pai precisa aprender a cuidar de um bebê. O que é lidar com um bebê? Quem

já foi mãe ou já teve uma criança bem próxima de si em algum momento da

vida, sabe que a gente aprende geralmente, a primeira criança que aparece na

sua vida geralmente é a que mais sofre, você prende a mão, você queima,

você deixa cair, tudo acontece, porque? Não porque você esteja desatento,

descuidado ou descomprometido com aquele bebê, não, que teve então dois

ou três filhos, sabe que o primeiro sempre sofre mais, o segundo a gente vai

tirando de letra, mais dá pra tirar de letra, não é verdade, embora seja

diferente, nós aprendemos, e é lógico que mais uma vez quando ele fala em

formação ele fala sobre esse olhar da pessoa experiente né? Do professor

experiente, do papel da formação que acontece também através de

estágios, ou até mesmo de relações dentro da escola onde se possibilita a

geração de um outro profissional que tem uma história que constituiu o

professor como deveria entre outras, não estou falando que tem nem de

melhores nem piores, estou falando de experiência de outras, que nos

fazem aprender com eles também. Então a gente aprende com o aluno, a

gente aprende com os pais, esse aprender com o professor, pode ser tanto

através dos dados ou através das nossas tecnologias, quando chamamos isso

Page 125: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

124

de bi formação né, que muita vezes é quando a gente vai mostrando através

de o quanto tem através dessa tecnologia de se mostrar algumas cenas aí, tem

umas que ficou vozes misturadas

Luiza – ruídos se unem e colocam e as pessoas refletem e debatem, sobre

esses valores, quer dizer, isso é, uma forma de inquietar, de refletir, de levar a

uma falta a uma necessidade, isso a leva a buscar, essa busca, essa incessante

auto-afirmação, fala

Tutora-Formadora B – Eu queria completar, que quando você fala ruídos

uma questão que, reaprender né, na verdade nesse significado ruídos esquecer que assim como professor na verdade ali a ruídos é outra né, ele ta numa

outra dimensão, num outro processo formativo né, eu vou, ajudar a formar

aquele aluno, como diria a Luzia mas eu não posso atuar como professor né,

eu tenho que me colocar também ruídos como dar aula, e é meio complicado

o professor dar aula né, eu ruídos infantil no mês passado e, eu me dei conta

de pessoas que nunca tinham pisado numa turma de educação infantil, e

assim, não sabiam com funcionava, e queriam elaborar projetos pra fixar o

aluno, então como eu vou dar aula nesse grupo, se eu tenho a experiência,

dentro da minha prática que eu tenho, eu não teria a teórica, então como eu

vou dar aula? Então essa ressignificação de professor para tutor, pra mim

foi um grande desafio, hoje eu já não tenho mais como tutora, já tenho

como mediar isso legal mais no princípio era difícil, eu queria dar aula,

eu queria explicar as coisas pras pessoas, porque aquilo, aquela

universidade que eu estou ruídos E o tutor ele tem uma outra função né?

Ele até pode ensinar, mais ele tem uma função diferenciada, real, ele

induz vozes baixas e ruídos – Tutora-Formadora C- ruídos É um questionamento em relação ruídos você

tem uma idéia de alfabetização gerada por censo comum em como

participar ruídos principalmente a questão de formação é trabalhar essa auto-

estima, ele vai e não aprende ruídos e justo isso aí, é com muito tato, muito

jeitinho, com muita proximidade mesmo, que eles vão esperando coisas

prontas né,aí eu tenho um aprende, você não tem uma receita, um pozinho mágico, pirlim pim pim que eu jogo nela e a criança vai aprender, não, então

tem que ter uma consciência muito grande pra lidar com essa aula, as vezes é

por questões ((ruídos)), tem que fazer curso, graduação, então é lidar com

todas as necessidades dos alunos ruídos

Luiza - É ter esse pensamento, é porque, é óbvio, porque você tendo esse

contato superficial, olho no olho se dá, através de um sorriso, através de, que

na verdade relações ruídos aí eu também acho interessante, interessante se

vocês tivessem um tempinho retomassem o texto quando ele ao final ele faz o

relato de uma é, professora que fala a respeito dessa relação ruídos. Então é

óbvio que vocês terão um modelo de formação, que será um modelo de

formação a distância, mais isso não, é, e em nenhum momento vai tirar de

vocês, vamos dizer assim né, a eficiência, mas diria a possibilidade, de interagir com esse professor, com esse ruídos e levá-lo a perceber, é, sobre

todas as dificuldades, sobre auto-formação, de reflexão, de dúvida, de

inquietação, é lógico que, ruídos as expectativas também deles é de um

resultado imediato, é de uma solução, uma receita milagrosa que dê

conta daquela inquietação ou daquela angústia que ele trás, mais nós

sabemos também que é impossível ruídos, então, dentro desse parecer

ruídos exatamente ruídos de tudo que vocês disseram aqui né, são

formadores, são o que? Dentro desta perspectiva o que é ser tutor? O que

é ser formador de formadores? Senão também mediador, também

orientador, é, professor de significado, não de contato direto, mas por

exemplo, se ruídos a necessidade da clareza da sua escrita, a sua linguagem escrita será de fundamental importância nessa interação. Porque o cuidado

que se deve ter com aquilo que se escreve e a necessidade de ser entendido

pelo o outro, se fazer entender, de você tentar ruídos quem vai ler o seu texto

mais a frente, que também se isso que vocês falam sobre isso, é

fundamentalmente importante, então... é, dentro dessa perspectiva, eu acho

Page 126: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

125

ruídos papel, a importância e a complexidade né, dá função de ser

formador, levando em consideração todas as dimensões da formação,

auto-formação, a partir dos quais(ruídos e também, é essa formação que

se dá ao longo da vida.

Um tutor-formador logo de início expressa a sua opinião sobre a função de tutor:

Tuto-Formador – Ser formador é ser responsável por um processo de

mudança interno e externo, uma mudança que deve começar em mim, e se

estender até o outro. Ser formador é ser alguém que provoca dúvidas e

inquietação mais também estende sua mão e convida a caminhar com solidez. Enfim, ser tutor formador é sobre tudo ser alguém que direciona o olhar e

focaliza ruídos corrente de trabalho e continua para que ele dê cada vez mais

frutos

Em suas palavras, apresenta o desafio de que ser tutor é um processo de

mudança que deve começar em mim e se estender até o outro. Ao anunciar tal

perspectiva, considera não somente as suas próprias experiências, seus conhecimentos,

mas a necessidade de ir até o outro, para que este também possa elaborar suas próprias

construções.

A aproximação com o conceito de exotopia (BAKHTIN, 2003) se instaura

quando identifica que há a necessidade de ir ao lugar do outro. Identifica que as dúvidas

e inquietações são recursos que cada formador dispõe para colocar no foco as

constituições e elaborações de cada participante do encontro. Em seu discurso, expressa

as intenções com a expressão estender a mão. O espaço da formação continuada é

identificado como um encontro entre sujeitos, tutor-formador e professores.

Rossi (2008) também apresenta a concepção sobre quem são os formadores:

Cheios de vida. Cheios de dúvidas. Ousados. Prontos para uma viagem

arriscada, sem mapas precisos. Descortinam o desconhecido, mas não

descartam os cantos de onde vieram. No dia a dia vivem no mundo dos

adultos, mas já ensinaram crianças, em escolas. Alguns ainda ensinam. Estes

dividem suas funções de professores de cada escola com suas funções de

formadores. Outros voltam à “casa materna” apenas como formadores

(2008:52).

A autora apresenta o campo da formação de professores na perspectiva do

formador, nomeação escolhida pela autora para abordar o profissional que trabalha com

Page 127: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

126

professores. Descreve o cotidiano do profissional e as tantas funções que lhe são

atribuídas, contudo há um aspecto que considera quando cita que esse trabalho acontece

com adultos. A marca dessa perspectiva propõe que há especificidades no trabalho do

tutor-formador, fazendo-se necessário que demarque e institua esse lugar.

Em diálogo com Andrade (2011), surgem questões sobre o ponto de vista do

tutor-formador: os formadores esperam (apostam) que os professores transformem a sua

prática? Os professores acreditam que os formadores possam lhes ensinar alguma coisa?

Há expectativas tanto dos formadores como dos professores que a formação

continuada contribua para transformar os cotidianos. No desafio de compreender que as

interlocuções se constituem no ato da formação, há ainda um caminho a ser perseguido

no que se refere à formação do professor. Porém, algo que já está presente nos discursos

dos tutores-formadores consiste na identificação de que há um interlocutor, o professor,

que está inserido em um contexto, atravessado por situações, conhecimentos, ações,

subjetividades que estão presentes nos cotidianos (ANDRADE, 2009).

A história dos formadores ainda está limitada às narrativas orais, há apenas

fragmentos da memória de cada um, contudo é com esses fragmentos e situações ainda

pontuais que tutores-formadores exercem a função nos cotidianos das redes de ensino

público, contribuindo para as tão sonhadas transformações das práticas escolares

(SNOECKY, 2003:22).

O fragmento destacado a seguir prossegue com a discussão da função abordando

a questão do deslocamento de posição:

Então essa ressignificação de professor para tutor, pra mim foi um grande

desafio, hoje eu já não tenho mais como tutora, já tenho como mediar isso

legal mais no princípio era difícil, eu queria dar aula, eu queria explicar as

coisas pras pessoas, porque aquilo, aquela universidade que eu estou

((ruídos)) E o tutor ele tem uma outra função né? Ele até pode ensinar, mais

ele tem uma função diferenciada, real, ele induz...(tutora-formadora).

Page 128: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

127

Aproximo o que a tutora-formadora aborda como ressignificação do conceito de

exotopia (BAKHTIN, 2003). Amorim (2004) convoca o pesquisador a deslocar-se ao

país do outro para construir escutas de alteridades e retornar ao seu lugar de pesquisador

para marcar no sujeito da pesquisa os excedentes de visão constituídos ao longo do

processo.

Na função de tutor-formador também há a exigência do exercício da exotopia,

pois o tutor-formador precisa ir ao lugar de professor - ver o mundo com os valores dos

docentes -, voltar à posição de tutor-formador e oferecer os excedentes de visão

constituídos. Encontro no processo de formação continuada proposto pelo Programa

Pró-Letramento a possibilidade de realizar deslocamentos de posição, para poder

oferecer os excedentes de visão aos interlocutores que participam do processo:

formadores da universidade, tutores-formadores e docentes.

A escrita deste texto de pesquisa instaura a marcação sobre as interlocuções que

são constituídas entre formadora e tutor-formador na topologia que se inaugura a cada

formação continuada que se inicia. As alteridades apontadas pela autora se fazem

presentes nas singularidades enunciativas que os sujeitos participantes do espaço de

formação continuada – formadora e tutor-formador – enunciam, criando tramas de

interlocuções infindáveis, indicando que essas interlocuções se constituem nos

excedentes de visão apresentados a cada enunciado.

3.3 A Tutora-Formadora

Segundo Bakhtin,

o “contexto extraverbal” dos enunciados compreende três fatores: o

horizonte espacial comum dos interlocutores; o conhecimento e a

compreensão comum da situação por parte dos interlocutores e avaliação

comum dessa situação (1926:5).

Page 129: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

128

Identifico que o Programa Pró-Letramento se constitui no “contexto extraverbal”

no qual os discursos são enunciados criando tramas de interlocuções. Tais interlocuções

são constituídas nos encontros de formação continuada, em um primeiro momento,

entre formadora e tutores-formadores e, em um segundo momento, entre tutora-

formadora e os professores.

As elaborações constituídas no ato da formação continuada dos tutores-

formadores, a partir dos objetivos propostos no planejamento pela equipe de

formadoras, representada neste texto pela formadora Luíza, revelaram tramas de

enunciados nas interlocuções entre a formadora e os tutores-formadores, apresentando

indícios sobre os temas propostos no planejamento.

A entrada no campo da formação dos professores, na aproximação do grupo da

tutora-formadora, tem como intenção observar os indícios constituídos na formação

continuada dos tutores-formadores, a partir do planejamento proposto pela equipe de

formadoras. A busca consiste em investigar esses indícios constituídos nas interlocuções

por meio dos enunciados, no ato da formação continuada para tutores-formadores.

A iniciativa da tutora-formadora em colocar-se disponível para a pesquisa com

seu grupo de professores foi o critério de escolha para a realização do trabalho

investigação. Encontrei naquela tutora-formadora uma disponibilidade em abrir um

espaço em que reflexões e posicionamentos ficam expostos, nas singularidades das suas

constituições. Assim, a pesquisa continuou no município de Queimados/RJ com um

grupo de 25 professores. Os encontros aconteciam semanalmente, perfazendo 12

encontros.

Page 130: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

129

A tutora-formadora Lina14

possui formação em Pedagogia com especialização

em Orientação Educacional. Trabalha na secretaria de educação do município em um

cargo de coordenação do Departamento Geral de Educação. Há ainda outras duas

tutoras-formadoras que fazem parte do Programa Pró-Letramento de Alfabetização e

Linguagem, cada uma com uma turma de docentes.

Snoeckx (2003) afirma que as funções realizadas por formador de professor,

nesse caso tutora-formadora, estão à mercê das necessidades, das urgências, das

prioridades, as atribuições são controladas e resultados de negociações dos profissionais

(SNOECKX, 2003:28). O trabalho realizado por Lina está na função de coordenação, a

formação de professores é algo que acontece de forma paralela.

Essa situação é semelhante para outros tutores-formadores participantes da

formação. O desempenho variado de funções, apresentando dentre elas a formação

continuada, coloca em questão tanto a qualidade de investimento desses profissionais,

em virtude da quantidade de demandas e da prioridade do trabalho com a formação de

professores.

As primeiras aproximações entre mim e a tutora-formadora foram por meio de

um convite realizado para ir ao município e conhecer o espaço da formação e uma

conversa inicial sobre o trabalho que seria realizado.

Um ponto ressaltado foi a conquista do local para realizar os encontros do

Programa Pró-Letramento, tanto de Alfabetização e Linguagem como de Matemática,

considerado pela própria tutora-formadora uma conquista. Em sua narrativa sobre o

processo, marca a importância dos encontros das formações continuadas do município.

Após nosso encontro, fiz o seguinte registro:

Encontramos na Secretaria Municipal de Educação, local de trabalho da

tutora-formadora. Nossa primeira conversa foi a narrativa que Lina realizou,

14 A tutora-formadora aprovou que seu nome verdadeiro fosse utilizado no corpo deste texto.

Page 131: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

130

muito empolgada, sobre a luta junto ao secretário de educação para que o

Pró-Letramento tivesse um local de concentração para a realização das

formações continuadas.

Nossa!Eu falei com ele várias vezes para convencê-lo da importância de tal

fato, foram várias conversas.

A possibilidade existia, pois havia um CIEP que está desativado em virtude

de um projeto para que se tornasse um campus da UERJ. A Prefeitura cedeu

o espaço para o projeto, porém esse ainda não foi iniciado. Assim, foi

concedido que o espaço da sala de leitura da escola fosse utilizado pelo Programa Pró-Letramento para concentrar as formações continuadas. Lina

me narra esse percurso de luta pelo espaço com um entusiasmo e com uma

compreensão sobre o lugar da formação continuada contribuindo para a

melhoria da qualidade das práticas dos professores.

O extrato acima, retirado de meus registros de campo, anuncia uma compreensão

por parte da tutora-formadora sobre a importância dos encontros de formação

continuada para professores. Ao materializar seu discurso sobre o tema, tornando-o um

espaço concreto, revela aos sujeitos participantes daquela rede municipal a importância

que a gestão local está direcionando para o projeto. Segundo Andrade,

a formação de professores se constitui uma formação discursiva sobre a qual

se mobilizam muitos agentes, constituindo uma forte intensidade de ações

políticas. Ela pode ser representada por um conjunto de imagens de seus

participantes, figuras produzidas pelas ações de indivíduos profissionais que

ocupam posições que lhes são designadas e autorizadas. (ANDRADE, 2011:2)

A função ocupada por Lina atrela-se a seu processo de formação continuada,

apresentado no fragmento a seguir:

Eu sempre juntei muito a teoria com a prática, né? A questão da prática, de

você está realizando, de você está fazendo. Mas de você está se

realimentando, porque se não, na hora de fazer você está vazio. Muito na

minha formação eu aprendi isso, vendo, estudando e pesquisando. (fragmento

da entrevista)

A iniciativa de Lina está autorizada pela função que ocupa. Os argumentos

construídos por meio de investimento na sua formação são produtos que constituem

alicerces para o desempenho de suas funções, desencadeando ações políticas sobre o

tema da formação continuada. A decisão de organizar um lugar para os encontros da

formação continuada dos professores cria um símbolo de um lugar destinado a receber

Page 132: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

131

profissionais para reflexões sobre as questões que circulam em torno da escola, nesse

caso específico, as referentes à alfabetização e linguagem.

Por meio da imagem, há uma aproximação do contexto no qual os discursos

estão sendo constituídos. Identifico nas imagens sobre o espaço do Pró-Letramento de

Queimados/RJ questões que são suscitadas a partir da imagem técnica que apontam para

singularidades e sentidos impressos na organização do espaço constituído por aquele

grupo de tutoras-formadoras. Há um aprofundamento sobre o espaço, indícios da

cultura, modos de subjetivação expressos por aqueles sujeitos, constituidores daquele

espaço: tutoras-formadoras e professores do ensino fundamental (SOUZA, 2007).

Identifico que o espaço conquistado pelo Programa Pró-Letramento no

município de Queimados/RJ instaura e materializa o espaço da formação continuada

para professores. Assim, ao compartilhar as fotos do espaço, identifico que as

subjetividades construídas pelos que coordenam esse processo no município se

desvelam na concretização da organização na montagem do espaço.

Figura 5: o lugar da formação do Pró-Letramento de Queimados/RJ

Page 133: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

132

Figura 6: o espaço interno – materiais para uso dos professores

Figura 7: espaço para exposição de trabalhos dos professores

Page 134: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

133

Figura 8: produções dos professores na formação do Pró-Letramento

Figura 9: grupo de professores assistindo a um vídeo na formação

A decisão de apresentar quatro imagens sobre o espaço consiste na aposta de que

há um contexto de organização para esse trabalho. Há indícios de uma preocupação por

parte da tutora-formadora para que as formações acontecessem em um lugar que

possuísse uma estrutura, com um trânsito livre de acordo com os objetivos propostos

Page 135: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

134

para o trabalho com os docentes. Lina marca de forma recorrente em nossos encontros

que se fazia necessário receber os professores em um espaço organizado para esse fim.

Nesse momento, identifico que seu cargo na gestão daquela rede de ensino se atrelava

às demandas do trabalho da tutora-formadora que compreendia o percurso e as

sinuosidades da formação continuada.

Ao observar as produções, recursos didáticos, objetos que constituem o espaço

da formação, há um entendimento de que os discursos são enunciados nesse “contexto

extraverbal”, assim há brechas para compreender que há uma relação que se estabelece

entre o horizonte extraverbal e os discursos enunciados nesse espaço (BAKHTIN,1926).

Contudo, encontro ainda uma consideração no que se refere aos objetos

constituidores do espaço, tanto os que foram escolhidos e colocados pelos tutores-

formadores, como aqueles produzidos pelos professores no ato da formação. De acordo

com Bakhtin (2003), os sentidos dos enunciados são constituídos pelos sujeitos ao

mesmo tempo em que esses mesmos sentidos os constituem. Um processo simultâneo

de constituições se estabelece no interior daquele espaço de formação; recursos e

objetos são constituidores do contexto extraverbal materializado no espaço da formação

continuada; as produções constituídas no ato da formação instauram novos recursos,

novos objetos. Há, portanto, uma infinita trama de produções que são constituídas no

ato desse processo.

Os bordados tecidos nos contornos dos discursos apresentam indícios que se

articulam com esse horizonte espacial e ideacional compartilhado (Bakhtin,1926) por

professores e tutora-formadora, sujeitos constituidores daquele espaço. Há ainda fios

que ficaram soltos, pontos ainda por bordar, no que se refere a considerações dos

professores sobre a criação de um espaço para a formação. Ainda que não fosse o foco

desta pesquisa, não foram observados nas gravações e em conversas informais reflexões

Page 136: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

135

sobre o tema. Esse fio possibilita a iniciação de uma busca de criar novos bordados para

uma investigação sobre o tema.

A tutora-formadora compartilhou o planejamento e decidi colocá-lo no corpo

deste texto com o objetivo de oferecer um horizonte sobre os temas e atividades

propostos pela tutora-formadora. O quadro 6 apresenta tal conteúdo.

Encontros Pautas Resumidas

1º encontro

Leitura literária: De Letra em letra - Bartolomeu Campos de Queiroz

Confecção de crachás para apresentação - Por que aderiu ao Pró-Letramento?

Quais as expectativas para o curso?

Leitura da apresentação dos fascículos no livro do Pró – letramento. Pág. 06 e 07

Leitura em roda do livro: Guilherme Augusto Araújo Fernandes de Mem Fox.

Confecção dos cadernos e materiais para adorno.

Escrita individual a partir da seguinte consigna: "Na sua história de professora,

quais foram as reviravoltas, os processos vividos, experiência dos nas suas

práticas de ensino de leitura e escrita?

Leitura de Memórias de alguns cursistas. Organização de um mural de fragmentos dos textos memorialísticos.

Em grupo, os professores escolhem os fragmentos que querem "publicar" no

mural.

2º encontro

Leitura em roda do livro: Asa da Palavra, de Adriano Bitarães Netto. Ed. Mazza

A partir dos questionamentos abaixo responder individualmente:

Para você, o que é linguagem?

Qual é a sua compreensão de linguagem ESCRITA?

O que você entende por alfabetização e letramento?

Explanação no power-point: História, leitura, escrita e alfabetização (material da

plataforma). Apresentação de pontos de vista organizados coletivamente:

Alfabetizar Letrando ou Letrar alfabetizando?

Em pequenos, grupos os professores apresentam suas questões e depois se organizam para a apresentação na plenária.

Criação de um mural por grupo, contendo os conceitos construídos na atividade

anterior de forma criativa (através de uma paródia, música, cartaz, poesia...

Leitura e reflexão do texto: capacidades linguísticas da alfabetização (pág. 14 e

15).

Apresentação do quadro 1 em power-point - Compreensão e valorização da

cultura escrita: capacidade, conhecimentos e atitudes ( pág.16 e 17)

Apresentação do power-point sobre Compreensão e valorização da Cultura

Escrita.

Apresentação do vídeo: Ler deveria ser proibido (Campanha publicitária de

incentivo a leitura).

3º encontro Conversa informal sobre as idéias apresentadas no vídeo, e reflexões quanto ao

conceito de alfabetização e letramento. Conversa e explanação do power-point Apropriação do Sistema da Escrita.

Reflexão coletiva sobre os diferentes tipos de suportes e gêneros textuais com

atividade de Leitura de diversas: parlendas e trava- línguas em grupos.

Divisão da turma em grupo a fim de propor análise do processo de escrita a partir

da produção de alunos.

Leitura compartilhada com comentários sobre cada um dos itens

Leitura em grupo com discussão sobre o tema, registrar em painel as observações

do grupo.

Apresentação de diversos jogos de alfabetização que podem ser utilizados com os

alunos dando a oportunidade de socialização de troca de idéias entre as cursistas

Page 137: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

136

4º encontro Leitura em roda do livro: A caligrafia de Dona Sofia

Apresentação do trecho do vídeo: Central do Brasil

Apresentação do power-point: Gêneros textuais

Manuseio de diferentes gêneros textuais e seus portadores.

Apresentação do vídeo Literatura Infantil

Apresentação em power-point do quadro 3 ( pág. 40)

Solicitar que as cursistas em grupos produzam atividades relacionadas às

capacidades do quadro 3:

Desenvolver fluência em leitura;

Construção de poesias pelas cursistas inspirando-se no tema abordado na aula.-

5º encontro Leitura do poema “Cortar o tempo” Carlos Drumond de Andrade - Perceber a necessidade de organização do tempo escolar no processo ensino aprendizagem/

Ler fascículo 3 pag. 6 introdução

Confeccionar individualmente lista de atividades relacionadas à leitura e escrita

que você desenvolve semanalmente - Relacionar as atividades que são ocasionais

e as que são realizadas cotidianamente.

Refletir a partir da leitura dos relatos o que se ensina e o que os alunos aprendem

com atividades de leitura desenvolvida nas escolas nessas condições - Conversa

informal sobre a narrativa dos professores.

Perceber a importância do planejamento para alcançar os objetivos -

Apresentação dos grupos pontuando a necessidade do professor ao planejar

atividades de escrita assumir-se como agente de letramento , promovendo com seus alunos a possibilidade de utilização da escrita real como registro,

Analise em grupo de três situações de escrita dos relatos da página 13, 14 e 15

Responder em grupo algumas questões relacionadas a aplicação do tempo

dedicado a leitura na escola - o que se lẽ? Para quê se lê? Quando se lê?Para

quem? Com quem? E em que condições se lé na escola? .

Responder em grupo algumas questões relacionadas à aplicação do tempo

dedicado a escrita na escola - O que se escreve? Para quê se escreve? Quando se

escreve? Para quem? Com quem? E em que condições se escreve na escola?

Avaliação do encontro -

Para casa: solicitar aos professores que levem para a próxima aula um

planejamento de sua turma da escola - Através de uma palavra expressar a importância e relevância do tema para uma melhor organização das atividades

6º encontro Avaliar planejamento de aula em grupo - Avaliação de alguns planejamentos,

observando se há ações educativas voltadas para a questão da leitura e da escrita.

Perceber se conhecimentos sobre leitura e escrita foram considerados neste

planejamento de aula?

Ptt Planejamento/ Refletir sobre o tema a partir da apresentação

Criar uma atividade de rotina para uma turma de alfabetização - Em grupo criar

um planejamento de aula com atividades de leitura e escrita para ser desenvolvido

numa sala de aula.

Leitura da página 26 tópico sobre improviso - Conversa informal discutindo os

conceitos de improvisação e espontaneidade

7º encontro Leitura de qualidade para ampliar as práticas de leitura docente - Leitura do Livro

que as cursistas escolherem dispostos para elas em uma mala. Logo após

expressão oral de algumas obras lidas. Refletir sobre a importância da Biblioteca escolar ou a sala de leitura, apontando

elementos relacionados à sua organização e possibilidades de uso - Apresentação

do power-point

PNBE - Apresentação da carta do Ministro da Educação que apresenta as abras

adquiridas para as escolas públicas

Levar os cursistas a refletir a respeito da importância do ato de ler e a mediação

do professor nesse processo - Apresentação do vídeo: “O ato de ler” do Ziraldo.

Reflexão e discussão em grupo.

Orientar os cursistas quanto aos conteúdos que serão abordados na formação:

Biblioteca escolar. Para quê? Como utilizá-la?

Livros grossos ou livros finos? Com figuras ou sem figuras? Que tal ouvirmos a opinião do leitor?

Page 138: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

137

E as escolas que não tem biblioteca?

Os suportes do texto na formação do leitor.

A ilustração dos livros infanto- juvenis

Orientar quanto a importância da contação de histórias bem como a possibilidade

de utilizar livros falados na sala de leitura - Apresentação do áudio livro: Contos

ao redor da Fogueira, de Rogério Andrade Barbosa. História ouvida: kumbúo

menino da floresta Sagrada.

Orientar os cursistas quanto aos conteúdos que serão abordados na formação:

Leitura: uma prática social na escola;

E na sala de aula, como ficam a leitura e a escrita? O acesso ao acervo e o papel do professor.

Situações de leitura.

A leitura nossa de cada dia - Leitura do fascículo do 4, Unidade II: Pag. 21 a 33 -

Dividir a turma em grupos e solicitar que cada grupo faça a leitura de um relato

da unidade I, em seguida cada grupo fará apresentação oral do relato lido

Proporcionar as cursistas conhecer a vida e a obra de 5 dos grandes mestres da

Literatura brasileira

Lygia Fagundes Teles: A Inventora de Memórias;

Quatro Vezes Quatro: João Cabral de Melo Neto;

No Caminho de Drummond;

José Lins do Rêgo: Engenho e Arte; Raquel de Queiroz: Não Me Deixes./ Apresentação do DVD Mestres da Literatura

( TV Escola – Duração 26 minutos).

8º encontro Promover leitura de qualidade para a ampliação das práticas de leitura - Leitura

em roda do livro: “Histórias de um livro aberto” De J. L. Diego, Editora Scipione

Apresentar as professoras uma forma lúdica e prazerosa de trabalhar com o

dicionário em sala de aula - Jogo do dicionário (Material da Plataforma)

Refletir sobre o uso do dicionário na escola e desenvolver atividades lúdicas de

utilização do dicionário propostas no Livro do Pró-Letramento,

Conhecer as melhores estratégias para ensinar a ler por prazer, ler para estudar e

para se informar

Leitura as melhores estratégias para: ler por prazer, ler para estudar e ler para se

informar. Relembrar e registrar e ou desenhar os momentos que elas consideraram mais

significativos

Preparação de um mural de lembranças: O que mais gostei na formação hoje?

Leu para os professores Felicidade Clandestina – Clarice Lispector

9º encontro Em círculo promover a brincadeira com os cursistas do brinquedo cantado

Escravos de Jó, que consiste em cantar e passar um objeto entre os integrantes a

medida que o objeto termina na mão de um participante este vai deixando a

brincadeira.

Propor reflexões sobre a lógica da escrita, assim como explorar o eixo da leitura e

produção textual - Distribuir fichas onde em grupo os cursistas confeccionem

uma lista de brincadeiras e jogos infantis que já participaram, e a partir desta lista

confecção de um caça palavra.

Compreender a importância dos jogos e brincadeiras, como instrumentos de promoção da aprendizagem nos anos iniciais.

Reflexão sobre as diferentes possibilidades de ação pedagógica com o sistema de

escrita, a partir de contextos significativos - Distribuição de reportagens de temas

do cotidiano retirados de jornais, onde os alunos em grupo devem escolher o tema

mais relevante da semana e reescrever os textos, de forma que possam ser

veiculados num telejornal

Perceber que o mundo da escrita e da oralidade é um universo de possibilidades

para se interagir socialmente.

Refletir sobre como os textos circulam e como são produzidos em contextos –

extra-escolares - Textos produzidos e apresentados na T.V Letramento, ( por dois

relatores/ repórteres) observando todas as nuances de uma matéria apresentada por um telejornal

Consolidar o tema abordado nesta aula/ Apresentação do power-point Lúdico

Page 139: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

138

Perceber a importância do lúdico no desenvolvimento da leitura e escrita -

Cântico coletivo e visualização do vídeo

Refletir sobre a relevância dos temas abordados. Painel: Se a aula de hoje fosse

uma música, que música seria?

10º encontro Leitura de qualidade para ampliar as práticas de leitura docente.

Leitura no power-point e Comentários do Texto: A camisa do homem feliz

Discutir sobre as características dos diversos saberes da oralidade e da escrita.

Apresentação do power-point sobre Modo de Falar e modo de escrever. (Livro do

Pró-letramento.)

Refletir sobre a capacidade de se expressar e comunicar de acordo com as

convenções sociais e culturais. Perceber a presença diversos falares em comunidades e adequação do uso da

língua.

Desenvolver a integração dos saberes da oralidade na produção escrita.

* Destacar no filme trechos que demonstram situações que envolvem a

explanação do assunto estudado no power-point.

* Realizar a Escrita e Relato dos fatos destacados

Subsidiar as reflexões dos cursistas a respeito do tema

Explanação do power-point: Alfabetização e Letramento

AULA: ORALIDADE E ESCRITA- Profª Monica Fernandes (Plataforma)

11º encontro Ampliar as práticas de leitura docente

Criar possibilidades de construção de frases e textos a partir de uma leitura

Atividade de Produção de texto Destacar palavras que foram citadas na história

Formar frases com as palavras destacadas;

Organizar um texto com as frases produzindo um novo texto.

Valorizar a relevância de ouvir os alunos - Apresentação do power-point: Rubens

Alves – Escutatória

Investigar a prática pedagógica no ensino de escritas textuais - Apresesentação do

power-point:A interlocução na sala de aula - Nelita Bortolotto /Editora Martins

Fontes - Material da Plataforma.

Possibilitar a aproximação da reflexão com a prática docente - Produção de

atividades em grupos para serem trabalhadas em sala de aula com os alunos a fim

de despertar a oralidade e a escrita. Observar a variação linguística na letra da música. Ouvir e analisar a letra da

música Lourinha Bombril - Paralamas do Sucesso

12º encontro Avaliar planejamento de aula em grupo - Avaliação de alguns planejamentos,

observando se há ações educativas voltadas para a questão da leitura e da escrita.

Considerar que conhecimentos sobre leitura e escrita foram considerados neste

planejamento de aula?

Refletir sobre o trecho do livro Parati de Amyr Klink: “Um rumo e um destino

fazem a diferença em qualquer situação”

Criar uma atividade de rotina para uma turma de alfabetização - Em grupo criar

um planejamento de aula com atividades de leitura e escrita para ser desenvolvido

numa sala de aula

Quadro 6: Planejamento da tutora-formadora

3.3.1 O primeiro encontro: apresentações, memórias, registros, cadernos...

O primeiro encontro da formação continuada dos professores dos anos iniciais

do ensino fundamental começou com a apresentação da tutora-formadora e um breve

Page 140: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

139

panorama da proposta de formação do Programa Pró-Letramento. Sobre esse primeiro

dia, registrei em meu caderno de anotações a seguinte passagem:

Ao chegar fui recebida por Lina e logo o encontro se iniciou. Iniciou com a

sua apresentação e logo após anunciou a minha presença, pedindo que

explicasse ao grupo sobre a pesquisa. Apresentei ao grupo de forma objetiva

o meu objeto e a proposta de investigação. O grupo nesse momento, por meio

de expressões faciais e corporais demonstrava um acolhimento e um interesse

sobre a minha estadia ali. Também me coloquei disponível para conversar

sobre o meu trabalho de pesquisa, questões em torno da universidade.

Compreendia que a minha presença no grupo marcava a presença da universidade naquele espaço de formação continuada. Logo após as

apresentações, Lina faz a leitura de um dos meus livros preferido Guilherme

Augusto Araújo Fernandes, de Men Fox. Após a leitura, faz a proposta de

ornamentação do caderno de registro e a apresentação das lembranças da

escola.

Após a leitura do livro, a tutora-formadora entregou um caderno e propôs que o

grupo ornamentasse o caderno e escrevesse sobre suas memórias da escola na primeira

página do caderno. O grupo se encantou com a proposta, diante dos materiais

oferecidos, e participou de forma entusiasmada da atividade. As conversas e

burburinhos se misturavam às histórias narradas e a proximidade entre os docentes foi

se construindo no movimento de fazer à mão.

A tutora-formadora Lina propôs que cada professor realizasse a leitura de suas

memórias. O fragmento a seguir transcreve algumas dessas histórias:

Lina: Quem gostaria de abrir suas memórias para a gente?

Professora A: Tudo começou com minhas bonecas e meu guarda-roupa. Eu

colocava elas sentadas e usava o guarda-roupas como quadro, claro que

quando minha mãe descobriu ela brigou comigo, porém, como eu queria o

quadro ela deu para gente um quadro, e como consequência, meus alunos aumentaram. Agora, eram meus irmãos e minhas bonecas. Graças a Deus,

minha mãe, uma analfabeta, hoje funcional, ela disse que poderia ser

professora de verdade! Fiz, então, o curso Normal e o adicional em

alfabetização de crianças especiais e vários cursos, e hoje, estou aqui!

(todos aplaudem)

Professora B: Eu cheguei no início de Belford Roxo (todos riem) Eu iniciei

minha história na educação vendendo docinhos e salgadinhos para os

professores e funcionários do CIEP em Nilópolis. Formada há muitos anos,

tentei um concurso e não passei por causa da prova de redação, mas a minha

irmã mais nova passou e queria muito que eu também tivesse esse trabalho de

professora. Foi assim que comecei a ter experiência nesse mundo né,

através da minha irmã, comecei a vender doces na escola que ela

trabalhou. Eu vendia meus docinhos para garantir o sustento dos meus

filhos, mas a vontade crescia de mudar para outro lado. Entrei num curso

Page 141: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

140

de redação para tentar recuperar minhas dívidas de escrita. Eu não sabia, mas

eu estava sendo observada pela diretora geral, que assim que surgiram as

turmas da noite de ensino juvenil, fui convidada para trabalhar com a turma

de alfabetização de alunos adultos, adolescentes. Acho que ela, a diretora,

achava que eu poderia ser uma professora leoa, que lutaria para trazer

alimento conhecimento para a turma da noite. Meus alunos tinham vidas

desorganizadas, alguns eram funkeiros, sem atividades, outros não sabiam o

que queriam, outros eram muito indisciplinados; e dois irmãos eram como eu,

vendedores de doces, só que eles vendiam doces no trem. Meu primeiro

trabalho que repercutiu nessa escola foi a construção do alfabeto com

sucatas e rótulos. Entrei em Belford Roxo em 1995 com apenas seis

meses de experiência com o juvenil e as experiências que via pela manhã

quando ia vender docinhos. Ali comecei a ter novas amigas professoras,

diferentes das antigas quando trabalhava na feira, trabalho digno, porém com

objetivos muitos diferentes. Iniciei meu trabalho agora concursada e com

uma turma de 1ª série. Eu tinha que dar conta da alfabetização daquela

turma, praticamente sem experiência. Então, coloquei-me a disposição

para participar de todos os cursos que pudesse fazer para continuar a

aprender a ser professora. Nessa escola encontrei pessoas amigas e pessoas

que criticavam o fato de eu pedir atividade toda hora para minha turma. Mas a crítica foi boa, pois fez com que eu criasse segurança para organizar minha

vida. (todos aplaudem)

Professora C: Comecei minha história como professora aos 18 anos de idade

na escola ruídos onde marcou uma história de alfabetização na minha vida.

Foi lá que dei os primeiros passos, concluí meu magistério, fiz estágio com

professores e continuei lecionando, não mais como estagiária, mas agora

como professora. Tive uma ótima diretora, Dona Áurea, que me ensinou

sempre que só se aprende a ler, lendo. Lecionei em escolas particulares ( a

professora citou nomes de diferentes instituições) (...) sempre com

alfabetização. Tive várias barreiras e tive uma que quase desisti, uma criança

veio a cair e o diretor me humilhou e me colocou bem no chão. Fiquei triste e quase desisti, mas houve uma voz que disse assim: - Quando tudo diz que

não uma voz me encoraja a não desisti, Jesus Cristo. (todos aplaudem)

Professora D: Tudo começou quando eu ainda era uma menina, minha mãe

era funcionária pública. Ela sempre trabalhou em escola como servente.

Por conta disso ela sempre matriculou meu irmão e eu (…) no horário

em que ela trabalhava. Passávamos o dia inteiro dentro da escola até

completarmos 12, 13 anos. O tempo passou, minha mãe teve que se aposentar

e meu irmão, que era dois anos mais velho que eu teve que arrumar seu 1º

emprego. Meu irmão prestou vestibular para matemática, hoje ele está

fazendo mestrado e está fazendo outra faculdade, direito. Euzinha, depois

que terminei meu segundo grau, me espelhei no meu irmão e também

decidi ser professora. Depois de 3 vestibulares consegui passar para a

Universidade no curso de Pedagogia. É tudo de bom! Sou professora e sou

feliz! (todos aplaudem)

Lina: Eu estou extremamente feliz acho que vocês estão motivados, eu

também estou motivada para estar aqui com vocês nós vamos longe nesse

trabalho. A última atividade seria olhar para o seu relato, para as suas

memórias que você está construindo e escolher um fragmento, pode ser uma

frase, ou uma coisa que muito te marcou, ou uma coisa que você nunca

esqueceu e colocar aqui para fazermos um mural com os fragmentos das

nossas histórias. Vocês podem escrever de canetinha ou pilot. É para escrever

agora.

A proposta está próxima do que foi realizado na formação do tutores-

formadores. A tutora-formadora cria um espaço de expressão das narrativas e a

Page 142: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

141

iniciativa do aplauso é validada por todos. A montagem do mural acontece com a

participação de todos.

A reminiscência funda a cadeia da tradição, que transmite os acontecimentos de

geração a geração (BENJAMIN, 1994:221). As elaborações constituídas por

professores e tutores-formadores estabelecidas por narrativas que pertencem a cada um,

compondo as memórias que tecem as histórias individuais de cada participante, fundam

a cadeia da tradição benjaminiana e contribuem com indícios sobre constituição de

possíveis saberes dos tutores-formadores.

As narrativas apresentam singularidades presentes na história de cada professor

naquele espaço. Ao aproximar o foco sobre o contexto social em que cada um está

inserido, enunciados que marcam posições sociais em relação às conquistas e fracassos

são recorrentes (BAKHTIN, 2003). Os enunciados carregam traços sobre os contextos

sociais que atravessam a constituição de cada um e o percurso da formação,

considerando tais situações.

Ser sujeito da história é ter, portanto, a tarefa de tornar presente o tempo

escondido sob as ruínas da história universal através dos “agoras” (KRAMER,

1993:50). Os professores colocam, por meio de suas narrativas, situações de um

momento que, ao mesmo tempo em que constitui cada um, também narra a história mais

ampla. Selecionam em suas memórias momentos críticos, e de alguma forma buscam

nas brechas encontrar novos caminhos, novas possibilidades.

Esse momento inicial apresenta ainda silêncios, deixando rastros de

interlocuções pontuais entre tutora-formadora e o grupo de professores. Ainda encontro

dúvidas no que se refere à compreensão que professores elaboraram sobre o ato de

narrar suas histórias no espaço da formação continuada como possibilidade de

constituição de sujeitos e, consequentemente, de compreensão sobre os atos de ensinar e

Page 143: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

142

aprender. Talvez ainda se faça necessário um movimento de investigação sobre as

produções que tais situações experimentadas na formação continuada possam produzir

para cada professor em seu processo de formação continuada.

3.3.2 Papel da escola, função do professor, alfabetizar e letrar

O fragmento a seguir faz parte do segundo encontro quando se inicia a leitura do

livro A caligrafia de Dona Sofia, de André Neves. A tutora-formadora fez um longo

discurso sobre a importância da leitura. Logo após, a discussão prossegue com a

exibição de um power-point que fez parte da formação dos tutores-formadores, sendo

utilizado na palestra de abertura da Profª Drª Ludmila Thomé de Andrade. O documento

tem como título Breve história de ideias sobre ensino escolar da escrita e

alfabetização. O fragmento a seguir é marcado pelas interlocuções que são constituídas

entre a tutora-formadora e os professores:

Lina: Alfabetizar é saber escrever o nome (...) nossos avós, nossos tataravós

só se alfabetizavam para saber escrever o nome (...) e ainda era na escola.

Estudei em uma escola, que não era para todos (...)

Voz feminina A – Dever e a importância da escola. O quanto a escola tinha

essa importância. Era muito importante, muito valorizado você estudar.

Lina – Mas era para poucos. Para poucos (...)

Professora A – A importância da escola, o quanto a escola tinha uma

importância, mas era para poucos, mesmo esses poucos, tinha a

importância, porque minha mãe também não é, mas ela sempre falou, meus

filhos vão estudar e, principalmente, as meninas. Porque a mulher é tão

escravizada, então pelo fato de você já ter um estudo você vai ser menos,

podendo até alcançar a sua independência dessa escravidão. Daí a devida

importância que a escola tinha. Mamãe falava assim, é deixa a casa de pernas

para o ar, mas eu quero todo o mundo na escola na hora certa.

Lina: Na verdade, essa discussão, eu acho que a gente está tendo, eu acho

que assim, está bem claro para todo o mundo o que é letrar e o que é

alfabetizar e qual a importância que esse contexto de letramento tem

para a vida dos sujeitos que estão lá com a gente na escola? ((silêncio)) Vamos nós! E aí eu já falei da Magda né, que é uma autora que no Brasil nos

ajudou, nos ajudou a difundir esse conceito de letramento, a pensar nessa

função social da escrita e isso etc e tal. E aí eu diria, o analfabeto pode ser

letrado. O letrado pode ser analfabeto?. Isso ela fala aqui, né? Eu

conheço alguns analfabetos que são letrados. Agora, o ideal, nós como

educadores, é que a gente consiga fazer o casamento, que a pessoa possa

ser alfabetizada e possa ser letrada para que ela possa se empodera desse

uso social, para que ela possa fazer uso disso no seu dia-a-dia, seu

Page 144: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

143

cotidiano, ok? Letrado versos não letrado. Grau de letramento. É... e a gente

vai ver daqui a pouco, a gente vai entrar no slide, é(...) todo o mundo

consegue perceber tudo, na mesma intensidade, no mesmo tempo, do mesmo

jeito? Não existem, por exemplo, letramentos(... )você vai, você vai a medida

que(...) é um processo, né? Você vai trabalhando, você vai adquirindo... você

vai fazendo mais relações com a vida, com aquilo que eu falei, com as coisas

que você já viveu, com as coisas que você já viu, com as coisas que você já

sabe, com a sua concepção de mundo, com a sua concepção de ser humano,

com a sua concepção de escola e(...) Eu sempre digo que eu tenho com a

escola um caso de amor, né? Eu, eu (...) fui criada em uma comunidade

do Rio de Janeiro, é (...) onde eu vivi com muitas dificuldades e (...) as

crianças, como eu, ali naquele lugar não tinham nenhuma perspectiva de

vida e na minha vida as coisas aconteceram de forma diferente (...) e eu

falo sempre isso, quando eu dou palestras, quando eu vou fazer

trabalhos por aí... Que o que me alçou a viver coisas interessantes... foi a

escola. Professora B – A escola representa esse mundo ampliado.

Lina – No meu caso foi a escola. A escola me disse: olha você pode, olha

você tem possibilidade, você não precisa ser, não que essas profissões

tenham nenhum demérito, mas você não precisa ser babá, só babá, você não precisa ser só doméstica, você não precisa ser só a diarista. Quem me

apresentou isso foi a escola. Então essa coisa de ler o mundo, de reler, quais

são os seus direitos, o que você pode, o letramento te dá isso, né? Você se

percebe enquanto cidadão, você se percebe enquanto sujeito, não passivo,

mas ativo na sociedade.

Lina – realiza leitura do ppt Grau de letramento. Não ser letrado e ser

letrado. Então há um caminho, né? Entre aquele que não é letrado... É um

processo, é um caminho, você vai (...) a medida que você vai trabalhando,

você vai aprendendo coisas, vai vendo coisas, vai dizendo coisas, vai

interagindo coisas, você vai se empoderando de compreender melhor o

mundo que o cerca, de olhar melhor as coisas. É tirar a informação. Reconhecer conteúdos, identificar e localizar. Então, depois dessas provinhas

que a gente dá, é... Mamãe foi a feira e comprou um quilo de banana.

Interpretação de texto: o que mamãe comprou na feira? Você já viu que as

vezes são coisas assim bastante simples que a gente nem liga que a criança

não consegue fazer. Então as vezes a criança ainda tem o letramento, uma

visão de concepção das coisas ainda muito limitada, as vezes a culpa é

nossa porque a gente trabalha esse tipo de coisa que não dá a

possibilidade (...) porque o letramento tem isso(...) O letramento, a gente diz,

é como a gente já falou aqui que é a criança, o indivíduo, né? A criança não...

o indivíduo ser capaz de usar socialmente (...) é (...) o que a gente lê, o que a

gente interage com o mundo (...) Nós enquanto professores, quando vamos

para a sala de aula, temos que colaborar. E colaborar como? Trabalhar

com coisas contextualizadas, do cotidiano, né? Que tenham, né? Que

façam uma ponte de contato com o esse aluno para que ele possa

entender essas coisas... é... E aí, por exemplo, em um outro momento, aí

aluno já vai localizar informações em textos curtos, já não é em textos muito

curtos, já aumentou um pouquinho. Localizar informação não escrita em

texto ((fala confusa, tom mais baixo)) Você já viu, as vezes, professor que

acabou de ler textos com coisas implícitas (...) é (...) subjetivas e fica todo o

mundo com cara de paisagem (...) ninguém consegue entender, só consegue

entender aquilo que está a olho nu, mas aquilo que está implícito a pessoa

não consegue fazer a ponte e etc. e tal. Mesmo que a informação não apareça

na forma literal. E, depois, vem textos longos, orientar-se sobre os títulos, comparar textos, localizar mais de uma informação, estabelecer relações entre

elementos do texto e realizar inferências. Quando você está... Quando você é

letrado, você lê uma coisa aqui e você consegue fazer uma ponte lá do outro

conhecimento.. Já aconteceu isso, né? Consegue associar uma coisa, um

conhecimento, não é estanque... eu estou aqui, por exemplo, associar com o

Page 145: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

144

que você fez, vou te dar um exemplo... poxa, meu pai é letrado, ele não

estudou muito, mas ele consegue. Então, é você fazer essas inter-relações. A

gente ser capaz de trabalhar em sala de aula, juntando a alfabetização

com o aluno, mas através do nosso trabalho, da metodologia que eles

usam que a gente oferece (...) possibilitar ao aluno fazer diferente, essas

pontes constantemente que a vida tem que a gente já viu e etc. Pode

interromper e falar, tá gente? Não quero todo mundo me olhando com

essas caras aí não, sério.

Os enunciados expressos por professores e a tutora-formadora ressaltam

provocações sobre a função da escola e uma discussão sobre acesso, permanência e

qualidade. Bakhtin nos afirma que a compreensão de uma fala viva, de um enunciado

vivo, é sempre acompanhada de uma atitude responsiva ativa e toda compreensão é

prenhe de resposta e, de uma forma ou de outra, forçosamente a produz: o ouvinte

torna-se o locutor (1997:291). Nas respostas da tutora-formadora, a necessidade de

pronunciamento sobre os sentidos e significados que a escola provocou na sua vida

pessoal está marcado nos enunciados que constitui ao longo do diálogo.

Nesse movimento de interlocução, a professora A anuncia a discussão sobre a

importância da escola, apontando que a escola tinha uma importância. Há uma

iniciativa da professora de explicar sua abordagem e buscar argumentos em sua própria

história de vida, apontando que sua mãe analfabeta valorizava a escola.

A interlocução que acontece nesse momento revela as discussões sobre a função

da escola e a questão do público recebido pelas redes públicas. Indícios sobre essas

questões foram temas de debates nos encontros da formação dos tutores-formadores.

Assim, a tutora-formadora se posiciona sobre o tema marcando que a escola era para

poucos.

A discussão sobre letramento e alfabetização acontece pela voz da tutora-

formadora e seus enunciados carregam vozes que se constituem em um universo de

experiências e práticas sobre o tema. Soares coloca que a discussão do letramento surge

Page 146: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

145

enraizada no conceito de alfabetização, o que tem levado (...) a uma inadequada e

inconveniente fusão de dois processos, com prevalência do conceito de letramento (...)

(2004:8). Esse enraizamento contribuiu para o predomínio do conceito de letramento,

apontando a presença de um certo espontaneismo e discursos recorrentes que o trabalho

com textos presentes oriundos das práticas sociais ensinaria crianças a ler e a escrever.

Essa é uma discussão constituída de argumentos e encaminhamentos que criam

diferentes caminhos e posicionamentos, por vezes, até contrários. Contudo, a discussão

não se estabeleceu, no que se refere a discussões verbais. A ausência de discursos

verbais dos docentes no que se refere a um tema polêmico no campo da formação causa

certo estranhamento. Os silêncios constituem as interlocuções nesse fragmento. A voz

da tutora-formadora se faz presente e não encontro no coletivo um movimento de

interlocução.

Tal movimento nos provoca a refletir que há ainda não-ditos que precisam ser

compartilhados no ato da formação continuada, criando então saberes que serão

compartilhados e constituidores desse espaço. Os silêncios apresentam indícios que

ainda há muito a dizer sobre o tema, ainda que pareça, ao campo da pesquisa, algo

recorrente.

A discussão continua no fragmento a seguir, que trata de letramento e

alfabetização. Há como intenção da tutora-formadora a marcação sobre o tema

letramento que mais uma vez acentua a interlocução com os encaminhamentos

propostos na formação de tutores-formadores:

Lina – ((muitas vozes)) ((Ela continua a leitura)). No início do século XX.

Letrado, das letras, de cultura erudita, elitista. Não era assim? Quem não

lembra? Fulano é letrado. Era aquele, uma pessoa, né, que sabia falar, que

conhecia as leis, que era um doutor, não era assim? Esse contexto deve ser

dever ser apagado? ((misto de vozes)) Oi? ((ruídos e silêncio)) Porém, nessa

associação ficam marcas desse acabamento, né? É (...) hoje a gente não é valorizado como aquele professor que ficava no (...) no tablado (...) quantas

escolas, né, o professor tá no retrato, os outros eram as cabeças vazias,

ninguém sabia nada, todos eles que estavam aqui, né? Ser letrado hoje não é

Page 147: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

146

isso, né? Ser letrado hoje tem um outro conceito de existência, em outras

coisas. silêncio E aí no dicionário é aquele que possui cultura, erudição, que

ou que é erudito ou instruído, que ou aquele que possui profundo

conhecimento literário... É... que ou aquele que é capaz de usar diferentes

tipos de material escrito, né? Substantivo masculino. O indivíduo de grande

conhecimento jurídico, advogado... é o letrado. O dicionário que diz. silêncio

Lina – E aí a Magda, que é uma autora, que vem apresentando para a gente,

de forma mais clara, mais ampla, mais interessante, esse contexto de

letramento... é.. Tem alguns livros interessantes, vou trazer alguns textos para a gente trabalhar aqui, pra gente ler (...) quem ainda nunca, quem nunca leu

nada de Magda Soares e quer aprender um pouco mais sobre o contexto de

letramento pode achar lá na internet que vocês vão achar (...) é (...) coisas

bem interessantes dela para ler, ta? Sobre letramento. Alfabetização (...) é (...)

comprar um livro, to lendo agora um livro “Alfabetização e

Linguagem”. É um livro de capinha vermelha, pequenininho (...)

Professora B – É esse que fala da ideologia do dom...

Lina – É, é, esse.Você tem?

Professora B assinala com a cabeça que conhece.

Lina: Então, é um livrinho bem pequeninho, bem fácil de ler. E fala assim

(...) Ela explica bem legal (...) Voz feminina B – Essa questão de dizer (...) tudo que a gente diz que o

aluno não aprende.

Lina – Aquilo que a gente estava falando aqui, né? Vai que ele não

aprende mesmo ou é a gente que não consegue (...) Professora B – Tem alunos que não aprendem não, mas tem uns lá na escola

que a gente fala que tem uma família que passa fome, que a gente ajudou

muito, caramba, que gente inteligente! Lê tudo, lê rápido, no tempo certo,

fazem conta (....) áudio baixo. Porque essa é uma exceção, né? A gente acha,

né? ((áudio baixo)) Aí a gente encontra uma família que passa muita

necessidade e grande parte das famílias tem muitos problemas (...)

Lina – áudio baixo Mas eu falo que essa família que o menino foi criado, fora o sobrevivente... Que vai dizer assim: eu passo fome, mas eu aprendo,

né? risos

Professora C – Veio para quebrar a regra.

Lina – Veio.

Professora C – Ele veio para quebrar a regra, né?.

Lina – Para quebrar regra. Graças a Deus.

Professora B – Ele e a família toda.

Professora C – Ah! Legal.

Professora B – Porque aqui é como se a gente (...) alguns, alguns

profissionais (...) é (...) não tem essa concepção da diferença do letrar, da

alfabetização (...)

Lina – Graças a Deus que tem uma colega lendo, né? Pra gente vir para cá e fica muito quietinho, né? Na verdade acho que hoje ficou claro para todo

o mundo que o conceito de letramento não é (...) é (...) antagônico a

alfabetização. Eles não são inimigos, né? Não tem disso. Um vai par lá e

o outro para lá. Eles precisam caminhar como? Juntos, lado a lado.

Então, quando ela diz isso é porque no Brasil a gente já viveu um monte

de, de... falhas, né? De coisas novas que vão, como a gente vê isso no

construtivismo (...) E coisa que vai surgindo e vai, não, agora (...) é aquela

coisa que eu falei, né? Nos anos oitenta todo o mundo era construtivista.

Ninguém sabia nada(...) Não sabia nem o que era. Ah... o que eu faço (?)

Não sei (...) mas, eu sou construtivista. Eu não sou mais tradicional.

Então, a preocupação desse conceito de letramento não veio

desqualificar o processo de alfabetização, de forma nenhuma, pelo

contrário, ele veio auxiliar, veio ajudar, veio ampliar e etc. e tal. Um é

mais importante que o outro? Não. Eles estão juntos, né? Tem (...) cada

um tem a sua importância.

Page 148: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

147

O tema sobre os métodos de alfabetização está presente na discussão. Mortatti

(2010) e Magda (2003) nomeiam-na de “querela dos métodos”. Em seus estudos,

apontam caminhos percorridos sobre alfabetização e a presença de um movimento de

marcar o “moderno” e desqualificar o dito “tradicional”, ou melhor, o já instituído. O

movimento de substituir formas “antigas” e “tradicionais” por “novas” e

“revolucionárias” é um processo apontado pelas autoras como algo recorrente no

campo.

A dicotomia que se coloca entre o “novo” e o “antigo” institui que cada

perspectiva teórica, ao se instalar, constitui-se negando e desqualificando a anterior e/ou

a vigente. A escolha de determinada perspectiva instaura a necessidade de se recusar e

desacreditar no arcabouço teórico construído até então. Esse é um movimento que está

presente no campo da alfabetização. Reconhecê-lo implica identificá-lo como um

movimento constituidor do campo (MORTATTI, 2009). A perspectiva de letramento e

alfabetização se insere nesse contexto quando as discussões se encaminham para uma

perspectiva de letramento em que refletir sobre a aquisição do código se torna algo

menor, quase que “antigo”.

Indícios dessa discussão estão presentes nos discursos da tutora-formadora Lina

quando apresenta que o conceito de letramento não é antagônico ao de alfabetização,

compactuando com Mortatti que nomeia o processo de permanências e rupturas. Diz

que no Brasil a gente viveu um monte de falhas, e aponta que havia a nomeação de ser

construtivista como ser “moderno”, rejeitando a nomeação de ser tradicional, pois está

relacionado a algo “antigo”.

Os enunciados contidos nos discursos da tutora-formadora são expressos com

silêncios e não-ditos sobre o tema: conceito de alfabetização e conceito de letramento. A

proposta de pesquisar sobre possíveis reflexões sobre o não falar de um tema presente

Page 149: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

148

no cotidiano da escola, no mínimo instaura a necessidade de abordá-lo em novos

encontros de formação.

Há fios que ficaram soltos a partir das escolhas e dos limites e contornos

exigidos em um texto dissertativo. Dentre eles destaco a leitura literária realizada em

todos os encontros pela tutora-formadora e a criação de um espaço de livros presente no

espaço da formação para os docentes. Investigações que podem ser analisadas em outras

possibilidades de pesquisa.

Amorim (2004) explicita que sujeitos, ao se tornarem sujeitos de pesquisa,

necessitam de um deslocamento de posição do pesquisador, esse sujeito se torna um

estrangeiro pelo simples fato de pretender estudá-lo. O campo da formação dos

docentes, do ponto de vista da tutora-formadora, indica que o fato de reconhecê-la como

objeto da pesquisa, ainda mostra que há diversos fios que ainda ficaram soltos sobre

diversos aspectos presentes no campo da formação continuada, no ato da sua

constituição.

Andrade propõe uma imagem metafórica do pantógrafo na busca de mapear a

articulação reticulada da formação docente:

O mapeamento deveria dar conta da especificidade da articulação reticulada

da formação docente, das possíveis aproximações e distanciamentos entre as

identidades, de modo a representar as posições mutuamente interferentes,

estabelecidas na cena da formação.

Os posicionamentos são mútuos e dinâmicos, nestes espaços de interrelação,

criando um dispositivo pantográfico. O mais importante será observar como

este será movimentado, a qualidade dos movimentos, quando o dispositivo for movimentado por cada um dos agentes na cena de enunciação da

formação. Os pontos são posições internas, mas ao serem movimentados

individualmente mexem com os outros, numa reação em cadeia inevitável, e

mexem automaticamente com o contorno exterior, modificando o contorno

do espaço ocupado pela figura. (ANDRADE, 2009:3)

O mapeamento do campo da formação explicitado pela autora com a metáfora

do pantógrafo nos desafia a compreender que essa trama da formação continuada

acontece no ato da posição que cada sujeito integrante do espaço – formadores, tutores-

Page 150: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

149

formadores e professores – realiza/expressa em seus posicionamentos. Situações que

acontecem quase que de forma simultânea e se alteram a cada movimento. As posições

são constituídas na interlocução entre os sujeitos, provocando aproximações e

distanciamentos, dependendo da posição que cada um toma no campo da formação.

Assim, os enunciados são construídos e alterados a cada movimento de enunciação

constituído pelos personagens desse espaço.

Identifico, portanto, que indícios das diversas interlocuções que cada

personagem do campo da formação constitui encontram interlocuções com as propostas

de formação que cada um tem experimentado ao longo do processo e a proposta de

formação continuada para tutores-formadores e para professores. Foi mais um espaço de

interlocução que contribuiu para a constituição das alteridades dos sujeitos

participantes.

Page 151: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

150

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Construí a imagem de tecer tramas, criando pontos, construindo possíveis

arremates, que atravessou o texto desta pesquisa desde o capítulo inicial, na

apresentação de um memorial de formação, justificando a escolha do objeto da

pesquisa. A elaboração do objeto de pesquisa tecido se aproxima da imagem sugerida

nas palavras de Bojunga: feito à mão. A delicadeza que propõe a autora, ao descrever o

caminho percorrido para a elaboração de um livro feito à mão, se assemelha à escrita de

um texto dissertativo que exige do pesquisador consistência no ato da escolha,

disponibilidade para escutas e olhares atentos para entrar no país do outro (AMORIM,

2004), situações construídas na proximidade com a arte de fazer à mão.

O exercício da exotopia (BAKHTIN, 2003, AMORIM, 2007) na constituição do

lugar de pesquisadora criou a possibilidade de um deslocamento de posição, para que eu

pudesse ir ao lugar da professora e à(s) posição(ões) de formadora de professores/tutora-

formadora, identificando os excedentes de visão, nesse momento, a partir de um lugar

mais distanciado das experiências e práticas. Esse exercício exotópico foi sendo

constituído ao longo do processo de investigação, tendo sido essa a primeira

aproximação do campo da formação a partir da qual me permiti conceber que havia um

caminho que (ainda) precisava ser constituído sobre o tema.

Os fios continuam a se tecer na escrita: na fundamentação teórico-metodológica,

marcando as cores dos discursos constituídos no ato da formação, identificando nuances

nos enunciados que compõem os discursos (BAKHTIN, 1926, 1997, 2003), criando

tramas infindáveis de interlocuções elaboradas no espaço da formação.

Um encontro que ainda deixa fios soltos e arremates por fazer se refere às

narrativas dos sujeitos, que constituem o espaço da formação continuada – formadores,

Page 152: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

151

tutores-formadores e professores – elaboradas neste espaço. A comunicação das

experiências (BENJAMIN, 1994) revela que talvez os profissionais ainda não

identifiquem a grandeza e a dimensão que tais histórias representam para o campo da

formação de professores e para a constituição de seus próprios saberes. Tais narrativas

fundam a cadeia da tradição transmitida de pessoa a pessoa (BENJAMIN,1994:198), e

o ato de narrar experiências profissionais pode produzir indícios que contribuam na

trama da cadeia da tradição (Benjamin,1994:211) das histórias que são constituídas nos

espaços de formação continuada.

Revelam-se no processo de investigação os encontros de algumas tramas

elaboradas no ato da formação continuada entre os sujeitos objetos deste estudo –

formador e tutor-formador – personagens que ainda estão nos bastidores do campo da

formação de professores.

O interesse em marcar a posição de quem se responsabiliza pela dinâmica e

planejamento do processo de formação continuada foi encontrado na equipe de

formadoras do LEDUC/FE/UFRJ, grupo composto por alguns pesquisadores que se

responsabilizou pela formação dos tutores-formadores. A abordagem aqui desenhada,

voltada para a posição discursiva do formador e/ou do tutor-formador, como sujeitos

integrantes do espaço da formação continuada (ANDRADE: 2007, 2009, 2011),

provoca o interesse sobre o tema e cria pontos de investigação, presentes nas

enunciações que colecionei a partir das observações registradas nos encontros de

elaboração do planejamento e reunidas para a escrita desta dissertação.

A investigação sobre o tema escolhido se realizou na duração do processo de

formação continuada oferecido pelo Pró-Letramento 2010-2011. O programa do MEC

cria espaços de formação continuada para tutores-formadores e professores dos anos

iniciais do ensino fundamental e a perspectiva escolhida permite identificar nos

Page 153: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

152

personagens – formadores e tutores-formadores – profissionais que têm a

responsabilidade de dinamizar o processo de formação continuada. Ainda se faz

necessária uma aproximação sobre a identidade desse personagem e as suas funções

cotidianas em seus municípios.

A participação como pesquisadora observadora, no nível micro, registrando as

interações ocorridas entre os personagens, atores participantes do processo, permitiu-me

considerar que o Programa Pró-Letramento instaura espaços de formação continuada

que nos permitem afirmar haver indícios de constituições do campo, tendo em vista as

interlocuções elaboradas pelos integrantes dessa esfera comunicativa que assim

constitui-se como espaço social (ANDRADE, 2009). No ato da formação, no diálogo

entre formador e tutor-formador, tutor-formador e professores, são deixados rastros,

pelos sujeitos que constroem tal espaço.

Os fios, as cores, as nuances, as tramas são escolhas elaboradas pelo olhar que

construí como pesquisadora. As observações realizadas teceram este texto de pesquisa,

reconhecendo que há ainda fios soltos, pontos para bordar, contudo, algumas tramas

foram tecidas, ainda que se tenha um longo caminho a se perseguir.

A participação nas reuniões da equipe de formadoras provocou observações

sobre os discursos enunciados entre os sujeitos participantes – formadores de

professores. A possibilidade de perceber as interlocuções constituídas entre aqueles

sujeitos instigaram a busca por possíveis interlocuções no ato da formação continuada

entre formadores e tutores-formadores, e tutores-formadores e professores.

No percurso construído, encontrei e participei ativamente de três instâncias no

campo da formação continuada: reuniões entre os formadores, para planejarem a

formação continuada para tutores-formadores; encontros de formação continuada, para

tutores-formadores; e formação continuada para professores do ensino fundamental.

Page 154: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

153

Parece-me que a identificação de tais instâncias do ponto de vista das decisões

metodológicas da pesquisa tornou-se por si mesma um fator que passa a contribuir para

marcar o reconhecimento desses espaços no campo da formação como espaços

constituidores de certas identidades sociais, por meio das posições que constituem o

campo da formação continuada.

A convocação da Universidade de forma sistemática para executar políticas

educacionais voltadas para a formação continuada reforça traços identitários, emanados

a partir da posição de formadores, para os professores universitários (ANDRADE,

2011). A aproximação entre a universidade e as redes públicas de ensino indica uma

possível diminuição da distância entre os docentes atuantes no ensino fundamental e as

produções científicas de pesquisadores. A realização de processos de formação para

tutores-formadores exige da Universidade um posicionamento sobre o campo da

formação continuada no que se refere a sujeitos e processos que o constituem.

Na instância dos formadores, profissionais localizados nas universidades, a

identificação e o reconhecimento do espaço da formação continuada como um lugar de

constituição de discursos entre os sujeitos pôde ser ressaltado como um dos princípios

da formação continuada.

Para Geraldi, a interlocução é um espaço de produção de linguagem e de

constituição de sujeitos (1997:5). Tal conceituação incitou-nos a buscar possíveis

origens das interlocuções, constituídas nos espaços de formação continuada.

Os planejamentos elaborados para as formações continuadas apresentam temas e

formatos composicionais que projetam a possibilidade de que sejam marcados indícios

de possíveis interlocuções. Assim, formadores e tutores-formadores, ao enunciarem

sobre temas como memórias, registros ou leitura literária, dentre outros, apontam a

Page 155: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

154

criação de interlocuções constituídas no interior dos enunciados que cada sujeito,

integrante do espaço expressa.

A localização de tais origens pela análise do planejamento permite-nos ressaltar

as formas didáticas que efetivamente criam espaços de interlocução entre formadores e

formandos, a partir de escolhas e seleções de temas. O planejamento se torna, então, um

recurso que cria, por meio dos temas, espaços em que sujeitos enunciam e constituem

interlocuções no ato da formação continuada.

Indícios de possíveis saberes elaborados a partir das práticas na formação

presentes nos espaços da formação revelam que a partir de suas constituições, novos

saberes são criados. Temas como memorial de formação, registros dos encontros da

formação, leitura literária são alguns dos que contribuem na constituição dos sujeitos.

A entrada no país do outro (AMORIM, 2004) criou uma aproximação do espaço

da formação continuada e apresentou um processo que se elabora em um movimento

discursivo tecido da seguinte forma: os discursos constituídos de enunciados expressos

no ato da formação continuada produzem interlocuções que tecem tramas enunciadas,

criando novas interlocuções, um movimento infindável tecido no ato das práticas na

formação. Desvelar esse processo apontou que há constituições que são tecidas pelos

sujeitos a partir de temas e atividades propostos, em uma primeira instância pelos

formadores e em uma segunda, pelos tutores-formadores.

Para identificar indícios de algumas dessas interlocuções, o exercício da

exotopia se fez constantemente presente. Assim, ao me deslocar na posição de

pesquisadora, observações sobre o lugar de tutor-formador foram possíveis a partir dos

excedentes de visão sobre o campo da pesquisa, com o foco nas interlocuções

constituídas. Encontro no conceito de exotopia a possibilidade de aproximação entre o

Page 156: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

155

tutor-formador e os professores, pois o deslocamento até o ponto de ancoragem do outro

e a volta à posição original revela os excedentes de visão sobre a posição observada.

Termino o processo de investigação identificando ainda fios soltos, pontos por

fazer, talvez possíveis arremates, ainda que em pequenas tramas. O texto buscou

construir um diálogo sobre o tema, considerando não somente os professores, mas

identificando que no cenário da formação existem os sujeitos que são os responsáveis

por realizá-la. Há uma interlocução que se constitui no ato da formação, entre os

sujeitos constituidores desse espaço: formadores, tutores-formadores e professores.

Há indícios nas interlocuções de possíveis saberes, que formadores e tutores-

formadores constituem, no ato da formação. Há um caminho de investigação sobre o

tema, apontando que tais saberes possam vir a contribuir na construção de um currículo

de formação de formadores e tutores-formadores. Cabe, então, considerar que a

perspectiva discursiva da linguagem possa contribuir na discussão sobre o campo, a

partir das interlocuções e das narrativas construídas ao longo do processo.

Page 157: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

156

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Page 158: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

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Page 160: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

159

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Professor-Formador: histórias contadas e cotidianos vividos. Campinas, SP: Mercado

das Letras: 2008.

Page 161: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

160

ANEXO

PROLETRAMENTO 2011 - LINGUAGEM

PLANEJAMENTO DETALHADO RJ e MG

1º DIA MANHÃ (MG e RJ)

HORÁRIO ATIVIDADE OBJETIVO PROCEDIMENTO RECURSO/MATE

RIAL

RESPONSÁVEL PROVIDÊNCIA

S

8:00 -9:00 Acolhida aos Professores-tutores

9:00 - 9:15 Vídeo 11 de

setembro

11:30 - 12:00 Diálogo sobre o

12:00-13:30 ALMOÇO ALMOÇO ALMOÇO ALMOÇO ALMOÇO ALMOÇO

1º DIA TARDE (MG E RJ)

HORÁRIO ATIVIDADE OBJETIVO PROCEDIMENTO RECURSO/MATE

RIAL

RESPONSÁVEL PROVIDÊNCIA

S

13:30 - 13:40 ACOLHIDA

13:40 - 13:55 LEITURA

LITERÁRIA

Contato com

literatura infantil de

qualidade a fim de

conhecer e ampliar

as práticas de leitura no trabalho docente

Leitura em roda do

livro "Guilherme

Augusto Araújo

Fernandes"

LIVRO "Guilherme

Augusto Araújo

Fernandes"

Autor: Mem Fox

Ilustrador: Julie Vivas

Editora: Brinque-

book

Coordenação e

formadores

04 livros

"Guilherme

Augusto Araújo

Fernandes"

Autor: Mem

Fox

Ilustrador: Julie Vivas

Editora: Brinque- book

13:55 - 14:20 APRESENTAÇÃO

DO GRUPO

Possibilidade de

iniciar o

estabelecimento de

vínculos entre os

participantes para o trabalho da semana

Manutenção da

roda/ Distribuição

do

crachá/apresentação

do

nome/município/RE

SPONDER: Por que

aderiu ao PL? Quais

as expectativas para a semana?

Crachás

Pilot p/ quadro

branco

Caneta hidrográfica

Coordenação 30 crachás X 04

04 pilot e

apagador

(verde/vermelho/preto/azul) X04

02 (x4) conjuntos

de caneta

hidrográfica com 12 cores

14:20 - 14:50 LEVANTAMENTO

DOS CONCEITOS

PRÉVIOS SOBRE

LINGUAGEM/

ESCRITA/ENSIN

O

1. através da

avaliação

diagnóstica,

proporcionar a

ativação de

conhecimentos

previamente

consolidados acerca

do conteúdo apresentado

A partir dos EIXOS

abaixo, responda individualmente:

1. LINGUAGEM

Para você, o que é linguagem?

Qual é a sua

compreensão de

linguagem ESCRITA?

2. PRÁTICAS DE

ENSINO – OBJETO

DE

Papel A4 e caneta

Coordenação 01 (x4) resma de

papel A4

30 (x04) canetas esferográficas

Page 162: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

161

CONHECIMENTO

Quando se

alfabetiza, ensina-se

o português? Por

que? (o que se

ensina?)

3. SUJEITO APRENDIZ

O que é ensinar

português para

brasileiros?

14:50 - 15:40 DISCUSSÃO COLETIVA

Apresentação de

pontos de vista

organizados

coletivamente

1. Em pequenos

grupos os tutores,

apresentam suas

questões e depois

organizam para a

apresentação na

plenária.

2. Escolha de um

orador e um escriba.

O orador tem voz na

plenária e o escriba

é responsável pelo texto do grupo.

3. O FORMADOR

registra no blocão os

principais pontos

dos três eixos para

serem usados ao longo da semana.

Papel 40 kg. coordenação Cavalete para blocão (x4)

Papel 40 kg (x4)

15:40 - 16:00 ORNAMENTAÇÃ

O DOS

CADERNOS

Zelo e apropriação

do material como

marca simbólica do

cuidado com a aprendizagem

Identidade e

importância do registro

Em grupos,

distribuição dos

cadernos e materiais para adorno

Papeis coloridos /Cola

Tesoura/Fitas

Miçangas

Imagens

Tecidos

Canetas hidrográfica

CD

Coordenação 30 (x4)Caderno para os tutores

Papeis coloridos

(Tudo X4)

:

crepom/laminado/etc

03 (x4) Colas/ 03

(x4)Tesouras/

Fitas diversas (x4) /Miçangas (x4)

Imagens/revistas

(x4)

Tecidos (x4)

16:00 - 16:10 IN- -TER- -VA- -LO IN- -TER-

16:10 - 16:40 ESCRITA DAS

TUTORAS SOBRE

SUAS MEMÓRIAS

DE PROFESSORA

ALFABETIZADORA

Possibilidade de

aproximação entre a

experiência

estudantil e suas

marcas na

construção do fazer

docente.

1. leitura do texto

"Lembranças" de Adélia Prado

2. Escrita individual

a partir da seguinte consigna:

"Na sua história de

professora, quais

foram as

reviravoltas, os

processos vividos,

Cópia do texto da

Adélia para as professoras

Caderno tutor

Coordenação 30 (x4) cópias do

texto

"Lembranças" de

Adélia Prado

Page 163: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

162

experienciados nas

suas práticas de

ensino de leitura e

escrita? "

16:40 - 17:20 PREPARAÇÃO DO

MURAL DE LEMBRANÇAS

1. A partir de uma

atividade de

publicação,

viabilizar a prática

social da escrita.

2. Partilha das

experiências

individuais

proporciona uma

visão coletiva da história da profissão

3. A profissão

docente é feita,

também, pelas

histórias subjetivas,

revelando a nossa

implicação ativa no seu percurso.

1. Organização de

um mural de

fragmentos dos

textos

memorialísticos.

2. Em grupo, as

tutoras escolhem os

fragmentos que

querem "publicar" no mural

3. A parte estética

de elaboração do

mural merece uma

atenção especial. Ela

revela questões

importantes sobre o

entendimento das

práticas educativas

tais como a

infantilização do

espaço escolar, a

relação com o gosto

estético, o valor

dado ao escrito na

escola, etc.

Papeis coloridos

Cola

Tesoura

Fitas

Imagens

Tecidos

Canetas hidrográfica

Coordenação Papeis coloridos

(Tudo X4)

:

crepom/laminado/etc

03 (x4) Colas

03 (x4)Tesouras

Fitas diversas (x4)

Imagens/revistas

(x4)

Tecidos (x4)

17:20 - 17:30 SÍNTESE Possibilidade de

organização didática

das principais

questões tratadas

(conteúdos e dúvidas)

Sugiro que os

formadores

convoquem o grupo

a elencar as

principais questões

do dia organizando

no blocão uma lista

de "conteúdos" trabalhados.

Blocão Coordenação Blocão

17:40 - 17:50 AVALIAÇÃO DO

DIA

Momento de

comentar, sugerir e

criticar aspectos do

curso de forma

propositiva.

A critério do

formador e do grupo

Coordenação e

formadores

17:50 - 18:00 APRESENTAÇÃO

DA AGENDA DO DIA SEGUINTE

Encadeamento e

explicitação do

conteúdo a ser

trabalhado ao longo

do curso, pode

ajudar o aluno (neste

caso, o tutor) a se

colocar numa

posição enunciativa

responsiva frente ao

seu papel de aprendiz.

Formulação livre de cada formador

Formadores

PROLETRAMENTO 2010 – LINGUAGEM

PLANEJAMENTO DETALHADO

2º DIA MANHÃ 8:00 - 12:00

HORÁRIO ATIVIDADE OBJETIVO PROCEDIMENTO RECURSO/MATE RESPONSÁVEL PROVIDÊNCIA

Page 164: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

163

RIAL S

8:00 - 8:05 ACOLHIDA

8:05 - 8:20 LEITURA

LITERÁRIA

Contato com

literatura infantil de

qualidade a fim de

conhecer e ampliar

as práticas de leitura no trabalho docente

Leitura em roda do

livro

LIVRO: : Ler,

escrever e fazer

conta de cabeça,

Bartolomeu Campos

Queirós

Coordenação

LUD enviará as

marcações de leitura

04 livros (Lud,

Beth)

8:20 - 8:25 RETOMADA DA

SÍNTESE DO DIA

ANTERIOR

Ativação dos

conhecimentos

estudados nos dia anterior

Organização livre de cada formador

Blocão Formador --------

8:25 - 8:55 ESCRITA INDIVIDUAL

1. Valorização da

palavra escrita do

professor

2. Reconhecimento

da escrita como um

procedimento de

formação

3. Aproximação dos

pontos de vista do

tutor e do PL a

respeito das

atribuições de um formador/tutor

4. A partir dos

textos escritos,

elencar as diversas

concepções de

"formação" e

"formador" que

estão circulando no

grupo

Propor ao grupo a

escrita individual a

partir da seguinte consigna:

Como se veem no

papel de

tutor/formador?

Caderno do tutor

Formador

---------

8:55 - 9:10 DISCUSSÃO

COLETIVA DOS

CONCEITOS DE

FORMAÇÃO

1. Sistematização

dos conceitos de

formação, formador

e tutor retirados do grupo

1. Em pequenos

grupos os tutores,

apresentam suas

questões e depois

organizam para a

apresentação na

plenária.

2. O FORMADOR

registra no blocão os

conceitos surgidos

nas falas dos tutores.

Blocão Formador ---------

9:10 - 10:00 LEITURA TEÓRICA

Aprofundamento

teórico acerca dos

conceitos de

formação, formador e tutor

1.individualmente os

tutores fazem uma

leitura silenciosa,

marcando o que

acham mais significativo.

Artigo: SOLIGO,

Rosaura e PRADO,

Guilherme Quem

forma quem, afinal?

IN: VICENTINI, A.;

FARIAS, M.;

SADALLA, A.;

PRADO, G.

Professor-formador:

histórias contadas e

cotidianos

vividos.São Paulo:

Mercado de letras, 2008

Coordenação

30 (x4) cópias dos artigos

10:00 - 10:10 IN- -TER- -VA- -LO -IN- -TER-

Page 165: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

164

10:10 - 11:10 SISTEMATIZAÇÃ

O DA LEITURA

Aprofundamento

teórico acerca dos

conceitos de

formação, formador

e tutor

1. Em pequenos

grupos os tutores

leem em voz alta

suas marcações e as

discute.

2. na grande roda,o

formador responde

as questões do grupo

e faz a síntese do texto.

Quadro branco Formador

---------

11:10 - 11:50 EXPLORAÇÃO DOS FASCÍCULOS

Através de uma

leitura transversal,

viabilizar a

aproximação dos

tutores com os

temas, com o

enfoque e

bibliografia de

referência.

Os tutores, em

pequenos grupos

(03) observam os

fascículos seguindo

a seguinte

orientação:

Quais os temas de

cada fascículo? O

conjunto de tema é

pertinente/Parece-

lhe interessante? A

que se destina este

material?

Fascículos PL Formador/ coordenação

Entrega dos fascículos

11:50 - 12:00 CONCLUSÃO DA MANHÃ/SÍNTESE

Possibilidade de

organização didática

das principais

questões tratadas

(conteúdos e dúvidas)

Sugiro que os

formadores

convoquem o grupo

a elencar as

principais questões

do dia organizando

no blocão uma lista

de "conteúdos" trabalhados.

Blocão/quadro branco/caderno tutor

formador ---------

12:00 - 13:30 AL- -MO- -ÇO AL- -MO -ÇO

2º DIA TARDE

HORÁRIO ATIVIDADE OBJETIVO PROCEDIMENTO RECURSO/MATE

RIAL

RESPONSÁVEL PROVIDÊNCIA

S

13:30 - 13:40 ACOLHIDA

13:40 - 13:55 LEITURA LITERÁRIA

Contato com

literatura infantil de

qualidade a fim de

conhecer e ampliar

as práticas de leitura

no trabalho docente

Leitura em roda do livro

LIVRO: Com a

pulga atrás da

orelha

Coordenação e formadores

04 livros Monica, Lud, Luiza

13:55 - 14:20 DINÂMICA DE GRUPO

Momento lúdico

para início da

discussão do tema

da tarde -

alfabetização e

letramento

Atividade livre

Dramatização

Jogo de mímica sobre as expressões

Formador ---------

14:20 - 15:00 RETOMADA DA

EXPLORAÇÃO DOS FASCÍCULOS

Aprofundamento teórico

Leituras anteriores

Protocolo de leitura

Extrapolação das leituras

ANALISAR A

BIBLIO PARA

PREENCHER A

TABELA

1. Coletivamente o

tutor fará uma tabela

com os autores

conhecidos e

Caderno tutor e blocão

Formador Tabela ok

Page 166: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

165

desconhecidos

2. em grupos de 03,

os tutores farão a

leitura das páginas

09 a 13 do fascículo

01 (Capacidades

Lingüísticas:

Alfabetização e

Letramento)

15:00 - 16:00 DISCUSSÃO COLETIVA

Movimento coletivo de estudo

1. Em pequenos

grupos os tutores,

apresentam suas

questões e depois

organizam para a

apresentação na

plenária.

2. Escolha de um

orador e um escriba.

O orador tem voz na

plenária e o escriba

é responsável pelo texto do grupo.

3. O FORMADOR

registra no blocão os

principais pontos

ELENCADOS

PELO GRUPO

Ppt com as páginas do fascículo -

Coordenação e formadores

04 Datashow

16:00 - 16:10 IN- -TER- -VA- -LO IN- -TER-

16:10 - 17:30 Aula expositiva

sobre alfabetização,

letramento e

linguagem

Aprofundamento

teórico sobre os

conceitos de

alfabetização,

letramento e linguagem

Aula expositiva com

movimentos de

interação com o

grupo a partir das

questões elencadas

nas atividades

anteriores

Ppt sobre história da

alfabetização e

letramento e a

discussão sobre linguagem

04 CD com os ppt das aulas

17:30 - 17:40 SÍNTESE Possibilidade de

organização didática

das principais

questões tratadas

(conteúdos e dúvidas)

Sugiro que os

formadores

convoquem o grupo

a elencar as

principais questões

do dia organizando

no blocão uma lista

de "conteúdos" trabalhados.

Blocão Coordenação Blocão

17:40 - 17:50 AVALIAÇÃO DO DIA

Momento de

comentar, sugerir e

criticar aspectos do

curso de forma propositiva.

Livre Coordenação e formadores

17:50 - 18:00 APRESENTAÇÃO

DA AGENDA DO

DIA SEGUINTE

Encadeamento e

explicitação do

conteúdo a ser

trabalhado ao longo

do curso, pode

ajudar o aluno (neste

caso, o tutor) a se

colocar numa

posição enunciativa

responsiva frente ao

seu papel de

aprendiz.

Formulação livre de cada formador

Formadores

Page 167: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

166

PROLETRAMENTO 2010 – LINGUAGEM

PLANEJAMENTO DETALHADO

3º DIA MANHÃ 8:00 - 12:00

HORÁRIO ATIVIDADE OBJETIVO PROCEDIMENTO RECURSO/MATE

RIAL

RESPONSÁVEL PROVIDÊNCIA

S

8:00 - 8:05 ACOLHIDA

8:05 - 8:20 LEITURA LITERÁRIA

Contato com

literatura infantil de

qualidade a fim de

conhecer e ampliar

as práticas de leitura

no trabalho docente

Leitura em roda do livro

LIVRO: Asa da palavra

LIVRO

ESCANEADO

Coordenação e formadores

04 livros Lud

8:20 - 8:25 RETOMADA DA

SÍNTESE DO DIA ANTERIOR

Ativação dos

conhecimentos

estudados nos dia

anterior

Organização livre de cada formador

-------- Formador --------

8:25 - 8:55 Dinâmica em grupo:

Encenação

Vivenciar situações

sociais cotidianas de

uso da leitura e da

escrita FORA da

escola a fim de

estabelecerem

relações entre a vida

e as práticas

escolares de leitura e

escrita

A turma dividida em

04 grupos, criarem

situações cotidianas

de leitura e escrita na vida

--------- Formador -------

8:55 - 9:25 AULA TEÓRICA

Quadro 01

Letramento e cultura escrita

1. Focalizar os

descritores, em

especial os do

quadro 01,

problematizando seu

lugar na construção

dos princípios

educacionais, com

destaque especial

para o lugar na

sociedade e na

escola

2. Estabelecimento

de relação entre as

práticas sociais de

escrita e leitura e os

processos de

aquisição da linguagem oral.

1. apresentação do

Ppt de imagens de

práticas sociais de

leitura e escrita com reflexões no grupão

2. Em pequenos

grupos de 04,

propor a discussão

das questões abaixo

a partir dos slides apresentados.

Que textos

circulam na escola

e quais textos

circulam no

mundo? Sao os

mesmos? O que é

escrita? Quais os

suportes que

conhecemos?

Ppt com imagens de

práticas sociais de

escrita e leitura

Suportes (base

material que permite circulação do texto)

Mediadores

Mônica ok / Coordenação

04 CD com os ppt das aulas

9:25 - 10:00 ANÁLISE DAS

NARRATIVAS DOCENTES

Discussão dos

descritores em

situações

"concretas" de

ensino e aprendizagem

Os tutores lerão a

narrativa e

destacarão os

descritores

referentes ao quadro 01

Narrativa Lud já

enviou Narrativas produzidas

Coordenação 30 (x4) de cópias das narrativas

10:00 - 10:10 IN- -TER- -VA- -LO -IN- -TER-

Page 168: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

167

10:10 - 10:40 Apresentação do

quadro do Marcuschi

Sistematização das

questões teóricas

Apresentação oral

do quadro pela

formadora após

distribuição do

quadro para as tutoras

Ppt Quadro

Marcuschi

CULTURA ESCRITA

Mônica ok 30 (x4) copais do

quadro do Marcuschi

10:30 – 11:50 INTERAÇÃO Assistir o VIDEO

PEQUENOS

TORMENTOS para

discutir as práticas

pedagógicas

focalizadas na

linguagem como interação verbal

11:50 - 12:00 CONCLUSÃO DA

MANHÃ/SÍNTESE

Possibilidade de

organização didática

das principais

questões tratadas

(conteúdos e dúvidas)

Sugiro que os

formadores

convoquem o grupo

a elencar as

principais questões

do dia organizando

no blocão uma lista

de "conteúdos" trabalhados.

Blocão/quadro

branco/caderno tutor

formador ---------

12:00 - 13:30 AL- -MO- -ÇO AL- -MO -ÇO

3º DIA TARDE

HORÁRIO ATIVIDADE OBJETIVO PROCEDIMENTO RECURSO/MATE

RIAL

RESPONSÁVEL PROVIDÊNCIA

S

13:30 - 13:40 ACOLHIDA

13:40 - 13:55 LEITURA LITERÁRIA

Mania de

explicação

13:55 - 14:20 DINÂMICA DE

GRUPO OUVIR AS

CRIANÇAS

QUERER DIZER

CÇAS FALANDO

JUNTO C/ PROF

DESLOCAR A

IDEIA DOS

SENTIDOS

ÚNICOS

GLOSSÁRIO DE

EMOÇÕES DO

LIVRO: palavras

filósofo, solidão,

ilha, saudade,

autorização,

sucesso, raiva,

vergonha, verdade,

pressentimento,

exemplo, amor,

beijo, amizade

(PALAVRAS DO

LIVRO)

Ler e criar novas

significações

Criança, escola,

cultura, leitura,

aula

14:20 - 15:00 VISÃO DE

LINGUA COMO

INTERAÇÃO

VERBAL,

ENUNCIAÇÃO

REFLETIR

SOBRE A

ESCUTA DA

PROFESSORA A

RESPEITO DA

FALA DAS CÇAS

NO ESPAÇO DA

SALA DE AULA

ENTENDIMENTO

DA “ESCUTA”

COMO

Page 169: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

168

RESPOSTA

15:00 - 15:20 VIDEO AMBIVALÊNCIA

S E

CONTRADIÇÕES

DOCENTES

PERGUNTAS

COM

RESPOSTAS

EMBUTIDAS

11 de setembro ADRIANE

15:20 - 16:00 DEBATE

16:00 - 16:10 IN- TER VA LO IN TER

16:10 - 17:30 AULA EXPOSITIVA

EGLÊ DIGITALIZAR

TEXTO

17:30 - 17:40 SÍNTESE Possibilidade de

organização didática

das principais

questões tratadas

(conteúdos e

dúvidas)

Sugiro que os

formadores

convoquem o grupo

a elencar as

principais questões

do dia organizando

no blocão uma lista

de "conteúdos"

trabalhados.

Blocão Coordenação Blocão

17:40 - 17:50 AVALIAÇÃO DO DIA

Momento de

comentar, sugerir e

criticar aspectos do

curso de forma propositiva.

A critério do formador e do grupo

Coordenação e formadores

17:50 - 18:00 APRESENTAÇÃO

DA AGENDA DO

DIA SEGUINTE

Encadeamento e

explicitação do

conteúdo a ser

trabalhado ao longo

do curso, pode

ajudar o aluno (neste

caso, o tutor) a se

colocar numa

posição enunciativa

responsiva frente ao

seu papel de

aprendiz.

Formulação livre de cada formador

Formadores

PROLETRAMENTO 2010 – LINGUAGEM

PLANEJAMENTO DETALHADO

4º dia manhã

HORÁRIO ATIVIDADE OBJETIVO PROCEDIMENTO RECURSO/MATE

RIAL

RESPONSÁVEL PROVIDÊNCIA

S

8:00 - 8:05 ACOLHIDA

8:05 - 8:20 LEITURA LITERÁRIA

Contato com

literatura infantil de

qualidade a fim de

conhecer e ampliar

as práticas de leitura no trabalho docente

Leitura em roda do livro

LIVRO: Caligrafia de dona Sofia

Coordenação e formadores

04 livros

BETH OK PPT

8:20 - 8:50 DINÂMICA DE

GRUPO

LEITURA/CONTE

XTO

Os tutores lerão o

texto

"DESCOBRIMENT

Os formadores Ler

Marlene

Page 170: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

169

LEITURA

LITERAL E

LEITURA LITERÁRIA

Cultural/histórica/vo

z do social

O DA AMÉRICA" e

VERÍSSIMO

“AUDÁCIA” para

discutir, no grupão,

uma concepção de

leitura que considere

diversos fatores para sua contextualização

8:50 - 9:55 AULA TEÓRICA:

Conceitos sobre LEITURA

QUADRO 03

Focalizar os

descritores, em

especial os de

LEITURA,

problematizando seu

lugar na construção

dos princípios

educacionais, com

destaque especial

para o lugar da

leitura na sociedade e na escola

2. Estabelecimento

de relação entre as

práticas sociais de

escrita e leitura e os

processos de

aquisição da leitura.

1. Escreva uma

definição para as

seguintes palavras:

DECODIFICAR -

COMPREENDER -

INTERPRETAR -

DECIFRAR -

INFERIR- RECITAR

2. Formar grupos

com as mesmas

palavras e definir

uma única significação

3. Apresentar no

grupão

Caderno do tutor Formador -----------

10:00 - 10:10 IN- -TER- -VA- -LO IN- -TER-

10:10-11-10 ATIVIDADE DE ESCRITA

Relação entre os

descritores e os

conceitos

trabalhados a partir

das experiências profissionais

NARRATIVAS

COMO

ESTRATÉGIA FORMADORA

A partir dos

descritores, escrever

narrativas DE

PROCESSOS

PEDAGÓGICOS

(BEM OU MAL

SUCEDIDOS)

sobre leitura no

mundo e leitura na

escola

Leitura de algumas

narrativas na grande roda

Caderno do tutor formador

11:10 - 11:50 AULA

EXPOSITIVA

Apresentação das

concepções de

leitura nos livros didáticos

Apresentação do ppt

sobre as concepções

de leitura nos livros

didáticos

MELHORAR

Ppt sobre leitura nos

livros didáticos

Cristina ok em

processo

04 CD com os ppt

das aulas

11:50 - 12:00 SÍNTESE Possibilidade de

organização didática

das principais

questões tratadas

(conteúdos e

dúvidas)

Sugiro que os

formadores

convoquem o grupo

a elencar as

principais questões

do dia organizando

no blocão uma lista

de "conteúdos"

trabalhados.

Blocão Coordenação Blocão

4º DIA tarde 13:30 as 18 hs

HORÁRIO ATIVIDADE OBJETIVO PROCEDIMENTO RECURSO/MATE

RIAL

RESPONSÁVEL PROVIDÊNCIA

S

13:30 - 13:40 ACOLHIDA

13:40 - 13:55 DINAMICA VIVENCIAR a

experiência de

leitura e escrita

Leitura em roda de

livros

PPT Coordenação 06 livros

Page 171: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

170

estrangeira para

perceber os vários

elementos que a compõem.

ESTRANGEIROS Mônica

13:55 - 14:20 RETOMADA DA

SÍNTESE DO DIA ANTERIOR

Ativação dos

conhecimentos

estudados nos dia anterior

Organização livre de

cada formador

-------- Formador --------

14:20 - 15:20 AULA TEÓRICA

COM FOCO NA

APROPRIAÇÃO

DO SISTEMA DE

ESCRITA

QUADRO 02

1. Focalizar os

descritores, em

especial os de

apropriação do

sistema de escrita,

problematizando seu

lugar na construção

dos princípios

educacionais, com

destaque especial

para os processos de

produção da língua e

suas formas de

aquisição do código

2. Estabelecimento

de relação entre as

práticas sociais de

escrita e leitura e os

processos de

apropriação do

sistema de escrita

1. apresentação do

Ppt DO dos

quadros sintéticos e

do ppt sobre a

CRÍTICA DA

escrita como um

sistema (texto da

lud)

2. Leitura dos textos

: da lud E

ENTREVISTA DA

Magda NA Revista guia da alfa

Ppt :

1. quadros sintéticos

2. A escrita como

um sistema (texto da lud)

Escritas de crianças

Mônica ok/Lud/

Coordenação

04 CD com o

quadros sintéticos

1. quadros sintéticos

2. A escrita como

um sistema (texto

da lud)s ppt das aulas

15:20 - 16:00 IN- -TER- -VA- -LO -IN- -TER-

16:00 - 17:40 Marcar uma

concepção de

alfabetização de um

ponto de vista

linguístico -

discursivo

Discussão mais ampla – macro

Concepção de alfa

Após o intervalo,

SEPARAR a turma

em dois grupos para a leitura dos textos

Destacar 03

questões focalizadas

sobre uma

concepção de

alfabetização para

compartilhar com o

grupo

17:40 - 17:50 SÍNTESE Possibilidade de

organização didática

das principais

questões tratadas

(conteúdos e

dúvidas)

Sugiro que os

formadores

convoquem o grupo

a elencar as

principais questões

do dia organizando

no blocão uma lista

de "conteúdos"

trabalhados.

Blocão Coordenação Blocão

17:50 - 18:00 AVALIAÇÃO Momento de

comentar, sugerir e

criticar aspectos do

curso de forma propositiva.

A critério do formador e do grupo

Coordenação e formadores

Page 172: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

171

PROLETRAMENTO 2010 – LINGUAGEM

PLANEJAMENTO DETALHADO

5º DIA MANHÃ

HORÁRIO ATIVIDADE OBJETIVO PROCEDIMENTO RECURSO/MATE

RIAL

RESPONSÁVEL PROVIDÊNCIA

S

8:00 – 9:00 Produção escrita Amarelinha Produzir cartões

para um jogo com

respostas à pergunta:

O que eu preciso

saber para ler e

escrever?

Criar uma

amarelinha não

necessariamente na

ordem canônica

(pares, proximidades associações etc)

Cartões coloridos

Sugiro usar as folhas coloridas avulsas

9:00-10:00 LEITURA

LITERÁRIA

Contato com

literatura infantil de

qualidade a fim de

conhecer e ampliar

as práticas de leitura no trabalho docente

Leitura em roda do

livro: "Minhas

férias, pula uma

linha, parágrafo, de

Cristiane Gribel

LIVRO: "Minhas

férias, pula uma

linha, parágrafo, de Cristiane Gribel

Coordenação e

formadores

04 livros "Minhas

férias, pula uma

linha, parágrafo,

de Cristiane

Gribel

DINÂMICA DE GRUPO

Discussão sobre

escrita na escola, o

gênero redação é um

gênero estritamente escolar

Dinâmica: o

professor se torna

professor da

história, corrige a

redação de

Guilherme

Os professores

apresentarão suas formas de correção

Beth

10:00 - 10:10 IN- -TER- -VA- -LO IN- -TER-

10:10 - 12:00 LEITURA

COMPARTILHADA

VIABILIZAR O

EXERCÍCIO DE

ESTUDO

COLETIVO

ENTRE OS

TUTORES COM

VISTAS À

HOMOLOGIA DE

PROCESSOS COM

OS PROFESSORES

EM SEUS

RESPECTIVOS

MUNICÍPIOS

Leitura do texto da

Leiva Leal, incluído na apostila

Textos e caderno do tutor

coordenação 01 por tutor

12:00 - 13:30 ALMOÇO

13:30 - 13:40 VIDEOS

DISCURSO DA

AFRICANA – A

HISTÓRIA ÚNICA

MARCADA PELO

APAGAMENTO

DA EXISTÊNCIA

Page 173: A formação dos formadores: um encontro com as práticas

172

DO OUTRO

13:40 - 13:55 SÍNTESE POSSIBILIDADE

DE SÍNTESE DOS

CONCEITOS DA SEMANA

COMO A ESCRITA

E A LEITURA

PODEM

CONTRIBUIR

PARA A

CONSTRUÇÃO

DO SEU LUGAR

DE TUTOR?

ESCRITA DA

ÚLTIMA PÁGINA

DESTE CAPÍTULO

DE FORMAÇÃO

CADERNO DO

TUTOR

13:55 - 14:20 AVALIAÇÃO AVALIAR A

FORMAÇÃO, O

FORMADOR, AS

CONDIÇÕES

MATERIAIS E

AUTOAVALIAÇÃ

O

AVALIAÇÃO FINAL FORMAL

14:20 - 17:00 CONFRATERNIZA

ÇÃO E

ENCERRAMENTO

E

Expressar

artisticamente a

experiência de

formação a fim de

avaliar o processo formativo

CONFRATERNIZA

ÇÃO e

ENCERRAMENTO

– ATIVIDADE CULTURAL