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UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA UNIR CAMPUS DE VILHENA DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO CURSO DE PEDAGOGIA ROSÂNGELA BOHERER DA SILVA BORGES ATUAÇÃO DO PSICOPEDAGOGO NO ÂMBITO EDUCACIONAL COMO MEDIDA DE ENFRENTAMENTO DO FRACASSO ESCOLAR VILHENA - RO Julho, 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA – UNIR

CAMPUS DE VILHENA

DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO

CURSO DE PEDAGOGIA

ROSÂNGELA BOHERER DA SILVA BORGES

ATUAÇÃO DO PSICOPEDAGOGO NO ÂMBITO EDUCACIONAL COMO

MEDIDA DE ENFRENTAMENTO DO FRACASSO ESCOLAR

VILHENA - RO

Julho, 2018

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ROSÂNGELA BOHERER DA SILVA BORGES

ATUAÇÃO DO PSICOPEDAGOGO NO ÂMBITO EDUCACIONAL COMO

MEDIDA DE ENFRENTAMENTO DO FRACASSO ESCOLAR

Monografia apresentada a Universidade

Federal de Rondônia, como requisito

avaliativo para conclusão do curso de

Pedagogia.

Orientadora: Profa. Me. Kelly Jessie Queiroz

Penafiel

VILHENA - RO

Julho, 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA – UNIR

CAMPUS DE VILHENA

DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO

CURSO DE PEDAGOGIA

ATUAÇÃO DO PSICOPEDAGOGO NO ÂMBITO EDUCACIONAL COMO

MEDIDA DE ENFRENTAMENTO DO FRACASSO ESCOLAR

ROSÂNGELA BOHERER DA SILVA BORGES

Este trabalho foi julgado adequado para obtenção do título de Graduação em

Pedagogia e aprovado pelo Departamento Acadêmico de Ciências da Educação (DACIE) da

Universidade Federal de Rondônia.

__________________________________

Profa. Me. Cláudia Justus Torres Pereira

Chefe do Departamento Acadêmico de Ciências da Educação

Professores que compuseram a banca:

__________________________________

Presidente: Profa. Me. Kelly Jessie Queiroz Penafiel

Orientadora - UNIR

__________________________________

Membro: Profa. Me. Daiane Trindade da Silva

Professora Voluntária - UNIR

__________________________________

Membro: Profa. Me. Helen Arantes Martins

Professora Substituta - UNIR

Vilhena, 10 de Julho de 2018.

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Dedico este trabalho primeiramente a Deus por

ter me sustentado, dando forças e sabedoria

nesta caminhada e ao meu querido esposo

(Paulo Sérgio) e filha (Stéfhany Gabrielly) que

estiveram sempre presente em minha vida, me

apoiando e incentivando para que eu não

pudesse desistir na trajetória deste curso.

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Agradeço a minha querida orientadora profa.

Kelly Jessie Queiroz Penafiel, por ter me

aceitado como sua orientanda, para que este

trabalho fosse realizado. Imensamente grata

por tudo, pelo apoio da minha família e todos

àqueles que fizeram parte da minha vida na

decorrência deste curso. Em especial minhas

amigas Eliane Pereira, Thais Rodrigues,

Vanuza Moura e Raiene Silveira jamais me

esquecerei de vocês e aos demais colegas da

turma VIII do curso de Pedagogia.

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RESUMO

O estudo tem como tema atuação do Psicopedagogo no âmbito educacional como medida de

enfrentamento do Fracasso Escolar. Partimos dos seguintes questionamentos: Qual função que

o Psicopedagogo desempenha na escola? Para tanto, obtivemos conhecer e compreender a

atuação do profissional mencionado no contexto escolar. Guiamos-nos pelos objetivos

específicos: investigar o surgimento da Psicopedagogia como profissão e compreender sua

atuação no ambiente escolar; investigar aspectos da formação do profissional psicopedagogo e

sua função na escola; compreender a atuação do Psicopedagogo e a sua relação com a

escola/professores em uma escola da rede estadual de Vilhena, RO. A pesquisa, de abordagem

qualitativa, utilizou como método de coletas de dados a aplicação de entrevista com roteiro

semiestruturado. Foi realizada entrevista com uma Psicopedagoga que atua na escola da Rede

Estadual de Ensino de Vilhena. Os resultados apontaram que embora a profissão não seja

regulamentada e reconhecida, este profissional atua na escola mediante ao título de Pós-

Graduação Lato Sensu em Psicopedagogia. Não há, de acordo com a entrevistada, o apoio do

poder público para a realização do trabalho do psicopedagogo. A partir da pesquisa de campo

entendemos que a Psicopedagogia enquanto área de atuação tem servido para estigmatizar e

excluir a vítima na medida em que mantém e sustenta práticas medicalizantes como

diagnóstico e encaminhamento à profissionais alheios ao cotidiano escolar e as nuances

pedagógicas do processo de ensino-aprendizagem.

Palavras-Chave: Psicopedagogo. Escola. Fracasso Escolar.

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LISTAS DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABE Associação Brasileira da Educação

ABPP Associação Brasileira de Psicopedagogia

FFCL Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras

ISOP Instituto de Seleção e Orientação Profissional

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC Ministério da Educação

PEC Proposta de Emenda Constitucional

TCLE Termo Livre de Consentimento Livre e Esclarecido

USP Universidade de São Paulo

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................... 09

2 FRACASSO ESCOLAR E PSICOLOGIA: CONSIDERAÇÕES

INICIAIS............................................................................................................... 11

2.1 Fracasso Escolar Como Problemática da Educação......................................... 11

2.2 Psicologia Escolar e da Educação no Brasil....................................................... 16

2.3 Transformações na Educação quanto aos Problemas de Aprendizagens........ 23

2.4 Educação e Psicologia de Mãos Dadas Contra o Fracasso Escolar?............... 25

3 PSICOLOGIA E EDUCAÇÃO ESCOLAR...................................................... 27

3.1 Pedagogia e Psicologia: Cumplicidade Ideológica............................................. 27

3.2 A Psicopedagogia.................................................................................................. 34

4 ASPECTOS METODOLÓGICOS..................................................................... 41

4.1 Participante da Pesquisa...................................................................................... 41

4.2 Instrumento de Coleta de Dados......................................................................... 42

5 RESULTADOS E DISCUSSÕES....................................................................... 43

5.1 O Profissional Psicopedagogo............................................................................. 43

5.2 Psicopedagogia: Uma Alternativa? .................................................................... 46

5.3 Psicopedagogia e Fracasso Escolar: Uma Discussão......................................... 49

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................. 54

REFERÊNCIAS................................................................................................... 55

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1 INTRODUÇÃO

Esta pesquisa consiste num estudo de abordagem qualitativa sobre a atuação do

Psicopedagogo no âmbito educacional como medida de enfrentamento do fracasso escolar.

Para compreender esta questão, procuramos descrevendo a contextualização do processo

percorrido pela Psicologia no Brasil. Para tanto, recorremos em diversas obras literárias

como: livros, artigos e documentos legais. Tal pesquisa, foi desenvolvida mediante a

participação de uma profissional psicopedagoga atuante numa escola de Ensino Fundamental

da rede estadual de Vilhena-RO, no ano de 2018.

Ao analisar as pesquisas já elaboradas anteriormente na biblioteca da Universidade

Federal de Rondônia - campus de Vilhena sobre a temática verifiquei que o tema referido não

é tão abordado nesta perspectiva. Desta forma, além da minha formação acadêmica espera-se

que este estudo possa contribuir para os acadêmicos e todos quanto à busca por novos

conhecimentos relativos ao tema.

Considerando os fatos mencionados acima, partimos dos seguintes questionamentos:

Qual função que o Psicopedagogo desempenha na escola? Como é a relação do

Psicopedagogo e o professor em sala?

O objetivo geral deste trabalho foi conhecer e compreender a atuação do profissional

Psicopedagogo no contexto escolar de uma escola da rede estadual de Vilhena-RO. Tendo

como os objetivos específicos;

Investigar o surgimento da Psicopedagogia como profissão e compreender sua

atuação no ambiente escolar;

Levantar dados sobre da formação do profissional psicopedagogo e sua função na

escola;

Compreender a atuação do Psicopedagogo e a sua relação com a

escola/professores em uma escola da rede estadual de Vilhena, RO.

A motivação para a escolha do tema de pesquisa advém por dois motivos,

primeiramente pela participação da Linha de Pesquisa: Psicologia e aprendizagem escolar,

integrante do Grupo de Estudos Pedagógicos (GEP), da Universidade Federal de Rondônia,

campus de Vilhena, que me despertou para estudos relativos à atuação da Psicologia e sua

interface com a Educação. A segunda razão é em virtude de minha atuação como monitora do

curso de extensão “Projeto Luz do Saber” em que tive a oportunidade de atuar como

estagiária e participar de intervenção pedagógica numa escola pública de Vilhena. Na ocasião,

pude atuar intervindo com atividades elaboradas no contexto do projeto, juntamente com os

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alunos que apresentavam dificuldades de aprendizagem. Obtendo então o interesse de

entender além deste processo, mas focando em como funciona a atuação do Psicopedagogo e

sua relação no âmbito escolar.

Esta monografia está organizada em 6 seções, incluindo a introdução, organizadas da

seguinte maneira: Na segunda seção apresentaremos a trajetória da Psicologia como ciência e

sua interface com a Educação. Na terceira seção trataremos sobre alguns aspectos da

problemática do fracasso escolar bem como estes foram ocultados pela relação de

cumplicidade estabelecida entre Pedagogia e Psicologia.

Na quarta seção apresentaremos os aspectos metodológicos da realização do presente

estudo. Na quinta seção apresentamos os resultados de nossa pesquisa empírica com uma

psicopedagoga. Na sexta seção, as considerações finais, em que finalizo esta pesquisa frisando

a importância dos conhecimentos adquiridos na minha formação e as expectativas de reflexão

para no espaço escolar quanto ao ensino-aprendizagem.

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2 FRACASSO ESCOLAR E PSICOLOGIA: CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Nesta seção iremos descrever a trajetória da Psicologia como ciência e sua interface

com a Educação.

2.1 Fracasso Escolar como Problemática da Educação

A preocupação com as chamadas dificuldades de aprendizagens surgem no Brasil por

volta de 1930, mediante as pesquisas realizadas por médicos, psiquiatras, psicólogos e demais

profissionais sob a influência e a novidade da Psicanálise, “[...] destacando-se a obra do

Médico Arthur Ramos, ‘A criança problema: a hygiene mental na escola primária’[...]”

(SOUZA, 2005, p.1 [sic]). Nessa abordagem, segundo Souza (2005), as explicações sobre o

que prejudicava o aprendizado da criança se davam em razão da herança genética resultando

na insuficiência de habilidades e aptidões. A partir desse ideário viabilizou-se por meio da

higiene mental programas voltados para a prevenção e recuperação das ditas “crianças

problema”.

Em 1940, sob influência da Psicanálise, surgem diversas explicações para o fracasso

escolar das camadas populares com base em interpretações e diagnósticos superficiais que

apontavam as causas mencionadas, tendo a família como papel central na aprendizagem do

aluno. Então “o tratamento a ‘criança-problema’, passa a ser oferecido em clínicas, dentro ou

fora da escola, mas com um enfoque no tratamento da criança e sua família.” (SOUZA, 2005,

p.1). Tendo como pressuposto que o fracasso escolar decorria da relação familiar

disfuncional, de doenças inerentes ao sujeito, de problemas emocionais, da desnutrição e da

carência cultural. Visão que desconsiderava qualquer influência dos demais envolvidos no

processo de escolarização desses sujeitos.

No Brasil, a obra de Patto (1999), “A produção do fracasso escolar: histórias de

submissão e rebeldia” é considerada por muitos estudiosos e estudiosas como um marco no

modo de pensar o fracasso, bem como a forma como ele se dá na rede pública de ensino

brasileira, seus estigmas, rotulações e principalmente o universo da criança “fracassada”1. Em

sua tese a autora faz uma análise histórica da construção das diferentes concepções sobre o

fracasso e afirma que ao longo da constituição do sistema educacional brasileiro as

explicações estiveram marcadas inicialmente por um discurso biológico em que as causas do

1 Ênfase da autora.

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fracasso estavam relacionadas a fatores genéticos, raciais ou hereditários. A hereditariedade

considerada cientificamente comprovada por meio de uma “adaptação”2 das teorias de

Darwin, assimiladas por intelectuais da burguesia na formação do darwinismo social,

consistia em passar uma ideia de conformidade aos indivíduos fracassados, justificando assim

a exploração e opressão exercidas pela classe dominante.

Com essa perspectiva somente nos anos 1960-1970, na literatura sociológica através

dos sociólogos como Bourdieu, Althulsser, Passeron e Establet, que foram questionados “[...]

o caráter integrado e socializador da escola, a prática docente reprodutora das relações de

desigualdade social, os currículos, a influência da violência simbólica produzida no interior

das instituições escolares” (SOUZA, 2005, p. 1). Foi no bojo dessas discussões dos anos de

1970 que essas teorias passaram a ser questionadas e as explicações começaram a ser

buscadas na proveniência cultural dos alunos e alunas, dando origem às teorias da carência

cultural. Assim a questão do fracasso escolar passou a ser considerado o fracasso de uma

classe social e a explicação para o menor rendimento escolar alcançado pelos grupos e classes

sociais mais pobres estava no fato de não participarem da cultura dominante (PATTO, 1999).

Para os estudiosos que concentram as explicações do fracasso nos indivíduos, a

privação cultural seria causa desencadeante das dificuldades escolares, em decorrência destes

alunos e alunas não terem bem estruturadas no seio familiar as condições necessárias para

desenvolver habilidades matemáticas e linguísticas. As famílias das classes populares eram

acusadas de não valorizarem a educação, visto ser mais importante uma ocupação com

rendimentos monetários do aluno para auxiliar no sustento familiar.

Essas teorias tiveram acolhimento dos profissionais da educação brasileira sob

influência das ideias advindas dos Estados Unidos da América (EUA), como forma de

justificar as causas dos problemas levantados, “[...] levaram a crer que as crianças das classes

populares em portadores de toda sorte de déficits: cognitivos, intelectuais, culturais,

linguísticos.” (SOUZA, 2005, p. 1).

A pesquisa atual tem ressaltado que a crença na incapacidade ou nas limitações

dessa capacidade por parte do professor influi no bom desenvolvimento do processo

de aprendizagem; a existência de dificuldades pessoais ou familiares por parte do

aluno não exclui a participação do educador na busca de alternativas educacionais; a

relação ensinar-aprender é atravessada pelo funcionamento institucional escolar,

definindo, muitas vezes, a qualidade do aprendizado; a participação dos pais muitas

das vezes, a define, do ponto de vista da escola, a qualidade da relação escolar

estabelecida; a insatisfação muitas vezes vividas pelo professor na relação escolar,

fruto de políticas públicas inconsequentes, é repassada na relação pedagógica e com

seus pares. (SOUZA, 2005, p. 2-3).

2 Ênfase da autora.

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Conforme denota a autora surgem vários fatores como forma de identificar e

compreender o processo educacional quanto ao fracasso e sucesso de aprendizagem, mediante

as pesquisas nos espaços escolares internos e externos, verificando como se dá o processo de

ensino. Levando em conta não apenas o diagnóstico estabelecido como forma de amenizar o

problema, mas tendo adiante propostas que visam o bom funcionamento no que se refere

ensinar-aprender numa estrutura que acolha e supere essas dificuldades por parte dos

envolvidos na escola. O termo fracasso escolar é um assunto que não se limita somente a

fator, mas que precisa ser compreendido como um processo que envolve “[...] as dimensões

histórica, cognitiva, social, afetiva e cultural.” (DOURADO, 2005, p. 2).

Patto (1997) argumenta que a transparência no sistema escolar permite conhecer

melhor os componentes existentes quanto ao desenvolvimento do ensino como, identificar

algum problema presente no ambiente escolar “[...] decompostos na análise sistêmica: entrada

(input), processamento e saída (output).” (PATTO, 1997, p. 15). Para essa análise sistêmica a

autora descreve com enfoque na interligação entre a escola e sociedade na visão dos autores

Dias (1977) e Coombs (1976) tendo em base os questionamentos:

[...] que papel os autores que têm se valido desta abordagem acreditam que a

educação formal desempenha nas sociedades em que se inserem? Como concebem

as formações sociais específicas para as quais voltam seu instrumental analítico, ou

seja, os chamados países do Terceiro Mundo? Que tipos de trocas se dão entre o

sistema escolar e o ambiente social? (PATTO, 1997, p. 15).

Sendo assim, conforme Dias (1977), Patto (1997) explica que o espaço escolar em

sua organização tem a finalidade de desenvolver o ensino de uma forma que ocorra a

aprendizagem dos alunos, seja no desenvolvimento intelectual, físico, emocional, moral e

social. Nesse sentido, Dias (1977) menciona a representação do sistema escolar como um

espaço envolvente com equilíbrio a partir da organização e transformação de uma educação

para a sociedade, processo esse contínuo com intencionalidades. Para melhores compreensões

desse método, Dias (1977) esclarece os segmentos em seis pontos sucedendo três da entrada

(input) e três da saída (output). O primeiro refere-se “[...] da sociedade para o sistema escolar

[...]” e o segundo “[...] do sistema escolar para a sociedade [...]”. (PATTO, 1997, p. 17).

Nessa sequência os primeiros três pontos, diz respeito aos “objetivos, conteúdo

cultural e recursos financeiros.” (PATTO, 1997, p. 17, grifo nosso). Tendo em vista à

participação da sociedade no âmbito escolar como nas suas conquistas tradicionais e culturais

que são conceitos advindos da sociedade para a escola como fatores essenciais na sua

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funcionalidade como sugestão para a base curricular. Atribuídos aos impostos pagos pela

sociedade como forma de investimento a educação, cabendo ao governo na distribuição.

Em relação aos três pontos do segundo, remete a “melhoria do nível cultural da

população, aperfeiçoamento individual e formação de recursos humanos.” (PATTO,

1997, p. 17, grifo nosso). De acordo com o aumento dos alunos ingressantes no ensino

escolar, pode-se verificar na sociedade em sua vivência a transformação advinda da

aprendizagem, bem como nas competências e capacidades de realizações. O indivíduo passa a

compreender melhor o mundo que cerca, dando sentido às coisas, valores, entre outros no

convívio social. Vivendo numa sociedade onde a diversidade precisa ser respeitada. Através

dos conhecimentos adquiridos permite que o indivíduo possa se ingressar no mercado de

trabalho. Pois o setor da economia se interessa por aqueles que realmente estão preparados,

ocorrendo então a concorrência em certos empregos. Desta forma, o primeiro passo, para ser

bem sucedido na vida em suas realizações, necessita começar pela educação.

“Após descrever a estrutura didática do sistema escolar brasileiro, em suas

dimensões vertical (graus de ensino) e horizontal (modalidades de ensino), bem como sua

estrutura de sustentação [...]” (PATTO, 1997, p. 18), a autora descreve mediante Dias (1977)

que uns dos problemas enfrentados pelo sistema escolar entre os anos de 1961 a 1964, advêm

pelo motivo da inserção de todos os alunos na escola por ser lei estabelecida, porém não

garante um ensino de qualidade devido a falta de recursos financeiros, causando sérios

problemas no processo de ensino-aprendizagem dos alunos, seguidos pela desistência e

reprovação, causados pela “[...] redução no número de crianças que se matriculam na 1ª série,

quando comparado com o contingente que atinge a 4ª série, quatro anos depois.” (PATTO,

1997, p. 18).

A partir dos dados obtidos na pesquisa de Dias (1977), Patto (1997) relata que o

autor entende que esses alunos que não avançam no ensino, estão sendo excluídos por haver

dificuldades em seu processo de aprendizagem, estando em série inferior a sua idade numa

classificação de alunos com déficit de aprendizagem.

Nessa mesma linha de pensamento, Coombs (1976) especifica melhor que Dias

(1977), dando sequência da análise do sistema escolar. Para ele, não basta apenas verificar,

mas compreender num sentido de ações para que possa ser modificado em razão de um ensino

eficaz. Com isso ele traz questões que indicam esse problema decorrente ao sistema escolar.

(PATTO, 1997). Segundo a autora:

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[...] a partir de 1945, todos os países vêm sofrendo mudanças ambientais

fantasticamente rápidas, provocadas por uma série de revoluções convergentes de

amplitude mundial – na ciência e tecnologia, nos assuntos econômicos e políticos,

nas estruturas demográficas e sociais. Os sistemas de ensino também cresceram e

mudaram mais rapidamente do que em qualquer outra época. Todos eles, porém

têm-se adaptado muito vagarosamente ao ritmo mais veloz dos acontecimentos que

os rodeiam. O consequente desajustamento – que tem assumido as mais variadas

formas – entre os sistemas de ensino e o meio a que pertencem constitui a essência

da crise mundial da educação. (PATTO, 1997, p. 20).

Por consequência dessa disfunção na educação, Coombs (1976, p. 21) caracteriza

em: “[...] a) a abrupta elevação das aspirações populares pelo ensino; b) a aguda escassez de

recursos; c) a inércia inerente aos sistemas de ensino; d) a inércia da própria sociedade.” Para

o autor a inércia da sociedade dificulta em relação ao avanço no ensino e recursos humanos,

devido suas formas de vida como: crenças, valores, tradições e costumes que estão

enraizados. Visto que, a população não se enquadra num perfil da busca pelo conhecimento

como: questionamento e reflexão para melhores condições na educação nacional, bem como

seu aperfeiçoamento no mercado de trabalho (PATTO, 1997).

Quanto às questões econômicas, Coombs (1976) indica a necessidade de

investimento na educação, como um dos fatores que podem contribuir para a sua melhoria.

Mesmo sabendo da insuficiência de verba para a elevação do ensino. Dessa forma, ele sugere

que os outros países deveriam ter uma união em prol da qualidade do ensino, através de um

empréstimo perfazendo as necessidades da escola em sua manutenção. Além disso, o autor

relata que tais investimentos financeiros podem colaborar, porém não irão sanar os problemas,

pois necessitam de Políticas Públicas sérias capazes de ações com mudanças para melhores

condições no sistema escolar. Para ele essa organização também tem grande eficácia à

conexão com a sociedade nos processos internos do sistema de ensino (COOMBS, 1976).

As ideias de Dias (1977) e Coombs (1976) são semelhantes às de Patto (1997, p. 21)

quando demonstra “[...] em seu discurso a crença de que a escola é, por excelência, uma

agência de ‘socialização’ [...]”, ou seja, um espaço que proporciona uma aprendizagem

significativa, levando os alunos à compreensão dos conteúdos e assuntos para obtenção de

novos saberes, tendo “[...] uma visão mais moderna e mais racional do mundo, e de outro,

através de critérios universalistas de avaliação, prepara-o para a transição do círculo familiar

para a esfera do trabalho”. (PATTO, 1997, p. 21).

No entanto, Coombs (1976), relata quanto aos dados levantados em relação ao

sistema escolar, não é apenas consequência de uma causa estabelecida pela escola, ainda mais

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pelo fato da administração política, não investir na educação popular. Resultando a não

permanência das crianças consideradas “o problema”3.

2.2 Psicologia Escolar e da Educação no Brasil

Antunes (2003) atesta que as relações entre Psicologia e Educação no Brasil terão

início ainda no período colonial. Entretanto, a autora alerta, que nesse período, não se pode

falar de teorias psicológicas propriamente ditas, mas apenas de “ideias psicológicas”4 sobre o

desenvolvimento humano.

A temática abordada neste período segundo Antunes (2003) sucedia pelos

argumentos dos autores “Alexandre de Gusmão, Mathias Aires, Francisco de Mello Franco e

Americus”, sendo eles representante da abordagem mais adiante chamada de interacionista

em psicologia do desenvolvimento que insere o indivíduo na sociedade para o

desenvolvimento, tendo à educação como um pressuposto para a modificação, por

acreditarem que a personalidade da criança poderia ser alterada. Processo esse considerado

pelos autores no sentido de tentar modificar seus comportamentos inatos.

Desta forma Antunes (2003) descreve que as discussões nesta época sobre as

abordagens quanto ao desenvolvimento de aprendizagem da criança foi em relação aos

prêmios e castigos, como umas das formas para conseguir dominar o comportamento da

criança. “[...] Havendo obras que a defendiam, outras que instavam à necessidade de

moderação de seu uso e outras ainda que a criticavam.” (ANTUNES, 2003, p. 141). Nesta

perspectiva, explica a autora que, “Manoel de Andrade Figueiredo” acreditava que a punição

não era o ideal para conseguir controlar a criança em sua personalidade, pois poderia ser

prejudicial ao seu desenvolvimento. Já “Americus” considerava a importância da precaução

de medidas a serem tomadas mediante ao monitoramento de controle na ausência dos alunos.

O processo de aprendizagem partia da construção de conhecimentos práticos. Sendo

assim, Manuel Figueiredo de Andrade se preocupava na forma de aprendizagem das crianças.

Pois segundo ele a interiorização dos conhecimentos depende do sujeito e de sua capacidade

para aprender. Ele alegava que era preciso ter cautela principalmente com aqueles alunos

ditos com dificuldades escolares ou designados ao retardo mental. Em que a intervenção

deveria ser de acordo com a faixa etária e capacidade da criança em aprender, num processo

envolvente de estímulos pela educação (ANTUNES, 2003).

3 Ênfase da autora.

4 Idem.

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Segundo Antunes (2003) vários questionamentos de autores foram levantados nessa

época sobre a evolução da criança em seus aspectos relacionados ao desenvolvimento. Para

Mello Franco o desenvolvimento sensorial se relacionava aos cuidados e a finalidade dos

órgãos do sentido. O desenvolvimento intelectual discutido nas obras de “Frei Mateus da

Encarnação Pinna, Azeredo Coutinho e Mello Franco”, referia à capacidade de raciocínio da

criança ao nascer. Sendo assim, para “Encarnação Pinna” as capacidades tem origem inata. Já

para Coutinho, nascemos como tábula rasa e todo conhecimento provém da experiência.

Mello Franco, em oposição aos pensamentos anteriores, considerava que o conhecimento

advém da interação social.

Antunes (2003) salienta que a utilização do jogo foi um assunto muito relevante e

debatido em prol do avanço da Psicologia no período colonial. Alexandre de Gusmão e Mello

Franco caracterizou o jogo como uma forma lúdica que poderia contribuir para a criança em

seu desenvolvimento físico interligado a educação moral “[...] juntos, dariam a base para a

formação de um ‘povo virtuoso’, temática essa que se fez presente no século XX, na

discussão sobre os fins da educação física.” (ANTUNES, 2003, p. 143).

De acordo com Antunes (2003) a ideia do jogo sustentada pelos estudos de

“Massimi” trouxe contribuições para prática educativa, evitando qualquer tipo de jogo que

não tenha finalidade concernente. A autora prossegue e afirma que para “Coutinho” o jogo

apresenta uma forma que cria possibilidade de manifestação da personalidade das crianças em

meio aos seus comportamentos. Esse assunto remete também as pesquisas do autor Fernão

Cardim “[...] sobre o ato de brincar em crianças indígenas.” (ANTUNES, 2003, p. 143).

Com a vinda da família Real ao Brasil Antunes (2003, p. 148) salienta que “[...] fez-

se necessário o rápido incremento de instituições que pudessem, pelos menos, reproduzir um

pouco das condições da metrópole”. Esse fato impulsionou a criação de universidades,

colégios e Escolas Normais em território brasileiro. Por este motivo surgiu à criação de

universidades, colegiais e regulares. Será nos currículos das Escolas Normais que os saberes

psicológicos encontrarão solo fértil. Entretanto, vale destacar que nesse período a Psicologia

ainda não havia se consolidado como ciência autônoma. As questões da “alma” 5, digamos

assim, eram assuntos da filosofia e da religião. Será no século XIX em diante que isso começa

a mudar.

Mais adiante no final do século XIX e início do XX, com o surgimento da Psicologia

Científica, os saberes da Psicologia serão agora tema de interesse nos cursos de medicina na

5 Ênfase da autora.

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Bahia e Rio de Janeiro. Segundo Antunes (2003), nessas faculdades aparecerão às primeiras

teses que tiveram como objeto de estudo a Psicologia. A maioria das teses elaboradas pelos

médicos era composta por investigações quanto à saúde e educação em relação aos fatores

psicológicos estabelecidos, sendo inseridas nas escolas as ideias advindas dessas teses.

Além dessas teses, Antunes (2003, p. 146) apresenta um crescente número de

investigações que tinham como temática a higiene mental do escolar, “[...] refletiam o

pensamento médico da época, considerado como expressão do conhecimento científico, capaz

de explicar as condutas e para elas prescrever regras.” A escola, sua estrutura e organização

passam a ser alvo de investigação do saber médicos. Era preciso investigar para poder

controlar os comportamentos físico, intelectual e moral das crianças, mediante as ações de

prevenção como algo que poderia ser controlado por tratamentos, evitando futuros problemas

que poderiam prejudicar o desenvolvimento social, político e econômico da sociedade

(ANTUNES, 2003).

De acordo com Antunes (2003) no Brasil por volta dos anos 30 do século XX em

Niterói/RJ são instaladas as Escolas Normais, de nível secundário, fixando então, o olhar para

a teoria e debates sobre a forma de aprendizagem dos alunos em relação ao procedimento de

ensino, havendo poucas interações com a prática. Tendo como objetivo principal a formação

do docente para conhecimentos relacionado ao psiquismo humano. Mais tarde, vemos surgir

nessas escolas, disciplinas dedicadas à Psicologia da Educação. As mudanças começaram

quando “Benjamin Constant” alterou a disciplina de Filosofia para Psicologia e Lógica pelo

fato da disciplina abordar questões psicológicas. E logo adiante, em decorrência deste

processo, novamente a disciplina foi modificada sendo chamada então de Psicologia e

Pedagogia (ANTUNES, 2003).

Em 1982 a disciplina Psicologia e Pedagogia foram implantadas como currículo nas

Escolas Normais amparada por “[...] um projeto-de-lei, de autoria de Paulo Egídio, ao

Congresso Legislativo da Província de São Paulo [...]” (ANTUNES, 2003, p. 147). Essa

dualidade de ensino foi unificada devido a Pedagogia tratar de temas psicológicos desde os

tempos da colônia. Desta forma a Psicologia se fez presente aos processos pedagógicos de

ensino-aprendizagem com o intuito de ir além dos conhecimentos que se possa ter em relação

ao que pode ser averiguado na criança, mas se preocupando com a aplicação de métodos

educacionais (ANTUNES, 2003).

As transformações que tiveram lugar no século XIX foram essenciais para a

compreensão deste processo, pois desde o século XVIII já havia grandes preocupações com

os fatores apresentados em relação à Psicologia e Pedagogia. Antunes (2003) explica que o

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acesso à educação não se estendia para todos os cidadãos. Mas com o crescimento do

processo da urbanização passa à exigência de pessoas alfabetizadas. “A preocupação com o

ensino elementar remonta esses tempos, quando foram buscadas algumas soluções, dentre as

quais a aplicação do método lancasteriano.” (ANTUNES, 2003, p. 148). Com a falta de

acesso do povo à educação a aplicação desse método não foi suficiente. Por este motivo

surgiram novas concepções psicológicas, haja vista que para isso era preciso instigar os

saberes quanto ao desenvolvimento da criança e o processo pedagógico. Tais concepções no

final do século XIX permitem;

[...] compreender também os rumos que a Psicologia tomava na Europa e nos

Estados Unidos influenciando o ideário brasileiro. O desenvolvimento das

elaborações oriundas principalmente da Filosofia e da Fisiologia consolidou as bases

para a conquista da condição de ciência autônoma pela Psicologia, sintetizando o

aprofundando o conhecimento até então acumulado, ao que se somava as demandas

do incremento do modo-de-produção capitalista, que requeriam novas formas de

conhecimento para subsidiar, legitimar e justificar muitos de seus pressupostos e

práticas. (ANTUNES, 2003, p. 148-149).

Em decorrência disto, acreditava-se que além das compreensões da Psicologia e sua

intervenção no desenvolvimento do aluno, ela poderia colaborar para a formação de um novo

homem. Um que fosse mais eficiente e produtivo para alavancar o país. Os conhecimentos da

então nascente Psicologia Científica, oriundo da Europa e Estados Unidos, passam a fazer

parte da “solução” 6 dos problemas do Brasil. Os intelectuais brasileiros da época pregavam

que para enfrentar os problemas nos centros urbanos era preciso repensar a educação. Com

isso problemas futuros poderiam ser amenizados ou solucionados pela ação dos educadores

mediante os saberes psicológicos como instrumentos que poderiam prevenir e/ou resolver os

problemas educacionais e sociais ao apontar as causas dos comportamentos considerados

inadequados (ANTUNES, 2003).

No século XX, em meios às transformações no Brasil, “[...] grupos de intelectuais

questionavam a hegemonia do modelo agrário-comercial-exportador, apontando para a

necessidade de modernização no país pelo ingresso do mundo industrializado.” (ANTUNES,

2003, p. 151). Era preciso capacitar as pessoas de acordo com a necessidade do trabalho,

tendo a educação como um meio para realização deste projeto. Antunes (2003) relata que as

transformações que ocorreram neste período com a inserção de novos saberes científicos,

dentre outros fatores, contribuiu para a modernização do Brasil. Momento este em que a

6 Ênfase da autora

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Psicologia teve repercussão, ganhando espaço como área específica no âmbito educacional,

sendo a conquista de sua autonomia um dos objetivos a ser concretizado.

Desta forma, Antunes (2003) relata que educadores, sociólogos e outros profissionais

da educação aderiram a novas formas de ensino, visando à necessidade de reforma no âmbito

educacional e em sua prática pedagógica. Através do instituto Associação Brasileira da

Educação (ABE) “[...] foram empreendidas as Reformas Estaduais de Ensino da década de 20,

baseadas em projetos eminentemente pedagógicos e nos pressupostos escolanovistas; além de

outras iniciativas, como o ensino nas Escolas Normais, a publicação de obras, etc.”

(ANTUNES, 2003, p. 151).

De acordo com Antunes em 1890, “Rui Barbosa” fundou um espaço chamado

Pedagogium onde se desenvolveriam novas estratégias de ensino-aprendizagem. Neste

estabelecimento “[...] foi criado o primeiro laboratório de Psicologia no Brasil, planejado em

Paris por Binet, com a elaboração de Manoel Bomfim, que o dirigiu por cerca de quinze

anos.” (ANTUNES, 2003, p. 151). Nos estudos realizados por Bomfim, ele argumenta a

ineficácia de ir além do que poderia ser trabalhado no laboratório. Ele defendia a ideia da

interação do meio em relação à linguagem para determinar os fenômenos psicológicos.

Em virtude das Reformas de Ensino em 1920, Antunes (2003) descreve que as

Escolas Normais passaram a ter importantes contribuições quanto ao preparo do docente em

sua atuação profissional. A Psicologia se constituiu como base para a ação pedagógica com

vários fatores como: estudos sobre a evolução da criança em seu processo de aprendizagem e

sua relação com o docente, bem como os testes pedagógicos para obtenção de novas

estratégias de ensino. Nesse contexto, a Psicologia teve o amparo das Escolas Normais,

principalmente mais tarde nos anos 1930, “[...] pois, foram elas os alicerces para as futuras

seções de Pedagogia das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras – FFCL, nas quais a

Psicologia foi introduzida como matéria do ensino superior, concomitantemente ao que

ocorria nas seções de Filosofia.” (ANTUNES, 2003, p. 153). As temáticas estudadas tinham

como base obras estrangeiras como as de Piéron, Walther, Simon e Claparède, dentre outros.

Com a Reforma Educacional, em 1929, no estado de Minas Gerais foi fundada a

Escola de Aperfeiçoamento dos Professores de Belo Horizonte ligada as Escolas Normais,

tendo como a diretora Helena Antipoff. O objetivo deste estabelecimento consistia com os

estudos para produção de conhecimentos relativos à Psicologia mediante aos ensinos e

experimentos pedagógicos. Essas ações tiveram como resultado grande contribuição para a

educação ao formar profissionais especialistas em Psicologia da Educação (ANTUNES,

2003).

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Segundo Antunes (2003), considera-se que a primeira escola fundada para alunos

com problemas cognitivos, foi estabelecia pelo médico Ulisses Pernambucano em 1925 como

Instituto de Psicologia de Pernambuco. A referida escola tinha a preocupação com a

aprendizagem dessas crianças, levando em conta a situação em que as mesmas se

encontravam. Em 1929 a escola passou a ser nomeada Instituto de Seleção e Orientação

Profissional (ISOP). As pesquisas desenvolvidas neste estabelecimento estavam relacionadas

ao “[...] estudos sobre testes de nível mental, aptidão e outros, incluindo a padronização para a

realidade brasileira; pesquisa sobre o vocabulário das crianças das escolas primárias e

elaboração de testes pedagógicos.” (ANTUNES, 2003, p. 154).

Ainda conforme a autora, a Psicologia teve grande impulso na Escola Normal de

Salvador através de “Isaías Alves” “[...] um dos pioneiros na difusão, aplicação, revisão e

adaptação de testes psicológicos no Brasil” (ANTUNES, 2003, p. 155). A medida defendida

por Isaías Alves repercutiu graças à adoção de testes psicológicos no sistema escolar. A

Reforma do Ensino do Ceará subsidiou a concretização da Escola Normal de Fortaleza sob a

direção de Lourenço Filho. O espaço foi desenvolvido de acordo com as proposta da Reforma

Educacional de 1929. Para efetivar essa proposta foi preciso abrir um laboratório de

Psicologia para capacitar os docentes e viabilizou condições para prosseguir nos estudos sobre

a leitura e a escrita por “Lourenço Filho” desde sua vinda da Escola Normal de Piracicaba

(ANTUNES, 2003).

O destaque entre as instituições de ensino desta época foi a Escola Normal de São

Paulo, onde a Psicologia pôde ser desenvolvida com a eficácia de vários processos como a

construção de laboratórios e sua desenvoltura, cursos de formação com ensino advindo de

Psicólogos do exterior e “[...] por ter sido a base para a cátedra de Psicologia Educacional da

seção de Pedagogia da FFCL da Universidade de São Paulo – USP.” (ANTUNES, 2003, p.

155).

Desta forma, considera-se que as Escolas Normais foram os pilares para a base da

divulgação da Psicologia e da Psicologia da Educação no Brasil em decorrências das

diferentes abordagens desenvolvidas. Em outras palavras, o processo educativo possibilitou o

progresso dos primeiros psicólogos no Brasil tendo grandes contribuições para o processo de

autonomização. Após a luta pelo reconhecimento da Psicologia como ciência autônoma, é

possível constatar que o período entre 1930 a 1962 foi marcado “[...] como aquele em que ela

se consolida como ciência e campo de atuação no Brasil, gerando condições para sua

legalização como profissão e para o estabelecimento de cursos regulares para a formação de

seus profissionais.” (ANTUNES, 2003, p. 157).

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A Psicologia, no decorrer dos anos, foi e continuou sendo grande sustentáculo para a

Educação gerando grandes resultados em relação à produção de vários estudos e

procedimentos de intervenções no âmbito educacional. A propagação da Psicologia

Educacional nesta época se estabeleceu em virtude das pesquisas mediante as publicações de

obras em diversas revistas e periódicos da área.

Antunes (2003) relembra que a partir dos anos 1930, a Psicologia foi inserida na

disciplina de Pedagogia e Filosofia da FFCL, sendo o início e suporte para seu progresso,

passando a ter espaço no nível superior. Nessa época, a cadeira de Psicologia foi ocupada por

Lourenço Filho até 1934 quando deixa o cargo. Anos mais tarde, a USP criou, “[...] na seção

de Pedagogia, a cátedra de Psicologia Educacional, incorporando o Laboratório de Psicologia

da Escola Normal de São Paulo e nomeando Noemi Silveira sua primeira catedrática.”

(ANTUNES, 2003, p. 158-159).

Ainda segundo a autora, por volta de 1940 foi inserido na FFCL Sedes Sapientiae um

projeto de preparação para a formação de psicólogos, tendo como base o curso de Pedagogia.

Neste mesmo local, mais adiante em 1953, sob a direção de Madre Cristina Sodré Dória, foi

fundada uma Clínica Psicológica designada ao acolhimento de crianças com problemas

escolares.

Podemos observar que a Psicologia se estabelece no Brasil por meio do campo da

Educação e continuou seu processo de produção mediante as orientações e técnicas

relacionada à Psicometria. Os diferentes momentos da história da Psicologia serão marcados

pela fecunda relação que se estabeleceu entre ela e a Pedagogia “[...] tendo interfaces

explícitas com atuações no âmbito do trabalho e da clínica.” (ANTUNES, 2003, p. 161).

Tendo a Educação um campo que dava o suporte quanto ao firmamento de

conhecimentos e práticas relativas à Psicologia, inclusive para a formação do professor.

Antunes (2003) ressalta que um dos primeiros trabalhos realizados em Psicologia Clínica

iniciou no âmbito educacional, se tratando das crianças com problemas escolares. Havendo

essa forte relação da Psicologia com a Educação demonstra o quanto a Educação colaborou

para o desenvolvimento da Psicologia em suas intervenções no Brasil.

Segundo Antunes (2003) a Psicologia e a Educação são tão próximas que para

compreender o processo histórico é preciso saber o vínculo constitutivo do desenvolvimento

de cada uma. A autora salienta que é possível ver marcas dessa íntima relação de

cumplicidade ideológica quando observamos que “[...] a maioria dos profissionais que

obtiveram o registro como psicólogos tinham formação em Pedagogia e atuaram no campo da

Educação [...]” (ANTUNES, 2003, p. 162).

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Vale ressaltar que as ações da Psicologia para serem desenvolvidas foram possíveis

com a ajuda e conformidades do Estado no fornecimento de recursos. Nota-se que o progresso

da Psicologia nesse período atendia aos interesses do Estado e da classe dominante, “[...]

embora as contradições se fizessem presentes, inclusive em ações eminentemente

educacionais, muitas das quais comprometidas com a construção de uma sociedade mais

democrática, igualitária e solidária.” (ANTUNES, 2003, p. 163).

Ainda no século XX, acontece o reconhecimento legal da profissão do psicólogo

mediante a Lei nº 4.119, 27 de agosto de 1962. Essa profissão foi regulamentada e

condicionada incluindo o currículo mínimo para permissão da formação que este profissional

exercerá.

2.4 Transformações na Educação quanto aos Problemas de Aprendizagens

Antunes descreve que o Golpe Militar de 1º de abril de 1964, provocou severas

mudanças na Educação e consequentemente, na nascente Psicologia. De acordo com Antunes

(2003, p. 164) o vínculo da Psicologia e Educação neste período foi,

[...] ao mesmo tempo polêmica e rica de possibilidades pelas críticas que começaram

a emergir. De um lado, o conhecimento psicológico estava incorporado aos

diferentes aspectos da Pedagogia e à prática profissional dos educadores, muitas

vezes aligeirado e desprovido de suficiente fundamentação teórica. Por outro lado, a

atuação específica do psicólogo na escola estava muito calcada numa perspectiva

clinica, ocupando-se do atendimento individual de “crianças com problemas de

aprendizagem” fora da sala de aula.

Em 1970 o Psicólogo da Educação atendia isoladamente aquelas crianças tidas como

problemáticas pela escola. Nesse contexto, as “crianças problemas”7 eram aquelas que não

aprendiam na escola. As explicações para este não aprender encontravam suas respostas nas

deficiências e dificuldades individuais, sendo eliminada qualquer hipótese que considerasse

aspectos pedagógicos, sociais e políticos (ANTUNES, 2003). Os sujeitos atendidos nesse

contexto eram aqueles que apresentavam algum problema relacionado ao

[...] desenvolvimento mental, atenção, comprometimentos motores ou emocionais

(vistos como produto das relações familiares; aliás, as famílias das classes populares

era – e ainda são – sistematicamente consideradas como causadoras dos problemas

apresentados pelas crianças, sob a alegação de que eram “desestruturadas” ou

constituídas por pais analfabetos). (ANTUNES, 2003, p. 164-165, grifo do autor).

7 Ênfase da autora.

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Submetidos a testes psicológicos padronizados, esses sujeitos tinham seu destino

marcado por diagnósticos que “comprovavam”8 as hipóteses anteriormente formuladas.

Diagnósticos esses que apontavam os problemas como tendo origem na criança, sua família e

seu contexto socioeconômicos. Não ocasionava em algo que poderia resultar num avanço,

servindo apenas para reforçar aquilo que foi predito pela escola. A psicologização das

dificuldades de aprendizagem desviava o olhar das questões pedagógicas que precisavam ser

repensadas.

Mais adiante na virada do século, visto que os problemas não foram sanados e que

ainda permaneciam, profissionais da Educação e da Psicologia continuam investigando essa

temática. A temática do fracasso escolar ainda assombra as escolas brasileiras e desafia

professores, psicólogos, pesquisadores e demais profissionais da educação.

Ao analisarmos as explicações sobre fracasso escolar, nos deparamos com

diferentes concepções de mundo, de ser humano e de ciência. Nos dias atuais observamos

um forte renascimento das explicações médicas e psíquicas na chamada “era dos

transtornos”9 onde se procura resolver problemas de aprendizagem e comportamentos

considerados inadequados na sala de aula com medicamentos e tratamentos médico-

psiquiátrico.

Os diagnósticos tornaram-se cada vez mais “precisos”10

e condenam milhares de

crianças e adolescentes ao consumo de potentes psicofarmacos que prometem resolver todos

os problemas de aprendizagem, comportamento e desajustes. A aprendizagem das crianças

acaba ficando comprometida, pois com laudos médicos a escola tende a cruzar os braços

diante do desenvolvimento desses alunos marcados como incapazes. Nesse contexto, a

Psicologia tem atuado como cúmplice na acusação da vítima. Promovendo a patologização e

a medicalização da aprendizagem. Antunes (2003, p. 166) descreve que nesse período:

É possível afirmar que se caminhou para uma dupla negação, isto é, a negação da

maneira como a Psicologia foi hipertrofiada na Educação e da modalidade de

atuação consubstanciada em modelos medicalizados, reconhecendo, porém, que o

processo educativo ocorre no âmbito do sujeito, de maneira tal que o aspecto

psicológico não pode ser negado, mas incorporado à apreensão do fenômeno em sua

totalidade, condição fundamental para a produção de conhecimento nesse campo e

base para o estabelecimento de processos efetivos de intervenção.

8 Idem.

9 Ênfase da autora

10 Idem.

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Por conseguinte, a Psicologia Escolar Crítica têm buscado romper com esse modelo

medicalizante por meio de processo de participação como troca de ideias dos demais no

espaço escolar. Com esse envolvimento de trabalho coletivo, é possível unificar forças para

vencer os problemas enfrentados na escola, criando “[...] possibilidades de construção de uma

educação mais democrática e efetiva, sobretudo para as camadas populares, considerando a

inevitável articulação com a realidade social como um todo e fundamentalmente com o

estabelecimento de um compromisso radical com ela.” (ANTUNES, 2003, p. 166).

Em virtude dos momentos mencionados por Antunes (2003, p. 167) quanto a

Psicologia no Brasil é possível verificar a desenvoltura ao “[...] que pode ser ilustrado pelo

aumento quantitativo e qualitativo de sua produção, abrangendo a pesquisa, as publicações, os

congressos e, sobretudo, as modalidades de intervenção [...]” sendo um processo de

construção especificamente da Psicologia na Educação.

2.4 Educação e Psicologia de Mãos Dadas Contra o Fracasso Escolar?

Embora alguns estudos começassem a destacar aspectos da estrutura e do

funcionamento das escolas e a consequente repercussão destes nas práticas docentes

influenciando o rendimento escolar dos alunos e alunas, continuavam centrados num aspecto

da carência cultural, ou seja, a escola era vista como inadequada às características psíquicas e

culturais da criança das classes populares (SOUZA, B., 2007).

Angelucci et al (2004) ao analisarem o estado da arte das pesquisas sobre o fracasso

escolar no período de 1991 a 2002, tomando por base os trabalhos produzidos na

Universidade de São Paulo (Instituto de Psicologia e Faculdade de Educação) concluem que o

fracasso escolar ainda é explicado como problema psíquico, por vários trabalhos produzidos

no período. Nessa perspectiva culpabilizam-se as crianças e famílias. Para as autoras, outro

conjunto de trabalhos considera o fracasso escolar um problema técnico em que a culpa pela

não aprendizagem das crianças recai sobre o professor/professora. Há ainda trabalhos que

analisam o fracasso como questão institucional em que a lógica excludente da educação

escolar é a responsável. E, finalmente, um último conjunto de trabalhos aborda o problema

como questão política em que a cultura escolar, a cultura popular e as relações de poder são

analisadas como fatores intervenientes no processo.

Pesquisas realizadas por Collares e Moysés (1996, 1997, 2010) e Moysés (2001)

relataram que o fracasso escolar ainda tem sido discutido com foco na culpabilização do aluno

ou a família, ocasionado pela desnutrição e disfunções neurológicas. Menções citadas por

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estes profissionais remetem aos diagnósticos com prejulgamentos quanto à criança. A partir

desses dados as autoras criticam o método de avaliação na clínica em que realiza teste de

inteligência mediante a capacidade do indivíduo, sendo que isso somente é possível a partir

das expressões que elas transmitem e não ao cognitivo, sendo considerado apenas dessa

forma. Esse processo de avaliação corresponde ao método utilizado pelos médicos, o qual

classifica o indivíduo através das suas expressões ao que aparenta sentir diagnosticando a

partir dos sintomas. Não levando em consideração no teste de inteligência às particularidades

do indivíduo e seus motivos (COLLARES; MOYSÉS, 2010).

Primeiramente é preciso diagnosticar o saber prévio que as crianças já possuem, pois

“uma atividade é ensinada, estimulada, quando é valorizada no grupo social, quando integra

ao conjunto de valores sociais, históricos, culturais, políticos de um determinado

grupo.”(COLLARES; MOYSÉS, 1997, p. 5). Dessa forma o teste de inteligência na criança

não pode se assemelhar com uma criança de outro espaço social ou histórico, devido à

diferença do desenvolvimento em sua realidade quanto às oportunidades de aprendizagem.

Mas considerar hipóteses do não aprendizado que nem sempre se define pela expressão do

potencial ao que ela venha ser, mas suas condições vivenciadas. (COLLARES; MOYSÉS,

1996).

Averiguar o desenvolvimento da criança não comparando com outra, mas ter

possibilidades de ações que precisa ser entendido ao que acontece com planejamento que

possa intervir para que a criança se desenvolva e supere, pois somente o diagnóstico sem uma

tomada de decisão poderá apenas criar rótulos de transtornos. (COLLARES; MOYSÉS, 1997;

MOYSÉS, 2001).

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3 PSICOLOGIA E EDUCAÇÃO ESCOLAR

Trataremos a seguir sobre alguns aspectos da problemática do fracasso escolar bem

como estes foram ocultados pela relação de cumplicidade estabelecida entre Pedagogia e

Psicologia. Tomaremos por fundamentação teórica os trabalhos de Collares e Moysés (1992),

Moysés (2001) e Bock (2003).

3.1 Pedagogia e Psicologia: Cumplicidade Ideológica

De acordo com Bock (2003) a Psicologia tem desde seu nascimento como ciência

autônoma no Brasil, fortes relações com a Educação escolar. Segundo a autora, as duas áreas

de conhecimento tem mantido uma colaboração tão estreita que originou a Psicologia da

Educação. Entretanto, essa relação nem sempre existiu. Ela nasceu num momento histórico

específico afim de atender necessidades específicas. Mas antes disso a autora relata que na

educação Ocidental, na chamada “Educação Tradicional”, o ensino era procedido sem a

necessidade de intervenção psicológica. A necessidade da intervenção da Psicologia no ensino

tem início quando o Movimento da Escola Nova, em suas propostas para ensino, institui

demandas específicas para a Psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem (BOCK,

2003).

Para compreender melhor o Ensino Tradicional antes da intervenção da Psicologia

Bock (2003) explica que com a regência do Ensino Tradicional a escola era caracterizada pela

sua rigidez para com o aluno. Em razão disso os vigilantes eram encarregados quanto ao

ensino para estarem sempre atentos aos comportamentos dos alunos, procurando evitar que

desobedecessem. Visto que o aluno tinha que aprender independente de suas vontades, mas

como algo essencial para sua vida. Sendo assim, por acreditarem num ensino regido pelos

conhecimentos inatos, a Psicologia não tinha nenhuma serventia nesse aspecto (BOCK,

2003).

Bock (2003) aborda que no século XX, foi um momento de imensas transformações

mundiais devido às Grandes Guerras. A criança passou a ser vista com novos olhares. Com

isso, o ensino tornou-se menos severo, levando em conta o desenvolvimento psicológico que a

criança tinha em relação à aprendizagem. De naturalmente propensa aos vícios, à criança

passa a ser concebida como naturalmente boa. O Movimento Escolanovista propõe ideias

radicalmente diferentes daquelas sustentadas pelas escolas tradicionais. O papel da educação

escolar agora é de garantir essa bondade espontânea da criança.

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Segundo Bock (2003) a escola em sua funcionalidade tinha agora a responsabilidade

e o dever de conservar o lado bom da criança em suas características. Desta forma, a criança

em sua total liberdade poderia se expressar, tornando assim a escola “[...] lugar onde a criança

poderia manifestar sua afetividade, expressa como carinho ou agressividade; sua criatividade,

expressa como construção ou destruição; sua liberdade, expressa como obediência ou

rebeldia. Todas as manifestações infantis foram tomadas, em seu natural, como boas e

desejáveis.” (BOCK, 2003, p. 81). A partir dessas manifestações “sem regras” também tinham

possibilidades de aprendizagens mediante trocas de saberes entre todos os alunos. O ensino

tinha o propósito de atender os interesses dos alunos. O papel do professor era planejar

diversos tipos de estratégias para instruir o aluno em seu interesse pela aprendizagem (BOCK,

2003).

A partir deste seguimento Bock (2003) descreve que a escola vinha desenvolvendo,

com enfoque principal para com a criança, não sendo como no ensino tradicional em meio às

perguntas e respostas absolutas. Mas dando significância para que o aluno possa se

desenvolver a partir de perguntas e experiências, podendo se expressar trazendo ideias e a

liberdade de questionar, tornando o ensino atrativo em suas curiosidades. Segundo a autora,

para que esses ideais fossem possíveis, a Pedagogia da Escola Nova precisava da Psicologia

para poder conhecer a criança e seu desenvolvimento natural.

A autora faz menção da Pedagogia escolanovista em relação à necessidade da

Psicologia no contexto escolar em que não se fazia presente no ensino anterior. Sendo de

extrema importância, pois se tratava de um olhar específico e entendido de como a criança se

desenvolve. É a partir deste momento em que a Pedagogia se une com a Psicologia, por

acreditar que essa área iria contribuir para suprir as necessidades previstas pela Pedagogia

escolanovista. Desta forma, Bock (2003, p. 81) descreve que “[...] As principais teorias do

desenvolvimento são deste período. Muita coisa será produzida sobre o desenvolvimento das

crianças: de seu pensamento e inteligência, de seus afetos e de sua sociabilidade, oferecendo à

educação um saber imprescindível ao seu trabalho”. São desse período também, fruto dessa

relação que se estabelece as visões naturalizantes sobre as crianças, a escola, a aprendizagem,

a pobreza, etc. que até hoje permeiam o fazer pedagógico.

No contexto escolar a Psicologia ampliou tanto em conhecimentos como em prática,

mediante as aplicações de testes e avaliações. Teorias que terão nos determinismos raciais e

na “carência cultural” suas explicações para as desigualdades e o fracasso escolar terão

nascido desse casamento entre Pedagogia e Psicologia. Tendo a Psicometria, com o

desenvolvimento e aplicação de testes afim de formar classes mais homogêneas, a Psicologia

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Clínica que começa a atender crianças com problema de aprendizagem e a Psicologia

Educacional em seus conhecimentos na promoção de melhores resultados de aprendizagem do

aluno (BOCK, 2003).

De acordo com Bock (2003), é preciso sondar o vínculo que a Psicologia e a

Educação tiveram diante das exposições de ideais e concepções construídas, em relação ao

desvendamento deste processo. Desta forma, segundo Bock (2003, p. 83) “A Psicologia

fortaleceu noções naturalizantes da Pedagogia e contribuiu para ocultar a educação como

processo social. A educação ficou concebida como processo cultural de desenvolvimento das

potencialidades dos indivíduos”. Conforme aponta a autora, percebemos que essa relação

entre Psicologia e Pedagogia tem servido de fundamento científico que oculta e/ou nega os

aspectos sociais que permeiam a educação.

A educação escolar se firma como instituição que por intermédio de sua estrutura

normativa tem estado a serviço do capital para formar o trabalhador necessário à manutenção

do poder e status da classe dominante. E para isso é necessário à participação da sociedade na

escola para que o ensino possa ser organizado de acordo com a cultura local em sua

convivência quanto à relação dos conteúdos pedagógicos que são estabelecidos (BOCK,

2003).

Bock (2003) relata que para compreender melhor este processo, evidentemente é

preciso levar em conta os desenvolvimentos e transformações da sociedade durante as

pedagogias do ensino tradicional e nova. O pensamento predominante no modelo de escola

tradicional, com base num paradigma inatista/maturacionista, considerava a pobreza como

fenômeno natural de uma sociedade. Calcada no modelo do darwinismo social, conforme nos

descreve Patto (1999), as ações pedagógicas e intervenção da Psicologia nesse contexto

consideravam a pobreza e as dificuldades de aprendizagem como tem uma razão hereditária.

O indivíduo já nascia predestinado à nobreza ou a servidão, não havendo evolução alguma.

Apenas continuando aquilo que já estava imposto para a sociedade de maneira rígida, através

de regras para todo o seguimento de suas vidas. Cabendo a escola em seu processo

educacional apenas reproduzir de acordo com o que a sociedade estava vivendo, mediante ao

modelo das classes dominadoras.

As propostas inovadoras da Escola Nova, que aparentemente rompiam com essas

práticas excludentes, não estiveram senão a serviço do capital. As demandas de um país que

se quer industrializar exigem uma nova concepção de homem, de sociedade, de educação. A

escola da atividade é pensada para garantir a formação desse novo homem. Desta forma,

segundo Bock (2003, p. 81) a escola aproveita essas situações e “[...] se põe a cumprir esta

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função, aproveitando a espontaneidade e criatividade das crianças. Desvaloriza o modelo

adulto, instiga à transformação e incentiva o novo”.

Ao analisar o caminho traçado por essas duas ciências (Psicologia e Pedagogia),

podemos perceber que a educação é um processo social, por meio da qual a sociedade adulta

impõe seus modelos, valores e regras a fim de responder as necessidades de grupos

dominantes. É cobrada dela, educação, responder às exigências e funções atribuídas numa

sociedade divida em classes.

Uma dessas exigências, no momento histórico em que se prepara o país para a

industrialização, é que prepare os indivíduos para o trabalho e para a convivência social

(regras de conduta e valores morais dominantes). Para tal, são utilizados instrumentos básicos

de intervenção uma determinada cultura, tomada pelo conjunto social e político que controla a

educação como a única cultura válida. Esses parâmetros sociais, com a ajuda de saberes da

Pedagogia e da Psicologia são traduzidos em parâmetros pedagógicos e servem para a

programação de conteúdos escolares, regras, critérios e formas de avaliação (BOCK, 2003).

A autora descreve assim, que a escola como aparelho ideológico a serviço do capital

e da classe dominante, adota parâmetros e ações pedagógicas com vistas a garantir os

interesses das classes dominantes. A autora cita que a política educacional é um conjunto de

propostas e interesses inseridos por diferentes grupos sociais, mas a Pedagogia e a Psicologia

mantém a ideia do sujeito em suas potencialidades ao que possa ser de acordo com seu

desenvolvimento. E quando o aluno não demostrava essa peculiaridade, o motivo é apontado

em razão de alguma anormalidade ou patologia inerente ao sujeito e seu contexto familiar e

social como, por exemplo, “[...] retardo, comprometimento psíquico, dinâmica familiar

conflituosa, desestruturação familiar, vítima de violência familiar [...]” (BOCK, 2003, p. 85).

Considerando essas questões, a autora alerta que devemos ser capazes de desvelar o

que os discursos e concepções historicamente construídos ocultaram. A educação, nesse

processo, ficou concebida como processo cultural de desenvolvimento das potencialidades do

indivíduo. Todos os aspectos sociais que compõem a educação ficaram ocultados. A isso,

Bock (2003) nomeia de “Cumplicidade Ideológica” firmada entre Pedagogia e Psicologia. “A

Psicologia dominante possui uma concepção de homem que parte da noção de natureza

humana. Segundo esta concepção, somos dotados de uma natureza que, ao se atualizar,

produz as capacidades que temos como humanos: trabalhar, amar, cooperar, sermos morais,

sermos seres pensantes e falantes e outras mais.” (BOCK, 2003, p. 85).

Desta forma, a autora descreve que a Psicologia compreende a natureza humana

como potencialidade. Em todos os lugares as organizações psicológicas serão as mesmas,

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somente as modificações nos conteúdos regionalistas que diferencia a forma de aprendizagem

quanto ao desenvolvimento do indivíduo em suas fases. Em outras palavras, a Psicologia, a

serviço da classe dominante, possui uma visão de homem que parte da noção de “natureza

humana”. Somos todos dotados de uma natureza que, ao se atualizar, produz capacidades que

temos como humanos.

Nessa concepção, o mundo psicológico faz parte dessa natureza, dado, portanto,

como potencialidade. A dinâmica e estruturas do mundo psíquico são universais, o conteúdo é

que muda com a cultural. Ao adotar essa concepção sobre o sujeito psicológico, assume-se

que as crianças que por algum motivo não apresentam desenvolvimento “normal” são

tomadas como problema. Para Bock (2003), essas noções isolaram o sujeito de seu mundo

social. Para a autora, a Psicologia não integrou em seus conceitos a realidade social.

Foram desenvolvidos pela Psicologia e a Pedagogia, instrumentos que pudessem

verificar a existência dos alunos ditos com problemas no espaço escolar, bem como ações

pedagógicas de reabilitação. Tendo a noção que o ser humano tem a capacidade se

desenvolver naturalmente sem a interferência da sociedade, por entender que poderia ser

prejudicial ao seu processo de construção. A não ser que esta influência poderia ser para

contribuir com o andamento natural do indivíduo.

A Psicologia não integrou em seus conceitos a realidade social; a pensou sempre

como algo a parte. Como algo fora dos sujeitos e como algo que nada tem a ver

diretamente com suas estruturas e dinâmicas psíquicas. Estas noções podem ser

evidenciadas nos conceitos de mundo psíquico e nas teorias que construímos.

Mundo psíquico é algo abstrato; sua gênese nunca está explícita nas teorias, apenas

o preenchimento dos conteúdos é que são apreciados. O homem já é o que vai ser:

esta noção está fortemente presente na Psicologia. (BOCK, 2003, p. 86).

Conforme Bock (2003) com essa concepção, a Psicologia e a Pedagogia se unificam

para averiguar e entender o processo educacional. Com isso a Psicologia colaborou ao modo

em que os problemas na educação não sejam apontados à escola quanto a sua forma de ensino

e sim ao indivíduo pelo seu fracasso. O motivo encontrado será somente do aluno,

encobertando todos envolvidos do processo educacional de suas ações.

Em razão disso a autora aponta a cumplicidade ideológica entre Psicologia e

Pedagogia. Nessa cumplicidade, a segunda faz uso dos conhecimentos científicos da primeira

para tentar ocultar as falhas da escola,

[...] do processo de ensino-aprendizagem, da educação, fruto de políticas

educacionais que projetaram a ‘crise’ da escola serão explicados pela pobreza, pela

falta de apoio que os alunos têm de suas famílias, da desestruturação familiar em

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grupos pobres da população, a presença ou ausência de um pai violento, a ausência

frequente da figura materna que trabalha para o sustento da família, da falta de

condições para o estudo em suas casas, da falta de interesse para o estudo e para

frequência à escola, preferindo o trabalho ou o bico, falta de ambiente culto em suas

famílias, a falta de oportunidade de acesso às normas cultas e às atividades cultas

que a sociedade pretensamente oferece a todos. (BOCK, 2003, p. 86).

Ainda para Bock (2003) a cumplicidade ideológica se mostra quando, adotando essa

noção de natureza humana, a Psicologia contribui, para que a educação e as instituições

possam sempre ficar ilesas e isentas de crítica ou do fracasso, uma vez que partindo desse

paradigma, este será sempre dos sujeitos, nunca da didática, estrutura autoritária da escola, de

sua desatualização, etc. A crítica que terá início inclusive dentro da própria Psicologia com

autores como Patto (1999), Antunes (2003), Bock (2003), Moysés e Collares (2010) entre

outros vem com autoridade para explicar o que se quer escamotear. O que se quer ocultar da

realidade social e escolar, ou seja, a pobreza, a desigualdade social e econômica, o descaso do

poder público.

Fruto desse casamento por conveniência, muitos diagnósticos são proferidos pela

Psicologia e Pedagogia, mais precisamente pela Psicopedagogia, sem que se conheça a escola,

a professora, o que está sendo ensinado, como está sendo ensinado. Sem que se pergunte à

criança o que ela sabe sobre seu encaminhamento a esses serviços de saúde, Psicologia e

Psicopedagogia, sobre suas dificuldades em aprender e suas ideias a respeito da escola. Bock

(2003) salienta que é como se o modelo de diagnóstico, de relatório sobre o aluno já

estivessem dados e estas questões não coubessem nos instrumentos e formulários. Para a

autora, a cumplicidade que se afirma é exatamente esta: a Psicologia se tornou cúmplice da

Pedagogia na acusação da vítima.

A cumplicidade mencionada por Bock (2003) é o ocultamento da Psicologia e da

Pedagogia na culpabilização do aluno pelo fracasso. O qual “Ditou formas de relacionamento

entre a escola e a família e entre professores e alunos; demonstrou importância da motivação

no aprendizado; mas não analisou a educação como processo social e a escola como uma

instituição a serviço de interesses sociais.” (BOCK, 2003, p. 87).

A autora nos chama atenção para como os resultados dessa cumplicidade serão

sentidos no cotidiano da sala de aula, nas formas de ensino, na avaliação e seus critérios e

como determinam uma agenda oculta na medida em que os interesses das camadas

dominantes ficam garantidos.

A questão que se coloca, segundo a autora, é: Porque tanto interesse em acobertar o

processo social que caracteriza a educação? As relações sociais e as formas de produção de

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vida, no contexto nacional, são geradoras de desigualdades sócias. O Brasil se caracteriza

como país extremamente desigual.

Entretanto, a educação brasileira é divulgada como um processo baseado e produtor

de igualdade social. Essa pretensão igualdade do currículo, que propõem uma “base comum

curricular” leva a concepção de que as desigualdades são resultado da “falta de empenho” ou

dedicação individual à educação, uma vez que “Todas as crianças são expostas a um processo

idêntico, garantido por projetos e currículos iguais em todo o país; os alunos são tratados de

forma igual; estão submetidos às mesmas regras e as mesmas formas de avaliação; as

condições de ensino são as mesmas [...]” (BOCK, 2003, p. 88). A meritocracia é apresentada

num discurso sobre a educação que garante ao poder público o papel de neutralidade.

Esse discurso sobre a educação nacional permite que uma política de “redução de

gastos” com projetos sociais se desenvolva na surdina, como foi o caso da aprovação da

Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 247/2016. Estas propostas criam espaço para

projetos de privatização da educação, sucateamento das escolas públicas em nome da

“redução de gastos”. Estas propostas afetam diretamente as classes menos favorecidas, uma

vez que a burguesia retira seus filhos da escola pública e os colocam em escolas particulares.

A partir dos fatos mencionados pode se verificar que na realidade, se tratando do

campo educacional, o que torna transparente no Brasil segundo Bock (2003) é a discussão de

como a escola deve prosseguir e não ao que ela se transformou. A situação da escola pública,

lida como crise, na verdade é uma questão política. O papel cumprido pela ideologia presente

na educação, como produtora de igualdade e de condições para obter uma vida digna se torna

fundamental quando possibilita que o poder público não queria investir em projetos sociais e

que não queria entender a educação como direito de todos.

As consequências dessa cumplicidade ideológica são sentidas também no sentido de

que geram a desigualdade social, pois os menos favorecidos não tem onde recorrer ficando

estagnados, enquanto a classe predominante investe no custeamento em razão de um ensino

de qualidade para seus filhos. Para Bock (2003) a Psicologia se torna cúmplice dessa

desigualdade social quando sustenta concepções biologizantes e individualistas sobre os

alunos. O individualismo recebe aporte científico da Psicologia e da Pedagogia para instituir a

ideia de diferenças individuais, marcando que cada pessoa possui suas características e deve

ser avaliado por isso, e que estas diferenças são da responsabilidade de cada um. Para a

autora, esse pressuposto sustenta uma visão de que o sujeito é isolado do mundo social, com

desenvolvimento independente de forças ou condições sociais. Como consequência, reduz-se

a realidade educacional, que também é social, a uma realidade individual. Desta forma,

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segundo a autora, as diferenças entre as pessoas ficam tomadas como produzidas no decorrer

do tempo e desenvolvimento, gerados pelas formas como cada um se engaja e aproveita as

condições oferecidas pelo meio. Garante a falsa noção de igualdade natural entre os sujeitos.

Bock (2003) soma a estas nefastas consequências da cumplicidade ideológica

mencionada uma oposição entre discurso educativo e prática escolar. Para a autora, no

processo educacional, esta noção de igualdade natural tem sérias consequências. O processo

de avaliação da produção é comprometido na medida em que se parte da ideia de que todos

devem ser avaliados da mesma forma, uma vez que são natural e inicialmente iguais.

A decorrência da desigualdade se manifestou devido essa cumplicidade retratada

anteriormente pela autora, ao modo que beneficiava somente as classes dominadoras, ou seja,

aqueles que tinham mais poder dentre a sociedade brasileira, enquanto as camadas da

população mais pobre ficam a mercê deste favorecimento pela falta de condição.

Bock (2003) conclui afirmando que a Psicologia, como ciência e profissão, deveria

ser capaz de denunciar péssimas condições de vida como geradoras de desigualdade e não

reforçar tais pensamentos. A Psicologia deve romper com a cumplicidade que tem

caracterizado sua relação com a educação, para se apresentar como um conhecimento capaz

de demonstrar e compreender a dimensão subjetiva das experiências vividas na escola por

alunos e professores.

Concordamos com a autora quando afirma que é preciso adotar concepções que

compreendam o sujeito como se constituindo ao atuar no mundo e nas relações sociais. É

preciso, enquanto profissionais da Pedagogia e da Psicologia que pensemos o ser humano

como ser histórico e social, que atua de forma transformadora sobre o mundo e, ao mesmo

tempo é transformado por ele.

É nesta perspectiva que segundo Sena e Soares (2012) a psicopedagogia se insere no

cotidiano escolar. Como uma forma de combater o fracasso escolar, acompanhando o

processo educativo do aluno, bem como suas dificuldades no ensino-aprendizado. Dando o

suporte para todos envolvidos na escola, orientando as práticas pedagógicas para se adequar

ao aluno em sua forma de aprendizagem.

3.2 A Psicopedagogia

De acordo com Noffs (2016) existem diversos tipos de trabalho, mas nem todos são

considerados como profissão. E dentro da diversidade de atividades existentes, a autora cita a

lentidão do reconhecimento profissional da atuação docente. Função esta que envolve

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diversos tipos de conhecimento, tanto gerais como específicos, para atuar no processo de

ensino-aprendizagem.

A autora frisa a formação docente mediante aos princípios e métodos que possibilita

o desenvolvimento enquanto professor, identificando a similaridade na formação do

psicopedagogo. Entre estes princípios destacamos de um modo geral o processo para esta

formação, que é a busca por novos conhecimentos. Nesta perspectiva, a autora relata a

necessidade de uma formação especializada que contemple as subjetividades dos indivíduos,

considerando as diferentes formas de aprender. Essa formação não deve visar apenas a

obtenção de status ou melhoria do salário, mas o cumprimento com sua função social

(NOFFS, 2016).

Noffs (2016) descreve que a Psicopedagogia é uma área de atuação que ainda não foi

reconhecida no Brasil, estando em processo de regulamentação. Segundo a autora, em 1996

com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de nº 9394/96, houve a

exigência de cursos superiores para docentes de toda rede pedagógica (privado, particular),

tendo 10 anos para se regularizar. De acordo com esta Lei, na obtenção desta formação em

nível superior, poderá o profissional se especializar para as áreas de orientação, gestão, entre

outras áreas pedagógicas para atuação na escola, seja lato ou stricto sensu.

Diante dessas questões em que poderiam se especializar em Psicopedagogia e em

relação à quantidade dos acadêmicos que estavam se formando nesta área, a Associação

Brasileira de Psicopedagogia (ABPp) vislumbrou a necessidade do projeto de Lei nº 3124/97

pelo deputado Federal Barbosa Neto (GO), quanto à regulamentação do exercício da

Psicopedagogia, que segundo ele, visava diminuir o fracasso escolar. Seguido entre outros

projetos de Lei até os dias atuais, como: Projeto de Lei nº 128/00 e nº 15/05 que se tratava da

assistência que o psicopedagogo deveria ter nos âmbitos educacionais, a de nº 3512/08 tinha

como proposta não somente a eliminação do fracasso escolar, mas quanto às formas que o

sujeito aprende em suas capacidades, em prol de melhores resultados de aprendizagens, já o

projeto de Lei nº 31/2010, em continuidades com os projetos de Lei anteriores, ratifica a

necessidade de acrescentar na formação dos que iriam se especializar em Psicopedagogia,

além dos cursos de Psicologia, Pedagogia e incluir o curso de fonoaudiologia. Projetos esses

que se alteraram conforme as mudanças provocadas na educação (NOFFS, 2016).

Por meio da resolução nº 2 do MEC – Conselho Nacional da Educação/Câmera de

Educação Superior, institui o cadastro nacional de oferta de cursos de pós-graduação

lato sensu (especialização) nas instituições credenciais no Sistema Federal de

Ensino, onde regulamenta a representação desses cursos de lato senso a partir de

2012 no sistema e-MEC. A Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação

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Superior estabelece a instrução normativa nº 1 de 16 de maio de 2014 onde elenca os

dados essenciais para o seu cadastro. Em seguida, publica no Diário Oficial da

União a Instrução Normativa nº 1 de 13 de fevereiro de 2015, que explicita os

procedimentos para o cumprimento da Instrução Normativa promulgada em maio de

2014. (NOFFS, 2016, p. 117).

De acordo com a autora citada, a partir dessas normativas os cursos previstos devem

cumprir os requisitos estabelecidos para sua formação. Pois anteriormente as especializações

em Psicopedagogias eram ministradas por instituições que nem sempre cumpriam com as

normativas.

Estima-se que o prazo para aprovação da regulamentação da especialização do

psicopedagogo está entre o ano de 2014 a 2024. Nesse intervalo de tramitação houve um

requerimento pelo presidente da Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado “[...]

solicita o desapensamento dos projetos afim de que ambos tenham tramitação autônoma.”

(NOFFS, 2016, p. 118). Nisto a ABPp deu assistência aos relatores desta proposta para que

sigam na ideia da tramitação autônoma (NOFFS, 2016). Em 2015, conforme descreve Noffs

(2016), não houve pronunciamento a respeito deste assunto pelos senados.

Souza e Cunha (2010) ao analisarem Projetos de Lei e Políticas Públicas para a

educação apontam que nos últimos anos, todos os projetos legislativos que relacionam

educação e psicologia, ferem princípios básicos de cidadania e dignidade humana. Ao analisar

os projetos de lei no âmbito legislativo municipal de São Paulo e também a nível nacional,

observam que a maioria sustenta proposições baseadas na crença de uma determinação

individual inata. Observamos que a situação não parece diferente neste caso. Embora as

propostas tenham nobre objetivo, se fundamentam em concepções individualistas e

medicalizantes da atuação de psicólogos, psicopedagogos e outros agentes alheios ao universo

escolar. Consideramos que a proposta de regulamentação da profissão de psicopedagogo fere

princípios que temos defendidos, uma vez que se justifica “[...] no atendimento de problemas,

distúrbios, ou patologias específicas dos alunos [...]” (SOUZA; CUNHA, 2010, p. 224).

Anjos e Dias (2015) denotam que a psicopedagogia surgiu com o objetivo de atender

aos indivíduos com algum distúrbio de aprendizagem. O profissional psicopedagogo teria

como campo de atuação clínicas ou instituições, atendendo tanto no coletivo como também na

individualidade, visando diagnosticar o “problema”11

para tentar solucioná-lo ou controlar a

situação já existente. Ambas são de extrema importância, porém diferencia a maneira de

procedência, ou seja, “[...] o primeiro visa buscar os obstáculos e as causas para o problema

11

Ênfase da autora.

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de aprendizagem já instalado; e o segundo, estudar as condições evolutivas da aprendizagem

apontando caminho para um aprender mais eficiente.” (SANTOS, 2009, p. 2).

Segundo Scoz (1992) tempos atrás os alunos com dificuldades para aprender eram

encaminhados para diversos profissionais, visto que as funções exercidas para este

atendimento não condiziam com as questões relativas aos problemas de aprendizagens. Com o

tempo, conforme os conhecimentos adquiridos, apontavam que havia a necessidade de um

único profissional atuante no espaço educacional que pudesse realizar um trabalho focado no

atendimento ao aluno afim de atender e superar as dificuldades de aprendizagem. Conforme

aponta Scoz (1992) o psicopedagogo tem a finalidade de desempenhar ações que possam

contribuir ao aluno, minimizando os problemas da escola bem como o fracasso escolar.

Ainda segundo o autor, se faz necessário que o psicopedagogo tenha conhecimentos

quanto ao “[...] acesso às informações das várias ciências, como a Pedagogia, a Psicologia, a

Sociologia, a Psicolinguística, de forma a atingir um conhecimento profundo, que deve estar

vinculado à realidade educacional brasileira, possibilitando-lhe uma visão global do aluno.”

(SCOZ, 1992, p. 3) Ou seja, que o mesmo tenha a capacidade de atuar em distintos

conhecimentos, juntamente com os envolvidos da escola. É preciso considerar os espaços

pedagógicos, sociais e políticas do fracasso escolar, para que possam envolver todos os alunos

que possui alguma dificuldade em aprender (SCOZ, 1992).

Conforme denota Nascimento (2013), é de extrema importância que o psicopedagogo

e o professor em sala de aula, se articulem profissionalmente, pois permitem que ambos

analisem a situação problema que podem vir ocorrer e buscar caminhos que permitem

repensar nas próprias práticas de ensino que estão sendo desenvolvidas e ao que pode ser

modificado. A partir desta junção de olhares o professor conhecedor de seus alunos ao notar

algo diferente deve encaminhar o mesmo ao psicopedagogo para poder ser investigado, pois o

mesmo deve,

[...] avaliar o aluno e identificar os problemas de aprendizagem, buscando conhecê-

lo em seus potenciais construtivos e em suas dificuldades, encaminhando-o, por

meio de um relatório, quando necessário, para outros profissionais - psicólogo,

fonoaudiólogo, neurologista, etc. que realizam diagnóstico especializado e exames

complementares com o intuito de favorecer o desenvolvimento da potencialização

humana no processo de aquisição do saber. (NASCIMENTO, 2013, p. 2).

A atuação do profissional psicopedagogo consiste num trabalho de prevenção e

orientação aos conteúdos desenvolvidos, numa interação com a equipe escolar e a família.

Este trabalho envolve ainda a socialização quanto ao despertamento das questões que

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envolvem a sensibilidade de pensar e envolver com o próximo, compreendendo todos no

espaço inserido na sociedade (ALMEIDA, 2010). O psicopedagogo deve advertir o professor

para que compreenda as trajetórias de ensino-aprendizagem do aluno para que a intervenção

seja possível. Processo esse que pode estar relacionado às dificuldades da criança desde o seu

nascimento ou ocasionada dentro da escola (ALMEIDA, 2010).

Sabemos que o ambiente da sala de aula é composto por heterogeneidade. E é nesta

perspectiva, que o psicopedagogo dá suporte aos educadores para que possam lidar com

diversos níveis de conhecimentos dos discentes, permitindo que haja aprendizagem

significativa.

A psicopedagogia constitui “[...] o caminho para a compreensão do ser humano no

exercício do aprender, principalmente porque é uma área que envolve a história de vida do

aluno e considera todos os seus aspectos: físicos, cognitivos, afetivos, emocionais e

religiosos.” (SANTOS, 2009, p. 8). Dessa forma segundo o autor citado, a psicopedagogia

atua no processo de aprendizagem do sujeito em meio às dificuldades e identificando o

problema a partir de um diagnóstico inicial em que poderá desenvolver trabalhos específicos à

necessidade apresentada (SANTOS, 2009).

Collares e Moisés (1997) apontam em seus estudos as opiniões de diversos

profissionais da educação e da saúde quanto as possíveis causas dos supostos distúrbios de

aprendizagem. Demonstrando as compreensões dos mesmos sobre o fracasso escolar, as

autoras percebem que nas opiniões expressas por esses profissionais (professores,

psicopedagogos, psicólogos, médicos, fonoaudiólogos e neurologistas), o fracasso escolar é

percebido como problema inerente ao sujeito e sua condição social. Para os mesmos, os

problemas de aprendizagem são explicados partindo de uma perspectiva medicalizante da

vida.

Segundo as autoras são tão extremos as falas de cada um quanto ao assunto, que não

é possível saber quem e de que lugares falam. Os argumentos apresentados são carregados de

preconceito. Não tendo argumentos de acordo com a formação adquirida, mas expressando

opiniões de senso comum sem nenhum amparo científico para fundamentar as alegações

(COLLARES, MOISÉS, 1992).

É possível observar mediante a realidade apresentada pelas autoras, que preconceitos

do dia a dia são travestidos de cientificidade para atender as demandas da classe dominante.

Esta visão reducionista sobre as crianças que não aprendem na escola embasa o fazer o olhar

desses profissionais em relação à criança. Haja visto, que nem sempre o problema de

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aprendizagem está relacionado ao aluno e sim a maneira como o professor ensina entre outros

fatores presente na vida dele.

Nesta perspectiva, foram investigados como as crianças são avaliadas em sala de

aula, podendo verificar a forma que os professores selecionavam as crianças ditas com

dificuldades, prevendo os sujeitos que iriam reprovar e os que iriam ser aprovados. Não

havendo uma investigação criteriosa do contexto da não aprendizagem, apenas rótulos e

prescrições que atestavam a origem do problema como se estivesse somente na criança

(COLLARES; MOISÉS, 1992).

A crítica que as autoras fazem remete a forma que as crianças são avaliadas. Sendo

um método que busca encontrar deficiências na criança, seu desenvolvimento, sua família e

seu processo de escolarização. Focalizando apenas no que o sujeito não sabe e não no que ele

já sabe. Esse método investigativo se vale principalmente de laudos e testes de inteligência

padronizados.

Moysés (2001) aponta que nos testes deste tipo os sujeito são avaliados conforme o

acerto das questões com respostas padronizadas, tendo previamente um modelo de

normalidade estabelecido pelo próprio teste. Segundo a autora, a era dos testes de inteligência

teve seu auge nos anos de 1910 a 1930. Este período se desenvolveu sob a influência dos

trabalhos, até então, elaborados por Galton, Binet, Simon e Spearman, Além disso, também se

desenvolveu sob o impacto da Primeira Guerra Mundial, a qual impôs a necessidade de

seleção rápida, eficiente e universal de recrutas para o exército. Este fenômeno fez com que

vários estudiosos desenvolvessem testes de inteligência e de seleção para soldados, os quais

introduziram os testes de aplicação coletiva, pois até então os testes eram todos de aplicação

individual, e passaram a ser maciçamente utilizados (MOYSÉS, 2001).

A utilização frequente dos testes tem levantando questionamentos por autores como

Patto (1997), Collares e Moysés (1992), Moysés (2001), Bock (2003) dentre outros, uma vez

que os mesmo têm sido utilizados para a rotulação ou classificação das crianças. Avaliadas

pelos testes de inteligência e classificadas como deficientes, normais ou superdotadas, as

crianças são fechadas dentro destas classificações.

Os pais e professores passavam a agir em função das expectativas que as

classificações geravam, e a criança é induzida a corresponder às expectativas. Os testes

sofreram também sérios questionamentos pela tendenciosidade que apresentavam, pois eram

construídos em função de fatores valorizados pela sociedade. Fatores que os grupos

dominantes apresentavam e que eram considerados como desejáveis. Falar bem, resolver

problemas com facilidade, apresentar facilidade para aprender.

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Elaborados considerando conforme valores de classe da burguesia, os testes têm sido

usados para justificar as desigualdades sociais como sendo causas naturais. Para Collares e

Moysés (1992), os testes não são pensados tendo em vista crianças reais. Crianças com

problemas, habilidades, pensamentos, sentimentos e vivências reais. Diagnósticos esses que

servem apenas para rotular os alunos em suas dificuldades e não o verdadeiro motivo do

porquê não aprendem.

Desta forma, entendemos que o uso dos testes de inteligência procura “evidenciar”

um problema que foi atribuído a criança antes mesmo de sua aplicação. Não considerando

seus aspectos de vivências e as expressões que são diversas e não fixas a um único modo de

ser/fazer. “A avaliação pode ser vista como uma perseguição ao defeito da criança; sim, pois

com certeza o defeito só pode estar localizado nela, já que vivemos em um mundo em que

todos pretensamente têm as mesmas oportunidades etc etc.” (COLLARES, MOISÉS, 1992,

sem paginação).

Em conformidades com as autoras, consideramos que não é possível medir o grau de

inteligência de uma criança e sim suas expressões. Pois as expressões são ações daquilo que

foi interiorizado, ou seja, daquilo que a criança já sabe ou aprendeu. Não podemos limitar sua

forma de expressão, acreditamos que independente da forma que a criança se expressa sobre o

determinado assunto ela está expressando algo, ela sabe fazer de alguma forma. Certos

assuntos umas saberão mais outra menos, isso dependerá das condições e do contexto que a

criança vive, bem como a forma que ela foi ensinada. Partimos do pressuposto de que o

processo de ensino-aprendizagem demanda muito da forma como o professor percebe seus

alunos e o próprio processo educativo.

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4 ASPECTOS METODOLÓGICOS

De abordagem qualitativa, que consiste em demonstrar o entendimento de uma

determinada realidade, a pesquisa procurou compreender a atuação do profissional

psicopedagogo e sua relação com os processos educativos escolares. Escolhemos o paradigma

qualitativo por acreditar que busca

[...] explicar o porquê das coisas, exprimindo o que convém ser feito, mas não

quantificam os valores e as trocas simbólicas nem se submetem à prova de fatos,

pois os dados analisados são não-métricos (suscitados e de interação) e se valem de

diferentes abordagens.” (CÓRDOVA; SILVEIRA, 2009, p. 32).

Nesta seção apresentaremos os aspectos metodológicos da realização do presente

estudo.

4.1 Participante da Pesquisa

Participou da pesquisa uma Psicopedagoga que atua na rede pública de ensino no

município de Vilhena – RO. Como todo processo de aproximação com o campo de pesquisa,

encontramos algumas dificuldades logo no contato com público alvo de nosso estudo.

Inicialmente faríamos entrevistas com duas profissionais que haviam sinalizado

interesse em colaborar com a pesquisa. Uma atuava como psicopedagoga na área clínica e

outra escolar. Uma tinha como campo de trabalho o setor privado e a outra o público. Com

relação ao desenvolvimento da pesquisa, foram feito convites para as profissionais

psicopedagogas atuantes em escolas do Ensino Fundamental da rede pública estadual e

particular de Vilhena em 2018. Primeiramente apresentamos a finalidade do projeto a ser

executado para a diretora da escola, notificando a necessidade da participação do profissional

mencionado.

Houve o condicionamento para esta procedência por parte da diretora, necessitando

após averiguar a aceitação deste profissional. O estudo de campo só foi possível mediante a

participação de uma Psicopedagoga que atua em uma escola pública da rede estadual. Não

obtivemos negação quanto à participação da Psicopedagoga da escola particular, mas foi

perceptível a relutância da mesma quando cancelou diversas vezes a entrevista previamente

agendada. Consideramos prudente prosseguir o estudo apenas com uma das profissionais,

visto que a participação deve ser de livre iniciativa e consentimento de qualquer sujeito.

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42

Após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE),

agendamos o local e horário para a realização da entrevista. A entrevistada tem 47 anos,

possui graduação em Pedagogia, Pós-Graduação Lato Senso em Psicopedagogia e atua na

rede pública estadual há cinco anos na função de Psicopedagoga, sendo uma professora

readaptada. Atende nos períodos da manhã e tarde alunos das turmas do 3° ao 7° ano do

Ensino Fundamental.

4.2 Procedimento de Coleta de Dados

Para a coleta dos dados recorremos a um roteiro semiestruturado de entrevista com 8

questões dissertativas iniciais. Durante a realização da entrevista, várias outras questões foram

emergindo, fruto do diálogo que se travou com a participante do estudo. Dessa forma, outras 9

questões foram propostas no decorrer da gravação.

A entrevista foi realizada no período vespertino e teve a durabilidade de duas horas e

trinta minutos. As respostas foram gravadas em áudio e posteriormente transcritas para

análise. Este procedimento aconteceu com autorização escrita da participante. Os dados

relativos a nome e escola em que atua foram mantidos em sigilo. Após a transcrição e análise

dos dados, o arquivo em áudio foi descartado.

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5 RESULTADOS E DISCUSSÕES

Encaminhar para diagnóstico os alunos que não correspondem às expectativas de

rendimento e de comportamento que vigoram nas escolas é um anseio de

professores, técnicos e administradores escolares que um número crescente de

psicólogos que trabalham em consultórios particulares ou em centros públicos de

saúde tem ajudado a realizar. (PATTO, 1997, p. 47).

A citação em epígrafe descreve o que tem ocorrido com um número cada vez maior

de crianças que não tem conseguido aprender na escola. Na seção 3 discutimos a produtiva

relação de cumplicidade estabelecida entre Pedagogia e Psicologia e como ambas atuaram na

acusação das vítimas pelo fracasso escolar.

Temos percebido que embora a discussão e a crítica sobre essas medidas remetam ao

início da década de 1980 no Brasil, a questão parece não avançar. Hoje, em pleno despontar

do século XXI, a questão da não aprendizagem escolar tem sido explicada em termos de

doenças e transtornos que precisam ser tratados na criança.

Velhas explicações biologizantes são remodeladas e assumem contornos da moda, no

entanto, permanecem firmes no ideário pedagógico. Professores, psicólogos, médicos e agora

também psicopedagogos parecem continuar buscando na criança as causas do não aprender.

Nesta seção apresentamos os resultados de nossa pesquisa empírica com uma psicopedagoga.

5.1 O Profissional Psicopedagogo

Nascimento (2013) afirma que o profissional psicopedagogo necessita ter a conexão

com o docente em sala de aula. Possibilitando assim verificar possíveis fatores que dificultem

o processo de aprendizagem. Em outras palavras, este profissional tem a função de orientar o

professor ao que possa ser feito para melhorar o ensino e auxiliar o aluno em suas

dificuldades. Diante disso, iniciamos a entrevista indagando sobre o que é ser um

Psicopedagogo.

É procurar participar de formação, palestras, estar se atualizando, conversando com

os pais e professores oferecendo sugestões, dicas e estratégias para melhor auxiliá-

los, tentar conscientizar os alunos sobre a importância da dedicação e compromisso

que devem ter com os estudos (PSICOPEDAGOGA).

Retomando sobre as funções do psicopedagogo, encontramos relatos de que esta

profissão atua em dois espaços, sendo clínico e/ou institucional. A primeira é uma intervenção

que permite a este profissional fazer um levantamento de todos os aspectos relacionados ao

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aluno em sua individualidade bem como sua autoestima, para tentar compreender toda

trajetória dos fatores que impossibilita a aprendizagem. A execução neste espaço parte de

trabalhos que envolvem diversas atividades bem como jogos entres outras, com adaptações

constantes de acordo com a especificidade do aluno (ANJOS; DIAS, 2015).

Já a segunda, remete a execuções de atividades em diversos contextos, ou seja, não

somente da escola, mas hospitalar, empresarial entre outros. Neste estudo daremos destaque a

atuação do psicopedagogo no espaço escolar. Visto que os problemas de dificuldades de

aprendizagem estão presentes no âmbito educacional, mesmo que sejam ocasionadas por

outros espaços (ANJOS; DIAS, 2015).

Partindo dessa questão, o psicopedagogo tem por objetivo atender o aluno como um

trabalho que previne, e combate o fracasso escolar. Trabalho este que necessita do mesmo

compreensões, conhecimentos e informações além do espaço escolar. Para que haja a

interações e a reflexão de novos procedimentos, considerando os conhecimentos prévios que o

aluno trás consigo. Nada disso adianta se o psicopedagogo não se aliar juntamente com o

professor inclusive todos da escola com o foco no aluno em seu processo de construção de

conhecimentos (ANJOS; DIAS, 2015).

Considerando o que foi apontado pelos autores, perguntamos a nossa entrevistada

quais são as funções do Psicopedagogo em relação ao espaço escolar e institucional. Para tal,

obtivemos a seguinte resposta:

Em minha opinião, as funções e o que é ser psicopedagogo tem o mesmo

significado, mas além da resposta dada anterior nossa função é tentar auxiliar o

aluno em suas dificuldades elevando sua autoestima, despertando neles o desejo de

aprender para que eles percebam as suas potencialidades, fazendo várias

intervenções através de atividades diversas, com jogos, mesa alfabética entre outras

(PSICOPEDAGOGA).

Almeida (2010) compreende que a atuação do psicopedagogo no âmbito educacional

é desempenhar ações diante da não aprendizagem, bem como orientar o professor quanto aos

procedimentos para a superação das dificuldades. Isso permitirá que a intervenção seja eficaz

e considere todo percurso percorrido pela criança em seu processo escolar. O mundo é

composto pela diversidade, inclusive a escola não é diferente. E é neste olhar que o

psicopedagogo deve interagir com docente na execução de seus planos, estabelecendo novas

formas de trabalhar com o aluno, com a intenção de contribuir e favorecer a todos no

aprendizado em sala de aula (ALMEIDA, 2010).

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Indagamos à entrevistada sobre sua relação profissional com o professor em sala de

aula:

Tenho uma relação amigável e procuro conversar a respeito dos alunos que

acompanho, procuro auxiliá-los quando necessário e tenho liberdade em visitar as

salas de aulas. Faço conscientização com os alunos como, por exemplo, através dos

cartazes (PSICOPEDAGOGA).

Segundo Almeida (2010) o psicopedagogo deve estar ciente das dificuldades que

encontra em seu trabalho, inclusive pela inserção e reconhecimento da profissão.

Considerando essas dificuldades, nos interessa saber, do ponto de vista da entrevistada, como

ela percebe esta questão. Em sua fala ela narra que:

Muitas vezes é devido essa função não ser reconhecida pelo Poder Público, não vem

materiais específicos para o psicopedagogo, é uma função deixada de lado, nem

mesmo valorizada, só ganham gratificação os que são concursado nesta função, aqui

em Vilhena só tem três concursadas (PSICOPEDAGOGA).

Sabemos que a profissão do Psicopedagogo está em processo de regulamentação. E

conforme as normativas do Ministério da Educação (MEC), para se obter essa formação é

preciso fazer a Pós-Graduação lato sensu se especializando nesta área (NOFFS, 2016). Mas,

enquanto isso não está determinado, os concursos públicos não tem a permissão de convocar

em seus editais, os cargos para psicopedagogos por compreenderem que isso infringe a

legislação. Podemos observar que isso é um obstáculo apontado pela entrevistada para realizar

sua função.

Diante do evidenciado acima, indagamos a nossa entrevistada quais as condições

necessárias para que o Psicopedagogo possa exercer sua função. Ela disse que:

As condições necessárias seria ter uma sala apropriada e equipada, o Poder Público

oferecer recursos e especialistas de determinadas áreas como: o neurologista,

psicólogos e fonoaudiólogo, otorrino entre outro. Pois a maioria dos pais não tem

condições de passar seus filhos no particular, onde muitas vezes não conseguimos

ter um diagnóstico (laudo) para ampará-los e podermos melhor ajuda-los

(PSICOPEDAGOGA).

Observamos na fala da entrevistada uma forte tendência à práticas medicalizadas no

contexto escolar ao apontar a necessidade de formação e contratação de profissionais alheios

ao contexto escolar a fim de “solucionar um problema escolar”. Em sua fala, ela sustenta a

necessidade de profissionais capazes de proferir diagnósticos e laudos para as crianças que

não tem condições econômicas de procurar estes profissionais por conta própria. Sem

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desconsiderar boas intenções da entrevistada, consideramos que a melhor forma de superar as

dificuldades é oferecer uma educação de qualidade teórica e técnica que permita aos alunos

atuar sobre seu meio social. Nesta direção, entendemos que tanto a psicologia, quanto a

psicopedagogia deveriam contribuir na medida em que disponibilizem o saber constituído em

seu campo de atuação a serviço dos agentes escolares em debates que ajudem a definir

projetos pedagógicos que levem ao conhecimento e ofereçam escuta aos estudantes e

professores no auxílio e construção de iniciativas positivas e de desenvolvimento (SOUZA;

CUNHA, 2010).

5.2 Psicopedagogia: Uma Alternativa?

Sabemos que existem inúmeros fatores que podem acarretar o não aprendizado do

aluno. Dessa forma, a questão abordada nos estudos de Araujo (2014) refere-se da

possibilidade do enfrentamento das dificuldades de aprendizagem a partir das contribuições

da Psicopedagogia. A autora relata que os diagnósticos estão ocorrendo com muita frequência

no âmbito educacional, impossibilitando que o próprio professor reflita suas ações quanto ao

planejamento. Gerando assim automaticamente a culpabilização individual e não uma

reflexão coletiva sobre o assunto, como uma forma de tentar explicar o porquê do aluno não

interiorizar o conhecimento. Desta forma, os diagnósticos colaboram para com os docentes na

medida em que isentam a escola das responsabilidades que determina sua prática para com o

aluno (ARAUJO, 2014).

Em meio aos questionamentos realizados com os professores na pesquisa de Araujo

(2014) foi constatado que as atitudes tomadas pelo psicopedagogo em relação ao pedagogo,

não diferem quanto aos procedimentos de conteúdos realizados para a melhoria do ensino.

Segundo ela verificou-se que as professoras que não tinham especialização recorriam as suas

experiências e na busca de novos conhecimentos em estratégias sendo como um desafio,

tendo os mesmos resultados das que tinham especialização em psicopedagogia (ARAUJO,

2014).

Morais (2010) descreve que a intervenção é feita para propiciar o despertamento no

aluno e em seu processo de aprendizagem. Partindo desses apontamentos, questionamos à

psicopedagoga se em sua opinião a Psicopedagogia tem colaborado no processo de ensino-

aprendizagem no espaço escolar e em quais aspectos.

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Acredito que sim. Principalmente pelas intervenções que são feitas, além disso,

quando necessário fazemos encaminhamentos e orientamos os pais procurar outros

especialistas, a fim de obter um laudo para melhor amparar seu filho.

(PSICOPEDAGOGA).

Ainda de acordo com Moraes (2010, sem paginação) o atendimento

psicopedagógico, é “[...] pautado no compromisso de promover desenvolvimento, auto-estima

e condições de maturidade emocional para resolver problemas e amadurecer o ser

cognoscente [...]”. Essas intervenções são formas que estimulam a vontade em adquirir o

conhecimento. Entretanto, temos observado, conforme autores como Moysés (2001) e Souza

e Cunha (2010) que estas práticas reproduzem concepções medicalizantes de individualização

da culpa pelo fracasso.

Tendo em vista o evidenciado, fizemos a seguinte pergunta para a psicopedagoga:

Com relação ao atendimento psicopedagógico na busca da superação das dificuldades, como

acontece à intervenção? Quando o processo começa e termina?

É feito o atendimento e quando vê que houve a melhoria é encerrado, agora a

questão do AEE é diferente, pois tem uns que tem deficiência mesmo. Agora déficit

de atenção irá diminuir, pois o aluno vai conseguindo se concentrar, pois vou

trabalhando com ele e ele vai seguindo, se esforçando e dedicando. A dificuldade às

vezes é pela falta de esforço. Eu digo para as mães terem o hábito de ler para os seus

filhos, para que eles possam contar o que compreendeu do livro ou escrever. As

exigências são grandes principalmente com a escrita em concursos e se a criança tem

essa prática ela não irá sofrer futuramente, mas irá melhorar cada vez mais. Se isso

fosse feito seria muito pouca as dificuldades. Pois é aos poucos que vai praticando.

Por maior que seja as dificuldades é preciso se esforçar, descobrindo a melhor força

de aprendizado através da busca, mas tem que querer. A escola sempre esta

conversando sobre isso, o compromisso que eles devem ter responsabilidade

(PSICOPEDAGOGA).

Moraes (2010) descreve que para a compreensão dos fatores que podem produzir

dificuldades, o psicopedagogo precisa fazer intervenções minuciosas para que possa verificar

a causa do problema, tendo em vista não somente suas dificuldades, mas as potencialidades

do indivíduo. A partir desta visão o psicopedagogo terá a noção do que possa ser trabalhado,

levando em conta as características do aluno. Constata-se pela fala da entrevistada que ela

atribui a superação das dificuldades ao esforço individual do sujeito. Impera aqui uma visão

reducionista que parece defender a ideia de meritocracia. É como se todos os problemas

enfrentados por essas crianças desaparecessem se as mesmas se esforçassem o suficiente. Este

tipo de pensamento desconsidera o contexto socioeconômico e as forças políticas que o

determinam.

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Quando aos procedimentos para intervenção, perguntamos para a psicopedagoga

sobre como é a forma de trabalhar com os maiores em relação aos menores. Segundo ela:

É um pouco difícil, pois já são adolescentes e se acham, mas dentro de sala de aula

eles brigam para ser atendido, pois querem aprender mais. Esses que tem

dificuldades de aprendizagem podem estar no sétimo ano, mas o nível deles às vezes

pode ser do quarto ano. Tendo que trabalhar a partir do nível que o aluno está

(PSICOPEDAGOGA).

Como já mencionado neste estudo, a psicopedagogia parte de um trabalho que visa

compreender os problemas de aprendizagem do indivíduo em todos os aspectos

neurofisiológicos, afetivos, cognitivos e social. Sendo assim, é possível verificar que este

profissional desempenha ações focadas em habilidades de aprendizagens que induz sanar ou

amenizar as dificuldades dos indivíduos (ARAUJO, 2014). Entretanto, temos observado que

este modelo de atendimento ainda desloca a responsabilidade efetiva da escola para o sujeito

individualizado. Seja ele aluno, professor, família. As velhas explicações para a problemática

do fracasso escolar encontram subsídios para se manter inalteradas.

Para maiores esclarecimentos sobre a atuação do psicopedagogo no que se refere às

questões de ordem estritamente pedagógicas, indagamos a nossa entrevista se o

psicopedagogo auxilia com atividades extraclasse (reforço). Desta forma obtivemos a seguinte

resposta:

O psicopedagogo não dá reforço, às vezes o professor pensa que é reforço, mas não

é. Irei trabalhar com jogos mesmo até com o sétimo ano. Já imaginou eu ter que

aprender todos os conteúdos para poder trabalhar com eles? Você vai trabalhar é

questão do raciocínio, desenvolver essa questão de atenção, mais é nessa questão

cognitiva para poder trabalhar (PSICOPEDAGOGA).

Podemos analisar que o processo de intervenção psicopedagógica, nesses moldes,

tem contribuído para a produção da queixa escolar na medida em que encaminha o sujeito

para outros profissionais fora da escola. A relação pedagógica parece não ser considerada

quando se analisam os fatores produtores da não aprendizagem. Tem a psicopedagogia atuado

como questionadora das práticas medicalizantes ou tem servido na produção de diagnósticos e

prescrições da individualização do fracasso? Tem a psicopedagogia sido capaz de direcionar

outros olhares às dificuldades de aprendizagem?

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49

5.3 Psicopedagogia e Fracasso Escolar: Uma Discussão

A articulação da equipe pedagógica com o psicopedagogo é fundamental no

desenvolvimento do aluno em sua aprendizagem. Compreende-se que;

O diagnóstico não pode ser considerado como um momento estático, pois é uma

avaliação do aluno que envolve tanto os seus níveis atuais de desenvolvimento,

quanto as suas capacidades e possibilidades de aprendizagem futura. Por muitos

anos, era uma tarefa exclusiva dos especialistas, que analisavam algumas

informações dos alunos, obtidas através da família e às vezes da escola, e logo após

devolviam um laudo diagnóstico, quase sempre com termos técnicos

incompreensíveis. A distância existente no relacionamento entre os especialistas, a

família e a escola impediam o desenvolvimento de um trabalho eficiente com o

aluno. (MORAES, 2010, p. 7).

Dessa forma, segundo Moraes (2010, p. 7) a intenção do diagnóstico é que “[...] seja

um trabalho conjunto onde todas as pessoas que estão envolvidas com o aluno devem

participar, e não atuar como meros coadjuvantes desse processo”. Em sequência dos

questionamentos feitos a nossa entrevistada, indagamos sobre o diagnóstico, se é feito pelo

professor. Obtivemos a seguinte resposta:

Sim, sendo encaminhado para a orientação faz o acompanhado e verifica o que

precisa ser tratado, pois nem todos os casos precisam, encaminhando para mim e

converso com o aluno e vejo qual é a dificuldade e chamo a mãe para entender mais

um pouco sobre as dificuldades, depois continuo fazendo trabalho com ele. Se eu ver

uma dificuldade BEM! Aí a gente encaminha para psicóloga que é um caso difícil

que a gente não tem apoio, só temos duas psicólogas no Estado e tem que atender

todos nas escolas ou então no caso seria os pais arcar com a consulta. Dessa forma a

Psicóloga iria passar com o Neuro. Conscientizo o pai assim, se a criança tem um

laudo ela é amparada.

Guarido (2010) ao analisar o discurso médico sobre a educação comenta que

atualmente, se tem produzido uma multiplicidade de diagnósticos psicopatológicos

(psicopedagógicos) e de terapêuticas que tendem a simplificar as determinações dos

sofrimentos infantis. A autora afirma que o resultado desse tipo de prática “[...] é que um

número cada vez maior de crianças em idade escolar [...] é medicado de forma a tentar sanar

sintomas das crianças [...]” (GUARIDO, 2010, p. 29). O problema com esta visão

biologizante dos modos de ser das pessoas é que ela desconsidera o contexto na qual se

apresentam, não levando em conta também, as complexas manifestações singulares de cada

sujeito. Ao discutir sobre o que representa o diagnóstico, Camillo, Frayse-Pereira e Telles

(1989, p. 204) chama atenção para o seguinte: “[...] o psicodiagnóstico e seu produto final,

que é a descrição diagnóstica, permite identificar, entre outros atributos, o tipo de orientação

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ideológico-científica a respeito da causação do comportamento humano que o diagnosticador

adota”.

Ainda sobre a crítica ao crescente processo de medicalização da aprendizagem,

Guarido (2010) destaca que quando a escola recorre a profissionais da saúde para sanar as

pretensas dificuldades “instaladas no aluno”, ela abdica de sua autoridade especializada em

educação e a concede à profissionais que desconhecem os processos complexos de ensino-

aprendizagem. Para a autora, a escola, os professores, se colocam como instrumentos do

poder e funcionam como “[...] extensão do olhar especialista na prática cotidiana, levados a

observarem as variações de comportamento das crianças e a orientarem seus familiares na

busca de tratamentos [...]” (GUARIDO, 2010, p. 36). Consideramos, desta forma, que a

psicopedagogia, quando se rende às práticas medicalizantes, serve de instrumento para

promover um esvaziamento do ato educativo e da densidade da experiência humana.

Procurando compreender como acontecem os atendimentos psicopedagógicos com

os alunos, perguntamos à entrevistada sobre as atividades realizadas durante as sessões. Os

atendimentos segundo a psicopedagoga acontecem uma vez na semana, de acordo com a

quantidade de alunos. São realizados em horário oposto ao da aula regular. Com a exceção

dos casos de “alunos dispersos”, que independente do momento, são retirados da sala para o

atendimento. Em média, cada sessão dura uma hora e trinta minutos, seguindo o modelo de

atendimento prestado em consultórios particulares. Segundo a entrevistada ela trabalha;

Com atividades diversas, jogos, mesa alfabética com vários tipos de atividades,

materiais confeccionados entre outros. Com trabalhos mais para estimular como

raciocínio e atenção, pois na maioria é esta questão, a concentração. Então através

de jogos e às vezes até trabalhos em cima de conteúdos, da onde o aluno está em seu

nível para avançar um pouco. Mas o papel é mais assim, estar estimulando essa

atenção (PSICOPEDAGOGA).

Ao ser questionada sobre as dificuldades que enfrenta na realização do trabalho, a

entrevistada respondeu da seguinte forma;

É a falta de apoio dos pais que muitas das vezes trabalham fora e não tem tempo

para dedicar e acompanhar o filho em seus deveres escolares. Estando só na internet,

na rua, jogando e quando a mãe chega não quer perder tempo, não olha o caderno

nem nada e só passa a mão na cabeça, não cobra nada, sendo complicado. Dizendo

que os pais pensam que a escola tem que fazer tudo, e às vezes chamam os pais e

nem para vir na escola não vem. Sendo difícil trazer os pais para falaram sobre as

dificuldades de seus filhos. Se for ver 5 de cada sala dizem que tem dificuldade de

aprendizagem e quando verifica não é e sim o querer que não se desenvolveu, aquele

compromisso em que os pais não põem, deixando-os livre. É claro que é melhor

brincar, não ter compromisso com nada se ele não quer a escola não vai desenvolver

isso também e é bem mais difícil. Tendo essa questão da responsabilidade que não é

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imposta nos filhos, dizendo que eles não querem, mas como filho devemos mostrar

para eles. Converso muito com os pais sobre o diálogo, dicas, sugestões de como

eles tem que agir em questão das atividades e eles se comprometem na sua frente,

mas depois não cumprem (PSICOPEDAGOGA).

A culpabilização do aluno e sua família pelo fracasso escolar comparece nas

afirmações da entrevistada quando pontua que a causa das dificuldades na realização de seu

trabalho se deve à “falta de apoio dos pais”. Esta visão parece desconsiderar ou ocultar a

realidade das condições materiais e sociais do cotidiano escolar. Esta questão se confirma

quando indagamos sobre o progresso dos alunos atendidos. Ela respondeu;

[...] geralmente é sempre positivo. Tem muito casos que você trabalha, trabalha e

você não vê muitos resultados porque é aonde a criança às vezes precisa de

continuação passar pelo neuro ou às vezes precisa de medicação. Aí os pais não têm

condições e o Estado não oferece, aí fica difícil, mas a gente continua tentando e

trabalhando. A noção dali é devagar, pois se ela conseguisse tudo isso daí aí seria

mais rápido, mas é bem lento mesmo (PSICOPEDAGOGA).

As autoras Levandowski e Scortegagna (2004) deixam explícito que é preciso

compreender o fracasso escolar em diversos enfoques sendo eles; psicológico, social e

pedagógico, pois são fatores que envolvem o aluno e todos que a ele se relaciona no âmbito

educacional. A interligação desse processo na escola é de fundamental importância no

trabalho do psicólogo, permitindo observar todo o contexto condizente ao aluno

(LEVANDOWSKI; SCORTEGAGNA, 2004).

Recorremos aos estudos de Menezes e Oliveira (2017) com a temática “um olhar

para a infância: a atuação do psicopedagogo no contexto da medicalização” quando as autoras

analisam a atuação do Psicopedagogo e os encaminhamentos que estão ocorrendo quanto ao

uso crescente de medicação no processo educacional, como forma de combate ao fracasso

escolar. Inicialmente as autoras fazem uma retrospectiva de como a criança era vista na

sociedade. Por séculos, as crianças foram consideradas como “adulto em miniatura”, sujeito

este que não tinha valor, sendo inferior na sociedade. Com o passar do tempo, a concepção de

infância foi se modificando, com mudanças que transformaram o olhar da sociedade em

relação à educação.

Durante a Revolução Industrial, as mulheres saem do lar em busca de trabalho. A

escola surge como instituição voltada às necessidades sócio econômicas deste momento. O

dever da escola era disciplinar física, intelectual e moralmente as crianças. Para as autoras,

acreditava-se que a criança deveria ser ensinada sem a presença dos adultos, por acreditarem

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que poderiam atrapalhar sua desenvoltura no aprendizado (MENEZES; OLIVEIRA, 2017). A

partir disso, a escola e a família se tornaram os pilares para a formação das crianças. Com essa

visão, houve o movimento de moralização em que se submetiam ao disciplinamento dos

alunos como forma de monitoramento, “[...] a fim de garantir o melhor desenvolvimento

intelectual e salvaguardar o vir a ser do capital mais valioso da sociedade, que representa o

futuro do Estado e esperança coletiva.” (MENEZES; OLIVEIRA, 2017, p. 3).

Foi nesse momento que segundo as autoras, a medicalização foi introduzida no

processo educacional por meio dos conceitos de normalidade x anormalidade, como forma de

adequar as crianças ao contexto social. Devendo ter um perfil que se encaixasse com as

competências e habilidades resultantes de produções da sociedade industrial. Segundo

Menezes e Oliveira (2017), a responsabilidades de educar os filhos, passa a ser não somente

da família, mas também do Estado, com sua abertura de políticas de saúde. E com as “[...]

transformações sociais, os ‘especialistas’ agentes do mecanismo de higienismo, levam a

família a entender-se como não suficiente capaz de educar seus filhos e, assim, a solicitar o

amparo técnico-científico na figura do médico, psiquiatra e psicólogo.” (MENEZES;

OLIVEIRA, 2017, p. 5).

Este percurso da medicalização inserida como forma de combate ao fracasso escolar

e o enfoque na formação do indivíduo para o mercado de trabalho, consideravam que “[...] o

que não fosse disfunção neurológica, retardos de maturação ou lesão cerebral tinha como

diagnóstico um aparelhamento genético com defeito, visto como um déficit intelectual, um

baixo QI” (MENEZES; OLIVEIRA, 2017, p. 5-6). Quando analisamos estas questões,

percebemos que as propostas e intervenções que consideram o sujeito apenas do ponto de

vista de sua biologia, tem como pressuposto uma visão higienista de educação e sociedade.

Utilizando-se de testes psicométricos e diagnósticos médicos, a pedagogia, juntamente com a

psicologia têm marcado como incapaz aqueles que fogem ao padrão de normalidade

estabelecido socialmente. Como consequência disto, tem sido elevando o número de crianças

que não aprendem na escola, que passam a consumir, com aval de pais, professores e

médicos, drogas como o metilfenidato (Ritalina).

Dessa forma, pais, professores e escola acreditam que esse tratamento centralizado

na intervenção farmacológica é a principal saída para sanar as dificuldades de aprendizagens

dos indivíduos, permitindo que possam ser inseridos na da sociedade (MENEZES;

OLIVEIRA, 2017). Se tratando da psicopedagogia nesta perspectiva, sua intervenção

diagnóstica estava ligada as dificuldades apresentadas pela criança por não aprender,

passando hoje a observar no âmbito escolar e familiar que envolve o indivíduo. Buscando ir

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mais além, com o olhar minucioso no desejo de aprendizagem do aluno (MENEZES;

OLIVEIRA, 2017).

Em vista dos argumentos apresentados pela nossa entrevistada, podemos verificar

que essa forma de diagnosticar e avaliar são decorrentes aos tempos de antigamente. Olhar

direcionado a criança em busca do problema, como se estivesse inserido somente nela.

Percebe-se nos resultados da entrevista, o enquadramento do que mencionamos na seção

anterior sobre a cumplicidade ideológica da Pedagogia e Psicologia, mais precisamente pela

Psicopedagogia, abordada por Patto (1999), Antunes (2003), Bock (2013) e Moysés e

Collares (2010), quanto à desconsideração das questões pertinentes ao sujeito em seu

contexto. Quando classificam as crianças pelas suas potencialidades sem compreender a real

situação ou condição vivida socialmente, compreendemos que a psicopedagogia, enquanto

área de atuação tem servido para estigmatizar e excluir a vítima na medida em que mantém e

sustenta práticas medicalizantes como diagnóstico, encaminhamento à neurologistas,

fonoudiólogos, etc. sem questionar as práticas propriamente pedagógicas adotadas.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo previsto nesta pesquisa foi “conhecer e compreender a atuação do

profissional Psicopedagogo no contexto escolar de uma escola da rede estadual de Vilhena-

RO”. Bem como as respostas da problemática tendo a compreensão sobre a função em

psicopedagogia no espaço escolar e sua relação com o professor em sala de aula.

Com base nas teorias que embasaram este estudo, constatou-se que a prática exercida

pelo psicopedagogo remete aos procedimentos utilizados antigamente, seguidos pela

potencialidade do indivíduo. Embora no discurso se afirme como prática diferente e que visa

o pelo desenvolvimento do sujeito diante da aprendizagem, observamos que ainda se mantém

o foco do problema no sujeito que não aprende, desconsiderando os fatores que envolvem sua

trajetória de vida.

Os resultados obtidos neste trabalho mostram que a função do psicopedagogo no

espaço escolar tem servido como instrumento de manutenção de uma educação medicalizada

quando centra o olhar apenas no sujeito em suas condições individuais. Não estamos negando

a contribuição da Psicopedagogia ou do profissional que a exerce, contudo, temos observado

que:

a) Embora a profissão não seja regulamentada e reconhecida, este profissional atua na escola

mediante ao título de Pós-Graduação Lato Sensu em Psicopedagogia;

b) Não há, de acordo com a entrevistada, o apoio do poder público para a realização do trabalho

do psicopedagogo. Concluiu-se que a Psicopedagogia enquanto área de atuação tem servido

para estigmatizar e excluir a vítima na medida em que mantém e sustenta práticas

medicalizantes como diagnóstico e encaminhamento à profissionais alheios ao cotidiano

escolar e as nuances pedagógicas do processo de ensino-aprendizagem.

Por fim, espera-se que esta pesquisa possa contribuir para futuros estudos nessa

temática e ser discutida a partir de outras perspectivas com a busca de novas percepções

diante de uma abordagem qualitativa.

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