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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
FACULDADE DE EDUCAO
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO
FUNES EXECUTIVAS: HABILIDADES MATEMTICAS EM
CRIANAS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA)
Salvador - Bahia
2016
DIANA MARIA PEREIRA CARDOSO
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DIANA MARIA PEREIRA CARDOSO
FUNES EXECUTIVAS: HABILIDADES MATEMTICAS EM
CRIANAS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA)
Tese apresentada ao Programa de Pesquisa e Ps-
graduao em Educao, Faculdade de Educao
da Universidade Federal da Bahia, como pr-
requisito para obteno do grau de Doutora em
Educao.
Orientador: Prof. Dr. Flix Marcial Daz
Rodriguez
Linha de pesquisa Educao e diversidade
Salvador
2016
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SIBI/UFBA/Faculdade de Educao Biblioteca Ansio Teixeira
Cardoso, Diana Maria Pereira.
Funes executivas : habilidades matemticas em crianas com transtorno
do espectro autista (TEA) / Diana Maria Pereira Cardoso. - 2016.
159 f. : il.
Orientador: Prof. Dr. Flix Marcial Daz Rodriguez.
Tese (doutorado) - Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Educao,
Salvador, 2016.
1. Crianas autistas - Educao. 2. Capacidade matemtica. 3. Autismo em
crianas. 4. Autismo. 5. Capacidade de aprendizagem. I. Daz Rodriguez,
Flix Marcial. II. Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Educao. III.
Ttulo.
CDD 371.94 - 23. ed.
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DIANA MARIA PEREIRA CARDOSO
FUNES EXECUTIVAS: HABILIDADES MATEMTICAS EM CRIANAS COM
TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA)
Tese apresentada como requisito parcial para a obteno do grau de Doutora em
Educao, tendo sido julgada e aprovada pela Banca Examinadora formada pelos
professores:
Aprovada em: 10 de junho de 2016
Prof. Dr. Flix Marcial Daz Rodriguez orientador _______________________________
Doutor em Cincias Pedaggicas pela Universidad Pedaggica Enrique Jos Varona UPEJV-
Cuba.
Prof. Dr. Telma Pantano - ___________________________________________________
Doutora em Cincias (Fisiopatologia Experimental) Universidade de So Paulo - USP
Prof. Dr. Jos Neander Silva Abreu _____________________________________________
Doutor em Psicologia (Neurocincias e Comportamento) Universidade de So Paulo - USP
Prof. Dr. Miguel Angel Garcia Bordas - __________________________________________
Doutor em Filosofia Universidad Complutense de Madrid - UCM
Prof. Dr. Maria Virgnia Machado Dazzani - _____________________________________
Doutora em Educao Universidade Federal da Bahia - UFBA
Prof. Dr. Alessandra Santana Soares e Barros - ___________________________________
Doutorado em Cincias Sociais Antropologia Universidade Federal da Bahia - UFBA
Prof. Dr. Antonio Eugenio Cunha - ______________________________________________
Doutor em Educao Universidade Estcio de S
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Dedico esta Tese a todas as crianas e adolescentes com
Transtorno do Espectro Autista, incluindo seus pais,
professores e demais profissionais comprometidos com
esse trabalho.
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AGRADECIMENTOS
A gratido um sentimento que traduz reconhecimento e emoo. Agradecer
manifestar carinho e relembrar de todas as pessoas que contriburam para a realizao desta
conquista profissional. Espero ento que este trabalho sirva de contribuio para os
profissionais comprometidos com o atendimento educacional de crianas que apresentam o
Transtorno do Espectro Autista (TEA).
Foram quatro anos exercitando a flexibilidade cognitiva, enfrentando momentos de
sonho, de incerteza, de angstia, de persistncia e de concretizao da presente tese. Durante
essa caminhada tive a oportunidade de encontrar pessoas maravilhosas que acreditaram e
colaboraram para que eu prosseguisse com o tema desta pesquisa.
Comeo agradecendo a Deus, Iemanj, a So Jorge pela proteo e orientao
espiritual; em seguida agradeo aos meus pais Jos Daniel e Ana Maria e tambm minha
famlia, especialmente minha tia Lcia Maria, pelo carinho e compreenso.
Agradeo ao meu orientador Flix Daz, que se mostrou interessado pela temtica,
pelo acolhimento, confiana e autonomia para que eu pudesse ter a liberdade de construir e
reconstruir vrias vezes meu projeto de tese, a partir das diversas contribuies obtidas.
Agradeo especialmente Telma Pantano pelo interesse e cooperao, atravs das
discusses e orientaes fornecendo subsdios importantes para a realizao desta tese.
Agradeo tambm Roberta Bortoloti pela oportunidade de trocarmos ideias e
refletirmos sobre a pesquisa.
Agradeo Nayara Argolo, Eliana Arajo, aos professores que conheci no curso de
Neuroeducao (CEFAC/SP) e a todos que eu tive a oportunidade de dialogar sobre o tema
desta pesquisa.
De modo especial, quero agradecer Mnica Barreto, minha amiga e colega de
trabalho e de doutorado, pelas valiosas opinies e pelo companheirismo nos eventos e
discusses que serviram de aportes para a pesquisa.
Agradeo a todos os professores, funcionrios do Programa de Ps-graduao da
Faculdade de Educao da UFBA.
Agradeo Adrielle Matos, Erica Bastos, Irenilson Barbosa e demais colegas do
Curso pela troca de ideais, incentivo e experincias.
Agradeo tambm ao diretor do CAEE-PB Ricardo Baqueiro e s crianas que fizeram
parte da pesquisa e seus respectivos pais. Estendo os meus agradecimentos aos meus colegas
de trabalho do CAEE-PB, minha amiga Graa Almeida, Aydil Muhana, Cristina Kaiow,
Valria Macedo, Anailton Ges e a todos que contriburam de modo peculiar para a
concretizao desta tese.
Enfim, agradeo aos professores Flix Daz, Miguel Bordas, Telma Pantano, Neander
Abreu, Eugenio Cunha, Alessandra Barros, Virginia Dazzani pela honra de t-los na banca
examinadora da defesa de minha tese.
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Conviver com o autismo abdicar de uma s forma de ver o
mundo, percorrer caminhos que nos conduzem a uma mltipla forma de
ver esse mesmo mundo, sem dvida falar e ouvir uma outra linguagem.
(Cavaco, 2009, p. 129)
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CARDOSO, Diana Maria Pereira. 2016, 159 f. il. Funes executivas: habilidades
matemticas em crianas com transtorno do espectro autista (TEA). Tese (Doutorado em
Educao) Faculdade de Educao, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2016.
RESUMO
A presente tese teve como objetivo verificar e analisar as habilidades bsicas da matemtica
do 1 ciclo de aprendizagem do ensino fundamental I presentes na amostra de crianas com
transtorno do espectro autista (TEA) e os comportamentos que sugerem relao com as
funes executivas, observados por meio de atividades de matemtica utilizadas no
atendimento educacional especializado realizado no Centro de Atendimento Educacional
Especializado Pestalozzi da Bahia (CAEEPB). Como opo metodolgica foi adotada a
pesquisa-ao, sob uma abordagem qualitativa. Fizeram parte desta pesquisa quatro crianas
com diagnstico de TEA, com idade entre 8 e 10 anos, sendo trs do sexo masculino e uma do
feminino. Atendendo ao propsito deste estudo, para a coleta de dados foram elaboradas
quatro atividades matemticas denominadas: Cabides numerados, Pies coloridos,
Cartes de contagem, Potes coloridos: aprendendo a classificar e a contar. De acordo com
os dados encontrados foi possvel conhecer quais habilidades bsicas da matemtica as
crianas pesquisadas dominam e perceber, a partir de atividades pedaggicas de matemtica,
os comportamentos e atitudes que sugerem relao com as funes executivas como:
flexibilidade cognitiva, controle inibitrio, memria de trabalho e ateno seletiva presentes
nas quatro crianas que apresentam diagnstico de TEA. Embora no se possa afirmar que os
achados sejam decorrentes de prejuzo da funo executiva, este estudo possibilitou saber o
quanto importante e necessrio que o professor conhea mais sobre as funes executivas
para melhor compreender os comportamentos repetitivos e perseverativos presentes nas
crianas com TEA e, assim, saber quando e como intervir no contexto escolar.
Palavras-chave: autismo em crianas, capacidade de aprendizagem, habilidades matemticas,
funes executivas, transtorno do espectro autista.
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CARDOSO, Diana Maria Pereira. 2016, 159 f. il. Executive functions: math skills in
children with autism spectrum disorder (ASD). Thesis (Doctorate in Education) School
of Education, Federal University of Bahia, Salvador, 2016.
ABSTRACT
The aim of this thesis was to verify and analyze the basic mathematical skills of the first cycle
of elementary education I present in the sample of children with autism spectrum disorder
(ASD) and the behaviors that suggest relation with the executive functions, observed through
mathematics activities used in the specialized educational service performed at the Centro de
Atendimento Educacional Especializado Pestalozzi da Bahia (CAEEPB). As a
methodological option the research-action was adopted under a qualitative approach. This
study included four children diagnosed with ASD, aged between 8 and 10 years, three of them
male and one female. According to the purpose of this study, four mathematical activities
were elaborated: "Numbered hangers", "Colored doodles", "Counting cards", "Colored pots:
learning to classify and to count". According to the data found, it was possible to know which
basic mathematical skills the children studied dominate and to perceive, from mathematics
pedagogical activities, the behaviors and attitudes that suggest relation with the executive
functions as: cognitive flexibility, inhibitory control, work memory and selective attention in
the four children with a ASD diagnosis. Although it is not possible to say that the findings are
due to impairment of the executive function, this study made it possible to know how
important and necessary it is for the teacher to know more about the executive functions to a
better understanding of the repetitive and persevering behaviors present in children with ASD,
thus, knowing when and how to intervene in the school context.
Key words: children with autism, ability to learn, mathematical skills, executive functions,
autism spectre disorder.
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LISTA DE SIGLAS
ABC Autism Behavior Checklist
ADI - R Autism Diagnostic Interview
ADOS Autism Diagnostic Observation Schedule
AEE Atendimento Educacional Especializado
APA Associao dos Psiquiatras Americanos
ASQ Autism Screening Questionnaire
ATA Escala DAvaluaci Dels Trets Autistes
BRIEF Escala Behavior Rating Inventory of Executive Functions
CAEEPB Centro de Atendimento Educacional Especializado Pestalozzi da Bahia
CARS Childhood Autism Rating Scale
CDPC Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia
CHAT Check-list for Autism in Todlers
CID - 10
CNE/CEB
Classificao Internacional de Doenas
Conselho Nacional de Educao / Cmera de Educao Bsica
CONADE Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficincia
DI Deficincia Intelectual
DSM IV Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorderes DSM 4 4 reviso
DSM - 5 Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorderes DSM 5 5 reviso
FACED Faculdade de Educao
PEP - 3 Psychoeducation Profile Third Edition
PEP - R Perfil Psicoeducacional Revisado
PHANFE
SECADI
SEESP/MEC
Programa de Habilitao Neuroeducativa das Funes Executivas
Secretaria de Educao Continuada, Alfabetizao, Diversidade e Incluso
Secretaria de Educao Especial do Ministrio da Educao
TEA Transtorno do Espectro do Autismo
TEACCH Theatment and Education of Autistic and Rilated Communication Handicapped
Children, traduo - Tratamento e Educao para Autistas e Crianas com
Deficincias Relacionadas Comunicao
TGD Transtorno Global do Desenvolvimento
TID Transtorno Invasivo do Desenvolvimento
UFBA Universidade Federal da Bahia
ZDP Zona de Desenvolvimento Potencial
ZDPr Zona de Desenvolvimento Proximal
ZDR Zona de Desenvolvimento Real
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LISTA DE ILUSTRAES
Figura 1 Regies cerebrais ................................................................................................ 43
Figura 2 Cabides numerados ............................................................................................. 98
Figura 3 Pies coloridos .................................................................................................. 100
Figura 4 Cartes de contagem ......................................................................................... 102
Figura 5 Potes coloridos .................................................................................................. 103
Quadro 1 DSM - 5 Critrio A e Lei n 12.764/2012 Inciso 1 ........................................ 25
Quadro 2 DSM - 5 - Critrios B e Lei n 12.764/2012 Inciso II ...................................... 26
Quadro 3 Nveis de gravidade para transtorno do espectro autista ...................................... 31
Quadro 4 Alteraes cerebrais presentes no TEA .............................................................. 42
Quadro 5 Bases neurais das funes executivas a partir do caso clnico Renato1 ............... 77
Quadro 6 Bases neurais das funes executivas a partir do caso clnico Renato 2 .............. 78
Quadro 7 Participantes da pesquisa ................................................................................... 97
Quadro 8 Habilidades - Atividade: Cabides numerados ................................................ 100
Quadro 9 Habilidades - Atividade: Pies coloridos ...................................................... 101
Quadro 10 Habilidades - Atividade: Cartes de contagem ............................................ 103
Quadro 11 Habilidades - Atividade: Potes coloridos: aprendendo a classificar e a contar
.......................................................................................................................................... 104
Quadro 12 Sntese da anlise da criana HB .................................................................... 107
Quadro 13 Sntese da anlise da criana IC ..................................................................... 116
Quadro 14 Sntese da anlise da criana JS ..................................................................... 123
Quadro 15 Sntese da anlise da criana PN .................................................................... 130
Quadro 16 Sntese da anlise da criana HB .................................................................... 135
Quadro 17 Sntese da anlise da criana IC ..................................................................... 136
Quadro 18 Sntese da anlise da criana JS ...................................................................... 136
Quadro 19 Sntese da anlise da criana PN .................................................................... 137
Quadro 20 Sntese das habilidades matemticas conquistadas pelas crianas com TEA ... 137
Quadro 21 Atitudes e comportamentos observados nas crianas com TEA que sugerem
envolvimento com as funes executivas ........................................................................... 139
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SUMRIO
1 INTRODUO ............................................................................................................... 12
2 TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA) .................................................... 20
2.1 BREVE HISTRICO DO PROCESSO DE CONCEITUAO DO TRANSTORNO DO
ESPECTRO AUTISTA: REFLEXES PARA O CONTEXTO EDUCACIONAL .............. 20
2.2 CARACTERIZAO E CRITRIOS DE DIAGNSTICO DO TEA (DSM - 5) .......... 27
2.3 DETECO E DIAGNSTICO DO TEA: A INTERFACE ENTRE O OLHAR DO
PROFISSIONAL DE EDUCAO E O OLHAR DO PROFISSIONAL DE SADE ......... 35
2.4 ESTRUTURAS CEREBRAIS DO TEA: CONHECENDO UM POUCO MAIS DO
TRANSTORNO .................................................................................................................. 42
3 COMPREENDENDO O TEA A PARTIR DAS TEORIAS COGNITIVAS ................ 45
3.1 TEORIA DA FUNO EXECUTIVA .......................................................................... 48
3.1.1 Alteraes Cognitivas e Comportamentais em Crianas e Adolescentes com TEA:
Dficits nas Funes Executivas ........................................................................................ 56
3.1.2 Flexibilidade Cognitiva ............................................................................................. 62
3.1.3 Memria de Trabalho ............................................................................................... 67
3.1.4 Ateno Seletiva ........................................................................................................ 70
3.1.5 Controle Inibitrio .................................................................................................... 71
3.2 BREVES NOES DAS BASES NEURAIS DAS FUNES EXECUTIVAS:
FALANDO PARA PROFESSORES .................................................................................... 72
4 CONTRIBUIES DA NEUROCINCIA PARA O PROCESSO DE ENSINO E DE
APRENDIZAGEM DE CRIANAS COM TEA. ............................................................ 80
5 PROCESSO DE ENSINO E DE APRENDIZAGEM DA MATEMTICA EM
CRIANAS COM TEA ..................................................................................................... 89
6 METODOLOGIA ........................................................................................................... 95
6.1 ESTRUTURA DA PESQUISA E PERCURSO METODOLGICO .............................. 95
6.2 PARTICIPANTES: COMPOSIO DA AMOSTRA.................................................... 96
6.3 INSTRUMENTOS E PROCEDIMENTOS DA COLETA DOS DADOS ....................... 97
7 ANLISE E DISCUSSO DOS DADOS: RESULTADOS DA PESQUISA ............. 106
8 CONSIDERAES FINAIS ........................................................................................ 141
REFERNCIAS ............................................................................................................... 144
APNDICE ...................................................................................................................... 155
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1 INTRODUO
O Transtorno do Espectro Autista (TEA), conhecido anteriormente como Transtorno
Global do Desenvolvimento (TGD) e Transtorno Invasivo do Desenvolvimento (TID) vem
sendo objeto de estudo de muitos pesquisadores nos ltimos anos.
Na 5 edio do Manual Diagnstico e Estatstico de Transtornos Mentais (DSM - 5),
o TEA faz parte do grupo de transtornos do neurodesenvolvimento, que se manifesta no incio
do perodo do desenvolvimento infantil, s vezes, em idade muito precoce, at mesmo antes
de a criana ingressar na escola (APA, 2014).
O TEA caracterizado por dficits persistentes na comunicao social e interao
social, incluindo tambm a presena de padres restritos e repetitivos de comportamento,
interesses ou atividades presentes em mltiplos contextos, manifestados atualmente ou por
histria prvia (APA, 2014).
A incluso de alunos com TEA no ensino comum tem sido uma realidade. De acordo
com a Lei 12.764/12 (BRASIL, 2012), que institui a Poltica Nacional de Proteo dos
Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, so assegurados os mesmos direitos
da pessoa com deficincia, dentre eles, o acesso educao, tanto na educao bsica quanto
no ensino profissionalizante e, quando necessrio, dever ser disponibilizada ao aluno com
TEA a presena de um profissional de apoio.
No estado da Bahia, com base no Censo Escolar de 20151, o nmero de alunos com
TEA matriculados em escolas regulares da rede pblica e privada de ensino corresponde a um
quantitativo de 2.111 alunos, sendo 536 matriculados na educao infantil, 1.484 no ensino
fundamental, 24 no ensino mdio e 67 matriculados na educao de jovens e adultos.
Especialmente na cidade de Salvador, o nmero de alunos com TEA matriculados no ensino
fundamental corresponde a 309, sendo 93 alunos distribudos nas escolas privadas, 200 nas
escolas da rede municipal de ensino e 16 nas escolas da rede estadual.
Alm do acesso classe comum do ensino regular, a pessoa com transtorno do
espectro autista tambm tem direito ao Atendimento Educacional Especializado (AEE), como
preconiza o artigo 1 da resoluo CNE/CEB n 4/20092 (BRASIL, 2009).
1 BRASIL. Censo Escolar Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira (INEP).
Disponvel em: . Acesso em: 12 abr. 2016. 2 Os sistemas de ensino devem matricular os alunos com deficincia, transtornos globais do desenvolvimento e
altas habilidades/superdotao nas classes comuns do ensino regular e no Atendimento Educacional
Especializado (AEE), ofertado em salas de recursos multifuncionais ou em centros de Atendimento
Educacional Especializado da rede pblica ou de instituies comunitrias, confessionais ou filantrpicas sem
fins lucrativos.
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De acordo com a Nota Tcnica de n 55/2013 (BRASIL, 2013), que orienta a atuao
dos centros de AEE e a recente portaria de n 243/2016 (BRASIL, 2016), que define os
critrios para o funcionamento, a avaliao e superviso de instituies pblicas e privadas
que prestam atendimento educacional especializado, estabeleceu-se como uma das atribuies
do profissional do AEE a elaborao de atividades que desenvolvam as funes cognitivas e
que estejam de acordo com as necessidades educacionais dos alunos com deficincia,
transtornos do espectro autista e altas habilidades.
Desse modo, imprescindvel considerar as habilidades cognitivas, especialmente as
funes executivas a serem desenvolvidas nas crianas e nos adolescentes com transtorno do
espectro autista, a fim de disponibilizar estratgias e recursos pedaggicos que promovam a
aprendizagem escolar e o desenvolvimento das funes executivas.
Entende-se por funes executivas um conjunto de habilidades cognitivas complexas e
superiores, especficas da espcie humana, indispensveis para iniciar e desenvolver uma
atividade, a ponto de alcanar o objetivo final. So responsveis pela capacidade de
autorregulao e autogerenciamento de componentes como: memria de trabalho, ateno
seletiva, planejamento, controle inibitrio, flexibilidade cognitiva, dentre outras habilidades
cognitivas. Essas funes so indispensveis na aquisio e no emprego das habilidades
sociais, na realizao de tarefas do cotidiano e no desenvolvimento do processo de
aprendizagem. Sendo assim, importante o bom funcionamento das funes executivas, pois
estaro presentes ao longo da vida (BARROS; HAZIN, 2013).
Nesse sentido, at o momento da presente pesquisa, pesquisadores, como, Damsio e
Maurer (1979), Ozonoff et al. (1991), Russel (1999), Pennington e colaboradores (1999) e
pesquisadores contemporneos, como, Bosa (2001), Czermainski, Bosa e Salles (2013)
abordam que os prejuzos executivos encontrados nas amostras envolvendo pessoas com TEA
esto relacionados aos seguintes componentes das funes executivas: controle inibitrio
(CHAN et al., 2009; CHRIST et al., 2007; CHRIST et al., 2011; GEURTS et al., 2004;
KILINASLAN et al., 2010; ROBINSON et al., 2009; VAN EYLEN et al., 2011),
planejamento (GEURTS et al., 2004; LANDA; GOLDBERG, 2005; LUPPI et al., 2005;
ROBINSON et al., 2009), flexibilidade cognitiva (GEURTS et al., 2004; VAN EYLEN et al.,
2011), fluncia verbal (GEURTS et al., 2004; KILINASLAN et al., 2010), memria de
trabalho (GEURTS et al., 2004; LANDA; GOLDBERG, 2005) e funes executivas
associadas a atividades do dia a dia (CHAN et al., 2009).
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Como se pode perceber, as funes executivas tm despertado interesse de vrios
pesquisadores nacionais e internacionais, no intuito de conhecerem o funcionamento das
funes executivas no TEA e entenderem a relao dessas funes com os comportamentos
que caracterizam esse transtorno.
Para melhor esclarecimento sobre as funes executivas, na qualidade de pesquisadora
responsvel pela presente tese, direcionei-me3 na busca de informaes bsicas sobre as reas
cerebrais envolvidas nas funes executivas abordadas por autores, como Jdar-Vicente
(2004), Wolfe (2007), Lima e Ferreira (2015), Richaudeau (2014), porm, sem me afastar do
compromisso educacional e tambm sem esquecer de olhar para as bases neurais das funes
executivas com as lentes de professora e psicopedagoga.
Extrair da literatura de outras reas cientficas informaes que dessem sentido para o
profissional de educao, especialmente o professor do AEE, tornou-se quase uma obsesso.
Junte-se a isso, o fato de ter como perfil profissional o interesse pela interface entre a rea da
educao e os conhecimentos relacionados a outras reas, como neuropsicologia e
neurocincia aplicada na rea da educao, conhecida como neuroeducao.
A experincia profissional como professora e psicopedagoga, acerca das necessidades
educacionais especiais apresentadas pelos alunos com deficincia intelectual e transtornos do
espectro autista, adquirida durante 23 anos, trabalhando no Centro de Atendimento
Educacional Especializado Pestalozzi da Bahia (CAEEPB), direcionou-me na busca de
conhecimentos em outras reas, principalmente da neuropsicologia e da neuroeducao.
O fato de no ter encontrado pesquisas que abordassem as funes executivas em
crianas com TEA, numa perspectiva educacional, especialmente no espao do atendimento
educacional especializado, tornou-se no s um desafio, mas uma ousadia, o que me motivou
a persistir no tema. Meu desejo, enquanto profissional de educao, era ter encontrado
estudos, j realizados anteriormente, que abordassem o exerccio das funes executivas, por
meio de atividades pedaggicas desenvolvidas no contexto do atendimento educacional
especializado direcionadas para crianas com TEA.
Assim, a escassez de pesquisas e o fato dos referidos estudiosos terem encontrado
prejuzos nas funes executivas em pessoas com TEA, me instigaram a um olhar mais atento
para os comportamentos das crianas com TEA no contexto do atendimento educacional
3 Mesmo ciente do entendimento de alguns quanto ao informalismo do estilo acadmico com relao ao uso da
1 pessoa, seja no singular ou no plural, me permito utiliz-la com a formalidade adequada, em detrimento da
diluio impessoal do sujeito na 3 pessoa, pois acredito que o texto se torna mais claro e autoral, afinal
abordo sobre minha experincia profissional. Aproveito para registrar que a formatao desta tese est em
conformidade ao estabelecido pela ltima verso da NBR 14724 (ABNT, 2011).
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especializado, alm de reforarem o meu interesse pelas habilidades cognitivas, especialmente
as funes executivas em crianas com esse transtorno.
Enfim, o desejo de pesquisar as funes executivas em crianas com TEA foi
motivado por vrios fatores como, por exemplo: a experincia profissional adquirida no
atendimento educacional especializado oferecido aos educandos com TEA no Centro de
Atendimento Educacional Especializado Pestalozzi da Bahia (CAEEPB), as aulas ministradas
para profissionais de educao sobre o TEA, como tambm as participaes em cursos e
congressos sobre o TEA e em outras reas de conhecimento, como neuropsicologia e
neuroeducao4.
Embora o servio de AEE tenha sido implantado no CAEEPB em 2009, atravs da
portaria de n 10.022/09, quando o Instituto Pestalozzi da Bahia (IPB) foi transformado em
Centro de AEE, j constava na unidade escolar alunos com TEA, ainda que em menor
proporo, alm daqueles que apresentavam deficincia intelectual (DI). Naquela poca, os
professores tinham pouco conhecimento sobre o transtorno. A partir de 2010 o Centro passou
a atender apenas alunos com TEA.
Outro fator motivador para a realizao desta pesquisa foi saber que a Nota Tcnica de
n 9/2010 (BRASIL, 2010) designa como uma das atribuies do professor que trabalha no
Centro de AEE o desenvolvimento de atividades especficas que atendam s necessidades
educacionais dos alunos com TEA e que exercitem e desenvolvam no AEE as suas funes
cognitivas.
Mediante o exposto, inteno que este estudo possa contribuir para o atendimento
educacional especializado disponibilizado aos educandos com TEA em centros de AEE e nas
salas de recursos multifuncionais, promovendo reflexes sobre o funcionamento das funes
executivas em crianas com TEA, numa perspectiva pedaggica ou psicopedaggica,
considerando, assim, a relevncia cientfica que este tema requer.
At delimitar com clareza o objeto de estudo, transcorreram-se trs anos de angstia e
ansiedade, gerados pelo conflito entre a necessidade e o desejo pelo tema atrelada escassez
de estudos que abordassem as habilidades cognitivas, especialmente o funcionamento das
funes executivas em crianas com TEA, numa perspectiva de carter educacional e no
apenas clnico, no contexto da neuropsicologia.
Assim sendo, o projeto de tese, a cada ano, foi sendo aperfeioado pela pesquisadora,
4 Curso realizado em So Paulo no Centro de Especializao em Fonoaudiologia Clnica (CEFAC) Formao
em Sade e Educao, no perodo de 2013/2014, em So Paulo.
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gerando inmeras alteraes; no entanto, o desejo de pesquisar sobre as funes executivas se
manteve presente, desde o anteprojeto, elaborado em 2011, intitulado Funes executivas em
crianas com Transtorno de Dficit de Ateno e Hiperatividade (TDAH) e Transtornos
Globais do Desenvolvimento (TGD): contribuies para o atendimento educacional
especializado, submetido ao exame de seleo do doutorado Programa de Ps-Graduao da
Faculdade de Educao da Universidade Federal da Bahia (FACED/UFBA).
Em 2012/2013, o projeto passou por alteraes que resultaram na implantao de um
Programa de Habilitao Neuroeducativa das Funes Executivas (PHANFE), direcionado
para crianas com TEA inclusas no contexto escolar. Contudo, no foi possvel dar
continuidade ao referido projeto e o tempo para a sua concluso era insuficiente, tendo em
vista o necessrio para a implantao e a avaliao do programa.
Diante dessa realidade, o projeto de tese foi novamente reestruturado. Vale tambm
destacar que o projeto submetido ao exame de qualificao, ocorrido em 2014, intitulado
Funes executivas em crianas com transtorno do espectro do autismo: contribuies para a
aprendizagem, tinha como objetivo constatar se o Perfil Psicoeducacional Revisado (PEP-R),
instrumento adotado para avaliar os aspectos do desenvolvimento e do comportamento de
crianas com autismo, poderia tambm contribuir na avaliao das funes executivas das
crianas pblico-alvo desta pesquisa.
Novamente o projeto teve que ser readaptado em decorrncia do PEP-R ter sido
revisto e lanado outra verso do instrumento denominado Psychoeducational Profile Third
Edition (PEP-3). Entretanto, essa nova reviso do instrumento, at o ano de 2015, no tinha
sido normatizada e traduzida para o idioma portugus e no estava disponvel para ser
comercializado no Brasil. Enfim, por se tratar de um trabalho cientfico, o mais indicado seria
aguardar a validao brasileira do instrumento, porm o tempo para a construo da tese
tornou-se um fator impeditivo para tal.
Nesse sentido, em julho de 2015, tive que abandonar a proposta inicial, que consistia
na aplicao do instrumento, relacionando os itens das escalas de desenvolvimento e de
comportamento com as funes executivas e tambm com as habilidades de matemtica do
ensino fundamental 1. Ainda assim, foi mantido o anseio de investigar sobre as funes
executivas envolvendo crianas com transtorno do espectro autista, sendo necessrio,
portanto, reestruturar toda investigao para que a pesquisa pudesse ser concretizada e dar
prosseguimento aos estudos das funes executivas em crianas com TEA para cumprir o
prazo de concluso da presente tese.
Enfim, as perguntas que nortearam esta tese consistiram em saber:
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Quais habilidades matemticas esto presentes na amostra de quatro crianas
com transtorno do espectro autista?
Como as funes executivas se apresentam nessas crianas na realizao das
atividades pedaggicas de matemtica?
Desse modo, o objetivo geral da pesquisa foi:
Verificar e analisar as habilidades bsicas da matemtica do I ciclo de
aprendizagem e a presena de comportamentos que sugerem relao com as
funes executivas presentes na amostra de quatro crianas com diagnstico de
TEA.
No sentido de alcanar esse objetivo, foram elaborados trs objetivos especficos:
1) Selecionar as habilidades bsicas de matemtica do 1 ciclo de aprendizagem do
ensino fundamental 1 da Rede Municipal de Ensino da cidade de Salvador/Ba com
base nas quatro funes executivas: flexibilidade cognitiva, controle inibitrio,
ateno seletiva e memria de trabalho.
2) Elaborar quatro atividades pedaggicas de matemtica que possam verificar, nas
crianas com TEA, o domnio das habilidades bsicas da matemtica do 1 ciclo de
aprendizagem do ensino fundamental 1.
3) Verificar quais funes executivas podem ser observadas nas crianas com TEA
enquanto realizam as atividades matemticas.
A escolha pelas habilidades matemticas aconteceu em funo de elas estarem
presentes no cotidiano das pessoas e serem habilidades bsicas necessrias para a
aprendizagem das crianas matriculadas no 1 ciclo do Ensino Fundamental 1, bem como nos
prximos nveis de escolarizao.
Desse modo, nesta pesquisa foram priorizadas as habilidades bsicas de matemtica do
1 ciclo de aprendizagem do Ensino Fundamental 1 da rede municipal de ensino da cidade de
Salvador/Ba, tais como: desenvolver conceitos de classificao, de conservao e de
quantificao; comparar e ordenar adequadamente os elementos, conhecer os numerais de 1 a
10, sequenciar e colocar os numerais em ordem crescente e decrescente, fazer contagem
utilizando material concreto, relacionar a ideia de nmero quantidade correspondente,
reconhecer a dezena como agrupamento de 10 elementos, realizar contagem de um em um,
associar a ideia de adio (juntar) e subtrao (retirar), reconhecer cores primrias e
secundrias, seriar os numerais colocando-os numa ordem.
A fundamentao terica alicerou quatro captulos, no sentido de esclarecer o
transtorno do espectro autista. Estes foram desenvolvidos por meio de pesquisa bibliogrfica,
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leitura de artigos cientficos, dissertaes e teses.
Aps esta introduo, o segundo captulo foi escrito no sentido de esclarecer o
transtorno do espectro autista e est subdividido em quatro sees, que trazem uma
abordagem sobre o histrico do TEA, enfatizando as mudanas ocorridas no processo de
conceituao do TEA ao longo dos anos, com algumas reflexes e contribuies para a rea
da educao; as caractersticas e os critrios de diagnstico do TEA, com base no Manual
Diagnstico e Estatstico de Transtornos Mentais (DSM-5), os instrumentos de avaliao,
enfatizando tambm questes relacionadas educao, a partir das mudanas ocorridas no
manual. Na terceira seo foi abordado sobre a importncia da deteco dos sinais do
transtorno pelo profissional de educao e a necessidade de encaminhamento para
profissionais de sade; alm disso, foi discutida a desmistificao do diagnstico e sua
importncia para possibilitar ao aluno com TEA o que preconiza a legislao brasileira. Na
quarta seo, foram abordados dados relevantes sobre as alteraes cerebrais presentes nas
pessoas com TEA.
No terceiro captulo h uma breve abordagem sobre duas teorias cognitivas teoria da
mente e teoria da coerncia central; em seguida, foram destacadas as funes executivas que
esto comprometidas nas pessoas com TEA, com base nas evidncias cientficas. Nas
subsees tratou-se dos seguintes componentes das funes executivas: flexibilidade
cognitiva, memria de trabalho, ateno seletiva e controle inibitrio. Esse captulo foi
concludo sob as bases neurais das funes executivas. Vale ressaltar que o tema foi
direcionado ao olhar da educao, dialogando com as reas da neuropsicologia.
No quarto captulo o enfoque est no processo de ensino e de aprendizagem de
crianas com TEA fundamentado em estudos da neurocincia aplicada na rea da educao,
com nfase na importncia das funes executivas para o processo de aprendizagem.
Dando sequncia estrutura terica desta pesquisa, no quinto captulo, esto algumas
reflexes sobre o processo de ensino e de aprendizagem da matemtica em crianas com TEA
e as modalidades de ajuda que lhes foram oferecidas.
No sexto captulo foram descritos os procedimentos metodolgicos utilizados nesta
pesquisa, a composio da amostra, os instrumentos (atividades pedaggicas) elaborados e os
procedimentos adotados para a coleta dos dados desta pesquisa.
Por fim, no stimo captulo, elaboramos a anlise com os resultados obtidos na
pesquisa e, no oitavo e ltimo captulo, constam as consideraes finais.
Os achados possibilitaram conhecer as habilidades matemticas presentes nas crianas
que participaram desta pesquisa, bem como perceber comportamentos que sugerem relao
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com as funes executivas. O estudo revelou ainda necessidade de elaborar atividades
matemticas que considerem o funcionamento cognitivo das crianas com TEA, incluindo a
capacidade de estimular o pensamento flexvel, a memria de trabalho, a ateno e outras
habilidades cognitivas relacionadas s funes executivas por meio de atividades
pedaggicas.
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2 TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA)
2.1 BREVE HISTRICO DO PROCESSO DE CONCEITUAO DO TRANSTORNO DO
ESPECTRO AUTISTA: REFLEXES PARA O CONTEXTO EDUCACIONAL
O termo autismo foi proposto a partir do incio do sculo XX, em 1911, pelo
psiquiatra suo Bleuler para descrever dois comportamentos considerados atpicos: fuga da
realidade e retraimento para o mundo interior. Esses eram constitudos como sintomas
presentes em pacientes adultos com diagnstico de esquizofrenia (FERRARI, 2007).
At o incio do sculo XIX, especialmente na dcada de 30, as crianas com quadro de
autismo eram confundidas e tratadas como pacientes esquizofrnicos e deficientes mentais,
pois nessa poca pouco se sabia a respeito do TEA e havia uma tendncia em relacionar o
quadro patolgico infantil com os mesmos comportamentos patolgicos presentes em adultos
que sofriam de esquizofrenia. Nessa poca os transtornos mentais presentes na infncia no
eram reconhecidos pela psiquiatria como transtornos especficos da infncia. Esse perodo foi
marcado pela influncia das ideias psicanalistas frequentes na clnica da infncia e pelo
modelo psicossomtico da psiquiatria infantil (MARFINATI; ABRO, 2014).
O termo esquizofrenia infantil foi introduzido por Potter no incio do sculo e mantido
por algum tempo pela comunidade mdica, ao se referir s pessoas com autismo (CAMPOS,
1999). As divergncias entre o autismo e a esquizofrenia so concernentes idade do incio
dos sintomas, ao histrico familiar e evoluo clnica do quadro (CAMPOS, 1999).
Dando continuidade ao histrico do autismo, impossvel no abordar os estudos do
pesquisador e psiquiatra austraco, Leo Kanner, realizados em 1943. Kanner, ao pesquisar 11
crianas com idades entre 2 e 8 anos, percebeu a presena de comportamentos que se
diferenciavam das alteraes psiquitricas da infncia, mas tinham caractersticas comuns,
sendo a mais notada a incapacidade para se relacionar com as pessoas (BANDIM, 2010).
Os prejuzos da linguagem eram evidentes nas crianas estudadas. Das 11 crianas, 3
permaneceram no mutismo e 8 apresentaram histria de atraso na fala e outras
especificidades, como: inverso pronominal e repetio ecollica (FERRARI, 2007).
Para Kanner, as crianas apresentavam comportamentos bem especficos,
caractersticos de um novo quadro patolgico. As alteraes estavam relacionadas ao prejuzo
no contato afetivo ou na vinculao social e isso era percebido de modo intenso nas crianas
estudadas ainda em idade bastante precoce. A essas alteraes de comportamento Kanner
denominou de Autismo Infantil Precoce. A partir desse estudo, Kanner publicou um artigo
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intitulado Autistic disturbances of affective contact traduzido no idioma portugus como
Distrbios autsticos de contato afetivo, no qual apresentou suas primeiras descobertas
acerca do autismo (BANDIM, 2010; FERRARI, 2007; LIMA, 2012).
Naquela poca, o autismo era caracterizado por comprometimento significativo e
qualitativo da socializao, alteraes da linguagem, dificuldade para simbolizao, abstrao
e compreenso de significados e comportamento estereotipado. Dos comportamentos
apresentados, trs chamavam a ateno de Kanner: a dificuldade no contato afetivo com as
pessoas, a inabilidade para utilizar a linguagem, no intuito de se comunicar de modo
recproco, ansiedade ou medo por coisas comuns do cotidiano, atividades e comportamentos
repetitivos e estereotipados.
Tambm na dcada de 40, praticamente um ano depois das descobertas de Kanner, em
1944, outro psiquiatra e pesquisador austraco, Hans Asperger, em pesquisa realizada com 4
crianas com dificuldade de interao social, encontrou comportamentos semelhantes queles
observados por Kanner. Embora as crianas pesquisadas no apresentassem desempenho
intelectual deficitrio, demonstravam dificuldades na utilizao social da linguagem e
limitaes para compreender e utilizar gestos e expresses sociais, bem como dificuldades na
interao social (BANDIM, 2010; CUMINE; LEACH; STEVENSON, 2006).
Com base nos resultados da sua pesquisa, Asperger escreveu uma comunicao
intitulada Psicopatias autistas na infncia para se referir s limitaes observadas nas
crianas estudadas. Mais tarde, o termo Psicopatia autista foi substitudo por Sndrome de
Asperger em homenagem a este pesquisador.
Alm de ter encontrado aspectos semelhantes aos dados percebidos por Kanner,
Asperger observou algo de estranho na linguagem verbal das crianas atpicas estudadas,
como, por exemplo: pouca naturalidade na fala, sendo por vezes pedante, com uma voz
montona, pouca modulao e sem entoao. Alm disso, o nvel cognitivo tambm chamou
ateno desse pesquisador, pois as crianas apresentavam inteligncia normal ou acima da
mdia, embora com dficits semnticos significativos. A diferena dos dois estudos estava no
fato de as pessoas estudadas por Asperger terem desenvolvido a linguagem durante a infncia
(ASSUMPO JNIOR; KUCZYNSKI, 2009; BANDIM, 2010; CUMINE; LEACH;
STEVENSON, 2006; TAMANAHA; PERISSINOTO; CHIARI, 2008).
Em decorrncia da 2 Guerra Mundial e dos trabalhos de Asperger serem publicados
em alemo houve dificuldade no acesso dos psiquiatras e especialistas aos estudos
desenvolvidos. Enquanto as comunidades, mdica e cientfica, no tinham acesso s pesquisas
de Asperger, as descobertas de Kanner tiveram grande repercusso. Hans Asperger tornou-se
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conhecido depois que a pesquisadora e psiquiatra inglesa Lorna Wing, em 1981, publicou em
ingls casos com sintomas similares aos descritos por Asperger, citando o referido autor
(BANDIM, 2010).
Dando sequncia discusso do conceito de autismo, autores como Assumpo Jnior
e Kuczynski (2009, 2015) e Bandim (2010) enfatizaram o surgimento de uma nova concepo
que diferenciou o autismo da psicose, ocorrida na dcada de 70, a partir dos estudos de Ritvo
(1976), passando, assim, a considerar o autismo como uma sndrome, caracterizando-o como
um transtorno do desenvolvimento e no mais como psicose.
A partir da dcada de 80, essa discusso esteve presente nas primeiras edies da
Classificao Internacional de Doenas (CID) e do DSM da Associao Americana de
Psiquiatria, como cita Bosa (2002, p. 28):
As primeiras edies da CID no fazem qualquer meno ao autismo. A oitava edio o traz como uma forma de esquizofrenia, e a nova agrupa-o
como psicose infantil. A partir da dcada de 80, assiste-se a uma verdadeira revoluo paradigmtica no conceito, sendo o autismo retirado da categoria
de psicose no DSM III e no DSM III-R, bem como na CID 10, passando a
fazer parte dos transtornos globais do desenvolvimento.
Como se pde perceber, o reconhecimento do autismo, enquanto transtorno presente
na infncia, passou por um longo processo de discusso na rea da sade. Somente na terceira
reviso do DSM, publicado em 1980, o autismo integrou uma nova categoria de transtornos,
tendo incio na infncia, sendo denominado como Transtornos Globais do Desenvolvimento
(TGD). Segundo Grandim e Panek (2015) a incluso do autismo no DSM III, em 1980, foi
importante, porque formalizou um diagnstico prprio.
Desse modo, o conceito de autismo proposto na Classificao Internacional de
Doenas 10 edio (CID-10) passou a fazer parte dos transtornos globais do
desenvolvimento; no DSM IV passou a pertencer ao quadro dos transtornos invasivos do
desenvolvimento, sendo depois alterado para transtornos globais do desenvolvimento no texto
revisado do DSM IV TR. Recentemente, em 2013, na 5 edio do Manual Diagnstico e
Estatstico de Transtornos Mentais (DSM-5), o autismo foi includo entre os transtornos do
desenvolvimento e denominado como Transtornos do Espectro Autista, conhecido pela sigla
TEA. O termo Transtorno do Espectro Autista ento se refere a este distrbio do
desenvolvimento, extinguindo o Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD). Nesta nova
edio no foi mais adotado o numeral romano e sim arbico.
Conforme o DSM-5, o TEA um dos transtornos do neurodesenvolvimento que se
apresenta no incio do perodo do desenvolvimento infantil, s vezes, em idade muito precoce,
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at mesmo antes de a criana ingressar na escola. No entanto, existem casos de crianas que
apresentam desenvolvimento normal no primeiro ano de vida e, s aps esse perodo, surgem
sinais de atraso ou estagnao no desenvolvimento.
O transtorno do espectro autista (TEA), como hoje denominado, continua mantendo
os sinais clnicos identificados anteriormente por Kanner e Asperger, tais como: dficits
persistentes na comunicao social e na interao social, incluindo tambm a presena de
padres restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades presentes em
mltiplos contextos, manifestados atualmente ou por histria prvia (APA, 2014).
Apesar de o autismo ser denominado internacionalmente como um transtorno do
espectro autista e pertencer ao grupo de transtornos do neurodesenvolvimento, Bosa (2002) e
Gillet (2015) ressaltam que existem posicionamentos contrrios ao DSM-5, como a
Classificao Francesa das Perturbaes Mentais da Criana e do Adolescente, em que o
autismo permanece ligado aos transtornos psicticos, sendo designado de autismo infantil
precoce. Desse modo, Bosa afirma que
a concepo de autismo como psicose ou como transtorno de desenvolvimento depende do sistema de classificao empregado, o qual,
por sua vez, traz implcitas concepes tericas diferentes sobre o
desenvolvimento infantil (BOSA, 2002, p. 29).
importante registrar que o termo espectro, relacionado ao autismo, foi empregado
pela primeira vez pelas pesquisadoras Lorna Wing e Juditer Gould, em 1979, para justificar
um grupo de crianas que, apesar de apresentarem caractersticas do autismo, no preenchiam
todos os critrios para receber o diagnstico de TEA (LIMA, 2012). Desse modo, a expresso
espetro autista, sugerida por Wing, utilizada at hoje para especificar as variaes das
manifestaes do transtorno apresentadas em cada criana. Essa heterogeneidade se refere aos
diferentes graus de severidade da condio autista que, provavelmente, esto relacionados
idade cronolgica, ao nvel de desenvolvimento da criana e aos fatores ambientais.
No Brasil, o termo transtorno do espectro autista na rea da educao passou tambm
por um processo de reavaliao e essa mudana pde ser percebida nos documentos
publicados pela Secretaria de Educao Especial do Ministrio da Educao (SEESP/MEC),
como sero abordados mais adiante. Assim, embora desde a dcada de 80 o autismo no
pertena mais ao quadro da esquizofrenia infantil ou psicose infantil, ainda h resqucios da
no distino do transtorno.
Em Educao, na dcada de 90, o autismo fazia parte da categoria de alunos com
condutas tpicas provenientes de um quadro psiquitrico. A partir desse perodo, a
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SEESP/MEC adotou a nomenclatura condutas tpicas para caracterizar os alunos que
apresentavam manifestaes de comportamentos tpicos de sndromes e quadros psicolgicos,
neurolgicos ou psiquitricos que ocasionam atrasos no desenvolvimento e prejuzos no
relacionamento social, em grau que requer atendimento educacional especializado (BRASIL,
2002).
Lowenthal e Mercadante (2009) consideravam o termo condutas tpicas um conceito
equivocado para se referir s pessoas com autismo. Segundo esses autores, o termo
Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD) foi citado nas legislaes brasileiras aps a
Terceira Conveno Nacional de Sade Mental, ocorrida em dezembro de 2001. No Brasil, na
rea da educao, esse mesmo termo foi citado pela primeira vez em 2008, atravs da Poltica
Nacional de Educao Especial na Perspectiva da Educao Inclusiva.
Durante anos o termo psicose foi utilizado, em documentos publicados pela Secretaria
de Educao Especial do Ministrio da Educao, como sendo um dos transtornos globais do
desenvolvimento. Desse modo, o termo psicose esteve presente na Poltica Nacional de
Educao Especial na Perspectiva da Educao Inclusiva (2008) ao referir no captulo V os
alunos atendidos pela educao especial Incluem-se nesse grupo estudantes com autismo,
sndrome do espectro do autismo e psicose infantil (BRASIL, 2008, p. 11), tambm nas
Diretrizes Operacionais da Educao Especial para o Atendimento Educacional Especializado
na Educao Bsica regulamentado pelo Decreto n 6.571/2008 e na Resoluo n 4/2009, que
institui as Diretrizes para o Atendimento Educacional Especializado (AEE) na Educao
Bsica. E assim, esteve presente em outros documentos, como em 2010, quando foi publicado
os Marcos Polticos Legais da Educao Especial na Perspectiva da Educao Inclusiva em
que se definiu os alunos com transtornos globais do desenvolvimento como:
[...] aqueles que apresentam alteraes qualitativas das interaes sociais recprocas e na comunicao, um repertrio de interesses e atividades restrito, estereotipado e repetitivo. Incluem-se neste grupo alunos com
autismo, sndromes do espectro do autismo e psicose infantil (grifo meu).
(BRASIL; MEC/SEESP, 2010, p. 21).
Alguns anos depois, em 2014, foi possvel observar o termo psicose na Nota Tcnica
n 4/2014 publicada pela Secretaria de Educao Continuada, Alfabetizao, Diversidade e
Incluso (SECADI/ MEC). importante esclarecer que, devido extino da SEESP, as
aes e projetos desenvolvidos anteriormente passaram a ser da competncia da Secretaria de
Educao Continuada, Alfabetizao, Diversidade e Incluso (SECADI). A Nota Tcnica n
4/2014 orienta quanto aos documentos comprobatrios de alunos com deficincia, transtornos
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globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotao no Censo Escolar, conforme
citao: [...] Inclui-se nesta definio alunos com autismo clssico, sndrome de Asperger,
sndrome de Rett, transtorno desintegrativo da infncia (psicose) e transtornos invasivos sem
outra especificao (BRASIL, 2014).
Em vista do que foi exposto, o conceito do autismo foi reformulado, tanto no contexto
da sade quanto no contexto educacional, at ser reconhecido internacionalmente como um
dos transtornos do neurodesenvolvimento, hoje denominado Transtorno do Espectro Autista.
Vale destacar que, atualmente, essa terminologia est presente tambm na Nota Tcnica n
20/2015, que d orientaes aos sistemas de ensino visando ao cumprimento do artigo 7 da
Lei Federal n 12.764/2012 (BRASIL, 2012), conhecida como Lei Berenice Piana, que institui
a Poltica Nacional de Proteo dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista.
Como atualmente o termo TEA est presente nos documentos voltados para a rea da
educao, vale discorrer a esse respeito, utilizando os critrios de diagnstico do TEA, A e B,
abordados no DSM-5 e alguns dos aspectos da Lei Federal 12.764/2012. Desse modo, seria
pretencioso dizer que os incisos I e II do 1 da Lei n 12.764/2012 estariam referindo-se aos
critrios A e B do DSM-5? Assim, analisaremos os critrios A e B do DSM-5 com os incisos
I e II da Lei Federal n 12.764/2012. Estaro em negrito as possveis semelhanas percebidas.
Quadro 1 DSM-5 Critrio A e Lei n 12.764/2012 Inciso 1
DSM-5 - critrio A
Dficits persistentes na
comunicao social e na interao social
Inciso 1 da Lei n 12.764/2012
1. Dficit na reciprocidade socioemocional
2. Dficits nos comportamentos
comunicativos no
verbais, usados para
interao social.
3. Dficits para desenvolver, manter e compreender
relacionamentos
I Deficincia persistente e clinicamente significativa da comunicao
e da interao social, manifestada por deficincia marcada de
comunicao verbal e no verbal usada para interao social;
ausncia de reciprocidade social; falncia em desenvolver e manter
relaes apropriadas ao seu nvel de desenvolvimento;
Fonte: APA (2014); BRASIL (2012)
Como se pode perceber, as reas da educao e da sade esto bem prximas, ao
caracterizarem os prejuzos relacionados ao item: comunicao social e interao social do
critrio A do DSM-5. No entanto, vale ressaltar que na Lei n 12.764/2012 os prejuzos
relacionados comunicao e interao social so considerados como deficincia de carter
persistente e clinicamente significativa.
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Quadro 2 DSM-5 - Critrios B e Lei n 12.764/2012 Inciso II
DSM-5 - critrios B
B Padres restritos e repetitivos de
comportamento, interesses ou atividades,
manifestados atualmente ou por histria
prvia.
Inciso II da Lei N 12.764/2012
1. Movimentos motores, uso de objetos ou fala estereotipados ou
repetitivos.
2. Insistncia na mesmice, adeso inflexvel a rotinas ou padres
ritualizados de comportamento verbal ou no verbal.
3. Interesses fixos e altamente restritos anormais em
intensidade ou foco.
4. Hiper ou hiporeatividade a estmulos sensoriais ou
interesse incomum por aspectos
sensoriais do ambiente.
II Padres restritos e repetitivos de comportamentos,
interesses e atividades, manifestados por comportamentos
motores ou verbais estereotipados ou por comportamentos
sensoriais incomuns; excessiva aderncia a rotinas e padres
de comportamento ritualizados; interesses restritos e fixos.
Fonte: APA (2014); BRASIL (2012)
No quadro 2, o mesmo foi percebido, ao relacionar o critrio B do DSM-5 com o
inciso II da Lei Federal n 12.764/2012. A comparao entre a similaridade do que foi
percebido sugere que as duas reas, educao e sade, no falam de transtornos diversos,
apesar de a legislao considerar o TEA como deficincia e no como transtorno do
neurodesenvolvimento, como abordado no DSM-5 e aceito pelos profissionais de sade.
provvel que isso acontea, porque, sendo o autismo considerado como deficincia, para
todos os efeitos legais, a pessoa com TEA tem seus direitos garantidos. Isso refora o
pensamento de Costa (2013), ao mencionar que a falta de polticas pblicas se originava na
falta de reconhecimento da pessoa com autismo como pessoa com deficincia - para fins
legais.
Outro aspecto importante encontrado em ambos os documentos se refere ao
reconhecimento das respostas incomuns dadas aos estmulos sensoriais pelas pessoas com
autismo. Apesar dos entraves e da escassez de dilogo entre os dois campos de saber,
educao e sade, os prejuzos apresentados pelo espectro autista reforam a certeza de que
vivel e necessrio o trabalho de parceria entre os profissionais de sade e de educao para
melhor identificarem e atenderem s necessidades e especificidades do aluno com TEA, na
perspectiva do contexto educacional inclusivo.
Sendo o TEA enquadrado como deficincia no Brasil, por conseguinte, os alunos que
apresentam esse transtorno so reconhecidos perante legislao brasileira de incluso como
pertencentes ao pblico-alvo da educao especial. Desse modo, a legislao lhes assegura o
direito matrcula em classes comuns de ensino em todos os nveis, modalidades e etapas de
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escolarizao do sistema educacional brasileiro. Alm de garantir o acesso educao, a
Constituio Federal do Brasil (1988), no artigo 208, III, j assegurava o atendimento
educacional especializado (AEE) s pessoas com deficincia, preferencialmente na rede
regular de ensino. Em 2009, com base no artigo da Resoluo n 4 do CNE/CEB, o
atendimento s especificidades educacionais do aluno com TEA dever acontecer mediante a
elaborao do plano de atendimento educacional especializado. Este deve ser elaborado em
articulao entre o professor, a famlia e os profissionais da sade e outros, quando for
necessrio.
Nesse sentido, vale destacar mais uma vez que a articulao entre a educao e a sade
necessria para a formulao e a implementao de aes a serem disponibilizadas a esses
alunos, pois essa intersetorialidade, na perspectiva da incluso escolar, uma das diretrizes da
Poltica Nacional de Proteo dos Direitos da Pessoa com TEA - Lei n 12.764/2012, e um
dos direitos a serem conquistados.
De fato, esse breve conhecimento importante e oportuno para que o professor de sala
de aula e do AEE busquem mais informaes sobre o transtorno do espectro autista e
conheam as especificidades desse transtorno, a partir de estudos que enfatizam prticas
pedaggicas baseadas em evidncias cientficas para que possa oferecer um ensino de
qualidade e atenda s necessidades do aluno, fazendo valer a Lei n 12.764/2012.
Na verdade, a interface entre as duas reas referidas necessita ser uma realidade nos
espaos de aprendizagem e teraputicos, visto que essa interao possibilitar um melhor
prognstico do desenvolvimento da criana com TEA. Para entender melhor esse transtorno,
abordaremos, na prxima sesso, os comportamentos que caracterizam o transtorno do
espectro autista e os critrios de diagnstico explcitos no DSM-5.
2.2 CARACTERIZAO E CRITRIOS DE DIAGNSTICO DO TEA (DSM-5)
Conforme o referido, o termo Transtornos Globais de Desenvolvimento (TGD) foi
alterado no ano de 2013 para Transtornos do Espectro Autista (TEA). A Associao dos
Psiquiatras Americanos (APA) elaborou a 5 edio do Manual Diagnstico e Estatstico de
Transtornos Mentais (DSM-5) e trouxe mudanas significativas para os critrios de
diagnstico do TEA que sero considerados mais adiante. No Brasil o DSM-5 foi publicado
em 2014.
Fazem parte do grupo de transtornos do neurodesenvolvimento: transtornos da
comunicao, deficincias intelectuais, transtorno do espectro autista, transtorno de dficit de
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ateno/hiperatividade, transtorno especfico da aprendizagem e transtornos motores (APA,
2014).
Depois de vrias dcadas, at hoje so mantidos os aspectos que caracterizam o
transtorno, observados por Kanner na dcada de 40, como: prejuzo qualitativo da interao
social e da comunicao, comportamentos e interesses restritos e estereotipias. Estas
caractersticas esto presentes na 10 reviso da Classificao Internacional de Doenas
Mentais da Organizao Mundial de Sade (CID-10) e tambm na 5 edio do Manual
Diagnstico e Estatstico de Transtornos Mentais da Associao Americana de Psiquiatria
(DSM-5).
Com base na leitura do DSM-5 (APA, 2014) e em autores como Assumpo Jnior e
Kuczynski (2015), a nova edio trouxe algumas alteraes que, se for comparada com a
quarta reviso do manual (DSM IV TR), possvel destacar algumas mudanas, como:
Na 5 edio no se utiliza mais as categorias dos transtornos descritas
anteriormente no DSM IV - TR: 299.00 transtorno autista, 299.80 transtorno de
Rett, 299.10 transtorno desintegrativo da infncia, 299.80 transtorno de Asperger,
299.80 transtorno global do desenvolvimento sem outra especificidade (incluindo
autismo atpico) (APA, 2014).
De acordo com o DSM-5 (APA, 2014, p. 51) indivduos com um diagnstico do
DSM IV bem estabelecido de transtorno autista, transtorno de Asperger ou
transtorno global do desenvolvimento sem outra especificao devem receber o
diagnstico de transtorno do espectro autista. Desse modo, o transtorno foi
tratado como uma nica categoria - TEA. Para Assuno Jnior e Kuczynski,
(2015) as distines entre os transtornos intragrupos foram abolidas no DSM-5,
porque ficaram inconsistentes com o passar do tempo e, havendo uma s
categoria, facilita a comunicao entre os profissionais da sade.
A sndrome de Rett, no DSM-5, no considerada mais um quadro categorial do
transtorno; isto, porque os sintomas do autismo podem estar presentes apenas no
incio e depois desaparecer no decorrer do desenvolvimento, sendo mais
relevante considerar as outras complicaes que caracterizam a Sndrome de
Rett, como: dificuldade no controle do tronco, processos mentais afetados, fala e
o uso das mos, regulao cardiorrespiratria (APA, 2014).
No DSM IV - TR os critrios de diagnstico se baseavam em uma trade de
sintomas relacionados ao comprometimento na interao social, na comunicao
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e na flexibilidade de pensamento, comportamento e interesse especfico. J o
DSM-5 considera como critrio de diagnstico do TEA uma dade, isto , os
sintomas devem estar relacionados ao critrio A: comunicao social e interao
social e ao critrio B: padres restritos e repetitivos de comportamento, interesses
ou atividades.
De modo resumido, os critrios A e B de diagnstico do TEA adotados pelo DSM-5
(APA, 2014) so:
A Dficits persistentes na comunicao social e na interao social em mltiplos
contextos, manifestados atualmente ou por histrias prvias.
Dficit na reciprocidade socioemocional;
Dficits nos comportamentos comunicativos verbais e no verbais usados para
interao social;
Dficits para desenvolver, manter e compreender relacionamentos.
Especificar a gravidade atual baseia-se em prejuzos na comunicao social e em padres
de comportamento restritos e repetitivos.
Critrios diagnsticos
B Padres restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades,
manifestados atualmente ou por histria prvia, por pelo menos dois dos seguintes
itens:
Movimentos motores, uso de objetos ou fala estereotipados ou repetitivos;
Insistncia na mesmice, adeso inflexvel a rotinas ou padres ritualizados de
comportamento verbal ou no verbal;
Interesses fixos e altamente restritos anormais em intensidade ou foco;
Hiper ou hiporreatividade a estmulos sensoriais ou interesse incomum por
aspectos sensoriais do ambiente.
Especificar a gravidade atual baseia-se em prejuzos na comunicao social e em padres
de comportamento restritos e repetitivos.
Critrios diagnsticos
C Os sintomas devem estar presentes precocemente no perodo do desenvolvimento.
D Os sintomas devem causar prejuzo clinicamente significativo no funcionamento
social, profissional e em outras reas importantes da vida do indivduo no presente.
E Os sintomas no so melhor explicados por deficincia intelectual (transtorno do
desenvolvimento intelectual) ou por atraso global do desenvolvimento.
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O modo como o DSM-5 exemplifica os critrios A e B sugere relao com os
dficits da teoria da mente, prejuzo na coerncia central, dficit nas funes
executivas e prejuzos relacionados ao dficit de integrao sensorial. Embora o
manual no traga de modo explcito essas teorias, os exemplos dos sintomas
apresentados pelo DSM-5 para caracterizao do transtorno sugerem relao s
teorias cognitivas.
Outra questo importante que o DSM-5 considera que os sintomas possam ser
manifestados atualmente ou por histrias prvias em mltiplos contextos.
Considera a presena dos sintomas desde o nascimento ou no comeo da
infncia, mesmo que no tenha sido detectado antes.
A terminologia transtorno do espectro autista refora a ideia de que o autismo faz
parte de um espectro, isto , h diferentes formas e graus da sintomatologia do
autismo se manifestar na criana.
Outra novidade que o DSM-5 trouxe foi abordar a heterogeneidade do transtorno do
espectro autista em trs nveis, organizados de acordo com a gravidade dos sintomas. Vale
destacar que os nveis do espectro descritos iniciam da maior gravidade para a menor, isto ,
parte do nvel 3 para referir ao mais grave, em seguida so abordados o nvel 2 e o nvel 1,
sendo este ltimo o mais leve. Alm de estabelecer a gravidade do nvel que vo de 1 a 3, o
DSM-5 indica tambm qual o nvel de ajuda necessria, como: nvel 3 necessita de ajuda
muito substancial, nvel 2 necessita de ajuda substancial e o nvel 1 necessita de ajuda.
No contexto educacional, principalmente no atendimento educacional especializado,
essa informao muito importante. No entanto, somente na prtica, durante o atendimento
educacional especializado, o professor saber qual o tipo de ajuda que o educando precisa e
qual ser a intensidade e frequncia dessa ajuda. Uma coisa certa; independentemente do
nvel de TEA que a criana apresenta, a mediao do professor ser necessria, e este dever
estar bem preparado para poder disponibilizar ao educando o tipo de ajuda imprescindvel.
Essa informao tambm refora o quanto importante assegurar ao educando a necessidade
do profissional de apoio, como est garantida na Lei 12.764/2012.
Nesse sentido, o professor trabalhar como mediador desenvolvendo com o educando
o que ainda no capaz de fazer com autonomia. difcil falar de mediao, sem mencionar
trs conceitos abordados por Vygotsky, como a Zona de Desenvolvimento Real (ZDR), a
Zona de Desenvolvimento Potencial e a Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDPr). Quando
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Vygotsky elaborou esses trs conceitos, o propsito foi explicar o processo de
desenvolvimento sobre a aprendizagem, a partir de uma viso dialtica.
Daz (2011) explica com clareza os trs nveis de desenvolvimento. A ZDR o que a
criana consegue fazer sozinha, porque j tem o conhecimento consolidado, enquanto a ZDP
o que ela faz sob a orientao ou com a ajuda de outra pessoa mais experiente, colegas e
professores, porque ainda no domina o conhecimento, e a ZDPr est entre o real e o
potencial, isto , se refere ao nvel quase acabado em sua maturao da Zona Potencial, ou
seja, o que ainda no se desenvolveu, porm, est em processo de amadurecimento.
Provavelmente, com a ajuda de outra pessoa mais experiente, o conhecimento se consolidar e
tambm a criana progredir em outros aspectos do desenvolvimento.
Outra informao trazida pelo DSM-5, que merece destaque, diz respeito alterao
dos graus de gravidade do transtorno, que pode variar de acordo com o contexto ou oscilar
com o tempo. Ainda a respeito dos nveis de gravidade do transtorno o DSM-5, destaca-se que
as categorias descritas de gravidade no devem ser usadas para determinar a escolha e a
proviso de servios, isso somente pode ser definido de forma individual e mediante a
discusso de prioridades e metas pessoais (APA, 2014, p. 51).
Nesse sentido, entende-se que h uma necessidade de elaborao e execuo de um
plano individualizado, no contexto do atendimento educacional especializado, como
determinam os seguintes documentos: Nota Tcnica n 55/2013, Resoluo n 4/2009,
Portaria n 243/2016.
Alm disso, nesse item do DSM-5, tambm se ressalta a importncia do trabalho da
equipe interdisciplinar, quando aborda a necessidade de discusses para decidir as prioridades
e estabelecer metas.
Quadro 3 Nveis de gravidade para transtorno do espectro autista
Nvel de
gravidade
Comunicao social Comportamentos restritos e repetitivos
Nvel 3
Exigindo
apoio muito
substancial
Dficits graves nas habilidades de comunicao
social verbal e no verbal, causam prejuzos
graves de funcionamento, grande limitao em
dar incio a interaes sociais, resposta mnima abertura social que partem de outros. Por
exemplo, uma pessoa com fala inteligvel de
poucas palavras, que raramente inicia as
interaes e, quando o faz, tem abordagens
incomuns, apenas para satisfazer s
necessidades e reage somente a abordagens
sociais muito diretas.
Inflexibilidade de comportamento, extrema
dificuldade em lidar com a mudana ou
outros comportamentos restritos, repetitivos
que interferem acentuadamente no funcionamento em todas as esferas. Grande
sofrimento, dificuldade para mudar o foco
ou as aes.
Nvel 2
Exigindo
Dficits graves nas habilidades de comunicao social verbal e no verbal; prejuzos sociais
aparentes, mesmo na presena de apoio;
Inflexibilidade de comportamento, dificuldade de lidar com mudana ou outros
comportamentos restritos, repetitivos que
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apoio
substancial
limitao em dar incio a interaes sociais e
resposta reduzida ou anormal a aberturas sociais
que partem de outros. Por exemplo, uma pessoa
que fala frases simples, cuja interao se limita a
interesses especiais reduzidos e que apresenta
comunicao no verbal acentuadamente
estranha.
aparecem com frequncia suficiente para
serem bvios ao observador casual e
interferem no funcionamento em uma
variedade de contextos. Sofrimento e/ou
dificuldade de mudar o foco ou as aes.
Nvel 1
Exigindo
apoio
Na ausncia de apoio, dficits na comunicao
social causam prejuzos notveis. Dificuldade para iniciar interaes sociais e exemplos claros
de respostas atpicas ou sem sucesso a aberturas
sociais dos outros. Pode apresentar interesse
reduzido por interaes sociais. Por exemplo,
uma pessoa que consegue falar frases completas
e envolver-se na comunicao, embora
apresente falhas na conversao com os outros e
cujas tentativas de fazer amizades so estranhas
e comumente malsucedidas.
Inflexibilidade de comportamento causa
interferncia significativa no funcionamento em um ou mais contextos. Dificuldade em
trocar de atividade, problemas para
organizao e planejamento so obstculos
independncia.
Fonte: APA (2014, p. 52)
Para entender melhor o transtorno do espectro autista, importante conhecer alguns
dos comportamentos abordados pelo DSM-5 (APA, 2014) e por alguns autores como: Bandim
(2010), Cumine, Leach e Stevenson (2006), Silva, Gaiato e Reveles (2012). So exemplos de
dficits relacionados comunicao e interao social, abordados por esses autores e pelo
DSM-5:
Dficit na reciprocidade socioemocional, variando, por exemplo, de abordagem social
anormal e dificuldade para iniciar e manter uma conversao e compartilhar interesses,
emoes ou afeto; dificuldade em ajustar o comportamento para se adequar a
contextos sociais diversos; manter e compreender relacionamentos; dificuldade para
participar ativamente de jogos ou brincadeiras sociais, preferindo atividades solitrias;
dificuldade em enunciar distintas respostas a diferentes pessoas e ajustar o
comportamento para se adequar a contextos sociais diversos; saber responder
adequadamente aos elogios ou crticas; dificuldade em compreender as prprias
emoes e as dos outros; dificuldade em variar a entonao da voz de acordo com a
situao; dificuldade em compartilhar brincadeiras imaginativas ou em fazer amigos;
ausncia de interesse pelos seus pares.
Dficits nos comportamentos comunicativos no verbais, usados para interao social,
variando, por exemplo, de comunicao verbal e no verbal pouco integrada;
dificuldade no contato visual, na compreenso e utilizao da linguagem corporal
(gestos); ausncia total de expresses faciais e comunicao no verbal; dificuldade
para variar as expresses faciais, a fim de estabelecer um contato social; dificuldade
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para reconhecer e responder aos sinais sociais numa conversa como, por exemplo:
franzir a sobrancelha e sorrir; no conseguem perceber o efeito dos prprios atos no
ambiente.
Quanto aos padres restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades,
podem ser manifestados por comportamentos relacionados aos:
Movimentos motores; uso de objetos ou fala de modo estereotipado ou repetitivo, a
exemplo de: estereotipias motoras, alinhar brinquedos ou girar objetos, ecolalia, frases
idiossincrticas, movimentos repetitivos e automticos de partes do corpo ou do corpo
todo.
Insistncia nas mesmas coisas; adeso inflexvel a rotinas ou padres ritualizados de
comportamento verbal ou no verbal; sofrimento extremo em relao a pequenas
mudanas; dificuldades com transies; padres rgidos de pensamentos; rituais de
saudao; necessidade de fazer o mesmo caminho ou ingerir os mesmos alimentos
diariamente; rituais especficos e no funcionais; dificuldade para generalizar a
aprendizagem em outros contextos.
Interesses fixos, restritos e perseverativos que chamam a ateno pela intensidade da
ateno seletiva ou foco intenso: forte apego a/ou preocupao com objetos incomuns
ou partes de objetos, interesses excessivos por determinados temas ou incomuns para
sua faixa etria.
Hipersensibilidade ou hiporreatividade a estmulos sensoriais ou interesses incomuns
por aspectos sensoriais do ambiente, tais como: indiferena aparente
dor/temperatura, reao contrria a sons ou texturas especficas, cheirar ou tocar
objetos de forma excessiva, fascinao visual por luzes ou movimentos (APA, 2014).
Gillet (2015) exemplifica diferentes atividades estereotipadas que podem ser
observadas na pessoa com TEA relativos : postura (balanar o corpo ou a cabea,
movimentar os dedos diante dos olhos), utilizao de um objeto (movimentar um objeto
diante dos olhos ou faz-lo girar), conforme determinada rea de interesse (dinossauros).
Sobre as diferentes possibilidades de respostas de comportamento que possam surgir
nas pessoas com TEA, Goldstein d alguns exemplos. Contudo, por se tratar de um espectro, a
autora enfatiza que as respostas podem variar de pessoa para pessoa e se apresentar de
diferentes formas, alm de diversificar, conforme o dia ou o momento.
Para Goldstein (2011, p. 19-20) a pessoa hipersensvel percebe intensamente os
estmulos dificultando a compreenso da informao, podendo apresentar alguns desses
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comportamentos: incmodo ao cortar as unhas e o cabelo; desconforto com etiquetas de
roupas em atrito com a pele ou com um gesto fsico de carinho; no gosta de andar descalo;
chora quando toma banho de chuveiro; evita o toque fsico se distanciando das pessoas; cria
rituais e rotinas; costuma selecionar os alimentos com base na textura ou consistncia;
demonstra mal-estar ao escovar os dentes; costuma sentir enjoos ao andar em automveis; se
incomoda e se distrai com barulhos de eletrodomsticos; evita brinquedos de parque como
gira-gira, balanos, escorregador, pula-pula; costuma no gostar de atividades que envolvem
pintura e argila ou outra que tenha que sujar as mos ou o corpo.
No caso da pessoa hipossensvel, Goldstein (2011) enfatiza que, em geral, costuma ter
dificuldade para perceber os estmulos do meio ambiente e apresenta alguns exemplos de
como costuma reagir aos estmulos: nem sempre consegue perceber quando tocada por outra
pessoa; adora andar descala, principalmente na areia ou na grama; morde a si prprio ou
morde o outro; costuma esbarrar em objetos, demonstra interesse exagerado e brinca de modo
intenso nos brinquedos de parque como gira-gira, balano, escorregador, pula-pula, parece
no se sentir saciado quando se alimenta, parece no ouvir ou adora sons altos, costuma
cheirar objetos, tende a levar boca ou comer objetos no comestveis, adora tomar banho
constante de chuveiro, no reclama ou se incomoda quando est sujo ou quando realiza
atividades que melam as mos ou o corpo.
Ter conhecimento dos variados comportamentos que uma criana com TEA possa
apresentar frente aos estmulos internos e externos, nos variados contextos sociais, pode
auxiliar os profissionais, especialmente o professor, a entender melhor a criana. Assim,
poder observar e intervir de modo eficaz no contexto escolar, alm de direcionar na escolha
de estratgias pedaggicas que possam beneficiar a criana, considerando suas necessidades e
especificidades no modo de preparar o ambiente ou a situao, bem como selecionar o
material pedaggico para propiciar a aprendizagem e acolh-la de maneira apropriada.
Enfim, ter hoje conhecimento sobre o transtorno no uma necessidade somente dos
pais de crianas autistas e de profissionais que trabalham com elas, mas sim uma questo
ampla que envolve uma sociedade (SURIAN, 2010). Quando as pessoas conhecem o
transtorno aumentam-se as chances de elas contriburem no desenvolvimento das crianas
com TEA, oportunizando um convvio social mais agradvel para a criana e para seus pais
que, geralmente, restringem o convvio social da criana por no saberem lidar,
principalmente em pblico, com situaes inusitadas, porque se sentem constrangidos e
fragilizados diante dos comportamentos estereotipados, repetitivos e inflexveis dos filhos.
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2.3 DETECO E DIAGNSTICO DO TEA: A INTERFACE ENTRE O OLHAR DO
PROFISSIONAL DE EDUCAO E O OLHAR DO PROFISSIONAL DE SADE
Discutir sobre a importncia da deteco precoce e da avaliao diagnstica de
crianas com suspeita de TEA desafiador, principalmente, quando o assunto abordado por
um profissional de educao. Ao mesmo tempo em que desafiador, motivador, por ser
necessrio e oportuno, visto que o diagnstico percebido por alguns profissionais ou pessoas
que conhecem superficialmente o transtorno como algo rotulador. Todavia, o diagnstico no
dever ser utilizado com a inteno de rotular, mas para oferecer s crianas que sofrem os
impactos do transtorno a oportunidade de terem garantido o direito a um plano clnico e
teraputico de tratamento e serem inseridas nos servios educacionais, como o atendimento
educacional especializado (AEE). Esse atendimento disponibilizado aos educandos com
TEA no turno oposto sua escolarizao, a fim de que possam usufruir de intervenes
necessrias para que venham a ter melhor prognstico e consolidar outros direitos garantidos
pela Poltica Nacional de Proteo dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista
Lei n 12.764/2012 e pela Lei Brasileira de Incluso da Pessoa com Deficincia LEI n
13.146/ 2015 (BRASIL, 2012, 2015).
Desse modo, Bandim (2010, p. 47) esclarece o sentido do diagnstico, ao afirmar que
[...] o diagnstico no significa simplesmente um rtulo (como muitos profissionais desavisados costumam colocar); o diagnstico pode ser considerado como o princpio fundamental para um direcionamento e ponto
de partida para o tratamento mais adequado possvel.
Outra questo relevante refere-se ao estigma, que pode gerar constrangimentos para a
criana e seus pais. Para Siegel (2008, p. 113) o rtulo importante na medida em que abre
as portas a um plano de tratamento. Assim dever ser visto pelos profissionais da educao,
isto , jamais dever ser utilizado como estigma, engessando a prtica do professor ao supor,
erroneamente, que alunos com TEA no aprendem, nem podem ser contrariados, deixando,
assim, de promover oportunidades para que possam desenvolver a socializao, a
comunicao e criar estratgias para agirem e pensarem de modo mais flexvel.
Apesar do TEA ser um transtorno de etiologia desconhecida, que demanda muitas
explicaes, o crebro infantil tem grande plasticidade e est em desenvolvimento, cuja
estrutura e modo de funcionamento so modificados ao longo da vida, por meio de estmulos
ambientais e experincias obtidas no dia a dia (COSENZA; GUERRA, 2011). Assim,
corroboramos o pensamento de Siegel (2008, p. 40), ao inferir que o diagnstico de cada
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criana necessita de ser estabelecido com uma margem de certeza, mas tambm deve ser
acompanhado de informaes de qual a probabilidade de se vir a alterar.
Nesse sentido, profissionais de sade e de educao devem se unir e estabelecer uma
sincronia para, juntos, criarem oportunidades de interveno que auxiliem no
desenvolvimento e na aprendizagem da criana.
No ambiente escolar, quando a criana se depara com um professor/pesquisador que
constantemente participa de cursos de formao continuada e se interessa em conhecer sobre
o desenvolvimento infantil e os transtornos na infncia, a exemplo do TEA, isto faz uma
diferena no processo de desenvolvimento da criana. Ele ter mais fundamentos para
direcionar os pais a buscarem profissionais capacitados para investigar melhor essa suspeita.
Sobre essa questo, Cunha (2011) ressalta a participao dos professores da escola
como sendo fundamental na deteco do transtorno, pois muitos casos de comportamento
autstico foram percebidos no ambiente escolar. Por ser o autismo um dos transtornos do
neurodesenvolvimento que se apresenta na infncia, justamente quando o crebro da criana
est em processo de desenvolvimento, torna-se imprescindvel a todo profissional que
trabalha com crianas conhecer esse transtorno para que ele possa ser detectado e
diagnosticado precocemente. Desse modo, a infncia uma etapa do desenvolvimento
humano que merece bastante ateno dos pediatras e professores que lidam com a educao
infantil. Quanto mais cedo forem percebidos os sinais indicativos do transtorno, maiores sero
as chances de a criana obter melhor prognstico, em decorrncia dos profissionais
oportunizarem intervenes com base na elaborao de um plano de atendimento clnico e
educacional individualizado e direcionado para atender as necessidades da criana.
Tambm vale destacar que, no contexto escolar, antes de o professor realizar qualquer
observao, preciso que se aproprie do marco normal do desenvolvimento infantil para que
possa, na sua prtica de sala de aula, comparar e perceber os possveis atrasos do
desenvolvimento que possam estar acontecendo.
Outros pesquisadores como Silva, Gaiato e Reveles (2012, p. 25) abordam que,
cada pessoa tem seu tempo de amadurecimento, suas preferncias e seu jeito de ser. Porm, no caso do autismo, a conexo com o mundo que est
prejudicada. Esperar o tempo dessa criana perder tempo, deixar uma ave
rara presa em uma gaiola e esperar que ela saia voando sem abrirmos a porta.
Ainda sobre a deteco precoce do autismo, Lima (2012) enfatiza que, alm dos pais e
professores, os mdicos, principalmente os pediatras, devem prestar ateno aos primeiros
sinais de alerta da presena do transtorno, mesmo quando no aparecem no discurso dos pais.
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Isso pode ser verificado em Bandim (2010, p. 47), quando aponta para as melhores
chances de interveno mediante a rapidez de diagnstico:
Quanto mais precoce for o diagnstico, mais chances tem a criana de responder aos diversos tipos de intervenes, j que quanto mais nova a
criana, maior o que chamamos de plasticidade cerebral ou neuroplasticidade [...], quanto mais tempo perdemos em proceder o
diagnstico e consequentemente o tratamento, mais a criana vai
consolidando formas de comportamento rgidas e resistentes s intervenes, e mais e mais a famlia vai ficando desgastada e desacreditando
verdadeiramente no que seu filho tem e o que pode ser feito para ajud-lo.
Nesse sentido, quando os neurnios no so estimulados no perodo adequado do
desenvolvimento infantil, a criana deixa para trs etapas importantes que poderiam contribuir
no seu processo de desenvolvimento.
Para perceber um provvel atraso no desenvolvimento infantil, importante que o
pediatra, alm de observar a criana escute atentamente as queixas trazidas em consultrio
pelos pais relacionadas ao histrico de atraso ou perda da linguagem receptiva e expressiva,
comportamentos que expressam isolamento social, interesses especficos e inapropriados
idade, ausncia ou perda do interesse por brincadeiras e brinquedos, dentre outros
comportamentos. Segundo Lima (2012), a principal queixa dos pais e o motivo mais comum
para marcar uma consulta com especialista referem-se ao atraso de linguagem, que costuma
ser mais frequente quando a criana est com aproximadamente um ano e seis meses de idade.
Nesse sentido, vale ressaltar a importncia de realizar uma avaliao detalhada,