z dissertação - joaquim (com comentários de 16-08-2016)
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPICENTRO DE CIÊNCIAS DA NATUREZA – CCN
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FÍSICAMESTRADO EM FÍSICA
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: DISPÓSITIVOS ELETRÔNICOS ORGÂNICOS
APLICAÇÃO DA TÉCNICA DE CARACTERIZAÇÃO ÓPTICA PORELIPSOMETRIA AO ESTUDO DAS PROPRIEDADES DE SUBSTRATOS
TRANSPARENTES, METÁLICOS E POLIMÉRICOS
TERESINA – PI2014
JOAQUIM BRASIL DE LIMA FILHO
APLICAÇÃO DA TÉCNICA DE CARACTERIZAÇÃO ÓPTICA PORELIPSOMETRIA AO ESTUDO DAS PROPRIEDADES DE SUBSTRATOS
TRANSPARENTES, METÁLICOS E POLIMÉRICOS
TERSINA – PI2014
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JOAQUIM BRASIL DE LIMA FILHO
APLICAÇÃO DA TÉCNICA DE CARACTERIZAÇÃO ÓPTICA PORELIPSOMETRIA AO ESTUDO DAS PROPRIEDADES DE SUBSTRATOS
TRANSPARENTES, METÁLICOS E POLIMÉRICOS
Dissertação apresentada à UniversidadeFederal do Piauí (UFPI) para a obtenção do
título de Mestre em Física junto ao programade Pós-Graduação Strictu Sensu em Física,área de concentração Eletrônica Orgânica.Linha de pesquisa: caracterização óptica.
Orientador: Prof. Dr. Ángel Alberto Hidalgo
TERESINA – PI2014
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FOLHA DE APROVAÇÃO
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Dedico este trabalho aos alunos de graduação e de pós-graduação que me sucederãoneste grupo de pesquisa. O texto desta dissertação foi desenvolvido com o máximo de rigorpossível, observando-se a norma culta do vernáculo e com o cuidado de torná-lo o maistransparente possível, de maneira a torná-lo acessível e facilitador da aquisição doconhecimento. Tenho a esperança de que este trabalho não fique obsoleto, e de que sejaatendido seu real propósito, que é transmitir o conhecimento adquirido ao longo de dois anosde estudo, reunindo e resolvendo os principais problemas cujas soluções não são de fácilacesso na literatura. Espero conseguir também transmitir ao estudante o espírito de auto-questionador quando vier a se deparar diante das mais diversas situações físicas. Por fim,espero conseguir transmitir ao leitor, por meio deste trabalho, a ideia de que todas asdificuldades são contornáveis, e que a persistência aguça a sensibilidade do experimentadorno sentido de torná-lo cada vez mais capaz de solucionar seus problemas.
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AGRADECIMENTOS
Agradeço, em primeiro lugar, à minha família, em especial aos meus pais, por todo oimensurável apoio, incentivo e devoção a mim dispensado neste período da minha formação.Agradeço também à minha irmã Hábbia pelo carinho pelos cuidados dedicados durante nossaconvivência.
Agradeço à Universidade Federal do Piauí por proporcionar toda a infraestrutura naqual este trabalho foi desenvolvido e onde eu tive o prazer de acumular grande parte doconhecimento que estabeleci até hoje. Agradeço também às agências CAPES, FAPEPI, CNPq,FINEP e INEO pelo fomento à pesquisa que resultou este trabalho.
Agradeço aos meus professores que conseguiram me fazer compreender novassituações da natureza e analisá-las da maneira como um físico deve fazer. A eles agradeçopelo conhecimento compartilhado. Em especial, agradeço ao professor Ángel pela excelenteconvivência, pela sua postura, seriedade e compromisso como orientador, pelo tempodedicado a mim nos meus momentos de maiores dificuldades. Agradeço também aosprofessores José Pimentel, Valdemiro, Cleânio, Letícia, Célio, Mônica, Renato Germano, pelaindescritível e grandiosa contribuição na minha formação pessoal e intelectual.
Agradeço ao meu amigo Rawlinson Medeiros Ibiapina pela sua parceria e pela suainquestionável amizade que me proporcionou um engrandecimento profissional semprecedentes.
Agradeço à FAPEPI e ao INEO por todo o apoio financeiro e pelas oportunidades amim oferecidas.
Agradeço às pessoas que fazem acontecer os mais importantes (para mim) espaços dauniversidade: Assis e sua turma; aos companheiros de trabalho Alisson, Maria, Maykol,Hunos, Patrésio, Janaira, Dolores, D. Francinete, Eugênia e Rute.
Agradeço muito aos meus companheiros de trabalho Alisson e Maria de Lurdes, peladedicação e por compartilharem comigo caríssimas partes de seu tempo, me ajudando e meensinando um pouco e inesquecível do conhecimento da química.
Por fim, mas sem menos respaldo, e com o maior carinho que pode brotar de mim,agradeço à minha namorada Marina Luz por estar ao meu lado em todos os momentos desteestudo, demonstrando atenção e compreensão nos meus momentos de maiores dificuldades.Agradeço a ela por seu imenso interesse em entender como é minha pesquisa e pelo carinhoao sugerir novos procedimentos nos momentos em que eu não via mais solução. Agradeço portudo ao mesmo tempo que peço-lhe desculpas pela minha ausência nos momentos em que eume dediquei arduamente ao projeto de finalizar meu mestrado.
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Aprendi neste biênio a olhar a evolução históricada ciência e perceber que, mesmo diante de tão grandiosoprogresso, ainda não é possível falar em uma verdadecientífica. Tudo não passa de especulação, mesmo quandose trata de uma teoria tão bem fundamentada a ponto decausar medo seu questionamento. Aprendi que o papel docientista é encarar uma realidade desconhecida e elaborarmodelos para compreendê-la e saciar a sede deexplicações. Aprendi que saciar tal sede significa torná-lamais crítica, pois a solução de cada problema éacompanhada pelo surgimento de outros tantos, gerandoum efeito catastrófico, ou seja, que gera indefinidamentenovos desafios. Aprendi que compartilhar o sucesso deuma criação científica pode gerar benefícios nos maisdiversos campos socioeconômicos e, portanto, esse é opapel primário do pesquisador, um compromisso quedevemos seguir para proporcionar evolução à sociedade.
vi
RESUMO
No presente trabalho, estudou-se a obtenção de polianilina (PAni) por meio de uma
rota enquadrada como síntese química. A partir do pó da PAni e do solvente N-metil-2-
pirrolidona (NMP) foram geradas soluções de diferentes concentrações, as quais foram base
para a confecção de filmes finos depositados pelo método casting em substratos de vidro,
quartzo e de ouro. Desenvolveu-se, com sucesso, um método controlado de confecção de
filme que permitisse estimar, com certa margem de segurança, sua espessura. O estudo das
propriedades ópticas dos filmes finos de PAni, bem como dos substratos em questão, se deu
por meio da técnica de elipsometria. A técnica mostrou-se robusta na descrição das
propriedades de todos os sistemas analisados. A medida elipsométrica sobre o filme mais
espesso, por exemplo, gerou um padrão de interferência por meio do qual elaborou-se um
método original de estimativa, com grande precisão, de espessura de filme em casos
semelhantes. O ajuste teórico segundo o modelo de Sellmeier para as medidas elipsométricas
nos substratos de materiais transparentes mostrou-se bastante eficaz. Uma boa caracterização
das propriedades do ouro foi obtida mediante o uso do modelo de Drude em adição a três
osciladores de Lorentz correspondentes as transições intrabandas. Propõe-se neste estudo a
aplicação do modelo de Tauc-Lorentz para os ajustes teóricos sobre as medidas elipsométricas
em filmes de PAni. Observou-se, a partir da análise das medidas elipsométricas, que os
parâmetros do modelo de Tauc-Lorentz usados para ajustes teóricos assumem valores
diferentes para diferentes espessuras dos filmes de PAni e também para os diferentes
substratos de deposição dos filmes.
Palavras-chave: elipsometria, polianilina, ouro, vidro, quartzo, substrato, caracterização
óptica, filmes finos.
vii
ABSTRACT
In this work it was studied the obtention of polyaniline (PAni) by means of a route had
as chemical synthesis. From the PAni powder and the N-methyl-2-pyrrolidone (NMP) it was
generated solutions of different concentrations, which were used to create thin films coated by
casting on glass, quartz, and gold substrates. It was developed, successfully, a controlled
method for the confection of films which allowed one to estimate, with a certain degree of
certainty, its thickness. The study of optical properties of the thin films of PAni, as well as the
considered substrates, was done by ellipsometry, which showed to be very powerful for the
description of the properties of all the analyzed systems. The ellipsometric measurement on
the thicker film, for instance, generated an interference pattern from which an original method
for estimating, with high accuracy, thickness was developed for similar cases. The theoretical
fitting according to the Sellmeier model for ellipsometric measurements on transparent
materials substrates showed to be very efficient. A good characterization on the gold
properties was obtained from the use of the Drude model in addition to three Lorentz
oscillators related to intraband transitions. It is proposed here the application of the Tauc-
Lorentz for theoretical fittings on the ellipsometric measurements of PAni films. It was
observed, from the analysis of the ellipsometric measurements, that the used models of Tauc-
Lorentz for PAni assumes different parameters values for different thickness of the films or
different substrates where they are coated.
Keywords: ellipsometry, polyaniline, gold, glass, quartz, substrate, optical characterization,
thin films.
SUMÁRIO
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS x
INTRODUÇÃO........................................................................................................1
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA........................................................................41.1 O Primeiro Período da Óptica..............................................................................41.2 O Segundo Período da Óptica..............................................................................91.2.1 A Consolidação Matemática da Óptica Geométrica..........................................101.2.2 Primeira Evidência do Comportamento Ondulatório da Luz: a Difração.........101.2.3 Isaac Newton e a Ambivalente Natureza da Luz..............................................111.2.4 A Luz de Huygens.............................................................................................121.2.5 A Velocidade da Luz..........................................................................................121.2.6 Young e a Polêmica Experiência da Fenda Dupla.............................................131.2.7 Fresnel: um Aliado de Young............................................................................131.2.8 A Polarização da Luz.........................................................................................141.2.9 A Velocidade da Luz Medida na Terra..............................................................141.2.10 A Luz é uma Onda Eletromagnética................................................................161.2.11 Propriedades Ópticas dos Materiais................................................................171.2.12 Os Fótons........................................................................................................171.3 De Que é Feita a Matéria?....................................................................................171.3.1 Os Gregos Antigos e a Constituição da Matéria...............................................181.3.2 A Civilização Renascentista e a Matéria no Renascimento...............................201.3.3 O Estabelecimento do Átomo Químico............................................................221.3.4 O Atomismo Físico...........................................................................................26
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA................................282.1 Propriedades Elétricas e Magnéticas dos Materiais.............................................282.2 As Equações de Maxwell.....................................................................................302.3 Ondas Eletromagnéticas no Vácuo......................................................................332.4 A Estrutura da Matéria.........................................................................................342.5 O Campo Elétrico nos Materiais..........................................................................362.6 Continuidade e Descontinuidade de Campos em Interfaces................................392.7 Ondas Eletromagnéticas em Materiais Lineares Transparentes...........................422.8 Luz Refletida e Refratada na Interface de Materiais Lineares Transparentes......452.9 Luz Refletida e Refratada na Interface de Materiais Lineares NãoTransparentes.............................................................................................................522.10 Modelos Ópticos................................................................................................542.10.1 A Dispersão Normal e a Equação de Cauchy..................................................552.10.2 A Dispersão Anômala e o Modelo de Sellmeier..............................................562.10.3 O Modelo Mecânico de Helmholtz.................................................................582.10.4 O Modelo de Lorentz......................................................................................612.10.5 Propriedades Ópticas dos Metais: O Modelo de Drude..................................662.10.6 O Modelo Drude-Lorentz................................................................................692.10.7 O Modelo de Tauc-Lorentz.............................................................................702.11 A Conexão Entre a Teoria Eletromagnética da Luz e a Óptica..........................71
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA.........................................................................733.1 Configurações de um Elipsômetro.......................................................................733.2 Caracterização Elipsométrica das Propriedades Ópticas de Substratos...............753.3 Caracterização Elipsométrica das Propriedades Ópticas de EstruturasEstratificadas..............................................................................................................793.4 O Elipsômetro GES5-E........................................................................................813.5 Modelos Matemáticos (Materiais Isotrópicos).....................................................833.6 Vantagens e Desvantagens do Formalismo de Jones...........................................843.7 O Formalismo de Mueller....................................................................................863.8 Vantagens e Desvantagens da Elipsometria.........................................................88
CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA........................................................................904.1 Limpeza de Materiais e Equipamentos................................................................904.1.1 Limpeza de Vidrarias Reutilizáveis...................................................................904.1.2 Limpeza de Estufa.............................................................................................914.2 Síntese da PAni.....................................................................................................914.3 Obtenção das Soluções NMP+PAni.....................................................................934.4 Obtenção de Substratos........................................................................................944.5 Obtenção de Filmes Pelo Mètodo Casting...........................................................944.6 Caracterização dos Materiais por Elipsometria....................................................95
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS.........................995.1 Limpeza de Materiais e Equipamentos................................................................995.2 Síntese da PAni.....................................................................................................995.3 Obtenção das Soluções NMP+PAni.....................................................................1005.4 Obtenção de Substratos........................................................................................1015.5 Obtenção de Filmes Pelo Método Casting...........................................................1015.6 Caracterização dos Materiais por Elipsometria....................................................1055.6.1 Caracterização dos Substratos Transparentes....................................................1055.6.2 Caracterização do Substrato de Ouro................................................................1085.6.3 Caracterização de Filme de PAni Obtido a Partir da Sol-5...............................1125.6.4 Caracterização do Filme de Pani Obtido a Partir da Sol-4................................1215.6.5 Caracterização do Filme de PAni Obtido a Partir da Sol-3...............................1245.6.6 Caracterização do Filme de PAni Obtido a Partir da Sol-2...............................1265.6.7 Caracterização de um Filme de PAni Depositado em Ouro..............................129
CAPÍTULO 6 – CONCLUSÕES............................................................................131
REFERÊNCIAS.......................................................................................................139
LISTA DE SÍMBOLOS x
LISTA DE SÍMBOLOS
A relação a seguir tem como função única a padronização da escrita deste trabalho. Emnenhum momento houve esforço para atribuir de maneira unívoca um caractere a umagrandeza. Em outras palavras, pode ocorrer de um mesmo símbolo representar duas ou maisgrandezas diferentes ao longo do texto deste trabalho. No entanto, isto não acarreta emprejuízo no entendimento do assunto abordado, pois sempre que necessário fazer uso de umsímbolo, seu significado é discutido ainda no corpo do texto.
Símbolos e Operadores Matemáticos
Atodo negrito na matemáticadeste texto, seja ele maiúsculoou minúsculo, latino ougrego, representa um vetorreal.
Atodo itálico na matemáticadeste texto, seja ele maiúsculoou minúsculo, latino ougrego, representa um escalarreal. Se houver menção devetor com o mesmo caractere,então este itálico representa omódulo do vetor.
Atodo negrito sob circunflexona matemática deste texto,seja ele maiúsculo ouminúsculo, latino ou grego,representa um vetor unitárioreal.
Atodo negrito itálico namatemática deste texto, sejaele maiúsculo ou minúsculo,latino ou greto, representauma matriz real quadrada.
~A ,
~A ,
~A , ou ~A
todo símbolo sob til referir-se-á à classe dos complexos, sejaele vetor, matriz quadrada ouescalar.
doperador diferencial total.
∂operador diferencial parcial.
%divide por 100 o número à suaesquerda.
+operador soma (entre vetoresou entre escalares).
– operador diferença ousimetrização (de vetores ou deescalares).
a/b ou ab
operação divisão entre osescalares a e b.
⋅operador produto escalar(entre vetores ou entreescalares).
×operador produto vetorial.
=equiparação (ou atestado deigualdade).
≡atestado de equivalência.
≠atestado de diferença.
≈atestado de valoresconfundíveis ou equiparáveisdevido à precisão ou rigor deinteresse.
≝definição matemática de umagrandeza por uma expressãomatemática que envolveoutras grandezas.
a > batestado de superioridade donúmero a em relação aonúmero b.
LISTA DE SÍMBOLOS xi
a < batestado de inferioridade donúmero a em relação aonúmero b.
a ≥ batestado de não superação donúmero b em relação aonúmero a.
a ≤ batestado de não superação donúmero a em relação aonúmero b.
∇⋅Adivergente do vetor A.
∇×Arotacional do vetor A.
∮elemento
A⋅d x
integral em regime fechado. Otermo “elemento” designa sea integral é realizada em umpercurso ou em umasuperfície.
∫integral de Riemann.
INTRODUÇÃO 1
INTRODUÇÃO
A descoberta dos polímeros intrinsecamente condutores (ICPs) [1] em 1960 e do
aumento da condutividade elétrica em outros tipos de polímeros [2] fez nascer um ramo da
ciência: a física dos condutores orgânicos, cujo papel é investigar métodos de obtenção e
caracterização de materiais orgânicos condutores e semicondutores. A polianilina (PAni) é um
dos materiais mais analisados em estudos científicos devido às perspectivas de aplicações em
áreas desde a biotecnologia, com a investigação de biocompatibilidade de materiais [3] e
biossensores [4, 5], até a indústria de dispositivos eletrônicos [6].
Uma das vantagens da PAni é sua fácil obtenção e processamento, podendo ser obtida
segundo diversas rotinas, como reportado por vários autores, dentre as quais destacam-se a
síntese química, na qual o polímero é obtido a partir da submissão da anilina a um meio
reacional composto por ácido e um sal oxidante [7-9], e a síntese eletroquímica, que consiste
em submeter, a um sistema composto de anilina e ácido, uma diferença de potencial
controlada entre eletrodos, em um dos quais será formado o filme de polianilina de interesse
[10, 11].
A PAni obtida por estes métodos tem a característica de material condutor. No entanto,
é possível fazê-la tornar-se isolante submetendo-a à interação com um meio básico. A
permutação entre os estados condutor e isolante da PAni pode, em alguns casos, ser realizada
diversas vezes, o que torna este material promissor na aplicação como sensor de bases [12-15]
e de ácidos.
Estas características da PAni têm feito dela alvo de estudos voltados à compreensão de
várias de suas propriedades para melhor aplicação na tecnologia. Dentre suas propriedades de
interesse, destacam-se o mecanismo de condução elétrica, sua conformação na composição de
filmes e suas propriedades ópticas. Os estudos das propriedades da PAni podem ser realizados
por meio de diversas técnicas, dentre as quais pode ser destacada a elipsometria.
A elipsometria é uma técnica de caracterização óptica que consiste em analisar a
mudança do estado de polarização da luz refletida por um sistema após nele ter sido incidida
luz linearmente polarizada. É uma técnica bastante versátil e bastante sensível às variáveis do
sistema em análise, tais como espessura, composição química, estrutura física, entre outras
INTRODUÇÃO 2
[16]. No entanto, tais informações não são obtidas imediatamente após ser realizada uma
medida elipsométrica. Em vez disso, uma medida elipsométrica fornece dois parâmetros, Ψ(λ)
e Δ(λ), denominados parâmetros elipsométricos [17]. Assim, na maioria dos casos, a obtenção
das propriedades do material caracterizado por elipsometria só é possível por meio da análise
computacional dos parâmetros elipsométricos medidos [18, 19]. Tal análise consiste em
simular computacionalmente uma medida elipsométrica sobre um sistema virtual, atribuindo-
lhe propriedades ópticas por meio de modelos matemáticos, fazendo-se variar os parâmetros
do modelo, até que os parâmetros da medida elipsométrica virtual coincida com aqueles
obtidos experimentalmente. Tal processo é denominado ajuste teórico sobre as medidas.
Diversos trabalhos relacionados à aplicação da elipsometria no estudo de importantes
propriedades de materiais podem ser destacados. Yokota, et. al., desenvolveram trabalhos nos
quais, utilizando-se da técnica de elipsometria, concluíram que a superfície de alguns vidros
tem índice de refração menor que o índice de refração do restante do seu volume [20, 21].
Vial, et. al., utilizaram esta técnica para a caracterização das propriedades do ouro, reportando
que o processo de ajuste teórico foi feito mediante o uso do modelo de Drude-Lorentz [22].
No campo da aplicação da elipsometria para a caracterização dos polímeros
condutores, destacam-se os trabalhos de Al-Attar, et. al. [23, 24]. Nestes trabalhos, eles
utilizaram o modelo de Drude-Lorentz para realizarem o ajuste teórico sobre as medidas
elipsométricas feitas em filmes finos de PAni obtidos pelo método da síntese eletroquímica.
Seus resultados finais mostraram que os melhores ajustes foram feitos quando considerados
três osciladores de Lorentz mais um termo de Drude.
Figura I.1 Diagrama de transições de energia para a polianilina dopada. [Im.: Al-Attar, ref. 23]
INTRODUÇÃO 3
Al-Attar, et. al., atribuíram interpretações físicas aos resultados obtidos pelos ajustes
teóricos. As energias dos osciladores de Lorentz utilizados no processo computacional estão
em torno de 1,5eV, 2,9eV e 3,7eV. Conforme pode ser visto na figura I.1, aos osciladores de
energias 1,5eV e 2,9eV foram atribuídas as formações de pólarons, P+, enquanto que ao
oscilador de energia centrada em torno de 3,7eV foi atribuída a transição do tipo π-π*.
Neste sentido, o presente trabalho é voltado à investigação das propriedades ópticas de
filmes finos de PAni por meio da técnica da elipsometria. Para tanto, uma detalhada evolução
histórica desde as primeiras teorias até a atual concepção sobre a natureza e as propriedades
da luz e da matéria é desenvolvida nos capítulos 1 e 2, a partir dos quais pôde-se efetivamente
desenvolver a teoria da elipsometria no capítulo 3. Estes três primeiros capítulos contemplam
de maneira clara e objetiva os conhecimentos mais fundamentais e necessários para a
aplicação da técnica não só ao caso em questão, mas também aos futuros estudos a serem
desenvolvidos por este grupo de pesquisa.
No capítulo 4, é detalhado o método utilizado desde a síntese da PAni até o processo
de análise de filmes a partir dela obtidos. No capítulo 5, são apresentadas detalhadas
discussões dos resultados gerados pelas caracterizações elipsométricas. Inclusive, neste
trabalho resolveu-se um problema fundamental deixado em branco por Al-Attar, et. al., que
analisaram apenas filmes muito finos, com espessuras menores que 30nm. Eles discutiram a
dificuldade de analisar filmes mais espessos, atribuindo o fator de dificuldade a algumas
propriedades da PAni, tais como a elevada absorbância em filmes de espessuras superiores a
50nm e também à inomogeneidade causada pelo aumento da espessura. Estas dificuldades
foram superadas no presente trabalho, tendo sido possível fazer excelentes análises em filmes
cujas espessuras foram superiores a 3000nm, ou seja, da ordem de 100 vezes mais espessos
que aqueles discutidos nos trabalhos de Al-Attar, et. al.
De modo geral, tentou-se neste trabalho explorar ao máximo os problemas voltados à
elipsometria mais essenciais e de difícil divulgação na literatura. Assim, espera-se que este
trabalho sirva também de fonte de conhecimento para outros grupos de pesquisa.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 4
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA
Quando se pergunta o que é a luz, é natural tentar responder como sendo (nestas ou em
outras palavras mais ou menos bem elaboradas) um elemento natural que faculta o sentido da
visão (aos seres dotados deste sentido). A parte destacada em itálico desta tentativa de
resposta demonstra uma imprecisão ao tentar descrever a natureza da luz, pois ao sugerir que
a luz é um elemento natural, não necessariamente tenta-se classificá-la como uma das
substâncias da natureza. Pelo contrário, descrevê-la como um elemento natural é praticamente
sinônimo de objeção em aprofundar-se na natureza intrínseca ou constituição da luz.
Em um contexto sensitivo (ou seja, sem um rigor científico), sem fazer uso de
conhecimentos básicos (i.e., seguindo o método do senso comum), tal objeção é, em partes,
compreensível. A compreensão desta objeção se dá pelo fato de a luz ser ingrediente essencial
que possibilita os seres de ver o que está à sua volta sem, no entanto, lhes facultar o poder de
tateá-la. No máximo, é possível analisar experimentalmente suas várias propriedades, tais
quais reflexão, refração e dispersão.
Por outro lado, mesmo essas propriedades sendo acessíveis à observação a partir de
recursos incrivelmente básicos (isto é, de fácil aquisição, como espelhos, lentes, cristais, etc.),
elaborar uma teoria que explique adequadamente todas as propriedades da luz não é uma
tarefa fácil (isto, em partes, explica o fato de, no passado, terem sido criadas tantas teorias
voltadas a explicar a luz – teorias atômicas, inclusive). Mais fácil que isso é transmitir o
conhecimento das teorias uma vez estabelecidas.
Este capítulo se reserva a esboçar brevemente um contexto histórico sobre o estudo das
propriedades da luz, desde as civilizações mais antigas até a atualidade.
1.1 O Primeiro Período da Óptica
A sequência de eventos que serão descritas neste subitem pode ser chamada de o Primeiro
Período da Óptica, e compreende o período desde o início dos tempos até o início do século
XVII [25].
Não há como precisar onde nem quando se deu início à compreensão e ao estudo da luz e
de suas propriedades de maneira sistemática. No máximo é possível citar a confecção, na
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 5
antiguidade, de utensílios baseados nessas propriedades, tais como os espelhos feitos a partir
de superfícies polidas de bronze e de outros metais entre os anos 2000 a.C. e 1500 a.C. [26].
Além disso, estudos versados em oftalmologia remontam à criação do papiro na civilização
egípcia antiga, isto é, 1500 a.C. ou antes; também os chineses já haviam feito estudos
detalhados sobre os fenômenos de reflexão e formação de sombras por volta do século IV a.C.
[27]. A confecção e a aplicação de dispositivos ópticos mais complexos, tais como lentes
convergentes utilizadas para acender fogueiras focalizando a luz do sol em um substrato,
foram descritas pelo grego Aristófanes1, por volta de 424 a.C [25, 28].
Contudo, as primeiras teorias, que se tem conhecimento, voltadas a explicar as
propriedades da luz foram estabelecidas na Grécia antiga. Aparentemente, entre outros
fatores, há três motivos básicos que podem ser tomados como principais motivadores para que
os gregos tenham encabeçado e dado início à discussão a respeito da óptica: (1) o interesse em
encontrar tratamento e/ou cura à cegueira dando início à oftalmologia grega, (2) o interesse
em entender o mecanismo da visão humana em termos científicos, e (3) o interesse em
estabelecer a compreensão e a descrição do espaço, unido ao interesse dos astrônomos em
fazer medidas e formulações matemáticas mais precisas acerca dos eventos celestes, dando
origem à geometria e à matematização da astronomia [27].
Entre os filósofos gregos que influenciaram o desenvolvimento de teorias relacionadas à
luz, podem ser destacados Pitágoras2, Empédocles3, Demócrito4, Platão5, Aristóteles6 e
Euclides7, que já tinham entendimento acerca da lei da propagação retilínea e da reflexão da
luz (enunciada por Euclides por volta de 300 a.C.); Herão8 explicou tais fenômenos a partir de
uma teoria na qual ele postula que a luz se propaga a partir da menor trajetória possível entre
dois pontos [25]. Esta teoria, no entanto, não foi capaz de explicar completamente o fenômeno
da refração da luz.
Nesse tempo, as discussões que versavam sobre óptica resumiam-se basicamente à
1 Aristófanes (ca. 447 a.C. – ca. 385 a.C.), dramaturgo grego nascido em Atenas.2 Pitágoras (ca. 571 a.C. – ca. 496 a.C.), matemático grego nascido em Samos.3 Empédocles (490 a.C. – 430 a.C.), filósofo grego nascido em Agrigento, conhecido como o criador da teoria
dos quatro elementos.4 Demócrito (ca. 460 a.C. – ca. 370 a.C.), filósofo grego nascido em Abdera.5 Platão (ca. 428 a.C. – ca. 347 a.C.), filósofo grego nascido em Atenas.6 Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.), filósofo grego nascido em Estagira, aluno de Platão e professor de
Alexandre, o Grande.7 Euclides (século III a.C.), matemático que vivem em Alexandria. É considerado como o “Pai da Geometria”.8 Herão (10 d.C. – 70 d.C.), geômetra e engenheiro nascido em Alexandria.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 6
tentativa de explicar o mecanismo da visão. Cinco dessas teorias merecem destaque. A seguir,
uma breve apresentação dos princípios básicos de cada uma dessas teorias é apresentada.
A primeira teoria a ser destacada neste texto foi desenvolvida por Pitágoras. Segundo ele,
a visão de um objeto ocorre por um processo no qual o olho emite uma coisa* que se propaga
em linha reta e que toca o referido objeto (se ele for digno de ser visível); ao ser tocado por tal
coisa, o objeto passa então a ser visto [29]. Esta teoria, no entanto, não explica a
impossibilidade de os objetos serem vistos no escuro. Por outro lado, ela foi de imensa
importância científica, pois estabeleceu princípios que milênios depois formaram a base do
que hoje é chamada de óptica geométrica, com a qual é possível fazer estudos quantitativos e
fabricar dispositivos ópticos.
A segunda teoria a ser citada é devida aos atomistas, dos quais se destacam Demócrito e
Leucipo9; ela sugere que tudo é feito de átomos que se movem no espaço vazio; neste sentido,
os raios de luz eram considerados como um fluxo de partículas de luz movendo-se livremente
no espaço vazio, em linha reta e que podia penetrar corpos transparentes; sugeriu que as
diferentes cores podiam ser explicadas pela existência de diferentes formas e tamanhos dos
átomos de luz [30]. Segundo essa teoria, a visão e os pensamentos são gerados quando
imagens da mesma forma e tamanho dos objetos são continuamente emanados por eles (na
forma de átomos de luz) e atingem o olho [27].
A terceira teoria, devida a Platão, é mais elaborada que a de Pitágoras. Segundo Platão, só
é possível ver um objeto visível se além de o olho emitir algo que toca o objeto, este algo vier
a ter uma coalescência com a luz do sol [29]. Neste caso, se não houver luz do sol, o objeto
não poderá ser visto, pois, embora o olho emita algo que toque o objeto, não poderá ter a
coalescência (com a ausente luz do sol) necessária para a visão.
A quarta teoria a ser destacada é devida a Aristóteles. Vale ressaltar neste ponto que não há
fonte segura sobre qualquer teoria pré socrática. Em vez disso, há fragmentos de texto que
discutem muito brevemente sobre uma ou outra. Aristóteles foi o primeiro a ter o cuidado de
escrever, descrever e definir cautelosamente termos e matérias de estudo e a fundamentar a
discussão de seus pontos de vista. Rejeitou com veemência as teorias antecedentes a ele; para
ele, a luz não era emanação corpuscular, tampouco a visão era resultado de emanação, pelos
olhos, de raios que tocam objetos. Ao mesmo tempo, Aristóteles não era adepto da teoria
* Embora deselegante, esta é a melhor palavra que traduz os pensamentos desta teoria.9 Leucipo (século V a.C.), filósofo grego que viveu em Mileto.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 7
atomista do mundo e, por lógica a esta concepção, não aceitava que poderia haver vazios (ou
espaços vazios); ao contrário disso, ele acreditava que sempre havia substâncias permeando
regiões intermediárias a dois corpos. Na tentativa de explicar o mecanismo da visão, ele
define que meios que possibilitam a visão (como o ar e a água) podem ser translúcidos ou
transparentes, e não são meios visíveis, mas meios através dos quais objetos não transparentes
(isto é, visíveis) podem ser vistos. Define também que a luz é um estado de transparência
resultado da presença do fogo ou de corpos luminosos. Em particular, a luz é o que faz um
meio transparente em potencial se tornar realmente transparente, permitindo a visão dos
objetos não transparentes [27, 30, 31].
Nenhuma destas quatro teorias leva em conta a álgebra nem a geometria como
ferramentas de descrição e determinação de valores relativos à óptica. Como já dito
anteriormente, elas se ocupam ou em determinar a natureza da luz ou em descrever o
mecanismo pelo qual ocorre a visão.
A quinta teoria a ser destacada, devida a Euclides, é a primeira teoria que estuda a luz a
partir de uma visão puramente matemática. Em seu trabalho, Optica, Euclides ignora
sistematicamente qualquer aspecto físico e psicológico da visão, isto é, as cores, a luz, a
coalescência, a forma sensível, a natureza do olho, etc. Ele cria postulados a partir dos quais,
de maneira algébrica e geométrica, é capaz de desenvolver e explicar certas peculiaridades da
visão, tais quais os problemas da perspectiva e da profundidade, ou seja, a aparência dos
objetos em função da sua relação espacial com o observador. Com esse tratamento, ele cria o
que hoje é denominada óptica geométrica [27, 29].
Fora essas teorias, pouco ou quase nenhum avanço relacionado à óptica foi feito no
contexto das civilizações pré Cristãs. Já no início da era cristã, no entanto, há evidências do
uso de lentes de aumento para ajudar a visualizar estruturas muito pequenas. Seria o precursor
dos óculos. Sêneca10 já havia sugerido que um globo de vidro preenchido com água poderia
ser utilizado com finalidade de ampliar a visão sobre um objeto; especula-se que alguns
artistas romanos utilizaram lentes de aumento para realizar trabalhos muito detalhados [25].
Por fim, Ptolomeu11 estendeu as análises matemáticas de Euclides e, além disso, incluiu
aspectos físicos, psicológicos e fisiológicos da visão [27]. Em adição a isto, Ptolomeu, de
10 Lúcio Aneu Sêneca (4 a.C – 65 d.C.), advogado e escritor romano.11 Cláudio Ptolomeu (90 – 168), cientista grego que viveu em Alexandria, no Egito, reconhecido pelos seus
notáveis trabalhos em matemática, astrologia, astronomia, geografia, cartografia, óptica e teoria musical.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 8
maneira inovadora, estudou e tabulou valores precisos dos ângulos de incidência e de refração
do ar para o vidro, do ar para a água e da água para o vidro, revolucionariamente inserindo no
âmbito da óptica dois ingredientes cruciais: o experimento e a medida [25, 28].
Com o fim do império romano (475 d.C.) e imediato início da era medieval, a filosofia
aristotélica se estabeleceu como conhecimento intelectual, ao passo que as demais maneiras
de abordar a natureza permaneceram adormecidas. Neste ínterim, pouco ou quase nenhum
progresso foi feito no campo da óptica [28]. Fora do contexto medieval, no entanto, al-
Hazen12 fez estudos sobre espelhos esféricos e parabólicos bem como fez descrição detalhada
do olho humano [25]. Nos três primeiros livros de seu tratado (dividido em sete livros), ele
descreve o modo como ocorre a visão, deixando clara a ideia de que a visão é resultado da
entrada, no olho, de raios externos que partem dos objetos [28].
A óptica veio ressurgir no século XIII, tendo como principal ícone Roger Bacon13,
considerado como o primeiro cientista no sentido moderno; ele trabalhou arduamente na
tentativa de sintetizar os raios visuais de Euclides e os raios externos de al-Hazen. Também
dedicou muito tempo no estudo dos espelhos esféricos e côncavos (demonstrando
entendimento da localização de seus pontos focais), e da refração da luz em lentes. Em meio a
seu trabalho, há indícios de que ele tinha noção de como construir telescópios, microscópios e
câmeras escuras (embora a criação desses artefatos se dê tempos depois de seu contexto) [25,
28, 30].
O século XIII também foi marcado com a criação, na Itália, e popularização dos óculos.
Trabalhos artísticos, documentários e notas preservados desde sua criação, desse século,
tornam indubitáveis a época e o local onde os óculos foram criados. No entanto, tão
importante dispositivo não foi criado por um cientista ou um disciplinado estudioso da óptica.
De acordo com uma inscrição em uma lápide na igreja Santa Maria Maggiore, em Florença, a
invenção é devida a Salvino degli Armati14, que morreu em 1317 (embora haja sinais de
existência de óculos já na metade do século XIII) [28]. É digno de nota que a invenção dos
óculos foi sem dúvidas a mais importante invenção relacionada à óptica até então, não
somente no sentido prático, mas no sentido de perspectivas teóricas.
12 Abu Ali al-Hasen Ibn (965 – 1040), físico e matemático árabe pioneiro da óptica do período medieval.13 Roger Bacon (1214 – 1294), filósofo inglês que influenciou o uso do empirismo e a matemática no estudo da
natureza.14 Salvino degli Armati, conhecido como o inventor dos óculos. Não se sabe a data em que nasceu.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 9
1.2 O Segundo Período da Óptica
Mesmo com a magnífica invenção dos óculos, estes artefatos não providenciaram
imediato impulso no desenvolvimento da óptica. Muito pelo contrário, os estudos sobre óptica
permaneceram praticamente parados. Embora as obras até então escritas tenham ficado
disponíveis em monastérios e bibliotecas de universidades, elas foram usadas no máximo para
leitura e transmissão de seus conhecimentos estabelecidos.
Somente no final do século XV e início do século XVI é que a
óptica acordou novamente, tendo novos avanços na pessoa do gênio
Leonardo da Vinci15, que tinha completo conhecimento dos tratados e
ideias sobre óptica desde os estudos primordiais até os de seu tempo.
Além de tal conhecimento, da Vinci é muito conhecido como um
exímio experimentalista e anatomista (do corpo humano como um todo,
bem como do olho). Em um de seus trabalhos, ele associou o
mecanismo da visão ao mecanismo de formação de imagem em uma
câmera escura, assertando corretamente que as imagens dos objetos se
formam na parte de trás do olho (ou seja, na retina). Contudo, por saber
que as imagens em uma câmera escura são sempre invertidas, enquanto
que o mundo é percebido sem inversão, ele erroneamente desenhou
trajetórias dos raios de luz, fazendo-os se interceptarem duas vezes
dentro do olho, resultando em uma imagem projetada sem inversões
(ver figura 1.1). Além da óptica, da Vinci atuou em muitos outros
campos do conhecimento humano, não sendo à toa a admiração voltada
a ele até os dias atuais [28].
Foi da Vinci quem primeiro sugeriu o uso de lentes para aumento visual de objetos
distantes, sendo o precursor do telescópio refrator [28]. No entanto, a maioria dos textos
atribuem tal invenção ao holandês Hans Lippershey16, por volta de 1608 [25, 30]. Talvez tal
invento tenha sido impulsionado por outro semelhante: o microscópio composto, criado
poucos anos antes, em 1600 pelo holandês Zacharias Janssen17 [30]. Em seguida, uma
adaptação, na qual a ocular convexa do microscópio de Janssen foi trocada por uma côncava,
15 Leonardo da Vinci (1452 – 1519), polímata italiano nascido em Amboise.16 Hans Lippershey (1570 – 1619), fabricante de lentes dos Países Baixos nascido em Wesel, Alemanha.17 Zacharias Janssen (1580 – 1638), conhecido como o criador do microscópio composto.
Fig. 1.1 Imagem das trajetórias dos raios de
luz retirada dos manuscritos de da
Vinci [Im: Vavilov, ref. 28].
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 10
foi feita por Francesco Fontana18, de Nápoles.
Galileu Galilei19, em Pádua, teve conhecimento sobre o invento do telescópio e, dentro de
meses, conseguiu construir os seus próprios instrumentos que usou para fazer observações
astronômicas. Johannes Kepler20, pegando o gancho de Fontana, fez, posteriormente, uma
semelhante adaptação no telescópio refrator [25].
1.2.1 A Consolidação Matemática da Óptica Geométrica
Johannes Kepler descobriu a reflexão interna total da luz que se propaga de um meio mais
denso para um meio menos denso. Ele também determinou matematicamente a lei de refração
da luz para pequenos ângulos de incidência, na qual o ângulo de incidência é proporcional ao
ângulo de refração. Desenvolveu um tratamento em primeira ordem da óptica de sistemas de
lentes finas, além de descrever detalhadamente a operação dos telescópios keplerianos (ocular
côncava) e galileanos (ocular convexa) [25].
Willebrord Snel21, professor em Leyden, descobriu empiricamente a até então
incompreensível lei da refração em 1621. Em seguida, René Descartes22, utilizando uma visão
atomista para a luz, foi o primeiro a publicar a lei da refração deduzida e formulada
matematicamente em termos de senos. Pierre de Fermat23 também deduziu a lei de refração da
luz em termos de senos. No entanto, o método de Fermat foi totalmente diferente do método
de Descartes [25]. Fermat elaborou o princípio de menor tempo, no qual a luz se propaga de
um ponto a outro segundo uma trajetória que lhe proporciona o menor tempo de propagação
(1657). Desta forma, ele não precisou entrar no âmbito da discussão a respeito da natureza da
luz.
1.2.2 Primeira Evidência do Comportamento Ondulatório da Luz: a Difração
Até este momento, todos concordavam plenamente com o fato de a luz se propagar em
linha reta a partir da fonte até um anteparo. Talvez o experimento que mais facilmente conduz
a essa suposição é o de formação de sombras semelhantes (isto é, que obedecem relações
18 Francesco Fontana (1580 – 1656), advogado e astrônomo italiano.19 Galileu Galilei (1564 – 1640), físico, matemático, astrônomo e filósofo italiano conhecido como o “Pai da
Ciência Moderna”.20 Johannes Kepler (1571 – 1630), astrônomo, matemático e astrólogo alemão que revolucionou a ciência do
século XVII.21 Willebrord Snel van Royen (1580 – 1626), astrônomo e matemático holandês.22 René Descartes (1596 – 1650), filósofo, físico e matemático francês.23 Pierre de Fermat (ca. 1605 – 1665), matemático e cientista francês.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 11
métricas triangulares) aos seus obstáculos situados entre um anteparo e uma fonte luminosa
pequena. Um comportamento diferente ao da propagação retilínea é conhecido como difração.
Em um experimento no qual ocorre difração, a região onde se esperava ser de sombra (devida
ao bloqueio da luz por um obstáculo) encontra-se iluminada. Em geral, o fenômeno da
difração é acompanhado pelo fenômeno de interferência, resultando na alternância entre
regiões de sombra e de luz onde deveria haver apenas sombra. Pode-se definir, portanto, que
a difração é o fenômeno no qual há mudança na trajetória da luz, fazendo com que a luz
penetre na região que deveria ser de sombra.
O primeiro relato de observação do fenômeno da difração da luz é atribuído ao professor
Francesco Maria Grimaldi24 no Colégio Jesuíta de Bolonha. Tal fenômeno também foi
observado mais tarde por Robert Hooke25. Além da difração, sabe-se que Hooke foi o primeiro
a estudar os padrões coloridos devido a interferências da luz em filmes finos. Graças a esses
fenômenos, ele propôs em seu estudo que a luz poderia ser uma propagação muito veloz de
uma vibração muito rápida de um meio [25]. É nesse ponto, portanto, que se dá a concepção
da natureza ondulatória da luz como teoria.
1.2.3 Isaac Newton e a Ambivalente Natureza da Luz
Pode-se dizer que Isaac Newton26 herdou muito conhecimento acumulado pelos filósofos
e estudiosos que o antecederam. Aliado a essa herança, Newton foi sem dúvidas um exímio
experimentador e observador da natureza. Experimentos com a luz, a análise de suas
propriedades e a busca pela sua natureza foram alvos de sua atenção por muito tempo.
Fruto de tanta dedicação, sua obra Opticks: or a Treatise of the Reflections, Refractions,
Inflections and Colours [32] (Óptica: ou um Tratado das Reflexões, Refrações, Inflexões e
Cores) contém descrições detalhadas de definições e axiomas tomados como suportes para
suas proposições, que por suas vezes foram embasadas em experimentos também muito bem
descritos e detalhados nesta obra.
Como objetos de estudos em Opticks, podem ser listados: reflexão, refração e
interferência da luz; composição e decomposição da luz e de suas cores; reflectância e
refratância das cores; formação de imagens em espelhos planos e curvos; formação de
24 Francesco Maria Grimaldi (1618 – 1663), físico e matemático italiano.25 Robert Hooke (1635 – 1703), cientista experimental inglês.26 Isaac Newton (1642 – 1727), físico, matemático, astrônomo, alquimista, filósofo natural e teólogo inglês
cujos trabalhos revolucionaram a ciência.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 12
imagens por lentes; formação de imagens no olho humano; confecção de telescópios
refratores e refletores.
Opticks foi escrito em uma série de três livros, sendo o primeiro dividido em duas partes e
o segundo dividido em quatro partes. O volume de toda a obra pode ser condensada em 149
páginas. Como é enfatizado em seu próprio texto, parte da obra foi apresentada em 1675,
sendo completada ao longo dos doze anos seguintes.
Há autores que apontam Isaac Newton ambivalente como defensor da natureza
corpuscular da luz, bem como de sua natureza ondulatória [25, 33, 34]. Outros autores (por
exemplo Batalhão, et al [35]), no entanto, esquecem de mencioná-lo como conhecedor e
estudioso das características ondulatórias da luz. Talvez isso pode ser induzido pelo (ou
induzir ao) consenso de que Newton, na maioria das vezes, se declarava partidário da teoria
corpuscular da luz, como se pode inferir pelo seguinte trecho retirado de Optics (Hecht, p. 4):
“The great weight of Newton's opinion hung like a shroud over the wave theory during the
eighteenth century, all but stifling its advocates” (O grande peso da opinião de Newton pairou
como uma mortalha sobre a teoria ondulatória durante o século XVIII, sufocando seus
defensores).
1.2.4 A Luz de Huygens
Na mesma época de Newton, Huygens27 estava difundindo a teoria ondulatória da luz,
com a qual ele explicava os fenômenos da reflexão, refração, difração e interferência da luz.
Com tal teoria, também ele concluiu, ao contrário dos cientistas precedentes, que a luz tem
sua velocidade diminuída ao passar de meios menos densos para meios mais densos. Huygens
também investigou o fenômeno da dupla refração da luz nos cristais de calcita e o explicou
nos moldes de sua teoria [25].
1.2.5 A Velocidade da Luz
Até este momento histórico, ninguém havia sugerido nenhum método experimental para
determinar a velocidade de propagação da luz. O que todos poderiam inferir era apenas que a
propagação da luz entre dois pontos ou ocorria muito rapidamente, ou de maneira instantânea.
27 Christiaan Huygens (1629 – 1695), físico, matemático, astrônomo e horologista neerlandês.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 13
No entanto, um fato curioso intrigou Ole Roemer28 que, em 1676 concluiu que a luz tem
velocidade finita. Após observações e anotações, ele percebeu que os eclipses de Io (uma das
luas de Júpiter) ocorrem entre intervalos de tempo que variam ao longo do ano. Durante quase
meio período de observação (isto é quase seis meses, sendo o primeiro mês aquele no qual a
Terra estava mais próxima de Júpiter e o último mês sendo aquele no qual a Terra estava mais
distante), o acumulado das diferenças de duração entre os eclipses somaram 22 minutos.
Roemer concluiu corretamente que tal fato se dá porque a luz demora mais tempo para
atravessar a distância adicional referente ao diâmetro da órbita terrestre (cujo valor já era
sabido em sua época). Com esses dados, ele calculou que a velocidade da luz era de 210 mil
km/s. Comparado com os valores atuais, suas medidas estavam defasadas em
aproximadamente 5 minutos [25, 36].
1.2.6 Young e a Polêmica Experiência da Fenda Dupla
Muitos textos (como por exemplo Nussenzveig e Resnick [33, 37]) apotam que Thomas
Young29 realizou os famosos experimentos da fenda dupla no ano de 1801. De acordo com
Hecht [25],Young apresentou seus textos nos anos de 1801, 1802 e 1803 perante a Royal
Society. No entanto, Rothman [34] alerta que talvez Young nunca tenha feito o experimento
da fenda dupla para a luz. Segundo o autor, Young explicou os anéis de Newton e as cores em
películas finas a partir das ideias de interferência de ondas de luz. É possível que ele tenha
utilizado as medidas realizadas por Isaac Newton para determinar os comprimentos de onda
das várias cores do espectro. O uso da interferência como propriedade ondulatória para
explicar tais padrões somado ao uso dos dados de Newton foram as bases para fortalecer a
ideia ondulatória da luz. Mesmo assim, foi alvo de críticas de outros cientistas que não
aceitavam a ideia ondulatória.
1.2.7 Fresnel: um Aliado de Young
Fresnel30, conhecedor das ideias de Huygens, vendo a propagação das ondas como
consequências de novas ondas geradas por fontes secundárias virtuais localizadas nas frentes
de ondas que lhe antecedem, teve sucesso ao conseguir explicar a propagação retilínea da luz.
28 Dane Ole Christensen Roemer (1644 – 1710), astrônomo dinamarquês conhecido como o primeiro adeterminar que a luz se propaga com velocidade finita.
29 Thomas Young (1773 – 1829), físico, médico e egiptólogo britânico.30 Augstin-Jean Fresnel (1788 – 1827), físico francês.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 14
Com tais ideias, ele também foi capaz de calcular os padrões de difração devidos a obstáculos
e aberturas. Tudo isso foi feito sem saber dos trabalhos de Young. Quando teve conhecimento
de tais trabalhos, eles se tornaram aliados nesse novo ramo da óptica [25].
1.2.8 A Polarização da Luz
Cientistas como Isaac Newton já tinham conhecimento de que a luz era dividida quando
passava por um cristal de calcita (figura 1.2). Huygens desenvolveu uma teoria que explicava
tal fenômeno dando-lhe o nome de polarização. No entanto, o primeiro a perceber o fenômeno
da polarização da luz por reflexão foi Malus31. Tal descoberta abriu as portas para que fossem
conduzidos vários experimentos para investigar tal fenômeno em interferências. Até este
momento, todos pensavam na luz como vibrações longitudinais (e portanto, o conceito
primitivo de polarização não era em nada semelhante ao atualmente aceito). Tal concepção,
no entanto, não era suficiente para explicar satisfatoriamente certos experimentos de
polarização da luz até então conduzidos. Depois de lidar por alguns anos com tal problema,
Young sugeriu que as vibrações da luz fossem na verdade ortogonais à direção de sua
propagação [25].
Depois disso, Fresnel realizou cálculos que resultaram nas famosas equações de Fresnel
para a reflexão e transmissão da luz polarizada. Com tantas conquistas, o número de
defensores da teoria corpuscular da luz ficou muito reduzido [25].
1.2.9 A Velocidade da Luz Medida na Terra
A primeira determinação da velocidade da luz feita em laboratório (quilométrico) foi
31 Étienne-Louis Malus (1775 – 1812), engenheiro, físico e matemático francês.
Fig. 1.2 Cristal de calcita sobre uma folha com listras. É possível perceber a dupla refração devida aos eixos de polarização do cristal. [Im: http://thespiritscience.net/wp-
content/uploads/2014/06/7-06HaliteCalcite.jpg].
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 15
devida a Fizeau32 no ano de 1849. Ele usou um sistema com rodas dentadas e um espelho a
uma distância de mais de 8km da roda (figura 1.3). Ao configurar a velocidade de rotação da
roda dentada, um pulso de luz que dela saía, refletia no espelho e retornava, só poderia ser
visto atrás da roda se passasse de volta pelo mesmo dente por onde saiu. Isso só poderia
ocorrer para certas velocidades de rotação da roda. Com esse aparato, Fezeau conseguiu um
resultado para a velocidade da luz de 315 330 km/s [25].
Utilizando um aparato diferente (de dimensão laboratorial, figura 1.4), que consistiu em
uma fonte de luz, um espelho giratório e um espelho fixo, Foucault33 não só mediu a
velocidade de propagação da luz no ar, mas também na água. Como resultado, concluiu que a
luz se propaga mais rapidamente no ar do que na água. Isso sem dúvidas foi um grande
choque para os poucos que ainda restavam para defender a teoria corpuscular da luz.
32 Armand Hyppolyte Louis Fizeau (1819 – 1896), físico francês conhecido como o primeiro a determinar comprecisão a velocidade da luz a partir de um aparato experimental terrestre.
33 Jean Bernard Léon Foucault (1819 – 1868), físico e astrônomo francês.
Fig. 1.3 Esquema do aparato utilizado por Fizeau para determinar a velocidade da luz. Ele utilizou uma roda dentada de 720 dentes e 720 interstícios, um espelho semitransparente e um espelho convencional. Após o alinhamento, a luz emitida pela fonte, reflete no espelho
semitransparente, passa por um dos interstícios, reflete no espelho distante e retorna ao olho do observador, passando pelo mesmo interstício e atravessando o espelho semitransparente. Inicia-se o movimento de rotação da roda, aumentando-se gradativamente sua velocidade até que, atingida certa velocidade, a luz de retorno não atravessa mais o interstício de onde saiu, por ser obstruída pelo dente adjacente. Assim é possível determinar a velocidade da
luz. [Im: http://www.apolo11.com/imagens/2014/esquema_fizeau_20140228-115307.jpg].
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 16
1.2.10 A Luz é uma Onda Eletromagnética
Enquanto tudo isso estava acontecendo na óptica, em outro ramo da física (o
eletromagnetismo), Faraday34 fez experimentos que lhe levaram a concluir que eletricidade,
magnetismo e luz estão relacionados entre si, uma vez que campos magnéticos são gerados a
partir de campos elétricos, e vice-versa, e que a polarização da luz pode ser alterada quando
submetida a campos magnéticos. O exímio matemático James Clerk Maxwell35 reuniu os
resultados de Faraday e os compilou matematicamente. Com a matematização da eletricidade
e do magnetismo, ele conseguiu concluir que campos eletromagnéticos podem se propagar
como ondas transversais com uma velocidade cujo valor calculado era incrivelmente próxima
à velocidade da luz medida até então [25, 30].
A confirmação experimental de que a luz é uma onda eletromagnética só veio ocorrer
tempos depois, em 1888, quando Hertz36 conduziu experimentos por meio dos quais ele
conseguiu produzir e detectar ondas eletromagnéticas, unificando de vez a óptica ao
eletromagnetismo [30, 38].
34 Michael Faraday (1791 – 1867), físico e químico inglês, considerado um dos cientistas mais influentes detodos os tempos.
35 James Clerk Maxwell (1831 – 1879), físico e matemático britânico.36 Hinrich Rudolf Hertz (1857 – 1894), físico alemão que demonstrou a existência da radiação eletromagnética
após criar aparelhos emissores e detectores de ondas de rádio.
Fig. 1.4 Esquema do aparato utilizado por Foucault para determinar a velocidade da luz. Um tubo cilíndrico de vidro preenchido com água pode ser colocado entre o espelho girante e o espelho estático. A confirmação de que a velocidade da luz é menor na água se dará pela
consequênte diminuição do desvio angular do feixe de luz de retorno. [Im: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/4/46/Speed_of_light_%28foucault
%29.PNG].
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 17
1.2.11 Propriedades Ópticas dos Materiais
No momento em que é estabelecido que a luz é uma onda com propriedades elétricas,
surge o questionamento: o que causa os efeitos ópticos dos materiais? É imediato sugerir,
simetricamente, que os materiais tenham propriedades elétricas. De fato, as propriedades
elétricas dos materiais já eram conhecidas desde os gregos antigos. No entanto, não se sabia
até então como era a estrutura e a organização microscópicas das cargas elétricas.
O primeiro a sugerir uma explicação sobre as propriedades ópticas dos materiais foi
Lorentz37. Ele elaborou um modelo no qual cargas elétricas estariam ligadas aos átomos dos
materiais. Combinando sua teoria com a teoria eletromagnética de Maxwell, ele foi capaz de
explicar as propriedades de reflexão e refração da luz em meios materiais. Também pôde
deduzir as equações de Fresnel para as reflectâncias e transmitâncias [30].
1.2.12 Os Fótons
Embora praticamente toda a comunidade científica estivesse convencida de que a natureza
da luz deveria ser ondulatória, novos experimentos apareceram, reportando que novos
fenômenos observados para a luz não poderiam ser explicados a partir da teoria ondulatória.
Em 1900, Planck38 apresentou seus trabalhos sobre a distribuição de energia do espectro de
um corpo negro: foi o surgimento das ideias de quantização. Em 1905, Einstein39 explicou o
efeito fotoelétrico teorizando a energia da luz como sendo quantizada. Segundo tal teoria, a
luz seria composta por pacotes discretos e quantizados de energia chamados de fótons. Esta
teoria foi utilizada para dar explicação ao chamado efeito Compton, no qual fótons de raios-X
são espalhados por elétrons. Desde então, a natureza da luz é tida como dual: tanto
ondulatória como corpuscular [30, 39].
1.3 De que é feita a matéria?*
Da leitura que precede este item, percebe-se que foi estabelecida uma verdadeira maratona
37 Hendrik Antoon Lorentz (1853 – 1928), físico neerlandês. Recebeu, em 1902, o prêmio Nobel de Física porseu trabalho sobre as radiações eletromagnéticas.
38 Max Karl Ernst Ludwing Planck (1858 – 1947), físico alemão considerado o Pai da Física Quântica. Foilaureado com o prêmio Nobel de Física de 1918 por suas contribuições na área da física quântica.
39 Albert Einstein (1879 – 1955), físico teórico alemão famoso por desenvolver a teoria da relatividade restritae geral. Foi laureado com o prêmio Nobel de Física em 1921 especialmente pelo seu trabalho sobre o efeitofotoelétrico.
* Todo o texto deste item e de seus subitens foi escrito com base, principalmente, nas referências [31] e [40].
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 18
na investigação e compreensão da natureza e das propriedades da luz. Uma corrida
semelhante foi traçada para se compreender de que é feita a matéria. Não é surpresa que tal
discussão também tenha se iniciado na Grécia antiga, por volta do período compreendido
entre os séculos VII a.C. e IV a.C., na chamada Escola Jônica, fundada por Tales de Mileto40.
Aliás, é importante notar que embora tenha-se para fins de estudo adotado uma origem do
pensamento sistemático, tal origem não tem um marco definido. Em vez disso, não se sabe ao
certo quando realmente começaram tais especulações.
1.3.1 Os Gregos Antigos e a Constituição da Matéria
Na Escola Jônica, os filósofos buscavam arduamente identificar o princípio de todas as
coisas. No que diz respeito à matéria, i.e., no tocante às substâncias e às coisas táteis, a
questão era: de que são feitas e de onde provêm todas as coisas? Para Tales de Mileto, todas
as coisas derivavam da água. Sua explicação se dava por meio da observação de que tudo tem
um mínimo de umidade; os alimentos que mantêm os seres vivos e os próprios seres vivos,
bem como a matéria que já deixou de ser viva, e, portanto, praticamente tudo tem um grau de
umidade. Como consequência disso, para Tales, a água é o elemento que se transforma para
gerar todas as outras substâncias.
Ainda na Escola Jônica, Anaximenes41 acreditava que era o ar a substância primeira, que
dava origem a todas as coisas a partir dos diferentes graus de rarefação e condensação. Para
Xenófanes42, a substância primeira era a terra. Para Heráclito43, o fogo. Talvez tenha sido a
partir desse conflito que surgiu o tão famoso (até hoje) conceito dos quatro elementos: terra,
água, vento e fogo. Segundo essa ideia, todas as coisas da natureza eram compostas por uma
combinação de diferentes frações dos quatro elementos.
Outra concepção que foi originada na Grécia antiga foi a do atomismo. Tal concepção
tinha como principais defensores Leucipo (considerado o criador da ideia), Demócrito e
Epicuro44. Para eles, a matéria era uma consequência da forma e da disposição dos átomos que
davam origem a todas as coisas; o que não era átomo era chamado de vazio. Assim, o que
separa um átomo de outro ou o meio onde os átomos se movimentam é o vazio. Junto com a
40 Tales (ca. 632 a.C. – ca. 558 a.C.), nascido em Mileto, foi filósofo, matemático, engenheiro, homem de negócios e astrônomo da Grécia Antiga.
41 Anaxímenes (588 a.C. – 524 a.C.), filósofo grego nascido em Mileto.42 Xenófanes (ca. 570 a.C. – 460 a.C.), filósofo grego nascido na cidade de Cólofon, na Jônia.43 Heráclito (ca. 535 a.C. – 475 a.C.), filósofo grego nascido em Éfeso.44 Epicuro (341 a.C. – ca. 270 a.C.), filósofo grego que nasceu em Samos.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 19
ideia atomista, surgiu o germe da conservação, segundo o qual os átomos não podem ser
criados nem destruídos.
Deve-se destacar também que a aritmética e a geometria teve seus fundamentos na Grécia
antiga. A Escola Pitagórica é que se destaca pela concepção da aritmética e matematização da
natureza. A geometrização da natureza, por sua vez, foi dada por Platão. Estas duas frentes
foram heranças importantíssimas que levaram ao desenvolvimento da física e da química da
atualidade.
Um dos maiores pensadores (senão o maior) da antiguidade foi sem dúvidas Aristóteles de
Estagira (384 a.C. – 322 a.C.). Como foi dito, ele não era partidário do atomismo, muito
menos à possibilidade de existência do vazio (ou vácuo). Sua cosmovisão dos quatro
elementos era suficiente para explicar as transformações e a origem das substâncias e dos
corpos.
Aristóteles se tornou uma grande autoridade, e a prevalência de suas ideias foi mantida
desde seu tempo até meados do século XIX. Parte dessa duradoura autoridade se deu porque
de fato as ideias de Aristóteles, do ponto de vista de especulações (ou seja, fora do ambiente
Fig. 1.2 Representação dos quatro elementos como concebido por Platão (geométrica) e por Aristóteles (qualitativa). A geometrização de Platão tem fundamento mecânico, por
exemplo, o fogo, mais penetrante, foi representado por uma figura geométrica de vértices mais pontudos, ou seja, mais penetrantes. Ao dodecaedro, pela ausência de um quinto elemento, associou-se o éter. Para Aristóteles, úmido e seco são qualidades passivas,
enquanto que quente e frio são qualidades ativas. A combinação de uma qualidade ativa com uma passiva resulta na criação de um dos quatro elementos (disposto graficamente
entre as qualidades) [Im: http://www.xr.pro.br/monografias/elementos.html em 06/11/14].
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 20
do método científico), são muito bem embasadas e seus argumentos são convincentes. Outra
parte dessa duradoura autoridade é devida ao fato de a filosofia criada por Aristóteles ter sido
conciliada aos dogmas da Igreja Católica por (São) Tomás de Aquino45. Qualquer propagação
de ideias contrárias aos dogmas católicos era vista como heresia, podendo resultar na pena de
morte. Por temer a morte, muitos intelectuais ou se dedicaram em buscar argumentos que
reforçassem o aristotelismo, ou se calaram, ou divulgaram seus pensamentos contrários de
maneira clandestina. Outro, no entanto, enfrentaram a consequente morte em virtude de
alegarem suas próprias '‘verdades’'.
1.3.2 A Civilização Renascentista e a Matéria no Renascimento
O ressurgimento do atomismo só veio a acontecer ao fim da idade média, com o início do
humanismo (época conhecida também como renascimento). O poema De Rerum Natura, de
Lucrécio46, pode ter sido o principal motivador do pensamento atomista da era cristã a partir
do século XVI. Isso aconteceu justamente quando as restrições impostas pela fortaleza cristã
começaram a se enfraquecer.
Se deve-se iniciar a história do estudo da matéria nos tempos modernos, talvez tal início
deva ser feito citando René Descartes. Sua importância se dá pelo fato de ele ter publicado a
obra Principia Philosophiae, na qual ele estabeleceu a base para um sistema de filosofia e de
ciência. Na discussão sobre a constituição da matéria, embora Descartes tenha argumentado a
favor da ideia corpuscular, ele não aceitava a existência do átomo, pois para ele tudo que tinha
extensão poderia ser infinitamente divisível.
Um novo caminho surge com a criação do método científico por Galileu Galilei
(considerado o pai da ciência moderna). É esse método científico o elemento que estava
faltando na busca e na compreensão da natureza. Entre outras características, esse método
exige que as observações sejam sistemáticas, passíveis de repetição, mensuráveis e
associáveis à matemática. Vale ressaltar também que Galileu era partidário da teoria atômica.
Este é um excelente ponto para dar uma pausa acerca das especulações. Aliás, se até aqui
as teorias acerca da natureza da matéria se firmaram especialmente em ideias especulativas, a
descrição histórica, a partir do próximo parágrafo, mostrará a concretização da teoria atômica
45 Tomás de Aquino (1251 – 1274), frade dominicano e sacerdote italiano cujas obras influenciaram a teologiae a filosofia moderna.
46 Lucrécio (ca. 99 a.C. – 55 a.C.), poeta e filósofo latino.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 21
com base em fortes evidências experimentais. As evidências experimentais se dão tanto no
âmbito da física (atomismo mecânico, a partir do qual as propriedades da matéria serão
explicadas a partir de experimentos nos quais ocorrem apenas processos físicos, isto é,
choques mecânicos, etc.) quanto no âmbito da química (atomismo químico, a partir do qual as
propriedades da matéria serão explicadas a partir de experimentos de reações químicas, isto é,
de mistura de substâncias iniciais que levam à formação de substâncias finais diferentes).
Um cientista digno de destaque, que teve parte de seus trabalhos influenciados pela visão
de Galileu, foi Gassendi47. Atomista, ele foi o primeiro a especular que os átomos poderiam se
unir para formar moléculas. Para ele, moléculas diferentes eram a origem das substâncias
(início do atomismo químico).
Mais tarde, Boyle48 desenvolveu trabalhos pioneiros no sentido de desmistificar a natureza
da matéria a partir de princípios químicos. Induzido pelo espírito do atomismo químico, ele
reforçou a ideia de que a natureza poderia ser constituída de compostos químicos, que por sua
vez seriam formados por arranjos de átomos.
Isaac Newton herdou de Galileu seus estudos sobre os movimentos dos corpos, bem como
suas ideias sobre a natureza atômica da matéria. Newton estendeu esses estudos e, ao unir o
atomismo às leis da mecânica e da gravitação (que ele mesmo sintetizou), conseguiu dar
explicações razoáveis para a variação da densidade do ar atmosférico em função da altitude.
Além disso, estendendo sua visão de forças, ele deixou em aberto a questão sobre a possível
existência de forças de interação atômica. Newton tratou seus estudos sobre o atomismo a
partir da ideia de que o átomo é pontual. As definições de Newton se tornaram portas abertas
para a descoberta da natureza atômica da matéria.
Embora a teoria atômica estivesse começando a ganhar impulso e novos seguidores, as
ideias aristotélicas ainda tinha muitos discípulos. Com o intuito de explicar fenômenos tais
como oxidação e combustão dos materiais, surgiu, no final da última década do século XVII,
a teoria do flogístico. Segundo tal teoria, a matéria era constituída de ar, água e três tipos de
terra: terra mercurial, terra vítrea e terra inflamável. Assim, a combustão poderia ser explicada
como uma transformação daquilo que viesse a ser queimado, sendo o fogo uma mera
consequência da expulsão de sua parte mais volátil: a terra inflamável. Esta teoria foi muito
aceita pelos químicos por ser capaz de explicar muitos fatos experimentais.
47 Pierre Gassendi (1592 – 1655), filósofo, cientista e matemático francês.48 Robert Boyle (1627 – 1691), filósofo natural, químico e físico irlandês.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 22
Ao mesmo tempo em que a teoria do flogístico foi criada e difundida, surgiu também
outra teoria chamada de Teoria do Calórico. Segundo essa teoria, o fogo era tido como uma
substância imponderável, sendo o calórico um fluido responsável pela mudança de estado da
matéria.
As teorias do flogístico e do calórico coexistiram por muitos anos no seio científico. No
entanto, elas tinham seus pontos positivos bem como pontos negativos. Por exemplo, segundo
a teoria do flogístico, a redução da massa da madeira após sua combustão era explicada
devido à expulsão da terra inflamável. No entanto, não havia explicação aceitável no âmbito
dessa mesma teoria para o aumento da massa do ferro após sua combustão.
Em 1774, o químico inglês Joseph Priestley49, percebeu que o aquecimento do óxido de
mercúrio ocorria junto com a liberação de um gás. Ao coletar esse gás, ele anotou dois fatos:
(1) em comparação ao ar, o gás coletado é melhor para respirar, e (2) o gás coletado era capaz
de tornar mais viva a chama de uma vela. Com essas observações, ele concluiu que tal gás não
poderia ter flogístico, chamando-o, portanto, de ar deflogisticado. A composição química,
bem como a importância desse gás em vários processos reacionais, bem como para a
respiração, só foi explicada por Lavoisier50.
1.3.3 O Estabelecimento do Átomo Químico
Foi com Lavoisier que a química, como ciência, teve o início de seus fundamentos
estabelecidos, pois ele foi o responsável por contribuir na sistematização e quantificação, bem
como na abertura de novas perspectivas de pesquisas. Segundo ele, toda reação química
deveria ser medida e, com isso, poderia ser explicada. A partir disso, é dada a ele a lei da
conservação da massa. Ele era partidário da teoria do calórico. Para ele, se a força
gravitacional predominasse, o universo seria nada mais que uma grande bola uniforme. No
entanto, o universo não o é. Assim, as partículas do fluido calorífico se repeliam acarretando
no balanço da força atrativa gravitacional, tornando possível o universo ser do jeito que é.
Essa ideia gerou um modelo atômico segundo o qual o calórico envolvia o átomo. A
densidade calorífica deveria diminuir com o inverso da distância ao centro dos átomos. Com
isso, era possível entender a dilatação térmica dos materiais. Mesmo assim, a teoria do
49 Joseph Priestley (1733 – 1804), teólogo, filósofo natural e político britânico creditado pela descoberta dooxigênio.
50 Antoine Laurent de Lavoisier (1743 – 1794), químico francês considerado o Pai da Química Moderna.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 23
calórico teve opositores. Um deles foi Humphry Davy51 que, realizando experimentos de
aquecimento de materiais a partir de atrito, concluiu que se o calórico existir, então ele pode
ser gerado de maneira infinita, bastando para isso continuar atritando os corpos pelo tempo
que se desejar.
Outro grande contribuinte das bases da química foi Proust52 a quem é atribuido o famoso
enunciado da química: em uma mesma reação química, seja ela qual for, as massas das
substâncias participantes guardam entre si uma relação fixa.
Os fundamentos químicos, iniciados por Lavoisier e por Proust, foram estendidos pelo
químico inglês Dalton53, que estabeleceu uma teoria atômica embasada em sete postulados:
i- todo elemento químico é composto de pequenas partículas chamadas átomos;
ii- todos os átomos de um mesmo elemento apresentam as mesmas propriedades;
iii- átomos de diferentes elementos têm propriedades químicas diferentes;
iv- durante uma reação química, nenhum átomo de determinado elemento desaparece
ou se transforma em um átomo de outro elemento;
v- formam-se substâncias compostas quando se combinam átomos distintos de mais de
um elemento;
vi- em um dado composto químico, os números relativos de átomos dos seus
elementos são definidos e constantes e, em geral, podem expressar-se como inteiros ou
frações simples;
vii- quando dois elementos se unem para formar uma terceira substância, presume-se
que apenas um átomo de um elemento se combine com um átomo de outro elemento.
A teoria de Dalton é fundamentada em dados experimentais. Nesta teoria, estão contidas
as ideias dos primórdios da filosofia grega (postulados i, ii e iii), os resultados de Lavoisier
(postulados i e iv) e os de Proust (postulado vii).
Se a teoria de Dalton estava correta, então o desafio estava lançado: determinar as massas
de cada reagente responsável por uma reação completa. Os postulados v e vi e vii são a base
para o início de uma química na qual quantificará as massas dos elementos químicos (em
termos de equivalentes-grama). Definiu-se o equivalente-grama (eq-g) como sendo a massa,
51 Humphry Davy (1778 – 1829), químico inglês.52 Joseph Louis Proust (1754 – 1826), químico francês.53 John Dalton (1766 – 1844), químico, meteorologista e físico inglês.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 24
em grama, da substância que reage com 1g de hidrogênio ou com 8g de oxigênio. Por
exemplo:
o equivalente-grama do hidrogênio é 1 e o do oxigênio é 8, pois 1g de hidrogênio
reage com 8g de oxigênio resultando em 9g de água. Em termos algébricos*
1H + 8O → 9HO;
o equivalente-grama do cloro é 35, pois
1H + 35Cl → 36HCl
Paralelamente, em 1808, o químico francês Gay-Lussac54, a partir de uma série de
experimentos, concluiu que as reações gasosas obedecem uma relação simples entre os
volumes dos gases reagentes. Para entender este raciocínio, as equações químicas (1.1) e
(1.2), que foram balanceadas em termos das massas dos reagentes, devem agora ser
balanceadas em termos dos volumes gasosos. O que se observa experimentalmente são as
seguintes reações:
2H + 1O → 1HO
e
1H + 1Cl → 2HCl
De acordo com as equações químicas (1.3) e (1.4), ao se misturar dois volumes (dois
litros, por exemplo) de hidrogênio com um volume (um litro, seguindo o exemplo) de
oxigênio, ao término da reação será obtido um volume de vapor d'água (ou um litro),
enquanto que a mistura de um volume de hidrogênio com um volume de cloro resulta em um
volume de vapor de ácido clorídrico. Isso quer dizer que a reação (1.3) inicia com três
volumes (dois de hidrogênio e um de oxigênio) e termina com um volume (de vapor d'água),
caracterizando uma contração, enquanto que a reação (1.4) inicia-se com dois volumes e
termina também com dois volumes. Surge aí um problema: por que há contração em certas
reações enquanto que não há contração em outras?
Tal intrigante situação levou Avogadro55 a elaborar em 1811 a tão famosa hipótese,
* CUIDADO: as equações químicas a seguir não são balanceadas em termos de número de átomos, mas emtermos das massas das substâncias em consideração
54 Joseph Louis Gay-Lussac (1778 – 1850), químico e físico francês.55 Lorenzo Romano Amedeo Carlo Avogadro di Quaregna e di Cerreto (1776 – 1856), cientista italiano que
(1.1)
(1.2)
(1.3)
(1.4)
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 25
conhecida como hipótese de Avogadro, que estabelece que sistemas gasosos de mesmo
volume, temperatura e pressão contém o mesmo número de moléculas, independentemente da
natureza química do gás.
É somente a partir daí que surge a distinção entre molécula (formadora dos compostos
químicos) e átomos (formadores das moléculas). Assim, o composto químico hidrogênio não
deve ser representado simplesmente pelo símbolo H, mas por HH ou por H2. Da mesma forma
em vez de O para o oxigênio, e em vez de Cl para o cloro, devem ser escritos,
respectivamente ClCl, ou Cl2 e OO, ou O2. Com isso, Avogadro concluiu a molécula de água é
HOH (ou H2O) e a molécula de ácido clorídrico é HCl. Foi a partir desse momento também
que as equações químicas puderam ser balanceadas em termos de moléculas (mol). Assim, as
equações (1.1) e (1.2) podem ser escritas e balanceadas corretamente como
Equação H2 + O2 → H2O
Massa (g) 1 8 9
Volume (×22,4L, 0ºC, 1atm) 0,5 0,25 0,5
Razão volumétrica* 2 1 2
Molécula (mol) 0,5 0,25 2
Razão molar (estequiometria)* 2 1 2
Equação H2 + Cl2 → HCl
Massa (g) 1 35 36
Volume (×22,4L, 0ºC, 1atm) 0,5 0,5 0,5
Razão volumétrica* 1 1 2
Molécula (mol) 0,5 0,5 0,5
Razão molar (estequiometria)* 1 1 2
deu notáveis contribuições à teoria molecular da matéria.* As razões volumétrica e molar aqui são calculadas de modo que se tenha os menores números inteiros
possíveis
Tabela 1.1 Reação química de formação de vapor d'água com valores experimentais de massa e volume e proposta de valores molares.
Tabela 1.2 Reação química de formação de vapor de ácido clorídrico com valores experimentais de massa e volume e proposta de valores molares.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 26
A visão estabelecida por Avogadro se mostrou mais racional e tornou as reações químicas
mais compreensíveis, tornando, portanto, o postulado vii de Dalton incompatível para certas
reações. Mesmo assim, Dalton não aceitou inicialmente a hipótese de Avogadro. Para
entender a oposição de Dalton à hipótese de Avogadro, basta refletir sobre o seguinte
questionamento: se o oxigênio é capaz de se ligar a dois hidrogênios, porque também não
seria capaz de se ligar a três, ou quatro, ou mais?
Embora houvesse opositores, os adeptos à hipótese de Avogadro concluíram que da
mesma forma que a molécula de água pode ser escrita como H2O, também deveriam ser
escritos simbolicamente Na2O e NaCl. Reunindo essas informações, pode-se concluir que o
hidrogênio, o sódio e o cloro só são capazes de se ligar uma vez, enquanto que o oxigênio
aceita para si a ligação com dois outros átomos. A partir disso, também, surge uma nova
concepção: os compostos químicos podem ser entendidos como simples (quando os átomos
que formam suas moléculas são idênticos, como o oxigênio) e como compostos (quando os
átomos que formam suas moléculas são diferentes, como a água).
Com tudo isso, o próximo passo veio a ser a determinação precisa da massa de cada
substância simples que reage com 1g de hidrogênio (ou com 8g de oxigênio, ou qualquer
outro que já se saiba seu equivalente-grama) e uma consequente organização desses elementos
em função de suas propriedades químicas semelhantes. A realização de tal tarefa culminou no
que hoje é conhecida como a Tabela Periódica dos Elementos Químicos, que teve como
principais protagonistas Lavoisier e Mendeleiev56.
1.3.4 O Atomismo Físico
A mecânica newtoniana também teve um papel crucial (senão decisivo) no
estabelecimento da teoria atômica. Partindo de seus fundamentos e agregando-os ao cálculo
estatístico, pode-se chegar matematicamente às propriedades dos gases desde uma série de
requisitos conhecidos como Postulados da Teoria Cinética dos Gases, teoria desenvolvida
principalmente por Maxwell e por Boltzmann57. Os postulados são os seguintes:
56 Dmitri Ivanovich Mendeleiev (1835 – 1907), químico russo criador da primeira versão da tabela periódicados elementos químicos. Em seus trabalhos, foi capaz de prever existência de certos elementos, bem comosuas características e propriedades químicas.
57 Ludwing Eduard Boltzmann (1844 – 1906), físico e filósofo austríaco que desenvolveu a mecânicaestatística e a aplicou à física.
CAPÍTULO 1 – LUZ E MATÉRIA 27
i- Um gás é formado por um número muito grande de partículas em movimento
retilíneo e que, à distância, não interagem entre si.
ii- Cada partícula realiza movimentos aleatórios.
iii- Os choques entre partículas, assim como os choques entre as partículas e as
paredes do recipiente, são perfeitamente elásticos.
iv- As dimensões de cada partícula são desprezíveis quando comparadas às distâncias
que elas percorrem entre cada colisão.
v- Cada colisão tem duração muito menor que o tempo de livre movimento.
É a partir da teoria cinética dos gases que se dá início a uma nova formulação sobre a
compreensão da temperatura e da transferência de energia térmica entre corpos ou substâncias
que se encontram a diferentes temperaturas. A teoria estabelece que a temperatura dos corpos
é uma medida do grau de movimento (translação, rotação, vibração) de suas moléculas. A
partir disso, Lord Kelvin58 estabeleceu a escala de temperatura cuja unidade de medida
carrega seu nome. Para ele, de acordo com a teoria cinética, deveria haver uma temperatura na
qual não haveria energia de agitação molecular, tal temperatura sendo o 0K.
58 William Thomson (1824 – 1907), mais conhecido como Lord Kelvin, foi um físico matemático e engenheiroinglês.
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 28
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA
No capítulo 1 tratou-se breve e qualitativamente a respeito de como a ciência que versa
sobre a óptica e a ciência que versa sobre a estrutura da matéria evoluíram até a atual
concepção que se tem delas. Há, no entanto, outras considerações que devem ser feitas a fim
de garantir uma boa compreensão dos capítulos seguintes que serão, portanto, abordadas nos
próximos itens.
É importante discutir detalhadamente cada ponto elencado. Para começar, preferiu-se
neste texto dar início às considerações sobre propriedades da matéria, seguida de uma
abordagem sobre as equações de Maxwell. A partir daí, será dado um palpite sobre o modelo
para a estrutura da matéria, a partir do qual serão explicados o máximo de fenômenos
observados. Por fim, abordar-se-á sobre a interação de ondas eletromagnéticas com a matéria.
2.1 Propriedades Elétricas e Magnéticas dos Materiais
O termo eletricidade foi cunhado na Grécia antiga, onde e quando percebeu-se que, após
ser atritado com materiais como seda, ou peles de animais, o âmbar era capaz de atrair
pequenos pedaços de palha seca. A palavra elektron significa âmbar. O termo magnetismo
também foi cunhado na Grécia antiga. Os gregos antigos observaram que uma pedra
encontrada na região da Magnésia tinha o poder de atrair e de ser atraída pelo ferro. A partir
desses conhecimentos, a eletricidade e o magnetismo foram estudados sem que fosse tecida
nenhuma relação entre esses dois ramos. [40]
Muitas pessoas já deve ter realizado (ou ao menos ter ouvido sobre) o famoso
experimento: atrair pequenos pedaços de papel com um pente de plástico depois de passá-lo
várias vezes nos cabelos secos. O pente é capaz de atrair pequenos pedaços de papel pelo
mesmo motivo que o âmbar dos gregos antigos era capaz de atrair pequenos pedaços de palha
seca. Isso é conhecido como eletrização por atrito.
Durante muito tempo, esse foi o único fenômeno relacionado à eletricidade que se teve
conhecimento. O primeiro gerador eletrostático foi criado justamente com base nesse tipo de
processo de eletrização. Trata-se do Globo de von Guericke59, criado em 1663. Este
dispositivo, na verdade, não foi criado com a intenção de gerar eletricidade (embora gerasse),
59 Otto von Guericke (1602 – 1686), cientísta, inventor e político alemão.
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 29
mas sim para gerar “fluidos de virtude”. Contudo, sua criação inspirou o desenvolvimento de
dispositivos semelhantes, estes sim, com a finalidade de gerar cargas elétricas. [41]
Em 1729 Stephen Gray60 percebeu que é possível transferir carga elétrica, por meio de
metais, de um objeto eletrizado a outro neutro. Além disso, ele descobriu o processo de
eletrização por indução em metais [41]. Tempos depois, em 1733, du Fay61 percebeu que a
eletricidade se manifestava de duas formas e as classificou como eletricidade resinosa (R) e
eletricidade vítrea (V). Eletricidade R repulsa R, mas atrai V, que por sua vez repulsa V [42].
Em 1745, van Musschenbroek62, em um experimento que quase provocou a morte de seu
amigo, inventou a jarra de Leyden, precursor do capacitor [41, 42].
Em 1747, Benjamin Franklin63 desenvolveu uma teoria na qual a eletricidade era descrita
como um fluido que escoava de um material para outro durante o processo de eletrização. Sua
teoria estabelecia a lei da conservação do fluido elétrico. Foi em sua teoria que surgiu pela
primeira vez as classificações de carga positiva e carga negativa. A partir dessas definições,
quando se fazia um fluido elétrico escoar de um material A para um material B, o primeiro
ficava com carga negativa, enquanto que o segundo ficava com carga positiva, definindo
assim um sentido positivo para o que veio posteriormente a ser chamado de corrente elétrica.
[40]
Realizando experimentos nos quais objetos eletrizados foram acoplados a uma balança de
torção, Coulomb64 determinou a lei do inverso do quadrado da distância para a força
eletrostática, a qual leva seu nome: lei de Coulomb. Segundo a lei de Coulomb, a força
eletrostática Felétrica entre duas cargas q1 e q2 separadas a uma distância d é dada por [38, 40]
F elétrica=K⋅q1 q2
d 2 ; K≈9,0⋅109 N m 2/C2.
Os estudos sobre eletricidade tiveram grande impulso (ou poder-se-ia dizer uma
verdadeira propulsão) quando Alessandro Volta65, em 1800, criou a primeira pilha elétrica
[42].
60 Stephen Gray (1666 – 1736), tingidor e astrônomo amador inglês.61 Charles François de Cisternay du Fay (1698 – 1739), químico francês e superintendente do Jardim do Jardin
des Plantes.62 Pieter van Musschenbroek (1692 – 1761), cientista holandês.63 Benjamin Franklin (1706 – 1790), considerado como o Primeiro Americano, foi um teórico em política,
político, cientista, inventor, ativista cívico e diplomata.64 Charles-Augustin de Coulomb (1736 – 1806), físico francês.65 Alessandro Giuseppe Antonio Anastasio Volta (1745 – 1827), físico italiano conhecido especialmente pela
invenção da pilha.
(2.1)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 30
2.2 As Equações de Maxwell
Como já foi dito, Maxwell já tinha conhecimento das leis da eletricidade e do magnetismo
elaboradas a partir dos estudos empíricos feitos por Ampère66, por Gauss67 e por Faraday,
entre outros.
A partir da famosa lei de Gauss, é possível quantificar a carga elétrica líquida q em uma
região medindo-se para isso o campo elétrico E em pontos que englobam a região onde se
localizam tais cargas. Matematicamente, a lei de Gauss pode ser escrita como [33, 38, 43]
∇⋅E=ρ eϵ ,
ou, em sua forma integral,
∮superfície
E⋅da=1ϵ ∫
volume
ρ e dυ .
A lei de Faraday está relacionada com a propriedade de se obter campos elétricos a partir
de campos magnéticos variáveis e vice-versa. De certa forma, pode-se dizer que a economia
global gira em torno desta lei, uma vez que a energia elétrica que chega nos domicílios e nos
ambientes de trabalho é originada em turbinas desenvolvidas com base em tal lei†. Ela pode
ser escrita como [33, 38, 43]
∇×E=−∂B∂ t
,
ou, em sua forma integral
∮contorno
E⋅d l=− ∂∂ t∫área
B⋅d a .
A lei de Ampère aponta a relação entre o vetor indução magnética B e a densidade de
corrente elétrica J de maneira similar à qual o campo elétrico está relacionado à carga elétrica
na lei de Gauss. A lei é escrita matematicamente como [33, 38, 43]
∇×B=μ J ,
ou, em sua forma integral
∮contorno
B⋅d l=μ∫área
J⋅d a .
Uma última equação muito importante é a que trata da ausência de monopolo magnético.
66 André-Marie Ampère (1775 – 1836), físico e matemático francês.67 Johann Carl Friedrich Gauss (1777 – 1855), matemático, astrônomo e físico alemão.† Frase bastante repetida pelo professor Walter Lewin, emérito do MIT, em suas aulas.
(2.2a)
(2.3a)
(2.4a)
(2.2b)
(2.3b)
(2.4b)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 31
Sabe-se que ao se quebrar um ímã, sempre serão obtidos novos ímãs, com polos norte e sul,
não importa quantas vezes se quebrem as partes de um ímã. Diz-se, portanto, que os polos
magnéticos são inseparáveis. Pode-se escrever isso matematicamente como [33, 38, 43]
∇⋅B=0 ,
ou, em sua forma integral
∮área
B⋅d a=0 .
Além disso, a lei de conservação das cargas elétricas (ou lei da continuidade para a
corrente elétrica) exige que [33, 38, 43]
∇⋅J+∂ρ e
∂ t=0 .
Nestas equações, o símbolo ∇ é um operador diferencial cuja forma depende das
coordenadas em que se está trabalhando, os símbolos ϵ e μ são, respectivamente, as constantes
denominadas permissividade elétrica (≡ 8,854187817∙10-12C2/N m2, valor atual para o vácuo
[44]) e permeabilidade magnética (≡ 4π∙10-7H/m, valor atual para o vácuo [44]). A grandeza ρe
é a densidade volumétrica de carga elétrica, isto é, quantidade de cargas dq contidas em um
volume dυ
ρe≝d qd υ
.
A grandeza J é a densidade de corrente elétrica, ou fluxo de cargas dq que atravessam um
elemento de área da, orientado na direção n em um intervalo de tempo dt, isto é
J≝d
d ad qd t
n=ρ e u ,
onde u é a velocidade das cargas elétricas que definem ρe.
Na época de Maxwell não havia ainda os mesmos símbolos usados nestas equações, mas o
conhecimento nelas contido era essencialmente o mesmo.
Ao observar detalhadamente a lei de Ampère, pode-se perceber que há inconsistência
tanto na sua forma diferencial quanto na sua forma integral [38]. Aplicando o operador
divergente em ambos os membros da equação 2.3a, obtém-se o seguinte resultado
∇⋅∇×B=μ ∇⋅J .
O divergente de qualquer rotacional é nulo. No entanto, o divergente de J não é
necessariamente nulo. Portanto, a forma diferencial é incompatível. Considere agora a
equação 2.4b aplicada entre as placas de um capacitor enquanto este está sendo carregado
(2.5a)
(2.5b)
(2.6)
(2.7)
(2.8)
(2.9)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 32
(figura 2.1).
Pela definição da equação 2.4b, a integral em contorno fechado do produto escalar entre o
campo magnético e o deslocamento ao longo do contorno é proporcional à corrente total
secante à superfície aberta definidora do contorno fechado. O problema neste caso especial é
que a superfície aberta escolhida da maneira mostrada na figura 2.1 não é atravessada por
corrente nenhuma. Assim, o lado direito da equação 2.4b é nulo sem, no entanto, o lado
esquerdo da mesma zerar.
Maxwell percebeu tal inconsistência. Uma forma de corrigir este problema é pensar no
que acontece entre as placas, à medida que o capacitor está sendo carregado. Neste caso, o
acúmulo de cargas elétricas faz aumentar o campo elétrico nesta região. A variação temporal
do campo elétrico pode estar relacionado ao campo magnético no contorno amperiano. Então,
é razoável pensar que deve-se adicionar tal contribuição à lei de Ampère. Além disso, ao
reescrever a equação da continuidade 2.6 como [38]
∇⋅J+∂ρ e
∂ t=∇⋅(J+ϵ
∂E∂ t)=0,
parece sensato pensar que em vez de J no lado direito da equação 2.4a, deve-se ter, na
verdade, J + ϵ ∂E/∂t. A lei fica, portanto, da seguinte maneira
∇×B=μ J+μ ϵ∂E∂ t
.
Por ter sumarizado as equações 2.2, 2.3, 2.5 e 2.11, o grupo com essas equações é
chamado de equações de Maxwell. Neste texto, achou-se mais conveniente reescrevê-las na
forma das equações 2.12. Assim, em cada equação separam-se os campos no lado esquerdo
enquanto que as fontes são escritas no lado direito.
Fig. 2.1 Superfície e contorno amperiano englobando uma das placas de um capacitor. [Im: Griffiths, ref. 38]
(2.10)
(2.11)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 33
∇⋅E=ρ eϵ Lei de Gauss 2.12a
∇×E+∂B∂ t=0 Lei de Faraday 2.12b
∇⋅B=0 (sem nome) 2.12c
∇×B−μϵ∂E∂ t=μ J Lei de Ampère corrigida 2.12d
As equações 2.12 juntas à equação 2.13 (conhecida como lei de Lorentz para a força
eletromagnética) formam as bases para o formalismo de todo o eletromagnetismo [38].
F=q(E+u×B).
2.3 Ondas Eletromagnéticas no Vácuo
Em uma região onde se faz vácuo não há cargas nem correntes elétricas. Como
consequência disso, o lado direito de cada uma das equações de Maxwell (equações 2.12) é
nulo.
∇⋅E=0 2.14a
∇×E+∂B∂ t=0 2.14b
∇⋅B=0 2.14c
∇×B−μ0ϵ 0∂E∂ t=0 * 2.14d
As equações 2.14 constituem um sistema acoplado de equações diferenciais parciais de
primeira ordem. Para desacoplá-las, aplica-se o operador rotacional nas equações 2.14b e
12.14d [38, 43]
∇×(∇×E)+∇×(∂B∂ t )=∇(∇⋅E)−∇2 E+ ∂
∂ t(∇×B)=
* Quando se usa o índice 0 para os símbolos ϵ e μ, subentende-se que o meio de ação dos campos elétrico emagnético considerado nas equações é o vácuo.
(2.13)
Tabela 2.1 Equações de Maxwell para a eletricidade e para o magnetismo.
Tabela 2.2 Equações de Maxwell para a eletricidade e para o magnetismo no vácuo.
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 34
−∇2 E+μ0ϵ 0
∂2 E∂ t 2 =0 *
∇×(∇×B)−∇×(μ 0ϵ 0∂E∂ t )=∇ (∇⋅B)−∇ 2 B−μ 0ϵ 0
∂∂ t(∇×E)=
−∇2 B+μ 0ϵ 0
∂2 B∂ t 2 =0 *
As equações 2.15a e 2.15b são, respectivamente, equações de ondas para o campo elétrico
E e para o campo magnético B. A velocidade de propagação de tais ondas no meio imaterial
proposto no início desses cálculos é dada por [44]
c=(μ 0ϵ 0)−
12≡299.792 .459m /s . †
Ao chegar a este resultado, Maxwell certamente deve ter sentido uma emoção eletrizante.
Naquele tempo já eram sabidos os valores da permissividade elétrica, da permeabilidade
magnética e da velocidade da luz. O valor obtido para a velocidade da propagação das ondas
eletromagnéticas é incrivelmente próximo ao valor da velocidade da luz conhecido em sua
época. A comparação entre estes resultados lhe induziu a sugerir que a luz era uma onda
eletromagnética.
2.4 A Estrutura da Matéria
Após toda essa discussão, chegou a hora de dar um palpite, ou seja, sugerir um modelo
para a estrutura da matéria. Tal modelo deve permitir que sejam extraídas todas as
propriedades fenomenológicas observadas experimentalmente.
A partir dos resultados de Lavoisier e seus sucessores atomistas, bem como dos trabalhos
de Boltzmann e de Maxell, pode-se inferir que
i- a matéria é feita de moléculas, que por sua vez são formadas pela combinação de
átomos;
ii- os átomos possuem cargas elétricas positivas e cargas elétricas negativas em sua
estrutura;
iii- a luz é uma onda eletromagnética.
* Na passagem do primeiro para o segundo membro desta equação, utilizam-se os seguintes resultadosmatemáticos: (1) rotacional do rotacional de um vetor é igual à diferença entre o gradiente do divergente e olaplaciano do vetor; (2) As derivadas espaciais (∇×A) e temporal (∂A /∂ t ) de uma função vetorialsão independentes, isto é, não importa a ordem em que elas são aplicadas. Na passagem do segundo membropara o terceiro membro, usou-se os resultados 1.14a e 1.14c.
† A letra c é geralmente reservada para representar a velocidade de propagação da luz no vácuo.
(2.16)
(2.15a)
(2.15b)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 35
A suposição i está de acordo com o que se observa nas reações químicas. A suposição ii
está de acordo com os experimentos de eletrização. A suposição iii é resultado das equações
de Maxwell.
Estas suposições são apenas o começo para uma descrição das propriedades dos materiais.
Com relação às propriedades elétricas, todos os materiais conhecidos até hoje podem ser
classificados em três grandes grupos:
I- materiais isolantes,
II- materiais semicondutores,
III- materiais condutores.
Os materiais isolantes não são bons condutores elétricos. Para que haja uma corrente
elétrica apreciável entre suas extremidades, é necessário que nelas seja aplicada uma diferença
de potencial (ddp) muito alta. Em outras palavras, os isolantes apresentam alta rigidez
dielétrica. A tabela 2.3 a seguir apresenta valores da rigidez dielétrica para alguns materiais.
Material Rigidez dielétrica(1000 V/mm)
Ar 3
Poliestireno 24
Papel 16
Pirex 14
Os materiais semicondutores têm a propriedade de não conduzir corrente elétrica
apreciável a menos que a ddp em suas extremidades exceda um certo valor. Em geral, essa
diferença de potencial é entre 1V e 10V.
Os materiais condutores mais conhecidos são os metais em geral. Eles conduzem corrente
elétrica com muita facilidade, bastando para isso a aplicação de pequenas ddp's em suas
extremidades.
Essas informações sugerem que as cargas elétricas nos materiais isolantes estão muito
bem presas aos átomos, enquanto que as cargas elétricas nos metais estão livres para
“escoarem” de acordo com o potencial elétrico aplicado nesse tipo de material.
Tabela 2.3 Rigidez dielétrica de alguns materiais. [f: Resnick, ref. 45]
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 36
Realizando experimentos nos quais radiação de urânio era feita incidir sobre uma fina
folha de ouro, Rutherford68 foi capaz de determinar as dimensões do átomo. Após mais
investigações e discussões teóricas, finalmente o modelo do átomo pôde ser tomado como
constituído de um diminuto núcleo de carga positiva envolto por uma distribuição de carga
elétrica que, em toda sua extensão, totaliza uma carga negativa de módulo igual à carga do
núcleo [40]. A massa do núcleo é cerca de 1637 vezes maior que a massa da distribuição
eletrônica, enquanto que a distribuição eletrônica se estende por um raio cerca de cem mil
vezes maior em comparação ao raio do núcleo (figura 2.2) [31, 39].
Nos moldes do modelo da figura 2.2, a estabilidade do átomo só pode ser compreendida
segundo a teoria da mecânica quântica, cujos fundamentos não serão aprofundados neste
trabalho. Ao contrário disso, o tratamento teórico clássico será a principal ferramenta de
estudos, uma vez que os resultados esperados são comparáveis aos obtidos experimentalmente
com um elevado grau de precisão.
2.5 O Campo Elétrico nos Materiais
O campo elétrico fora do átomo, devido exclusivamente a seus elétrons e núcleo, é nulo.
Para concluir isso, considere-se uma superfície gaussiana esférica concêntrica ao núcleo e de
raio maior que o raio atômico. A carga total enclausurada é nula, pois o átomo é neutro. Logo,
68 Ernest Rutherford (1871 – 1937), físico inglês nascido na Nova Zelândia conhecido como o Pai da FísicaNuclear. É considerado o maior físico experimental desde Michael Faraday. Ganhou o prêmio Nobel deQuímica de 1908 por desenvolver trabalhos sobre a desintegração de elementos radioativos.
Figura 2.2 Modelo da estrutura do átomo de hélio. [Im: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/2/23/Helium_atom_QM.svg/640px
-Helium_atom_QM.svg.png]
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 37
o campo elétrico na superfície gaussiana em questão também é nulo.
Se um campo elétrico externo exercer ação sobre tal átomo, ele deverá atuar tanto nas
cargas negativas bem como nas cargas positivas (pelo princípio da superposição), deslocando
estas na direção do campo, enquanto que aquelas são deslocadas no sentido contrário. O
átomo neutro imerso em um campo elétrico, portanto, fica polarizado (figura 2.3). [38]
Algo um pouco mais complexo ocorre com as moléculas. Resultados experimentais
sugerem que há dois tipos de moléculas: polares e apolares. Nesse ponto de vista, as
moléculas polares são aquelas que têm dipolo elétrico permanente, como a molécula de água.
As moléculas apolares, no entanto, não têm dipolo elétrico permanente.
Quando uma molécula polar é submetida a um campo elétrico, seu dipolo elétrico tende a
ser orientado no sentido do campo. Há também um efeito de distorção da distribuição
eletrônica, porém este efeito é irrelevante frente ao torque que a molécula sofre.
Quando uma molécula apolar é submetida a um campo elétrico, sua distribuição pode ser
deformada em maior ou menor grau, dependendo da orientação da molécula com o campo.
A aplicação de um campo elétrico em um pedaço de material induz a polarização (ou a
reorientação) dos constituintes do material (átomos ou moléculas). Uma grandeza física de
extrema importância nesse processo é a polarização do material P dada por [33, 38, 43]
P≝momento de dipolo por unidade devolume
e cuja unidade de medida no S.I. é C/m². Teoricamente, a polarização do material é devida,
em partes, à deformação da distribuição, em torno dos átomos e das moléculas, dos elétrons
Figura 2.3 Deslocamento da distribuição eletrônica de um átomo neutro devido à ação de um campo elétrico externo. Quando não muito intenso, um campo elétrico provoca um
deslocamento d muito pequeno (0,23fm para E = 500kV/m). A esfericidade da distribuição eletrônica, portanto, não é alterada. A concepção de um dipolo elétrico surge pelo fato de a
carga negativa de uma distribuição esférica ter ação como se toda a carga estivesse localizada em seu centro (ponto O). [Im: Griffths, ref. 38]
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 38
ligados, como também pela redistribuição, na superfície do material, de elétrons livres. A
polarização se relaciona matematicamente com a densidade superficial de cargas ligadas,
σligados, por meio da equação
σ ligados≝P⋅n ,
enquanto que a relação de P com a densidade volumétrica de cargas ligadas, ρligados, é dada por
ρ ligados≝−∇⋅P .
Se as cargas elétricas de um material se reordenam, elas acabam alterando o campo
elétrico. E se elas se reordenam de acordo com o campo elétrico, ao alterá-lo deverão se
reordenar em função da alteração do campo. Isso pode gerar uma confusão ao tentar-se refletir
sobre esse processo. Porém, é possível resolver tal impasse a partir de um simples artifício.
Tal artifício consiste no seguinte:
i- suponha que, após o equilíbrio do rearranjo das cargas, o campo elétrico total seja o
resultado da superposição do campo elétrico originalmente aplicado Eaplicado com o
campo elétrico devido aos dipolos originados Edipolos
Etotal=Eaplicado+Edipolos ,
ii- suponha que o campo elétrico não seja muito forte, de modo que o material em
questão polarize-se de maneira linear ao campo elétrico total em seu interior, isto é
Pmat=χ mat(ϵ 0 Etotal),
onde χmat é uma constante positiva que depende do material. Ela é propositalmente
escolhida assim de modo a ser adimensional; ela recebe o nome de susceptibilidade
elétrica. Materiais que respondem linearmente ao campo elétrico são denominados
materiais lineares.
O campo elétrico devido aos dipolos elétricos de um material é dado por
Edipolos=−1ϵ 0
Pmat .
Assim, combinando as equações 2.19, 2.20 e 2.21, tem-se
Eaplicado=(1+χ mat)⋅Etotal=ε mat E total ,
onde
εmat≝1+ χ mat .
Conclui-se, portanto, que, o campo elétrico resultante é proporcional ao campo elétrico
(2.17)
(2.18)
(2.19)
(2.20)
(2.22a)
(2.22b)
(2.21)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 39
originalmente aplicado. Na equação 2.22a, a constante εmat é definida como constante
dielétrica do material. Suponha que seja originado um campo elétrico a partir do acúmulo de
cargas nas placas de um capacitor plano, entre as quais ainda não há material nenhum. Depois
de estabilizado o campo elétrico, anota-se a diferença de potencial entre suas placas e, em
seguida, isola-se o capacitor. Posteriormente, insere-se um pedaço de material dielétrico entre
as placas. Anota-se, então, a nova diferença de potencial entre as placas. Verifica-se que, ao
fim deste procedimento, o potencial elétrico diminui, o que significa dizer que, em função da
presença do dielétrico, isto é, em função de uma reorganização de cargas do dielétrico forçada
pelo campo elétrico original, o campo elétrico total dentro do material deve ser menor que o
campo original na região agora ocupada*. A constante dielétrica dos materiais é, portanto,
sempre maior que 1.
2.6 Continuidade e Descontinuidade de Campos em Interfaces
As funções do campo elétrico e do campo magnético apresentam descontinuidade espacial
na interface dos materiais. Isso ocorre como resultado da polarização elétrica e magnética do
material em questão. Suponha, por exemplo, um material dielétrico localizado entre as placas
de um capacitor (figura 2.4).
* A queda de potencial é dada pela diminuição no valor do módulo da integral de linha ∫+
−
E⋅d l na região
entre as placas do capacitor, passando por dentro do dielétrico. Para isso, o campo elétrico no interior domaterial deve ser reduzido. Essa redução se dá por conta da indução de dipolos elétricos no seu interior.
+ + + + + + + + + + + + + + + +
– – – – – – – – – – – – – – – –
+ + + + + +
– – – – – –
Eapl
= σapl
/ϵ0
E(2)ind
= σind
/ϵ0
Emat
= (σapl
– σind
)/ϵ0
= (1 + χmat
)Eapl
+σapl
–σapl
–σind
+σind
= – χeσ
apl
Eapl
Eapl
Figura 2.4 Campo elétrico nas regiões externa e interna a um dielétrico linear. O campo elétrico devido exclusivamente às cargas do capacitor E
apl induz dipolos elétricos no
material. Como consequência, a interface do material apresenta um acúmulo de cargas, enquanto que em seu interior é garantida a neutralidade, pelo menos a nível mesoscópico
(isto é, para dimensões grandes o suficiente para englobar várias moléculas, mas suficientemente pequenas comparadas com as dimensões do material).
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 40
O campo elétrico devido às cargas nas placas do capacitor é
E apl=σ aplϵ 0
.
Este campo elétrico induz a polarização do material dielétrico. Como consequência desta
polarização, é gerado um campo elétrico dentro do material dado por
E ind=σ indϵ 0
de sentido contrário ao campo elétrico Eapl. Se o dielétrico for linear, então
σ ind=−χ matσ apl ,
ou seja, de sinal contrário à carga elétrica que a induz. Portanto
Emat=1εmat
E0<E0 .
Observa-se, então, que ao passar de fora para dentro do material, o campo elétrico sofre
uma alteração, isto é, há uma descontinuidade do campo elétrico na interface. Fica mais fácil
trabalhar tal descontinuidade quando se define a permissividade elétrica do material, ϵmat
εmat≝ϵ matϵ 0
.
A descontinuidade é, portanto, dada por
ϵ 0 Eapl=ϵ mat Emat .
De maneira mais geral, caso a interface seja dada entre dois dielétricos lineares quaisquer,
escreve-se
ϵ 1 E1=ϵ 2 E2 ,
onde os índices subscritos na equação 2.29 referem-se aos dielétricos da interface.
Em um caso mais geral, suponha que a direção do campo elétrico seja oblíqua à interface,
como mostra a figura 2.5. Aplicando a lei de Gauss (equação 2.2b) à superfície cilíndrica
mostrada na figura 2.5, tem-se
Eexterno⊥
−E interno⊥
=σ induzidoϵ 0
.
Isto quer dizer que, se a componente do campo elétrico perpendicular à interface puder ser
medida dentro e fora do material, então deverá ser verificado que elas são diferentes. Tal
resultado não é intuitivo e o estudante precisa refletir bastante até entender o mecanismo que
leva a essa descontinuidade. A diferença entre essas componentes é devida à carga elétrica
induzida acumulada na interface. Se o material for linear, então
(2.29)
(2.27)
(2.28)
(2.23)
(2.24)
(2.25)
(2.26)
(2.30)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 41
E externo⊥
−E interno⊥
=−χ mat
σ indϵ 0
,
o que conduz a
(1+χ mat)Eexterno⊥
=E interno⊥
⇒Eexterno⊥
=εmat E interno⊥ ,
isto é,
ϵ 0 Eexterno⊥
=ϵ mat E interno⊥ .
O resultado na equação 2.31a é justamente o que foi obtido e mostrado para o caso mais
geral na equação 1.33.
Agora, aplicando a lei de Faraday (equação 2.3b) ao contorno mostrado na figura 2.5,
tem-se
E externo∥
=E interno∥ .
O resultado na equação 2.31b mostra que a componente do campo elétrico paralela à
interface dentro e fora do material não sofre alteração, isto é, é contínua.
O fenômeno da descontinuidade ocorre também com o campo magnético. Neste caso a
descontinuidade se dá na componente paralela à interface do material*. Como consequência
da descontinuidade desta componente, obtém-se a relação
1μ0
Bexterno∥
=1μ 1
Binterno∥ .
A componente perpendicular à interface, no entanto, é contínua, isto é,
* O campo magnético é resultado de um campo elétrico que varia no tempo, conforme sugere a equação 1.18d,o campo magnético é perpendicular ao campo elétrico. Se o campo elétrico é descontínuo na direçãoperpendicular à interface, o campo magnético deverá ser descontínuo na direção paralela à interface.
Figura 2.5 Aplicando-se a lei de Faraday ao contorno à esquerda, verifica-se que a componente do campo elétrico paralela à interface é contínua. Aplicando-se a lei de Gauss à superfície gaussiana à direita (escolheu-se aqui um cilindro), verifica-se que a componente
do campo elétrico perpendicular à interface é descontínua.
E┴ext
E┴int
E||ext
E||int
Eext
Eint
E┴ext
E||ext
E||int
E┴int
(2.32a)
(2.31b)
(2.31a)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 42
Bexterno⊥
=Binterno⊥ .
As equações 2.31 e 2.32 são denominadas condições de contorno para a eletrodinâmica.
Assim, qualquer que seja o fenômeno eletromagnético de interfaces, estas equações devem ser
observadas.
2.7 Ondas Eletromagnéticas em Materiais Lineares Transparentes
Nos materiais não condutores, especificamente nos dielétricos lineares, não há cargas nem
correntes elétricas livres. Esta situação é idêntica à situação descrita para o vácuo (primeiro
parágrafo do item 2.3). No entanto, enquanto que as equações 2.14a-c permanecem
inalteradas, a equação 2.14d, terá uma mudança do ponto de vista físico, que não acarretará
nenhuma alteração do ponto de vista matemático. A mudança se dá pelo fato de a
permissividade elétrica e a permeabilidade magnética terem valores diferentes para materiais
diferentes. Portanto, quando se tratar de meios materiais, em vez de escreverem-se ϵ0 e μ0,
serão escritos ϵ e μ. A equação de ondas para o campo elétrico fica, portanto
−∇2 E+μϵ
∂2 E∂ t 2 =0.
A velocidade w de propagação de uma onda eletromagnética em um meio material
transparente é dada, portanto, pela expressão
w=1
√ϵ μ=cn
onde
n≝√ ϵ μϵ 0μ0
é o índice de refração do meio material. Neste contexto, ele é definido como um fator de
proporcionalidade entre a velocidade de propagação da onda eletromagnética no vácuo e a
velocidade de propagação da onda no material. Isso quer dizer que há mudança na velocidade
da onda ao passar de um meio para outro. Uma vez que a frequência da onda não é alterada ao
passar de um meio para outro (pois é estabelecida pela fonte que gera a onda) e a velocidade
da onda (independentemente de sua natureza) é dada pela relação w = λv, onde v é sua
frequência temporal e λ, sua frequência espacial (ou seja, seu comprimento de onda), então
n=cw=λ 0νλν =
λ0
λ ⇒λ=λo
n,
(2.34a)
(2.34b)
(2.33)
(2.32b)
(2.34c)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 43
o que implica dizer que o comprimento de onda λ da onda eletromagnética em meios
materiais transparentes é menor do que o comprimento de onda no vácuo, λ0, pois n é maior
que a unidade (no caso de dispersão normal).
Mais resultados coerentes com a prática podem ser extraídos destas equações. Para isso é
preciso resolver a equação de onda 2.33. Só que aí pode surgir a pergunta: e por que não
resolver também a equação 2.15b em sua forma modificada para meios materiais? Por três
motivos muito bem fundamentados:
i- ao resolver a equação de ondas para o campo elétrico, automaticamente encontra-se
o resultado para a equação de ondas do campo magnético, uma vez que o campo
elétrico relaciona-se com o campo magnético por meio da equação 2.14b (ou, se
preferir, pela equação 2.14d).
ii- ao interagir com o campo eletromagnético, a maioria dos materiais respondem mais
sensivelmente ao campo elétrico do que ao campo magnético. Isto quer dizer que a
permissividade elétrica dos materiais ϵ é diferente à do vácuo.
iii- a maioria dos materiais são não magnetizáveis. Em outras palavras, a
permeabilidade magnética da maioria dos materiais é aproximadamente igual à do
vácuo [38], quando o tratamento é feito em frequências ópticas [43, 46].
Como consequência das observações ii e iii, o índice de refração, definido pela equação
2.34, pode ser obtido pela relação
n=√ε ,
onde ε, chamado constante dielétrica do material, é definido pela equação 2.27.
A equação de ondas 2.33 admite uma infinidade de soluções, desde que sejam da forma
E=E(k⋅r±ω t ),
onde k é chamado de vetor de onda e rege a direção de propagação da onda. A constante ω
determina a frequência da onda. Além disso, ω e k estão relacionadas com a velocidade pela
seguinte equação
ω=k⋅w . *
A equação 2.37 é conhecida como relação de dispersão.
Assim, em coordenadas cartesianas, uma solução plausível para a equação 2.33 é [25, 38]
* Pois ∇2E=k2 E e ∂
2 E/∂ t2=ω
2 E , logo −k 2+w2ω 2
=0⇒ω=k⋅w .
(2.36)
(2.35)
(2.37)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 44
E=Re {(E s s+E p⋅eiϕ p)⋅e i(k⋅r−ω t )}, 0≤ϕ <π .
Na equação 2.38, optou-se pelo uso da matemática dos números complexos com o intuito
de facilitar cálculos. A escolha da parte real como representante da realidade física é arbitrária
e, sem prejuízo nenhum, poder-se-ia ter escolhido a parte imaginária, uma vez que elas
diferem entre si apenas por uma fase de 90º. Fisicamente, esta equação detém todas as
propriedades desejáveis de uma onda harmônica. Matematicamente, ela se mostra de
simplicidade ímpar para a realização de cálculos e obtenção de resultados plausíveis.
Nesta equação, assume-se que (s , k , p) , nesta ordem, formam um terno ordenado de
vetores unitários e perpendiculares entre si. A equação 2.38 expressa o fato de a luz ser uma
onda polarizada, isto é, descreve uma onda que se propaga na direção k , enquanto que o
campo elétrico oscila perpendicularmente a k (com suas projeções nas direções s e p ).
Além disso, por meio dela é possível expressar matematicamente todos os tipos de
polarização da luz:
I- para descrever um estado de polarização linear na direção s , basta fazer Ep = 0;
II- para descrever um estado de polarização linear na direção p , basta fazer Es = 0;
III- para descrever um estado de polarização linear em um eixo qualquer, basta fazer φ
= 0;
IV- para descrever um estado de polarização circular, basta fazer Es = Ep e φ = {π/2,
3π/2};
V- o estado de polarização elíptica é o estado mais geral que além de englobar os
estados I, II, III e IV, engloba os demais não citados. A equação 2.38 dá conta de tudo
isso.
Substituindo a equação 2.38 na equação 2.14b, tem-se que
B=1w⋅k×E ,
ou seja, o campo magnético é perpendicular ao campo elétrico, e seu módulo é proporcional
ao módulo do campo elétrico.
Para entender o mecanismo da reflexão e refração entre meios transparentes, define-se
plano de incidência como sendo o plano que contém as direções de incidência da onda e da
normal à interface dos meios (figura 2.6).
(2.38)
(2.39)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 45
2.8 Luz Refletida e Refratada na Interface de Materiais Lineares Transparentes
Para prosseguir e dar um tratamento mais geral, a equação 2.38 deve ser reescrita de modo
a tratar os resultados consequentes da existência de uma interface entre materiais
transparentes: a reflexão e a refração. Deste modo, as equações para a propagação do campo
elétrico são escritas na forma
EI (r , t )=Re {~E0 I ei (k I⋅r−ω t)},
ER(r , t)=Re{~E0R ei (kR⋅r−ω t )},
ET(r , t)=Re{~E0 T ei (kT⋅r−ω t )}.
A frequência para todas as ondas é a mesma, pois é determinada pela fonte que a gerou. Como
o campo elétrico da onda eletromagnética é sempre ortogonal à direção de propagação, então
EI⋅k I=0 ,
ER⋅kR=0 ,
ET⋅kT=0 .
Além disso, a polarização mais geral para estas ondas pode ser representada por~E0 I=E I
(p) pI+E I(s)eiϕ I s ,
~E0 R=ER
(p) pR+ER(s)e iϕ R s ,
~E0T=ET
(p) pT+ET(s)e iϕ T s ,
onde p indica a direção paralela ao plano de incidência e s , a direção perpendicular. As
ondas refletida e refratada são formadas na interface. Suponha, portanto, que a interface seja o
plano xy, com z = 0, como sugere a figura 2.7. Observa-se que a dependência espacial e
(2.40a)
(2.40b)
(2.40c)
(2.41a)
(2.42a)
(2.42b)
(2.42c)
(2.41b)
(2.41c)
xy
z
Figura 2.6 Direções dos vetores de onda de incidência kI, de reflexão k
R e refração k
T. A
normal à interface é designada pela linha tracejada. O plano em cinza claro é definido como plano de incidência.
kI
kR
kT
θI
θR
θT
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 46
temporal dos campos elétricos das ondas incidente, refletida e transmitida é dada apenas pela
função exponencial (equações 2.40). Uma vez que as equações 2.40 são válidas para qualquer
instante de tempo e em qualquer ponto da interface, então, deve valer a relação
k I⋅r=kR⋅r=kT⋅r ,
para z = 0. A equação 2.43 implica que
k I(x) x+k I
(y) y=k R(x) x+kR
(y) y=k T(x) x+kT
(y ) y .
Para que a equação 2.44 seja válida, deve-se ter
k I(x)=k R
(x )=kT
(x)
e
k I(y)=k R
(y )=k T
(y ).
A figura 2.6 mostra um caso particular das equações 2.45, na qual as componentes y dos
vetores de onda são nulos (isto é, as direções de propagação das ondas incidente, refletida e
refratada estão contidas no mesmo plano: o plano xz). Demonstra-se, dessa forma, o que já
havia sido constatado empiricamente desde a antiguidade: os raios de luz incidente, refletido e
refratado são coplanares. O plano formado por estes raios é definido como plano de
incidência. Além disso, a equação 2.45a conduz ao seguinte resultado
k I senθ I=k R senθ R=k Tsenθ T .
Uma vez que kI = kR, então θI = θR, ou seja, o ângulo de incidência é igual ao ângulo de
reflexão (fenômeno também já conhecido desde a antiguidade, denominado reflexão
especular). Além disso, aplicando as relações 2.34 e 2.37 na relação 2.46, conclui-se queωw I
senθ I=ωwT
senθ T
⇒nI senθ I=nTsenθ T .
A equação 2.47 é a famosa lei de Snell-Descartes para a refração.
Chegar a todas essas conclusões sobre tais fenômenos partindo da concepção de que a luz
é uma onda formada por campos elétrico e magnético que oscilam perpendicularmente entre
si e à direção de propagação da onda é, sem dúvidas, incrível. Observando-se mais
atentamente as equações 2.42 e reescrevendo-as em termos das coordenadas cartesianas xyz
(figura 2.7), tem-se~EI=−E I
(p )cosθ I x+E I(s)eiϕ I y+E I
(p)senθ I z ,
~ER=ER
(p )cosθ I x+ER(s)eiϕ R y+E R
(p)senθ I z ,
(2.43)
(2.44)
(2.45a)
(2.45b)
(2.46)
(2.47)
(2.48a)
(2.48b)
xy
z
ET(s)
ET
(s)
kT
EI(s)
kI
ER(s)
kRER
(p)
θR
1
EI(p)
θI
θT
2
BT(p)
BT(s)
kT
BI(p)
kI
BR(p) k
R
BR
(s)θ
R1
BI(s)
θI
θT
2
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 47
~ET=−ET
(p)cosθ T x+ET(s)e iϕ T y+ET
(p)senθ T z ,
com
(−E I(p )cosθ I x+E I
(s)eiϕ I y)+(E R(p)cosθ I x+E R
(s)eiϕR y )=−ET(p )cosθ T x+E T
(s)eiϕ T y
e
ϵ I (E I(p)+ER
(p))senθ I=ϵT ET
(p)senθ T .
As equações 2.49 e 2.50a resultam da aplicação das condições de contorno (equações 2.31) às
equações 2.48. A equação 2.49 conduz a
(E I(p)−E R
(p))cosθ I=ET
(p)cosθ T .
e a
E I(s)e iϕ I+ER
(s)eiϕ R=ET(s)e iϕ T
Combinando as equações 2.35, 2.47, 2.50a e 2.50b, tem-se
r p≝ER(p)
E I(p)=
ϵT tgθ T−ϵ I tgθ I
ϵ T tgθ T+ϵ I tgθ I
=senθ I cosθ I−senθ T cosθ T
senθ I cosθ I+senθ T cosθ T
e
t p≝ET(p)
E I(p)=
2ϵ I senθ I cosθ I
ϵ I senθ I cosθ T+ϵT senθ T coθ I
=2senθ T cosθ I
senθ T cosθ T+senθ I cosθ I
.
(2.51a)
(2.51b)
(2.50b)
(2.50c)
Figura 2.7 Estas são representações da figura 1.6 quando rotacionada em torno do eixo z e y de modo que o plano da interface separadora dos meios 1 e 2 seja vista apenas como uma
reta e que o eixo y aponte perpendicularmente para fora da página. À esquerda, são mostradas as componentes do campo elétrico. À direita, são mostradas as componentes do campo magnético. São mostrados também os vetores de onda k. Embora, por questão de
comodidade, o esboço de cada vetor se dê em pontos diferentes do desenho, todos os vetores representados se referem ao mesmo ponto (e mesmo instante de tempo) na interface separadora dos meios. Dessa forma, as figuras da esquerda e da direita compõem uma só,
de modo que os campos elétricos e magnéticos nelas ilustrados se referem ao mesmo conjunto de ondas eletromagnéticas. Entre estas figuras está esboçado o sistema de
coordenadas de referência para cálculos.
(2.48c)
(2.49)
(2.50a)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 48
Substituindo a equação 2.47 no terceiro membro das equações 2.51, obtém-se
r p=nT cosθ I−nI cosθ T
nTcosθ I+nI cosθ T
e
t p=2nI cosθ T
n I cosθ T+nT cosθ I
.
As equações 2.52 são chamadas equações de Fresnel para os coeficientes de reflexão e de
refração no modo transverso magnético (TM). Define-se que uma onda eletromagnética vibra
no modo TM quando o vetor campo magnético da onda oscila na direção perpendicular ao
plano de incidência [38]. Falta agora calcular os coeficientes de reflexão e de refração no
modo transverso elétrico (TE), isto é, para a componente do campo elétrico que oscila
perpendicularmente ao plano de incidência.
Para isso, é preciso considerar também as funções do campo magnético para as ondas
incidente, refletida e refratada, que podem ser calculadas pela substituição das equações 2.48
na equação 2.39. Tomando como referência o campo magnético na interface, isto é, em z = 0,
para qualquer instante (representado na figura 2.7),
1μ I(BI
(s )+BR
(s))=
1μ T
BT(s),
(B I(p)e iϕ I+BR
(p)eiϕR)senθ I=BT(p)e iϕ T senθ T,
1μ I(BI
(p)eiϕ I−BR(p)e iϕ R)cosθ I=
1μ T
BT(p)e iϕ T cosθ T .
As equações 2.53 resultam da aplicação das condições de contorno (equações 2.32) ao campo
magnético na interface. A combinação das equações 2.53a e 2.53c dá
BR( p)eiϕR
BI(p)e
iϕ I
=μT tgθ T−μ I tgθ I
μT tgθ T+μ I tgθ I
e
BT( p)eiϕ T
B I(p )e
iϕ I
=2μT senθ I cosθ I
μT senθ T cosθ I+μ I senθ I cosθ T
.
Para frequências ópticas, uma enorme variedade de materiais atendem à relação (§2.7, iii)
μmat≈μ 0.
O membro direito de cada uma das equações 2.54 representa um número real, pois θI e θT são
valores reais (isto é, grandezas mensuráveis). Além disso as permeabilidades magnéticas, até
(2.52a)
(2.52b)
(2.53a)
(2.53b)
(2.53c)
(2.54a)
(2.54b)
(2.55a)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 49
o presente momento, foram definidas como grandezas reais. Isto sugere, portanto, que a
mudança na defasagem das componentes p e s do campo magnético (e portanto do
campo elétrico) deve ser um múltiplo de π. Logo, quando a interface é dada entre dois
materiais transparentes, ocorre que
ϕ R−ϕ I∈{0,±π ,±2π ,±3π , ... }
e
ϕ T−ϕ I∈{ 0,±π ,±2π ,±3π , ... }.
Assim, substituindo as equações 2.47 e 2.55 nas equações 2.54, tem-se que
BR( p)
BI( p)=
nI cosθ I−nTcosθ T
nI cosθ I+nT cosθ T
e
BT( p)
BI( p)=
2nTcosθ I
nT cosθ T+nI cosθ I
. *
De acordo com a equação 2.39,
B(p)=
1w
E (s )
e
B(s )=
1w
E(p ).
Substituindo a equação 2.57 nas equações 2.56, tem-se
r s≝ER(s)
E I(s)=
sen (θ T−θ I)
sen(θ T+θ I)=
nI cosθ I−nT cosθ T
nI cosθ I+nT cosθ T
e
nT
nI
ET(s )
E I(s )=
sen 2θ I
sen (θ I+θ T)=
nT cosθ I
nT cosθ T+nI cosθ I
⇒t s≝ET(s)
E I(s)=
nI sen 2θ I
nTsen(θ I+θ T)=
2 nI cosθ I
nI cosθ I+nT cosθ T
.
As equações 2.58 são as equações de Fresnel para os coeficientes de reflexão e refração da
componente do campo elétrico perpendicular ao plano de incidência. As equações de Fresnel
exprimem resultados experimentais importantes, e por isso é necessário discuti-as
detalhadamente. Os gráficos da figura 2.8 mostram os valores para os coeficientes de Fresnel.
(2.56a)
(2.56b)
(2.57a)
(2.58b)
(2.58a)
(2.57b)
(2.55b)
(2.55c)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 50
Observa-se que estes gráficos mostram valores positivos, bem como valores negativos
para os coeficientes de reflexão. Estes valores estão relacionados com a mudança (ou não
mudança) da direção de oscilação do campo elétrico que ocorre na interface. A direção de
vibração do campo elétrico é aquela que o observador veria se a onda eletromagnética se
propagasse perpendicularmente em direção ao seu olho. Assim, no gráfico da figura 2.8,
valores positivos indicam que o campo elétrico refletido (ou transmitido) oscila em fase com
o campo elétrico incidente, enquanto que valores negativos sugerem que há mudança de fase
de oscilação de 180º do campo elétrico da onda refletida em relação ao campo elétrico da
onda incidente.
Observa-se, a partir das equações 2.52 e 2.58, que no caso de incidência normal (θI ≈ 0) os
coeficientes rp, rs,, entre si, e tp e ts, entre si, são indistinguíveis (a não ser pelo fato de rs = –
rp). Isto quer dizer que em torno de tal ângulo, não tem como definir o plano de incidência e,
por isso, o mecanismo de reflexão é o mesmo para as duas componentes do campo elétrico*.
* Se você observar a figura 1.9 e imaginar os raios de incidência e reflexão se aproximando, de modo que θI
vai tendendo a zero, perceberá que EI(p) e ER
(p) tenderão a ser colineares e apontarão em direções opostas.Assim, o coeficiente de reflexão para a componente do campo elétrico paralela ao plano de incidência foicalculado de modo a dar este resultado particular (mesmo que sem cogitar inicialmente esta possibilidade).Já o coeficiente de reflexão para a componente do campo elétrico perpendicular ao plano de incidênciaoferece valores negativos para qualquer ângulo de incidência. Conclusão: A reflexão da luz que se propagade um meio menos denso para um mais denso ocorre com mudança de fase de 180º do campo elétrico.
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90
-1
-0.8
-0.6
-0.4
-0.2
0
0.2
0.4
0.6
0.8
1
ângulo de incidência
coef
icie
ntes
Figura 2.8 Gráficos das amplitudes dos coeficientes de reflexão e de transmissão das componentes paralela e perpendicular do campo elétrico em relação ao plano de incidência. Nesta simulação, a onda incide de um meio de índice de refração 1 para um meio de índice de refração 1,5. Coeficiente de transmissão da componente paralela e perpendicular: t
p e t
s.
Coeficiente de reflexão da componente paralela e perpendicular: rp e r
s.
56.3º
tp
ts
rp
rs
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 51
O mesmo ocorre com o mecanismo de refração.
No caso de incidência rasante (θI ≈ 90º), a reflexão tende a 100%, enquanto que a refração
tende a zero. Este fenômeno pode ser facilmente observado por qualquer pessoa. Basta olhar
qualquer superfície (mesmo que não seja transparente, mesmo que não seja bem polida)
segundo um ângulo rasante que será possível ver uma reflexão praticamente especular. [47]
Existe também um ângulo de incidência especial para o qual não há reflexão da
componente do campo elétrico paralela ao plano de incidência. Este ângulo de incidência é
denominado ângulo de Brewster69 (θB). É possível prever o valor deste ângulo a partir da
equação 2.52. Olhando atentamente a esta equação, verifica-se que se for atendida a condição
θ I+θ T=90 º
então
senθ I=cosθ T
e
senθ T=cosθ I ,
o que dá
r p=0 .
Substituindo a equação 2.60b na equação 2.47, tem-se que
tgθ B=nT
n I
.
Assim, não importa qual seja o estado de polarização da luz incidente (desde que não seja
linear no plano de incidência), ao incidir segundo o ângulo de Brewster, a onda originada pela
reflexão estará no estado de polarização perpendicular ao plano de incidência (isto é, paralela
à interface).
Da mesma forma, é possível descrever o mecanismo de reflexão e refração quando a onda
se propaga do meio de maior índice de refração para o meio de menor índice. O gráfico da
figura 2.9 mostra os coeficientes de Fresnel da reflexão das componentes do campo elétrico
paralela e perpendicular à interface. Algo diferente acontece neste caso: há um ângulo de
incidência, θc, acima do qual a reflexão é total, isto é, não há refração. Tal ângulo é
denominado de ângulo crítico. É possível prevê-lo a partir da equação 2.47. Basta, para isto,
verificar que este fenômeno não ocorre caso θT < 90º. Então, para θT = 90º,
69 Sir David Brewster (1781 – 1868), físico, matemático, astrônomo, inventor e escritor escocês.
(2.59)
(2.60a)
(2.60b)
(2.61)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 52
senθ c=nT
nI
,
onde, nT < nI*. Este resultado, claro, também é alcançado pelas equações de Fresnel. Para ver
isto, basta substituir a equação 2.62 nas equações 2.52a e 2.58a.
2.9 Luz Refletida e Refratada na Interface de Materiais Lineares Não Transparentes
É fácil inspecionar um material e concluir quando ele é transparente e quando ele é não
transparente. Um material é transparente quando permite a passagem de luz através si. No
entanto, a transparência de um material está fortemente ligada ao comprimento de onda (ou à
frequência) da radiação que interage com o material. Assim, um material pode ser
transparente para determinada região espectral, porém opaco em outras regiões específicas.
Sua não transparência é dada pela absorção da radiação pelo material. A absorção pode ser
compreendida como uma atenuação da intensidade da radiação à medida que a onda se
propaga no interior do material. Experimentos nos quais são medidos os valores para a
absorção da luz que atravessa lâminas de materiais mostram que a absorção é (geralmente)
proporcional à espessura da lâmina [48].
É possível explicar estes resultados fazendo-se uso da teoria até aqui desenvolvida. A
* Para valores de θI > θC, θT passa a assumir valores complexos. Esta condição também pode ser utilizada paraobter θC [46].
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90
-1
-0.8
-0.6
-0.4
-0.2
0
0.2
0.4
0.6
0.8
1
ângulo de incidência
coef
icie
ntes
rs
rp
41.8º
(2.62)
34º
Figura 2.9 Gráficos das amplitudes dos coeficientes de reflexão das componentes paralela e perpendicular do campo elétrico em relação ao plano de incidência. Nesta simulação, a onda incide de um meio de índice de refração 1,5 para um meio de índice de refração 1.
Coeficiente de reflexão da componente paralela: rp. Coeficiente de reflexão da componente
perpendicular: rs.
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 53
equação 2.37 pode ser reescrita como
ω=k⋅cn
,
o que sugere que
kmat=n kvácuo .
Assim, é possível explicar a atenuação do campo elétrico da onda eletromagnética ao
sugerir que o índice de refração é, na verdade, expresso por um número complexo do tipo
~n=n+ iκ ,
onde ~n é o índice de refração complexo do material, n é a parte real enquanto que κ
(denominado coeficiente de extinção do material) é a parte imaginária. Substituindo a equação
2.65 na equação 2.40c, o campo elétrico refratado passa a ser descrito pela expressão
ET(r , t)=Re{~E0 T ei(~kT⋅r−ω t )}=Re {~E0 T e i[(nT+iκ T)k0⋅r−ω t]}=Re {[~E0 T ei(nT k0⋅r−ω t )]e−κT k0⋅r},
que é uma onda evanescente que tem sua amplitude diminuída em função da distância
propagada no interior do material, r, de acordo com o fator exponencial fora dos colchetes no
último membro da equação 2.66.
Ao sugerir que a equação 2.65 descreve as propriedades ópticas dos materiais, a definição
na equação 2.27, bem como todas as dela consequentes, devem ser mudadas de forma que a
constante dielétrica do material passa a ser definida como~ε≝εℜ+iε ℑ
e
~ε =~n 2=(n2−κ 2)+ i(2nκ ),
o que implica em
n=√ 12[ε ℜ+√ε ℜ2 +ε ℑ2 ]
e
κ=√ 12[−εℜ+√ε ℜ2 +ε ℑ2 ] .
Experimentalmente, talvez a maior consequência da redefinição proposta na equação 2.65
ocorre nos coeficientes de Fresnel (equações 2.52, 2.58) que, diferentemente do caso de
propagação de radiação entre materiais transparentes, os coeficientes passam a ser grandezas
complexas no caso de uma interface entre materiais não transparentes (ou entre um material
transparente e um material não transparente).
(2.63)
(2.64)
(2.65)
(2.66)
(2.67)
(2.68)
(2.69a)
(2.69b)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 54
2.10 Modelos Ópticos
Até aqui, a teoria eletromagnética da luz deu excelentes resultados e proporcionou a
explicação de vários fenômenos ópticos observados na prática. Há, no entanto, dois
fenômenos que até então não foram discutidos à luz da teoria eletromagnética:
i- o fenômeno da dispersão, que trata da dependência do índice de refração do material
à frequência da onda eletromagnética, isto é, n=n (ω ).
ii- o fenômeno da absorção, que trata da dependência do coeficiente de extinção à
frequência da onda eletromagnética, isto é, κ=κ (ω ).
A sugestão de que o índice de refração de um material depende da frequência da onda
eletromagnética que o atravessa tem suas origens nos experimentos de Isaac Newton [32].
Após atravessar um prisma, a luz branca se decompõe em cores diferentes. Em outras
palavras, a luz branca, que é a simples combinação das luzes de todas as cores puras, incide
em um prisma de acordo com um ângulo θI, mas cada cor pura emerge segundo um ângulo
diferente das demais cores puras, θT(ω).
Após a obtenção da lei de refração (lei de Snell-Descartes), vários estudos foram feitos no
âmbito de tabelar o índice de refração em função do comprimento de onda para diferentes
materiais. O gráfico da figura 2.10 mostra alguns resultados típicos. Estes resultados são
obtidos para materiais transparentes. O fenômeno da dispersão que ocorre nesses materiais é
denominado dispersão normal por atender as seguintes características [47]
i- o índice de refração cresce com a diminuição do comprimento de onda,
ii- o índice de refração cresce mais rapidamente quanto menor for o comprimento de
onda,
iii- para diferentes substâncias, quanto maior o índice de refração, mais íngreme é a
curva em um dado comprimento,
iv- a curva do índice de refração de uma substância não pode ser obtida pela curva do
índice de refração de outra substância pela translação no eixo das ordenadas.
Praticamente todas as substâncias transparentes incolores (inclusive os gases, embora em
grau muito menor quando comparados aos líquidos e sólidos) apresentam o fenômeno da
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 55
dispersão normal na região do visível. A análise desse fenômeno (bem como a análise do
fenômeno da dependência da absorção em função do comprimento de onda) se dá por meio de
modelos matemáticos ou modelos físicos.
2.10.1 A Dispersão Normal e a Equação de Cauchy
O primeiro modelo bem-sucedido na descrição do fenômeno da dispersão normal foi o
modelo de Cauchy70, proposto em 1836 na forma da equação [47]
n (λ )=C 1+C 2
λ2 +C3
λ4 ,
onde C1, C2 e C3 são constantes características das substâncias. O índice de refração de
substâncias diferentes assumem valores diferentes para C1, C2 e C3. Esta equação não tem
base teórica. No entanto, ela se adéqua formidavelmente a muitos resultados práticos, sendo
bastante utilizada na descrição das propriedades ópticas de materiais transparentes. Para obter
estas constantes, é suficiente que se saiba o valor do índice de refração para três
comprimentos de onda diferentes. Na maioria dos casos, no entanto, a determinação das
constantes C1 e C2 apenas já é suficiente para fornecer uma lei de dispersão bastante acurada.
70 Augustin-Louis Cauchy (1789 – 1857), matemático francês.
Figura 2.10 Variação do índice de refração em função do comprimento de onda para várias substâncias diferentes. [Im: Jenkins, ref. 47]
(2.70)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 56
2.10.2 A Dispersão Anômala e o Modelo de Sellmeier
Em 1904, ao estudar como o índice de refração dos vapores de algumas substâncias
variam com o comprimento de onda da luz, Wood71 descobriu um comportamento até então
desconhecido para o índice de refração do vapor de sódio. Ele percebeu que ao fazer luz
branca passar por um prisma dentro do qual fez-se vácuo seguido de vaporização de sódio, há
forte absorção da luz referente aos comprimentos de onda compreendidos entre 589,0nm e
589,6nm. Além disso, o índice de refração em torno destes comprimentos de onda não podem
ser descritos pela equação 2.70 sugerida por Cauchy. Este comportamento do índice de
refração ficou conhecido como dispersão anômala. Foi assim chamado, pois até então não
havia registro desse tipo de dispersão. Vapores de outras substâncias também apresentam este
tipo de comportamento na região do visível. Posteriormente descobriu-se que até mesmo os
materiais transparentes apresentam este tipo de dispersão na região do ultravioleta e do
infravermelho. [47]
Quando as medidas do índice de refração de materiais transparentes são realizadas na
região do não-visível, a curva de dispersão começa a sofrer desvios da equação de Cauchy,
conforme mostra a figura 2.11. Nesta figura, a equação de Cauchy descreve muito bem a
dispersão na região do visível, mas a partir do ponto R da figura, o índice de refração começa
a diminuir mais rapidamente do que é previsto pela equação. No intervalo caracterizado como
região de absorção, o índice de refração torna-se difícil de ser medido, pois a luz referente aos
comprimentos de onda não atravessam o material (a menos que ele seja suficientemente fino).
Depois da região de absorção, o índice de refração assume valores mais altos em relação à
região anterior à de absorção; na região mais à direita da região de absorção, volta a ter o
comportamento de dispersão normal que, novamente, é bem descrito pela equação de Cauchy,
porém com novos valores para as constantes C1, C2 e C3.
Todos os materiais apresentam absorção de luz para determinadas frequências (ou
comprimentos de onda). A este fenômeno se dá o nome de absorção seletiva e a região de
absorção é chamada de gap. Dessa maneira, o termo dispersão anômala não se enquadra mais
no contexto original, no qual pensava-se que apenas algumas poucas substâncias poderiam
apresentar este comportamento. No entanto, o termo permanece em uso, agora em outro
contexto, que descreve a mudança abrupta do índice de refração em torno do gap.
71 Robert Williams Wood (1868 – 1955), físico e inventor norte-americano.
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 57
O primeiro modelo bem-sucedido na descrição do comportamento anômalo foi o modelo
de Sellmeier72, publicado em 1871. Partindo da análise de dados experimentais de índices de
refração em função do comprimento de onda em diferentes materiais, Sellmeier elaborou uma
lei matemática para descrever a dispersão nos materiais transparentes. A lei é dada pela
equação [47]
n2=1+
S λ2
λ2−λ0
2 ,
onde S é uma constante e λ0 é o comprimento de onda no qual há forte absorção de luz.
A partir da equação 2.71, Sellmeier mostrou que era possível descrever matematicamente
a variação do índice de refração dos materiais com precisão superior à equação de Cauchy. É
fato conhecido que os materiais apresentam mais de uma região de absorção. Para descrever
as várias regiões de absorção dos materiais, a equação de Sellmeier deve ser reescrita na
forma [47]
n2=1+∑
i
S i λ2
λ2−λ i
2 ,
onde os comprimentos de onda λi são os comprimentos de onda de luz de frequências
correspondentes à frequência de ressonância das partículas constituintes do material.
É interessante notar que a equação de Sellmeier não só descreve bem o fenômeno da
dispersão anômala quando o comprimento de onda é próximo (mas não ilimitadamente tão
próximo) do comprimento de onda λ0, mas também descreve muito satisfatoriamente o
fenômeno da dispersão normal. Em outras palavras, a equação de Cauchy pode ser obtida a
72 Wilhelm Sellmeier (1859 – 1928).
Figura 2.11 Dispersão anômala. [Im: Jenkins, ref. 47]
(2.72)
(2.71)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 58
partir da equação de Sellmeier, como um caso particular em que o comprimento de onda da
dispersão normal é maior que o comprimento de onda da região de absorção. Reescrevendo a
equação 2.71 na forma
n2=1+
S
1−λ 02/λ2
e expandindo a equação 2.73 (como uma soma infinita dos termos de uma progressão
geométrica de razão menor que 1), tem-se
n2=1+S(1+ λ 0
2
λ 2+λ0
4
λ 4+...),desprezando fatores de ordem superior a 2,
n≈(1+S )1 /2[1+ S λ02/(1+S )
λ 2 ]1/2
.
Expandindo a equação 2.74b em série de Taylor,
n≈(1+S )1 /2[1+ 12
S λ 02/(1+S )
λ2 +18
(S λ02/ (1+S ))2
λ 4 +...]⇒n=S1+
S2
λ 2+S3
λ4 ,
onde
S 1≡(1+S )1 /2 ,
S 2≡12
S λ02
(1+S )1 /2
e
S 3≡18(S λ 0
2)
2
(1+S )3/2.
A equação 2.74d é a equação de Cauchy obtida a partir da equação de Sellmeier
assumindo que o comprimento de onda é maior que o comprimento de onda de luz
correspondente à frequência de absorção pelo material.
2.10.3 O Modelo Mecânico de Helmholtz
Embora o modelo de Sellmeier tenha obtido sucesso na aplicação matemática da dispersão
anômala em frequências ópticas próximas às frequências de absorção, ele falha ao tentar
descrever a dispersão na região de absorção em si, como pode ser visto no gráfico da figura
(2.73)
(2.74a)
(2.74b)
(2.74d)
(2.74e)
(2.74f)
(2.74g)
(2.74c)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 59
2.10. Nela é representado a simulação do índice de refração de um material hipotético que
apresenta gaps de absorção em torno de 500nm e em torno de 800nm. De acordo com a
equação de Sellmeier, o índice de refração nessas regiões sofre descontinuidade e tende a
menos infinito ao se aproximar pela esquerda do gap e a mais infinito ao se aproximar pela
direita do gap.
Figura 2.10 Simulação gráfica da equação de Sellmeier 2.72. Os valores para esta simulação são S
1 = 0,1, λ
1 = 500nm, S
2 = 0,04 e λ
2 = 800nm.
Figura 2.11 Curva de dispersão de um oscilador com diferentes graus de fricção e de absorção de energia. (a) Alto grau de absorção e de fricção. (b) Alto grau de absorção, baixo
grau de fricção. (c) Baixo grau de absorção, alto grau de fricção. (d) Baixo grau de absorção, baixo grau de fricção. [Im: Jenkins, ref. 47]
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 60
É de se imaginar que seja fisicamente improvável uma grandeza desse tipo sofrer tal
descontinuidade. Realmente, experimentos feitos com prismas de pequeno ângulo de
refringência ou filmes finos de materiais mostram que o índice de refração dos materiais é
contínuo. Resultados de tais experimentos geram curvas de dispersão semelhantes às curvas
mostradas na figura 2.11 [47].
Helmholtz73 observou que a expressão matemática de Sellmeier tem um fator semelhante
àquele obtido na solução da equação diferencial do oscilador harmônico sem atrito que oscila
devido a uma força harmônica no tempo (ou seja, segundo uma aceleração de amplitude a0)
d2 xd t 2=−ω 0
2 x+a0cosω t ,
cuja solução é dada por
x= x0 cosω t ,
com
x0=Aλ2
λ 2−λ 0
2 ,
onde
A≝a0λ 0
2
(2π c)2.
Em extensão mecanicista à equação de Sellmeier, Helmholtz sugeriu que um termo de
dissipação proporcional à velocidade dos osciladores fosse incluído na equação 2.75a [47], de
modo a resultar em uma equação do tipo
d2 xd t 2=−γ
d xd t−ω 0
2 x+a0 cosω t ,
onde γ é uma constante que determina o grau de dissipação de energia do oscilador. A solução
da equação 2.76a é
x= x0 cos (ω t+δ ),
com
x0=a0
√(ω 2−ω 0
2)
2+(γ ω)2
e
73 Hermann Ludwing Ferdinand von Helmholtz (1821 – 1894), físico alemão que fez contribuições em praticamente todos os campos da ciência vigentes em sua época.
(2.75a)
(2.75b)
(2.75c)
(2.75d)
(2.76a)
(2.76b)
(2.76c)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 61
tg δ=γ ω
ω 02−ω 2 .
Nestes resultados, o comprimento de onda λ da luz está relacionada com a frequência ω por
meio da equação (bastante conhecida dos fenômenos ondulatórios em geral)
ω=2πν =2πcλ
.
2.10.4 O Modelo de Lorentz
Até aqui as equações de Maxwell foram aplicadas para explicar os fenômenos de reflexão
e de refração de ondas monocromáticas (isto é, para onda de única frequência de vibração ω).
Isto foi feito supondo-se que o material é uma descontinuidade do meio no qual a onda
eletromagnética se propaga, levando em conta as condições de contorno a tal descontinuidade.
Além disso, Cauchy e Sellmeier encontraram equações matemáticas na tentativa de expressar
o fenômeno da dispersão.
No entanto, ninguém ainda tinha conseguido expressar satisfatoriamente os fenômenos de
dispersão e de absorção a partir de argumentos físicos. Para explicar tais fenômenos, é preciso
associar as equações de Maxwell à estrutura da matéria. Isto significa dizer que deve-se levar
em conta a hipótese de que o material é feito de moléculas (e átomos).
Supõe-se que a matéria é feita de átomos simples e que os átomos constituintes da matéria
têm a estrutura representada na figura 2.2. Para entender os fenômenos de dispersão e de
absorção da luz, é preciso entender como se dá a interação entre ondas eletromagnéticas e um
arranjo de vários átomos deste tipo.
A figura 2.12 mostra a ação de um campo elétrico sobre um arranjo de átomos. O campo
elétrico provoca uma reorganização dos elétrons e do núcleo, deslocando-os de suas posições
de equilíbrio. Para ter uma noção da ordem de grandeza desse deslocamento, considere que
um átomo de hidrogênio seja submetido a um campo elétrico E = 500kV. Sabe-se,
experimentalmente, que a polarizabilidade atômica do hidrogênio é α = 7,34∙10-41 C2∙m/N
[38]. A polarizabilidade P (isto é, o momento de dipolo induzido) é dada por
P=−η e x=−α E ,
onde η é o número de partículas por unidade de volume, e é a carga elementar e x é a distância
entre o centro de cargas positivas e o centro de cargas negativas. Tem-se, portanto, que
x≈0,229 fm .
(2.77)
(2.78)
(2.76d)
(2.76d)
x
O +e– e
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 62
O segundo membro da equação 2.77 representa a definição de momento de dipolo. No
terceiro membro foi usada a suposição de resposta linear ao campo pelo átomo em questão. O
resultado 2.78 torna propícias as seguintes hipóteses:
i- como consequência de o deslocamento da distribuição eletrônica ser muito pequeno,
a esfericidade da distribuição é mantida (isto é, se houver deformação, ela pode ser
desprezada sem prejuízo);
ii- como consequência de o deslocamento da distribuição eletrônica ser muito
pequeno, a densidade de carga elétrica em um volume esférico de raio dessa ordem de
grandeza pode ser tido como constante.
Se o campo elétrico for removido, a estrutura atômica toma sua forma de equilíbrio, no
qual o centro da distribuição esférica de elétrons coincide com o centro do núcleo atômico.
Isto implica dizer que durante a ação do campo elétrico, o átomo responde com uma força
interna provocada pela interação entre as cargas da eletrosfera e as cargas nucleares.
Problema: como se dá a lei de forças para este tipo de interação? O núcleo, de carga positiva,
encontra-se em uma região onde a densidade de carga elétrica é constante e de sinal negativo.
O campo elétrico dentro desse tipo de distribuição de cargas pode ser calculado a partir da lei
de Gauss (equação 2.2b)
Figura 2.12 Ação do campo elétrico sobre um arranjo de átomos. A direção do campo elétrico é representada pela direção das setas horizontais. A nuvem eletrônica, de carga
negativa, sofre um deslocamento para a esquerda, enquanto que o núcleo, de carga positiva, sofre um deslocamento para a direita. A ação do campo elétrico não altera a esfericidade da nuvem eletrônica. Além disso, o deslocamento do núcleo em relação à sua posição antes da ação do campo elétrico é quase 2 mil vezes menor que o deslocamento do centro da nuvem
eletrônica, que por sua vez é menor que a dimensão do núcleo, isto é x < 1 fm.
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 63
∮superfície
E⋅d A=1ϵ ∫
volume
ρ d v
⇒E ( x)=−e
4πϵ a⋅x .
De acordo com a equação 2.79, a força interna ao átomo que contrabalanceia o campo
elétrico externo é
F interna=e⋅E interno=−e2
4πϵ a⋅x ,
ou seja, a força de restauração é do tipo lei de Hooke.
Diante disso, é possível pensar no átomo como sendo um sistema no qual valem as leis de
Newton. Neste sistema, a nuvem eletrônica responde à ação de um campo elétrico externo
segundo um deslocamento em torno da posição de equilíbrio que, embora seja muito pequeno
do ponto de vista prático, é 1836 vezes maior que o deslocamento do núcleo atômico*.
Portanto, a análise da resposta atômica ao campo elétrico pode ser feita a partir do ponto de
vista da resposta exclusivamente por parte da eletrosfera. A equação diferencial para o
deslocamento x(z, t) do centro da eletrosfera em torno da posição de equilíbrio em cada plano
z do material e a cada instante t pode ser escrita como
med2 xd t 2 =−e E (x , t)−K x−G
d xd t
,
onde me é a massa da distribuição eletrônica, E(x, t) representa o campo elétrico total no
interior do material, K é a constante de proporcionalidade da força interna dada na equação
2.80 e G é uma constante. O termo do lado esquerdo da equação 2.81 é a força resultante
sobre a eletrosfera. O primeiro termo do lado direito representa a força que o campo elétrico
exerce sobre a eletrosfera, o segundo termo representa a força restauradora e o terceiro termo
representa uma força dissipativa em função da velocidade de deslocamento do centro da
eletrosfera†.
No caso da interação da luz com o material, suponha que a causa do campo elétrico E(x, t)
no interior do material seja devida ao campo elétrico
Eoriginal(z , t)=Re {E0x e i(k z−ω t )}
* Isto se dá pelo fato de a massa do elétron ser 1836 vezes menor que a massa do próton.† A inserção deste termo é forçada para dar conta da dissipação de energia por parte do material. Este termo é
bastante semelhante ao termo dissipativo que é estudado nos modelos mecânicos e pode ter surgido nomodelo de Lorentz devido à incrível semelhança que as medidas espectroscópicas apresentam quandocomparadas com medidas mecânicas em sistemas oscilatórios.
(2.81)
(2.82)
(2.79)
(2.80)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 64
de uma onda eletromagnética plana que se propaga na direção z com amplitude E0x na direção
x. Substituindo a equação 2.82 na equação 2.22a, e trabalhando no plano complexo, tem-se
E (x ,t )=Re{ 1εmat
E0x e i (k z−ω t)}.Substituindo a equação 2.83 na equação 2.81, tem-se
d2~x (z , t)d t 2 +γ
d~x (z ,t )d t
+ω 02~x ( z , t)+
eε mat me
E0x e i(k z−ω t )=0 ,
onde fez-se x→~x exclusivamente para simplificar cálculos, e foram definidas as constantes
ω 02≝
Kme
e
γ≝Gme
.
Na equação 2.84a, tem-se que x (z , t)=Re{~x (z ,t )}. Esta equação é idêntica à equação
2.76a, porém obtida a partir da hipótese atômica, especulando-se sua estrutura. Uma solução
para a equação 2.84a é
~x (z ,t )=x0 ei (k z−ω t+δ ),
que denota uma resposta, de amplitude x0, oscilante semelhante à indução oscilante do campo
elétrico da onda eletromagnética que interage com os elétrons do material. O fator de fase δ
determina a diferença de fase da resposta eletrônica ao campo elétrico da onda. Substituindo a
equação 2.85 na equação 2.84a, tem-se
x0 eiδ≝~x0=
e E 0 x/(εmat me)
(ω 2−ω 0
2)+iγ ω
,
isto é,
x0=e E0 x /(εmat me)
√(ω 2−ω 0
2)
2+(γ ω)2
e
δ=arc tg(ω2−ω 0
2
γ ω ).Combinando as equações 2.20, 2.22a, 2.77 e 2.86a, tem-se
~ε mat=1+1ϵ 0
η e2/me
(ω 02−ω 2
)+ iγ ω.
(2.84a)
(2.84b)
(2.84c)
(2.85)
(2.86b)
(2.86c)
(2.86a)
(2.83)
(2.87a)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 65
A equação 2.87a determina que a função dielétrica deve ser expressa por um número
complexo. Isto já havia sido sugerido na equação 2.65 na tentativa de explicar a absorção de
luz pelo material. A parte real e imaginária da equação 2.87a são, respectivamente,
εℜ=1+ω p
2(ω 0
2−ω 2
)
(ω 02−ω 2
)2+(γ ω )2
e
ε ℑ=ω p
2γ ω
(ω 02−ω 2
)2+(γ ω )2
,
onde definiu-se
ω p2≝η e2
ϵ 0 me
.
As equações 2.87 descrevem incrivelmente bem os resultados experimentais em materiais
dielétricos. Elas são frutos do que é conhecido como modelo de Lorentz e têm sido
amplamente utilizadas na descrição das propriedades ópticas dos materiais. Esta equação
apresenta a dependência da função dielétrica de um material com a frequência angular ω da
radiação nele incidente. A função dielétrica também pode ser escrita como função do
comprimento de onda λ, da frequência v, ou da energia E da radiação incidente. Para isto,
basta substituir ω pela grandeza desejada mediante a seguinte relação
E=h
2πω=hν=
hcλ
,
onde h é a constante de Planck. Para análise de medidas, o software utilizado neste trabalho
computa a função dielétrica dependente da energia. Assim, a equação de referência neste
trabalho para o modelo de Lorentz será
~ε mat=1+E p
2
(E02−E2
)+ i Eγ E,
onde definiram-se
γ≝2πh
Eγ
e
ω p≝2πh
E p.
(2.87b)
(2.87c)
(2.88)
(2.89a)
(2.89b)
(2.87d)
(2.89c)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 66
2.10.5 Propriedades Ópticas dos Metais: O Modelo de Drude
Três anos depois da descoberta dos elétrons por Thomson74, Drude75 desenvolveu uma
teoria para explicar as propriedades ópticas, elétricas e térmicas dos metais, baseando seu
trabalho na mecânica estatística de Boltzmann para os gases ideais, levando em conta as
seguintes considerações [49]:
i- antes de formar a grade metálica o átomo isolado de um metal é
eletricamente neutro. Seu núcleo tem carga positiva e∙Za, onde Za é o número
atômico, e e = 1,60∙10-19C. Ele possui Za elétrons, dos quais Z são fracamente
ligados e Za – Z são fortemente ligados;
ii- o metal é formado pelos átomos cujas configurações espaciais não são
alteradas (a não ser por uma força mecânica externa que deforme o metal ou
pela variação de temperatura). Imóveis, eles formam uma espécie de grade.
Seus elétrons que antes eram fracamente ligados se desassociam do átomo e se
tornam livres para se deslocarem ao longo da grade.
iii- as forças de interação elétron-elétron e elétron-grade são desprezíveis,
exceto pelas colisões que ocorrem quando um elétron em movimento encontra
um átomo da grade ou outro elétron como obstáculo.
iv- a duração das colisões é desprezível quando comparada ao intervalo de
tempo entre duas colisões sucessivas.
v- a velocidade de um elétron no interior da grade metálica, na ausência de
74 Sir Joseph John Thomson (1856 – 1940), físico inglês mais conhecido por descobrir o elétron e por seusestudos sobre condução elétrica em gases, trabalhos que lhe proporcionaram o prêmio Nobel de Física de1906.
75 Paul Karl Ludwing Drude (1863 – 1906), físico alemão.
Figura 2.13 Trajetória de um elétron em movimento livre dentro de uma grade constituída pelos átomos do metal. A duração das colisões é considerada desprezível quando
comparada ao intervalo de tempo entre duas colisões consecutivas.
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 67
campo elétrico externo, é obtida a partir da mesma matemática associada à
velocidade de uma molécula em um gás ideal, isto é,
ve=√ 2k BTme
,
onde kB = 1.38∙10-23 m2 kg2/s2 K é a constante de Boltzmann, T é a temperatura
do metal em kelvin e me é a massa do elétron.
vi- a probabilidade de haver uma colisão, entre um elétron e outro ou entre um
elétron e um átomo, em um intervalo de tempo dt é dada por
℘=d tτ ,
onde τ é o intervalo médio de tempo entre as colisões.
Se um campo elétrico E(t) é aplicado a um metal, então o elétron sofrerá uma força dada
por
F( t)=−e E( t).
Suponha que a velocidade de um elétron em um dado instante de tempo t seja u(t). A
probabilidade de este elétron sofrer uma colisão em um instante de tempo t + dt é dada pela
equação 2.91. Então, a probabilidade de ele não sofrer colisão no instante t + dt é
℘=1−℘=1−d tτ .
Portanto, a velocidade do elétron no instante t + dt é dada por
u( t+d t)=(1−d tτ )(u( t)+F(t)
me
d t),o que resulta em
u( t+d t)−u(t)=(−u( t)τ d t+
F( t)me)d t ,
onde foram desprezados termos de ordem superior a 2 em dt. Tomando o limite dt → 0, a
equação 2.95 resulta em
du (t )d t
=−u (t)τ +
F(t)me
.
Se o campo elétrico na equação 2.92 for gerado por uma onda eletromagnética dada pela
equação 2.82, então a solução da equação 2.96 será
u( t)=Re {u0 ei (k z−ω t+δ )}.
(2.90)
(2.91)
(2.92)
(2.93)
(2.94)
(2.95)
(2.96)
(2.97)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 68
Portanto, substituindo as equações 2.92 e 2.97 na equação 2.96, tem-se
u0 e iδ=−e E0τ /me
1−iω τ,
o que dá
u0=−e E0τ /me
√1+τ 2ω 2
e
tg δ=τ ω .
Substituindo a equação 2.97 na equação 2.8, tem-se
J=ρ e⋅Re{−eτ /me
√1+ω 2τ 2E(t )e iδ}=Re{η e2τ /me
√1+ω 2τ 2E0e i(k z−ω t+δ)}=
=Re {J0(ω)ei(k z−ω t+δ )}=J0(ω )cos(k z−ω t+δ ).
A equação 2.99 denota a densidade de corrente elétrica no metal causada pelo campo elétrico
da onda eletromagnética nele incidente. Observa-se que a densidade de corrente elétrica é
proporcional ao campo elétrico. O fator de proporcionalidade
~σ (ω )≝η e2τ /me
√1+ω 2τ 2e iδ≝σ 0 e iδ
é denominado condutividade e depende da frequência de variação do campo elétrico.
Enquanto que no modelo de Lorentz considera-se que os elétrons estão ligados aos átomos
do material e se rearranjam de maneira a restaurar suas posições de equilíbrio quando são
submetidos à ação de uma força elétrica, no modelo de Drude, a suposição é que eles estão
relativamente livres para se deslocarem ao longo do material, sofrendo colisões a cada
intervalo de tempo dt com probabilidade τ/dt caracterizando a propriedade de resistência
elétrica. Dessa forma, a equação diferencial 2.96 é idêntica à equação 2.84a com ω0 → 0 (pois
os elétrons são livres) e γ → 1/τ. No caso do modelo de Drude, a polarização é resquício do
arranjo de cargas elétricas livres proporcionado pela ação do campo elétrico. Assim, a função
dielétrica do metal pode ser escrita como
~ε metal=1−1ϵ 0
ω p2
ω 2−iω /τ
.
Seguindo o mesmo raciocínio da sessão anterior, a equação 2.101 pode ser reescrita como
(2.98a)
(2.100)
(2.98b)
(2.98c)
(2.101)
(2.99)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 69
função do comprimento de onda λ, da frequência v, ou da energia E da radiação incidente.
Para isto, basta substituir ω pela grandeza desejada mediante a relação mostrada pela equação
2.88. Como, para análise de medidas, o software utilizado neste trabalho computa a função
dielétrica dependente da energia, a equação de referência neste trabalho será
~ε metal=1−1ϵ 0
Ep2
E2−i EΓ E
,
onde definiu-se
1τ ≝
2πh
EΓ .
2.10.6 O Modelo Drude-Lorentz
Desde os primeiros modelamentos com a lei de dispersão de Lorentz, percebeu-se que a
análise das propriedades ópticas dos meios materiais em uma região espectral ampla* não é
possível de ser realizada utilizando-se apenas um oscilador de Lorentz. Percebeu-se que em
vez da equação 2.89a, era necessário usar um modelo do tipo da equação 2.103.
~ε mat=ε∞+∑j
f j Ep
(E j2−E2
)+ i Eγ E.
As primeiras interpretações para a equação 2.103 determinavam que as moléculas do
material sob a ação do campo eletromagnético teriam fj elétrons de frequência natural ωj [25].
Uma interpretação mais adequada, no entanto, é dada pela mecânica quântica, segundo a qual,
a função dielétrica é dada por
~ε mat=ε∞+∑j
A j E j
(E j2−E2
)+ i Eγ E,
onde Aj está relacionado à probabilidade de transição de elétrons entre as energias E e Ej. Para
uma completa descrição dos materiais, é necessário combinar as equações 2.102a e 2.104 em
uma única equação, resultando em
~ε mat=ε∞−E p
2
E2−i EΓ E
+∑j
A j E j
(E j2−E2
)+ i Eγ , j E.
* A região espectral utilizada para análise das propriedades ópticas dos materiais neste trabalho pode serconsiderada ampla.
(2.102a)
(2.103)
(2.104)
(2.105)
(2.102b)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 70
2.10.7 O Modelo de Tauc-Lorentz
Desde sua proposta, o modelo de Tauc-Lorentz tem sido um dos principais modelos
utilizados para modelar materiais amorfos [50-53]. Este modelo foi proposto em 1966 por
Tauc, et. al., [54] com a finalidade de contabilizar a assimetria na parte imaginária da função
dielétrica causada pela não conservação do vetor de onda, porém mantendo a estrutura de
transição interbandas dada pelo modelo de Lorentz. Assim, o modelo de Tauc-Lorentz é
obtido multiplicando-se, na parte imaginária da função dielétrica obtida pelo modelo de
Lorentz (parte imaginária da equação 2.104), cada termo de absorção pelo respectivo gap de
Tauc dado por
ε ℑ=ATauc
(E−Eg)2
E2 ,
onde ε2 = 0, se E ≤ Eg e não nulo no restante da região espectral. Assim, a parte imaginária da
função dielétrica de um material amorfo é dada por
ε ℑ=∑j
A j E j Eγ , j(E−Eg, j)2
(E2−E j
2)
2+Eγ , j
2 E2
1E
.
A parte real da função dielétrica é dada pela aplicação das relações de Kramers-Kronig à
equação 2.107, resultando em
εℜ=ε∞+∑j
A j Eγ , j
π ζ j4
a ln , j
2α j E j
ln( E j2+Eg , j
2+α j Eg , j
E j2+Eg , j
2 −α j Eg , j)
−A j
πζ j4
a tg , j
E j [π−arctg(2 Eg , j+α j
Eγ , j )+arctg(−2 Eg , j+α j
Eγ , j )]+2
A j E j
πζ j4α j
Eg , j(E2−γ j
2)[π+2 arctg(2 γ j
2−Eg , j
2
α j Eγ , j )]−
A j E j Eγ , j
πζ j4
E2+Eg , j
2
Eln(|E−Eg , j|
E+E g , j)
+2 A j E j Eγ , j
πζ j4 Eg , j ln[ |E−Eg , j|(E+Eg , j)
√(E j2+Eg , j
2)
2+Eg , j
2 Eγ , j2 ],
onde foram definidos
a ln , j≝(Eg , j2−E j
2)+Eg, j
2 Eγ , j2−E j
2(E j
2+3 Eg , j
2),
a tg≝(E2−E j
2)(E j
2+Eg , j
2)+Eg , j
2 Eγ , j2,
(2.106)
(2.107)
(2.108b)
(2.108c)
(2.108a)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 71
ζ j4≝(E2
−γ j2)
2+α j
2 Eγ , j2
4,
α j≝√4 E j2−Eγ , j
2
e
γ j≝√E j2−
Eγ , j2
2.
2.11 A Conexão Entre a Teoria Eletromagnética da Luz e a Óptica
Até agora foi desenvolvida uma teoria para explicar os fenômenos ópticos: a teoria
eletromagnética da luz. A questão é que se existe uma maneira de testá-la, esta maneira deve
estar relacionada à energia contida em seu campo eletromagnético. Isto quer dizer que deve
ser definida uma grandeza física do tipo “quantidade de luz” que chega a uma superfície por
meio da qual a teoria eletromagnética da luz deverá ser consolidada, e tal grandeza deverá
estar relacionada com o fluxo da energia contida no campo eletromagnético.
Se esta grandeza é definida de modo a ser mensurável, então é inevitável que ela seja uma
informação macroscópica, mesmo que tenha suas bases na realidade microscópica. Em outras
palavras, uma estatística deve relacionar a teoria eletromagnética da natureza da luz à
realidade mensurável.
A conexão foi proposta por Poyting76, a partir do teorema que leva seu nome. Segundo
este teorema, a energia por unidade de tempo e de área transportada pelos campos elétrico E e
magnético B é dada pelo vetor S definido por [25]
S≝1μ 0
E×B .
Assim, o fluxo de energia que atravessa um elemento orientado de área da é dada por
Φ=|S⋅d a|.
Substituindo a equação 2.39, na equação 2.109, então
S∝|E|2 .
De acordo com a equação 2.111, a densidade de taxa de energia (isto é, a quantidade de
energia que chega a uma superfície de área unitária a cada unidade de tempo) é proporcional
ao quadrado da amplitude do campo elétrico da onda eletromagnética.
Portanto, a interação entre luz e matéria ocorre da seguinte maneira: ao incidir sobre um
76 John Henry Poynting (1852 – 1914), físico inglês.
(2.109)
(2.110)
(2.111)
(2.108d)
(2.108e)
(2.108f)
CAPÍTULO 2 – INTERAÇÃO ENTRE LUZ E MATÉRIA 72
material, parte da energia do campo eletromagnético se converte em trabalho realizado sobre
os portadores de carga (livres ou ligados) do material, caracterizando absorção de parte da luz
incidente, enquanto que outra parte é refletida e uma terceira parte é refratada.
Isto sugere que os olhos são dispositivos que enviam ao cérebro a informação adquirida a
partir do trabalho realizado pelas ondas eletromagnéticas sobre seus elétrons constituintes. O
cérebro, por sua vez, traduz tal informação, convertendo-os em sensações tais como cores e
intensidade luminosa. Os sensores optoeletrônicos funcionam de maneira semelhante,
convertendo a intensidade luminosa em corrente elétrica. Esta é a base para a criação de
dispositivos pelos quais são feitos experimentos de pesquisa e de desenvolvimento de novas
tecnologias.
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 73
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA
Elipsometria é uma técnica de caracterização óptica de materiais baseada
principalmente (mas não somente) na propriedade da luz denominada polarização. É uma
técnica avançada e robusta que apresenta muitas vantagens e também desvantagens.
O primeiro elipsômetro foi criado por Drude em 1887 e era incrivelmente idêntico aos
vários elipsômetros utilizados atualmente; no entanto, o atual nome da técnica só foi
estabelecido em 1954 por Rothen [55]. Contudo, sua aplicação não se popularizou de
imediato, pois a aquisição de dados por meio de um elipsômetro ocorre mediante o ajuste dos
vários dispositivos que o compõem, o que, naquela época, fazia da elipsometria uma técnica
árdua e muito trabalhosa. A recente integração com os modernos computadores tornou a
elipsometria uma técnica rápida e amplamente aplicável. [17]
Atualmente há vários métodos de aplicação desta técnica. Cada método está
relacionado a particularidades de determinado tipo de análise (métodos mais simples
possibilitam apenas medidas de espessura, enquanto que os mais sofisticados fornecem o
máximo de informações sobre o material em análise). Neste trabalho, ater-se-á à discussão
sobre o método conhecido como Elipsometria Espectroscópica* por Reflexão Oblíqua† de
Ângulo Variável‡ de Incidência de Luz Linearmente Polarizada por Polarizador Girante§ com
montagem dos elementos seguindo a sequência Polarizador-Amostra-Compensador-
Analisador (RPVASE-PSCA#).
3.1 Configurações de um Elipsômetro
Praticamente todos os elipsômetros possuem, como principais dispositivos, uma
* Elipsometria Espectroscópica porque faz uso de um amplo intervalo de comprimento de onda (ou defrequência) de radiação eletromagnética (no presente caso, o intervalo vai desde 225nm a 825nm).
† Elipsometria por Reflexão Oblíqua pelo fato de o método fazer luz ser refletida pela amostra em análise sobdeterminado ângulo previamente estabelecido. Outra variante é a Elipsometria por Luz Transmitida (ou porLuz Refratada).
‡ Elipsometria de Ângulo Variável é uma contravariante do tipo Elipsometria de Ângulo Fixo. Em geral éutilizado apenas um ângulo de incidência, mesmo quando o equipamento possibilite variar.
§ Elipsometria de Luz Polarizada por Polarizador Girante é uma das variantes, sendo as outras aElipsometria de Luz Polarizada por Analisador Girante e a Elipsometria de Análise por CompensadorGirante da Luz Refletida (ou Transmitida, se for o caso).
# Do inglês Rotating Polarizer Variable Angle Spectroscopic Ellipsometer – Polarizer-Sample-Compensator-Analyzer.
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 74
lâmpada, um polarizador (P, de polarizer), um compensador (C, de compensator), um
analisador (A, de analyzer) e um detector, como esquematizado pela figura 3.1 [46, 55].
Cabe aqui uma breve descrição sobre cada elemento óptico que compõe o elipsômetro.
O polarizador é o dispositivo que tem o papel de selecionar e permitir passar somente luz
linearmente polarizada. A direção de polarização da luz que emerge do polarizador é dada
pelo ângulo P . Dessa forma, o equipamento foi desenvolvido para fazer incidir luz
linearmente polarizada sobre a amostra. Mesmo assim, na maioria dos casos, a luz refletida
pela amostra é elipticamente polarizada. O compensador e o analisador são dispositivos
ópticos que têm o papel de determinar a elipticidade da luz refletida pela amostra: daí o nome
da técnica ser elipsometria.
O compensador é um dispositivo feito de material birrefringente, isto é, que possui
dois eixos ópticos distinguíveis. O índice de refração do compensador para uma radiação de
determinado comprimento de onda linearmente polarizada na direção de um de seus eixos é
diferente do índice de refração para a radiação de mesmo comprimento de onda polarizada na
direção do outro eixo. O compensador é desenvolvido a partir de um material cujos eixos
ópticos são perpendiculares entre si, de tal forma a obter-se luz circularmente polarizada após
incidência de luz linearmente polarizada na direção 45º com seus eixos, como esquematizado
na figura 3.2.
Figura 3.1 Esquema do elipsômetro do tipo RPVASE-PSCA.
Figura 3.2 A luz linearmente polarizada, representada por suas componentes nas direções x e y, incide em um compensador. No interior do compensador, a luz em uma das direções (x,
por exemplo) se propaga mais rapidamente que na outra direção (y). Assim, a luz que emerge é elipticamente polarizada.
nx
ny
Lâmpada
Polarizador
Compensador
Amostra
Analisador
Detector
i
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 75
O analisador é também um polarizador. Recebe a denominação de analisador pelo fato
de ser o componente último antes do detector, permitindo a análise da luz que lhe chega.
3.2 Caracterização Elipsométrica das Propriedades Ópticas de Substratos
Neste trabalho, define-se substrato como um meio material semi-infinito. Define-se
também, para fins experimentais em elipsometria, o substrato como sendo um corpo material
que atende a pelo menos um dos seguintes critérios:
i- material não transparente, de superfície plana, lisa e regular, cuja espessura é
suficiente para que a luz que lhe atravessa tenha intensidade desprezível comparada à
luz nele incidente;
ii- material transparente, de superfície plana, lisa e regular, cuja espessura é suficiente
para permitir resolver os feixes obliquamente refletidos na interface superior e na
interface inferior.
Suponha que a amostra da figura 3.1 seja um substrato. Dessa forma, se Epol for o
campo elétrico que emerge do polarizador, então o campo elétrico que chega no detector pode
ser expresso por*
Eana=Re {(~r p cos P cos A p+~r ssen P sen A s)Epol }=
=Re {~r s(~ρ cos P cos A p+sen P sen A s)}Epol ,
onde Eana é o campo elétrico da radiação após passar pelo analisador, P e A são as
* A equação 3.1 se refere ao caso em que não se faz uso do compensador. Como será visto adiante, ocompensador é um dispositivo que é solicitado, na maioria dos casos, quando a medida elipsométrica é feitasobre sistemas transparentes.
(3.1)
Figura 3.3 Luz colimada incidindo em placas de diferentes espessuras. Em (a), a placa é transparente e fina, de modo que a luz oriunda das múltiplas reflexões se sobrepõem. Em (b), a placa é transparente e espessa o suficiente de modo que permite distinguir-se o feixe refletido em sua interface superior daquele refletido na interface inferior. Em (c), a placa é
opaca e a intensidade da luz vai a zero rapidamente ao penetrar no material.
(a) (b) (c)
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 76
posições angulares* do polarizador e do analisador, respectivamente, ~r p e ~r s são os
coeficientes de reflexão complexos da componente paralela e da perpendicular ao plano de
incidência, respectivamente, da radiação, dados por
~r p≝ER(p)eiδ R
(p)
E I(p) =
~n T cosθ I−n I cos~θ T
~nT cosθ I+nI cos~θ T
e
~r s≝ER(s)eiδ R
(s)
E I(s) =
nI cosθ I−~nT cos~θ T
nI cosθ I+~nT cos~θ T
,
onde ~n T é o índice de refração do material e nI é o índice de refração do meio transparente
no qual o material em estudo está imerso, δ R(p ) e δ R
(s) são as defasagens nas componentes do
campo elétrico refletidas em relação às do campo elétrico incidente, θI e~θ T são os ângulos
de incidência e de refração, respectivamente. Na equação 3.1, ~ρ é definido por
~ρ≝~r p
~r s
.
Combinando as equações 3.2 e 3.3, tem-se que
~ρ=ER(p)/ER
(s)
E I(p)/E I
(s) ei (δ p−δ s)≝tgΨ e iΔ ,
com
0≤Δ<2π . †
Na equação 3.4a, Ψ e Δ são denominados parâmetros elipsométricos. A priori, eles são
o alvo da elipsometria. A análise das propriedades ópticas dos materiais se dá após a obtenção
desses parâmetros.
Combinando as equações 3.2, 3.3 e 3.4, tem-se
~ρ=~n T cosθ I−n I cos
~θ T
~n Tcosθ I+nI cos~θ T
⋅~nT cos
~θ T+nI cosθ I
~n T cos~θ T−nI cosθ I
=
=~n T nI (cos2θ I−cos2~θ T)+(
~n T2−nI
2)cosθ I cos
~θ T
~n T nI (cos2θ I−cos2~θ T)−(~n T
2−nI
2)cosθ I cos~θ T
.
Fazendo-se uma análise detalhada sobre a equação 3.2, verifica-se que, quando luz
linearmente polarizada incide sobre um material não transparente, dá-se origem a luz refletida
* A posição angular de um componente óptico é definida em um plano perpendicular à propagação daradiação, fazendo-se uso da regra da mão direita.
† Define-se Δ neste intervalo de modo que haja solução de valor único na inversão das funções senΔ e cosΔ.
(3.3)
(3.2a)
(3.2b)
(3.4a)
(3.5)
(3.4b)
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 77
cujo estado de polarização não é mais linear. Como consequência da necessidade de expressar
o índice de refração do material como um número complexo (~n T), é necessário expressar o
ângulo de refração (~θ T) como um também número complexo. Dessa forma, a lei de Snell
para o caso em questão deve ser reescrita como
n I senθ I=~nT sen
~θ T .
Se não fosse adotado um número complexo para o ângulo de refração, a equação 3.6
seria incompatível, pois o lado direito expressa um número real, enquanto que o lado
esquerdo, sem o ângulo complexo, expressaria um número complexo. Contudo, a função seno
da equação 3.6 mantém a mesma estrutura trigonométrica definida para a função seno de um
número real. Dessa forma, vale a relação
sen2~θ T+cos2~θ T=1 .
Assim, combinando as equações 3.5 e 3.6, tem-se
~ρ=
nI~nT(cos2θ I−1+
nI2
~n T2 sen2θ I)+(~n T
2−nI
2)cosθ I√1−
nI2
~nT2 sen 2θ I
nI~n T(cos2θ I−1+
n I2
~nT2 sen 2θ I)−(~nT
2−nI
2)cosθ I √1−
n I2
~nT2 sen2θ I
.
Isolando ~n T na equação 3.8, tem-se
~n T2=nI
2sen 2θ I⋅[1+ tg2θ I⋅(1−~ρ1+~ρ )
2
].Na equação 3.9, o índice de refração do substrato está relacionado com os parâmetros
elipsométricos, com o índice de refração do meio de onde a luz incide no substrato e com o
ângulo de incidência. Isto não quer dizer que o índice de refração do material dependa do
ângulo de incidência da luz (nem do índice de refração do meio no qual ele se encontra, pois
seu índice de refração não é uma propriedade que dependa de fatores externos, mas sim uma
propriedade intrínseca do material). Isto quer dizer que os parâmetros elipsométricos são
sensíveis ao ângulo de incidência. Em elipsometria, portanto, é imprescindível que se tenha
precisão sobre o ângulo de incidência para que seja possível inverter os parâmetros
elipsométricos medidos de modo a serem obtidas as propriedades ópticas do material.
Partindo-se da definição 3.4, tem-se que
(3.6)
(3.7)
(3.8)
(3.9)
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 78
1−~ρ1+~ρ
=1−2 isenΔ⋅tgΨ −tg2Ψ
1+2senΔ⋅tgΨ + tg2Ψ.
Combinando-se as equações 3.9 e 3.10,
εℜ+ iε ℑ=~n T2=(nT
2−κ T
2)+ i(2nTκ T)=
=nI2 sen2θ I⋅[1+ tg2θ I⋅
(1−tg2Ψ )2−4sen2Δ tg2Ψ −4 i senΔ tgΨ (1−tg2Ψ )
(1+2cosΔ tgΨ + tg2Ψ )2 ],
onde ε1 é a parte real e ε2, a parte imaginária, da constante dielétrica do material. Daí, tem-se
εℜ=nT2−κ T
2=nI
2 sen2θ I⋅[1+tg 2θ I⋅(1−tg2Ψ )
2−4 sen2Δ⋅tg2Ψ
(1+2cosΔ⋅tgΨ + tg2Ψ )2 ]
e
ε ℑ=2 nTκ T=nI2sen 2θ I tg2θ I⋅
4senΔ tgΨ (1−tg2Ψ )
(1+2cosΔ⋅tgΨ +tg 2Ψ )2 .
Combinando as equações 3.11b e 3.11c, tem-se
nT=√ 12[εℜ+√ε ℜ2 +4ε ℑ
2 ]
e
κ T=√ 12[−εℜ+√εℜ2 +4ε ℑ
2 ].
Em elipsometria, a obtenção das propriedades ópticas pelas equações 3.11 e 3.12 é
denominada bulk calculation, ou inversão direta de parâmetros. Por meio dessas equações,
verifica-se que
κ T=0⇔ε ℑ=0 .
O resultado 3.13 expressa o fato de que se o substrato é transparente, então seu índice
de refração é real e, consequentemente, sua constante dielétrica também é real. Substituindo a
equação 3.13 na equação 3.11c, tem-se que
ε ℑ=0⇔senΔ=0 .
isto é, se Δ∈{ 0, π}. Este caso já havia sido previsto no capítulo 2 (equação 2.55b). Assim,
ao caracterizar, na região do visível, vidro, quartzo ou outro material transparente, esperam-se
resultados das medidas em cosΔ próximos de 1 (ou de –1). Por outro lado, quando se faz
medida elipsométrica em substrato não transparente em certa região do espectro, o módulo da
medida em cosΔ será menor que 1. É importante lembrar desta observação, pois facilita na
hora de fazer ajustes teóricos (com o modelo de Lorentz, por exemplo).
(3.10)
(3.11a)
(3.11b)
(3.11c)
(3.12a)
(3.12b)
(3.13)
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 79
3.3 Caracterização Elipsométrica das Propriedades Ópticas de Estruturas Estratificadas
Ao contrário do que ocorre com um substrato, a luz refletida por um filme fino é uma
combinação da luz refletida em sua interface superior (ar/película, no caso de o meio
envolvente ser o ar) e sua interface inferior (película/substrato, no caso de uma estrutura de
monocamada depositada em um substrato). Neste trabalho, os filmes analisados são
classificados em três regimes relativos à sua espessura:
i- filmes espessos, se a espessura for maior que 10.000nm,
ii- filmes finos, se a espessura estiver entre 100nm e 10.000nm,
iii- filmes ultrafinos, se a espessura for menor que 100nm.
A álgebra utilizada para a análise do substrato foi relativamente simples. No entanto, à
medida que aumenta a complexidade do sistema a ser caracterizado, fica praticamente
inviável fazer uso de álgebra semelhante. A notação matricial torna o cálculo mais compacto.
Assim, é preciso definir matricialmente cada componente óptico de um elipsômetro.
Antes disso, porém, é importante frisar que a teoria a ser desenvolvida ainda trata
sobre estruturas com interfaces homogêneas e paralelas. Assim, a amplitude do campo elétrico
assume dependência linear à medida que penetra a estrutura do sistema.
Há dois formalismos matriciais em óptica: o formalismo de Jones, que trabalha com
matrizes 2×2 e o formalismo de Müller-Stokes, que trabalha com matrizes 4×4 [46, 55, 56].
No formalismo de Jones, o vetor campo elétrico pode ser descrito por
~E=[ Ex
Ey e iδ ]e i(k⋅r−ω t ).
Assim, supondo que o campo elétrico EI é linearmente polarizado (isto é, δI = 0 ou δI =
π) e incide em um material, o campo elétrico a uma profundidade d dentro do material será
dado por~E2=
~T 12 E1
⇒[E2p(z=d )eiδ T
(p)
E2s(z=d )e iδ T(s ) ]=[(
~T 12)11 (~T 12)12
(~T 12)21 (
~T 12)22][E1p( z=0)
E1s( z=0)].Na equação 3.14, a matriz 2×2 é chamada de matriz transferência. Seus coeficientes
são calculados comparando-se as componentes do campo elétrico incidente com as
(3.13)
(3.14)
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 80
componentes do campo elétrico no interior do material definido pela equação 2.66 e pelos
coeficientes de refração de Fresnel [46, 55] dados por
~t p≝ET(p)eiδ T
(p)
E I(p) =
2nI cos~θ T
nI cos~θ T+~n T cosθ I
e
~t s≝ET(s)ei δ T
(s)
E I(s) =
2nI cosθ I
nI cosθ I+~nT cos~θ T
.
Da equação 3.14, tem-se que
E2 p( z=d )e iδ T(p)
=(~T 12)11 E1 p(z=0)+(~T 12)12 E1s(z=0)
⇒E 2 p(z=0)e−κ d e iδ T(p )
=(~T 12)11 E1 p(z=0)+(~T 12)12 E1s( z=0)
e
E2 s(z=d )e iδ T(s )
=(~T 12)21 E1 p( z=0)+(~T 12)22 E1 s(z=0)
⇒E 2s( z=0)e−κ d e iδ T( s)
=(~T 12)21 E1 p(z=0)+(~T 12)22 E1s( z=0) .
A equação 3.16a evidencia o fato de a componente p do campo elétrico da onda
refratada estar relacionada com as componentes p e s do campo elétrico incidente. De
forma semelhante, a equação 3.16b evidencia o fato de a componente s do campo elétrico
da onda refratada estar relacionada com as componentes p e s do campo elétrico
incidente. Este é o caso mais geral de um material com propriedades anisotrópicas (materiais
birrefringentes, por exemplo). Se o material for isotrópico [46, 55, 57], as equações 3.16 se
reduzem a
E2 p( z=0)e−κ d eiδ T(p)
=(~T 12)12 E1 p(z=0)
⇒(~T 12)12=
E2p( z=0)eiδ T(p)
E1p(z=0)e−κ d
=~t p e−κ d
e
E2s(z=0)e−κ d e iδ T(s )
=(~T 12)22 E1s(z=0)
⇒(~T 12)22=
E2 s(z=0)eiδ T(s )
E1s( z=0)e−κ d
=~t s e−κ d ,
ou seja, quando se trata de materiais isotrópicos, a matriz ~T 12 da equação 3.14 é diagonal e
seus coeficientes são os coeficientes de transmissão de Fresnel multiplicados pela exponencial
evanescente com a profundidade d no material. Nas equações 3.17, κ é a parte imaginária
(3.15a)
(3.15b)
(3.16a)
(3.16b)
(3.17a)
(3.17b)
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 81
do índice de refração do material (equação 2.65).
Com isso, fazendo-se uso da notação matricial, o campo elétrico refletido pelo sistema
película/substrato é dado por~Eamostra=[
~R12+~T 31
~R23~T 13]Epol ,
onde ~R representa a matriz de transferência por reflexão* na interface e ~T representa a
matriz de transferência por transmissão. O índice 1 se refere ao meio de onde a luz incide, o
índice 2 se refere à película e o índice 3 se refere ao substrato. Assim, ~R12 é a matriz
reflexão da luz na interface entre o meio 1 e o meio 2, ~T 13 é a matriz transmissão da luz
desde a interface entre os meios 1 e 2 até a interface entre os meios 2 e 3.
Representa-se o campo elétrico refletido por um sistema de dois filmes finos
sucessivamente montados em um substrato por meio da equação~Esistema=[
~R12+~T 31
~R23~T13+
~T 31~T 42
~R34~T 24
~T 13 ]Epol .
Percebe-se então, comparando-se as equações 3.14 e 3.18, que quanto mais complexa
a estrutura do sistema em análise, mais complexa ainda se torna sua análise matemática.
3.4 O Elipsômetro GES5-E
O elipsômetro utilizado neste trabalho foi desenvolvido pela empresa SEMILAB. A
seguir, será dada uma discussão detalhada sobre o cerne do seu funcionamento.
O detector do elipsômetro fornece a intensidade da luz após o percurso PSCA. De
acordo com o teorema de Poynting, a intensidade de luz é proporcional ao quadrado do
módulo do campo elétrico da radiação utilizada (equação 2.111).
No caso de elipsometria de substratos, por exemplo, o detector acusará a intensidade
dada pelo quadrado do módulo da equação 3.1, isto é
I ana(A , P)=
* Matriz diagonal, no caso de materiais isotrópicos, cujos elementos são os coeficientes de Fresnel para areflexão. No caso de materiais anisotrópicos, em geral, todos os elementos são não nulos.
Figura 3.4 Luz colimada incidindo em sistema filme/substrato.
(3.18a)
(3.18b)
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 82
=I pol rs2⋅(tg 2Ψ cos2 Acos2 P+2 tanΨ cosΔ sen Acos Asen P cos P+sen2 Asen 2 P )=
=2 I pol r s
2
tg 2Ψ cos2 A+sen 2 A⋅(1+α cos 2 P+β sen 2 P) ,
onde
α≝tg2Ψ −tg2 Atg 2Ψ + tg2 A
e
β≝2 tgΨ tg AcosΔ
tg2Ψ + tg2 A.
De acordo com o manual do equipamento, as constantes α e β são obtidas por meio
das somas de Hadamard*, definidas por
S 1=∫0
π /4
I (P )d P=I 0
2(α +β +π /2),
S 2=∫π/4
π/2
I (P)d P=I 0
2(−α +β +π /2),
S 3= ∫π /2
3π/4
I (P )d P=I 0
2(−α−β +π /2),
S 4=∫3π/4
π
I (P)d P=I 0
2(α−β +π/ 2) .
Daí,
I 0≝2 I pol rs
2
tg2Ψ cos2 A+sen2 A=
1π (S1+S2+S3+S 4) ,
α=1
2 I 0
(S1−S 2−S3+S 4)
e
β=1
2 I 0
(S 1+S 2−S3−S 4) .
Tendo-se os valores de α e de β, pode-se obter diretamente os valores de tgΨ e de cosΔ
dados pelas equações 3.19b e 3.19c.
É muito importante ter em mente que os parâmetros elipsométricos tgΨ e cosΔ são
obtidos a partir de fotometria, conforme descrevem as equações 3.19, 3.20 e 3.21. Assim, no
* As somas de Hadamard consistem em um método particular de obtenção dos coeficientes de Fourier de uma função periódica [#55].
(3.19a)
(3.19b)
(3.19c)
(3.20a)
(3.20b)
(3.20c)
(3.20d)
(3.21a)
(3.21b)
(3.21c)
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 83
caso de substratos transparentes, flutuações na intensidade da luz acusada pelo detector pode
gerar dados espúrios do tipo |cosΔ| > 1. Para minimizar os efeitos da flutuação estatística na
obtenção da intensidade da luz a partir do detector e eliminar a possibilidade de gerar dados
espúrios, o elipsômetro GES5-E é dotado de um compensador com eixos orientados a 45º
com o plano de incidência. Dessa forma, a onda linearmente polarizada refletida por
substratos transparentes terá seu estado de polarização alterado para elipticamente polarizada
após passar pelo compensador. O software integrado ao elipsômetro computa a medida
realizada no sistema PSCA e refaz o cálculo dos parâmetros elipsométricos, fornecendo-os
como se o compensador não tivesse sido ativado.
Ao contrário do que foi discutido para substratos, no caso de filme fino a intensidade
de luz que chega ao detector é dada pelo módulo do quadrado da equação 3.18a. Assim, ao
contrário do caso dos substratos, é mais difícil tirar conclusões imediatas a partir dos
resultados de medidas feitas em filmes finos. Isto porque os coeficientes elipsométricos, neste
caso, carregam em si a superposição das informações referentes à película fina e ao substrato.
A complexidade da análise dos resultados das medidas em filmes finos é, portanto, muito
superior à complexidade da análise das medidas em substratos (compare as equações 3.14 e
3.18).
Para a análise detalhada das medidas, é necessário fazer uso de ferramentas
computacionais que possibilitam realizar cálculos robustos e que fornecem resultados
confiáveis. Empresas que desenvolvem a engenharia de elipsômetros também são
responsáveis por desenvolver engenharia de software que possibilitam a análise matemática
das medidas por meio de confecção de modelos que descrevem teoricamente a estrutura do
material em estudo.
3.5 Modelos Matemáticos (Materiais Isotrópicos)
Como já foi discutido, o modelo matemático mais simples para a análise de medidas
elipsométricas é o modelo de substrato. A obtenção das propriedades ópticas neste caso pode
ser feita mediante um dos processos
i- inversão direta dos parâmetros elipsométricos (bulk calculation) por meio das
equações 3.11 e 3.12, ou
ii- fitting matemático (ou ajuste teórico sobre a medida) que consiste em simular uma
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 84
medida elipsométrica a partir de modelos teóricos (tais como o modelo de Cauchy*, de
Sellmeier†, de Lorentz‡, de Drude§, entre outros) ajustando os parâmetros do modelo
até que a medida simulada coincida com a medida realizada.
Quando a análise se refere a medidas em filmes finos, a obtenção das propriedades
ópticas ocorre mediante um dos processos [16]
I- se houver um banco de dados que contemple as informações (índice de refração ou
função dielétrica) tanto do material do substrato quanto do material do filme fino,
então a espessura do filme é a única incógnita a ser determinada. Ela pode ser
diretamente obtida por fitting matemático simulando uma medida elipsométrica (por
meio das equações 3.11 ou 3.12, 3.17 e 3.18), comparando a simulação com a medida
realizada, onde a espessura é a variável do fitting. O melhor ajuste matemático
fornecerá a espessura do filme fino.
II- se houver um banco de dados que contemple as informações apenas de um dos
materiais (ou o do substrato ou o do filme fino), deverá ser feita uma simulação de
medida elipsométrica mediante um ajuste teórico no qual as incógnitas envolvidas são
a espessura e os parâmetros do modelo a ser utilizado.
III- se não houver um banco de dados prévio, então é importante que se tenha em
mãos um substrato limpo e o sistema filme/substrato. Ambos serão medidos.
Primeiramente modela-se o substrato. Após a obtenção das propriedades ópticas do
substrato, modela-se o sistema filme/substrato. Ao fim desta sequência, obtêm-se as
propriedades ópticas do sistema.
3.6 Vantagens e Desvantagens do Formalismo de Jones
A principal vantagem do formalismo de Jones é o fato de ser possível descrever
* Bastante utilizado para modelar materiais isolantes transparentes que apresentam dispersão normal na regiãoespectral da medida, como por exemplo o quartzo na região espectral de 200nm a 1500nm.
† Bastante utilizado para modelar materiais isolantes transparentes que apresentam dispersão anômala naregião espectral da medida, como por exemplo o vidro que apresenta dispersão anômala próximo a 300nm.
‡ Bastante utilizado para modelar materiais isolantes e semicondutores que apresentam absorção da radiaçãona região espectral da medida.
§ Bastante utilizado para modelar materiais com propriedades condutoras. Em geral, este modelo é muito bompara região espectral abaixo de 1eV. Para regiões de energias mais altas, utilizam-se o modelo de Drude-Lorentz, que consiste na soma das equações 2.87 e 2.101.
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 85
matematicamente diversos dispositivos ópticos bem como vários estados de polarização
(equação 3.13) de maneira relativamente fácil.
Por exemplo, um polarizador pode ser descrito pela matriz
~P≝[1 0
0 0].Dessa forma, se luz no estado de polarização do tipo representado na equação 3.13 passar pelo
polarizador, seu estado de polarização será dado por
Epol=P R(P ) E=[1 00 0][ cos P sen P
−sen P cos P][ Ex
Ey e iδ]ei (k⋅r−ω t ) ,
onde
R(P )≝[ cos P sen P−sen P cos P ]
é a matriz rotação (ou mudança de base) do sistema de referências que define o estado de E
para o sistema que define o estado de Epol.
Quando há dois polarizadores consecutivos cujos eixos de polarização estão
defasados, então o estado de polarização da luz após atravessar os dois polarizadores é dado
por
Epol=P R(P2) P R(P1)E .
Um compensador pode ser representado matematicamente pela matriz
~C=[1 0
0 e iδ ].Assim o estado de polarização da luz ao atravessar um compensador é calculado da mesma
forma mostrada pela equação 3.23, trocando-se P por ~C . O ângulo δ é dado por
δ=2πλ|n '−n ' '|d ,
onde d é a espessura do compensador, n' e n'' são os índices de refração em direções
perpendiculares. A direção de menor índice de refração é denominada eixo principal.
Tratou-se também da notação da transformação da luz por reflexão e por refração por
um meio anisotrópico por meio da matriz ~T 12 na equação 3.14.
Dessa maneira, percebe-se que o formalismo de Jones é bastante simples e
conveniente para descrever matematicamente os mais variados dispositivos ópticos, bem
como uma infinitude de estados de polarização da luz. No entanto, não é possível denotar luz
(3.22)
(3.23)
(3.24)
(3.25)
(3.26)
(3.27)
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 86
não polarizada por meio de matriz 2×1. Consequentemente, não há como descrever um
dispositivo despolarizador de luz por meio de uma matriz 2×2. [55]
3.7 O Formalismo de Mueller
A vantagem fundamental do formalismo de Mueller é o fato de nele não haver
restrições matemáticas para descrever qualquer estado de polarização da luz, bem como o fato
de não haver restrição para descrever qualquer tipo de dispositivo óptico. A tabela a seguir
mostra os vários estados de dispositivos ópticos e suas respectivas representações nos
formalismos de Jones e de Mueller.
Polarização Matriz de Jones Matriz de Mueller
Polarizadora
Compensadorb
Matriz de rotação (ou mudança de base)c
Amostrad
Despolarizador
0000
1100
1100
0000
00
- sen δcos δ
1100
1100
00
cos δsen δ
0001
1000
00
cos 2α- sen 2α
00
sen 2αcos 2α
1000
0000
0000
0000
00
- sen 2Ψ sen Δsen 2Ψ cos Δ
1- cos 2Ψ
00
- cos 2Ψ100
00
sen 2Ψ cos Δsen 2Ψ sen Δ
A
00
10
0eiδ
10
sen αcos α
cos α- sen α
0cos Ψ eiΔ
sen Ψ0
Tabela 3.1 Matrizes de Jones e de Mueller. A ação da matriz a um campo elétrico transforma seu estado de polarização. Fonte: Fujiwara [55].
a- Eixo de transmissão paralelo ao eixo x. b- Eixo principal paralelo ao eixo x e δ é dado pela equação 3.27. c- A rotação é dada no sentido anti-horário. d- Neste caso, supõe-se que
a amostra é isotrópica e define-se A = (rp*r
p + r
s*r
s)/2.
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 87
Tabela 3.2 Representação geométrica, em vetores de Jones e em vetores de Stokes de alguns estados de polarização. Fonte: Fujiwara [55].
Polarização Representação Geométrica Vetor de Jones Vetor de Stokes
Polarização linear paralela ao eixo x
Polarização linear paralela ao eixo y
Polarização linear a 45º aos eixos
Polarização circular para a direita
Ey
Ex
Polarização circular para a esquerda
Ey
Ex
Ey
Ex
Ey
Ex
Ey
Ex
Polarização elíptica
Ey
Ex
Luz não polarizada
1100
1-100
1010
1001
100-1
1- cos 2Ψ
sen 2Ψ cosΔ- sen 2Ψ senΔ
1000
10
01
11
1i
1-i
sen Ψcos Ψ eiΔ
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 88
A fim de obter o máximo de informações sobre as amostras em estudo, a elipsometria
se encarrega, portanto, de medir os coeficientes da matriz de Mueller. A obtenção dos
coeficientes da matriz de Mueller se dá de maneira semelhante ao descrito para a matriz de
Jones (equações 3.13, 3.14, 3.16 e 3.17).
3.8 Vantagens e Desvantagens da Elipsometria
A principal vantagem da elipsometria é que, por se tratar de uma técnica óptica, a
caracterização é do tipo não invasiva, isto é, não danifica a amostra em estudo; além disso, é
uma técnica que possibilita realizar medidas rápidas e precisas (a acurácia pode ser da ordem
de 0,1Å), permitindo análises em tempo real in-situ ou ex-situ [16, 17, 55]. A rapidez e a
precisão são características chaves que possibilitam a técnica ter larga aplicabilidade na
pesquisa e no desenvolvimento de novas tecnologias.
As medidas elipsométricas são realizadas com o intuito de se obter as propriedades
ópticas dos materiais. No entanto, os resultados de uma medida elipsométrica são os
chamados parâmetros elipsométricos, que descrevem a mudança do estado de polarização da
luz após interagir† com a amostra em estudo. A causa da mudança do estado de polarização da
luz é o real objeto de interesse: as propriedades ópticas [16, 17, 46, 55].
No entanto, para obter as propriedades ópticas dos sistemas por meio da elipsometria,
é necessário passar por um processo denominado modelamento, no qual deverão ser levados
em conta a estrutura e o tipo de materiais do sistema em análise. Assim, é necessário saber se
a medida é referente a um substrato, ou se é oriunda de um sistema de monocamada
(bicamada, etc.) sobre um substrato. É necessário também saber se os materiais são isolantes,
semicondutores, condutores ou magnetizáveis. Desta forma, é de extrema importância saber
toda a história do material desde sua confecção até o momento em que será analisado.
O processo de modelamento é na maioria das vezes muito engenhoso e, senão,
enfadonho. Esta é, talvez, a principal desvantagem da elipsometria. Além disso, se o sistema
apresentar certo grau de rugosidade ou de deformação, a luz refletida pelo sistema será, em
certo grau, parcialmente despolarizada. Quanto mais um sistema for capaz de despolarizar a
luz nele refletida, mais impossível é sua caracterização por elipsometria. Por fim, se o sistema
consiste de pelo menos uma camada com espessura de ordem superior à região espectral do
† A interação pode ser a reflexão da luz (no caso de elipsometria por reflexão) ou a transmissão da luz (no caso de elipsometria por transmissão) pelo material.
CAPÍTULO 3 – ELIPSOMETRIA 89
elipsômetro, a luz refletida carregará informações praticamente impossíveis de serem
analisadas. A figura 3.5 representa situações práticas de sistemas com propriedade de
despolarizar a luz neles incidente.
Figura 3.5 Casos em que a luz refletida carrega informações espúrias. [Im: Fujiwara, ref. 55].
CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA 90
CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA
4.1 Limpeza de Materiais e Equipamentos
Antes de qualquer procedimento em laboratório de química, os instrumentos e
equipamentos reutilizáveis foram submetidos a processos de limpezas, seguindo-se os roteiros
descritos a seguir. A limpeza dos equipamentos e das vidrarias onde são preparadas e/ou
acondicionadas as soluções ou materiais obtidos como resultados dos procedimentos descritos
a seguir tem a importância de preservar a pureza das substâncias e das soluções utilizadas
neste estudo.
4.1.1 Limpeza de Vidrarias Reutilizáveis
A limpeza de vidrarias reutilizáveis (tais como béqueres, funis, balões volumétricos,
provetas, buretas, etc.) foi feita mediante o seguinte roteiro [58]:
i- usando-se água de torneira e detergente*, esfregaram-se, sempre que
acessíveis, as paredes (interna e externa) dos recipientes com esponja macia†.
Esse procedimento visa a retirada de solventes orgânicos e contaminantes
encrustados nas paredes das vidrarias;
ii- em seguida, o detergente foi retirado adequadamente das vidrarias por meio
de enxágue abundante com água de torneira;
iii- depois usou-se água destilada para retirada de resíduos solúveis
provenientes da água limpa usada na etapa ii;
iv- secaram-se as vidrarias‡;
v- ambientaram-se todas as vidrarias antes de utilizá-las. O processo de
ambientação consiste em inserir na vidraria uma pequena quantidade do
solvente ao qual ela é destinada, manuseando-a convenientemente de modo que
o solvente banhe toda sua superfície interna, sendo, ao final, descartado. Este
processo tem por finalidade retirar possíveis resquícios de impurezas que sejam
resistentes às etapas anteriores de limpeza e que por ventura possam ser
* O detergente utilizado foi o Limpol® Neutro em embalagem de 500mL produzido por Bom Bril LTDA.† A esponja utilizada foi Esponjex® produzida por Bom Bril LTDA.‡ Para a secagem das vidrarias, utilizou-se ventilação quente gerada por secador de cabelo Maxis Travel® da
Mondial.
CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA 91
solúveis ao solvente ao qual a vidraria é destinada.
4.1.2 Limpeza de Estufa
Antes da síntese e antes da secagem de filmes, bem como de qualquer outro material, a
estufa* foi limpa mediante o seguinte roteiro:
i- utilizando-se água de torneira e detergente†, esfregaram-se as paredes e o
prato da estufa com uma esponja grossa‡. Com este procedimento, visou-se
remover impurezas encrustadas na estufa;
ii- em seguida, o sabão foi removido com água de torneira em abundância;
iii- para retirar resíduos de detergente e de outros materiais, passou-se nas
paredes internas e no prato da estufa papel toalha§ encharcado de acetona#;
iv- a estufa lavada foi ligada e programada para operar a 150ºC. Sua porta foi
mantida aberta por 2h. Com isso, visou-se a evaporação e convexão de resíduos
voláteis de dentro da estufa para o ambiente externo;
v- após 2h, fechou-se a porta e fez-se vácuo durante 10 minutos. Após tudo
isso, a estufa foi reprogramada para trabalhar a 60ºC, temperatura em que se
desenvolve as demais etapas descritas neste trabalho.
4.2 Síntese da PAni
Vários são os métodos de síntese de polianilina [1]. No entanto, a PAni utilizada neste
trabalho foi obtida seguindo-se os passos descritos no roteiro disponível no apêndice A desta
dissertação, seguindo-se rigorosamente as quantidades dos materiais exigidas em cada etapa,
bem como o tempo de duração de cada reação ali indicada. Este roteiro pouco difere dos
demais métodos de síntese encontrados na literatura. Cabe aqui uma discussão detalhada do
passo a passo de modo a compreender a motivação que culminou no desenvolvimento deste
roteiro.
Antes de ser utilizada para as sínteses de PAni neste trabalho, a anilinaΓ foi submetida
ao processo de dupla destilação simples (processo não descrito no roteiro de síntese). Com
* A estufa utilizada neste trabalho foi a Estufa de Secagem a Vácuo Q819V® fabricada por QUIMIS.† O mesmo já descrito na nota de rodapé da página anterior.‡ Semelhante à descrita na nota de rodapé da página anterior.§ Papel toalha Kleenex Multifold® produzido por Kimberly-Clark.# A acetona utilizada neste trabalho foi produzida por Vetec QUÍMICA FINA.Γ A anilina utilizada neste trabalho foi produzida por ISOFAR.
CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA 92
esse procedimento, objetivou-se a obtenção de anilina pura.
Na solução alcoólica obtida na Etapa 1 (conf. §A.2), escolheu-se o álcool etílicoΔ
como ambiente reacional por ele ter baixo ponto de fusão, permitindo que a síntese ocorresse
à baixa temperatura (condição imposta pelo roteiro) e impedindo, portanto, que seus
componentes congelassem. Além disso, o álcool etílico tem o poder de dissociar o ácido
sulfúricoΘ, permitindo que a síntese ocorra em ambiente de pH menor que 7, condição
necessária para que haja síntese. O ácido sulfúrico foi o agente dopante da polianilina.
Embora estudos indiquem que a polianilina pode ser sintetizada à temperatura
ambiente [7-9], optou-se por trabalhar em baixa temperatura pois, de acordo com estudos [9],
a síntese nessa condição resulta em um polímero de alto peso molecular. A temperatura da
parede do béquer foi medida durante parte do processo de síntese. Utilizou-se, para isto, um
termômetro digital do tipo espeto* que permite a medida de temperaturas no intervalo de
-45ºC a 230ºC com precisão de 0,1ºC. O sensor do termômetro foi mergulhado no banho
térmico (§A.3.1) mantendo-o em contato com a parede do béquer.
Para que a síntese ocorra, é necessária, além do meio reacional de pH ácido, a
presença de um agente oxidante que provoque a reação de ligação dos monômeros da anilina
[1-9]. O agente oxidante utilizado foi o persulfato de amônia†. O agente oxidante foi
lentamente inserido no ambiente reacional com o intuito de manter o controle da reação, de
modo que a síntese ocorresse contínua e lentamente.
Após 4 horas, fez-se filtragem do resultado da reação (§A.3.4) utilizando-se papel-
filtro quantitativo‡, com o intuito de reter as partículas insolúveis e deixar passar para descarte
o solvente e tudo nele dissolvido (que não são de interesse para o estudo em questão).
A lavagem do material retido no papel-filtro (§A.3.5) teve por objetivo separar os
oligômeros e as moléculas de pequeno e médio peso molecular (solúveis na acetona§), retendo
no papel-filtro uma polianilina dopada de maior qualidade.
O material assim obtido foi conduzido à desdopagem (§A.4.2). Este processo foi feito
mergulhando-se a polianilina dopada em uma solução básica de hidróxido de amônio#. O
Δ O álcool etílico utilizado neste trabalho foi produzida por ISOFAR Indústria e Comércio de ProdutosQuímicos Ltda.
Θ O ácido sulfúrico utilizado neste trabalho foi produzido por Vetec QUÍMICA FINA.* Da marca Incoterm, modelo 6132.08.1.00.† O persulfato de amônio utilizado neste trabalho foi produzido por Synth.‡ O papel-filtro utilizado neste trabalho foi produzido por Unifil.§ A acetona utilizada neste trabalho foi produzida por DINÂMICA QUÍMICA CONTEMPORÂNEA LTDA.# O hidróxido de amônio utilizado neste trabalho foi produzido por ISOFAR.
CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA 93
objetivo do uso da base é provocar a desprotonação do polímero. A posterior adição de base
(§A.4.2.d) foi feita com o intuito de garantir a máxima desprotonação possível do material.
O processo de filtragem, de maneira semelhante à filtragem descrita na parte ácida da
síntese, foi realizado objetivando-se que as maiores partículas do material ficassem retidas no
papel-filtro. O que passou pelo filtro, de desinteresse deste estudo, foi descartado.
No processo de lavagem desta parte básica da síntese, utilizou-se água destilada para
retirar o hidróxido de amônio misturado ao material. Após a lavagem, o material foi seco em
estufa a 60ºC e, em seguida, pulverizado.
4.3 Obtenção das Soluções NMP+PAni
Soluções de concentrações diferentes de PAni dissolvidas em NMP foram obtidas.
Doravante elas são denominadas de Sol-i, onde i = 1, 2, 3, ….
A solução Sol-1 foi preparada dissolvendo-se (9,6 ± 1,0)mg de PAni em (50,0 ±
0,1)mL de NMP em um béquer pequeno. Fez-se agitar a solução por meio de agitador
magnético durante 6h.
A solução Sol-2 foi preparada dissolvendo-se (11,6 ± 1,0)mg de PAni em (25,0 ±
0,1)mL de NMP em um béquer pequeno. Fez-se agitar a solução por meio de agitador
magnético durante 6h.
A solução Sol-3 foi preparada dissolvendo-se (18,1 ± 1,0)mg de PAni em (25,0 ±
0,1)mL de NMP em um béquer pequeno. Fez-se agitar a solução por meio de agitador
magnético durante 6h.
A solução Sol-4 foi preparada dissolvendo-se (42,4 ± 1,0)mg de PAni em (25,0 ±
0,1)mL de NMP em um béquer pequeno. Fez-se agitar a solução por meio de agitador
magnético durante 6h.
A solução Sol-5 foi preparada dissolvendo-se (498,9 ± 1,0)mg de PAni em (25,0 ±
0,1)mL de NMP em um béquer pequeno. Fez-se agitar a solução por meio de agitador
magnético durante 6h.
Em seguida, cada solução assim obtida foi filtrada para retirada de possíveis
impurezas insolúveis no NMP
CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA 94
4.4 Obtenção de Substratos
Para os substratos, foram utilizados três tipos diferentes de materiais: quartzo, vidro e
ouro. Lâminas de vidro e de quartzo foram cortadas nas dimensões (1,25 ± 0,10)×(2,50 ±
0,10)cm2 e, em seguida, foram submetidas a um processo de limpeza química conhecida como
hidrofilização. O processo de hidrofilização utilizado neste trabalho foi feito de acordo com
os seguintes passos* [59]:
i- as lâminas foram previamente lavadas com água e detergente, utilizando-se
esponja macia para esfregá-las;
ii- em seguida, foram submetidas a enxágue abundante em água destilada;
iii- depois foram submetidas a secagem por meio de ventilação de ar quente;
iv- após secarem, as lâminas foram mergulhadas, durante 30 minutos, em
solução 1:1 de álcool metílico e ácido clorídrico;
e- depois foram enxaguadas abundantemente em água Milli-Q;
f- em seguida, foram secadas mediante o mesmo processo descrito em iii;
Após hidrofilização, algumas lâminas de vidro foram separadas e destinadas à
deposição de camada de ouro. A deposição do ouro foi feita em metalizadora Edwards® onde
o metal foi fundido e evaporado sob vácuo (pressão da ordem de 10-6 Pa).
4.5 Obtenção de Filmes Pelo Método Casting
Com o intuito de garantir filmes uniformes, previamente adaptou-se à estufa um
sistema de nivelamento. Este sistema consiste em três pés dotados de regulagem de altura.
Assim, ajustou-se a altura dos pés de modo que o prato interno à estufa (onde os substratos
são dispostos para secagem) ficasse perfeitamente horizontal. A certificação da
horizontalidade do prato foi feita com o auxílio de um instrumento de construção civil
chamado nível.
A obtenção de filmes ocorreu em etapas diferentes. Em cada etapa, utilizou-se apenas
uma das soluções preparadas, depositando-se sobre os substratos 10 gotas de solução, exceto
quando fez-se filme com a solução Sol-5, caso em que depositaram-se 15 gotas. O
* O passo a descreve uma limpeza comum que remove as impurezas mais abundantes, i.e., em larga escala. Ospassos seguintes são procedimentos para uma limpeza fina, mais precisa.
CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA 95
gotejamento foi feito com o auxílio de pipetas Pasteur†, utilizando-se pipetas diferentes para
cada solução de diferente concentração. Em cada processo de obtenção de filmes por casting,
o gotejamento ocorreu dentro de estufa com mecanismo de controle de temperatura e pressão.
Para análise quantitativa, as pipetas Pasteur foram submetidas a estudos de volumetria.
O estudo de volumetria das pipetas consistiu em aferição dos volumes de 100, 200, 300, 400,
500, 600, 700, 800 e 900 gotas depositadas, por cada pipeta, na proveta de 10mL utilizada
neste trabalho.
Após deposição de volume de solução sobre os substratos, a estufa foi fechada, e
submetida a máxima despressurização possível. A temperatura foi controlada e mantida a
60ºC durante 24h.
4.6 Caracterização dos Materiais por Elipsometria
As medidas elipsométricas foram realizadas no modo de medida estendida, no qual a
região espectral analisada vai desde 0,75eV (1648nm) a 6,5eV (190nm). Para isso utilizaram-
se dois detectores (um CCD, para a região do visível e do ultravioleta, e um OMA, para a
região do infravermelho próximo) para a análise desta região espectral.
A técnica utilizada foi do tipo RPE, com rotação do polarizador a 6Hz, utilizando-se
para as medidas o tempo de integração de 2s. Isto quer dizer que cada par ordenado (Ψ(λ),
Δ(λ)) adquirido é uma média sobre 2 × 6Hz × 2s = 24 medidas* (equações 3.20).
Além disso, em todas as medidas, optou-se pelo uso de microspots†. A vantagem do
uso dos microspots no caso de substratos transparentes se dá pelo fato de eles evitarem que
haja medida da luz refletida na interface inferior dos substratos, enquanto que no caso de
substratos opacos, os microspots possibilitam a medida em uma região pequena e uniforme
convenientemente escolhida pelo operador. As análises pós medidas foram feitas
contabilizando-se a ação dos microspots. Para isso, determinou-se a abertura angular do
conjunto de lentes dos microspots a partir de medidas e fittings simulacionais sobre amostras
padrões estabelecidas pela companhia que construiu o elipsômetro.
† As pipetas Pasteur utilizadas neste trabalho foram produzidas por NORMAX Fábrica de vidros científicoslimitada.
* Cada meia volta (180º) de um polarizador contempla todos os estados de polarização linear de uma ondaeletromagnética. Por isso, a cada volta são realizadas duas medidas, o que justifica o fator 2 no início doproduto nesta equação.
† O elipsômetro utilizado neste trabalho faculta ao operador o uso de microspots. Um microspot é compostopor um conjunto de lentes e sua finalidade é focalizar a luz sobre uma amostra em uma região elíptica desemi-eixos aproximadamente iguais a 100µm e 100/cos θi, onde θi é o ângulo de incidência.
CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA 96
Optou-se por realizar as medidas no tracking mode, no qual fez-se coincidir o ângulo
do analisador com o valor do parâmetro elipsométrico Ψ(500nm). O tracking mode consiste
em orientar o analisador de modo a minimizar os efeitos de ruídos. A intensidade de luz que
chega ao detector depende da posição P do polarizador bem como da posição A do analisador,
conforme equação 3.19a. Quando uma medida está sendo feita, o analisador fica parado,
enquanto que o polarizador fica girando. Durante uma medida, a menor intensidade de luz que
chega ao detector pode ser prevista igualando a zero sua derivada em relação a P, isto é,
∂ I ana , mín( A, P)
∂ P=0 .
Esta condição é atendida quando P satisfaz a relação
tg 2 P=βα ,
isto é, se
cos 2 P= α
√α 2+β 2
e
sen 2 P=β
√α 2+β 2
.
Substituindo o resultado 4.2 na equação 3.19a, tem-se que
I mín= I 0(1−√α 2+β 2
).
Para determinar qual posição do A analisador deve ser ajustada no momento da
medida, deve-se ter em mente que Imín deve ser maximizado em relação a A. Portanto, a
derivada
∂ I mín
∂ A=I 0
1
2√α 2+β 2
∂(α 2+β 2
)
∂A
deve ser nula, isto é,
∂(α 2+β 2
)
∂ A=( tg2 A−tg2Ψ )(4−2cos2 Δ)
tem que ser zero. Logo, conclui-se que a melhor posição do analisador é A = Ψ.
É possível ter uma noção prévia do valor de Ψ durante o alinhamento que precede a
medida. O alinhamento consiste em situar a amostra a ser analisada sobre o suporte para
amostras do equipamento e variar sua posição de modo que a trajetória da luz refletida
coincida com o caminho óptico em direção ao detector. O sistema estará alinhado para medida
(4.1)
(4.2a)
(4.2b)
(4.2c)
(4.3)
(4.4)
(4.5)
CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA 97
quando forem atendidas duas condições:
i- a intensidade de luz captada pelo detector deve ser máxima;
ii- o parâmetro residual, definido por
R≝1−α 2−β 2
deve ser praticamente nulo (isto é, o menor possível; em geral, menor que 0,01). Fazer
este parâmetro atingir o valor mínimo é sinônimo de que o plano de incidência é
estabelecido (e, portanto, as posições angulares do polarizador e do analisador podem
ser medidas) [55, 60];
iii- a simetria, definida como
Σ ≝∫0
π
I ( P)d P−∫π
2π
I (P )d P ,
deve ser mínima, pois o estado de polarização da luz que emerge do polarizador é
indistinguível quando sua posição angular é P de quando sua posição angular é P + π.
Em geral, uma medida confiável pode ser obtida quando for possível fazer Σ menor
que 2%.
Além de tudo, com a finalidade de manter o máximo de acurácia, tomou-se a devida
precaução de realizar dupla medida, uma com retarder e outra sem retarder, sempre que
ocorresse o caso em que |cosΔ| > 0,9 (§3.3).
Em todos os casos, as medidas foram realizadas segundo o ângulo de incidência de
75º. Procedeu-se dessa maneira pelos seguintes motivos (cf. apêndice B)
i- é importante evitar realizar medidas segundo o ângulo de Brewster, pois
neste ângulo de incidência a luz é refletida no estado de polarização
perpendicular ao plano de incidência e, embora sua intensidade varie à medida
que o polarizador gira, não é possível obter valores precisos de Ψ, pois,
conforme a equação 3.4a, ρ ≈ 0, ou seja, o resultado gerado pode ser
indistinguível com os erros inerentes à medida. No caso do vidro e do quartzo*,
o ângulo de Brewster é menor que 60º;
ii- em geral, quanto maior o ângulo de incidência, maior é a intensidade da luz
refletida pela amostra (conforme discutido no item 2.8). Quanto mais intensa a
* Conforme discussão feita nos itens 2.8 e 3.2, o ângulo de Brewster só pode ser definido para materiaistransparentes, como evidenciado pela equação 2.61, onde nT é real. Para materiais não transparentes, noentanto, há um ângulo denominado pseudo ângulo de Brewster segundo o qual luz linearmente polarizada nadireção paralela ao plano de incidência tem sua intensidade minimizada, mas não anulada.
(4.6)
(4.7)
CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA 98
luz que chega ao detector, menor a margem de erro pelas medidas;
iii- tanto para materiais transparentes quanto para materiais não transparentes,
ângulos maiores que 70º oferecem excelente distinguibilidade entre as
amplitudes (ou intensidades) do campo elétrico e, portanto, cálculos mais
confiáveis para a razão entre tais amplitudes, base para obtenção dos
parâmetros elipsométricos.
Por fim, com a finalidade de investigar possível anisotropia nas amostras, toda a
metodologia foi repetida para diferentes posições angulares do azimute ϕ das amostras. Nesse
sentido, foram feitas, no mesmo ponto para cada amostra, 13 medidas, desde ϕ = 0 a ϕ = 180º,
com passos de 15º entre cada medida.
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 99
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS
Neste capítulo será dada ênfase sobre os resultados obtidos após seguidos os
procedimentos experimentais de acordo com o que foi descrito no capítulo 4.
5.1 Limpeza de Materiais e Equipamentos
O processo de limpeza das vidrarias e dos equipamentos se deu rigorosamente de
maneira idêntica a um dos métodos estabelecidos pela referência [58]. Assume-se neste
trabalho que a qualidade da limpeza é, portanto, idêntica à publicada pelos autores da
referência e, portanto, suficiente para o desenvolvimento deste trabalho com potencial de
garantia de qualidade nos resultados obtidos.
5.2 Síntese da PAni
Como resultado da dupla destilação, a anilina obtida apresentou-se no aspecto incolor
e bastante transparente. Para a síntese, utilizou-se (20 ± 0,1)mL de anilina, isto é, (20,4 ±
0,142)g*.
A temperatura medida em função do tempo da reação de síntese (cf. §A.3) está
* Utilizou-se aqui a densidade da anilina como sendo de (1,0217 ± 0,0020)g/mL, de acordo com oespecificado na referência [44].
0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 220 240
-16
-15
-14
-13
-12
-11
-10
Tempo (min)
Tem
per
atur
a (º
C)
Figura 5.1 Temperatura do lado externo da parede do béquer em função do tempo de reação de síntese. Os pontos são os valores anotados. A linha contínua representa uma
previsão da temperatura não anotada. Ela foi assim obtida a partir de sugestão de valores de temperatura a cada 5 minutos. A seta indica o momento em que foi despejada a última gota da solução de oxidante. A região hachurada representa o intervalo desde quando a solução
começou a mudar de cor de branco para verde-escuro.
70min
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 100
representada no gráfico da figura 5.1. Durante a agitação, observou-se que a coloração inicial
do sistema formado pelas substâncias dentro do béquer era de tom branco (leitoso). Passados
140 minutos de agitação, a coloração continuou praticamente a mesma. A partir daí, a
mudança da coloração passou a ser perceptível, tornando-se inicialmente um branco
claramente esverdeado e passando, após 175 minutos de agitação, a ser de cor verde bastante
escuro. Percebeu-se que antes da mudança de cor do sistema, a temperatura manteve-se
estável em torno de -15ºC, começando a elevar-se gradualmente à medida que a coloração do
sistema fosse sendo alterada. Este aumento de temperatura no processo de síntese é relatado
em alguns estudos [1, 7], sendo atribuído à relativamente alta entalpia de síntese.
Passadas 4 horas de reação, percebeu-se, analisando-se o sistema, que como resultado
da síntese, obteve-se um sistema de mistura esverdeada de líquido com partículas insolúveis.
Estas são as mesmas características descritas para a PAni dopada [61]. Estas partículas
ficaram retidas no papel-filtro depois do processo de filtração. Após ser lavado com acetona e
após ser submetido à reação de desprotonação seguido de nova filtração e lavagem com água
destilada, o material final apresentou-se na coloração azul-escura, característica da PAni
desdopada [7].
Após secagem da PAni, ela foi destacada do papel-filtro e teve sua massa aferida. O
valor medido foi de (5,3812 ± 0,0010)g, o que dá um rendimento superior a 26%.
5.3 Obtenção das Soluções NMP+PAni
As soluções obtidas por meio do procedimento descrito no item 4.3 tiveram as
características descritas na tabela 5.1.
SOLUÇÃO CONCENTRAÇÃO ASPECTO
Sol-1 (0,19 ± 0,03)g/L Solução bastante fluida, de tom azul-claro.
Sol-2 (0,46 ± 0,05)g/LSolução de menor fluidez e coloração pouco maisintensa que a da anterior.
Sol-3 (0,72 ± 0,05)g/L Solução pouco fluida e de coloração azul-escura.
Sol-4 (1,70 ± 0,05)g/L Solução viscosa e de coloração azul-escura intensa.
Sol-5 (20,0 ± 0,2)g/LSolução bastante viscosa e de coloração azul-escuramuito intensa.
Tabela 5.1 Concentração e descrição das características das soluções obtidas.
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 101
A intenção era de obter soluções de concentrações, em g/L, de 0,200, 0,400, 0,800,
1,60 e 20,0, respectivamente. No entanto, aferir massas da ordem do miligrama acaba sendo
um processo árduo e delicado devido a fatores externos tais como variações de temperatura,
vibrações na bancada onde se encontra a balança de precisão, ventilação, etc.
5.4 Obtenção de Substratos
Como o processo de tratamento das superfícies dos substratos de vidro e de quartzo se
deu rigorosamente de maneira idêntica ao estabelecido pela referência [59], assumiu-se neste
trabalho que a qualidade da limpeza foi idêntica à publicada pelos autores da referência e,
portanto, suficiente para o desenvolvimento deste trabalho com potencial de garantir a
qualidade dos resultados.
Assumiu-se ainda que a superfície do ouro, depois de depositado no vidro, estava
limpa e pronta para ser submetida à deposição de filme de PAni.
5.5 Obtenção de Filmes Pelo Método Casting
Antes de gotejar solução nos substratos, as pipetas utilizadas foram submetidas à
análise de volumetria, de acordo com o descrito no item 4.5. Os gráficos das figuras 5.2, 5.3,
5.4, 5.5 e 5.6 apresentam os resultados das análises. O volume médio de uma gota de cada
pipeta é dado pelo coeficiente angular da linha de tendência traçada sobre os dados medidos.
O módulo do coeficiente linear da linha de tendência, dividido pelo número total de gotas e
adicionado à margem de segurança de leitura de volume na proveta, fornece a margem de
segurança de determinação do volume médio da gota por este método. A incerteza na medida
do volume de cada grupo de 100 gotas foi de 0,05mL, o que dá uma margem de segurança de
0,5µL por gota.
0 100 200 300 400 500 600 700 800 900
0
2000
4000
6000
8000
10000
f(x) = 11.36x + 6.67
Volumetria para a pipeta da Sol-1
Número de gotas
Vol
ume
(µL
)
Figura 5.2 Volumetria feita para a pipeta utilizada para gotejar a solução Sol-1. O coeficiente angular da linha de tendência fornece o volume médio de uma gota desprendida pela pipeta e o coeficiente linear dividido pelo número total de gotas fornece a margem de
segurança.
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 102
0 100 200 300 400 500 600 700 800 900
0
2000
4000
6000
8000
10000
f(x) = 14.29x + 50.00
Volumetria para pipeta de Sol-4
Número de gotas
Vol
ume
(μL
)
0 100 200 300 400 500 600 700 800 900
0
2000
4000
6000
8000
10000
f(x) = 10.60x - 176.36
Volumetria para pipeta da Sol-3
Número de gotas
Vol
ume
(μL
)
0 100 200 300 400 500 600 700 800 900
0
2000
4000
6000
8000
10000
f(x) = 11.00x - 0.00
Volumetria para pipeta da Sol-2
Número de gotas
Vol
ume
(μL
)
Figura 5.3 Volumetria feita para a pipeta utilizada para gotejar a solução Sol-2. O coeficiente angular da linha de tendência fornece o volume médio de uma gota desprendida pela pipeta e o coeficiente linear dividido pelo número total de gotas fornece a margem de
segurança.
Figura 5.4 Volumetria feita para a pipeta utilizada para gotejar a solução Sol-3. O coeficiente angular da linha de tendência fornece o volume médio de uma gota desprendida pela pipeta e o coeficiente linear dividido pelo número total de gotas fornece a margem de
segurança.
Figura 5.5 Volumetria feita para a pipeta utilizada para gotejar a solução Sol-4. O coeficiente angular da linha de tendência fornece o volume médio de uma gota desprendida pela pipeta e o coeficiente linear dividido pelo número total de gotas fornece a margem de
segurança.
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 103
Dessa forma, foi possível estimar os volumes depositados sobre cada lâmina, bastando
para isso, multiplicar o valor médio de uma gota de cada pipeta pelo número de gotas
depositadas sobre as lâminas. Foi possível também estimar a espessura de cada filme a ser
obtido.
A estimativa da espessura foi feita a partir do seguinte raciocínio. A estrutura da PAni é
dada pela fórmula molecular [–(C6H4NH)–]n, isto é, pela união de monômeros provenientes da
anilina, cuja estrutura geométrica é dada pela figura 5.7 [62, 63].
0 100 200 300 400 500 600 700 800 900
0
2000
4000
6000
8000
10000
f(x) = 11.52x + 168.18
Volumetria para a pipeta da Sol-5
Número de gotas
Vol
ume
(μL
)
Figura 5.6 Volumetria feita para a pipeta utilizada para gotejar a solução Sol-5. O coeficiente angular da linha de tendência fornece o volume médio de uma gota desprendida pela pipeta e o coeficiente linear dividido pelo número total de gotas fornece a margem de
segurança.
Figura 5.7 Estrutura geométrica de uma molécula de anilina com os comprimentos das ligações entre seus átomos. [Im: http://www.uwosh.edu/faculty_staff/gutow/
Chem_371_S09/NGMR%20webpage/Aniline/Aniline.html].
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 104
Os monômeros que formam a PAni são originados pela retirada do hidrogênio para e
do(s) hidrogênio(s) ligados ao nitrogênio da molécula da anilina. Assim, a PAni assume a
estrutura mostrada na figura 5.8 [1].
Assim, utilizando-se os valores mostrados na figura 5.7, as dimensões médias de uma
unidade monomérica que forma a polianilina são e = (2,0 ± 0,5)Å, h = (5,0 ± 0,5)Å e l = (6,5
± 0,5)Å*, onde e, h e l representam, respectivamente, a espessura, a largura e o comprimento
de uma unidade monomérica. O volume de uma unidade monomérica é, portanto, V0 = (65 ±
28)Å3. Se o filme depositado sobre uma lâmina de vidro de área Af for Vf, então, a espessura
do filme é dada por
e f=V f
Af
.
O volume do filme é dado por
V f=N ×V 0 ,
onde N é o número de unidades monoméricas que compõe o filme. O valor de N é dado por
N=6,02⋅1023⋅n ,
onde n é o número de mol de monômeros de anilina que forma o filme. O número de mol, por
sua vez, é dado por
n=mM
,
onde m é a massa total de monômeros que constitui o filme e M é a massa molecular de cada
unidade monomérica. A massa total de monômeros que constitui o filme é a massa de PAni
utilizada para formar o filme. Assim, a massa m de PAni de um filme é dada por
m=C⋅V sol ,
onde C é a concentração comum e Vsol é o volume da solução depositada para formar o filme.
Como a deposição é feita com o auxílio de uma pipeta Pasteur, o volume da solução é dado
* A margem de segurança de 0,5Å para as dimensões da anilina não foi retirada da referência citada. Ela foiestipulada neste trabalho para finalidade de cálculos.
Figura 5.8 Estrutura molecular da polianilina [Im: Bhadra, ref. 58].
(5.1)
(5.2)
(5.3)
(5.4)
(5.5)
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 105
por
V sol=ng⋅V g ,
onde ng e Vg são, respectivamente, o número de gotas desprendidas pela pipeta e o volume
médio da gota. Combinando-se as equações 5.1-5.6, tem-se que
ef=6,02⋅1023
⋅C⋅ng⋅V g⋅V 0
M⋅Af
.
A massa molar de um monômero de anilina é (91 ± 1)g/mol* [44]. É possível, portanto,
estimar as espessuras dos filmes substituindo os valores de C, ng, Vg, V0, M e Af na equação
5.7. As estimativas para as espessuras dos filmes estão listados na tabela 5.2.
Solução Dimensões do filme Estimativa de espessura (nm)
Sol-1* Não forma filme -
Sol-2* (1,24 ± 0,05)cm × (2,41 ± 0,05)cm 73 ± 51
Sol-3* (1,19 ± 0,05)cm × (2,47 ± 0,05)cm 112 ± 75
Sol-4* (1,19 ± 0,05)cm × (2,47 ± 0,05)cm 355 ± 215
Sol-4† (1,28 ± 0,05)cm × (2,28 ± 0,05)cm 357 ± 216
Sol-5‡ (1,28 ± 0,05)cm × (2,41 ± 0,05)cm 4807 ± 2875
5.6 Caracterização dos Materiais por Elipsometria
5.6.1 Caracterização dos Substratos Transparentes
Após o rigoroso processo de limpeza de superfícies, as lâminas de vidro e de quartzo
foram submetidas a medidas por elipsometria. Depois das medidas, o resultado foi analisado.
A análise foi feita seguindo o estudo realizado por Kitamura, et. al. [64], no qual fez-se uso da
lei de dispersão de Sellmeier (equação 2.71) para o modelamento do vidro. Esta ideia foi
estendida para o tratamento das medidas feitas no quartzo. O modelo de Sellmeier é bem
apropriado para estes tipos de materiais, uma vez que eles são transparentes na região
espectral analisada. A figura 5.9 mostra os resultados das medidas e do modelamento para o
* De acordo com a referência [44], a massa da anilina é 93,127g/mol. Neste trabalho utilizou-se (91 ± 1)g/molpara contabilizar o fato de 0 < y < 1, como esquematizado na figura 5.8.
(5.6)
(5.7)
Tabela 5.2 Estimativas das espessuras dos filmes a partir das soluções de diferentes concentrações de PAni em NMP.
* Depositado em quartzo. † Depositado em ouro. ‡ Depositado em vidro.
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 106
vidro em termos dos coeficientes de Fourier α e β. A figura 5.10 mostra os resultados e o
modelamento para o quartzo.
MATERIAL ε∞ S1 λ1 (µm) S2 λ2 (µm)
Vidro 1 1,402 ± 0,002 0,0795 ± 0,002 0,3 ± 0,1 1,9 ± 0,3
Quartzo 1 1.2101 ± 0,0003 0.0942 ± 0,0002
A tabela 5.3 mostra os valores para os parâmetros de Sellmeier obtidos após o
modelamento para o quartzo e para o vidro com o auxílio do software SEA. Observa-se que o
melhor ajuste para o vidro foi feito com dois gaps de Sellmeier, enquanto que para o quartzo
1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0
0,780
0,785
0,790
0,795
0,800
0,805
0,810
Energia (eV)
β
1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0
-0,62
-0,61
-0,60
-0,59
-0,58
Energia (eV)
α
Figura 5.9 Resultado em termos do coeficiente de Fourier α e β de uma medida elipsométrica em vidro (linha pontilhada) e do modelamento da medida utilizando-se a lei
de dispersão de Sellmeier (linha contínua). R² é o coeficiente de qualidade do modelamento.
R² = 0,98674
Tabela 5.3 Valores dos parâmetros da lei de dispersão de Sellmeier (equação 2.71) para o vidro e para o quartzo. Devido a suas características, ambos os sistemas foram modelados
como substratos.
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 107
só foi necessário um. Faz-se necessário o uso de um gap de Sellmeier sempre que parte da
região espectral analisada é relativamente próxima de um comprimento de onda para o qual
há absorção de luz. Assim, as regiões de gap para o vidro, uma situada no infravermelho e
outra no ultravioleta, não estão tão distantes da região analisada e são importantes para o
ajuste teórico. Já no caso do quartzo, o gap mais importante para o ajuste teórico é aquele
situado no ultravioleta, sendo o do infravermelho tão distante da região de interesse que pôde
ser desprezado para o ajuste teórico.
Para testar a confiança do ajuste teórico, compararam-se os valores para o índice de
refração obtido a partir deste modelo com aqueles tabelados nas referências [44, 65]. Estas
referências apresentam o valor 1,52 para índice de refração do BK7 em 546,1nm, enquanto
que o presente modelo fornece 1,54 para o vidro analisado. O BK7 é o vidro cujas
1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 4,5 5,0 5,5
0,79
0,80
0,81
0,82
0,83
Energia (eV)
β
1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 4,5 5,0 5,5
-0,61
-0,60
-0,59
-0,58
-0,57
-0,56
Energia (eV)
α
Figura 5.10 Resultado em termos do coeficiente de Fourier α e β de uma medida elipsométrica em quartzo (linha pontilhada) e do modelamento da medida utilizando-se a
lei de dispersão de Sellmeier (linha contínua). R² é o coeficiente de qualidade do modelamento.
R² = 0,97767
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 108
características mais se aproximam do vidro de microscopia usado neste trabalho. Para o
quartzo (SiO2), as referências tabelam para o índice de refração, no mesmo comprimento de
onda, o valor 1,46, enquanto que o presente modelo para o quartzo fornece o valor 1,49. As
diferenças entre os valores fornecidos pelos modelos deste trabalho e aqueles fornecidos pelas
referências são de 1% e 2% para o índice de refração do vidro e do quartzo, respectivamente.
Diante desta margem, verifica-se que o ajuste teórico é confiável.
5.6.2 Caracterização do Substrato de Ouro
O mesmo procedimento foi realizado para as medidas na superfície do ouro
metalizado nas lâminas limpas de vidro. Neste caso, para o ajuste teórico, utilizou-se o
modelo de Drude e três osciladores de Lorentz. Para realizar este ajuste, o filme de ouro foi
considerado como um substrato, pois, a deposição de ouro sobre as lâminas de vidro deu-se de
acordo com o requerimento de que a espessura não fosse menor que 100nm. O uso de filmes
nessa ordem de espessura está fundamentado nos estudos de Loebich [66] e Hodgson [67],
segundo os quais, para essa espessura do ouro, a transmitância da luz (no comprimento de
onda de 492nm) é praticamente zero. Isso facilita o processo de modelagem pós
caracterização elipsométrica, pois assim não há necessidade de contabilizar, no ajuste, o que
estiver abaixo do ouro. Os parâmetros obtidos pelo melhor ajuste estão dispostos na tabela
5.4.
ε∞ = 3,18 ± 0,02
DrudeEp (eV) EΓ (eV)
7,71 ± 0,005 0,098 ± 0,002
Lorentz
j fj Ej (eV) Eγ, j (eV)
1 0,25 ± 0,03 2,740 ± 0,005 0,45 ± 0,02
2 0,54 ± 0,08 3,15 ± 0,01 0,87 ± 0,06
3 2,17 ± 0,07 4,23 ± 0,01 2,19 ± 0,04
A figura 5.11 mostra os resultados em α e em β do ajuste teórico sobre as medidas
elipsométricas.
Vial, et. al. [22], analisaram dois modelos matemáticos para ajuste teórico do ouro.
Tabela 5.4 Valores dos parâmetros da lei de dispersão de Drude-Lorentz (equação 2.105) para o ouro.
OU
RO
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 109
Um dos modelos consiste apenas de um termo de Drude, e o outro consiste em um termo de
Lorentz em adição a um de Drude. Os valores dos parâmetros analisados por eles estão
dispostos na tabela 5.5.
Comparando-se os dados das tabelas 5.4 e 5.5, percebe-se que os resultados obtidos no
presente trabalho para o modelamento do ouro são bastante diferentes daqueles obtidos por
Vial, et. al. Além disso, percebe-se que os valores dos parâmetros de Drude sugeridos em seu
trabalho são diferentes quando o modelamento ocorre com um oscilador de Lorentz e sem o
oscilador. Isto acontece porque ao adicionar uma função matemática no processo de
modelamento, todos os parâmetros têm de ser reajustados para que os resultados expressem
da melhor forma possível a realidade medida.
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75-0,8
-0,3
0,2
0,7
Energia (eV)
β
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75-0,6
-0,5
-0,4
-0,3
-0,2
-0,1
0,0
Energia (eV)
α
Figura 5.11 Resultado em termos do coeficiente de Fourier α de uma medida elipsométrica em superfície de ouro (linha pontilhada) e do modelamento da medida utilizando-se a lei de
dispersão de Drude com adicional de seis osciladores de Lorentz (linha contínua). R² é o coeficiente de qualidade do modelamento.
R² = 0,99887
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 110
ε∞ EP (eV) EΓ (eV) fj Ej Eγ, j
Drude 9,0685 8,9148 0,07593
Drude-Lorentz 5,9673 8,7411 0,06584 1,09 2,6885 0,43366
Esta é uma justificativa para a diferença entre os valores dos parâmetros do modelo
Drude-Lorentz obtidos neste trabalho, onde foram utilizados três osciladores de Lorentz, e
para os parâmetros de Drude obtidos no trabalho de Vial, et. al. Outro fator importante que
deve ser notado é a amplitude (ou região) espectral definida para os modelos. Enquanto que
Vial, et. al., utilizaram dados na região de 1,24eV-2,48eV, a amplitude espectral de aquisição e
modelamento de dados para o ouro neste trabalho vai desde 0,75eV até 6,0eV. Assim, na
região desde 0,75eV a pouco mais de 1,0eV, o modelo de Drude pode ser melhor aproveitado
para o ajuste, enquanto que no restante do espectro disponível, o modelamento só pode ser
efetivado com a inserção de mais osciladores de Lorentz, motivo que levou a serem utilizados
três osciladores no presente trabalho.
A partir do modelo de Drude, é possível extrair propriedades físicas importantes do
metal. Uma dessas propriedades físicas é a densidade de portadores de cargas, que pode ser
calculada substituindo-se na equação 2.87d os valores obtidos do ajuste. Por simplicidade de
aplicação ao caso em estudo, a equação 2.87d pode ser reescrita como
η=ϵ 0 me(ω p
e )2
=4π
2ϵ 0 me
h2 (E p
e )2
.
Assim, tomando da referência [44] os valores das constantes, a densidade de portadores de
cargas, em cm-3, pode ser dada substituindo-se o valor da energia de plasma em eV na fórmula
η[cm−3
]=7,25%⋅E p, [eV]
2 .
Logo, a partir desse ajuste, a densidade de portadores de carga é de 4,31 × 1022 cm-3.
De acordo com a referência [49], a densidade de portadores livres é de 5,90 × 1022 cm-3.
Embora diferentes, estes valores têm a mesma ordem de grandeza. A diferença pode ser
atribuída a vários fatores, entre os quais pode ser citada possível impureza no ouro.
Outra propriedade física importante que pode ser inferida a partir do modelo de Drude
é a condutividade DC. Para isto, basta fazer ω → 0 na equação 2.100 e nela substituir os
Tabela 5.5 Valores dos parâmetros (equação 5.11c) da lei de dispersão de de Drude (segunda linha) e de Drude-Lorentz (terceira linha) para o ouro obtidos por Vial, et. al. [22].
(5.8)
(5.9)
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 111
valores dos parâmetros que estão disponíveis na tabela 5.4. Para simplificar a aplicação destes
valores, combinando-se as equações 2.87d, 2.100 e 2.102b, esta última pode ser reescrita na
forma
σ =η e2τ
me
=2πϵ 0
h
Ep2
E Γ
.
Assim, tem-se que a condutividade em S/mm pode ser obtida substituindo-se os valores de Ep
e de EΓ, ambos em eV, na fórmula
σ [S/mm ]=13,45⋅Ep,[ eV ]
2
EΓ ,[eV ]
.
O valor da condutividade para o ouro extraída por meio do presente ajuste teórico é
8.158 S/mm. Este valor está de acordo com a ordem de grandeza para a condutividade de
metais, que é de 104 S/mm.
Após uma medida elipsométrica também é possível obter o índice de refração
complexo de um substrato de duas maneiras diferentes: a partir da inversão direta dos
parâmetros elipsométricos (equações 3.11 e 3.12) ou por substituição dos valores dos ajustes
teóricos na função matemática do modelo utilizado (no presente caso, equação 2.105). A
figura 5.12 mostra a comparação entre o índice de refração complexo do ouro obtido no
presente estudo e aquele obtido a partir dos parâmetros sugeridos por Vial, et. al.
Percebe-se desta figura que o modelo proposto neste trabalho se adéqua bem à
inversão direta dos parâmetros elipsométricos. Percebe-se também que o modelo proposto por
Vial, et. al. se ajusta razoavelmente bem na região de análise deles, mas se desvia muito da
medida quando esta é feita em região espectral mais ampla. Dois dos osciladores de Lorentz
propostos no presente trabalho descrevem as transições eletrônicas que ocorrem nas energias
2,74eV e 3,15eV. Segundo Anderson [68], a função trabalho do ouro é de 4,83eV. Este valor é
compatível com 5,5eV reportado por Thèye [69] para a energia de Fermi para o ouro. Assim,
o terceiro oscilador de Lorentz pode ser entendido como o que descreve a absorção pelos
elétrons da energia dos fótons incidentes no ouro durante a medida causando o efeito
fotoelétrico.
(5.10)
(5.11)
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 112
5.6.3 Caracterização de filme de PAni Obtido a Partir da Sol-5
A primeira amostra de PAni a ter sido analisada foi aquela obtida pela solução mais
concentrada (Sol-5). Procedeu-se dessa maneira devido ao fato de o filme assim gerado ser o
mais espesso de todos. A opção de analisar inicialmente o filme mais espesso de PAni está
associada à expectativa de a luz refletida por tal filme contemplar exclusivamente
informações da camada superior do filme, possibilitando analisar suas propriedades ópticas
sem a preocupação de ter que contabilizar as propriedades do substrato abaixo do filme. Suas
propriedades ópticas, portanto, serviriam de ponto de partida para a caracterização dos demais
filmes.
180 380 580 780 980 1180 1380 15800,0
0,5
1,0
1,5
2,0
2,5
Comprimento de onda (nm)
n
180 380 580 780 980 1180 1380 1580
0
2
4
6
8
10
12
Comprimento de onda (nm)
κ
Figura 5.12 Comparações entre o índice de refração e o coeficiente de extinção obtidos por inversão direta de medidas elipsométricas (linha pontilhada), ajuste teórico com o modelo
de Drude somado com três osciladores de Lorentz (linha contínua fina) e com os parâmetros sugeridos por Vial, et. al. [49], (linha contínua espessa). A região hachurada destaca a região de validade dos parâmetros sugeridos por Vial, et. al., 1,24eV-2,48eV.
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 113
A figura 5.13 mostra os resultados obtidos para as medidas em filmes espessos de
PAni. Percebe-se, no entanto, neste gráfico, que na região abaixo de 1,5eV a medida apresenta
um aspecto de interferências construtivas e destrutivas. Infere-se, portanto, que a PAni é
transparente nesta região espectral. Se o índice de refração da PAni (equação 2.65) fosse
conhecido para esta região espectral, então seria possível utilizar os dados de interferometria
para inferir a espessura do filme caracterizado.
A figura 5.15 esquematiza a óptica geométrica da luz refletida nas interfaces ar/filme e
filme/substrato. A luz refletida pela interface filme/substrato, ao emergir pela interface
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75
-0,90
-0,80
-0,70
-0,60
-0,50
0,40
0,50
0,60
0,70
0,80
Energia (eV)
α β
Figura 5.13 Resultado em termos dos coeficientes de Fourier de uma medida elipsométrica em filme espesso de PAni. A parte hachurada do gráfico delimita a região espectral onde a
PAni mostra-se transparente.
0,75 0,85 0,95 1,05 1,15 1,25 1,35 1,45 1,55
-0,90
-0,80
-0,70
-0,60
-0,50
0,40
0,50
0,60
0,70
0,80
Energia (eV)
α β
Figura 5.14 Resultado em termos dos coeficientes de Fourier de uma medida elipsométrica em filme espesso de PAni na região espectral entre 0,75eV e 1,55eV. Acima do gráfico
estão indicadas as ordens de interferências construtivas m, m + 1, etc., e os comprimentos de onda de interferência.
α
β
m; 158
0nm
m + 1;
1387
nm
m + 2;
1242
nm
m + 3;
1130
nm
m + 4;
1040
nm
m + 5;
967n
m
m + 6;
908n
m
m + 7;
859n
m
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 114
ar/filme sobrepor-se-á à luz refletida pela interface ar/filme. Esta, por sua vez, neste ínterim,
terá percorrido uma distância s. A fase da onda que emerge do filme é dada por
δ 2=2π⋅2l
λ filme+ξ π ,
pois 2l é a distância total segundo a qual a onda se propaga dentro do filme, e λfilme é o
comprimento de onda no interior do material que constitui o filme. O parâmetro ξ será zero se
o índice de refração do substrato for menor que o índice de refração do material do filme; caso
contrário, o parâmetro assume valor 1 (equações 2.52a e 2.58a). Substituindo a equação 2.34c
na equação 5.12, tem-se
δ 2=2π⋅2 l nλ 0
+ξ π ,
onde n é o índice de refração do material do filme. A fase da onda refletida na interface
ar/filme será
δ 1=2π⋅sλ0
+π .
onde π contabiliza a mudança de fase por reflexão na interface ar/filme, pois o índice de
refração do filme, independentemente do material que o componha, será sempre maior que o
índice de refração do ar, e, assim, a reflexão da onda será dada com consequente mudança de
fase em 180º. A diferença de fase, portanto, é dada por
δ 2−δ 1=Δ=2πλ0
(2 l n−s)+(ξ−1)π .
De acordo com a geometria da figura 5.15,
substrato
i
rr
sh
ld
Figura 5.15 Trajetórias de incidência e de reflexões da luz em um sistema ar/filme/substrato.
(5.12)
(5.13)
(5.14)
(5.15)
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 115
l=n d
√n2−sen 2i
e
s=2d sen 2i
√n2−sen2 i
.
Substituindo-se as equações 5.16 na equação 5.15, tem-se
Δ=4 πdλ 0
√n2−sen2i+(ξ−1)π .
Para que haja interferência construtiva, é necessário que
Δ=2 mπ , m∈ℕ*.
Logo, combinando as equações 5.17 e 5.18, tem-se
m−ξ−1
2=2
dλ0
√n2(λ0)−sen2i .
No caso em que o material do filme é a PAni, o substrato é o vidro, o ângulo de
incidência é de 75º, é razoável supor que o índice da PAni esteja entre 1,6 e 2,0*. A partir
dessa suposição, tem-se que, ξ = 0 (pois o índice de refração do vidro está em torno de 1,5).
Substituindo-se essas informações na equação 5.19, é possível analisar as relações entre m e
λm que determinam as interferências construtivas. O gráfico da figura 5.16 mostra os possíveis
valores para m de acordo com as posições de interferências construtivas obtidas a partir do
gráfico da figura 5.14.
* Esta suposição tem dois fundamentos básicos. Primeiro, a facilitação dos cálculos, pois sendo maior que 1,6resulta em ξ = 0. Segundo, a razoabilidade, uma vez que a maioria dos materiais têm índice de refraçãoabaixo de 2,0 quando são transparentes em uma região espectral.
8009001000110012001300140015001600
0
1
2
3
41000nm
Posição de interferência construtiva (nm)
Ord
em d
e in
terf
erên
cia
(5.16a)
(5.16b)
(5.17)
(5.18)
(5.19)
Figura 5.16 Possíveis valores de m para interferências destrutivas considerando-se 1,6 < n < 2,0 e d = 1000nm.
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 116
Uma análise rápida do gráfico da figura 5.16 permite excluir a possibilidade de o filme
ser menor ou igual a 1000nm. Os motivos:
i- o valor de m não pode ser fracionário. Esta condição não é atendida, pois,
para a interferência destrutiva que ocorre em torno de λ ≈ 1590nm, 1 < m < 2.
ii- o valor de m deve obedecer uma sucessão de incremento unitário. Essa
expectativa não é atendida neste caso, como pode ser visto no gráfico da figura
5.16, pois nele m(1130nm) é igual a m(1242nm) e a m(1387nm).
Fazendo-se gráficos semelhantes, aumentando-se o valor sugerido para a espessura do
filme, é possível encontrar uma espessura mínima que satisfaça as condições de interferências
construtivas em questão. É o caso mostrado no gráfico da figura 5.17.
Percebe-se por meio deste gráfico que a espessura mínima de 3070nm atende às
condições de interferência construtiva, pois m = {5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12} são valores de
incremento unitário para posições de interferências construtivas adjacentes. Qualquer
espessura maior que 3070nm também atenderá esses requisitos na região 1,6 < n < 2,0.
Essa espessura está em consonância com a previsão da espessura do filme conforme
mostrado na tabela 5.2. É imprescindível ter inicialmente uma estimativa razoável para o
valor da espessura do filme antes de iniciar o processo de modelamento, pois esta é muitas das
8009001000110012001300140015001600
4
5
6
7
8
9
10
11
12
133070nm
Posição de interferência construtiva (nm)
Ord
em d
e in
terf
erên
cia
Figura 5.17 Possíveis valores de m para interferências construtivas considerando-se 1,6 < n < 2,0 e d = 3070nm.
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 117
vezes a mais importante variável de regressão. Embora a dependência do índice de refração
com o comprimento de onda seja um fator que limite o uso preciso da equação 5.19 para a
determinação deste parâmetro, os dois métodos utilizados (o da volumetria e o da análise
gráfica com margem de erro) mostram-se, até aqui, robustos (ou pelo menos compatíveis
entre si).
Inserindo-se o valor inicial da espessura de 3070nm, modelou-se o sistema
ar/filme/substrato utilizando-se ~n (λ )=1+ i⋅0 para o ar, o modelo de Tauc-Lorentz para a
PAni e o modelo de Sellmeier para o vidro. Os parâmetros iniciais para o modelo de Tauc-
Lorentz para a PAni foram estimados a partir dos seguintes critérios:
i- as energias dos osciladores de Lorentz devem assumir valores maiores que 1,5eV,
pois abaixo dessa energia se encontra o padrão de interferência. Um oscilador de
Lorentz abaixo dessa energia seria responsável por absorção de luz nessa região,
minimizando os efeitos de interferência. Assim, qualquer padrão de interferência que
viesse a existir nesta região do espectro seria disfarçado pelo pico de absorção de
Lorentz.
ii- as energias dos osciladores de Lorentz devem estar próximos das energias dos
fótons para os quais o parâmetro β assume os menores valores, pois é neste parâmetro
que está contabilizado o parâmetro elipsométrico Δ, que por sua vez contabiliza o fator
de absorção de luz (cf. equação 3.19c). Assim, pela forma da curva mostrada na figura
5.18, três osciladores próximos a 1,8eV, 3,5eV e 5,8eV podem ser responsáveis pelos
mínimos em β.
iii- os outros três parâmetros de cada oscilador no modelo de Tauc-Lorentz são
investigados fazendo-os variar manualmente, um de cada vez, até que a curva teórica
fique o mais próximo possível da curva obtida a partir das medidas.
Após esse procedimento, fez-se o software SEA trabalhar com os valores obtidos
manualmente, exceto os valores das energias dos osciladores de Lorentz e da espessura,
variando-os até que um melhor ajuste fosse obtido. Depois, tentou-se um novo ajuste, desta
vez liberando todos os valores, tornando-os variáveis para um ajuste final. Finalmente,
percebeu-se que um melhor ajuste pôde ser obtido inserindo-se um quarto oscilador com
energia próximo a 2eV. Os parâmetros do modelo de Tauc-Lorentz que resultaram no melhor
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 118
ajuste teórico sobre as medidas estão indicados na tabela 5.5.
ε∞ = 1,91 ± 0,02 espessura = (3017,753 ± 0,001)nm
Tauc-Lorentz
j Aj (eV) Ej (eV) Eγ, j (eV) Eg, j (eV)
1 12,0 ± 0,3 1,733 ± 0,002 0,392 ± 0,005 1,301 ± 0,004
2 1,64 ± 0,05 2,047 ± 0,003 0,569 ± 0,004 0,616 ± 0,002
3 33 ± 1 3,527 ± 0,007 0,93 ± 0,01 2,84 ± 0,01
4 138 ± 21 5,69 ± 0,04 1,39 ± 0,04 5,14 ± 0,03
ε∞ = 1
SellmeierS λ0 (µm)
1,60 ± 0,02 0 ± 26
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
Energia (eV)
β
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75
-0,9
-0,8
-0,7
-0,6
-0,5
Energia (eV)
α
R² = 0,99219
Figura 5.18 Ajuste teórico (linha contínua) sobre os dados (linha pontilhada) a medida (linha pontilhada) por elipsometria feita no filme mais espesso de PAni.
Tabela 5.5 Valores dos parâmetros da lei de dispersão de Tauc-Lorentz (equações 5.21 e 5.22) para o filme mais espesso de PAni depositado em vidro.
VID
RO
PAni
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 119
A figura 5.18 mostra o gráfico do ajuste teórico em termos de α e de β. Diante da
qualidade do ajuste teórico, representado matematicamente pelo coeficiente R², e da
sobreposição da função gerada pelo ajuste à curva de medidas mostrada na figura 5.18
(figuras de comparação de ajustes às medidas são chamadas figuras de mérito), é possível ver
concordância do modelo à realidade medida, inclusive na região de interferências.
Observa-se que, neste caso, o modelo final do substrato é bastante diferente daquele
obtido na sessão anterior. A razão física para isto é que, na parte espectral de transparência da
PAni, isto é, na região onde as propriedades ópticas do substrato se somam às da PAni na
medida do estado de polarização da luz de prova refletida pelo sistema, que vai de 850nm a
1650nm, o índice de refração do vidro varia de n(1650nm) = 1,48 a n(850) = 1,53, ou seja,
em menos de 4%, e, para fins de ajuste das medidas, pode ser tomado como praticamente
constante.
Por meio dos parâmetros resultantes do modelamento, é possível obter o índice de
refração complexo para a PAni, cujas partes real e imaginária estão mostradas no gráfico da
figura 5.19.
As propriedades ópticas e elétricas da polianilina variam de acordo com o seu grau de
oxidação e de dopagem. Existem dois estados de dopagem extremos para a polianlina:
polianilina na forma base e polianilina na forma sal de esmeraldina [61]. Os espectros de
absorção para essas duas formas de polianilina são bastante diferentes, como pode ser
verificado no gráfico da figura 5.20.
200 400 600 800 1000 1200 1400 1600
0,0
0,5
1,0
1,5
2,0
2,5
0,0
0,5
1,0
1,5
Comprimento de onda (nm)
n κ
Figura 5.19 Propriedades ópticas da PAni. Comparação entre os resultados obtidos por inversão direta de parâmetros elipsométricos (linha pontilhada) e aqueles obtidos por
modelagem teórica (linha contínua). Observa-se grande concordância entre estes métodos na região espectral no qual o filme é opaco. A inversão direta na região do infravermelho dá
resultados espúrios.
n
κ
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 120
Segundo a referência [61], a forma base esmeraldina pode assumir três estados de
oxidação: o estado de total redução, denominado base leuco esmeraldina (BLE), o estado de
total redução, denominado base pernigranilina (BP) e um estado intermediário. Estes estados
de oxidação estão representados na figura 5.8, na qual y representa um número entre 0 e 1.
A dopagem da base de esmeraldina pode ser feita mediante interação do material com
um meio ácido. Dessa forma, ocorre protonação, isto é, alocação dos prótons H+, bem como
dos contra íons, na estrutura do polímero. Este processo é reversível, e é chamado de
desdopagem. A reversão do processo pode ser feita mediante interação do material com um
meio básico.
Conforme foi descrito no capítulo anterior, a PAni foi inicialmente obtida na forma sal,
porém, por ser insolúvel, ela foi submetida a meio básico com o intuito de adquiri-la na forma
base de esmeraldina. A comparação entre a análise das medidas elipsométricas no primeiro
filme formado a partir do polímero obtido nesta síntese e as informações discutidas na
referência [61] sugere que a PAni obtida a partir da síntese realizada neste trabalho apresenta-
se em graus intermediários de oxidação e de protonação, uma vez que as energias de 2eV e
1,7eV obtidas no ajuste teórico das medidas elipsométricas, correspondem, respectivamente,
aos comprimentos de onda 620nm (associado à transferência local de cargas entre os anéis
quinóides e as unidades imina-fenil-imina na cadeia da BLE) e 730nm (associado às
transições π → pólaron e pólaron → π* no caso do sal de esmeraldina). Em outras palavras,
este resultado pode ser um indicativo de que a tentativa de obtenção de PAni totalmente
Figura 5.20 Absorbâncias da base e do sal de esmeraldina. [Im: Wallace, et. al.; ref. 43]
320nm
330nm
430nm
650nm
780nm
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 121
desdopada pode não ter sido efetiva. A energia de 3,5eV obtida no presente ajuste,
correspondente ao comprimento de onda de 350nm, também está em consonância com o
reportado nas referências [61, 23], segundo as quais na interação entre o material e a radiação
com esta energia ocorre transição eletrônica π-π*.
Por fim, a absorção de energia de 5,7eV pelo material pode estar associada ao efeito
fotoelétrico ou a transições eltrônicas do tipo n-π* ou n-σ*.
5.6.4 Caracterização do Filme de PAni Obtido a Partir da Sol-4
O filme a ter sido caracterizado em seguida foi aquele obtido a partir da solução Sol-4,
isto é, o segundo mais espesso do grupo de filmes. A figura 5.21 mostra o resultado das
medidas em α e β para este filme.
Como pode ser visto na figura 5.22, uma comparação prévia com os resultados das
medidas no filme mais espesso mostra uma sutil diferença entre elas na região acima de
1,75eV. A diferença é mais marcante na região abaixo de 1,75eV, onde são observadas as
estruturas de interferência. Percebe-se ainda, nesta comparação, que as posições (no espectro)
de mínimos locais de α e de β não mudam para energias superiores a 1.75eV. Espera-se então
que as energias de transição sejam bem próximas às anotadas na tabela 5.5.
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75
-0,9
-0,8
-0,7
-0,6
-0,5
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
Energia (eV)
α β
m; 128
0nm
m + 1;
835n
m
α
β
Figura 5.21 Resultados em α e β das medidas elipsométricas no segundo mais espesso filme de PAni. As setas indicam posições de interferências construtivas.
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 122
Para este filme, são observadas, nas medidas, estruturas que se assemelham a
interferências construtivas em dois pontos do espectro: uma em torno de 835nm e outra em
torno de 1280nm. A partir do modelo para o filme anteriormente analisado, o índice de
refração para esses comprimentos de onda são n(835nm) = 2,178 e n(1280nm) = 1,995.
Substituindo-se esses dados na equação 5.19, estima-se que a espessura do filme seja de
514nm. Este resultado está em consonância ao previsto na tabela 5.2. Ele foi utilizado para
iniciar o processo de ajuste teórico. A tabela 5.6 mostra os valores dos parâmetros que
resultaram no melhor ajuste. Os gráficos da figura 5.23 mostram o ajuste da curva teórica às
medidas realizadas.
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75
-0,9
-0,8
-0,7
-0,6
-0,5
Energia (eV)
α
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
Energia (eV)
β
Figura 5.22 Comparações das medidas em α e em β obtidas para o filme mais espesso (curva clara) e para o segundo mais espesso (curva escura).
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 123
ε∞ = 1,56 ± 0,04 espessura = (539,6670 ± 0,0005)nm
Tauc-Lorentz
j Aj (eV) Ej (eV) Eγ, j (eV) Eg, j (eV)
1 2,38 ± 0,03 1,961 ± 0,001 0,783 ± 0,003 0,215 ± 0,007
2 21,4 ± 0,6 3,578 ± 0,008 1,27 ± 0,01 2,54 ± 0,03
3 148 ± 28 5,47 ± 0,07 2,01 ± 0,06 4,98 ± 0,03
ε∞ = 1
SellmeierS λ0 (µm)
1,2100 0,0942
Comparando-se esta análise à anterior, verifica-se uma marcante diferença: o
desaparecimento do oscilador de 1,7eV. Isto indica que, neste filme não há transições π →
pólaron e pólaron → π*. Este tipo de transição está intrinsecamente relacionada à
conformação do polímero [61]. Assim, parece que a conformação do polímero pode estar, de
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
Energia (eV)
β
0,7 1,7 2,7 3,7 4,7 5,7-0,9
-0,8
-0,7
-0,6
-0,5
Energia (eV)
α
QU
AR
TZ
OPA
ni
Tabela 5.6 Valores dos parâmetros da lei de dispersão de Tauc-Lorentz (equações 5.21 e 5.22) para o segundo mais espesso filme de PAni depositado em quartzo.
Figura 5.23 Ajuste teórico (linha contínua) sobre as medidas feitas em PAni depositada em quartzo obtida a partir da Sol-4 (pontos).
R² = 0,99678
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 124
algum modo, relacionada à espessura do filme.
5.6.5 Caracterização do Filme de PAni Obtido a Partir da Sol-3
A figura 5.24 mostra os resultados das medidas em α e em β para o filme formado a
partir da solução Sol-3.
Antes de iniciar o ajuste teórico, compararam-se as medidas em α e em β dos filmes
obtidos pelas soluções Sol-4 e Sol-3. A comparação está mostrada na figura 5.25. O objetivo é
investigar se a caracterização neste filme também forneceu interferência em alguma região do
espectro usado. Das comparações, é possível perceber
i- enlarguecimento e deslocamento para menor energia dos picos em α e em β devidos
aos osciladores de Lorentz;
ii- uma elevação, tanto em α quanto em β, da estrutura que, no filme anterior, se referia
a um dos mínimos de interferência;
iii- um deslocamento para menor energia do pico de interferência.
A observação i sugere que pode haver uma mudança perceptível nos valores das
energias e das intensidades dos osciladores do modelo Tauc-Lorentz. As observações ii e iii
sugerem que a espessura deste filme não deve ser muito inferior à espessura do filme obtido a
partir da Sol-4.
Assim, no processo de ajuste teórico, o valor inicialmente usado para a espessura foi
de 300nm. Utilizou-se neste ajuste o mesmo modelo descrito no item 5.6.4. No entanto, o
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75
-0,80
-0,75
-0,70
-0,65
-0,60
-0,55
-0,50
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
Energia (eV)
α β
Figura 5.24 Resultados em α e β das medidas elipsométricas no filme de PAni obtido pela Sol-3.
α
β
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 125
melhor ajuste foi obtido após trocar-se este modelo por um semelhante àquele obtido no item
5.6.3. O resultado do ajuste, com a espessura do filme e os valores dos parâmetros de Tauc-
Lorentz, estão dispostos na tabela 5.7.
ε∞ = 1,92 ± 0,03 espessura = (350,7430 ± 0,0003)nm
Tauc-Lorentz
j Aj (eV) Ej (eV) Eγ, j (eV) Eg, j (eV)
1 2,9 ± 0,03 1,44 ± 0,01 1,18 ± 0,06 0,57 ± 0,02
2 5,4 ± 0,5 1,8485 ± 0,009 0,48 ± 0,03 1,42 ± 0,03
3 10,9 ± 0,8 3,52 ± 0,02 1,12 ± 0,02 2,37 ± 0,04
4 53 ± 11 5,79 ± 0,06 1,89 ± 0,06 4,72 ± 0,05
ε∞ = 1
SellmeierS λ0 (µm)
1,2100 0,0942
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
Energia (eV)
β
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75
-0,9
-0,8
-0,7
-0,6
-0,5
Energia (eV)
α
Figura 5.25 Comparações das medidas elipsométricas nos filmes obtidos pelas soluções Sol-3 (curva escura) e Sol-4 (curva clara).
mSol-4
(1280nm) = 1
725nm
QU
AR
TZ
OPA
ni
Tabela 5.7 Valores dos parâmetros da lei de dispersão de Tauc-Lorentz (equações 5.21 e 5.22) para o filme de PAni depositado em quartzo a partir da Sol-3.
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 126
A figura 5.26 mostra o resultado gráfico do ajuste teórico. Por comparação, verifica-se
que o valor da espessura previsto no ato da confecção do filme difere daquele obtido a partir
do melhor ajuste teórico. Em outras palavras, o valor obtido pelo ajuste está fora da margem
prevista.
Observa-se da tabela 5.7 que os valores das posições dos osciladores de Lorentz são
diferentes daqueles ajustados para o filme obtido a partir da Sol-5. A diferença mais notável
está na banda polarônica, associada ao primeiro oscilador (j = 1) que se deslocou mais, neste
caso, para a região do infravermelho. Este é mais um indicativo de dependência da
conformação molecular da PAni com sua espessura.
5.6.6 Caracterização do Filme de PAni Obtido a Partir da Sol-2
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
Energia (eV)
β
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75
-0,8
-0,75
-0,7
-0,65
-0,6
-0,55
-0,5
Energia (eV)
α
Figura 5.26 Ajuste teórico (linha contínua) sobre as medidas feitas em PAni obtida a partir da Sol-3 (pontos).
R² = 0,95896
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 127
A figura 5.27 mostra os resultados das medidas em α e em β para o filme formado a
partir da solução Sol-2 e a comparação desses resultados com os obtidos para o filme formado
a partir da Sol-3. Percebe-se desta comparação que as posições dos picos e vales em α e em β,
em energias acima de 1,75eV, estão situados praticamente nas mesmas posições das abcissas.
Isto sugere que o modelo a ser utilizado para o ajuste teórico das medidas neste filme deve ser
bastante parecido com os modelos usados para os ajustes teóricos das medidas nos filmes
anteriores. Assim, para o ajuste, fez-se uso dos mesmos parâmetros resultantes do melhor
ajuste teórico sobre as medidas no filme obtido a partir da Sol-3. Utilizou-se, inclusive, como
valor inicial da espessura, o mesmo obtido ao fim daquele ajuste. A motivação para o uso da
mesma espessura está tanto no fato de, como previsto na tabela 5.2, os dois filmes têm
praticamente a mesma espessura como na coincidência do pico de interferência na
comparação das duas medidas. Em outras palavras, espera-se que a espessura dos dois filmes,
considerando-se a margem de segurança, seja praticamente a mesma.
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75
0,60
0,65
0,70
0,75
0,80
0,85
0,90
Energia (eV)
β
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75
-0,80
-0,75
-0,70
-0,65
-0,60
-0,55
-0,50
Energia (eV)
α
Figura 5.27 Comparações das medidas elipsométricas nos filmes obtidos pelas soluções Sol-2 (curva escura) e Sol-3 (curva clara).
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 128
Com isso, procedeu-se ao ajuste teórico, cujos valores dos parâmetros obtidos ao fim
da melhor regressão estão dispostos na tabela 5.8 e cuja figura de mérito está exibida na figura
5.28.
ε∞ = 1,54 ± 0,03; espessura = (368,8790 ± 0,0002)nm
Tauc-Lorentz
j Aj (eV) Ej (eV) Eγ, j (eV) Eg, j (eV)
1 0,86 ± 0,04 1,546 ± 0,004 0,72 ± 0,01 0 ± 0,03
2 13,1 ± 0,7 1,8240 ± 0,0007 0,51 ± 0,02 1,55 ± 0,02
3 16 ± 1 3,44 ± 0,02 1,47 ± 0,03 2,50 ± 0,03
4 65 ± 5 5,86 ± 0,06 2,8 ± 0,1 4,54 ± 0,04
ε∞ = 1
SellmeierS λ0 (µm)
1,2100 0,0942
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75
0,60
0,65
0,70
0,75
0,80
0,85
0,90
Energia (eV)
β
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75
-0,80
-0,75
-0,70
-0,65
-0,60
-0,55
-0,50
Energia (eV)
α
QU
AR
TZ
OPA
ni
Tabela 5.8 Valores dos parâmetros da lei de dispersão de Tauc-Lorentz (equações 5.21 e 5.22) para o filme de PAni depositado em quartzo a partir da Sol-2.
Figura 5.28 Ajuste teórico (linha contínua) sobre as medidas feitas em PAni obtida a partir da Sol-2 (pontos).
R² = 0,97727
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 129
5.6.7 Caracterização de um Filme de PAni Depositado em Ouro
A figura 5.29 mostra os resultados em α e em β das medidas e do melhor ajuste teórico
sobre as medidas feitas para o filme de PAni obtido a partir da Sol-4 depositado sobre ouro.
Percebe-se que há nítida diferença entre os resultados destas medidas e daquelas feitas
para o filme obtido a partir da mesma solução e depositado em quartzo. Observa-se para esta
medida o padrão de interferência que ocorre na região abaixo de 1,75eV. Observa-se também
a presença de máximos e mínimos locais na região acima de 1,75eV cujas causas talvez sejam
as mesmas já descritas nos casos anteriores: a absorção de energia pela PAni devido a
transições eletrônicas e polarônicas.
A tabela 5.9 apresenta os valores obtidos ao fim do melhor ajuste teórico. Observa-se,
a partir desta tabela, que o terceiro oscilador de Tauc-Lorentz não desempenha papel nenhum
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75-1,0
-0,5
0,0
0,5
Energia (eV)
α
0,75 1,75 2,75 3,75 4,75 5,75 6,75-1,0
-0,5
0,0
0,5
1,0
Energia (eV)
β
Figura 5.29 Ajuste teórico (linha contínua) sobre as medidas feitas em PAni obtida a partir da Sol-4 (pontos).
R² = 0,99320
CAPÍTULO 5 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE RESULTADOS 130
no ajuste teórico, uma vez que a margem de segurança para seus parâmetros excedem em
várias ordens o valor médio do ajuste. Em outras palavras, o mesmo ajuste é obtido quando o
terceiro oscilador é eliminado do modelo. Como interpreta-se que este oscilador contabiliza a
absorção de luz pelo material no processo de degradação, isto sugere uma interação da PAni
com o ouro no sentido de torná-la mais estável.
ε∞ = 2,2 ± 0,2; espessura = (702,771 ± 0,001)nm
Tauc-Lorentz
j Aj (eV) Ej (eV) Eγ, j (eV) Eg, j (eV)
1 1,90 ± 0,04 1,928 ± 0,003 0,610 ± 0,06 0,18 ± 0,01
2 3,0 ± 0,3 3,86 ± 0,02 1,17 ± 0,05 1,0 ± 0,1
3 97 ± 17000 6,1 ± 0,6 0 ± 2 5 ± 4890
ε∞ = 1,09916
DrudeEp (eV) EΓ (eV)
7,30455 0,0987
Lorentz
j fj Ej (eV) Eγ, j (eV)
1 0,66519 2,91172 0,84047
2 1,61313 3,97758 1,89412
3 1,88011 6,81686 4,76018
Verifica-se, além disso, que não há banda polarônica neste caso. Estas informações
podem sugerir que o material apresente diferentes propriedades quando depositado em
substratos diferentes.
OU
RO
PAni
Tabela 5.9 Valores dos parâmetros da lei de dispersão de Tauc-Lorentz (equações 5.21 e 5.22) para o filme de PAni depositado em ouro a partir da Sol-4.
CAPÍTULO 6 – CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS 131
CAPÍTULO 6 – CONCLUSÕES
A elipsometria é uma técnica de caracterização que fornece com bastante precisão as
propriedades ópticas dos materiais constituintes de um sistema, com a vantagem de ser não
invasiva, mantendo o sistema intacto e disponível para outras finalidades após a
caracterização. Porém, tão grande vantagem tem um custo muito alto, pois, para a correta
aquisição e interpretação das propriedades, é necessário ter rigorosamente disponível todo o
histórico do sistema analisado, isto é, ter conhecimento de como ele foi fabricado e que
influências sofreu desde sua fabricação até o momento em que foi caracterizado. Isto porque
uma medida elipsométrica, em geral, não fornece de imediato as propriedades ópticas do
sistema. Na maioria dos casos, estas só podem ser adquiridas após um árduo processo de
ajustes teóricos de parâmetros compatíveis com os tipos de materiais que compõem o sistema
em estudo.
Há várias situações possíveis de serem enfrentadas diante de uma análise
elipsométrica que podem ser subdivididas em dois grupos: (i) sistemas uniaxiais, isto é, que
apresentam simetria de rotação em torno do eixo normal à superfície e (ii) sistemas com
diferentes eixos ópticos. As amostras estudadas neste trabalho mostraram-se uniaxiais, uma
vez que não foram detectadas diferenças entre as medidas feitas em diferentes ângulos
azimutais. A análise de sistemas que apresentam anisotropia é mais complexa e um estudo
neste sentido é deixado como perspectiva para futuros trabalhos do grupo.
Considerando-se sistemas uniaxiais, devem ser distinguidas algumas possibilidades
ópticas: (I) o caso em que a transmitância é nula e a rugosidade da superfície não afeta as
medidas elipsométricas, (II) o caso em que a função dielétrica complexa (ou o índice de
refração complexo) do material é conhecida em adição à insignificante rugosidade da
superfície, e, por fim, (III) o caso em que nenhuma característica do material é conhecida
previamente à análise.
No caso (I), o mais simples de todos, é possível obter diretamente o índice de refração
por meio da inversão direta dos parâmetros elipsométricos (equações 3.11 e 3.12). Este tipo
de análise foi aplicado à caracterização do substrato de ouro na seção 5.6.2. Portanto, nesta
análise, considerou-se a superfície do ouro como sendo plana e não rugosa. Obter o índice de
CAPÍTULO 6 – CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS 132
refração complexo desta maneira, permite obter outras propriedades ópticas do sistema, tais
como a profundidade de penetração do campo eletromagnético e a reflectância. Mesmo assim,
somente o processo de ajuste teórico permite obter o máximo de informações sobre o
material, como, para o ouro, por exemplo, o número de portadores livres, a frequência de
plasma e a condutividade elétrica (equações 5.9 e 5.11).
No caso (II), a espessura é o único parâmetro de ajuste teórico, pois a função dielétrica
é conhecida. Desta forma, a precisão na espessura do filme dependerá da precisão sobre o
conhecimento da função dielétrica.
O caso (III), é o mais complexo de todos, no entanto, é o mais interessante, pois
apresenta o maior potencial para extração de informações. Neste caso, um sistema teórico
deve ser desenvolvido computacionalmente de modo a compreender o sistema real sob análise
simulando uma medida elipsométrica até que esta medida simulada seja idêntica à realizada
experimentalmente, processo denominado, como descrito anteriormente, de ajuste teórico. O
sistema teórico deve descrever a situação real em questão. Em outras palavras, se o sistema
real caracterizado for constituído de N camadas de filmes finos e de um substrato, o sistema
teórico deve contemplar a exata sequência das N camadas relativamente ao substrato, ao
ambiente onde se fez a medida e ao sentido de propagação da luz usada para caracterização. A
cada uma das N camadas deverá ser atribuído um modelo, que por sua vez deve ser
condizente ao tipo de material que constitui tal camada. A complexidade do modelo usado no
ajuste teórico depende da abrangência espectral usada na caracterização do sistema real. Por
exemplo, no caso do ouro analisado neste trabalho, o sistema teórico consiste simplesmente
de um substrato (o ouro) caracterizado em ar (cujo índice de refração complexo é
~n≈1+ i⋅0, isto é, idêntico ao do vácuo). Assim, o sistema teórico usado foi do tipo
vácuo/ouro, e o modelo, devido à ampla região espectral usada para a análise, foi do tipo
Drude + 3 Lorentz. Assim, embora este seja um sistema bastante simples (pois consiste
apenas de um ambiente e de um substrato), o modelo tem um alto grau de complexidade, pois
envolve 12 parâmetros de ajuste, a saber: ε∞, Ep, EΓ, fj, Ej e Eγ, j, com j assumindo valores de 1
a 3.
O processo de ajuste teórico é um processo estatístico cuja validade matemática
depende da qualidade do ajuste, dado por meio do parâmetro R2, do desvio mínimo
quadrático, dado por MRS e da figura de mérito. A aceitação de um modelo, no entanto, vai
CAPÍTULO 6 – CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS 133
além da boa qualidade matemática de ajuste: é necessário verificar se os parâmetros finais de
ajuste são fisicamente plausíveis.
Neste sentido, quanto mais informações forem conhecidas de antemão, menos árduo
será o processo de ajuste teórico. Um dos mais importantes parâmetros de modelamento é a
espessura da camada do filme constituinte do sistema sob análise elipsométrica, sendo
imprescindível ter estimativa de um valor que seja o mais próximo possível da real espessura
do filme. Ter uma noção precisa da espessura reduz muito o árduo processo de investigação
dos valores dos parâmetros dos modelos ópticos adotados para ajuste teórico. Isto porque há
situações nas quais, mesmo com uma espessura não condizente com a realidade, a adoção de
certos valores para os parâmetros dos modelos ópticos de ajuste teórico fornece uma boa
imitação matemática das medidas elipsométricas. Por outro lado, na maioria das vezes é
impossível ter um bom ajuste quando não se consegue acertar a real espessura do filme.
Um dos métodos de estimar a espessura de um filme proposto neste trabalho é
denominado de método de volumetria para estimativa de espessura de filme depositado pelo
método casting. Fazendo-se uma comparação entre as espessuras resultantes dos ajustes
teóricos e aquelas previstas pela técnica de volumetria para alguns dos filmes analisados neste
trabalho, verifica-se boa concordância entre elas. Portanto, a técnica da volumetria para prever
a espessura de um filme no ato de sua confecção é promissora e merece ser aprimorada.
Neste trabalho houve também a oportunidade de analisar um padrão de interferência e,
a partir dele, inferir com acurácia a espessura do filme em análise, mesmo sem ter
conhecimento prévio de suas reais propriedades ópticas. Este método mostrou-se bastante
eficaz, além de muito simples. O uso de padrões de interferência na forma como foi feita
neste trabalho é bastante indicado para as análises futuras sempre que as medidas fornecerem
padrões semelhantes.
No caso de substratos transparentes, a caracterização óptica por elipsometria revelou-
se efetiva mediante o uso do modelo de Sellmeier para o ajuste teórico sobre as medidas,
retornando, inclusive, valores muito próximos aos tabelados na literatura.
No caso da caracterização do substrato de ouro, o modelo de Drude com três
osciladores de Lorentz mostrou-se razoável, e seus resultados, inclusive, fornecem
propriedades que estão de acordo com a literatura.
Partindo-se da espessura da PAni obtida pelo método da interferometria, e influenciado
CAPÍTULO 6 – CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS 134
pelo trabalho de Al-Attar, et. al. [53], as primeiras tentativas de ajuste teórico sobre as
medidas elipsométricas deram-se com a aplicação do modelo de Lorentz, tentando-se ajustes
com três osciladores centrados nos valores publicados pelos autores. No entanto, após
exaustivas tentativas, percebeu-se que o modelo de Tauc-Lorentz mostra-se mais eficiente,
fornecendo um ajuste de maior qualidade e resultados plausíveis diante de interpretação física.
É interessante destacar que o modelo de Tauc-Lorentz foi inicialmente proposto para
sistemas semidondutores desordenados. Desta forma, ele se mostra naturalmente mais
adequado para ser aplicado aos ajustes teóricos sobre as medidas realizadas nos filmes de
PAni. Também deve ser destacado que todas as tentativas de ajustes teóricos nas quais
tentaram-se combinações entre osciladores de Lorentz e de Tauc-Lorentz levaram a resultados
com baixos valores de R2. Portanto, o melhor ajuste teórico para os filmes de PAni, tanto do
ponto de vista computacional, quanto do ponto de vista físico, é feito usando-se o modelo de
Tauc-Lorentz.
No trabalho de Al-Attar, a obtençaõ da PAni e de seus filmes é obtida por meio de
síntese eletroquímica. Diferentemente, no presente trabalho, a PAni é obtida por meio de
síntese química enquanto que os filmes são obtidos pelo método casting. A diferença entre
estes dois métodos pode induzir diferentes conformações finais na estrutura do filme. Além
disso, características como o peso molecular médio e o arranjo molecular podem ser afetadas
pelo método de obtenção do material e de seus filmes. Estes fatores podem ser a causa das
diferenças entre os resultados finais das análises das medidas elipsométricas feitas por Al-
Attar e aquelas feitas no presente trabalho.
Por meio da medida elipsométrica sobre o filme mais espesso de PAni analisado neste
trabalho, foi possível inferir de antemão sua espessura. Assim, o processo de ajuste teórico
pôde ser efetivado sem maiores dificuldades. O resultado final teve qualidade bastante
aceitável, tanto do ponto de vista matemático quanto do ponto de vista físico. Por isso, os
valores dos parâmetros do modelo obtido ao fim deste ajuste serviram de ponto de partida
para o ajuste dos filmes analisados posteriormente. No entanto, as análises dos demais filmes
de PAni mostraram-se realizáveis apenas mediante mudanças nos parâmetros dos modelos.
Isto pode gerar, entre outras, quatro interpretações físicas: (a) as propriedades de um filme de
PAni podem ser dependentes da espessura, (b) as propriedades de um filme de Pani podem ser
dependentes da solução estoque utilizada, (c) as propriedades de um filme de PAni podem ser
CAPÍTULO 6 – CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS 135
alteradas por influência da umidade relativa do ar no momento em que se dá sua
caracterização óptica, ou (d) as propriedades de um filme de PAni podem ser dependentes da
temperatura no momento de sua caracterização. A interpretação (a) foi discutida neste
trabalho logo após as obtenções dos resultados dos ajustes finais de cada filme. A
interpretação (b) é proposta pelo fato de terem sido utilizadas soluções de diferentes
concentrações para a obtenção dos diferentes filmes analisados, situação que pode levar a
processos de diferentes graus de agregação e de enovelamento do polímero. As interpretações
(c) e (d) são propostas devido ao fato de a umidade relativa do ar e a temperatura sofrerem
grandes variações ao longo do dia na cidade de Teresina associada ao fato de as medidas
elipsométricas terem sido realizadas imediatamente após a confecção de cada filme que, por
suas vezes, foram obtidos em horários diferentes e em dias diferentes. Neste sentido, mais
uma perspectiva gerada para os futuros experimentos é a realização de medidas sistemáticas
que permitam monitorar possíveis influências do ambiente no resultado de uma caracterização
elipsométrica.
200 400 600 800 1000 1200 1400 1600
1,4
1,6
1,8
2,0
2,2
2,4
Comprimento de onda (nm)
n
200 400 600 800 1000 1200 1400 1600
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
Comprimento de onda (nm)
κ
Figura 6.1 Partes reais e imaginárias dos índices de refração complexos obtidos a partir dos parâmetros da tabela 6.1.
Sol-5/vidroSol-4/quartzoSol-3/quartzoSol-2/quartzoSol-4/ouro
CAPÍTULO 6 – CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS 136
Além disso, verificou-se a possibilidade das propriedades ópticas de um filme de PAni
também serem dependentes do substrato sobre o qual o filme é depositado. Para fácil
comparação, a figura 6.1 mostra o índice de refração resultante dos modelos utilizados para
descrever as propriedades ópticas dos filmes de PAni analisados neste trabalho. Além disso, a
tabela 6.1 também pode ser tida como um guia comparativo. Desta forma, a apresentação na
tabela está organizada por valores de energia, ou posição, das bandas Ej, onde o índice j indica
o número da transição.
Sol-5/vidro Sol-4/quartzo Sol-4/ouro Sol-3/quartzo Sol-2/quartzo
espessura 3017 nm 540nm 703nm 351nm 369nm
ε∞ 1,91 ± 0,02 1,56 ± 0,04 2,2 ± 0,2 1,92 ± 0,03 1,54 ± 0,03
A1 (eV) 12,0 ± 0,3 2,9 ± 0,03 0,86 ± 0,04
E1 (eV) 1,733 ± 0,002 1,44 ± 0,01 1,546 ± 0,04
Eγ, 1 (eV) 0,392 ± 0,005 1,18 ± 0,06 0,72 ± 0,01
Eg, 1 (eV) 1,301 ± 0,004 0,57 ± 0,02 0 ± 0,03
A2 (eV) 1,64 ± 0,005 2,38 ± 0,03 1,90 ± 0,04 5,4 ± 0,5 13,1 ± 0,7
E2 (eV) 2,047 ± 0,003 1,961 ± 0,01 1,928 ± 0,003 1,8485 ± 0,009 1,8240 ± 0,0007
Eγ, 2 (eV) 0,569 ± 0,004 0,783 ± 0,003 0,610 ± 0,06 0,48 ± 0,03 0,51 ± 0,02
Eg, 2 (eV) 0,616 ± 0,002 0,215 ± 0,007 0,18 ± 0,01 1,42 ± 0,03 1,55 ± 0,02
A3 (eV) 33 ± 1 21,4 ± 0,6 3,0 ± 0,3 10,9 ± 0,8 16 ± 1
E3 (eV) 3,527 ± 0,007 3,578 ± 0,008 3,86 ± 0,02 3,52 ± 0,02 3,44 ± 0,02
Eγ, 3 (eV) 0,93 ± 0,01 1,27 ± 0,01 1,17 ± 0,05 1,12 ± 0,02 1,47 ± 0,03
Eg, 3 (eV) 2,84 ± 0,01 2,54 ± 0,03 1,0 ± 0,1 2,37 ± 0,04 2,50 ± 0,03
A4 (eV) 138 ± 21 148 ± 28 97 ± 17000 53 ± 11 65 ± 5
E4 (eV) 5,69 ± 0,04 5,47 ± 0,07 6,1 ± 0,6 5,79 ± 0,06 5,86 ± 0,06
Eγ, 4 (eV) 1,39 ± 0,04 2,01 ± 0,06 0 ± 2 1,89 ± 0,06 2,8 ± 0,1
Eg, 4 (eV) 5,14 ± 0,03 4,98 ±0,03 5 ± 4890 4,72 ± 0,05 4,54 ± 0,04
Observa-se que os dois filmes originados a partir da mesma solução mãe, Sol-4,
depositados em substratos diferentes, ouro e quartzo, apresentam propriedades ópticas
bastante distintas. Comparando os modelos obtidos após o melhor ajuste teórico sobre as
medidas elipsométricas destes dois filmes, nota-se que aquele depositado em ouro tem uma
Tabela 6.1 Comparação entre os parâmetros dos modelos obtidos ao fim dos melhores ajustes teóricos sobre as medidas elipsométricas nos diferentes filmes.
CAPÍTULO 6 – CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS 137
transição a menos em realação àquele depositado em quartzo. Comparando-se, no entanto,
estes dois filmes com todos os demais, verifica-se que eles não possuem a transição de
energia descrita pelo oscilador de Tauc-Lorentz localizado entre 1,4eV e 1.7eV, embora os
valores dos demais parâmetros, com exceção daquele de maior energia, não tenha revelado
grandes variações.
É interessante notar que o ajuste teórico para o filme depositado sobre ouro resulta em
figura de mérito e R² praticamente idênticos nos casos em que são e em que não são
considerados os parâmetros da transição de energia mais alta. Isto quer dizer que o algorítmo
de Levenberg-Maquardt, que realiza o ajuste teórico, não apresenta sensibilidade a estes
parâmetros. Verifica-se que o ajuste teórico sobre as medidas elipsométricas realizadas no
substrato de ouro evidencia uma transição em energia próxima à considerada para o filme de
PAni em questão. Assim, a falta de sensibilidade do algoritmo de Levenberg-Maquardt pode
ser explicada, do ponto de vista físico, pela falta de contraste óptico nesta região espectral.
Outro ponto de destaque neste trabalho é o fato de a caracterização óptica ter sido feita
em ampla região espectral. Fazer uso de uma larga região espectral para a análise óptica dos
sistemas é muitas vezes vantajoso, principalmente quando o espectro contempla as regiões do
visível e do NIR, pois uma região espectral maior é sinônimo de maior número de dados a
serem analisados e, consequentemente, sinônimo de possibilidade de análise das mais
intrínsecas propriedades do sistema sob caracterização. Isto porque será necessário usar um
maior número de parâmetros do modelo em questão durante o ajuste teórico. Ao contrário do
que foi feito neste trabalho, os autores referenciados fizeram uso de região espectral bem
menor em seus estudos. Isto fica evidente na análise do filme de ouro, onde a região do NIR é
mais importante para uma precisa determinação da contribuição dos elétrons livres. No
mesmo sentido, no caso da PAni, o acesso à região do NIR, permite determinar melhor a
contribuição dos pólarons. Por extensão, o acesso à região UV, muitas vezes não é
considerada nos estudos publicados. Neste trabalho, foi possível fazer medidas nesta região. A
análise de tais medidas revelaram a necessidade de incluir um oscilador de Tauc-Lorentz com
energia centrada entre 5,5eV e 5,9eV. Poucos trabalhos mostram a caracterização da PAni na
região abaixo de 300nm (acima de 4,1eV). Esses poucos, no entanto, não atribuem significado
físico a esta banda.
Este oscilador pode ser associado a um dos dois fenômenos físicos: (1) a absorção de
CAPÍTULO 6 – CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS 138
energia dos fótons e consequente liberação de elétrons, processo conhecido como efeito
fotoelétrico, cuja função trabalho pode ser simulada com uma cauda de transição assimétrica,
como proposto neste trabalho, ou (2) uma transição eletrônica de alta energia, tal como uma
transição do tipo n-π* ou n-σ*.
REFERÊNCIAS 139
REFERÊNCIAS
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APÊNDICE A – ROTEIRO PARA A SÍNTESE DA PAni 144
APÊNDICE A – ROTEIRO PARA A SÍNTESE DA PAni
A.1 Material Necessário:→ equipamento: 1 capela[1, 2, 3], 1 geladeira[1], 1 agitador[2, 3], 1 balança de precisão[2],
1 bomba de vácuo[2, 3], 1 estufa[3].→ materiais físicos: etiquetas adesivas*, 1 balão volumétrico de 500mL[1] (BV500), 1
balão volumétrico de 1L[2] (BV1), 3 béqueres de 25mL[1] (Bq25-1, Bq25-2 e Bq25-3), 1 béquer de100mL[2] (Bq100), 1 béquer de 1L (Bq1)[2], 1 béquer de 2L[3] (Bq2), 1 proveta de 20mL[1, 2, 3], 1funil[1, 2], 45cm × 45cm de filme PVC[2], 1 caixa de isopor[2], 3 suportes universais[1, 2, 3] (SU-1,SU-2 e SU-3), 3 garras[1, 2, 3] (Gr-1, Gr-2 e Gr-3), 1 baqueta de vidro[2], 1 espátula de metal[2],1 bureta de 50mL[2], 1m × 1m de papel-alumínio[2, 3], 1 suporte para papel-filtro[2, 3], 2 papéis-filtro[2, 3] (PF-1 e PF-2), 1 kitassato de 2L[2, 3].
→ recipientes para descarte: 1 recipiente para descarte de anlina (RDAn), 1 Recipientepara descarte de álcool etílico (RDEOH), 1 recipiente para descarte de ácido sulfúrico[1]
(RDH2SO4), 1 recipiente para descarte de hidróxido de amônio (RDNH4OH), 1 recipiente paradescarte de resíduo de lavagem da PAni dopada (RDPAni+), 1 recipiente para descarte deresíduo de lavagem da PAni desdopada (RDPAni0).
→ reagentes†: ácido sulfúrico[1] (50mL), álcool etílico[1] (600mL), água destilada[1, 2, 3]
(6,5L), gelo[2] (5Kg), sal de cozinha[2] (2kg), anilina[2] (50mL), persulfato de amônia[2] (20g),acetona[2] (1L), hidróxido de amônio[2, 3] (50mL).
A.2 Etapa 1: Preparo Da Solução Alcoólica De Ácido Sulfúrico
Lavar material físico antes de usar.
a- Ambientar:com o álcool etílico (descartando o conteúdo ambientador no RDEOH):
o balão volumétrico BV500,e o funil;
com o ácido sulfúrico (descartando o conteúdo ambientador no RDH2SO4):o béquer Bq25-1,e a proveta.
b- Encher o BV500 com 100mL de álcool etílico (álcool despejado diretamente do frascono funil acoplado no BV500).c- Adicionar na proveta, com auxílio do Bq25-1, 13,8mL de ácido sulfúrico.d- Despejar conteúdo da proveta no Bq500.e- Adicionar, no BV500, mais álcool etílico até completar o volume de 500mL.
* Quantas forem necessárias para rotular os recipientes a serem utilizados no processo da síntese.1 A ser usado na etapa 1 da síntese.2 A ser usado na etapa 2 da síntese.3 A ser usado na etapa 3 da síntese.† Os reagentes são solicitados em quantidades suficientes a suprir eventuais perdas devidas aos procedimentos
de ambientação e de mensuração de volumes.
APÊNDICE A – ROTEIRO PARA A SÍNTESE DA PAni 145
A.3 Etapa2: Síntese
Lavar material antes de usar.
a- Ligar a balança de precisão para estabilizar*.b Ambientar:
com anilina:o béquer Bq25-2 (descartando o conteúdo ambientador no RDAn),e, com o auxílio do Bq25-2, a proveta (descartando conteúdoambientador no RDAn).
com água destilada, a bureta (descartando conteúdo ambientador na pia).
A.3.1 Preparo de Ambiente Frioa Cobrir a boca do béquer Bq1 com filme de PVC para evitar contaminação interna.b- Instalar o Bq1 na caixa de isopor.c- Inserir alternadamente camadas de gelo e sal até a borda da caixa de isopor.d- Fechar a caixa de isopor, mantendo a boca do béquer voltada para o lado de for a dacaixa.
A.3.2 Misturaa- Retirar, cuidadosamente, o filme de PVC da boca do Bq1.b- Inserir, com auxílio do Bq25-2, 20mL de anilina na proveta.c- Transferir o conteúdo da proveta para o Bq1.d- Transferir aos poucos, com o auxílio de uma baqueta de vidro, a solução alcoólica deácido sulfúrico do BV500 para o Bq1.h- Ligar o agitador.
A.3.3 Oxidantea- Tarar a balança de precisão com o béquer Bq100 sobre o prato da balança.b- Inserir, com o auxílio de uma espátula de metal, persulfato de amônia no Bq100 até quea balança acuse a massa de 11,52g.c- Adicionar, em seguida, no Bq100, 20mL de água destilada, medidos na proveta.d- Agitar o sistema com auxílio de um bastão de vidro até que todo o persulfato sejadissolvido e a solução torne-se incolor.
A.3.4 Oxidaçãoa- Transferir o conteúdo resultante do Bq100 para a bureta.b- Abrir a válvula da bureta de modo a deixar gotejar lentamente na solução contida nobéquer Bq1.c- Atentar para o momento em que é despejada a última gota da bureta.d- Desacoplar, ao término do gotejamento, a bureta do sistema sob agitação.e- Cobrir, com papel-alumínio, o béquer sob agitação.f- Contar 4h†.
* A balança deve ser ligada antes do início de todo o procedimento, pois ela demora certo tempo até seestabilizar.
† Tempo estimado para que a síntese tenha sido concluída. Se achar necessário, o experimentador podeestender o tempo de reação.
APÊNDICE A – ROTEIRO PARA A SÍNTESE DA PAni 146
A.3.5 Filtragema- Passadas 4h de agitação, retirar o agitador de dentro do Bq1.b- Montar o sistema para filtragem a vácuo.c- Com a bomba de vácuo ligada, despejar no filtro, à medida que for possível, toda asolução contida no Bq1.
A.3.6 LavagemApós a filtragem, ainda com o mesmo sistema de vácuo, lavar o conteúdo do papel-
filtro com acetona em abundância (usar 500mL).
A.4 Etapa3: Desdopagem
Lavar material antes de usar.
A.4.1 Desdopantea- Ambientar com NH4OH (descartando o conteúdo ambientador no RDNH4OH):
o Bq25-3,com o auxílio do Bq25-3, a proveta,e o BV1.
b- No balão volumétrico BV1:despejar 150mL de água destilada;despejar 10mL de NH4OH (medidos na proveta com o auxílio do Bq25-3);despejar água destilada até completar o volume de 1L.
A.4.2 Desdopagema- Com cuidado, transferir o conteúdo do papel-filtro no béquer Bq2.b- Transferir a solução de NH4OH do BV1 para o Bq2.c- Deixar agitando por 12h.d- Passadas as 12h, adicionar 20mL de NH4OH (medidos com o auxílio da proveta) nobéquer Bq2 sob agitação.e- Esperar agitar por mais 1h. Enquanto isso:
preparar sistema para secagem a vácuo com o suporte grande para papel-filtro,ligar a estufa e programá-la para operar a 60ºC por 24h.
A.4.3 Filtragema- Passada 1h de agitação, fazer filtragem a vácuo.b- Descartar, no RDPAni0, o conteúdo colhido no kitassato.
A.4.4 Lavagema- Reutilizando o sistema de vácuo, fazer lavagem do material contido no filtroutilizando água destilada em abundância (até que o líquido filtrado tenha aspecto incolor).b- Colocar o sistema filtro+material para secar na estufa a 60ºC.c- Lavar e guardar a vidraria utilizada.
APÊNDICE A – ROTEIRO PARA A SÍNTESE DA PAni 147
A.5 Pulverizaçãoa- Com o auxílio de uma espátula, separar a PAni do papel-filtro e colocá-la em umalmofariz.b- Pressionar com um pistilo a PAni contra a parede do almofariz até formar pó degrânulos pequenos.d- Secar a vácuo o pó da PAni.
APÊNDICE B – PSEUDO ÂNGULO DE BREWSTER 148
APÊNDICE B – PSEUDO ÂNGULO DE BREWSTER
O conceito de pseudo ângulo de Brewster pode ser encontrado em livros que discutem
as propriedades ópticas dos materiais. No entanto, a solução do problema em si é de difícil
acesso. Por isso, neste apêndice, será feita uma discussão mais detalhada sobre este conceito.
Suponha que luz de determinado comprimento de onda incida do ar (nar = 1 + 0i) em
uma superfície de material não transparente. A equação 3.2a pode ser reescrita como
~r p=~n Tc I−
~c T
~n T cI+~c T
,
onde definiram-se
cI≝cosθ I
e
~c T≝cos~θ T .
Assim, combinando as equações B.1, 3.6 e 3.7, tem-se
~r p=~n T
2 c I−(~nT2−sI
2)
1/2
~n T2 cI+(~nT
2−sI
2)
1/2 ,
onde definiu-se
sI≝senθ I .
Definindo-se ainda
ρ≝(nT2+κ T
2)
1/2,
δ≝atgκ T
nT
,
R≝[(nT2−κ T
2−sI
2)]
1 /2
e
D≝atg2nTκ T
nT2−κ T
2−sI
2 ,
onde nT e κT estão definidos na equação 2.65, tem-se
~r p=cI
2 ρ 4−R+i⋅2cI ρ
2 R1/2 sen (2δ−D /2)
cI2 ρ 4
+R+2cI ρ2 R1/2 cos(2δ−D /2)
.
A reflectância, propriedade fisicamente mensurável, da onda eletromagnética
(B.1a)
(B.1b)
(B.1c)
(B.2a)
(B.2b)
(B.3a)
(B.3b)
(B.3c)
(B.3d)
(B.4)
APÊNDICE B – PSEUDO ÂNGULO DE BREWSTER 149
polarizada na direção p é definida por
RP≝~r p*⋅~r p
e, portanto, é dada por
Rp=(cI ρ
4−R)2
+4c I2 ρ 4 R sen2
(2δ−D / 2)
[cI ρ4+R+2cI ρ
2R1 /2cos (2δ−D / 2)]2 .
De maneira semelhante, combinando-se as equações 3.2b, 3.6, 3.7, B.1b, B.1c, B.2b e
B.3, tem-se que
~r s=cI
2−R−i⋅2cIR
1 /2 sen D /2
cI2+R+i⋅2cIR
1/2 cosD /2.
Logo,
Rs=~r s
*⋅~r s=
(c I2−R)2
+4cI2R sen2D /2
(cI2+R+2cI cos D /2)
2 .
A figura B.1 mostra os gráficos de Rp e de Rs em função do ângulo de incidência θI
para o ouro quando é analisada luz de comprimento de onda de 480nm, para o qual nT 1,0965
e κT = 1,7635.
(B.5)
(B.6)
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90
0
0.2
0.4
0.6
0.8
1
Ângulo de inciência (grau)
Ref
lect
ânci
a
Figura B.1 Reflectâncias de luz de comprimento de onda 480nm polarizada nas direções p e s para o ouro.
Rs
Rp
pseu
do ân
gulo
de B
rewste
r
(B.7)
(B.8)
APÊNDICE C – SIMULAÇÃO DE UMA MEDIDA ELIPSOMÉTRICA 150
APÊNDICE C – SIMULAÇÃO DE UMA MEDIDA ELIPSOMÉTRICA
Diante do que foi exposto neste trabalho, percebe-se que a elipsometria é um método
engenhoso de aquisição das propriedades ópticas dos materiais. Neste apêndice será dada uma
abordagem de como são obtidas as medidas elipsométricas.
Seja dada uma estrutura hipotética, cujas propriedades ópticas são tais que deveriam
fornecer os parâmetros α = 0,7 e β = 0,3 como resultados de uma medida elipsométrica a um
dado comprimento de onda λ. Então, pela equação 3.19a, a intensidade de luz que incidiria no
detector do elipsômetro em função da posição angular do polarizador (no caso de uma
montagem elipsométrica do tipo RPVASE), no intervalo de meia volta, com passos de 1º,
deve corresponder ao gráfico da figura C.1.
Neste caso, o processo de aquisição de informação útil por meio das somas de
Hadamard deve ser feita reescrevendo as equações 3.20 nas formas
S 1=∑j=1
10
I (P j)⋅δ P ,
S 2=∑j=10
20
I (P j)⋅δ P ,
S 3=∑j=20
30
I (P j)⋅δ P
e
0 15 30 45 60 75 90 105 120 135 150 165 180
0.00
0.05
0.10
0.15
0.20
P(º)
I(A
, P)
Figura C.1 Simulação da intensidade de luz de um dado comprimento de onda em função da posição angular do polarizador em uma medida elipsométrica em um substrato. A região
hachurada ilustra o processo de obtenção da primeira das somas de Hadamard.
(C.1a)
(C.1b)
(C.1c)
APÊNDICE C – SIMULAÇÃO DE UMA MEDIDA ELIPSOMÉTRICA 151
S 4=∑j=30
40
I ( P j)⋅δ P ,
pois está sendo simulado o caso real de medidas discretas. O ângulo Pj assume valores do tipo
0, 5º, 10º, …, 175º, 180º, para meia volta do polarizador. No caso em discussão, δP = 5º nas
equações C.1. Realizando o cálculo das somas de Hadamard, tem-se que S1 = 0,142, S2 =
0,066, S3 = 0,033 e S4 = 0,109, o que dá, portanto, em αcalculado = 0,683 e βcalculado = 0,293. As
diferenças entre o idealizado e o calculado são de 2,4% para α e de 2,3% para β.
Se, no entanto, for possível fazer uma medida com passo menor da posição angular do
polarizador, δP = 1º, por exemplo, é de se esperar que a acurácia na obtenção de α e de β seja
maior, pois as equações C.1 se aproximam mais das integrais 3.20. O gráfico da figura C.2
ilustra esta situação.
Nesta nova situação, os valores obtidos para as somas de Hadamard são S1 = 0,131, S2
= 0,060, S3 = 0,029 e S4 = 0,101, o que dá αcalculado = 0,697 e βcalculado = 0,299. As diferenças
entre o idealizado e o calculado são de 0,4% para α e de 0,3% para β.
(C.1d)
0 15 30 45 60 75 90 105 120 135 150 165 180
0.00
0.05
0.10
0.15
0.20
P (º)
I(A
, P)
Figura C.2 Simulação da intensidade de luz de um dado comprimento de onda em função da posição angular do polarizador em uma medida elipsométrica em um substrato.
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