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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ - CAMPUS DE CASCAVEL CENTRO DE EDUCAÇÃO, COMUNICAÇÃO E ARTES CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM LETRAS NÍVEL DE MESTRADO PROFISSIONAL RENATA ZUCKI LETRAMENTO LITERÁRIO: PRÁTICAS DE LEITURA DO TEXTO LITERÁRIO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL CASCAVEL PR 2015

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ - CAMPUS DE CASCAVEL CENTRO DE EDUCAÇÃO, COMUNICAÇÃO E ARTES

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM LETRAS – NÍVEL DE MESTRADO PROFISSIONAL

RENATA ZUCKI

LETRAMENTO LITERÁRIO: PRÁTICAS DE LEITURA DO TEXTO LITERÁRIO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO

FUNDAMENTAL

CASCAVEL – PR 2015

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RENATA ZUCKI

LETRAMENTO LITERÁRIO: PRÁTICAS DE LEITURA DO TEXTO LITERÁRIO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO

FUNDAMENTAL

Dissertação apresentada à Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE – para obtenção do título de Mestre em Letras, junto ao Programa Stricto Sensu em Letras, Nível de Mestrado Profissional (Profletras). Linha de Pesquisa: Teorias da Linguagem e Ensino Orientador: Prof. Dr. Gilmei Francisco Fleck Coorientadora: Profª. Drª. Carmen Teresinha Baumgartner

CASCAVEL – PR 2015

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Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)

Z86L

Zucki, Renata

Letramento literário: práticas de leitura do texto literário nos anos iniciais

do ensino fundamental. /Renata Zucki.— Cascavel, 2015. 159 p.

Orientador: Prof. Dr. Gilmei Francisco Fleck Orientadora: Profª. Drª. Carmen Teresinha Baumgartner

Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual do Oeste do Paraná Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Letras – Nível de Mestrado Profissional

1.Letramento literário. 2. Estética da recepção. 3. Concepções e práticas

literárias. 4. Leituras intertextualizadas. I. Fleck, Gilmei Francisco. II. Baumgartner, Carmen Teresinha. III. Universidade Estadual do Oeste do Paraná. IV. Título.

CDD 20.ed. 372.4

800

Ficha catalográfica elaborada por Helena Soterio Bejio – CRB 9ª/965

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RENATA ZUCKI

LETRAMENTO LITERÁRIO: PRÁTICAS DE LEITURA DO TEXTO LITERÁRIO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Esta dissertação foi julgada adequada para a obtenção do Título de Mestre em Letras e aprovada em sua forma final pelo Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Letras, Nível de Mestrado Profissional (Profletras), área de concentração em Linguagens e Letramentos, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE.

COMISSÃO EXAMINADORA

________________________________________________________ Prof. Dr. Gilmei Fransisco Fleck (UNIOESTE-Profletras/Cascavel)

Orientador

_____________________________________________________________ Profª. Drª. Carmen Teresinha Baumgartner (UNIOESTE-Profletras/cascavel)

Coorientadora

_______________________________________________________ Profª. Dra. Giane Lessa

1º Membro Efetivo (UNILA- ILAACH-Foz do Iguaçu)

_______________________________________________________ Prof. Dr. Antonio Donizeti da Cruz

2º Membro Efetivo (UNIOESTE-Cascavel)

_______________________________________________________ Profª. Dra. Valdeci Batista de Melo Oliveira

3º Membro Efetivo (UNIOESTE-Profletras/Cascavel)

Cascavel, 06 de agosto de 2015.

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Aos meus filhos, Luís Gustavo e Fabio Luís:

meus maiores mestres e alunos.

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AGRADECIMENTOS

Ao Professor Dr. Gilmei Francisco Fleck, de quem tive o privilégio de ser

orientanda, pelas palavras de incentivo e intervenções enriquecedoras, pelos

exemplos de conhecimento e dedicação, de responsabilidade e firmeza.

À Professora Carmen Teresinha Baumgartner, pela coorientação amiga e

competente.

A todas as professoras do Mestrado, em especial às professoras Doutoras

Greice da Silva Castela e Valdeci Batista de Melo Oliveira, que participaram da

minha banca de qualificação, e me presentearam com valiosas contribuições,

apontando caminhos.

À Cris, secretária do PROFLETRAS, que em um exemplo de competência e

dedicação, sempre fez mais do que suas atribuições.

Ao MEC/CAPES, pelo Programa de Mestrado Profissional em Letras e pela

concessão da bolsa durante o período de 2013 a 2015, o que contribuiu

significativamente com a qualidade da pesquisa efetivada.

Às colegas do Mestrado, pelo convívio e trocas de experiências,

principalmente à Dani, minha parceira de todos os momentos.

À direção da escola onde trabalho, pela amizade e apoio constantes.

Às amigas da escola, pela presença, incentivo e votos de confiança.

Aos meus alunos, sujeitos de minha pesquisa, mas, principalmente, sujeitos

do meu aprendizado como professora e pesquisadora.

Ao Gustavo, meu esposo, amigo e conselheiro, pelo enorme incentivo e ajuda

em todas as horas e em todos os lugares.

A Deus, meu refúgio e minha fortaleza, meu Senhor, em quem eu confio...

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O poder de nossa sensibilidade e de nossa inteligência, só podemos desenvolvê-lo em nós mesmos, nas profundezas de nossa vida espiritual. Mas é nesse contato com os outros espíritos, que chamamos de leitura, que se faz a educação do espírito. (MARCEL PROUST, 1993).

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ZUCKI, Renata. LETRAMENTO LITERÁRIO: práticas de leitura do texto literário nos anos iniciais do ensino fundamental. 2015. (159 fs.) Dissertação (Mestrado Profissional em Letras - Profletras) – Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Cascavel. Orientador: Prof. Dr. Gilmei Francisco Fleck RESUMO: A pesquisa aqui apresentada focaliza-se em reflexões e análises sobre as práticas de leitura do texto literário na escola. A partir de estudos e de nosso conhecimento empírico sobre a temática, observamos inúmeros questionamentos que perpassam o assunto; entretanto, as questões mais importantes que motivaram a realização dessa pesquisa dizem respeito a como a leitura do texto literário contribui para o letramento e desenvolvimento do senso crítico dos alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental e, principalmente, como podemos construir um caminho na formação de um futuro leitor crítico, já no início do processo de escolarização. Com o propósito de encontrar respostas a essa problematização, investigamos e analisamos como vêm ocorrendo as práticas iniciais de letramento literário com alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental de uma Escola da Rede Municipal de Ensino de Cascavel - PR. Além disso, buscamos elaborar e propor práticas de leitura de textos de literatura, sob a forma de um Projeto de Intervenção Pedagógica (Oficinas Literárias), com vistas à constituição de uma proposta de letramento literário na referida escola; refletindo sobre a importância desse trabalho, bem como, analisando os problemas, dificuldades e resultados alcançados na realização dessas práticas por professores e alunos envolvidos nesse processo. Na perspectiva de alcançar os objetivos propostos, sustentamos a pesquisa nos pressupostos teóricos de autores que partilham da visão sociointeracionista da leitura, como Geraldi (1997) e Rojo (2004); e da essência artística e humanizadora da literatura, dentre os quais destacamos: Cândido (1972), Lajolo (1993), Azevedo (1999), Petit (2008), Zilberman (2009), Soares (2011), Cosson (2012) e Kleiman (2012), entre outros. Para embasar a elaboração de nosso Projeto de Intervenção, recorremos às proposições da Estética da Recepção, de Jauss (1994) e Iser (1979), e à concepção de Intertextualidade da Literatura Comparada, de Fillola (1994). Para a análise do objeto-problema: o processo de formação de leitores de literatura na escola (anos iniciais), realizamos um estudo exploratório em uma turma de 5º ano da escola investigada, utilizando uma abordagem qualitativa. Trata-se, portanto, de uma pesquisa bibliográfico-qualitativa, cujos procedimentos desenvolveram-se pelo viés da pesquisa-ação. Como resultado desse processo de investigação, entendemos que o trabalho escolar com a literatura não pode continuar a ocorrer de maneira intuitiva e espontânea, ou apenas servir de pretexto para o ensino da língua; mas que deve ser tomado como conhecimento elaborado, que contribui para a humanização e emancipação dos alunos, e que por isso precisa ser intencional e sistematizado desde o início do processo de escolarização. PALAVRAS-CHAVE: Letramento literário; Estética da recepção; Concepções e Práticas literárias; Leituras intertextualizadas.

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ZUCKI, Renata. Letramento literario: prácticas de lectura del texto literario en los años iniciales de la enseñanza fundamental. 2015. (159 páginas) Disertación (Maestría Profesional en Letras - Profletras) – Universidad Estadual del Oeste de Paraná. Director: Prof. Dr. Gilmei Francisco Fleck RESUMEN: La investigación que aquí presentamos se centra en la reflexión y el análisis sobre las prácticas de lectura de textos literarios en la escuela. A partir de nuestros estudios y conocimientos empíricos sobre el tema, observamos que hay numerosas preguntas que subyacen respeto el tema; sin embargo, los problemas más importantes que motivaron esta investigación se refieren a cómo la lectura de textos literarios contribuye para el desarrollo de la alfabetización y el pensamiento crítico de los estudiantes de los primeros años de la escuela primaria, y sobre todo cómo podemos construir un camino en la formación de un futuro lector crítico, al principio del proceso de escolarización. Con el propósito de encontrar respuestas a este cuestionamiento, investigamos y analizamos cómo se están produciendo prácticas iniciales de alfabetización literaria con los estudiantes en los primeros años de la enseñanza primaria de una Escuela de la Municipalidad de Cascavel - PR. Además, tratamos de desarrollar y proponer prácticas de lectura de textos literarios en la forma de un Proyecto de Intervención Pedagógico (Talleres Literarios), cuyo objetivo es el desarrollo de una propuesta de alfabetización literaria en la escuela; además de reflexionar sobre la importancia de este trabajo, así como el análisis de los problemas, las dificultades y los resultados en la consecución de estas prácticas por parte de los profesores y estudiantes involucrados en el proceso. En vista de la consecución de los objetivos propuestos buscamos soporte para la investigación en los presupuestos teóricos de los autores que comparten de la visión socio-interaccionista de la lectura como Geraldi (1997) y Rojo (2004); y la esencia artística y humanizadora de la literatura, entre los que podemos destacar: Cândido (1972), Lajolo (1993), Azevedo (1999), Petit (2008), Zilberman (2009), Soares (2011), Cosson (2012) e Kleiman (2012), entre otros. Para apoyar el desarrollo de nuestro proyecto de intervención, utilizamos las proposiciones de la Estética de la Recepción de Jauss (1994) e Iser (1979), y el diseño de la propuesta de Literatura Comparada e Intertextualidad de Fillola (1994). Para el análisis del objeto-problema: el proceso de educar a los lectores de la literatura en la escuela (primeros años), se realizó un estudio exploratorio con un 5 º año de la referida escuela, utilizando un enfoque cualitativo. Es esa, por lo tanto, una investigación-literatura cualitativa, cuyos procedimientos se han desarrollado por el sesgo de la investigación-acción. Como resultado del proceso de investigación, entendemos que el trabajo de la escuela con la literatura no puede continuar ocurriendo de manera intuitiva y espontánea, o simplemente como un pretexto para la enseñanza de idiomas; sino que debe ser tomado como conocimiento establecido, lo que contribuye a la humanización y la emancipación de los estudiantes, y por lo tanto tiene que ser intencional y sistemático desde el inicio del proceso de escolarización. PALABRAS CLAVE: Alfabetización literaria; Estética de la Recepción; Conceptos y prácticas literarias; Lecturas intertextualizadas.

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ZUCKI, Renata. Literary literacy: reading practices of literary texts in the early years of Elementary School. 2015. (159 pages) Dissertation (Masters‟ in Letters - Profletras) – State University of West Paraná. Cascavel. Tutor: Prof. Dr. Gilmei Francisco Fleck ABSTRACT: The research presented here focuses on the reflection and analysis of reading practices of literary texts in school. From our studies and empirical knowledge on the subject, we observed numerous questions that underlie the mentioned subject; however, the most important issues that motivated this survey is related to how the reading process of literary texts contributes to the development of literacy and critical thinking of students in the early years of Elementary School, and especially how we can build up a path in the formation of a future critical reader early in the schooling process. With the purpose of finding answers to this questions we investigated and analyzed how are occurring the initial literary literacy practices with students in the early years of elementary school of Cascavel - PR. In addition, we developed and proposed practical reading of literature texts in the form of a Pedagogic Intervention Project (Literary Workshops), aimed to develop a proposal for literary literacy at the school; reflecting on the importance of this work, as well as analyzing the problems, difficulties and results in achieving these practices by teachers and students involved in this process. In view of achieving the proposed objectives, we sustained our research upon theoretical assumptions of authors who share the socio-interactionist view of reading such as Geraldi (1997) and Rojo (2004); and the artistic and humanizing essence of Literature, among which we highlight: Cândido (1972), Lajolo (1993), Azevedo (1999), Petit (2008), Zilberman (2009), Soares (2011), Cosson (2012) and Kleiman (2012), among others. To support the development of our Intervention Project, we use the propositions of the Aesthetic Reception by Jauss (1994) and Iser (1979), and the design of Intertextuality of Comparative Literature by Fillola (1994). For the analysis of our object-problem: the process of educating readers of literature in school (early years), we conducted an exploratory study in a class of 5th grade at the mentioned school, using a qualitative approach. It is, therefore, a Literature-qualitative research, in which the procedures were developed by the research-action bias. As a result of the research process we understand that the school work with Literature can not continue to occur intuitively and spontaneously, or merely as a pretext for Language teaching; but it must be taken as an established knowledge which contributes to the humanization and emancipation of students, and therefore it needs to be done intentionally and systematically since the beginning of the schooling process. KEYWORDS: Literary literacy; Aesthetics of reception; Literary concepts and practices; Intertextualized readings.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – HIS ONLY FRIEND – Briton Rivière ........................................................ 76

Figura 2 – MENINO COM UM CÃO – Pablo Picasso ................................................ 76

Figura 3 – MENINO COM CÃO – Edouard Manet ................................................... 76

Figura 4 – TURMA DA MÔNICA: Dona Morte– Maurício de Souza .......................... 79

Figura 5 – TURMA DA MÔNICA: Chico Bento e Rosinha – Maurício de Souza ....... 79

Figura 6 – TURMA DA MÔNICA: Cascão e Cebolinha – Maurício de Souza .......... 79

Figura 7 – TURMA DA MÔNICA: Cebolinha – Maurício de Souza ........................... 79

Figura 8 – TURMA DA MÔNICA: Mônica e Magali – Maurício de Souza ................. 79

Figura 9 – TURMA DA MÔNICA: Personagens – Maurício de Souza ...................... 79

Figura 10 – TURMA DA MÔNICA: Chico Bento – Maurício de Souza ...................... 79

Figura 11 – TURMA DA MÔNICA: Mônica – Maurício de Souza .............................. 80

Figura 12 – TURMA DA MÔNICA: Chico Bento – Maurício de Souza ...................... 80

Figura 13 – TURMA DA MÔNICA: Astronauta – Maurício de Souza ........................ 80

Figura 14 – TURMA DA MÔNICA: Rei Leonino – Maurício de Souza ..................... 80

Figura 15 – TURMA DA MÔNICA: Magali – Maurício de Souza ............................... 80

Figura 16 – O CASTELO SCHARFFENBERG – Ernst Ferdinand Oehme ................ 82

Figura 17 – O CASTELO DOS PAPAS DE AVIGNON – Paul Signac ...................... 83

Figura 18 – SEM TÍTULO – óleo sobre tela – Jacob Isaakszoon van Ruisdael ........ 83

Figura 19 – CASTELO EM MONEMVASIA – Constantine Maleas ........................... 84

Figura 20 – O CASTELO EM LA ROCHE-GUYON – Georges Braque ..................... 84

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 13

I PARTE: REFLEXÕES TEÓRICAS

1 AS PRÁTICAS DE LEITURA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO

FUNDAMENTAL: REFLEXÕES INICIAIS ................................................................ 24

1.1 A LEITURA E SUAS CONCEPÇÕES: MÚLTIPLAS VISÕES DE UM PROCESSO ....... 25

1.2 LEITURA, ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO: ENTRE CONCEITOS E

RELAÇÕES ............................................................................................................... 31

1.3 A LITERATURA E O LETRAMENTO LITERÁRIO: FERRAMENTAS PARA

FORMAR CULTURALMENTE O CIDADÃO ............................................................. 37

1.4 A CRIANÇA, A LITERATURA INFANTIL E A ESCOLA: UMA RELAÇÃO DE

APRENDIZAGEM QUE DEVE SER ESTIMULADA E CUIDADA .............................. 41

1.5 A LEITURA DO TEXTO LITERÁRIO: EXERCÍCIO DE HUMANIZAÇÃO DO

HOMEM E DA SOCIEDADE ..................................................................................... 48

II PARTE: PRÁTICAS DE LEITURA DO TEXTO LITERÁRIO

2 O PERCURSO METODOLÓGICO: MEIOS E FORMAS PARA ALCANÇAR

PROPÓSITOS ........................................................................................................... 56

2.1 ABORDAGEM METODOLÓGICA: TRAJETÓRIA ORGANIZACIONAL DA

PESQUISA ................................................................................................................ 56

2.2 CONTEXTO DA PESQUISA: O CAMPO DAS AÇÕES ...................................... 59

2.3 OFICINAS DE LEITURA LITERÁRIA: PLANEJAMENTO ESTRUTURADO DE

AÇÕES PARA LEITURA DO TEXTO DE LITERATURA .......................................... 63

2.3.1 Desenvolvimento sistemático das atividades: efetivação das práticas de

leitura ....................................................................................................................... 72

III PARTE: REFLEXÕES ANALÍTICO-CRÍTICAS SOBRE AS PRÁTICAS

EFETUADAS

3 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES .................................................................... 88

3.1 A ESCOLA INVESTIGADA E SUA RELAÇÃO COM A LITERATURA: O

ESPAÇO INSTITUCIONAL DA FORMAÇÃO DO LEITOR ....................................... 89

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3.2 APLICAÇÃO DA PROPOSTA PEDAGÓGICO-LITERÁRIA: EM BUSCA DO

PRAZER NA LEITURA .............................................................................................. 92

3.2.1 Módulo I ........................................................................................................... 92

3.2.2 Módulo II .......................................................................................................... 95

3.2.3 Módulo III ......................................................................................................... 97

3.2.4 Módulo IV ...................................................................................................... 100

3.3 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS: AS PRÁTICAS SOB UM

OLHAR CRÍTICO .................................................................................................... 103

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 115

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 121

ANEXOS ................................................................................................................. 126

Anexo 1 – DIÁRIO DE CAMPO: Tabela de aplicação e anotações do Módulo 1 .... 126

Anexo 2 – DIÁRIO DE CAMPO: Tabela de aplicação e anotações do Módulo 2 .... 129

Anexo 3 – DIÁRIO DE CAMPO: Tabela de aplicação e anotações do Módulo 3 .... 133

Anexo 4 – DIÁRIO DE CAMPO: Tabela de aplicação e anotações do Módulo 4 .... 136

Anexo 5 – Conto: “A vendedora de fósforos” (Hans Christian Andersen) ............... 141

Anexo 6 – RELATÓRIO DE OBSERVAÇÃO I: ........................................................ 143

Anexo 7 – RELATÓRIO DE OBSERVAÇÃO II: ....................................................... 147

Anexo 8 – Mostra de atividades .............................................................................. 157

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INTRODUÇÃO

Pela nossa prática docente na área de Língua Portuguesa, observamos que

entre gestores, professores e estudiosos, muito se tem falado sobre a importância

da leitura na escola, atribuindo-se à literatura um papel essencial na formação de

leitores produtores de sentidos e com senso crítico em relação ao ato de ler.

Como sabemos, a escola é, por excelência, a instituição responsável pela

sistematização e transmissão das experiências social e historicamente acumuladas

pela humanidade. Cabe à escola, portanto, a passagem dos conhecimentos

cotidianos (os quais todos os indivíduos dominam e dos quais fazem parte) para os

elementos das esferas não cotidianas, como a Ciência, a Filosofia e a Arte; ou seja,

os saberes elaborados, acumulados pelo gênero humano ao longo da história. Para

tanto, o principal mecanismo para a apropriação desses saberes é a leitura. Leitura

essa compreendida de acordo com a concepção interacionista de linguagem, na

qual o ato de ler é visto como um processo dialógico, interlocutivo (BAKHTIN, 1992).

Para se formar leitores, então, não basta que os indivíduos saibam

decodificar, é preciso que eles façam uso da habilidade de leitura em seus diversos

contextos de interação e atuação. É dessa preocupação com o uso que surge o

termo letramento, o qual passa a ser compreendido como a capacidade do indivíduo

de usar a leitura e a escrita como um meio de tomar consciência da realidade para

transformá-la.

Para que o letramento, sob o ponto de vista da prática social, seja de fato

desenvolvido, a escola não só deve atentar aos textos lidos, mas também à forma

como a leitura está sendo mediada e incentivada pelos professores e realizada pelos

alunos. Isto é: é necessário levar em conta o que está sendo lido e, principalmente,

a forma como a leitura está sendo feita.

É consenso, como já foi destacado anteriormente, atribuir à escola a

responsabilidade de formar leitores. Todos concordam, também, que a escola tem

papel fundamental como promotora do gosto pela leitura. Compreendendo isso, é de

extrema importância que o trabalho com o texto literário seja incorporado às práticas

cotidianas de sala de aula, justamente por se tratar de uma forma específica de

conhecimento.

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A literatura é, desse modo, tomada como uma maneira particular de acesso

aos saberes elaborados social e historicamente. Nessa perspectiva, Lajolo (1993)

enfatiza a importância de a literatura estar presente no currículo escolar:

[...] é à literatura, como linguagem e como instituição, que se confiam os diferentes imaginários, as diferentes sensibilidades, valores e comportamentos através dos quais uma sociedade expressa e discute, simbolicamente, seus impasses, seus desejos, suas utopias. Por isso a literatura é importante no currículo escolar: o cidadão, para exercer plenamente sua cidadania, precisa apossar-se da linguagem literária, alfabetizar-se nela, tornar-se seu usuário competente, mesmo que nunca vá escrever um livro. (LAJOLO, 1993, p. 106-107).

Como destaca Lajolo, é preciso garantir a todos o acesso a essa produção

cultural tão importante, cabendo ao indivíduo, posteriormente e de acordo com a

consciência adquirida, refutá-la ou decidir-se por ela. Assim, em um país

democrático, o letramento literário não deveria ser privilégio de uma minoria, como

bem nos lembra Jane Paiva (2007, p. 120) ao mencionar que: “para as classes

dominantes ler é sinônimo de literatura; enquanto que para as classes populares, as

múltiplas leituras do cotidiano”.

Dessa forma, não apenas a alfabetização deve ser discutida como um direito

de todo cidadão, mas também o letramento, e dentro dele: o letramento literário, por

se configurar em um saber estético elaborado; ou seja, todos, indistintamente,

deveriam ter a possibilidade de apropriar-se da riqueza cultural, científica e artística

produzida historicamente pela humanidade, incluindo-se a Literatura.

Nesse sentido vale retomar as palavras de Antoine Compagnon (2012), sobre

o papel da literatura:

[...] fonte de inspiração, a literatura auxilia no desenvolvimento de nossa personalidade ou em nossa „educação sentimental‟, [...]. Ela permite acessar uma experiência sensível e um conhecimento moral que seria difícil, até mesmo impossível, de se adquirir nos tratados dos filósofos. (COMPAGNON, 2012, p. 59).

Consoante ao pensamento do autor, Rildo Cosson (2012, p. 17) aponta que

“a experiência literária não só nos permite saber da vida por meio da experiência do

outro, como também vivenciar essa experiência”. Ou seja, a leitura do texto literário

torna o mundo e suas relações mais compreensíveis, principalmente para as

crianças, por não possuírem ainda uma vivência mais aprofundada e bagagem das

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diversas esferas da vida humana. Assim, a criança, pelas características de

sensibilidade que são próprias a essa fase do desenvolvimento, identifica-se com a

literatura, à medida que esta torna “o mundo mais compreensível, transformando

sua materialidade em palavras de cores, odores, sabores e formas intensamente

humanas” (COSSON, 2012, p. 17).

Sobre essa peculiaridade da literatura de ampliar e enriquecer a nossa visão

da realidade, bem como de produzir experiências, sem que estas sejam,

necessariamente, vividas na concretude do cotidiano, Anatol Rosenfeld (1976)

argumenta que

[...] de um modo geral, a literatura [...] permite ao leitor a vivência intensa e ao mesmo tempo a contemplação crítica das condições e possibilidades da existência humana. [...] A literatura é o lugar privilegiado em que a experiência „vivida‟ e a contemplação crítica coincidem num conhecimento singular, cujo critério não é exatamente a „verdade‟ e sim a „validade‟ de uma interpretação profunda da realidade tornada em experiência. (ROSENFELD, 1976, p. 53-54).

Além disso, compreendemos que a literatura é também uma fonte de prazer e

de estímulo à expressão do pensamento, da imaginação e da criatividade. Ao ler,

ouvir e contar histórias, a criança, mesmo não alfabetizada, constrói sentidos e

significados, expressa sentimentos, cria seu próprio mundo, vivenciando suas

fantasias. Desse modo, o envolvimento com o mundo da fantasia lhe oportuniza o

conhecimento de si e do ambiente que a cerca.

Contudo, apesar das possibilidades de construções de sentidos que a

literatura pode proporcionar, bem como de seu caráter humanizador, o que

observamos no contexto escolar em que atuamos (enquanto professora de Língua

Portuguesa dos anos iniciais do Ensino Fundamental, no município de Cascavel,

Paraná) é que o texto literário vem sendo reduzido a pretexto para o ensino da

língua, da gramática, da ortografia e de gêneros textuais. Tal abordagem tende a

esvaziá-lo de seu mais precioso sentido poético. Dessa forma, a leitura dos textos

de literatura nos anos iniciais de escolarização tem sido limitada à utilidade que se

pretende dar a esses textos, ou, utiliza-se o texto literário como ensejo para discutir

situações tematicamente interligadas. Há também a confusão, por parte dos

professores, entre a obra literária e a paradidática, como nos aponta Ricardo

Azevedo:

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Há, não podemos esquecer, o caso dos livros paradidáticos, aqueles que pretendem „distrair educando‟. Boa parte dos livros dirigidos ao público infantil pertence a essa categoria. Eles se utilizam da ficção de forma utilitária e têm necessariamente uma mensagem única (uma utilidade) no final [...] (AZEVEDO, 1999, s/p).

Somado a isso, destacamos ainda a separação e rotulação dos leitores

(alunos) segundo a faixa etária ou série escolar, como se grupos de idade

apresentassem as mesmas características e fossem homogêneos, ou se houvesse

padronização e gradação da experiência humana. À essa configuração dos livros de

literatura infantil estão vinculados os fins lucrativos, uma vez que o mercado editorial

percebeu o crescimento da demanda desse produto e usa desse artifício para

produzir livros para serem consumidos nas escolas. Nesse sentido, como afirma

Lajolo (1993, p. 29),

[...] a complexidade crescente da indústria editorial moderna exige compatibilização de demanda e produção, orientando uma pela outra, criando uma em função da outra, reforçando uma e otimizando outra: são essas providências que garantem a sobrevivência do mercado.

Quando as editoras se pautam, unicamente, na observância de faixas etárias

para classificarem os livros de literatura infantil, estão indiretamente atestando que

não existem diferenças entre as crianças, quanto ao seu nível de desenvolvimento.

Ou seja, ao padronizar o que cada “idade ou etapa” pode ler, como adverte Azevedo

(2007), o mercado editorial elimina as experiências individuais da criança (as quais

variam de sujeito para sujeito, tendo em vista os diferentes contextos socioculturais

nos quais cada um está inserido) e generalizam os leitores dessa literatura.

Não queremos dizer com isso que as crianças possam ou tenham que ler

qualquer obra literária. Nem toda a leitura é adequada à infância, quer seja por seus

temas, quer seja pela sua complexidade linguística. Entretanto, uma rotulação fixa,

que desconsidere o desenvolvimento e potencialidades infantis (a criança como

sujeito social: sua história, suas experiências e ligações com o livro) também não é

meio eficaz de promover o gosto pela leitura. Pautando-nos, novamente, no

pensamento de Ricardo Azevedo (2007, p. 83) destacamos que

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[...] a crença num mundo abstrato e higiênico, dividido em faixas etárias, mundo que simplesmente ignora a experiência das coisas, concreta e individual, vivida por cada um de nós, somada à confusão existente entre os diferentes tipos de livros produzidos – confusão, diga-se de passagem, alimentada justamente pelas concepções que arbitrariamente dividem as pessoas em faixas de idade – podem ajudar muito a estabelecer „fatias‟ do mercado editorial ou a facilitar a organização burocrática das escolas, mas, a nosso ver, não têm contribuído para formar cidadãos criativos, participantes, dotados de senso crítico e visão humanista da vida e do mundo.

Assim, percebemos que a classificação de literatura por faixa etária está mais

atrelada aos fins lucrativos, utilitários e ideológicos de determinados grupos (o que

contribui para o consumismo) e com as expectativas das escolas que esperam por

uma literatura pedagógica, do que com a literatura emancipadora, que desenvolva a

criatividade, a imaginação e que tenha uma função social.

Também apontamos aqui as condições oferecidas para a leitura literária na

escola. Tais circunstâncias influenciam sobremaneira as perspectivas e resultados

dessa leitura: o acervo e instalações/acomodações da biblioteca escolar, bem como

a metodologia e encaminhamentos práticos de leitura mediados pelo professor.

Quando nos voltamos para as questões sobre a prática com a literatura em

sala de aula observamos, a partir dessa nossa experiência escolar cotidiana, uma

tendência de os professores explorarem apenas os aspectos formais e estruturais do

texto literário, com vistas à produção de fichas, questionários e resumos.

Constatamos, com isso, que as atividades de leitura propostas pela escola, na sua

grande maioria, constituem-se de abordagens mecânicas que não levam ao

entendimento mais profundo do texto, nem à formação de um leitor crítico, como

pretendem os planejamentos e documentos oficias.

Quanto às condições físicas e materiais para a realização das práticas de

leitura, verificamos que, apesar do espaço físico da escola investigada ser pequeno

e desconfortável, o acervo da biblioteca é muito bom, considerando os investimentos

provenientes do MEC com relação à quantidade e qualidade das obras. Contudo,

um aspecto chama muito a atenção: a constatação de que os alunos, por orientação

da direção e coordenação escolar, não podem manusear os livros novos, apenas os

exemplares mais antigos, devido ao risco de sujarem ou extraviarem o material

recebido. Sendo assim, restringir o acesso dos alunos somente a um mesmo

material de leitura (livros mais velhos) e não promover contato com outras diferentes

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leituras literárias dificulta o desenvolvimento de uma proposta para o letramento

literário.

Sobre essa necessidade do contato direto do aluno com o livro Regina

Zilberman (2009) indica que o trabalho de leitura deve ser feito na escola no sentido

de resgatar a interação com a obra de ficção, o que possibilita uma nova relação

entre alunos e texto, além de proporcionar o enriquecimento desse leitor e de novas

descobertas, pois,

[...] consequentemente, a proposta de que a leitura seja enfatizada na sala de aula significa o resgate de sua função primordial, buscando, sobretudo, a recuperação do contato do aluno com a obra de ficção. (ZILBERMAN, 2009, p. 35).

Nesse sentido, a existência de um bom acervo literário na escola não é

garantia de formação de bons leitores, principalmente se esses leitores não tiverem

a oportunidade de manusear as obras, pois é esse contato direto que vai ajudar a

despertar a curiosidade e a vontade de ler no aluno.

Contudo, outra faceta dessa realidade também foi observada: a maioria das

salas de aula contam com “caixas de livros literários”, que os professores organizam

e fazem circular entre seus alunos. Consideramos, a princípio, essa presença muito

favorável por proporcionar avanços na qualidade de leitura, já que os alunos não

podem manusear livremente os livros da biblioteca. Porém, constatamos que não é

feito nenhum trabalho específico com os livros que são lidos em sala de aula.

Assim, ao afirmarmos a importância de não se restringir a liberdade do aluno

ao acesso dos livros, também não podemos acreditar que a simples exposição do

aluno ao texto seria suficiente para que ele se tornasse um leitor mais consciente e

maduro. O acesso é importante, mas sem um trabalho intencional e metódico, torna-

se inútil.

Essas são algumas questões que temos percebido sobre o trabalho com o

texto literário em salas de aula da Rede Municipal de Cascavel, a partir de nosso

trabalho docente e vivências do cotidiano escolar. Acrescentamos a isso, o fato dos

documentos oficiais que norteiam as ações e práticas de ensino no município:

Currículo para a Rede Municipal de Ensino de Cascavel e PCN1 não oportunizarem

1 Convém aqui ressaltar que, apesar do sistema municipal de ensino de Cascavel – PR ter proposta e

currículo próprios, todos os livros didáticos distribuídos no município (por meio do Programa Nacional

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uma discussão teórico-metodológica acerca das especificidades do texto literário no

ensino fundamental. Isto é, tais documentos, em geral, afirmam e ressaltam o

caráter subjetivo da literatura enquanto potencial humanizador e emancipador,

entretanto, não apontam caminhos para a sistematização do texto literário em sala

de aula.

Bordini e Aguiar (1988) observam que os professores querem incentivar

posturas críticas e participantes de seus alunos em relação à realidade social que os

circunda, mas que acabam valendo-se dos mesmos encaminhamentos pedagógicos

que recaem na obrigatoriedade, dando-se por satisfeitos com leituras superficiais

dos textos solicitados e preenchimentos de fichas, redação de resumos e resolução

de exercícios escritos. Concordamos com as autoras quando afirmam que

[...] se os métodos de ensino, como ficaram comprovado, encerram pouca margem para a imaginação e a criatividade e não acolhem práticas familiares ou desafiadoras aos alunos, é possível deduzir-se que o problema reside mais nesses métodos do que na bagagem cultural prévia daqueles que frequentam a escola. (BORDINI e AGUIAR, 1988, p. 33).

Pode-se constatar que, embora muito discutido do ponto de vista teórico, o

ensino de literatura continua sendo um desafio para pesquisadores e professores. É

preciso que as discussões teóricas não se percam no discurso, mas que apresentem

contribuições significativas para propostas metodológicas sobre o tratamento do

texto literário em sala de aula.

Os professores, algumas vezes, deixam de aplicar técnicas e estratégias

adequadas à aprendizagem por não as conhecerem e, por consequência, não

conseguem dinamizar ou dar um bom direcionamento às aulas de leitura. Portanto,

ou ministram aulas de literatura com pouco conhecimento acerca das teorias

necessárias ou fazem da leitura algo distante da literatura. E essa situação precisa

mudar.

Para tanto, devemos encontrar caminhos a fim de que o ensino da literatura

seja valorizado e dinamizado sob outro enfoque, divergente do panorama

do Livro Didático – PNLD) seguem e/ou estão adequados aos Parâmetros Curriculares Nacionais

(PCN); por isso, mesmo que de maneira indireta, as concepções previstas nos PCN perpassam o

trabalho didático com a disciplina nas escolas que fazem uso do livro como instrumento de ensino.

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observado. Por isso, sabendo que a leitura do texto literário contribui para o

letramento e desenvolvimento do senso crítico dos alunos, a questão fulcral que

permeia esta pesquisa é como podemos construir um caminho na formação de um

futuro leitor literário, já no início do processo de escolarização, em um contexto

escolar que não privilegia a formação de leitores críticos e autônomos.

Na tentativa de encontrar respostas a tal questionamento, buscamos adaptar

e aprofundar o método comparatista proposto pelo pesquisador Antonio Mendonza

Fillola em sua obra Literatura Comparada e Intertextualidad (1994), aplicando-o em

nossa realidade escolar. É precisamente pelo aspecto da aplicação didática que os

estudos de Mendoza Fillola se destacam no cenário da produção intelectual sobre o

processo de leitura.

O autor espanhol, pouco conhecido no contexto educacional brasileiro, mas

amplamente referenciado por professores, acadêmicos e pesquisadores íbero-

portugueses, ancora-se nos conceitos de dialogismo bakthiniano e de

intertextualidade, bem como nos fundamentos da Estética da Recepção, e

compreende que nenhum texto pode ser lido independente da experiência que o

leitor tem de outros textos (verbais e não verbais, orais ou escritos) anteriores, com

os quais interagiu ao longo de sua vida, o que vai influenciar na construção de

sentidos para determinada obra.

Outro aspecto que destacamos como muito produtivo no método comparatista

desenvolvido por Fillola (1994) é a aproximação e análise de produções literárias

com outras criações artísticas, em particular com a pintura. Atividade esta, que se

torna sinônimo de ampliação ou ativação de intertexto, e que se mostra bastante

prazerosa para o leitor, especialmente para as crianças, tendo em vista seu gosto

lúdico. Assim, o autor insiste, explicitamente, na incorporação da Literatura

Comparada ao ensino, como forma de ativar, no leitor, vários conhecimentos e

habilidades de linguagem, bem como o desenvolvimento de estratégias de

monitoramento metacognitivos que levam a perceber os contrastes expressivos

entre textos escritos e outros códigos artísticos; o que julgamos ser bastante

profícuo para as séries iniciais, considerando que os alunos dessa faixa etária, em

sua grande maioria, possuem poucas experiências estéticas.

Ao pensar na formação do leitor literário contemporâneo, Fillola (1994)

demonstra que a troca de experiências e a diversidade de interpretações

apresentam-se como alternativa à ampliação e ao enriquecimento da realidade,

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permitindo ao leitor a reflexão crítica sobre a existência humana por meio do texto

literário. Consequentemente, a leitura literária pode fomentar a pluralidade cultural

do aluno.

Dessa forma, nossa pesquisa insere-se no contexto da atual tendência

educacional e de políticas públicas que se preocupam com a formação de leitores e

com a democratização da leitura. Desenvolver e socializar estudos que visam a

problematizar essas práticas de formação de leitores contribuem com as atuais

reflexões, em voga no meio acadêmico, sobre a relação entre leitura e democracia

cultural, essa “entendida como distribuição equitativa de bens simbólicos,

considerados estes como aqueles que são, fundamentalmente, significações, só

secundariamente, mercadorias” (SOARES, 2008, p. 18).

Assim, no intuito de focalizar o olhar acadêmico para as práticas com a

literatura infantil e juvenil em sala de aula e na intenção de problematizá-las em um

contexto em que a educação tem privilegiado o processo de alfabetização em

detrimento da formação de leitores, realizou-se a presente pesquisa.

Nesta pesquisa sobre o letramento literário na escola, descrevemos e

analisamos, por meio de um estudo exploratório de base qualitativa, como vêm

ocorrendo algumas práticas iniciais de letramento literário em uma turma de 5º ano

do Ensino Fundamental de uma Escola da Rede Municipal de Ensino de Cascavel -

PR, bem como algumas das implicações dessas práticas na formação leitora dos

alunos. Além disso, buscamos elaborar e propor práticas de leitura de textos de

literatura fundamentadas nos estudos comparatistas de Fillola (1994), com vistas à

constituição de uma proposta de letramento literário na referida escola. A partir da

aplicação de nosso projeto de leitura literária, refletimos sobre a importância desse

trabalho e analisamos os problemas, dificuldades e resultados alcançados na

realização dessas práticas, tanto por parte dos professores, quanto dos alunos

envolvidos nesse processo.

Ao se abordar especificamente a literatura na pesquisa e não a leitura, de

forma geral, intenta-se reforçar a importância e especificidade das obras literárias,

que constituem material indispensável para que se aflore a criatividade e se amplie a

possibilidade de múltiplas leituras de mundo.

Para fundamentarmos a metodologia da pesquisa baseamo-nos nos estudos

de Marli André (2008), por chamar a atenção dos professores e pesquisadores para

a necessidade de se observar as dimensões pessoal e interacional, bem como as

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dimensões institucional e sociocultural no ambiente escolar. Desse modo, a

pesquisa qualitativa foi adotada para o desenvolvimento das presentes atividades,

tendo em vista sua preocupação com a interpretação dos fenômenos (em seus

ambientes naturais) em termos dos significados que as pessoas envolvidas neles

conferem, a fim de compreender a situação da problemática e ajudar os investigados

na solução de tais problemas. Citamos também Silva e Menezes (2001), as quais

apontam que

[...] a interpretação dos fenômenos e a atribuição de significados são básicas no processo de pesquisa qualitativa. Não requer o uso de métodos e técnicas estatísticas. O ambiente natural é a fonte direta para coleta de dados e o pesquisador é o instrumento-chave. É descritiva. [...] O processo e seu significado são os focos principais de abordagem. (SILVA; MENEZES, 2001, p. 20).

Nessa perspectiva, a pesquisa qualitativa prevê, não somente a interação

direta do pesquisador com o(s) pesquisado(s) em seu cotidiano (contextos naturais),

como também descreve o processo e os significados das práticas investigadas.

Além disso, do ponto de vista dos procedimentos técnicos, optamos pelo viés da

Pesquisa-Ação, por considerarmos a estreita relação entre a ação investigativa e a

perspectiva de resolução de um problema coletivo observado; isto é, ao mesmo

tempo em que analisamos teoricamente um dado problema da realidade

educacional, nos propomos a apontar alternativas de enfrentamento para tal

situação.

Destacamos, a partir daí, a revisão teórica de alguns fundamentos que dão

suporte à ideia de que os alunos necessitam não apenas ser alfabetizados, mas

orientados, consciente e sistematicamente, para as amplas possibilidades

polissêmicas que a leitura dos textos de literatura pode propiciar. Para tanto,

apoiamo-nos em pesquisadores que partilham da visão interacionista da leitura,

como Geraldi (1997) e Rojo (2004), e da essência artística e humanizadora da

Literatura, dentre os quais destacamos: Cândido (1972), Lajolo (1993), Azevedo

(1999), Petit (2008), Zilberman (2009), Soares (2011), Cosson (2012) e Kleiman

(2012), entre outros.

Para embasar a elaboração do projeto de prática de leituras do texto literário,

com vistas ao letramento literário dos educandos do Ensino Fundamental fez-se

necessário recorremos às proposições da Estética da Recepção, de Iser (1979) e

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Jauss (1994), e à concepção de Intertextualidade da Literatura Comparada, de

acordo com Fillola (1994). Tal procedimento também foi fundamental nas etapas de

preparação das atividades de leitura e a posterior análise dos resultados

alcançados, conferindo sustentabilidade às conclusões que foram expressas em

relação às práticas efetuadas. Sendo assim, esta é uma pesquisa que propõe

também a elaboração e aplicação de um projeto de intervenção pedagógica, sob a

forma de Oficinas de Leitura Literária, nas quais se analisa a recepção dos alunos

após a aplicação de cada módulo do projeto, à luz da teoria abordada.

Para tanto, organizamos este trabalho da seguinte maneira: na primeira parte

(Capítulo 1) – revisão bibliográfica – delimitamos e discutimos a pertinência do tema

proposto por meio do referencial teórico, e buscamos um diálogo com diversos

autores que tratam dos conceitos relacionados a esta pesquisa. Na segunda parte

(Capítulo 2) – projeto de leitura literária – apresentamos, de maneira fundamentada

e planejada, o projeto de intervenção pedagógica de leitura do texto literário (para as

séries iniciais do Ensino Fundamental), propondo atividades que visam à construção

de um leitor interpretativo e crítico. A partir da aplicação do projeto (Oficinas de

Leitura Literária), propõe-se, na terceira parte (Capítulo 3) – reflexões críticas sobre

a prática efetuada –, a análise dos resultados da intervenção – com considerações

sobre as possibilidades de alcançar os objetivos propostos com tais práticas.

Consideramos a pesquisa abrangente pelo seu tema e aos fins a que se

destina – dissertação de mestrado profissional – contudo, os estudos aqui propostos

visam a, primordialmente, um melhor conhecimento sobre ensino da literatura nas

séries iniciais e sua recepção pelos alunos. Há um mundo a ser descoberto no

âmbito da literatura infantil e infanto-juvenil em sala de aula e sobre a importância

que hoje a escola atribui aos textos literários, como instrumento de educação,

socialização e humanização; não apenas de maneira intuitiva e espontânea, mas

tomado como conhecimento elaborado e sistematizado.

Acreditamos que a educação pela Literatura tem a tarefa de proporcionar

oportunidades de convívio dos alunos com a imaginação e a criatividade. Um projeto

educativo que se apoie nessa perspectiva fortalece o potencial de cada criança (pois

revela sua originalidade, estimula sua expressão e respeita iniciativas diferenciadas

de preferências, gostos, tendências e habilidades individuais), contribuindo,

significativamente, para a formação de sujeitos críticos.

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I PARTE: REFLEXÕES TEÓRICAS

1 AS PRÁTICAS DE LEITURA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO

FUNDAMENTAL: REFLEXÕES INICIAIS

Neste primeiro capítulo, discutiremos o tema que é foco desta pesquisa: a

necessidade de uma proposta de letramento literário nas séries iniciais do Ensino

Fundamental. Para tanto, partimos da ideia de que o trabalho sistematizado com a

Literatura – entre as possibilidades está a forma como o elaboramos nas práticas

propostas mais adiante –, amparado em teorias consistentes e metodologias que lhe

sejam coerentes, deve iniciar-se já na fase de alfabetização, e constitui-se, portanto,

em um valioso instrumento para o letramento crítico dos alunos.

Assim, procuramos mostrar, inicialmente, que o modo como a leitura se

realiza em sala de aula depende da concepção de linguagem a que está vinculada.

E é das diferentes concepções de linguagem (e consequentemente de leitura) que

decorrem os conceitos de alfabetização e letramento. Nos dias de hoje, ser

alfabetizado, isto é, saber ler e escrever, tem se mostrado condição insuficiente para

responder adequadamente às demandas da sociedade contemporânea, as quais

exigem dos indivíduos uma maior capacidade de entender os significados e usos

das palavras em diferentes contextos sociais, ou seja, serem letrados. Por isso, para

compreendermos o que se entende atualmente por alfabetização e letramento,

pontuamos algumas das principais definições e concepções dos autores que mais

discutem o assunto no Brasil.

Ao analisarmos o conceito de letramento, destacamos que o mesmo também

pode ser pensado em relação à literatura. Dessa forma, na sequência das

discussões fundamentamos o conceito de letramento literário por meio de reflexões

sobre o papel e importância da literatura e da literatura infantil (por se tratar das

séries iniciais) na sociedade.

Abordamos, ainda, as especificidades da leitura do texto literário, para

demonstrar que esta deve ser pensada e planejada pela escola desde o início do

processo de escolarização dos pequenos aprendizes, já que é função dessa

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literatura educar a sensibilidade da criança e estimular seus interesses de leitor em

formação. Para alcançar eficiência nessa jornada formativa, consideramos

necessário que os educadores conheçam, a princípio, as diferentes conceituações

que o processo de leitura engloba. Assim, a seguir, abordamos algumas dessas

concepções e suas implicações no processo de ensino-aprendizagem de leitura.

1.1 A LEITURA E SUAS CONCEPÇÕES: MÚLTIPLAS VISÕES DE UM PROCESSO

O homem, apesar de suas características particulares, é parte integrante da

natureza e está, assim, submetido às exigências impostas pelo meio natural. Ao

garantir materialmente sua sobrevivência, o homem intervém no mundo,

transformando-o e transformando-se a si mesmo. Ao ampliar sua condição animal,

por meio do trabalho, o ser humano se constrói como homem e, nesse processo de

humanização, cria meios para satisfazer suas necessidades, ao mesmo tempo que

produz conhecimentos e cultura (LEONTIEV, 1978).

Contudo, o homem não se constitui individualmente, mas, modifica-se na

relação com os outros seres da sua espécie, e utiliza a linguagem como recurso

mediador entre seus semelhantes. Logo, como afirma Leontiev (1978), a linguagem

é um produto da ação humana, além de ser um suporte simbólico dessa ação, o

qual torna possível a representação, tanto do mundo no qual e sobre o qual agem os

seres humanos, como também a representação que o ser humano tem de sua ação

e de si mesmo como sujeito dessa ação. Desse modo, compreender a linguagem

implica em refletir sobre o próprio ser humano, já que é por meio dela que o homem

se constitui e constitui o seu redor, num processo de interação.

Embora a linguagem seja um fenômeno social que nasce das relações entre

os sujeitos, nem sempre, ao longo da história da educação, ela foi (ou, em alguns

casos, ainda é) vista dessa maneira. De acordo com Geraldi (1996), qualquer

atividade em sala de aula, e qualquer metodologia de ensino, relaciona-se a uma

opção política, a qual envolve teorias de compreensão e de interpretação da

realidade. Por isso, a concepção de leitura e a forma como ela se realiza em sala de

aula está atrelada a uma concepção de linguagem. Desse modo, discutir as

concepções de linguagem e os conceitos subjacentes a tais concepções, embora

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sejam constantemente abordados por diversos outros trabalhos, é relevante, pois as

práticas de leitura e seus resultados dependem da perspectiva teórica em que estão

circunscritas, já que carregam uma postura política que envolve uma visão da

realidade.

Geraldi (1984), ancorado nos pressupostos bakhtinianos, compreende e

apresenta tais concepções, sendo: linguagem como expressão do pensamento,

linguagem como instrumento de comunicação e linguagem como forma de interação.

A concepção de linguagem como expressão do pensamento fundamenta-se

na visão do subjetivismo idealista, na qual o sujeito constrói uma representação

mental do que o texto quis dizer unicamente pelas ideias e intenções do autor, sem

considerar os fatores externos à comunicação, como o interlocutor. A língua é

concebida, assim, como um produto acabado, um sistema estável, um depósito

inerte (BAKHTIN, 1992). Diante disso, a escola acaba tornando-se o local de

reprodução formal deste código (mais precisamente do código de prestígio),

restando ao aluno atuar de forma passiva ao que lhe é ensinado, sem reconhecer e

compreender a historicidade da linguagem e suas múltiplas relações com a

realidade. Decorrente dessa concepção, a prática de leitura no ambiente escolar é

utilizada, apenas, para decodificar e exteriorizar as ideias contidas no texto e, por

meio dela, o leitor deve expressar corretamente (escrita e oralmente) as intenções

do autor.

Na segunda concepção, linguagem como instrumento de comunicação, o

objeto de estudo é o sistema de escrita da língua: o conjunto de signos que se

combinam segundo regras específicas. A linguagem é tida como uma ferramenta

utilizada para transmitir uma mensagem, uma informação de um emissor para um

receptor (GERALDI, 1984). Embora compreenda a língua como um ato social, essa

concepção desconsidera os diferentes usos e contextos de seus falantes, limitando-

se a uma análise do funcionamento interno da língua, apoiada nos estudos

linguísticos realizados pelo Estruturalismo. A leitura, nessa perspectiva, é vista como

mera decodificação, pois nela se prioriza a estrutura do texto, na qual a função do

leitor é extrair, linearmente, as ideias textuais, repetindo-as, copiando-as.

Observamos, portanto, que se trata de uma abordagem também superficial e

descontextualizada de ensino da língua, por privilegiar o processo de decodificação,

separar o homem do seu contexto social e limitar-se ao estudo do funcionamento

interno da língua em sua estrutura textual.

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A terceira concepção de linguagem defende, conforme aponta Geraldi (1984),

que a linguagem é interação, de modo que os sujeitos utilizam-na não só para

expressar seus pensamentos ou para transmitir conhecimentos, mas, também, para

agir, atuar sobre o outro e sobre o mundo. Assim, os sujeitos são vistos como

agentes sociais, pois é por meio de diálogos entre eles que ocorrem as trocas de

experiências e conhecimentos.

Nessa concepção, a preocupação essencial do ensino da língua é levar o

aprendiz, além do conhecimento gramatical (tendo em vista que toda língua é

constituída de uma gramática), a desenvolver a capacidade de refletir, de maneira

crítica, sobre o mundo que o cerca e, de modo especial, sobre o uso da língua como

ferramenta de interação social. As práticas de leitura, nesta visão, são orientadas

pela “interação autor-texto-leitor” (KOCH; ELIAS, 2010, p. 12), ou seja, o processo

de interação entre autor e leitor ocorre por meio da linguagem, a qual materializa-se

no e pelo texto.

Nesse ponto, é necessário ampliar o conceito de texto, o qual diz respeito não

apenas a formalização do discurso verbal ou não verbal, mas às condições

anteriores a ela, isto é, ao contexto de produção e elaboração; e às posteriores, ou

seja, à leitura ou à atitude responsiva do leitor.

“Todo texto é, assim, articulação de discursos, vozes que se materializam, ato

humano, é linguagem em uso efetivo. O texto ocorre em interação e, por isso

mesmo, não é compreendido apenas em seus limites formais” (BAKHTIN, 2003, p.

66). Todo texto precisa, necessariamente, de um interlocutor, de um “alguém” para

que a intenção do dizer se realize. O texto é construído, tendo em vista um objetivo

e uma perspectiva socio-histórica, por isso, está sempre inserido em um gênero

específico.

Para Bakhtin (2003), os tipos relativamente estáveis de enunciados são

denominados gêneros discursivos; ou seja, formas de textos (semelhantemente

estruturados) criados pela sociedade, que funcionam como mediadores entre o

enunciador e o destinatário. O autor dividiu os gêneros discursivos (apesar de

considerá-los interdependentes) em primários e secundários, sendo os primários

referentes às situações cotidianas; e os secundários às circunstâncias mais

complexas e formais de comunicação (a exemplo das áreas acadêmicas, científicas,

artísticas, etc.).

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No entanto, nenhum gênero apresenta-se “solto” fortuitamente na sociedade,

mas está situado em uma determinada esfera comunicativa. De acordo com Bakhtin

(2003), há diferentes esferas de comunicação, e cada uma delas produz os gêneros

necessários a suas atividades. Essas esferas dividem-se em: esferas do cotidiano,

na qual se encontram as formas comunicativas familiares, íntimas, comunitárias,

entre outras; e as esferas dos sistemas ideológicos constituídos, que compreendem

os textos que circulam na ciência, na política, na arte, na religião, etc. Assim, em

cada uma delas, há um conjunto específico de gêneros; por exemplo: na esfera

cotidiana encontramos as listas de supermercado, receitas, recados, etc.; na esfera

digital, os e-mails, bate-papo virtual, blogs, e assim por diante.

Por isso, como aponta Brait (2000, p. 20) “não se pode falar de gêneros sem

pensar na esfera de atividades em que eles se constituem e atuam, aí implicadas as

condições de produção, de circulação e recepção”; ou seja, ao se pensar em gênero

discursivo, além das suas condições de produção e recursos estruturais/linguísticos,

é preciso considerar a esfera comunicativa a que pertence, pois ela determinará os

espaços sociais que podem ou não ser ocupados por seus interlocutores.

Nessa perspectiva, e voltando-nos para as especificidades do ensino formal

da língua, é preciso que a escola seja um espaço que promova, de maneira

intencional, a leitura variada de textos das diferentes esferas sociais; pois é por meio

de uma variedade de textos com diferentes funções sociais que se desenvolverá o

letramento do aluno, aprimorando sua competência linguística. E esse trabalho

sistematizado com os diferentes gêneros discursivos, com vistas ao letramento

crítico do aluno, deve iniciar-se já no processo de alfabetização.

Contudo, se muitas têm sido as concepções de leitura ao longo do tempo, há

um consenso, nos dias de hoje, de que ela não se restringe à decodificação de

sinais e à identificação de palavras e frases (isto é, ao processo de alfabetização),

mas vai muito além disso: trata-se do processo de letramento, do qual falaremos

mais adiante.

Das concepções de linguagem, e consequentemente de leitura,

apresentadas, assumimos concordância com a perspectiva interacionista, da qual

compreendemos que a leitura constitui-se em um processo complexo de

compreensão em que o leitor, sujeito ativo na construção de sentidos, participa

como um coenunciador. Nas palavras de Bakhtin (2003), o leitor, em processo de

interação com o autor por meio do texto, “ocupa simultaneamente uma posição ativa

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e responsiva: concorda ou discorda dele (total ou parcialmente) completa-o, aplica-o,

prepara para usá-lo, etc. [...] Toda compreensão é prenhe de resposta” (BAKHTIN,

2003, p. 271).

Recordemo-nos também que, segundo Bakhtin (2003), enunciado é o

discurso vivo que ocorre na comunicação efetiva dos indivíduos em sociedade, por

isso, é algo individual, único, singular, irrepetível (jamais proferido antes da mesma

forma, e não o sendo depois, nas mesmas condições de interlocução).

Consoante aos conceitos bakthinianos, Rojo (2002) afirma que “a leitura é

vista como um ato de se colocar em relação um discurso (texto) com outros

discursos anteriores a ele, emaranhados nele e posteriores a ele, como

possibilidades infinitas de réplica, gerando novos discursos/textos” (ROJO, 2002,

p.02). Nessa concepção, a leitura passa a ser um processo de construção de

significados, levando em consideração fatores linguísticos e discursivos. A autora

(ROJO, 2004) ainda afirma que ler um texto é

[...] escapar da literalidade dos textos e interpretá-los, colocando-os em relação com outros textos e discursos, de maneira situada na realidade social; é discutir com os textos, replicando e avaliando posições e ideologias que constituem seus sentidos; é, enfim, trazer o texto para a vida e colocá-lo em relação com ela. (ROJO, 2004, p. 02).

Dessa forma, a leitura é produção de sentidos. E a produção de sentidos

remete-se a um processo que envolve não só os mecanismos de decodificação, mas

de ativação de conhecimentos e experiências particulares do leitor. Referimo-nos

neste ponto, aos aspectos cognitivos e metacognitivos do ato de ler; ou seja,

segundo a autora (ROJO, 2004), há diferentes capacidades discursivas e

linguísticas que são solicitadas ao leitor no momento da leitura, das quais destacam-

se: capacidades de decodificação, que sozinhas não permitem ao leitor aprofundar-

se no universo discursivo, mas que sem elas não se pode ter compreensão das

ideias postas no texto, já que estas envolvem conhecimentos linguísticos que

passam pelo reconhecimento de letras, fonemas, morfemas, enfim, do sistema e

estrutura do código da língua; capacidades de compreensão, que são a ativação do

conhecimento de mundo do leitor, a comparação de informações com outros textos,

inferências locais e globais, ou seja, as experiências de sua “bagagem” cultural; e,

por fim, as capacidades de apreciação e réplica do leitor em relação ao texto

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(interpretação, interação). Essas se referem a recuperar o contexto de produção do

texto, situando-o em um momento histórico e social; definição de metas e finalidades

de leitura; percepção de relações de intertextualidade, interdiscursividade e de

outras linguagens (não verbais).

Portanto, para Rojo (2004), a leitura passa não apenas por um processo de

decodificação, de decifração de códigos, mas sim de compreensão que envolve

conhecimentos de mundo, com práticas sociais e também de conhecimentos

linguísticos que vão muito além do simples domínio de fonemas.

Nessa perspectiva, cada sujeito leitor tem características próprias: os seus

conhecimentos, o contexto sociocultural no qual está inserido e os traços próprios de

sua personalidade; as quais vão formar o seu perfil único de leitor. Em outras

palavras, esse perfil constitui-se dentro de um contexto histórico pré-determinado.

Ele se forma ao longo dos anos e das várias leituras (verbais e não verbais) que vão

sendo realizadas e incorporadas pelo leitor.

Esse conhecimento adquirido forma um arcabouço que vai servir de base

para a leitura de novos textos. Portanto, há sempre um conhecimento pré-existente

que vai determinar certo olhar para o texto; e mesmo a falta de um conhecimento

anterior também vai influenciar as expectativas em torno da leitura. Tais

conhecimentos prévios não se relacionam apenas ao conhecimento linguístico e

estrutural (regras de formação/constituição de textos) como também ao

conhecimento de dados culturais que podem ser ativados pela linguagem. São por

essas razões que um enunciado (texto) e sua leitura configuram-se como irrepetíveis

(BAKTHIN, 2003).

No momento em que consideramos a interação autor-texto-leitor, a leitura

torna-se um ato dialógico no qual o leitor põe-se em diálogo com o autor, que por

sua vez é detentor de determinados conhecimentos e que decidiu evidenciá-los ou

partilhá-los, por meio da linguagem. Por isso mesmo, nenhuma prática de leitura

pode centrar-se apenas no código em si, nem somente na extração das intenções

do autor ao escrever seu texto, ou unicamente nos conhecimentos do próprio leitor.

Antes requer um olhar atento para os elementos cotextuais e contextuais, tendo em

vista que implicam compreensão e conhecimentos prévios que são constituídos

antes mesmo do momento da leitura.

Ao promover a leitura fundamentada nessa concepção interacionista de

linguagem, possibilita-se o desenvolvimento do tão almejado leitor crítico, aquele

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que produz sentidos e não apenas extrai informações do texto. Condição, essa,

essencial para a efetivação do letramento dos sujeitos que, segundo Soares (2009,

p. 72), “é o que as pessoas fazem com as habilidades de leitura e escrita, em um

contexto específico, e como essas habilidades se relacionam com as necessidades,

valores e práticas sociais”.

Essa preocupação com a questão do letramento e níveis de letramento dos

sujeitos está presente, hoje, não só no meio acadêmico (enquanto pesquisas e

publicações), mas é evidenciada, principalmente, pelos documentos oficiais que

norteiam o trabalho pedagógico nas escolas (como os PCNs e Diretrizes

Curriculares Estaduais, no caso do Estado do Paraná), tendo em vista, ser a escola,

ainda, a principal agência de letramento (KLEIMAN, 2012). Assim, se o letramento é

imprescindível para que qualquer pessoa possa exercer sua cidadania de maneira

consciente e plena, cabe-nos aprofundar esse conceito tão importante e sua relação

com a leitura e alfabetização; o que será desenvolvido a seguir.

1.2 LEITURA, ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO: ENTRE CONCEITOS E

RELAÇÕES

Historicamente, a escola é a instituição responsável pela alfabetização dos

indivíduos, provendo as novas gerações dos conhecimentos, habilidades, valores e

atitudes considerados essenciais à formação de um cidadão consciente e

participativo em seu meio social. Entretanto, esse aprendizado tem início antes

mesmo da criança começar a frequentar os ambientes escolares.

Segundo Cagliari (1992), quando chega à escola a criança já usa um

vocabulário que expressa um conjunto de regras gramaticais, o que demonstra um

domínio da forma de falar própria do meio social a que pertence. Conforme explicita

o autor:

[...] uma criança que entra para a escola pela primeira vez aos 7 anos já trilhou um longo caminho linguístico, já provou no dia-a-dia um conhecimento e uma habilidade linguística muito desenvolvidos. (CAGLIARI, 1992, p. 19).

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Dessa forma, o professor precisa levar em conta os conhecimentos que o

aluno traz, uma vez que este é um sujeito ativo, inserido em inúmeros processos de

aprendizagens. É necessário que se considere que

[...] a criança que se inicia na alfabetização já é um falante capaz de entender e falar a língua portuguesa com desembaraço e precisão nas circunstâncias de sua vida em que precisa usar a linguagem. Mas não sabe escrever nem ler. Esses são usos novos da linguagem para ela, e é sobretudo isso o que ela espera da escola. (CAGLIARI, 1992, p. 29).

Assim, a criança, que já faz parte de um amplo processo de letramento,

precisa encontrar na escola os mecanismos para que se aproprie dos

conhecimentos historicamente acumulados (principalmente em suportes escritos), ou

seja, aprenda a decifrar e manejar o código escrito da língua para utilizá-los em seu

cotidiano.

Nesse ponto, é necessário examinar mais a fundo os conceitos de letramento

e alfabetização, os quais, apesar de diferentes, são fenômenos complementares. De

acordo com Kleiman (2012),

[...] podemos definir hoje o letramento como um conjunto de práticas sociais que usam a escrita, como sistema simbólico e como tecnologia, em contextos específicos, para objetivos específicos (conferir Scribner e Cole 1981). As práticas específicas da escola, que forneciam o parâmetro de prática social segundo a qual o letramento era definido, e segundo a qual os sujeitos eram classificados ao longo da dicotomia alfabetizado ou não-alfabetizado, passam a ser, em função dessa definição, apenas um tipo de prática – de fato, dominante – que desenvolve alguns tipos de habilidades mas não outros, e que determina uma forma de utilizar o conhecimento sobre a escrita. (KLEIMAN, 2012, p. 19).

Segundo a autora, o letramento pode ser compreendido como um fenômeno

amplo que ultrapassa os domínios da escola, referindo-se ao fato de que a escola,

diante da perspectiva do letramento, enfatiza apenas algumas práticas ligadas à

escrita e ao uso da escrita. Assim sendo, fora do ambiente escolar encontramos

outros usos e práticas ligados à escrita. Nesse sentido, Kleiman (2012, p. 20) afirma

que o “[...] fenômeno do letramento, então, extrapola o mundo da escrita tal qual ele

é concebido pelas instituições que se encarregam de introduzir formalmente os

sujeitos no mundo da escrita”. Desta forma, letramento seria um conjunto de práticas

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com objetivos específicos e em contextos específicos, mediados pela escrita. A

escola, por sua vez, seria apenas uma agência de letramento, dentre as várias

outras, e realizaria apenas algumas práticas específicas de letramento.

Nessa perspectiva, ser letrado não significa, necessariamente, ser

alfabetizado, ou vice-versa. Uma pessoa pode ser capaz de ler um anúncio no

jornal, mas não ser capaz de ler um romance; pode escrever um recado para um

familiar, mas não conseguir escrever uma carta de apresentação com vistas a um

emprego, e assim por diante.

Como indica Magda Soares (2009), um indivíduo pode ser analfabeto, isto é,

não ter adquirido a “tecnologia” do ler e escrever (e sofrer estigmas por conta disso);

mas, se vive em um meio onde a leitura e a escrita se faz intensamente presente,

pode ser, de certa forma, letrado, porque se envolve em práticas sociais que fazem

uso desses sistemas simbólicos. O mesmo pode ocorrer com crianças ainda não

alfabetizadas; ou ainda o contrário: podemos encontrar pessoas alfabetizadas que

apresentam um baixo nível de letramento.

A pesquisadora conceitua o termo, em outro texto produzido sobre o assunto,

da seguinte maneira:

Letramento é o estado ou condição de indivíduos ou de grupos sociais de sociedades letradas que exercem efetivamente as práticas sociais de leitura e de escrita, participam competentemente de eventos de letramento. (SOARES, 2002, p.145).

Por eventos de letramento, no caso, entendem-se as práticas em que a

escrita é condição necessária para a interação entre pessoas, bem como do

processo de interpretação dessa interação, isto é, “situações em que práticas de

leitura e/ou escrita têm uma função essencial” (SOARES, 2002). E se levarmos em

conta o fato de estarmos inseridos em uma sociedade grafocêntrica, a escrita está

no centro da maioria das relações e interações sociais, desde uma simples lista de

supermercado, do itinerário do ônibus, até situações complexas de uso de

tecnologias.

A necessidade de ampliar o conceito de alfabetização começou a se tornar

efetiva quando as transformações sociais provocadas pelo capitalismo começaram a

se refletir na Educação: como a condição do alfabetizado frente às exigências do

mercado de trabalho e da aceleração tecnológica. Tais mudanças, por sua vez,

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acarretaram novas demandas sociais de uso da leitura e da escrita, e exigiram um

novo conceito para designá-las. Ou, como aponta Tfouni (2004), uma nova realidade

social se impôs: não basta apenas adquirir o código escrito e saber decodificá-lo, é

preciso também fazer uso dessa “tecnologia” nas diversas práticas de interação

mediados pela linguagem; saber responder às exigências de leitura e de escrita que

a sociedade faz continuamente – daí o surgimento do termo letramento.

Contribuições acerca do conceito de letramento também são feitas por Magda

Soares em seu artigo “Letramento e escolarização”, do qual destacamos:

Antes do surgimento da palavra letramento, e ainda hoje, usava-se/usa-se apenas a palavra alfabetização para referir-se à inserção do indivíduo no mundo da escrita, tornando-se sempre necessário, neste caso, explicitar que por “alfabetização” não se estava/está entendendo apenas a aquisição da tecnologia da escrita, mas, mais amplamente, a formação do cidadão leitor e escritor. O uso da palavra letramento vem distinguir os dois processos, por um lado garantindo a especificidade do processo de aquisição da tecnologia da escrita, por outro lado atribuindo não só a especificidade, mas também visibilidade ao processo de desenvolvimento de habilidades e atitudes de uso dessa tecnologia em práticas sociais que envolvem a língua escrita (SOARES, 2003, p. 90-91).

Como podemos observar, alfabetização e letramento são processos

independentes, mas ao mesmo tempo indissociáveis: a alfabetização se desenvolve

por meio de práticas sociais de leitura e de escrita (através de atividades de

letramento), enquanto que o letramento só pode desenvolver-se no contexto da

alfabetização (aprendizagem das relações grafema-fonema e estruturas

linguísticas). Portanto, o letramento é muito maior que a alfabetização. É o estado ou

condição de quem se envolve em práticas sociais de leitura e de escrita. É levar os

sujeitos – crianças e adultos – a fazer o uso da leitura e da escrita, envolverem-se

em práticas sociais de leitura e de escrita.

Da pluralidade de usos sociais da leitura e escrita, bem como da diversidade

de acesso que os sujeitos têm aos diversos contextos de usos, decorre, portanto, os

diferentes tipos e níveis de letramento (que dependem das necessidades do

indivíduo e de seu meio). E a alfabetização é, sob esse ponto de vista, uma das

práticas de letramento, que faz parte do conjunto de práticas sociais de uso da

escrita específicas da instituição escolar. Pois, como afirma Angela Kleimam:

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[...] a alfabetização, portanto, tem características específicas, diferentes das do letramento, mas é parte integrante dele. Como prática escolar, ela é essencial: todos – crianças, jovens ou adultos – precisam ser alfabetizados para poder participar, de forma autônoma das muitas práticas de letramento de diferentes instituições. (KLEIMAN, 2005, p. 16).

Assim, embora o senso comum continue perpetuando a ideia de que na

escola se ensina e se aprende a ler e a escrever (alfabetiza-se), não devemos

estabelecer a simples substituição de “alfabetização” por “letramento”. Soares (2003)

afirma que a alfabetização possui uma especificidade e que essa não pode ser

desprezada. A autora nos diz que, atualmente, a alfabetização vem sendo

"desinventada". Isso significa que a especificidade do processo de alfabetização foi

abandonada, esquecida, desprezada e que essa é uma das causas da precariedade

do domínio da leitura e da escrita pelos alunos. Ao contrário, como indica Soares

(2009, p. 47),

[...] o ideal seria alfabetizar letrando, ou seja: ensinar a ler e a escrever no contexto das práticas sociais da leitura e da escrita, de modo que o indivíduo se tornasse, ao mesmo tempo, alfabetizado e letrado. (grifos da autora).

Ao considerar, então, que a criança chega à escola já inserida em diferentes

contextos de letramento, torna-se imprescindível que o professor observe e

aproveite todo o conhecimento que os alunos trazem, sem, contudo, limitar-se a ele.

Para tanto, além de valorizar o conhecimento que o aluno traz para a

aprendizagem da leitura e da escrita, a escola (aqui representada pela figura do

professor alfabetizador) precisa de conhecimentos específicos para proporcionar

atividades que o façam avançar na construção de suas hipóteses a respeito da

língua, ou seja, é necessário que o professor domine os meios e recursos de

sistematização do código escrito, de maneira significativa para o aluno.

Nesse sentido, a utilização do texto literário na alfabetização, por meio das

práticas de ler e ouvir histórias, pode, sim, contribuir no processo de transição da

fala para a escrita, ou seja, na aquisição e manejo do código escrito (ampliação

vocabular, incorporação de estruturas linguísticas, etc); como pontua Fleck (2008, p.

19), “da leitura (literária) não se extraem apenas vocábulos, mas formas e estruturas,

gêneros e estilos que se projetarão, futuramente, no uso da linguagem e na redação

individual e própria do leitor.”

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Cabe aqui ressaltar que essa prática com o texto literário deve ser de

natureza quantitativa e qualitativa: é necessário que o professor propicie ao aluno o

acesso a vários tipos de textos e obras, sem perder de vista a qualidade (estética e

linguística) de cada uma delas.

Assim, aprender a ler e a escrever, apesar de ser uma tarefa complexa, pode

se tornar mais fácil se, desde o início, a criança encontrar um ambiente rico e

motivador, que estimule novas descobertas e que oportunize, gradativamente, o

contato com as complexidades da língua. É o que nos aponta Cagliari (1992),

quando menciona:

[...] uma criança pode começar ouvindo histórias, aprendendo a decifrar os sons das letras (no seu dialeto e no da escola) em diversos contextos (palavras diferentes), e se pôr a ler pequenos textos de cujo conteúdo já tem conhecimento (já ouviu) ou que sabe de cor, como canções, provérbios, adivinhações etc. Se esse tipo de atividade for intensificado, a criança passa a ter um outro tipo de contato com a escrita, que não é simplesmente um jogo de montar e desmontar sílabas e palavras. (CAGLIARI, 1992, p. 168).

É importante, então, dar significado ao processo de aprendizado da leitura e

da escrita no qual a criança está inserida, a fim de contribuir para a sua formação; e

a literatura, por sua natureza lúdica e emotiva, cria um contexto especial de

motivação, atraente aos olhos dos pequenos, o que facilita esse processo.

Contudo, apesar de se constituir em uma importante ferramenta que

possibilita o estudo e a apropriação de diversas formas e estruturas da língua, o

texto literário não se reduz a sua função linguística. Ele é construção de sentidos e

significados; é processo de humanização; é arte, cuja leitura pode auxiliar de forma

relevante numa sociedade letrada, no desenvolvimento intelectual e da consciência

do mundo.

Nesse contexto, a literatura (e aqui, especificamente, a literatura infantil e

infanto-juvenil) vem solidificar o espaço da leitura na escola enquanto formação de

leitores, tendo em vista que ela pode proporcionar a possibilidade de a criança

adentrar num mundo diferente: num mundo de sonhos e ações dos personagens

das histórias, que desmistificam preconceitos e permitem-lhe relacionar fatos com

sua própria vida, numa forma de tornar o mundo mais compreensível e mais

humano.

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Assim, o letramento literário é, pois, fundamental, tanto para a constituição do

leitor, como também para a formação do ser e, consequentemente, de todos que

estão inseridos nesse processo de aprendizagem. Mas, para compreendermos o

que é e como o letramento literário pode, efetivamente, contribuir para o letramento

crítico dos sujeitos, precisamos, primeiramente, entender o papel da literatura na

sociedade; como veremos na próxima seção.

1.3 A LITERATURA E O LETRAMENTO LITERÁRIO: FERRAMENTAS PARA

FORMAR CULTURALMENTE O CIDADÃO

Como verificamos, promover o letramento é capacitar a criança a se

relacionar e interagir socialmente, por meio da leitura e da escrita, nos mais diversos

contextos de atuação. Por isso, quanto maior o contato da criança com os mais

diferentes gêneros textuais (orais e escritos) que circulam na sociedade, maior será

sua consciência sobre o mundo. Nessa perspectiva, o conceito de letramento

também pode ser pensado em relação à literatura, a qual passa a ser compreendida

como uma prática social relevante ao letramento. E ao acreditarmos que existe um

letramento literário, torna-se necessário discutir o que, nesta pesquisa, está sendo

considerado como literatura.

Ao longo da história, muitas tentativas de se definir literatura foram feitas, as

quais divergem entre si. Como aponta Terry Eagleton, em Teoria da Literatura: uma

introdução (1994), para alguns estudiosos de teoria literária, literatura é a

valorização da forma (o texto em si, a organização da linguagem); para outros a

literatura é conceituada a partir da imaginação e da criatividade linguística/estrutural

do autor ao escrever determinada obra; para outros, ainda, a definição de literatura

fica por conta do próprio leitor, ou seja, depende de como o texto é lido e não da

natureza daquilo que é lido; entre outros inúmeros conceitos, tendo em vista que as

pesquisas e produções teóricas nesse campo são infindáveis.

De acordo com Márcia Abreu (2006), na maior parte das vezes não são

critérios linguísticos, textuais ou estéticos que fazem um texto ser considerado

literário ou não, mas sim as posições políticas e sociais de uma determinada época.

Para a autora,

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[...] nós temos que discutir o que é literatura, pois ela é um fenômeno cultural e histórico e, portanto, passível de receber diferentes definições em diferentes épocas e por diferentes grupos sociais. (ABREU, 2006, p. 41).

Assim, apesar das muitas tentativas de definição da literatura, o certo é que

todas elas estão situadas num momento histórico e dependem das formulações

daquele período, ou seja, cada tempo, cada grupo social tem sua definição para

literatura. Na mesma linha de pensamento, Marisa Lajolo (1989, p. 25) afirma:

[...] já houve centenas de tentativas de definir o que é literatura. Nessas investidas, vários têm sido os critérios pelos quais se tenta identificar o que torna um texto literário ou não literário: o tipo de linguagem empregada, as intenções do escritor, os temas e assuntos de que trata a obra, a natureza do projeto do escritor... tudo isso já teve ou ainda tem sua hora e sua vez. Cada uma destas definições é parcial em si mesma. E em conjunto, mais do que se anularem umas às outras, complementam-se, ajustam melhor certos aspectos e, acima de tudo, correspondem ao que foi ou é possível pensar de literatura num determinado contexto da vida do homem.

Independentemente das definições formuladas e de suas limitações

conceituais, todas apresentam um ponto em comum, como enfatiza a autora

(LAJOLO, 1989, p. 70): “Este conceito e esta prática de literatura como alguma coisa

que toca profundamente as pessoas, como transbordamento de uma alma para

outra, parece durar até hoje”.

Portanto, a literatura leva à “incorporação” do outro no próprio sujeito: a

experiência do outro, em outro tempo e lugar, à experiência e consciência do sujeito

leitor. Experiências essas, quase reais, que envolvem o ser e o ajudam a

compreender o mundo que o rodeia, muitas vezes por meio da fantasia e do

imaginário; têm, portanto, caráter formativo. Nesse processo, o leitor, ao interagir

com a obra lida, torna-se também autor, pois, mediante sua leitura e suas

experiências, pode argumentar, criticar, levantar outras questões, ou simplesmente,

apreciar o que um outro autor tentou transmitir através de sua escrita, numa atitude

responsiva (BAKTHIN, 2003).

Michèle Petit (2008), antropóloga francesa que tem publicado vários trabalhos

sobre a formação do leitor, corrobora com esta visão ao afirmar que a leitura literária

é, antes de tudo, uma experiência de liberdade na qual

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[...] os leitores apropriam-se dos textos, lhes dão outro significado, mudam o sentido, interpretam à sua maneira, introduzindo seus desejos entre as linhas: é toda a alquimia da recepção. Não se pode jamais controlar o modo como um texto será lido, compreendido ou interpretado. (PETIT, 2008, p. 26).

As possibilidades propiciadas pela leitura do texto literário promovem o

acesso a experiências simbólicas que levam o leitor a um encontro consigo mesmo:

muitas vezes, ao lermos um livro somos sensibilizados pela maneira como o escritor

cria seu texto (manejo da linguagem), como descreve lugares, pensamentos,

situações ou sentimentos que até então não nos eram claros ou possíveis de

explicar. Assim, durante a leitura, percebemo-nos em momentos de descoberta de

nós mesmos, pois reconhecemos nas palavras do outro, emoções e ideias que não

sabíamos expressar; ou seja, experiências necessárias à organização de nossa

história, de nossa própria vida. Neste processo, o leitor transforma o texto e é

transformado por ele, pois, na leitura, é-lhe possível alterar sentidos, distorcer,

reempregar, introduzir variantes, ao mesmo tempo em que “[...] também é

transformado: encontra algo que não esperava e não sabe nunca aonde isso poderá

levá-lo.” (PETIT, 2008, p. 28-29).

Nesse sentido, o leitor vai se desenvolvendo tanto cultural quanto

criticamente, isto é, vai tornando-se letrado. Esse processo de letramento que se faz

via textos literários pode ser definido, segundo Rildo Cosson (2012), como

letramento literário. O autor, juntamente com Graça Paulino (2009), definem o termo

como:

[...] processo de apropriação da literatura enquanto construção literária de sentidos. [...] Aqui convém explicitar, em primeiro lugar, que considerar o letramento literário um processo significa tomá-lo como um estado permanente de transformação, uma ação continuada, e não uma habilidade que se adquire como aprender a andar de bicicleta ou um conhecimento facilmente mensurável como a tabuada de cinco. (PAULINO e COSSON, 2009, p. 67).

Podemos observar, aqui, o destaque que os autores dão ao caráter

processual do letramento literário. Ou seja, o processo de apropriação da literatura,

e tudo que ele implica na formação do indivíduo, não consegue efetivar-se por meio

de leituras fragmentadas e esporádicas (aquelas que ocorrem de vez em quando e

que não são sistematizadas). Ao contrário, todo processo formativo pressupõe uma

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continuidade de ações e práticas e uma intencionalidade, de modo que os sujeitos

envolvidos compreendam e participem dos objetivos a serem alcançados. Por isso,

compreendemos que ler literatura é uma atividade que precisa ser aprendida e,

portanto, é papel da escola encontrar os mecanismos para que essa prática se

efetive da melhor maneira possível.

Contudo, apesar de se constituir em uma importante prática escolar, Paulino e

Cosson (2009) indicam que o letramento literário não se restringe ao ambiente da

escola, mas que pela sua natureza social e cultural, acompanha o indivíduo por toda

sua vida. Nesse sentido os autores registram:

Também deve ficar claro que o letramento literário não começa nem termina na escola, mas é uma aprendizagem que nos acompanha por toda a vida e que se renova a cada leitura de uma obra significativa. Depois, trata-se de apropriação, isto é, um ato de tornar próprio, de incorporar e com isso transformar aquilo que se recebe, no caso, a literatura. [...] Por fim, trata-se da apropriação da literatura não apenas como um conjunto de textos, consagrados ou não, mas também como um repertório cultural que proporciona uma forma singular – literária – de construção de sentidos. (PAULINO e COSSON, 2009, p. 67-68).

Nessa perspectiva, a apropriação da obra literária contribui efetivamente para

a formação do indivíduo e, consequentemente, da sociedade. Observamos, assim, a

função da literatura não simplesmente como contexto para abordagem de temas ou

análise linguística (como pretexto para alfabetizar), mas sim como uma ferramenta

para formar culturalmente o indivíduo que nela se integra. Nesse sentido, a leitura da

literatura pode ser considerada uma das práticas, única e singular, do processo de

letramento. E se é na escola que a criança tem o primeiro contato sistemático com a

leitura e a escrita, é também na escola que o aluno deveria ser letrado para tal

prática. Fazemos nosso, aqui, o pensamento de Fleck (2008, p. 25), acerca do

assunto:

Compreender a importância da iniciação do sujeito no mundo literário, por meio da exploração da literatura infantil e infanto-juvenil, é lançar boas sementes num solo fértil, que, no futuro, revelará frutos como a criticidade, o engajamento social e político, a consciência de que todo ser humano é agente histórico – elementos constituintes das ações de um leitor critico, transformador do meio pela capacidade de compreensão e pelo domínio do poder da palavra como construtora de discursos.

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Essa iniciação literária por meio da exploração da literatura infantil, indicada

por Fleck (2008), configura-se, no que denominamos aqui, como uma proposta de

letramento literário para as séries iniciais do ensino fundamental. Mas, para

compreendermos, efetivamente, no que consiste a literatura infantil e a sua

importância para a infância, precisamos estudar com maior propriedade essa

questão, e examinar argumentos que respaldem a sua inserção no ambiente

escolar. Além disso, discutir sobre o processo de reconhecimento da literatura

infantil exige problematizações históricas, tecidas a seguir, uma vez que somente

em tempos recentes valorizou-se a literatura infantil como ferramenta democrática

para a construção e reconstrução de saberes.

1.4 A CRIANÇA, A LITERATURA INFANTIL E A ESCOLA: UMA RELAÇÃO DE

APRENDIZAGEM QUE DEVE SER ESTIMULADA E CUIDADA

Apesar da importância dada aos gêneros literários infantis na atualidade,

muitos ainda questionam a legitimidade da literatura infantil. Alguns argumentos têm

operado no sentido de não legitimá-la enquanto arte.

De acordo com Hunt (2010), o primeiro motivo contrário à literatura infantil

baseia-se no fato de que muitos acreditam que a escrita destinada às crianças deve

ser necessariamente simples, como se o texto destinado aos jovens leitores

equivalesse ao texto escrito pelo autor quando jovem; isto é, filosófica e

linguisticamente simplificado.

Outra premissa que colabora para a sua não legitimação é a ideia de que o

texto dessa natureza é necessariamente trivial e se destina a uma cultura menor,

fazendo emergir uma confusão entre os aspectos característicos da literatura infantil

e aqueles que se vinculam a uma literatura adulta de baixo nível.

Tais concepções podem influenciar a escolha e o uso dos textos literários na

escola, interferindo nas práticas pedagógicas em sala de aula. Além disso,

historicamente a literatura infantil serviu, em grande parte do tempo, a interesses

pragmáticos e moralistas que, em muito, distanciavam-se das necessidades infantis,

e os resquícios dessa formação recaem sobre práticas pedagógicas atuais, afetando

o processo de democratização do bem cultural literário.

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Criadas inicialmente para o público adulto, as histórias infantis só passaram a

receber este nome e a destinar-se ao público infantil no final do século XVII, quando

Charles Perrault, na corte do rei Luís XIV, iniciou a compilação de histórias e relatos

orais guardados pela memória do povo (narrativas maravilhosas de fontes orientais,

fontes célticas e fontes europeias), estabelecendo, assim, o primeiro núcleo da

literatura infantil ocidental; embora, não tenha sido essa sua primeira intenção, como

nos aponta Nelly Novaes Coelho (1998, p. 67):

[...] a preocupação de Charles Perrault, nesse início de recriação da literatura folclórica, estava longe de ser com a infância. Só após sua terceira adaptação, A pele de asno (também um conflito feminino, ocasionado pelo desejo incestuoso de um pai por sua jovem filha), é que se manifesta sua intenção de produzir uma literatura para crianças.

De acordo com Coelho (1998), a partir deste momento, Perraut dedica-se a

redescobrir a narrativa popular maravilhosa por dois motivos: o primeiro é provar que

as histórias nacionais orais podiam ser tão boas quanto os antigos clássicos da

literatura, e o segundo, divertir as crianças, principalmente as meninas, direcionando

sua formação moral.

As histórias advinham e circulavam entre pessoas simples, geralmente

camponeses, de pouca instrução, predominantemente mulheres; eram humildes

contadores de histórias tradicionais, transmitindo narrativas oralmente, de geração

para geração (MACHADO, 2002). Essa prática perdurou por vários séculos, até que

escritores passaram a coletar narrativas orais e registrá-las no papel. Com o passar

do tempo, tais histórias sofreram adaptações e se transformaram em literatura para

os pequenos.

Seguindo o exemplo de Perrault, já no século XIX, em 1802, os irmãos

Wilhelm e Jacob Grimm, na Alemanha, coletaram contos de fadas tradicionais e

lançaram uma coletânea dessas histórias populares, com características diferentes

da obra do francês Perrault: bem mais extensas e dirigidas ao povo com uma

linguagem próxima da oralidade. E, algumas décadas depois, Hans Christian

Andersen, em 1835, na Dinamarca, além de compilar contos populares e recontá-

los, também criou histórias novas como, por exemplo, “O patinho feio”. Tais autores

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representam, na verdade, alguns dos vários escritores2 que reuniram histórias que

há muito vinham sendo narradas oralmente e as transcreveram dentro das

perspectivas culturais de suas épocas (COELHO, 1991).

Outra observação que remonta a origem das histórias infantis diz respeito à

história da própria concepção de infância, a qual começa a ser delineada somente a

partir do século XVIII, quando a criança passa a ser considerada um ser diferente do

adulto, com necessidades e características próprias, devendo receber uma

educação especial, que a preparasse para a vida adulta. Surgem, nesse contexto,

os primeiros livros para crianças, pois, antes disso, não se escrevia para crianças, já

que não existia a visão de que havia “infância”.

Foi a partir das transformações provocadas pelo capitalismo, no final do

século XVIII e início do século XIX, o qual suscitou uma nova classe social

emergente – a burguesia – e a valorização de um modelo familiar burguês que o “ser

criança” ganha enfoque; e estabelece-se assim, um interesse maior na sua

educação, a qual visava à transmissão dos valores burgueses. A literatura infantil

nasce então, nesse contexto, com o intuito de transmitir os valores deste novo

modelo social centrado no reconhecimento da vida doméstica, fundada no

casamento e na educação dos filhos.

Sobre o surgimento da literatura infantil, com a ascensão da burguesia,

Regina Zilberman (2009, p. 15) ressalta:

Antes da constituição desse modelo familiar burguês, inexistia uma consideração especial para com a infância. Essa faixa etária não era percebida como um tempo diferente, nem o mundo da criança como um espaço separado. Pequenos e grandes compartilhavam dos mesmos eventos, porém nenhum laço amoroso especial os aproximava. A nova valorização da infância gerou maior união familiar, mas igualmente os meios de controle do desenvolvimento intelectual da criança e manipulação de suas emoções. Literatura infantil e escola, inventada a primeira e reformada a segunda, são convocadas para cumprir uma missão.

Torna-se evidente, assim, a estreita ligação entre literatura infantil e ensino.

Na escola, a criança passa a ser introduzida de modo gradativo ao mundo adulto, e,

2 De acordo com Nelly Novaes Coelho (1991, p.12): “[...] Perrault, Grimm ou Andersen, ou as fábulas

de La Fontaine, [...] são eles alguns dos escritores que, desde o século XVII, interessados na literatura folclórica criada pelo povo de seus respectivos países, reuniram as estórias anônimas, que há séculos vinham sendo transmitidas, oralmente, de geração para geração, e as transcreveram por escrito”. (COELHO, 1991, p. 12).

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para tanto, a pedagogia viu na literatura infantil um de seus instrumentos, cujo

objetivo era a formação moral dos pequenos aprendizes e a sua preparação para a

vida adulta conforme os moldes burgueses.

Ao considerarmos a estratificação social do então emergente capitalismo,

verificamos que “crianças das classes privilegiadas liam especialmente os clássicos,

e as outras, mais ouviam do que liam, os livros de cavalaria, de aventuras, lendas e

contos folclóricos” (CUNHA, 2006, p. 19). Nesse contexto, as intenções de leitura do

texto literário eram fundamentalmente formativas e informativas e, para isso,

fizeram-se adaptações dos clássicos e do folclore, além da incorporação dos contos

de fadas até então não voltados especificamente para as crianças. No Brasil, essa

situação é semelhante, como aponta Maria Antonieta Antunes Cunha (1999, p.23):

No Brasil, como não poderia deixar de ser, a literatura infanto-juvenil tem início com obras pedagógicas e, sobretudo adaptadas de produções portuguesas, demonstrando a dependência típica de colônia. Essa fase embrionária da literatura infanto-juvenil brasileira é representada em especial por Carlos Jansen (Contos seletos das mil e uma noites, Robinson Crusoé, As viagens de Gulliver a terras desconhecidas), Figueiredo Pimentel (Contos da carochinha), Coelho Neto e Olavo Bilac (Contos pátrios) e Tales de Andrade (Saudade).

Essa tendência de se buscar no exterior o insumo literário vai até o início do

século XX, quando Monteiro Lobato renova a literatura infantil brasileira ao criar

personagens que despertavam a imaginação das crianças. Sobre a importância do

autor, Cunha (1999, p. 23) destaca:

Com Monteiro Lobato é que tem início a verdadeira literatura infanto-juvenil brasileira. Com uma obra diversificada quanto a gêneros e orientação, cria esse autor uma literatura centralizada em algumas personagens, que percorrem e unificam seu universo ficcional. No Sítio do Pica-pau Amarelo vivem Dona Benta e Tia Nastácia, as personagens adultas que „orientam‟ crianças (Pedrinho e Narizinho), „outras criaturas‟ (Emília e Visconde de Sabugosa) e animais como Quindim e Rabicó. Ao lado de obras marcadamente didáticas, escreve Lobato outras de exploração do folclore ou de pura imaginação, com ou sem o reaproveitamento de elementos e personagens da literatura infantil tradicional.

Monteiro Lobato retratou através do “Sítio do Pica-Pau-Amarelo” o ambiente

nacional brasileiro, com seus mitos e crendices populares, engajando-se nos

problemas do seu tempo e objetivando exercer influência na formação dos leitores

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mirins. O autor valorizou a criança pela sua inteligência, por sua curiosidade

intelectual e sua capacidade de compreensão e introduziu-as no contexto da cultura

mundial, recorrendo a personagens das fábulas de outras épocas históricas ao lado

de seres da mitologia grega. Ao mesmo tempo, recuperou as culturas que

construíram a identidade nacional e valorizou a contribuição do índio, do negro e do

branco. Assim, a literatura infantil de Monteiro Lobato voltou-se para formar na

criança o hábito da leitura, demonstrando que, para isso acontecer, é necessário

atraí-la por meio bons textos, isto é, interessantes, agradáveis e recreativos.

Por meio das propostas inovadoras dos livros concebidos por Lobato, iniciou-

se, já na década de 1970, o processo que revolucionaria as obras destinadas à

criança. Caracterizados pelo experimentalismo e pelo questionamento, os textos

lobatianos influenciaram grande parte de autores da contemporaneidade, dos quais

se destacam: Ana Maria Machado, Angela Lago, Eva Furnari, Leo Cunha, Sérgio

Capparelli e Tatiana Belinky, entre outros (COELHO, 1991). Assim, a partir do último

quarto do século XX, surge, em oposição a uma literatura pedagógica e moralista,

uma literatura inovadora e reflexiva, o que é possibilitado pelo trabalho experimental

com a linguagem, inclusive a visual.

Hoje contamos com muitas versões e adaptações de histórias para as

crianças: dos clássicos à literatura contemporânea; de nacionais ou estrangeiros.

Contudo, Machado (2002) nos alerta sobre versões prosaicas das histórias infantis

que, segundo ela, só atestam a arrogância e a ignorância de seus adaptadores.

Arrogantes porque se consideram melhores que os autores originais e ignorantes

porque não conhecem o papel que os contos desempenham na formação das

crianças, tampouco sabem que não se lê literalmente. Em nome da moralidade, do

didatismo, do realismo ou do politicamente correto, modificam as histórias,

resultando em versões deturpadas do original, nas quais, por exemplo, João e Maria

se perdem por serem desobedientes, transformando-as em as únicas culpadas de

todos os males que lhes acontecem. E ainda evita que as crianças empurrem a

bruxa no fogo, “impedindo o efeito catártico de um castigo bem dado ao vilão cruel e

entravando o sentido profundo da história” (MACHADO, p. 77).

Sobre esse assunto, Teresa Colomer (2007) observa também tais erros de

simplificação. Com o propósito de facilitar a leitura das crianças, adaptadores

acabam desvalorizando o “literário” dos textos, omitindo elementos narrativos

essenciais, como por exemplo, um conflito, ou empregando um vocabulário

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extremamente pobre, o que impede o progresso das crianças. Por outro lado,

encontramos nos livros infantis textos realmente voltados para adultos e

incompatíveis para os pequenos leitores.

Na mesma linha de pensamento, Petit (2008) também salienta que nem toda

leitura é edificante, já que há obras que apenas distraem o leitor, levando-o à

regressão de seu senso crítico:

Se existe uma leitura que auxilia a simbolizar, a se mover, a sair do lugar, e a se abrir para o mundo, existe também uma outra que só conduz aos prazeres da regressão. E se alguns textos nos transformam, há uma grande quantidade que, na melhor das hipóteses, apenas nos distraem. (PETIT, 2008, p. 101).

As obras literárias, diferentemente dos textos empobrecidos produzidos pela

Indústria editorial, abordam o contraditório e a ambiguidade, dão espaço para a

subjetividade e para as diferentes simbolizações advindas das linguagens que

tendem à plurissignificação. Ao lê-las, os leitores encontram sentidos que estão

relacionados às suas experiências como seres humanos.

Sobre esse aspecto, Abramovich (1997, p. 143) aponta que “por meio de um

material literário de qualidade, a criança é capaz de pensar criticamente e reformular

seu pensamento”. Nesse sentido, considera-se como material literário de qualidade

textos que apresentem uma proposta ficcional que atenda o imaginário dos leitores e

os incentive a elaborar novas possibilidades para perceber o mundo a sua volta.

Cabe evidenciar aqui, a concepção vigotskiana acerca da imaginação: “[...]

imaginação como uma formação especificamente humana, intrinsecamente

relacionada à atividade criadora do homem.” (VIGOTSKI, 2009, p. 07).

A partir dos estudos de Vigotski (2009), compreendemos que a capacidade

criadora do homem se desenvolve de forma consciente e orientada, graças às

relações que estabelece constantemente com os instrumentos, signos, símbolos e

padrões de seu meio social. Ou seja, a imaginação tem sua “origem” no social do

indivíduo; e é ao imaginar, combinar, reelaborar experiências que o homem cria o

novo. Ao apoiarem-se na experiência, imaginação e criatividade estão diretamente

relacionadas com a realidade de cada sujeito.

Para Vigotski (2009), a capacidade de imaginar e de criar inicia-se na infância

e está ligada ao contexto histórico, familiar, escolar e à riqueza de experiências

vivenciadas pela criança. Por isso, o autor atribui especial importância à intervenção

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educacional, devido a sua contribuição na humanização do indivíduo, pois “em todo

processo de educação da criança, a formação da imaginação não tem apenas um

significado particular do exercício e do desenvolvimento de alguma função separada,

mas um significado geral que se reflete em todo o comportamento humano”

(VIGOTSKI, 2009, p. 59).

Nessa perspectiva, Vigotski (2009) destaca a importância do trabalho

pedagógico no sentido de criar condições e possibilidades para que as crianças

possam participar da cultura3. Pois, ao imaginar, combinar, reelaborar experiências,

a criança cria o novo; capacidade que “faz do homem um ser que se volta para o

futuro, erigindo-o e modificando o seu presente” (VIGOTSKI, 2009, p. 14). Além

disso, o autor considera que a imaginação (fantasia) depende do acúmulo de

experiência da realidade, por isso defende, no período da infância, a apropriação

das máximas elaborações humanas por meio da instrução formal, possibilitando,

dessa forma, a construção de bases sólidas para a atividade de criação.

Diante dessa concepção sócio interacionista de desenvolvimento psíquico, a

qual considera que a criança possui e desenvolve sua capacidade criadora de forma

consciente e orientada, os textos que objetivam, apenas, inculcar valores, mudar

comportamentos ou informar o leitor sobre um determinado assunto (por meio da

história ficcional ou dos personagens) contrariam a construção da criticidade nos

educandos.

Paralelo a esse intuito moralizante com que surge a literatura infantil, o qual

perdura até os dias de hoje, destacamos outro grande problema enfrentado por esta

esfera artística: a escolarização da leitura literária.

Apesar da maioria dos professores reconhecerem a importância da literatura

no desenvolvimento infantil, grande parte dos encaminhamentos metodológicos

adotados para o trabalho com o texto literário empobrece as possibilidades

polissêmicas que o texto poderia proporcionar, pois a leitura das obras tem servido,

apenas, como pretexto para abordar e explorar conteúdos ligados à língua; ou seja,

um papel utilitário.

3 Acrescentamos a esta proposição de Vigotski, as reflexões de Saviani (1985), para quem a escola

deveria proporcionar, a todos, sem distinção, o acesso aos bens materiais e culturais socialmente produzidos; especialmente aos sujeitos das classes menos favorecidas, historicamente excluídos do capital cultural. “A pressão em direção à igualdade real implica a igualdade de acesso ao saber,

portanto, a distribuição igualitária dos conhecimentos disponíveis.” (SAVIANI, 1985, p. 87).

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Sobre esse problema relacionado à sistematização do trabalho com os textos

literários, Magda Soares (2011) explica que é inevitável escolarizar a literatura

(tendo em vista que ler literatura é uma atividade que precisa ser aprendida;

portanto, é papel da escola encontrar os meios para que essa prática se efetive),

mas que devemos ter cuidado com uma escolarização inadequada. Segundo a

autora,

[...] os exercícios que, em geral, são propostos aos alunos sobre textos da literatura infantil não conduzem à análise do que é essencial neles, isto é, à percepção de sua literariedade, dos recursos de expressão, do uso estético da linguagem; centram-se nos conteúdos, e não na recriação que deles faz a literatura; voltam-se para as informações que os textos veiculam, não para o modo literário como as veiculam. (SOARES, 2011, p. 43).

Desse ponto de vista a escolarização da literatura é um processo que a

escola não pode desconsiderar e nem desviar-se, ela é fato. Assim, o que precisa

ser encarado e discutido não é “se a escola deve ou não escolarizar a literatura”

(COSSON, 2012, p. 23), mas como sistematizar essa escolarização sem

desconfigurar ou falsear o texto literário. Para tanto, os autores apontam para a

necessidade de se conciliar o discurso pedagógico e discurso estético no tratamento

do texto literário, porém, para que isso ocorra, é necessário que os professores

compreendam o estreitamento entre estes dois discursos (estético e pedagógico) –

as especificidades de cada um e como eles se inter-relacionam – para que então

possam construir estratégias de abordagem da leitura literária coerentes com esse

propósito.

Essa construção de estratégias de abordagem da leitura literária pressupõe,

então, diferentes modos de leitura, de acordo com determinadas especificidades do

texto. Por isso, a próxima seção tem por objetivo fazer o detalhamento dessas

especificidades da leitura do texto literário.

1.5 A LEITURA DO TEXTO LITERÁRIO: EXERCÍCIO DE HUMANIZAÇÃO DO

HOMEM E DA SOCIEDADE

Como discorremos nas seções anteriores, a Literatura, por ser uma produção

humana, está intrinsecamente ligada à vida social. De acordo com Antônio Candido

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(1972), a literatura pode ser concebida como arte que transforma e humaniza o

homem e a sociedade na qual vive. O autor atribui à literatura três funções:

A primeira das funções pontuada por Candido (1972) é a função psicológica,

sendo assim nomeada pelo fato de o homem apresentar necessidade de imaginar e

fantasiar. E na literatura, ele pode encontrar um rico meio de expressar essa

capacidade.

Contudo, a imaginação e as fantasias expressas pela literatura apoiam-se na

realidade, e é por meio desse vínculo com o real que a literatura exerce sua outra

função: a função formadora. Essa segunda função entende a literatura como um

instrumento educativo indireto, tendo em vista que busca desnudar aquilo que a

ideologia dominante procura ocultar; ou seja, possibilita ao leitor experimentar (por

meio do outro: o autor e seu texto) o contato com diferentes realidades, visões de

mundo e convenções sociais; pois,

[...] a literatura pode formar; mas não segundo a pedagogia oficial. [...]. Longe de ser um apêndice da instrução moral e cívica, [...], ela age com o impacto indiscriminado da própria vida e educa como ela. [...]. Dado que a literatura ensina na medida em que atua com toda a sua gama, é artificial querer que ela funcione como os manuais de virtude e boa conduta. E a sociedade não pode senão escolher o que em cada momento lhe parece adaptado aos seus fins, pois mesmo as obras consideradas indispensáveis para a formação do moço trazem frequentemente aquilo que as convenções desejariam banir. [...]. É um dos meios por que o jovem entra em contato com realidades que se tenciona escamotear-lhe. (CANDIDO, 1972, p. 805-806).

Enfim, desse modo, a literatura pode atuar de forma relevante na formação do

indivíduo, auxiliando-o, inclusive, a construir valores diferentes daqueles

padronizados e difundidos pelas classes hegemônicas.

E, finalmente, registra Candido a última função da literatura em sua visão: a

social; que é a própria representação da sociedade e do homem; ou seja, é a função

ímpar que tem a literatura de retratar, denunciar e desmascarar a condição humana

em seus diversos contextos e realidades ao longo do tempo. É através dessa função

que o leitor tem contato com a realidade que o cerca, mesmo que dela não participe

diretamente. Esse reconhecimento possibilita a sensação de estranhamento e a

incorporação da realidade da obra às suas experiências pessoais.

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Para Candido (2004), sendo a literatura uma manifestação cultural de todos

os povos em todas as épocas da humanidade (quer seja por meio do folclore, de

lendas ou de produções escritas mais complexas, como a poesia e o romance), não

há homem ao qual pode ser negado o direito à produção literária. E é exatamente

pela capacidade de sensibilizar o ser humano, por permitir que ele atue de forma

mais crítica diante da complexidade da vida, que a literatura elenca um dos bens

culturais que deveriam ser divididos equitativamente entre todos os indivíduos de

uma sociedade.

Consoante Candido (2004), Petit (2008) sustenta que todas as pessoas,

independentemente da idade ou classe social, têm a necessidade (e também

deveriam ter o direito) de desenvolver sua imaginação; e a literatura atua no sentido

de alimentar essa fantasia, pois, a autora entende que é o texto literário, “esse

território de cultura elevada” (PETIT, 2008, p. 43), que constrói as mais efetivas e

duradouras experiências de leitura.

Entretanto, não é um luxo poder pensar a própria vida com a ajuda de obras de ficção ou de testemunhos que tocam no mais profundo da experiência humana. De obras que nos ensinam muito sobre nós mesmos, e muito sobre outras vidas, outros países e outras épocas. Parece-me inclusive que seja um direito elementar, uma questão de dignidade. (PETIT, 2008, p. 78).

Petit (2008) afirma que todos têm direitos culturais; o direito ao saber e

também o direito ao imaginário, o direito de apropriar-se de bens culturais que

contribuem, em cada idade da vida, para a construção ou para a descoberta de si

mesmo; uma abertura para o outro, para o exercício da fantasia – sem o qual não

existe o pensamento e tampouco a elaboração do espírito crítico.

Ao levarmos em conta, então, esse caráter sócio histórico e humanizador da

literatura, que contribui para a ampliação dos horizontes culturais e pessoais dos

indivíduos (além dos linguísticos), bem como a concepção interacionista de

linguagem, a qual prevê uma participação ativa do leitor; compreendemos, neste

trabalho, que é de suma importância que as práticas de leitura do texto literário

possam ser pensadas a partir dos pressupostos teóricos da Estética da Recepção;

justamente porque essa teoria fundamenta-se na relação entre o leitor e a obra, e

nela, a representação de mundo do autor que se confronta com a representação de

mundo do leitor, em uma ação dialógica da leitura.

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A “Teoria da Estética da Recepção” de Hans Robert Jauss (1921-1997)

nasceu na Alemanha em meados de 1960 e depois contou com contribuições de

outros pesquisadores importantes, entre eles o também alemão Wolfgang Iser

(1926-2007). Para que a interação leitor-texto se concretize, Jauss (1994) propõe

sete teses de que resultam sete estágios percorridos pelo leitor. Em todas as teses,

Jauss delimita o horizonte de expectativas, que representa o saber do leitor. O

horizonte de expectativa antecede a relação do leitor, porém, a interação do leitor-

texto modifica esse horizonte, como aspecto essencial que impulsiona o

prosseguimento e construção da compreensão, interpretação e aplicação estética.

Na primeira tese, Jauss trata da relação dialógica entre o leitor e o texto. Na

perspectiva dialógica, a obra é atualizada pelo leitor. E essa atualização se

diferencia conforme diferenciam-se as épocas históricas; assim, em épocas

diferentes, novas atualizações serão feitas sem, contudo, desconsiderar as

anteriores, mas modificando-as. Ocorre a descoberta dos conhecimentos prévios

que se relacionam ao assunto que a obra suscita. O leitor rememora o conjunto de

informações acerca do tema.

É sobre a tríade escritor-obra-leitor que o pesquisador alemão elabora a

segunda tese de sua teoria, na qual examina a experiência literária do leitor. Para

tanto, apresenta o conceito de horizonte de expectativas, que é entendido como um

“saber prévio” (JAUSS, 1994, p. 28) baseado em experiências anteriores do leitor, as

quais vão fornecer as bases para a compreensão e recepção uma obra. Cada leitor

pode reagir individualmente a um texto, mas a recepção é um fato social, já que todo

conhecimento é socialmente construído.

A terceira tese vai abordar exatamente a quebra da expectativa do leitor em

relação ao texto literário, obrigando-o a reestruturar e reconstituir o horizonte interno

das suas percepções. Jauss acredita que o valor de uma obra decorre do seu

distanciamento estético em relação ao horizonte de expectativas dos leitores. Assim,

uma obra de valor possibilita a ampliação e modificação do horizonte de expectativa

do leitor.

A quarta tese é estruturada a partir da hermenêutica, dinâmica de pergunta e

de resposta sobre o texto em seu contexto de produção, que permite ao pesquisador

conhecer a história da recepção da obra e comparar as diferenças entre a

compreensão passada e a presente. Significa descobrir como o leitor da época

percebeu e compreendeu determinada obra, recuperando o processo comunicativo

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que se instalou, e contrapô-lo com a recepção atual. Assim, o autor entende que

uma obra do passado só terá importância no presente se o leitor atual conseguir

suscitar nela perguntas e respostas interessantes.

As três últimas teses da Estética da Recepção tratam da historicidade da

literatura. A história da literatura está em constante movimento e transformação.

Para tanto, Jauss, na quinta tese, analisa o processo diacrônico da obra literária, e

diz que uma obra não perde seu poder de ação ao transpor o período em que

surgiu. “Um passado literário só logra retornar quando uma nova recepção o traz de

volta ao presente” (1994, p. 44); isto é, um texto literário antigo pode, por meio de

uma nova recepção, desencadear uma percepção diferenciada, que leva à

reformulação de sua compreensão.

Nesse movimento, Jauss já aponta para a sexta tese, na qual indica que, para

o leitor, tudo é simultâneo ao seu tempo: mesmo as obras produzidas em períodos

distintos e distantes serão apropriadas como atuais e serão submetidas ao seu atual

horizonte de expectativas.

Finalmente, na sétima tese, Jauss reflete sobre a relação entre literatura e

sociedade. Diferentemente do que postula a concepção marxista (a qual

compreende a literatura como reflexo da sociedade), o autor atribui à arte literária

um papel transformador, por oportunizar ao leitor a modificação do seu horizonte de

expectativas e, consequentemente, sua visão de mundo, tanto ao nível estético

quanto ao ético.

Para o criador da Estética da Recepção a arte não existe para confirmar o

que já é conhecido, e sim para contrariar expectativas. Assim, a literatura pode levar

o leitor a uma nova percepção e compreensão de seu universo. E esse processo de

transformação ocorre, historicamente, em três etapas: a produtora (Poiesis), a

receptiva (Aisthesis) e a comunicativa (Katharsis). Regina Zilberman (1989) explica

cada um destes termos, do seguinte modo:

[...] fruto do relacionamento da obra e o leitor é o aspecto fundamental da teoria fundada na recepção. Compõe-se em três etapas, inter-relacionadas: a poiesis, pois o recebedor participa da produção do texto; a aisthesis, quando este alarga o conhecimento que o destinatário tem do mundo; e a katharsis, durante a qual ocorre o processo de identificação que afeta as possibilidades existenciais do leitor. [...] Identificação equivale à resposta do leitor quando da experiência estética e tem um significado tanto intelectual quanto afetivo. (ZILBERMAN, 1989, p. 113).

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De acordo com a autora, essas etapas desencadeiam no leitor três modos de

experimentar da obra: a atividade produtiva, a perceptiva e a liberativa. Na primeira

delas, que é a poiesis (poesia), o leitor sente-se envolvido subjetivamente pelo texto,

a partir das possibilidades que a obra oferece. O desafio do novo e das palavras que

se transformam em imagens ilustram, engrandecem e surpreendem o leitor,

provocando (produzindo) prazer.

Na segunda etapa, a aesthesis (estesia) acontece a apreciação total da

estética do texto. Nesse momento, o leitor amplia os horizontes de expectativa e fica

suscetível a obter novas experiências prazerosas da arte, percebendo seu valor

estético.

Já a Kátharsis (catarse), a terceira etapa, refere-se ao efeito estético

propiciado pelo texto literário. Esse efeito possibilita a mudança de pensamento, de

atitude e de comportamento, tornando-se uma marca duradoura. É a possibilidade

de liberação dos conflitos internos, que dá uma sensação de alívio, desviando o

leitor das atividades práticas e da rotina.

Wolfgang Iser, adepto da Estética da Recepção, amplia as ideias de Jauss e,

contribui, dessa forma, na compreensão das especificidades da leitura do texto

literário. Para Iser “[...] é sensato pressupor que o autor, o texto e o leitor são

intimamente interconectados em uma relação a ser concebida como um processo

em andamento que produz algo que antes inexistia.” (ISER, 1979, p.105)

De acordo com o autor (ISER, 1979), leitor e sua leitura estão, de certa forma,

previstos no texto, ou seja, o escritor, ao compor o seu texto, prevê para ele um

determinado tipo leitor, o denominado leitor implícito. Para exemplificarmos esse

conceito pensemos em um autor que escreve um livro de literatura infantil: ao

escrevê-lo escolhe determinadas estruturas e tipo de linguagem para transmitir, o

mais adequadamente possível, a sua mensagem. Tais escolhas só são possíveis a

partir de uma imagem de leitor (e por conseguinte, de leitura) que ele constrói para

seu texto.

Assim, esse escritor compartilha uma base de conhecimento comum com o

leitor; e o leitor mais proficiente pode fazer, ainda, várias inferências sobre o texto

que vão além dos sentidos previstos pelo autor, como identificar os traços

ideológicos, o contexto de produção, etc.

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Ao retomar o conceito de Ingarden (apud COSTA LIMA, 2002, p. 25), de que

cada texto é um universo fechado no qual se encontram pontos de indeterminação,

Iser introduz, ainda, a ideia de “vazios constitutivos”, os quais “permitem o

estabelecimento de relações de interação” (ISER,1979, p. 88). Todo texto apresenta

“vazios” que são preenchidos de diferentes formas por cada leitor, a partir de suas

experiências de vida e de seus conhecimentos linguísticos. É esse preenchimento

que vai compor o sentido do texto.

Devido à grande quantidade de gêneros textuais que circulam na sociedade,

os quais possuem diferentes estruturas e funções sociais, podemos encontrar textos

que apresentam mais ou menos “vazios”. Dependendo das características e

objetivos de cada texto, alguns são mais ou menos susceptíveis a leituras

polissêmicas. Nessa perspectiva, quanto maior for o grau de objetividade de um

texto, menor serão as possibilidades de “preenchimento” do leitor. Em contrapartida,

quanto maior a subjetividade expressa em uma obra, maior será a atuação do leitor

na construção de significado.

Assim, ao considerarmos esses “vazios” propostos por Iser pelo viés da

educação escolar, mais especificamente, pelo letramento literário, cabe ao professor

mediar maneiras de como preencher, coerentemente, tais pontos de indeterminação;

ou seja, o professor pode, e deve, estimular o preenchimento dos vazios, sem,

contudo, preencher ele mesmo para o aluno. Cabe aqui ressaltar, também, que não

é qualquer possibilidade de preenchimento que pode ser considerada (pelo risco de

tornar-se arbitrária ao texto), mas aquelas marcadas pelas próprias regras internas

de constituição do texto.

Para tanto, salientamos mais uma vez que a variedade e a qualidade dos

textos literários oferecidos às crianças é fundamental. As experiências cotidianas e o

gosto que os alunos demonstram por certos tipos de histórias devem ser

considerados pelo professor, como forma de valorizá-los.

Contudo, essa aproximação do texto com a realidade social e afetiva do aluno

não deve ser a única prática de leitura literária na escola. Não podemos deixar de

apresentar um texto por julgarmos que ele não traz elementos do cotidiano do aluno.

Ao contrário, é imprescindível apresentar-lhe outras realidades e experiências,

outras épocas e linguagens, pois é o novo que amplia horizontes. Assim, ao serem

encaminhados, progressivamente, para leituras mais complexas, os pequenos

aprendizes podem ampliar a consciência sobre si mesmos e sobre o mundo, além

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de estabelecerem paralelos que lhes deem oportunidades de alcançarem níveis

sociais mais privilegiados.

Como vimos, a literatura, ao constituir-se em uma importante prática social de

figuração artística da realidade, assume papel fundamental na formação dos

sujeitos. Por meio dos primeiros contatos com os textos literários, desde que

significativos e consistentes, a criança pode desenvolver o gosto pela leitura e, por

conseguinte, desenvolver sua consciência crítica.

Destacamos, assim, que o trabalho com a literatura na escola é importante e

que, em muitos casos, ele constitui-se na única possibilidade de contato com o texto

literário por parte de uma grande parcela de alunos. Tal escolarização, entretanto,

precisa ser adequada, permitindo a compreensão e o envolvimento lúdico com as

obras. Nesse sentido, a escola precisa incluir e oferecer oportunidades para que a

literatura se efetive enquanto instrumento de formação: não apenas como pretexto

para aprendizagem de conteúdos, mas como ferramenta de humanização, como

possibilidade de constituição de um indivíduo ativo na sociedade em que vive.

Ao levarmos em conta tal necessidade, compreendemos que essa

escolarização da literatura só pode ser adequada se pensada e sistematizada a

partir de fundamentos criteriosos, ou seja, baseada em uma teoria que sustente,

tanto seus objetivos e perspectivas, quanto suas ações metodológicas. Por isso,

desenvolvemos, no capítulo a seguir, uma proposta pedagógica de trabalho com o

texto literário para as séries iniciais. Tal prática de leitura está organizada segundo

os princípios da Estética da Recepção e da Literatura Comparada. Em nossa

proposta de leitura, a inclusão da intertextualidade literária ligadas às produções

artísticas de outras áreas (como a pintura, a música, o desenho, etc.) possibilita ao

leitor explorar os diálogos culturais e a beleza estética como premissas para uma

aprendizagem crítica.

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II PARTE: PRÁTICAS DE LEITURA DO TEXTO LITERÁRIO

2 O PERCURSO METODOLÓGICO: MEIOS E FORMAS PARA ALCANÇAR

PROPÓSITOS

Neste capítulo, apresentaremos como foi estruturada a pesquisa no que

concerne aos aspectos conceituais e formais. Descreveremos também a situação de

leitura literária em que se encontra a escola investigada e a turma envolvida no

projeto, pois é a partir dessa realidade efetiva que planejamos nossa proposta de

intervenção pedagógica para leitura do texto literário nos anos iniciais; a qual será

exposta ao final desta parte.

2.1 ABORDAGEM METODOLÓGICA: TRAJETÓRIA ORGANIZACIONAL DA

PESQUISA

Esta pesquisa consistiu em verificar e analisar, por meio de um estudo

exploratório fundamentado nos princípios da pesquisa qualitativa, de que forma a

literatura infantil é utilizada pelos professores de uma turma de 5° ano do ensino

fundamental (da escola municipal investigada) na perspectiva de formar o futuro

leitor crítico e contribuir para uma aprendizagem significativa.

De acordo com Marli André (2008), a pesquisa no contexto da educação

sofreu, ao longo do tempo, forte influência do modelo positivista, o qual compreende

a realidade como algo mensurável e quantificável, ou seja, uma abordagem

quantitativa dos fatos.

Segundo a autora, foi somente em meados do século XIX que os cientistas

sociais começaram a questionar se o método de investigação positivista poderia

continuar servindo de base para o estudo dos fenômenos educacionais. É nesse

cenário que surge o paradigma interpretativo, também denominado de abordagem

qualitativa, a qual defende que a pesquisa desenvolvida no âmbito educacional deve

considerar a dinâmica das relações sociais permeadas pelas interações entre os

sujeitos no espaço pesquisado.

Tal abordagem tem contribuído para um novo olhar sobre a educação ao

ampliar o debate acerca das possibilidades de descoberta e desvelamento de

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práticas escolares, realçadas pelas dinâmicas das interações sociais estabelecidas

nesse âmbito, pois, como atesta a pesquisadora:

Esse tipo de pesquisa permite, pois, que se chegue bem perto da escola para tentar entender como operam no seu dia-a-dia os mecanismos de dominação e de resistência, de opressão e de contestação ao mesmo tempo em que são veiculados e reelaborados conhecimentos, atitudes, valores, crenças, modos de ver e de sentir a realidade e o mundo. (ANDRÉ, 2008, p. 41)

Denzin e Lincoln (2006) também consideram a pesquisa qualitativa como uma

atividade de construção de representações e significações realizadas tanto pelo

observador, quanto pelos observados, sendo ambos considerados os sujeitos da

ação investigativa. Para tanto, a pesquisa qualitativa envolve uma abordagem

interpretativa do mundo circundante, o que significa que os pesquisadores estudam

os fenômenos em seus cenários naturais e tentam entendê-los ou interpretá-los de

acordo com os significados que as pessoas a eles conferem. Por isso, pesquisa

qualitativa vai além da análise de dados quantitativos, pois utiliza uma variedade de

técnicas com a finalidade de apreender e interpretar os significados existentes no

ambiente da investigação. Assim,

[...] a pesquisa qualitativa envolve o estudo do uso e a coleta de uma variedade de matérias empíricas - estudo de caso; experiência pessoal; introspecção; história de vida; entrevista; artefatos; textos e produção culturais; textos observacionais, históricos, interativos e visuais [...]. Entende-se, contudo, que cada prática garante uma visibilidade diferente ao mundo. Logo, geralmente existe um compromisso no sentido do emprego de mais de uma prática interpretativa em qualquer estudo. (DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 17).

Nessa perspectiva, a Pesquisa-ação é reconhecida como uma das principais

formas de pesquisa qualitativa, pelo seu caráter participativo e pelo fato de promover

interação entre o pesquisador e os sujeitos investigados. De acordo com Thiollent

(1997) a pesquisa-ação é um tipo de investigação social de base empírica, na qual

atores (sujeitos pesquisados) e pesquisadores se envolvem de modo cooperativo na

compreensão da realidade em que estão inseridos; não só identificando os

problemas coletivos, mas também buscando e experimentando soluções em

situação real. “A dimensão ativa do método manifesta-se no planejamento de ações

e na avaliação de seus resultados.” (THIOLLENT, 1997, p. 14).

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Assim, para demandar o nosso estudo na perspectiva qualitativa (pelo viés da

pesquisa-ação), empregamos a observação participante como técnica principal e o

diário de campo como recurso auxiliar. Por isso, fizemos, no primeiro semestre letivo

do ano de 2014, observações de aulas de Língua Portuguesa (leitura de textos

literários e aulas de biblioteca, especificamente) em uma de 5° ano, com o objetivo

de obter informações e indicativos de como esse trabalho com a literatura infantil se

efetiva nesta realidade específica. A observação, segundo Lüdke e André (1986)

possibilita

[...] que o observador chegue mais perto da „perspectiva dos sujeitos‟, um importante alvo nas abordagens qualitativas. Na medida em que o observador acompanha in loco as experiências diárias dos sujeitos, pode tentar apreender a sua visão de mundo, isto é, o significado que eles atribuem à realidade que os cerca e às suas próprias ações. (LÜDKE e ANDRÉ, 1986, p. 26).

O registro das observações foi feito através de diário de campo, no qual

indicamos o dia, a hora, o local e o período de duração de cada uma; bem como as

anotações pertinentes às atividades literárias desenvolvidas e aos sujeitos

envolvidos.

Segundo Angrosino (2009), a confiabilidade da observação participante

depende do registro sistemático, análise de dados e repetição regular das

observações durante um determinado período de tempo. Além disso, o pesquisador,

pode atestar a validade da sua observação, também, pela triangulação das

informações, utilizando diversas técnicas complementares como depoimentos,

narrativas, história de vidas, práticas interacionistas, entre outros.

A descrição interpretativa das práticas investigadas procurou relatá-las de

acordo com a visão e compreensão dos pesquisados; pois buscou retratar os

sujeitos, as situações e as opiniões como eles se apresentaram, ou seja, na

perspectiva dos envolvidos na pesquisa. Não queremos insinuar com isso, que

tecemos um discurso “neutro” (tendo vista nossa compreensão bakthiniana de

linguagem), mas que primamos por uma descrição criteriosa e detalhada do

comportamento dos sujeitos, considerando suas expressões e gestos, seus olhares,

a receptividade, participações e interações; enfim, tudo que fosse significante para a

compreensão da situação sociocultural que estava sendo investigada.

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A partir da definição da abordagem metodológica de nosso trabalho,

passamos a descrever os aspectos contextuais da realidade investigada, no intuito

de traçar um perfil dos sujeitos leitores da referida escola, e estabelecer como e em

que condições as práticas de leitura literária vêm sendo realizadas.

2.2 CONTEXTO DA PESQUISA: O CAMPO DAS AÇÕES

A escolha do local de investigação e aplicação do projeto de intervenção

pedagógica deu-se em virtude de nossa própria ação docente, tendo em vista

fazermos parte do quadro de professores da escola desde o ano de 2011. Além

disso, a direção, coordenação e demais professores mostraram-se bastante

receptivos e entusiasmados com a ideia de desenvolvermos uma proposta de

trabalho, intencional e sistematizada, com a literatura infantil.

A Escola Municipal está localizada no perímetro central do município de

Cascavel, Paraná. Desde 1982 funciona como Escola Básica, atendendo alunos da

Educação Infantil e do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental, com um total de 16

turmas distribuídas nos períodos matutino e vespertino, sendo: duas turmas de pré-

escolar, três turmas de 1º ano, três turmas de 2º ano, três turmas de 3º ano, duas

turmas de 4º ano e três turmas de 5º ano, totalizando 412 alunos4 atendidos nesta

instituição escolar. Para o desenvolvimento desta pesquisa, optamos pela

observação, coleta de dados e aplicação do projeto de intervenção em uma turma

de 5º ano, composta por 24 alunos (11 meninos e 13 meninas), visando uma

participação mais segura e detalhada neste processo.

De acordo com o PPP (Projeto Político Pedagógico, ano de 2014) da

instituição, a escola conta com 14 professoras e uma monitora de biblioteca; todas

com vasta experiência no magistério, entre 12 a 26 anos de atuação em sala de

aula. Também fazem parte do quadro efetivo da escola há mais de 5 anos, o que

demonstra uma estabilidade na carreira e no quadro funcional da escola. No que se

refere à formação, com exceção de duas professoras que possuem habilitação, uma

em Letras e a outra em História, todas as demais são graduadas em Pedagogia.

4 A quantidade de turmas e número de alunos refere-se ao ano de 2014, período em que foram

coletados os dados e no qual foi, também, aplicado o Projeto de Intervenção.

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A unidade de ensino dispõe de um prédio antigo, com espaço físico pequeno

e inadequado: observamos, por exemplo, que a biblioteca escolar não consegue

acomodar grande parte dos livros (tanto os didáticos e de pesquisa, quanto os de

literatura) que possui, os quais ficam empilhados, em cantos, indisponíveis para

manuseio de professores e alunos.

Todas as turmas têm, semanalmente, uma aula na biblioteca, com duração de

1hora e 20 minutos. Nesta aula, os alunos podem ler obras selecionadas pela

bibliotecária e fazer empréstimos, para poderem levar os livros para casa, por um

período fixo de sete dias. Acontece que os materiais disponíveis para essas práticas

são apenas os exemplares mais antigos, pois a escola não permite o manuseio dos

livros mais novos, tendo em vista o “risco” dos alunos sujarem ou estragarem o

acervo.

No que se refere ao trabalho pedagógico, o Currículo para a Rede Municipal

de Ensino é o documento que norteia as ações e práticas de ensino.

O Currículo da Rede Pública Municipal de Ensino de Cascavel foi elaborado

em 2007 e implementado em 2008. Contempla as modalidades da Educação Infantil,

do Ensino Fundamental (Anos Iniciais) e da Educação de Jovens e Adultos.

Ancorado nos pressupostos do Método Materialista Histórico Dialético, na

Pedagogia Histórico-Crítica e na Psicologia Histórico Cultural, compreende a leitura

como um processo cognitivo e social; como observamos na passagem:

[...] concebendo a leitura na condição de cognição e de prática social, o leitor aciona seu conjunto de valores e crenças, resultantes da classe social à qual pertence, para o processo de compreensão e interpretação do texto. (CASCAVEL, 2008, p. 331).

Decorrente dessa concepção de leitura como prática social, o Currículo

Municipal elenca a leitura literária como uma “abordagem da leitura” que “expande

as fronteiras de conhecimento do leitor” (CASCAVEL, 2008, p. 331). Destaca também

que

[...] ao aproximar o leitor do universo literário que supera os limites de sua vida cotidiana, a obra literária desafia seu pensamento, provoca emoções e sentimentos novos, conduz à compreensão da realidade social. Dessa forma, o leitor é posto diante dos grandes conflitos da humanidade, não diretamente, mas de maneira indireta, por meio dos conflitos artisticamente retratados na obra literária, numa unidade dialética entre conteúdo e forma. A obra de arte não soluciona os

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conflitos da humanidade nem os cria, ela os traduz de maneira artisticamente condensada. A superação desses conflitos cabe à prática social em sua totalidade. (CASCAVEL, 2008, p. 331).

Assim, percebemos que o documento valoriza o papel da literatura na

formação do leitor crítico e demonstra uma preocupação com as especificidades do

texto literário. Contudo, limita-se, apenas, a apontar a importância de tal trabalho,

sem estruturar uma abordagem metodológica respaldada em um aporte teórico

consistente; ou seja, apesar de assinalar a relevância da leitura literária, o currículo

não oferece suporte teórico e metodológico para que os professores desenvolvam

um trabalho com o texto literário de forma sistematizada.

Além do Currículo da Rede Pública Municipal, os Parâmetros Curriculares

Nacionais – PCN – também servem, indiretamente, como um instrumento de apoio à

prática docente. Apesar de o sistema público municipal não fazer menção direta aos

PCN, a rede faz uso dos livros didáticos distribuídos por meio do Programa Nacional

do Livro Didático – PNLD5 – os quais seguem as orientações dos Parâmetros

Nacionais; por isso, mesmo que de maneira latente, as concepções previstas nos

PCN perpassam o trabalho didático com a literatura nas escolas do município, tendo

em vista que a grande maioria dos professores orienta seu trabalho a partir do livro

didático.

A noção de discurso presente nos PCN constitui-se em um importante

elemento para compreensão da língua e da literatura. Alicerçado nas ideias

bakthinianas, o documento compreende que nenhum discurso acontece no vazio, e

as escolhas feitas pelo locutor, ao proferir o discurso, não são aleatórias; podem ser

conscientes ou inconscientes, mas sempre serão decorrentes das condições em que

o discurso é realizado. Essa concepção engloba tanto o discurso oral quanto o

escrito. Na forma escrita, ele ocorre através da produção de textos e sua

manifestação sempre dialoga com os outros discursos já produzidos.

Nesta perspectiva, o texto configura-se como unidade básica do ensino, e o

texto literário, por sua especificidade, como elemento indispensável ao

5 O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) tem por objetivo central a avaliação, aquisição e

distribuição universal e gratuita de livros didáticos para os alunos das escolas públicas do ensino

fundamental. Avaliados a cada três anos, os livros didáticos são aprovados conforme sua adequação

aos Parâmetros Nacionais Curriculares, e posteriormente incluídos no Guia de Livros Didáticos, que

auxilia os professores na escolha dos livros que serão usados em sala de aula.(cf. ALBUQUERQUE e

COUTINHO, 2006).

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desenvolvimento da linguagem e do pensamento crítico. O texto literário é definido

como uma forma de representação e estilo, com predomínio da criatividade e

intenção estética. No entanto, o texto literário, apresentado na concepção de

representação da realidade, não se prende aos critérios de experiências pessoais ou

aos modos e padrões da realidade; ele constitui-se numa maneira singular de dar

forma às experiências humanas na medida em que transgride valores, permitindo a

construção de novos sentidos nas relações entre o sujeito e o mundo. Assim,

[...] pensar a literatura a partir dessa relativa autonomia ante outros modos de apreensão e interpretação do real corresponde a dizer que se está diante de um inusitado tipo de diálogo, regido por jogos de aproximação e afastamento, em que as invenções da linguagem, a instauração de pontos de vista particulares, a expressão da subjetividade podem estar misturadas a citações do cotidiano, a referências indiciais e, mesmo, a procedimentos racionalizantes. Nesse sentido, enraizando-se na imaginação e construindo novas hipóteses e metáforas explicativas, o texto literário é outra forma/fonte de produção/apreensão de conhecimento (PCN, 1998, p. 26-27).

Ainda sobre o texto literário, cabe destacar que os PCN também criticam o

uso do texto como pretexto para o tratamento de questões sobre valores morais ou

voltadas à gramática “que não aquelas que contribuem para a formação de leitores

capazes de reconhecer as sutilezas, as particularidades, os sentidos, a extensão e a

profundidade das construções literárias” (PCN, 1998, p. 27) e ratifica que o trabalho

com o texto literário envolve o reconhecimento das singularidades e propriedades

particulares dos textos literários.

A reflexão sobre a importância da literatura, mesmo que limitada, apresenta

objetivos que podem levar o aluno a transformar-se em um leitor crítico:

Para ampliar os modos de ler, o trabalho com a literatura deve permitir que progressivamente ocorra a passagem gradual da leitura esporádica de títulos de um determinado gênero, época, autor para a leitura mais extensiva, de modo que o aluno possa estabelecer vínculos cada vez mais estreitos entre o texto e outros textos, construindo referências sobre o funcionamento da literatura e entre esta e o conjunto cultural; [...]; da leitura mais ingênua que trate do texto como mera transposição do mundo natural para a leitura mais cultural e estética, que reconhece o caráter ficcional e a natureza cultural da literatura (PCN, 1998, p. 71).

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Embora reconheçamos importantes as preconizações do documento, a

literatura carece, nos PCN, de um tratamento mais específico e elaborado, pois

enquanto a noção sobre a língua é bem fundamentada a literatura é apresentada de

forma tênue e diluída, sendo mencionada, apenas, na seção que aborda as leituras

dos gêneros textuais direcionados aos anos finais. Note-se, aqui, que em momento

algum o documento refere-se ao trabalho com a literatura nos anos iniciais do ensino

fundamental.

Nessas circunstâncias, os PCN favorecem a interpretação equivocada de que

o trabalho com a literatura, no ensino fundamental, trata-se da apresentação de mais

um gênero textual e de sua abordagem linguística e estrutural. Tal interpretação é

facilmente observada na maioria dos livros didáticos desse nível de ensino, os quais

trazem textos literários fragmentados, adaptações e atividades voltadas para o

estudo do gênero, além das tradicionais fichas de leitura e questionários.

Percebemos, mais uma vez, que este documento oficial também evidencia a

importância da leitura literária como forma de elevar o nível de conhecimento acerca

do mundo e como forma de transgredir padrões e modos de ver a realidade, “dando

novas possibilidades aos leitores para reinterpretar o mundo atual e os mundos

possíveis, num jogo de aproximação e afastamento das citações do cotidiano” (PCN,

1998, p. 26-27). Entretanto, como já observamos em relação ao Currículo Municipal,

os PCN limitam-se, também, a evidenciar a relevância da prática literária, sem

apontar direcionamentos metodológicos para que os professores tenham subsídio

para desenvolver um trabalho com o texto literário de forma a valorizar as

especificidades da literatura.

Assim, temos como ponto de partida esse contexto educacional em que

atuamos enquanto professores, o que possibilitou-nos não apenas diagnosticar o

problema teoricamente, mas vivenciá-lo, cotidianamente, em nossa prática em sala

de aula. Foi pensando nessa realidade, na qual se configura o problema de

formação do leitor literário, que elaboramos o Projeto de Intervenção Pedagógica –

“Oficinas de Leitura Literária para os Anos Iniciais – práticas comparatistas”, o qual

descrevemos na seção a seguir.

2.3 OFICINAS DE LEITURA LITERÁRIA: PLANEJAMENTO ESTRUTURADO DE

AÇÕES PARA LEITURA DO TEXTO DE LITERATURA

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Ao longo do processo de escolarização da Literatura, temos observado uma

apresentação e abordagem das produções literárias de maneira desconexa e

fragmentada, visando muito mais ao (re)conhecimento de autores, títulos,

personagens, características linguísticas ou escolas literárias, do que os fins

estético-lúdicos; os quais, na realidade, encerram sua verdadeira essência.

Este tratamento didático inadequado tem incidido direta e negativamente no

desenvolvimento do hábito leitor, sendo uma das principais causas da falta de gosto

pela leitura, evidente na maioria das escolas, bem como pela dificuldade que os

alunos demonstram na compreensão e construção de sentidos sobre as obras

literárias.

Assim, na busca de uma alternativa metodológica para o trabalho escolar com

a Literatura, que permita desenvolver nos alunos os conhecimentos necessários,

que os desperte para o gosto lúdico e compreensivo dos textos literários, e, partindo

do pressuposto que a sensibilidade estética deve ser estimulada de maneira

intencional, desde o início da escolarização, apresentamos uma Proposta de

Aplicação Pedagógico-Literária para os anos iniciais do Ensino Fundamental,

direcionada aos alunos de 5º ano.

Este modelo de aplicação está fundamentado nos conceitos da Estética da

Recepção, os quais consideram a relação dinâmica entre autor, obra e leitor;

atribuindo à leitura, não só o caráter didático e formativo, mas especialmente a

fruição e satisfação pessoal que ela proporciona ao leitor, contribuindo, assim, com a

humanização do indivíduo, em seus níveis mais complexos e elaborados. Pois,

como aponta Hans R. Jauss:

[...] a experiência estética não se inicia pela compreensão e interpretação do significado de uma obra; menos ainda, pela reconstrução da intenção de seu autor. A experiência primária de uma obra de arte realiza-se na sintonia com (Einstellung auf) seu efeito estético, isto é, na compreensão fruidora e na fruição compreensiva. Uma interpretação que ignorasse esta experiência estética primeira seria própria da presunção do filólogo que cultivasse o engano de supor que o texto fora feito, não para o leitor, mas sim, especialmente, para ser interpretado. (JAUSS, apud COSTA LIMA, 2002, p. 69 – grifo do autor).

Além disso, contemplamos também as noções de intertextualidade da

Literatura Comparada, aqui compreendida como a capacidade do leitor de associar

aspectos de um texto com outros conhecimentos de seu universo cultural; atividade

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esta, que se torna sinônimo de ampliação ou ativação de intertexto. Nesse sentido,

Antonio Mendonza Fillola exorta que:

[...] en realidad, en todo proceso de recepción (sea de un Texto o de un Discurso), partimos de un estímulo visual (texto escrito: poema, novela/producción plástica: pintura, escultura), en cuya recepción siempre se produce la lectura de significados implícitos y explícitos que constituyen parte de la obra. 6 (FILLOLA, 1994, p. 91).

A Literatura Comparada, surgida no final do século XIX, compreende que a

literatura não é um objeto de estudo estanque e imanente, mas constitui-se como

constante diálogo entre textos e culturas de diferentes épocas e lugares, a partir de

processos de empréstimos, trocas e retomadas de discursos. Sua abordagem

transcende os limites da linguagem e da nacionalidade para explicar as relações de

criações literárias em suas semelhanças e diferenças.

De acordo com Fillola (1994), a Literatura Comparada não é uma ciência cuja

tarefa consiste em elaborar teorias, mas uma disciplina comparativamente empírica,

que procura colocar em evidência, de modo prático e direto, as conexões entre a

literatura, a cultura e outros acontecimentos sócio-históricos. Como menciona o

autor:

[...] la LC [Literatura Comparada] no pretende desarrollar teorías propias, su ámbito de investigación está basado en la aplicación, igual que sucede en la investigación metodológica de una didáctica aplicada.7 (FILLOLA, 1994, p. 19-20).

Apesar de a comparação ser uma questão que remonta à antiguidade (já

observada na Poética de Aristóteles), é importante destacar a precedência de

Bakhtin em relação a esses estudos, os quais foram ampliados por Julia Kristeva. A

partir da teoria de Bakhtin sobre o dialogismo, a autora elabora e firma o conceito de

intertextualidade, dizendo que “[...] todo texto se constrói como mosaico de citações,

todo texto é absorção e transformação de um outro texto.” (KRISTEVA, 2005, p. 68).

6 Nossa tradução: [...] na realidade, em todo processo de recepção (seja de um Texto ou de um

Discurso), partimos de um estímulo visual (texto escrito: poema, novela/produção plástica: pintura, escultura), em cuja recepção sempre se produz a leitura de significados implícitos e explícitos que constituem parte da obra. 7 Nossa tradução: A Literatura Comparada não pretende desenvolver teorias próprias, seu âmbito de

investigação está baseado na aplicação, tal qual a investigação metodológica de uma didática aplicada.

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Reportando-se à compreensão de Kristeva acerca da intertextualidade, Fillola

(1994) destaca a importância deste fundamento como instrumento que permite aos

sujeitos ampliarem seus conhecimentos, tanto literários quanto culturais. O autor

aponta que:

[…] cuestiones como la intertextualidad e interculturalización patentes en las obras literarias – aspectos que se podrían conectar con lo que J. Kristeva (1978:85) denomina la absorción y transformación – son conceptos que resultan lo suficientemente globalizadores como para permitir cohesionar una serie de conocimientos literarios y culturales y organizarlos en límites más amplios que la referencia a una producción nacional y de época.8

(FILLOLA, 1994, p. 39).

Portanto, para o teórico, intertextualidade é entendida no seu sentido mais

lato, como uma interconexão de textos e significados, também estendido para a

produção artística de diferentes signos.

Além disso, Fillola (1994) também faz referência à correspondência existente

entre a Literatura Comparada e os diversos sistemas artísticos9 (verbais e não

verbais; como a escultura, a pintura, a música, o cinema, etc.), cuja perspectiva

globalizadora serve para ampliar a compreensão do leitor e recepção significativa da

obra e, consequentemente, contribuir para a formação leitora crítica. Contudo,

apesar da perspectiva intersemiótica, a proposta não está voltada para o estudo

semiótico específico destes signos, mas em proporcionar aos alunos um recurso

motivador e estimulante para a compreensão da variedade discursiva e para a

aceitação da diversidade sócio cultural evidenciada nestes sistemas artísticos.

Nessa direção também efetuamos as nossas propostas de práticas de leituras

intertextualizadas.

Assim, ancorado nesses pressupostos da Literatura Comparada e

intertextualidade, o pesquisador espanhol (FILOLLA, 1994) desenvolve um modelo

de aplicação para o trabalho com o texto literário na escola. Ao estabelecer sua

proposta o autor assinala o papel do professor nesse processo, cujas ações devem

8 Nossa tradução: Questões como a intertextualidade e a interculturalização presentes nas obras

literárias – aspectos que poderiam ser conectados com o que J. Kristeva (1978:85) denomina de absorção e transformação – são conceitos suficientemente globalizadores que podem permitir a coesão de uma série de conhecimentos literários e culturais e organizá-los em limites mais amplos que apenas a referência a uma produção nacional e de determinada época. 9 Fillola (1994, p. 66) pontua que a Literatura Comparada contempla em suas opções metodológicas a

análise de produções literárias em relação com outras criações artísticas, em particular com a pintura.

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centrar-se em: trabalhar as relações entre diversos campos e sistemas de

comunicação (verbais e não verbais) em uma perspectiva semiótica, estabelecendo

paralelos e conexões entre produções literárias e outras artes; potencializar a

participação do leitor na atribuição de valores às obras que lê (descobrimento de

novos valores); e salientar as relações (seja pelas semelhanças ou contrastes) entre

dois ou mais exemplos de expressões culturais que, com signos e códigos distintos,

colocam em evidência um conjunto de convencionalismos artísticos- culturais.

Embora sua proposta comparativa para o ensino de literatura esteja voltada

para contextos educacionais bilíngues (ou uma literatura em língua estrangeira),

acreditamos que as proposições do pesquisador (FILLOLA, 1994) possam ser

utilizadas como referencial metodológico e adaptadas para qualquer modalidade de

ensino (inclusive para os anos iniciais de escolarização); tendo em vista que sua

metodologia requer do leitor a ativação de vários conhecimentos e habilidades de

linguagem, e o desenvolvimento de estratégias de monitoramento metacognitivos

para perceber os contrastes expressivos entre textos escritos e outros códigos

artísticos.

Para estruturar a sequência didática de seu modelo comparativo Filolla (1994)

propõe quatro fases, as quais elencamos:

Fase 1 - Aproximação dos conceitos chaves: trata-se da apresentação

inicial baseada em produções plásticas com evidentes vínculos entre si e com o

texto literário (a semelhança formal entre elas favorece a compreensão dos objetivos

do enfoque comparatista). Proporciona-se aos alunos as habilidades básicas para

apreciarem e detectarem diversas formas de interconexão entre produções

artísticas. Desenvolve-se o conceito de intertextualidade assim como a

compreensão dos diversos fenômenos de transformação que ocorrem na criação de

novas obras.

Fase 2 - A sistematização da metodologia da Literatura Comparada:

constitui-se na aplicação dos recursos comparativos de observação voltados para os

textos literários propriamente ditos. Traz o emprego de estratégias de observação

que são contrastados em textos da mesma língua.

Fase 3 - Estudo integrado de obras literárias em línguas distintas: a

comparação de textos em línguas distintas vai permitir ao aluno estabelecer

conexões e correlações entre conhecimentos, línguas, gêneros e cultura.

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Fase 4 - Integração de conhecimentos culturais e projeção

interdisciplinar da proposta: tem um caráter globalizador que destaca a

possibilidade de se analisar, em sala de aula, produções de distintas artes,

conectando-as com as obras literárias.

Para cada fase de sua proposta, o autor propõe alguns passos a fim de

esquematizar a sequência metodológica, definindo-os como:

1- Objetivos – aplicação, que inclui: análise e comentários pessoais das

associações que a recepção das obras e de suas comparações –

contrastes ou paralelismos – provocaram no leitor.

2- Sistematização de dados – levantamento e organização de dados

obtidos a partir das observações dos alunos.

3- Metacognição do processo e das habilidades – análise dos textos

literários. Interessa que o aluno reflita conscientemente sobre seu próprio

processo de observação e leitura, alcançando níveis mais complexos do

texto, como a ideologia do autor, movimento estético literário, etc.

4- Conclusões – análise dos resultados obtidos com os alunos.

Em outra importante obra, La educación literária (2004), Fillola aponta que a

formação do leitor literário consiste em capacitar o sujeito para “identificar, associar,

relacionar, compreender, integrar e interpretar elementos que compõem o texto”

(2004, p. 156). Nesse desafio de formar os leitores, o autor ressalta a importância de

se desenvolver juntamente com os alunos, durante a leitura, estratégias e

conhecimentos textuais.

As estratégias de leitura, segundo Solé (1998), são os mecanismos de

compreensão necessários para o desenvolvimento do sujeito enquanto leitor

proficiente. O uso dessas “táticas” possibilita compreender e interpretar de forma

independente os textos. Rojo (2004) também faz referência a tais estratégias ao

destacar que há diferentes capacidades discursivas e linguísticas que são

solicitadas ao leitor no momento da leitura, desde a decodificação até a ativação do

conhecimento de mundo do leitor, a antecipação de conteúdos, comparação de

informações com outros textos, inferências locais e globais, entre outras. São esses

mecanismos que permitem que o ato de leitura seja caracterizado como produção

de sentidos.

Consoante Fillola (2004), as fases de leitura se organizam em cinco

momentos que desenvolvem habilidades diferentes no leitor. A primeira fase

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consiste no trabalho de realizar predições de forma intuitiva do texto a ser lido. A

segunda, a terceira e a quarta fases ocorrem durante o processo de leitura; por isso,

compreendem o desenvolvimento das habilidades de dedução, seleção das

expectativas e a certificação das informações do texto. Por fim, a fase de

compreensão e interpretação demonstra que o leitor interagiu com as informações

do texto e o entendeu.

As fases de leitura descritas por Fillola (2004) estão previstas em três etapas

de leitura: antes, durante e depois. Essa organização apontada pelo autor é

corroborada por Solé (1998) ao afirmar que para uma proposta de leitura em sala de

aula dar bons resultados é preciso que contemple os três momentos. O primeiro

momento consiste no reconhecimento das informações do texto antes de iniciar a

leitura; por isso, o leitor realiza predições e questionamentos sobre o texto. No

segundo momento, durante a realização da leitura, o leitor exercita as habilidades de

formular hipóteses; questionando, assim, o texto formulando perguntas a fim de

esclarecer dúvidas. No último momento, após a leitura, o sujeito tem a oportunidade

de confirmar suas impressões sobre o texto por meio de atividades de comprovação

de leitura. Vale ressaltar que as ações correspondentes a cada tempo de leitura não

são fixas, tendo em vista que o leitor ativo recorre a estas estratégias ao mesmo

tempo em que percorre o texto.

Segundo a autora, o leitor autônomo é aquele que exercita as estratégias de

leitura nos três tempos em que ela ocorre:

Este tipo de leitor caracteriza quem é capaz de [...] interrogar-se sobre a sua própria compreensão, estabelecer relações com o que lê e o que faz parte do acervo pessoal, questionar seu conhecimento e modificá-lo, estabelecer generalizações que permitam transferir o que foi compreendido para outros contextos diferentes (SOLÉ, 1998, p. 72).

As estratégias apresentadas por esses dois teóricos assemelham-se do ponto

de vista da organização; entretanto, distanciam-se no que concerne à última fase de

leitura. Enquanto que para Solé (1998) as atividades depois da leitura tem um

caráter mais pedagógico (prevendo exercícios de comprovação de leitura, como a

realização de resumos e perguntas), Fillola (2004), ao contrário, concebe a pós-

leitura como um processo de compreensão sem o compromisso de ter que realizar

atividades formais para se certificar que o leitor de fato compreendeu o texto.

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Nessa perspectiva de trabalho pontuada por Fillola (1994 e 2004),

entendemos que a recepção leitora, as estratégias cognitivas e as conexões

intertextuais constituem uma base de referência metodológica que nos possibilita

romper com a tradicional problemática do ensino da literatura, ou seja, da leitura

isolada e fragmentada do texto literário. Por isso, propomo-nos a abordar, nos anos

iniciais do ensino Fundamental, alguns exemplos de intertextualidade literária

ligadas às produções de outras artes (a pintura, a música, o desenho, entre outros

códigos de comunicação), por meio da apreciação, observação e valorização dos

diversos tipos de conexões entre as obras. Também, tendo em vista a faixa etária

dos alunos aos quais a proposta é dirigida, procuramos explorar o jogo e a

brincadeira como formas de mediar a leitura e a compreensão das obras apreciadas.

Para tanto, estabelecemos alguns objetivos a fim de melhor conduzir as

ações que planejamos para a prática de leitura do texto literário nas séries iniciais do

Ensino Fundamental, conforme listamos a seguir:

- Apresentar aos professores das séries iniciais uma proposta teórico-

metodológica para o trabalho com a literatura e subsidiar sua prática com sugestões

de encaminhamentos pedagógicos que lhes possibilitem uma reflexão sobre o

ensino da literatura no Ensino Fundamental – tendo como aporte teórico a Estética

da Recepção e a Literatura Comparada como uma das possibilidades de realização

deste trabalho – a fim de promover a formação leitora e contribuir para o letramento

crítico dos alunos.

- Propiciar aos alunos o desenvolvimento de conhecimentos que lhes

permitam construir sentidos para as obras trabalhadas, por meio da análise reflexiva

mediada pelo professor, visando à construção de uma vivência estético-literária.

- Estimular os alunos a apreciarem e valorizarem as obras, por meio de

observações detalhadas e apontamentos críticos do professor, levando-os a

perceber que a literatura faz uso estético da linguagem.

- Potencializar a participação dos alunos no processo de recepção e

construção de valores às obras apresentadas através de atividades lúdicas, levando-

os a rever valores já incorporados e conduzindo-os ao descobrimento de outros.

Baseando-nos nas fases do modelo comparativo de Filolla (1994),

interligando-as com as teses de Jauss (1994), descritas anteriormente, estruturamos

nossa Proposta de Aplicação Pedagógica-Literária em quatro módulos, os quais

sistematizam-se nas seguintes etapas:

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1- Apresentação das obras e determinação do horizonte de expectativas:

Inicialmente são apresentadas as obras literárias bem como as obras de

outras naturezas, sendo feito um levantamento de conhecimentos prévios

(empíricos, conhecimento de mundo) que os alunos demonstrem sobre obras,

autores e temas que serão explorados. Na sequência, estabelece-se os

encaminhamentos (observação, leitura, audição, etc) para que sejam

apreciadas e observados os traços de intertextualidade.

2- Recepção e Análise das obras: Por meio de questionamentos, comentários

e estímulos à conversação (interação de ideias e conhecimentos)

estabelecem-se a comparação entre os contrastes e paralelismos detectados

entre as diversas obras; tanto ao nível formal e estrutural, quanto às questões

emocionais, de sensibilidade e gosto lúdico. Nesta etapa, também, o

professor explora conhecimentos acerca do contexto de produção das obras,

intenções do autor, inferências, etc.

3- Integração de Conhecimentos Culturais: A partir do estudo das obras,

promove-se a integração dos conhecimentos abordados com outros

conhecimentos culturais dos alunos, por meio de atividades lúdicas

interdisciplinares.

4- Conclusões: Depois da aplicação de cada módulo, propicia-se um momento

de reflexão e avaliação acerca dos resultados alcançados, bem como uma

análise criteriosa da pesquisadora quanto ao envolvimento, recepção e

interação dos alunos com as obras abordadas.

Tendo em vista auxiliarmos o aluno na construção de sentidos e na

interpretação do texto literário em suas especificidades, além de privilegiarmos uma

aprendizagem a partir de um processo de interação entre o grupo escolar,

desenvolvemos um programa de leitura baseado em estratégias cognitivas e

metacognitivas, as quais visam a valorizar o conhecimento, as vivências e as

experiências dos pequenos leitores.

Lembrando que o leitor competente, de acordo com Fillola (1994) possui e

aplica um conjunto de competências metacognitivas das diferentes funções

receptoras, através das quais organiza o seu processo de recepção leitora,

desenvolvemos atividades (questões mediadoras) que contemplam as etapas de

pré-leitura e pós-leitura (conforme constam no DIÁRIO DE CAMPO: Tabela de

aplicação e anotações, em anexo).

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As atividades antes da leitura estão agrupadas na primeira etapa de nossa

Proposta de Aplicação Pedagógica-Literária (Apresentação das obras e

determinação do horizonte de expectativas) e têm os seguintes objetivos:

- ativar os conhecimentos de mundo dos alunos, por meio da exploração de

elementos temáticos e contextuais, encorajando-os a expressar as suas ideias e a

partilhar experiências;

- despertar a curiosidade dos alunos e ajudá-los a estabelecer objetivos de

leitura (que auxiliam na interpretação), estimulando-os a interagir com o texto, a

questioná-lo e a construir conhecimentos.

As atividades organizadas para a pós-leitura estão concentradas na terceira e

quarta etapas da Proposta (Integração de Conhecimentos Culturais e Conclusões), e

têm por finalidade:

-reorganizar, analisar e contrapor ideias;

-promover a reflexão sobre o texto;

-proporcionar a partilha e a construção de significados.

Para tanto, elaboramos, primeiramente, uma tabela de planejamento da

aplicação dos módulos das oficinas literárias de modo a organizar a sequência e

encaminhamentos das aulas, as quais estão dispostas nos anexos deste trabalho

(anexos 1, 2, 3 e 4). Além disso, a tabela foi usada para auxiliar no

acompanhamento dos resultados alcançados pelos alunos, pois servem como notas

de campo.

Assim, ao considerarmos as especificidades dos anos iniciais do ensino

Fundamental e, tendo em vista que o Sistema de Ensino Municipal de Cascavel – Pr

não apresenta nenhuma orientação sistematizada de trabalho com a literatura

infantil, acreditamos que, amparados nos pressupostos da Estética da Recepção e

adaptando o método comparativo de Fillola (1994) à realidade educacional da escola

investigada, podemos desenvolver uma proposta didático-pedagógica que prima

pela essência humanizadora e emancipadora da Literatura. Tal proposta segue

detalhada na seção a seguir.

2.3.1 Desenvolvimento sistemático das atividades: efetivação das práticas de

leitura

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Ao longo de todas as etapas e práticas efetuadas, as reações, contribuições,

mostras de interesse e desinteresse dos alunos foram anotados pela pesquisadora

nas tabelas de planejamento das atividades (conforme constam nos anexos 1, 2, 3 e

4, ao final deste trabalho). Essas constituíram o Diário de Campo no qual se

efetuaram os registros necessários para a futura análise reflexiva-crítica que também

integra nosso texto.

Os aspectos avaliativos, bem como demais comentários reflexivo-críticos

sobre as atividades realizadas são o assunto chave que se discute após a aplicação

das atividades, conforme o planejamento feito anteriormente e que, a seguir,

expomos:

MÓDULO 1 (duração de 5 aulas)

Tema da Prática: Literatura, Música e Cinema: Relações possíveis no conto “A

vendedora de fósforos” (de Hans Christian Andersen, tradução de Pedro Bandeira)

M.1.1- Apresentação das obras e determinação do horizonte de expectativas:

- Preparação do ambiente: sala com multimídia, tapete e almofadas. Roupas,

fantasias e acessórios (para dramatização, ex: chapéus, capas, lenços, fantoches;

enfim, materiais do acervo escolar). Alunos dispostos livremente.

- Conversação sobre quais obras e autores serão explorados neste módulo,

investigando o que os alunos sabem (ou não) e pensam sobre eles: quem são

(foram), que temas estão sendo abordados, como produziram suas obras, etc.

M.1.2- Recepção e análise das obras:

- Apresentação de trechos selecionados de duas músicas clássicas eruditas, sendo

elas: “Moonlight Sonata” – 1st Movement (Beethoven - 1801) e “Nocturne nº 20”

(Frederic Chopin - 1831).

- Conversação sobre a recepção e os efeitos da experiência estética a partir das

músicas: o que foi sentido, captado, as impressões que os alunos perceberam com

as obras.

- Narração (pela professora) do conto “A vendedora de fósforos” (anexo 5), de Hans

Christian Andersen (1845), explorando a dramaticidade da história.

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- Questionamentos e comentários sobre os aspectos da obra que os alunos pensam

ser mais expressivos, relacionando-os à recepção pessoal de cada um.

- Enumeração das associações e alusões possíveis entre as obras (conto e

músicas), elencando e enfatizando os aspectos da sensibilidade estética entre elas.

- Apresentação do curta de animação “The Little Matchgirl” (do diretor Roger Allers -

2007), que associa a sequência de textos imagéticos (não verbais) com a música

clássica.10

- Explanação sobre aspectos importantes da vida, obra e contextos sócio-históricos

dos autores de cada obra.

M.1.3- Integração de Conhecimentos Culturais:

- Explicação e conversação sobre os diferentes códigos, formas e elementos

utilizados por seus autores em cada criação artística, bem como os diferentes efeitos

de sentidos provocados em cada leitor: levantar pautas referentes à intenção dos

autores, contextos de produção das obras, construção de sentidos de acordo com os

conhecimentos do grupo (contrastando-os com os conhecimentos prévios

anteriormente levantados e os conhecimentos formais necessários para uma

compreensão mais profunda).

- Ampliação das discussões relacionando o tema e conhecimentos abordados com a

realidade social, histórica e cultural na qual os alunos estão inseridos. Ou seja, por

meio de reflexões sobre como podemos analisar e interpretar essa temática dentro

da atual sociedade em que vivemos, demonstrar aos alunos que a obra de arte

configura-se na representação artística de uma realidade social e culturalmente

determinada, mas que seus valores ultrapassam os limites temporais, constituindo-

se como algo universal.

- Divisão da turma em grupos e releitura do conto. A partir da recepção que cada

grupo realizou sobre o texto literário e as outras obras, os alunos deverão escolher

uma das músicas apresentadas e dramatizar (sem texto verbal) a história do conto,

procurando expressar o que mais os sensibilizou no enredo e na música.

M.1.4- Conclusões:

10

.disponível em : https://www.youtube.com/watch?v=_rill4j6c0k. Acesso em 08 de jul. de 2014.

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- Avaliação conjunta do trabalho realizado, refletindo se foi prazeroso, se ampliou

conhecimentos, se despertou sensações e emoções; enfim, se motivou uma

ampliação das percepções lúdicas e estéticas, além dos conhecimentos artístico-

literários, compreendendo a Arte enquanto representação artística de uma

determinada realidade.

MÓDULO 2 (duração de 5 aulas)

Tema da Prática: Literatura e Arte Plástica: Relações possíveis entre o Conto

“Biruta” (Lygia Fagundes Telles) e telas de Pablo Picasso, Edouard Manet e Briton

Rivière

M.2.1- Apresentação das obras e determinação do horizonte de expectativas:

- Preparação do ambiente: sala com multimídia, cartolinas, papéis coloridos, tintas e

pincéis. Alunos dispostos livremente.

- Conversação sobre quais obras e autores que serão explorados neste módulo,

investigando o que os alunos sabem (ou não) e pensam sobre eles: quem são

(foram), que temas estão sendo abordados, como produziram suas obras, etc.

- Conversação sobre a relação do ser humano com os animais de estimação

(interação de experiências).

M.2.2- Recepção e análise das obras:

- Apresentação (em multimídia) das telas: “Menino com um cão” (Pablo Picasso –

1905; “His only friend” (Briton Rivière – 1871) e “Menino com cão” (Edouard Manet –

1832-1883).

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Figura 1

HIS ONLY FRIEND - Briton Rivière – Óleo sobre tela – 1871 – Inglaterra

Fonte:http://www.wikiart.org/en/briton-riviere/his-only-friend-1871. Acesso em 08 de jul. de 2014.

Figura 2

MENINO COM UM CÃO – Pablo Picasso – guache – 57 x 41 cm – 1905

Fonte: http://pt.wahooart.com/@@/5ZKDBN-Pablo-Picasso-Menino-com-um-cao. Acesso em 08 de jul.de 2014.

Figura 3

MENINO COM CÃO – óleo sobre tela – Edouard Manet – 1832-1883, França.883

Fonte: http://pt.wahooart.com/@@/8EWFJH-Edouard-Manet-Menino-com-cao. Acesso em 08 de jul.de 2014.

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- Apresentação do conto “Biruta” (Lygia Fagundes Telles): Narração pela professora,

com acompanhamento individual.

BIRUTA (Lygia Fagundes Telles) Sinopse: Em Biruta, conhecemos a história de Alonso e seu cachorro Biruta: acompanhamos a solidão do menino, sua luta pela sobrevivência e para proteger o seu querido cão, companheiro e único amigo. É impossível não nos emocionarmos com esse retrato tão fiel da amizade, do amor do menino Alonso por Biruta e seu medo de se ver em sérias dificuldades pelas traquinagens do cão. Fonte do original: TELLES, Lygia Fagundes. Histórias escolhidas. São Paulo: Boa Leitura Editora, 1961. Disponível em: http://www.tirodeletra.com.br/conto_canino/Biruta1-LygiaFagundesTelles.htm

Acesso em 06 de jul. de 2014.

- Observação comparativa e contrastada das obras: em que obras há uma

correlação mais direta; o que elas têm em comum e o que as distancia; quais suas

semelhanças e diferenças, e o que elas provocam no processo de recepção.

M.2.3- Integração de Conhecimentos Culturais:

- Questionamentos e comentários, por meio de conversação, sobre como os alunos

poderiam explicar as relações existentes entre as obras plásticas e literária.

- Explanação sobre aspectos importantes da vida, obra e contextos sócio-históricos

dos autores de cada obra.

- Identificação dos aspectos formais das obras: os diferentes códigos (verbal e não

verbal), formas e elementos utilizados por seus autores em cada criação artística,

bem como os diferentes efeitos de sentidos provocados em cada leitor. Assim como

no módulo anterior, levantar pautas referentes à intenção dos autores, contextos de

produção das obras, construção de sentidos de acordo com os conhecimentos do

grupo (contrastando-os com os conhecimentos prévios anteriormente levantados e

os conhecimentos formais necessários para uma compreensão mais profunda).

- Posteriormente às leituras e discussões, os alunos serão motivados a

representarem esteticamente a percepção que tiveram das obras exploradas,

demonstrando suas experiências pessoais por meio da pintura: pinturas livres,

abordando a temática, utilizando tintas e papéis coloridos.

M.2.4- Conclusões:

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- Por meio do diálogo e da participação coletiva, avaliar se os alunos

compreenderam que cada obra tem um valor individual, podendo ser percebida,

apreciada e valorizada como uma unidade em si mesma; mas, que ao mesmo tempo

pode estabelecer conexões com outras obras de distintos códigos.

MÓDULO 3 (duração de 5 aulas)

Tema da Prática: Literatura e o lúdico: relações possíveis entre poesia, o desenho e

a brincadeira

M.3.1- Apresentação das obras e determinação do horizonte de expectativas:

- Preparação do ambiente: sala com multimídia e cadeiras. Alunos dispostos em

círculo. Materiais para desenho: sulfite, lápis, lápis de cor, giz de cera, canetas

hidrográficas, etc. Baú de fantoches, roupas, fantasias e adereços. - Conversação

(antecipação de experiências) sobre brincadeiras: o que é uma brincadeira, quem

são os envolvidos, se gostam, etc.

- Conversação sobre poesia e poema: levantamento dos conhecimentos prévios

sobre o que os alunos compreendem por poesia e por poema; se gostam; quais as

mais conhecidas; o que geralmente elas manifestam, etc.

- O professor deverá organizar uma caixa com poemas selecionados de alguns

autores (os poemas selecionados são: “O medo do menino”, “Segredinhos de amor”

e “Cantiga do vento” – de Elias José (1991); “Leilão de Jardim”, “Uma palmada bem

dada” e “Mosquito escreve” – de Cecília Meireles (1987); “Lagoa” e “No banco de

jardim” – de Carlos Drummond de Andrade (2009); “Pescaria”, “Cemitério” e “Ficção

científica” – de José Paulo Paes (1989); “O Leão” – de Vinícius de Moraes (1975) e

“A Boneca” – de Olavo Bilac (1919).

- Dividir os alunos em duplas. Em uma caixa decorada cada dupla sorteará,

aleatoriamente, um poema: títulos e autores variados, sem contarem aos demais.

- Distribuídos na sala de maneira a não se comunicarem entre si, cada um fará a

leitura individual do poema sorteado.

- Em um lado do quadro, os títulos dos poemas estarão colados, de maneira visível

a todos. No outro canto da lousa, dispor desenhos de Maurício de Souza que

apresentem relação com o conteúdo dos poemas. Os alunos poderão levantar

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hipóteses sobre a qual título cada desenho se refere. Os desenhos selecionados

são:

Figura 4 figura 5 figura 6

Figura 7 figura 8

Figura 9 figura 10

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figura 11 figura 12

figura 13 figura 14

figura 15

Fonte: http://turmadamonica.uol.com.br/personagem/ Acesso em 12 de set. de 2014.

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M.3.2- Recepção e análise das obras:

- Após leitura, cada dupla deverá, no centro do círculo, expressar gestualmente

(mímicas, expressões e dramatização) a percepção e recepção que teve do seu

poema; sem comunicar-se verbalmente. Para tanto, poderão dispor, também, de

fantoches, fantasias e adereços, de modo a enriquecer a caracterização. Os demais

alunos tentarão descobrir, de acordo com os títulos colados no quadro, qual dos

poemas está sendo representado, relacionando cada um com o desenho de

Maurício de Souza.

- Ao término da brincadeira, cada dupla lê o seu respectivo poema aos demais,

declamando-os, se possível.

M.3.3- Integração de Conhecimentos Culturais:

- Conversação e debate sobre o que os poemas têm em comum e o que os

diferencia; bem como as relações entre os poemas e os desenhos, evidenciando,

para os alunos, a associação entre a poesia infantil e a brincadeira como uma forma

de experiência lúdico-literária.

- Identificação dos aspectos formais das obras: o código e suas estruturas neste

gênero textual, os temas e elementos utilizados por seus autores em cada criação

artística, bem como os diferentes efeitos de sentidos provocados em cada leitor.

Assim como no módulo anterior, levantar pautas referentes à intenção dos autores,

possibilidades de interpretação e construção de sentidos de acordo com os

conhecimentos do grupo (contrastando-os com os conhecimentos prévios

anteriormente levantados e os conhecimentos formais necessários para uma

compreensão mais profunda).

- Na sequência, os alunos poderão representar esse processo de recepção e

compreensão das obras por meio de desenhos (utilizando os materiais organizados

anteriormente: sulfite, lápis, lápis de cor, giz de cera, canetas hidrográficas...) e

criação de versos, montando um varal de poesias e desenhos.

M.3.4- Conclusões: (idem ao 1.4)

- Além de analisar o processo de recepção das leituras literárias sob o viés do prazer

e ludicidade, observar e refletir sobre a interação entre o grupo e suas trocas de

experiências, as quais desencadeiam uma maior compreensão sobre o mundo e

sobre o próprio indivíduo.

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MÓDULO 4 (duração de 5 aulas)

Tema da Prática: Literatura e Arte Plástica: relações possíveis entre o Conto “A

Princesa que escolhia” (Ana Maria Machado) e telas de Ernst Ferdinand Oehme;

Paul Signac; Jacob Isaakszon Van Ruisdael; Constantine Maleas e Georges Braque.

M.4.1- Apresentação das obras e determinação do horizonte de expectativas:

- Preparação do ambiente: sala com multimídia, tapete e almofadas, espelhos,

sulfite, papéis coloridos, tesoura e cola, canetinhas e lápis de cor. Alunos dispostos

livremente.

- Conversação sobre quais obras e autores que serão explorados neste módulo,

investigando o que os alunos sabem (ou não) e pensam sobre eles: quem são

(foram), que temas estão sendo abordados, como produziram suas obras, etc.

M.4.2- Recepção e análise das obras:

- Apresentação (em multimídia) das telas: “O Castelo Scharffenberg à noite” (Ernst

Ferdinand Oehme - 1827); “O Castelo dos Papas de Avignon” (Paul Signac - 1900);

“Castelo Bentheim” (Jacob Isaakszoon Van Ruisdael - 1653); “Castelo em

Monemvasia” (Constantine Maleas - 1928) e “O Castelo em La Roche Guyon”

(Georges Braque - 1963).

Figura 16

Ernst Ferdinand Oehme (1797-1855) - O Castelo Scharffenberg à noite, óleo sobre tela, 595 x 860 mm) – 1827.

Disponível em: http://volobuef.tripod.com/pictures/oehme_schlossscharffenbergbeinacht.jpg Acesso

em 08 de jul.de 2014.

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Figura 17

Paul Signac - O Castelo dos Papas de Avignon – 1900. Neo impressionismo (pontilhismo)

Disponível em: http://www.aprendendoeconstruindo.com/2012/08/dica-cultural-impressionismo-paris-e.html Acesso em 08 de jul.de 2015.

Figura 18

Jacob Isaakszoon van Ruisdael - óleo sobre tela - 1653 - (National Gallery of Ireland - Dublin, Ireland)

Disponível em: http://pt.wahooart.com/@@/8XZUQC-Jacob-Isaakszoon-Van-Ruisdael-(Ruysdael)-Bentheim-Castelo Acesso em 08 de jul.de 2014.

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figura 19

Castelo em Monemvasia por Constantine Maleas

(1879-1928, Turkey)

Disponível em: http://pt.wahooart.com/@@/8XXS72-Constantine-Maleas-Castelo-em-Monemvasia Acesso em 08 de jul.de 2014.

figura 20

O Castelo em La Roche-Guyon, por Georges Braque (1882-1963, France)

Disponível em: http://pt.wahooart.com/@@/8lj27q-georges-braque-o-castelo-em-la-roche-guyon Acesso em 08 de jul.de 2014.

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- Conversação sobre a recepção e os efeitos da experiência estética das obras: o

que foi sentido, captado; as impressões que os alunos perceberam com as obras; o

que elas despertam em cada aluno.

- Narração (pela professora) do conto “A Princesa que escolhia” (Ana Maria

Machado, 2006), explorando a dramaticidade da história e ilustrações do livro.

Resumo: Certa vez havia uma princesinha que, por um certo tempo boazinha,

sempre cordata com tudo e com todos, decide, num determinado momento, exercer

o ato de discordar e expressar verbalmente sua distinta opinião. Diante do

atrevimento verbal (tomar a palavra) e moral (discordar) da princesinha, o rei

resolve colocá-la de castigo trancafiada numa torre. Contudo, o castigo a ela

imposto transmuta-se em oportunidade para o saber, uma vez que a torre em que é

trancafiada possuía uma biblioteca repleta de exemplares que ela lia, lia, sem parar.

Mas não só de livros se compunha a biblioteca frequentada pela princesinha. Como

personagem de um conto de fada moderno que é, a princesa tem também acesso à

internet, podendo então complementar pesquisas várias. Assim, o direito à palavra

desdobrou-se em direito ao saber, saber esse que se mostra extremamente

necessário, uma vez que é a princesinha quem descobre a cura para uma epidemia

que assolava o reino. É por sua voz que o rei conhece possíveis saídas ao

problema. O rei se mostra de tal modo contente que resolve tirar a princesa do

castigo e ainda lhe dar uma recompensa, qual seja, uma coroa nova, mas a

princesinha escolheu outro tipo de recompensa: o poder de sempre escolher.

Assim, a princesinha passara a ser sujeito de seu desejo, escolhendo tudo o que

queria, roupas, comidas, filmes e até a escola em que queria estudar, local em que

também exercia suas escolhas. Quando era preciso escolher falar um não, de

acordo com sua vontade, ela não hesitava, mantendo-se fiel à sua conduta

autônoma. E escolhendo e escolhendo, ela atinge, segundo materna e paterna

opinião, a idade de se casar. Decidem então dar um baile para que ela pudesse

escolher um príncipe. O rei, já acostumado com o desejo de escolha da filha, tenta

negociar às avessas para, implicitamente, impor sua vontade. A princesinha até

recebe muito gentilmente cada convidado a marido no baile, ficando todos

impressionados com sua inteligência e beleza. No entanto, sempre exercendo seu

poder de escolha, ela vai recusando cada um deles, sugerindo-lhes, muito

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divertidamente, outra esposa (as princesas dos contos de fadas clássicos: Branca

de Neve, Cinderela, etc), de acordo com a característica de cada um deles.

Dispensando cada um dos pretendentes, para desespero do rei, a princesa escolhe

não se casar naquele momento, mas sim estudar, viajar muito e conhecer outros

lugares e outras pessoas. Vai para a Universidade e se forma em Arquitetura. E se

o poder de se expressar verbalmente levou-a ao saber, o saber leva-a enfim a

conhecer e escolher seu par. Numa reunião, encontra um arquiteto e recorda-se de

que ele era o filho do jardineiro com quem brincava na infância, no período de

castigo na torre, e foi ele que a princesa escolheu para namorar. A princesa

permanece com o filho do jardineiro e a voz narrativa relativiza o “viverão felizes

para sempre” dos contos de fada clássicos, substituindo-o pela tensão dialética que

caracteriza qualquer relacionamento amoroso nos dias de hoje.

- Questionamentos e comentários sobre os aspectos da obra que os alunos pensam

ser mais expressivos, relacionando-os à recepção pessoal de cada um.

- Enumeração das associações e alusões possíveis entre as obras (conto e

pinturas), elencando e enfatizando os aspectos da sensibilidade estética entre elas:

levantamento e análise das diferenças entre as obras bem como dos elementos que

as aproximam.

- Explanação sobre aspectos importantes da vida, obra e contextos sócio-históricos

dos autores de cada obra.

- Análise de como o mesmo tema (cenário/paisagem) foi retratado pelos artistas de

diferentes formas, e como elas produzem diferentes percepções no leitor.

- Detalhamento, no conto, dos aspectos que marcam uma subversão aos contos de

fadas tradicionais (a possibilidade de escolha da princesa, o distanciamento dos

padrões patriarcalistas, o desenvolvimento tecnológico, etc).

M.4.3- Integração de Conhecimentos Culturais:

- Explicação e conversação sobre os diferentes códigos, formas e elementos

utilizados por seus autores em cada criação artística, bem como os diferentes efeitos

de sentidos provocados em cada leitor: levantar pautas referentes à intenção dos

autores, contextos de produção das obras, construção de sentidos de acordo com os

conhecimentos do grupo (contrastando-os com os conhecimentos prévios

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anteriormente levantados e os conhecimentos formais necessários para uma

compreensão mais profunda).

- Ampliação das discussões, relacionando o tema e conhecimentos abordados com

a realidade social, histórica e cultural na qual os alunos estão inseridos.

- Releitura11 individual do conto. A partir da recepção que os alunos realizaram do

texto literário e das obras (pinturas), cada um irá criar, por meio de pinturas,

dobraduras e colagens, um castelo para a princesa do conto. Isto é, levando em

consideração o perfil transgressor da princesa (em relação aos contos tradicionais) e

observando os diferentes recursos e técnicas utilizadas esteticamente pelos artistas,

os alunos deverão criar (produzir) um castelo que, de acordo com a opinião pessoal,

represente a morada da princesa do conto.

- Exposição e apresentação das obras produzidas pelos alunos, com espaço para

diálogo e interação de ideias e opiniões.

M.4.4- Conclusões:

- Avaliar coletivamente, por meio da conversação, os momentos mais interessantes

do módulo na opinião dos alunos, observando se conseguiram adquirir

conhecimentos e produzir sentidos para suas leituras; tendo em vista a possibilidade

(sem as cobranças da sala de aula) de demonstrarem seus interesses, dividirem

seus conflitos e buscarem as soluções de problemas que os afligem.

Essa proposta que apresentamos constitui-se, assim, em uma sugestão

orientadora para a prática docente no que diz respeito à compreensão da leitura

literária; pois o texto literário revela-se como um objeto privilegiado para o

desenvolvimento das competências linguísticas dos alunos, dada a riqueza que o

caracteriza, que abrange as dimensões artística, cultural e social. É por isso mesmo

que contribui para o desenvolvimento de capacidades de construção de significados,

e auxilia, também, na aquisição de um vasto conjunto de saberes, que inclui os

conhecimentos sobre a própria língua e o mundo.

Uma vez apresentados o caminho metodológico e a proposta didática pelo

qual trilhamos, partimos então para o capítulo da análise das obras trabalhadas e

dos dados obtidos na pesquisa aplicada, a fim de expormos a apreciação de nosso

percurso de pesquisa.

11

Concordamos com Vincent Jouve quando assevera que: “Desde que uma obra seja minimamente construída, a releitura não é apenas desejável: é necessária.” (JOUVE, 2002, p. 30).

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III PARTE: REFLEXÕES ANALÍTICO-CRÍTICAS SOBRE AS

PRÁTICAS EFETUADAS

3 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

Neste capítulo comentamos as atividades desenvolvidas nos quatro módulos

da oficina realizada com os sujeitos da pesquisa, incluindo os encaminhamentos e

intervenções, bem como a análise feita a partir dos dados colhidos e avaliações

feitas no decorrer deste processo.

Para desenvolvermos esse tópico nossas reflexões voltaram-se para três

pontos importantes: as informações sobre o contexto sócio histórico interacional da

escola investigada – que nos levam a compreender como a prática de leitura literária

é concebida e realizada neste ambiente escolar –; a aplicação de nossa Proposta

Pedagógico-Literária – no qual descrevemos e detalhamos a recepção de nossa

intervenção prática –; e a análise e discussão dos resultados desta aplicação à luz

do referencial teórico estudado.

Tal como nos referimos anteriormente, o percurso investigativo desta

pesquisa teve como pressuposto uma metodologia qualitativa, baseada em um

paradigma de investigação interpretativo, recorrendo a diversas técnicas de coleta

de informações, a saber: a observação-participante, os registos escritos por meio de

notas de campo e a análise de documentos da instituição escolar (como o PPP da

escola, planejamentos, livros didáticos de língua portuguesa e os cadernos dos

alunos).

Os dados foram obtidos ao longo do ano letivo de 2014, mais especificamente

nos meses de fevereiro a outubro, e a aplicação do Projeto de Intervenção ocorreu

nos meses de novembro e dezembro do mesmo ano. Tais dados foram

intercruzados com os registros escritos da observação de campo, de maneira que

ambos pudessem passar por um constante processo de reinterpretação.

A seguir, apresentamos, pormenorizadamente, os procedimentos específicos

de cada momento de análise.

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3.1 A ESCOLA INVESTIGADA E SUA RELAÇÃO COM A LITERATURA: O

ESPAÇO INSTITUCIONAL DA FORMAÇÃO DO LEITOR

Na escola em que realizamos o projeto não são ministradas aulas específicas

de leitura literária em sala de aula. Os textos literários são selecionados em função

do gênero e do conteúdo que os professores devem desenvolver. Assim, os

professores precisam, conforme o planejamento da série, trabalhar os gêneros:

teatro, biografia, fábula, conto, lenda, poema, entre outros. Por isso, ao longo dos

meses de observação (de fevereiro a outubro), a professora regente12 da turma

investigada ocupou-se dos gêneros “conto de fadas”, “fábulas” e “crônicas”,

totalizando 09 aulas cujo foco central eram textos literários, as quais

acompanhamos. Já as aulas de leitura na biblioteca, como explicamos no capítulo

anterior, têm por objetivo a leitura literária e acontecem semanalmente, portanto,

pudemos observar e participar de 21 aulas no decorrer deste período.

Ao observarmos e analisarmos as aulas de leitura literária desenvolvidas pela

professora do 5º ano, bem como pela monitora de biblioteca, percebemos

encaminhamentos equivocados13 que colaboram para a inadequada escolarização

da literatura.

Destacamos, primeiramente, uma excessiva preocupação da professora com

a conceitualização metalinguística e estrutura dos textos literários, ficando o

processo de leitura e interação com as histórias em segundo plano. O mesmo

ocorria com as aulas ministradas pela monitora de biblioteca, e em diversas aulas

foram verificados os mesmos procedimentos tradicionais, ou seja, propostas de

atividades14 interessantes, mas que acabavam por concentrar-se somente no campo

formal da escrita.

No que refere-se à formação das profissionais em questão, assim como a

maioria das demais professoras da escola, as duas possuem curso superior em

Pedagogia. Porém, em conversas com a pesquisadora disseram não ter tido

nenhuma disciplina sobre Literatura Infantil na graduação, apenas alguns cursos de

12

Note-se aqui que no Sistema Municipal de Ensino de Cascavel, cada turma possui um professor regente que leciona todas as disciplinas curriculares; com exceção de Artes, Espanhol e Educação Física. 13

Observe-se que esta análise é feita sobre as aulas de leitura literária acompanhadas no período desta pesquisa e que não se estende, nem se aplica, ao trabalho das docentes de maneira geral. 14

Registramos o desenvolvimento de algumas atividades literárias realizadas pela professora regente e pela monitora de biblioteca à título de exemplificação (anexos 6 e 7).

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formação continuada, proporcionados pela Secretaria Municipal de Educação de

Cascavel. Depreendemos das respostas dadas a essa questão que falta a formação

para o trabalho com literatura. Consideramos essa formação profissional

fundamental, porque o aluno precisa da orientação do professor para a construção

de significados para as diversas leituras propostas na escola.

Como assevera Michèle Petit (2008), para que um indivíduo aventure-se na

cultura letrada, além do encontro com o objeto livro, ele necessita de alguém que o

apresente à leitura. Ele precisa de um mediador que o conduza pelos textos quando

estes ainda lhes são estranhos. Os mediadores sociais, especialmente professores

e bibliotecários, são pontes para o desenvolvimento do chamado “gosto” pela leitura,

principalmente a literária, em qualquer fase da trajetória de leitura do indivíduo.

O caráter intersubjetivo da leitura explica a centralidade do mediador (PETIT,

2008). Ninguém nasce leitor. É claro que, como já apontava Paulo Freire na década

de 1980: “A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior desta

não possa prescindir da continuidade da leitura daquele [...]” (FREIRE, 1989, p.11),

pois a leitura não se restringe às habilidades linguísticas de manejo do código

escrito, mas caracteriza-se como um processo de descoberta e de atribuição de

sentidos que possibilita a interação do sujeito com o mundo. Contudo, para que esse

leitor não fique apenas no nível da “leitura do mundo”, precisamos de mediação e

exemplos que nos conduzam à leitura crítica, por isso, é fundamental inserir os

sujeitos no universo da literatura, compartilhando com eles possibilidades de leitura,

acompanhando essas leituras e acolhendo os efeitos de sentido por elas produzidos.

O esboço do leitor adulto, maduro e autônomo, já vai sendo formado na

infância; daí o papel central do mediador, que vai delineando sua formação. A

criança, o jovem, enfim, o aluno precisa ser cativado, ser conquistado, direcionado

para o caminho da leitura. Se a pessoa se sente pouco à vontade em aventurar-se

na cultura letrada devido à sua origem social, seu distanciamento dos lugares do

saber, a dimensão do encontro com um mediador, por meio da interação e das

trocas de ideias é essencial (PETIT, 2008).

Mas para que tal mediação seja eficaz, é essencial que todos aqueles que

trabalham com a leitura compreendam as especificidades e o papel da literatura no

processo de formação do sujeito. Isso, contudo, só acontece por meio de um

referencial teórico consistente.

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Essa falta de fundamentação reflete-se no cotidiano de sala de aula da

maioria das escolas municipais, tendo em vista pertencermos ao quadro próprio do

magistério da Rede Municipal de Ensino há mais de treze anos e vivenciarmos esse

problema não só na escola investigada, mas em várias outras em que já

trabalhamos.

Tal constatação foi asseverada pelas observações realizadas na referida

turma. Verificamos que as poucas obras utilizadas pela professora regente e

monitora de biblioteca objetivavam a disciplinarização dos alunos: por meio das

ações dos personagens, as docentes ressaltavam que os alunos deviam transportar

para a vida real os exemplos de tais atuações, as quais teriam que ser copiadas ou

rejeitadas. Nesse contexto, a leitura serve, então, para reproduzir dogmatismos e

mudar comportamentos socialmente indesejados. Foi observado também, que todas

as práticas de leitura literária culminavam ou com a elaboração de resumos, ou com

o preenchimento de questionários acerca dos elementos estruturais de cada texto.

Percebemos, ainda, em relação à escolha do material literário, que as

professoras não têm o conhecimento prévio dos livros que trabalham em sala de

aula. Todas as salas dispõem de “caixas de leitura”, que são obras enviadas pelo

MEC (através do Programa Nacional Biblioteca na Escola – PNBE), mas que servem

apenas para manuseio aleatório; isto é, os alunos que terminam suas atividades

podem ler tais livros para ocuparem o tempo ocioso, mas não é feito nenhum

trabalho direcionado com eles. Aliás, os professores não conhecem a maioria dos

títulos que compõem o acervo.

Assim, verificamos que a leitura literária ocupa uma atividade unicamente

pedagógica. As professoras trabalham, quase que exclusivamente, com os textos

literários presentes no livro didático de Língua Portuguesa, deixando os livros

literários para o ambiente da biblioteca.

Ao acompanharmos as aulas desenvolvidas na biblioteca, encontramos um

ótimo acervo, com uma variedade de autores e títulos, de cânones da literatura até

textos recentes. Entretanto, além do espaço físico ser pequeno e desconfortável,

também verificamos que o acesso dos alunos aos livros é bastante restrito e

controlado, devido ao risco de sujarem ou extraviarem o material.

Em conversas formais e informais com as professoras e bibliotecária,

notamos que todas consideram importante a leitura literária na escola. No entanto,

suas práticas se perdem no processo de formação do leitor crítico por falta de

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fundamentos teórico-metodológicos que possibilitem a reflexão sobre uma prática de

qualidade.

Os alunos, por sua vez, encaram as aulas de leitura literária como

enfadonhas e maçantes, pois associam a leitura de livros com preenchimento dos

questionários, exercícios e fichas; atividades estas que realizam de maneira

mecânica. Além disso, são “obrigados” a levar um livro emprestado da biblioteca, por

semana, para fazer a leitura em casa e depois apresentar um resumo, prática

cansativa e desestimulante, na opinião deles.

Ao mesmo tempo em que as aulas de literatura lhes desagradam,

percebemos, paradoxalmente, que a maioria dos alunos tem interesse e gosta de

ouvir histórias e manusear os livros literários, especialmente os livros novos, aos que

eles têm pouco (ou quase nenhum) acesso; demonstrando que, apesar de não

gostarem de “ler”, são, de alguma forma, atraídos pela literatura.

Feitas as observações de como os sujeitos da pesquisa encaram e realizam

as práticas de leitura literária, passamos a descrever como se deu a aplicação e

recepção de nosso Projeto de Intervenção Pedagógico-Literário.

3.2 APLICAÇÃO DA PROPOSTA PEDAGÓGICO-LITERÁRIA: EM BUSCA DO

PRAZER NA LEITURA

3.2.1 Módulo I

O planejamento feito no Módulo I foi aplicado nos dias 03 e 04 de novembro,

com previsão inicial de 5 aulas. Contudo, o trabalho estendeu-se, devido ao

significativo envolvimento dos alunos com as atividades. Assim, no primeiro dia,

reunimo-nos por um período de 2h e 15 minutos, e no segundo dia utilizamos 3h e

20 minutos para concluirmos o trabalho, perfazendo um total de 5h e 35 minutos,

que equivalem a pouco mais de 6 aulas. Dos 24 alunos da turma, somente 1 faltou

no primeiro dia.

No início, apesar de as aulas acontecerem em uma das salas da escola e de

a pesquisadora ser conhecida pelos alunos, todos estranharam a organização do

ambiente: tapete e almofadas; roupas, fantasias e acessórios em caixas, no canto. A

partir daí, apresentamos o objetivo da oficina e como ela iria se estruturar.

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Ao visualizarem os títulos das obras, seus respectivos autores e datas de

publicação em cartaz, feito pela pesquisadora e colado no quadro, os alunos já se

mostraram curiosos em relação ao que seria feito na oficina. Um aluno comentou já

ter ouvido falar de Bethoveen e outro, de Hans Cristhian Andersen. Quando

questionados sobre como e onde conheciam os autores, responderam que

Bethoveen “tocava aquelas músicas de instrumentos” e H. C. Andersen escreveu a

história do Patinho Feio. Sobre Chopin, ninguém tinha conhecimentos acerca do

compositor, mas levantaram as hipóteses de que ele era ou escritor ou músico.

Quanto ao conto, os alunos não o conheciam, mas arriscaram palpites sobre

seu enredo, hipotetizando que se tratava de uma personagem pobre, que precisava

ajudar a família.

Sobre as músicas clássicas, alguns falaram que se tratava de “músicas

chatas”, “músicas de igreja” e alguns outros riram. A pesquisadora então interveio,

pedindo que relaxassem, fossem se acomodando nas almofadas e prestassem

atenção nas melodias que iriam ser apresentadas.

Após a audição, todos estavam bastante calmos. Vários alunos comentaram

que as músicas transmitiam uma emoção forte, pois “dava vontade de chorar”. Dois

alunos brincaram durante a apresentação, fingindo que dormiam, mas ao serem

indagados pela professora, disseram que haviam gostado.

Durante a narração do conto, feita pela pesquisadora, os alunos comoveram-

se com a história, confirmando suas hipóteses. Ao assistirem o vídeo da obra

prontamente perceberam a relação das músicas com o drama do conto. Todos

demonstraram apreciar as obras e solicitaram que pudessem ouvi-las e vê-las

novamente, tanto as músicas quanto a história e o vídeo.

Como relações de semelhança entre as obras alguns apontaram que elas

“mexem com a emoção”; “fazem a gente imaginar”; “todas são muito tristes”; “elas

lembram a solidão”. Um aluno comentou que ambas “fazem a gente ter esperança”.

A pesquisadora pediu, então, que ele explicasse sua colocação, e o aluno relatou

que apesar de sentir-se triste com as músicas e com a história, tinha a sensação de

que “um dia as coisas podem melhorar, mesmo se as coisas forem difíceis”.

Com relação às diferenças entre as obras, os alunos destacaram os suportes

de cada uma, pois as músicas foram ouvidas (áudio do MediaPlayer); o conto era

escrito (papel) mas também foi oralizado pela professora; e no vídeo havia uma

sequência de imagens (desenhos). Além disso, também apontaram que o tempo de

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apresentação de cada obra era diferente, pois a leitura era muito mais lenta em

relação às apresentações áudio-visuais.

No segundo dia, a pesquisadora fez uma breve exposição sobre os autores e

seus respectivos períodos de produção. Os alunos relacionaram a música clássica

com a cultura erudita, expondo, inclusive, que tocar piano é uma atividade muito

difícil, pelo instrumento ser caro e de difícil aprendizagem. Concluíram, também, que

as melodias tem diferentes tempos e ritmos, por isso a música tem que ser pensada

e organizada antes de ser tocada, e que pode ser registrada, porém utiliza símbolos

diferentes da escrita padrão. Destacaram que compor uma música é muito mais

complexa do que escrever uma história.

Neste momento, a pesquisadora interveio novamente. Durante a reflexão

sobre os processos de criação das obras, os alunos concluíram que: a música

também tem que ser escrita (registrada), antes de ser tocada, porém utiliza símbolos

diferentes da escrita padrão; as melodias têm diferentes tempos e ritmos; o texto

escrito também requer esforço e técnica para ser elaborado e que a escrita do conto

é tão complexa quanto a música é, pois as duas emocionam da mesma forma.

Na opinião da maioria dos alunos, os autores das obras queriam provocar

sentimentos de solidão, tristeza e abandono em seus leitores, para que eles

pudessem pensar em como é difícil passar por momentos assim. Os alunos

conseguiram recontar oralmente o enredo da história, e alguns alunos fizeram

analogia entre o conto e suas experiências pessoais, relatando histórias de vida de

familiares e/ou amigos. Consideramos este momento bastante produtivo, pois os

alunos demonstram a necessidade de falar e de serem ouvidos sobre tudo aquilo

que vivem e observam da vida.

A partir de então, lançamos a proposta de dramatizar a história do conto por

meio de gestos e expressões corporais harmonizados pela música clássica,

podendo utilizar, para tanto, fantasias, adereços e fantoches do “baú” que

improvisamos. Três alunos não quiseram participar da dramatização proposta,

dizendo não gostarem de apresentações, por isso, foi-lhes sugerido desenhar ou

escrever suas impressões sobre a história, além de assistirem à mostra dos colegas.

Os três alunos optaram, então, pela produção de desenhos. Os demais alunos

dividiram-se em três grupos, elegendo a “Nocturne nº 20” (de Frederic Chopin) como

a mais representativa para o conto. Vários alunos mostraram-se tímidos e com

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dificuldades de realizar as expressões corporais, outros, no entanto, demonstraram

vivacidade, criatividade e emoção em suas apresentações.

Ao término das apresentações, reunimo-nos em círculo e a pesquisadora

propôs uma avaliação do módulo. Todos os alunos avaliaram positivamente as

atividades elogiando-as, porém estranharam não terem que realizar nenhuma tarefa

escrita sobre a leitura. Surgiram questões como: “vai ser só isso?”, “nós não vamos

usar o caderno?”, “você vai fazer algum trabalho para a gente apresentar o texto da

vendedora de fósforos?”, etc. Esclarecemos, então, que em nenhum módulo da

oficina nós faríamos atividades de interpretação escrita ou de análise da estrutura

textual, mas que iríamos observar essas questões oralmente, durante o trabalho,

sempre que necessário.

Os alunos demonstraram aprovar a ideia, mas a maioria considerou que sem

as atividades escritas não há aula, ou seja, as crianças reproduziram a ideologia

vigente entre os professores de que são os exercícios e produções textuais o

objetivo final de uma leitura.

3.2.2 Módulo II

O segundo módulo foi desenvolvido nos dias 17 e 18 de novembro, também

ultrapassando a previsão inicial de 5 aulas, sendo necessárias 7 aulas para concluir

o trabalho. Nos dois dias houve participação de 100% da turma.

Ao nos dirigirmos para a sala onde realizamos o módulo anterior, alguns

alunos já perguntaram se iríamos “apenas ler e brincar” ou se faríamos “atividades”

(referindo-se aos exercícios escritos ou cópias).

Na sala, ao observarem os títulos das obras e seus autores, disseram nunca

terem visto ou lido nenhuma delas, bem como não sabiam nada sobre os autores.

Respondendo aos questionamentos pré-leitura, os alunos destacaram que as

pinturas geralmente são encontradas em museus, como decoração de casas e em

filmes, mas que, às vezes, podemos encontrar gravuras de quadros nos livros

escolares. Ao apreciarem as telas, compararam detalhes entre elas, tais como as

cores utilizadas pelos artistas, as roupas dos personagens, o ambiente, os traços e

linhas, surpreendendo a pesquisadora. Fizeram as seguintes observações: “os

meninos das pinturas são de antigamente”; “cada um deles tem um cão como

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melhor amigo”; “dois dos meninos estão descalços e com roupas simples, por isso

parecem ser pobres”; “os dois últimos quadros utilizam bastante a cor azul”; “o

quadro de Pablo Picasso utiliza linhas e traços diferentes dos outros dois quadros

(mais distorcido, com menos precisão nos detalhes)”; “todos estão ao ar livre com

seus cães”; “nos dois primeiros quadros os cães parecem ser vira-latas”; “no último

quadro o menino parece mais bem vestido e seu cão aparenta ser de raça”. Alguns

alunos expressaram oralmente os sentimentos e emoções que as pinturas

despertaram, compartilhando com a turma.

Como observaram os quadros antes do conto, os alunos levantaram a

hipótese de que o título do texto remetia-se ou a um menino (“bem maluquinho”,

segundo eles), ou a um cachorro arteiro. Após a leitura do conto entusiasmaram-se

ao confirmarem a hipótese de que o título se referia a um cachorro. Também

conseguiram descrever todas as características dos personagens e recontaram,

oralmente, o enredo da história com riqueza de detalhes.

Todos ficaram bastante emocionados com o conto, e a maioria quis

compartilhar com o grupo seus sentimentos e experiências com relação aos animais

de estimação. Vários alunos levantaram questões sociais importantes, como: a

violência contra os animais, o abandono e a falta de assistência por parte do

governo. Também solicitaram que a pesquisadora narrasse o conto novamente.

No segundo dia de aplicação deste módulo, a pesquisadora fez uma breve

apresentação sobre aspectos importantes da vida, obra e contextos sócio-históricos

dos autores de cada obra. Por meio dos questionamentos pós-leitura (tabela do

anexo 2), realizamos a identificação dos aspectos formais das obras: os diferentes

códigos (verbal e não verbal), formas e elementos utilizados por seus autores em

cada criação artística, bem como os diferentes efeitos de sentidos provocados em

cada leitor.

Com relação às pinturas, vários alunos disseram acreditar que os autores

criaram suas obras para mostrar às outras pessoas seu carinho pelos animais e

como seus bichinhos de estimação foram importantes na infância. Um aluno

observou que as roupas dos meninos das telas se devem ao período em que foram

produzidas.

Na turma, sete alunos não tinham animais de estimação em casa, por isso,

decidiram representar, por meio de desenhos e colagens, o personagem Biruta, do

conto. Dois alunos não quiseram produzir pinturas, por isso resolveram escrever

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suas histórias e de seus animais. Os demais produziram releituras das obras

apresentadas, retratando a si mesmos e aos seus animais.

Todos demonstraram muito entusiasmo no momento de apresentar suas

produções aos demais colegas. Interagiram e trocaram ideias sobre os trabalhos.

3.2.3 Módulo III

O Módulo III foi aplicado nos dias 24 e 25 de novembro, no decorrer de 5

aulas, de acordo com a previsão inicial. No primeiro dia estavam presentes 23

alunos e no segundo dia não houve faltas.

Antes de descrevermos o processo de aplicação e recepção deste módulo,

gostaríamos de pontuar que os alunos não questionaram mais a necessidade de

realizarem exercícios escritos sobre a prática de leitura, ao contrário, expressaram

que a forma de leitura da oficina era “muito mais gostosa”.

Diferentemente dos outros dias, não havia títulos de obras e autores na sala,

então, a pesquisadora explicou que as atividades seriam voltadas para a poesia,

desenhos e brincadeiras. Os alunos entusiasmaram-se com o tema “brincadeira”,

contudo alguns apontaram que era necessário jogos ou brinquedos para que

pudesse haver brincadeira. Segundo outros alunos, qualquer “coisa” ou atividade

pode tornar-se uma brincadeira, só basta imaginar e ter com quem se divertir.

Cada um falou sobre as brincadeiras que mais gostavam. Dos 23 alunos

presentes, 18 indicaram que suas brincadeiras preferidas estavam relacionadas com

jogos eletrônicos, como vídeogames, tabblets, etc. Dois alunos disseram gostar mais

de jogos esportivos, como futebol e bets; dois relataram gostar mais de “brincadeiras

de casinha” e um aluno disse gostar de brincar de “escolinha”.

Quando indagados sobre o que sabiam e se gostavam de poema/poesia

alguns perguntaram: “mas nós não íamos brincar?”. Sobre a diferença entre os

termos, dois alunos arriscaram responder: “o poema é mais curto e a poesia é mais

longa”; “poema fala de várias coisas e poesia fala de amor”.

A partir daí, a pesquisadora colou no quadro os títulos dos poemas e seus

autores, bem como os desenhos da Turma da Mônica, produzidos por Maurício de

Souza. Procedemos a uma breve conversação sobre o que a turma conhecia dos

autores apresentados. Vários disseram já ter lido ou ouvido outros poemas de

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Cecília Meireles e de Vinícius de Moraes, e todos conheciam as produções de

Maurício de Souza.

Com base nos títulos e na observação dos desenhos, os alunos tentaram

relacioná-los, utilizando como estratégia os elementos-chave de cada um dos

códigos, ou seja, a palavra escrita com o desenho (ex.: vento, jardim, lago, pescaria,

boneca, etc.).

Todos ficaram bastante curiosos para ver se tinham acertado as associações

que fizeram. A pesquisadora dividiu-os, então, em duplas (e um trio), pedindo que

sorteassem um dos referidos poemas. Explicou que após a leitura silenciosa, cada

dupla deveria, no centro do círculo, representar gestualmente (por meio de mímicas,

expressões e dramatização) a percepção e recepção que teve do seu poema; sem

comunicar-se verbalmente. Para tanto, poderiam utilizar, também, fantoches,

fantasias e adereços (das caixas de fantasias utilizadas no primeiro módulo), como

forma de enriquecer a caracterização. Os demais alunos tentarão descobrir, de

acordo com os títulos colados no quadro, qual dos poemas está sendo

representado, relacionando cada um com o desenho de Maurício de Souza.

Os alunos demonstraram divertirem-se muito com as apresentações

(dramatizações dos poemas) e vários elogiaram a brincadeira. Todos conseguiram

relacionar corretamente a dramatização com o desenho e com o seu respectivo

poema. Ao término da atividade, cada dupla leu o seu respectivo poema aos demais,

e a maioria conseguiu empregar entonação, fluência e ritmo adequados a cada

texto.

No dia seguinte, os alunos releram, individualmente, os poemas e a

pesquisadora mediou uma conversação sobre as obras (conforme atividades de

pós-leitura, tabela 3, anexo 3). Cabe-nos ressaltar, aqui, que as questões propostas

(organizadas nas tabelas de aplicação e anotações – diário de campo) não visam

restringir nem condicionar a construção de sentidos que a leitura pode proporcionar

a cada aluno. Servem, apenas, como um direcionamento para a professora levar os

alunos a refletirem sobre pontos fundamentais dos poemas, sendo ampliadas e/ou

reelaboradas conforme a recepção de cada turma.

Novamente, como nos módulos anteriores, a pesquisadora fez uma

explanação concisa sobre aspectos importantes da vida, obra e contextos sócio-

históricos dos autores abordados. Voltando-nos para a recepção dos poemas, um

aluno comentou que “as poesias não falavam só de amor, mas de várias coisas, e

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de forma engraçada, divertida”, e todos concordaram. Vários alunos consideraram

que os poemas não foram feitos apenas para as crianças, “mas que qualquer

pessoa, em qualquer idade pode se divertir com eles.”

Como vários alunos, durante suas participações orais, misturavam os termos

“poesia” e “poema”, ora utilizando um, ora outro para referirem-se ao objeto textual,

fizemos, neste momento, nova intervenção expondo, com base nos estudos de

Antonio Candido, em seu livro o Estudo Analítico do Poema (1993), a diferenciação

entre os termos poema e poesia. Adequando a linguagem e complexidade dos

conceitos, os alunos foram orientados que:

[...] a poesia não se confunde necessariamente com o verso, muito menos com o verso metrificado. Pode haver poesia em prosa e poesia em verso livre. Com o advento das correntes pós-simbolistas, sabemos inclusive que a poesia não se contém apenas nos chamados gêneros poéticos, mas pode estar autenticamente presente na prosa de ficção. (CANDIDO, 1993, p. 13).

Assim, definimos poesia como “a forma suprema de atividade criadora da

palavra, devida a intuições profundas e dando acesso a um mundo de excepcional

eficácia expressiva.” (CANDIDO, 1993, p. 12). Enquanto que o conceito poema foi

tomado como o “produto concreto”15 (CANDIDO, 1993, p. 14) da poesia, ou seja, a

materialidade textual.

Demonstrando compreensão acerca dos conceitos evidenciados, alguns

alunos destacaram que os poemas de Carlos Drummond de Andrade não eram

engraçados e “Segredinhos de Amor”, de Elias José, falava de vários sentimentos e

não só de amor. Apesar de considerá-los difíceis os alunos conseguiram expressar

ideias e opiniões interpretativas sobre eles. Chegaram à conclusão, também, de que

os poemas requerem um grande conhecimento e manejo com a linguagem, para

sensibilizarem e atingirem o efeito lúdico.

Na sequência, a professora pediu que os alunos representassem esse

processo de recepção e compreensão dos poemas por meio de desenhos e criação

15

Evidenciamos a profundidade dos estudos de Candido (1993) acerca dos conceitos de poema e

poesia, os quais não se restringem, em hipótese alguma (sabemo-lo), às definições acima elencadas.

Contudo, compreendemos que o domínio da teoria lírica é incumbência do professor. Por isso, e

tendo em vista a faixa etária dos alunos envolvidos neste trabalho, bem como o objetivo de nossa

proposta, limitamo-nos a diferenciar os termos de maneira mais sucinta, porém teoricamente

embasada.

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de versos, montando um varal de poesias e desenhos. De maneira geral, todos se

empenharam em produzir desenhos para os versos dos poemas e divertiram-se,

apresentando-os uns para os outros. O varal ficou exposto no mural da escola e as

outras turmas puderam apreciar o trabalho realizado na Oficina.

3.2.4 Módulo IV

O quarto e último módulo de nossa oficina foi aplicado nos dias 01 e 02 de

dezembro, com a presença de todos os alunos da turma. O tempo previsto de 5

aulas foi extrapolado, perfazendo um total de 8 aulas.

Ao observarem as telas, os alunos identificaram, de imediato, o universo dos

contos de fadas, relacionando os castelos às princesas, aos príncipes, às bruxas,

aos cavaleiros, às assombrações, etc. Todos associaram a figura dos castelos com

a antiguidade e com a riqueza e poder dos reis.

Alguns alunos comentaram que os reis e rainhas não têm o poder e influência

nos dias de hoje, como tinham antigamente. Elencaram inúmeros contos de fadas

que já tinham ouvido, dentre eles: “Cinderela”, “Branca de Neve”, “Bela Adormecida”,

etc. Quanto às tramas destes contos de fadas conhecidos, os alunos destacaram

que todas estão baseadas nas ações de protagonistas que enfrentam grandes

obstáculos antes de triunfarem contra o mal (“mudam as princesas, mas todas vivem

felizes para sempre”, comentaram).

Os meninos da turma mostraram-se um pouco controversos ao tema. Alguns

disseram não gostar dessas histórias, contudo sabiam o enredo de todas que foram

citadas. No que se refere às telas, os alunos observaram como a variedade de

técnicas produz efeitos tão diferentes, ou seja, a diferença entre as pinturas está na

técnica utilizada, e não no objeto retratado em si. Todos apreciaram e observaram

atentamente as obras, analisando as cores e formas. Manifestavam-se, oralmente,

dizendo quais telas mais gostaram ou menos gostaram, justificando o motivo. As

justificativas da maioria partiam de argumentos consistentes, como por exemplo: “eu

gostei deste quadro de Georges Braque porque as formas geométricas que ele usou

e os riscos das árvores dão a impressão de uma ventania. Parece que as árvores

estão se mexendo por entre o castelo. Dá uma sensação gostosa olhar.”

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Apesar de nunca terem ouvido falar dos pintores em questão, os alunos

levantaram a hipótese que as três primeiras telas eram de um período mais antigo

do que as duas últimas, as quais utilizam técnicas mais modernas de pintura.

Com relação ao conto, os alunos levantaram hipóteses de que o título se

referia a uma princesa que escolhia namorados (príncipes) ou que escolhia castelos,

devido aos diferentes castelos retratados nas telas.

No início da narração do conto, feita pela pesquisadora, os alunos disseram

que esperavam um conto de fadas, porque o “era uma vez” e a figura da princesa

deixavam uma pista que sugere o começo do conto de fadas. Entretanto, após a

narração, os alunos observaram que “A princesa que escolhia” era muito diferente

de todas as demais, e que ela não tinha nome porque não era como as outras; não

precisava de um nome que a diferenciasse, pois suas próprias atitudes a faziam

diferente.

Todos observaram que em nenhum momento a autora do conto descreve ou

ilustra como era o castelo da princesa que escolhia.

Na opinião da maioria, as telas de Constantine Maleas e Georges Braque são

as que mais se aproximam do conto, pois utilizam técnicas e formas diferenciadas

das demais, tal qual a princesa que escolhia, que também diferenciava-se das

outras princesas tradicionais.

No segundo encontro, relemos o conto (escaneado e projetado no

multimídia). Como nos outros módulos, a pesquisadora apresentou aspectos

importantes da vida, obra e contextos sócio-históricos dos autores de cada obra.

Alguns alunos destacaram que os pintores queriam mostrar ao seu público como

eles enxergavam aqueles castelos (a visão particular de cada um).

Quanto à Ana Maria Machado, autora do conto, vários alunos já haviam lido

outras de suas obras (como “Bisa Bia, Bisa Bel” e “O gato do mato e o cachorro do

morro”), contudo, nenhum conhecia “A Princesa que escolhia”.

O fato de a princesa ficar de castigo na torre e poder brincar, experimentar

muitas comidas gostosas e fazer amizades deixou alguns alunos surpresos. Outro

motivo de surpresa foi a presença da tecnologia: livros, computador, acesso à

internet e projetor de imagens. Por isso, os alunos comentaram que o conto não é

indicado apenas para crianças, mas que muitos adultos podem pensar em suas

escolhas por meio dessa história.

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Os alunos evidenciaram que, além de incorporar o cenário e personagens

tradicionais dos contos clássicos: reino, castelo, torre, rei, rainha, baile, etc., a obra

de Ana Maria Machado faz referência direta aos contos Banca de Neve, Cinderela,

Bela Adormecida e Rapunzel. Também evidenciaram que o mosquito que a princesa

descobriu poderia ser o mosquito da dengue. Uns alunos falaram que conheceram o

assunto pela televisão, outros disseram que aprenderam na escola com a

professora.

Nas discussões evidenciou-se que a Princesa que escolhia não é submissa.

Ela é diferente das princesas dos contos “Rapunzel”, “Cinderela”, “A Bela

Adormecida”, “Branca de Neve”. Além disso, levantaram questões e compartilharam

experiências, relacionando o tema e conhecimentos abordados com a realidade

social, histórica e cultural na qual estão inseridos. Ou seja, por meio de reflexões

sobre o conto “A Princesa que escolhia” os alunos, utilizando exemplos de mães e

familiares ou de histórias que ouviram, discutiram sobre o papel da mulher na

sociedade.

Para finalizar, a pesquisadora propôs que representassem o castelo em que a

Princesa que escolhia morava quando criança ou depois que se casou, tendo em

vista que não há nenhuma descrição ou ilustração de ambos os locais. Os alunos

demonstraram bastante entusiasmo com a proposta de produzir um castelo para a

Princesa, principalmente com a possibilidade de uso de materiais diversificados.

Imaginaram cenários diversos, revelando a capacidade de imaginação e de

construção de novos sentidos. Também demonstraram muito entusiasmo no

momento de apresentar suas produções aos demais, interagindo e trocando ideias

sobre os trabalhos.

Para finalizar a oficina, a pesquisadora organizou as atividades16 que eles

produziram em pastas coloridas e decoradas, para que pudessem levar para casa e

agradeceu a presença e participação de todos.

Descritos, então, o passo a passo da aplicação de nossa Proposta

Pedagógico-Literária, passamos à fase de análise e discussão dos resultados,

tomando por base os autores estudados no primeiro capítulo desta pesquisa.

16

Algumas das produções feitas pelos alunos durante a oficina foram fotografadas e arquivadas nos

anexos deste trabalho (anexo 8).

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3.3 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS: AS PRÁTICAS SOB UM

OLHAR CRÍTICO

No primeiro capítulo desta dissertação discutimos, brevemente, sobre alguns

apontamentos que Magda Soares faz em seu artigo “A escolarização da literatura

infantil e juvenil”, (2011, p. 17-48) publicado na obra A escolarização da leitura

literária – O jogo do livro infantil e juvenil. Ao tecer reflexões acerca das instâncias

de escolarização da literatura, a autora encara o trabalho com o texto literário como

uma prática específica em que se relacionam tanto a atividade comunicativa e

estética quanto a didática, de forma interacional. Com as ideias expressas nesse

texto é que iniciamos nossas discussões acerca das observações efetuadas ao

longo da pesquisa.

A primeira discussão que Soares (2011) levanta diz respeito às práticas

pedagógicas que envolvem o livro literário, geralmente inadequadas do ponto de

vista da seleção de textos por parte dos professores. Podemos estabelecer uma

relação entre essa proposição da autora e a prática das professoras (regente e

monitora) da escola investigada na medida em que ambas selecionam os textos

literários visando à exposição de um gênero textual ou um conteúdo a ser

trabalhado.

Com base nos Relatórios de Observação I e II (anexos 6 e 7) entre outras

observações17 in loco, podemos evidenciar, também, encaminhamentos da leitura

literária por um viés moralista. Tal afirmativa é possível a partir da constatação de

que se utiliza a literatura como ferramenta para transmissão de valores e

ensinamentos morais e que neles se explora pouco (ou quase nada) os recursos

expressivos ligados à enunciação literária. Essa prática, ao que tudo indica, sugere

que as professoras ainda não têm claras as funções da literatura e ainda não se

desvincularam das concepções tradicionais de leitura e literatura. Além disso, essa

proposta pragmática do trabalho com a literatura também é reflexo de um processo

histórico, que serviu para fins meramente pedagógicos, objetivando incutir nas

crianças valores os quais a sociedade pretendia perpetuar.

Não se trata aqui de questionar a relação entre literatura e ensino, a qual

consideramos inegável. O problema está na escolha dos textos literários, ou como

17

Salientamos que todas as observações que realizamos eram agendadas anteriormente, tanto com a professora regente, quanto com a monitora de biblioteca.

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pontua Paulino (2010, p. 161) “na constituição antiestética ou a-estética dos cânones

escolares de leitura”, os quais pouco se preocupam com a experiência literária. Ao

contrário, servem a objetivos didáticos, indo na direção oposta daquilo que Candido

(1972) discute sobre as funções da literatura (problematizadas no primeiro capítulo

deste texto). As funções psicológica, formadora e social da literatura (CANDIDO,

1972) indicam que a literatura, além de atender às demandas fantasiosas do ser

humano, pode formar o indivíduo, ampliando as referências pessoais do leitor, ao

permitir e fomentar que ele desvele o universo de um outro desconhecido.

Outra questão levantada por Soares (2011), referente à leitura e estudo de

livros de literatura, enfoca como os professores utilizam-se da literatura em sua sala

de aula, o que frequentemente envolve atividades impositivas, avaliativas e

desprovidas de significados para a criança. Novamente, aqui, evidenciamos a

constatação da autora na prática das professoras, alvo da investigação, pois ao

proporem tarefas que se restringiram às questões de localização de informações,

estrutura textual e transmissão de ensinamentos, ambas acabaram por corroborar

com a faceta didática do texto artístico-literário como pretexto para se trabalhar com

as questões da língua.

Os próprios alunos, pelo comportamento de estranheza à metodologia de

nossa oficina – e também pelos questionamentos durante a aplicação dos primeiros

módulos (“vai ser só isso?”, “nós não vamos usar o caderno?”, “você vai fazer algum

trabalho para a gente apresentar o texto...?”, etc) –, demonstraram como essa

prática tradicional é rotineira no percurso escolar, ao ponto de tornar-se hábito. Por

isso, o fato de não terem que reproduzir a mesma sequência a que estão habituados

causou-lhes estranhamento e surpresa.

Note-se que não temos a pretensão de afirmar que tais atividades são, em

sua totalidade, supérfluas e desnecessárias. Ao contrário, todos os alunos precisam

aprender a localizar informações, a compreender a estrutura e função dos textos

literários, a resumir ideias; contudo, não podemos ficar somente nessa mesma

abordagem; apenas reproduzindo o conhecimento. É necessário um movimento de

revitalização da leitura literária na escola, a fim de aguçar o senso crítico e a

percepção de ambos os envolvidos – aluno e professor, para apreciar o valor

estético do texto antes de sua organização estrutural ou seu conteúdo linguístico.

A terceira e última questão abordada por Soares (2011), concernente à

escolarização da literatura, refere-se à biblioteca escolar, entendida como “estatuto

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simbólico que constrói certa relação escolar com o livro, fundadora da relação

posterior do aluno com a instituição não escolar [...]” (SOARES, 2011, p. 23).

Entretanto, o que constatamos foi uma evidente precariedade desse ambiente, tendo

em vista o pouco espaço para os alunos e professores circularem, a dificuldade de

acomodação, já que as mesas e cadeiras encontram-se amontoadas, além dos

muitos livros didáticos (velhos e novos) empilhados nos cantos.

A biblioteca, que deveria ser, como também assevera Petit (2008), um

ambiente propício para trocas de experiência e qualificado a “contribuir para uma

mudança de atitude em relação à leitura” (PETIT, 2008, p. 11), mostra-se carente de

elementos que favorecem uma adequada escolarização da literatura; o que minimiza

o potencial de educadores e estudantes dessa escola enquanto leitores literários.

Ao analisarmos a nossa prática de leitura literária desenvolvida durante a

oficina, constatamos que os pontos acima elencados influenciam sobremaneira a

recepção dos alunos em relação à leitura. Primeiramente, ao propiciarmos um

ambiente mais adequado à leitura (com mais espaço e comodidade, além do acesso

aos livros e textos e materiais como fantoches, fantasias, tintas, etc.) percebemos

que os alunos puderam vivenciar o prazer estético, tanto na perspectiva de sua

participação na construção do imaginário, quanto na apreciação do que estava

sendo apresentado.

Certamente, nosso espaço improvisado em nada se assemelhava a uma

biblioteca, contudo, oferecia alguns dos elementos para que as crianças pudessem

se concentrar e imaginar, como bem nos lembra Petit (2008) ao refletir sobre o

impacto que uma biblioteca adequada promove na vida das pessoas:

A biblioteca ideal é a que permite que as crianças sonhem e que não lhes imponha idéias, imagens ou histórias, mas que lhes mostre possibilidades, alternativas. Essas coisas terão uma ligação profunda com sua vida adulta, mais tarde. (PETIT, 2008, p. 31).

Assim, depreende-se que a organização do espaço, a qualidade e o acesso

ao acervo, a ludicidade do ambiente e o comprometimento da professora

responsável pela biblioteca com o local revelam-se elementos fundamentais para a

socialização das experiências entre as crianças e jovens, ampliando suas

potencialidades leitoras e fortalecendo o entendimento da leitura também como uma

prática social.

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Após aplicarmos o primeiro módulo de nossa oficina literária, percebemos que

a força do texto literário é tamanha que professora e alunos caminharam juntos na

trilha do enredo, ocorrendo uma vibração recíproca de sensibilidades, a ponto de

diluir-se o ambiente real frente a comoção da palavra. Todos ficaram magicamente

envolvidos pela sensibilidade das músicas e com a personagem da pequena

vendedora de fósforos, mas sem perder o senso crítico, que é estimulado pelo

enredo. Depois da história vieram muitos comentários e depoimentos, dos quais

mencionamos alguns a seguir:

– Nossa! Que história linda! Mas a menininha estava sempre muito sozinha, tão

pequena e tinha que se virar sozinha. Eu não gosto de ficar sozinha. (G. F. A. – nove

anos).

– Eu gostei! Não queria que ela acabasse desse jeito. Mas foi melhor pra ela,

porque, pelo menos ela se encontrou com a vó que ela amava e que amava ela. (A.

A. L. da S. – dez anos).

– Eu gostei, pensei que fosse chata, mas é linda porque me fez pensar em outras

coisas. E ele fala das outras crianças que não vivem que nem a gente. (M. de L. –

nove anos).

– É muito triste... às vezes eu me sinto triste também.... mas eu gosto das histórias

que me fazem chorar porque eu lembro que tem coisa difícil para os outros

também.(R. Z. T. – nove anos).

Não é possível transcrever todos os depoimentos, mas, em conversa com as

crianças depois da história, pudemos observar que cada uma, de acordo com seu

nível de desenvolvimento e percepção, elaborou diferentes comentários sobre o

texto literário, emitindo conceitos em seus questionamentos ou simplesmente

comentando o prazer de ouvir a história narrada. Tal constatação assevera a

proposição de Fillola (1994, p. 91), quando menciona:

En cada espectador (aquí intencionadamente queremos relacionar este término con el de expectativa mencionado por Jauss e Iser, entre otros) tales estímulos pueden desencadenar una serie de reacciones diferentes: goce estético, reconocimiento de rasgos de estilo, reconocimiento de determinados rasgos o atribución de conceptualizaciones, establecimiento de algunas relaciones y de interconexiones com referentes de igual o de distinto signo artístico o de código expresivo.18 (grifos do autor).

18

Nossa tradução: Em cada espectador (aqui, intencionalmente, queremos relacionar este termo com

a expectativa mencionada por Jauss e Iser, entre outros) tais estímulos podem desencadear uma

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Observamos, também, que a trajetória da personagem (a vendedora de

fósforos) foi vivida pela imaginação infantil com a força de um drama real, sendo

reforçado pela associação com as músicas clássicas apresentadas. Dessa forma, o

texto literário foi, para as crianças, bem mais que uma forma de educação ou de

socialização; mostrou-se como um modo de representação do real, que as auxiliam

a reelaborar a sua própria realidade, sob a forma de brincadeira, de jogo ou de

ficção. Ademais, verificamos que a comparação entre os dois sistemas artísticos

(música e literatura), além da ativação de vários conhecimentos e habilidades

linguísticas do leitor estudante (tal qual propõe Fillola – 2004), é um ótimo recurso

didático para ampliar o universo cultural dos alunos, já que a maioria não conhece

ou não tem acesso a esse tipo de arte, não tendo a oportunidade de apreciá-la.

Evidenciamos, assim, que nesse processo de inter-relação didática dos

diferentes referentes culturais – quer seja da literatura com a música, ou com

qualquer outro código artístico, como a pintura, o desenho, entre outros – o

professor não necessita dominar conhecimentos aprofundados da Semiologia numa

fase inicial de preparação de alunos leitores, já que o objetivo não é “ensinar”

música, desenho ou pintura, mas permitir o prazer estético pela comparação. Nesse

momento da formação do leitor, isso se alcança sem fins analíticos profundos e

teoricamente sustentados na Semiótica. Isto é, mesmo sem ter domínio pleno da

semiótica ou dedicar-se aos estudos semióticos mais complexos, o professor pode,

por meio da metodologia aqui proposta, promover práticas positivas de literatura,

relacionados a outras artes, na escola, posto que estas fomentam a participação

criativa e interesse do aluno leitor e conduzem-no pelo caminho do gosto e

apreciação do texto literário que ganha, assim, também, outras dimensões

imaginativas.

Nos módulos 2 e 4 o trabalho com o texto literário se fez por meio da

associação com a pintura. É possível verificar as relações existentes entre essas

duas artes sem, necessariamente, termos que recorrer a algum estudo

intersemiótico mais aprofundado. O cotejo entre a literatura e as artes plásticas não

é recente. Mario Praz, em seu livro Literatura e artes visuais (1982), aponta que a

série de reações diferentes: o gosto estético, o reconhecimento de traços de estilo, o reconhecimento

de determinadas características ou atribuição de conceitualizações, o estabelecimento de algumas

relações e interconexões entre referentes de igual ou distinto signo artístico.

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aproximação entre literatura e pintura passou a ser tratada, pelos estudiosos, com

maior intensidade a partir do século XX, quando surge uma série de movimentos

literários e artísticos, a saber: as vanguardas europeias e o modernismo. No entanto,

esse objeto de discussão é comum desde o período Renascentista, no século XVIII.

Tal aproximação (entre literatura e artes plásticas) foi bem vista por Roland

Barthes. De acordo com Solange Ribeiro de Oliveira (1993), Barthes defendia a

supressão da linha que as separa. Citando o autor:

Se a literatura e a pintura já não são mais consideradas numa relação hierárquica, uma sendo espelho de fundo para a outra, por que mantê-las como objetos ao mesmo tempo unidos e separados, em resumo classificados juntos? Por que não eliminar a diferença entre elas (que é puramente de meio material)? Por que não renunciar à pluralidade das artes, para afirmar tão mais fortemente a

pluralidade dos textos? (BARTHES, s/d apud OLIVEIRA, 1993, p.

44).

Para o teórico francês, como afirma Solange Ribeiro de Oliveira (1993), a

complexidade e a capacidade expressiva das imagens podem acrescentar

significados à obra literária. Em Aula, texto magistral da aula magna que Roland

Barthes proferiu em 7 de janeiro de 1977, no Collège de France, ao inaugurar sua

cadeira na disciplina de semiologia literária, o autor já afirmava: “[...] toda imagem é,

de certo modo, uma narrativa.” (BARTHES, 1989, p. 36). Assim, podemos

depreender que a pintura, por ser uma imagem complexa, não se limita a

argumentar sobre um tema por um único viés, mas propõe, tal qual o texto literário,

várias possibilidades interpretativas, podendo, inclusive, manter pontes sincrônicas

com outras imagens e textos.

Percebe-se, portanto, que a literatura e a pintura podem estabelecer uma

relação enriquecedora, contribuindo para o processo de criação, sem que as

especificidades e particularidades de cada uma sejam desconsideradas. A literatura

oportuniza a leitura da imagem e também a elabora por meio das palavras;

igualmente, a leitura de uma pintura pode levar à produção de uma escrita.

Convergente ao pensamento de Barthes, Mendonza Fillola (1994) assinala

que

[...] socio-culturalmente también se hermanan las diversas artes que componen nuestros sistemas artísticos. Este hecho fundamental de nuestra tradición cultural, esta contigüidad de producción y de

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recepción, resulta que, después se desvincula em la organización programaciones y de curricula escolares. 19 (FILLOLA, 1994, p. 66).

Percebemos, por meio da afirmação de Fillola (1994), também pautada nas

proposições de Mario Praz (1979), que a conexão entre a literatura e a pintura é

inquestionável; e é certo que, desde a aparição de ambas as artes, existe uma

correlação entre elas, em alguns casos evidente, e em outros, mais perceptual

(FILLOLA, 1994). O fato é que, mesmo mantendo uma série de correlações, essa

proximidade e paralelismos que tais artes têm entre si acabam por desvincular-se

durante o processo de ensino da literatura; o qual direciona sua atenção apenas

para os conhecimentos teóricos e eruditos acerca dos textos literários.

Contudo, mesmo defendendo a aproximação entre literatura e pintura, Fillola

(1994), mais uma vez ancorado nas reflexões de Mario Praz, ressalta que para

explicarmos e alcançarmos essa série de correlações com nossos alunos não basta

compararmos exemplos que sejam ou pareçam simples transposições intertextuais;

é preciso conduzirmos um sistemático procedimento de análise que leve-os a

observar “lo evidente, con lo percebido y con lo motivado” 20 (FILLOLA, 1994, p. 68).

Para tanto, Fillola (1994) reconhece a metodologia comparativa vinculada à estética

da recepção como ferramenta capaz de colocar em evidência os vários tipos de

correlações entre os sistemas artísticos. Assim, se produzirá um procedimento útil

para “evidenciar cuestiones de referencia, copia, interpretación, influencia, alusión,

etc., a la vez que sirve para ampliar los aspectos de comprensión/recepción

significativa”.21 (FILLOLA, 1994, p. 69).

A fim de experimentarmos esse exercício de comparar textos literários com

pinturas envolvendo uma mesma temática22, tomamos dois contos de duas autoras

19

Nossa tradução: [...] sócio culturalmente, as diversas artes que compõem os nossos sistemas

artísticos também são irmanados. Este fato fundamental da nossa tradição cultural, esta proximidade

entre produção e recepção, é que depois se dissocia na organização dos currículos escolares.

20 Nossa tradução: [...] leve-os a observar “o evidente, com o percebido e com o motivado” (FILLOLA,

1994, p. 68). 21

Nossa tradução: um procedimento útil para “evidenciar questões de referência, cópia, interpretação, influência, alusão, etc., uma vez que tais direcionamentos servem para ampliar os aspectos de compreensão/ recepção significativa” (FILLOLA, 1994, p. 69). 22

Fillola (1994), citando Mario Praz (1979), nos adverte que: “Solo cabe hablar de correspondencias cuando las intenciones expresivas y las poéticas son comparables o cuando hay similitud en los medios técnicos utilizados.” (PRAZ, 1979 apud FILLOLA, 1994, p.68). Nossa tradução: “Somente cabe falar de correspondências quando as intenções expressivas e as poéticas são comparáveis, ou quando há similitude nos meios técnicos utilizados.” (PRAZ, 1979 apud FILLOLA, 1994, p. 68).

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da literatura brasileira, Lygia Fagundes Telles e Ana Maria Machado, contrastando-

os com obras de mestres da arte como: Pablo Picasso, Edouard Manet, Briton

Rivière, Paul Signac, Constantine Maleas e Georges Braque, entre outros; com a

intenção de buscar, na pluralidade dos signos, uma nova possibilidade de

aprendizado.

Com base na aplicação de nossa proposta, torna-se possível assegurar o

quanto ambos os sistemas artísticos (literatura e pintura) são de essencial valor no

desenvolvimento educacional, por oferecerem ao aluno inúmeras possibilidades de

leitura e compreensão dos signos linguísticos, e não se aterem somente à regras e

aos padrões tradicionais; o que abre espaço para o imaginário e aguça o

entendimento do leitor acerca da intencionalidade do autor na obra.

A literatura e a pintura retratam e combinam o real e o imaginário com grande

destreza, por isso, oferecem possibilidades de leitura que promovem a descoberta

de novas perspectivas, além de estimular o poder de crítica do aluno, ao

proporcionar-lhe diferentes formas de interagir com as pessoas e com o mundo.

Ademais, desenvolvem competências e habilidades na prática da leitura, como a

capacidade de inferência e uma melhor percepção das entrelinhas do texto, sem

mencionar o fator motivador que a apreciação de uma pintura pode ser para uma

futura abordagem a um texto literário.

Ao analisarem e compararem as pinturas com os textos literários, durante os

módulos II e IV, os alunos inferiram, levantaram, confirmaram e refutaram hipóteses,

envolvendo-se significativamente com os textos (verbais e não verbais). Prova desse

envolvimento mais profundo são os detalhes e conexões percebidos pelos pequenos

leitores, tanto nos textos escritos quanto nas obras iconográficas, tais como as

cores, traços e linhas utilizadas pelos pintores e a caracterização dos personagens

feita pelas autoras. Ou seja, os alunos perceberam que a variedade de técnicas de

pintura produzem efeitos diferentes. Tais efeitos produzem sensações e

interpretações distintas em cada leitor. E isso também se aplica aos textos literários,

pois a estilização da linguagem é a forma da literatura se definir como arte,

principalmente, na quebra dos padrões linguísticos tradicionais.

Note-se, como consta no Anexo 4, a observação feita pelos alunos de que a

princesa que escolhia não tinha nome porque ela não era como as outras; não

precisava de um nome que a diferenciasse, pois suas próprias atitudes a faziam

diferente das outras princesas dos contos de fadas. Também consideraram que as

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telas de Constantine Maleas e Georges Braque são as que mais se aproximam do

conto de Ana Maria Machado, pois utilizam técnicas e formas diferenciadas das

demais, tal qual a princesa.

Além disso, a comparação entre estes diferentes códigos artísticos também

promoveu, ao nosso ver, interseções diacrônicas e sincrônicas (JAUSS, 1994) na

significação das obras. Diacronicamente, o conto “A Princesa que escolhia” aborda

como a evolução da mulher, antes cerceada pelos padrões patriarcalistas, para a

mulher que toma decisões e chega a chefe de estado. Ao levantarem questões e

compartilharem experiências relacionando o tema e conhecimentos abordados com

a realidade social, histórica e cultural na qual estão inseridos, os alunos, por meio

das reflexões circunscritas na obra, discutiram a temática da mulher na sociedade,

refletindo sobre sua valorização, suas conquistas, preconceitos e dificuldades

sofridas ao longo do tempo, utilizando, para isso, exemplos de mães, familiares e

artistas.

Sincronicamente, os alunos vivenciaram a evolução da princesa enquanto ser

humano, a qual era uma criança inocente que se transforma em uma mulher adulta,

passando pelas mesmas mudanças, tensões e conquistas pelas quais todas as

pessoas passam ao longo de suas vidas. Vários alunos fizeram um paralelo com

suas próprias vidas: como eles já mudaram e ainda vão mudar, como há inúmeras

possibilidades de futuro, etc.; ou seja, reconheceram a linguagem poética como

meio de refletir acerca de suas vidas.

Essas interseções diacrônicas e sincrônicas também foram observadas

durante o trabalho com o conto “Biruta” (Módulo II), pois, ao confrontarem o texto

com as pinturas, observando os diferentes períodos de produção, os alunos

refletiram sobre a proximidade do ser humano com os animais domésticos ao longo

do tempo.

Mas as reflexões não se restringiram, apenas, à categoria diacrônica. Ao

ficarem emocionados com a história, a maioria dos alunos quis compartilhar com o

grupo seus sentimentos e experiências com relação aos animais de estimação; por

isso, vários estudantes levantaram questões sociais importantes, como: a violência

contra os animais, o seu abandono por parte das pessoas (donos) e a falta de

assistência a eles por parte do governo.

Com relação ao Módulo III, cujo tema era “A Literatura e o Lúdico”,

propusemos a associação entre a poesia, o desenho e a brincadeira. Essa proposta

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exigiu dos pequenos leitores uma organização mental de mecanismos complexos de

reflexão e construção de sentidos, pois, como aponta Vigotski (1977), durante a

brincadeira a criança consegue ir além de sua realidade, vivenciando, via

imaginação, situações que, de outra maneira, não lhe seria possível experienciar.

Conforme aponta o autor: “A brincadeira é a escola da vida para a criança; educa-a

espiritual e fisicamente. Seu significado é enorme para a formação do caráter e da

visão de mundo do futuro homem”. (VIGOTSKI, 2009, p. 100).

As atividades teatrais propostas por Vigotski (2009) – brincadeiras,

encenações, dramatizações – que as crianças desenvolvem a partir dos textos

literários, confirmam o princípio de que as formas de ação da criatividade podem ser

não apenas mentais, mas também concretas, expressas pelo corpo,

experimentadas. Através dessas atividades teatrais os alunos praticaram a leitura,

desenvolveram a memória, estimularam o senso crítico e artístico. Além disso, foi

ocasião de socialização. Os efeitos surgiram em todas as áreas – afetiva, expressiva

e intelectual – pois as crianças desinibiram-se, aprenderam a trabalhar com as

significações das palavras, criticaram e receberam elogios e críticas pertinentes;

enfim, valorizaram e estimularam o esforço alheio, trabalhando em equipe.

Dessa forma, percebemos que este contato entre a poesia e a brincadeira por

meio dos desenhos permitiu que os alunos estabelecessem uma nova relação com a

linguagem. Os poemas selecionados inter-relacionados aos desenhos de Maurício

de Souza possibilitaram o exercício criativo da construção de significados da palavra

escrita através do som, do movimento, da expressão corporal e da sensação. Desse

modo, consideramos fundamental que o trabalho com poemas em sala de aula

explore as diversas sensações evocadas pelos textos, tanto nos seus aspectos

linguísticos quanto nos aspectos físicos, que são os movimentos expressivos (não

necessariamente os da dramatização, mas de entonação, de ritmo e “vivificação”

dos versos lidos).

A atividade comparativa foi importante para despertar a curiosidade e a

motivação do grupo para o aprofundamento de algumas especificidades da poesia;

mais estritamente: a diferença entre poema e poesia, questionamento lançado já no

início da aplicação do módulo.

Neste caso, o processo comparativo e suas implicações foi além daquele que

planejamos inicialmente. A princípio, nossa proposta objetivava a comparação entre

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os poemas e os desenhos23 da Turma da Mônica, como forma de ativar

conhecimentos metacognitivos e levantar hipóteses sobre os temas poéticos.

Entretanto, após a aplicação da metodologia comparativa e da intervenção da

pesquisadora (explicando e diferenciando os conceitos poema e poesia) alguns

alunos apontaram que os textos “A pequena vendedora de fósforos” e “Biruta” (lidos

nos módulos anteriores) também continham poesia, porque, segundo eles:

– [Os contos] tinham muita emoção e sentimentos, com palavras diferentes...

(N. B. – 9 anos)

– Essas palavras fazem a gente sonhar e imaginar os sentimentos dos

personagens. (G. S. L. – 9 anos)

Ao referirem-se à “palavras diferentes” os alunos explicaram que os contos

lidos não eram construídos com as mesmas palavras que utilizamos no cotidiano,

mas com palavras que permitiam sonhar, imaginar e viver as emoções, ou seja,

condizentes com “a forma suprema de atividade criadora da palavra, [...] de

excepcional eficácia expressiva.” (CANDIDO, 1993, p. 12), isto é, a poesia. Ou seja,

a inter-relação textual não restringiu-se aos textos selecionados para o módulo pois

os alunos reportaram-se à impressões estético-literárias de textos trabalhados

anteriormente; o que demonstra, claramente, que um trabalho fundamentado com a

literatura comparada, na escola, é capaz de promover, além do gosto lúdico, a

produção crítica de conhecimento.

Sem que a pesquisadora determinasse, os alunos, espontaneamente,

iniciaram a troca e a comparação dos poemas, observando as diferentes estruturas

de cada um, contando os versos, as estrofes, se tinham rimas ou não; enfim,

aprofundando os conhecimentos linguísticos e textuais do gênero poema. Chegaram

à conclusão de que a produção de poemas requer um grande conhecimento e

manejo com a linguagem, para alcançarem o efeito lúdico e estético.

Pensar o ensino de literatura dessa maneira: uma prática que permite e

fomenta a troca, o diálogo e o questionamento, remete-nos à discussão que Fillola

(1994) promove acerca do tratamento escolar da literatura:

Ciertamente, algunos planteamientos dogmáticos han entorpecido la aproximación afectiva y efectiva del alumno hacia el disfrute de la literatura, al serle presentada, en general, como un discurso crítico

23

Os poemas e os desenhos estão elencados na seção que descreve os módulos, p. 76 a 78 deste trabalho.

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cuyas claves, de supuesta difícil comprensión, no estaban a su alcance. 24 (FILLOLA, 1994, p. 22).

Destacamos dessa reflexão a indicação da necessidade de uma aproximação

afetiva e efetiva do aluno com a literatura. O relacionamento do leitor com o texto

literário se faz por meio de uma adesão afetiva, resultado de um processo de

identificação. Essa relação afetiva faz frutificar, com maior intensidade, os subsídios

cognitivos e linguísticos, oportunizando a ampliação de conhecimentos; isto é, uma

aprendizagem efetiva e significativa.

Assim, não se pode pensar em um trabalho com o texto literário, senão

aquele que se afasta de uma relação mecanicista com a obra e que se aproxima da

liberdade, da troca de experiências, do diálogo, criando uma relação próxima entre

os sujeitos envolvidos pelo texto: autor – leitor; e no caso do ambiente escolar:

alunos – professor.

A escola ainda é, nos dias de hoje, o espaço privilegiado para o encontro

entre o leitor e o livro. E, neste espaço, concluímos nós, as atividades e

encaminhamentos literários desenvolvidos em nosso projeto estimularam o

pensamento dos alunos, a percepção da realidade em suas múltiplas significações,

a consciência do “eu” em relação ao “outro”. Percebemos que os alunos, de uma

maneira geral, foram tocados pela singularidade dos textos e das obras de arte. O

mais importante a destacar é que esses leitores foram sacudidos do estado de

inércia e passividade que, na maioria das vezes, acompanhava suas leituras.

Desta forma, esses alunos puderam se posicionar de forma diferente no

momento da leitura. Ao interagirem com os textos e obras de arte, situaram-se como

os leitores ativos, que hipotetizam, opinam e interferem nas histórias. Por isso,

conseguimos confirmar – com resultados concretos, colhidos em sala de aula

através da riqueza e criatividade dos textos orais e escritos dos alunos, de suas

dramatizações e desenhos – a especificidade do valor literário na formação inicial da

criança e como uma metodologia consistente e criativa pode, sim, contribuir

significativamente na formação leitora.

24

Nossa tradução: “Certamente alguns planejamentos dogmáticos têm dificultado a aproximação afetiva e efetiva do aluno com a literatura; a qual é apresentada, em geral, como um discurso complexo, de suposto difícil entendimento, que não está ao seu alcance.” (FILLOLA, 1994, p. 22).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa, ao ter problematizado questões que envolvem a importância da

leitura literária na formação dos sujeitos, abordou, também, temáticas acerca das

metodologias de ensino de literatura; especialmente para os anos iniciais do Ensino

Fundamental, o qual carece, ainda, de uma abordagem mais específica para o

tratamento do texto literário em sala de aula.

Sem pretensões de esgotar as reflexões sobre a temática ou sobre as

possíveis pesquisas a serem realizadas a esse respeito, o presente trabalho

procurou levantar indagações (as quais, muitas vezes, são ocultadas pelo esforço e

dedicação dos sujeitos que trabalham arduamente para alcançar uma educação

crítica no município de Cascavel, quais sejam: as professoras, monitoras de

biblioteca, coordenadores e diretores) sobre a prática escolar com o texto literário e

propor uma alternativa didática para o ensino de literatura nas escolas da rede

municipal.

Partimos de nosso conhecimento empírico do processo de ensino de literatura

contrastando-o com reflexões teóricas, para chegarmos, então, à apresentação de

uma proposta de aplicação prática. Assim, nossas experiências com a leitura literária

desenvolvidas no Projeto de Intervenção Didática foram abordadas pelo viés da

Estética da Recepção (JAUSS, 1994) e pelo método comparatista de Fillola (1994),

os quais valorizam o papel do leitor na construção de sentidos para a obra literária.

Da Estética da Recepção compreendemos que a literatura não existe para si

ou para confirmar o que já é conhecido, e sim para contrariar expectativas, gerar

dúvidas, produzir reflexões, enfim, para o prazer de nos (re)descobrirmos: a nós

mesmos e ao mundo ao nosso redor. Assim, a literatura pode levar o leitor a uma

nova percepção e compreensão de seu universo. Em outras palavras, o leitor

sempre acrescenta elementos novos à sua leitura, pois a interação com o texto

propicia um alargamento de horizontes.

Das teses desenvolvidas por Jauss (1994), buscamos (por se tratar dos anos

iniciais do Ensino Fundamental) contemplar os conceitos de horizonte de

expectativas, no qual examinamos a experiência literária dos alunos-leitores acerca

dos temas abordados nos contos e poemas que trabalhamos; a quebra da

expectativa do leitor em relação ao texto literário, ao apresentarmos as obras

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contrastando-as com outros signos artísticos, o que criou um hiato entre o que os

alunos esperavam dos textos e o que realmente ocorreu ao longo da recepção das

obras; e, os aspectos ligados à historicidade das obras, isto é, a interseção entre os

aspectos diacrônicos e sincrônicos de cada uma, situando-as na evolução e

explicação do mundo. Assim, ampliar os horizontes de experiência dos alunos, foi

nossa preocupação constante.

Metodologicamente, organizamos nossa aplicação com base na proposta

intertextual de Fillola (1994), para quem a intertextualidade é entendida no seu

sentido mais lato, como uma interconexão de textos e significados, também

estendida para a produção artística de diferentes signos. À proposta inicial do

pesquisador espanhol fizemos as adaptações necessárias a nossa realidade, fato

que resultou possível, sem inconvenientes.

Neste sentido, Fillola (1994) faz referência à correspondência existente entre

a Literatura Comparada e os diversos sistemas artísticos (verbais e não verbais;

como a escultura, a pintura, a música, o cinema, etc.), cuja perspectiva globalizadora

serviu, nesta pesquisa, para ampliar a compreensão do aluno-leitor e recepção

significativa da obra e, consequentemente, contribuiu para uma futura formação

leitora crítica.

Comparar e estabelecer conexões entre imagens, sons e textos de diferentes

épocas e culturas para obter novas significações para a leitura foi um trabalho que

traduziu a importância da leitura literária no desenvolvimento infantil, pois

impulsionou toda a ação espontânea das crianças para as múltiplas possibilidades

de expressão. Os suspiros e risos durante as narrações, a observação atenta das

obras, o manuseio interessado dos livros, o recriar da história que ouviram ou leram;

ações e reações que evidenciaram o prazer e a fruição dos textos literários lidos.

Se é verdade que, historicamente, a literatura infanto-juvenil nasceu sob a

égide dos propósitos educativos, nossas intervenções pedagógicas buscaram,

sempre, enfatizar a natureza primordialmente estética dos textos e, em decorrência

disso, a ampliação dos conhecimentos de mundo e linguísticos dos alunos-leitores.

Vale dizer que nossa Oficina Literária significou, de certo modo, contar uma

história: na recepção, nas vozes, nos olhares, nos sorrisos, nos gestos de cada

aluno. Uma história de participação de estudantes em uma experiência literária que

lhes permitiu fazer parte de uma “comunidade leitora” – ou como sugere Petit (2008),

um círculo de pertencimento mais amplo, que se estende “[...] para além do

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117

parentesco, da localidade, da etnicidade.” (p. 95) – , possibilitou-lhes ampliar os seus

conhecimentos sobre as obras lidas e, ao mesmo tempo, conduzir o seu próprio

processo de letramento. Uma história passível de novas leituras, reinterpretações e

novos sentidos.

Não queremos desconsiderar ou depreciar, com isso, o trabalho que vem

sendo desenvolvido com a literatura na escola investigada. Entretanto, as

professoras envolvidas na pesquisa, por não disporem de uma formação específica

na área, bem como terem pouco acesso às metodologias de trabalho com o texto

literário, ainda lançam mão de práticas em que a obra literária é usada unicamente

como ferramenta de estudo da língua. Mas, mesmo com tantos desafios a serem

superados, todas as professoras com quem interagimos, e outras tantas

profissionais de educação observadas, preocupam-se em refletir cotidianamente

sobre suas práticas; o que permite, possivelmente, uma releitura do fazer

pedagógico com a literatura, possibilitando atuações cada vez melhores e mais

comprometidas com o aprendizado dos alunos.

Decorre daí a nossa primeira consideração conclusiva sobre o tema

pesquisado: a necessidade de uma formação consistente dos professores que

atuam nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Destacamos, inicialmente, que é

necessário um efetivo investimento dos cursos de formação desses professores no

que se refere ao trabalho com alfabetização, letramento, literatura infanto-juvenil e

letramento literário. Além disso, a formação continuada é de suma importância para

todos os profissionais da educação, não apenas no sentido de preencher lacunas

provenientes das falhas na formação acadêmica, mas ampliando as bases para uma

imersão no letramento literário, a fim de que os professores tenham condições de

trabalhar, efetivamente, para a construção de uma comunidade de leitores.

Outro importante ponto observado no decorrer desta pesquisa – que

influencia a prática do professor com o texto literário e que, em nossa opinião,

mereceria ser revisto –, está no fato de os documentos oficiais que orientam os

planejamentos – o Currículo para a Rede Municipal de Ensino de Cascavel e os

PCN – não direcionarem uma seção específica para o ensino de literatura no Ensino

Fundamental. Os textos, como vimos, destacam a importância da literatura na

formação dos indivíduos; contudo, não apontam direcionamentos metodológicos

para que os professores tenham subsídios para desenvolver um trabalho com o

texto literário de forma a valorizar suas especificidades.

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Reiteramos a ideia de que a educação é a principal via de acesso para a

transformação da sociedade; e ensinar constitui-se, ainda hoje, um grande desafio,

sobretudo, para os professores de literatura, que tem que “competir” com um

universo de informações e recursos digitais que despertam muito mais o interesse

de crianças e adolescentes do que o “bom e velho” livro.

Além disso, a escola, ainda muito arraigada na tradição historicista, não

corresponde ao desejo de uma leitura literária livre e autônoma, pois não conseguiu

se libertar da imposição, da obrigatoriedade e, portanto, de uma ligação distante da

literatura com o leitor. O ensino continua centrado em atividades fragmentadas e

desconectadas ou em exercícios gramaticais de interpretação mecânica. Ou seja, a

sala de aula ainda é um espaço marcado pelas abordagens formalistas e

estruturalistas que analisam o texto literário como produto acabado, sem valorizar o

papel essencial dos leitores na atualização da significação textual; por isso, ao

saírem da escola, os alunos acabam abandonando o hábito da leitura, pois encaram

a prática literária como algo atrelado aos exercícios escolares.

Dessa forma, os métodos tradicionais de ensino da literatura não dão conta

da formação crítica do aluno, pois se tornaram, na grande maioria, apenas

reprodutores de conhecimento. Neste cenário, surge a necessidade de novas

alternativas metodológicas que superem o paradigma tradicional. Algumas

experiências nesse sentido já vêm sendo aplicadas25; contudo, elas não podem ficar

circunscritas, apenas, a eventos esporádicos como projetos e oficinas de leitura

literária, nem tão pouco serem realizadas de maneira espontânea e intuitiva, sem

uma fundamentação teórica e metodologias adequadas.

Diante do exposto, e avaliando os resultados positivos da aplicação de nosso

projeto, consideramos o método comparativo de Fillola (1994) como uma alternativa

consistente para o trabalho escolar com a literatura, especialmente nas séries

iniciais do Ensino Fundamental; pois nesta fase, é nítido o gosto das crianças pelas

atividades artísticas, especialmente as literárias.

Ao constituir-se em uma importante prática social de figuração artística da

realidade, a literatura assume papel fundamental na formação dos sujeitos. Por meio

dos primeiros contatos com os textos literários, desde que significativos e

25

Note-se que várias escolas da Rede Municipal de Cascavel, a exemplo do que ocorre no âmbito nacional, contemplam em seus Projetos Políticos Pedagógicos (PPP), projetos de leitura literária, como: “A hora da Leitura”, “Sarau de Poesia”, “Cantos e Contos”, entre outros.

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consistentes, a criança pode desenvolver o gosto pela leitura e, por conseguinte,

desenvolver sua consciência crítica.

Destacamos, assim, que o trabalho com a literatura na escola é essencial e

que, em muitos casos, ele constitui-se na única possibilidade de contato com o texto

literário por parte de uma grande parcela de alunos. Tal escolarização, entretanto,

precisa ser adequada, permitindo a compreensão e o envolvimento lúdico com as

obras. Nesse sentido, a escola precisa incluir e oferecer oportunidades para que a

literatura se efetive enquanto instrumento de formação: não apenas como pretexto

para aprendizagem de conteúdos, mas como ferramenta de humanização

(CANDIDO, 1972), como possibilidade de constituição de um indivíduo ativo na

sociedade em que vive.

Ao levarmos em conta tal necessidade, compreendemos que essa

escolarização da literatura só pode ser adequada se pensada e sistematizada a

partir de fundamentos criteriosos, ou seja, baseada em uma teoria que sustente,

tanto seus objetivos e perspectivas, quanto suas ações metodológicas.

Tal foi a justificativa para desenvolvermos uma proposta pedagógica de

trabalho com o texto literário para as séries iniciais organizada segundo os princípios

da Estética da Recepção e na intertextualidade do método comparatista de Fillola

(1994), por possibilitarem ao leitor explorar os diálogos culturais e a beleza estética

como premissas para uma aprendizagem crítica.

A leitura dos textos literários associada à leitura de diferentes signos artísticos

serviu não apenas como material lúdico e de expansão dos horizontes de leitura,

mas, principalmente, como um recurso cognitivo que auxiliou os alunos a levantarem

hipóteses e interessarem-se em descobrir se essas hipóteses seriam confirmadas,

ou não, ao longo do trabalho com os textos. Em suma, as leituras intertextuais,

promovidas pelo viés comparatista, estimularam a atenção e curiosidade dos alunos

não somente pelas obras em si, mas pelo processo de leitura, isto é, pelo processo

dialógico de construção de sentidos. E é, justamente, na troca de experiências e

histórias de leitura que, de fato, ocorre a interação entre textos e leitores.

Com base nessas reflexões, insistimos que a teoria literária precisa subsidiar

a prática pedagógica dos professores, de forma que esta possa, realmente,

contribuir para a formação de alunos leitores de literatura. A proposta comparatista

de Fillola (1994) – com as devidas adequações aos diferentes níveis de ensino e

temáticas específicas–, constitui-se, assim, em uma alternativa didática que

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possibilita ao aluno compreender a literatura como fenômeno cultural, histórico e

social.

É essa relação entre o texto literário e a perspectiva sociocultural que a

escola deve promover aos alunos, levando-os a perceber as possibilidades de

significação que literatura (objeto artístico polissêmico que transgride normas e

regras) permite. No entanto, a tarefa de apresentar ao aluno o caráter polissêmico

da leitura literária, valorizando a recepção do leitor na significação textual, ainda

parece ser um desafio no contexto escolar. Daí a importância e necessidade de

ampliarmos os estudos intersemióticos, em sua complexidade e as muitas

possibilidades que eles abrem para seguimento desse trabalho iniciado de forma

despretensiosa.

Por fim, em busca de um diálogo aberto e construtivo com os colegas de

profissão, esperamos que os professores, principalmente os que ensinam nas séries

iniciais, possam vir a enriquecer suas práticas por meio da leitura deste texto.

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ANEXOS

Anexo 1 –

DIÁRIO DE CAMPO: Tabela de aplicação e anotações do Módulo 1

Estabelecimento de Ensino: Escola Municipal ___________________ Turmas: 5º ano B – Total de alunos: 24 alunos. Período: Matutino

MÓDULO I: Duração: 5 aulas Datas: 03/11; 04/11/2014. Número de alunos presentes por aula: 1º dia: 23 alunos; 2º dia: 24 alunos.

Tema da Prática: Literatura, Música e Cinema: Relações possíveis no Conto “A vendedora de fósforos” (de Hans Christian Andersen, tradução de Pedro Bandeira)

Expectativas com a Prática

Atividades de Pré-leitura

Atividades de pós-leitura

Aulas 1 e 2 - Nestas aulas, espera-se que os alunos: – Compartilhem conhecimentos prévios sobre o tema e as obras selecionadas. – Apreciem as obras apresentadas, valorizando seus recursos artísticos. – Exteriorizem sentimentos, sensações e sentidos provocados pela recepção das obras. – Reflitam e contrastem seus conhecimentos de mundo com os proporcionados pelas obras trabalhadas. – Expliquem o que perceberam e captaram sobre as obras, descrevendo as impressões motivadas pela apreciação/percepção. – Analisem os aspectos mais expressivos de cada obra, relacionando-os à recepção pessoal de cada um.

Aulas 1 e 2 - a) Levantamento de conhecimentos de mundo e de diferentes experiências pessoais sobre os temas: – Vocês gostam de música clássica? Conhecem algum compositor? Costumam ouvir com frequência? Em quais lugares e situações, geralmente, ouve-se esse tipo de música? Quais são suas principais características? – Quanto ao conto, vocês já o ouviram antes? Quem será essa vendedora e por que ela vende fósforos? Como e o que ela conseguia as suas vendas? b) questionamentos sobre a expressividade e particularidades das obras, bem como as relações entre elas: – O que mais chamou a

Aulas 1 e 2 – a) Confronto dos conhecimentos prévios com elementos fornecidos pelos textos: – Que características marcantes pudemos perceber nos trechos das músicas clássicas (instrumentos, ritmos, melodias, etc.)? É um estilo comum em nossa sociedade? Por quê? Quem tem acesso a esse tipo de música, e onde frequentemente são apreciadas? – Com relação ao conto, quem é a vendedora e por que ela vendia fósforos? Como era a sociedade em que ela vivia? Como era a atitude das pessoas em relação à pobreza? Quais eram suas expectativas e anseios (o que ela desejava de sua vida)? b) Questionamentos e apontamentos feitos mediante intervenção do professor:

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– Enumerem associações e alusões possíveis entre as obras (conto, animação e músicas), elencando e enfatizando os aspectos da sensibilidade estética entre elas. Aulas 3, 4 e 5 – Nestas aulas, espera-se que os alunos: – Identifiquem e compreendam os diferentes códigos, formas e elementos utilizados por seus autores em cada criação artística. – Analisem pautas referentes à intenção dos autores, contextos de produção das obras e os conhecimentos formais envolvidos no processo de criação da obra de arte. – Construam sentidos sobre as obras por meio da interpretação dos elementos textuais e contextuais. – Relacionem a temática e conhecimentos abordados com a realidade social, histórica e cultural na qual estão inseridos, refletindo sobre a atemporalidade e universalidade das obras artísticas. – Produzam releituras ou novos meios de representação das obras trabalhadas, procurando adequá-las à sua realidade e expressando o que mais os sensibilizou.

atenção de vocês em cada obra apresentada? Na sua opinião, qual obra é mais expressiva? Por quê? Há algum tipo de relação entre elas? Quais semelhanças e quais diferenças podemos perceber entre elas? Aulas 3, 4 e 5 – a) questionamentos sobre a estrutura e elementos composicionais das obras, bem como os conhecimentos envolvidos no processo de produção das obras: – Vocês já ouviram falar dos autores das músicas que ouvimos e do conto que lemos? Imaginam quando, para quem e por que eles as criaram? Vocês acreditam que o trabalho de compor uma música ou escrever uma história seja fácil? Que tipos de conhecimentos são necessários para se criar tais obras? Na sua opinião, o que os autores estão querendo expressar?

– Que efeito produz a recepção de cada obra isoladamente? Em que se diferencia essa recepção ao relacionarmos as obras entre si? Entre quais obras se dá uma relação mais direta? Por quê? Aulas 3, 4 e 5 - a) Confronto das hipóteses levantadas com os conhecimentos adquiridos por meio contextualização e intervenção do professor: – A partir das informações textuais e contextuais o que podemos depreender sobre as intenções dos autores em suas obras? A que tipo de público (leitores) elas se destinavam? O que essas obras queriam provocar em seus leitores? b) Exploração dos principais recursos formais e artísticos utilizados pelos autores para alcançar seus objetivos (quais conhecimentos estão envolvidos no processo de criação das obras): - destaque aos arranjos musicais, aos efeitos da animação e à construção da narrativa. c) Produção de releitura das obras: Dramatização, exploração de expressões corporais, gestos e dança para criar uma releitura das obras trabalhadas. d) Interação entre o grupo e apresentações. e) Avaliação em conjunto.

NOTAS DE CAMPO: Data: 03/11/2014.

Aulas 1 e 2 -

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- Os alunos, de maneira geral, demonstraram curiosidade e interesse pelo tema.

- Apenas alguns alunos responderam às questões feitas pela pesquisadora na

etapa de pré-leitura (no que se refere à música clássica); os demais apenas

observavam os procedimentos.

- Quanto ao conto, os alunos não o conheciam, mas arriscaram palpites sobre seu

enredo.

- A atividade envolveu os alunos, deixando-os atentos à apresentação das obras.

- De maneira geral, os alunos apreciaram as obras e solicitaram que pudessem

ouvi-las (músicas, vídeo e narração do conto) novamente.

- Todos os alunos relacionaram a música clássica com a cultura erudita, expondo,

inclusive que tocar piano é muito difícil (instrumento caro, difícil de aprender...).

- A maioria dos alunos interagiu entre si e com a pesquisadora, participando com

comentários, compartilhando experiências e opinando sobre o tema do conto.

- Seis alunos não quiseram falar da experiência com as obras (recepção).

- Todos os alunos relacionaram as músicas com a melancolia (drama) do conto.

- Apontaram como relações de semelhança entre as obras: “mexem com a

emoção”; “fazem a gente imaginar”; “todas são muito tristes”; “elas lembram a

solidão”. Um aluno comentou que ambas “fazem a gente ter esperança”.

- Com relação às diferenças, os alunos indicaram: os suportes de cada obra

(áudio/vídeo/escrita); o tempo de apresentação (leitura mais lenta em relação às

apresentações audiovisuais).

Aulas 3, 4 e 5: Data: 04/11/2014.

- Os alunos disseram não conhecer nada sobre os autores e períodos de produção

das obras.

- Um aluno disse já ter ouvido falar do compositor Bethoveen.

- Após conversação e explicação da pesquisadora, alguns alunos começaram a

relacionar as músicas e o conto com outras obras que já tiveram contato

anteriormente. Também elencaram algumas outras obras que conheciam do autor

H. C. Andersen.

- Na opinião da maioria dos alunos, os autores das obras queriam provocar

sentimentos de solidão, tristeza e abandono em seus leitores, para que eles

possam pensar em como é difícil passar por momentos assim.

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- Destacaram que compor uma música é muito mais difícil do que escrever uma

história.

- Durante a reflexão sobre os processos de criação das obras, os alunos concluíram

que: a música também tem que ser escrita (registrada), antes de ser tocada, porém

utiliza símbolos diferentes da escrita padrão; as melodias têm diferentes tempos e

ritmos; o texto escrito também requer esforço e técnica para ser elaborado e que a

escrita do conto é tão complexa quanto a música, pois as duas emocionam da

mesma forma.

- Os alunos conseguiram recontar oralmente o enredo da história. Alguns alunos

fizeram analogia entre o conto e suas experiências pessoais (história de vida).

- Os alunos deram pouca ênfase à animação (desenho animado).

- Três alunos não quiseram participar da dramatização proposta. Os demais alunos

dividiram-se em três grupos, elegendo a “Nocturne nº 20” (de Frederic Chopin)

como a mais representativa para o conto, e demonstraram vivacidade e emoção em

suas apresentações.

- Todos os alunos avaliaram positivamente as atividades elogiando-as, porém

estranharam não ter que realizar nenhuma tarefa escrita sobre a leitura.

Anexo 2 –

DIÁRIO DE CAMPO: Tabela de aplicação e anotações do Módulo 2

Estabelecimento de Ensino: Escola Municipal ____________________ Turmas: 5º ano B – Total de alunos: 24 alunos. Período: Matutino

MÓDULO II: Duração: 5 aulas Datas: 17/11; 18/11/2014. Número de alunos presentes por aula: 1º dia: 24 alunos; 2º dia: 24 alunos.

Tema da Prática: Literatura e Arte Plástica: Relações possíveis entre o Conto “Biruta” (Lygia Fagundes Telles) e telas de Pablo Picasso, Edouard Manet e Briton Rivière

Expectativas com a Prática

Atividades de Pré-leitura Atividades de pós-leitura

Aulas 1 e 2 Nesta aula, espera-se que os alunos: – Compartilhem conhecimentos prévios

Aulas 1 e 2 a) Levantamento de conhecimentos de mundo e de diferentes experiências pessoais

Aulas 1 e 2 a) Após apreciação das telas e leitura do conto, confrontar os conhecimentos prévios

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sobre o tema e as obras selecionadas. – Apreciem as obras apresentadas, valorizando seus recursos artísticos. – Exteriorizem sentimentos, sensações e sentidos provocados pela recepção das obras. – Reflitam e contrastem seus conhecimentos de mundo com os proporcionados pelas obras trabalhadas. – Expliquem o que perceberam e captaram sobre as obras, descrevendo as impressões motivadas pela apreciação. – Analisem os aspectos mais expressivos de cada obra, relacionando-os à recepção pessoal de cada um. – Enumerem associações e alusões possíveis entre as obras (conto e quadros), elencando e enfatizando os aspectos da sensibilidade estética entre elas. Aulas 3, 4 e 5 Nestas aulas, espera-se que os alunos: – Identifiquem e compreendam os diferentes códigos, formas e elementos utilizados por seus autores em cada criação artística. – Analisem pautas referentes à intenção dos autores, contextos de

sobre os temas: – Vocês gostam de pinturas? Conhecem algum pintor? Que tipo de quadros vocês gostam? Em quais lugares e situações, geralmente, veem quadros e pinturas? Quais são suas principais características? – Quanto ao conto, vocês já o ouviram antes? O que é um Biruta? Quem será o Biruta do texto (levantamento de possibilidades de histórias que poderão surgir a partir do título)? Por que será a autora utilizou o nome Biruta? b) questionamentos sobre a expressividade e particularidades das obras, bem como as relações entre elas: – O que mais chamou a atenção de vocês em cada obra apresentada? Na sua opinião, qual obra é mais expressiva? Por quê? Será que podemos relacioná-las entre si? Quais semelhanças e quais diferenças podemos perceber entre elas? Aulas 3, 4 e 5 a) questionamentos sobre a estrutura e elementos composicionais das obras, bem como os conhecimentos envolvidos no processo de produção das obras: – Vocês já ouviram falar dos autores das pinturas e do conto que lemos? Vocês imaginam quando, para quem e por que eles as criaram? Que tipos de

com elementos fornecidos pelos textos: – Que características marcantes pudemos perceber nos quadros? Como são as personagens retratadas? Em que ambiente eles estão? Quais as cores predominantes? – Com relação ao conto, quem é o Biruta? Por que ele tinha esse nome? Quem era seu dono e onde eles moravam? Como era o Biruta? Como era o Alonso? b) Confronto das hipóteses levantadas e intervenção (mediação) do professor: – Que efeito produz a recepção de cada obra isoladamente? Em que se diferencia essa recepção ao relacionarmos as obras entre si? Entre quais obras se dá uma relação mais direta? Por quê? Aulas 3, 4 e 5 a) contextualização das obras por meio da intervenção do professor. b) Questionamentos confrontando a explicação do professor com as características observadas nas obras: – A partir das informações textuais e contextuais o que podemos depreender sobre as intenções dos autores em suas obras? A

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produção das obras e os conhecimentos formais envolvidos no processo de criação da obra de arte. – Construam sentidos sobre as obras por meio da interpretação dos elementos textuais e contextuais. – Relacionem a temática e conhecimentos abordados com a realidade social, histórica e cultural na qual estão inseridos, refletindo sobre a atemporalidade e universalidade das obras artísticas. – Produzam releituras ou novos meios de representação das obras trabalhadas, procurando adequá-las à sua realidade e expressando o que mais sensibilizou-os.

conhecimentos são necessários para se criar tais obras? Na sua opinião, o que os autores estão querendo expressar?

que tipo de público (leitores) elas se destinavam? O que essas obras queriam provocar em seus leitores? Quais os principais recursos formais e artísticos utilizados pelos autores para alcançar seus objetivos? Quais conhecimentos estão envolvidos no processo de criação das obras? c) Produção de releitura das obras: Desenhos, pinturas e colagens para criar uma releitura das obras trabalhadas. d) Interação entre o grupo apresentações.

NOTAS DE CAMPO: Datas: 17/11/2014.

Aula 1 e 2

- Os alunos, disseram nunca terem visto ou lido nenhuma das obras apresentadas,

bem como não sabiam nada sobre os autores.

- Sobre as pinturas responderam que geralmente elas são encontradas em museus,

como decoração de casas e em filmes, mas que, às vezes, podemos encontrar

gravuras de quadros nos livros escolares.

- Como observaram os quadros antes do conto, os alunos levantaram a hipótese de

que o título do texto remetia-se ou a um menino (“bem maluquinho”, segundo eles),

ou a um cachorro arteiro.

- Nas pinturas, os alunos observaram e compararam profundamente os detalhes,

como: as cores utilizadas pelos autores, as roupas dos personagens, o ambiente,

os traços e linhas.

- Fizeram as seguintes observações: “os meninos das pinturas são de antigamente”;

“cada um deles tem um cão como melhor amigo”; “dois dos meninos estão

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descalços e com roupas simples, por isso parecem ser pobres”; “os dois últimos

quadros utilizam bastante a cor a azul”; “o quadro de Pablo Picasso utiliza linhas e

traços diferentes dos outros dois quadros (mais distorcido, com menos precisão nos

detalhes)”; “todos estão ao ar livre com seus cães”; “nos dois primeiros quadros os

cães parecem ser vira-latas”; “no último quadro o menino parece mais bem vestido

e seu cão aparenta ser de raça”.

- Após a leitura do conto os alunos entusiasmaram-se ao confirmarem a hipótese de

que o título se referia a um cachorro.

- Os alunos descreveram todas as características dos personagens e recontaram,

oralmente, o enredo da história com riqueza de detalhes.

- Todos ficaram bastante emocionados com o conto e a maioria quis compartilhar

com o grupo seus sentimentos e experiências com relação aos animais de

estimação.

- Vários alunos levantaram questões sociais importantes, como: a violência contra

os animais, o abandono e a falta de assistência por parte do governo.

Aulas 3, 4 e 5 : Data: 18/11/2014.

- Com relação às pinturas, vários alunos disseram acreditar que os autores criaram

suas obras para mostrar às outras pessoas seu carinho pelos animais e como seus

bichinhos de estimação foram importantes na infância.

- Um aluno observou que as roupas dos meninos das telas se devem ao período em

que foram produzidas.

- A maioria dos alunos destacou que acreditam que os autores, tanto das pinturas

quanto do conto, direcionaram suas obras para o público infantil, para mostrar a

relação de amor entre as crianças e seus animais.

- Um aluno disse acreditar que as obras são voltadas para o público adulto, pois na

fase adulta as “pessoas, quase sempre, se esquecem da pureza dos animais” (fala

do aluno).

- Os alunos solicitaram que a pesquisadora narrasse o conto novamente.

- Na turma, sete alunos não tinham animais de estimação em casa, por isso,

decidiram representar, por meio de desenhos e colagens, o personagem Biruta, do

conto. Dois alunos não quiseram produzir pinturas, por isso resolveram escrever

suas histórias e de seus animais. Os demais, produziram releituras das obras

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apresentadas, retratando a si mesmos e aos seus animais.

- Todos demonstraram muito entusiasmo no momento de apresentar suas

produções aos demais. Interagiram e trocaram ideias sobre os trabalhos.

Anexo 3 –

DIÁRIO DE CAMPO: Tabela de aplicação e anotações do Módulo 3

Estabelecimento de Ensino: Escola Municipal ___________________________ Turmas: 5º ano B – Total de alunos: 24 alunos. Período: Matutino

MÓDULO III: Duração: 5 aulas Datas: 24/11; 25/11/2014. Número de alunos presentes por aula: 1º dia: 23 alunos; 2º dia: 24 alunos.

Tema da Prática: Literatura e o Lúdico: relações possíveis entre poesia, o desenho e a brincadeira.

Expectativas com a Prática

Atividades de Pré-leitura

Atividades de pós-leitura

Nestas aulas, espera-se que os alunos: – Compartilhem conhecimentos prévios sobre poesia e os temas dos poemas selecionados. – Exteriorizem sentimentos, sensações e sentidos provocados pela recepção dos poemas. – Reflitam e contrastem seus conhecimentos de mundo com os proporcionados pelas obras trabalhadas. – Expliquem o que perceberam e captaram sobre os poemas, descrevendo as impressões motivadas pela apreciação/percepção. – Analisem os aspectos mais expressivos de cada poema,

Aulas 1 e 2 a) Levantamento de conhecimentos de mundo e de diferentes experiências pessoais sobre o que é poesia e poema: – Quem gosta de brincar? O que é uma brincadeira para vocês? Como nos sentimos quando brincamos? O que é necessário para que possamos brincar? E de poesia, vocês gostam? E de poemas? Por que algumas vezes nos referimos a poema e outras vezes a poesia? Vocês leem poemas? Onde, geralmente vocês tem acesso e/ou leem poemas? De que vocês acham que cada poema vai falar? Vocês percebem alguma

Aulas 3,4 e 5 a) Após a leitura dos poemas e realização da brincadeira, confrontá-las com as expectativas anteriores dos alunos. b) questionamentos sobre a expressividade e particularidades dos poemas, bem como as relações entre eles: – O que mais chamou a atenção de vocês em cada poema apresentado? Na sua opinião, qual poema é mais expressivo? Por quê? Há poemas que podem ser relacionados entre si? Quais? Que semelhanças e quais diferenças podemos perceber entre elas? Existe alguma relação entre os poemas lidos e a brincadeira? c) contextualização dos poemas e autores por meio

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relacionando-os à recepção pessoal de cada um. – Enumerem associações e alusões possíveis entre os poemas e a brincadeira, elencando e enfatizando os aspectos da sensibilidade estética entre elas. – Analisem pautas referentes à intenção dos autores, contextos de produção das obras e os conhecimentos formais (arranjos linguísticos) envolvidos no processo de criação dos poemas. – Construam sentidos sobre os poemas por meio da interpretação dos elementos textuais e contextuais. – Relacionem a temática e conhecimentos abordados com a realidade social, histórica e cultural na qual estão inseridos, refletindo sobre a atemporalidade e universalidade das obras artísticas. – Produzam novos meios de representação dos poemas trabalhados, procurando adequá-los à sua realidade e expressando o que mais sensibilizou-os.

relação entre os títulos dos poemas e os desenhos de Maurício de Souza? O que conhecem sobre esse autor?

da intervenção do professor (breves comentários sobre cada um). d) Questionamentos confrontando a explicação do professor com as características observadas nas obras: – A partir das informações textuais e contextuais o que podemos depreender sobre as intenções dos autores em seus poemas? A que tipo de público (leitores) elas se destinam? O que esses poemas querem provocar em seus leitores? Quais os principais recursos formais e artísticos (figuras e arranjos linguísticos) utilizados pelos autores para alcançar seus objetivos? Quais conhecimentos estão envolvidos no processo de criação desses poemas? e) Representação dos poemas (e do processo receptivo) por meio de desenhos e versos: Varal de Poesias. d) Interação entre o grupo apresentações.

NOTAS DE CAMPO:

Aulas 1 e 2 – Datas: 24/11/2014.

- Os alunos entusiasmaram-se com o tema “brincadeira”, contudo alguns apontaram

que era necessário jogos ou brinquedos para que pudesse haver brincadeira.

- Segundo outros alunos, qualquer coisa ou atividade pode tornar-se uma

brincadeira, só basta imaginar e ter com quem se divertir.

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- Cada um falou sobre as brincadeiras que mais gosta, e a resposta da maioria

remetia-se a jogos eletrônicos, como videogame, tabblet, etc. (18 alunos). Dois

alunos disseram gostar mais de jogos esportivos (futebol); dois relataram gostar

mais de “brincadeiras de casinha” e um aluno disse gostar de brincar de “escolinha”.

- Quando indagados sobre poema/poesia alguns perguntaram: “mas nós não íamos

brincar?”.

- Sobre a diferença entre poema/poesia, dois alunos arriscaram responder: “o

poema é mais curto e a poesia é mais longa”; “poema fala de várias coisas e poesia

fala de amor”.

- A partir dos títulos e da observação dos desenhos, os alunos tentaram relacioná-

los utilizando como estratégia os elementos-chave de cada um (ex.: vento, jardim,

lago, pescaria, boneca, etc.).

Aulas 3,4 e 5 – Data: 25/11/2014.

- Vários alunos já tinham ouvido falar dos autores dos poemas, mas não tinham

conhecimento de suas produções e contexto.

- Os alunos demonstraram divertirem-se muito com as apresentações

(dramatizações dos poemas). Todos conseguiram relacionar corretamente a

dramatização com o desenho e com o seu respectivo poema.

- Vários alunos elogiaram a brincadeira.

- Um aluno comentou que “as poesias não falavam de amor, mas de várias coisas,

e de forma engraçada, divertida”, e todos concordaram.

- Vários alunos responderam que esses poemas não foram feitos apenas para as

crianças, “mas que qualquer pessoa, em qualquer idade pode se divertir com eles.”

- Vários alunos, ao participarem oralmente, misturavam os termos:poema/poesia.

- Após intervenção da pesquisadora (explicando e diferenciando os conceitos

poema e poesia) alguns alunos apontaram que os textos “A pequena vendedora de

fósforos” e “Biruta” (lidos nos módulos anteriores) também continham poesia,

porque (segundo eles) “tinham muita emoção e sentimentos, com palavras

diferentes” e “essas palavras fazem a gente sonhar e imaginar os sentimentos dos

personagens”.

- Chegaram à conclusão de que os poemas requerem um grande conhecimento e

manejo com a linguagem, para se chegar ao efeito lúdico.

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- Alguns alunos destacaram que os poemas de Carlos Drummond de Andrade não

eram engraçados e Segredinhos de Amor, de Elias José, mas falavam mais de

sentimentos. Apesar de considerá-los difíceis os alunos conseguiram expressar

ideias e opiniões interpretativas sobre eles.

- Houve troca e comparação dos poemas entre os alunos: observaram as diferentes

estruturas de cada um, contando os versos, as estrofes, se tinham rimas, etc.

- Os alunos, de maneira geral, empenharam-se em produzir desenhos para os

versos dos poemas e divertiram-se, apresentando-os uns para os outros.

- O “varal” com a produção dos alunos ficou exposto no mural da escola e as outras

turmas puderam apreciar o trabalho.

Anexo 4 –

DIÁRIO DE CAMPO: Tabela de aplicação e anotações do Módulo 4

Estabelecimento de Ensino: Escola Municipal _______________________ Turmas: 5º ano B – Total de alunos: 24 alunos. Período: Matutino

MÓDULO IV: Duração: 5 aulas Datas: 01/12; 02/12/2014. Número de alunos presentes por aula: 1ª: 24 alunos; 2ª: 24 alunos.

Tema da Prática: Literatura e Arte Plástica: Relações possíveis entre o Conto “A Princesa que escolhia” (Ana Maria Machado) e telas de Ernst Ferdinand Oehme; Paul Signac; Jacob Isaakszon Van Ruisdael; Constantine Maleas e Georges Braque.

Expectativas com a Prática

Atividades de Pré-leitura Atividades de pós-leitura

Aulas 1 e 2 – Nesta aula, espera-se que os alunos: – Compartilhem conhecimentos prévios sobre o tema e as obras selecionadas. – Apreciem as obras apresentadas, valorizando seus recursos artísticos. – Exteriorizem sentimentos, sensações

Aulas 1 e 2 – a) Levantamento de conhecimentos de mundo e de diferentes experiências pessoais sobre os temas: – Vocês gostam de contos de fadas? Quais contos de fadas vocês conhecem? O que, geralmente, eles têm em comum? Em que ambientes eles costumam acontecer? Que vocês

Aulas 1 e 2 – a) Após apreciação das telas e leitura do conto, confrontar os conhecimentos prévios com elementos fornecidos pelos textos: – Que características marcantes pudemos perceber nos quadros? Como são os ambientes retratados? O que eles têm em comum? Quais suas

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e sentidos provocados pela recepção das obras. – Reflitam e contrastem seus conhecimentos de mundo com os proporcionados pelas obras trabalhadas. – Expliquem o que perceberam e captaram sobre as obras, descrevendo as impressões motivadas pela apreciação/percepção. – Analisem os aspectos mais expressivos de cada obra, relacionando-os à recepção pessoal de cada um. – Enumerem associações e alusões possíveis entre as obras (conto e quadros), elencando e enfatizando os aspectos da sensibilidade estética entre elas. Aulas 3, 4 e 5 - Nestas aulas, espera-se que os alunos: – Identifiquem e compreendam os diferentes códigos, formas e elementos utilizados por seus autores em cada criação artística. – Analisem pautas referentes à intenção dos autores, contextos de produção das obras e os conhecimentos formais envolvidos no

sabem sobre castelos? Quem morou (mora) neles? O que eles representavam antigamente e representam hoje? – Quanto ao conto, vocês já o ouviram antes? Por que será a autora intitulou-o “A princesa que escolhia” (levantamento de possibilidades de histórias que poderão surgir a partir do título)? O que será que ela vai escolher? O que geralmente as princesas escolhem? b) questionamentos sobre a expressividade e particularidades das obras, bem como as relações entre elas: – O que mais chamou a atenção de vocês em cada obra apresentada? Na sua opinião, qual obra é mais expressiva? Por quê? Será que podemos relacioná-las entre si? Quais semelhanças e quais diferenças podemos perceber entre elas? Aulas 3, 4 e 5 – a) questionamentos sobre a estrutura e elementos composicionais das obras, bem como os conhecimentos envolvidos no processo de produção das obras: – Vocês já ouviram falar dos autores das pinturas e do conto que lemos? Vocês imaginam quando, para quem e por que eles as criaram? Que tipos de conhecimentos são necessários para se criar

diferenças? – Com relação ao conto, como é a princesa protagonista? Por que ela não tem nome no conto? Como é o ambiente em que ela vive? Qual sua relação com os pais (o rei e a rainha)? b) Confronto das hipóteses levantadas e intervenção (mediação) do professor: – Que efeito produz a recepção de cada obra isoladamente? Em que se diferencia essa recepção ao relacionarmos as obras entre si? Entre quais obras se dá uma relação mais direta? Por quê? Aulas 3, 4 e 5 – a) contextualização das obras por meio da intervenção do professor. b) Questionamentos confrontando a explicação do professor com as características observadas nas obras: – A partir das informações textuais e contextuais o que podemos depreender sobre as intenções dos autores em suas obras? A que tipo de público (leitores) elas se destinavam? O que essas

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processo de criação da obra de arte. – Construam sentidos sobre as obras por meio da interpretação dos elementos textuais e contextuais. – Relacionem a temática e conhecimentos abordados com a realidade social, histórica e cultural na qual estão inseridos, refletindo sobre a atemporalidade e universalidade das obras artísticas. – Produzam releituras ou novos meios de representação das obras trabalhadas, procurando adequá-las à sua realidade e expressando o que mais sensibilizou-os.

tais obras? Na sua opinião, o que os autores estão querendo expressar? Que recursos utilizaram para produzi-las?

obras queriam provocar em seus leitores? Quais os principais recursos formais e artísticos utilizados pelos autores para alcançar seus objetivos? Quais conhecimentos estão envolvidos no processo de criação das obras? c) Produção de releitura das obras: Desenhos, pinturas e colagens para criar uma releitura das obras trabalhadas. d) Interação entre o grupo (apresentações).

NOTAS DE CAMPO:

Aula 1 e 2 – Data: 01/12/2014.

- Ao observarem as telas, os alunos identificaram, de imediato, o universo dos

contos de fadas, relacionando os castelos às princesas, aos príncipes, às bruxas,

aos cavaleiros, etc.

- Todos associaram a figura dos castelos com a antiguidade e com a riqueza e

poder dos reis.

- Alguns alunos comentaram que os reis e rainhas não têm o poder e influência nos

dias de hoje, como tinham antigamente.

- Elencaram inúmeros contos de fadas que já ouviram, dentre eles: “Cinderela”,

“Branca de Neve”, “Bela Adormecida”, etc.

- Quanto às tramas dos contos de fadas conhecidos, os alunos destacaram que

todas estão baseadas nas ações de protagonistas que enfrentam grandes

obstáculos antes de triunfarem contra o mal (“mudam as princesas, mas todas

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vivem felizes para sempre”, comentaram).

- Os meninos da turma mostraram-se um pouco controversos ao tema. Alguns

disseram não gostar dessas histórias, contudo sabiam o enredo de todas que foram

citadas.

- No que se refere às telas, os alunos observaram como a variedade de técnicas

produz efeitos tão diferentes, ou seja, a diferença entre as pinturas está na técnica

utilizada, e não no objeto retratado.

- Todos apreciaram e observaram atentamente as obras.

- No que se refere ao conto, os alunos levantaram hipóteses de que o título se

referia a uma princesa que escolhia namorados (príncipes).

- Após a leitura, os alunos observaram que a Princesa que escolhia não tinha nome

porque ela não era como as outras; não precisava de um nome que a diferenciasse,

pois suas próprias atitudes a faziam diferente das demais.

- Todos destacaram que em nenhum momento a autora do conto descreve ou

ilustra como era o castelo da Princesa que escolhia.

- Na opinião da maioria, as telas de Constantine Maleas e Georges Braque são as

que mais se aproximam do conto, pois utilizam técnicas e formas diferenciadas das

demais.

Aulas 3, 4 e 5 – Data: 02/12/2014.

- Apesar de nunca terem ouvido falar dos pintores em questão, os alunos

levantaram a hipótese que as três primeiras telas eram de um período mais antigo

do que as duas últimas, as quais utilizam técnicas mais modernas de pintura.

- Alguns alunos destacaram que os pintores queriam mostrar ao seu público como

eles enxergavam aqueles castelos (a visão particular de cada um).

- Quanto à Ana Maria Machado, autora do conto, vários alunos já haviam lido outras

de suas obras, contudo, nenhum conhecia “A Princesa que escolhia”.

- Alguns alunos comentaram que o conto não é indicado apenas para crianças, mas

que muitos adultos podem aprender a fazer escolhas certas por meio dessa história.

- O fato de a princesa ficar de castigo na torre e poder brincar, experimentar muitas

comidas gostosas e fazer amizades deixou alguns alunos surpresos. Outro motivo

de surpresa foi a presença da tecnologia: livros, computador, acesso à internet e

projetor de imagens.

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- Os alunos evidenciaram que, além de incorporar o cenário e personagens

tradicionais dos contos clássicos: reino, castelo, torre, rei, rainha, baile, etc., a obra

de Ana Maria Machado faz referência direta aos contos da “Banca de Neve”,

“Cinderela”, “Bela Adormecida” e da “Rapunzel”.

- Os estudantes responderam que o mosquito que a princesa descobriu lembra a

dengue. Uns alunos falaram que conheceram o assunto pela televisão, outros

disseram que aprenderam na escola com a professora.

- Nas discussões evidenciou-se que a Princesa que escolhia não era submissa. Ela

é diferente das princesas dos contos “Rapunzel”, “Cinderela”, “a Bela Adormecida”,

“Branca de Neve”.

- Também detalharam, oralmente, os aspectos que marcam uma subversão do

conto “A Princesa que escolhia” em relação aos contos de fadas tradicionais (a

possibilidade de escolha da princesa, o distanciamento dos padrões patriarcalistas

– não vivem felizes para sempre, não é frágil nem precisa de um príncipe para ser

feliz, ela é dona de sua própria vida –, o desenvolvimento tecnológico, etc).

- Levantaram questões e compartilharam experiências relacionando o tema e

conhecimentos abordados com a realidade social, histórica e cultural na qual estão

inseridos. Ou seja, por meio de reflexões do conto “A Princesa que escolhia” os

alunos discutiram a temática da mulher na sociedade, refletindo sua valorização,

suas conquistas, preconceitos e dificuldades sofridas ao longo do tempo (alguns

utilizaram exemplos de mães e familiares).

- Os alunos demonstraram bastante entusiasmo com a proposta de produzir um

castelo para a Princesa que escolhia, principalmente com a possibilidade de uso de

materiais diversificados.

- Todos demonstraram muito entusiasmo no momento de apresentar suas

produções aos demais. Interagiram e trocaram ideias sobre os trabalhos.

- Imaginaram cenários diversos, revelando a capacidade de imaginação e de

construção (novos sentidos).

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Anexo 5 –

Conto: “A vendedora de fósforos” (Hans Christian Andersen - Tradução de

Pedro Bandeira)

Era a noite de Ano Novo, na Dinamarca, lá no norte gelado do mundo. Sozinha,

naquela noite de inverno rigoroso, andava pelas ruas uma garotinha pobre,

descalça, com a cabecinha descoberta. Fazia um frio terrível, nevava e já tinha

escurecido há bastante tempo. Ela havia saído bem cedinho do casebre onde

morava, calçando os velhos chinelos de sua falecida avó. Mas eles eram muito

grandes e tinham caído de seus pezinhos, pouco antes, quando ela tivera de correr

para não ser atropelada por um carro que passava a toda velocidade. Procurou,

mas só achou um dos pés do par de chinelos. Na mesma hora, porém, um moleque

mau arrancou-o de suas mãos, rindo e dizendo, só de pirraça:

– Onde vai com esse chinelão, garota? É tão grande que pode até servir de berço

para um bebê! Ah, ah! Vou levá-lo comigo para quando eu crescer e tiver um filho!

Com seus pezinhos nus, roxos de frio, enterrando-se enregelados na neve fofa das

calçadas, a menina vagava, carregando caixinhas de fósforos num bolso de seu

avental remendado. Ela já não tinha mais mãe, nem pai, e sua avó havia morrido.

Todos os dias, o padrasto malvado a mandava para as ruas, para vender caixas de

fósforos para os transeuntes.

Mas ninguém lhe comprara nem um palitinho de fósforo durante aquele dia inteiro.

Ninguém lhe dera sequer uma moedinha. Faminta, tremendo de frio, a pobrezinha

olhava as janelas iluminadas nas casas que se preparavam para a ceia de Ano

Novo. Parou um pouco à frente de uma delas, admirando uma árvore de Natal

grande, iluminada. De lá de dentro, vinha um delicioso aroma de ganso assado e

seu pequeno estômago retorcia-se de fome.

Não ousava ir para casa, porque o padrasto bateria nela por não ter conseguido

vender nem uma caixinha de fósforos. Chegar em casa sem trazer algum dinheiro

era surra na certa. Na verdade, mesmo tendo de levar uma surra de cinta, ela

gostaria de estar naquela hora aconchegada no meio dos trapos onde dormia todas

as noites, embora soubesse que continuaria a sentir frio, porque o casebre não

tinha forro e o vento assobiava atravessando as falhas do telhado mal tapadas com

palha e trapos.

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Exausta, a menininha encolheu-se num vão entre duas casas. Sentou-se, encolheu

as perninhas, mas continuava a sentir frio, muito frio. Suas mãozinhas estavam

enregeladas. Talvez, se acendesse um dos fósforos, poderia esquentar-se um

pouco. Com os dedos endurecidos, riscou um fósforo. A chama ardeu na mesma

hora. Que beleza! Envolveu a chama com a mão. Clara e quente, parecia uma

velinha de Natal! Mas era uma luz estranha... Refletida nela, a menina viu-se

sentada dentro da sala que havia visto há pouco, à frente de uma grande lareira de

ferro, toda adornada em latão polido! O fogo da lareira crepitava alegremente e

aquecia tanto, tanto... Maravilha!

A menina já ia estendendo os pés, para esquentá-los também, quando tudo se

apagou e a lareira desapareceu. E ela viu-se de novo encolhida na calçada, só com

um toquinho de fósforo queimado nas mãos... Riscou mais um fósforo, que

acendeu-se claro, brilhante, tornando a parede transparente como um véu. E ela viu

uma sala grande, aquecida, onde estava uma mesa, com toalha bordada e posta

com fina porcelana e talheres de prata. No centro da mesa, um ganso assado

fumegava, recheado de ameixas e maçãs. De repente, o ganso pulou da travessa

de prata e saiu na direção da menina, cambaleando pela sala, com o garfo e a faca

espetados nas costas! Aí, o fósforo se apagou e ela só via a parede, grosseira e

fria.

Ela acendeu outro fósforo. Na mesma hora, viu-se sentada sob os ramos da mais

linda árvore de Natal, maior e mais enfeitada do que a que ela acabara de ver pela

vidraça da casa por onde tinha passado ainda há pouco. Milhares de velas ardiam

nos ramos verdes, e figuras coloridas como as bonecas que ela às vezes via nas

vitrinas das lojas, olhavam para ela, sorrindo... A pequena estendeu as mãos para o

alto mas, nisto, o fósforo se apagou. As velas de Natal foram subindo, subindo, e

ela viu que eram estrelas cintilando no céu negro do inverno. Uma das estrelas caiu,

traçando um longo risco de fogo no céu.

_“Isso é sinal de que alguém vai morrer...”, pensou a menina, lembrando-se de sua

querida avó, a única pessoa neste mundo que lhe quisera bem. A avó costumava

dizer que, quando uma estrela cai, sobe aos céus uma alma.

A pobrezinha tornou a riscar um fósforo. No clarão da chama, surpresa, a menina

viu, radiante e luminosa, sua velha vovó, com a expressão meiga e bondosa de que

ela se lembrava tão bem.

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– Vovó! – gritou a pequena. – Leva-me contigo! Sei que não mais estarás aí quando

o fósforo se apagar. Desaparecerás, como a boa lareira, o delicioso ganso assado e

a grande, linda árvore de Natal!

Riscou às pressas o resto dos fósforos que havia na caixinha, para ter a avó ali a

seu lado, para conservá-la mais um pouco junto de si. O clarão dos fósforos tornou-

se mais intenso que a luz do dia. Nunca a avó fora tão grande e bela! Ergueu a

menina nos braços e as duas voaram, felizes, para as alturas, onde não havia frio

nem fome, nem apreensões. Voaram para junto de Deus...

Fonte:http://www.bibliotecapedrobandeira.com.br/pdfs/contos/a_vendedora_de_fosforos.pdf

Anexo 6 –

RELATÓRIO DE OBSERVAÇÃO I: Relato descritivo de aula de leitura literária

observada na Biblioteca de uma Escola da Rede Municipal de Ensino de Cascavel –

PR.

A aula foi desenvolvida pela monitora de biblioteca com alunos do 5º ano do

Ensino Fundamental (24 alunos), com tempo de duração de 1 h e 25 minutos, no dia

12 de março de 2014, no período da manhã.

A sala da biblioteca é pequena; dispõe de oito mesas com quatro cadeiras

cada, rodeada por estantes com livros e materiais de leitura variados. A monitora

recebeu os alunos (sem a presença do professor regente da turma), organizando-os

em pares de meninos e pares de meninas em cada mesa. Os alunos são proibidos

de manipular/manusear os materiais das estantes.

A monitora iniciou a aula lendo para os alunos o livro Até as Princesas soltam

Pum – Ilan Brenman/Ionit Zilberman, Editora Binque Book. Durante a leitura ela

circulou pela sala e acabou se perdendo em alguns trechos. A cada duas ou três

páginas lidas fazia uma pausa e mostrava as gravuras para os alunos, perguntando

o que eles mais gostaram, o que entenderam da passagem e o que acharam dos

desenhos. Destaca-se, a seguir, momentos da narração da história e do diálogo da

monitora com os alunos:

(Mon: Monitora da biblioteca; A: alunos; A1: apenas um aluno por vez)

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Mon (apresentando o livro aos alunos): Está bem, agora chega de conversa e prestem atenção que eu vou contar uma história bem novinha para vocês. Essa daqui é diferente porque vai mostrar que aqueles personagens das histórias clássicas que todo mundo conhece também têm defeitos e são como a gente. Olhem que bonita! Quem escreveu essa história foi Ilan Brenman e quem fez as ilustrações foi Ionit Zilberman. E olhem como ele é colorido e bonito. Então ele começa assim: “Depois de chegar da escola, Laura chamou o pai e perguntou: - As princesas soltam pum? [...] - Acho que sim, as princesas soltam pum – respondeu o pai com muita delicadeza.” Viram, quem então é essa menininha? A: Laura! Mon: E o que ela quer saber? A: Se as princesas também soltam pum. Mon: E para quem ela vai perguntar? A: Para o pai dela. Mon: E onde o pai está? A1: Está no sofá. Mon: É, está no sofá descansando. Agora continuando: “– Não pode ser pai [...]. Depois de algum tempo, o pai encontrou um livro que parecia ter mais de duzentos anos.” – E agora, onde o pai foi? A: Na biblioteca. A1: Pegar um livro pra pesquisar o problema. Mon: Estão vendo? Viram como os livros são importantes? A gente pode encontrar tudo neles, todo tipo de conhecimento. Continuando: “O pai fez cara de mistério [...]. - Você lembra da noite do baile da Cinderela? - Sim!” Viram o que eu falei no começo? Quem é a primeira princesa que tinha problemas de soltar pum? A: A Cinderela. Mon: E o que vocês acharam desse desenho do baile? A1: É bonito. A1: Eu achei que parece velho, é esquisito. Mon: É porque a Cinderela é de antigamente e não de hoje em dia. Então, continuando: “– Naquela noite ela estava muito nervosa [...]. Branca soltou um pum tão fedorento que chegava a ser tóxico. Ela desmaiou por causa disso.” – E agora, depois da Cinderela, quem foi a princesa que teve problemas de intestino? A: A Branca de Neve! Mon: Estão vendo que nem foi a bruxa que envenenou a Branca de Neve? Foi ela mesmo que teve problemas com os puns! A1: Vai ver a bruxa nem era tão má e nem ia matar a Branca de Neve, ela até sofreu com o gás tóxico! Mon: Verdade. Mas prestem atenção que está quase terminando: “– E a pequena Sereia? [...]. – Mas, mesmo soltando pum, elas continuam sendo lindas princesas, não é pai?” – Qual foi a última princesa que o pai mostrou que solta pum? A: A Pequena Sereia.

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Mon: Viram que lindo esse mar que eles desenharam aqui? O que é que dá para enxergar? A1: Parece pano e... letrinhas. Mon: É, eles fizeram as conchas de tecido e as ondas de letras misturadas, bacana não é? A: É. Mon: E agora o livro termina assim: “– Claro filha. Elas são as princesas mais lindas do mundo, mas até as princesas soltam pum. O importante é você não espalhar esse segredo por aí [...]. Descubram esse segredo e não contem pra ninguém.” – E então, gostaram da história? A: Sim! Mon: E o que ela nos ensinou? A: (em silêncio). A1: Que princesa também solta pum. Mon: É, que todo mundo, não importa se é rico ou pobre, todo mundo solta pum. Agora isso pode ser feito em qualquer lugar? A: Não! A1: Tem que ir ao banheiro! Mon: É, vocês estão lembrados das regras de convivência que as professoras fizeram no começo do ano? Então, o corpo da gente tem necessidades, mas nós temos que aprender a controlar [...].

Assim, após a leitura do livro, a monitora inicia um diálogo sobre as regras de

convivência, comportamento noções de higiene pessoal. Abordou também a

importância de uma alimentação saudável para evitar e prevenir problemas de

digestão. Após essa conversação, construiu um pequeno texto coletivo com as ideias

discutidas: higiene e alimentação. O texto, feito em cartolina, ficou fixado na parede,

com a identificação dos alunos da turma, os quais o copiaram em folha sulfite.

Na sequência, pediu aos alunos que desenhassem a parte que cada um mais

gostou da história. Como exemplo da atividade, foi coletado um modelo desenvolvido

por um aluno (selecionado aleatoriamente). Segue abaixo:

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Anexo 7 –

RELATÓRIO DE OBSERVAÇÃO II: Relato descritivo de aula de leitura literária

observada em uma turma de 5º ano do Ensino Fundamental (24 alunos), de uma

Escola da Rede Municipal de Ensino de Cascavel – PR.

A aula foi desenvolvida pela professora regente em duas etapas, com tempo

de duração de 2h e 15 min. no dia 08 de agosto de 2014, e de 2h e 45 min. no dia

11 de agosto, no período da manhã. A observação dessa aula foi agendada com a

professora regente, tendo em vista o cronograma de aulas da semana e o conteúdo

programático que ela estava trabalhando, ou seja, a professora regente agendou os

dias em que iria trabalhar com textos literários, conforme a sua programação.

A aula teve início com a professora organizando os lugares dos alunos devido

a problemas de indisciplina. Após a organização inicial, ela passou no quadro a

definição de “Contos de Fadas” para que os alunos copiassem (conforme exemplo

de atividade coletada abaixo). Na sequência, explicou, oralmente, o que havia

registrado, enfatizando a estrutura que os contos de fada geralmente apresentam.

Nesse momento, a professora questionou os alunos sobre quais contos de fadas

eles conheciam e como eles observavam essa estrutura dentro de cada conto, como

se destaca na passagem:

(P: professora; A: alunos; A1: apenas um aluno por vez)

P: Vocês já ouviram e leram muitos contos de fadas, quem lembra algum? A: João e Maria, João e o pé de feijão, Branca de Neve, Cinderela... P: Isso mesmo, e por exemplo, na história da Cinderela, qual é a situação inicial? A1: Ela estava sozinha, abandonada. A1: E tinha que fazer todo o serviço para sua madrasta. P: Isso, e depois, qual vai ser o conflito que vai acontecer? A: (em silêncio) P: Qual é o problema que vai acontecer na história com a Cinderela? A1: Vai ter o baile...

A dinâmica da aula consistia em que a professora ia questionando-os de forma

que conseguissem identificar a ordem existente no conto utilizado como exemplo para

a explicação. A seguir, falou um pouco sobre a divisão entre “Contos de Fadas” e

“Contos Maravilhosos”, mostrando aos alunos um exemplar antigo da biblioteca. O

livro foi passado aos alunos para que pudessem folheá-lo.

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Como forma de sistematização do conteúdo abordado a professora aplicou

algumas atividades fotocopiadas (conforme seguem abaixo) e pediu para que os

alunos produzissem um texto, como tarefa de casa, contando uma versão

diferenciada do conto “Chapeuzinho Vermelho”. Para tanto, ela entregou uma cópia

da versão original da história (Irmãos Grimm) e de uma história em quadrinhos da

Turma da Mônica sobre o tema, lendo-a em voz alta para os alunos e dando algumas

sugestões de como poderiam produzir os textos.

No dia 11 de agosto, a professora iniciou a aula conferindo os cadernos dos

alunos para verificar quem havia feito a tarefa de casa (produção de texto: releitura do

conto “Chapeuzinho Vermelho”). Em seguida, passou no quadro a definição de

“Fábulas” e um exemplar desse gênero, com o título: “O Reino do Leão” para que os

alunos copiassem. Então, explicou, oralmente, o conteúdo, abordando,

principalmente, a função moral das fábulas, mas sem a participação efetiva dos

alunos. Leu para os alunos outras duas fábulas de Esopo, “A Raposa e as uvas” e “A

Pomba e a Formiga”, destacando a moral de cada uma e que lição os alunos podem

tirar delas para suas vidas.

Após a explicação, retomou os contos de fadas, tentando diferenciá-los das

fábulas. Evidenciou que também os contos de fadas tem uma lição de vida

(exemplificou com a história da “Chapeuzinho Vermelho”, que desobedeceu sua

mãe), mas que não é explícita como nas fábulas.

Buscando imprimir um caráter interdisciplinar a sua aula, aplicou para os

alunos uma série de problemas matemáticos envolvendo a temática dos contos de

fadas e dos animais das fábulas. Os problemas foram sendo lidos oralmente, um a

um, e o algoritmo da operação foi sendo desenvolvido pela professora, no quadro, e

os alunos chamados a resolver o mecanismo operatório. Para concluir a atividade, a

professora pediu que os alunos representassem a sequência dos problemas através

de desenhos e colorissem.

Coletamos, do caderno de um aluno, algumas amostras de atividades e textos

trabalhados nesses dias, as quais seguem abaixo:

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Anexo 8 –

Mostras de trabalhos desenvolvidos pelos alunos durante os módulos da Oficina

Literária

(Biruta – representação de F. L. T. – 10 anos)

(Princesa que escolhia – representação de J. C. P. – 9 anos)

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(varal de poesias e desenhos)

(Castelo da princesa que escolhia – representação de J. Y. P. S. – 9 anos)

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(Ambiente da sala onde se desenvolveu o Projeto)