a escrita diarística de alejandra pizarnik e ana cristina cesar

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A ESCRITA DIARÍSTICA DE ALEJANDRA PIZARNIK E ANA CRISTINA CESAR Disponível em: http://oguari.blogspot.com.br/2012/11/a- escrita-diaristica-de-alejandra.html . Acesso em: 3 jun. 2015. Karine Bueno Costa (FAFIUV) “Quanto mais o homem fala de si, mais deixa de ser ele mesmo. Mas deixe que se esconda por trás de uma máscara e então ele contará uma verdade.” Oscar Wilde RESUMO: A partir da escrita diarística de Alejandra Pizarnik e de Ana Cristina Cesar propor-se-á uma análise sobre a reflexão do eu que se constrói sob o crivo da subjetividade, ou seja, sobre a imagem do eu - outro que se constrói na poesia. Perscrutar-se-á sobre o desejo das escritoras de se retratarem em seus textos poético a partir de uma escrita diarística, autobiográfica, pactuadas ao pronome eu e, sobre a tensão que se estabelece assim entre a arte e a vida. palavras chave:Alejandra Pizarnik, Ana Cristina César, Diários, Vida e Arte. RESUMEN: A aprtir de la escrita diarística de Alejandra Pizarnik y de Ana Cristina Cesar se propondrá una analice sobre la reflexión del yo que formase a cerca de la criba que es la subjetividad, o sea, sobre la imagen del yo- otro que se construye en la poesía. Analisaremos el deseo de las escritoras retrataren su personalidaden sus textos poéticos a partir de una escrita diarística, autobiográfica, pactadas al pronombre yo, y sobre la tensión que establece así entre la arte y la vida. palabras llave:Alejandra Pizarnik, Ana Cristina César, Diarios, Vida y Arte.

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Texto sobre a escrita íntima de Alejandra Pizarnik e Ana Cristina Cesar

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A ESCRITA DIARSTICA DE ALEJANDRA PIZARNIK E ANA CRISTINA CESAR

Disponvel em: http://oguari.blogspot.com.br/2012/11/a-escrita-diaristica-de-alejandra.html. Acesso em: 3 jun. 2015.Karine Bueno Costa(FAFIUV)

Quanto mais o homem fala de si, mais deixa de ser ele mesmo. Mas deixe que se esconda por trs de uma mscara e ento ele contar uma verdade.

Oscar Wilde

RESUMO:A partir da escrita diarstica de Alejandra Pizarnik e de Ana Cristina Cesar propor-se- uma anlise sobre a reflexo do eu que se constri sob o crivo da subjetividade, ou seja, sobre a imagem do eu - outro que se constri na poesia. Perscrutar-se- sobre o desejo das escritoras de se retratarem em seus textos potico a partir de uma escrita diarstica, autobiogrfica, pactuadas ao pronome eu e, sobre a tenso que se estabelece assim entre a arte e a vida.palavras chave:Alejandra Pizarnik, Ana Cristina Csar, Dirios, Vida e Arte.

RESUMEN: A aprtir de la escrita diarstica de Alejandra Pizarniky de Ana Cristina Cesar se propondr una analice sobre la reflexin del yo que formase a cerca de la criba que es la subjetividad, o sea, sobre la imagen del yo- otro que se construye en la poesa. Analisaremos el deseo de las escritoras retrataren su personalidaden sus textos poticos a partir de una escrita diarstica, autobiogrfica, pactadas al pronombre yo, y sobre la tensin que establece as entre la arte y la vida.palabras llave:Alejandra Pizarnik, Ana Cristina Csar, Diarios, Vida y Arte.

Dirio. Prtica de escrita pessoal que abarca relatos do dia-a-dia de um indivduo, extremamente subjetiva e oculta. Mas poder esta escrita estar ligada literatura e ultrapassar os limites entre vida e arte? essa questo que se buscar responder no decorrer do presente artigo, pelo vis das escritas diarstica de Alejandra Pizarnik e Ana Cristina Cesar.

Jovem, inteligente. Poeta de literatura forte, ertica e sangunea, com aluses morte, com questionamentos sobre o eu, com escrita autobiogrfica, suicdio aos trinta e poucos anos. Descrio esta que no se distingue entre Alejandra Pizarnik e Ana Cristina Cesar.

A primeira, escritora argentina, inserida na poesia dos anos 60, possui uma escrita forte e influente. Nasceu em Buenos Aires, formada em Filosofia e Letras pela Universidade de Buenos Aires. Em Paris estudou literatura francesa e colaborou com tradues como de Artaud. Publicou vrias obras e como muitos de sua gerao levou a relao entre arte e vida ao extremo, o que ocasionou sua morte, envolvida pelas garras da depresso.

A segunda Ana Cristina Cesar, poeta carioca, que se enquadra na gerao mimegrafo dos anos 70, cujos poetas estavam margem das grandes editoras e por isso cunhavam seus livros artesanalmente. Formada em Letras, pela PUC do Rio de Janeiro.Mestre em Comunicao pela UFRJ e mestre em Teoria e Prtica de Traduo Literria, na Universidade de Essex, na Inglaterra. Depois da segunda edio deA teus psa poeta suicida-se, saltando da janela do apartamento de seus pais no Rio de Janeiro.

As duas esto ligadas pelo elo de refletirem a tenso existente entre arte e vida e por terem os gneros ntimos como a base de seu projeto potico. O dirio, por exemplo, faz parte de suas construes literrias.

A prtica de escrever dirios muito antiga e sempre esteve ligada tentativa de auxiliar a memria a reter nos signos o que eventualmente esquecer-se-ia. Tambm, ao desejo insacivel, de pura condio humana, de relatar a subjetividade, de expressar sentimentos e confessar segredos ntimos que s revelam-se aos melhores amigos em pacto de morte. Na escrita das poetas que nos deteremos, essa prtica textual desenvolvida como mago de um projeto potico, calcada no campo ilusrio que o da literatura. As duas adotam a escrita diarstica como forma de expresso do conflito interno e dilemtico que se constri quando a prpria identidade posta em xeque.

Um dos textos basilares sobre a questo do dirio de Maurice Blanchot, O dirio ntimo e a narrativa,inserido na obraO livro por vir.Nesse ensaio, o francs (2005) diz que o dirio ntimo que parece to livre de formas, to dcil aos movimentos da vida e capaz de todas as liberdades, submetido a uma clusula, leve, porm perigosa: o pacto que se assina o de respeitar o calendrio, este o que controla os dias da existncia, e definido pelo terico como o demnio dessa prtica: O calendrio o seu demnio, o inspirador, o compositor, o provocador e o vigilante (2005, p. 270). Estabelece-se assim, um pacto diablico com os dias, selado com a verdade. A verdade a exigncia a ser atingida sem ser ultrapassada, para conseguir tal proeza, preciso a sinceridade na escrita. Para atingi-la convm ser superficial, para Blanchot, essa uma grande virtude, porm, que exige coragem (2005). Sem dvidas, escrever na tentativa de no faltar com a verdade no apenas exige coragem, como entra no campo de uma impossibilidade at.

A partir dessas reflexes questionamo-nos se no seria esse tentar atingir o relato verdadeiro, de narrar o mundo, de conseguir prend-lo na escrita tal qual faz uma narrativa ficcional, uma espcie de escrita ilusria tambm? Pois por ser tal qual uma narrativa, no seria tambm uma construo imaginria j que todo imaginrio est, de alguma forma, ligado ao mundo real?

Esse um dos pontos cruciais para os questionamentos a cerca da escrita diarstica de Alejandra Pizarnik e Ana Cristina. Escrever sobre um fato ocorrido uma forma de tentar eterniz-lo, algo possvel apenas no texto imaginrio, ou seja, na literatura. Apenas o literrio perpassa o tempo, vendo-se aqui o texto histrico tambm como uma representao literria, pois por mais que parta de um fato real narrado por um historiador que parte de seu ponto de vista, ou seja, criando iluses tambm por se tratar de uma subjetivao, tema abordado por Hayden White, emMetahistria, mas que no interessa de todo ao nosso estudo, apenas como apontamento para notarmos a concepo que o real pode adquirir ao tornar-se linguagem.

Voltando-se para a questo do dirio, Blanchot explora a ideia de que tentar eternizar um fato um dos vrios motivos que faz com que o dirio seja uma espcie de salvao: (...) a ambio de eternizar os belos momentos e mesmo de fazer da vida toda um bloco slido que se pode abraar com firmeza, (...) elevar a vida nula bela surpresa da arte, e a arte informe verdade nica da vida, o entrelaamento de todos esses motivos faz do dirio empresa de salvao (BLANCHOT, 2005, p. 274). Mas o que realmente deseja-se salvar? O que se viveu ou o que resta na imaginao desse vivido? Para o terico:

Escreve-se para salvar a escrita, para salvar sua vida pela escrita, para salvar seu pequeno eu (as deformaes que se tiram contra os outros, as maldades que se destilam) ou para salvar seu grande eu, dando-lhe um pouco de ar, e ento se escreve para no se perder na pobreza dos dias ou, como Virginia Woolf, como Delacroix, para no se perder naquela prova que a arte, que a exigncia sem limite da arte (BLANCHOT, 2005, p. 274).

Por esse ltimo motivo apontado entra tambm a escrita da escritora argentina, Alejandra Pizarnik e da carioca, Ana Cristina Cesar, escreve-se sobre o eu para no se perder na arte, para tornar-se arte. Escrevem para no se perderem nessa pobreza dos dias, para aliviar a solido:

He pensado en mi soledad absoluta, () He pensando que estoy sola y que me sustento solo en mi para sobrellevar mi vida y mi muerte. Pensar que ningn ser me necesita, que ningn me requiere para completar su vida(PIZARNIK, 2005, p.107)[1].

O dirio desempenha o papel de companheiro. E por fim, escrevem para no se perderem na exigncia sem limite da arte da qual nos fala Blanchot. O dirio para as poetas o recipiente que abarca a vida e a escrita. E por isso capaz de eterniz-las na linguagem, porm, por ser literatura no passa de uma armadilha, uma tentativa, uma construo.

A escrita de dirios para o terico francs vista sob a tica de que realmente no passa de uma armadilha, portanto, por mais que a vida seja relatada no intuito de captar e salvar os dias, no futuro, o prprio escritor do dirio ter em sua leitura do passado fatos ilusrios, sua escrita o trai, sua linguagem o apunha-la. Existe apenas a iluso de dias vividos: Escrevemos para salvar os dias, mas confiamos sua salvao escrita, que altera o dia (BLANCHOT, 2005, p. 275). Ao tornar-se linguagem o que era a vida real torna-se uma vida imaginria. O visvel torna-se invisvel ao ser dado como literatura.

Em depoimento Beatriz Rezende no curso Literatura de mulheres no Brasil, ministrado em 06 de abril de 1983, incluso posteriormente emCritica e Traduo,Ana Cristina aborda a questo do dirio em sua escrita, pois alm deAntigos e soltosconter escritos que remetem ao dirio, muitos de seus poemas so escritos na forma de dirio ou que colocam em xeque essa escrita. Diz ela: Eu acho que exatamente esse tipo... essa armadilha que estou propondo. (...) Aqui no dirio mesmo, de verdade, no meu dirio. Aqui fingido, inventado, certo? No so realmente fatos da minha vida. uma construo (1999b,p.259). Portanto, ao fazer poesia Ana Cristina constri uma realidade, pois sabe da impossibilidade de express-la: Se voc contar a tua histria pessoal e virar literatura, no mais a tua histria pessoal, j mudou (1999b, p.262). Ento, ao se tratar de literatura:escribir undiario como un relato de vida est prcticamente ausente(PIZARNIK, 2005, p. 10)[2].

O que se obtm, finalmente, do processo da escrita de si para seu querido amigo, de acordo ainda com o autor deO livro por vir,em sntese, que, no se viveu o que est escrito, e nesse ponto que o dirio encontra sua maior tenso e gravidade (BLANCHOT, 2005, p. 275). No dirio esto presentes os traos de algum que escreve sobre si para si mesmo, mas o escritor no consegue retratar sua subjetividade nas palavras, no o escritor que est sendo construdo e sim a imagem de outro.Je est un autre, j nos dizia Rimbaud, portanto, o eu torna-se um outro na escrita do dirio.Porm est submetido a um paradoxo, o qual desafiado por Pizarnik e Ana C., pois esse outro s existe se for antes um eu e partir de sua existncia. Algo desse algum que escreve permanecer na escrita, e dentro desta possibilidade que entra a escrita diarstica das duas poetas.

Por se tratar de literatura, a escrita das poetas possuem o desejo de um interlocutor, mesmo que oculto, pois praticamente inaceitvel que algum faa arte apenas para ser apreciada por si mesmo. Doravante, mesmo que no possua um leitor virtual, ou que no se deseje um leitor, o autor de um dirio v o prprio objeto de escrita como um outro, como um confidente a quem relata sua vida. Contudo, nada impede ainda, que o dirio possa ter um leitor real. Este ao deparar-se com a escrita diarstica acabar nas malhas de um texto autobiogrfico, consequentemente, ler na busca de segredos ntimos, de tentar descobrir o eu do escritor. E nesse desejo do outro que esto os questionamentos realizados pelas poetas, a partir do jogo biogrfico, ou melhor, da autobiografia.

Para fomentar essa ideia de autobiografia um estudo notrio o de Phillipe Lejeune,O pacto autobiogrfico, publicado em 1975. Nesse livro, o francs diz que a autobiografia e os escritos de um eu tm como tema comum contar a vida de algum. (2008). Para o terico, a autobiografia definida como: narrativa retrospectiva em prosa que uma pessoa real faz de sua prpria existncia, quando focaliza sua histria individual, em particular a histria de sua personalidade (2008, p. 14). Nas poesias de Alejandra Pizarnik e Ana Cristina Cesar o eu conclamado a todo o momento. No pensar, portanto, essa questo autobiogrfica na leitura da escrita de ambas impossvel, pois se encontra subjacente pergunta: Quem sou eu?

A escrita desenvolve-se na tentativa de registrar a vivencia de quem escreve, de torn-la literatura, mas esse eu que escreve torna-se, por assim dizer, um eu de papel, para nos utilizarmos das palavras de Barthes em seu artigoDa obra ao texto(2004). Esse eu no mais o eu real, porm sim, um eu que se constri a partir deste. Por isso o questionamento de quem afinal sou eu: O eu que escreve ou o que a literatura constri? Ou ainda: Ambos no seriam um s?

Lejeune prope o que ele chama de pacto autobiogrfico, para dar conta dessa questo, que seria: a afirmao, no texto, dessa identidade, remetendo, em ltima instncia, ao nome do autor, escrito na capa do livro (2008, p. 26). O pacto estabelecido no momento em que o nome do escritor inserido na obra, como ser real. Tanto Ana C. como Pizarnik colocam em suas poesias seus nomes de fato, ou s vezes criam personagens, que acabam referindo-se prpria imagem autoral. O estudioso distingue dois casos para essa questo, o primeiro do pacto, que se refere ao nome do prprio escritor no texto literrio, e o segundo o pacto autobiogrfico, que subjaz em torno dos dados biogrficos do leitor, s suas confisses (2008). Em sntese, o que define a autobiografia que: para quem a l , antes de tudo, um contrato de identidade que selado pelo nome prprio (2008, p. 33). No entanto, a construo de uma identidade do ser que se define na escrita vai muito mais alm e muito mais problemtica do que parece ser, o prprio Lejeune assume o conflito que existe nesse campo em que se arriscou a teorizar. Analisando tudo o que escreveu emPacto autobiogrficochega a uma concluso modesta: Errei- mas como tive razo de errar! Talvez a autocrtica, tal como a autobiografia, seja um empreendimento impossvel... (2008, p. 69).

A autobiografia tida como uma impossibilidade, embora afirmada num talvez. O problema torna-se, assim, maior ainda. Contudo, fato que por mais que se trate de um eu factual ao torna-se escrita ou literatura ser um outro na viso de outro, uma imagem construda a partir da viso de mundo de seu leitor. No caso do dirio, o leitor percorre as pginas na busca de desvendar segredos do escritor, e sempre acaba construindo um mito para a imagem autoral.

Uma excelente observao feita por Blanchot que: o dirio est ligado estranha convico de que podemos nos observar e que devemos nos conhecer (2005, p.275). Talvez por isso, existam tantos escritos voltados para o eu do escritor, voltados para a vida em sua essncia real, como por exemplo, os textos confessionais de Santo Agostinho, as incrveis cartas de Kafka, alguns textos de Borges, como Borges e eu, bem como o autor que assinalou a prpria morte e depois a ressuscitou emRoland Barthes por Roland Barthes. Enfim, so muitos escritos a partir do eu escritural. E essa uma questo cada vez mais levantada no sculo XXI, pois no mundo miditico, nas redes sociais dainternet,o ponto crucial est literalmente nessa construo do eu e de relatos autobiogrficos. Quem sou eu cada vez mais disseminado nas redes, o que acaba sendo uma tentativa de construir uma imagem de si para o outro. Uma construo, por sua vez, mundana, mas que serve de bom exemplo para analisar a tentativa de construir-se a partir das palavras. Na viso de Kingler (2007), dentro da histria de si no contexto latino-americano a produo mais recente afasta-se da tradio do depoimento: aparece como indagao de um eu, que, a princpio, parece ligado ao narcisismo miditico contemporneo. (...), portanto todo relato autobiogrfico remete a um para alm de si mesmo (2007, p. 25). Por esse prisma enquadra-se a arte potica das autoras Alejandra Pizarnik e Ana Cristina Cesar. A escrita do eu tange o espao literrio, o dirio na escrita de ambas tem um forte cunho enigmtico, pois no tido como um mero campo de desabafo sentimental e de relatos de experincias cotidianas, pelo contrrio, os escritos esto calcados em suas funes quanto escritoras e sobre o que so a partir da literatura, com reflexes e indagaes sobre este eu e sobre a identidade construda a partir das palavras. Em sntese, a escrita questionamento do ser que vive pela literatura, e morre tambm por esta arte.

O escritor de um dirio sempre acaba construindo a imagem de um eu e torna-se observador dessa imagem. Metaforicamente, um ato simplesmente narcsico: o escritor observa-se e deseja-se conhecer, atitudes que fogem eternamente de seu alcance, como a imagem refletida sobre a gua. No caso de Narciso, ele morre para atingir sua imagem fictcia, no caso de Alejandra Pizarnik e Ana Cristina Cesar, a morte tambm no diferente.

O que fica depois da morte de um escritor sua obra, tudo o que no foi publicado vem tona, ainda mais quando se trata de suicidas. De alguma forma vedado o direito de morte ao que no era destinado publicao. Temos ento,Diriode Alejandra Pizarnik, publicado em 2005, por Ana Becciu eAntigos e soltosde Ana Cristina Cesar, pelo Instituto Moreira Sales e organizado por Viviana Bosi.

A obraDirioscontm relatos, reflexes e anotaes sobre a literatura, sobre a identidade autoral. Os escritos so sobre o que Pizarnik l da outra que ela mesma, nele ela faz analises sobre esse eu-outro que se constri nas palavras:Hablar de si en un libro es transformarse en palabras, en lenguaje.Decir yo es anonadarse, volverse un pronombre, algo que esta fuera de mi(PIZARNIK, 2005, p.344)[3]. Com esse relato evidencia-se que a poeta percebe a existncia de uma fronteira entre vida e literatura, o eu torna-se outro. Por mais que se retrate, que se produza na base da autobiografia, ser, por ser linguagem, uma impossibilidade estar nas palavras. O desejo de estar nas palavras fracassa, impossvel fazer de si um personagem literrio:[] por querer hacer de mi un personaje literario en la vida real fracaso en mi deseo de hacer literatura con mi vida real pues esta no existe: es literatura(PIZARNIK, 2005, p. 200)[4].Mas ao afirmar que sua vida real no existe pois literatura, fica evidente que a poeta vive e se afirma apenas na literatura, o que revela que querendo ou no a vida da poeta est nas palavras, vida literria.

Questionamentos semelhantes encontramos emAntigos e Soltosde Ana Cristina Cesar, neste caso no se trata de dirio propriamente. Este livro contm escritos dos mais variados, que foram encontrados dentro de uma pasta rosa, so muitos manuscritos, primeiras, ou vrias, verses de um mesmo poema, poemas inacabados, falas subjetivas, dirios de viagem tanto em portugus como em ingls e muitas anotaes. Como Alejandra Pizarnik, as reflexes subjetivas permeiam o arquivo, um textos mais impressionantes e que resume praticamente todos os nossos apontamentos, at ento, uma prosa potica intitulada Pequeno raciocnio fantstico ou delrio terico da baronesa, no livro h trs verses para o texto, a primeira que se apresenta a que no possui nenhuma rasura, o que nos leva crer ser esta a ltima verso, segue o incio: Mas verdade, eu vivo e escuto do que vivo ao mesmo tempo. (...) Tudo me leva a crer que se trata do Texto Perfeito da minha prpria vida, da biografia ideal, que se produz como texto simultaneamente vida (2008, p. 171).O eu - outro torna-se apenas um ser: o que grafa e o que grafado.Tudo leva a crer nisso, pois percebe que seu segredo :

(...) ter encontrado a perfeita harmonia entre as palavras que se pensam (a grafia da vida) e a realidade sem palavras (a prpria vida que me vive). Percebo que sou eu que sou grafada, sou eu tambm que escuto em surdina o velho discurso que me grafa. E finalmente vislumbro maravilhada que sou eu que escrevo, agora, aqui neste cais (...). Percebo que o segredo que, ao dizer eu, este texto realiza a conjuno entre o real (esta minha vida ou quem a viva), o simblico (este discurso ou pronome que aqui deliro) e o enigmtico (este ouvir constante da minha prpria biografia) (CESAR, 2008, p.271- 273).

Essa glosa de reflexes est diretamente ligada s relaes entre texto e vida e tanto Ana C. como Pizarnik possuem uma escrita com base nesse desejo de conjuno entre real (vida do escritor), simblico (pronome eu) e o enigmtico (a biografia inserida na escrita), pois a partir disso possvel tornarem-se uma personalidade literria. Jorge Luiz Borges em seu texto Borges e eu reflete justamente sobre essa questo: Ao outro, a Borges, que sucedem as coisas. (...) seria exagerado afirmar que nossa relao hostil; eu vivo, eu me deixo viver, para que Borges possa tramar sua literatura, e essa literatura me justifica (1999, p.206). Se e no ao mesmo tempo, a arte justifica a vida e vice versa: eu estou destinado a perder-me, definitivamente, e s um instante de mim poder sobreviver no outro. Pouco a pouco vou cedendo-lhe tudo, embora conhea seu perverso costume de falsear e magnificar (1999, p. 206). O escritor se doa para a literatura.

Ana C. e Pizarnik levam ao extremo essa relao, at confundirem-se totalmente com a arte. Porm, na arte a vida no pode ser expressa realmente, a construo de um paradoxo, uma irreal realidade: !Cuantas cosas pierdo! !Cuantas sensaciones [] Todo por vivir menos, en esta, mi dolorosa e irreal realidad! (PIZARNIK, 2005, p. 18)[5].No h como colocar a subjetividade na escrita, viver a realidade no texto literrio. Agamben nos diz emProfanaesque: O autor marca o ponto em que uma vida foi jogada na obra. Jogada, no expressa, no realizada. Por isso, o autor nada pode fazer alm de continuar, na obra, no realizado e no dito. (AGAMBEN, 2007, p. 61). A imagem que se projeta na obra no sente as emoes vivenciadas pelo eu real, mas, no entanto, esta imagem que perpetuar a imagem do escritor que escreve sobre si. Borges diz que ele (Borges real) permanecer no Borges e no em si, ou seja, o que o faz ser eteno a literatura, porm, reconhece-se menos no Borges do que em um laborioso rasqueado de guitarra (1999). O mesmo acontece com as poetas que analisamos, Alejandra e Ana C. que esto sendo construdas, no entanto, no passam de representaes: mscara sobre o rosto.

Borges conclui seu texto dizendo: Assim minha vida uma fuga e tudo eu perco e tudo do esquecimento, ou do outro. No sei qual dos dois escreve esta pgina (1999, p. 206). Para no se perderem e no serem do esquecimento as poetas, carioca e argentina, registram seu eu, entra ento a questo do dirio, objeto para o registro do vivido, do real. Contudo, ao adentrar na literatura tudo passa a ser do outro e construdo pelo outro da mesma maneira, mesmo sendo confidentes, subjetivas, a escrita do eu ao torna-se literatura desconstri o eu real, se que este existiu.Beatriz Ferrs Antn em sua tese de doutoradoSujeto, cuerpo y lenguaje: los dirios de Alejandra Pizarnik, defendida em 2007, pela Universidade Autnoma de Barcelona, diz que havia na escrita de Alejandra:una voluntad clara de descubrimiento del yo, de desnudarlo y mostrar en carne viva suesencia.Fragmentos como el que sigue, de 1955, funcionarn a este nivel, al representar un enfrentamiento de la escritora consigo misma a travs del cual dejar caer la mscara que la aprisiona(ANTN, 2007, p. 44)[6].A citao que a estudiosa refere-se a seguinte:

Alejandra: tienes cuarenta das de angustia inconfesable. Cuarenta das de soledad ahogada, sin probabilidades de confesarla. Sin un rostro amado a quien quejarse de la desgracia que se prende a tu destino. Alejandra: ese rostro amado es uno solo y se ha ido. Es como si te hubiesen arrancado todo. Es como si te hundiesen en la fra suma de los das para que en ellos te aturdas tratando de olvidar su ausencia. Alejandra: has de luchar terriblemente. Has de luchar t y este cuadernillo. Han de luchar ambos, pues los ojos del amado rostro dicen que quizs no est todo perdido. Quizs haya an algo por salvar! Qu? Preguntas! Tu alma, Alejandra, tu alma!(1955, p. 32,apudANTN, 2007, p. 44)[7].

A escritora volta-se para sua imagem, estranha convico de observar-se que nos diz Blanchot. Alejandra fala para si, questionando sobre esta outra que ela mesma, paradoxo impossvel de ser desfeito, mas nem tudo est perdido, pois h a luta de Alejandra e de seu caderninho: seu dirio, para permanecer eternamente nas palavras, ou pelo menos sua alma perpetuar, literariamente claro. Chama por ela mesma, expondo sua angustia, deseja exprimi-la, quer colocar no papel seus quarenta dias de angstia inconfessvel, mas por mais que tente exprimi-los, foge-se eternamente a realidade. Porm, a frustrao dessa impossibilidade visvel, pois este rosto (amado) que se constri um s, e deve lutar para comprovar isso, e conforta-se com a ideia de que talvez haja algo ainda por salvar: a alma. Ou seja, o intocvel e inatingvel. Um rosto sem imagem por baixo da mscara.

Ana Cristina tambm faz semelhantes interrogaes a sua outra, num rascunho da pasta rosa, uma espcie de carta, destinada a ela mesma, que como epgrafe leva: O juzo final/ comea em mim/ nos lindes da minha vida. Poema de Murilo Mendes. Abaixo do poema segue uma anotao dizendo: texto de consulta, Convergncia em Sintaxe. E inicia a potica com o vocativo:

Ana,Ana? Sei teu nome. Sei teu nome? Se no sei, soube um dia, personalizei os fonemas comigo confundidos, fiz-te persona. Como o velho palhao face s suas tintas: to dele que mesmo sobre a mesa so carne e rosto: o nome. (...) nunca te conheo, eu sou o teu nome: um dia soube. Eu existo pelo nome que te dei. E reinvento-me reexisto-me te esquecendo. Me (te) chamam, eu finjo, esqueo, lembro: o julgamento acontecendo todos os dias, abstraindo o concreto e concretizando o abstrato, o nome contra o pro-nome, pelo pronome. Antes te ensinavam aos meus sentidos: hoje meus sentidos te incorporam. Annima, no sou duas, apenas perco os sons que me definem. Carta: morte.Assino. Assino: nome (2008, p.156).

O desejo de conhecer-se, de revelar-se nesta outra evidente na escrita das duas poetas, a subjetividade acaba perdendo-se e sendo impossvel concretiz-la nas palavras: no estou conseguindo expressar a minha ternura, minha ternura entende?(CESAR, 1999a, p.120).Ou como diz Alejandra:Cuento con una carencia casi absoluta de recursos internos, a pesar de tener dentro de mi un mundo tan vasto, pero es un mundo dependiente de mi, divorciado de mi yo ()(PIZARNIK, 2005, p. 106)[8].O que deseja expressar, o que ambas sentem realmente no se separa do ser que o viveu, mas ao tornar-se palavras o sentimento revelado outro.

Ao ler a escrita de si, reconhece-se e no ao mesmo tempo, pois o sentimento real do poeta no cabe na literatura. Na carta-poema de Ana C. encontra-se uma excelente afirmao de que se est abstraindo o concreto e concretizando o abstrato. Por esse prisma, no h duas, trata-se de apenas uma, mas que se torna duas, a que escreveu e outra que escrita desta mesma, impossvel achar o som que a defina como una.

O autobiogrfico no texto potico ento um pacto, uma tentativa de aproximao com o leitor, tema j abordado na viso de Lejeune. Heloisa Buarque de Hollanda, em depoimento para Ana Cludia Viegas, anexo em seu livro,Bliss e Blue: segredos de Ana C., comenta a respeito desse pacto desejado na obra de Ana Cristina:

Esse segredo em termos de pacto, um pacto que ela fazia com o leitor, um pacto que ela fazia com o autor, um pacto que ela fazia com o tradutor, ela vivia de pactos. Um pacto que eu estou falando, no sentido de ser... um segredo. Quando voc faz um pacto, o pacto um segredo seu, uma coisa irracional, um pacto de morte. Voc faz um pacto, um compromisso cego; no um acordo, diferente. Isso o que ela faz com o leitor. Se voc est a fim de fazer acordo, vai ler outra pessoa. Se voc no fizer um pacto com ela, no serve. Acordo ela no faz (HOLLANDA,apudVIEGAS, 1998, p.131-132).

Em muitos poemas deA teus ps,livro de poesia de Ana C.est claro que a poeta no tem a inteno de construir um dirio ntimo. Porm, o efeito que o dirio provoca no leitor desperta desejo, e assim, quem l em busca de desvendar segredos do escritor cai na armadilha literria. Ana utiliza-se do gnero narrativo do dirio ntimo para tentar atingir na linguagem a corporalidade do poeta, o mesmo faz Pizarnik. O dirio no propriamente um dirio, pois no fiel ao gnero. E sendo assim, ao ser escrito no campo da linguagem literria deseja-se secretamente que o leiam. A sinceridade teatralizao. Ana Cristina aborda perfeitamente essa questo num pequeno poema deInditos e dispersos,publicado postumamente, organizado por Armando Freitas Filho. Segue o poema:

DO DIRIO no dirio:Forma sem normaDefesa cotidianaContedo tudoAbranges uma ana

(CESAR,1985, p. 36).

Nota-se que dirio, mas logo a afirmao de que no o . O qual uma defesa cotidiana, a proteo dos dias, a salvao do vivido que nos diz Blanchot. E em contedo tudo, o que sonoricamente tem-se contendo tudo. Tudo abrange uma ana, com letra minscula, portanto, ana apenas um objeto da poesia, porm, h um jogo implcito na linguagem, em uma ana, sonoricamente novamente ouve-se humana, agora portanto, foge da ideia de objeto. Humano s pode ser de carne e osso. Literalmente o que lemos na citao acima: abstraindo o concreto e concretizando o abstrato. Assim, o dirio a forma de fazer um convite ao leitor para invadir a intimidade do eu lrico. Algo que no acontece, pois o dirio no passa de uma ttica sedutora. No entanto, o desejo pela intimidade autoral latente, deseja-se apoderar-se da vida daquele que escreve. Sendo assim, Ana C. joga com seu leitor. Pode-se constatar essa afirmao no fragmento abaixo, retirado do final do poema-prosa dia 16 de outubro de 1983,do livroIndito e Disperso:

(...) Lembra que dirio era alimento cotidiano? Que importa a m fama depois que estamos Mortos? Importa tanto que abri a lata de lixo: quero outro testemunho. Dirio no tem graa, mas esquenta, pega-se de novo a caneta abandonada, e o interlocutor fundamental. Escrevo para voc sim.Da cama do hospital. A lesma quando passa deixa um rastro prateado. Leiam se forem capazes (1985, p.198). (Grifos da autora).

Poema datado, como se fosse um dirio, contudo, trata-se de uma reflexo a cerca sobre o mesmo. Alis, vrios poemas de Ana C. so datados,mas no seguem uma ordem cronolgica, nota-se ento, que o dirio tem funo meramente potica e no de relatar sentimentos e frustraes vividas. O dirio serve para reflexo da identidade, deste nome que se constri na escrita provindo do real. A escrita do dirio torna-se, portanto,uma espcie de garantia prpria identidade, existncia.

Esse eu do dirio um eu que partiu do real. Mas pergunta-se: Sendo linguagem, esse eu no seria autoficcional, uma construo, um fingimento? Ainda mais quando o dirio de escritores de literatura? Pensar, por este vis,chega-se a ideia de Fernando pessoa, do poeta como um fingidor, que cria dores, finge que sente. Ou seja, a folha de dirio das poetas pode apenas tratar-se de um palco, onde o poeta encena, arma e engana por trs de uma mscara.

Portanto, o dirio um artifcio sobreposto diante da face escritural: uma mscara. Mscara que pretende revelar o que est por trs, atravs da persuaso, ou melhor, da seduo. Guiando o leitor como Ariadne com seu fio, porm, num processo mais lento e quase imperceptvel: o rastro prateado da lesma. Interlocutor fundamental mesmo a escrita diarstica estar ligada ao segredo, no desejar um escritor. No caso da escrita de Ana Cristina e de Alejandra o pessoal no secreto, no poema Jornal ntimo de na C. relata-se: Binder diz que o dirio um artifcio, que no sou sincera porque desejo secretamente que o leiam (CESAR, 1998: 109). artifcio, arte (fcio), no real e sim, um jogo literrio. Por isso o desafio: leiam se forem capazes, pois a mscara muitas vezes confunde-se com a face da poeta, que por sua vez torna-se nula por ser inserida na literatura.Alejandra Pizarnik tambm centraliza nesta tenso,na reflexo das relaes que se estabelecem entre arte e vida emDiarios: Qutatela mscara.Y detrs o debajo hubo una ausencia de cara. (PIZARNIK, 2005, p. 297)[9].Dessa forma, o autobiogrfico permeia todo o projeto potico, inseparvel da escrita para ultrapassar os limites entre arte e vida centralizando no pronome eu.

Constata-se assim, que o poeta, construtor de mentiras, expulso da republica platnica, sempre insistir em permanecer. Este fabricador de simulacros deixa de ser intil ao imitar a vida, portanto insiste em marcar presena. Em suma, se lermos a escrita diarstica de Alejandra Pizarnik e Ana Cristina Cesar em busca de descobrir segredos autobiogrficos, de descobrir a intimidade das escritoras encontrar-se- apenas literatura, porm, se formos ler apenas como obra literria encontrar-se- a vida tambm. Sendo assim, vida e arte so inseparveis no projeto potico de ambas. Trata-se de uma fuso enigmtica. Uma depende da outra. J no se sabe qual das duas escreve.

REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS AGAMBEN, G.Profanaes.Trad. Selvino Jos Assmann. So Paulo: Boitempo, 2007.ANTN, B. F.Sujeto, cuerpo y lenguaje:los diarios de Alejandra Pizarnik. 2007. Dissertaode DoutoradoPrograma de estudosPs-graduados emTeora de la Literatura y Literatura Comparada, Universidad Autnoma de Barcelona.BARTHES, R. Da obra ao texto.In. ______.O rumor da lngua. Trad. Mrio Laranjeira. 2 Ed. So Paulo: Martins Fontes, 2004.BLANCHOT, M.O Livro por vir. Trad. Leila Perrone- Moiss. So Paulo: Martins Fontes, 2005.BORGES, J. L. O Fazedor. In ______.Obras Completas de Jorge Luiz Borges, vol. 2. So Paulo: Globo, 1999.CESAR, A. C.Antigos e soltos:poemas e prosas da pasta rosa. So Paulo: Instituto Moreira Sales, 2008.______.A teus ps. So Paulo: tica, 1999a.______.Critica e traduo. So Paulo: 1999b.______.Inditos e dispersos. So Paulo: Brasiliense S. A., 1985.KLINGER, D.Escritas de si, escrita do outro:o retorno do autor e a virada etnogrfica. Rio de Janeiro: 7Letras, 2007.LEJEUNE, P.O pacto autobiogrfico:de Rousseau internet. Trad. Jovita Maria Gerhein Noronha, Maria Ins Coimbra Guedes. Belo Horizonte: UFMG, 2008.PIZARNIK, A.Diarios.Ana Becciu (ed.). Barcelona: Lumen,2005.VIEGAS, A. C.Bliss e Blue:segredos de Ana C. So Paulo: Annablume, 1998.

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[1]Pensei em minha solido absoluta, () Pensei que estou s e que me sustento somente em mim para sobre-elevar minha vida e minha morte. Pensar que nenhum ser me necessita, que ningum me quer para completar sua vida (PIZARNIK, 2005, p. 107).[2]Escrever um dirio como relato de vida est praticamente ausente (PIZARNIK, 2005, p.10).[3]Falar de si em um livro transformar-se em palavras, em linguagem. Dizer eu aniquilar-se, restituir-se em um pronome, algo que est fora de mim (PIZARNIK, 2005, p.344).[4][] por querer fazer de mim uma personagem literria na vida real fracasso e em meu desejo de fazer literatura com minha vida real, pois esta no existe: literatura (PIZARNIK, 2005, p.200).[5]Quantas coisas perco! Quantas sensaes [] Tudo por viver menos, nesta, minha dolorosa e irreal realidade! (PIZARNIK, 2005, p. 18).[6]Havia uma vontade de descobrimento do eu, de desnud-lo e mostrar em carne viva sua essncia. Fragmentos como o que segue, de 1955, funcionaram a este nvel, ao representar um enfrentamento da escritora consigo mesma atravs do qual deixa cair a mscara que a aprisiona(ANTN, 2007, p. 44.).[7]Alejandra: tem quarenta dias de angstia inconfessvel. Quarenta dias de saudade sufocada, sem probabilidades de confess-la. Sem um rosto amado a quem queixar-se da desgraa que se prende teu destino. Alejandra: esse rosto amado um s e se h ido. como se houvessem te arrancado tudo. como se te afundassem na fria soma dos dias para que neles atordoe-te tratando de esquecer sua ausncia. Alejandra: h de lutar terrivelmente. H de lutar tu e este caderninho. Ho de lutar ambos, pois os olhos do amado rosto dizem que qui no esteja tudo perdido. Qui haja ainda algo por salvar! O Que? Perguntas! Tua alma, Alejandra, tua alma!(PIZARNIK, 1955, p. 32apudANTN, 2007, p. 44).[8]Conto com uma carncia quase absoluta de recursos internos, apesar de ter dentro de mim um mundo to vasto, porm um mundo dependente de mim, divorciado de meu eu (...) (PIZARNIK, 2005, p. 106).[9]Tiraste a mscara. E detrs ou debaixo houve uma ausncia de rosto (PIZARNIK, 2005, p. 297).