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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE MONTAR, COLAR, PINTAR... Escultura com sucatas na sala de aula Por: Regina Costa de Pinho Orientador Prof. Dayse Serra Rio de Janeiro 2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

MONTAR, COLAR, PINTAR...

Escultura com sucatas na sala de aula

Por: Regina Costa de Pinho

Orientador

Prof. Dayse Serra

Rio de Janeiro

2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

MONTAR, COLAR, PINTAR...

Escultura com sucatas na sala de aula

Apresentação de monografia à Universidade

Cândido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em Arteterapia em

Educação e Saúde.

Por: Regina Costa de Pinho

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AGRADECIMENTOS

A todos os professores do Instituto a

Vez do Mestre – Arteterapia,

A meus alunos, co-autores desta

composição,

A todas as pessoas, que fazem parte

da minha vida pessoal e profissional, a

minha sincera gratidão.

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DEDICATÓRIA

À memória deLúcia Maria

e à presença de Cândida, Luciana, Sílvia

e Vânia.

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RESUMO

A proposta deste trabalho surgiu das inúmeras crianças que apresentam

dificuldades de aprendizagem da leitura e da escrita, na instituição para

menores onde atuamos como voluntários na área de educação e saúde.

Deparamo-nos freqüentemente com crianças desmotivadas, estima

abalada, acabando por ter um desempenho muito abaixo do esperado, embora

esforços sejam desenvolvidos pela própria instituição, pela escola, e pelo

próprio aluno. O professor muitas vezes esmorece pelos constantes

insucessos. Limitado a regras impostas, perde a oportunidade de desenvolver

um trabalho que atenda ao aluno que não aprende pelos métodos tradicionais.

Mas como conquistar para a nossa proposta as crianças maiores, não

alfabetizadas, tão desencantadas com o ambiente escolar e com seu próprio

desempenho? Isso nos desafiou a criar situações de atividades para as

crianças, que as incentivassem a pensar, refletir, raciocinar, sentir,

enriquecendo suas experiências. O ensinar brincando, explorando e refletindo

sobre a realidade, cultura, regras e papéis sociais.

Um destaque especial para as oficinas de esculturas com sucatas,

admirável instrumento para as crianças trabalharem com a diversidade e

despertarem a vontade de aprender.

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METODOLOGIA

Esta pesquisa se baseia na observação de experiências vividas, de um

grupo de 11 (onze) crianças na faixa etária de 7 (sete) e 9 (nove) anos , alunas

da Educação Infantil, meninos e meninas, baixo rendimento escolar,

matriculadas na rede pública municipal de ensino de Rio de Janeiro RJ e

também matriculados em instituição filantrópica no bairro da Tijuca- Rio de

Janeiro RJ.

Para a composição deste trabalho, foram necessárias pesquisas

bibliográficas através dos autores Angela Philippini, Dina Lúcia Chaves Rocha,

Fayga Ostrower, Maria Cristina Urrutigaray, Susan Bello entre outros e em

artigos na internet, com o objetivo de comprovar as hipóteses levantadas

acerca da utilidade da escultura com sucatas no processo arteterapêutico.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I - Dificuldade de Aprendizagem:

Quem são as nossas crianças? 10

CAPÍTULO II - Arteterapia: O acolhimento 15

CAPÍTULO III – Esculturas com sucata: Aspectos 22

transformadores da construção na Arteterapia

CAPÍTULO IV- Percurso Simbólico e 30

Individuação: Construindo um caminho

CONCLUSÃO 34

ANEXOS 38

BIBLIOGRAFIA 48

WEBGRAFIA 50

ÍNDICE 51

FOLHA DE AVALIAÇÃO 52

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INTRODUÇÃO

Segundo Jardini (2003), o distúrbio de leitura e escrita é uma

nomenclatura genérica, utilizada para definir as alterações que impedem ou

dificultam a aquisição e continuidade do processo de leitura e escrita, variando

segundo etiologia e sintomatologia, e tem se expandido de maneira

assustadora entre os profissionais da área, apesar da maioria desses

profissionais nem sempre conseguir explicar claramente o significado dessa

expressão ou os critérios em que se baseiam para utilizá-la no contexto

escolar.

Dentre as definições mais comumente citadas, encontra-se que do

termo “dificuldade” está mais relacionado aos problemas de ordem

psicopedagógica e/ou sócio culturais, ou seja, atrasos no desempenho escolar

por falta de interesse, inadequação metodológica ou mudança no padrão de

exigência da escola. Alterações normais que foram consideradas no passado

como alterações patológicas.

Por outro lado, o termo “distúrbio” e “transtorno” de aprendizagem

estão mais vinculados aos problemas intrínsecos do aluno, sugerindo a

existência de comprometimento neurológico.

Ressaltamos ainda, que as dificuldades de aprendizagem podem

ocorrer concomitantemente com outras condições incapacitantes.

Podem apresentar-se de muitas formas, mas a grande preocupação

dos pais e escola é a fase de alfabetização, que envolve as séries pré, primeira

e segunda série, onde a incidência dos erros é mais, e facilmente observável.

Mas antes de iniciar a criança no ensino sistemático da leitura e escrita,

temos que oferecer-lhe uma série de atividades cuidadosamente preparadas.

Pois uma criança tenha ou não uma deficiência, necessita de uma educação

que leve em consideração todos os aspectos do desenvolvimento.

Deve também ser lembrado, que os problemas das crianças com

dificuldades não estão limitadas à escola.

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Antes de uma criança ser estigmatizada deste modo, assim que entra

na escola, pela manhã, já pode ter sido repreendida em casa, tropeçado na

rua, ou impedida pelos amigos de participar de um jogo.

Diante disso, a arte passa a ter uma grande relevância, proporcionando

à criança a possibilidade de liberdade que lhe possibilitará reduzir suas tensões

e ao mesmo tempo, uma maneira dela assimilar suas frustrações e conflitos na

vida real.

Então, quanto mais a criança estiver mergulhada num ambiente

educacional que utilize a arte como ferramenta de ensino no processo de

ensino-aprendizagem, tanto mais esta terá momentos para estabelecer e

concretizar seus sentimentos e frustrações em formas mais expressivas de

linguagem.

A arte passa a auxiliar as atividades de criação, onde os processos

mentais como a sensibilidade para detectar problemas, a fluência, a

flexibilidade, a originalidade, a análise, a síntese, dentre outros são

estimulados.

Segundo Jardini apud Souza (2003), o caráter social da arte está

relacionado com a forma com a qual esta proporciona a criança a comunicar-se

com seu meio, e também, comunicar como ela consegue “ver” esse meio e

fazer suas relações com ele, desenvolvendo a socialização, a auto-estima, a

liberdade, a confiança dentro de seu trabalho educacional, bem como na

solução de seus problemas, o que torna a arte inerente ao processo de ensino-

aprendizagem, como uma ferramenta de aspecto lúdico, que leva a criança a

saborear o seu aprendizado com mais entusiasmo e desenvoltura.

Acreditamos que a escultura com sucata constitua um excelente

material para a tarefa proposta, uma vez que favorece o desbloqueio do canal

criativo, acessando seus talentos e habilidades.

Assim, os ideais que deram origem à própria Arteterapia, constituirão o

ponto de partida deste trabalho.

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CAPÍTULO I

DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM

Quem são as nossas crianças?

Este capítulo tem a intenção de apresentar, sucintamente, a

sintomatologia mais freqüente apresentada por crianças com baixo rendimento

escolar em leitura e escrita.

1.1- Mas quem são as nossas crianças?

No livro “A descoberta da criança: introdução à educação infantil”, Mary

Sue Pereira nos diz que:

“São nossas todas as crianças. São nossas as crianças

fáceis e participativas, as dóceis e as tranqüilas, que

aprendem rápido e interagem com o meio e com os

colegas, que são disciplinados e entendem os limites

propostos. Também são nossas as crianças agitadas ou

hiperativas, as apáticas ou que não falam as desajustadas

ou insatisfeitas, as hipotônicas, as desordeiras, as que

apresentam distúrbios ou dificuldades de leitura e escrita,

bem como aquelas para as quais não temos sequer uma

definição para seu comportamento.” (PEREIRA, 2002,

p.71)

Como são nossas as crianças órfãs, as filhas de trabalhadores que

recorrem às creches populares, e também as negligenciadas pelas famílias,

dentre outras.

Antigamente os pais estavam mais atentos às dificuldades escolares

ou de relacionamento apresentadas pela criança, passavam mais tempo em

sua companhia e supervisionavam as tarefas. Hoje tudo se transformou.

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As crianças passam mais tempo na escola/abrigos/instituições e nas

atividades extra-escolares do que em casa.

O professor passou a ser o detector primário das dificuldades

apresentadas pela criança, e não mais a família.

1.2- Sintomas

Listaremos a seguir, os sintomas apresentados basicamente em sala

de aula.

De acordo com Jardini (2003), utilizaremos duas classificações: a

predominantemente visual, e a predominantemente fonológica, pois

acreditamos resumir a sintomatologia de forma clara e simples.

Sintomatologia predominantemente visual:

- inversões (letras, palavras, frases)

-omissões (letras, sílabas, palavras, linhas)

-aglutinações de palavras na frase. Ex: /omeninopu Lou acerca/

-não corta o /t/;

-não pinga o /i/;

-trocas espaciais (b/d, p/q, 2/5, 12/21,par/pra, as/as);

-espelhamento resistente de números e letras;

-não soletra, não analisa nem sintetiza a palavra, decompondo-a em letras;

-dificuldade na coordenação e ritmo;

-confusões na leitura. Ex: esguia/estria mamadeira/madeira);

-neografismos (cria letras que são a somatória de duas ou mais, como /d/

cortado;

-neologismos (na fala, inventa palavras. Ex: enfestado=arrumado para uma

festa);

-disgrafias (letra ilegível e irregular);

-dificuldades na leitura de palavras (decodificação, lê errado embora entenda o

que leu);

-confusão de direita com esquerda;

-falta de predomínio de dominância cerebral;

-desajeitado, derruba tudo, às vezes hiperativo;

-dificuldade para das laçadas;

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-dificuldades em memorizar nomes, telefones;

-dificuldades com fisionomias;

-dificuldades na compreensão da leitura (textos);

-dificuldades na produção de textos com seqüência lógica temporal e

coerência;

-confusão com antônimos;

-não memoriza matérias e tabuadas;

-confunde-se ao preencher formulários, gabaritos e tabelas com linhas e

colunas;

-não gosta de ler, estudar, ou escrever;

-dificuldades com línguas estrangeiras;

-apresenta desatenção, dispersão;

-apresenta resistência em atender ordens e limites;

-apresenta baixa auto-estima afetiva e intelectual (acha-se “burro”).

Sintomatologia predominantemente fonológica (Jardini, 2003):

-troca letra surdas/sonoras ( p/b, t/d);

-troca arquifonemas (ar, na, as, al );

-trocas nasais (n/m, ao/am);

-troca grupos consonantais (pra/pla);

-omissões (letras, sílabas, palavras, linhas);

-comete muitos erros no ditado;

-dificuldade com sinônimos;

-apresenta lentidão ou imprecisão em dar respostas;

-dificuldades com a seqüência dos fatos ao contar casos;

-dificuldades com a escrita (decodificação), lê errado embora entenda o que

leu;

-dificuldades na compreensão da leitura de textos;

-dificuldade em resumir idéias, textos;

-dificuldades na produção de textos com seqüência lógica temporal e

coerência;

-é inseguro;

Cabe ressaltar, que estes e muitos outros sintomas, fazem parte da

trajetória esperada no processo de aquisição da leitura e escrita, portanto são

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sintomas indicativos, não configurando uma predição de dificuldade de

aprendizagem ou mesmo um distúrbio.

1.3-Intervenções:

1.3.1- Pedagógica.

Caberá ao professor atento, distinguir esta criança, atuando

preventivamente, minimizando os sintomas, a discriminação, e favorecendo a

auto-estima.

Portanto, embasada nas suspeitas da professora, a coordenação da

escola deverá solicitar aos pais uma avaliação especializada por profissional

competente, incluindo exames básicos de saúde como o oftalmológico, por

exemplo.

Fica claro que uma equipe multidisciplinar faz-se necessário para o

correto diagnóstico e posterior tratamento.

1.3.2- Social.

Os professores vêm sendo historicamente negados como produtores de

conhecimento, tornados no discurso oficial responsáveis pelo fracasso escolar.

No entanto, os dados disponíveis nas estatísticas educacionais e

sociais nos mostram que o fracasso escolar é resultado inevitável de um

projeto social excludente, que ainda hoje não consegue atender a demanda da

população.

É função das políticas sociais criar melhores condições de vida e

desenvolvimento.

Nossas crianças precisam de atenção de saúde, alimentação,

educação e assistência, visando seu desenvolvimento integral e harmônico.

Portanto quando se fala em dificuldade de aprendizagem da leitura e

da escrita, falamos também de uma grave necessidade social, e urgente

mobilização de toda a sociedade brasileira.

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1.3.3-Arteterapêutica.

Enquanto esperam, nossas crianças não são diagnosticadas, tratadas,

ou encaminhadas devidamente, gerando toda uma gama de sofrimento

e incapacidade, nas próprias crianças, nas famílias, nos colégios.

Neste momento, surge uma criança com olhos bem abertos, sozinha

ou acompanhada de outra criança, e ficam paradas à porta de nossa sala de

atendimento.

Atraídas pelas risadas, ambiente alegre, colorido, um mundo diferente

do habitual.

Um lugar onde todos produziam robôs, patos e outros bichos e

seres com sucata...

“...tia, posso ser sua ?”

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CAPÍTULO II

ARTETERAPIA

O acolhimento

A Arteterapia que a todos acolhe, é, segundo a Associação de

Arteterapia do Rio de Janeiro, o uso terapêutico da atividade artística no

contexto de uma relação profissional por pessoas que experienciam doenças,

traumas ou dificuldades na vida, assim como por pessoas que buscam

desenvolvimento pessoal.

Como esclarece Urrutigaray (2008), a Arteterapia como instrumento

educativo pode possibilitar atividades preventivas tanto no âmbito

psicopedagógico, já que oferece uma interação entre a arte e cognição, quanto

no contexto de re-significação de atitudes pessoais.

A mobilização da construção pessoal a partir da utilização de técnicas

específicas da Arteterapia trará a aprendizagem como resultado deste

processo.

A Arteterapia e seus múltiplos recursos expressivos é descrita por

Philippini,2002, p13:

“Uma, dentre as inúmeras formas de descrever o que é

mesmo Arteterapia, será considerá-la como um processo

terapêutico, que ocorre através da utilização de

modalidades expressivas diversas. As atividades

artísticas utilizadas configurarão uma produção simbólica,

concretizada em inúmeras possibilidades plásticas,

diversas formas, cores, volumes, etc. Esta materialidade

permite o confronto e gradualmente a atribuição de

significados às informações provenientes de níveis muito

profundos da psique, que pouco a pouco serão

apreendidas pela consciência.”

O que a criança faz, o que a criança vive como faz e como vive nos

apontava uma direção a seguir.

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A propaganda boca a boca do que era feito em nossa sala foi capaz de

tirar meninos e meninas das quadras de esporte, da cantina e do pátio de

brinquedos. Todos, meninos e meninas suados por correrem até a sala,

queriam participar do grupo.

Um grupo nada invejável, formado pelas crianças consideradas

desajustadas, inábeis, sem coordenação, fora dos padrões para a sua faixa

etária.

2.1- Sentido da arte na educação escolar

A Arte é meio de expressão comum à cultura de todos os tempos.

Como os demais conceitos e idéias, a idéia de Arte é construída socialmente.

Segundo Alcídio Mafra (1970), quando olhamos um quadro,

apreciamos uma obra arquitetônica ou escultórica ou, então, ouvimos música

ou assistimos a um filme, vivemos experiências que produzem em nós, ao

mesmo tempo, impressões as mais diversas.

Quando examinamos uma pintura, por exemplo, vemos separadamente

elementos como cores, linhas, massas, texturas, etc, os quais, conjugando-se,

mediante uma ordem, uma estrutura, criam impressões que dão à obra a sua

qualidade específica.

Assim, apesar das diferenças, dos materiais empregados pelos artistas

para comunicar suas idéias, há sempre qualidades comuns em todas as obras

de Arte.

Os materiais e as técnicas de Arte tornam-se o meio de expressão do

artista; seu significado é, assim, incorporado à obra de Arte por ajudar a criá-la

e dar-lhe existência objetiva.

A Arte envolve dois princípios fundamentais: o da forma que se deriva

de nossa opinião do mundo orgânico e do aspecto universal de todas as obras

artísticas e o princípio da criação, peculiar à mente humana e que leva a criar

e apreciar a criação de símbolos, fantasias, mitos, etc.

“Cada cultura, cada época, cada geração e cada

indivíduo vêem o mundo através de olhos diferentes,

sendo impossível, portanto, em relação à Arte ter-se como

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definitivo um conceito ou definitiva uma imagem. Uma vez

que novas idéias estão constantemente surgindo, as

obras de Arte do mundo contemporâneo se ligam às do

passado como elos de uma cadeia de evolução na busca

constante de novas formas e novos tipos de expressão”.

(MAFRA, 1970, p.57)

Mas para alguns, a arte é uma disciplina, para outros a arte é apenas

uma forma de atividade prática, ou uma forma de expressão e um campo de

conhecimento.

Essas várias concepções sobre o papel da Arte na educação escolar

podem divergir em pontos essenciais.

Como foi colocado por Dina Rocha (2009), o sistema educacional

estimula e valoriza muitas das vezes, o pensamento que converge, que analisa

logicamente, que é objetivo, em detrimento da imaginação criativa, intuitiva, e

subjetiva, própria do pensamento que diverge.

As crianças ficam presas ao mesmo modo de expressão. Nenhuma

diferença individual é tolerada.

Sugere que as escolas (Sistema Educacional) utilizem as técnicas tidas

como “arteterapêuticas” (técnicas expressivas e criativas) que têm, muitas

vezes, uma função clínica ou psicoterápica no trabalho com a Arteterapia.

Quando a criança repete ou trabalha em cima de modelos, formas ou

comportamentos preestabelecidos, ela não se comunica, não se expressa

adequadamente, não há espaço para que ela se coloque. Quando praticada

com autenticidade e liberdade, a expressão é capaz de revelar o ser.

“Objetivamos que a criatividade, assim como na

Arteterapia, seja estimulada, desenvolvida, trabalhada,

valorizada e reconhecida como “matéria-prima para

educar”.

E que o “fazer criativo” esteja para a educação escolar,

assim como “o fazer terapêutico” está para Arteterapia.

(ROCHA, 2009, p.111)

A palavra “criatividade” tem sua origem etimológica na palavra “criar”,

derivada do Latim.

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Dina Rocha (2009), nos leva a conhecer vários autores para ir

construindo a Linha do Tempo da Criatividade, onde poderemos perceber a

evolução, as interferências sofridas, as implicações de outras teorias, e

identificar os pesquisadores e suas contribuições; sinalizando que o

profissional atento deve ter em mente que quanto mais cedo for iniciado o

processo de desenvolvimento da criatividade, dará ao seu aluno e/ou cliente, a

possibilidade de explorar todo ou grande parte do seu potencial criativo.

Segundo Ostrower (1977), criar é basicamente, formar. É poder dar

forma a algo novo. Em qualquer que seja o campo de atividade, trata-se, nesse

“novo”, de novas coerências que se estabelecem para a mente humana,

fenômenos relacionados de modo novo e compreendidos em termos novos. O

ato criador abrange, portanto, a capacidade de compreender; e esta por sua

vez, a de relacionar, ordenar, configurar, significar.

Criar não representa um relaxamento ou um esvaziamento pessoal,

nem uma substituição imaginativa da realidade; criar representa uma

intensificação do viver, um vivenciar-se no fazer; e, em vez de substituir a

realidade, é a realidade; é uma realidade nova que adquire dimensões novas

pelo fato de nos articularmos, em nós e perante nós mesmos, em níveis de

consciência mais elevados e mais complexos. Somos, nós, a realidade nova.

Daí o sentimento do essencial e necessário no criar, o sentimento de um

crescimento interior, em que nos ampliamos em nossa abertura para a vida.

A conquista da autonomia, segundo Urrutigaray (2008), como autoria

de pensamento e ações, implica em processos pedagógicos que estimulem o

aprender a aprender.

Os educadores têm a missão de ajudar seus alunos a definir seus

pensamentos limitadores, a reconhecer e comunicar seus medos, seus

verdadeiros sentimentos e desejos.

A psicopedagogia encontra na aplicação da Arteterapia, um excelente

canal de intervenção para a aquisição da aprendizagem significativa, para a

minimização de problemas de aprendizado, atuando também de modo

preventivo às possíveis questões de aquisição de conhecimento.

A manipulação do material plástico fornece a conjugação do sensível

com o cognitivo, promovendo a busca pelo aprimoramento em direção ao

autoconhecimento.

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2.2 - Arte como método terapêutico

Apoiada no referencial teórico de Carl Gustav Jung, criador da

Psicologia Analítica, forneceremos alguns poucos dados teóricos e práticos que

autorizam a prática de “fazer arte” como um processo expressivo revelador de

uma subjetividade e, viabilizar a análise do resultado de sua criação.

De acordo com Urrutigaray (2008), tal como nos processos formadores

de imagens oníricas, as imagens imaginadas procedem de um material contido

num espaço hipotético designado por inconsciente coletivo, precisamente de

seus conteúdos, os arquétipos; e são produzidos pela ativação da função

criadora (chamada de instinto do espírito), frente aos estímulos materiais

proporcionados.

Esta parte oculta da psique também está dotada de emoções e

impulsos, capazes de promover e dirigir a atividade humana, por seu caráter

motivador.

Tanto as imagens surgidas nos sonhos quanto àquelas criadas

plasticamente são revestidas de uma carga de energia psíquica, a libido;

surgindo diversas expressões capazes de serem percebidas através das

padronizações de configurações formadas pela integração de imagens,

emoção e impulso. Jung chamou essas padronizações de complexos e

arquétipos.

A formação de representações formais é o elemento passível de ser

submetido à percepção e constitui-se no fator preponderante para relacionar

configurações ao ego, surgindo a compreensão, como revelação significativa.

A participação do ego é necessária no sentido de confrontar com todo

este material alheio à sua vontade, pois como já foi dito, ele se constitui de

conteúdos do inconsciente.

Ainda segundo Urrutigaray (2008), a manutenção do equilíbrio

saudável ao desenvolvimento de uma personalidade depende, portanto, da sua

possibilidade de ser capaz de interpretar simbolicamente as expressões

emergentes à consciência, confrontando-as e integrando-as com as situações

de experiências vividas.

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Desta maneira entra a compreensão da Arteterapia como um fazer

revelador.

O material plástico como a folha de papel, as pinturas, os lápis, as

sucatas, as argilas; compõem os esquemas referenciais mais próximos e

seguros para conter todo fluxo energético projetado do inconsciente e ansioso

para ser conhecido, mas que à diferença dos modelos ambientais copiados,

estes agora são produzidos, resgatando o indivíduo de sua dimensão de

sujeito.

Agora, a projeção de conteúdos continua sendo executada, porém

descaracterizada de assimilações de comportamento reprodutivo. Desta

maneira entra a compreensão da Arteterapia como um fazer revelador.

“O fazer arte é terapêutico, porque proporciona

integração de uma personalidade, mediante a aplicação

de técnicas e práticas expressivas, que tanto facilitam a

materialização de formas, doadas por conteúdos

projetados, bem como permitem a identificação funcional

das mesmas, já que possibilitam a sua integração,

restituindo à personalidade os sentimentos acerca de si

que estavam faltosos. Dando ao sujeito que a utiliza como

prática o deleite de desfrutar de si mesmo.”

(URRUTIGARAY, 2008, p.50)

2.3-O trabalho com grupos

As atividades lúdicas seguida da atividade criadora, realizadas através

das artes, estimulam a organização e construção do pensamento e a

expressão de idéias.

Ampliam a base de experiências psicomotoras, exercitam a atenção e

autodisciplina de forma ativa e inteligente.

Trabalhando em grupos, possibilitamos tanto o alcance de objetivos

pessoais quanto os objetivos sociais.

A educação que partilha materiais partilha também regras de uso,

respeito ao próximo, proporcionando uma noção de bem comum.

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“A Arteterapia trabalhada em grupos, possibilita tanto o

alcance de objetivos pessoais (a individualidade), quanto

os objetivos sociais, já que ela fornece à personalidade

em formação o viés de integrar-se às necessidades de

adaptação às exigências externas da coletividade”.

(URRUTIGARAY, 2008 p.80).

Segundo Urrutigaray (2008), a criança fortalecida, cada vez mais

estruturada, valorizada, reconhecida, aumenta o grau de motivação e

disposição de ser.

“... a consecução de uma tarefa em grupo desenvolve

sentimentos de companheirismo, intimidade, satisfação,

identificação, semelhança, atração, compreensão,

orientação, esclarecimento, apoio, proteção e ajuda.”

(URRUTIGARAY, 2008 p.81)

Como a Arteterapia facilita o ingresso comum a todos favorecendo a

aceitação das diferenças individuais, o sentimento de inclusão social pode ser

experimentado.

O processo de criatividade é facilitado pelas modalidades e materiais

expressivos diversos, tais como colagens, modelagem, construção, criação de

personagens e outras infinitas possibilidades criativas, propiciando o

surgimento de símbolos indispensáveis para que cada indivíduo entre em

contato com aspectos a serem entendidos, assimilados e alterados.

Dentre estas modalidades expressivas, destaca-se a construção com

sucatas. Pois restaurando, reformando, reaproveitando ou reciclando, o

indivíduo cria e recria sua história de escolhas, configurando e reconfigurando

sua forma e identidade.

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CAPÍTULO III

ESCULTURAS COM SUCATAS

Aspectos transformadores da construção na

Arteterapia

3.1 - Técnica expressiva: Construção

“Muitas crianças, que temporariamente se

desinteressaram de outros meios de expressão,

encontram aqui um estímulo novo para suas atividades

artísticas” (MAFRA, 1970, p.145).

Construção vem do verbo “construir”, que significa segundo Ferreira

(1986), dar estrutura, edificar, fabricar, organizar, dispor, arquitetar, formar,

conceber e elaborar.

A literatura sobre o assunto é vasta, mas dentro dos limites fixados

para este trabalho, foi preciso selecionar artistas e obras, pois não seria

possível abordar toda a produção artística referente a escultura/construção

acumulada.

Um dos períodos mais fascinantes da história humana é a Pré-História.

Segundo Proença (1997), esse período não foi registrado por nenhum

documento escrito, pois é exatamente a época anterior à escrita.

Como a duração da Pré-História foi muito longa, os historiadores a

dividiram em três períodos: Paleolítico Inferior (cerca de 500 000 a.C.),

Paleolítico Superior (aproximadamente 30 000 a.C.), e Neolítico (por volta do

ano 10 000 a.C.).

A principal característica dos desenhos da Idade da Pedra Lascada,

nome pelo qual também é conhecido o Paleolítico Superior, é o naturalismo.

Os artistas do Paleolítico Superior realizaram também trabalhos em

escultura. Predominam as figuras femininas, com a cabeça surgindo como

prolongamento do pescoço, seios volumosos, ventre saltado e grandes

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nádegas. Dentre esses trabalhos, destacam-se a Vênus de Savinhano e a

Vênus de Willendorf.

Dos povos da Antiguidadde, os que apresentavam uma produção

cultural mais livre foram os gregos.

No século XII a.C., o povo grego era formado pelos aqueus, jônios,

dórios e eólios. Com o passar do tempo, no entanto, esses povos passaram a

ter a mesma cultura. Já por volta do século X a.C., os habitantes da Grécia

continental e das ilhas do Mar Egeu que falavam diversos dialetos gregos

estavam reunidos em pequenas comunidades distantes uma das outras. Muitas

delas transformaram-se em cidade-Estado, a pólis grega.

No princípio as comunidades eram muito pobres, mas aos poucos

começaram a prosperar. Com a intensificação do comércio, as cidades-Estado

entraram em contato com as culturas do Egito e do Oriente Próximo.

As criações artísticas dessas civilizações, com certeza, causaram

muito espanto e admiração nos gregos. Mas, se inicialmente estes imitavam os

egípcios, depois criaram sua arquitetura, sua escultura e sua pintura, movidos

por concepções muito diferentes das que os egípcios tiveram da vida, da morte

e das divindades.

O escultor grego do período arcaico, assim como o escultor egípcio,

apreciava a simetria natural do corpo humano. Para deixar clara ao observador

essa simetria, o artista esculpia figuras masculinas nuas, eretas, em rigorosa

posição frontal e com o peso do corpo igualmente distribuído sobre as duas

pernas. Esse tipo de estátua é chamado Kouros, palavra grega que significa

homem jovem.

Na Grécia, os artistas não estavam submetidos a convenções rígidas,

pois as estátuas não tinham função religiosa, como no Egito. Em vista disso, a

escultura grega pode evoluir livremente. Assim, o escultor grego começou a

não se satisfazer mais com a postura rígida e forçada do Kourus.

Nessa procura de superação da rigidez das estátuas, o mármore

mostrou-se um material inadequado: era pesado demais e se quebrava sob

seu próprio peso, quando determinadas partes do corpo não estavam

apoiadas. Os braços estendidos de uma estátua, por exemplo, corriam sério

risco de se quebrar.

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A solução para esse problema foi trabalhar com um material mais

resistente. Começaram então a fazer esculturas em bronze, pois esse metal

permitia ao artista criar figuras que expressassem melhor o movimento. O Zeus

de Artemísio é um exemplo disso. Os braços e as pernas dessa estátua

mostram uma atividade vigorosa. Seu tronco, porém, traduz imobilidade.

Um novo corte na linha do tempo, e podemos dizer que a arquitetura

moderna teve início na segunda metade do século XIX, quando apareceram as

primeiras grandes construções com estrutura metálica, que constituíam formas

totalmente novas em relação ao que se fazia no passado.

Os novos materiais produzidos pelas indústrias, como o ferro, o vidro, o

cimento e o alumínio, foram a principal contribuição para o nascimento da

arquitetura moderna, pois permitiram a criação de novas formas arquitetônicas,

que no período anterior à industrialização, só podiam ser imaginadas.

Na escultura, o traço marcante são as formas abstratas e a integração

entre espaço, movimento, luz e até mesmo som, reflexo da tendência de

síntese que caracteriza as artes, e do contato dos artistas com a realidade da

era eletrônica e espacial que vivemos atualmente.

As modalidades expressivas devem ser criativas e variadas para o

alcance da compreensão simbólica, e também da função organizadora

específica de cada símbolo.

Dentre essas modalidades expressivas, destaca-se a construção, que

é também um modo de informação lógica.

Todo o processo criativo, após o momento inicial de se experimentar e

explorar materiais, surge como necessidade de organizar, de colocar junto, de

elaborar o trabalho final.

A construção proporciona, em síntese, a reprodução do conhecimento

e a estruturação, constituição e reconstituição do nosso universo interior.

Devido ao fato de crianças maiores, não leitoras se caracterizarem pela

contradição, podem e devem ser favorecidas por modalidades expressivas que

lhes permitam analisar, inventar e compreender.

A construção no processo arteterapêutico, auxilia no autoconhecimento

e na edificação de benefícios específicos das técnicas construtivas, partindo de

técnicas básicas das artes plásticas, como modelagem, recorte, colagem,

desenho, pintura e de outros materiais.

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A construção trabalha com a montagem, desmontagem, equilíbrio e

desenvolvimento da coordenação visual e motora do paciente. Possibilita,

assim, a vivência com diversas situações, trabalha a percepção e o despertar

de valores, como por exemplo: noções de peso, tamanho, forma, posição e

espaço. Visa ainda a classificar e selecionar materiais, organizando-os para

construir uma forma pessoal.

Caracteriza-se pela utilização de estruturas tridimensionais: espaço

composto de comprimento, largura e profundidade. Essas três dimensões

buscam a organização, estruturação e o equilíbrio de outros elementos para

estabelecer a harmonia e a ordem visual.

Com a tridimensionalidade, estamos mais próximos do palpável, do

concreto, da vida real que tem três dimensões: podemos dar forma, estruturar,

ordenar, moldar. (CHRISTO, 2009, p.65)

Com três dimensões podemos explorar modificações na forma do que

foi trazido à tona. Estruturamos, organizamos, damos forma e volume.

As estruturas tridimensionais requerem o nível mais elevado de

inteligência visual para trabalhar com relações espaciais em relação a um

trabalho bidimensional.

Para cada direção da construção, podem-se instituir planos diversos

como o vertical, o horizontal e o transversal. Desta maneira as formas

construtivistas, também tridimensionais, são vistas distintamente de diferentes

ângulos e distâncias.

São importantes para um trabalho de construção: formato, tamanho,

cor e textura.

A forma é uma estrutura, um modo de organização de partes que se

articulam entre si, formando um todo.

A representação e a criação de formas foram, sem dúvida, facilitada

pela Geometria que simplificou, sistematizou, e desenvolveu o estudo das

formas, O termo “formas básicas” é bastante utilizado nas Artes Plásticas,

porque se constitui um elemento essencial para compor e criar formas.

Ao falar da percepção da forma como princípio de tomada de

consciência, estaremos ingressando em alguns fundamentos da Psicologia da

Forma, conhecida como Gestalt.

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Segundo Urrutigaray (2008), a Arteterapia através da percepção da

forma concebida, favorece o desenvolvimento e a formação da consciência,

porque norteia as elaborações pessoais, favorecidos por processos re-

integrativos, no sentido de separar a fragmentar os aspectos pessoais dos

aspectos coletivos presentes nos culturais, de-integração. O poder ter

referências comparativas entre aquilo que é comum e o subjetivo permite tal

alcance formativo. A partir da análise da forma, o indivíduo vai efetuando

pontes entre seus aspectos individuais (como necessidades a serem

compreendidas), e os aspectos culturais incorporados (como os ideais sociais).

A estabilidade como impulso promovido pela pregnância para a

Gestalt, ou a significação para Jung, são as finalidades desejadas pela

Arteterapia: alcançar a transformação a partir da imagem criada.

Nos trabalhos de construção em Arteterapia, é necessário que o

arteterapeuta observe todo o processo realizado, indicando por onde foi

iniciado o trabalho, de que forma uniu as partes, se foi feito individualmente ou

em grupo, se necessitou de ajuda ou se fez ou desfez alguma parte do

processo, etc. Sobretudo as possibilidades de interação e equilíbrio da

estrutura organizada devem ser observadas.

A técnica da construção em Arteterapia pode ser realizada de forma

livre ou dirigida, ou de forma individual ou coletiva.

Oaklander (1980) nos relata uma experiência de atividade de escultura

que considera a “mais bem sucedida que já experienciei com crianças, que foi

chamada de “escultura de lixo”. Embora livros de arte para crianças pequenas

ofereçam algumas idéias boas de escultura fáceis de serem executadas, a

autora não crê que seja necessário dirigir o trabalho.

No presente trabalho, no entanto, todas as atividades foram dirigidas e

trabalhadas coletivamente.

Para se trabalhar com construção em Arteterapia, é importante levar

em consideração as etapas gradativas de domínio da técnica, permitindo que

as crianças evoluam, até adquirir na sua produção, uma estrutura mais

complexa.

Existem materiais e técnicas diversas de se fazer construção em

Arteterapia.

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Entre elas são citadas materiais como madeira, papel, arame, sucata e

tecido, dentre outras. Abordaremos a seguir, apenas a construção com sucata.

Segundo Rocha (2009), sucata é o material que já foi usado, sem

“utilidade”, que seria jogado no lixo, que pode ser reaproveitado, reutilizado,

ressignificado. Os materiais diversos são materiais novos, que têm utilidades

diversas, diferentes, que podemos utilizar e ressignificar, dar outro significado

(um botão pode ser transformado no miolo de uma flor e, até mesmo, nas

pétalas).

É outra possibilidade de transformação da matéria, pois propicia

explorar diferentes propriedades de cada tipo de material, comparando-os entre

si e utilizando-os conforme suas características específicas. A criança então é

estimulada a classificar, a selecionar e organizar diferentes tipos de materiais.

A autora lembra ainda, que quando for reutilizar algumas embalagens,

recipientes, lavá-los adequadamente, se necessário com água quente. Fazer a

limpeza das sucatas antes de trabalhar, e se for pedir aos alunos que levem

sucata para a escola, mandar uma circular informando a importância de se

manipular materiais limpos.

Os materiais disponibilizados para o nosso grupo foram:

-cola branca e colorida

-papéis coloridos (de seda, crepom e laminado)

-fita adesiva

-palitos para churrasco, de dente, de sorvete

-fitas coloridas

-caixas de vários tamanhos (de pasta de dentes, de remédios, de

sapatos...)

-embalagens industriais

-pedaços de isopor

-papelão

-copos de papel, de plástico

-chapinhas

-clipes

-tampas

-canudos

-tubos de papel toalha, de papel higiênico

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Foram utilizadas, além da técnica de construção, outras atividades:

pintura, colagem, relaxamento e fantasia criativa, como auxílio ao processo de

construção.

Segundo Urrutigaray (2008), o exercício lúdico de montagem de

personagens, como marionetes ou simples bonecos, a criação de cenários,

etc... A inovação a partir de algo já criado, com uma formatação já atualizada

em outra modalidade presente apenas no imaginário, para depois ser

materializada em outra forma, provoca estados de profunda virtualidade e

criatividade.

Onde as dimensões: caos-ordem-desordem-nova-ordem conseguem

interagir sem provocar sensação de recusas, decorrentes das pressões de

eliminação de um determinado objeto, de destruição, de aniquilamento,

viabilizando a projeção destes conteúdos sombrios, através da percepção de

novas configurações surgidas a partir da transformação, não destruição do

material original.

Segundo Philippini apud Nagem (2009), a transformação plástica por

meio do trabalho com as mãos funciona como um elo entre o mundo real e o

mundo da fantasia, entre o consciente e o inconsciente, que permite viajar para

dentro de si e resgatar o sentido de sua própria vida. Resgatar o sentido da

vida nos auxilia a valorizar e utilizar tudo que está à nossa volta.

O trabalho com sucata propicia o estímulo à criatividade por meio da

construção e da reconstrução do concreto e do real. Traz a mudança por meio

do concreto. Por poder ser aliada à pintura, à colagem e à modelagem,

apresenta-se como uma atividade rica e complexa, podendo mobilizar os

conteúdos inconscientes, transformando-os e ressimbolizando-os de forma

benéfica.

Daí em diante, a imaginação aflora, e se vê no que é jogado fora, mais

do que apenas lixo.

Philippini (2009) torna claro que os exercícios de criação, construção e

animação de personagens constituem-se em efetivos, delicados, graduais,

lúdicos e sutis convites, para que a multiplicidade anímica se manifeste.

Somos habitados por infinitos “novos personagens”, e convidá-los à

cena é colorir o cotidiano, é emocionar-se com a própria profundidade e

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abrangência psíquica. É também propiciar condições para que a luz do self

guie a consciência para melhores e mais harmônicas rotas.

Valladares e Novato (2001), analisaram os efeitos da utilização da

construção em Arteterapia junto a adolescentes, relatando que por meio do

estudo foi possível observar que através dos indícios de evolução crescente

dos trabalhos práticos houve mudanças comportamentais nos pacientes

expressas pela diminuição da ansiedade, insegurança e melhor relacionamento

e integração grupal nos adolescentes.

Consideraram que a partir desse trabalho o processo terapêutico da

construção pode trazer benefícios a esta clientela, seja a nível simbólico (pelas

imagens) como a nível comportamental.

A construção permite infinitas opções de descobertas, o que favorece o

equilíbrio emocional das crianças maiores. Elas desenvolvem sua expressão e

imaginação espontaneamente, descarregando tensões e exteriorizando suas

alegrias, temores e fantasias.

Trabalha com o equilíbrio psicológico, colaborando no despertar de

valores, no desenvolvimento motor, intelectual e social, auxiliando no

crescimento afetivo psicomotor e cognitivo, permitindo a criação e

experimentação, o que gera o prazer de novas descobertas e uma forma mais

satisfatória de se expressar, de se comunicar.

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CAPÍTULO IV

PERCURSO SIMBÓLICO E INDIVUDUAÇÃO

Construindo um caminho

“Trata-se de um caminho feito de cores e de formas,

repleto de significado. Este caminho, às vezes, é longo,

às vezes, é cheio de obstáculos, obrigando a recuos e

paradas... Por ele caminham viajantes solitários ou, por

vezes, bandos alegres e ruidosos e todos, ao passarem,

deixam rastros e restos, pistas e partes, com seus pés

marcam o trajeto e, com suas mãos, alargam a

passagem. Há quem desista logo, quem caminhe um

pouco mais e quem, arduamente, chegue até o final, para

só então descobrir que este fim bem pode ser só o

começo...” (PHILIPPINI, 2004, p.20)

4.1 - Representações coletivas inconscientes

Durante o processo de individuação, muitas etapas são vivenciadas e

percorridas.

O conceito de arquétipo é uma das peças-chave para a compreensão

da teoria junguiana.

Segundo Grinberg (2003), arquétipo é um conceito criado a partir da

observação de temas típicos bem definidos, presentes nos mitos, e na literatura

universal, que se repetem em sonhos, imagens, fantasias, delírios e

alucinações de todos os indivíduos. Teoricamente não se pode conhecer

completamente o arquétipo nem esgotá-lo. É uma das manifestações da

energia psíquica que se torna visível por meio de uma imagem arquetípica ou

se evidencia nos comportamentos externos, principalmente os que expressam

as experiências mais básicas e universais da humanidade, como nascimento e

morte. Existem diversos tipos de arquétipos, que se manifestam na medida em

que as situações cotidianas vão surgindo.

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Os símbolos arquetípicos podem ser encontrados em mitos, contos,

lendas e manifestações culturais de modo geral. Assim, dos arquétipos

estudados por Jung, interessará ao presente trabalho o arquétipo do herói.

O herói, de acordo com a maioria dos mitos e contos de fadas, só

consegue chegar à vitória depois de passar por uma longa e difícil jornada, que

representa o seu processo de individuação.

É o arquétipo que incorpora as mais poderosas aspirações e revela a

maneira pela qual elas são idealmente compreendidas e realizadas.

Representa a vontade e a capacidade de procurar e suportar repetidas

transformações em busca da totalidade ou do significado.

Implica não só a capacidade de resistir, mas também a de sustentar

conscientemente a tremenda tensão entre os opostos.

Grinberg (2003), nos fala sobre o arquétipo do herói (Jung), tão

fundamental ao desenvolvimento pessoal e da cultura. A abordagem é focada

na fase da adolescência, mas o autor lembra que em qualquer idade, todas as

grandes transformações pelas quais passamos são, ao se iniciarem,

impulsionadas pela busca heróica da diferenciação entre a consciência do ego

e a totalidade da psique.

É esse arquétipo que dá forças ao ego quando este acha que não

conseguiu enfrentar uma situação nova, pois para ser capaz de se desenvolver

e desempenhar a contento os diferentes papéis que precisa exercer no mundo

adulto, o ego necessita de certo grau de autonomia.

A adolescência é uma fase de muitas mudanças, mas mesmo estando

sempre em mudança, é fundamental que o ser humano se sinta único e

idêntico a si mesmo, a fim de poder seguir o caminho do desenvolvimento.

Essa busca solitária é complementada pela vivência do coletivo, do

sentimento de pertencer a um grupo e de identificação com uma turma.

O adolescente não sabe quem é, e emprega grande parte de sua

energia na busca de auto-afirmação e autonomia, a fim de entrar na vida adulta

dotados de segurança e auto-estima.

É esse sentimento que nos permite enfrentar o desafio e o perigo de

entrar no desconhecido que se apresenta na fase da adolescência, mas essa

mesma força, se mal direcionada, poderá causar uma inflação da

personalidade e levar a aventuras muito perigosas e a acidentes.

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4.2 – A Individuação

O caminho de um indivíduo é um caminho de crescimento, de

transformação.

Ao longo desse processo de desenvolvimento e diferenciação da

consciência, podemos perceber, em um nível mais profundo, que nossas

experiências estão subordinadas a um objetivo.

A esse processo, o pilar de sustentação de toda a nossa busca, Jung

denominou individuação, termo que significa tornar-se um “indivíduo”, aquele

que não se divide.

Segundo Grinberg (2003), implica tornar-se si-mesmo, ou seja, aquilo

que de fato somos o que nada tem a ver com individualismo, com o sentimento

que leva a enfatizar alguma peculiaridade particular em detrimento de

considerações e obrigações coletivas.

Como disse Jung, a individuação se faz entre os homens. O processo

de individuação deve levar a relações coletivas mais intensas e não ao

isolamento.

Para Philippini apud Nagem (2009), estes processos de transformação

que podem ocorrer no campo material e no campo psíquico, se observados e

relacionados durante o trabalho arteterapêutico, podem propiciar ao indivíduo

que caminha uma integração de seus conteúdos materiais e imateriais, que se

tornam matéria-prima essencial ao seu processo de individuação.

Durante o caminho de crescimento, muitos materiais tornam-se o

veículo plástico por meio das modalidades expressivas, que poderão ser tão

variados quanto à criatividade e o treinamento do arteterapeuta permitir.

Philippini apud Nagem (2009), nos fala sobre o bricoleur. A palavra

bricoleur significa trabalho de amador, onde a técnica é improvisada, adaptada

ao material e às circunstâncias.

Um bricoleur não possui um projeto preconcebido, mas atinge seu

objetivo operando sem este plano previamente definido e a partir de materiais

improvisados. Escolhe intuitivamente, pois se afasta do caminho conhecido,

constrói a partir de sobras.

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Considera o processo de intervenção na transformação da matéria-

prima (física e psíquica), no tocante à forma e à individuação em quatro níveis:

Restauração: um trabalho lento e paciente, de pura e simples

manutenção, com o intuito de preservar o que existe de importante e o que se

atribui valor.

Reforma: é atribuir uma nova vida, um novo sopro a um objeto, uma

obra de arte.

Reaproveitamento: ao reaproveitar, tomamos posse de diversos

materiais antes de descartá-los, criando e exercendo novas formas de

utilização. Sucata não é lixo se reaproveitado, consistindo em fazer arte com

algo que não servia para mais nada. A partir daí, a imaginação começa a

aflorar, pois se consegue ver no que é jogado fora, mais do que apenas lixo.

Então reaproveitando conteúdos psíquicos, transmutando-os em construções

renovadas e renovadoras, oferece à psique um novo sentido, essencial ao

caminho de individuação.

Reciclagem: reciclar é aproveitar o material de que foi feito um objeto e

que já tenha sido usado, evitando que o material acabe no lixo. É submeter

uma substância a um tratamento para suas propriedades, ou aproveitar melhor

seu rendimento.

“Restaurando, reformando, reaproveitando ou reciclando, o indivíduo

que cria e recria sua história de escolhas estará configurando sua forma e

identidade, sua matéria e psique, seu corpo e espírito, sua mente e alma”.

(PHILIPPINI apud NAGEM, 2009, p.31)

Ao debruçar-se sobre a matéria já usada e desgastada, o paciente

bricoleur passará a olhar para si mesmo de uma nova e transformadora

maneira.

Este caminho transformador engloba uma série de experimentações e

vivências, que se materialização nas bricolagens onde tudo se transfigurará e

integrará.

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CONCLUSÃO

Já no século V a.C., existem registros de arte sendo usada na Grécia,

como um meio de tratamento e cura. Com isso, a arte passou a ser utilizada

como instrumento de expressão transformadora e colaboradora de seres mais

saudáveis.

Segundo Philippini (2004), a arte como ferramenta terapêutica, no

Brasil, é vista por segmentos mais conservadores com reservas. Dentro do

universo junguiano, é prática rotineira.

Na fase pré-escolar, por ser entendida como anterior à aprendizagem

escrita, as crianças trabalham com tintas, tesouras, papéis coloridos, música e

teatro.

Aparentemente trabalho criativo, mas em geral, são ensinadas técnicas

que na maioria das vezes as crianças se limitam a reproduzir. Outros

professores se valem dessas técnicas como preparatórias para a leitura e

escrita. Alguns poucos incorporam a seu trabalho, a arte como um processo de

fazer/aprender.

Para que a criança se expresse por meio de várias linguagens, é

necessário que aprenda a lidar com o maior número possível de materiais,

lembrando que conhecimento é coisa que se recria e reconstrói no contato com

outras experiências e conhecimentos construídos em outros espaços, grupos e

práticas não necessariamente escolares.

A produção artística da criança não é algo isolado de um contexto, não

é uma mera resposta a uma solicitação feita pelo professor.

Em cada atividade a criança seleciona aspectos que deseja

representar e busca, nas experiências passadas, individuais ou

compartilhadas, as referências para o que deseja construir. Na arte a criança

constrói, organiza, registra e expressa saberes diversos: capacidade narrativa,

noções matemáticas, noções de tempo e espaço, noções de diversidades

socioculturais, de geometria, de teoria das cores e da forma, noções estéticas.

Muitas dessas noções só serão vistas pela escola bem mais tarde,

outras sequer serão consideradas.

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Assim, sem um preparo para compreender como essas noções vão

sendo expressas e construídas, o professor avalia a criança com base em um

rol de habilidades consideradas necessárias para a aprendizagem da leitura e

escrita.

Em conseqüência, uma série de conhecimentos já construídos pela

criança não são vistos, não fazem parte do rol de saberes que devem ser

observados pela professora.

Mas achar que isto se deve à pura desatenção do professor é também

um equívoco.

É preciso entender em que direção está indo o olhar do professor. Que

ideais de arte, de educação, de conhecimento dirigem seu olhar.

A aprendizagem humana é um processo interativo, onde vários

componentes se inter-relacionam: genética, neurológica, psicológica,

educacional, social, etc., e quando as crianças chegam à escola, encontram-se

altamente receptivas à aprendizagem, quer venham de ambientes favoráveis

ou desfavoráveis.

A educação deve e tem de levar as crianças a pensar em sucesso, e

não em insucesso.

As crianças que não aprendem as aquisições simbólicas essenciais -

ler, escrever, falar, e contar – falham na escola e terão provavelmente as

mesmas hipóteses de sucesso na vida, ficando portanto , privadas de

identidade cultural.

Caracterizar, controlar, e transformar o insucesso escolar envolve

medidas educacionais intensivas, claras, com a participação de toda a

sociedade.

Este assunto é vasto e permite abordar questões as mais diversas.

Voltando nosso olhar para a arte e para a história do homem, podemos

ver que a relevância da atividade artística está igualmente, no processo e no

produto. Ao se expressar nas mais diversas linguagens, a criança lança pistas

sobre a forma como se vê e vê o mundo.

Denuncia a forma como é vista, pondo à mostra os inúmeros mitos,

crenças e preconceitos que conduzem nossa maneira de ver e de tratar cada

criança no processo de alfabetização. As crianças maiores, não alfabetizadas,

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descrentes de suas possibilidades, aguardam por ajuda.Dentre as inúmeras

possibilidades, a Arteterapia.

A experiência do trabalho com Arteterapia proporciona a possibilidade

de reconstrução e da integração de uma personalidade.

Segundo Urrutigaray (2008), tal como se medicação fosse, a

instrumentação de materiais pictóricos, plásticos, reconduz o sujeito, que deles

faz uso, a mecanismos de estruturação de si mesmo, dada pela elucidação de

seu próprio material.

Ainda segundo Urrutigaray (2008), o objetivo da Arteterapia na

atividade escolar: é o desenvolvimento do potencial produtivo e criativo como

elemento resultante da formação de estruturas psíquicas superiores.

(pensamento hipotético-dedutivo). A organização das idéias, a estruturação do

espaço e do tempo, e a compreensão da causalidade.

PHILIPPINI (apud NAGEM, 2008, p. 32), esclarece:

“ O arteterapeuta, que exerce sua função por intermédio

de meios indiretos e por isso mesmo eficazes, vai

colhendo durante o processo uma imagem, um sonho,

uma lembrança,um gesto, um tom de voz, um sorriso,

uma lágrima e, desta forma, segue compondo e

recompondo a história de seu analisando e seu processo

arteterapêutico. Este processo evidencia o trabalho com o

inesperado, com aquilo que se apresenta, com o que se

tem à mão, com um adaptar-se às cincunstâncias. “É o

mesmo sentido abordado na antropologia, onde sempre

trabalhamos com o inesperado, com o novo trazido a

cada sessão pelo paciente.”

Aos poucos, o respeito e o cuidado com os objetos produzidos

individualmente ou em grupo se desenvolviam, como também a valorização

pela própria obra, desconsiderando aspectos como acabamento, rigor estético,

ou outras formalidades.

Abordamos no capítulo III, aspectos transformadores da construção em

arteterapia, e no capítulo IV o processo de crescimento e transformação. A

aplicação da oficina de criatividade. Construção com sucatas: dirige-se para a

valorização do potencial criador, como constituinte de toda ação.

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Pudemos observar no cotidiano da sala de aula, momentos de prazer,

em que o lúdico predominava e a experimentação era permitida, recuperando o

prazer de aprender, e a autonomia do pensamento e do sentimento.

Uma nítida mudança de comportamento das crianças foi observada

durante o processo, bem como da evolução de desenvolvimento de objetos

tridimensionais, e a melhora no rendimento escolar (segundo relatos dos

professores responsáveis pelas tarefas complementares à escola).

Assim, verificamos como cada criança foi se recriando de forma

consciente e prazerosa, buscando encontrar a própria força.

Consideramos então, que a partir desse trabalho, o processo

arteterapêutico da construção com sucatas, pode trazer benefícios a esta

clientela, seja a nível simbólico (pelas imagens), seja a nível comportamental

como cognitivo, auxiliando no processo de alfabetização.

Este estudo, recolhido do cotidiano de um trabalho voluntário que lida

com crianças de classes populares, não se encerra aqui.

Esperamos possa servir como convite aos que se interessarem em

aprofundar os estudos no tema, e que cada vez mais tragam respostas para o

complexo processo de aprendizagem da leitura e da escrita.

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ANEXO 1

Figura: Cachorro

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ANEXO 2

Figura 2: Jacaré

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ANEXO 3

Figura 3: Vaquinha

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ANEXO 4

Figura 4: Ovelha

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ANEXO 5

Figura 5: Cachorros

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ANEXO 6

Figura 6: Pinto

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ANEXO 7

Figura 7: Robô

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ANEXO 8

Figura 8: Filó (1)

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ANEXO 9

Figura 9: Filó (2)

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ANEXO 9

Morada do Inventor

A professora pedia e a gente levava,

achando loucura ou monte de lixo:

latas vazias de bebidas, caixas de fósforo,

pedaços de papel de embrulho, fitas,

brinquedos quebrados, xícaras sem asa,

recortes e bichos, pessoas, luas e estrelas,

revistas e jornais lidos, retalhos de tecido,

rendas, linhas, penas de aves, cascas de ovo,

pedaços de madeira, de ferro ou de plástico.

Um dia, a professora deu a partida

e transformamos, colamos, e colorimos.

E surgiram bonecos esquisitos,

bichos de outros planetas, bruxas

e coisas malucas que Deus não inventou.

Tudo que nascia ganhava nome, pais,

casa, amigos, parentes e país.

E nasceram histórias de rir ou de arrepiar!

E a escola virou morada de inventor!

Poema de Elias José

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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

AARJ, Associação de Arteterapia do Rio de Janeiro. Estudos em Arteterapia: diferentes olhares sobre a arte. Rio de Janeiro: Wak, 2009. CARVALHO, Mary Sue. A Descoberta da Criança: introdução à educação infantil. Rio de Janeiro: Wak, 2002. CHAVES, Dina Lúcia Rocha. Brincando com a Criatividade: contribuições teóricas e práticas na Arteterapia e na educação. Rio de Janeiro: Wak, 2009. CHRISTO, Edna Chagas. Criatividade em Arteterapia: pintando & desenhando, recortando, colando & dobrando. Rio de Janeiro: Wak, 2009. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. GRINBERG, Luiz Paulo. Jung: O Homem Criativo, 2ª ed. São Paulo: FTD,

2003.

LEITE, Regina Garcia. A Formação da Professora Alfabetizadora: reflexões

sobre a prática, 4ª ed. São Paulo: Cortez, 2003.

MAFRA, Alcídio de Souza. Artes Plásticas na Escola. Rio de Janeiro: Bloch Editores, 1970. OAKLANDER, Violet. Descobrindo Crianças: a abordagem gestáltica com crianças e adolescentes. São Paulo: Summus,1980. OSTROWER, Fayga. Criatividade e Processos de Criação. Rio de Janeiro: Imago,1977. PHILIPPINI, Angela. Cartografias da Coragem. Rotas em Arteterapia. Rio de

Janeiro: Pomar, 2004.

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PHILIPPINI, Angela. Arteterapia: métodos, projetos e processos, 2ª ed. Rio de Janeiro: Wak, 2009. PROENÇA, Graça. História da Arte. São Paulo: Ática, 1997. SAVASTANO, Renata R. Jardini. Método das Boquinhas: alfabetização e reabilitação dos distúrbios da leitura e escrita. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003.

URRUTIGARAY, Maria Cristina. Arteterapia: a transformação pessoal pelas

imagens, 4ª. Ed. Rio de Janeiro: WAK, 2003.

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WEBGRAFIA

Revista Escola Abril

www.revistaescolaabril.com.br

Disponível em: http://revistaescola.abril.com.br/língua-portuguesa/pratica-

pedagogica/morada-inventor

Acesso 13 de Dezembro de 2010.

Associação de Arteterapia do Rio de Janeiro

www.aarj.com.br

Disponível em: http://www.aarj.com.br/sys/índex.

Acesso 07 de Outubro de 2010.

União Brasileira de Associações de Arteterapia

www.ubaat.com.org

Disponível em: http://WWW.ubaat.org

Acesso 07 de Outubro de 2010.

Artes e Terapias Atelier Eveline Carrano

www.artesterapias.com.br

Disponível em: http://www.arteseterapias.com/site/índex

Acesso 07 de Outubro de 2010.

Revista Eletrônica de Enfermagem

www.fen.ufg.br

Disponível em: http://wwwfen.ufg.br/revista/revista3_1/arterap.html

Acesso 14 de Dezembro de 2010.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 9

CAPÍTULO I

Dificuldade de Aprendizagem: 10

Nossas crianças

1.1- Mas quem são nossas crianças? 10

1.2- Sintomas 11

1.3- Intervenções 13

CAPÍTULO II

Arteterapia: O acolhimento 15

2.1- Sentido da arte na educação escolar 16

2.2- Arte como método terapêutico 19

2.3- O trabalho com grupos 20

CAPÍTULO III

Esculturas com sucatas: Aspectos transformadores 22

da construção na Arteterapia

3.1- Técnica expressiva: Construção 22

CAPÍTULO IV

Percurso Simbólico e Individuação 30

Construindo um caminho

4.1 - Representações coletivas inconscientes 30

4.2 – A Individuação 32

CONCLUSÃO 34

ANEXOS 38

BIBLIOGRAFIA 48

WEBGRAFIA 50

ÍNDICE 51

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição:

Título da Monografia:

Autor:

Data da entrega:

Avaliado por: Conceito:

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