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IDENTIFICAÇÃO DO CONTEÚDO ESTOMACAL DA TAINHA (Mugil curema, VALENCIENNES, 1836) E DO PEIXE PEDRA (Genyatremus luteus BLOCH, 1790), NA REGIÃO ESTUARINA DA RAPOSA, MARANHÃO-BRASIL: RESULTADOS PRELIMINARES Ladilson Rodrigues Silva 1* , Daniele Costa Batalha 2 , Mariana Barros Aranha 3 , Marina Bezerra Figueiredo 4 Estudo financiado pela FAPEMA; Apoiado pelo grupo de pesquisa – Biopesq. 1 [email protected] . Graduando em Engenharia de Pesca – UEMA; 2 [email protected] . Graduando em Engenharia de Pesca – UEMA; 3 [email protected] . Graduando em Engenharia de Pesca – UEMA; 4 [email protected] . Docente do curso de Engenharia de Pesca – UEMA. Resumo Neste estudo são descritos o comportamento e o hábito alimentar de duas espécies frequentemente capturadas pela frota artesanal maranhense, e que apresentam grande valor comercial para o estado, por meio de identificações dos itens alimentares encontrados no trato digestório. Para a realização das análises foram adquiridos, mensalmente desde agosto de 2016 a janeiro de 2017, 179 espécimes da tainha e 163 do peixe pedra, que foram seccionados em laboratório, para a extração dos estômagos. Cada estomago foi observado individualmente, para a classificação quanto ao estádio de repleção e digestão e também para que o conteúdo estomacal pudesse ser determinado de acordo com o comportamento alimentar das espécies. No decorrer das amostragens, a maioria das tainhas estavam com trato digestório vazio (62%). Os estômagos que continham algum conteúdo alimentar (38%), o material estava semi-digerido. As tainhas apresentaram hábito alimentar preferencialmente iliófago, com predominância do item Detrito (50,72%) na maioria dos estômagos que continham alimento. Fizeram parte da alimentação dessa espécie ainda, organismos planctônicos (40,58%) e restos de vegetais (44,93%). Em relação ao peixe- pedra, 55% dos estômagos analisados não foi observado nenhum alimento e 45 % dos tratos digestórios apontaram algum conteúdo alimentar, onde 31% estava com material semi-digerido e 14% sem digestão. O peixe pedra apresentou uma dieta onívora e carnívora baseada em seu comportamento bentônico, se alimentando de bivalves (79,73%), crustáceos (43,66%), algas (24,32%), poliquetas (21,33%), isopódas (16,90%) e equinodermas (15,49%). Através dos resultados é possível classificar a tainha como um típico consumidor de primeira

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IDENTIFICAÇÃO DO CONTEÚDO ESTOMACAL DA TAINHA (Mugil curema, VALENCIENNES, 1836) E DO PEIXE PEDRA (Genyatremus luteus BLOCH, 1790), NA REGIÃO ESTUARINA DA RAPOSA, MARANHÃO-BRASIL: RESULTADOS PRELIMINARES

Ladilson Rodrigues Silva1*, Daniele Costa Batalha2, Mariana Barros Aranha3, Marina Bezerra Figueiredo4

Estudo financiado pela FAPEMA;

Apoiado pelo grupo de pesquisa – Biopesq.

[email protected]. Graduando em Engenharia de Pesca – UEMA; 2 [email protected]. Graduando em Engenharia de Pesca – UEMA; [email protected]. Graduando em Engenharia de Pesca – UEMA; [email protected]. Docente do curso de Engenharia de Pesca – UEMA.

Resumo

Neste estudo são descritos o comportamento e o hábito alimentar de duas espécies frequentemente capturadas pela frota artesanal maranhense, e que apresentam grande valor comercial para o estado, por meio de identificações dos itens alimentares encontrados no trato digestório. Para a realização das análises foram adquiridos, mensalmente desde agosto de 2016 a janeiro de 2017, 179 espécimes da tainha e 163 do peixe pedra, que foram seccionados em laboratório, para a extração dos estômagos. Cada estomago foi observado individualmente, para a classificação quanto ao estádio de repleção e digestão e também para que o conteúdo estomacal pudesse ser determinado de acordo com o comportamento alimentar das espécies. No decorrer das amostragens, a maioria das tainhas estavam com trato digestório vazio (62%). Os estômagos que continham algum conteúdo alimentar (38%), o material estava semi-digerido. As tainhas apresentaram hábito alimentar preferencialmente iliófago, com predominância do item Detrito (50,72%) na maioria dos estômagos que continham alimento. Fizeram parte da alimentação dessa espécie ainda, organismos planctônicos (40,58%) e restos de vegetais (44,93%). Em relação ao peixe-pedra, 55% dos estômagos analisados não foi observado nenhum alimento e 45 % dos tratos digestórios apontaram algum conteúdo alimentar, onde 31% estava com material semi-digerido e 14% sem digestão. O peixe pedra apresentou uma dieta onívora e carnívora baseada em seu comportamento bentônico, se alimentando de bivalves (79,73%), crustáceos (43,66%), algas (24,32%), poliquetas (21,33%), isopódas (16,90%) e equinodermas (15,49%). Através dos resultados é possível classificar a tainha como um típico consumidor de primeira ordem que transfere energia para os demais níveis, e o peixe pedra foi caracterizado como um consumidor secundário que se alimenta de organismos invertebrados móveis. A tainha se mostrou mais seletiva quanto a aquisição de alimentos do que o peixe pedra que se alimenta de diversos organismos bentônicos.

Palavras-chaves: Alimentação; repleção; digestação

Abstract

This study describes the behavior and eating habits of two species frequently captured by the Maranhão artisanal fleet, and which present great commercial value to the state through identifications of food items found in the digestive tract. In order to carry out the analyzes, 179 specimens of the mullet and 163 of the torroto grunt were collected each month from August 2016 to January 2017, which were sectioned in the laboratory for the extraction of the stomachs. Each stomach was individually observed for classification as to the stage of repletion and digestion and also so that the stomach contents could be determined according to the feeding behavior of the species. During the samplings, most of the mullets were empty digestive tract (62%). Stomachs containing some food content (38%), the material was semi-digested. The mullets presented a food habit preferentially iliophagous, with the predominance of Detrito (50.72%) in the majority of the stomachs that contained food. Planktonic organisms (40.58%) and vegetable remains (44.93%) were also part of the diet of this species. Regarding torroto grunt, 55% of the analyzed stomachs did not observe any food and 45% of the digestive tracts indicated some alimentary content, where 31% was with semi-digested material and 14% without digestion. The fish stone presented an omnivorous and carnivorous diet based on benthic behavior, feeding on bivalves (79.73%), crustaceans (43.66%), algae (24.32%), polychaetes (21.33%), isopods (16.90%) and echinoderms (15.49%). The mugilide studied by these results was classified as a typical first-order consumer that transfers energy to the other levels, and fish stone was characterized as a secondary consumer who feeds on mobile invertebrate organisms. Mullet has been more selective as to the acquisition of food than torroto gruntwhich feeds on various benthic organisms.

Keywords: Feeding; repletion; digestion

Introdução

No estado do Maranhão a pesca é considerada uma das atividades mais tradicionais garantindo desde muito tempo para as comunidades ribeirinhas um dos principais meios de sobrevivência e abastecimento para a população (Santos et al, 2011). Existem nessa região quase 278 comunidades pesqueiras tradicionais com mais de 100 mil pescadores que se dedicam quase exclusivamente a modalidade de pesca artesanal, que se estrutura com base em um caráter cultural, social e econômico fundamental para o desenvolvimento do setor pesqueiro maranhense (Tsuji, 2011).

Diante desse contexto para que se possa garantir a perpetuação dos estoques pesqueiros visando o bem estar do meio ambiente, se faz necessário a promoção de medidas de manejo que procurem o desenvolvimento de um programa de pesca viável econômico, social e ecologicamente, buscando sempre a gestão, o monitoramento e a preservação da diversidade dos estoques e também da atividade pesqueira, que além de constituir um legado cultural é o principal meio de sobrevivência de comunidades costeiras (Resende et al.,2003).

Nessa perspectiva Silva-Junior (2012) afirma que o acompanhamento e monitoramento dos recursos biológicos é crucial para gerar informações sobre como ocorrem os processos ecológicos, servido de base essencial para a construção de um sistema pesqueiro sustentável. Segundo este autor, para amenizar as perdas da diversidade biológica é sensato a realização de estudos de dinâmica populacional que irão garantir uma melhor administração dos recursos vivos exploráveis, marinhos e estuarinos.

O estudo da estrutura trófica em que estão inseridos os organismos aquáticos, vem se mostrando eficaz para a obtenção de informações sobre organização das populações proporcionando dessa forma conhecimento de como ocorrem as interações entre os vários níveis alimentares e a sua relação com o meio ambiente (Vasconcelos Filho et al., 2009).

Estoques de Genuatremus luteus e Mugil curema constituem recursos pesqueiros de importância elevada para o comércio maranhense. Assim, este trabalho tem por objetivo contribuir com a assimilação de informações sobre a dieta trófica dessas espécies, com o intuito de adquirir mais conhecimento sobre a biologia de um recurso pesqueiro tão importante economicamente e ecologicamente para o desenvolvimento sustentável do setor pesqueiro do Estado.

Metodologia

Para que pudessem ser realizados os estudos biológicos foram coletados por meio da pesca extrativa artesanal aproximadamente 30 amostras mensais da tainha (Mugil curema), e do peixe pedra (Genyatremus luteus) com o intuito de realizar estudos sobre o hábito alimentar dessas espécies identificando seu conteúdo estomacal. As amostragens até o momento foram realizadas entre os meses de agosto 2016 a janeiro de 2017. Após coletados, os exemplares foram encaminhados para o Laboratório de Biologia Pesqueira da Universidade Estadual do Maranhão onde ocorreram os processamentos do material biológico. Os peixes foram medidos para a extração do comprimento total, padrão e furcal (cm) e pesados para a obtenção de seu peso total e eviscerado a partir da utilização de uma balança com precisão de 0,01 g. Para a obtenção das informações sobre alimentação e posição da cadeia trófica dos indivíduos, os estômagos da tainha (Mugil curema) e do peixe pedra (Genyatremus luteus) foram coletados e seccionados na porção do esôfago e intestino delgado. Em seguida os estômagos foram separados e abertos e os itens identificados ao menor táxon possível, com auxílio de bibliografias pertinentes e/ou de pesquisadores especialistas em determinados taxas de organismos.

Após a retirada e abertura do trato digestório dos indivíduos, e antes do conteúdo ser pesado e identificado, foi realizado uma estimativa visual do Estádio de Repleção, que uma proporção estabelecida através da observação do grau de preenchimento em que o estômago se encontra no momento em que o mesmo é aberto. Para esta análise foi utilizada a escala de avaliação de Hérran (1988), em que os estômagos puderam ser classificados em: estômago cheio (totalmente completo com alimento); estômago quase cheio (½ preenchido com alimento); estômago parcialmente cheio (¼ de alimento) e estômago vazio. O conteúdo estomacal pode ainda ser classificado, de acordo com Hyslop (1980), em três categorias de grau de digestão aonde o material foi determinado em digerido, não digerido ou semi-digerido. Estômagos que apareceram apenas iscas foram considerados vazios e incorporados ao total de estômagos vazios. Para as análises qualitativa e quantitativa do conteúdo estomacal das espécies coletadas no estuário da Raposa, foram aplicados os métodos de: frequência de estômagos vazios, frequência de ocorrência, numérico e o gravimétrico como propõe Aragão (2003).

· Ocorrência de estômagos vazios (qualitativo) – determinado pela técnica:

OV (%) = (Nº de estômagos vazios/ Nº total de estômagos) x 100

· Frequência de Ocorrência (qualitativo) - calculada através da equação:

FO (%) = (Nº de estômagos com item i / Nº total de estômagos) x 100

· Frequência numérica – proposto através a equação:

FN = (Nº de presas do item i/ Nº total de presas) x 100

· Análise gravimétrica (quantitativo) – determinado pela equação:

P (%) = (Peso do item i / Peso total dos itens alimentares) x 100

O conteúdo estomacal foi analisado ao microscópio estereoscópio, quando necessário, identificando até o menor nível taxonômico possível, e posteriormente empregado os métodos de frequências numéricas, de ocorrência e peso úmido dos itens alimentares. A importância de cada item nos conteúdos estomacais foi obtida através do Índice de Importância Relativa (IRI) (Hyslop, 1980) modificado para peso:

IRli = %Foi x (%Ni + %Pi), onde:

%Foi – porcentagem da frequência de ocorrência de cada item alimentar;

% Ni – porcentagem em número de presas ingeridas de cada item alimentar;

% Pi – porcentagem em peso de presas ingeridas de cada item alimentar.

Resultados e discussão

Dos exemplares estudados ao longo do período de amostragem, foram separados e analisados 342 estômagos, para as possíveis classificações quanto ao estádio de repleção e digestão do trato digestório. Do que foi observado para a tainha, mais da metade (62%) dos indivíduos estavam com o estomago totalmente vazio (Figura 1A), e os que apresentaram algum vestível de alimento (Figura2A), 21% estava ½ cheio e 17 % ¼ cheio (Figura 2A). Em relação ao grau de digestão do conteúdo estomacal, foi verificado, que um total de 69 estômagos se encontraram com o material semi-digerido, sendo que o restante, devido ao elevado índice de vacuidade esteve com o conteúdo digerido (Figura 2B).

Figura 1 - Trato digestório da tainha capturada na Zona Costeira maranhense A: vazio; B: com alimento.

Figura 2 – A: Situação de Repleção do trato digestório das Tainhas capturadas na Zona Costeira maranhense; B: Percentual do grau de digestão encontrado nos estômagos das Tainhas capturadas na Zona Costeira maranhense.

Mesmo com grande número de indivíduos com trato digestório vazio, as tainhas apresentaram uma rica diversidade de itens alimentares pertencentes a vários grupos taxonômicos. Os microrganismos, restos de vegetais e detrito orgânico estiveram entre os principais itens que compuseram a dieta alimentar durante os meses de coleta. O conteúdo alimentar foi constituído de microalgas pertencentes ao grupo das Bacilariofíceas, Cianofíceas, Dinoflagelados e Clorofíceas; larvas de crustáceos; vegetais e restos orgânicos e substrato (Figura 3). Dieta Similar, já foi observada por Neto, (2012), em estudos realizados com algumas espécies de Mugilideos, comprovando o hábito alimentar planctófago e iliófago.

Figura 3 - Itens alimentares encontrados no tubo digestório da tainha capturada na zona costeira maranhense: Bacilariofíceas (1- Surirella sp, 2- Navicula sp, 3-Coscinodiscus sp); Cianofícea (4- Chroococcus sp), Clorofícea (5- Oscillatoria sp); Dinoflagelado (6- Ceratium sp); Microalga não identificada 7; Microcrustáceo 8 e 9; Vegetais 10; Detrito 11.

Fonte: Batalha, 2016

Quanto a frequência de ocorrência, o sedimento orgânico e os vegetais estiveram entre os itens que mais apareceram, contabilizando 50,72% e 44,93% respectivamente superando os microrganismos que foram apontados com frequências mais baixas. As mesmas proporções também já foram registradas por Deus et al. (2007) e outras literaturas ao analisar a dieta dessa espécie, determinando a preferência pela escolha de ambientes bentônicos para realizar a sua alimentação.

O Índice de Importância Alimentar (Figura 4), comprovou que a Mugil curema se alimenta preferencialmente de material orgânico ou detrito e que após as análises foi apontado como item de importância elevada para a dieta desses organismos com 50,72%. Os microrganismos (21, 24%) e os restos vegetais (29,96%) se classificaram como elementos de importância baixa atuando como alimentação acessória. Oliveira e Soares, (1996) expõe que a família Mugilidae por apresentar hábito filtrador se alimenta em períodos diurnos e noturnos, absorvendo grande quantidade de pequenos organismos vivos e também sedimento. Medeiros (2013) sugere ainda que as tainhas ao consumir grandes quantidades de detrito, atuam como fundamentais recicladores de matéria orgânica em ecossistemas estuarinos.

Figura 4 - Importância alimentar dos itens ingeridos pela tainha

Lemos (2015) afirma que o comportamento alimentar das tainhas é flexível e adaptável a ingestão de diferentes alimentos, havendo uma modificação juntamente com a mudança de fase e ciclo de vida. Quando larvas, optam pela ingestão de microrganismos zooplanctônicos e fitoplanctônicos. Já os juvenis, ao migrar para mar aberto, preferem se alimentar de substrato e sedimento, atuando como principal medida estratégica para aumentar seu peso e facilitar a migração entre ambientes. Após a modificação para a alimentação bentônica, o intestino dos mugilideos aumenta em comprimento para consegui absorver mais nutrientes.

Os ambientes costeiros na visão de Vasconcelos Filho et al., (2009) dispõe de um sistema trófico composto por três grupos, que se classificam em consumidores primários (Peixes fitoplanctófagos, zooplanctófagos, onívoros, herbívoros, detritívoros), consumidores de segunda ordem (Peixes que tem sua alimentação baseada em pequenos, crustáceos e peixes, anelídeos, outros vegetais e sedimento) e consumidores terciários (Peixes carnívoros que consomem peixes dos grupos anteriores). Diante dessa classificação e analisando os principais itens consumidos pela tainha é possível caracterizá-la como típico consumidor primário filtrador que incorpora em sua dieta organismos planctônicos, matéria orgânica e inorgânica e alguns tipos de vegetais, exercendo dessa forma papel de regulador energético e ponte eficaz para a circulação dos nutrientes pelos demais grupos. Para esse autor, as tainhas jovens e adultas buscam sempre os estuários que são regiões ricas em nutrientes e alimento.

Já o Peixe Pedra apresentou resultados distintos. Dos 163 estômagos verificados (Figura 5), 74 estavam com algum conteúdo alimentar, aparecendo 8% de indivíduos com trato digestório cheio, 13% com ½ de alimento nos estômagos e 24 % com ¼ de itens alimentares (Figura 6A). Os estômagos vazios alcançaram maiores proporções em todo o período de coleta, resultado distinto do encontrado por Almeida et al., (2005), que observou grande porcentagens para estômagos totalmente cheios, quando estudado o hábito alimentar dessa mesma espécie, na Baía de São José de Ribamar. Para os estômagos com alimento, o estádio de digestão semi-digerido apresentou maior dominância com 51 estômagos nessa situação. Os classificados com sem digestão foram menos frequentes, com apenas 14% das amostras Figura 6B).

Figura 5 - Trato digestório do peixe pedra capturado na Zona Costeira maranhense. A: vazio; B: com alimento.

Figura 6- A: Situação de Repleção encontrado nos estômagos do Peixe Pedra capturado na Zona Costeira maranhense; B: Porcentagem do Grau de Digestão dos itens alimentares presentes nos estômagos de G. luteus.

O Genyatremus lueus, é uma espécie de peixe pertencente à família dos Haemulideos, que são frequentemente encontrados em regiões costeiras, como estuários e lagunas, normalmente escondidos sobre os fundos lodosos, arenosos e pedregosos, para se proteger da ação predatória e também para se alimentar, surgindo daí a denominação, proposta por pescadores locais, de peixe-pedra (Noleto-Filho, 2012). Almeida et al., (2005), o classifica segundo seu hábito alimentar como um indivíduo onívoro oportunista, que tem preferência pela ingestão de organismos associados ao substrato, algas, raízes de mangues e bivalves, justificando sua existência em ambientes estuarinos e recifais.

Durante as análises do trato digestório do peixe pedra, puderam ser encontradas diversos itens alimentares (Figura 7) nos tubos digestórios desses espécimes, que confirmaram a dieta alimentar tipicamente bentônica, já descrita em várias literaturas. O grupo bivalve foi constatado como o item com maior ocorrência no decorrer do estudo, estando presente em 59 estômagos, os decápodes apareceram como o segundo grupo de maior frequência de ocorrência na alimentação dos peixes-pedras aparecendo em 31 tratos digestórios. As algas (24,32 %), Poliquetas (21,13%), Isópodos (16,90%) e os Ofiuroides (15,49%) estiveram entre os itens menos frequentes no decorrer das amostragens.

Figura 7- Itens alimentares encontrados no estômago do Peixe Pedra: A- Bivalves; B- Decápode (camarão); C- Poliqueta; D- Alga; E- Isopoda (Excorallana sp); F- Ofiuroide (Ophionereis sp).

A grande quantidade de estômagos com presença de moluscos bivalves observada neste estudo aponta esses indivíduos como alimento primário, ao passo que tem a dieta baseada preferencialmente em organismos bentônicos. Almeida et al. (2005) em estudo realizado para essa mesma espécie, encontrou resultados divergentes, à medida que, em sua pesquisa o item de maior abundância foi o grupo das algas, que dominaram todas coletas. Mesmo com a predominâncias das algas, a autora afirma que a espécies tem sua dieta baseada em seu comportamento bentônico e que a presença excessiva de um determinado item poderá estar relacionada com sua elevada oferta no ambiente em que os peixes-pedras se concentram.

A classe dos moluscos bivalves segundo o Índice de Importância Alimentar pode ser caracterizada como o único item de importância elevada. Os decápodes foram classificados com itens de importância relativa secundária e o restante dos componentes da dieta apareceram apenas com importância relativamente baixa (Figura 8). A reduzida abundância desses itens pode ter sido provocada pelo consumo acidental desses organismos, ao passo que estão frequentemente distribuídos em ambientes de ocorrência do peixe-pedra (Lopes et al., 2001).

Figura 8 - Importância de cada item alimentar encontrado no tubo digestório do peixe-pedra capturado na zona costeira maranhense.

Araujo (2016) afirma que o hábito alimentar dos peixes pertencentes a família Haemulidae, é modificável de acordo com o ciclo de vida. Nas fases iniciais, a dieta é composta por pequenos crustáceos, e quando alcançam a idade reprodutiva procuram se alimentar de presas mais diversificadas. A troca de alimentação se dá pela necessidade energética que aumenta conforme o desenvolvimento dos peixes. Quando desenvolvidos optam por presas que posam garantir maiores quantidades de nutrientes. Pereira (2011) coloca que os Haemulideos têm hábito carnívoro em alguma fase de sua vida, já que procuram se alimentar de invertebrados móveis como crustáceos e poliquetas. A diferenciação de alimentação ao longo de seu desenvolvimento, pode estar relacionada com as modificações morfológicas e anatômicas da espécie predatória, que busca sempre minimizar o gasto excessivo de energia, assim como também deve ser influenciada pela disponibilidades e diversidade dos recursos acessíveis para alimentação dessas espécies.

Fernandes (1981/82), coloca que o Genytremus luteus não se caracteriza como uma espécie que seleciona seu alimento como ocorre com a tainha. Essa espécie, segundo o autor, é adaptada a um tipo de alimentação bastante diversificada, já que a estrutura de seu aparelho digestivo, os rastros branquiais curtos e espaçados e a dentição são ideais para trituração do alimento.

Considerações parciais

No que diz respeito a alimentação mesmo com os resultados da pesquisa ainda preliminares, é possível observar que as duas espécies estão inseridas em grupos consumidores distintos, mas com comportamentos alimentícios parecidos. Mesmo com a semelhança na preferência por ambientes bentônicos para procurar alimento, o peixe pedra se mostrou mais predador que a tainha, já que em seu trato digestório, não foi possível observar a presença de sedimento, resultado encontrado frequentemente nos estômagos das tainhas, que além de detrito buscam se alimentar de alguns organismos planctônicos e vegetais. As duas espécies sempre procuram os estuários para realizar sua alimentação, contribuído para a conservação do equilíbrio ecológico do meio ambiente.

Referências

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IRI (%)

microrganismos Restos vegetais Detrito 21.23957199999999929.95932400000000250.72

IRI (%)

AlgasBivalvesDecápodaIsopodaOfiuroidePoliqueta4.294912000000000164.32616400000000623.2949714.88071999999999933.18939100000000014.9169510000000001