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69 SANTOS, M. P. dos; CASTRO, C. B. de. Imagens da Educação, v. 2, n. 3, p. 69-78, 2012. AS RELAÇÕES ENTRE ESCOLA E CULTURA SOB O OLHAR DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO: UMA ABORDAGEM SISTÊMICA doi: 10.4025/imagenseduc.v2i3.18274 Marcos Pereira dos Santos* Célia Beatriz de Castro** * Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais – CESCAGE. <[email protected]> ** Universidade Estadual de Ponta Grossa – UEPG. [email protected] Resumo: Este artigo realiza análises crítico-reflexivas acerca das relações existentes entre escola e cultura à luz da Sociologia da Educação. Para tanto, inicialmente, são apresentadas notas históricas sobre o campo de estudo e pesquisa científica denominada Sociologia das Instituições Educacionais Escolares. Em seguida, discorre-se sobre a escola, compreendendo-a como uma instituição de caráter multifuncional. Por fim, traz à discussão o conceito polissêmico da palavra ‘cultura’ e, nesse contexto, as principais dimensões culturais da instituição educacional escolar na sociedade contemporânea: cultura na escola, cultura da escola e cultura escolar. Palavras-chave: Escola. Cultura. Sociologia da Educação. Ciências Sociais Aplicadas. Abstract: The relations between school and culture under the look of the sociology of the education: a boarding systemic. This article has as main objective to effect some analyses critical-reflexives concerning the existing relations between school and culture to the light of the Sociology of the Education. For in such a way, initially brief historical notes on the study field and scientific research called Sociology of the School Educational Institutions are presented. After that, one searchs to discourse on the school, understanding it as an institution of multi- functional character. Finally, we bring to the quarrel the polissemic concept that gravite around the word ‘culture’ and, in this context, the main cultural dimensions of the school educational institution in the society contemporary: culture in the school, culture of the school and pertaining to school culture. Keywords: School. Culture. Sociology of the Education. Applied Social Sciences. Introdução Diante da crise dos paradigmas hegemônicos no campo das Ciências Sociais e das Ciências da Educação e com a crescente introdução das abordagens qualitativas nas pesquisas socioeducacionais, a retomada das investigações científicas sobre as instituições educacionais escolares, no alvorecer dos anos 1990, intensificou-se de forma exponencial, dando destaque especial à abordagem sociocultural, ao seu caráter multidisciplinar e multimetodológico, à sua complexidade e suas possibilidades e limitações. Sob essa perspectiva, o presente artigo apresenta algumas análises crítico-reflexivas acerca das relações entre escola e cultura sob a ótica da Sociologia da Educação, uma vez que essa área do saber possibilita apreender de forma mais abrangente o lugar ocupado pela escola na sociedade contemporânea, levando-se em consideração os aspectos políticos, econômicos e culturais a ela direta e indiretamente atrelados. Sociologia das instituições educacionais escolares: breves notas históricas A Sociologia das Instituições Educacionais Escolares, como campo de estudo e pesquisa científica, surgiu na Inglaterra e nos Estados Unidos, no final da década de 1960, em decorrência da necessidade de se aprofundar o entendimento acerca das relações entre as desigualdades na sociedade civil organizada e os

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    SANTOS, M. P. dos; CASTRO, C. B. de. Imagens da Educao, v. 2, n. 3, p. 69-78, 2012.

    AS RELAES ENTRE ESCOLA E CULTURA SOB O OLHAR DA SOCIOLOGIA DA EDUCAO: UMA ABORDAGEM SISTMICA

    doi: 10.4025/imagenseduc.v2i3.18274

    Marcos Pereira dos Santos*

    Clia Beatriz de Castro**

    * Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais CESCAGE. ** Universidade Estadual de Ponta Grossa UEPG. [email protected]

    Resumo: Este artigo realiza anlises crtico-reflexivas acerca das relaes existentes entre escola e cultura luz da Sociologia da Educao. Para tanto, inicialmente, so apresentadas notas histricas sobre o campo de estudo e pesquisa cientfica denominada Sociologia das Instituies Educacionais Escolares. Em seguida, discorre-se sobre a escola, compreendendo-a como uma instituio de carter multifuncional. Por fim, traz discusso o conceito polissmico da palavra cultura e, nesse contexto, as principais dimenses culturais da instituio educacional escolar na sociedade contempornea: cultura na escola, cultura da escola e cultura escolar. Palavras-chave: Escola. Cultura. Sociologia da Educao. Cincias Sociais Aplicadas. Abstract: The relations between school and culture under the look of the sociology of the education: a boarding systemic. This article has as main objective to effect some analyses critical-reflexives concerning the existing relations between school and culture to the light of the Sociology of the Education. For in such a way, initially brief historical notes on the study field and scientific research called Sociology of the School Educational Institutions are presented. After that, one searchs to discourse on the school, understanding it as an institution of multi-functional character. Finally, we bring to the quarrel the polissemic concept that gravite around the word culture and, in this context, the main cultural dimensions of the school educational institution in the society contemporary: culture in the school, culture of the school and pertaining to school culture. Keywords: School. Culture. Sociology of the Education. Applied Social Sciences.

    Introduo

    Diante da crise dos paradigmas hegemnicos no campo das Cincias Sociais e das Cincias da Educao e com a crescente introduo das abordagens qualitativas nas pesquisas socioeducacionais, a retomada das investigaes cientficas sobre as instituies educacionais escolares, no alvorecer dos anos 1990, intensificou-se de forma exponencial, dando destaque especial abordagem sociocultural, ao seu carter multidisciplinar e multimetodolgico, sua complexidade e suas possibilidades e limitaes.

    Sob essa perspectiva, o presente artigo apresenta algumas anlises crtico-reflexivas acerca das relaes entre escola e cultura sob a

    tica da Sociologia da Educao, uma vez que essa rea do saber possibilita apreender de forma mais abrangente o lugar ocupado pela escola na sociedade contempornea, levando-se em considerao os aspectos polticos, econmicos e culturais a ela direta e indiretamente atrelados. Sociologia das instituies educacionais escolares: breves notas histricas

    A Sociologia das Instituies Educacionais Escolares, como campo de estudo e pesquisa cientfica, surgiu na Inglaterra e nos Estados Unidos, no final da dcada de 1960, em decorrncia da necessidade de se aprofundar o entendimento acerca das relaes entre as desigualdades na sociedade civil organizada e os

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    processos de ensino-aprendizagem que ocorriam nas escolas inglesas e norte-americanas, envolvendo estudantes oriundos de diferentes contextos socioculturais.

    Uma vez que o funcionalismo e as metodologias quantitativas orientaram inicialmente os estudos de tericos da Educao e das Cincias Sociais Aplicadas sobre esse novo campo de pesquisa, desde os anos 1970 as abordagens etnometodolgicas, interacionistas, etnogrficas e historiogrficas competem entre si por espao cientfico nessa rea devido importncia de se compreender a escola e suas dimenses culturais.

    Segundo Derquet (1996), na dcada de 1970, os estudos sobre a Sociologia das Instituies Educacionais Escolares apresentaram concluses bastante contraditrias e, por permanecerem presos a paradigmas normativos e modelos funcionalistas de anlise da realidade escolar, levantaram candentes polmicas sobre sua real importncia como um campo de estudo e pesquisa cientfica. Contudo, foi possvel observar que progressivamente os estabelecimentos de ensino construram uma identidade prpria, sendo capazes, assim, de absorver elementos emanados do exterior e de trabalh-los internamente, reformulando-os por meio de uma dinmica especial que ainda estava por ser investigada e decifrada.

    Desse modo, foi somente no final dos anos 1980 e incio da dcada de 1990 que a Sociologia das Instituies Educacionais Escolares ganhou novo impulso e conquistou um vasto territrio de abrangncia, particularmente com a intensificao do uso de abordagens etnogrficas e etnolgicas na pesquisa educacional. Enquanto as pesquisas quantitativas sugeriam que o cotidiano escolar produzia pouca diferena na vida de estudantes e professores, os estudos etnogrficos, notadamente voltados para as experincias vividas, representaes sociais, significados e percepes dos alunos, revelaram que a vivncia escolar era extremamente importante para aqueles.

    A partir dessas constataes, os estudos sobre os estabelecimentos de ensino passaram a agregar um nmero maior de pesquisadores em diferentes pases, inclusive no Brasil, ampliando-se as suas perspectivas de anlise. Reconhece-se, ento, a [...] necessidade de se aprofundar os processos socioculturais na constituio histrica da identidade das instituies educacionais

    escolares, como condio para se adquirir o seu significado social e sua importncia na vida pessoal e profissional tanto de docentes quanto de discentes. (COULON, 1995, p. 33). A escola como instituio multifuncional

    No campo da denominada sociologia das organizaes, as instituies escolares se configuram como espaos sociais formais e sistemas complexos e burocrticos de cunho multifuncional. No entanto, o interesse pelo desenvolvimento organizacional, aplicado s escolas, partiu de autores norte-americanos com o objetivo de alcanar a melhoria das instituies escolares em termos de funcionamento tcnico-administrativo e gesto pedaggica.

    Ao se considerar a escola como um sistema social composto de partes ou segmentos que formam um todo orgnico (THURLER, 2001), faz-se necessrio refletir sobre a dinmica do cotidiano escolar em seus mltiplos aspectos, pois o pensamento pedaggico contemporneo no pode se esquivar dessa importante tarefa sob pena de cair na superficialidade.

    A escola aparece inicialmente em nossa sociedade como se fosse instituio nica e universal, que trata todos os alunos de forma igualitria e onde se elaboram os conhecimentos e valores sociais, portanto, capaz de preparar os indivduos para a vida em sociedade. Todavia, essa uma concepo superficial e fragmentada que se alicera, principalmente, na ideologia capitalista dominante, uma vez que a escola pode ser entendida, em contrapartida, como redentora, reprodutora ou transformadora da sociedade de classes.

    Embora a escola apresente alguns aspectos conservadores, entendemos ser mais importante perceber no cotidiano escolar seu lado transformador e questionador da sociedade instituda. preciso, pois, ir alm do conservadorismo e descobrir nas relaes cotidianas da escola sua dimenso progressista. Corroborando com Meksenas (1991, p. 135), isso significa dizer que [...] a escola uma instituio social dinmica, tendo em vista que existem no seu interior foras progressistas atuando para a transformao da prpria escola e da sociedade.

    Segundo o autor, as foras progressistas (ativas ou escolanovistas) presentes na escola servem para demonstrar que ela um espao

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    institucional disputado tanto pela classe dominante quanto pela classe trabalhadora, estando a servio dos seus interesses: no primeiro caso, para qualificar mo de obra e torn-la submissa; no segundo caso, para ter acesso a um conhecimento til que possa ajudar a melhorar o padro de vida, o que pode implicar um processo a mais na transformao da sociedade capitalista.

    Alm dessas questes, faz-se necessrio, para fins de anlise, que a estrutura administrativa da escola seja compreendida sob duas perspectivas distintas: por um lado, trata-se de uma instituio social cujas funes no contexto da coletividade global precisam ser consideradas em toda a sua complexidade; em contrapartida, diz-se de escolas, isto , de grupos sociais concretos, constitudos de pessoas cuja interao a essncia da atividade do processo educacional.

    Em outras palavras, isso significa afirmar que:

    Como instituio, a escola, fundamentalmente voltada para a educao, no deixa de se inserir no mercado de trabalho e na configurao poltica nacional, alm de apresentar outras conexes funcionais a serem percebidas ou descobertas. A prpria problemtica da funo educativa da escola no momento atual tem consequncias relevantes para a organizao e gesto dos sistemas escolares e das suas unidades. Como grupos sociais, as escolas tm participantes: alunos, professores, administradores e todas as demais pessoas envolvidas nos processos sociais que se desenvolvem e se intercruzam na escola e em torno dela. Todos eles trazem para a interao escolar as suas motivaes, os seus hbitos individuais e os efeitos das suas vinculaes e experincias extra-escolares. (LENHARD, 1998, p. 17)

    A distino entre a perspectiva institucional,

    voltada para objetivos comuns a servio da sociedade, e a assim chamada perspectiva informal, ou seja, a das relaes humanas entre indivduos e subgrupos, bem conhecida no campo das Cincias da Administrao. Quando se trata de escola, contudo, preciso compreender que nela as relaes humanas no apenas interferem positiva ou negativamente com o trabalho, tal como ocorre nas indstrias,

    nas foras armadas e em muitas outras organizaes; mas que so o trabalho, isto , por seu intermdio se exerce o ensino.

    A escola uma instituio social, ou seja, um conjunto organizado de atividades dependentes da vida coletiva. No entanto, embora parea bvia a sua funo social, a qual concebida por Etzioni (1984, p. 67) como a [...] contribuio que uma atividade parcial d atividade total de que faz parte [...], no to clara assim a definio mais precisa dessa funo. Historicamente, a escola surgiu e continua nos dias atuais em virtude de contribuir para a socializao do saber cientfico e preparar os estudantes para a vida social e o ingresso no competitivo mercado de trabalho.

    Face a essas consideraes, a unidade escolar constitui um sistema de relaes no qual se justapem, sobrepem e subordinam-se sistemas parciais, uns formalmente institudos, outros informalmente surgidos. Ao mesmo tempo, pode ser considerada, ela prpria, como subsistema de um todo maior, quando encarada como componente de uma rede, abrangendo vrias escolas e o respectivo sistema de administrao e apoio. exatamente nessa perspectiva que se verifica, na escola, a coexistncia de funes sociais manifestas e latentes e de diferentes dimenses culturais. Cultura: um conceito polissmico

    A concepo de cultura algo relativamente complexo. A utilizao desse vocbulo gera neologismos e, em certos casos, se realizam associaes imprevistas, como a de funcionrio da cultura. Tal fato resulta, pois, na ampliao indefinida de seu espectro semntico, que por si s abrangente fazendo com que a palavra cultura apresente uma faceta individual e outra coletiva, um plo normativo e outro descritivo, uma nfase universalista e outra diferencialista.

    Sobre essa questo, Camilleri (2007, p. 81) esclarece que:

    Entre os empregos atualmente pertinentes da palavra cultura, encontramos a acepo tradicional, individual, normativa, promocional e perfectiva com uma conotao elitista: a cultura considerada como o conjunto das disposies e qualidades caractersticas do esprito cultivado, isto , a posse de um amplo

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    leque de conhecimentos e competncias cognitivas gerais, uma capacidade de avaliao inteligente e julgamento pessoal em matria intelectual e artstica, um senso da profundidade temporal das realizaes humanas e do poder de escapar do mero presente. Na outra extremidade do campo semntico dessa palavra, temos, ao contrrio, a acepo puramente descritiva e objetiva desenvolvida pelas Cincias Sociais contemporneas: a cultura entendida como o conjunto dos traos caractersticos do modo de vida de uma sociedade, uma comunidade ou um grupo, a compreendidos os aspectos que se podem considerar como os mais cotidianos, triviais ou inconfessveis.

    Dito de outra forma, cultura o termo

    genrico empregado para significar duas acepes diferentes, a saber: de um lado, o conjunto de costumes, crenas, hbitos e realizaes de um povo numa determinada poca histrica; e, de outro lado, tudo o que diz respeito s artes, erudio e s demais manifestaes mais sofisticadas do intelecto e da sensibilidade humana, consideradas coletivamente (KNECHTEL, 2005). Assim sendo, cultura um estilo de vida prprio, um modo particular de vida que todas as sociedades possuem e que caracteriza cada uma delas. Todavia, esse um conceito amplo de cultura, no tendo como principal objetivo a organizao em si, mas toda a sociedade e os sujeitos que a compem.

    Uma vez que a cultura de um povo pode ser definida como um padro de pressupostos bsicos aprendidos para a resoluo de problemas de adaptao externa e integrao interna, o termo cultura pode ser concebido, em linhas gerais, como tudo o que se refere a valores, condutas, conhecimentos e saberes que permitem aos homens orientar e explicar seu modo de sentir e atuar no mundo. Em outras palavras, pode-se dizer que cultura se constitui num conjunto de smbolos (normas, regras, modos de pensar e fazer, etc.) que confere ao indivduo e tambm ao grupo social uma identidade prpria, possibilitando distinguir um grupo de outro por meio de suas aes concretas.

    Nesse contexto, cultura pode ser compreendida ainda como herana coletiva; patrimnio intelectual e espiritual; conjunto das maneiras de viver caractersticas de um grupo

    humano, num dado perodo histrico; acumulao e cristalizao de toda experincia individual ou coletiva que nos precede, ultrapassa e institui enquanto sujeitos humanos.

    Ao considerarmos cultura como um [...] todo complexo que inclui os saberes, as crenas, as artes, a moral, as leis, os costumes e outras tantas capacidades adquiridas pelo homem enquanto membro da sociedade (CERTEAU, 1995, p.141), faz-se necessrio atentar para o fato de que alguns aspectos da cultura do passado sobrevivem, de certo modo, no presente como elementos ainda ativos e diretamente carregados de valor, sentido e significado. A instituio educacional escolar e suas dimenses culturais

    Ao longo das duas ltimas dcadas, cresceu a necessidade de superar os impasses tericos e metodolgicos das pesquisas cientficas que focalizam as instituies educacionais escolares e de buscar alternativas terico-metodolgicas para alm do j produzido, sem, no entanto, negar totalmente proposies e saberes que muitos dos estudos revelaram. Aprofunda-se, assim, o entendimento de que as escolas no podem ser analisadas fora do tempo e do lugar onde atuam, no qual influem tanto as necessidades e os interesses da sociedade quanto as prprias aes, os significados e as experincias individuais e coletivas das pessoas que passam pelos bancos escolares.

    Se as instituies educacionais escolares cumprem, por um lado, funes sociais determinadas, elas igualmente se modificam independentemente dessas determinaes pois so moldadas e construdas pela histria sociocultural e profissional de seus personagens, com suas vivncias, experincias, utopias, realizaes e possibilidades (TURA, 2000).

    Toma-se, pois, esse momento, como uma etapa de superao e aprofundamento no campo de estudos culturais sobre os estabelecimentos escolares, no qual inter-relaes tericas e metodolgicas so ampliadas ou reduzidas em propostas de pesquisas cientficas mais ou menos abrangentes. Numa tentativa ainda provisria, pode-se dizer que tais pesquisas tendem a priorizar trs dimenses culturais bsicas, a saber: a cultura na escola, a cultura da escola e a cultura escolar. E sobre essas dimenses culturais que passaremos, a partir de agora, a

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    discorrer de forma crtico-reflexiva, tendo como pano de fundo a Sociologia da Educao. Cultura na escola

    Nesta dimenso cultural, encontram-se estudos e pesquisas cientficas que procuram [...] examinar nos estabelecimentos escolares as caractersticas ou manifestaes socioculturais especficas ou a diversidade e as diferenas tnico-culturais marcantes entre o corpo docente e discente (DAYRELL, 1999, p. 21).

    Os pesquisadores da cultura na escola so movidos, entre outros aspectos, por questes sobre como se diferenciam as formas de apreenso de uma cultura hegemnica por grupos culturais diversos, que marcas de identidade so engendradas nas relaes socioculturais entre professores e alunos, e como a escola ressignificada por diferentes grupos culturais. Os estudos sobre essas temticas tomam para anlise escolas que renem estudantes de minorias raciais, imigrantes, adolescentes e jovens oriundos de subrbios e favelas, e, ainda, escolas de sindicato e escolas de bairros com caractersticas culturais especficas.

    Em linhas gerais, pode-se dizer que o interesse central da dimenso cultural em questo est basicamente na descrio das manifestaes de uma ou mais culturas no interior da escola e na anlise de suas relaes com o institudo da cultura escolar hegemnica. Como lembra McLaren (1997), historicamente poucos estudos no Brasil, em especial, tm-se preocupado com as questes culturais, uma vez que s recentemente novas possibilidades de pesquisa cientfica se abrem nesse campo, orientadas para aspectos do multiculturalismo (ou diversidade cultural).

    Nesse contexto, todo o fenmeno da emigrao no Brasil e suas relaes com a educao e a escola se apresentam, em nosso entendimento, como campo frtil de mltiplas narrativas, a ser escrutinado, analisado e realmente desvelado. Dizemos isso, porque grande parte dos estudos que focalizam a cultura na escola tem sido realizada nos Estados Unidos e em pases europeus e anglo-saxes.

    Em termos metodolgicos, esses estudos privilegiam os processos, as experincias, as relaes e um conjunto sistemtico de manifestaes que revelam como diferentes expresses culturais se interagem a outras no

    cotidiano da vida escolar e demarcam a identidade distintiva de grupos sociais especficos, tanto no nvel cultural quanto no simblico. So, de acordo com Lopes (2006, p. 55), [...] estudos etnogrficos que requerem de seis a doze meses de observao da vida escolar e, em especial, dos componentes tnico-culturais investigados que ali se manifestam. Todavia, a observao abrange, segundo o autor, diferentes espaos e situaes escolares, como a sala de aula, atividades de lazer ao redor da escola, os corredores, discusses regulares em grupo, entrevistas informais, dirios, a presena em sesses de orientao educacional, longas conversas com os pais e com antigos e novos professores da escola.

    Uma vez que a dimenso comparativa nesses estudos fundamental, exige-se do pesquisador a escolha de um grupo menor de participantes que se possa contrapor ao grupo principal, objeto de investigao. Por essas razes, o nmero de participantes do grupo principal no deve ser muito extenso, sendo menor ainda o nmero dos componentes do grupo comparativo. Diante do exposto, faz-se necessrio destacar a importncia de se procurar apreender, pelos sujeitos estudados, a cultura e o seu saber local, bem como as diferentes formas de penetrao dessa cultura no cotidiano da vida escolar e da sala de aula. A descrio compreensiva das caractersticas scio-histricas e culturais da cidade, vila, bairro ou aglomerado onde a escola se localiza torna-se, pois, essencial para contextualizar as questes culturais e os grupos sociais examinados, em um universo mais amplo. Cultura da escola

    As pesquisas cientficas voltadas para a compreenso da chamada cultura da escola buscam dar visibilidade ao que se denomina ethos cultural de um estabelecimento de ensino, sua marca ou identidade cultural, constituda por caractersticas ou traos culturais que so transmitidos, produzidos e incorporados pela e na experincia vivida no cotidiano escolar.

    Para que se possa compreender o significado de cultura da escola, Forquin (1993, p. 167) chama a ateno para o fato de que, entre outras questes, [...] a escola tambm um mundo social, que tem suas caractersticas de vida prprias, seus ritmos e ritos, sua linguagem, seu

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    imaginrio, seus modos prprios de regulao e transgresso, e seu regime prprio de produo e gesto de smbolos.

    Dessa forma, a investigao da cultura da escola se confunde, muitas vezes, com os estudos sobre a identidade da escola, e surge da necessidade de se responder ao seu carter complexo e multidimensional, exigindo, portanto, uma abordagem de pesquisa que multirreferencial, multipolar e interdisciplinar. Analiticamente, pode-se dizer que esse tipo de pesquisa exige uma abordagem meso, isto , uma metodologia situada entre as anlises tradicionalmente denominadas de micro ou macroestruturas escolares.

    Assim sendo, nesse tipo de estudo, o olhar do pesquisador se dirige para os processos mais particulares e contingentes da escola, privilegiando as anlises culturais do cotidiano, os acontecimentos, as interaes sociais, as relaes de poder, as vivncias escolares e os saberes construdos, reproduzidos e transformados no seu interior, que fazem dessas escolas instituies educacionais marcadamente diferentes de outras (ROCKWELL; EZPELETA, 1985). Busca-se, dessa forma, apreender o estruturante da cena escolar, a dinamicidade particular que produz a configurao escolar singular sem, no entanto, descartar o institudo; uma vez que a escola, como integrante de formaes sociais historicamente situadas, se constri tambm nas inter-relaes que seus atores estabelecem com as polticas pblicas e a cultura cientfica (Cincias da Educao).

    Para Cardoso (2001, p. 93), metodologicamente, a cultura da escola pode ser identificada por quatro diferentes subculturas, a saber:

    1) cultura das normas ou cultura poltica: se manifesta nas formas de normatizao da educao, e se materializa nas normas, regras de funcionamento e na organizao formalizada em burocracias institucionais. Constitui assim uma subcultura da cultura nacional que se expressa nas polticas pblicas de educao, sendo, pois, mediadora entre o poder institudo, os alunos e os professores; 2) cultura estruturalista: se expressa nos modelos institudos de funcionamento da escola, e se concretiza na escola real, resultado das prticas pedaggicas

    construdas pela experincia e prtica profissional dos atores escolares; 3) cultura interacionista: nasce das interaes sociais e integra os atores escolares (professores, alunos e famlias) numa cultura prpria, invisvel e distinta da escola real; e 4) cultura cientfica ou cultura pedaggica: diz respeito ao conhecimento produzido pelas Cincias da Educao, aos corpos de saberes que se expressam nas publicaes cientficas, nos manuais e nas prticas pedaggicas.

    Assim, a cultura da escola surgiria como um

    produto das reas de interseo entre essas quatro subculturas, exigindo, pois, uma espcie de desenho metodolgico que viesse abranger todas elas.

    Para se dar conta dessa complexidade analtica e metodolgica, os estudos sobre cultura da escola tm-se utilizado de abordagens etnogrficas mais abrangentes, de longa durao, necessrias realizao do esforo intelectual que Geertz (1989, p. 15) denomina descrio densa das caractersticas singulares da escola. Nesta, segundo o autor, se articulam uma multiplicidade de fenmenos presentes no cotidiano escolar, se constroem e se apreendem os sentidos atribudos vida escolar, as teias de significados compartilhados pelos seus atores, os detalhes do dia a dia que configuram a lgica informal da vida escolar e o ethos cultural da escola.

    Diante dessas questes, o institudo, o vivido e o construdo compem as dimenses principais que permitiro desvelar, em profundidade, o familiar e o desconhecido da cultura e da vida das instituies educacionais escolares. Tais estudos requerem do pesquisador, alm de observaes de fatos e ocasies pontuais, uma longa imerso no campo de pesquisa, a vivncia diria e prolongada da experincia escolar e da vida da escola, registrada em dirio de campo, em questionrios e entrevistas, em materiais e artefatos variados etc. Alm disso, exigem tambm a utilizao de diferentes procedimentos de coleta de informaes, os quais, consequentemente, geram uma grande quantidade e variedade de dados empricos.

    Entretanto, esse conjunto de situaes coloca o pesquisador diante de questes centrais ao longo do processo de recolhimento e anlise

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    interpretativa das informaes. Estas dizem respeito incorporao ou ao abandono dos dados coletados e importncia da perspectiva terica para enfrentamento dessa deciso, ao dilema do maior ou menor distanciamento ou do envolvimento do pesquisador com os atores e a dinmica da escola estudada, sensibilidade do pesquisador para estabelecer contato direto e, muitas vezes, perturbadores com detalhes da vida dos sujeitos informantes e situaes que vivencia, e s questes ticas que perpassam esse tipo de pesquisa. Dizemos isso porque concordamos com Demo (1985) ao afirmar que a pesquisa tambm uma forma de conduta e experincia moral, cujas consequncias refletem inevitavelmente a qualidade do tipo de situao humana em que foram produzidas. Cultura escolar

    Os estudos que tm o foco de investigao cientfica na cultura escolar tendem a privilegiar as transformaes e impregnaes que constituem a vida escolar, reconstituindo a trajetria histrica e social de instituies educacionais escolares, a partir de recortes espao-temporais mais demarcados. Busca-se identificar a presena de um ethos escolar na maneira de ser, agir, sentir, conceber e representar a vida escolar, as vivncias de alunos e professores que passaram por um estabelecimento de ensino, num determinado momento histrico (CAMARGO, 2000).

    Em outras palavras, isso significa dizer que, nesta dimenso cultural, central a trama das relaes e interaes sociais, as experincias pessoais e profissionais vividas por seus atores considerados, porm, em cenrios e configuraes que se corporificam em memrias e legados socioculturais familiares, polticas educacionais, concepes de formao, conhecimentos, processos didticos, tcnicas pedaggicas especficas, representaes sociais, sentidos e significados sobre o papel da escola e de seus atores na sociedade. Esses estudos, todavia, ganham dimenses sociais e culturais mais abrangentes ao relacionarem a trajetria de escolas e de seus agentes ao movimento das ideias e prticas pedaggicas que predominam na sociedade e no meio educacional, em determinada poca histrica.

    Mas, afinal, o que se entende por cultura escolar?

    Na concepo de Julia (2001, p. 10), a cultura escolar instituda e construda social e historicamente ao longo de um determinado perodo pode, sumariamente, ser descrita como:

    [...] um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar; ou ainda, um conjunto de prticas que permitem a transmisso de conhecimentos e a incorporao de comportamentos, normas e prticas, coordenadas a finalidades (religiosas, sociopolticas ou simplesmente de socializao) que podem variar segundo as pocas histricas.

    Essa afirmao, em linhas gerais, leva-nos ao

    entendimento de que:

    A cultura escolar supe necessariamente uma relao entre os materiais culturais disponveis num determinado momento histrico e social. Alm disso, ela realiza um trabalho de reorganizao, reestruturao e transposio didtica para tornar os contedos curriculares assimilveis pelos alunos. Nesse contexto, vale destacar ainda que outro elemento constitutivo da cultura escolar a interiorizao, pois se trata de saber de modo que o saber se incorpore ao indivduo sob forma de esquemas operatrios ou habitus. (CERTEAU, 1995, p. 33).

    A realizao de um recorte cronolgico

    torna-se, pois, fundamental nessas investigaes cientficas, na medida em que contemplam trs elementos essenciais cultura escolar: o espao especfico da escola, os cursos graduados em nveis e o corpo profissional.

    Dessa forma, a cultura escolar no pode ser analisada sem levar em conta o corpo profissional dos agentes escolares (professores, educadores e demais profissionais da escola) chamados a cumprir normas e ordens, e a utilizar os dispositivos pedaggicos disponveis. Para alm dos limites da escola, o pesquisador, nesse contexto, deve se preocupar em identificar modos de pensar e agir, largamente difundidos em grupos sociais formalmente escolarizados, em contraposio s culturas familiares.

    Forquin (1993, p. 167) alerta-nos para o fato de no se confundir, portanto, o conceito de cultura da escola com o de cultura escolar,

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    uma vez que esta ltima pode ser concebida como o [...] conjunto de contedos cognitivos e simblicos que, selecionados, organizados, normalizados e rotinizados, sob o efeito dos imperativos de didatizao, constituem habitualmente o objeto de uma transmisso deliberada no contexto das escolas. Esse entendimento de cultura escolar tem, segundo o autor, condicionado muitos pesquisadores envolvidos com a histria das culturas escolares a priorizarem trs diferentes eixos temticos de investigao cientfica, a saber: 1) as normas e finalidades que regem a escola; 2) a avaliao do papel desempenhado pela profissionalizao do trabalho do educador ao longo da histria da educao; e 3) a anlise histrica das prticas pedaggicas e dos contedos curriculares ensinados no mbito escolar.

    Todavia, em termos metodolgicos, tais estudos transitam de forma pioneira pela histria cultural das prticas escolares, tentando apreender a memria escolar de uma poca, reunida em diferentes fontes histricas, como por exemplo: fotografias, poesias, tarefas e exerccios escolares escritos, cadernos de notas tomadas pelos alunos, cpia de exames escolares e concursos pblicos, dirios e biografias escolares, correspondncias e revistas da escola, arquivos e atas de reunies escolares, discursos e saudaes, notcias sobre a vida escolar em jornais locais ou arquivos pblicos e pessoais, prticas escolares reunidas em documentos oficiais, artefatos reunidos em museus de educao, manuais e textos escolares, histria oral, memria viva de professores e demais profissionais da educao entre outras.

    A ttulo de esclarecimento, interessante salientar ainda que muitos dos estudos sobre cultura escolar que vem sendo realizados por pesquisadores franceses, ingleses, portugueses e brasileiros, desde a dcada de 1970 at os dias atuais, tm privilegiado o recolhimento e a organizao de diversos documentos histricos, materiais impressos e registros escritos guardados em arquivos, prateleiras e armrios escolares (DERQUET, 1996). Devido disperso espacial dessas fontes histricas, dedica-se normalmente um bom tempo da pesquisa cientfica identificao, triagem e coleta do material mais adequado aos objetivos propostos nos estudos. O pesquisador, nesse sentido, enfrenta igualmente outra questo crucial, a saber: o pssimo estado de conservao

    em que muitos dos documentos histricos se encontram, exigindo assim cuidados especiais e manuseio adequado.

    Sem a pretenso de esgotar o assunto em pauta, vale enfatizar que a questo central que se coloca na realizao de pesquisas cientficas de vis histrico, etnogrfico e historiogrfico a de como conhecer a trajetria de uma escola, perceber a dinmica de seus ciclos de vida e caracterizar sua identidade e seu papel social no movimento da sociedade na qual se insere, das polticas pblicas educacionais e das ideias pedaggicas que orientam a formao e a prtica docente em um determinado momento histrico. Essas reflexes demonstram, portanto, o crescente interesse de pesquisadores de diferentes nacionalidades pelo campo de estudo acerca da escola e suas dimenses culturais no contexto da sociedade contempornea, o que fundamental para o desenvolvimento tanto das Cincias da Educao quanto para o das Cincias Sociais Aplicadas em geral. Consideraes finais

    medida que este artigo ia adquirindo forma e sentido, fortalecia-se cada vez mais a concepo de que existe, incontestavelmente, uma relao orgnica entre escola e cultura. uer se tome a palavra educao no sentido amplo, de formao e socializao do indivduo, quer se a restrinja unicamente ao domnio escolar, necessrio reconhecer que se toda educao sempre de algum por algum ela supe necessariamente a comunicao, transmisso e aquisio de conhecimentos, competncias, crenas, hbitos e/ou valores, que constituem o que se chama precisamente de contedo da educao.

    Uma vez que esse contedo que se transmite na educao sempre alguma coisa que nos precede, ultrapassa e institui enquanto sujeitos humanos, possvel perfeitamente dar-lhe o nome de cultura; concebendo-a como uma herana e um bem social comum, um patrimnio de conhecimentos, competncias, instituies, valores e smbolos constitudos ao longo de geraes e caractersticos de uma comunidade humana particular, definida de modo mais ou menos amplo e exclusivo. (MEKSENAS, 1991).

    Nesse sentido, pode-se dizer que a cultura o contedo substancial da educao, sua fonte e

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    SANTOS, M. P. dos; CASTRO, C. B. de. Imagens da Educao, v. 2, n. 3, p. 69-78, 2012.

    justificao ltima, ou seja, a educao no nada fora da cultura e sem ela. De forma recproca, acreditamos que pela e na educao, por meio do trabalho paciente e continuamente recomeado de uma tradio docente que a cultura se transmite e se perpetua, pois a educao realiza a cultura como memria viva, reativao incessante e sempre ameaada, fio precrio e promessa necessria da continuidade humana. Isso significa afirmar que tanto educao e cultura quanto escola e cultura aparecem como duas faces rigorosamente recprocas e complementares de uma mesma realidade, isto , uma no pode ser pensada sem a outra e toda reflexo sobre uma desemboca imediatamente na considerao da outra.

    No contexto dessas discusses, a Sociologia das Instituies Educacionais Escolares tem se configurado, portanto, como um campo promissor de estudos e pesquisas cientficas que rene, sob a abordagem sociocultural, diferentes dimenses terico-metodolgicas e uma bagagem de conhecimentos amplos, complexos e instigantes, ganhando, dessa forma, um nmero cada vez maior de adeptos entre pesquisadores de vrios pases.

    Mesmo apresentando poucas edificaes, muitos avanos foram identificados neste campo de pesquisa nas duas ltimas dcadas. O maior deles est na substituio de uma concepo compacta, uniforme, homognea e generalista da escola para uma viso histrica, multidimensional, pluralista e diversificada; ainda que abordada a partir de consensus ou ethos culturais unificadores, que se mantm ou se transformam ao longo da histria, alterando, consequentemente, o significado sociocultural e a importncia pessoal atribuda escola e suas dimenses culturais por parte de autoridades governamentais, professores, alunos e comunidade em geral. Contudo, essas transformaes se processaram tambm nas abordagens metodolgicas utilizadas pelos estudiosos da cultura na escola, da cultura da escola e da cultura escolar, privilegiando-se os mtodos qualitativos e a integrao de diferentes instrumentos e procedimentos analticos, ampliando assim o repertrio de questes e respostas nesse campo de estudo, com vistas obteno de um conhecimento descritivo, intersubjetivo e compreensivo.

    Face ao exposto, no se pode negar a ocorrncia de maior autonomia na investigao

    da natureza social e cultural dos estabelecimentos de ensino, nem tampouco a existncia de condies mais adequadas para a construo de uma teoria sociolgica das instituies educacionais escolares, que necessariamente passa pela investigao da identidade sociocultural das escolas. Nesse sentido, coloca-se para o pesquisador do campo da cultura e dos estabelecimentos escolares a necessidade de responder ao carter complexo e multidimensional da escola, cuja transversalidade aponta para uma desejvel integrao entre as Cincias Sociais Aplicadas e as Cincias da Educao com as demais reas correlatas do saber. Referncias CAMARGO, M. A. Coisas velhas: um percurso de investigao sobre cultura escolar (1928-1958). So Paulo: Editora da UNESP, 2000. CAMILLERI, C. Antropologia cultural da educao. So Paulo: Rideel, 2007. CARDOSO, T. M. A cultura da escola e a profisso docente: inter-relaes. 2001. 145 f. Tese (Doutorado em Educao) Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2001. Mimeografado. CERTEAU, M. A cultura no plural. 2.ed. So Paulo: Papirus, 1995. (Coleo Travessia do Sculo). COULON, A. Etnometodologia e educao. Petrpolis: Vozes, 1995. DAYRELL, J. Mltiplos olhares sobre educao e cultura. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 1999. DEMO. P. Elementos metodolgicos da pesquisa participante. In: BRANDO, C. R. (Org.). Repensando a pesquisa participante. 2.ed. So Paulo: Brasiliense, 1985. p. 104-130. DERQUET, J. L. O funcionamento dos estabelecimentos de ensino na Frana: um objeto cientfico em definio. In: BARROSO, J. (Org.). O estudo da escola. Lisboa: Porto, 1996. p. 11-25.

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    Recebido em: 17/08/2012 Aceito em: 02/10/2012