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Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas 9 HIDROLOGIA DE SUPERFÍCIE: estimativa de vazões máximas 9.1 Introdução Dados de vazão em bacias hidrográficas são escassos no Brasil, existindo, na maior parte, monitoramento hidrológico em grandes bacias, normalmente conduzido por empresas de energia elétrica ou indústrias de grande porte. A disponibilidade de dados de precipitação é muito superior à de vazão, graças à grande quantidade de postos meteorológicos em funcionamento. Isto levou a geração de modelos que relacionam a precipitação à possível vazão ou escoamento superficial direto que esta proporciona. Deve-se ressaltar que grande parte dos modelos foram desenvolvidos para as condições fisiográficas, hidrológicas, pedológicas e climáticas dos EUA, havendo carência de informações específicas que possam ser utilizadas para aplicação segura destes modelos às condições brasileiras. No entanto, os modelos que serão apresentados neste tópico são os mais simples e práticos para se estimar a vazão para projetos hidráulicos, do ponto de vista de pequenas bacias hidrográficas. 9.2 Método Racional Este método leva o nome racional pela coerência na análise dimensional das variáveis, sendo o mais simples e mais usual em pequenas áreas. É um modelo empírico cujo objetivo é aplicar um redutor na precipitação intensa, significando um percentual do total precipitado que escoa, superficialmente sendo este redutor, influenciado pela cobertura vegetal, classe de solos, declividade e tempo de retorno da precipitação, existindo tabelas com valores propostos para este fator (Tabela 9.1). A forma geral do método é: A I C Q = (1) Em que Q é a vazão (L 3 T -1 ), I, a intensidade da precipitação (L T -1 ), A, área da bacia (L 2 ) e C, o fator de redução (adimensional), conhecido como coeficiente de escoamento superficial ou fator C. Observe que ao se multiplicar I por A, resulta na unidade de Q. Para se obter a vazão em m 3 s -1 , trabalhando com a intensidade de precipitação em mm h -1 e área em ha, a equação 1 fica: 360 A I C Q = (2)

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Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

9 HIDROLOGIA DE SUPERFÍCIE: estimativa de vazões máximas

9.1 Introdução

Dados de vazão em bacias hidrográficas são escassos no Brasil, existindo, na

maior parte, monitoramento hidrológico em grandes bacias, normalmente conduzido

por empresas de energia elétrica ou indústrias de grande porte.

A disponibilidade de dados de precipitação é muito superior à de vazão, graças

à grande quantidade de postos meteorológicos em funcionamento. Isto levou a

geração de modelos que relacionam a precipitação à possível vazão ou escoamento

superficial direto que esta proporciona. Deve-se ressaltar que grande parte dos

modelos foram desenvolvidos para as condições fisiográficas, hidrológicas,

pedológicas e climáticas dos EUA, havendo carência de informações específicas que

possam ser utilizadas para aplicação segura destes modelos às condições brasileiras.

No entanto, os modelos que serão apresentados neste tópico são os mais simples e

práticos para se estimar a vazão para projetos hidráulicos, do ponto de vista de

pequenas bacias hidrográficas.

9.2 Método Racional

Este método leva o nome racional pela coerência na análise dimensional das

variáveis, sendo o mais simples e mais usual em pequenas áreas. É um modelo

empírico cujo objetivo é aplicar um redutor na precipitação intensa, significando um

percentual do total precipitado que escoa, superficialmente sendo este redutor,

influenciado pela cobertura vegetal, classe de solos, declividade e tempo de retorno da

precipitação, existindo tabelas com valores propostos para este fator (Tabela 9.1). A

forma geral do método é:

AICQ ⋅⋅= (1)

Em que Q é a vazão (L3 T-1), I, a intensidade da precipitação (L T-1), A, área da

bacia (L2) e C, o fator de redução (adimensional), conhecido como coeficiente de

escoamento superficial ou fator C. Observe que ao se multiplicar I por A, resulta na

unidade de Q. Para se obter a vazão em m3 s-1, trabalhando com a intensidade de

precipitação em mm h-1 e área em ha, a equação 1 fica:

360

AICQ

⋅⋅= (2)

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

É importante observar que o método Racional transforma um processo

complexo, com muitas variáveis envolvidas, em algo bastante simples, resumindo toda

a complexidade apenas no fator C. Os principais problemas deste método, quando

aplicado a bacias hidrográficas, são:

- Não existir nenhuma consideração sobre variabilidade espacial e temporal

da precipitação na bacia, assim como de fatores físicos, em especial

cobertura vegetal, classe de solo e declividade, os quais interferem

decisivamente no processo;

- Não considera a forma da bacia, apenas a área total;

- Todo o processo de geração do escoamento, a partir da precipitação e

infiltração, é resumido apenas no fator C, que implica numa proporção

direta da chuva em deflúvio;

- Recomendado, com precauções, apenas para bacias menores que 8 km2.

Na Tabela 9.1 tem-se valores para o coeficiente de escoamento superficial de

acordo com vários tipos de cobertura da superfície, declividade e tempo de retorno do

projeto.

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

Tabela 9.1 Valores de C para várias superfícies, declividade e tempo de retorno.

Superfície Tempos de Retorno (anos)

2 5 10 25 50 100 500

Asfalto 0,73 0,77 0,81 0,86 0,90 0,95 1,00

Concreto/telhado 0,75 0,80 0,83 0,88 0,92 0,97 1,00

Gramados (Cobrimento de

50% da área)

- Plano (0-2%)

- Média (2-7%)

- Inclinado (>7%)

0,32

0,37

0,40

0,34

0,40

0,43

0,37

0,43

0,45

0,40

0,46

0,49

0,44

0,49

0,52

0,47

0,53

0,55

0,58

0,61

0,62

Gramados (Cobrimento de 50

a 70% da área)

- Plano (0-2%)

- Média (2-7%)

- Inclinado (>7%)

0,25

0,33

0,37

0,28

0,36

0,40

0,30

0,38

0,42

0,34

0,42

0,46

0,37

0,45

0,49

0,41

0,49

0,53

0,53

0,58

0,60

Gramados (Cobrimento maior

que 75% da área)

- Plano (0-2%)

- Média (2-7%)

- Inclinado (>7%)

0,21

0,29

0,34

0,23

0,32

0,37

0,25

0,35

0,40

0,29

0,39

0,44

0,32

0,42

0,47

0,36

0,46

0,51

0,49

0,56

0,58

Campos cultivados

- Plano (0-2%)

- Médio (2-7%)

- Inclinado (>7%)

0,31

0,35

0,39

0,34

0,38

0,42

0,36

0,41

0,44

0,40

0,44

0,48

0,43

0,48

0,51

0,47

0,51

0,54

0,57

0,60

0,61

Pastos

- Plano (0-2%)

- Médio (2-7%)

- Inclinado (>7%)

0,25

0,33

0,37

0,28

0,36

0,40

0,30

0,38

0,42

0,34

0,42

0,46

0,37

0,45

0,49

0,41

0,49

0,53

0,53

0,58

0,60

Florestas/Reflorestamentos

- Plano (0-2%)

- Médio (2-7%)

- Inclinado (>7%)

0,22

0,31

0,35

0,25

0,34

0,39

0,28

0,36

0,41

0,31

0,40

0,45

0,35

0,43

0,48

0,39

0,47

0,52

0,48

0,56

0,58

Para se determinar a chuva de projeto, utiliza-se a equação de chuvas

intensas, já mencionada anteriormente. Nesta equação, o tempo de duração da

precipitação para o projeto deve ser considerado como sendo igual ao tempo de

concentração da bacia. Tempo de concentração é o tempo necessário para que toda a

bacia participe do escoamento na seção de controle, ou seja, teoricamente, refere-se

ao tempo necessário para que uma gota de chuva que tenha atingido o ponto mais

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

distante da seção de controle passe por ela. Assim, garante-se a participação de toda

a área de drenagem da bacia e a situação crítica de vazão máxima.

O cálculo do tempo de concentração pode ser realizado por meio de várias

fórmulas. A seguir apresentam-se algumas delas:

- Equação de Kirpich

385,0155,1 HL57tc −⋅⋅= (3)

Esta equação é bastante aplicada para pequenas bacias e sub-estima o tempo

de concentração e conseqüentemente, superestima a chuva intensa. Sua aplicação é

recomendada para áreas menores que 1000 ha e áreas relativamente homogêneas.

Nesta equação, tc é o tempo de concentração (minutos), L é o comprimento do

talvegue principal (km) e H a representa o desnível entre a cabeceira e a seção de

controle da bacia (m).

- Equação de Ven Te Chow

64,0

0S

L64,52tc

��

��

�= (4)

Aplicada para bacias hidrográficas com áreas menores que 2500 ha e

apresenta as seguintes características: tc é o tempo de concentração (minutos); L é o

comprimento do talvegue principal (km) e S0 é o declividade média do talvegue, (m

km-1).

- Equação de Picking

31

0

2

SL

79,51tc��

��

�= (5)

Em que tc é o tempo de concentração (minutos); L é o comprimento do

talvegue principal (km) e S0 é o declividade média do talvegue, m km-1.

- Equação de Giandotti

H80,0

L5,1A4tc

⋅⋅+⋅= (6)

Em que tc é o tempo de concentração (horas); A é a área da bacia, km2; L é o

comprimento desde a saída da bacia (seção de controle) até o ponto mais afastado,

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

em km; H é a diferença entre as cotas média e a mais baixa (seção de controle), em

m.

- Equação SCS Lag

Esta equação é aplicada para áreas menores que 800 ha e não representa

uma situação fixa em termos de solo. O coeficiente CN, conhecido como curva-

número varia com a textura do solo, sua capacidade de armazenamento e infiltração

de água e cobertura vegetal. Detalhes sobre o comportamento de CN serão

apresentados na seqüência.

50,0o

70,080,0 S9

CN1000

L42,3tc −⋅��

���

� −⋅⋅= (7)

Em que tc é o tempo de concentração (min); L é o comprimento do talvegue

principal (km); S0 é o declividade média do talvegue, m km-1; CN é a curva-número

(adimensional).

- Equação SCS –método cinemático

� ��

���

�⋅=VtLt

67,16tc (8)

Em que Lt é o comprimento de cada trecho constituído por uma cobertura

vegetal distinta (km); Vt é a velocidade da água em cada trecho (m s-1).

Na Tabela 9.2 tem-se valores de velocidade do escoamento associados às

características de cada trecho e declividade. Recomenda-se que em canais bem

definidos e mapeados, seja aplicada a equação da resistência hidráulica ou equação

de Manning.

Tabela 9.2 Velocidades médias de escoamento superficial (m s-1) para cálculo de tc

em canais e em superfícies.

Declividade (%) Escoamento Cobertura

0 -3 4 -7 8 -11 >12

Florestas 0 –0,5 0,5 –0,8 0,8 –1,0 >1,0

Pastos 0 –0,8 0,8 –1,1 1,1 –1,3 >1,3

Áreas cultivadas 0 –0,9 0,9 –1,4 1,4 –1,7 >1,7

Sobre a

superfície do

terreno Pavimentos 0 –2,6 2,6 –4,0 4,0 –5,2 >5,2

Mal definidos 0 –0,6 0,6 –1,2 1,2 –2,1 >2 ,1 Em canais

Bem definidos Equação de Manning

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

Equação de Manning:

2132h IR

n1

V ⋅⋅= (9)

Em que n é o coeficiente de rugosidade de Manning, Rh é o raio hidráulico e I é

a declividade do canal ou trecho (m/m). Rh deve ser obtido dividindo-se a área

molhada pelo perímetro molhado do canal.

- Equação de Dodge

Esta equação pode ser aplicada a bacias rurais de grande porte, com área

variando de 140 a 930 km2.

17,0o

41,0 SA88,21tc −= (10)

Em que tc é o tempo de concentração (minutos); A é a área da bacia, km2; S0 é

a declividade média do talvegue, m m-1.

- Equação da Onda Cinemática

Esta equação foi derivada do modelo onda cinemática, obtido a partir das

equações hidrodinâmicas apresentadas anteriormente. É um modelo de estimativa do

tempo de concentração com bons resultados para pequenas bacias hidrográficas. Sua

estrutura foi desenvolvida no capítulo anterior e é a seguinte:

( )3,04,0

60,0

Si

nL447tc

⋅⋅⋅= (11)

Neste caso, tc está em minutos; L é o comprimento do talvegue (km), n é o

coeficiente de rugosidade de Manning, S é a declividade da superfície (m/m) e i é a

chuva intensa, em mm/h, obtida a partir da equação de chuvas intensas. Observa-se

que se para o cálculo de i considera-se o tempo de duração da chuva igual ao tempo

de concentração da bacia, há um problema iterativo a ser resolvido, uma vez que tc

ficará implícito na equação, ou seja:

( )

( )3,0

4,0

c

a

60,0

Stcb

TRK

nL447tc

⋅��

��

+

⋅⋅= (12)

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

Exemplo de Aplicação 9.1

Calcule o tempo de concentração para uma bacia hidrográfica com área de 500

ha, comprimento do talvegue igual a 2,5 km e declividade do canal igual a 0,02 m/m. A

equação de chuvas intensas da região possui os parâmetros K = 1900; a = 0,112; b =

15,2 e c = 0,720. Considere TR igual a 30 anos e a rugosidade do canal igual a 0,05 e

a equação da onda cinemática (equação 12)

( )

( )

( )

( )minutos 68,60tc

tctc2,1544,17

tc80,23

tc2,15102,415

02,0tc2,15

301900

05,05,2447tc

288,0

288,0

3,04,0

720,0

112,0

60,0

≅=+⋅

=+⋅=

⋅��

��

+

⋅⋅=

De acordo com as equações apresentadas anteriormente, o comprimento e a

declividade do curso d´água principal da bacia são as características mais

freqüentemente utilizadas para o cálculo do tempo de concentração. É difícil dizer qual

método é mais preciso em determinada bacia, pois todas foram obtidas para

condições particulares. Dentre estas, entretanto, a de uso mais freqüente é a proposta

por Kirpich, apesar da mesma ser conservadora e ter tendência a subestimar o valor

de tc e por conseqüência, superestimar a intensidade de precipitação e a vazão de

projeto.

Deve-se ressaltar que as características fisiográficas da bacia devem ser

previamente estudadas e determinadas, se possível, com auxílio dos Sistemas de

Informações Geográficas e visitas à área do projeto, com o objetivo de se conhecer a

ocupação atual da bacia, as classes de solo predominantes e características gerais da

cobertura vegetal. Tudo isto é de suma importância para uma boa escolha de

coeficientes do escoamento superficial e cálculos adequados para o tempo de

concentração, evitando equívocos ao projeto final da estrutura.

9.2.1 Chuva de Projeto

9.2.1.1 Determinação do Tempo de Retorno (TR)

A chuva crítica para um projeto de obras hidráulicas é escolhida com base em

vários aspectos, levando-se em conta a segurança da obra e seus custos, inclusive de

manutenção. Quando se conhece a vida útil da obra a ser projetada e o risco máximo

permissível, o tempo de retorno pode ser assim calculado:

Considerando P a probabilidade de ocorrência em qualquer dos anos, J a

probabilidade de não ocorrência em qualquer dos anos:

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

P1J −= (13)

Sendo W a probabilidade de não ocorrência em um ano específico e p a

probabilidade de ocorrência em um ano específico:

nJW = sendo n o período em anos (14)

W1p −= (15)

Substituindo (13) e (14) em (15), tem-se:

n)P1(1p −−= sendo TR1

P = (16)

n)TR1

1(1p −−= (17)

n1

)P1(1

1TR

−−= (18)

Em termos práticos, esta equação pode ser aplicada da seguinte forma:

n1

)k1(1

1TR

−−= (19)

Neste caso, k é entendido como o risco assumido para a obra a ser projetada e

n a vida útil da mesma (anos). O TR pode ser estimado também em função de um

estudo dos custos da obra, associando o custo da obra e o custo de manutenção. A

lógica deste procedimento é a seguinte: quanto maior o TR, maior o custo da obra,

pois maior será a chuva de projeto e por conseqüência, a vazão do projeto. Em

contrapartida, menor será o custo de manutenção da mesma, pois haverá maior

segurança e necessidade de intervenção. Assim, busca-se minimizar o custo total da

obra, o qual é obtido pela soma dos custos da obra em si com os de manutenção. Na

Figura 9.1 pode-se observar o comportamento geral desta análise, visando obtenção

do ponto de mínimo na curva de custo total.

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

Figura 9.1 Comportamento dos custos da obra e de sua manutenção em função do

Tempo de Retorno.

9.2.1.2 Determinação do tempo de duração da chuva intensa

Quando se considera o tempo de duração da chuva menor que o tempo de

concentração da bacia, ocorrerá uma vazão de pico menor que a máxima porque não

haverá participação de toda a área de drenagem da bacia hidrográfica no escoamento,

propiciando uma vazão de pico menor. Se for adotado o tempo de duração maior que

o tempo de concentração da bacia, também não se obterá vazão de pico máxima, uma

vez que a duração da chuva será consideravelmente alta, reduzindo sua intensidade.

Neste caso, haveria a formação de um patamar na hidrógrafa. Sendo assim, é

recomendável que para o cálculo da chuva de projeto, seja considerado o tempo de

duração igual ao tempo de concentração da chuva. Na Figura 9.2, pode-se observar

graficamente esta situação.

TR

Custo Custo da obra

Custo de manutenção

Custo total

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

Figura 9.2 Comportamento da hidrógrafa de acordo com a duração da precipitação

considerada.

Exemplo de Aplicação 9.2

Seja uma bacia hidrográfica de área igual a 50 ha, que apresenta comprimento

do talvegue principal igual a 1,5 km e declividade entre a extremidade do curso d’água

e a seção de controle igual a 8%, com a seguinte distribuição das características de

superfície: 10 ha, ocupando 0,4 km de comprimento do talvegue, coberto por floresta,

com declividade de 10%; 20 ha, ocupando 0,6 km de comprimento, coberto por milho,

com declividade de 4% e 20 ha, ocupando 0,5 km de comprimento, coberto com pasto

plantado e declividade de 20%. Determinar a vazão de projeto para uma barragem a

ser construída na seção de controle da mesma, utilizando a fórmula de Kirpich, o

método da velocidade média e o método da onda cinemática para o tempo de

concentração. Considere uma vida útil de 30 anos e um risco de 80% para o projeto e

a seguinte equação de chuvas intensas:

( ) 736,0

179,0

td39,10

TR702,842I

+

⋅= , em que I é expresso em mm/h, TR, em anos e td, em minutos.

a) Determinação do coeficiente de escoamento superficial

td < tc td = tc

td > tc

tempo

Q

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

Neste caso, deve-se calcular o fator C, com base numa média ponderada pela

área. Assim, aplicando-se a Tabela 9.1 e valores de TR entre 25 e 50 anos, tem-se:

Área 1 (Floresta): C = 0,46

Área 2 (Milho): C = 0,45

Área 3 (Pastagem): C = 0,47

46,050

46,02044,02045,010C =⋅+⋅+⋅=−

b) Determinação da precipitação intensa

- Cálculo de tc por Kirpich

L = 1,5 km .: Para declividade de 8%, H será igual a 120 m

41,141205,157tc 385,0155,1 =⋅⋅= − minutos

- Cálculo da precipitação intensa determinando-se o TR pela equação 11

anos14,19)8,01(1

1

)k1(1

1TR

301

n1

=−−

=

−−

=

( )53,134

41,1439,10

14,19702,842I

736,0

179,0=

+

⋅= mm/h

- Cálculo de tc pela velocidade média (Tabela 9.2, considerando valores

médios)

Trecho 1: Lt = 0,4 km e Vt = 0,9 m/s .: 0,444 km/m s-1

Trecho 2: Lt = 0,6 km e Vt = 0,9 m/s .: 0,667 km/m s-1

Trecho 3: Lt = 0,5 km e Vt = 1,6 m/s .: 0,313 km/ m s-1

( ) 73,23313,0667,0444,067,16tc =++⋅= minutos

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

- Cálculo da precipitação intensa por esta metodologia

( )38,106

73,2339,10

14,19702,842I

736,0

179,0=

+

⋅= mm/h

Cálculo de tc e i pelo método da Onda Cinemática (n = 0,03).

( )

( )

( )

( )

( )mm/h 23,120

10,3921,84

30842,7i

minutos 84,21tc

08,039,10tc

307,842

03,05,1447

Stcb

TRK

nL447tc

736,0

0,179

30,040,0

736,0

179,0

60,0

3,04,0

c

a

60,0

=+

⋅=

⋅��

��

+

⋅⋅=

⋅��

��

+

⋅⋅=

c) Cálculo da vazão

- Por Kirpich

3605053,13446,0

Q⋅⋅= = 8,59 m3 s-1

- Pelo método da velocidade

80,6360

5038,10646,0Q =⋅⋅= m3 s-1

- Pela Onda Cinemática

68,7360

5023,12046,0Q =⋅⋅= m3 s-1

Obs.: Comparando-se as metodologias, observa-se a situação comentada

anteriormente, onde o valor da vazão de projeto calculado com base no tempo de

concentração pela metodologia de Kirpich é superior ao das outras metodologias,

gerando valor 20,8% superior ao método da velocidade e 10,6% superior ao método

da Onda Cinemática. Como a bacia é pequena, acredita-se que, devido à base física

do modelo, a estimativa com base no método da Onda Cinemática produziu resultado

mais coerente.

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

9.3 Método de McMath

Este método é semelhante ao método Racional. Tem sido aplicado aos países

andinos, onde o clima, em algumas regiões, por ser semi-árido, é semelhante ao

Nordeste brasileiro, mostrando que seu desempenho e aplicação possa ser mais

recomendado para estas regiões. Sua fórmula geral é:

5 4SA.I.C.0091,0Q = (20)

Em que Q é a vazão de pico (m3/s), C é o coeficiente de escoamento, I é a

intensidade da chuva (mm h-1), A é a área da bacia de drenagem (ha) e S é o

declividade média do curso d’água principal (m m-1).

O coeficiente C, deste método, deve ser obtido pela soma de 3 outros

coeficientes (C1, C2, C3), correspondentes às características da vegetação, solos e

topografia. Na Tabela 9.3, apresentam-se os coeficientes utilizados para determinação

do fator C do método de McMath.

Tabela 9.3 Coeficientes de escoamento em função da vegetação, solos e topografia.

VEGETAÇÃO SOLO TOPOGRAFIA

% Cobertura da bacia C1 Textura C2 Declividade (%) C3

100 0,08 Arenosa 0,08 0,0 – 0,2 0,04

80 – 100 0,12 Ligeira 0,12 0,2 – 0,5 0,06

50 – 80 0,16 Média 0,16 0,5 – 2,0 0,08

20 – 50 0,22 Fina 0,22 2,0 – 5,0 0,10

0 – 20 0,30 Argilosa 0,30 5,0 – 10,0 0,15

Exemplo de Aplicação 9.3

Determinar a vazão de projeto para uma bacia hidrográfica utilizando o método

de McMath, com as seguintes características fisiográficas:

• Área de drenagem: 12,04 km2

• Declividade média do curso d´água =1,10%

• Comprimento de talvegue: 5,6 km

• Cota da nascente: 1000m

• Cota da foz: 872m

• TR =50 anos

• Características fisiográficas básicas:

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

Cobertura % área Declividade (%) textura C1 C2 C3 Cfinal

reflorestamento 15 5,3 Arenoso 0,30 0,08 0,15 0.53

café 9 4,6 Argilo-arenoso 0.30 0,16 0,10 0.56

pastagem 35 5,8 Argilo-arenoso 0,22 0,16 0,15 0,53

cult. Anuais 23 3,1 Argilo-arenoso 0,22 0,16 0,10 0,48

pomar 1 3,7 Argilo-arenoso 0,30 0,16 0,10 0,56

matas ciliares 9 2,1 Argiloso 0,30 0,30 0,10 0,70

matas e capoeira 8 6,5 Argilo-arenoso 0,30 0,16 0,15 0,61

• Intensidade de precipitação das localidades mais próximas à bacia:

( ) 149,1

187,0

128,56t

T.810,10224i

+=

( ) 005,1

179,0

2817,33t

T.341,4159i

+= Sendo, i em mm/h e t em minutos.

a) Cálculo do coeficiente C, considerando as condições fisiográficas anteriores e valor

médio ponderado pela área de cada cobertura:

5432,061,008,070,009,056,001,048,023,053,035,056,009,053,015,0C =×+×+×+×+×+×+×=

b) Cálculo da intensidade de precipitação:

Utilizando-se a equação de Giandotti para cálculo de tc tem-se:

( )minutos 147,69horas 46,2

12880,0

6,55,104,124tc ==

⋅+⋅=

( )1

149,1

187,0

1 mmh17,4728,567,147

)50(*81,10224i −=

+=

( )1

005,1

179,0

2 mmh97,44817,337,147

)50.(341,4159i −=

+=

Considerando-se a média das chuvas intensas, tem-se I = 46,07 mm/h

c) Cálculo da vazão de projeto

5 4 011,01204*07,46*5432,0*0091,0Q =

Q = 26,93 m3/ s

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

9.4 Método Cypress-Creek

Esta metodologia foi desenvolvida especificamente para dimensionamento de

sistemas de drenagem superficial em áreas planas. É um método empírico,

desenvolvido com base em dados de monitoramento hidrológico de várias bacias

americanas com declividade menor que 0,45%, pertencentes a 4 regiões dos Estados

Unidos. Sua fórmula geral é:

KACQ ×= (21)

Em que Q é a vazão de projeto, em cfs (“pés cúbicos por segundo” – 1 pé ∼

30,5 cm), C é um coeficiente associado ao deflúvio, A é a área a ser drenada, em

milhas2 (1 milha ∼ 1,6 km) e K é igual a 5/6.

O coeficiente C para a região Sudeste dos EUA, representada pelo estado da

Flórida, pode ser calculado por:

Re75,1439,16C ×+= (22)

Em que Re é a chuva efetiva em polegadas. Uma das formas mais usuais de

obtenção da chuva efetiva é o método Curva-Número (CN-SCS) a ser detalhado no

próximo item.

Na realidade pode haver uma distorção entre o valor calculado para Q e o

original, quando a área de drenagem for maior que 100 ha. Assim, é necessário

calcular um coeficiente de distorção, para correção da vazão estimada pela equação

21:

( )ARe89,26

ARe75,1439,16 65

××××+=α (23)

Analisando-se as equações acima, observa-se que a vazão Q corresponde ao

produto de Re pela área dividido pelo tempo de duração da chuva, de onde aparece o

valor 26,89, uma vez que 1 polegada/24 horas = 26,89 cfs/mi2, considerando como

critério de projeto uma chuva de duração de 24 horas, valor este típico para projetos

desta natureza. O valor da chuva efetiva a ser aplicado na determinação de C deve

ser multiplicado por α.

9.5 Método Curva-Número - USDA/ARS (CN - SCS)

Este método foi desenvolvido pelo Serviço de Conservação de Solos do

Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (SCS-USDA) e visa ao cálculo do

deflúvio total gerado em uma bacia ou área de contribuição, sendo bastante útil para

dimensionamento de terraços de infiltração e bacias de contenção, os quais

necessitam do volume total escoado. Além disto, é aplicado para determinação das

precipitações efetivas, as quais são aplicadas na estimativa da Hidrógrafa Unitária

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

Sintética Triangular (HUT), a ser apresentada na seqüência. Na Figura 9.3 apresenta-

se um esquema geral do método e seus parâmetros.

Figura 9.3 Representação gráfica do método Curva Número (CN - SCS).

Desta Figura, tem-se que P é a precipitação acumulada total, Ia é a abstração

inicial, Pef é a precipitação efetiva (P – Ia), Q é o deflúvio; F é a infiltração acumulada

total (P – Q) e S é a infiltração potencial.

O embasamento físico deste método pode ser entendido da seguinte forma:

total ãoprecipitaçefetiva ãoprecipitaç

absorção de máxima capacidadeinfiltrado volume =

Na realidade, existem perdas iniciais no processo associadas à infiltração

inicial, retenção pelas depressões do terreno e cobertura vegetal, as quais são

denominadas abstrações iniciais. Assim, obtém-se a seguinte formulação:

PQ

IaSIaQP =

−−− (24)

Em que P é a precipitação total, Q, o deflúvio ou precipitação efetiva, S, é a

capacidade máxima de absorção de água e Ia, abstrações iniciais. Segundo os

Escoamento superficial potencial

Abstração Inicial (Ia)

Precipitação total (P)

Escoamento superficial atual

Infiltração atual (F)

Potencial de Infiltração (S)

(Escoamento superficial potencial – Escoamento

superficial atual)

Pre

cipi

taçã

o ef

etiv

a

Precipitação total

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

autores desta proposta, Ia corresponde a 20% de S. Sendo assim, a equação que

estima o deflúvio, fica:

( )S80,0P

S20,0PQ

2

⋅+⋅−= (25)

Todas as variáveis da equação 25 são trabalhadas em mm.

O método preconiza ainda que somente existirá escoamento quando P for

superior às abstrações iniciais, o que se observa pelo numerador da equação 25. A

capacidade máxima de absorção S é obtida com base na Curva Número (CN), de

acordo com a equação abaixo:

254CN

25400S −= (26)

Os valores para CN variam de 1 a 100 e estão associados a diversos

parâmetros fisiográficos como cobertura vegetal, umidade do solo antecedente ao

evento e classe de solo. Os solos foram agrupados em 4 categorias (grupos):

- Grupo A: são aqueles que produzem pequeno escoamento e alta infiltração,

caracterizados por altos teores de areia, pequenos teores de silte e argila e

profundos;

- Grupo B: menos permeáveis que os solos da categoria A, ainda sendo

arenosos, porém, menos profundos;

- Grupo C: solos que geram escoamento superficial superior ao solo B, com

capacidade de infiltração média a baixa, percentual mais elevado de argila

e pouco profundos;

- Grupo D: solos pouco profundos, com baixa capacidade de infiltração e

presença de argilas expansivas, com maior capacidade para geração do

escoamento.

Uma análise rápida deste agrupamento permite concluir que esta classificação

é bastante superficial, não sendo consistente com os vários aspectos de manejo e

solos, tais como compactação e intemperismo, sendo que este último, confere

atributos físico-químicos e mineralógicos marcantes em solos tropicais. Assim, por

exemplo, um solo com alto teor de argila (acima de 50%), com estrutura tipicamente

granular, conferida pela mineralogia mais oxídica, principalmente com elevados teores

de gibsita, como alguns Latossolos, seriam encaixados no grupo C ou D. No entanto,

são solos com alta capacidade de infiltração, ou seja, são argilosos, mas seu

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

comportamento hidrológico é tipicamente de solos arenosos, devendo ser

classificados aos grupos A ou B.

Este agrupamento de solos e seus atributos hidrológicos foram desenvolvidos

com base nas condições de clima temperado, com menor grau de intemperismo, onde

a textura tem maior influência no comportamento físico-hídrico dos solos, enquanto em

solos tropicais, a estrutura é o fator determinante. Essa abordagem simples mostra o

quanto é problemática a importação de modelos. Apesar das dificuldades levantadas,

na ausência de outras informações mais realistas, apresenta-se na Tabela 9.4, os

valores de CN para bacias rurais.

Tabela 9.4 Valores de CN para diversas situações de cobertura vegetal e tipos de

solos.

Uso do Solo Superfície Tipo de solo

A B C D

Solo lavrado - com sulcos retilíneos

- em fileiras retas

77

70

86

80

91

87

94

90

Plantações

regulares

- em curvas de nível

- terraceamento em nível

- em fileiras retas

67

64

64

77

76

76

83

84

84

87

88

88

Plantações de

cereais

- em curvas de nível

- terraceamento em nível

- em fileiras retas

62

60

62

74

71

75

82

79

83

85

82

87

Plantações de

legumes

- em curvas de nível

- terraceamento em nível

- pobres

- normais

- boas

60

57

68

49

39

72

70

79

69

61

81

78

86

79

74

84

89

89

94

80

Pastagens

- pobres, em nível

- normais, em nível

- boas, em nível

47

25

6

67

59

35

81

75

70

88

83

79

Campos

permanentes

- normais

- esparsos, baixa

transpiração

- normais

- densas, alta transpiração

30

45

36

25

58

66

60

55

71

77

73

70

78

83

79

77

Chacaras

Estradas de

terra

- Normais

- Más

- de superfície dura

56

72

74

75

82

84

86

87

90

91

89

92

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

Florestas

- muito esparsas, baixa

transpiração

- esparsas

- densas, alta transpiração

- normais

56

46

26

36

75

68

52

60

86

78

62

70

91

84

69

76

Além disto, foi proposta uma correção dos valores de CN com base na

umidade antecedente, a qual possibilitou separar 3 situações distintas:

- Situação 1: solos secos, com precipitação acumulada nos últimos 5 dias

menor que 36 mm para estação de crescimento, e, em outro período,

menor que 13 mm;

- Situação 2: solos com umidade na capacidade de campo e os valores de

CN correspondem aos da Tabela 9.4;

- Situação 3: ocorreram precipitações nos últimos 5 dias, com o solo

saturado, considerando total precipitado maior que 53 mm para época de

crescimento, e em outro período, maior que 28 mm;

Na Tabela 9.5 constam valores de CN corrigidos para as situações 1 e 3,

tendo-se como referência, a situação 2.

Tabela 9.5 Valores de CN corrigidos conforme situação de umidade do solo

antecedente.

Valores médios

(situação 2)

Valores corrigidos

(situação 1)

Valores corrigidos

(situação 3)

100 100 100

95 87 98

90 78 96

85 70 94

80 63 91

75 57 88

70 51 85

65 45 82

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

60 40 78

55 35 74

50 31 70

45 26 65

40 22 60

35 18 55

30 15 50

25 12 43

20 9 37

15 6 30

10 4 22

5 2 13

Exemplo de Aplicação 9.4

Considere uma bacia hidrográfica com 1,5 ha de área, dividida em 0,75 ha

ocupados por eucalipto e solo com capacidade média de infiltração e textura média; os

outros 0,75 ha ocupados por pastagem, também em condições normais, e solo com

textura argilosa e baixa capacidade de infiltração. Para o hietograma abaixo,

determinar o deflúvio e a infiltração média na bacia para as situações de umidade do

solo 1, 2 e 3 do método CN-SCS.

a) Determinação dos valores de CN

- Área com eucalipto: o solo desta área pode ser enquadrado como

intermediário entre B e C. Adotando-se B (para se obter maior segurança),

pela Tabela 9.4, encontra-se CN igual a 60. Este valor é para situação de

10

30

16

12 10

8 4

Tempo (min)

IP (m

m/h

)

30 60 90 120 150 180 210

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

umidade 2. Para as demais situações, têm-se os valores 40 e 78,

respectivamente, de acordo com a Tabela 9.5.

- Área com pastagem: pode-se enquadrar o solo desta área no grupo C.

Assim, tem-se, para a situação 2, um valor de CN igual a 75 e para as

situações 1 e 3, 57 e 88, respectivamente.

b) Valor médio de CN, ponderado pelas áreas de ocupação de cada valor:

- situação 1: 5,485,1

5775,04075,0 =⋅+⋅

- situação 2: 67,5

- situação 3: 83

c) Cálculo de S e abstração inicial

- situação 1: 71,2692545,48

25400S =−= mm .: Ia = 0,2 x 269,71 = 53,94 mm

- situação 2: S = 122,3 mm .: Ia = 24,5 mm

- situação 3: S = 52,02 mm .: Ia = 10,4 mm

d) Cálculo do defúvio

- situação 1: Q = 0. O valor do total precipitado, que é de 45 mm, não supera

a abstração inicial (45<53,94). Isto ocorre devido ao fato de que a umidade

inicial do solo está muito baixa, havendo, portanto, maior potencial de

infiltração.

- situação 2: ( )( ) 94,2

3,12280,0455,2445

Q2

=⋅+

−= mm

- situação 3: Q = 13,82 mm. Esta situação implica num maior deflúvio, haja

vista a alta umidade inicial do solo, reduzindo o potencial de

armazenamento de água, aumentando o escoamento.

e) Cálculo da Infiltração Média

- Situação 1: I = 45 – 0 = 45 mm

- Situação 2: I = 45 – 2,94 = 42,06 mm

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

- Situação 3: I = 45 – 13,82 = 31,18 mm

9.6 Hidrógrafa Unitário Triangular (HUT)

9.6.1 Abordagem introdutória

A fim de reduzir as dificuldades na elaboração da hidrógrafa unitária de uma

bacia hidrográfica, tais como a existência de monitoramento de vazões, a dificuldade

de extrapolação do HU de uma bacia para outra e à maior complexidade matemática,

foi desenvolvido um modelo de HU que simplifica o processo de estimativa de vazões

e tempo de pico para uma hidrógrafa produzida por uma dada precipitação efetiva. A

principal aplicação deste método de estimativa do HU consiste na caracterização do

hidrograma de projeto, a ser apresentado na seqüência.

A idéia central é considerar a hidrógrafa com formato triangular (aproximando

as curvas de ascensão e recessão a uma reta), o que facilita o entendimento e o

cálculo da vazão de pico. O SCS-USDA propôs um modelo de HU com esta

aproximação, que ficou conhecido pela sigla HUT, associando os parâmetros da

hidrógrafa (vazão de pico e tempo de pico) às características físicas da bacia.

Ao se calcular a área deste triângulo, automaticamente se determina o volume

de deflúvio. Uma vez considerado unitário, esta área será igual à de uma precipitação

unitária. A Figura 9.4 ilustra uma hidrógrafa triangular e a seguir as idéias básicas

desenvolvidas por esta metodologia.

10

30

16

12 10

8 4

Tempo (min)

IP (m

m/h

)

30 60 90 120 150 180 210

Situação 2: 10,12 mm/h

Situação 3: 24,12 mm/h

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

Figura 9.4 Representação de uma hidrógrafa triangular e seus parâmetros.

Por esta Figura, pode-se desenvolver o seguinte raciocínio, a partir do cálculo

da área da hidrógrafa:

Q2

teqp2

taqp =×+× (24)

Em que Q corresponde ao deflúvio unitário, qp é a vazão de pico unitária, ta o

tempo de ascensão da hidrógrafa, te, o tempo de recessão. Ainda na Figura 9.4, D

representa o tempo de duração da precipitação unitária, normalmente igual ao tempo

de monitoramento da precipitação para apenas 1 evento efetivo; tp representa o tempo

de pico da hidrógrafa. O valor de te é ajustado ao valor de ta como sendo:

taHte ×= (25)

A partir da análise de várias bacias norte-americanas, foi encontrado um valor

de 1,67 para H. Para uma precipitação efetiva unitária qualquer Pu (0,1 mm; 1,0 mm;

10,0 mm), tem-se valor de Q na equação 24 (Pu = Q). O desenvolvimento da equação

para cálculo da vazão de pico da hidrógrafa unitária está apresentado na seqüência.

( ) Pu2tetaqp ⋅=+⋅ (26)

Isolando qp:

D

te ta

Q

tempo

qp

tp

tb

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

teta

Pu2qp

+⋅= (27)

Substituindo a equação 25 na 27, considerando H = 1,67, obtém-se:

ta67,2

Pu2qp

⋅⋅= (28)

Ao se analisar as unidades da equação 28, observa-se que para Pu em mm e

ta, em horas, a vazão de pico (qp) será obtida em mm h-1 ou, em termos de análise

dimensional, LT-1. Para obter a vazão em unidades L3T-1, é necessário multiplicar a

equação 28 pela área da bacia, que possui unidade em L2:

AtaPu

67,22

qp ⋅⋅= (29)

Para estimar a vazão de pico unitária (qp) em m3 s-1, a partir da equação 29,

trabalhando-se com Pu em mm, A em km2 e ta em horas, é necessário multiplicar esta

equação por uma constante de transformação de unidades da seguinte forma:

- km2 para m2 = multiplica-se por 106 (no numerador da equação da 29);

- mm para m = dividi-se por 103 (no numerador da equação da 29);

- hora para segundo = multiplica-se por 3600 (no denominador da equação

29);

Assim, a constante será:

278,03600

1

10

103

6=⋅

Multiplicando-se a equação 29 por 0,278, obtém-se:

ta

APu208,0qp

⋅⋅= (30)

Em que, qp é a vazão de pico do HUT, em m3 s-1, Pu, a precipitação unitária,

em mm, A representa a área da bacia, em km2 e ta tempo de ascensão, em horas.

Esta equação é especialmente válida para bacias menores que 8 km2 (800 ha).

A determinação do tempo de pico (tp) do HUT é feita com base no tempo de

concentração da bacia. O SCS-USDA produz a seguinte equação empírica para este

cálculo, considerando as características fisiográficas da bacia, e o fato, observado em

várias bacias, de que, em média, tp = 0,60*tc:

50,0

70,080,0

X1900

14,25

SL6,2

tp⋅

��

���

� +⋅⋅= (31)

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

Em que tp é obtido em horas, L é o comprimento hidráulico ou comprimento do

curso d’água principal (m), S, capacidade máxima de absorção de água na bacia (vide

método CN) e X, a declividade do curso d’água, em percentagem.

Observa-se ainda pela Figura 9.4 que:

2D

tpta += (32)

O valor de D a ser adotado pode variar de forma considerável. Para maior

segurança do dimensionamento, tem sido adotado D = tc. Alguns autores, porém,

sugerem um valor de D variando de 1/5 a 1/3 de tc. Para simulação da hidrógrafa de

projeto, D é igual ao intervalo de tempo de simulação.

Exemplo de Aplicação 9.5

Para uma bacia hidrográfica de 10 ha de área, calcular a vazão de pico do

hidrograma, considerando a umidade antecedente da situação 3*. O comprimento

hidráulico é de 1200 m e a declividade igual a 12,5%. Considere Pu = 10 mm, CN = 83

e precipitação total de 30 mm em 30 minutos.

1o) Cálculo do Deflúvio total

mm 02,52S254CN

25400S =�−=

( ) ( )mm 36,5

62,7140,1030

S8,0PS2,0P

Q22

=−=⋅+

⋅−=

2o) Cálculo de tp e ta

( )

( )245,0

5,121900

14,25

5212006,2

tp5,0

70,080,0

=⋅

��

���

� +⋅⋅= hora = 14,72 minutos

Como D é igual a 30 minutos, ta será igual a:

ta = 30/2 + 14,72 = 29,72 minutos = 0,50 hora

O valor da vazão de pico unitária será (área = 10 ha ou 0,1 km2):

416,050,0

10,010208,0qp =⋅⋅= m3 s-1

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

Observe que este valor diz respeito à vazão de pico unitária, ou seja, para um

evento de 10 mm em 30 minutos. Recordando, do capítulo anterior que Q = P x q,

tem-se:

31030

P ==

Assim, a vazão de pico para este evento será:

s/m 25,1416,03Q 3=×=

Note que, para obtenção da vazão de pico final, que é o objetivo do exercício,

não faz diferença o valor de Pu adotado. Assim, por exemplo, se Pu for igual 1 mm, a

vazão de pico unitária seria 0,0416 m3 s-1. Porém, a relação entre a precipitação

efetiva e Pu seria igual a 30,0 e vazão final não mudaria.

Obs.: Com o deflúvio, calculado pelo método do número da curva (CN) e a vazão de

pico, com base no HUT, ficam definidas as condições necessárias para o

desenvolvimento de projetos hidráulicos, como terraços, bacias de contenção,

barragens e aplicação de modelos para estimativa da perda de solo em bacias

hidrográficas.

9.6.2 Geração do hidrograma de Projeto

O hidrograma de projeto determinado pela metodologia do SCS-USDA, baseia-

se nas premissas do HU e da chuva de projeto, sendo que esta última é trabalhada na

forma de intervalos de tempo menores que o tempo de concentração (tc). Na

realidade, tc é dividido em vários intervalos cumulativos de tempo. A partir das chuvas

intensas calculadas para cada intervalo de tempo acumulado, determina-se, pelo

método CN, a precipitação efetiva acumulada. Por diferença entre valores

consecutivos encontra-se a precipitação efetiva propriamente dita, a qual é aplicada

para determinação do hidrograma de projeto final.

O cálculo das coordenadas do hidrograma de projeto é feito por meio das

equações de convolução na forma matricial, ou seja:

[ ] [ ] [ ]PqQ ×= (33)

A matriz de valores [q] é obtida a partir do HUT, determinando-se as equações

das retas de ascensão e recessão do mesmo. Por meio destas equações, determina-

se a ordenada q para cada intervalo de tempo.

* Ocorreram precipitações nos últimos 5 dias, com o solo saturado, considerando o total precipitado maior que 53 mm, para a época de crescimento, e maior que 28 mm em outro período.

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

Exemplo de Aplicação 9.6

Determine o hidrograma de projeto considerando uma bacia hidrográfica com

tempo de concentração de 100 minutos e área de drenagem de 100ha. O tempo de

retorno para o projeto é de 50 anos e o CN médio para a bacia é igual a 70. A equação

de chuvas intensas a ser aplicada é:

708,0

151,0

)39,9t(

TR1,778i

+=

a) Determinação do intervalo de tempo de simulação ∆t, o qual deve ser múltiplo do

tempo de concentração ou do tempo de pico, ou seja, ≤ 1/5 tc ou ≤ 1/3 tp. A partir

deste intervalo, calculam-se as precipitações efetivas acumuladas pelo método CN. No

exemplo em questão, o intervalo de 10 minutos parece ser um bom valor. Assim,

subdivide-se tc em 10 intervalos acumulados de 10 minutos cada, calculando a

intensidade média máxima e a precipitação total multiplicando a intensidade pelo

respectivo tempo.

T (min) I (mm h-1) Ptotal CN S Pefetiva

acumulada ∆∆∆∆P

10 172.18 28.70 70.00 108.86 0.41 0.41

20 128.26 42.75 70.00 108.86 3.39 2.98

30 104.24 52.12 70.00 108.86 6.62 3.23

40 88.81 59.21 70.00 108.86 9.58 2.96

50 77.95 64.95 70.00 108.86 12.27 2.68

60 69.81 69.81 70.00 108.86 14.71 2.45

70 63.47 74.04 70.00 108.86 16.96 2.25

80 58.35 77.80 70.00 108.86 19.04 2.08

90 54.13 81.20 70.00 108.86 20.99 1.94

100 50.58 84.30 70.00 108.86 22.81 1.83

b) Determinação do HUT

Pu =1,0 mm

A = 1,0 km2

tc6,02td

ta +=

Considerando td = 10min:

min65100*6,02

10ta =+= = 1,0833 hora

13sm 192,00833,1

11208,0qp −=⋅⋅=

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

tr =108 min; tb = 175 min

Baseado na equação da reta tem-se:

002954,0)650(

)192,00(xy

1m =−

−=∆∆= :. t002954,0Q1 ⋅= (para t até 67 min)

001761,0)65174()192,00(

xy

m2 −=−

−=∆∆=

)175t(001761,0Q2 −−= :. 3065,0t001761,0Q2 +⋅−= (para t entre 65 e 175 min).

c) Obtenção das ordenadas do HU (substituição dos valores de t nas equações acima)

t q t q

0 0 95 0.139205

10 0.02954 105 0.121595

20 0.05908 115 0.103985

30 0.08862 125 0.086375

40 0.11816 135 0.068765

50 0.1477 145 0.051155

65 0.19201 155 0.033545

t

Q

Qp (65 ; 0,192)

(175;0)

1 2

(0,0)

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

75 0.174425 165 0.015935

85 0.156815 175 0

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

d) Cálculo do número de ordenadas do hidrograma final e montagem das matrizes. nº valores q =18 .: [q]18x1 nº valores Pef=10 . : [P]27x18 Q =q + Pef - 1 = 27 . : [Q]27x1

0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2.68 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2.45 2.68 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2.25 2.45 2.68 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2.08 2.25 2.45 2.68 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.94 2.08 2.25 2.45 2.68 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 2.25 2.45 2.68 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0

0 1.83 1.94 2.08 2.25 2.45 2.68 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 2.25 2.45 2.68 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 2.25 2.45 2.68 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 2.25 2.45 2.68 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 2.25 2.45 2.68 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 2.25 2.45 2.68 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 2.25 2.45 2.68 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 2.25 2.45 2.68 2.96 3.23 2.98 0.41 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 2.25 2.45 2.68 2.96 3.23 2.98 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 2.25 2.45 2.68 2.96 3.23 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 2.25 2.45 2.68 2.96 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 2.25 2.45 2.68 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 2.25 2.45 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 2.25 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 2.08 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83 1.94 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1.83

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

[q]18x1

Q(t) q(t) 0.0000 0 0.0121 0.02954 0.1123 0.05908 0.3078 0.08862 0.5908 0.11816 0.9530 0.1477 1.3935 0.19201 1.9192 0.17443 2.3696 0.15682 2.7210 0.13921 2.9828 0.1216 3.1148 0.10399 3.1283 0.08638 3.0333 0.06877 2.8380 0.05116 2.5497 0.03355 2.1481 0.01594 1.7471 0 1.3576 1.0210 0.7409 0.5124 0.3307 0.1918 0.0923 0.0292 0.0000

e) Hidrograma Final

0.00

0.50

1.00

1.50

2.00

2.50

3.00

3.50

0 20 40 60 80 100

120

140

160

180

200

220

240

260

Tempo (minutos)

Hid

rogr

ama

Fin

al (m

3 /s)

0

0.05

0.1

0.15

0.2

0.25

HU

(m

3 /s)

Hidrograma Final HUT

Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas

9.7 Referências Bibliográficas

BROOKS, K.N.; FFOLLIOT, P.F.; GREGERSEN, H.M.; DEBANO, L.F. Hydrology and

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RIGHETTO, A. M. Hidrologia e recursos hídricos. São Carlos: EESC/USP, 1998,

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TUCCI, C.E.M. Vazão Máxima e Hidrograma de Projeto. In: TUCCI, C.E.M. (Org.)

Hidrologia: ciência e aplicação. Segunda Edição. Porto Alegre: Ed.

Universidade/ABRH, 2001. p.527-572.

WATSON, I.; BURNETT, A.D. Hydrology – An environmental approach. Boca

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