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VALES DA UVA GOETHE COMO UM
ARRANJO PRODUTIVO LOCAL (APL):
UMA ANÁLISE PELO MODELO DE
DIAMANTE DE PORTER.
Patricia de Sa Freire (UNESC )
Adriana Carvalho Pinto Vieira (UNESC )
Roseli Jenoveva Neto (UNESC )
VANESSA ESTEVAM (unesc )
A principal característica da sociedade contemporânea é a
hipercompetitividade que impõem uma nova direção para a produção
de valor à organização, passando do capital, da terra e da mão-de-
obra para a informação e o conhecimento. Porém, tanto a informação
como o conhecimento, para serem criados precisam ser, antes de tudo,
compartilhados. Desta maneira, este mundo sem fronteiras carrega em
si o paradoxo de exigir que as empresas atuem de maneira cooperativa
para se tornarem competitivas. Surgem as redes cooperativas como os
arranjos produtivos locais (APL) com a gestão de recursos e negócios
por meio da reciprocidade para alcançarem ganhos conjuntos. Os
agentes propositalmente se interconectam, se inter-relacionam e
desenvolvem interdependência a favor do ganho comum. É o momento
de amadurecimento dos quais cada participante tem a consciência que
ganhará muito mais se estiver trabalhando conjuntamente com os
“vizinhos”. Neste contexto, este estudo vem contribuir para uma
melhor compreensão dos APLs ao definir como objetivo do estudo,
compreender os “Vales da Uva Goethe”, em Urussanga, Santa
Catarina como um arranjo produtivo local com base no Método
Diamante de Porter (1993). Para alcançar este objetivo fez-se
necessários explorar os fenômenos estudados - arranjo produtivo local
e “Vales da Uva Goethe” e descrever a interação e interdependência
de suas manifestações pelo Método Diamante de Porter. Atingindo o
objetivo da pesquisa, pode-se afirmar que os Vales pode ser
considerado um APL pela visão do Método Diamante, pois gerencia os
determinantes da competitividade colaborativamente, além de estarem
sujeitos enquanto coletividade ao acaso e as ações do governo.
Palavras-chaves: Vales da Uva Goethe, Arranjo Produtivo Local,
Modelo de Diamante, Competitividade, Inteligência Competitiva.
XXXIV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Engenharia de Produção, Infraestrutura e Desenvolvimento Sustentável: a Agenda Brasil+10
Curitiba, PR, Brasil, 07 a 10 de outubro de 2014.
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1. Introdução
A sociedade contemporânea tem múltiplas designações na literatura científica, como a
Economia do Conhecimento, Nova Economia, Economia Digital, Economia em Rede, Nova
Sociedade, Sociedade da Informação, Sociedade do Conhecimento, entre outras (FREIRE,
2014). Mas, é consenso que sua principal característica é a hipercompetitividade (HORNEY,
1945) que impõem uma nova direção para a produção de valor à organização, passando do
capital, da terra e da mão-de-obra para a informação e o conhecimento. Assim, estes ativos
intangíveis – informação e conhecimento - transformaram-se no real fator de produção por
agregar valor distintivo e configurar vantagem competitiva. (NONAKA; TAKEUCHI, 1997;
TERRA, 2001).
Porém, tanto a informação como o conhecimento, para serem criados precisam ser,
antes de tudo, compartilhados (FREIRE et al, 2013). Desta maneira, este “mundo sem
fronteiras” (OHMAE,1991, p.18) carrega em si o paradoxo de exigir que as empresas atuem
de maneira cooperativa (SHARMA; ERRAMILLI, 2004; LEONIDOU et al, 2010) para se
tornarem competitivas (PORTER, 1989).
Pode-se então considerar a compreensão de Casaroto e Filho (1999) sobre o tema
quando afirmam que as empresas que agem de modo individualizado, principalmente as
pequenas e médias, terão suas forças reduzidas e sugere a inserção destas em redes de
cooperação.
Neste caminho, para vencer o desafio da hipercompetitividade desta economia
globalizada, as estratégias organizacionais passaram a determinar a agilização e otimização
dos processos de cooperações para potencializar as competências distintivas. Ao se perceber a
aprendizagem como um processo determinante da manutenção e da melhoria contínua do
desempenho (Nevis et al, 1995), abriu-se uma janela para que a organização aprendesse com
a experiência do “outro”. Surgem as redes cooperativas.
As redes organizacionais, como os arranjos produtivos locais (APL) são caminhos
colaborativos, encontrados pelos agentes, para a gestão de recursos e negócios por meio da
reciprocidade para alcançarem ganhos conjuntos (Powell, 1990). Os agentes propositalmente
se interconectam, se inter-relacionam e desenvolvem interdependência a favor do ganho
comum. É o momento de amadurecimento dos quais cada participante tem a consciência que
ganhará muito mais se estiver trabalhando conjuntamente com os “vizinhos”.
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Em seu estudo, Mozatto (2012) destaca a importância de se ampliar a abrangência das
investigações sobre as cooperações organizacionais, principalmente os APLs que ainda se
configuram em um fenômeno novo e, por isso ainda estão se constituindo um objeto de estudo
científico.
Neste contexto, partindo-se do pressuposto de que as pesquisas científicas tem
importante papel no desenvolvimento socioeconômico do país, este estudo vem contribuir
para uma melhor compreensão dos arranjos produtivos locais (APLs) ao definir como
objetivo do estudo, compreender os Vales da Uva Goethe, na região de Urussanga, Santa
Catarina como um arranjo produtivo local com base no Método Diamante de Porter (1993).
Para alcançar este objetivo fez-se necessários explorar os fenômenos estudados -
arranjo produtivo local e os Vales da Uva Goethe e descrever a interação e interdependência
de suas manifestações pelo Método Diamante de Porter. Para uma melhor fluidez da leitura,
os Vales da Uva Goethe serão chamados a partir deste ponto de Vales.
2. Arranjo Produtivo Local (APL)
Para compreender os arranjos produtivos locais, ou Cluster em inglês, é
importante explorar o tema sob uma visão histórica identificando as dimensões de análise dos
pesquisadores.
Porter (1993, 1998) é um dos pesquisadores que mais se destaca ao levar o tema a
ser reconhecido como um novo paradigma para o desenvolvimento da economia de uma
nação, estado ou das cidades. Mas, antes dele, a discussão teórica e empírica já norteavam as
pesquisas científicas.
Em 1937, Coase provocou as discussões sobre a necessária cooperação em um
arranjo de trocas e fornecimento, pois, como descreve o autor, nenhuma empresa é capaz de
prover a si mesma de todos os produtos e serviços necessários para seus processos eficientes
de transformação. Com esta discussão o novo paradigma (KUHN, 2005) de perceber a
organização dos agentes econômicos não mais pela forma e força dos agentes, mas por sua
relação. Expoente desta linha de pensamento, em 1984, Marshall apontou os positivos
resultados coletivos entre agentes cooperativos que se agrupassem em distritos industriais.
Inclusive, Williamson (1975) com olhar nos relacionamento interorganizacional destaca a
importância de se analisar tanto o mercado como a hierarquia nele existente como uma rede.
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Outros e diversos autores tem fortalecido esta visão de mundo sem fronteiras (OHMAE,1991,
p.18) e interconectado os quais a atenção para o sucesso organizacional deve ser não mais nos
agentes e, sim nas relações entre eles.
Uma das definições mais aceitas, referencia-se a de Porter (1998, p.197) que
descreve os APL (clusters) como “...concentrações geográficas de empresas interconectadas,
fornecedores especializados, provedores de serviços, firmas em indústrias relacionadas e
instituições associadas”. Esta visão geográfica, segundo o autor aponta para a formação de
uma rede de agentes interconectados que podem abranger uma cidade, uma região, um estado,
país ou mesmo uma rede de países vizinhos.
Conforme afirmam Pedrozo et al (2004), sabe-se que as interações existentes
entre os agentes que compõem um arranjo produtivo estabelecem relações de
complementaridades e interdependência entre eles com o objetivo de sucesso e aprendizado
para todos. Inclusive, uma cadeia organizada pode ser indutora do desenvolvimento
socioeconômico regional em que, as necessidades geradas nos diferentes elos da cadeia
promovem ações individuais e coletivas que acabam por criar valor para toda a rede,
principalmente se existe um APL (NORONHA e TURCHI, 2005).
Os APL’s agroindustriais veem influenciando o desenvolvimento regional a
medida que geram empregos, renda, comércio e prestação de serviços para a localidade e,
consequentemente, melhores condições de vida para a população rural (BALESTRINI et al.,
2005). Mas Porter (1998) destaca que o objetivo maior de um APL não é o desenvolvimento
socioeconômico da região, mesmo que a consequência natural o seja. O autor afirma que os
“...clusters se alinham melhor com a natureza da competição e com as fontes de vantagens
competitivas” (PORTER, 1998, p. 205). Ou seja, os APL’s são constituídos para a criação de
vantagens competitivas para seus membros.
Corroborando, Balestrini et al. (2005) esclarecem que a lógica da atuação em rede
surge a partir da necessidade da cooperação objetivando maior eficiência e competitividade.
Essa dinâmica interativa dos agentes para o alcance de estratégias de eficiência e
competitividade relacionam os APL como uma derivação do Modelo Diamante (PORTER,
1993). Como é o caso das Indicações Geográficas (IG) no universo das Propriedades
Intelectuais. Como ativos intangíveis, as IGs favorecem a competitividade das APL por, como
conclui Souza (2010, p.12), existir o “reconhecimento que esta abordagem abre uma
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possibilidade contemporânea baseada nos diferenciais regionais para maior competitividade
do aglomerado”.
Com base na Teoria da Vantagem Competitiva e no Modelo Diamante de
Competitividade de Michael Porter (PORTER, 1993; 1998) pode-se analisar os APL como
uma estratégia competitiva visto que, valorizam as inter-relações dos 4 componentes do
Modelo que formatam o ambiente os quais as empresas competem promovendo ou
impedindo, aumentando ou diminuindo a vantagem competitiva. Os componentes são:
condições de fatores; condições de demanda; setores correlatos e de apoio; estratégia,
estrutura e rivalidade das empresas. Somado a estes determinantes das competitividades,
Porter (1993) aponta duas variáveis que podem influenciar sobremaneira os APL, o acaso que
está fora do controle das empresas, mas pode se configurar em oportunidades, e o governo
que com suas ações e intervenções pode melhorar ou piorar o cenário competitivo.
Figura 1: “Modelo Diamante de Competitividade” de Porter
Fonte: Elaborado pelas autoras como base em Porter (1993, p. 163)
Neste entendimento, pode-se considerar que os APLs manifestam a interação
destes quatro componentes ambientais e as duas variáveis de maneira a promover nas para a
rede, o aumento da produtividade; a ampliação da capacidade de inovação e, a geração de
novos negócios. Complementando Pereira e Pedrozo (2004, p 70) detalham que, “a
formalização da cooperação entre duas ou mais organizações constitui-se numa decisão
estratégica que visa dividir riscos, trocar recursos, acessar novos mercados, alcançar
economias de escala, obter sinergias e, por fim, garantir vantagem competitiva”.
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Mas, nem todos os objetivos são tão simples de serem alcançados, pois para um
APL se constituir realmente cooperativo é preciso que sejam gerenciados diversos fatores
(PEDROZO et al, 2004; MONTEIRO, 2003; MOZZATO, 2012) que hoje são considerados
como responsáveis pelo insucesso da rede, como: a não geração dos resultados comerciais
esperados; não haver a transferência do conhecimento pretendido; dificuldades e desconexão
na comunicação interna da rede; a complexidade da gestão e os custos de manutenção; falta
de confiança e aprendizagem; inexistência de comprometimento dos participantes; e falta de
percepção da geração de valor (SADOWSKI E DUYSTERS, 2008; TOIGO e ALBA, 2010).
Desta forma, gerenciar a colaboração para o atendimento das expectativas
compartilhadas é importante para o sucesso do APL, principalmente porque o arranjo
produtivo foi constituído em resposta a necessidade de competitividade, ou seja com a
transferências de habilidades, conhecimentos e capacidade tecnológica (KOGUT, 1988).
3. Procedimentos Metodológicos
Para a classificação da pesquisa, toma-se como base a taxionomia apresentada por
Vergara (2009), que a qualifica em relação a dois aspectos: quanto aos fins e quanto aos
meios de investigação.
Quanto aos fins a pesquisa é caracterizada como exploratória e descritiva. Quanto aos
meios de investigação classifica-se como bibliográfica, documental e estudo de caso. É uma
pesquisa bibliográfica, pois foi necessário levantar o que já foi publicado pela ciência sobre o
fenômeno dos arranjos produtivos locais. Foi necessário analisar o fenômeno em sua realidade
organizacional. Pode também ser considerada documental, pois para conhecer os Vales foi
necessário analisar a sua história em manuais e documentos da ProGoethe. Em relação as
fontes primárias, foi realizada uma pesquisa de campo por meio de entrevistas livres, não
estruturadas, com o Presidente da ProGoethe, Sr. Renato Damian.
4. A APL do Vales da Uva Goethe
Criada em 2006, a Associação ProGoethe deu início a busca pela criação de valor aos
produtos a partir da uva Goethe. Em 18 de agosto de 2010 sob o registro n°. IG201009 a
ProGoethe protocolou no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) o primeiro
processo de reconhecimento de Propriedade Intelectual pela Indicação de Procedência (IP) de
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Santa Catarina, dos vinhos e espumantes dos “Vales da Uva Goethe”, a qual obteve o
reconhecimento em 2012 (publicado na Revista INPI n°. 2.145, em 14 de fevereiro).
Para a Associação, o projeto está proporcionando a organização do APL para a
competitividade dos produtores com a qualificação do produto e pretende-se com a
participação de todos os produtores da região delimitada, realmente agregar valor aos
produtos que carreguem o selo da Indicação de Procedência de acordo com as normas do
Conselho Regulador propostas no Manual de Controle Interno da IPVUG.
O arranjo produtivo VALES DA UVA GOETHE abraça diretamente uma área de
458,9 Km2 compreendendo os municípios de Urussanga, Pedras Grandes, Cocal do Sul,
Morro da Fumaça, Treze de Maio, Orleans, Nova Veneza e Içara no Estado de Santa Catarina,
Brasil (INPI, 2012). Somando as área próximas compreendidas no extremo sul catarinense, o
arranjo produtivo da região delimitada, respeitando a definição de Porter (1998, p.197) pode
então ser considerada uma concentração geográfica de micro, pequena e médias empresas
interconectadas, próximas a seus fornecedores especializados de serviços e produtos, as
indústrias relacionadas e, inclusive, as instituições parceiras como a Universidade do Extremo
Sul Catarinense (UNESC).
Os vinhos Goethe produzidos neste APL são referências de terroirs de qualidade pelas
condições alcançadas na relação específica de clima-solos. Mas nem sempre foi assim. O
processo de aprendizagem vem desde a chegada dos italianos à região em 1878.
A região de Urussanga foi colonizada por 19 imigrantes italianos que, após aportarem
em Pernambuco, passam pelo Rio de Janeiro, Desterro (atual ilha de Santa Catarina), Laguna,
Tubarão e Pedras Grandes, com destino a Urussanga, onde chegam em 26 de maio de 1878.
Logo depois, aportam mais 78 famílias conhecedores dos vinhedos italianos.
O processo de aprendizagem para o acerto da terra e do ramo certo de videira foi
longo. Vários ramos foram trazidos da Itália desde a colonização, mas nenhuma deu origem a
vinhos de qualidade (VELLOSO, 2008). Foi preciso ir além e buscar conhecimentos fora das
fronteiras da rede já constituída. No início do século XX, o regente consular em Florianópolis,
o advogado e jornalista Sr. Giuseppe Caruso Mac Donald, se instala em Urussanga. Em uma
de suas viagens a São Paulo, traz e distribui aos colonos a variedade Goethe para a produção
do vinho branco. O sucesso foi alcançado, conforme atestam Flores e Flores (2012, p. 74).
Durante quase quarenta anos, dos anos 30 até o desenvolvimento das carvoarias nas regiões
de Criciúma e Tubarão por volta dos anos 60, a região de Urussanga e os vinhedos da uva
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Goethe prosperaram. Com sua decadência os produtores se dispersaram, mas nunca
abandonaram os vinhedos.
A APL dos Vales nasce neste último século com uma visão compartilhada por todos
os produtores de Urussanga de resgate do reconhecimento do mercado nacional e com
possibilidade da conquista do internacional. Com a ação positiva de conquista da Indicação de
Procedência (IP) que passa a agregar valor distintivo aos seus produtos.
Assim, pelo Modelo Diamante de Porter (1983) pode-se analisar a APL dos Vales
como segue:
a) Condições de fatores: O maior problema dos Vales se situa na dimensão de
estrutura e financeira, pois a grande maioria dos produtores participantes da IP é
formada de microempresários individuais e familiares e, artesanais (coloniais). A
região é intrinsicamente relacionada a produção da uva e vinho Goethe como visto
anteriormente, somado a fatores naturais propícios como o solo e clima, entretanto
alguns dos produtores ainda, não conseguem eles mesmos, agregar valor ao
produto para formar um preço que retorne além dos custos operacionais.
O maior desafio ainda parece ser interno ao APL, pois alguns vitivinicultores ainda
não reconhecem o valor agregado pelo selo IPVUG e não conseguem estabelecer
preços com este ativo intangível. Um aprendizado que ainda preciso ser construído
no APL.
b) Condições de demanda: a IP melhorou a demanda dos produtos fazendo com que
o vinho alcançasse um aumento de 20% no faturamento de vinho e a espumante de
30%. Após a concessão do registro da IPVUG conseguiu-se passar ao consumidor
segurança da qualidade do produto, com padrão de características regionais, haja
vista que há um controle da qualidade pelo Conselho Regulador. Novos mercados
sempre estiveram fora do controle dos vitivinicultores de Urussanga. O esperado
com o reconhecimento da IP dos Vales é a consolidação de estruturas coletivas
para facilitação do acesso a novos mercados. Esta nova fase como APL somado a
força do valor distintivo do selo IPVUG deverá possibilitar o comercio dos
produtos em redes de supermercados nacionais, além das já conquistadas redes da
região. Porém, ainda não foi alcançado um dos maiores objetivos dos produtores, a
constância da demanda. A IP tem também o objetivo de impor um equilíbrio da
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demanda rompendo com a inconstância típica de produtos de baixa demanda, mas
para tal ainda precisa-se de tempo e de um maior investimento em marketing. Por
isso, a demanda tanto em volume como em periodicidade ainda é considerada
insatisfatória.
c) Setores correlatos e de apoio: Este fator é satisfatório inicialmente, podendo no
futuro, com o crescimento da demanda exigir uma nova estrutura da rede de
fornecedores. A Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC) está bem
próxima para as pesquisas, cursos e apoios na constituição de relacionamentos
positivos parra a criação e compartilhamento de conhecimentos. A ProGoethe
mantém estreito e proativo relacionamento com diversas entidades locais,
regionais e nacionais com o intuito de fomentar a aprendizagem da rede, bem
como o crescimento da demanda. O Conselho Regulador (CR) a partir das normas
implementadas pelo Manual de Controle Interno (MCI) acompanha a padronização
da produção e a qualidade final dos produtos dos Vales.
Os produtores e vinícolas da região começaram a investir no enoturismo com a
promoção de atividades correlatas como hotelaria, gastronomia, enologia e os
contadores de história da imigração italiana. Mais, neste quesito, ainda estão longe
de poderem competir com outras regiões turísticas do Estado e do Sul do país, pois
ainda falta investimentos para o desenvolvimento de um plano de desenvolvimento
integrado do enoturismo na região.
d) Estratégia, estrutura e rivalidade das empresas: A IP Vales da Uva Goethe
abraça as vinícolas que produzem o vinho e a espumante a partir da uva Goethe.
Por sua peculiaridade de terra e clima, os produtos produzidos na região é
realmente único o que facilita a sua diferenciação de concorrente. Para o APL dos
Vales é forte o valor agregado advindo da IPVUG, tanto para os próprios
produtores, como para seus parceiros e clientes. No Erro! Fonte de referência
não encontrada. são apresentadas os participantes da ProGoethe que são por
assim dizer, reconhecidas como produtoras de vinhos de qualidade:
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Quadro 1: Vinícolas da IPVUG x produtos liberados
VINÍCOLA Produtos Aprovados
CR safra 2013/14
VINÍCOLA MAZON Augusta demi sec e
seco , Goethe classico
VINHOS QUAREZEMIM Margherita demi sec e
seco
IRMÃOS FELLIPE Tulipa
VINHOS TREVISOL Casa del Sole
VITIVINICOLA URUSSANGA
Espumante Goethe
Casa Del Nonno Demi
Sec, Peccato Reserva,
Casa Del Nonno
Goethe Noble
VINICOLA DE NONNI Senhor Valdemar
Fonte: ProGoethe (2014)
Pela divulgação do reconhecimento da IP dos Vales, a curiosidade do turista já
começa a ser despertada e o “vinho Goethe” a ser reconhecido. Somado aos
consumidores locais, com a curiosidade dos turistas, houve um considerado
aumento do faturamento (20% para os vinhos e 30% para a espumante) e, os
vitivinicultores esperam um aumento da preferência pelo Goethe gerando um
aumento no consumo regular do consumo pelos moradores locais e regionais. Esta
visão compartilhada une os participantes do APL e afastam os concorrentes, pois
os produtos que carregam a certificação da indicação geográfica trazem consigo
uma carga cultural enraizada nas tradições regionais acabando por preservar a
identidade do local e, em ciclo virtuoso, geram mais valor aos produtos da uva
Goethe, diferenciando-os dos concorrentes.
e) Acaso: Destacam-se nesta análise, os planos estratégicos do próprio Governo
Federal de incentivo às iniciativas do Projeto Brasil Maior que se configuram em
um acaso que poderá se transformar em oportunidades para os Vales para sustentar
a marca internacionalmente.
Um acaso que a ProGoethe tem consigo transformar em oportunidades para o APL
é a parceria com a Universidade do Extremo Sul Catarinense, por meio do Grupo
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de Pesquisa Propriedade Intelectual, Desenvolvimento e Inovação (PIDI), do qual
as autoras fazem parte. Com dezenas de artigos científicos sobre os Vales sendo
apresentados e publicados em diferentes regiões do Brasil e do mundo (como a
Turquia, Espanha, Chile, México, Portugal, Romênia, entre outros) a IPVUG vai
tomando corpo e se divulgando pelo globo.
f) Governo: O Governo tem apoiado a formação da IG com o seu próprio
reconhecimento que promoveu um ambiente propício para o enoturismo, o
fortalecimento da Progoethe e a motivação da aprendizagem por parte dos
produtores. O Governo do Estado de Santa Catarina, com base neste incentivo da
IG, promoveu região delimitada pela Indicação de Procedência dos “Vales da uva
Goethe” a território de importância única no Estado.
Com base nesta análise, no caso dos Vales a constituição da Associação dos
Produtores da Uva e do Vinho Goethe (ProGoethe) foi por força de exigências legais para o
registro da IG no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), mas também para a
gestão necessária ao sucesso do APL. Como destaca Wegner (2011, p.19) as vantagens de
uma APL “encobrem o fato de que a cooperação demanda esforços de constituição,
coordenação e manutenção”. Pereira et al (2010) ainda complementam afirmando que, sobre
um arranjo produtivo incide custos materiais e de gestão para envolver os participantes e
motivá-los a cooperar, além da gestão de interesses e expectativas diversas que levam a
conflitos manifestos ou não manifestos que bloqueiam os resultados pretendidos pelos
participantes.
A luz de Souza (2010, p.12), pode-se concluir que o APL dos Vales foi constituído no
“universo da propriedade intelectual em sua variante Indicação Geográfica”, abrindo assim
uma possibilidade contemporânea para uma maior competitividade dos agentes e da própria
rede produtiva.
5. Considerações Finais
Atingindo o objetivo da pesquisa, de compreender os Vales da Uva Goethe como
um arranjo produtivo local com base no Método Diamante de Porter (1993), pode-se afirmar
que a IPVUG deve ser considerada um APL pela visão do Método Diamante, pois gerencia os
determinantes da competitividade colaborativamente, além de estarem sujeitos enquanto
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coletividade ao acaso e as ações do governo. Inclusive, confirma-se a classificação dos Vales
como um APL com base nas conclusões de Vieira et al (2013), quando estes afirmam que a IP
gerará um ciclo de agentes interligados e interdependentes que propiciarão benefícios à
coletividade.
Resumidamente, com a conquista da IG, os vitivinicultores dos Vales se uniram
para a conquista de resultados para todos. Os participantes da IPVUG, segundo os
entrevistados, tem alcançado um aumento de 20% no faturamento médio do vinho e 30% na
espumante, configurando-se em sucesso do APL.
Sugere-se a continuidade da pesquisa para aprofundamento do modelo diamante
com a análise aprofundada das estratégias de crescimento da marca no mercado.
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