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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS CAMPUS I PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDO DE LINGUAGENS ALBA VANÚSIA NASCIMENTO MURICY CAMINHOS PARA O LETRAMENTO LITERÁRIO: A TESSITURA DO PROJETO INSTITUCIONAL DE LEITURA EM PINDOBAÇU-BA Salvador 2017

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS – CAMPUS I

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDO DE LINGUAGENS

ALBA VANÚSIA NASCIMENTO MURICY

CAMINHOS PARA O LETRAMENTO LITERÁRIO: A TESSITURA DO PROJETO

INSTITUCIONAL DE LEITURA EM PINDOBAÇU-BA

Salvador

2017

ALBA VANÚSIA NASCIMENTO MURICY

CAMINHOS PARA O LETRAMENTO LITERÁRIO: A TESSITURA DO PROJETO

INSTITUCIONAL DE LEITURA EM PINDOBAÇU-BA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação

em Estudo de Linguagens da Universidade do Estado da

Bahia, como parte dos requisitos para a obtenção do título

de Mestre.

Orientadora: Profa. Dra. Luciana Sacramento Moreno

Gonçalves

Salvador

2017

Ficha Catalográfica

____________________________________________________________________

M977c Muricy, Alba Vanúsia Nascimento.

Caminhos para o letramento literário: a tessitura do projeto

Institucional de leitura / Alba Vanúsia Nascimento Muricy. – Salvador,

2017.

114 f. : il.

Orientadora: Profa. Dra. Luciana Sacramento Moreno Gonçalves.

Dissertação (mestrado) - Universidade do Estado da Bahia. Departamento

de Ciências Humanas. Campus I. Programa de Pós-Graduação em Estudo

de Linguagens – PPGEL, 2017.

1. Literatura. 2. Letramento Literário. 3. Práticas Leitoras. 4. Projeto

Institucional de Leitura – PIL. I. Gonçalves, Luciana Sacramento Moreno.

II. Universidade do Estado da Bahia. Departamento de Ciências Humanas.

Campus I.

CDD 410

___________________________________________________________________

ALBA VANÚSIA NASCIMENTO MURICY

CAMINHOS PARA O LETRAMENTO LITERÁRIO: A TESSITURA DO PROJETO

INSTITUCIONAL DE LEITURA EM PINDOBAÇU-BA

Aprovada em:

Banca Examinadora:

___________________________________________________________________________

Profa. Dra. Luciana Sacramento Moreno Gonçalves (Orientadora)

Programa de Pós-Graduação em Estudo de Linguagens

Universidade do Estado da Bahia - UNEB

___________________________________________________________________________

Profa. Dra. Márcia Rios (Avaliador interno)

Programa de Pós-Graduação em Estudo de Linguagens

Universidade do Estado da Bahia - UNEB

___________________________________________________________________________

Profa. Dra. Maria Helena da Rocha Besnosik (Avaliador externo)

Programa de Pós-Graduação em Educação

Universidade Estadual de Feira de Santana - UESF

Salvador

2017

AGRADECIMENTOS

Agradecer é um ato de reverência àqueles que ao longo da jornada puseram-se a caminhar

conosco.

Gratidão à presença divina na minha vida, aos anjos de luzes que inspiraram e sustentaram

meus passos.

Gratidão aos anjos humanos que participaram de formas diversas deste processo de produção.

À mainha, pelas orações de todos os dias, presença de fé em minha vida.

À Clara, por velar comigo e perdoar minhas ausências e meus cansaços.

À tia, por assumir a maternidade minha e da Clara para que eu pudesse estudar.

À professora Luciana Sacramento Moreno Gonçalves, pela orientação, paciência e

disponibilidade.

À professora Márcia Rios, pela enorme contribuição crítica no texto da qualificação.

À professora Maria Besnosik, por toda delicadeza e leitura lúcida do material da qualificação.

Aos amigos que o mestrado me presenteou, pessoas lindas que tive o prazer de conhecer e

conviver.

À Camila, Geysa e Danilo pelo profissionalismo, boa vontade e solicitude com que inúmeras

vezes me atenderam.

A Ageu, Cleusa e Marília que me acolheram em Salvador.

“A beleza não está na partida nem na

chegada, mas na travessia”.

Guimarães Rosa

RESUMO

O presente trabalho constitui-se em estudo acerca do letramento literário, desenvolvido no

âmbito do Projeto Chapada, a partir de práticas, realizadas no Projeto Institucional de Leitura

(PIL). Este apresenta como eixo o fomento ao letramento literário e se constitui de ações

leitoras diversas, desenvolvidas no ensino fundamental da rede municipal de Pindobaçu - BA.

Essa pesquisa objetiva investigar como práticas de leitura, a exemplo da “Poesia na Calçada”

e do “Intervalo com Rubem Alves”, dentre várias outras, contribuem para letramento literário,

tecem uma rede escolar leitora e provocam o despertar do interesse pela leitura entre

diferentes leitores, a saber: alunos, professores, familiares, comunidade não escolar. Nesta

investigação, defende-se que as práticas de letramento literário se inserem no campo da

democratização do conhecimento, sobretudo, o artístico e, precisam comprometer-se com

aqueles que foram historicamente marginalizados por uma tradição de leitura elitista e

excludente. Para isso, embasa-se nas discussões da Sociologia da Leitura a partir da

compreensão desta como prática cultural, social e histórica Chantal Horellou-Lafarge, Monique Segré (2010) e Roger Chartier (2011), nas contribuições de Antônio Cândido

(2012) para quem a literatura tem um papel humanizador, configurando-se em direito básico

do ser humano, nas reflexões sobre letramento literário abordadas por Rildo Cosson (2012).

Caracteriza-se por uma abordagem qualitativa, a partir da pesquisa bibliográfica e de seu

cunho descritivo e de análise documental. Entende-se que percursos investigativos como estes

podem auxiliar para o alargamento da discussão em torno da promoção da leitura e do

fomento de tais práticas além de propiciar elaborações reflexivas que se consolidem em

letramentos outros. Pois, embora a temática da leitura tenha conquistado lugar nas discussões

pedagógicas, os espaços formativos e o contexto escolar encontram-se ainda muito

distanciados de práticas efetivas e consolidadas.

Palavras-chave: Literatura; Letramento Literário; Práticas Leitoras; Projeto Institucional de

Leitura (PIL).

ABSTRACT

The present work is a study about literary literacy, developed within the framework of the

Chapada Project, based on practices carried out in an Institutional Reading Project (IRP). This

one has as its axis the promotion of literary literacy and it is constituted of several reader

actions, developed in the fundamental education of schools of the city of Pindobaçu - BA.

This research aims at investigating how practices, such as “Poesia na Calçada” and the

“Intervalo com Rubem Alves”, among others, contribute to literary literacy, weave a school

reading network and provoke the interest of reading among different readers, namely:

students, teachers, family members and the non-school community. In this research, it is

argued that literary literacy practices fall within the field of the democratization of

knowledge, especially the artistic, and must commit themselves to those who have been

historically marginalized by a tradition of elitist and excluding reading. For this, it bases itself

on the discussions of the Sociology of Reading from the understanding of this as cultural, social and historical practice Chantal Horellou-Lafarge, Monique Segré (2010) and Roger

Chartier (2011), in the contributions of Antônio Cândido (2012) for whom literature has a

humanizing role, in basic human right and in the reflections on literary literacy addressed by

Rildo Cosson (2012). All the investigative work is characterized by a qualitative approach,

based on bibliographic research and its descriptive character and documental analysis. It is

understood that investigative paths such as these can help to broaden the discussion around

promoting reading and fostering such practices as well as providing reflective elaborations

that are consolidated in other literatures. For, although the thematic of reading has gained a

place in the pedagogical discussions, the formative spaces and the school context are still

much distanced from effective and consolidated practices.

Key-words: Literature; Literary Literature; Practical Readers; Institutional Reading Project

(IRP).

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Território de Identidade Piemonte Norte do Itapicuru............................................22

Figura 2 - Dimensões do PIL na Gestão Escolar.....................................................................76

Figura 3 - Organograma de Estruturação da Rede Municipal de Ensino................................80

SUMÁRIO

1 JUNTANDO OS FIOS QUE TECEM O OBJETO DA PESQUISA....................................10

2 ONDE FOI PARAR O “AMOR” AOS LIVROS E À LITERATURA?...............................21

2.1 A Cidade, um Contexto e o Projeto de Leitura...................................................................24

2.2 O Letramento Literário como Lastro para Aprendizagem da Leitura de Literatura...........33

3 A TESSITURADO PROJETO INSTITUCIONAL DE LEITURA (PIL)...........................37

3.1 A Gênese do Projeto Chapada – A História Contada.........................................................39

3.2 A Proposta de Ação do ICEP nas Linhas e Entrelinhas dos Documentos Norteadores.....41

4 DESENROLANDO OS FIOS QUE TECEM O PROJETO INSTITUCIONAL DE

LEITURA..................................................................................................................................49

4.1 Os Documentos Norteadores do PIL..................................................................................52

4.2 As Concepções de Leitura que Tecem os PILs...................................................................59

5 A TESSITURA DE UMA REDE LEITORA: ESTRUTURAÇÃO E FUNCIONAMENTO

DO PIL EM PINDOBAÇU.......................................................................................................73

5.1 As Práticas de Leitura na Contramão de uma Cidade sem Biblioteca................................83

5.2 Nas Calçadas e Intervalos a Tessitura dos Projetos de Leitura...........................................88

6 ARREMATANDO ALGUMAS CONSIDERAÇÕES..........................................................95

REFERÊNCIAS.......................................................................................................................99

ANEXOS................................................................................................................................107

10

1 JUNTANDO OS FIOS QUE TECEM O OBJETO DA PESQUISA

Um galo sozinho não tece uma manhã: ele precisará sempre de outros

galos. De um que apanhe esse grito que ele e o lance a outro; de um

outro galo que apanhe o grito de um galo antes

e o lance a outro; e de outros galos que com muitos outros galos se

cruzem os fios de sol de seus gritos de galo, para que a manhã, desde

uma teia tênue, se vá tecendo, entre todos os galos.

(João Cabral de Melo Neto, Poesias Completas, 1968)

O letramento literário é um tema comumente discutido. Todavia, apesar disso, ainda

suscita interesses e evidencia espaços lacunares para novas discussões dada não apenas a sua

abrangência, mas ainda os diferentes recortes e perspectivas sob as quais se esboça essa

temática. Assim, o presente trabalho inscreve-se como um desdobramento desse tema por

meio do relato de uma experiência local em torno de práticas leitoras: a tessitura do Projeto

Institucional de Leitura – PIL, constituído de ações leitoras diversas implementadas no

contexto da rede de educação do município de Pindobaçu- BA. O projeto é resultante de uma

parceria institucional da Secretaria de Educação do município com o Instituto Chapada de

Educação – ICEP. Propõe a incorporação das práticas de leitura nos processos formativos das

equipes técnicas e de coordenadores pedagógicos bem como a extensão dessas práticas

leitoras aos professores, alunos e funcionários das unidades escolares do Ensino Fundamental.

O interesse em investigar o PIL materializou-se no ano de 2015 a partir da minha

inserção no mestrado. Antes disso, a temática da leitura já fazia parte das minhas reflexões e

estudos como pedagoga e professora de Língua Portuguesa. Ao longo dos vinte anos dessa

trajetória profissional, a atividade com a leitura sempre foi uma constante na minha prática

pedagógica e, principalmente, nas minhas inquietações a respeito do lugar da leitura no

espaço escolar e na práxis pedagógica.

No ano de 2013, iniciei um trabalho na Secretaria Municipal de Educação de

Pindobaçu, município ao norte da Bahia, como supervisora técnica do Ensino Fundamental II.

Nesse ano, ao inserir-me na rede municipal de educação, passei a frequentar os encontros

pedagógicos do Instituto Chapada de Educação- ICEP. A afirmação de uma parceria do

município com o ICEP implicava na adesão aos encaminhamentos da rede Chapada, dentre

esses, a implementação do PIL. O PIL apresenta-se como uma proposta de fomento à leitura,

constituindo-se de ações e projetos de leitura diversos desenvolvidos e/ou (re)criados nas

escolas em todos os municípios parceiros do ICEP. O Instituto Chapada de Educação e

Pesquisa (ICEP) caracteriza-se como uma rede colaborativa que visa qualificar a gestão

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pedagógica dos municípios parceiros por meio de uma política de formação continuada,

acompanhamento e avaliação da aprendizagem.

Embora a rede municipal de educação já estivesse inserida nesta parceria desde o ano

de 20091, somente em 2013 o PIL passa a ser assumido de forma mais sistemática pelas

escolas do município. Nesse ano, as diversas ações leitoras desenvolvidas isoladamente nas

unidades escolares do município foram mapeadas pela supervisão pedagógica de cada

segmento de ensino e abarcadas pelo Projeto Institucional de Leitura – PIL. Dessa forma, toda

ação de leitura desenvolvida nas unidades escolares passa a constituir o PIL.

A minha experiência no Projeto relaciona-se à função de Supervisora Pedagógica do

Ensino Fundamental II. Nesta função, desenvolvia tanto a formação profissional educativa das

coordenadoras pedagógicas do segmento citado, quanto a articulação e orientação do PIL nas

unidades escolares. As formações com as coordenadoras pedagógicas aconteciam

semanalmente. Iniciávamos cada encontro, impreterivelmente, com um momento destinado à

leitura de livros ou textos literários, momento denominado “formação leitora”. Enquanto

mediadora desse processo formativo, apoiava as coordenadoras na discussão, na escrita e na

avaliação das práticas leitoras a serem implementadas no espaço escolar.

Destacamos algumas das diferentes acepções do termo formação para definirmos

nossa compreensão sobre o mesmo. De acordo com o dicionário Aurélio (FERREIRA, 1986,

p. 800), formação pode significar, entre outras coisas, “ato, efeito ou modo de formar;

constituição. Para Antônio Joaquim Severino (2006, p. 621) formação é um processo de devir

humano, mediante o qual o indivíduo natural devém um ser cultural. Portanto, o sentido dessa

categoria envolve um complexo conjunto de significados que o verbo formar pode expressar:

constituir, compor, ordenar, fundar, criar, instruir-se, colocar-se ao lado de, desenvolver-se,

dar-se um ser. Há pois, um sentido mais rico denotado pela voz reflexiva do verbo, como que

indicando que é uma ação cujo agente só pode ser o próprio sujeito. O termo formação aqui,

portanto, equivale a processo constitutivo.

A cada encontro, uma das coordenadoras assumia a função de mediadora da formação

leitora ou esta mediação era assumida por mim. O papel da mediadora nesta formação leitora

consistia na apresentação criativa do livro mediante a leitura de um capítulo, texto-fragmento,

fragmentos ou capítulos, de modo a despertar o interesse e instigar a leitura da obra. A partir

daí, seja pelas provocações suscitadas pela mediação, seja, pelo clima de diálogo que a leitura

provoca, as opiniões a respeito da leitura eram compartilhadas e/ou confrontadas. Cada um

1 A adesão do município à rede Chapada é marcada por descontinuidades. Nos anos de 2012, 2015 e 2016 o município não

fez adesão à parceria com o ICEP. As descontinuidades são, normalmente, de ordem política, cada gestor municipal assume

ou não essa parceria. Ocorrendo, inclusive, descontinuidades em uma mesma gestão política.

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dos participantes assumia essa discussão de forma espontânea, a partir das suas impressões e

compreensões. Para além das práticas leitoras ali desenvolvidas, aprofundava-se a discussão

teórica sobre leitura, literatura e sobre o papel do professor como agente de letramento.

O PIL institui-se, portanto, nos espaços formativos da rede municipal como uma

política de promoção de incentivo à leitura a partir do pressuposto de que pensar a experiência

com a leitura é pensar também a formação de leitores, enfatizando-se a responsabilidade da

escola com a promoção de práticas leitoras que provoquem interesse pela leitura para além da

mera decodificação e das práticas impositivas escolares.

Assim, o projeto de leitura que já me interessava como sujeito envolvido no processo

pedagógico da rede municipal, passou a interessar-me como objeto de pesquisa. Algumas

questões interpelaram-me na condução deste estudo: quais as contribuições do PIL para a

constituição de leitores? De que forma as práticas de leitura desenvolvidas pelo PIL

configuram-se em letramento literário? Que aproximações há entre as concepções de leitura e

literatura estudadas ao longo da minha trajetória acadêmica e as que se delineiam no PIL? Ao

longo das análises aqui empreendidas retomo-as no intento de respondê-las.

Dessa forma, minha relação com o Projeto Institucional de Leitura – PIL está

vinculada ao contexto profissional na condição de sujeito partícipe do projeto e ao incurso

acadêmico na condição de pesquisadora interessada nas práticas de leitura como forma de

inserção social e cultural. Tomo distância, portanto, do Projeto, para percebê-lo como objeto

de pesquisa, uma vez que as disciplinas cursadas na pós-graduação possibilitaram a ampliação

do meu universo teórico sobre a temática da leitura e da literatura, provocando esta

experiência formativa uma percepção mais crítica, estimulando-me a refletir sobre as práticas

de leitura no âmbito do PIL de forma mais reflexiva e contextualizada, dado que sua

concepção se vincula a um projeto de formação continuada, implicado por questões político-

ideológicas. Uma vez que este projeto de formação continuada insere-se num quadro de

reformas educacionais mais amplo a partir da consolidação do processo de globalização, da

redefinição das formas de organização do Estado e do protagonismo das agências

internacionais ligadas ao campo educacional.

Conforme Popkewitz (1997, p. 18), o papel estratégico vislumbrado para a educação

no panorama de um mundo em processo de globalização tende a se expressar por meio de

reformas de ensino, concebidas como alternativas “para alcançar o ressurgimento econômico,

a transformação cultural e a solidariedade nacional”. O impacto dessas mudanças sobre a

educação tem sido tematizado por vários autores com enfoques distintos, dentre eles

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destacamos Esteve (1992), Popkewitz (1997), Carnoy (1999), Biddle et al., (2000), Catani e

Oliveira (2000).

Nesse cenário de mudanças, surge um amplo aparato normativo sobre as questões do

magistério como a LDB, o PNE e, mais recentemente, as Diretrizes Curriculares Nacionais

para a Formação de Professores da Educação Básica (BRASIL, 2001), até chegar àqueles

documentos que circulam no âmbito da burocracia estatal, mas não penetram o debate no

âmbito das instâncias formadoras, como universidades e secretarias de educação, assim como

as organizações da sociedade civil, como, por exemplo, os Referenciais para a Formação de

Professores (BRASIL, 1999), praticamente desconhecidos para além da esfera de abrangência

daqueles que participaram de sua elaboração.

Vislumbra-se, portanto, na formação docente, um dos elementos-chave para as

reformas dos sistemas educacionais, passando-se a investir nessa direção. Conforme Gatti

(2009, p. 199), a formação continuada tem recebido atenção de destaque. Os indicadores

revelam o elevado número de docentes que participam de atividades ou cursos com esse

objetivo. Segundo dados do Censo de Profissionais do Magistério da Educação Básica de

2003 analisados por Catrib et al., (2008), 701.516 desses profissionais, de um total de

1.542.878, participaram de alguma atividade ou curso, presencial, semipresencial ou a

distância, nos dois anos anteriores, oferecidos quer por instituições governamentais, no

âmbito dos entes federados, União, estados e municípios, quer por instituições de Ensino

Superior de caráter público ou privado, quer por ONGs, sindicatos ou ainda pelas próprias

escolas.

Com problemas crescentes nos cursos de formação inicial de professores, a ideia de

formação continuada como aprimoramento profissional foi se deslocando também para uma

concepção de formação compensatória destinada a preencher lacunas da formação inicial. Os

indicadores resultantes de avaliação dos cursos de formação e do desempenho dos alunos

demonstram a insuficiência ou mesmo a inadequação da formação inicial adquirida em

instituições de Ensino Superior, extraordinariamente expandidas, sobretudo por intermédio do

setor privado, a partir dos anos 1980. (GATTI; NUNES, 2008).

Segundo Aguerrondo (2004, p. 15), os processos de formação continuada

desenvolvidos desde os anos de 1980, quer para a atualização ou complementação de

conhecimentos, quer para a preparaçãoda implementação de uma reforma educativa, não

produziram os efeitos esperados. Entre as razões invocadas estão a dificuldade de formação

em massa, a brevidade dos cursos, realizados nos limites dos recursos financeiros destinados,

e a dificuldade de fornecer, pelos motivos citados, ou ainda pelo nível de preparação das

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instituições formadoras, os instrumentos e o apoio necessários para a realização das mudanças

esperadas.

Portanto, é a partir da consideração desse contexto educacional que propomos a

análise do PIL, projeto implementado a partir da proposta de formação continuada do ICEP.

Assim, o objetivo desta dissertação é investigar as práticas de leitura no âmbito do Projeto

Institucional de Leitura implementado na rede municipal de Pindobaçu-BA, cujo objetivo é

fomentar a leitura nas escolas, contribuindo para a formação de uma comunidade de leitores.

Dessa forma, a questão que se coloca é: Como as práticas de leitura desenvolvidas pelo PIL se

constituem em letramento literário?

Se o letramento literário é entendido como “o processo de apropriação da literatura

como construção literária de sentidos” (PAULINO; COSSON, 2009, p.67), compreendemos

que a aproximação afetiva e cultural com textos e obras literárias se caracteriza como

letramento literário e que este apresenta-se como possibilidade de democratização do

conhecimento artístico-literário, comprometendo-se com aqueles marginalizados ao longo de

uma tradição histórica em que o ato de ler é marcado pelo elitismo e pela exclusão.

Defendemos a implementação de políticas públicas comprometidas com a

democratização da leitura e a inserção social daqueles que foram ao longo da história

ocupando apenas as margens. Para tanto, não se faz suficiente distribuir livros e apregoar a

importância da leitura nas práticas pedagógicas. Urge a emergência de compreensões mais

amplas e críticas e de investimentos de diversas ordens.

Por outro lado, entendemos que, enquanto sujeitos envolvidos com os processos

educativos, estamos implicados com as políticas de leitura, sobretudo, aquelas que se

desenvolvem em esferas mais próximas. Yunes (2003) ressalta a necessidade de se

estabelecerem políticas de leitura de natureza comunitária num chamado à responsabilidade

da sociedade civil no que se refere à questão da leitura. Comungando desse pensamento de

Yunes (2003), do compromisso que temos como articuladores de políticas de leitura, nosso

olhar direciona-se para a significação das práticas de leitura desenvolvidas nos espaços

formativos locais a partir da implementação do PIL e suas reverberações no contexto da

educação básica municipal. Compreendemos que a leitura de literatura se constitui em uma

experiência singular. Conforme Cosson (2012):

[...] na leitura e na escritura do texto literário encontramos o senso de nós

mesmos e da comunidade a que pertencemos. A literatura nos diz o que

somos e nos incentiva a desejar e a expressar o mundo por nós mesmos. E

isso se dá porque a literatura é uma experiência a ser realizada. No exercício

da literatura, podemos ser outros, podemos viver como os outros, podemos

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romper os limites do tempo e do espaço de nossa experiência e, ainda assim,

sermos nós mesmos. [...] A experiência literária não só nos permite saber da

vida por meio da experiência do outro, como também vivenciar essa

experiência. (COSSON, 2012, p. 17).

Acreditamos que a experiência literária se constitui em via de acesso à experiência

singular e subjetiva da experiência estética. Embora prevaleça uma compreensão positivista

que enclausura o conhecimento nas grades da cientificidade objetiva, deslegitimando as

demais formas de conhecimento e concepções de mundo, sobretudo, aquelas que estão na

esfera das subjetividades e da arte, ignorando que, para viver, criar e construir, o ser humano

necessita de instrumentos que fundam seu potencial imaginativo, bem como ampliem seus

universos, entendemos que a arte (a Literatura, nesse caso) tem também a função de ampliar

este potencial na formação individual e coletiva disseminando outras experiências que

confirmem e assegurem os direitos humanos.

O presente estudo justifica-se por propiciar uma reflexão sobre as práticas de leitura

fundamentada em referenciais atualizados a respeito do letramento literário, intentando

compreender como o desenvolvimento de projetos de leitura, a exemplo do PIL, podem

contribuir com a formação de leitores em um contexto social marcado pelas ausências

materiais e pelo distanciamento de determinados bens culturais. Dessa forma, ao analisarmos

a forma como se processa a constituição do PIL e as práticas de leitura desenvolvidas no

contexto da rede municipal de ensino, pretendemos instigar percepções mais críticas e

ampliadas dessas práticas leitoras. Pois, entendemos que a partir de reflexões críticas e

contundentes é possível provocar mudanças positivas na práxis pedagógica. E que o

conhecimento acadêmico pode contribuir com os espaços escolares, de forma mais específica,

com os contextos educacionais públicos, como uma forma de interação com a sociedade e de

democratização dos saberes produzidos, sob pena da universidade constituir-se numa “torre

de marfim”, alheia às demandas sociais e ensimesmada pelas grades do academicismo.

Assim, afirmamos a inserção desta pesquisa nos estudos da Sociologia da Leitura

Chantal Horellou-Lafarge, Monique Segré (2010) e Chartier (2011), compreendendo a leitura

como prática sócio-histórica implicada com as relações culturais, tecnológicas e

institucionais. E incluímos as compreensões sobre letramento abordadas por Magda Soares

(2010), Cosson (2012) para discutirmos o letramento literário como via de acesso à leitura.

Entendemos que pensar o PIL implica refletir sobre propostas viáveis de letramento

literário que vão além das muitas pesquisas existentes que primam pela divulgação dos

resultados das avaliações realizadas sobre a baixa qualidade da leitura dos estudantes

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brasileiros. Comungamos, assim, da fala de Soares (2010, p. 63): “Eu diria que temos

avaliado muito, e pesquisado pouco ou nada, sobre as causas e as circunstâncias que podem

explicar os baixos resultados ou o fracasso das nossas crianças em leitura, os baixos níveis de

letramento da população jovem adulta”. Entendemos, portanto, que há um espaço lacunar de

discussão sobre letramento literário que carece ser ocupado pelas pesquisas em Literatura,

seja no que se refere às causas dos baixos níveis de letramento, seja no que se refere aos

caminhos percorridos que vão se constituindo em letramento literário ou viabilizando esse

processo.

Destacamos, assim, a Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil2 como uma pesquisa em

âmbito nacional que tem como objetivo avaliar o comportamento leitor do brasileiro. A ampla

divulgação de seus resultados a tornam referência para diagnóstico e estudos que objetivem

refletir e avançar nas discussões sobre os atuais indicadores de leitura, de acesso ao livro e da

melhoria dos índices de leitura. Levando em consideração o contexto político e

mercadológico que perpassa a pesquisa compreendemos que trata-se de uma pesquisa

quantitativa3 com possibilidades de leituras qualitativas sobre essa temática. A pesquisa

considera leitor aquele que leu, inteiro ou em partes, pelo menos 1 livro4 nos últimos 3 meses.

Enquanto que não leitor é aquele que declarou não ter lido nenhum livro nos últimos 3 meses,

mesmo que tenha lido nos últimos 12 meses.

Dentre as principais motivações para ler um livro destacam-se: o gosto, a atualização

cultural ou o conhecimento geral e a distração. Os gêneros mais lidos pelos entrevistados são

a Bíblia, os livros religiosos, o conto e o romance. Os lugares5 mais citados em que se

costuma ler são a casa, a sala de aula e as bibliotecas em geral. Os leitores citam como razão

para não ler mais: a falta de tempo; a preferência por outras atividades; a falta de paciência

para ler e a ausência de bibliotecas por perto. Em relação à média de livros lidos nos últimos 3

meses, entre todos os entrevistados, a pesquisa revela que foram lidos 2,54 livros, sendo 0,66

desses, indicação da escola. A pesquisa destaca que:

2Failla (2016). 3A pesquisa utiliza a técnica quantitativa. Com abrangência nacional, direciona-se à população brasileira residente com 5

anos e mais, alfabetizada ou não. Como instrumento de coleta de dados são realizadas entrevistas pessoais face a face

domiciliares, com utilização de questionário elaborado de acordo com os objetivos da pesquisa. 4Consideram-se livros em papel, livros digitais ou eletrônicos e áudio livros digitais, livros em braile e apostilas escolares,

excluindo-se manuais, catálogos, folhetos, revistas, gibis e jornais. 5Assim como observado nas edições anteriores da pesquisa, a maior parte dos brasileiros lê no domicílio, embora a leitura em

outros locais, sobretudo locais públicos e em trânsito, comece a ganhar importância, o que pode estar associado à leitura em

plataformas digitais (pela facilidade de armazenar e transportar os conteúdos em equipamentos que já estão incorporados ao

cotidiano dos indivíduos, principalmente o telefone celular). E é exatamente a população adulta a que mais lê nesses locais.

Já a população com renda mais alta lê mais em praticamente todos os locais pesquisados. (2016, p. 130).

17

Os resultados de 2015 reforçam uma tendência percebida desde 2007:

quanto maior a escolaridade e a renda, maior é o hábito de leitura de livros,

assim como também é maior entre aqueles que ainda são estudantes. Estes

últimos, sobretudo pela leitura de livros indicados pela escola, didáticos ou

literatura. (FAILLA, 2016, p. 69).

Percebe-se a partir dos dados que, embora a escola tenha uma relevância na indicação

de leituras, os gêneros conto e romance estão depois da Bíblia e dos livros religiosos, ou seja,

as escolhas pela leitura são provocadas por outras instituições, movidas por interesses

pessoais. Endossam essa percepção os títulos6 de livros, os autores mais citados e as

motivações para ler: por gosto ou interesse pessoal, por motivo religioso, por indicação da

escola.

Um aspecto importante quando se aborda a questão da formação do leitor refere-se ao

papel exercido pelas bibliotecas. Dessa forma, a pesquisa destaca as percepções dos

entrevistados em relação à biblioteca e seus usos. Para 71% dos entrevistados a biblioteca está

associada a um espaço para estudo e pesquisa. Ressalta-se no documento:

Outros usos e associações que esse espaço poderia ter, o que concorreria

para a ampliação de seu público frequentador, tiveram percentuais baixos de

menções. No entanto, ainda que a biblioteca seja vista como espaço do

estudante, e seja realmente mais frequentada por estudantes, 37% de seu

público é composto por não estudantes. (FAILLA, 2016, p. 111).

Em relação à frequência a bibliotecas, a pesquisa revela que, entre estudantes, 34%

não frequentam uma biblioteca e entre leitores esse percentual é de 51%. Certamente, a não

existência de bibliotecas públicas e escolares em muitos municípios e bairros e a limitação

dos acervos nas bibliotecas, associados a outros fatores, colaboram para gerar esses

percentuais. Pois, mesmo a despeito dos Programas de incentivo à leitura por meio da

distribuição de acervos de obras de literatura a exemplo do Programa Nacional Biblioteca da

Escola7 (PNBE) muitas escolas não possuem bibliotecas escolares e não têm acesso ainda a

obras de literatura.

Corroboramos com Fantinati e Ceccantini (2004, p. 50) a pequena consciência em

relação ao problema da falta de políticas institucionais de peso que promovam uma expansão

maciça de bibliotecas pelo país, a situação calamitosa da maior parte das bibliotecas

6Os gêneros mais citados são a Bíblia, Religiosos, Conto, Romance, Didáticos, Infantis, Histórias em quadrinhos, Poesia. 7O Programa Nacional Biblioteca da Escola – PNBE- foi instituído em 1997 e tem como principal objetivo democratizar o

acesso a obras de literatura infanto-juvenil, brasileiras e estrangeiras, e a materiais de pesquisa e referência a professores e

alunos das escolas públicas brasileiras. O programa é executado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação –

FNDE- em parceria com a Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação-SEB/MEC.

18

existentes, o quase inexistente investimento em formação de recursos humanos especializados

(bibliotecários e animadores culturais) e a bibliografia bastante escassa sobre o assunto.

Retratos de Leitura no Brasil evidencia, assim, uma realidade já percebida por nós que

trabalhamos em educação: ainda lemos pouco; a leitura ainda está atrelada à escola; as

bibliotecas, enquanto espaços de leitura são pouco frequentadas8 e não se atualizam em

relação aos acervos e projetos de leitura. No entanto, a pesquisa desmistifica crenças

comumente disseminadas de que os jovens não leem. Do contingente de jovens entrevistados,

a pesquisa informa que 84% daqueles que têm de 11 a 13 anos se declararam leitores,

enquanto 75% dos jovens em faixa etária entre os 14 e os 17 anos podem ser enquadrados, de

acordo com os critérios da pesquisa, igualmente, como leitores. Pode-se ver que estes

percentuais estão bastante acima dos 56% apontados pela pesquisa como o percentual de

leitores da população brasileira como um todo.

Essas constatações ratificam a importância de estudos sobre leitura como

possibilidades de inserção social e cultural e a necessidade de se pensar, de forma crítica e

inovadora, a formação de leitores. Assim, inscrevemos essa pesquisa na perspectiva do

letramento literário, entendendo-o como proposição de novos caminhos para a leitura de

literatura.

Corroborando o pensamento de Hélder Pinheiro (2011), entendemos que há diferenças

significativas entre fazer uma pesquisa em literatura, em ciências sociais ou em linguística. A

primeira diferença está no objeto e no modo como tratá-lo. Assim, dada a complexidade e o

caráter plural do objeto pesquisado, a produção do conhecimento nesta área requer uma

compreensão epistemológica que privilegie a dinâmica e a criticidade. Partimos, portanto, da

perspectivava de abordagem qualitativa com caráter descritivo, de cunho exploratório.

Utilizamos a pesquisa bibliográfica e a análise documental. Segundo Bravo (1991), são

documentadas todas as realizações produzidas pelo homem que se mostram como indícios de

sua ação e que podem revelar suas ideias, opiniões e formas de atuar e de viver.

Para a análise documental elegemos o documento Gestão Pedagógica da Rede de

Ensino, publicação do ICEP, com o objetivo de compreender a proposta de ação do Instituto

Chapada de Educação e Pesquisa (ICEP) – instituição que desenvolve a formação continuada

nos municípios e implementa o Projeto Institucional de Leitura (PIL); os Planos de Formação

dos Coordenadores Pedagógicos do município; as Pautas Formativas da supervisão

8Apesar de 55% dos entrevistados informarem que sabem da existência de uma biblioteca em sua cidade ou seu bairro (esse

número era maior em 2011 (67%), 66% não frequentam bibliotecas ou frequentam raramente (14%). Somente 5% da

população frequenta sempre, e 15%, às vezes. A biblioteca mais visitada por quem frequenta sempre ou às vezes (55% de

20% dos entrevistados) é a escolar, seguida da pública (51%).

19

pedagógica e os Projetos de Leitura implementados na rede escolar municipal, intentando

compreender, a partir de seus elementos constitutivos, as concepções de leitura e literatura

que fundamentam o PIL. A análise desses documentos objetivou, ainda, entender os tempos

institucionais destinados à leitura nos espaços de formação pedagógica dos coordenadores e

professores e nas unidades escolares em que o projeto se desenvolve; as escolhas que

motivaram as leituras realizadas e o processo de mediação pedagógica proposto pelo PIL.

Os documentos elencados como corpus deste estudo foram analisados a partir dos

referenciais teóricos que fundamentam essa dissertação. Assim, num movimento de reflexão

crítica fomos dialogando com o PIL em sua constituição e proposta de ação, por vezes,

questionando e confrontando-o, no intento de entendermos de que forma as práticas de leitura

desenvolvidas a partir do PIL têm fomentado o letramento literário na rede municipal de

educação.

A dissertação está organizada em cinco seções a partir dessa introdução: Na Segunda

Seção “Onde foi parar o amor aos livros e à Literatura?” realiza-se uma abordagem da leitura

de literatura como prática cultural e experiência estética que provoca o desenvolvimento

humano e como desafio e compromisso da escola de garantir àqueles que não têm acesso a

outros espaços uma aproximação com a arte literária. Fundamentamos nossa discussão em

Cândido (2012) para quem a literatura tem um papel humanizador, portanto, precisa ser vista

como um direito básico do ser humano. Segundo o autor, sendo instrumento poderoso de

instrução e educação a literatura é proposta como equipamento intelectual e afetivo. Sublinha

ele:

Os valores que a sociedade preconiza, ou os que considera prejudicais, estão

presentes nas diversas manifestações da ficção, da poesia e da ação

dramática. A literatura confirma e nega, propõe e denuncia, apoia e combate,

fornecendo a possibilidade de vivermos dialeticamente os problemas.

(CÂNDIDO, 2012, p. 113).

Dessa forma, a luta pelos direitos humanos pressupõe a fruição da arte e da literatura

em todas as modalidades e em todos os níveis como um direito inalienável (CÂNDIDO, 2012,

p. 126). Discutimos nesta seção o lugar ainda não ocupado pela leitura na política pública

local, nas práticas pedagógicas e nas propostas curriculares. A frase que nomeia a seção

rememora a fala de uma figura ilustre da cidade conhecido por todos como mestre Paulo de

Olinda, um leitor apaixonado por livros e Literatura, que durante quarenta anos dedicou-se a

cuidar da biblioteca municipal como bibliotecário e promotor de leituras entre os jovens e

frequentadores da biblioteca e que foi afastado do seu ofício porque a prefeitura já não tinha

20

condições de manter a ajuda de custo de oitenta reais ao mês. Articulo sua fala-desabafo – “O

prefeito não tem amor aos livros, não tem amor à Literatura!” – à discussão do lugar ainda

não ocupado pela leitura, pela Literatura, pela arte de um modo geral; seja nas políticas

públicas, nas propostas pedagógicas e curriculares e nos cursos de formação de professores.

Na terceira seção “A Tessitura do Projeto Institucional de Leitura” apresentamos o

Instituto Chapada de Educação e Pesquisa (ICEP), buscando compreender o contexto político

educacional em que se insere como proposta política de formação docente e instituição

implementadora do PIL. Analisamos a proposta de ação do Instituto nos municípios parceiros

da rede Chapada subsidiando nossa análise nos documento norteadores do ICEP e sua

inserção no contexto das políticas de formação continuada. Assim, discutimos essas

propostas, fomentadas a partir das políticas públicas neoliberais, buscando as contribuições

teórico-críticas de Oliveira (2007), Antônio Nóvoa (1999) e Gatti (2008).

Na quarta seção intitulada “Desenrolando os Fios do PIL”, descrevemos o

funcionamento do Projeto Institucional de Leitura, as escolhas de leitura feitas a partir do PIL;

o processo de seleção dos textos e de mediação através da análise dos documentos

norteadores do projeto. Enfim, desenrolamos os fios do projeto para compreender de que

forma essas práticas de leitura se configuram em letramento literário e como se inscrevem no

contexto do ensino fundamental do município. As análises orientam-se pelas contribuições

teóricas sobre letramento e leitura de literatura de Soares (2010), Cosson (2012), Yunes

(2003), Kleiman (1995), Lajolo (1993) e Colomer (2007).

Na quinta seção “A Tessitura de uma Rede Leitora: estruturação e funcionamento do

PIL em Pindobaçu”, descrevemos a estrutura e funcionamento do PIL na rede municipal,

discorremos sobre as práticas de leitura implementadas a partir do projeto e, mediados pelas

considerações de Cosson (2012) e Lerner (2002), analisamos três pautas formativas da

supervisão pedagógica e dois projetos de leitura implementados na rede municipal de

educação desde o ano de 2014.

Por fim, tecemos algumas considerações sobre esse movimento de fiação literária

desenvolvido via PIL, elencando os pontos vulneráveis do projeto e os pontos positivos que

delineiam caminhos para o letramento literário na realidade local. O intento orienta-se na

perspectiva de que as provocações suscitadas pelo presente estudo possam imprimir alguma

contribuição para que projetos como esse se concretizem como propostas efetivas de leitura

da literatura.

21

2 ONDE FOI PARAR O “AMOR” AOS LIVROS E À LITERATURA?

Os livros são objetos transcendentes

Mas podemos amá-los do amortáctil

Que votamos aos maços de cigarro

Domá-los, cultivá-los em aquários

Em estantes, gaiolas, em fogueiras

Ou lançá-los pra fora das janelas

(Caetano Veloso, Livro, 2004)

Um pouso de tropeiros deu origem ao município de Pindobaçu. Situado no Centro

Norte baiano, era o local em que os viajantes das tropas de animais de carga paravam para

descansar. O principal itinerário da viagem era o caminho que ligava a antiga Vila Nova da

Rainha (atual cidade de Senhor do Bonfim) à vila velha de Jacobina. Inicialmente

denominado Lamarão, por causa da grande umidade e lama existente no local, o lugar onde

repousavam os tropeiros viajantes que se deslocavam de Senhor do Bonfim para Jacobina, foi

batizado, posteriormente, de Pindobassu, palavra indígena do Tupy Guarani que significa

palmeira grande, palmeira alta. Nome atribuído através de um plebiscito por causa da grande

quantidade de palmeiras de babaçu na região. Mais tarde convencionou-se a grafia para

Pindobaçu.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2016), o

município tem uma população de 21.191 habitantes. Foi criado o distrito pela Lei Estadual nº

2.041, de 21 de agosto de 1927 e elevado à categoria de vila pelo decreto lei estadual nº

10.724, de 30 de março de 1938. A povoação permaneceu com o nome de Lamarão até o ano

de 1914. Pela lei estadual nº 542 de 04 de março de 1953 foi criado o município de

Pindobaçu, sendo seu território desmembrado do município de Campo Formoso.

O bioma é, principalmente, a caatinga. Sua sede está a 448 km da capital baiana.

Possui vários acidentes geográficos sendo os mais destacados as cachoeiras da Fumaça, a dos

Apertados e a do Poço Pelado; os rios Aipim, Itapiruçu-Açu, Capivara, Lamarão e o rio da

Fumaça.

Situado entre as cidades de Senhor do Bonfim e Jacobina, municípios que se

destacam economicamente na microrregião, Pindobaçu não apresenta as mesmas

características socioeconômicas e a população é extremamente carente. A base econômica do

município é a agricultura, a pecuária e o garimpo de esmeralda. Um dos maiores garimpos de

extração de esmeraldas do Brasil está situado no distrito de Carnaíba; a região é conhecida

pela produção significativa do mineral, embora toda produção do minério seja escoada para

fora do município.

22

Pindobaçu é uma das cidades que compõem o Território de Identidade Piemonte do

Itapicuru9. Segundo a Secretaria de Planejamento da Bahia, os Territórios de Identidade da

Bahia foram reconhecidos como divisão territorial oficial de planejamento das políticas

públicas do Estado da Bahia em 2010, compõem-se atualmente de 27 territórios10 de

identidade.

Figura 1- Território de Identidade Piemonte Norte do Itapicuru

Fonte: https://territoriosculturaisbahia.wordpress.com/divisao-territorial.

A região onde se situa o município de Pindobaçu é uma das áreas mais irrigadas do

polígono da Seca, sendo comparado a um oásis, com rios, lagos, fontes, lagos artificiais,

riachos e cachoeiras. Pindobaçu destaca-se no cenário da microrregião tanto pelas festas

culturais tradicionais, como a dos ternos de reis e a festa do padroeiro, quanto pelas belezas

naturais de suas serras, cachoeiras e barragens.

Em relação ao sistema de ensino, destacam-se os seguintes dados: segundo o Censo de

2015 (INEP, 2015), a rede municipal de Pindobaçu possui 40 escolas para o atendimento de

5.232 alunos. Desse total, 615 estão matriculados na creche, 630 em pré-escolas, 1.950

9O Território de Identidade Piemonte Norte do Itapicuru possui extensão total de 14,1 mil quilômetros quadrados e população

de 261,9 mil habitantes, segundo o Censo 2010 do IBGE. É composto por nove municípios: Andorinha, Antônio Gonçalves,

Caldeirão Grande, Campo Formoso, Filadélfia, Jaguarari, Pindobaçu, Ponto Novo e Senhor do Bonfim. O bioma

predominante nos nove municípios do território é a Caatinga. Os climas registrados são o tropical semiárido e o subúmido a

seco. As precipitações pluviométricas tendem a acontecer entre a primavera e o verão, com quantidade de chuva variando

anualmente entre 500mm e 800mm. (IBGE, 2010). 10O “território é conceituado como um espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, caracterizado por

critérios multidimensionais, tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições, e uma

população com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos

específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade, coesão social, cultural e territorial”.

Dados do Ministério do Desenvolvimento Agrário – MDA. (BRASIL, 2003, p. 4).

23

estudantes nos anos iniciais, 1.403 nos anos finais e 634 são alunos da Educação de Jovens e

Adultos. Em relação à infraestrutura 95% das escolas fornecem alimentação e 100% água

filtrada. Apenas uma escola possui uma pequena biblioteca, e duas escolas (5% do total)

possuem espaço designado como sala de leitura. Pelo menos 40% das escolas estão equipadas

com televisão, aparelho de DVD e máquina copiadora. Sendo que apenas 33% têm acesso a

internet. Em relação ao rendimento escolar11, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas

(INEP, 2015) registra que nos anos iniciais a taxa de reprovação é de 6,9%, o abandono 3,5%

e a aprovação 89,6%; nos anos finais o índice de reprovação sobe para 13,6%, o de abandono

4,6% e a aprovação é de 81,8%. A rede estadual é representada por uma escola com 501

alunos matriculados no Ensino Médio.

O IDEB12 2015 nos anos iniciais da rede municipal teve como média 4,5,

demonstrando crescimento em relação aos anos anteriores, atingiu a meta projetada de 3,7,

mas não alcançou 6,0. Nos anos finais o IDEB foi 3,7 não atingiu a meta projetada para o

município de 4,1 e não alcançou 6,0 – meta idealizada pelo Ministério da Educação.

No ano de 2009, o município, através da Secretaria Municipal de Educação, aderiu ao

Projeto Chapada de Educação, hoje denominado Instituto Chapada de educação (ICEP)13. A

partir desta parceria o município fez uma modificação no organograma da secretaria de

educação, reestruturando a rede municipal de educação. A estruturação organizacional da rede

municipal de educação referencia-se, portanto, nos moldes de organização funcional

sugeridos pelo ICEP. Os Secretários de Educação foram orientados a designar uma equipe

técnica, responsável pela gestão pedagógica da rede municipal de ensino. A proposta é formar

uma equipe composta por um Diretor Pedagógico e pelos Supervisores Técnicos, um para

cada segmento de ensino. Pressupõe-se que esta formatação viabilize as ações formativas,

articulando os segmentos de ensino e promovendo uma melhor articulação e estruturação da

rede.

11Ao final de um ano letivo, alunos matriculados em escolas públicas brasileiras podem ser aprovados, reprovados ou

abandonar os estudos. A soma da quantidade de alunos que se encontram em cada uma dessas situações constitui a Taxa de

Rendimento: Aprovação + Reprovação + Abandono = 100%.

12O IDEB é calculado com base no aprendizado dos alunos em português e matemática (Prova Brasil) e no fluxo escolar (taxa

de aprovação). 13O Instituto Chapada de Educação e Pesquisa (ICEP) é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, fundada

em 2006, com o objetivo declarado de proporcionar uma formação continuada de coordenadores pedagógicos e ações em prol

da melhoria da educação pública em algumas regiões do estado da Bahia. Atualmente o instituto conta com o apoio

do Instituto Natura (Programa Crer para Ver) , do Itaú BBA , do Instituto Península , Concessionária Rota dos Coqueiros (da

empresa Odebrecht) , da Ashoka , do Programa de Formação Continuada de Gestores de Educação Básica (PROGED) , além

dos 19 municípios parceiros.

24

2.1 A CIDADE, UM CONTEXTO E O PROJETO DE LEITURA

Pindobaçu possui poucas opções de lazer e entretenimento. A cidade não possui

teatro, cinema, banca de revistas e nem livraria. Os espaços e acesso a determinados bens da

cultura letrada são, portanto, bastante limitados.

A cidade possuía uma biblioteca municipal cujo acervo era constituído basicamente de

livros doados por moradores e por instituições sociais como Rotary e Lions Club. Este espaço

era utilizado pelos alunos da cidade para realização de pesquisas em enciclopédias, periódicos

e livros em geral. A biblioteca municipal cumpria ainda o papel de clube do livro, pois os

moradores leitores tomavam livros emprestados para leitura.

Cresci visitando este espaço e esta vivência proporcionou-me o contato com diversos

autores e obras literárias. Acompanhava minha avó para renovação de livros que eram

tomados de empréstimo, devolução ou para aquisição de novos títulos. Ali trocavam-se

livros, impressões e sugestões de leituras. A biblioteca tinha público cativo e frequentadores

assíduos. O responsável pela biblioteca era o Sr. Paulo de Olinda, o mestre Paulo, como era

conhecido. Filho de Olinda – PE, mestre Paulo, fixou residência em Pindobaçu, constituindo

família e assumindo algumas funções na comunidade. Vereador, professor, radialista e, por

seu interesse e dedicação aos livros, assumiu a função de bibliotecário14. Função esta que

exerceu por mais de quarenta anos conquistando o reconhecimento de toda a comunidade

pelos serviços prestados à biblioteca municipal. Em 2008, Mestre Paulo foi destituído da

função e a biblioteca municipal fechada, desativada, sob alegação do prefeito em exercício de

que o pagamento destinado ao seu ofício de bibliotecário onerava a prefeitura.

Posteriormente, o gestor seguinte, por sua vez, entendeu que o prédio ocupado pela

biblioteca municipal também representava ônus para o município. O espaço físico onde

funcionava a biblioteca foi então reformado para abrigar a extensão do curso de Pedagogia da

Universidade do Estado da Bahia Programa de Formação Continuada de Professores

PARFOR15/UNEB, campus de Senhor do Bonfim, município vizinho de Pindobaçu. Os livros

que constituíam o acervo da biblioteca ficaram à deriva no pátio e alguns destes foram

empilhados em caixas e deixados nas escolas, na secretaria municipal de educação, e outros

14Na verdade, o termo bibliófilo seria mais adequado, uma vez que Seu Paulo não tinha formação como bibliotecário, mas

amor e dedicação aos livros, amava-os do amor táctil de que fala Caetano Veloso. 15Plano Nacional de Formação de Professores destinado aos professores da rede pública da Educação Básica em exercício

sem formação adequada à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96. Importante salientar que o Plano

Nacional de Formação de Professores é implementado a partir da exigência da LDB dentro do contexto de um projeto

hegemônico das políticas públicas neoliberais.

25

jogados no lixo ou queimados. Algo parecido com o que Jorge Luis Borges (apud PETIT,

2010) dizia sobre a verdadeira função dos monarcas que era construir fortificações e incendiar

bibliotecas.

Impressiona que atitudes de tamanho desatino parecessem naturais à comunidade. O

fechamento da biblioteca e o fim dado aos livros não provocaram nenhuma manifestação ou

indignação dos moradores, muito menos dos governos municipais que assumiram a gestão

municipal posteriormente. Passadas quatro gestões diferentes, desde que houve o fechamento

da biblioteca, nenhum dos gestores manifestou interesse em restituir a biblioteca à

comunidade. O zelo e o cuidado do mestre Paulo para com os livros, a dedicação com o

espaço de leitura e a paciência em restaurar páginas e capas de muitos dos livros, já

danificados pelo manuseio e pelo tempo, e “o amor aos livros” jazem junto com ele.

A situação não seria tão grave se não fosse o fato de que, somado a esta ausência de

biblioteca16, a cidade não dispõe de banca de revistas e jornais17, livraria, cinema ou teatro e

fica distanciada de centros urbanos maiores. O que implica num distanciamento da cultura

letrada e em um acesso limitado a determinados bens culturais, dessa forma, há uma

dificuldade de acesso a certos espaços culturais que poderiam promover uma aproximação

maior com a arte e ampliar as experiências estéticas dos moradores.

Acrescenta-se ainda o fato de não existir no município iniciativas de ordem privada ou

por parte da gestão municipal de incentivo à leitura, a apresentações culturais, teatrais ou

sessões de cinema para a comunidade local. Obviamente, existem manifestações outras da

cultura local que constituem o patrimônio cultural do município, no entanto, reivindicamos

aqui a participação dos cidadãos pindobaçuenses também, nas demais experiências estéticas,

dentre elas, a leitura e o acesso aos livros impressos.

É a partir deste contexto político-social da cidade de Pindobaçu que pensamos na

relevância de projetos que aludem à arte, ao acesso a bens culturais não disponibilizados na

realidade local.

16Segundo último levantamento do Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas (SESP) atualizado em abril de 2015, a Bahia

possui cerca de 442 bibliotecas públicas municipais distribuídas nos 417 municípios. Ressaltamos, porém, que nos

municípios da microrregião onde estamos inseridos a maioria não dispõe de bibliotecas públicas. E as poucas que existem

mantém-se pela doação de livros, normalmente usados, realizada pelas comunidades locais. Assim, o que constatamos a

partir dessa consulta ao SESP é que ali são elencados nomes de espaços que já funcionaram ou intentaram funcionar em

algum momento mas, que não corresponde a bibliotecas de fato. O município de Pindobaçu inclusive consta nesta lista dos

municípios que possui biblioteca, no entanto, a cidade não tem nenhum espaço que possa ser denominado Biblioteca desde o

ano de 2008. 17O único jornal que circulava na cidade era o jornal A Tarde do qual seu Paulo de Olinda era assinante e representante de um

grupo de 15 pessoas a quem ele entregava diariamente as edições. O jornal vinha pela empresa de ônibus São Luiz que faz a

linha Senhor do Bonfim a Jacobina; era recebido por ele em um dos pontos de ônibus da cidade e repassado aos leitores. Hoje

Pindobaçu não recebe nenhum jornal, não tem banca de revista e a assinatura de determinadas publicações como a Folha de

são Paulo, por exemplo, é inviável, pois a cidade não faz parte do perímetro de distribuição.

26

E entendemos que, mesmo vivendo em uma sociedade pós-literária18, o contexto em

que estamos inseridos está tão aquém do desejável que, enquanto a maioria reivindica acesso

às novas tecnologias, ainda não garantimos sequer o direito ao livro impresso. Estamos tão

distantes deste bem cultural que em muitas escolas municipais turmas completas, de 30 alunos

ou mais, não recebem o livro didático por causa da discrepância entre o número de alunos

matriculados e os dados do MEC19.

Compartilhamos, assim, da fala de Antônio Cândido (2012) de que pensar em direitos

humanos passa pelo pressuposto de reconhecer que aquilo que consideramos indispensável

para nós é também indispensável para o próximo, como o direito aos bens incompressíveis,

ampliando inclusive a compreensão do que sejam esses bens. Destaca o autor:

São bens incompressíveis não apenas os que asseguram a sobrevivência

física em níveis decentes, mas os que garantem a integridade espiritual. São

incompressíveis certamente a alimentação, a moradia o vestuário, a

instrução, a saúde, a liberdade individual, o amparo da justiça pública, a

resistência à opressão etc.; e também o direito à crença, à opinião, ao lazer e,

por que não, à arte e à literatura. (CÂNDIDO, 2012, p. 22).

Essa compreensão de Antônio Cândido (2012) nos instiga a pensar sobre as

necessidades básicas que temos como seres humanos. Embora façamos parte de uma

sociedade marcada pelas desigualdades socioeconômicas e pelas exclusões de diversas ordens

em que a maioria dos direitos básicos são negados a uma grande parcela da população,

queremos comungar do entendimento de que não só o direito aos bens materiais básicos

precisa ser garantido, uma vez que só eles não satisfazem as necessidades essenciais do ser

humano, como também aqueles que estão na dimensão intelectual, artística e espiritual. Assim

é que para o autor citado a igualdade entre os sujeitos sociais e a necessidade da existência de

leis que assegurem essa igualdade configuram-se nesse cenário de bens incompressíveis.

Endossando essa reivindicação, Michèle Petit (2009) afirma que não é um luxo pensar

a própria vida com a ajuda de obras de ficção ou de testemunhos que tocam no mais profundo

da experiência humana. Diz ela: “(...) parece-me inclusive que seja um direito elementar, uma

questão de dignidade”. (PETIT, 2009, p. 78). Comungando também desse entendimento da

literatura enquanto experiência do humano, Tzvetan Todorov (2012) assinala o seguinte:

18A tese de Peter Sloterdijk, apresentada na primeira parte do livro Regras para o Parque Humano em advoga que o projeto

humanista de formação do homo humanus mediante a cultura literária – que tinha em vista, principalmente, o refreamento

das tendências “desenibidoras” (enthemmenden) do ser humano, responsáveis pelos diversos tipos de barbárie –

desmantelou-se, de modo que é possível caracterizar a hodierna sociedade de massas, lastreada em mídias contemporâneas,

tais como a radiodifusão, televisão e internet, como pós-humanista (post-humanistich) ou pós-literária (post-literarisch). 19O livro didático é distribuído de acordo com o censo do ano anterior. Dessa forma muitos alunos ficam sem o livro durante

todo o ano letivo.

27

Mais densa e mais eloquente que a vida cotidiana, mas não radicalmente

diferente, a literatura amplia o nosso universo, incita-nos a imaginar outras

maneiras de concebê-lo e organizá-lo. Somos todos feitos do que outros

seres humanos nos dão: primeiro nossos pais, depois aqueles que nos

cercam; a literatura abre ao infinito essa possiblidade de interação com os

outros e, por isso, nos enriquece infinitamente. Ela nos proporciona

sensações insubstituíveis que fazem o mundo real se tornar mais pleno de

sentido e mais belo. Longe de ser um simples entretenimento, uma distração

reservada às pessoas educadas, ela permite que cada um responda melhor à

sua vocação de ser humano. (TODOROV, 2012, p. 23-24).

Pensamos, portanto, que em lugares longínquos como o nosso, em que as experiências

estéticas são limitadas e usufruídas somente por aqueles que possuindo recursos materiais

podem deslocar-se a outros lugares e ter acesso a outros espaços culturais (pois, enquanto

possuidores de capital material tornam-se detentores de capital intelectual) a escola

desempenha um papel relevante na aproximação com o universo literário. Seja pela

propagação do conhecimento, de forma particular, o estético, seja como possibilidade de

acesso a outros bens culturais. Como bem pontua Petit (2009):

A pobreza material é temível porque priva a pessoa não apenas dos bens de

consumo que tornam a vida menos dura, mais fácil, mais agradável; não

apenas dos meios de proteger a própria intimidade; mas também dos bens

culturais que conferem dignidade, compreensão de si mesmo e do mundo,

poesia; e priva ainda das trocas que são realizadas em torno desses bens. A

pobreza impede de participar em uma sociedade, de estar ligado ao mundo

através do que produziram aqueles que o integram: esses objetos culturais

que circulam e desembocam em outros círculos diferentes do parentesco ou

do bairro, que são o espaço do íntimo e do que se compartilha para além das

fronteiras do espaço familiar. (PÉTIT, 2009, p. 42).

Daí entendermos que a democratização do conhecimento artístico-literário possibilita

a ampliação dos direitos humanos. Pois, pela singularidade da experiência artística dá-se a

ampliação dos universos habitados, a superação das limitações físicas e intelectuais instituídas

e, inclusive, a imersão nas brenhas do imaginário.

Do lugar onde estamos podemos vislumbrar lugares outros, novas possibilidades de

percepção que signifiquem nosso estar no mundo, provocando-nos, principalmente,

humanizando-nos. Conforme Marilena Chauí (2000), “a arte inventa um mundo de cores,

formas, volumes, massas, sons, gestos, texturas, ritmos, palavras, para nos dar a conhecer

nosso próprio mundo”. (CHAUÍ, 2000, p. 325).

Assim como o mito e a ciência são modos de organização da experiência humana,

também a arte vai aparecer no mundo humano como forma de organização, como modo de

transformar a experiência vivida em objeto de conhecimento. (ARANHA, 1993, p. 345).

28

Negar esta forma de conhecimento é negar o direito de humanização20 do homem e de

participação plena. Em Uma História da Leitura, Alberto Manguel (1996), referindo-se às

limitações materiais impostos pela realidade, afirma:

a dicotomia artificial entre vida e leitura é ativamente estimulada pelos

donos do poder. Os regimes populares exigem que esqueçamos e, portanto,

classificam os livros com os luxos supérfluos; os regimes totalitários exigem

que não pensemos e, portanto, proíbem, ameaçam e censuram; ambos, de um

modo geral, exigem que nos tornemos estúpidos e aceitemos nossa

degradação docilmente, e, portanto, estimulam o consumo de mingau.

Nessas circunstâncias, os leitores não podem deixar de ser subversivos.

(MANGUEL, 1996, p. 22).

A leitura, portanto, não só nos humaniza como nos conscientiza e instiga a reivindicar

por nossos direitos como necessidades básicas da condição de humanização do ser.

Reivindicar pelo acesso e direito à leitura é, pois, impreterível ao exercício da fantasia, da

autoafirmação, da subjetividade, da criatividade; ao enveredamento pelas brenhas do

conhecimento. Impreterível a nossa interação com a realidade, com os diversos mundos

expressos na leitura, impreterível ao complexo exercício de ser e viver plenamente.

Dessa forma, o processo de leitura dá-se de forma inter-relacionado e, para tanto,

autor, obra, leitor e mediador estão interligados como constituintes de uma mesma unidade

orgânica. Segundo Chantal Horrellou-Lafarge e Monique Segré (2010), a leitura é um

processo que alterna liberdade, criação e coerção. Liberdade, porque o texto é sempre em

parte inacabado e aberto; criação, porque suscita o trabalho imaginário do leitor e a

cooperação ativa; coerção, posto que o texto se emoldura em pontos de ancoragem que

induzem à compreensão.

Conforme pontua Chartier (2011, p. 20), cada leitor, a partir de suas próprias

referências, individuais ou sociais, históricas ou existenciais, dá um sentido mais ou menos

singular, mais ou menos partilhado, aos textos de que se apropria. Dessa forma, os estudos

sociológicos reconhecem a pluralidade de textos e de práticas de leitura historicamente

contextualizadas numa relação dialógica com os leitores e as demandas sociais. O

reconhecimento da leitura enquanto pluralidade, proporciona a vantagem de romper com a

ideia monolítica e homogênea que se tem comumente do seu processo, dado como natural e

espontâneo. (CHARTIER, 2011).

20Buscamos a conceituação de Cândido (2012, p. 29) de que humanização é o processo que confirma no homem aqueles

traços que reputamos essenciais, como o exercício da reflexão, a aquisição do saber, a boa disposição para com o próximo, o

afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos problemas da vida, senso da beleza, a percepção da complexidade do

mundo e dos seres, o cultivo do humor.

29

Entendendo que a aproximação afetiva e cultural com textos e obras se configura

como democratização do conhecimento artístico-literário, enfatizamos o lugar que cabe à

literatura e à leitura de literatura. Compete, portanto, à escola a responsabilidade social de

propiciar tempos/espaços de democratização desses saberes uma vez que, para a maioria dos

estudantes, a escola se constitui no único espaço que possibilita o contato com textos e obras

artístico-literárias. Pois, como assinala Aranha (1993): “a educação em arte só pode propor

um caminho: o da convivência com as obras de arte”. (ARANHA, 1993, p. 347).

Somente pelo acesso e convivência com os bens culturais podemos experienciar a

sensibilidade estética, através das diversas expressividades humanas. A experiência estética

promove o conhecimento do outro, o autoconhecimento, o deleite, acorda o imaginário,

suscita emoções e sentimentos que afloram nossa essência humana. Negar essa experiência é

negar o direito basilar à nossa dignidade.

Segundo Cândido (1972), a arte e, portanto, a literatura, é uma transposição do real

para o ilusório por meio de uma estilização formal da linguagem, que propõe um tipo

arbitrário de ordem para as coisas, os seres, os sentimentos. Corroborando com este

pensamento, Cosson (2012) destaca o seguinte:

[...] a prática da literatura seja pela leitura, seja pela escritura, consiste em

uma exploração das potencialidades da linguagem, da palavra e da escrita,

que não tem paralelo em outra atividade humana. É no exercício da leitura e

da escrita de textos literários que se desvela a arbitrariedade das regras

impostas pelos discursos padronizados da sociedade letrada e se constrói um

modo próprio de se fazer dono da linguagem que, sendo minha é também de

todos. Isso ocorre porque a literatura é plena de saberes sobre o homem e o

mundo. (COSSON, 2012, p. 16).

A experiência da literatura é, pois, necessária à nossa constituição humana, como

experiência de elaboração simbólica, emocional e cultural. Conforme Cândido (2012), a

literatura constitui uma forma de conhecimento singular do mundo e dos homens e se a vida

de cada um corresponde a um esforço persistente de conhecimento, superação e libertação,

caberá sempre à literatura um lugar de relevo.

Sabemos da dificuldade de definir ou mesmo conceituar literatura sob risco iminente

de limitarmos a amplitude e complexidade inerente a esse vocábulo, como diz Lajolo (1982,

p. 24) a poeira é muita quando se tenta definir literatura, liberdade, arte e congêneres.

Conforme Terry Eagleton (2003) discute em Teoria da literatura: uma introdução, muitas

têm sido as tentativas de se definir literatura. O autor, depois de analisar as muitas definições

que se esboçam através de um exercício de reflexão sobre os limites dessas conceituações,

30

afirma que os juízos de valor atribuídos à literatura não só são historicamente variáveis como

têm uma estreita relação com as ideologias sociais. E pontua: “(...) eles se referem não apenas

ao gosto particular, mas aos pressupostos pelos quais certos grupos exercem e mantêm o

poder sobre outros”. (EAGLETON, 2003, p. 17).

A literatura é, segundo Candido (2012),“todas as criações de toque poético, ficcional

ou dramático em todos os níveis de uma sociedade, em todos os tipos de cultura”

(CANDIDO, 2012, p. 179). Em consonância com Candido (2012), Cosson (2012) afirma que

“é por possuir essa função maior de tornar o mundo compreensível transformando sua

materialidade em palavras, cores, odores, sabores e formas intensamente humanas que a

literatura tem e precisa manter um lugar especial nas escolas”. (COSSON, 2012, p. 12).

Reivindicar um lugar para a literatura significa garantir uma aproximação com toda a

complexidade inerente à nossa condição humana:

Por isso é que nas nossas sociedades a literatura tem sido um instrumento

poderoso de instrução e educação, entrando nos currículos, sendo proposta a

cada um como equipamento intelectuaÌ e afetivo. Os valores que a sociedade

preconiza, ou os que considera prejudiciais, estão presentes nas diversas

manifestações da ficção, da poesia e da ação dramática. A literatura confirma

e nega, propõe e denuncia, apoia e combate, fornecendo a possibilidade de

vivermos dialeticamente os problemas. Por isso, é indispensável tanto a

literatura sancionada quanto a literatura proscrita; a que os poderes sugerem

e a que nasce dos movimentos de negação do estado de coisas predominante.

(CÂNDIDO, 2012, p. 24).

A literatura, portanto, se caracteriza como experiência complexa, provocativa.

Compreensão essa que se distancia de arte revestida de uma aura21 positiva, imutável e

intocável, uma vez que não é uma experiência inofensiva, tão somente edificante. Edifica,

eleva, mas, também desmorona, corrompe, transgride, rompe com o instituído, institui outras

percepções. Situa-nos no universo e na vida, funda outros universos, inscreve outras

possibilidades de vivências, faz o inesperado irromper-se.

A literatura duplica o mundo no sentido mais amplo que essa palavra pode encerrar: a

duplicação de homens e mulheres, de ideias, de cidades, de mitos, de deuses, dos sentimentos,

dos pecados, das virtudes. Não apenas duplica, duplica ao tempo em que promove o discurso,

o debate e o contraditório.22 Enfim, permite que nos reaproximemos da nossa natureza

humana. E sendo humanos estamos inseridos num tempo e num lugar, portanto, impregnados

21 Para Walter Benjamin, a aura é uma teia singular composta de elementos espaciais e temporais: a aparição única de uma

coisa distante, por mais perto que ela esteja. (BENJAMIN, 2012, p.184). 22 Lima, et al. (2012).

31

das questões que nos circundam; implicados com os outros e com o mundo. Em Teoria da

Literatura “Revisitada” Magaly Trindade Gonçalves e Zina Bellodi (2005, p. 36) afirmam

que a Literatura, desde seus primórdios, é uma resposta a impulsos extremamente humanos e

que só nela podem ser satisfeitos.

A função da literatura está ligada à complexidade da sua natureza ao tempo que é uma

construção de objetos autônomos como estrutura e significado; é uma forma de expressão,

isto é, manifesta emoções e a visão do mundo dos indivíduos e dos grupos; e é também uma

forma de conhecimento. (CÂNDIDO, 2012).

Assim, entendemos que a Literatura em conjunto com outros campos de

conhecimento, tece realidades outras, de inserção e ação do homem no mundo. Como destaca

Lajolo (2008):

É à literatura, como linguagem e instituição, que se confiam os diferentes

imaginários, as diferentes sensibilidades, valores e comportamentos através

dos quais uma sociedade expressa e discute, simbolicamente, seus impasses,

seus desejos, suas utopias. (LAJOLO, 2008, p. 106).

Entendemos, portanto, a prática de leitura como prática cultural, historicamente

situada e variável, conforme define Chartier (2011, p. 20), a leitura como apropriação,

invenção, produção de significados. As práticas de leitura estão, portanto, implicadas com as

questões sociais e culturais, memórias individuais e coletivas constituintes do sujeito. Dessa

forma, o ato de ler é sempre uma ação subjetiva, implicado com conexões múltiplas; político,

social e culturalmente condicionado. Como bem sublinha Freire (1989, p. 14) o ato de ler

implica sempre percepção crítica, interpretação e “reescrita” do lido.

Nesta mesma linha dialógica Yunes (2003) assinala que o ato de ler nos possibilita o

desvelamento do eu, do sujeito que somos, uma ação marcada pela forte presença da carga

pessoal de vida e de vivências que se desnudam ao demarcarmos o lugar de onde falamos. E

acrescenta: “Ler é realizar a experiência de se pensar pensando o mundo”.

A leitura de literatura está impregnada pela subjetividade, intencionalidades,

polissemias, dialogismo e intertextualidades inerentes à prática da leitura, enquanto prática

social, cultural e historicamente situada. Corroborando com tal compreensão Cruz (2012)

sinaliza:

O ensino pautado na leitura literária poderá afirmar-se enquanto dinâmica de

rituais que estimula ao processo cognitivo uma dada forma de estar, de ler e

de ver o mundo, como se esse mundo fosse mundo aberto em forma de livro.

Desse modo, o mundo livro é um mundo pronto a escrever-se e a ser escrito

no ato de leitura, considerando-se necessariamente que toda a leitura é

32

prática não- individual. Daí que a pluralidade do termo leitura seja a

expressão da sua ambiguidade conceptual, pois o ato de leitura é entre outras

coisas o ato de desvelamento do sujeito. (CRUZ, 2012, p. 66).

A leitura da palavra está impregnada dos sentidos do mundo, pois, a palavra lida está

prenhe do mundo que nos cerca, dos mundos que nos habitam, das experiências que tivemos

antes de decodificar os signos linguísticos. A palavra-mundo, a palavra-vida – significada,

sentida, vivenciada, transcendente.

Como assinala Todorov (2012), a literatura é pensamento e conhecimento do mundo

psíquico e social em que vivemos. Dessa forma, os cânones estéticos de produção e recepção

são colocados em questão. Isto significa que a historicização necessária aos estudos literários

está implicada com os códigos interpretativos por meio dos quais lemos o texto literário.

Assim como a cultura, a literatura é um campo aberto à contestação e à reapropriação.

Conforme pontua Cevasco (2003):

O próprio conceito do que é literatura é repensado, e o cânone, a lista das

obras consideradas grandes, é ampliado para incluir a produção silenciada,

de por exemplo, mulheres, negros e homossexuais. Do mesmo modo,

estudam-se gêneros populares – como as histórias de detetives e os romances

baratos vendidos em bancas de revista. A produção simbólica é estudada em

relação à formação sócio histórica. (CEVASCO, 2003, p. 114).

Ainda na esteira do pensamento de Todorov (2012), é importante atentarmos à sua

crítica sobre a imanência estruturalista, a qual, quando se pretende radical e exclusiva, afasta a

obra literária de toda relação possível que ela possa ter com o mundo, com o real, com a vida.

Isso significa que a obra literária está impregnada do mundo, do humano, de valores e

ideologias, implicada com a vida. E por causa disso nos aproximamos da obra literária. Para

Todorov (2012, p.76), o perigo que hoje ronda a literatura (...) é o de não mais participar da

formação cultural do indivíduo, do cidadão.

O conhecimento da literatura não é um fim em si, mas uma das vias régias que

conduzem à realização pessoal de cada um. O caminho tomado atualmente pelo ensino

literário, que dá as costas a este horizonte (...), arrisca-se a nos conduzir a um impasse – sem

falar que dificilmente poderá ter como consequência o amor pela literatura. (TODOROV,

2012, p. 33).

Se a leitura de literatura está ausente de muitas práticas escolares, se o contato com a

literatura se dá expressivamente por meio de aulas explicativas sobre datas e periodização,

não poderá haver aproximação com a obra literária uma vez que essa aproximação pressupõe

33

um contato, um envolvimento, um desfrute, uma exploração, uma provocação dos sentidos

que promovam, de fato, a experiência literária.

O processo de leitura é, portanto, um processo de constituição do sujeito, constituição

esta que se dá pelas relações significativas estabelecidas entre autor-texto-leitor e contexto,

pelas interações realizadas. Para Bethania Sampaio Corrêa Mariani (2005, p. 108), quando

falamos em leitura, estamos nos referindo a uma prática visceralmente impregnada de

linguagem, e quando falamos em leitor, estamos mobilizando uma concepção de sujeito que é,

simultaneamente, afetado por processos ideológicos e inconscientes.

Dessa forma, é que pensamos na reflexão de Iser (1996) de que a literatura se realiza

ou se concretiza somente pela leitura. É por meio da literatura que nos aproximamos das

experiências diversas, das questões humanas, de universos outros mediados pelos textos. É,

pois, em contato com a obra literária, desafiados por esta que nos acercamos do conhecimento

de nós mesmos ou do mundo como afirma Zila Letícia Goulart Pereira Rêgo (2006):

O contato com a Literatura resulta sempre num ganho para o leitor. Tanto

faz se ela confirma expectativas ou abala convicções. Fica invariavelmente

um saldo de conhecimento acerca de si mesmo e do mundo, uma perspectiva

inusitada ou uma forma diferente de ele se autoconceder e de interagir com a

realidade. (RÊGO, 2006, p. 210).

Esse contato com a literatura pode provocar-nos a sairmos dos lugares em que

firmamos crenças e expectativas, lançando-nos a terrenos movediços em que experimentamos

a possibilidade de crescimento intelectual, pessoal, cultural e emocional.

2.2 O LETRAMENTO LITERÁRIO COMO LASTRO PARA APRENDIZAGEM DA

LEITURA DE LITERATURA

Pensar o letramento coloca-se como um desafio que nos instiga a expandir nossas

reflexões sobre este processo tão em voga no momento e suas repercussões no contexto do

Projeto Institucional de Leitura (PIL). Fundamentados em Brian Street (1984)

compreendemos “o letramento em termos de práticas concretas e sociais, ou seja, as práticas

letradas como produtos da cultura, da história e dos discursos”. (STREET, 1984, p. 9),

implicado, portanto, com os contextos de produção e de recepção.

Se o conceito de letramento se define como “um conjunto de práticas sociais que usam

a escrita, enquanto sistema simbólico e enquanto tecnologia, em contextos específicos, para

objetivos específicos” (KLEIMAN, 1995; SOARES, 2010) a ampliação desse conceito

34

inclusive para o campo de estudos literários torna-se, sem dúvida, bastante pertinente. Daí a

necessidade de falar-se em letramentos dada a abrangência do termo.

Paulino e Cosson (2009) ratificam a dificuldade de definir de forma única e universal

o termo letramento e retomam os eixos de definição que, perpassando os diferentes momentos

históricos, continuam vigentes: o primeiro eixo de definição relacionado a literacy situa o

letramento no campo do domínio básico da escrita, designando assim a habilidade de ler e

escrever no sentido de alfabetização. O segundo eixo originado nas décadas de 1970 e 1980, o

letramento corresponde a “um conjunto de práticas sociais” mediado por textos escritos. E

enfatizam:

[...] nessa nova concepção, letramento não pode ser singular, mas sim um

plural, pois há tantos letramentos quanto as práticas sociais e os objetos que

enformam o uso da escrita na nossa sociedade letrada, como se observa no

uso do termo em expressões tais como letramento digital, letramento

financeiro ou letramento midiático, para indicar a competência de leitura e

interação social associada à escrita e até para além dela. (PAULINO;

COSSON, 2009, p. 67).

Segundo Kleiman (1995), os estudos do letramento partem de uma concepção de

leitura e de escrita como práticas discursivas, com múltiplas funções e inseparáveis dos

contextos em que se desenvolvem. Diversos tipos de saberes, valores, ideologias,

significados, recursos e tecnologias, entre eles os saberes estratégicos, precisam ser

mobilizados nas práticas de letramento. Pontua Roxane Rojo (2009):

O termo letramento busca recobrir os usos e práticas sociais de linguagem

que envolvem a escrita de uma ou de outra maneira, sejam eles valorizados

ou não valorizados, locais ou globais, recobrindo contextos sociais diversos

(família, igreja, trabalho, mídias, escola etc.), numa perspectiva sociológica,

antropológica e sociocultural. (ROJO, 2009, p. 98).

Dessa forma, letramento literário é o processo de apropriação da literatura enquanto

construção literária de sentidos. (PAULINO; COSSON, 2009). Para estes autores, algumas

considerações importantes estão inseridas nesta definição: a ideia de processo, de ação

contínua e não uma habilidade adquirida, e a ideia de apropriação no sentido de significar o

que recebe, tornar próprio e, apropriação da literatura como repertório cultural. Sublinham

eles: a adoção do conceito de letramento literário vem ao encontro da sempre reivindicada

leitura efetiva dos textos literários como requisito sine qua non para o acesso concreto e

frequente a obras literárias após ou durante o ensino escolar da literatura. (PAULINO;

COSSON, 2009, p. 67).

35

Entendemos, portanto, que a criação de espaços significativos de leitura e interação

com o texto literário promove a ampliação do letramento literário. Essa ampliação é

importante por propiciar uma experiência literária crítica e ampla através de um contato maior

com textos diversos sejam estes canônicos ou não. E esta experiência literária prolonga-se

para além dos espaços escolares, como experiência constitutiva do sujeito. Segundo Cosson

(2012):

[...] o letramento literário é diferente dos outros tipos de letramento porque a

literatura ocupa um lugar único em relação à linguagem, ou seja, cabe à

literatura “[...] tornar o mundo compreensível transformando a sua

materialidade em palavras de cores, odores, sabores e formas intensamente

humanas”. (COSSON, 2012, p. 17).

Há, pois, uma singularidade que caracteriza o letramento literário, fomenta nossa

constituição como sujeitos humanos atravessados por experiências diversas, oriundas das

muitas leituras das quais nos apropriamos ao longo de nossas trajetórias. Como bem assinala

Cosson (2012),

Operando com a liberdade da linguagem, dando palavras à liberdade

humana, a experiência da literatura proporciona uma forma singular,

diferenciada, de dar sentido ao mundo e a nós mesmos. É por isso que o

contato com a literatura é tão fundamental ao desenvolvimento do ser

humano. É por essa razão que concebemos o letramento literário como o

processo de apropriação da literatura enquanto construção literária de

sentidos. (COSSON, 2012, p. 70).

Assim, propomos a discussão sobre letramento literário como possibilidade, dentre

outras, do desenvolvimento humano e como desafio e compromisso da escola de garantir este

conhecimento àqueles que não têm acesso a outros espaços de aproximação com a arte, de

modo particular, com a arte literária.

Uma compreensão que se esboça é a de que espaços e projetos que possibilitem

aproximação e contato com diferentes bens culturais, incluindo-se aqueles da cultura letrada,

podem se constituir em propostas significativas para fomentar experiências estéticas que

promovam a formação humana, ampliem a vivência do prazer e da emoção e possibilitem o

acesso a uma gama de conhecimentos.

Pois, como salienta Cosson (2012), é justamente para ir além da simples leitura que o

letramento literário é fundamental no processo educativo. Na escola, a leitura literária tem a

função de nos ajudar a ler melhor. Nesse processo de formação, a partir da experiência leitora,

compreendemos que a leitura da palavra nos devolve a capacidade de ler o mundo como

36

afirma Freire (2009). Entendemos que as práticas de leitura podem fomentar a constituição de

leitores, fundar mundos, instigar a criticidade e promover educação literária.

37

3 A TESSITURA DO PROJETO INSTITUCIONAL DE LEITURA (PIL)

Não existe imparcialidade. Todos são orientados por

Uma base ideológica. A questão é: sua base ideológica

é inclusiva ou excludente?

(Paulo Freire)

Na tessitura do PIL está o Instituto Chapada de Educação (ICEP). O ICEP denomina-

se como uma associação civil sem fins econômicos (reconhecida como Organização da

Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP)23, fundada em 04 de dezembro de 2006, com

sede no distrito de Caeté-Açu, município de Palmeiras –Bahia. O trabalho do ICEP se

estende, atualmente, por seis Territórios de Identidade nos estados da Bahia – Chapada

Diamantina, Agreste Litoral, Pratigi e Salvador; em Pernambuco – Cabo de Santo Agostinho

e Jaboatão dos Guararapes; e em Alagoas – São Miguel dos Campos.

O Projeto Chapada atua na formação continuada de educadores em vinte redes

municipais no ensino fundamental na Região da Chapada Diamantina, desde 2000, em

parceria com as prefeituras, organizações não governamentais e com financiamento do

Programa Crer para Ver da empresa Natura e da Fundação Abrinq pelos Direitos das

Crianças. Em 2007, o Projeto Chapada24 deu origem ao Instituto Chapada de Educação e

Pesquisa (ICEP).

Importante ressaltarmos que a atual legislação brasileira possibilita que empresas

abatam o valor do Imposto de Renda – IR a pagar, fazendo doações dirigidas para projetos

sociais e dependendo da modalidade de doação, é possível, inclusive, diminuir o valor do

imposto final a ser pago. Criada em 1991 a Lei ficou conhecida pelo nome do secretário da

Cultura à época, Sérgio Paulo Rouanet e institui o Pronac (Programa Nacional de Apoio à

Cultura). Através de renúncia fiscal, empresas públicas, privadas e pessoas físicas podem

patrocinar projetos culturais e receberem o valor em forma de desconto no imposto de renda.

Ou seja, os cofres públicos deixam de receber parte daquele dinheiro em troca de um

patrocínio cultural, uma forma de “terceirizar” um repasse de recursos federais. É, portanto, a

partir do contexto dessa lei que se estrutura o Projeto Chapada, subsidiado pela empresa

Natura, pelo Banco Itaú e pela cadeia internacional de lojas de vestuário C&A.

23Organizações da sociedade civil que fazem parte do terceiro setor, ou seja, não governamentais. De acordo com a legislação

que regula as OSCIP, lei nº 9.790, de 23 de março de 1999, se uma OSCIP quiser ser reconhecida como tal precisa constar

em seu estatuto determinados pré-requisitos previstos e detalhados em lei. Esses serão analisados pelo Ministério da Justiça e,

caso aprovados, a organização passará a receber a qualificação.

38

O ICEP esboça em seus documentos a seguinte missão: melhorar a aprendizagem de

alunos da Educação Infantil e do Ensino Fundamental a partir da formação continuada aliada

à mobilização política em territórios colaborativos, da disseminação de conhecimentos e da

participação no debate político da educação. Configura-se como um arranjo cooperativo.

Segundo o ICEP, os Territórios são alicerçados em Redes Colaborativas que se definem como

espaços democráticos de participação, parceria e horizontalidade que buscam fortalecer o

coletivo considerando a identidade e autonomia de seus componentes.

A constituição do Território Colaborativo Chapada Diamantina (BA) teve como

premissa a Rede Colaborativa de Aprendizagem entre Municípios que é orientada para a

profissionalização dos educadores e gestores da educação, sendo essa a principal estratégia

meio para atingir a meta desse território colaborativo, que é ter 100% de estudantes até os 8

anos de idade lendo e produzindo textos.(ICEP, 2013).

Segundo o ICEP, a colaboração territorial estabelece um novo paradigma de

desenvolvimento local e otimiza o processo educacional, pois agrega as gestões municipais,

sociedade civil e suas comunidades educadoras; consolida o processo educacional como parte

de um contexto cultural e favorece a troca de experiências entre redes.

Na legislação em vigor constam os Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADE)

como uma experiência de política pública educacional, um instrumento de gestão pública para

a melhoria da qualidade social da educação. A ADE seria uma resposta, a partir de uma

perspectiva territorial, ao desafio de superar as desigualdades entre estados e municípios. De

acordo coma Resolução CNE/CEB nº 01 de 23 de janeiro de 2012 que dispõe sobre a

implementação do regime de colaboração, os Arranjos de Desenvolvimento da Educação, já

em curso em diferentes regiões, são experiências que aglutinam municípios territorialmente

próximos em uma rede colaborativa, cooperativa e que se constitui como Arranjo a partir de

um diagnóstico educacional territorial e priorização de ações educacionais.

De acordo com Neves, relator do parecer dos Arranjos de Desenvolvimento da

Educação (BRASIL, 2011), o objetivo central de um ADE é desenvolver uma metodologia

para apoiar municípios a alavancarem ações e indicadores educacionais, visando à melhoria

da qualidade da educação no âmbito local e regional e, ao mesmo tempo, promover o

fortalecimento do regime de colaboração. É a forma pela qual seus idealizadores entendem ser

possível “[...] assegurar o direito às duas primeiras etapas da Educação Básica (Educação

Infantil e Ensino Fundamental) de qualidade e a desenvolvê-la no espaço geográfico a eles

comum”. (BRASIL, 2011, p. 4).

39

Em sua configuração, os arranjos podem envolver atores das três esferas de governo

(União, Estados e municípios) e também da sociedade (setor privado, terceiro setor, sociedade

civil organizada etc.). A Constituição reconhece três tipos de arranjos intermunicipais: (i) as

regiões metropolitanas (RM); (ii) as regiões integradas de desenvolvimento (RIDE); e (iii) os

consórcios. (SPINK, 2005). Cada um com especificidades, possibilidades e limites próprios.

Entendemos que em um país de dimensões continentais como o nosso, os arranjos

territoriais colaborativos possibilitam às políticas públicas de educação, a partir da

consideração dos contextos locais, imprimirem em suas ações as singularidades identitárias

das redes envolvidas. Dessa forma, aproximam-se das realidades locais envolvendo os

sujeitos desses contextos, promovendo uma participação mais efetiva, maximizando os

benefícios e minimizando os custos. No entanto, não podemos deixar de sublinhar que o

conceito de “arranjo educativo” é tomado certamente por analogia a arranjo produtivo, muito

empregado no planejamento econômico atualmente. Propõe-se, portanto, uma aproximação

entre lógicas e dinâmicas bem diferentes. Ademais, estudos das experiências desenvolvidas ou

em desenvolvimento a partir de ADE sinalizam fragilidades seja de articulação entre os

municípios envolvidos em que muitas vezes opera a sobreposição de alguns que se tornam

porta-vozes e realizadores do arranjo, seja causadas pelas descontinuidades políticas locais,

seja pela incompatibilidade de interesses entre as esferas pública, privada e civil. Assim,

acreditamos na consolidação de políticas regionais que de fato viabilizem práticas

cooperativas e colaborativas entre os municípios participantes, mas que sejam pautadas além

dos interesses econômicos.

3.1 A GÊNESE DO PROJETO CHAPADA – A HISTÓRIA CONTADA

Localizado no interior do estado da Bahia, na região das cadeias montanhosas da

Chapada Diamantina, o Território Colaborativo Chapada teve sua primeira “semente”

plantada em 1997, no município de Palmeiras. Cybele Amado de Oliveira25, então professora

do Colégio Estadual de Caeté-Açu (distrito palmeirense), notava que a situação educacional

local era, segundo ela, “caótica”. Ela conta que, ao longo de seis anos, presenciou um cenário

desolador: os alunos chegavam ao ensino fundamental II “analfabetos funcionais ou

analfabetos mesmo”, o que demonstra que havia um problema na base, que se propagava por

todo o ciclo escolar. Na tentativa de contribuir para a melhoria das condições de ensino e

25Cybele Amado de Oliveira é graduada em pedagogia e mestre em Desenvolvimento e Gestão Social pela Universidade

Federal da Bahia (UFBA). É mentora, diretora executiva e presidente do Instituto Chapada de Educação e Pesquisa (ICEP).

40

aprendizagem dos alunos da região, Cybele resolveu criar uma ação, inicialmente nomeada

“Programa de desenvolvimento e auxílio ao professor”. Esse primeiro programa, então, foi

enviado por ela a várias organizações. A Fundação Abrinq interessou-se pela proposta, com

uma ressalva: trabalhar não só com os alunos específicos (aqueles com maior dificuldade de

aprendizagem), mas também com os professores da rede de ensino, com vistas à ampliação do

escopo do projeto, seus impactos e o número de crianças atendidas.

No ano de 1998, com o nome de “Agentes da Educação”, o programa foi implantado,

a empresa Natura financiava o projeto; em contrapartida, os municípios contratavam e

formavam os coordenadores pedagógicos em suas respectivas redes de ensino. A ideia inicial

era atender às cidades mais próximas do Vale do Capão26.

E já no primeiro ano de trabalho os resultados foram muito positivos: alta redução no

índice de evasão (80%); considerável redução no índice de repetência (20%); aumento de

80% na frequência escolar; melhoria na qualidade da expressão escrita e oral dos alunos;

avanços no plano de cargo e salários; reestruturação física das escolas ( Meirelles; Oliveira,

2012, p. 114). Ao final de dois anos de trabalho, foi organizada uma “feira da educação” em

Palmeiras, na qual foram apresentados as experiências e os resultados obtidos com o

Programa. A partir daí, outros municípios se interessaram pelo programa. Em 1999, foi

constituída uma parceria entre o comitê técnico do “Crer para Ver” e os gestores das cidades

da Chapada Diamantina pertencentes à Diretoria Regional de Educação – Direc 27.

A partir de 2005, com o reconhecimento local, o programa ampliou seu escopo,

focando na consolidação de espaços de formação permanente nas escolas, por meio da

construção de equipes colaborativas de trabalho”. (OLIVEIRA; MEIRELLES, 2012, p. 117).

Com a consolidação das ações, os resultados obtidos e o reconhecimento da comunidade, o

Grupo Gerenciador decidiu constituir-se como uma organização reconhecida por lei e com

identidade jurídica. Para tanto, em 2006 foi criado o Instituto Chapada de Educação e

Pesquisa (ICEP).

O Instituto é definido por seus gestores como uma rede capaz de mobilizar toda a

comunidade escolar - de secretários municipais de educação a professores, e conta com

participantes em mais de 30 municípios do Brasil, a maior parte deles na Chapada

Diamantina. Segundo documentos do setor jurídico do ICEP, o Instituto mantém-se por

financiamentos dos próprios municípios, os quais cobrem os gastos diretamente relacionados

às formações locais (hora e transporte da formação, certificado) e financiamento dos parceiros

26Vale do Capão é o nome mais conhecido do distrito de Caetê-Açu, que está situado exatamente no meio das montanhas do

vale.

41

privados (fundações, institutos e empresas) que cobrem os custos internos e de estrutura física

do instituto.

Atualmente, o Território Chapada é composto por 32 municípios que, ao longo dos

anos e por uma questão geográfica, foram distribuídos em três núcleos: Núcleo de Seabra,

formado em 2000 e composto pelos municípios de Boquira, Ibitiara, Iraquara, Lençóis, Novo

Horizonte, Seabra e Souto Soares. Núcleo de Andaraí: formado em 2005, sendo composto por

Andaraí, Itaetê, Marcionílio Souza e Wagner. Núcleo de Tapiramutá: criado em 2005, é

integrado por Bonito, Piritiba, Pindobaçu e Tapiramutá. Em decorrência da instabilidade

econômica e administrativa nos municípios, o número de municípios que mantém adesão ao

Projeto Chapada costuma variar. A troca de gestores a cada 4 anos gera mudanças de ingresso

ou saídas de municípios desta rede.

O Instituto investe em dois blocos: Formação/Mobilização Política e Produção de

Conhecimento. Defende a gestão da educação municipal a partir do trabalho em redes

colaborativas, as quais se constituem em espaços democráticos de participação, parceria e

horizontalidade. Dessa forma, fortalecem o coletivo, considerando a identidade e autonomia

de seus componentes. (ICEP, 2013). Feita essa explanação sobre o ICEP a partir dos discursos

circulantes entre os membros do instituto e os jornais e revistas locais passemos a analisar a

proposta do referido instituto através dos documentos tomados aqui para análise.

3.2 A PROPOSTA DE AÇÃO DO ICEP NAS LINHAS E ENTRELINHAS DOS

DOCUMENTOS NORTEADORES

Para um entendimento da proposta pedagógica e de ação do ICEP são analisados os

Planos de Formação de Coordenador Pedagógico – documento que explicita os objetivos; as

expectativas de aprendizagem; os conteúdos; os dispositivos de formação e os instrumentos

de avaliação e o caderno Gestão Pedagógica da Rede de Ensino27.

O Caderno de Gestão Pedagógica traz uma síntese da proposta pedagógica do Instituto

e está organizado em seis capítulos. O capítulo um traz uma explanação sobre a gestão da

educação municipal a partir do trabalho em redes colaborativas, sublinha a necessidade desta

27 Gestão Pedagógica da rede de ensino: política de formação continuada, acompanhamento e avaliação da aprendizagem.

1ed., Palmeiras – BA: Instituto Chapada de Educação e Pesquisa, 2014. Além do Caderno de Gestão Pedagógica, o instituto

possui mais quatro publicações: Livro Vozes dos Educadores Brasileiros – Educação em nossas mãos; Livro Coordenador

Pedagógico – função, rotina e prática; Regime de Colaboração e Associativismo Territorial; Guia da Mobilização –

Engajamento e Participação na Formação de Territórios Colaborativos.

42

forma de organização dadas as fragilidades das redes municipais em gerirem sozinhas as

formações profissionais.

No capítulo dois do documento apresenta-se a formação continuada como processo

contínuo, articulada aos contextos de trabalho. São destacadas as responsabilidades dos

membros das equipes técnicas na formação dos diretores e coordenadores pedagógicos e as

funções e rotinas profissionais dos membros da equipe técnica e coordenador pedagógico,

sobretudo, do papel desse último na gestão da formação permanente dos professores. A

formação dos diretores escolares e coordenadores pedagógicos compete aos membros da

equipe técnica municipal sob supervisão e direcionamento do ICEP.

Os capítulos três e quatro do documento discute e apresenta os Planos de Formação e

as Pautas Formativas, respectivamente, como instrumentos organizadores das ações do

supervisor técnico. Os instrumentos são apresentados no documento através de modelos

referenciais e detalhamento de expectativas e metas a serem alcançadas em relação a

coordenadores pedagógicos, professores e alunos.28

O capítulo cinco trata dos dispositivos de formação que permitem otimizar as

potencialidades formativas das escolas, tais como, as situações de dupla conceitualização29 e a

tematização da prática a partir das discussões teóricas de Delia Lerner (2007), Telma Weiz

(2002) e Donald Schon (1992). O capítulo seis do documento discute o papel da equipe

técnica da Secretaria de Educação na definição e no acompanhamento de uma política de

avaliação.

A leitura dos material supracitado possibilita-nos fazer algumas inferências a respeito

da proposta e atuação do Instituto em pauta. Não intentamos discutir o material em todos os

seus aspectos constitutivos, assim, limitamos nossa análise aos aspectos que nos remetem à

compreensão da proposta do ICEP.

O trabalho pedagógico do instituto desenvolve-se a partir de duas dimensões: a

dimensão municipal e a dimensão territorial regional. Na primeira, são desenvolvidas as

estratégias de gestão municipal compreendidas pelos seminários didáticos e avaliativos

municipais e conselhos escolares municipais de classe. Na segunda, implementa-se a

formação das equipes técnicas e a formação de coordenadores pedagógicos. Para formação de

equipes técnicas são realizadas oito formações por ano, com carga horária de oito horas cada

encontro. Para formação de coordenadores pedagógicos são realizados três encontros por ano,

28 Em anexo. 29 Dupla conceitualização é uma estratégia que o formador usa quando o grupo de professores sabe pouco do conteúdo que

vai ensinar ou precisa reconceitualizá-lo, ou seja, atualizá-lo de acordo com as novas pesquisas.

43

com carga horária de oito horas cada encontro. Compreendemos a importância desses

encontros para qualificação do trabalho pedagógico nas redes municipais, no entanto,

entendemos que a carga horária referente aos encontros territoriais, destinados à equipe

técnica e coordenação pedagógica, é limitada e insuficiente para aprofundamento das leituras,

discussões e reflexões necessárias ao processo formativo. Ademais está comprometida com a

descontinuidade política e as oscilações financeiras das gestões municipais. Como sublinhado

no documento a reunião das equipes técnicas propõe-se a planejar as práticas profissionais,

refletir sobre as ações e os resultados da gestão municipal com base nos Planos de Ação e

Planos de Formação Continuada de Educadores. (ICEP, 2014, p. 25).

A motriz do ICEP é a formação continuada em rede. A formação da equipe técnica é

feita pelos formadores específicos do ICEP de cada segmento (Supervisor Técnico da

Educação Infantil, Supervisor Técnico do Fundamental I, Supervisor Técnico do Fundamental

II, Diretor Pedagógico) na cidade de Seabra- BA. A partir destes encontros, os conteúdos

formativos discutidos são disparados nas redes municipais de educação através de formações

específicas: Os Supervisores Técnicos responsabilizam-se pela formação dos Coordenadores

Pedagógicos e os Coordenadores Pedagógicos responsabilizam-se pela formação dos

professores. O documento explicita:

O desenvolvimento profissional de educadores figura como uma das

condições para a realização de políticas educacionais. Embora a formação

continuada seja um direito previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional de 1996, fazer cumpri-lo no cotidiano escolar parece ser um

desafio para os gestores. Para redimensionar as escolas como espaços

tempos de aprendizagem para os próprios educadores e criar condições para

que elas integrem redes de aprendizagem, é necessário reconceitualizar

planos e práticas profissionais das Secretarias Municipais de Educação e

construir uma cadeia de formação e responsabilidades. (ICEP, 2014, p. 30).

Ao tempo em que assinala a formação continuada como um direito previsto na LDB

9394/96, o documento expressa a dificuldade dos gestores municipais em cumprir este direito.

Dessa forma, o Instituto assume a responsabilidade por gerir a formação profissional nos

municípios parceiros. Esse processo de formação dos profissionais da educação na rede

Chapada se dá envolto em toda complexidade e problemática que envolve a questão da

formação continuada nos últimos anos no País.

Segundo Gatti (2008), o número de iniciativas colocadas sob o grande guarda-chuva

do termo “educação continuada” cresceu geometricamente, o termo refere-se aos limites dos

cursos estruturados e formalizados oferecidos após a graduação ou é tomado de modo amplo e

44

genérico como qualquer tipo de atividade que venha a contribuir para o desempenho

profissional – horas de trabalho coletivo na escola, reuniões pedagógicas, congressos,

seminários, cursos de diversas naturezas e formatos. Dessa forma, muitas iniciativas de

formação continuada adquirem a função de programas compensatórios e não de atualização e

aprofundamento de avanços do conhecimento, sendo realizados com a finalidade de suprir a

má-formação inicial.

Certamente, a inserção da formação continuada na letra da LDB aponta para um

avanço na legislação. Mas é importante salientarmos que, ao evidenciar em seu texto a

formação continuada, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação 9394/96 abre um leque de

possibilidades de interpretação, ações e ambivalências a começar pelo próprio termo,

entendido como capacitação em serviço (Art. 61, Inciso I), aperfeiçoamento profissional

continuado (Art. 67, Inciso II), treinamento em serviço (Art. 87). Essas ambivalências se

estendem ao entendimento do que esta formação deva priorizar: conhecimento teórico ou

saberes práticos, soma-se ainda, a indefinição sobre os tempos/espaços para realização desta

formação.

Embora se compreenda que a escola seja o locus desta formação, na maioria das vezes,

a formação continuada desenvolve-se em espaços outros, distanciados dos contextos

escolares, alheia, inclusive, às reais necessidades das escolas. Assim, entendemos que ao não

se regulamentar o lócus desta formação e ao se distanciar do espaço universitário - lugar de

diálogo entre ensino, pesquisa e extensão, esse processo pode assumir uma configuração

fragmentada e tecnicista.

De acordo com Oliveira (2007, p. 110), “as conquistas mais importantes da LDB

9394/96 têm tido efeito limitado e, às vezes contraditório, em razão de condições objetivas

que não se encontram asseguradas”. Soma-se a isso, o caráter compensatório e aligeirado que

esta formação vem assumindo, através de programas com concepções técnico- instrumental e

por outro lado, a ampliação desenfreada do mercado destinado à formação continuada.

Nóvoa30 (1999) assinala que o surgimento do mercado da formação vem de par com a

tendência à mercantilização do ensino e tem provocado um empobrecimento dos programas e

práticas de formação docente. Nesse mesmo sentido, Lang (1996, p. 9) afirma que a

profissionalização no campo da formação de professores é ambígua e justifica essa

ambiguidade afirmando que o termo indica ora uma modalidade de formação particular, como

30O aumento do mercado da formação continuada foi abordado por Antônio Nóvoa (1999) em seu artigo “Os professores na

virada do milênio: do excesso dos discursos à pobreza das práticas”.

45

formar o mais próximo possível da realidade prática, ora um modelo de profissionalidade

mais técnica.

Assim, uma questão que se coloca é relativa à importância e ao papel dos saberes

teóricos na formação. Até que ponto a formação continuada tem contribuído para o

desenvolvimento de um profissional crítico, analítico, capaz de compreender os processos

sociais e fazer as relações necessárias entre estes e sua práxis pedagógica? Que importância

atribui à apreensão da totalidade, no sentido dialético, que permitirá a formação de sujeitos

capazes de construir, como afirma Gramsci (1983), sua concepção de mundo e não apenas

aceitar uma concepção imposta?

O desafio de formar um educador que seja capaz de colaborar na construção de

conhecimentos socialmente significativos, como uma síntese entre as experiências e os

conhecimentos produzidos nas condições sociais e culturais dos processos de vida e de

trabalho dos educandos e os conhecimentos universais elaborados pelo conjunto da

humanidade, torna-se central em uma proposta de formação. A formação do educador exige,

portanto, uma sólida base teórica e epistemológica para que este possa ter condições de

realizar o movimento entre o particular e o universal, entre a estrutura e a conjuntura, entre a

parte e o todo como elementos de uma totalidade histórica. Para Freire (1983), a prática não

pode ater-se à leitura descontextualizada do mundo. Ao contrário, vincula o homem nessa

busca consciente de ser, estar e agir no mundo, num processo que se faz único e dinâmico.

Hoje, mais do que em outras épocas, se exige do educador uma postura alicerçada num

processo permanente de reflexão. Entende-se que o papel do professor vai muito além do

domínio técnico, pois, como ser histórico, está implicado com a construção de si mesmo e da

história.

Urge, pois, perscrutar crítica e dialogicamente os princípios e métodos de formação

continuada que vêm sendo empreendidos. Pois, essa é uma questão importante para ser

pensada, uma vez que implica diretamente a qualidade das formações ofertadas. Certamente

que na esfera municipal as dificuldades para implementar a formação continuada dos

profissionais de educação tendem a ser mais evidentes dadas as condições limitantes,

inclusive de ordem orçamentária. Embora exista na política nacional de formação dos

profissionais da educação o regime de colaboração entre a União, os Estados e os Municípios,

que garante a formação inicial ou segunda licenciatura, os municípios ainda precisam atender

às demandas de formação pedagógica contínua desses profissionais. Dessa forma, surgem

espaços para atuação das consultorias em educação. O Instituto Chapada institui-se como uma

46

dessas agências de formação pedagógica que, a partir de um escopo de rede colaborativa

responde a essa demanda dos municípios. De acordo com o site31 do ICEP,

Municípios de pequeno ou médio porte, que sozinhos não poderiam arcar

com as despesas de um programa de formação continuada (tanto para os

professores como para gestores escolares e equipe técnica da Secretaria de

Educação), juntam-se em uma parceria colaborativa e dividem gastos com

programas de formação que podem durar de dois a quatro anos. (ICEP,

2013).

A proposta de formação do ICEP destaca em seu texto “a reflexão sobre a prática

como peça-chave neste contexto, baseada na valorização do fazer profissional e da construção

de conhecimento por meio da análise e problematização32”. O documento apresenta como

aporte teórico para esse processo formativo Nóvoa (1999), Imbernón (2010), Gouveia (2012)

dentre outros. Como partícipe desse processo, na condição de membro da equipe técnica do

município no período de 2013 a 2015, percebo que, a formação continuada implementada na

rede colaborativa Chapada está envolta na mesma problemática que tem caracterizado essa

temática. Conforme já mencionamos, o trabalho em rede, ao tempo que possibilita a inserção

dos contextos e singularidades locais, é acentuadamente marcado pelas descontinuidades

políticas das gestões e ainda muito fragilizado. O processo de formação se dá pela formação

de formadores mediadores, o que traz implicações em relação ao que chega do outro lado, na

ponta final da formação muitas coisas são mudadas, recebem outras conotações. Embora a

formação esteja articulada aos contextos de trabalho, nem sempre é possível articular os

saberes teóricos aos saberes práticos, ou seja, a demanda por respostas às questões urgentes da

prática muitas vezes sobressai-se àquelas inerentes ao processo de reflexão, desconectando a

formação da verdadeira práxis e configurando-se como técnica e instrumental. Os tempos de

formação são comprometidos pelas agendas diferenciadas de cada município, pelas

descontinuidades de ordem política e orçamentária, com carga horária limitada, muitas vezes,

insuficiente para leituras e reflexões mais aprofundadas.

O Instituto implementa uma organização em cadeia do processo formativo cabendo ao

diretor pedagógico a formação dos diretores escolares; ao supervisor pedagógico a formação

dos coordenadores pedagógicos e aos coordenadores pedagógicos, a formação dos

professores. O documento Gestão Pedagógica da Rede de Ensino elenca as atribuições do

coordenador pedagógico e destaca as dimensões que devem ser assumidas como “norte do

31Disponível em: <www.institutochapada.org.br>. Acesso em: 30 abr. 2017. 32Conforme os Referenciais para a Formação de Professores (RFP), publicado pelo MEC em 1998 (BRASIL, MEC, 1998).

47

plano de trabalho”. Dentre elas, destacam-se: práticas de leitura e escrita profissionais; pautas

de formação; relatórios e devolutivas aos professores; apoio ao planejamento do professor;

criação de redes de aprendizagem para aprofundamentos teóricos.

Nesse processo formativo ganham destaque como principais indutores do currículo a

ser implementado na formação, o Plano de Ação da Equipe Técnica para a Educação

Municipal (documento que comunica as metas e prioridades do trabalho em prol do projeto

educativo local) e o Plano de Formação de Coordenadores Pedagógicos. Importante salientar

que tanto o Plano de Ação da Equipe Técnica quanto o Plano de Formação de Coordenadores

Pedagógicos e demais instrumentos formativos que sistematizam o trabalho do ICEP nas

redes municipais são apresentados a partir de modelos escritos na rede Chapada e da

apresentação de roteiros como sugestão para elaboração dos planos dos municípios. Os

documentos analisados apresentam uma justificativa em que consta uma leitura da realidade

escolar, os objetivos que se propõe alcançar, os conteúdos a serem aprofundados; as metas

definidas para os coordenadores, os professores e alunos.

Embora cada município escreva seu plano formativo, há uma sistematização comum

de itens a ser contemplados nesta escrita. Os municípios que estão em fase mais avançada,

definida a partir do tempo em que estão inseridos na rede, normalmente socializam suas

escritas com os demais, constituindo assim modelos, referenciais a serem seguidos.

Entendemos que, se esta formatação dada ao trabalho sistematiza e dá uma unidade aos

documentos publicizados pela rede, por outro lado, pode haver uma padronização dos

conteúdos que, se não for cuidadosamente analisada, pode descaracterizar uma proposta

formativa que considera os contextos e peculiaridades locais, indo na contramão do que

preconiza o documento:

Trabalhar em rede é tornar visível o fio que conecta e inter-relaciona

pessoas, profissionais, escolas e municípios quando o objetivo é aprimorar a

qualidade da educação pública. Redes colaborativas se constituem em

espaços democráticos de participação, parceria e horizontalidade. Dessa

forma, fortalecem o coletivo, considerando a identidade e autonomia de seus

componentes. (ICEP, 2013, p. 17).

Segundo o ICEP, o trabalho em rede possibilita a troca, a socialização, a

corresponsabilidade pelo trabalho, “práticas de sucesso contextualizadas podem ser

incorporadas como patrimônio de todos. As dificuldades e os desafios são assumidos,

abordados e resolvidos como questões da rede”. Conforme exemplificado em relato cedido

pelo Instituto:

48

Na experiência do Território Chapada, o trabalho com o plano de formação

foi aprimorado conforme a reflexão sobre a prática avançava. De acordo

com os sujeitos envolvidos, ele foi o grande diferencial do trabalho,

estabeleceu o norte, organizou e antecipou a rotina, garantiu a

intencionalidade das ações, facilitou a gestão de cada iniciativa e, com a

construção coletiva, conseguiu o compromisso de todos. Para o desenho dos

planos de formação anuais, usamos as reflexões sobre as diferenças dos

conteúdos de formação dos professores e dos conteúdos de formação dos

coordenadores. Foram claramente definidas as aprendizagens a ser

desenvolvidas segundo cada sujeito envolvido na formação, ainda que o foco

estivesse no coordenador pedagógico. (TERRITÓRIO CHAPADA, 2013).

Entendemos, como partícipes desse projeto, a necessidade dessa proposta formativa

ser discutida e reelaborada na coletividade nos municípios em que é implementada sob pena

de um trabalho formativo verticalizado e padronizado. E percebemos que, esta necessidade de

discussão e participação dos diferentes sujeitos envolvidos nesse processo formativo, ainda

não está consolidada em nossa realidade.

Dessa forma, algumas afirmações do documento analisado se apresentam como

questionáveis. Um exemplo refere-se à construção da autonomia dos municípios parceiros do

Instituto, pois embora se destaque no documento que a criação de quadros locais de

profissionais preparados para assumir a formação dos educadores, tanto na dimensão

municipal quanto na escolar, favorece a construção da autonomia do município na gestão da

educação para além da atuação de consultores e assessores pedagógicos externos, que passam

assim, a assumir o papel de colaboradores. (2014, p. 34). Não está expresso no documento

como se viabiliza essa autonomia dos municípios em relação à consultoria do Instituto nem se

faz a apresentação de propostas que visem o desenvolvimento dessa autonomia. Sendo assim,

nos perguntamos se há, de fato, interesse do instituto fomentar essa autonomia nos municípios

em que atua, ajudando-os a “caminharem com as próprias pernas” como tão bem expressa o

documento.

49

4 DESENROLANDO OS FIOS QUE TECEM O PROJETO INSTITUCIONAL DE

LEITURA

Que a importância de uma coisa há que ser medida

pelo encantamento que a coisa produza em nós.

Manoel de Barros (2010)

O Projeto Institucional de Leitura (PIL) é uma ação voltada a uma política de leitura

implementada pelo Instituto Chapada de Educação e Pesquisa33 nos municípios parceiros do

instituto. Intenta apoiar os estudantes na ampliação do repertório de leitura nos mais diversos

gêneros e aproximá-los da leitura de uma diversidade de autores, enfatizando de modo

particular a leitura de literatura. O PIL passou a fazer parte da formação pedagógica das

equipes técnicas e gestores escolares dos municípios da região da Chapada Diamantina no ano

de 2005. Este projeto é um encaminhamento da rede Chapada a partir da análise dos dados

sobre leitura, realizada pelas redes municipais de educação parceiras do Chapada, que

revelava pouco acesso dos alunos à leitura e baixa participação das famílias no incentivo à

leitura.

Por isso, o PIL visa à formação de uma comunidade de leitores nas redes municipais

onde o projeto é implementado. Ao longo dos anos, esse objetivo se mantém e outros vão

sendo incorporados como o de desenvolver ações de leitura que também estejam mais

diretamente ligadas às necessidades de aprendizagem dos estudantes. A denominação PIL

abarca diversas ações e projetos de leitura. Cada escola dentro da rede municipal de educação

planeja seus projetos de leitura a serem desenvolvidos em uma unidade, semestre ou ano

letivo. Há, portanto, dentro de uma mesma escola a escrita e implementação de diversos

projetos de leitura ao longo do ano.

Os encontros formativos com as equipes técnicas e as formações pedagógicas

realizadas nos municípios com os formadores do ICEP e coordenadores pedagógicos discutem

a importância da formação de comportamentos leitores e desenvolvimento de práticas leitoras

através de um referencial teórico selecionado pelo Instituto. Nos Planos de Formação, Pautas

formativas e referências citadas nos Projetos Institucionais de Leitura consultados para esta

pesquisa destacam-se: Andar entre Livros, Teresa Colomer (2007), Do mundo da leitura para

a leitura do mundo, Marisa Lajolo (2002), Ler e escrever na escola: o real, o possível e o

necessário, Délia Lerner (2002), Estratégias de leitura, Isabel Solé (1998), Práticas da leitura,

33Outros documentos inspiraram e serviram como indutores para elaboração do PIL, como o Projeto Institucional Leitura

pelo professor elaborado pelas formadoras do município de Uberlândia – MG em parceria com o Instituto Avisa Lá e

Instituto C&A.

50

Roger Chartier (2011), Oficina de leitura, Ângela Kleiman (1995), Livro-escola, leitura e

produção de textos, Ana Maria Kaufman (1995). Percebemos, portanto, uma fundamentação

teórica importante para aprofundamento das discussões. Nos encontros formativos do ICEP

são vivenciadas atividades de leitura articuladas a momentos de reflexão e discussão teórica a

partir de uma compreensão dialógica entre teoria e prática.

Os municípios, através das equipes técnica-pedagógicas das secretarias de educação,

elaboram o PIL por meio da análise dos resultados de leitura advindos das avaliações internas

- realizadas periodicamente pelas escolas através dos diagnósticos de leitura e escrita

realizados a cada semestre ou unidade letiva como forma de acompanhamento das

aprendizagens dos alunos. Os resultados são tabulados, analisados e socializados com a

comunidade escolar para que seja dado os devidos encaminhamentos pedagógicos, e das

avaliações externas como a Prova Brasil34. Os diagnósticos de leitura e escrita são atividades

envolvendo leitura e escrita, elaboradas pela coordenação pedagógica e professores das

unidades escolares com acompanhamento da supervisão pedagógica, considerando a Matriz

de Referência do Saeb e as competências leitoras de cada série. A equipe técnica- pedagógica

acompanha e reescreve o projeto em conjunto com os docentes, a partir do monitoramento das

metas e ações que foram traçadas para o PIL no decorrer do ano letivo. Cada escola define as

ações do PIL a partir dos objetivos que possuem para a leitura no ano em curso.

Essas ações ocorrem na escola - envolvendo alunos, professores, funcionários - e fora

dela (na praça, embaixo de uma árvore, na feira local, nas ruas da comunidade, de casa em

casa etc.). Os projetos escritos constam nos Planos de Formação dos Coordenadores

Pedagógicos e no Plano de Ação da Escola. Convém salientarmos a dificuldade que tivemos

de acesso aos projetos, pois não há uma compreensão por parte da coordenação e dos

professores da importância do registro da relação que esses estabelecem entre o planejado e o

realizado, possibilitando o acompanhamento e avaliação das ações. Percebemos, como

supervisora pedagógica, a dificuldade da escola escrever seu Plano de Trabalho, registrar e

documentar suas ações pedagógicas e a cultura escolar. E a dificuldade do coordenador e

professor escrever seus textos, revelar seu pensamento por escrito. Corroboramos com Freire

34 O Sistema de Avaliação da Educação Básica – Saeb – é composto por duas avaliações complementares, a Aneb e a Anresc

(Prova Brasil). A avaliação denominada Avaliação Nacional da Educação Básica – Aneb - permite produzir resultados

médios de desempenho conforme os estratos amostrais, promover estudos que investiguem a equidade e a eficiência dos

sistemas e redes de ensino por meio da aplicação de questionários, conforme vem sendo implementado na avaliação desde o

ano de 1995. Por ser amostral, oferece resultados de desempenho apenas para o Brasil, regiões e unidade da Federação. A

avaliação denominada Avaliação Nacional do Rendimento Escolar – Anresc (Prova Brasil), realizada a cada dois anos, avalia

as habilidades em Língua Portuguesa (foco na leitura) e em Matemática (foco na resolução de problemas). É aplicada

somente a estudantes de 4ª série/5º ano e 8ª série/9º ano de escolas rede pública de ensino com mais de 20 estudantes

matriculados por série alvo da avaliação.

51

(2009) a importância de o professor vencer o medo de escrever, de registrar, de expor suas

ideias, tornando-se, assim, autor e assumindo a autoria de seu pensamento e do conhecimento

que constrói em sua prática.

Inicialmente, o projeto é esboçado nos encontros de formação através de um

documento que consta: público – alvo (alunos, professores, coordenador pedagógico, diretor

escolar, funcionários), objetivos e ações para cada um dos sujeitos envolvidos e cronograma

de desenvolvimento do projeto. O ICEP faz o acompanhamento do PIL através das ações

descritas nos Projetos e dos resultados de aprendizagem em leitura. Este monitoramento é

realizado pelos formadores junto à equipe técnica, coordenadores e diretores escolares,

através da análise dos projetos escritos, das pautas formativas e das estratégias formativas

desenvolvidas. Nos encontros formativos de rede há momentos de discussão sobre o

andamento dos trabalhos em relação ao PIL, assim, o ICEP, por meio dos formadores, avalia

o planejado e traça novas metas ou sugere ações no sentido de qualificar o que já está sendo

desenvolvido em cada município.

Os projetos institucionais de leitura são tomados como dispositivos de formação, tendo

em vista a mobilização para a constituição de uma rede leitora. Nos espaços de formação com

as Equipes Técnicas, como também nas formações internas nos municípios, abre-se essa

frente de investimento, ajudando os membros da supervisão técnica e coordenação

pedagógica refletirem acerca dos PILs dos seus municípios. Constituem-se objetivos do PIL

(ICEP, 2013):

I. Fomentar a leitura nas escolas, contribuindo para a formação de uma

comunidade de leitores plenos;

II. Estimular os leitores a descobrirem livros que muitas vezes encontram-

se nas bibliotecas municipais ou nas escolas, sem uso;

III. Difundir obras literárias, bem como ampliar o conhecimento sobre seus

autores, estimulando sua leitura;

IV. Fomentar a leitura na comunidade.

Depoimentos de formadores do ICEP e coordenadores pedagógicos destacam que a

leitura de literatura no PIL é sempre uma constante e uma questão central para o

desenvolvimento do projeto. A partir do ano de 2014 foi incorporada aos PILs a leitura de

clássicos universais como Dom Quixote, de Cervantes, A Metamorfose, de Kafka, O Pequeno

Príncipe, de Exupéry, Os Miseráveis, de Victor Hugo, dentre outros, por meio da ação

52

conhecida como “Tertúlias Dialógicas Literárias”35. As Tertúlias Dialógicas Literárias

envolvem os alunos e estendem-se aos pais e comunidade que, por meio dessa ação, são

convidados a conhecerem os clássicos, e, uma vez na semana, se reúnem para compartilhar a

leitura de textos, fragmentos ou capítulos dos livros.

Segundo diretores e coordenadores, os efeitos e resultados das ações do PIL são

evidenciados nas escolas pelo aumento da retirada de livros na biblioteca da escola e da sala

(observada por meio dos controles de registros de empréstimos), pelo comportamento leitor

que o grupo vai adquirindo, pelos resultados crescentes que se tem a cada ano no âmbito das

aprendizagens que envolvem leitura. Como consequência da ação do PIL nos municípios,

cita-se a aquisição de livros de literatura pelas escolas e algumas secretarias de educação,

campanhas e gincanas para aquisição de livros realizadas pelas escolas, criação de Lei

Municipal que institucionalizou o dia da leitura em alguns municípios, criação e ampliação

dos cantinhos de leitura, salas de leitura e bibliotecas escolares. Percebemos, em visita às

escolas, e, também, em conversa informal com coordenadores e responsáveis pelas salas de

leitura um movimento de alunos consultando as estantes de livros e outros à procura de algum

título sugerido nas sala de aula pelo professor.

4.1 OS DOCUMENTOS NORTEADORES DO PIL

Conforme já mencionado, não há um documento que apresente ou sintetize os

princípios norteadores do Projeto Institucional de Leitura, embora a rede Chapada possua

cinco publicações que sintetizam as concepções, as propostas e os movimentos da rede. Em

relação ao PIL não há uma publicação que reúna e sintetize os embasamentos teóricos do

projeto, a estruturação e o registro das práticas de letramento literário implementadas na rede.

Entendemos que essa ausência traz implicações no desenvolvimento do projeto tais como: não

sistematização do projeto, falta de uma clareza e percepção mais abrangente do que está sendo

realizado, muitas das ações realizadas, e, não visibilidade às ações exitosas realizadas. O que

compromete o fortalecimento de uma cultura das redes municipais de registrarem,

documentarem suas ações e contribui para acentuar os impactos desastrosos da política de

35A Tertúlia Literária Dialógica é uma atividade cultural e educativa desenvolvida a partir da leitura de livros da literatura

clássica universal. A atividade está baseada no diálogo como gerador de aprendizagem. Não apresenta nenhum obstáculo

social ou cultural para a participação: é uma atividade gratuita, aberta a todas as pessoas, de diferentes coletivos sociais e

culturais. (MELLO, 2002). Nascida na escola de educação de pessoas adultas de La Verneda de Sant-Martí (Espanha), a

atividade é atualmente difundida pela Confederação de Federações e Associações de Participantes em Educação e Cultura

Democrática de Pessoas Adultas (CONFAPEA), da Espanha, por meio do projeto “Mil y Una Tertúlias Literárias Dialógicas

por Todo el Mundo”. A ideia é tomar a leitura como território de união de diferentes conhecimentos (os do mundo da vida e

os do sistema), caminho construído entre homens e mulheres de diferentes idades, formação, procedência e etnias.

53

descontinuidade que marca as redes municipais. Embora o PIL seja escrito em todos os

municípios estes registros, em muitos casos, deixam de ser socializados e ficam de posse das

equipes técnicas e coordenadores pedagógicos, não fazendo parte dos arquivos das escolas.

Assim, a partir da análise dos documentos coletados, elegemos três que nos parecem

norteadores da escrita dos PILs nos municípios da rede Chapada: “Os Indicadores da

Qualidade de Formação de Leitores”, “A Pauta de Formação das Equipes Técnicas”36 e os

Projetos Institucionais de Leitura. A coleta desses documentos constituiu-se em um dos

obstáculos para realização desta pesquisa, uma vez que não há um arquivo sistematizado dos

documentos relativo ao PIL. Os documentos estão nos municípios, de posse de coordenadores

ou equipe técnica, mas não há uma catalogação sistemática, um arquivo que possa ser

consultado, pesquisado. Para acessá-los, é necessário contactar inúmeras pessoas. Assim, o

material analisado foi cedido dos arquivos pessoais de diretoras pedagógicas de alguns

municípios da rede Chapada, coordenadoras pedagógicas e outros do arquivo pessoal de uma

das formadoras do ICEP.

Os Indicadores da Qualidade da Formação de Leitores é um documento do ICEP

socializado com a gestão escolar no qual consta os indicadores de qualidade ou expectativas

em relação à formação leitora da gestão escolar, dos educadores, dos estudantes, funcionários

e da comunidade do entorno da escola. Infere-se que compete à gestão a socialização do

documento com a comunidade escolar e a mobilização desta para efetivação das expectativas

elencadas. O documento não explicita as referências nas quais se baseia para elencar os

indicadores nele enumerados. Em cada página do documento são listados os indicadores da

formação leitora relacionados a cada membro do contexto educativo, definindo, assim, de que

forma cada um dos sujeitos pode ampliar sua formação leitora e contribuir para a formação

leitora no projeto escolar. Elencamos alguns destes indicadores da qualidade de formação de

leitores, especificando os sujeitos do processo a quem se direcionam, (ICEP, 2013):

I. Implementar Projetos Institucionais de Leitura envolvendo a

comunidade escolar e entorno; (Gestão Escolar)

II. Prover o acervo de literatura com diversidade de obras e autores;

(Gestão Escolar)

III. Ler livros de diferentes gêneros e em diferentes suportes por escolha

própria e/ou direcionada pelo professor; (Alunos)

IV. Desenvolver comportamentos leitores e escritores; (Alunos)

36A equipe técnica é formada pelo Diretor Pedagógico e os Supervisores Técnicos da rede municipal de educação.

54

V. Investir em sua formação leitora; (Professores)

VI. Elaborar e executar projetos de leitura; (Professores)

VII. Conhecer o acervo literário da escola; (Professores)

VIII. Ler para e com seus filhos; (Pais)

IX. Colaborar com a manutenção e gestão dos espaços e projetos de leitura

da escola; (Pais)

X. Conservar e utilizar os espaços de leitura da escola; (Comunidade do

entorno)

XI. Envolver-se com a comunidade escolar nas campanhas e projetos de

fomento à leitura; (Comunidade do entorno)

XII. Interagir através de ações planejadas pela escola, a fim de se tornarem

coparticipantes do processo de aprendizagem dos comportamentos

leitores.

Na escrita dos PILs analisados, percebemos que os indicadores de qualidade da

formação leitora estão expressos nos objetivos específicos, evidenciando uma relação

dialógica entre os documentos.

A Pauta de Formação das Equipes Técnicas37 é um documento socializado nos

encontros formativos da rede, destinados às equipes técnicas. Neste documento esboçam-se

três questões a serem refletidas pela equipe técnica, socializadas e discutidas com os pares de

formação e levadas ao município de atuação com vistas a direcionar os Projetos de Leitura da

rede municipal. As questões expressas no documento são: O que já fazemos em nossas

escolas? O que queremos desenvolver a partir do PIL? Quais as ações da gestão escolar neste

encaminhamento?

As discussões realizadas nos encontros formativos da rede Chapada a partir das

questões citadas são pautadas nos encontros formativos realizados nos municípios, dando

seguimento e embasamento à elaboração dos PILs de cada escola. Entendemos que esta

reflexão seja importante para que a discussão sobre os projetos em torno da leitura se

mantenha nas unidades escolares, como uma forma de avaliação do que se deseja

implementar a partir e através dos projetos de leitura, pois sistematiza o trabalho

desenvolvido.

37 Em anexo.

55

Quando se pensa sobre as ações da gestão escolar no encaminhamento do PIL, por

exemplo, enfatiza-se o papel da escola em gerir tempos/espaços para a leitura. Pensamos,

porém, do lugar de quem esteve na supervisão pedagógica articulando algumas dessas ações

do PIL, a necessidade de se ampliar a discussão sobre leitura e letramento literário, tanto nos

espaços de formação do ICEP como no âmbito das escolas municipais, sob pena do trabalho

pedagógico com o projeto limitar-se às questões práticas.

Os Projetos Institucionais de Leitura são os documentos escritos nos municípios que

dizem das ações de leitura a serem desenvolvidas em cada escola ou na rede municipal de

educação. Acreditamos que a análise dos elementos constitutivos dos projetos nos possibilita

entender a forma como o PIL se estrutura e a partir daí compreendermos a dinâmica do

Projeto. Assim, dentre os três documentos escolhidos para análise do PIL : Indicadores da

Qualidade de Formação de Leitores, Pauta de Formação das Equipes Técnicas e Projetos

Institucionais de Leitura, destacamos a análise dos elementos constitutivos do PIL expressos

nos Projetos Institucionais de Leitura por compreendermos que seja o documento que mais

dados apresenta para apreensão do objeto estudado.

Dessa forma, buscamos compreender a tecelagem do PIL nos seus elementos

constitutivos, intentando a partir dessa análise explicar sua estrutura organizacional.

Analisamos projetos de algumas escolas dos municípios de Andaraí, Tapiramutá, Ibitiara, Boa

Vista do Tupim e Pindobaçu38com o intuito de perceber a estruturação do PIL. Os

documentos que registram o Projeto Institucional de Leitura (PIL) nestes municípios, embora

diferenciem-se em relação a alguns conteúdos, assemelham-se nos elementos constitutivos,

sendo eles: justificativa; público-alvo; objetivos gerais e específicos; descrição das ações

leitoras e referências.

A partir da análise dos projetos citados, compreendemos as concepções que permeiam

a escrita desses projetos, os referenciais teóricos que fundamentam o trabalho e a estrutura

organizacional do PIL. Nas justificativas dos PILs delineia-se a concepção de leitura que

orienta o projeto. As justificativas dos projetos analisados trazem inicialmente uma

apresentação do projeto, enfatizam o espaço da escola como primordial na promoção de

práticas de leitura, dizem da importância de incorporação da prática leitora na vivência do

coordenador e professor para, desta forma, promover a incorporação da leitura aos hábitos dos

educandos. Embora os projetos analisados utilizem a expressão “formar hábitos”, “incorporar

a leitura aos hábitos dos estudantes”, acreditamos em um despertar do gosto pela leitura,

entendendo-a como um processo intermediado, um encontro com textos, com livros.

38 Os projetos foram cedidos pelas diretoras pedagógicas dos referidos municípios.

56

Os PILs estruturam-se a partir da premissa de formação em cadeia. De acordo com os

documentos analisados, “pensa-se num movimento em cadeia capaz de mobilizar ações que

extrapolem os muros da escola e promovam o compartilhamento desta vivência com a

comunidade”. Assim, o coordenador pedagógico responsabiliza-se pela incorporação de

práticas leitoras à práxis pedagógica dos professores e esses, por sua vez, provocados pela

leitura em seu processo formativo, desencadeiam a prática leitora nas escolas e salas de aula

onde atuam. Entende-se que, à medida que a equipe técnica pedagógica se aproxima da

leitura, ampliando seu repertório leitor e constituindo-se como sujeitos leitores, há uma

repercussão desse movimento em cadeia na rede municipal.

O ICEP defende a ideia de que, para transformar a escola numa comunidade de

leitores, é preciso investir na formação leitora dos profissionais da educação, conforme

destaca o projeto de Boa Vista do Tupim: “a proposta exposta tem a finalidade de desenvolver

comportamentos leitores em cadeia, auxiliando a escola a planejar a ação para o

desenvolvimento, acompanhamento e avaliação de suas práticas leitoras”. (BOA VISTA DO

TUPIM, 2011).

Cosson (2014) ressalta que a noção de comunidade de leitores, embora se faça

presente em vários estudos sobre a literatura, parece ter partido de Fish (1980). Para Fish

(apud Cosson, 2014), não há nem leitor nem texto fora das convenções de uma comunidade

interpretativa. A compreensão de formação de comunidade de leitores esboçada na

justificativa do PIL de Boa vista do Tupim remete-nos, portanto, ao princípio do letramento

literário defendido por Cosson (2012):

[...] adotamos como princípio do letramento literário a construção de uma

comunidade de leitores. É essa comunidade que oferecerá um repertório,

uma moldura cultural dentro da qual o leitor poderá se mover e construir o

mundo e a ele mesmo. Para tanto, é necessário que o ensino da Literatura

efetive um movimento contínuo de leitura, partindo do conhecido para o

desconhecido, do simples para o complexo, do semelhante para o diferente,

com o objetivo de ampliar e consolidar o repertório cultural do aluno.

(COSSON, 2012, p. 48).

Para a maioria das escolas, a justificativa para elaboração dos projetos institucionais

de leitura está nas dificuldades apresentadas pelos alunos em relação à leitura, tais como:

dificuldade em localizar informações explicitadas no texto, realizar inferência ou fazer

reflexões sobre o texto, conforme destaca o fragmento seguinte:

57

Considerando o resultado do diagnóstico de leitura realizado nesta unidade

de ensino, observou-se os seguintes problemas: a leitura não é uma prática

social no cotidiano dos alunos, estes apresentam dificuldades em localizar

informações, realizar inferência e fazer reflexões a partir do texto. Pensando

nesta situação a Escola Municipal Maria Quitéria resolveu implementar o

Projeto Institucional de Leitura, envolvendo toda a comunidade escolar,

visando a valorização e compreensão das diferentes formas de leituras e

linguagens que permeiam a sociedade. Isso significa redefinir a leitura na

sala de aula e na escola como um todo, não apenas para cumprir tarefas, mas

a leitura como prática social construtora de sentidos e significados para a

comunidade. (TAPIRAMUTÁ, 2008).

Evidencia-se que, embora a justificativa para elaboração do PIL parta da consideração

dos resultados dos diagnósticos de leitura realizados na escola, o pressuposto central da

justificativa é a percepção de que a leitura não é uma prática social no cotidiano dos alunos.

Ou seja, há uma compreensão mais ampla dos resultados em relação à leitura dos alunos. A

escola não se limita a pensar nas dificuldades de localizar informações ou realizar inferências

sobre o lido. Compreende que estas habilidades são consequência de uma relação de não

proximidade com a leitura. A justificativa explicita uma concepção de leitura “como prática

social construtora de sentidos e significados”, em consonância com o PIL analisado do

município de Ibitiara que assinala ser “o ato de leitura, um ato cultural e social”.

Percebemos, portanto, semelhanças na escrita da concepção de leitura que orientam os

PILs e a aproximação da compreensão de leitura e de letramento concebida nesta dissertação,

dialogando, assim, com Cosson (2012)

O ato de ler, mesmo realizado individualmente, torna-se uma atividade

social. O significado deixa de ser uma questão que diz respeito apenas ao

leitor e ao texto para ser controlado pela sociedade. A leitura é o resultado de

uma série de convenções que uma comunidade estabelece para a

comunicação entre seus membros e fora dela. Aprender a ler é mais do que

adquirir uma habilidade. Aprender a ler e ser leitor são práticas sociais que

medeiam e transformam as relações humanas. (COSSON, 2012, p. 40).

A compreensão de leitura, portanto, ultrapassa a decifração do código escrito. Inclui a

interação com o texto em seus diversos sentidos e significados e com o contexto em que está

inserido. Leitura de mundo e leitura da palavra intercruzam-se. Conforme destaca Freire

(1989), em A importância do ato de ler: “(...) linguagem e realidade se prendem

dinamicamente”. A compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a

percepção das relações entre o texto e o contexto. (FREIRE, 1989, p. 9).

Essa compreensão estende-se à justificativa do PIL de Andaraí quando este destaca

que as etapas do trabalho de formação leitora foram pensadas considerando os leitores e os

58

propósitos sociais que guiam as práticas de leitura. O documento traz a seguinte citação de

Kaufman (1995):

É indiscutível que os leitores não se formam com leituras escolares de

materiais escritos elaborados expressamente para a escola com a finalidade

de cumprir as exigências de um programa. Os leitores se formam com a

leitura de diferentes obras que contêm uma diversidade de textos que

servem, como ocorre nos contextos extraescolares, para uma multiplicidade

de propósitos [...]. (KAUFMAN,1995, p. 45).

Percebe-se uma correlação nas escritas dos PILs no que diz respeito à compreensão de

leitura como prática social atravessada, portanto, por múltiplos propósitos, além daqueles

restritos ao cumprimento de tarefas escolares ou à mera decodificação.

Entendemos que a escrita das justificativas aponta para uma atualização teórica a

respeito da leitura e do ato de ler. E pensamos essa atualização como uma ação importante

quando se propõe implementar projetos de leitura em espaços escolarizados, pois acreditamos

que tais compreensões teóricas sejam fundamentais, uma vez que é através dessas

compreensões que se promovem práxis pedagógicas atualizadas, consistentes e coerentes.

O público-alvo definido pelo PIL são os coordenadores pedagógicos, gestores

escolares, professores, alunos, funcionários e comunidade do entorno. Ao se eleger os

diferentes atores da unidade escolar como partícipes do projeto reconhece-se a sua

institucionalização. Segundo o dicionário Aurélio (1986, p. 430), institucionalizar significa

dar caráter de instituição ou adquiri-lo; oficializar-se; estabelecer-se. Assim, entendemos que

a institucionalização do projeto de leitura enfatiza um lugar para a leitura na escola e,

consequentemente, na práxis pedagógica que aí se desenvolve. Projetos institucionais tendem

a envolver mudanças organizacionais e envolvimento maior dos atores do processo, uma vez

que as ações e responsabilidades são estendidas a todos. Incorporam-se, ainda, aos projetos

político-pedagógicos das unidades escolares constituindo-se como proposta política da escola.

A institucionalização do projeto enfatiza-o como ação central e contínua, diferenciando-o de

projetos cujas ações, muitas vezes, se tornam pontuais e fragmentadas.

O processo de institucionalização dá-se a partir dos conceitos relacionados a hábitos e

rotinas. Segundo Guerreiro (2005), hábitos “são tendências para a repetição de respostas, dado

um contexto estável e facilitador”. E as “rotinas representam formas de pensar e de agir que

são habitualmente adotadas por um grupo de indivíduos de forma inquestionável, são os

componentes das instituições”. (GUERREIRO et al., 2005, p. 99). Ou seja, a

institucionalização estabelece o projeto na organização da escola e consegue, com o tempo,

59

fornecer um conjunto de padrões de comportamentos e hábitos, ao aceitar como algo que

prevalece e permanece dando estabilidade e previsibilidade às ações dos indivíduos. Há uma

responsabilidade conjunta pela ação empreendida, de forma que esta passe a ser parte

constituinte da instituição.

Sendo assim, ao institucionalizar a leitura, o PIL tende a diferenciar-se de outros

projetos desenvolvidos em muitas escolas que implementam ações leitoras de forma pontual e

descontínua e limitam a responsabilidade da leitura e do projeto a professores e alunos. O

envolvimento e responsabilidade de todos os sujeitos do contexto escolar configura a leitura

como prática integrativa, cria hábitos e rotinas de leitura. Há, assim nos parece, um

investimento coletivo e sistemático com a leitura e, consequentemente, com a formação de

leitores quando as condições institucionais estão estabelecidas.

4.2 AS CONCEPÇÕES DE LEITURA QUE TECEM OS PILs

Os objetivos gerais elencados nos projetos analisados reportam-se às concepções de

leitura que fundamentam o PIL, tecendo assim um diálogo com as justificativas. Dos

objetivos gerais elencados, destacamos dois que são comuns a esses projetos. São eles:

I. Valorizar e compreender as diferentes linguagens que permeiam nossa

sociedade, aproximando a leitura de diferentes propósitos e

apresentando-a como prática social;

II. Destacar a leitura como prática de interação, solidariedade e

inventividade, envolvimento, debate e transformação.

Os objetivos se vinculam às concepções de leitura apresentadas nas justificativas dos

projetos ao referirem-se à leitura como prática social e prática de interação. A compreensão da

leitura como processo de interação remete-nos a Soares (2000):

Leitura não é esse ato solitário; é interação verbal entre indivíduos, e

indivíduos socialmente determinados: o leitor, seu universo, seu lugar na

estrutura social, suas relações com o mundo e com os outros; o autor, seu

universo, seu lugar na estrutura social, suas relações com o mundo e os

outros. (SOARES, 2000, p. 18).

A interação é marca indelével do processo de leitura, seja pela relação que se

estabelece entre leitor – texto, seja pelas relações estabelecidas entre leitor e mundo e entre

leitor e leitor. Ou seja, é um processo dinâmico marcado pelas diversas inter-relações que aí

60

se estabelecem e se reelaboram. Em O ato de leitura, Iser afirma que “o texto representa um

efeito potencial que é realizado no processo da leitura”. Para o autor:

A obra literária tem dois polos, (...) o artístico e o estético: o polo artístico é

o texto do autor e o polo estético é a realização efetuada pelo leitor.

Considerando esta polaridade, é claro que a própria obra não pode ser

idêntica ao texto nem à sua concretização, mas deve situar-se em algum

lugar entre os dois. Ela deve inevitavelmente ser de caráter virtual, pois ela

não pode reduzir-se nem à realidade do texto nem à subjetividade do leitor, e

é dessa virtualidade que ela deriva seu dinamismo. Como o leitor passa por

diversos pontos de vista oferecidos pelo texto e relaciona suas diferentes

visões e esquemas, ele põe a obra em movimento, e se põe ele próprio

igualmente em movimento. (ISER,1996, p. 21).

Ainda segundo Iser, o leitor aciona seu repertório que é o conjunto de normas sociais,

históricas e culturais trazidas por ele. Nesta mesma linha dialógica Leffa (1999) pontua que

no processo da leitura, por exemplo, esses elementos podem ser o leitor e o texto, o leitor e o

autor, as fontes de conhecimentos envolvidas na leitura, existentes na mente do leitor, como

conhecimento de mundo e conhecimento linguístico, ou ainda, o leitor e os outros leitores. No

momento em que cada um desses elementos se relaciona com o outro, no processo de

interação, ele se modifica em função desse outro. Em resumo, podemos dizer que, quando

lemos um livro, provocamos uma mudança em nós mesmos, e que essa mudança, por sua vez,

provoca uma mudança no mundo. (LEFFA, 1999, p. 14-15).

O diálogo estabelecido entre as justificativas dos projetos e os objetivos gerais

elencados aponta para, além de uma unidade textual do documento, uma coerência da

compreensão do processo de leitura enquanto interação. Quiçá, esse diálogo e compreensão

sejam concretizados na prática, pois sabemos dos distanciamentos que podem ocorrer entre o

que se esboça teoricamente e aquilo que de fato se materializa.

Os objetivos específicos dos PILs analisados direcionam-se para cada um dos

diferentes sujeitos do contexto escolar. Assinalamos estes objetivos listados nos projetos

analisados, elencando os objetivos específicos comuns a esses PILs e tecemos uma leitura de

análise dos mesmos a partir dos referenciais teóricos que subsidiam esta dissertação

intentando perceber como se delineiam os caminhos para o letramento literário no PIL.

Os objetivos específicos para diretores e coordenadores pedagógicos, como dupla

gestora, referem-se a incentivar o envolvimento de toda comunidade escolar no processo de

formação leitora e fomento à leitura; ampliar o próprio repertório leitor, bem como o do

professor; organizar a rotina do mês considerando as ações de fomento à leitura; criar

ambiente social favorável à leitura; valorizar e implementar práticas pedagógicas que

61

estimulem o prazer de ler; interagir na comunidade através de ações planejadas pela escola, a

fim de se tornarem coparticipantes do processo de aprendizagem dos comportamentos leitores

dos alunos; estimular e orientar o professor na organização e utilização sistemática dos

cantinhos ou salas de leitura; estimular os professores a criarem momentos de leitura

envolvendo pais e alunos; incentivar os pais a fazerem empréstimo de livros na biblioteca ou

salas de leitura da escola.

A análise dos objetivos elencados para diretores e coordenadores pedagógicos nos

possibilita o entendimento de algumas compreensões que aí se delineiam e se apresentam para

nós como essenciais à consolidação do processo de letramento literário: a primeira diz

respeito à responsabilidade que deve assumir a gestão para que haja o envolvimento da

comunidade escolar no processo de leitura implementado. A inclusão dos gestores como

sujeitos leitores, os quais precisam, também, ampliar o próprio repertório leitor, coloca-os

como participantes efetivos do projeto de leitura e não meros organizadores das

atividades/ações do projeto. Ou, ainda, como seres alheios ao processo de leitura

desenvolvido por entender que esta é responsabilidade de professores e alunos como

comumente acontece nas escolas.

Pressupõe-se, assim, que ler e escrever são tarefas de toda a comunidade escolar,

considerando, como afirma Kleiman (2008, p. 20), que a escola é, na contemporaneidade, a

“mais importante das agências de letramento”. Portanto, como agência de letramento carece

de inserir-se nas práticas de letramento, responsabilizando-se por este processo, tomando-o

para si.

Uma outra compreensão perceptível na análise destes objetivos é sobre a importância

de se criar um ambiente favorável à leitura, uma vez que a relação com a leitura pressupõe o

contato com os livros, com suportes textuais diversos, com a manipulação dos objetos

portadores de escrita e a convivência com adultos leitores. A ambientação por meio de

cartazes motivadores de indicação literária ou propagandas de livros; organização de cantos e

salas de leitura, constitui-se numa necessidade precípua para concretização do letramento

literário na escola. De acordo com Cosson (2009):

O letramento literário requer o contato direto e constante com o texto

literário. É, aliás, esse o sentido básico do letramento literário. Sem esse

contato, a vivência da literatura não tem como se efetivar. À escola e ao

professor cabe, pois, disponibilizar espaços, tempos e oportunidades para

que esse contato se efetive. Com isso, a escola precisa oferecer biblioteca

com acervo literário incentivador, banco de textos, sala de leitura ou, pelo

menos, uma estante em sala de aula onde o aluno possa manusear obras

literárias. (COSSON, 2009, p.74).

62

Nesse mesmo sentido, Nanci Gonçalves da Nóbrega (2005, p. 129), ao pontuar linhas

de ação para dinamizar acervos, propõe: (...) proporcionar concretamente ambiência de

leitura, por meio da criação de espaços agradáveis para o convívio com livros e demais

suportes de leitura e diversidade de linguagens (tapetes, almofadas, cadeiras de balanço,

cestos com revistas e livros, cores, etc.). A criação da ambiência leitora é sem dúvida uma

forma de motivação para a leitura. Como afirma Chartier (1994), “a leitura não é apenas uma

operação abstrata de intelecção; ela é engajamento do corpo, inscrição num espaço, relação

consigo e com os outros” (p. 16). Importante, portanto, que a escola esteja impregnada pela

leitura, não apenas no discurso oral ou no texto escrito dos projetos, planos e propostas

pedagógicas, mas nas veias deste espaço, nas ações desenvolvidas e nas atitudes dos sujeitos

deste contexto.

Ana Maria Machado (2011, p. 22) faz uma crítica à forma como se realiza a leitura de

literatura na escola, em que as atividades se concentram em leituras obrigatórias

acompanhadas por questionamentos sem sentido, “perguntas policialescas”, como diz ela.

Dessa forma, ao invés de aproximar o aluno da leitura, instigando-lhe o gosto, a leitura torna-

se atividade enfadonha, distanciando o aluno do encontro prazeroso com esta experiência

estética. Esta dificuldade dos professores em relação ao trabalho com a leitura de literatura

vincula-se às ausências de contato com a literatura na trajetória de vida e no percurso

formativo do professor. Para Machado (2011),

A formação de professores não lhes dá a oportunidade de ter contato com a

experiência estética, de apreciar em si mesmos os efeitos do convívio com as

artes, de vivenciar as emoções intensas e densas que elas podem lhes

propiciar, de sentir o arrepio do encontro súbito com o lampejo de beleza

criado pelas obras artísticas ou a exaltação de ir aos poucos descobrindo pelo

exercício da inteligência a complexa rede de significações que um texto pode

ter. (...). Em sua capacitação profissional, num país onde já não havia livros

nem leitores em casa, esses professores não têm oportunidade de se

converter em leitores nem de descobrir a literatura com a intensidade de seu

efeito mobilizador emocional e intelectual. Além de tudo, estão inseridos

num sistema em que raramente os diretores, coordenadores, funcionários das

secretarias de educação costumam ler para si mesmos, para sua própria

fruição de algo bom a que têm direito. (MACHADO, 2011, p. 23).

Ousamos dizer que a nossa cultura escolar não é uma cultura de leitura, de acesso aos

livros como patrimônio cultural e intelectual necessário à experiência literária do sujeito. A

escola ainda prioriza o conteúdo específico de cada disciplina dentro dos moldes positivistas,

da fragmentação e do enclausuramento científico. Sendo as experiências estéticas relegadas a

63

segundo plano, de forma que os cursos de formação de professores ou as capacitações

profissionais não incluem a experiência literária em seus conteúdos (mesmo quando se trata

do curso de Letras), nem tão pouco disponibilizam tempo para essa vivência.

Evidencia-se, assim, um distanciamento dos discursos, que enfatizam a importância da

leitura e a ausência do interesse dos alunos por esta atividade, das práticas nas instituições em

que estamos inseridos. Apregoamos a leitura, mas não incorporamos essa vivência à prática.

Solicitamos aos alunos que leiam quando nós mesmos, como professores ou gestores

escolares não dispomos de tempo, nem interesse pela leitura. Na maioria das vezes, não fomos

despertados por ela, provocados por esta experiência.

Outra compreensão importante que se esboça refere-se aos objetivos que se referem à

valorização e implementação de práticas pedagógicas que estimulam o prazer de ler e da

organização da rotina escolar, considerando as ações de fomento à leitura. Entendemos haver

nestas escritas uma integração da leitura à práxis pedagógica de forma que as ações

desenvolvidas através do PIL fazem-se constituintes do processo pedagógico, partes, portanto,

do projeto educativo e, não, atividade esporádica ou produto de um projeto pontual. A leitura

está no centro das atividades pedagógicas, como atividade que inclui a comunidade escolar e é

incluída na práxis desenvolvida e não como apêndice de conteúdo ou para ocupar tempos e

espaços vazios que por acaso surjam no cotidiano escolar, como ocorre em muitos contextos

escolares. Conforme Cruz (2012):

O aluno terá maiores chances de ser bom leitor se a escola contribuir

construtivamente para recuperar a leitura como fruição de texto. Esse

exercício de leitura é uma forma de interlocução gratuita que se define por

não pretender controlar resultados que os alunos tenham a dar. Para que esse

exercício de leitura se tornasse realidade na escola brasileira faz-se

necessário que as bibliotecas tenham um acervo diversificado; que os

professores não transformem em obrigação o que deve ser prazer e, que a

preocupação da organização pedagógica seja com a aprendizagem cultural e

não apenas com a informativa. (CRUZ, 2012, p. 60).

Há, pois, uma necessidade com a organização pedagógica do espaço escolar para que,

de fato e não apenas na fala, a aprendizagem da leitura se processe, se efetive. Um

compromisso de todos, mas, principalmente, da escola através da gestão escolar em promover

um espaço propício de interação com os diferentes suportes textuais, um ambiente letrado e

uma política pedagógica comprometida com a leitura.

O documento Indicadores da Qualidade de Formação de Leitores elenca os seguintes

objetivos para os professores:

64

i. Desenvolver comportamentos leitores vinculados à prática de leitura de

textos literários, como apreciar textos lidos/ouvidos, interessar-se por

ampliar seu repertório de obras literárias conhecidas,

indicar/recomendar livros e leituras;

ii. Aumentar o número de textos disponíveis e a variedade de gêneros

textuais em uso;

iii. Intercambiar experiências leitoras entre os colegas e equipe pedagógica;

iv. Apropriar-se do acervo da escola e selecionar acervos de livros

adequados a cada faixa etária;

v. Sensibilizar pais e alunos sobre a importância da leitura e estimular o

gosto pela mesma;

vi. Difundir obras literárias estimulando suas leituras, bem como

aprofundar o conhecimento sobre seus autores;

vii. Ler diariamente para os alunos com diferentes propósitos;

viii. Possibilitar o acesso a diferentes materiais de leitura e as ações de

estímulo ao comportamento leitor;

ix. Promover a leitura, assumindo-a como fator de desenvolvimento

individual e coletivo;

x. Recorrer à tecnologia para promover o acesso ao livro;

xi. Estimular a diversificação das atividades de leitura e a informação sobre

livros e autores;

xii. Oportunizar a leitura e o contato com livros;

xiii. Proporcionar o aumento do repertório de histórias conhecidas pelos

alunos;

xiv. Compartilhar suas impressões sobre as histórias lidas, favorecendo aos

alunos a manifestação de ideias e sentimentos

xv. Interagir na comunidade através de ações planejadas pela escola, a fim

de se tornarem coparticipantes do processo de aprendizagem dos

comportamentos leitores;

xvi. Envolver os alunos em atividades em que a leitura seja significativa,

despertando-lhes o desejo de aprender a ler;

xvii. Motivar os alunos para a construção de sentidos do texto ampliando o

contexto cultural dos mesmos. (ICEP, 2013, p. 3).

65

Percebemos que os objetivos específicos elencados para os professores comungam

com o pensamento de Bortoni- Ricardo (2010, p. 16), o de que o professor é, por definição,

um agente de letramento. Ao responsabilizar o professor por “desenvolver comportamentos

leitores”, “promover a ampliação de práticas leitoras”, “a leitura e o contato com livros”,

enfatiza-se a compreensão do professor como agente social que mobiliza o grupo para o

trabalho com a leitura. Concordamos com a responsabilidade que tem e deve ter o professor

nas propostas de letramento literário. No entanto, ressaltamos o cuidado que é preciso ter para

que não se responsabilize o professor pelo fracasso ou sucesso de todo o processo,

desconsiderando outros sujeitos e fatores implicados na concretização de propostas de leitura.

Para Paulino e Cosson (2009), uma das práticas que ajudam a concretizar o letramento

literário na escola é a interferência crítica do professor:

[...] ou seja, o papel a ser cumprido pelo professor na formação do aluno, na

educação literária. Trata-se da formação do gosto, desde que não seja

entendida como mero refinamento, mas sim como a aprendizagem da cultura

literária. Mais precisamente, é o trabalho de construção do repertório do

aluno que envolve o conhecimento da literatura como sistema cultural ou,

ainda, a consciência de que possuímos um patrimônio cultural que deve ser

reconhecido, conhecido e trabalhado como ponto de partida para a formação

de um repertório literário personalizado, ligando as atividades escolares a

vida social e à sua história. [...] a interferência crítica do professor é

fundamental para que os alunos ampliem sua competência de leitura, lendo

textos culturalmente significativos e entendendo o que os faz significativos.

(PAULINO; COSSON, 2009, p. 75).

Uma outra percepção que temos dos objetivos do PIL elencados para os professores é

que existe um diálogo entre esses objetivos. Ao apropriar-se do acervo da escola para

selecionar livros adequados a cada faixa etária, por exemplo, o professor necessita

desenvolver sua própria constituição de sujeito leitor, dessa forma, amplia o seu repertório de

leitura e, consequentemente, o dos alunos. Sendo este um dos requisitos do letramento

literário: a atualização do universo literário do sujeito leitor. Conforme Lajolo (2008), os

profissionais mais diretamente responsáveis pela iniciação na leitura devem ser bons leitores.

Um professor precisa gostar de ler, precisa ler muito, precisa envolver-se com o que lê.

(LAJOLO, 2008, p. 108).

Alguns objetivos apresentam-se, a nosso ver, como provocações cruciais, por

exemplo, quando se propõe ao professor difundir obras literárias estimulando suas leituras e

compartilhar suas impressões sobre as leituras feitas. Esta afirmação implica a existência de

um sujeito leitor e uma práxis leitora. Pois, o professor só poderá difundir uma obra literária

se tiver conhecimento desta obra, se tiver estabelecido contato e envolvimento, não de forma

66

obrigatória, mas de forma afetiva. Há, portanto, aí uma provocação para que os objetivos

sejam assumidos pelo professor como constituinte desse sujeito que lê e, assim, ganha

autoridade para propor e compartilhar leituras e estimular outros a se constituírem leitores.

Petit (2010, p. 141) pontua que o que atrai a atenção da criança é o interesse profundo que os

adultos têm pelos livros, seu desejo real, seu prazer real.

Por outro lado, entendemos que não basta elencar objetivos que colocam o professor

como agente mediador, instigador de leituras. É necessário que a escola crie tempos para que

este sujeito amplie suas leituras, constitua-se como leitor. E como agente mediador faz-se

mister alargar sua compreensão teórica sobre leitura e letramento, sob pena de, distanciado

destes conhecimentos e de uma constituição leitora, exercer o papel de mero falador de obras.

Para Cruz (2012), ler deve ser uma conflagração de trocas de leituras. A autora destaca a

necessidade de se pensar com urgência a mudança na cultura da escola para a aquisição de

uma política de leitura que mantenha o docente comprometido com a construção do seu

próprio conhecimento e com a transformação do seu ser no mundo através do prazer de estar

com o texto. (CRUZ, 2012, p. 67).

Dessa forma, ao compreender seu papel e a relevância da prática da leitura, o professor

assume-se como agente imprescindível no processo do letramento literário. Tem, portanto,

como requisitos básicos para desempenhar esse papel a condição precípua de ser ele próprio

leitor literário e estar em constante processo formativo, seja no que se refere à sua

constituição leitora, seja no que se refere à fundamentação teórica e metodológica, tão

necessárias à função de agente de letramento. O professor como agente de letramento literário

cumpre o papel de instigador e mediador de leituras. Conforme Kleiman,39

[...] boas perguntas – inferenciais, críticas – são essenciais. E quanto mais

cedo melhor, para aproveitar o entusiasmo, a curiosidade, a criticidade com

que a criança chega à escola. O conceito de mediação semiótica de Vygotsky

(1984) outorga ao professor, como mediador, um papel central na co-

construção do saber. O sentido do mediador – aquele que está no meio – é

daquele que exerce um papel intermediário entre dois interessados numa

negociação, naquele que arbitra. Por isso eu prefiro a imagem do professor

como agente de letramento que, como todo agente social, mobiliza o grupo

para um objetivo comum num trabalho que tem dimensões políticas

importantes. (KLEIMAN, 2006).

Como agente de letramento, o professor não pode ser um mero intermediário de

saberes, mas um coautor do processo dialógico que estimula o aluno a elaborar questões que o

39Keiman (2007).

67

levem a uma compreensão mais ampla e significativa da leitura. Como afirma Vygotsky

(1998), todo processo de desenvolvimento cognitivo se dá na interação entre sujeitos.

Petit (2010) destaca que o iniciador ao livro desempenha um papel-chave. Assim, o

iniciador de livros é aquele ou aquela que pode legitimar um desejo de ler que não está muito

seguro de si. Aquele ou aquela que ajuda a ultrapassar os umbrais de diferentes momentos do

percurso. Seja profissional ou voluntário, é aquele ou aquela que acompanha o leitor no

momento, por vezes tão difícil, da escolha do livro. Aquele que dá oportunidade de fazer

descobertas, possibilitando-lhe mobilidade nos acervos e oferecendo conselhos eventuais sem

pender para uma mediação do tipo pedagógica”. (PETIT, 2010, p. 174-175). O mediador é

chamado por Petit de iniciador de livros e sua função é auxiliar a ultrapassar os diferentes

umbrais que surgirão no itinerário de leitura do indivíduo.

Comungando com Bortoni-Ricardo (2010), de que a mediação de outra pessoa,

normalmente mais experiente, pode levar o aluno a realizar a internalização da atividade, isto

é, a reconstruir internamente os processos construídos através da interação com o outro. O

gosto pela leitura não pode surgir da simples proximidade material com os livros. Um

conhecimento, um patrimônio cultural, uma biblioteca podem se tornar letra morta se

ninguém lhes der vida. Se a pessoa se sente pouco à vontade em aventurar-se na cultura

letrada devido à sua origem social, ao seu distanciamento dos lugares do saber, a dimensão do

encontro com um mediador, das trocas, é essencial. (BORTONI-RICARDO, 2010, p. 171).

Chama a atenção o objetivo “recorrer à tecnologia para promover o acesso ao livro”.

Interpelamos se o entendimento de literatura esboçada nesse objetivo limita-se à compreensão

da literatura ao suporte livro, pois entendemos que este é ainda um ranço presente na

compreensão pedagógica quando situamos a literatura no contexto da revolução digital. Como

professores de literatura, ainda nos desassossegamos com a amplitude que o texto escrito

ganha neste novo contexto.

No contexto da contemporaneidade, é imprescindível o entendimento de que os

processos de leitura estão imbricados com a linguagem digital. Portanto, a literatura não pode

ser associada apenas à página impressa, realiza-se por e em diferentes suportes. Como salienta

Petit (2010), a verdadeira democratização da leitura é poder ter acesso, se desejarmos, à

totalidade da experiência da leitura, em seus diferentes registros. Dessa forma, é importante

pensarmos que o letramento literário se consolida mediante diferentes interações e suportes

textuais e não apenas pelo livro. Atentar para essas questões ainda limitantes em relação à

leitura e suas diversas formas de realização significa construirmos caminhos que possibilitem

à escola efetivar propostas de letramento literário a partir de diferentes suportes.

68

Em relação aos alunos são destacados os seguintes indicadores de qualidade da

formação de leitores:

i. Desenvolver os comportamentos leitores para ampliar o repertório

cultural;

ii. Aumentar o repertório de textos conhecidos;

iii. Construir o hábito de ouvir histórias, sentindo prazer e demonstrando

envolvimento;

iv. Frequentar a biblioteca escolar ou salas de leitura, valorizando o acervo,

manuseando livros e solicitando o empréstimo de livros;

v. Ampliar o repertório literário por meio da leitura diária e do acesso a

textos;

vi. Desenvolver habilidades de investigar, estabelecer relações,

argumentar, justificar dentre outras;

vii. Estabelecer conexões entre o texto e os conhecimentos prévios,

vivências, crenças e valores;

viii. Utilizar os textos literários como uma possibilidade de apreciarem e

refletirem a respeito das experiências humanas;

ix. Trocar impressões com outros leitores a respeito dos textos lidos

através da participação em discussões em grupo e debates.

x. Recontar histórias ouvidas, lidas ou inventadas de modo a suscitar o

interesse dos outros interlocutores. (ICEP, 2013, p. 4).

Entendemos que, ao corresponsabilizar toda escola pelo compromisso com a leitura,

retira-se dos ombros do professor a carga de assumir a responsabilidade integral com a

formação do leitor e, do aluno, o peso da obrigação de ser um leitor pronto, formado,

constituído. Ao pressupor uma constituição do sujeito leitor, portanto, em processo contínuo

de formação, evidencia-se a necessária interação deste aluno com os demais sujeitos desse

processo e com as diferentes situações e conhecimentos para sua constituição leitora.

Ao assumir-se como partícipe, identificando-se com ele, afetado pelas interações

proporcionadas pela escola e corresponsabilizado pela sua constituição como sujeito leitor, o

aluno assume um posicionamento mais compromissado e interativo em relação ao processo de

leitura. Conforme Todorov:

69

Encorajar a leitura por todos os meios – inclusive a dos livros que o crítico

profissional considera com condescendência, se não com desprezo, desde Os

Três Mosquiteiros, até Harry Potter: não apenas esses romances populares

levaram milhões de adolescentes, mas, sobretudo, lhes possibilitaram a

construção de uma primeira imagem coerente do mundo, que, podemos nos

assegurar, as leituras posteriores se encarregarão de tornar mais complexas e

nuançadas. (TODOROV, 2012, p. 82).

Dessa forma, o aluno posiciona-se como um ser ativo no processo do letramento

literário desenvolvido na escola; aproximando-se da leitura como uma aprendizagem

instigante e, inclusive, prazerosa; despertando o gosto pela leitura e desenvolvendo

comportamentos que ampliem sua capacidade leitora e seu repertório cultural. Como adverte

Solé (1998), não se deve esquecer que interesse também se cria, se suscita e se educa e que,

em diversas ocasiões, ele depende do entusiasmo e da apresentação que o professor faz de

uma determinada leitura e das possibilidades que seja capaz de explorar. (SOLÉ, 1998, p. 43).

Para Neves (1998), a inserção do aluno no universo da cultura letrada desenvolve a

habilidade de dialogar com os textos lidos, através da capacidade de ler em profundidade e

interpretar textos significativos para a formação de sua cidadania, cultura e sensibilidade. Isso

pode significar a ampliação do acesso e do diálogo com uma diversidade de textos e leituras.

Conforme assinala Soares (2008), a escola deve formar o leitor da ampla variedade de textos

que circulam nas sociedades grafocêntricas em que vivemos. Enfatiza a autora:

É função e obrigação da escola dar amplo e irrestrito acesso ao mundo da

leitura; e isto inclui a leitura informativa, mas também a leitura literária, a

leitura para fins pragmáticos, mas também a leitura de fruição; a leitura que

situações da vida real exigem, mas também a leitura que nos permita escapar

por alguns momentos da vida real. (SOARES, 2008, p. 33).

Sendo assim, não serve qualquer projeto de leitura, mas um projeto comprometido

com as questões sociais, estéticas, culturais e históricas, que tenha como objetivo maior a

constituição de um sujeito leitor, crítico e ativo frente à leitura dos textos com os quais se

defronta e com a leitura do mundo no qual está inserido, sob pena de formarmos leitores

passivos, acríticos, meros decodificadores domesticados à lógica mercadológica que rege as

instituições.

Todorov (2012, p. 11) reivindica que o texto literário volte a ocupar o centro e não a

periferia do processo educacional e da nossa formação como cidadãos. Dessa forma, é

fundamental pensarmos se os tempos para a leitura estão tambémassegurados. É preciso

incluir na escola momentos nos quais o conteúdo da leitura tenha tanta relevância quanto os

conteúdos didáticos de cada disciplina, pois nenhum projeto de leitura, por mais bem

70

elaborado que seja, será válido, exequível, se os tempos institucionais para a atividade da

leitura também não forem concebidos.

De acordo com Dionísio (2014), a única interação promovida pela literatura seria a de

responder a perguntas por outros colocadas e propõe, a partir de Freebody e Luke (apud

Dionísio, 2014), um projeto de formação de um leitor que tome parte de forma fluente, eficaz

e crítica nos múltiplos eventos textuais e discursivos, um sujeito cosmopolita. Sobre este

projeto de formação do leitor cosmopolita, Dionísio assinala:

Uma escolarização que considere as condições sociais, históricas,

econômicas e culturais de produção e interpretação; práticas que requerem

dos alunos a capacidade de identificar e especular sobre as agendas

institucionais, ideologias, agentes e agências por detrás do texto, bem assim

como a falar dos seus (e dos outros) pontos de vista sociais, culturais, éticos

e estéticos, projetos comuns, recursos e posições culturais. (...) neste projeto

de construção escolar do leitor cosmopolita, aspira-se a que os textos, todos

os textos, estejam a serviço dos jovens alunos e dos seus professores, sem

exclusões, nem comparações. Isto, obviamente, só será possível se o que se

quiser promover for o indivíduo e não, em primeiro lugar o livro ou a leitura.

(DIONÍSIO, 2014, p. 82).

O projeto de constituição do leitor precisa, portanto, estar implicado com a criticidade,

com os diferentes pontos de vistas, incluindo-se aqueles que, ao longo da história, foram

desvalorizados, marginalizados ou mesmo excluídos dos discursos, numa compreensão mais

ampla de que a formação do sujeito humano é o cerne de todo esse processo.

Do lugar de quem vivenciou essa experiência de leitura através da implementação e

acompanhamento das ações do PIL, durante três anos como supervisora pedagógica na rede

municipal, entendemos que, embora o aluno leitor apresentado nos documentos seja um

sujeito partícipe de uma proposta formativa coletiva, nem sempre no desenvolvimento dos

processos de letramento é esse aluno leitor que se configura. Existe esse sujeito que se

constitui leitor, envolve-se com a experiência da leitura e interage com outros sujeitos leitores,

mas ainda não tem voz nas indicações de leitura, insere-se nos projetos de maneira acanhada,

realiza leituras solicitadas pelo professor em um processo de interação limitado e responde à

proposta do projeto como um coadjuvante. Dessa forma, entendemos que há fragilidades na

concepção de leitura dos envolvidos no projeto (coordenador pedagógico, professor) e na

forma de gestão do trabalho pedagógico que, ao invés de aproximar o aluno da leitura, o

mantém distanciado e, às vezes, até resistente a ela.

Os objetivos específicos para os funcionários destacam o ato de ler frequentemente,

valorizando os espaços de leitura e interação nas ações planejadas pela escola, a fim de se

71

tornarem coparticipantes do processo de aprendizagem dos comportamentos leitores. Ao

elencar os objetivos para a comunidade, pontua-se a participação nos momentos de leitura na

escola, a colaboração com a escola no desenvolvimento do Projeto Institucional de Leitura e a

corresponsabilização pelo processo de aprendizagem dos comportamentos leitores dos alunos.

Conforme já salientamos, a inclusão dos diferentes sujeitos envolvidos no processo educativo,

na responsabilização destes pelo desenvolvimento do projeto de leitura promove uma

interação maior e um compromisso e envolvimento de todos na concretização do letramento

literário.

Quando funcionários e pais assumem-se como partícipes desse processo, integrantes

efetivos do projeto, responsabilizando-se pelas aprendizagens dos comportamentos leitores

dos alunos, interagindo, dialogando com eles sobre leituras e livros há uma promoção do

letramento literário e uma ampliação das práticas leitoras que se estendem além dos muros

escolares e do processo de escolarização da leitura. Evidencia, assim, um movimento coletivo

em torno da leitura e da proposta pedagógica da escola.

Yunes (2003) pontua que o movimento desencadeado pela literatura, de natureza

catártica, mobiliza os afetos, a percepção e a razão convocados a responder às “impressões”

deixadas pelo discurso, cujo único compromisso é o de comover o leitor, de tirá-lo de seu

lugar habitual de ver as coisas, de fazê-lo dobrar-se sobre si mesmo e descobrir-se um sujeito

particular. O processo não é tão simples e rápido, mas, uma vez desencadeado, torna-se

prazeroso e contínuo. (YUNES, 2003, p. 27).

Acreditamos que a corresponsabilização de todos os sujeitos do contexto escolar,

incluindo-se aí os pais e a comunidade do entorno, imprime ao PIL um diferencial importante.

Ao assumirem-se como partícipes efetivos do projeto, cada um é provocado a assumir

também sua constituição leitora, pois dela depende a constituição de todos os outros sujeitos

envolvidos no projeto. Percebemos, portanto, que se responsabilizando pela sua constituição

leitora e corresponsabilizado pela constituição leitora dos demais, desencadeia-se um

movimento de busca pela autoformação, independente da trajetória de vida de cada um com

relação à leitura. É assim que, muitas vezes, pais com pouco domínio da cultura letrada,

contribuem significativamente para a aproximação de seus filhos com a leitura da literatura

quando se propõe, por exemplo, a lerem capítulos ou fragmentos de textos em casa ou na

escola junto com os filhos. Ou, contam “causos” em momentos de leitura criados pela escola.

Assim, entendemos que o PIL é uma proposta de letramento literário que traz

contribuições significativas ao contexto do município. Obviamente, com lacunas,

ambiguidades e contradições, uma vez que estamos no terreno das complexidades inerente ao

72

processo da leitura. Sigamos perscrutando criticamente a materialização do PIL a partir das

práticas de leitura desenvolvidas nas escolas da rede municipal.

73

5 A TESSITURA DE UMA REDE LEITORA: ESTRUTURAÇÃO E

FUNCIONAMENTO DO PIL EM PINDOBAÇU

A escola enche o menino de matemática, de geografia, de linguagem,

sem via de regra, fazê-lo através da poesia da matemática, da

geografia, da linguagem. A escola não repara em seu ser poético, não

o atende em sua capacidade de viver poeticamente o conhecimento e

o mundo(...). O que eu pediria à escola, se não me faltassem luzes

pedagógicas, era considerar a poesia como primeira visão direta das

coisas, e depois como veículo de informação prática e teórica,

preservando em cada aluno o fundo mágico, lúdico, intuitivo e

criativo, que se identifica basicamente com a sensibilidade poética.

(Drummond, 1988)

A parceria da rede municipal de Pindobaçu com o Instituto Chapada de Educação e

Pesquisa (ICEP) trouxe para a educação da cidade um novo olhar sobre a leitura. Se antes a

compreensão de leitura vinculava-se à mera decodificação do signo linguístico, pensada e

trabalhada na escola como complementação ao exercício da escrita, a partir do PIL essa

compreensão amplia-se. Embora leitura e escrita constituam-se processos imbricados, a

leitura na escola, a partir da implementação do PIL, passa a ser compreendida sob outra

perspectiva que não somente a de ler para reproduzir o lido no papel ou ler para dizer o que

está escrito, ou seja, a leitura apenas em função da escrita, do ato de escrever. Há uma

percepção de que a incorporação de práticas leitoras à rotina das escolas municipais

reverberou em toda a práxis educativa, na formação de novos hábitos, incentivo à leitura de

literatura por parte de professores, alunos, pais e funcionários da escola.

O que ao nosso ver apresenta-se como um alargamento da compreensão de leitura e

como um passo importante para tarefa tão complexa que é pensar a leitura. Conforme

sublinha Yunes (2003), a partir da escrita de Christopher Lasca, reconceituar a leitura e suas

implicações envolve novas variáveis que enlaçam questões teórico-epistemológicas da

interpretação e abordam a produção de sentido em práticas culturais, políticas e éticas

nitidamente imbricadas no tecido da vida social.

A partir da implementação do PIL, as escolas passaram a ressignificar os espaços de

aprendizagem, agregando à suas rotinas rodas literárias e a leitura realizada pelo professor.

Atividades de leitura que antes não aconteciam nas escolas pois, na maioria das escolas

municipais, até então, os únicos momentos destinados à leitura era a leitura do livro didático

para resolver questões ou a leitura dos conteúdos disciplinares no quadro negro. Depois da

implementação do PIL nas escolas, segundo os diretores escolares e coordenadores

74

pedagógicos, percebe-se, claramente, um movimento de leitura dentro da escola que já

ultrapassa os muros escolares ganhando as calçadas, ruas, rios e feiras do município.

Um exemplo desse movimento é a atividade de leitura do Projeto “Poesia na Calçada”.

O projeto desenvolveu-se em todas as escolas do fundamental I da rede municipal no ano de

2014, em cada escola as ações leitoras ganharam singularidades adequando-se ao contexto

sociocultural das comunidades em que estão inseridas. A atividade de leitura realizada, por

exemplo, na zona rural, no povoado do Marcelo desenvolveu-se à beira do rio dessa

localidade. Dado o hábito das pessoas nas cidades do interior, sentarem-se nas calçadas para

conversarem, na sede do município a leitura de poesias é realizada nas calçadas para os

moradores. Na zona rural, as pessoas do local não costumam sentar nas calçadas para

conversarem, as prosas acontecem em torno de determinadas atividades comunitárias como a

quebra do licuri, a colheita e abano do feijão, a farinhada nas casas de farinha ou a lavagem de

roupas no rio. No distrito do Marcelo, as mulheres se reúnem para lavar roupas no rio

Itapicuru, enquanto lavam e quaram as roupas, conversam (proseiam, como elas dizem) e

cantam, ao tempo em que as crianças brincam na água ou estão na escola.

A partir do desenvolvimento do projeto “Poesia na Calçada” pela escola municipal de

Marcelo, as lavadeiras foram surpreendidas pela visita dos alunos (filhos) declamando textos

poéticos à beira do rio em que as mulheres reúnem-se para lavar roupas e prosear. A recepção

foi maravilhosa, muitas choraram ao rememorarem de quando eram crianças e a mãe

declamava ou “dizia versos” para elas. E outras, inclusive, integraram-se à atividade dizendo

(declamando) versos aprendidos na infância.

A ação leitora desenvolvida pelo projeto evidencia um movimento importante

desencadeado a partir da leitura de poesia. Uma significação dos textos por parte dos

envolvidos na leitura que propiciou um diálogo cultural entre duas gerações. Esse diálogo

possibilitado pela leitura da literatura através da poesia instiga-nos a pensar como as ações de

leitura desenvolvidas na escola podem ampliar-se a partir da inserção das manifestações

culturais locais, e o quanto outras leituras das tradições culturais dos contextos locais podem

ser incorporadas àquelas do repertório escolar. Pois, se entendermos que o PIL tem muito o

que compartilhar e socializar com a comunidade de entorno também é certo que esta

comunidade tem contribuições culturais singulares que podem dialogar significativamente

com o contexto escolar, de modo particular aqui, com as leituras aí realizadas. Nesse sentido,

Colomer (2007), citando Casarini e Federicis sobre o valor da literatura como construção

cultural, destaca:

75

A literatura é sentida como uma das formas em que se auto-organiza e se

auto representa o imaginário antropológico e cultural, um dos espaços em

que as culturas se formam, se encontram com outras culturas, as absorvem,

pretendem confrontar-se ou conquista-las; ou bem elas desenvolvem, no seu

interior, modelos alternativos aos existentes, ou criam modelos e imagens do

mundo que, através da retórica da argumentação e da persuasão, tratam de

impor-se aos diferentes estratos de público que configuram o tecido social.

(...) a literatura oferece importantíssimos suportes e modelos para

compreender e representar a vida interior, os afetos, as ideias, os ideais, as

projeções fantásticas e também, modelos para representarmos nosso passado,

o de nossa gente, e o dos povos, a história. (COLOMER, 2007, p. 29).

Uma outra mudança perceptível após a implementação do PIL na rede municipal diz

respeito às salas de leitura das escolas que hoje funcionam em sua grande maioria como

bibliotecas. A maioria das salas eram arquivos de livros amontoados, guardados a sete chaves

e desvinculados da prática pedagógica escolar e dos sujeitos da escola. A implantação do PIL

incentivou algumas escolas a reconfigurarem este espaço, vinculando-o à ação educativa e

provocando os sujeitos do contexto escolar a visitá-los e fazer uso do patrimônio material e

cultural aí disponibilizado.

De acordo com diretores e coordenadores pedagógicos, esses espaços estão sendo

visitados com mais frequência. Percebe-se um movimento de leitura na escola que está

adentrando essas salas de leitura. Livros antes encaixotados estão nas mãos dos alunos. “Os

livros estão perdendo a poeira e ganhando o suor das mãos de quem por direito deve folheá-

los, lê-los, tocar e desejar ser tocados pela literatura”, relata uma coordenadora pedagógica.

Há, pois, uma dinamização dos acervos das salas de leitura viabilizada pelo PIL. Esse

movimento de leitura em torno dos livros se apresenta como algo significativo dentro de um

contexto social marcado pelas ausências materiais e culturais de biblioteca e de acervos

literários nas escolas municipais.

O PIL estrutura-se através de um movimento em cadeia que mobiliza gestor escolar,

coordenador pedagógico, docentes, alunos e funcionários da escola. E daí estende-se para a

comunidade em torno da escola a partir do compartilhamento da vivência leitora e das

atividades de leitura desenvolvidas no espaço escolar. Para tanto, mobilizam-se ações de

corresponsabilidade em torno de três dimensões, conforme esquematizado a seguir:

76

Figura 2 - Dimensões do PIL na Gestão Escolar

Fonte: Elaboração da própria autora.

No segmento do ensino fundamental I, as discussões sobre leitura estão inclusas nas

pautas dos formadores externos do ICEP, profissionais que atuam como formadores na rede

Chapada, responsáveis pelo encaminhamento das formações pedagógicas no município. Nos

encontros formativos destinados a formação continuada dos professores, inclui-se a discussão

sobre a importância de incorporar os projetos de leitura às rotinas escolares.

A partir de um referencial teórico previamente definido pelo formador40, as discussões

são realizadas e as ações a serem desenvolvidas nas escolas encaminhadas pelos

coordenadores pedagógicos e gestores de cada unidade escolar. Os coordenadores

pedagógicos e gestores escolares, por sua vez, sensibilizam o corpo docente, fomentam a

discussão teórica e orientam a escrita dos projetos de leitura (PIL) a serem implementados

pela escola.

No ensino fundamental II, a discussão teórica e a escrita dos projetos são

desenvolvidas pelo Supervisor Técnico no espaço de formação dos coordenadores

pedagógicos, uma vez que não há neste segmento formador externo. Cabe aos coordenadores

pedagógicos desenvolverem no espaço/tempo da escola destinado ao planejamento do

professor as discussões teóricas e implementação dos projetos junto à comunidade escolar.

40 Andar entre Livros (Teresa Colomer), Formação do Professor como Agente Letrador (Bortoni-Ricardo), Ensinar: tarefa

para profissionais (Lerner) são os referenciais mais utilizados.

77

A disponibilização de tempos pedagógicos para efetivação desta proposta é

fundamental. Dessa forma, os coordenadores pedagógicos dispõem de 8horas semanais de

planejamento pedagógico com a Supervisão Técnica e, das 25horas/aulas41 semanais da carga

horária dos professores, 5 horas/aulas são destinadas ao planejamento pedagógico dos

professores nas unidades escolares, o que possibilita uma coesão nas ações pedagógicas,

viabilizando a implementação do PIL. Em todos estes espaços formativos convencionou-se a

realização das formações leitoras42 no início ou no decorrer da atividade formativa.

Denomina-se formação leitora o momento de leitura realizado no início de todas as

atividades formativas da rede em que são lidos textos, capítulos ou fragmentos de livros

selecionados, inicialmente, pelo formador, supervisor técnico ou coordenador pedagógico e na

sequência dos encontros indicados pelo grupo a partir dos seus interesses, curiosidade de

leitura ou interesse de aprofundamento de determinada obra literária ou da obra de

determinado autor(a). A intenção é provocar um encontro com textos literários diversos,

promovendo a constituição leitora dos sujeitos envolvidos.

A formação leitora objetiva a aproximação dos coordenadores pedagógicos e

professores com textos e autores literários, canônicos ou não, escolhidos pela supervisão

técnica, pelos coordenadores e professores por afinidade; por se constituir em uma leitura

desafiante ou por se tratar de um autor ou texto não conhecido pelo grupo que suscite

curiosidade ou, ainda, como indicação de alguém que já leu e deseja compartilhar/socializar a

leitura. A escolha dos textos, portanto, é orientada por razões diversas relacionadas ao gosto,

interesse pessoal, valor estético atribuído à obra, interesse em conhecer ou aprofundar a

leitura de determinada obra. Dessa forma, as formações leitoras incluem leituras de poemas,

contos, crônicas, capítulos de livros, letras de músicas e obras fílmicas.

A formação leitora inicia-se pelo momento de sensibilizaçãoem que os participantes

são convidados à leitura. Apresenta-se o texto de forma motivadora buscando instigar o

grupo; este também é o momento em que o mediador responsável pela formação leitora expõe

sua relação com a obra escolhida, como se deu o contato com o texto ou autor; normalmente

são invocadas suas memórias afetivas com a obra. Existe uma preparação do ambiente para

este momento através da disposição de elementos relacionados à leitura, fragmentos retirados

dos textos, exposição das obras no tapete literário, nas paredes da sala ou no chão da sala. O

41Essa sistematização na organização dos tempos de planejamento foi uma iniciativa da Secretaria de Educação no ano de

2013. 42As formações leitoras iniciam todos os encontros escolares sejam eles de qualquer ordem: reuniões de pais, reunião entre

gestão e docentes, reunião gestão e discentes, reunião gestão e funcionários, conselhos de classes e encontros formativos.

78

tapete literário é um elemento simbólico de destaque da formação leitora onde se dispõem

textos, obras literárias, fragmentos dos textos, imagens ilustrativas e/ou objetos relacionados à

leitura do dia. São confeccionados de materiais diversos como feltro, palha etc. Ou utiliza-se

tapetes comuns customizados ou não, que ganham elementos da leitura e transformam-se em

tapetes literários. Em algumas escolas os tapetes são constituintes das salas de aulas, pátios ou

áreas comuns. As obras colocadas no tapete literário também ficam disponibilizadas para a

troca literária (quem se interessa em ler, leva a obra e ao devolver tece comentários sobre a

leitura realizada). No tapete literário são ainda colocados livros CDs ou filmes que façam

parte das vivências de leitura dos participantes que no decorrer das formações leitoras serão

socializados.

Os participantes organizam-se em círculos, sentados no chão ou no tapete. Esta

disposição em círculos possibilita que todos sejam vistos, propiciando o diálogo e maior

interação. O tempo destinado à formação leitora é em torno de uma a duas horas. Após

motivação inicial faz-se a leitura do texto, normalmente, em voz alta feita pelo responsável do

dia e acompanhada pelos demais participantes, ou é feita uma leitura silenciosa e depois

compartilhada a partir dos fragmentos que mais chamaram a atenção, destacados pelo leitor-

mediador ou pelo grupo. Às vezes, após a sensibilização inicial, prossegue-se com a leitura

silenciosa e na sequência realiza-se a leitura em voz alta em que cada um lê um parágrafo ou

parte do texto.

Enfim, a dinâmica da leitura é conduzida ou sugerida pelo mediador e aceita ou não

pelo grupo. O mediador conduz a atividade de leitura de modo que aí se estabeleçam diálogos,

compartilhamento e discussão de ideias promovendo a participação de todos. A condução da

atividade de leitura se faz tanto oralmente como por meio de questionamentos escritos de

formas diversas, através de frases de efeito retiradas do texto, questionamentos do autor ou

personagem trazidos para reflexão dos participantes. Ou seja, há uma preocupação em fazer

instigações sobre o lido de forma criativa e desafiadora para que os participantes se sintam

provocados a significar a leitura. Como não existe contato dos integrantes do grupo com o

texto e nem com o autor anterior ao momento da leitura, dependendo do interesse dos

participantes, surge a necessidade de dar continuidade à leitura em outra formação ou

aprofundar o contato com o autor e suas obras.

Os textos utilizados nas formações leitoras, os livros lidos podem ter uma

continuidade nos outros espaços ou não (no planejamento dos professores, salas de aula,

reuniões de pais). Algumas leituras prolongam-se, da leitura de um capítulo para o livro todo,

ou do espaço de formação do coordenador pedagógico para o espaço de planejamento dos

79

professores e destes para os alunos. Como exemplo, citamos a leitura de um capítulo do livro

O Pequeno Príncipe, de Saint-Exupéry que instigou os coordenadores a prosseguirem com a

leitura do livro durante o semestre; ao tempo em que também apresentaram o livro aos

professores e alguns, motivados pela leitura, instigaram os alunos a lerem a obra. A leitura

realizada na escola culminou em diferentes atividades de dramatização, produção de

quadrinhos, charges, sessões de cinema com o filme dentre outras.

Embora não exista uma preocupação com a culminância em forma de um produto final

a ser apresentado, dependendo da prática leitora desenvolvida, algumas produções a partir da

leitura desenvolvida são visíveis e inevitáveis. Como se os leitores precisassem exteriorizar o

que vivenciaram no processo de leitura e não podendo conter o lido apenas dentro de si,

precisassem dessa exteriorização que toma as paredes das salas, os pátios das escolas e até os

palcos.

Ao assumir a responsabilidade pela formação leitora os coordenadores pedagógicos e

professores iniciam, na verdade, um aprendizado de mediar o processo de leitura. Uma vez

que nenhum está na condição de leitor mais experiente, alguns tem uma aproximação maior

com a leitura, mais contato com os livros, mas são iniciantes no processo de mediação, ou

seja, de ler como um ato de construção de sentidos, de significação. Faz-se pertinente

salientarmos que para a maioria dos coordenadores e professores falar sobre uma obra lida, é,

ainda, descrever a narrativa, literalmente. Existe, portanto, uma fragilidade nos processos de

mediação das leituras, relacionada ao repertório leitor ainda limitado dos professores e,

principalmente, ao desconhecimento das bases teóricas sobre leitura e mediação pedagógica.

É dessa forma que entendemos que ao assumir a formação leitora na condição de mediadores

cada um é desafiado, compelido pela própria experiência da leitura a rever, reelaborar sua

concepção sobre o ato de ler.

Pela mediação requerida nesse processo são desafiados, inicialmente, a provocarem os

outros pela leitura que será feita e depois a instigarem sobre o lido. Vão, portanto, se

apropriando do texto, de mecanismos/ estratégias de leitura, promovendo a interação entre o

autor, o texto, e os leitores e assumindo-se como agentes desse processo de letramento. Ao

assumirem o texto como seu, no sentido de que nele se reconhecem, se sentem tocados,

instigam também o grupo a vivenciar e compartilhar suas experiências de leitura. Como

afirma Cosson (2012),

Ler implica troca de sentidos não só entre o escritor e o leitor, mas também

com a sociedade onde ambos estão localizados, pois os sentidos são

resultado de compartilhamentos de visões do mundo entre os homens no

80

tempo e no espaço. (...) Ao ler, estou abrindo uma porta entre meu mundo e

o mundo do outro. O sentido do texto só se completa quando esse trânsito se

efetiva, quando se faz a passagem de sentidos entre um e outro. (COSSON,

2012, p. 27).

Esse processo de mediação assumido pelo grupo apresenta-se como um desafio para

constituição leitora de si mesmo, um desafio de problematizar as leituras realizadas, um

desafio de aprendizagem em dialogar com as obras e com os pares. A mediação provoca

novas percepções, aguça outras compreensões, desestabiliza as certezas, através da

problematização do que foi lido, num processo dialógico e interativo.

Assim, entendemos que o Projeto Institucional de Leitura surge como um chamado da

e para a rede municipal de educação de articular a leitura através de ações leitoras diversas à

prática educativa cotidiana, como um compromisso da escola com a leitura e, de forma mais

específica, como uma iniciativa pedagógica importante de aproximação dos sujeitos com a

literatura. Uma vez que para a maioria dos estudantes a escola se constitui no único espaço

que possibilita o contato com os textos e obras literárias. Na estruturação organogramática da

rede municipal evidencia-se esse processo encadeado:

Figura 3 - Organograma de estruturação da Rede Municipal de Ensino

Fonte: Elaboração própria autora.

A estrutura organogramática a partir da qual se organiza a rede municipal de educação

pressupõe uma formação pedagógica em cadeia. É a partir dessa organização que se dá

também a estruturação do PIL, através do desenvolvimento de algumas etapas, envolvendo os

diferentes sujeitos da comunidade escolar, num movimento encadeado. Assim, passamos a

narrar o desenvolvimento do PIL especificamente no município de Pindobaçu. Pois, embora o

projeto esteja na rede Chapada cada município tem sua forma de estruturação pedagógica

dessa ação.

Inicialmente, nos encontros de formação continuada destinados ao coordenador

pedagógico, implementa-se a formação leitora do grupo sob responsabilidade da supervisão

técnica pedagógica ou do formador do ICEP e, posteriormente, cada um dos componentes do

Supervisor

Técnico

Gestor Escolar Coordenador Pedagógico

C

oordendor

Professor

Alunos

81

grupo assume esta formação leitora. Nesta etapa o grupo de coordenadores sugere e escolhe

os autores e repertório de textos que querem conhecer ou aprofundar nos encontros

subsequentes. Dessa forma, delineiam-se quatro etapas de desenvolvimento do PIL:

Na primeira etapa é realizada a reflexão sobre a importância da leitura através do

estudo da fundamentação teórica que subsidiará a reflexão. As ações leitoras que serão

desenvolvidas na unidade letiva ou semestre são discutidas e analisadas para serem

compartilhadas, discutidas e selecionadas junto com os professores no momento do

planejamento das escolas. Esta é, portanto, a etapa de discussão e resolução inicial dos

encaminhamentos que serão dados para implementação dos projetos de leitura em cada

unidade escolar. Para manter uma sistematização no planejamento do PIL garantindo a

unidade do trabalho da rede municipal, normalmente, a supervisão técnica em decisão

colegiada com coordenação pedagógica e gestores escolares fazem a opção de desenvolver o

mesmo projeto em todas as escolas, ressalvando-se as peculiaridade de cada unidade escolar e

seus diferentes contextos. Dessa forma, mesmo quando toda a rede implementa o Projeto

Poesia na Calçada, por exemplo, cada escola direciona o PIL de forma diferenciada, com

escritas, propósitos e ações, muitas vezes, diferentes.

Cada encontro formativo é iniciado com uma formação leitora realizada pelo

Supervisor Técnico e pelos Coordenadores Pedagógicos. Este momento formativo costuma

acontecer de forma que todos os participantes possam assumir em algum momento a

formação leitora, num movimento cíclico. Ao se responsabilizar pela apresentação e mediação

de uma obra literária o coordenador pedagógico traz para o grupo a sua escolha ou indicação

literária, motivando o grupo a fazer a leitura da obra e compartilhando suas impressões sobre

a mesma bem como, instigando o grupo através do processo de mediação.

Importante salientar que a formação leitora constitui-se em um dos tempos

pedagógicos destinado à leitura, ao contato com os textos literários, porém o processo de

leitura implementado via PIL engloba outros tempos/espaços além deste. Os textos utilizados

nas formações leitoras são crônicas, contos, capítulos de livros, poemas, letras de músicas,

filmes ou partes destes. Selecionados pelo formador e pelos integrantes do grupo a partir de

seus interesses, considerando o valor estético atribuído a obra, a pertinência da leitura, o gosto

pessoal ou ainda o interesse em conhecer ou aprofundar a leitura da obra ou do autor. Assim,

as leituras são as mais diversas de Cervantes e Machado a Martha Medeiros, Exupéry,

Fernando Pessoa, Lygia Bojunga, Sérgio Vaz43 etc. Há, por parte do grupo, um acolhimento,

43Sérgio Vaz (Ladainha, Minas Gerais, 1964). Poeta, cronista e produtor cultural. Nascido em Minas Gerais,

muda-se criança para Taboão da Serra, região metropolitana de São Paulo. Na adolescência, trabalha no bar de

82

uma recepção bem tranquila de toda essa diversidade de textos e autores. Talvez pelo

entendimento de que estamos compartilhando da escolha do outro, carecendo, portanto, de

uma abertura ao diverso, ao desconhecido. Algumas leituras incomodam consideravelmente o

grupo quando vão de encontro com as crenças e concepções religiosas dos participantes.

A segunda etapa é realizada nas escolas sob articulação do coordenador pedagógico,

cabe ao coordenador promover momentos de reflexão sobre o processo da leitura e os

objetivos a serem perseguidos para consolidação de comportamentos leitores. Compete ao

coordenador também provocar o corpo docente a participar e assumir as formações leitoras a

cada encontro formativo. E à dupla gestora (diretor e coordenador) planejar ações de leitura

com os alunos e funcionários. A partir das formações leitoras desencadeadas no tempo do

planejamento semanal de quatro horas, os professores assumem o compromisso de

desenvolver a formação leitora junto aos alunos num movimento cíclico e dinâmico de forma

que cada um, a seu modo, seja envolvido no processo. Compete ao coordenador apoiar os

professores na organização sistemática das formações leitoras a serem desenvolvidas com os

alunos e no desenvolvimento dos comportamentos leitores vinculados ao processo de leitura.

Dessa forma, a elaboração do PIL é um processo coletivo a partir das discussões

suscitadas nos momentos de formação pedagógica do coordenador, no tempo de planejamento

dos professores e no diálogo desses com os alunos em sala de aula. A partir da escrita inicial

são pensados tempos/espaços para apresentação do projeto ao público-alvo intentando a

sensibilização e mobilização de todos na efetivação do mesmo.

A terceira etapa é realizada nas salas de aula pelos professores através das formações

leitoras que visam provocar o contato dos alunos com leituras diversas; através da formação

leitora os alunos são sensibilizados e motivados a inserirem-se nas atividades de leitura

desenvolvidas na escola e adentrarem o universo da literatura.

Assim, todos os processos da sensibilização à mobilização para realização do projeto

de leitura, as vivências leitoras que serão desenvolvidas, envolvem todos os sujeitos da escola

e família num movimento coletivo de corresponsabilidades que tende a culminar em

atividades que se estendem para além dos muros da escola. Nesta etapa conclui-se a escrita

final do projeto que está sendo desenvolvido; a escrita do texto fica sob a responsabilidade da

coordenação pedagógica. Entende-se que a partir deste movimento em cadeia fomentado pelo

PIL os diferentes sujeitos do contexto escolar sejam envolvidos, provocados, atravessados

seu pai. Interessado por literatura, começa a escrever letras de música para uma banda formada por amigos. Em

2001, organiza a Cooperifa, cooperativa de artistas da periferia e, depois de encontrar uma fábrica abandonada,

organiza nela uma mostra cultural com suas obras. A Cooperifa fixa-se no Bar do Zé Batidão, onde promove

sarau todas as quartas-feiras.

83

pela experiência leitora. Jorge Larrosa (2011) assinala algumas das possibilidades de

pensamento a partir da experiência, embora haja uma banalização do uso desta palavra sem

ter consciência plena de suas enormes possibilidades teóricas, críticas e práticas. Para Larrosa

a experiência é “isso que me passa” Não há experiência, portanto, sem a aparição de alguém,

ou de algo, ou de um isso exterior a mim, alheio a mim. A experiência supõe que o

acontecimento afeta a mim, que produz efeitos em mim, no que eu sou, no que eu penso. Daí

que a experiência me forma e me transforma.

Há uma dificuldade por parte dos coordenadores pedagógicos em relação à escrita do

projeto, seja pela compreensão equivocada a respeito da importância do registro, seja pela

dificuldade de expressar-se por escrito. Percebemos durante o período em que estivemos

inseridos na rede municipal que não existe uma cultura de registro daquilo que se intenta

realizar nas escolas ou dos projetos, ações pedagógicas já realizadas. O que contribui para a

inexistência de arquivos e registros do que foi realizado pela escola e pela secretaria de

educação. Acentuando, inclusive, a descontinuidade das ações e práticas de leitura no âmbito

das escolas e da rede municipal de educação.

5.1 AS PRÁTICAS DE LEITURA NA CONTRAMÃO DE UMA CIDADE SEM

BIBLIOTECA

O uso da expressão práticas de leitura se origina, no Brasil, de duas tradições de

investigações sobre a leitura. Primeiramente, de estudos históricos e sociológicos, nesse caso

a expressão procura designar a situação da leitura em sua concretude, englobando o conjunto

de elementos que concorrem para a criação dessa situação, sempre como histórica. Já a

segunda linha de investigação de que se origina o uso pedagógico da expressão práticas de

leitura é conhecida como “estudos sobre o letramento”. Nesse caso, trata-se do conceito de

‘práticas de letramento’ – dentre as quais as de leitura estão inseridas. (BATISTA, 2014).

Entendemos como práticas de leitura aqui as situações reais de leitura desenvolvidas nos

contextos formativos pedagógicos e nas escolas da rede municipal de educação. Assim, duas

proposições instigam-nos ao escrever sobre essas práticas de leitura.

A primeira delas é que as práticas de leitura implementadas pelo PIL nas escolas

municipais apontam para um movimento de leitura e de acesso aos livros, ao texto escrito

numa cidade distanciada de determinados bens culturais como cinema, teatro, biblioteca e

livraria. Compreendemos, portanto, como uma ação positiva em relação à leitura como forma

de democratização desse conhecimento, restrito a alguns privilegiados socialmente e, de

84

inserção dos alunos e demais sujeitos do contexto escolar ao universo da literatura. A segunda

proposição é uma inquietação sobre o desafio da escola de aproximar os alunos da leitura de

modo particular, aqui, da leitura de literatura. Assim, indagamos em que sentido as práticas de

leitura implementadas pelo PIL tem instigado e contribuído para constituição dos alunos

como sujeitos leitores? Entendendo que o mero exercício da leitura na escola não implica

necessariamente na constituição de sujeitos leitores.

As práticasde leitura dizem da materialidade do PIL no contexto escolar do município.

Estão escritas nos Planos de Formação dos Coordenadores Pedagógicos, nas Pautas

Formativas e nos Projetos de Leitura. Assim, realizamos a análise destas práticas a partir dos

documentos citados. Ressaltamos que embora seja uma análise documental dada a escolha

metodológica da pesquisa, incluímos nessas análises nossas percepções como sujeito partícipe

do projeto.

Nos Planos de Formação são esboçados os indicadores de qualidade de formação de

leitores tomados como base para escrita das pautas formativas, os objetivos específicos

definidos nos PILs e as ações leitoras desenvolvidas nas unidades escolares. Os indicadores

referem-se às formas como cada ator do contexto escolar e da comunidade do entorno da

escola pode inserir-se às práticas de leitura implementadas pelos projetos de leitura a saber:

através da utilização dos espaços de leitura dentro e fora da escola, desenvolvendo

comportamentos leitores, lendo e ouvindo histórias, lendo e indicando livros, envolvendo-se

com os projetos de leitura. Os indicadores servem ainda para a escola fazer uma auto

avaliação sobre a participação de cada um e da gestão escolar como responsável primeiro pelo

encaminhamento e desenvolvimento dos projetos de leitura.

Nos Planos de Formação dos Coordenadores Pedagógicos são descritas as práticas de

leitura que serão desenvolvidas nas unidades escolares durante a unidade ou semestre letivo.

Os planos servem, portanto, como documento norteador do trabalho que será efetivado pela

coordenação junto aos docentes. Dentre as ações pedagógicas relacionadas ao processo de

ensino aprendizagem destacam-se as práticas de leitura que serão implementadas.

As Pautas Formativas são o desdobramento do plano de formação. Elas são planejadas

pela equipe técnica e se constituem em um meio para a realização intencional do

aprimoramento das práticas dos diretores escolares e dos coordenadores pedagógicos. De

acordo com o documento Gestão Pedagógica da Rede de Ensino, a pauta não temuma função

meramente instrumental, é um plano ancorado na reflexão sobre a prática. (ICEP, 2013, p.

89).

85

As pautas formativas analisadas esboçam-se a partir de três elementos constitutivos: os

objetivos, conteúdos e as estratégias formativas. Analisamos sete pautas de formação do

coordenador pedagógico escritas pela Supervisão Pedagógica entre os meses de abril a

outubro do ano de 2015. Em todas elas constam a formação leitora que é o momento

formativo destinado à leitura, conhecimento de autores e obras com vistas a própria

constituição leitora e, dependendo da relação de interesse com o lido, a socialização destas

leituras em outros contextos. As pautas propõem a leitura de Mia Couto, Mário Quintana,

Vinicius de Moraes, Roseana Murray, Cecília Meireles, Cora Coralina, José Paulo Paes,

Martha Medeiros, Rubem Alves e Lya Luft.

A escolha dos autores e obras apontam uma diversidade que vai dos clássicos a autores

que rompem com o cânone tradicional. Autores menos conhecidos ou não reconhecidos pela

crítica literária figuram nas pautas formativas de leitura dos coordenadores pedagógicos.

Como já salientado anteriormente, as escolhas das leituras, textos e autores, tem motivações

diversas, incluindo-se as sugestões do próprio ICEP nos momentos formativos das equipes

técnicas. Mas na maioria das vezes são escolhas pessoais dos coordenadores pedagógicos.

A primeira pauta analisada do mês de abril de 2015 tem como proposta de leitura Mia

Couto. A escolha da leitura de uma literatura contemporânea africana em língua portuguesa

apresenta-se como um exemplo relevante de ampliação do repertório de leituras para além

daquelas instituídas pelo cânone literário e pelos livros didáticos. Essa leitura possibilitou a

reflexão sobre a marginalização de indivíduos e de culturas pela elite dominante. A leitura

desenvolveu-se através de uma roda de leitura44 mediada pela Supervisora Técnica do

Fundamental I. Foram lidos pequenos trechos de alguns livros do autor; fez- se a leitura da

biografia e discutiu-se a temática social que ele aborda - a condição de estar e viver a serviço

do outro.

Entendemos que essa leitura traz para a pauta das discussões elementos importantes

para compreensão da literatura como conhecimento do outro e da condição humana no

mundo. Rompendo com compreensões mais limitantes de que a literatura é apenas

entretenimento ou conhecimento fechado em si mesmo. Retomando Cândido (2012) por meio

da humanização a literatura propicia o exercício da reflexão, aquisição do saber, a boa

disposição para com o próximo, a capacidade de penetrar nos problemas da vida.

44A compreensão de rodas de leitura aqui assemelha à de círculo de leitura. As rodas de leitura se constituem por um círculo

ou semicírculo reunindo determinado número de pessoas para lerem mediadas por um leitor-guia uma vez que a leitura em

grupo amplia e ordena nossos conhecimentos. O objetivo das rodas de leitura é compreender o lido num processo dialógico

da linguagem, assim como aponta Bakhtin (1992). As rodas de leitura se caracterizam por seu perfil de ‘compartilhamento’.

Como bem salienta Yunes (1999, p. 21), “ler em círculo não é novo: novo é o uso do círculo para aproximar os leitores na

troca de suas interpretações”.

86

Ao refletir sobre obras que trazem uma perspectiva de literatura como conhecimento

inserido num contexto social, histórico e cultural, entendemos que seja esta uma prática de

leitura literária com características de inovação. Ao tempo que se distancia dos textos

comumente lidos ou sugeridos na escola, normalmente os que mais circulam nos livros

didáticos; aproxima-se da literatura como exercício da criticidade, como leitura da condição

humana marcada pela inserção social. Dessa forma, entendemos que a escolha do autor

favorece esse entendimento.

Para Cosson (2012), muitos são os fatores que influenciam a seleção da literatura na

escola: os programas, a legibilidade do texto, as condições para a leitura na escola e o cabedal

de leitura dos professores. A partir destes fatores muitas são as direções tomadas para seleção

dos livros para o letramento literário. O autor posiciona-se por aquela que contemple a

pluralidade e diversidade de autores e obras incluindo-se aí, o cânone. Segundo Cosson,

[...] ao lado do princípio positivo da atualidade das obras é preciso entender

a literatura para além de um conjunto de obras valorizadas como capital

cultural de um país. A literatura deveria ser vista como um sistema composto

de outros tantos sistemas. Um desses sistemas corresponde ao cânone, mas

há vários outros, e a relação entre eles é dinâmica, ou seja, há uma

interferência permanente entre os diversos sistemas. A literatura na escola

tem por obrigação investir na leitura desses vários sistemas até para

compreender como o discurso literário articula a pluralidade da língua e da

cultura. (COSSON, 2012, p. 34).

É nesse sentido que entendemos haver na proposta de leitura dessa pauta uma abertura

ao diálogo entre o sistema canônico e o contemporâneo que possibilita a ampliação dos

repertórios e horizontes leitores. Embora o autor não fosse conhecido por 90% dos

participantes da formação, na apresentação do autor, dos textos e livros apresentados como O

último vôo do flamingo, Raiz de Orvalhos e outros poemas, Tradutor de Chuvas, o grupo de

coordenadores demostrou um grande interesse, inclusive, em adquirir obras de Mia Couto e

realizar a formação leitora com outros textos do autor.

A segunda pauta analisada datada do dia 08 de julho de 2015 tem como proposta de

leitura Mário Quintana. O objetivo é apreciar textos do autor através da leitura e reflexão

sobre poemas de Mário Quintana. A pauta não especifica os textos que foram selecionados

para a leitura. No detalhamento da pauta sugere-se uma roda de leitura na qual os

participantes são convidados a passar uma caixinha contendo diversos poemas do autor. Cada

participante a partir da leitura dos poemas escolhe um, socializando a leitura e explicando o

porquê da escolha e comentando suas impressões sobre a leitura.

87

A escolha de Mário Quintana aponta para um olhar renovado sobre obras literárias e

autores uma vez que, embora figure no cânone literário brasileiro, Quintana é um autor menos

conhecido em relação a outros nomes da tradição literária. Conforme Bosi (2001) o projeto de

uma lírica é comum a quase toda a poesia pós-modernista. Dele participaram, cada um a seu

modo, poetas que têm escrito desde a década de 30, ou desde fins da década anterior, e que,

apesar de menos conhecidos pelo público médio, devem figurar ao lado de um Drummond, de

um Jorge de Lima e de uma Cecília Meireles, como vozes originais da literatura brasileira

contemporânea. É o caso de (...) Mário Quintana, poeta que encontrou fórmulas felizes de

humor sem sair do clima neo-simbolista que condicionara a sua formação. (BOSI, 2001, p.

463).

A escolha por autores que fogem à consagração da crítica literária revela uma abertura

para a riqueza e diversidade literária. Tais propostas de leitura apresentam- se como

desafiadoras dos parâmetros e padrões tradicionais instituídos, inclusive, pela escola.

Iniciativas interessantes quando se compreende quão importante é a ampliação dos repertórios

de leitura e o acolhimento da diversidade textual e literária. Pois, somente dessa forma, os

espaços institucionais abrem horizontes para a constituição de leitores sem as grades das

imposições dominantes.

A receptividade do grupo com o gênero poema/poesia é impressionante. Houve um

grande envolvimento e interação com os textos lidos nesta formação. Alguns participantes

solicitaram o empréstimo de obras do autor e sugeriram a criação de um grupo de Whatsapp

somente para socialização de textos do autor. À revelia do que se diz que a poesia cada vez

menos encontra lugar na escola e é batizada como um “discurso difícil” percebe-se que, ainda

cabe à poesia um lugar (necessário) de leitura. Evidencia-se, no entanto, a dificuldade do

registro das ações planejadas, a pauta não especifica os textos selecionados para leitura o que,

inclusive, dificulta uma análise ou mesmo avaliação por parte da própria coordenação

pedagógica das práticas de leitura implementadas.

A terceira pauta formativa analisada data do dia 21 de setembro de 2015 propõe a

leitura de poesia de diversos autores (Vinicius de Moraes, Roseana Murray, Cecília Meirelles,

Elias José, José Paulo Paes). Solicitou-se aos participantes da formação que lessem as poesias

dispostas nas paredes da sala. Em seguida, propôs-se a leitura em círculo do livro A Grande

Fábrica de Palavras de Agnès de Lestrade, relacionando-o com os diversos poemas lidos.

Percebe-se nessa listagem de autores uma ênfase à poesia contemporânea, marcada pela

escolha de autores que normalmente fazem-se presentes nos livros didáticos como expoentes

da poesia. Mas é importante atentarmos para a ausência do nome de Drummond nesta relação

88

e a presença do nome de Roseana Murray. Uma vez que Drummond é um “clássico” quando

falamos em poesia, dificilmente a escola trabalha textos poéticos sem citar Carlos Drummond

de Andrade pois, dentre os muitos critérios de escolha dos textos que fazem parte dos

repertórios para a atividade de leitura da literatura, um deles é o trabalho com os autores que

mais circulam nos livros didáticos. Assim, entendemos essa ausência como uma abertura a

novas leituras para além daquelas já consagradas. Em relação a Roseana Murray chama nossa

atenção sua presença na lista de autores selecionados porque associada à literatura infantil

poderiam pressupor que sua leitura interessaria mais ao público infantil.

Apropriar-se dos textos e autores que circulam mais frequentemente nos livros

didáticos não deixa de ser importante (e, na maioria das vezes, este é o único material

disponível dada a ausência de acervos no contexto das escolas municipais) mas, por outro

lado, possibilitar o contato com outras leituras e autores certamente caracteriza-se como uma

forma de ampliação do universo literário dos envolvidos nestas práticas de leitura. Assim, a

escolha dos textos e autores que irão compor as atividades de leitura é sem dúvida uma das

questões centrais que envolve as práticas de leitura. Segundo Cosson (2012) a seleção de

obras literárias tem seguido as mais variadas direções. As que priorizam o cânone,

entendendo-o como inquestionável; as que defendem a contemporaneidade dos textos como o

critério mais adequado para realizar esta seleção e a que prima pela pluralidade e diversidade

de autores, obras e gêneros na seleção de textos.

Dialogando com o autor acreditamos que um olhar crítico baseado na autonomia nos

possibilitará selecionar obras relacionadas nas três direções apontadas, entendendo que, estas

não se excluem, mas cada uma pode contribuir para uma ampliação dos repertórios leitores.

Principalmente, para a constituição leitora de sujeitos críticos envolvidos e comprometidos

com a leitura literária como reflexão da condição do humano. Para tanto, é mister que as

escolhas literárias estejam comprometidas com a formação plena do leitor, numa perspectiva

mais ampla que os ditames sociais, a tradição e a lógica mercadológica. Assim, acreditamos

que as pautas de leitura analisadas se apresentam como esboços importantes para

desenvolvimento de práticas de leitura que rompem com as limitações de ordem material da

rede municipal de Pindobaçu.

5.2 NAS CALÇADAS E INTERVALOS A TESSITURA DOS PROJETOS DE LEITURA

“O Projeto Boca Pil abarca todas as ações de leitura desenvolvidas no chão das escolas

que utilizam como instrumento o bocapiu. O nome bocapiu faz uma referência à sacola muito

89

utilizada no nordeste e característica da cultura da nossa região. Os homens tiram a palha e as

mulheres tecem, costuram essa sacola que é vendida nas feiras livres e usada para fazer a feira

carregar a marmita pra roça, levar roupas e apetrechos e, agora, levar livros de literatura para

casa e para escola. Num trocadilho de letras criamos a expressão Boca Pil em referência às

práticas de leitura do PIL e aí vamos inventando ações leitoras e haja bocapius”. O fragmento

refere-se ao Projeto Bocapiu Literário implementado nas escolas municipais desde o ano de

2014. Esse projeto, dentre outros, se constitui na materialização do PIL no município.

Destacamos dois projetos implementados no município no ano de 2014 e que

continuam em desenvolvimento na Escola Municipal Navarro de Britto, situada na sede do

município, a despeito de haver uma acentuada descontinuidade das ações pedagógicas nos

períodos de mudança de gestão municipal e, muitas vezes, em uma mesma gestão. Por conta

da dificuldade das escolas manterem arquivados os projetos e ações desenvolvidas os dois

projetos, que aqui tomamos como corpus de análise, são os únicos a que tivemos acesso. Os

projetos foram elaborados nos contextos formativos da coordenação pedagógica e, nos

contextos de formação e planejamento dos professores. Estão documentados por escrito e

registro de fotos.

Inicialmente destacamos o projeto Poesia na Calçada que propõe a formação leitora

dos alunos através de textos poéticos de autores como Vinicius de Moraes, Cecília Meirelles,

Elias José, José Paulo Paes. Cada turma escolhe um autor a partir dos que foram sugeridos.

Justifica-se a escolha do gênero pela facilidade de acesso aos textos e pela aproximação da

poesia com o universo dos alunos. Pontua-se os seguintes objetivos a serem alcançados com o

projeto: fomentar a apreciação poética dos alunos ampliando seu repertório; favorecer a

aproximação com a entonação adequada durante a leitura por meio da escuta de poemas; ler e

indicar livros de poesias; realizar recitais de poemas nas calçadas para a comunidade do

entorno da escola. Cabe à gestão escolar apresentar o projeto para a comunidade escolar,

mobilizando-a na execução e usufruto das ações.

A proposta de ação do projeto sugere três etapas para desenvolvimento das ações: a

primeira, relaciona-se à sensibilização dos alunos, corpo docente e funcionários da escola,

através da apreciação de vídeos com declamações de poemas e apresentação dos autores

escolhidos; exposição nos murais, paredes das escolas, portas das salas dos textos poéticos e

dos autores; indicações de leituras nos murais. A segunda etapa diz respeito aos tempos de

leitura dos textos em sala de aula sob responsabilidade dos professores e alunos, tendo em

vista a apreciação de poemas, discussão e socialização das leituras e apropriação dos textos

poéticos pelos alunos. A terceira etapa sugere a preparação dos alunos para ocuparem as

90

calçadas do entorno da escola lendo e declamando poesia. Como atividade de culminância,

propõe-se um desfile com os alunos caracterizados dos autores declamando poemas pelas

ruas, acompanhados muitas vezes da charanga.

Entendemos a relevância de projetos como este que trazem o texto poético para o

universo da escola, uma vez que existe uma resistência à leitura da poesia e uma

desvalorização social desta leitura. Em Poesia na Sala de Aula (2007), Hélder Pinheiro relata

que observando cinco listas de livros oferecidos no início do ano letivo em Fortaleza, não

encontrou sequer um livro de poesia e de oito listas de 5ª a 8ª série fornecidas por grandes

escolas não havia uma indicação de livro em verso.

Seja porque a leitura de textos em prosa, como é o caso das crônicas, ajusta-se melhor

ao tempo apressado e fragmentado da escola, seja por conta da dificuldade de compreensão da

linguagem que dificulta a compreensão textual por parte dos professores que, na maioria das

vezes, não foram iniciados neste gênero textual, seja pela dificuldade metodológica de

trabalhar a leitura de textos poéticos, este é o gênero mais distanciado das práticas

pedagógicas. Dessa forma, pensamos que, atividades de leitura do texto poético constituem-se

em iniciativas importantes de acesso a esse gênero textual e ao contato com uma diversidade

de autores. Cabe, portanto, à escola promover essa vivência singular de afloramento das

emoções e da sensibilidade provocada pela experiência com o texto literário poético. Valemo-

nos das palavras de José Paulo Paes (1995):

O texto poético é o espaço mais rico e amplo, capaz de permitir a liberação

do imaginário e do sonho das pessoas. É preciso que o fato poético esteja

muito presente e seja bem trabalhado pela escola para que o universo escolar

possa romper o tédio e a indiferença com que muitas vezes se vê recoberto.

Um mundo sem poesia é o mais triste dos mundos. (PAES, 1995, p. 1).

Para tanto, não só a disponibilização de poemas é indispensável, como o tempo para

leitura e a mediação dessa leitura. Entendemos que o tempo disponibilizado para o contato

com os textos, para a realização da atividade de leitura seja fundamental para a efetivação de

qualquer projeto de leitura. Embora os projetos de leitura constem nos projetos político-

pedagógicos das escolas, em sua maioria ficam esboçados apenas no papel, pois não há tempo

pedagógico para a leitura. Ler demanda tempo para contato com os textos, para envolvimento

e exploração do lido.

O Projeto Poesia na Calçada certamente possibilita uma aproximação com o texto

poético ao criar tempos na sala de aula e na dinâmica escolar para a leitura de poemas, a

despeito da urgência do tempo escolar em cumprir o conteúdo programático das disciplinas.

91

Fazemos, portanto, uma análise positiva do projeto a partir da sua proposta. Entende-se que,

ao possibilitar o contato com a poesia e o envolvimento dos alunos com este gênero, a escola

cumpre sua função como agência de letramentos. Ao apropriarem-se dos textos para

declamarem, inclusive em espaços outros que não o da sala de aula, os alunos aproximam-se

desta leitura, ampliam seus repertórios de leitura e inscrevem-se como coautores do lido

dando seu tom ao texto.

Culminância do Projeto Poesia na Calçada da Escola Municipal de Bananeira.

Alunos declamando e representando poemas lidos em sala de aula.

Tecemos, entretanto, uma ressalva sobre a escolha dos autores que, provavelmente, são

nomes que circulam mais frequentemente nos livros didáticos, consagrados pelo mercado

editorial. A escolha dos autores e textos a serem trabalhados baseia-se, normalmente, na

indicação do professor, o que significa que escolhemos para o processo de mediação o que é

mais acessível e o que já temos algum conhecimento. Assim, defendemos a necessidade da

escola ampliar as escolhas literárias para além daquelas apresentadas pelo livro didático a

partir de uma perspectiva crítica, ampla e atualizada. Segundo Silva (2003, p. 19), vários

estudos mostram que o repertório de leitura do professor de Língua Portuguesa é limitado e

está estagnado, o que leva a reproduzir mecanicamente sempre as mesmas indicações e

práticas de leitura junto a seus alunos.

92

O projeto não especifica como pretende ampliar o ciclo de leituras de poesias a partir

da incorporação de outros nomes de autores, inclusive pela própria sugestão dos alunos. Isso

renovaria e ampliaria o repertório de leituras de alunos e professores e incluiria outros

“grandes” autores que não se fazem presentes nos livros didáticos bem como, outras formas

de expressão poética, como a poesia periférica e o cordel. Segundo Gebara (2007), nem

sempre a poesia que está no livro é desejada pelo aluno para a realização da leitura. Faz-se

necessário, portanto, que o Projeto possibilite aos professores a ampliação de seus repertórios

de leitura de forma efetiva e oportunize aos alunos expor suas preferências e indicações de

leitura.

O outro projeto analisado Um Intervalo com Rubem Alves é desenvolvido nos

intervalosdo tempo escolar destinado ao lanche e recreação. Ao longo do ano letivo outros

autores passaram a ser lidos no horário dos intervalos, gerando outros projetos similares: Um

intervalo com Martha Medeiros, Um intervalo com Lya Luft e Um intervalo com Mário

Quintana.

Inicialmente o projeto propunha a leitura nos intervalos para os professores pensando

em propiciar um momento prazeroso com a leitura e a qualificação dos professores como

leitores modelos. Ao longo do tempo, o projeto incorporou nomes de autores não conhecidos

pelos professores objetivando a ampliação de seus repertórios de leitura, uma vez que na

implementação de algumas práticas de leitura constatou-se que o repertório de leitura dos

professores era muitas vezes limitado. O Projeto Poesia na Calçada, por exemplo, quando foi

implementado nas escolas causou um desassossego quanto à seleção dos textos a serem lidos,

revelando a limitação do repertório de poesias por parte dos professores. Sendo assim, o

projeto intervalo incluiu autores desse gênero para possibilitar aos professores a ampliação de

seu conhecimento sobre autores e textos poéticos.

O projeto Intervalo apresenta como justificativa a necessidade do professor alimentar

seu próprio repertório de leitura como leitores modelos. São elencados os seguintes objetivos

a serem alcançados com o projeto: qualificar o repertório de leitura dos professores; ler para

apreciar Rubem Alves; ler e indicar livros de Rubem Alves; compartilhar novas leituras com

os colegas.

A proposta de ação do projeto propõe o seguinte desenvolvimento: apresentar o

Projeto Institucional de Leitura “Um intervalo com Rubem Alves”, através de uma exposição

no mural com textos e capas de livros do autor, convidando os professores a fazerem leitura e

apreciação dos textos. Em seguida, entregar um envelope contendo textos de Rubem Alves

para cada participante. Depois de realizado o “contato com o autor”, por meio dos textos

93

recebidos e das leituras realizadas apresenta-se a biografia do autor e abre-se espaço para que

sejam socializadas as impressões dos participantes. Propõe-se em seguida a elaboração de um

cronograma para que cada professor socialize um texto ou livro do autor com os colegas.

Como culminância do projeto os professores irão trocar entre si os textos que mais gostaram.

Rubem Alves é um autor conhecido por muitos professores pela presença de seus

textos no contexto das formações e palestras pedagógicas. Suas crônicas, ensaios e contos são

frequentemente socializados entre os educadores. O escritor critica o ensino tradicional ainda

vigente em nossas escolas e descreve o ato de ensinar como uma arte, um exercício de alegria

e paixão. A forma direta e, por vezes romântica, de escrever cativa os leitores. Assim,

acreditamos que este conhecimento tenha sido um dos motivos principais para escolha do

autor e sua obra como tema do Projeto Intervalo. Conforme já salientamos, as escolhas para

os projetos de leitura no município são feitas de acordo com diferentes motivos, dentre eles, o

interesse pessoal e a relação de proximidade com a produção literária do autor.

Entendemos que momentos de leitura como este criado pelo projeto Um intervalo com

Rubem Alves são significativos por propiciarem o contato do professor com textos, leituras e

autores e possibilitarem um contato maior com a leitura e a aproximação com textos e obras,

entendendo que é a partir desses contatos e aproximações que ampliam-se os repertórios

leitores. Assim, compreendemos que os objetivos elencados pelo projeto refletem essa

preocupação em fomentar o repertório de leitura dos professores. E salientamos a necessidade

de que os projetos de leitura, principalmente, os que têm como público alvo os professores,

possibilitem a inserção de novas leituras que ampliem o campo de conhecimento, alargando o

universo de leitura dos sujeitos envolvidos, inclusive, desafiando-os e provocando-os ao

conhecimento do novo e de outras experiências estéticas. Pois, só pode incentivar a leitura

aquele professor que, no decorrer de sua própria formação, desenvolveu uma boa relação com

a leitura e compromete-se com a sua constituição leitora.

Por outro lado, entendemos que ao usar o tempo de intervalo do professor para a

leitura a escola está driblando a falta de tempo pedagógico para o ato de ler. Assim, aquilo que

se apresenta como uma dinâmica criativa, para usufruto da leitura em todos os momentos,

confirma-se também como uma denúncia daquilo que ainda não conseguimos garantir nas

escolas – tempo(s) para a leitura, a despeito de todo discurso sobre a importância dessa

atividade no processo educativo. Poderíamos pensar que para haver esse tempo é preciso

interferir no horário de descanso e lanche do professor, tamanho é o assoberbamento de

tarefas a serem cumpridas e conteúdos a serem estudados no tempo pedagógico. Tirar tempo

para ler ainda é confundido com perder tempo e enquanto os conteúdos curriculares e demais

94

afazeres da rotina pedagógica da escola são priorizados a leitura ainda é relegada ao segundo

tempo.

Ademais, enfatizamos quão atentos precisamos estar à implementação das práticas de

leitura, de modo a perceber compreensões pedagógicas cristalizadas considerando as forças

do hábito e as crenças enraizadas. Sob pena de repetirmos velhos paradigmas no que tange à

atividade da leitura na escola, continuando a usar velhas roupas só que, agora, “coloridas”,

como dito na poesia-canção de Belchior.

95

6 ARREMATANDO ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

"Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces

Estendendo-me os braços, e seguros

De que seria bom que eu os ouvisse

Quando me dizem: "vem por aqui!"

Eu olho-os com olhos lassos,

(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)

E cruzo os braços,

E nunca vou por ali...

Não, não vou por aí! (...) Só vou por onde

Me levam meus próprios passos...

José Régio (1925, p. 108-110)

A ideia para essa reflexão final e transitória não é a de fechar as questões aqui

apresentadas. É, principalmente, arrematar alguns fios que consideramos importantes na

Tessitura do Projeto Institucional de Leitura (PIL) e nas discussões levantadas por essa

pesquisa a respeito do letramento literário. Para Graça Paulino (2008, p. 407), o letramento

literário, como outros tipos de letramento, continua sendo uma apropriação pessoal e

consciente, de práticas sociais de leitura/escrita, que não se reduzem à escola, embora muitas

vezes passem por ela. Segundo a autora, as experiências estéticas, entre as quais se inclui a

leitura de literatura, estão sendo mais valorizadas nestes tempos de capitalismo tardio, como

modos de reumanizar as relações enrijecidas pela mercantilização.

Nesse sentido, compreendemos que a leitura de literatura constitui-se em uma

experiência estética ímpar no processo de humanização do homem e que a escola, assim como

outros espaços sociais, pode fomentá-la. Pois, como afirma Peixoto (2003), quanto mais

condições de acesso ao mundo da cultura – arte, filosofia e ciência – tanto mais genuinamente

humano o homem se faz. Assim, apesar dos muitos fios ainda soltos na implementação e

desenvolvimento do PIL acreditamos que esse seja uma proposta de letramento importante

para o contexto da rede municipal de educação.

Apropriamo-nos da mesma questão instigadora proposta por Besnosik (2002) sobre

“como incentivar leitura sem proporcionar o acesso aos bens culturais”. Até porque nos

inquieta tamanho distanciamento de determinados bens culturais no contexto da cidade de

Pindobaçu, entendendo que o acesso a eles é condição precípua para inserção social e à

cultura letrada. Dessa forma, permeia essa pesquisa a compreensão do quanto as ausências de

bibliotecas, livrarias e demais bens culturais, pertencentes também à cultura letrada, distancia-

nos do acesso a determinadas formas de conhecimento e a certas experiências estéticas,

limitando nosso universos de conhecimento e nossa percepção estética e crítica.

96

Para Fischer (1973, p. 32), a cultura deve ser compreendida como todas as formas de

expressão artística e todo o patrimônio material e simbólico da sociedade.Assim, entendemos

que o acesso a todas as formas de expressão artística e ao patrimônio material de uma

sociedade é direito inalienável à nossa formação humanizada e em consonância com Chartier

(2011) reafirmamos a concepção de leitura como uma prática cultural.

Conforme Cosson (2014, p. 50) acreditamos que a leitura da literatura conduz a

indagações sobre o que somos e o que queremos viver, de tal forma que o diálogo com a

literatura traz sempre a possibilidade de avaliação dos valores postos em uma sociedade. Tal

fato acontece porque os textos literários guardam palavras e mundos tanto mais verdadeiros

quanto mais imaginados, desafiando os discursos prontos da realidade. Também porque na

literatura encontramos outros caminhos de vida a serem percorridos. Dessa forma,

apropriamo-nos nessa pesquisada compreensão de Cândido (2012) sobre literatura e

destacamos o lugar que ainda cabe à literatura no contexto da escola e de suas práticas

pedagógicas, concebendo-a como agência fomentadora do letramento literário.

Nesse estudo, tomou-se como objetivo investigar as práticas de leitura no âmbito do

Projeto Institucional de Leitura implementado na rede municipal de Pindobaçu-BA. A análise

dessa investigação visa compreender como as práticas de leitura desenvolvidas pelo PIL se

constituem em letramento literário. Assim, considerando a implementação do PIL a partir do

contexto das políticas públicas de formação continuada instituídas no país a partir dos anos

80, analisamos os documentos norteadores da proposta do ICEP, consultoria pedagógica

responsável pela implementação do PIL e os documentos que explicitam o projeto de leitura.

Nessa análise identificamos elementos cruciais a uma proposta de letramento literário

como: o incentivo à leitura e à constituição de leitores em um contexto social desprovido de

biblioteca pública, bibliotecas escolares e escassez de livros, jornais e revistas impressos; a

incorporação das práticas de leitura à rotina das escolas; a constituição de uma comunidade de

leitores a partir de um “movimento contínuo de leitura”; a compreensão da leitura como

prática cultural, social e de interação; a inserção dos diferentes atores do contexto escolar

como partícipes do projeto; a diversidade de gêneros textuais e autores - os consagrados que

fazem parte do cânone e os que circulam nas margens, que não estão presentes nos livros

didático nem são consagrados pela crítica, ampliando, assim, a recepção textual dos

envolvidos no projeto e provocando a dessacralização da literatura uma vez que essa vai

muito além do cânone.

Há, pois, um impacto do PIL nas escolas a partir do fomento das práticas de leitura

desenvolvidas pelo projeto. Esse impacto se apresenta de diferentes formas, seja nas

97

ambiências de leitura (salas de leitura, cantinhos, cartazes com propagandas de livros e filmes

etc.) seja na reorganização do tempo escolar de modo a integrar a leitura à prática pedagógica.

Nota-se que a leitura vem ocupando um lugar nas discussões e práticas pedagógicas das

escolas e que há uma compreensão dos projetos de leitura como um processo formativo

contínuo e não uma ação pontual, um produto apresentado em eventos escolares. Demonstram

isso o movimento em torno da leitura perceptível nas escolas da rede municipal de educação

diferente do que acontecia antes da institucionalização do projeto em que as atividades de

leitura eram pontuais e isoladas. Como destaca Cosson (2014), ao tomar o letramento como

processo, estamos tratando de um fenômeno dinâmico, que não se encerra em um saber ou

prática delimitada a um momento específico.

Por outro lado, a análise dos documentos e, principalmente, a nossa percepção como

sujeitos envolvidos no projeto revela fragilidades na execução e desenvolvimento do PIL em

relação ao processo de mediação, ainda não compreendido nem consolidado pelos

coordenadores pedagógicos e professores; os modelos de homogeneização e padronização

inerente ao processo de formação continuada implementado por consultorias; a dificuldade

em criar e gerir tempos para a leitura ante a fragmentação curricular e o escasso tempo

pedagógico, a dificuldade de registro e documentação dos projetos desenvolvidos, incluindo a

ausência de um documento que formaliza o PIL dentre as publicações do ICEP. Ademais, o

PIL ainda é uma atividade direcionada pelo professor, carecendo dar voz aos alunos, incluir

suas escolhas de leitura e suas impressões do mundo. Implementando, assim, em sua proposta

a escuta às necessidades e interesses dos alunos, a partir de uma dinâmica mais dialógica.

Como salienta Orlandi (1996), a escola ignora o fato de que o aluno convive com outras

formas de linguagem em sua comunidade, e, portanto, acaba legitimando leituras que

correspondam ao gosto do docente e não a necessidade do discente.

Percebemos que ainda há um distanciamento entre o escrito, registrado, documentado

e a efetivação do projeto na prática pedagógica. E entendemos que esse distanciamento diz

respeito à dificuldade de compreensão das bases teóricas sobre letramento literário, às

dificuldades de execução do planejado, seja essas de ordem material (como acervo

indisponível, a falta de papel nas escolas para reprodução de cópias dos textos), seja de ordem

de compreensão e organização pedagógica. Merece atenção a lacuna, ainda existente, quanto à

formação dos coordenadores e professores em relação à leitura de literatura de modo que o

ativismo pedagógico não afugente a reflexão teórica necessária à práxis pedagógica.

Não obstante, analisamos o PIL implementado no município de Pindobaçu como uma

ação política- pedagógica de leitura que configura-secomo uma proposta importante de

98

letramento literário nas escolas da rede municipal de educação. Considerando que as práticas

de leitura aí desenvolvidas têm contribuído para o exercício da leitura, possibilitado o diálogo

sobre leitura e, principalmente, promovido a constituição de leitores. E a despeito de toda

teorização sobre leitura realizada nos espaços acadêmicos sem aproximação ou repercussão

alguma nos espaços escolares trouxe contribuições significativas no fazer pedagógico das

escolas básicas do município, desenvolvendo e potencializando práticas de leitura.

Assim, cremos que embora muitos fios ainda estejam soltos na tessitura desse projeto,

o PIL apresenta-se como um caminho singular para o letramento literário no contexto

municipal. As práticas de leitura aí implementadas configuram-se como passos importantes na

tessitura de uma rede leitora que à revelia de muitos obstáculos e descontinuidades tem

possibilitado a experiência com a leitura da literatura.

Esperamos que os caminhos de leitura aí constituídos possam fomentar experiências

de liberdade e humanização que rompam com as ausências materiais e sociais instituídas à

maioria da população local e provoquem outras reflexões na práxis pedagógica do município.

Ademais, intentamos suscitar discussões sobre as infinitas possibilidades de letramento que

cotidianamente vão constituindo-se como caminhos outros que não aqueles já conhecidos,

decretados e institucionalizados mas, que não respondem aos anseios de uma política de

leitura. Sigamos, como diz o autor de Cântico Negro “por onde nos levam nossos próprios

passos”, desde que comprometidos com uma práxis pedagógica que tenha lugar para a leitura

de literatura.

99

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107

ANEXO 1

PLANO DE FORMAÇÃO DA COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA45

METAS

Professores do I e II ciclo

I. 100% dos professores planejando sequências didáticas e projetos de produção de texto

para que os alunos desenvolvam comportamentos leitores e escritores.

II. 100% dos professores selecionando textos a serem lidos pelos alunos para aprofundar

e ampliar os conhecimentos sobre os projetos que serão desenvolvidos por unidade.

III. 100% dos professores desenvolvendo conhecimento sobre a didática dos contextos de

alfabetização, leitura com autonomia, produção de texto e comunicação oral, formal

e informal nas situações de reconto, dramatização de histórias trabalhadas na roda de

conversa.

IV. 100% dos professores desenvolvendo comportamentos leitores para auto formação.

V. 100% dos professores planejando as etapas de produção de texto (planejar, textualizar

e revisar).

EXPECTATIVAS DE APRENDIZAGEM:

SITUAÇÃO DIDÁTICA 01

1 Professor

i. Aprofundar conhecimentos sobre o que é ler, sobre os diferentes; comportamentos

leitores, tendo em vista a relação texto, contexto e leitor;

ii. Avaliar as próprias práticas de ensino e de leitura tendo como referência o nível de

letramento dos estudantes;

45Parte do Plano de Formação da Coordenação Pedagógica. Os Planos de Formação da Coordenação Pedagógica esboçam as

metas e objetivosa serem alcançados pela comunidade escolar, relacionados a cada conteúdo, durante todo o ano letivo.

108

iii. Ensinar as práticas sociais da leitura garantindo a circulação de diferentes portadores e

gêneros textuais na sala de aula;

iv. Planejar e realizar intervenções antes, durante e depois da leitura para apoiar a

construção de sentidos e de significados pelos estudantes nos atos de leitura.

2 Alunos

i. Avançar nos conhecimentos sobre a leitura e a escrita através das práticas de leitura;

ii. Aprender a utilizar as estratégias de leitura: seleção, antecipação, verificação e

inferência;

iii. Compreender a função social da leitura;

iv. Desenvolver comportamentos leitores.

109

ANEXO 2

PAUTA DE FORMAÇÃO DAS EQUIPES TÉCNICAS 46

O QUE JÁ FAZEMOS EM

NOSSAS ESCOLAS

O QUE QUEREMOS

DESENVOLVER A

PARTIR DO PROJETO

INSTITUCIONAL

AÇÕES PARA GESTÃO

PEDAGÓGICA

Leitura como recurso

pedagógico.

Contação de história.

Reprodução ou reconto da

história pelos alunos.

Leitura e exploração de

histórias.

Empréstimos de livros

semenalmente.

Livros disponíveis nas salas

de aulas para manuseio e

leitura.

Poucos esclarecimentos

sobre o tipo de texto, do

livro, do autor e do

ilustrador.

Planejamento de

rodas de leituras,

como atividade

permanente.

Desenvolver o

hábito diário da

leitura, como

momento de

prazer.

Ressaltar os

comportamentos e

os propósitos

leitores, atentando

à importância da

leitura em seu

portador de

origem.

Valorização da

prática social da

leitura.

Oferecer

informações sobre

o autor, sua forma

de escrever,

curiosidades sobre

sua vida e obras.

Participar,

acompanhar e

auxiliar no processo

de reflexão sobre os

planejamentos e

ações diárias.

Viabilizar o

desenvolvimento

dos projetos de

leitura na escola e

da formação

continuada, através

da inserção dos

mesmos no Projeto

Político-Pedagógico

e no Plano de

Intervenção

Pedagógica.

Propiciar passeios

culturais em

bibliotecas, museus

e outros, com

transporte gratuito.

46 Documento socializado nos encontros formativos da rede Chapada em que esboçam-se as questões a serem refletidas sobre

o direcionamento do PIL nas unidades escolares dos municípios.

110

ANEXO 3

PROJETO INSTITUCIONAL DE LEITURA “UM INTERVALO COM RUBEM

ALVES”

JUSTIFICATIVA

O Projeto Institucional de Leitura “Um Intervalo com Rubem Alves” surge da necessidade de

qualificar a formação leitora do professor. Além de propiciar aos professores um momento

prazeroso de leitura na escola, constitui-se em um instrumento de valorização dos professores

como leitores-modelo para a comunidade escolar, e, principalmente, para os próprios colegas,

incentivando-os à leitura.

OBJETIVOS

i. Qualificar o repertório de leitura dos professores;

ii. Ler e indicar livros de Rubem Alves;

iii. Fomentar a formação leitora dos professores ampliando seu repertório;

iv. Compartilhar leituras com os colegas por meio do empréstimo de livros.

AÇÕES

I. Apresentar o Projeto através de uma exposição de textos e livros do autor e convidar

os professores para apreciação dos mesmos.

II. Entregar um envelope contendo textos de Rubem Alves para os professores,

solicitando que façam a leitura e socializem com os colegas.

III. Apresentar a biografia do autor e ouvir as impressões do grupo.

IV. A partir de um cronograma de leitura realizar a leitura de um texto, fragmento ou

obra do autor para os demais participantes.

V. Presentear um colega com um texto do autor.

111

ANEXO 4

CADERNO GESTÃO PEDAGÓGICA DA REDE DE ENSINO47

Sumário

Apresentação

Capítulo 1

A gestão da educação municipal

Capítulo 2

A formação permanente

Capítulo 3

Os planos de formação

Capítulo 4

As pautas de formação

Capítulo 5

Alguns dispositivos de formação

Capítulo 6

O processo de avaliação

Referências bibliográficas

47 Publicação do ICEP que expressa a proposta pedagógica da rede Chapada.

112

FOTOS

Foto 1 - Praça Principal de Pindobaçu – BA

Foto 2 - Estação Ferroviária - Primeira Sede da Biblioteca de Pindobaçu

113

Foto 3 - Mural da Escola Municipal Luís Navarro de Britto: exposição dos títulos de literatura

para realização das escolhas de leitura pelos alunos.

Foto 4 - Projeto Poesia na Calçada Escola Municipal de Várzea Grande

114

Foto 5 - Caminhada Literária do Colégio Municipal Telésfero de Menezes