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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE ASPECTOS RELEVANTES DO PROCESSO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL Por: KALINE DE OLIVEIRA LYRIO Orientador Prof: Jean Alves RIO DE JANEIRO 2010

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

ASPECTOS RELEVANTES DO PROCESSO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL

Por: KALINE DE OLIVEIRA LYRIO

Orientador Prof: Jean Alves

RIO DE JANEIRO 2010

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

ASPECTOS RELEVANTES DO PROCESSO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL

Apresentação de monografia à Universidade Cândido Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Direito Processual Civil.

Por: Kaline de Oliveira Lyrio

Rio de Janeiro 2010

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DEDICATÓRIA

Dedico esta obra a Deus, a quem devo toda honra e glória. Aos meus pais, com muito amor e carinho, Walmir Lyrio da Silva e Calede Archanjo de Oliveira da Silva, exemplos de retidão de caráter, senso de justiça, otimismo e humildade, demonstração incansável de probidade, ternura, perseverança, fé e coragem em enfrentar os desafios.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço ao professor e orientador Jean Alves, pelo apoio e encorajamento contínuos na pesquisa, aos demais Mestres, pelos conhecimentos transmitidos, e à Diretoria do Curso de Direito Processual Civil do Instituto a Vez do Mestre, pelo apoio institucional.

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RESUMO

Este trabalho elenca os principais entraves processuais decorrentes da legislação

executiva expressada através do Código de Processo Civil, trazendo a baila alguns aspectos

da evolução do evolução do processo civil brasileiro, sobretudo em relação ao processo de

execução, que tem o escopo de promover a forma mais adequada de se promover a entrega

da tutela jurisdicional.

Com efeito, o Código de Processo Civil vem sendo modificado, gradativamente, no

que se pode denominar verdadeira busca pela superação da morosidade processual, sem

que sejam feridos os princípios basilares da ampla defesa, do devido processo legal e do

contraditório, próprios de um verdadeiro Estado Democrático de Direito.

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METODOLOGIA

Para a elaboração deste trabalho foram realizados dois tipos de pesquisas, a

saber: a pesquisa bibliográfica, constituída principalmente de artigos científicos e livros,

visto que permite a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla; e a pesquisa

documental. Embora esta última se assemelhe à pesquisa bibliográfica, permite que se

tenha acesso à documentos tipo: reportagens de jornal, relatórios de pesquisa, documentos

oficiais, entre outros.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I - A REFORMA PROCESSUAL 10

CAPÍTULO II - O PROCESSO DE EXECUÇÃO 26

CAPÍTULO III - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA 37

CONCLUSÃO 51

BIBLIOGRAFIA 52

ÍNDICE 53

FOLHA DE AVALIAÇÃO 55

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INTRODUÇÃO

O objeto de estudo dessa pesquisa se constitui os aspectos gerais do

processo de execução, bem como as alterações inseridas no Livro II do Código de Processo

Civil Brasileiro pela Lei n° 11.232/05 .

É fato notório que, desde sua promulgação, o Código de Processo Civil é

acompanhado por uma ferrenha discussão à respeito de suas diretrizes e aplicações, uma

vez que o mesmo revelou-se um instrumento processual de elevada complexidade prática,

transformando seus institutos muitas vezes em meros meios postergatórios, dando à tutela

jurisdicional a fama de inoperante e injusta.

Assim, deu-se partida em um processo de busca por melhorias, que

culminaram num movimento de reformas no Código de Processo Civil, iniciado nos

primeiros raios da década de 1990, e que dura até hoje.

Neste contexto, insere-se o presente trabalho. Visando elucidar a sistemática

do processo de execução dos títulos judiciais.

O presente trabalho justifica-se, uma vez que a crescente descrença no

sistema processual brasileiro,vem direcionando a classe jurídica para a necessidade de

adoção de um amplo movimento nacional, no sentido de que mudanças urgentes e

estruturais sejam aplicadas às modalidades instrumentais em nosso estatuto processual,

garantindo aos cidadãos meios adequados de defesa de seus direitos, eliminando o receio

de ver suas pretensões sucumbirem diante da complexa teia processual.

Com o objetivo de contribuir, mesmo que modestamente, para a

compreensão do sistema jurídico, esta pesquisa é relevante porque através dos seus

resultados será possível, em meio a inúmeras reflexões, atentar para a efetiva

aplicabilidade dos princípios como os da efetividade e utilidade, enquanto solução para o

quadro engessado do sistema processual brasileiro.

Destarte, num primeiro momento, será exposto o contexto histórico deste

processo de reformas, onde serão abordados além das fases evolutivas do processo civil,

enquanto ramo da ciência jurídica, as dúvidas relativas aos métodos a serem aplicados afim

de implementar-se as necessárias alterações estruturais, assim como os razões e

fundamentos que nortearam todo o processo.

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Posteriormente, será comentada a nova estrutura executória, destacando-se

inicialmente a estrutura anterior à Lei nº. 11.232/05, passando pela sistemática de execução

para, finalmente, expor os resultado das alterações instituídas pelo diploma legal.

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CAPÍTULO I – A REFORMA PROCESSUAL

1.1 - Histórico da Reforma do Código de Processo Civil.

Não há como falar em reforma do Código de Processo Civil, sem antes,

abordar o contexto histórico evolutivo deste “ramo da ciência jurídica que estuda e

regulamenta o exercício, pelo Estado, da função jurisdicional” 1.

Porém, não serão contempladas no presente trabalho, todas as fases histórico-

evolutivas do Direito Processual, uma vez que, de um lado, não é o seu objetivo central, e,

de outro, tal abordagem estaria fora de contexto, pois a concepção de Direito Processual na

Grécia Clássica, no Império Romano ou na Idade Média e seus reflexos não exercem

significante influência na atual fase reformatória pela qual passa o nosso ordenamento

instrumental.

Neste sentido, temos que, sucintamente, a evolução científica (ou doutrinária)

do Direito Processual Moderno, pode ser dividida em três fases, muito distintas entre sí: a

fase imanentista, a fase autonomista ( ou conceitual ) e a fase instrumentalista.

A primeira fase baseou-se na teoria que, tentava estabelecer o conceito de uma

ação processual intrinsecamente ligada ao direito material, foi a chamada teoria

imanentista, clássica ou civilista, que teve como expoentes dentre outros, Savigny,

Garsonnet, e, entre nós, João Monteiro, Clóvis Beviláqua.

Esta teoria parte do conceito de que a ação seria o direito de pedir em juízo o

que nos é devido, ou seja, “a ação seria uma qualidade de todo direito ou o próprio

direito reagindo a uma violação”2. Deste conceito surgiram várias conceituações que

resultavam, segundo Ada Pellegrini Grinover, Cândido Dinamarco e Antonio Carlos de

Araújo Cintra3, “em três conseqüências inevitáveis: não há ação sem direito; não há

direito sem ação; a ação segue a natureza do direito”.

1 Alexandre Freitas CÂMARA, Lições de Direito Processual Civil, p. 5. 2 Antonio Carlos de Araújo CINTRA, Cândido Rangel DINAMARCO, Ada Pellegrini GRINOVER, Teoria Geral do Processo, p. 266. 3 Ibid., p. 266

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Dizia-se, então, que o direito material, sendo essencial, era verdadeiro direito

substantivo, enquanto o processo, mero conjunto de formalidades para a atuação prática

daquele, era um direito adjetivo. Daí a afirmação de que o Direito Processual era um mero

apêndice do Direito Material, daí o termo imanentista, que nos lembra imã.

A segunda fase, também conhecida como fase científica ou autonomista do

Direito Processual, inicia-se com os primeiros trabalhos que passam a considerar o

processo como relação jurídica, sendo que seu marco inicial é 1868, ano da publicação da

obra do jurista alemão Oskar von Bülow cuja tradução seria A Teoria das Exceções

Processuais e os Pressupostos Processuais. 4

Embora já existissem discussões acerca da distinção entre a relação jurídica

processual e a relação jurídica de direito privado, a obra de Bülow é o estopim de uma série

de estudos que vão contribuir para o desenvolvimento da teoria do processo, na qual, a

partir da identificação e estruturação dos conceitos essenciais inerentes à ciência

processual, o Direito Processual passa a ser considerado como ramo autônomo do Direito.

É nessa fase que o mundo conhece os maiores autores do Direito Processual de

todos os tempos, nomes como os de Giuseppe Chiovenda, Francesco Carnelutti, Piero

Calamandrei e Enrico Tullio Liebman na Itália, destacando-se entre nós Alfredo Buzaid,

Lopes da Costa, Moacyr Amaral Santos.

A terceira fase surge a partir do momento em que as diretrizes e conceitos

básicos da autonomia científica do Direito Processual já estavam cristalizados, e, puderam

então os processualistas dedicarem-se ao estudo de meios de aperfeiçoar a prestação

jurisdicional, tornando-a cada vez mais segura e célere. É a chamada fase instrumentalista.

Nesta fase, o processo passa a ser visto como um instrumento utilizado pelo

Estado para alcançar seus escopos sociais, jurídicos e políticos, garantindo aos

jurisdicionados a certeza de uma tutela jurisdicional adequada e efetiva.

É uma fase extremamente crítica, uma vez que os processualistas modernos

têm consciência dos níveis de desenvolvimento já alcançados e, ao mesmo tempo,

deparam-se com as falhas sistêmicas ainda existentes, que impedem o alcance de uma

prestação jurisdicional satisfativa.

4 Muito embora Cândido Rangel Dinamarco afirme que Bülow, na verdade, não criou a idéia da relação jurídica processual, apenas a racionalizou e desenvolveu, propondo o desdobramento da autonomia da ação e do processo ( Cândido Rangel DINAMARCO, A Instrumentalidade do Processo, p. 18-19)

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É, no decorrer dessa fase, na qual busca-se o pleno acesso à “ordem jurídica

justa”, que implementam-se três fases de desenvolvimento teórico que, acompanhadas de

instrumentos práticos (Leis), começam a dar ao processo civil, contornos democráticos, são

as conhecidas “três ondas do acesso à justiça” 5 , também conhecidas como

“renovatórias”6 do direito processual, nas quais, sucintamente, busca-se o seguinte:

a) a primeira onda visa transpor a barreira econômica que, muitas vezes,

impedia àqueles que possuíam uma posição jurídica de vantagem, de obter a tutela

jurisdicional de seus direitos, uma vez que não dispunham de recursos para arcar com as

despesas processuais. Nesta fase então, a meta era garantir a assistência judiciária aos

necessitados, neste sentido, temos a Lei n. 1.060/50 e o art. 5°, LXXIV, da CRFB;

b) a segunda onda volta-se para a defesa dos interesses supra-individuais

também conhecidos como direitos coletivos e difusos que, por serem interesses que estão

acima dos indivíduos, não podiam ser tutelados pelos mesmos institutos processuais de

proteção dos direitos individuais, assim, temos a ação popular, a ação civil pública, a ação

civil coletiva e o mandado de segurança coletivo;

c) a terceira onda surge, então, não mais perseguindo as garantias básicas de

acesso à Jurisdição, já asseguradas, mas sim, nasce com a missão de buscar meios para

que, na medida do possível essa prestação jurisdicional seja célere e eficiente, atendendo,

pois os anseios dos jurisdicionados. Nessa seara, temos como exemplo a Lei n. 9.099/95,

que regulamenta os Juizados Especiais Cíveis, na qual há a primazia da oralidade,

simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade.

Dentre os grandes processualistas desta nova fase do desenvolvimento do

Direito Processual podemos citar os nomes de Mauro Cappelletti, professor italiano, além

dos notáveis juristas brasileiros José Carlos Barbosa Moreira e Cândido Rangel Dinamarco.

Destarte, conforme leciona Alexandre Freitas Câmara7, podemos então aduzir

que a evolução legislativa do Direito Processual Pátrio, sempre acompanhou a evolução

científica afeta a este ramo do direito. Assim é que, efetivamente, nossos Códigos de

5 Alexandre Freitas CÂMARA, Lições de Direito Processual Civil, p. 35 6 Antonio Carlos de Araújo CINTRA, Cândido Rangel DINAMARCO, Ada Pellegrini GRINOVER, Teoria Geral do Processo, p. 49 7Alexandre Freitas CÂMARA, Lições de Direito Processual Civil, p. 10.

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Processo Civil foram elaborados com fincas nas teorias predominantes na fase científica

(tanto o CPC de 1939, elaborado à luz das teorias de Chiovenda, como o de 1973,

verdadeiro "monumento em homenagem a Liebman", enquadrando-se, pois, nesta fase da

evolução do Direito Processual).

No entanto, o nosso Código de Processo Civil, que à época de sua entrada em

vigor, era considerado como um dos mais modernos do mundo, foi pouco a pouco

demonstrando ser, na prática, um instrumento deveras complexo do ponto de vista da

aplicabilidade de alguns de seus institutos.

Tal complexidade, resultou nos clamores advindos tanto da comunidade

técnica ( Advogados, Juízes, Promotores de Justiça, Defensores Públicos, etc.), quanto da

sociedade civil, que sempre ansiaram por uma prestação jurisdicional mais eficiente e justa.

Não restou outra alternativa então, a não ser repensar o Código de Processo

Civil vigente, a fim de dar-lhe meios de cumprir seu papel, qual seja de ser o instrumento-

meio de uma prestação jurisdicional eficaz e justa. Eficaz, pois, deve, enquanto norma

instrumental, permitir aos seus operadores os mecanismos adequados aos fins a que se

destina e justa, pois deve, acima de tudo, garantir a segurança jurídica baseada no

contraditório e na ampla defesa;

Diante deste paradigma, nascem os primeiros raios de uma reforma processual,

muito embora possa-se dizer que o Código de Processo Civil já foi reformado antes

mesmo de entrar em vigor, pois, ainda no período de sua vacância foi alterado pela Lei na

5.925, de 1° de outubro de 1973, que modificou a redação de noventa e três de seus

artigos, além de remunerar um dispositivo daquele diploma e modificar a epígrafe de uma

Seção e de um Capítulo do Código.

A reforma do Código de Processo Civil, porém arquitetou-se, de fato, na década

de 1980, após a criação de uma Comissão incumbida de reformar aquele diploma. Tal

comissão, constituída por Luís António de Andrade, José Joaquim Calmon de Passos,

Kazuo Watanabe, Joaquim Correia de Carvalho Júnior e Sérgio Bermudes. Essa comissão

elaborou um anteprojeto de reforma do CPC que não foi levado a termo.

Entretanto, na década de 1990, foi composta nova comissão, desta feita, por

alguns da anterior e pelos membros da Escola Nacional de Magistratura e do Instituto

Brasileiro de Direito Processual. Esta comissão foi constituída originariamente por Sálvio de

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Figueiredo Teixeira (Presidente), Ada Pellegrini Grinover, Athos Gusmão Carneiro,

Celso Agrícola Barbi, Humberto Theodoro Júnior, José Carlos Barbosa Moreira, José

Eduardo Carreira Alvim, Kazuo Watanabe e Sérgio Sahione Fadei, tendo como secretária

Fátima Nancy Andrighi.

Ao contrário da primeira, esta comissão, elaborou uma série de anteprojetos de

lei que iniciaram as alterações conhecidas como “minirreformas” do CPC, tal apelido se

deve ao fato de que cada anteprojeto visava alterar determinada “parte” do Código.

Neste primeiro momento, hoje conhecido como a “primeira fase da reforma do

CPC” houve a aprovação de doze leis (entre agosto de 1992 a dezembro de 1995) que

alteraram profundamente o CPC.

Só a guisa de ilustração, listamos as modificações que estas leis promoveram:

a) a lei n. 8.455, de 24 de agosto de 1992, que alterou dispositivos do Código

de Processo Civil referentes à prova pericial;

b) a lei n. 8.637, de 31 de março de 1993, que alterou o art.132 do Código de

Processo Civil, referente à vinculação do juiz ao processo (identidade física do juiz);

c) a lei n. 8.710, de 24 de setembro de 1993, que alterou dispositivos do

Código de Processo Civil referentes à citação (especialmente a postal) e à intimação;

d) a lei n. 8.718, de 14 de outubro de 1993, que deu nova redação ao art. 294

do Código de Processo Civil (estabilização do processo) para permitir aditamentos ao

pedido antes da citação do demandado;

e) a lei n. 8.898, de 29 de junho de 1994, portadora de remodelação do Código

de Processo Civil no tocante à liquidação de sentença (particularmente, eliminando a

liquidação por cálculo do contador);

f) a lei n. 8.950, de 13 de dezembro de 1994, com alteração

de dispositivos do Código de Processo Civil e acréscimo de outros, em matéria de recursos;

g) a lei n. 8.951, de 13 de dezembro de 1994, que alterou dispositivos do

Código de Processo Civil referentes à ação de consignação em pagamento e ação de

usucapião;

h) a lei n. 8.952, de 13 de dezembro de 1994, contendo a alteração de um

número grande de dispositivos do Código de Processo Civil, com normas gerais de direito

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processual, normas referentes à tutela jurisdicional antecipada, à conciliação, atos

processuais, processo cautelar etc.;

i) a lei n. 8.953, de 13 de dezembro de 1994,que alterou dispositivos do

Código de Processo Civil referentes ao processo de execução;

j) a lei n. 9.079, de 14 de julho de 1995, incluindo no Código de Processo

Civil, no Livro que trata dos procedimentos especiais, o processo monitório (com o nome

de ação monitoria);

k) a lei n. 9.139, de 30 de novembro de 1995, que introduziu profundas

inovações na disciplina do recurso de agravo;

l) a lei n. 9.245, de 26 de dezembro de 1995, com significativas alterações no

procedimento sumário ( o qual passou a chamar-se assim e não mais sumaríssimo).

É certo que a produção legislativa não se estagnou após esta primeira etapa,

sendo aprovadas entre dezembro de 1996 e dezembro de 1999, várias leis que, embora

possuam relevância para o processo civil, ( a Lei da Arbitragem, a Lei do Habeas Data, a

Lei do Fax, a Lei da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental, dentre outras),

não tiveram o condão de alterar a estrutura do Código de Processo Civil, justificando-se,

pois, a sua não inclusão em nenhuma das etapas da reforma do C.P.C..

Destarte, a segunda etapa da reforma do C.P.C., também conhecida como

“reforma da reforma”, efetivamente, inicia-se apenas em dezembro 2001, com a

promulgação de três leis:

a) a Lei n. 10.352, de 26 de dezembro de 2001, que alterou a disciplina dos

recursos e do reexame necessário;

b) a Lei n. 10.358, de 27 de dezembro de 2001, que inseriu no C.P.C.

alterações afetas ao processo de conhecimento;

c) a Lei n. 10.444, de 07 de maio de 2002, que promoveu alterações relativas

à tutela antecipada, ao procedimento sumário, à execução forçada , entre outras.

d) a Lei n. 11.187, de 19 de outubro de 2005, que dá nova redação disciplina

ao recurso de agravo, ampliando as hipóteses em que ele deve ser necessariamente retido e

não de instrumento.

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É justamente nesse segundo estágio da reforma do C.P.C., que surge a Lei n°

11.232, promulgada em 22 de dezembro de 2005, e que rompe, definitivamente, com a

estrutura procedimental utilizada para a satisfação das obrigações oriundas dos títulos

executivos judiciais.

1.2 - O C.P.C. de 1973, Reformar ou Revogar?: Eis a Questão

Como já dito anteriormente, os clamores advindos tanto da comunidade técnica

(Advogados, Juízes, Promotores de Justiça, Defensores Públicos, etc.) quanto da sociedade

civil, sempre basearam-se no anseio por uma prestação jurisdicional mais eficiente e justa.

Daí surgiu a espectativa de que, através da aplicação de princípios maiores, através de

alterações no diploma processual, seria possível alcançar a alcandorada efetividade do

processo. Neste sentido, Cândido Rangel Dinamarco:8

A nova perspectiva aqui proposta constitui motivo para a abertura do sistema processual aos influxos do pensamento publicista e solidarista vindo da política e da sociologia do direito. Pelo fio da instrumentalidade, o processo há de receber as lições que durante séculos negou-se a ouvir e sentir as críticas que jamais soube racionalizar. Racionalizando-as e aprendendo quais são os óbices atuais à plena realização da missão recebida, ele terá dado um passo enorme em direção ao desejado aperfeiçoamento.

A grande dificuldade (e o desafio), no entanto, era promover as mudanças

necessárias de forma a não interromper a continuidade dos trabalhos legislativos tampouco

transformar o Código de Processo Civil em um mosaico. Assim, por exemplo, já pela

ocasião da reforma de 1973, o ilustre Alfredo Buzaid em sua Exposição de Motivos

salientava: 9

Ao iniciarmos os estudos depararam-se-nos duas sugestões: rever o Código vigente ou elaborar Código novo. A Primeira tinha a vantagem de não interromper a continuidade legislativa . O plano de trabalho, bem que compreendendo a quase-totalidade dos preceitos legais, cingir-se-ia a manter tudo quanto estava conforme com os enunciados da ciência, emendando o que fosse necessário, preenchendo lacunas e suprindo o supérfulo, que retarda o andamento dos feitos.

8 Cândido Rangel DINAMARCO, A Instrumentalidade do Processo, p. 11. 9 Alfredo BUZAID, Exposição de Motivos do Código de Processo Civil, In: Código de Processo Civil, p. 12.

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Deste modo podemos notar que, já naquela ocasião, difícil era a decisão a ser

tomada em relação ao método a adotar-se para promover as reformas, assim sendo, mais

mais adiante prosseguiu Buzaid, já deixando transparecer sua decisão:10

Mas a pouco e pouco nos convencemos de que era mais difícil corrigir o Código velho que escrever um novo. A emenda ao Código atual requeira um concerto de opiniões, precisamente nos pontos em que a fidelidade aos princípios não tolera transigências. E quando a dissensão é insuperável, a tendência é de resolvê-la mediante concessões, que não raro sacrificam a verdade científica a meras razões de oportunidade. [...]

Tirando o tempo que se passou, nada mudou em relação aos conflitos

atuais que se processaram ao se decidir por atualizar o Código de Processo Civil. Ocorre

que, ao contrário do ocorrido anteriormente, talvez por receio de uma longa tramitação

legislativa, a exemplo do que ocorreu com o Código Civil, optou-se desta vez por

reformas setoriais deixando-se de lado as considerações do Autor do anteprojeto do Código

de 1973. Assim, por exemplo, acerca da primeira etapa da reforma, pronunciou-se Cândido

Rangel Dinamarco: 11

Assim específicos, com a explícita renúncia a qualquer pretensão de reorganizar o Código de Processo Civil ou alterar sua estrutura, esses anteprojetos trouxeram a proposta de uma série de mini-reformas e não de uma reforma global e abragente. Sem guerrear o Código ou postular sua substituição, eles integraram uma verdadeira estratégia de guerrilhas contra os pontos sensíveis do sistema, bem definidos e merecedores de uma ocupação oportuna e saneadora.

Tal entendimento, seguia as diretrizes traçadas pela comissão revisora,

presidida pelo Minsitro Salvio de Figueiredo Teixeira, do STJ que resumiam-se a:12

a) localizar os pontos de estrangulamento da prestação jurisdicional; b)deixando de lado divergências de ordem doutrinária ou meramente acadêmicas, assim como outros pontos merecedores de modificação, apresentar sugestões somente de simplificação, agilidade e efetividade; c)encaminhar as sugestões não em um único anteprojeto, mas através de vários, setoriais, inclusive para viabilizar a aprovação no Congresso Nacional,

10 Ibid., p 12. 11 Cândido Rangel DINAMARCO, A Reforma da Reforma, p. 34. 12 Salvio de Figueiredo TEIXEIRA, apud José da Silva PACHECO, Evolução do Processo Civil Brasileiro, p. 304.

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considerando que um único pedido de vista poderia comprometer todo o trabalho; d) aproveitar a própria disposição dos artigos existentes, abrindo espaço para novos, se necessário (v.g., arts. 272-273, 460-461, 478-479), mas sem alterar a fisionomia do código; e) buscar o consenso nas alterações propostas, democratizando o debate, fazendo da reforma não uma manifestação isolada da magistratura, mas uma reivindicação uníssona de todos os segmentos interessados, nela integrando foro e universidade, professores e profissionais, juizes, advogados, defensores e representantes do Ministério Público.

Mais adiante, desta feita referindo-se à segunda etapa da reforma do C.P.C.,

prosseguiu o mestre:13

Também agora pautaram-se os reformadores por não interferir na estrutura do Código nem propor aprimoramentos conceituais ou sistemáticos: sempre no método das guerrilhas, limitaram-se a buscar pontos sensíveis e identificar focos de retardamento na produção da tutela jurisdicional, propondo soluções simplificadoras, aceleradoras e, portanto, propícias à integridade e efetividade desta.

Desta forma, nota-se que a intenção dos reformadores, ia além da reforma do

Código, propriamente dita, permeava a questão da finalidade e objetivos da mesma e

culminava na certeza que todo o estratagema delineado, devia ser o mais célere, na medida

do possível, evitando com isso que os objetivos pretendidos fossem comprometidos por

uma fatal morosidade advinda do processo legislativo.

Assim, embora bem fundamentada, e, efetivamente, tenha permitido que o

Código fosse alterado, a opção por reformas pontuais, apenas em determinados livros do

Código de Processo Civil, acirrou os debates a respeito do processo de reforma como um

todo. Surgindo entre os processualistas grandes críticas ao método utilizado.

Deste modo, segundo Alexandre Freitas Câmara:14

[...] os membros da Comissão partiram de uma falsa premissa: a eles pareceu que seria preciso optar entre promover reformas setoriais ou elaborar um novo Código

13 Cândido Rangel DINAMARCO, A Reforma da Reforma, p. 35 14 Alexandre Freitas CÂMARA, A Nova Execução de Sentença, p. 12-13.

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de Processo Civil. Ocorre que uma alternativa não excluía a outra. Ao escolherem o método que acabou por ser usado, a Comissão produziu um resultado que pode ser considerado pernicioso. É que o Código de Processo Civil brasileiro perdeu, completamente, sua identidade. Hoje, mais do que um Código de Processo Civil, o que se tem em vigor é uma verdadeira colcha de retalhos.

No mesmo sentido, posiciona-se Cândido Rangel Dinamarco:15

Além disso, as Reformas não se pautam por preocupações concentradamente sistemáticas, o que gera o risco de alojar no Código disposições mal costuradas entre si, sem a indispensável coordenação orgânica, funcional e mesmo conceitual. Exemplos dessa falha são a disciplina da tutela antecipada e do processo monitório.

De fato, se as alterações, por um lado tiveram o condão de tornar o Código de

Processo Civil mais eficiente, por outro, lhe impuseram significante perda em organização

institucional e clareza didática.

Destarte, mais adiante, Alexandre Freitas Câmara revela sua preocupação e faz

sua sugestão:16

É preciso, porém, dar coerência ao sistema processual civil. isto não mais se conseguirá com reformas setoriais. É preciso elaborar um novo Código de processo Civil para o Brasil (sem renunciar às reformas setoriais que se façam necessárias até que o novo Código fique pronto).

É de bom alvitre salientar que, o ilustre jurista, observa ainda que, o início dos

trabalhos da Comissão de reforma se deu na década de 1990, transcorrendo-se pois, quase

dezessete anos, tempo este que, se não fosse suficiente para a completa tramitação

legislativa de um novo Código de Processo Civil, ao menos seria o bastante para que o

mesmo já estivesse deveras adiantado.

15 Cândido Rangel DINAMARCO, A Reforma da Reforma, p. 39. 16 Alexandre Freitas CÂMARA, A Nova Execução de Sentença, p. 13.

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1.3 - As Tendências Basilares da Reforma

1.3.1 - A Questão da Instrumentalidade

Inicialmente, convém citar a lição de Cândido Rangel Dinamarco:17

É vaga e pouco acrescenta ao conhecimento do processo a usual afirmação de que ele é um instrumento, enquanto não acompanhada da indicação dos objetivos a serem alcançados mediante o seu emprego. Todo instrumento, como tal, é meio; e todo meio só é tal e se legitima, em função dos fins a que se destina.

Assim sendo, e, partindo da premissa de que as normas processuais buscam

hoje a plena satisfação do direito material, ou seja, procuram estabelecer um processo de

resultados (realmente efetivo), temos que o processo deve dispor de meios para garantir o

alcance de tais resultados.

É neste contexto, que surge, enquanto “núcleo e a síntese dos movimentos

pelo aprimoramento do sistema processual” 18 , a questão da instrumentalidade

processual, que, pode ser definida como sendo o “aspecto positivo da relação que liga o

sistema processual à ordem jurídico-material e ao mundo das pessoas e do Estado,

com realce à necessidade de predispô-lo ao integral cumprimento de todos os seus

escopos sociais, políticos e jurídico.”19

Hoje, mais do que nunca, o processualista deve ser sensível aos grandes

conflitos jurídicos, sociais e políticos de sua época, buscando soluções adequadas para os

problemas que persistem em impedir o alcance da “ordem jurídica justa”. E para isso, é

necessário que cultive-se a consciência de que somente através da instrumentalidade

pode-se chegar a um denominador comum, equacionando-se os problemas existentes, os

17 Cândido Rangel DINAMARCO, A Instrumentalidade do Processo, p. 149 18 Mauro CAPPELLETTI, apud Cândido Rangel DINAMARCO, A Instrumentalidade do Processo, p. 23 19 Antonio Carlos de Araújo CINTRA, Cândido Rangel DINAMARCO, Ada Pellegrini GRINOVER, Teoria Geral do Processo, p. 47

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instrumentos e institutos já utilizados e as soluções recentes, afim de permitir que o

processo possa, efetivamente, ser considerado como instrumento a serviço da paz social.

1.3.1.1 - O Aspecto Negativo da Instrumentalidade

O aspecto negativo da instrumentalidade está diretamente ligado à própria razão

de existir do processo, assim, embora autônomo em relação ao direito material, é,

inegavelmente, instrumento de atuação deste, sendo sua existência justificada por este

objetivo.

Deve-se, no entanto, evitar a interpretação equivocada acerca da sua real

função, qual seja, ser um catalizador procedimental do processo, uma vez que, como é

cediço, processo e procedimento são institutos conceitualmente distintos entre si.

Desta forma, não se pode confundir a instrumentalidade do processo, (enquanto

meio de persecução da satisfação do direito material violado), com a questão da autonomia

do Direito Processual em relação ao Direito Material, sob pena de retroceder-se aos

primórdios da ciência processual.

Neste diapasão, leciona Cândido Rangel Dinamarco:20

Como vem sendo dito, é relativizar o binômio substance-procedure. Não se trata de renunciar à autonomia do direito processual e muito menos aos princípios solidamente instalados em sua ciência e a nível de garantias constitucionais. É que a autonomia do processo não implica seu isolamento e o seu culto como se fosse um valor em si mesmo.

O aspecto negativo diz respeito à negação do processo como valor em si

mesmo e rejeição aos excessos de forma, exemplificando tal afirmação trazemos a seguinte

colação:21

Uma projeção desse aspecto negativo da instrumentalidade do processo é o princípio da instrumentalidade das formas, segundo o qual as exigências formais do processo só merecem ser cumpridas à risca, sob pena de invalidade dos atos, na medida em que isso seja indispensável para a consecução dos objetivos desejados

20 Cândido Rangel DINAMARCO, A Instrumentalidade do Processo, p. 267 21 Antonio Carlos de Araújo CINTRA, Cândido Rangel DINAMARCO, Ada Pellegrini GRINOVER, Teoria Geral do Processo, p. 48

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(v.g., não se anula o processo por vício de citação, se o réu compareceu e se defendeu).

Assim, verifica-se que, o apego exagerado à técnica retira do processualista a

consciência de que o processo não vale pelo que ele é, mas pelos resultados que ele visa

atingir, fazendo-se necessário rechaçar, cada vez mais, o formalismo exacerbado e a

morosidade processual, no sentido de buscar a efetividade e proporcionar o oferecimento

da tutela jurídica adequada ao jurisdicionado, valorizando-se os fins a serem atingidos e

não dos meios.

1.3.1.2 - O Aspecto Positivo da Instrumentalidade

O aspecto positivo da instrumentalidade permeia e fundamenta os conceitos

abordados acima, ( item 1.3.1), e está, diretamente ligado à idéia de efetividade, na qual o

processo deve ser capaz de permitir o alcance pleno de todos os seus propósitos

institucionais, contribuindo pois, para que o exercício da jurisdição possa promover a paz

social.

Cumpre destacar, porém, que não basta apontar a direção e esperar que os

resultados comecem a aparecer, necessário se faz implementar mudanças, para que se

possa alcançar os objetivos perseguidos, nesse sentido, manifesta-se Cândido Rangel

Dinamarco:22

Ora, é preciso adequar o processo ao cumprimento de toda essa sua complexa missão, para que ele não seja fonte perene de decepções somadas a decepções (“toda decepção é muito triste”), nem permite que com isso se desgaste a legitimidade do sistema.

Vê-se, desta forma, que, antes de mais nada, deve prevalecer o entendimento no

qual a existência do Direito Processual, não exclui a importância do Direito Material,

tampouco, ocorre o contrário e que, inobstante a sedimentação da autonomia do Direito

Processual em relação ao Direito Material, ambos devem caminhar lado a lado para que

possam atingir plenamente seus objetivos.

22 Cândido Rangel DINAMARCO, A Instrumentalidade do Processo, p. 271

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1.3.2 - Questão da Efetividade

Ultimamente, a efetividade é tida como o maior desígnio do processo moderno,

toda a moderna doutrina processual se preocupa com o tema. Trata-se de um problema que

aflige, tanto a juristas e magistrados, quanto advogados e partes. Parte-se da premissa que o

processo é efetivo à medida que assegura ao titular do direito material violado, exatamente

aquilo a que o mesmo faz jus. Tal efetividade do processo, todavia, está condicionada ao

peso maior ou menor que se dê a dois pratos de uma balança: certeza e celeridade. Se, por

um lado, o juiz deve buscar, em qualquer processo, conhecer a verdade quer seja ela formal

ou material, por outro, essa busca incessante, muitas vezes traz consigo uma excessiva

demora do processo, o que faria com que a busca pela máxima justiça se tornasse extrema

injustiça. Admitir-se um processo com duração demasiadamente longa é admitir-se um

processo sem nenhuma efetividade.

Por esta razão, cada vez mais, percebe-se que não basta, ao direito processual,

a pureza conceitual de seus institutos e de seus remédios, mas sim, deve ser observado o

resultado prático que tais institutos propiciam, pois, atualmente, o que se espera é um

processo de resultado que satisfaça a pretensão dos que o acionam.

Neste sentido, Alexandre Freitas Câmara conceitua efetividade como sendo “a

aptidão de um instrumento para alcançar seus objetivos”.23

Ocorre, porém, que existem vários pontos estranguladores que impedem a

consolidação, de forma plena, da efetividade no âmbito processual, tais pontos, podem ser

sintetizados em quatro aspectos fundamentais, a saber: “ a) admissão em juízo; b) modo-

de-ser do processo; c) a justiça das decisões; d) a sua efetividade”.24

A admissão em juízo refere-se à abertura da via de acesso à tutela jurisdicional,

quer seja para pleitear um provimento, ou para impor resistência.

No que pertine ao modo-de-ser do processo, faz-se necessário pôr em prática

os princípios e garantias constitucionais do processo, a fim de que se tenha uma

participação simétrica das partes, um juiz interessado na correta prestação da jurisdição,

23 Alexandre Freitas CÂMARA, Lições de Direito Processual Civil, p. 224. 24 Cândido Rangel DINAMARCO, A Instrumentalidade do Processo, p. 273

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bem como a diversidade de procedimentos para um melhor exercício da função

jurisdicional.

A justiça das decisões deve pautar-se de forma que o juiz valore situações de

fato de acordo com os sentimentos sociais de justiça, encontrando na lei seu limite.

Entretanto, sempre que o texto legal possibilitar mais de uma interpretação razoável, é

dever do magistrado decidir pela que melhor atenda ao sentimento social de justiça.

A efetividade como tendência do direito processual moderno volta-se para a

necessidade de se conceder maior utilidade aos provimentos jurisdicionais. O processo

deve mostrar-se capacitado a produzir precisamente a providência solicitada.

Assim, segundo, Alexandre Freitas Câmara, “o processo só é efetivo se dispõe

de meios capazes de permitir ao Estado atingir os escopos da jurisdição”. 25

E, para que o processo se torne, verdadeiramente efetivo, é necessário que se

considere cinco proposições:26

a) o processo deve dispor de instrumentos de tutela adequados, na medida do possível, a todos os direitos (e outras posições jurídicas de vantagem) contemplados no ordenamento, quer resultem de expressa previsão normativa, quer se possam inferir do sistema;

b) esses instrumentos devem ser praticamente utilizáveis, ao menos em princípio, sejam quais forem os supostos titulares dos direitos (e das outras posições jurídicas de vantagem) de cuja preservação ou reintegração se cogita, inclusive quando indeterminado ou indeterminável o círculo dos eventuais sujeitos;

c) impende assegurar condições propícias à exata e completa reconstituição dos fatos relevantes, a fim de que o convencimento do julgador corresponda, tanto quanto puder, à realidade;

d) em toda a extensão da possibilidade prática, o resultado do processo há de ser tal que as segure à parte vitoriosa o gozo pleno da específica utilidade a que faz jus segundo o ordenamento;

e) cumpre que se possa atingir semelhante resultado com o mínimo de dispêndio de tempo e energias.

Destarte, o processo brasileiro, ao longo destes anos de reformas, avançou em

alto grau e hoje, segundo Alexandre Freitas Câmara,27 encontra-se estruturado de forma a

assegurar o respeito aos cinco postulados por Barbosa Moreira, citando, por exemplo, o

mandado de injunção como instrumento de garantia de direitos que em princípio não

25 Alexandre Freitas CÂMARA, Lições de Direito Processual Civil, p. 224. 26 José Carlos Barbosa MOREIRA, apud. Alexandre Freitas CÂMARA, Dos Procedimentos Sumário e Sumaríssimo, p. 8

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teriam proteção dada a falta de norma jurídica; cita igualmente a ação popular e a ação

civil pública que ampara os direitos cujos titulares são indeterminados ou indetermináveis;

também explica que os poderes instrutórios do juiz são importantíssimas ferramentas e

que permitem a descoberta da verdade; aduz ainda, como instrumentos capazes de

assegurar o direito ao gozo específico daquilo que faz jus, os institutos da tutela

jurisdicional das obrigações de emitir declaração de vontade (arts. 466-A a 466-C do

C.P.C.) e da tutela jurisdicional específicas das obrigações de fazer e não fazer (art. 461do

C.P.C.); por fim, salienta as vantagens de institutos como a tutela antecipada que permite o

alcance do máximo de vantagem com o mínimo de dispêndio.

Após estas considerações, poderia parecer que não há mais nada a ser

modificado, assim como a instrumentalidade e a efetividade já teriam esgotado toda

capacidade contributiva em prol do aperfeiçoamento da prestação jurisdicional, ledo

engano, conforme se verá a seguir, a instrumentalidade e a efetividade estão longe de

exaurir seu potencial norteador contribuindo, pois, cada vez mais para que o processo

torne-se não só um “mero instrumento técnico a serviço da ordem jurídica, mas, acima

disso, um poderoso instrumento ético destinado a servir à sociedade e ao Estado”. 28

27 Alexandre Freitas CÂMARA, Lições de Direito Processual Civil, p. 225. 28 Antonio Carlos de Araújo CINTRA, Cândido Rangel DINAMARCO, Ada Pellegrini GRINOVER, Teoria Geral do Processo, p. 51

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CAPÍTULO II - O PROCESSO DE EXECUÇÃO

2.1- Antiga Estrutura Executória

Sem adentrar, (momentaneamente), no mérito da discussão acerca das

modalidades de sentenças existentes, e suas respectivas formas de satisfação, reputa-se de

bom alvitre destacar a mazela que sempre afligiu a todos que, direta ou indiretamente

lidam com o processo: a satisfação plena do direito violado, na maioria dos casos, somente

era alcançada após exaustivo ciclo composto por duas etapas heterogêneas, uma cognitiva

e outra executiva.

Isso ocorria pois, como é cediço, o Código Civil Brasileiro foi elaborado, a

partir das teorias sustentadas por Enrico Tullio Liebman, notável processualista italiano

que durante sua estada em nosso país na década de 1940, trouxe consigo os conceitos

científicos acerca do direito processual que efervesciam na Europa, contribuindo,

sobremaneira para o desenvolvimento da ciência processual pátria, através da influência que

suas teses inculcaram, em seus alunos da Faculdade de Direito de São Paulo dentre os quais

estavam Luíz Eulálio de Bueno Vidigal, Alfredo Buzaid e José Frederico Marques dentre

outros que, mais tarde vieram a se destacar no cenário do Direito Processual Brasileiro.

Entre essas teorias está a que sustenta a completa autonomia do processo de

execução em relação ao processo de conhecimento. Esta dicotomia exigia a propositura de

nova relação processual subseqüente para que se fizesse cumprir a determinação contida na

sentença prolatada.

Assim, esse dogma da separação entre cognição e execução alimentava um

anacronismo insustentável e incompatível com um sistema processual que prestigie a

efetividade da tutela jurisdicional. Tratava-se de mecanismo burocrático e artificial.

Neste sentido:29

29 Athos Gusmão CARNEIRO, apud Debora Ines Kram BAUMÖHL, A Nova Execução Civil: a desestruturação do processo de execução, p. 116

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Após o longo contraditório no processo de conhecimento, ultrapassados todos os percalços, vencidos os sucessivos recursos, sofridos os prejuízos decorrentes da demora, o demandante logra obter ao fim a prestação jurisdicional definitiva, com o trânsito em julgado da condenação da parte adversa. Recebe então a parte vitoriosa, de imediato, sem tardança maior, o 'bem da vida' a que tem direito? Triste engano: a sentença condenatória é título executivo, mas não se reveste de preponderante eficácia executiva. Se o vencido não se dispõe a cumprir a sentença, deverá iniciar o processo de execução, efetuar nova citação, sujeitar-se à contrariedade do executado mediante 'embargos', com sentença e a possibilidade de novos e sucessivos recursos.

Verifica-se pois, que o modelo atrasava, onerava e dificultava a prestação

jurisdicional, paralisando-a e proporcionando espaço para manobras ilegítimas de devedores

recalcitrantes. Levando a sociedade a completa descrença no sistema judiciário, taxando-o,

por vezes como falido.

2.2 A Atual Estrutura Executória

Os bons ventos da fase instrumentalista enfim, laçam seus influxos sobre este

que era, por muitos considerado o calcanhar de Aquiles do Direito Processual.

Inspirados pelos ideais da instrumentalidade e efetividade do processo, os

doutrinadores, começam a mitigar a dicotomia que existia entre a atividade cognitiva e

executória, desenvolvendo um novo paradigma capaz de equacionar os institutos

endoprocessuais com o intuito de permitir,enfim, que o processo cumpra seu real papel de

ser instrumento-meio gerador de justiça.

Neste sentido, utiliza-se conceitos que embora não sejam inéditos, ganham

nova roupagem afim de adequarem-se à nova perspectiva desejada, dentre estes,

destacam-se:

A questão da economia processual, como sendo esta a precursora do novo

paradigma processual, uma vez que o direito processual moderno pressupõe a hegemonia

da eficiência não só em relação à entrega da prestação jurisdicional propriamente dita,

como também em relação à própria estrutura organizacional legislativa.

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E o sincretismo processual que, outrora, apenas como sincretismo, foi

utilizado na fase imanentista como método didático para justificar a posição do direito

processual em relação ao direito material. Hoje, sincretismo processual equivale à fusão de

procedimentos que, embora conceitualmente possuam distinções, complementam-se para

cumprir o real objetivo da tutela jurisdicional.

Para o Direito Processual Brasileiro, o sincretismo processual significa uma

verdadeira ruptura conceitual, estrutural e prática, através da qual, espera-se alcança a

alcandorada efetividade do processo.

É neste cenário, que vem à luz a Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005,

trazendo como escopo a missão de contribuir para que o exercício da jurisdição seja efetivo

e célere.

Aplicando os pressupostos da instrumentalidade, efetividade, economia e

sincretismo processual a Lei nº 11.232/05, derruba o dogma liebmaniano, determinando a

adoção de um sistema em que a execução de sentença deixa de ser efetuada através da

instauração de uma nova relação processual passando a ser apenas um prolongamento do

procedimento que prolatou a mesma.

Neste sentido, manifesta-se Alexandre Freitas Câmara30

O que se fez foi transformar a execução de sentença em fase do mesmo processo em que o provimento jurisdicional é proferido. Nesses casos, deixa-se de falar no binômio processo de conhecimento - processo de execução e se passa a reconhecer a existência de um processo misto, sincrético, em que se desenvolvem duas fases distintas (conhecimento e execução).

Cabe salientar que, a Lei nº 11.232/05 vem complementar as Leis 8.952/94 que

inseriu em nosso ordenamento o instituto da tutela antecipada e 10.444/02, que promoveu

alterações relativas à tutela antecipada, ao procedimento sumário, as quais já reconheciam

a execução imediata como forma de se promover a satisfação tempestiva e eficaz da parte

titular do direito material, em face das obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa.

30 Alexandre Freitas CÂMARA, A Nova Execução de Sentença, p. 9.

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2.3 - A Concepção do Termo “Sentença”

O novo diploma legal ao determinar que: “Sentença é o ato do juiz que implica

alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei.” (Art. 162 do C.P.C.),

procurou adequar o diploma legal à técnica processual. Uma vez que a sentença não põe

termo ao processo, mas apenas encerra o ofício jurisdicional do magistrado de primeira

instância, substitui-se pois, a idéia de “extinção” pela de “resolução”.

Exemplo disso é que, mesmo com a sentença, o processo terá o seu regular

prosseguimento e desenvolvimento se a parte sucumbente interpuser recurso. Portanto,

andou bem o legislador, à medida que não é a sentença, mas o seu trânsito em julgado, que

encerra o processo.

O cuidado externado na remição aos art. 267 e 269 do Código de Processo

Civil, visa, apenas, dirimir quaisquer dúvidas quanto aos tipos de sentenças prolatadas e o

encerramento da atividade de julgar.

Destaca-se, porém que, independente do provimento jurisdicional resolver o

mérito do processo (art. 269 do CPC) ou não chegar a apreciar o seu objeto (art. 267 do

CPC), o mesmo será considerado sentença para os efeitos processuais pertinentes

(interposição de recurso e execução provisória, principalmente).

2.4 - Cumprimento de Sentença das Obrigações de Emitir Declaração de

Vontade

Os artigos 639, 640 e 641 do CPC, foram substituídos pelos 466-A, 466-B e

466-C. Trata-se de uma mudança topográfica, dentro dos livros e capítulos do Código de

Processo Civil.

Desta forma, resolve-se a questão da dissonância que grande parte da doutrina

atribuía a tais dispositivos. Afirma-se isso porque a pretensão contida nesses dispositivos

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possui um caráter predominantemente cognitivo distanciando-se da natureza executiva

propriamente dita.

Neste sentido, leciona Alexandre Freitas Câmara31

[...] alterações veio atender a um antigo reclamo doutrinário. É que o processo que tem por objeto a tutela jurisdicional substitutiva da declaração de vontade é de conhecimento, e não de execução, razão pela qual sua regulamentação fica melhor no Livro I do que no Livro II do CPC. E isto se dá porque tal processo tem por objeto imediato uma sentença (a qual irá substituir a declaração de vontade não emitida). Ora, é sabido que o processo de conhecimento é, precisamente, o processo de sentença. Assim, não pode haver qualquer dúvida a respeito da natu-reza cognitiva do processo que tenha por objeto a tutela jurisdicional substitutiva da declaração de vontade.

Para exemplificar, veja-se que, nas hipóteses de obrigação de declarar vontade,

uma parte se compromete com a outra, mediante um contrato preliminar, em firmar o

termo definitivo quando preenchidos determinados pressupostos.

Ocorre que, uma vez descumprido o avençado, não há como a parte

prejudicada compelir fisicamente a parte recalcitrante a firmar o acordo.

Já houve época em que se afirmou que, nesses casos, nada poderia ser feito

para obrigar a parte inadimplente a firmar o contrato, pois qualquer ato judicial nesse

sentido estaria contrariando a liberdade individual de contratar.

Assim, ao prejudicado caberiam apenas as perdas e danos. Não obstante, tal

perspectiva quedou superada, sobretudo em função das críticas elaboradas por Chiovenda,

que demonstrou em seus ensaios que embora não houvesse fungibilidade jurídica entre as

declarações do indivíduo e do Estado, existiria uma fungibilidade material, a declaração do

Estado sub-rogaria a vontade faltante.

Essa seria, portanto, a finalidade da execução de emissão de declaração de

vontade, a saber, permitir que seja captada a vontade originária de um contrato preliminar

quando da realização do contrato definitivo.

31 Alexandre Freitas CÂMARA, A Nova Execução de Sentença, p. 59.

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Com efeitos meramente jurídicos, e não físicos, ao invés do Estado compelir a

parte inadimplente a cumprir com sua obrigação, ele simplesmente substitui aquela

vontade, com conseqüências idênticas àquela declaração se fosse espontânea.

2.5 - A Liquidação de Sentença

O primeiro ponto a ser observado neste artigo (475-A e §§1º,2º e 3º) diz

respeito à alteração topográfica do procedimento de liquidação de sentença. O Código de

Processo Civil incluía este procedimento no Livro II, relativo ao processo de execução, eis

que o legislador de 1973 entendeu tratar-se de demanda posterior à prolação da sentença.

A nova Lei modifica a natureza jurídica do instituto, retirando-lhe a

característica de processo autônomo, passando a ser mero incidente processual.

Veja-se que, em sua essência, a liquidação é destinada à obtenção de um

valor ou a individualização de um objeto, estabelecendo o quantum debeatur e

completando os pressupostos que a lei exige para que o título executivo judicial possa

constituir fundamento de um processo de execução. Ela tem lugar sempre que a sentença

for genérica, por não se puder mensurar, quando de sua prolação, a extensão do dano.

Por certo, essa atividade em nada se assemelha ao procedimento executivo

no qual preponderam os atos expropriatórios, à medida que o Judiciário, no curso da

liquidação, busca apenas integrar a liquidez do título estabelecido no processo de

conhecimento originário.

A liquidação realiza-se mediante dilação probatória e cognição plena, e

apresenta caráter preponderantemente cognitivo.

Assim, demonstra-se adequada a alteração da numeração dos artigos

referentes à liquidação de sentença, bem como sua inclusão no Livro I, atinente ao

processo de conhecimento.

Feito esse esclarecimento quanto ao aspecto topográfico do procedimento de

liquidação de sentença, cumpre atentar para as alterações empreendidas especificamente

com a revogação do art. 603 do CPC.

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32

Inicialmente, observa-se que o teor do caput foi reduzido, mantendo-se

apenas a menção à determinação do valor. Parece correta a alteração, pois o atual

dispositivo, ao referir-se à individuação do objeto ou à determinação do valor, é

redundante, a definição do valor devido é o próprio objeto a ser individualizado na

liquidação. Além disso, foi suprimido o parágrafo único do mencionado artigo, que dá

lugar a outros três parágrafos, com algum teor inovador.

O parágrafo 1º do artigo 475-A traz a idéia da regra do anterior artigo 603,

parágrafo único do CPC, salientando-se, apenas, a alteração na forma de chamar o devedor

para integrar a relação processual de liquidação. Enquanto no sistema vigente se prevê a

citação para alcançar essa finalidade, a reforma aponta que o réu será intimado na pessoa

de seu advogado.

A citação, como se sabe, é prevista no art. 213 do CPC. Trata-se do ato pelo

qual se chama a juízo o réu ou a parte interessada para se defender. Pode ser real (por aviso

de recebimento ou oficial de justiça) ou ficta (por hora certa ou através de edital publicado

em jornal de grande circulação).

A intimação, por sua vez, como definida no art. 234 do CPC, é o ato de

mera ciência às partes de qualquer acontecimento do processo, dando-se em regra através

de publicação no periódico do órgão oficial ou em quadro de avisos da repartição.

Proposta um pouco mais inovadora reside no art. 475 - A, §2º, que admite o

procedimento de liquidação quando a sentença que determinou condenação genérica ainda

for objeto de recurso. O atual regramento do Código de Processo Civil não admite

expressamente essa possibilidade, embora a doutrina e a jurisprudência já reconheçam o

seu cabimento.

De acordo com a nova sistemática, poderá a parte vencedora no processo de

conhecimento dar ensejo à liquidação mediante carta de sentença, em autos suplementares,

visto que o processo principal, com o recurso interposto, deve seguir ao órgão jurisdicional

ad quem.

A idéia central do dispositivo é demonstrar que a liquidação não perde a sua

utilidade nos casos de execução provisória, permitindo-se ao credor presumido que ganhe

tempo para exercer a futura satisfação de sua pretensão.

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A mera expectativa de que o provimento de primeira instância seja mantido

já é suficiente para legitimar e autorizar o adiantamento da mensuração do quantum

debeatur.

Ressalte-se que isso não trará prejuízo algum ao devedor que poderá,

simultaneamente, prosseguir com os seus recursos e objetar os valores discutidos na

liquidação. O que não se pode perder de vista, no entanto, é que findo o processo de

liquidação, caso se pretenda proceder à execução provisória, deverá ser prestada caução

idônea, observando aquilo que fora apurado no incidente que mensurou a condenação.

Finalmente, no que tange ao art. 475 – A, §3º, trata-se de regra voltada ao

próprio magistrado, que fica impossibilitado de proferir sentenças genéricas nas hipóteses

de ressarcimento por danos causados em acidente de veículo de via terrestre e de cobrança

de seguro relativas a danos causados em acidentes de veículos.

2.5.1 - Liquidação por Cálculo

O art. 475-B faz menção à liquidação por cálculo do credor, inserida em

nosso diploma processual por força da Lei 8.898/94. A primeira alteração trazida no

dispositivo refere-se a renumeração, que visa atender a reestruturação topográfica do

Código de Processo Civil.

Alem disso, deve-se observar que enquanto o artigo 604 do CPC afirma que

a liquidação por calculo seguirá a forma do artigo 652 do CPC (execução por quantia

certa), o novo dispositivo remete ao procedimento de cumprimento de sentença, que

consiste numa das principais mudanças erigidas pela Lei e que dará lugar ao processo de

execução por título judicial, correndo nos próprios autos do processo de conhecimento e

tornando mais célere a satisfação do credor.

Por fim, os parágrafos 2º, 3º e 4º do artigo 475 – B nada acrescentam ao

nosso ordenamento. Trata-se de mera separação, em dispositivos diversos, daquilo que já

era consagrado nos parágrafos 1º e 2º do artigo 604.

Assim, caso o valor indicado na memória de cálculo do credor seja

exagerado, ou a parte autora hipossuficiente, sendo os autos remetidos ao contador e

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encontrado valor inferior àquele que a parte entende ser devido não se obstará a execução,

doravante denominada “cumprimento da sentença”.

A repercussão da medida afetará exclusivamente a penhora, que deverá ser

feita nos moldes do cálculo oficial.

2.5.2 - Liquidação por Arbitramento

Nesse procedimento, para que se possa verificar o montante devido, é

imprescindível a presença de um especialista, perito, que deverá necessariamente conhecer

da questão posta em juízo.

O procedimento desta espécie de liquidação pretende ser breve, acompanhando,

sempre que possível, o rito ordinário. A ressalva, no entanto, é que não há alegações de

fato, de modo que a discussão se circunscreve no âmbito do que foi levantado pelo perito

em seu laudo.

O juiz poderá se socorrer, ainda, de pareceres técnicos de ambas as partes, bem

como inquirir testemunhas e o próprio perito em audiência, para fim de esclarecimentos.

Uma vez produzido o laudo e tendo as partes sobre ele se manifestado, caberá ao juiz

proferir decisão relativa à liquidação.

Destaque-se que a decisão do magistrado, embora possa se basear no laudo,

não está a ele vinculado, desde que regularmente fundamentada. Esclarecidos esses

aspectos preliminares, veja-se que uma primeira mudança levada a cabo pelo projeto de

reforma dirige-se à expressão sentença, constante na redação do art. 607 do CPC, que foi

substituída pelo termo decisão.

Trata-se de alteração polêmica, pois a ampla doutrina e jurisprudência

reconhece que na liquidação por arbitramento o processo extingue-se mediante sentença,

por força do prisma cognitivo nele constante.

Embora discreta, não se pode olvidar da mudança técnica relativa ao termo

audiência de instrução e julgamento, que agora passa a vigorar apenas como audiência.

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2.5.3 - Liquidação por Artigos

Mais uma vez a reforma processual altera a numeração dos artigos, com vistas

ao reposicionamento topográfico. Atente-se, ainda, à mudança de redação traçada no art.

475- F.

Embora não represente qualquer inovação, essa alteração fere de morte

eventuais dúvidas quanto ao rito utilizado na liquidação por artigos, eis que o artigo 272,

expressamente referido pelo novel dispositivo, determina, claramente que o procedimento

comum pode adotar o rito ordinário ou sumário.

Isto porque o artigo 609 do Código de Processo Civil indica que essa espécie

de liquidação é regida pelas normas atinentes ao procedimento comum constante no Livro

I. Por remeter amplamente ao procedimento cognitivo, poder-se-ia indagar se tal

dispositivo estaria abrangendo também o procedimento sumário.

2.5.4 - O Agravo de Instrumento em Face da Decisão de Liquidação

O artigo 475-H trouxe uma alteração de porte.

Embora o procedimento de liquidação configure-se como um incidente

processual, a fim de completar um dos requisitos necessários aos títulos executivos, era

entendimento majoritário que a decisão que lhe põe fim seria interlocutória ou sentença

conforme a modalidade de liquidação utilizada (por artigos ou por arbitramento) ou a

necessidade de mero cálculo aritmético, ou ainda a atualização desse cálculo.

A ampla doutrina entendia que, no caso de liquidação por arbitramento ou por

artigos, a decisão do juiz que põe fim às discussões referentes ao valor do crédito,

homologando-o e rejeitando as impugnações, possui natureza de sentença.

Assim também comungava a jurisprudência, o que parecia adequado, à medida

que nessas espécies de liquidação surgia uma demanda incidental, exercia-se cognição

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plena e, ao fim, obtinha-se a definição do quantum debeatur, objeto imediato do incidente,

completando-se o terceiro requisito do título executivo.

Tratava-se, pois, de análise de parte do mérito da demanda principal.

De se observar ainda que a Lei 11.232/05, em seu artigo 9º, revoga

expressamente o inciso III do artigo 520, que previa, exatamente, o cabimento de apelação

sem efeito suspensivo nas hipóteses de sentença que julga liquidação.

Nesse ultimo caso, incide a Súmula nº 118 do Superior Tribunal de Justiça, a

entender ser o agravo o recurso cabível.

Temos aqui, a nosso ver, duas interpretações possíveis.

A primeira, que pensamos ser mais acertada, aplica literalmente os termos do

novel artigo 475- H, c/c artigo 9º da Lei, resultando na utilização do agravo como recurso

apto a desafiar toda e qualquer decisão proferida em sede de liquidação.

A segunda, de natureza teleológica, permitiria a utilização de apelação nas

hipóteses de liquidação por artigos e por arbitramento, tendo em vista a natureza das

questões aí decididas.

Ocorre que tal apelação seria recebida nos efeitos devolutivo e suspensivo, ante

a revogação do artigo 520, inciso III, o que claramente contraria o espírito da Lei.

Mesmo a se adotar a primeira posição, que, repetimos, adotamos, ainda há a

possibilidade de requerimento de efeito suspensivo, na forma do artigo 527, inciso III, c/c

558 do CPC.

De se ressaltar ainda que o dispositivo parece criar exceção à regra trazida pela

recente Lei nº 11.187/05, que alterou novamente o procedimento do agravo, e determinou,

como regra, a forma retida para esse recurso.

Pensamos que, diante dos termos peremptórios do artigo 475-H, não tem

cabimento a regra do artigo 527, inciso II que dá ao Relator o poder monocrático de

converter agravo de instrumento em agravo retido nas hipóteses que menciona. Ou seja, o

agravo dirigido contra a decisão que resolve liquidação será sempre interposto e recebido

na forma instrumental.

De qualquer sorte, sendo a liquidação um incidente prévio ao cumprimento da

sentença em processo cognitivo, realmente não faria sentido a possibilidade de interposição

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de apelação, eis que demandaria a prolação de uma segunda sentença na mesma fase

processual, o que certamente causaria indisfarçável tumulto processual.

CAPÍTULO III - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA

3.1 - O Procedimento de Cumprimento de Sentença

O cumprimento da sentença, quanto às obrigações de fazer ou não fazer, não

sofrerá mudanças com o presente projeto, continuando a ser regulado pelos artigos 461 e

461-A da atual lei.

A inovação trazida pelo presente dispositivo diz respeito ao cumprimento da

sentença quanto às obrigações por quantia certa. Estando a sentença líquida, ou após a

devida liquidação, a execução dar-se-á dentro do processo de conhecimento, sendo a etapa

final deste, sem a necessidade de um processo autônomo de execução. A sentença

condenatória terá, então, efetivação forçada, e sua execução será regulada pelo Capítulo X,

inserido pela Lei que aqui se estuda.

Desta forma, o credor só precisará ajuizar ação de execução, quando esta for

baseada em título executivo extrajudicial, caso em que a execução continuará a ser

regulada pelo Capítulo IV do Código.

O parágrafo primeiro do dispositivo ora comentado trata dos conceitos de

execução definitiva e execução provisória, que não foram modificados. A rigor, não há

diferença entre a execução definitiva e a provisória.

O que ocorre é que a execução provisória, por se basear em título que pode ser

desconstituído, guarda certas peculiaridades para resguardar a segurança do devedor, já

que este pode ter a decisão reformada a seu favor.

O problema deste dispositivo é que, ao versar sobre os títulos executivos

judiciais, esvazia o conteúdo do artigo 587, que passará a tratar apenas dos títulos

extrajudiciais, cuja execução é invariavelmente definitiva. Desta sorte, mesmo não

havendo menção expressa na nova Lei, entendemos haver revogação da parte do artigo 587

que trata da execução provisória.

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Assim, a execução provisória de título judicial continuará a ser aquela na qual

não há trânsito em julgado de sentença condenatória. Todavia, no novo texto, o legislador

optou pela expressão “recurso ao qual não foi atribuído efeito suspensivo” em vez de

“recurso recebido só no efeito devolutivo”.

O parágrafo segundo deste artigo repete a regra do parágrafo segundo do artigo

586, apenas acrescentando que a liquidação dar-se-á em autos apartados, o que já ocorre

atualmente.

3.1.2 - O Art. 475-J do Código de Processo Civil

Uma das maiores inovações, é o fato de que o processo executivo decorre

automaticamente da sentença condenatória, sem a necessidade de iniciativa do credor. Em

conseqüência deste fato, não há citação do devedor, que deverá efetuar o pagamento em até

15 (quinze) dias, sob pena de multa.

Não obstante o entendimento de que tais inovações constituem verdadeiro

progresso na sistemática da concretização dos direitos obtidos no processo cognitivo, os

dispositivos do projeto não escapam a críticas, nem tampouco deixam de suscitar dúvidas

quanto à sua interpretação.

A redação do caput, quando aplicada à execução provisória, causa algumas

perplexidades. É o que ocorre, por exemplo, na hipótese em que o devedor, condenado ao

pagamento, recorre da sentença, porém sem obter efeito suspensivo no recurso, e, para

evitar a incidência da multa prevista em lei, efetua o pagamento ao credor no prazo de

quinze dias a contar da publicação da decisão, sem, no entanto, que o último tenha

requerido a execução.

Segundo o artigo 588, I (que foi substituído pelo artigo 475), a execução

provisória corre por conta e responsabilidade do exeqüente, que será responsável pelos

danos que o executado venha a sofrer. Se, na hipótese ventilada, for revertida a decisão

condenatória e o devedor tiver sofrido danos em razão do pagamento efetuado ao credor,

surge a dúvida sobre a responsabilidade pelo ressarcimento de tais danos ao devedor. Não

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parece razoável que o credor, que não requereu a execução provisória (e, portanto, não

assumiu o risco), arque com esta despesa.

Outra dificuldade que surge da redação do artigo é a determinação da data de

início da contagem do prazo de quinze dias para efeitos de incidência da multa.

Se for considerado que referido prazo começa a correr a partir da publicação da

decisão que deu ensejo a recurso sem efeito suspensivo, problema seria compatibilizar a

redação do caput com o parágrafo quinto do dispositivo ora em análise, eis que, caso o

credor mais uma vez permanecesse inerte, poder-se-ia aventar a possibilidade de

arquivamento do processo mesmo na pendência de recurso, repita-se, sem efeito

suspensivo.

Solução para esta hipótese seria considerar que o prazo para incidência da

multa somente seria contado a partir do trânsito em julgado da decisão condentória;

todavia, nesta hipótese, estar-se-ia afastando a possibilidade de execução provisória, o que

não parece razoável diante da previsão expressa contida no artigo anterior.

No que concerne ao parágrafo primeiro, criou-se situação diferente daquela que

vigia na hipótese de embargos do devedor, prevista no artigo 737.

Inicialmente, deve-se dizer que a permissão de intimação pela via postal revoga

tacitamente o artigo 222, alínea “d” do CPC que vedava essa modalidade de comunicação

processual em sede de processo executivo.

Visto isso, é de se notar que, pela redação deste parágrafo, além de ter-se

alargado para quinze dias o prazo para oferecimento da oposição do devedor, definido no

artigo 738, a impugnação somente será permitida depois de seguro o juízo pela penhora de

bens do devedor, sem previsão da possibilidade de depósito em juízo do valor da

condenação.

Na antiga sistemática do processo de execução autônomo, se afirmava que “em

princípio, deve a penhora recair sobre o bem ou os bens que, uma vez citado, o devedor (ou

o responsável) nomear, no prazo de 24 horas, desde que não prefira efetuar logo o

pagamento (art. 652, caput)”.

Hoje, interpretando-se literalmente o disposto neste artigo, depreende-se que

somente é oferecida ao devedor a escolha entre o pagamento direto ao credor ou a punição

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com a multa e penhora de seus bens como requisito necessário ao oferecimento de

impugnação.

Não há também menção à possibilidade de nomeação dos bens à penhora pelo

próprio devedor, especialmente diante da inexistência da hipótese de garantia do juízo pela

penhora antes de decorrido o prazo de quinze dias estabelecido no caput.

Assim sendo, e como visto, com a redação do artigo 475-J, aparentemente, o

devedor foi desprovido do direito de indicar bens a penhora, uma vez que no cumprimento

da sentença não há citação do devedor para nomeação dos bens, nem previsão de garantia

do juízo pela penhora que não seja aquela requerida pelo credor na forma do caput.

Procurando seguir o raciocínio do legislador, uma vez requerido pelo credor,

será expedido mandado de penhora e avaliação a ser cumprido por oficial de justiça. Caso

o oficial não possa proceder à avaliação por depender de conhecimentos especializados,

será imediatamente nomeado avaliador que deverá entregar o laudo no curto prazo

assinalado pelo juiz.

Não são definidos no dispositivo os conceitos de “conhecimentos

especializados” ou de “breve prazo”, cabendo ao juiz decidir sobre a necessidade da

presença do avaliador e o prazo adequado para entrega do laudo no caso concreto.

Segundo o parágrafo quarto, se o pagamento efetuado no prazo do caput for

parcial, a multa incidirá sobre o valor restante, evitando, assim, que o devedor se livre da

penalidade da multa sem adimplir integralmente o valor devido.

Por outro lado, fica claro que a multa será calculada com base no valor ainda

não pago, evitando penalização excessiva do devedor, que, por iniciativa própria procedeu

ao pagamento de parte da quantia devida.

No quinto e último parágrafo deste artigo, cuida-se do arquivamento do

processo em face da inércia do credor em requerer a execução. Conforme disposto no

caput, o requerimento poderá ser feito caso o devedor não pague o valor devido no prazo

de quinze dias, ou se pagar parcialmente, ocasião em que, como já visto, ficará sujeito a

incidência da multa de 10% sobre o valor restante e à penhora de seus bens para garantia

do pagamento desta parte da dívida.

Desse modo, se o credor não proceder ao requerimento da execução dentro dos

seis meses e quinze dias que sucederem à publicação da decisão relevante, o processo será

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arquivado de ofício pelo juiz da causa, sem prejuízo da possibilidade de seu

desarquivamento posterior a pedido da parte interessada.

3.2 - A Impugnação

O artigo 475-L em muito se assemelha ao 741, que cuida das hipóteses sobre as

quais poderão versar os embargos à execução fundada em sentença. Contudo, a

impugnação regulada por este artigo, já prevista no parágrafo primeiro do artigo anterior,

em muito difere dos embargos do executado, especialmente no que concerne à sua natureza,

desprovida de autonomia.

Assim, não pode a impugnação ser entendida como ação incidente e autônoma

diante do processo de execução, tendo em vista que não mais existe tal processo em

separado, sendo a “execução”, ou cumprimento da sentença, um desdobramento do mesmo

processo cognitivo, razão pela qual o inciso I deste artigo, diferentemente de seu

correspondente no artigo 741, não faz menção ao “processo de conhecimento”.

Pelo mesmo motivo, não foi repetida a norma do inciso IV do artigo 741, eis

que não há mais a possibilidade de cumulação indevida de execuções, já que esta decorrerá

automaticamente da sentença.

Ainda pelo motivo indicado, foi excluída no inciso V, a hipótese de “nulidade

da execução até a penhora” prevista como possível objeto dos embargos, uma vez que a

“nulidade até a penhora” implicaria na nulidade de todo o processo de conhecimento.

O inciso III, em comparação ao artigo 741, constitui inovação ao inserir como

hipótese de objeto da impugnação do devedor a “penhora incorreta ou avaliação errônea”.

Os demais incisos não trazem inovações, tendo se limitado a reproduzir as

hipóteses já existentes para a ação de embargos e já estudadas pela doutrina.

O mesmo se pode dizer com relação ao parágrafo primeiro, que reproduz o

parágrafo único do artigo 741, acrescentando apenas o termo “pelo Supremo Tribunal

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Federal”, deixando inequívoco a quem cabe decidir sobre a compatibilidade da aplicação

ou interpretação das normas em que se fundam o título com a Constituição Federal.

O parágrafo segundo determina que quando o executado invoca como

fundamento o excesso de execução, previsto no inciso V, pleiteando quantia superior à

resultante da sentença, deverá declarar de imediato o valor que considera correto, a fim de

evitar a rejeição liminar do seu pleito.

De se ressaltar, por fim, que se omitiu o legislador quanto à possibilidade de

apresentação de objeção de pré-executividade, o que já vinha sendo admitido

tranqüilamente pela jurisprudência do S.T.J, sobretudo nos casos de falta de condição de

ação ou de pressuposto processual.

Mais uma diferença marcante entre a impugnação e os embargos reside na

concessão de efeito suspensivo.

Enquanto aos embargos, por força do parágrafo primeiro do artigo 739, é

sempre atribuído tal efeito, ao novo instituto da impugnação, conforme dispõe o caput do

artigo 475–M, o efeito suspensivo somente será concedido quando o juiz considerar

relevantes seus fundamentos e, cumulativamente, entender que o prosseguimento da

execução é manifestamente suscetível de causar graves danos ao executado e de difícil ou

incerta reparação.

Em todo caso, mesmo quando atribuído efeito suspensivo à impugnação, o

credor poderá prosseguir com a execução mediante requerimento, desde que ofereça

caução suficiente e idônea.

O tratamento dado à matéria causa espécie, tendo em vista que o efeito

suspensivo eventualmente atribuído é desnaturado ao se permitir a continuação da

execução, tornando-o mero empecilho, a ser afastado mediante simples prestação de

caução.

Vale salientar, ainda, que a caução a ser prestada pelo exeqüente deve

corresponder à extensão do grave dano em potencial que poderia vir a sofrer o executado,

conforme entendido pelo juiz ao conceder o efeito suspensivo à impugnação.

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Uma vez atribuído efeito suspensivo, a execução dar-se-á nos mesmos autos e,

caso contrário, correrá em autos apartados, conforme o mandamento do parágrafo segundo.

Nota-se a intenção do legislador em impedir que a impugnação, na ausência de

efeito suspensivo, interfira no andamento da execução, preocupação que se torna

desnecessária se o mesmo for deferido, já que, suspensa a execução, não há que se falar em

interferência, podendo a impugnação correr nos mesmos autos.

Surge a dúvida na hipótese em que o efeito suspensivo seja deferido e depois

afastado pela prestação de caução. Haverá a necessidade de desmembramento do processo,

autuando-se a impugnação em separado? Uma interpretação teleológica sugere que sim, eis

que o escopo do legislador foi permitir a celeridade do processo de execução, o que só será

alcançado se houver respeito à norma do parágrafo segundo.

Outra importante conseqüência do fato da impugnação, ao contrário dos

embargos, não ter natureza de ação autônoma, e sim de simples cumprimento da sentença

condenatória, é o comando do parágrafo terceiro, que determina que, da decisão da

impugnação, só caberá apelação no caso de extinção da execução.

Trata-se de decorrência lógica, uma vez que a decisão é interlocutória, e como

tal, só pode ser atacada por agravo.

Por outro lado, caberá apelação no caso de extinção do processo, eis que esse é

o recurso cabível na forma da nova redação do parágrafo 1º do artigo 162 do CPC.

De se observar, por último e como já referido anteriormente, que o legislador

menciona expressamente a locução “agravo de instrumento” o que parece indicar nova e

expressa exceção aos termos da Lei nº 11.187/05 que alterou o procedimento do recurso de

agravo, tornando preferencial a forma retida.

3.3 - Os Títulos Executivos Judiciais

O artigo 475–N arrola os títulos executivos judiciais, antes disciplinados pelo

artigo 584, que será expressamente revogado pelo artigo 9º da Lei nº 11.232/05.

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O rol, considerado taxativo pela doutrina, sofreu poucas alterações.

Os incisos I torna-se mais específico, eis que menciona todas as formas de

obrigação que podem originar a execução.

Os incisos II e IV permanecem com texto inalterado, sendo apenas renumerado

este último.

O inciso VI foi corrigido quanto a Corte competente, tendo em vista a alteração

introduzida pela Emenda nº 45/04, eis que agora cabe tal mister ao Superior Tribunal de

Justiça, e não mais ao Supremo Tribunal Federal.

O inciso VII unificou o inciso V e o parágrafo único do artigo 584, tendo

havido apenas discreta alteração de redação e renumeração.

No inciso III foi substituído o vocábulo “verse” por “inclua”, o que torna o

dispositivo mais técnico, uma vez que não teria cabimento uma decisão homologatória que

se referisse à matéria integralmente estranha aos autos.

Isso poderia levar a desconfortável situação de uma petição inicial contendo

um pedido X, que seria, simplesmente, abandonado, requerendo-se, ao depois, a

homologação de um pedido Y, mediante aceitação da parte contrária, o que,

indubitavelmente, colocaria em xeque o princípio da correlação entre petição inicial e

sentença.

Ademais, tal hipótese é contemplada separadamente no inciso V, que não

guarda correspondência com nenhum dos incisos do antigo artigo 584, e trata do acordo

extrajudicial, de qualquer natureza, homologado judicialmente.

Isso já havia sido inicialmente previsto no artigo 55, caput, da Lei 7.244/84 e

hoje consta no artigo 57 da Lei 9.099/95. A Lei 8.953/94 também inseriu esta possibilidade

no inciso III do artigo 584, que foi posteriormente revogado pela Lei 9.307/96. Assim,

restou à Lei 10.358/01 recolocar a cláusula anteriormente abolida no inciso III do artigo

584, agora, finalmente, reeditada pela Lei nº 11.232/05 e reposicionada no lugar adequado.

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3.4 - Execução Provisória

Como já aludido no comentário ao artigo 475–I, a rigor, a execução provisória

em nada difere da definitiva. Deve ser observado o título no qual a execução se baseia, que

é ou não definitivo. O projeto não visa a modificar esta sistemática, razão pela qual

consideramos que a inserção da locução “no que couber” inserida no artigo 475–O em

nada modifica a interpretação que vem sido dada ao artigo 588, caput.

O inciso I trata da responsabilidade objetiva do credor que requer a execução

provisória, assumindo o risco de posterior modificação da decisão recorrida.

Este dispositivo sofreu apenas alterações de redação com a finalidade de dar

mais técnica ao texto. O inciso II unifica o disposto nos incisos III, IV e parágrafo primeiro

do artigo 588, acrescentando apenas que a liquidação dos eventuais prejuízos será feita por

arbitramento (artigos 475-C e 475-D, que revogam os artigos 606 e 607, respectivamente).

Em regra geral, impõe-se a liquidação por arbitramento quando determinado

pela sentença ou convenção das partes, ou ainda quando a natureza do objeto da liquidação

exigir (art. 475-C). Aqui, impõe-se pela própria Lei.

Desde a Lei 10.444/02, ao credor só é necessário prestar caução para a

realização de atos dos quais possa resultar grave dano ao executado.

No inciso III foi substituído o termo ´domínio’ por propriedade, palavras que

contêm o mesmo sentido jurídico, não tendo havido, portanto, nenhuma modificação.

A grande novidade trazida pelo presente dispositivo é que a caução prestada

pelo credor não será mais requerida pelo executado, e sim deferida de plano pelo juiz.

Esta alteração tem como escopo a efetiva proteção do devedor, que não mais

precisará iniciar a contra-cautela quando o exeqüente proceder a qualquer ato que lhe possa

resultar dano grave. Nos termos deste artigo, além de idônea, a caução deverá ser também

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suficiente, fato que, apesar de não estar atualmente expresso no texto da lei, decorre da

lógica e da própria natureza da garantia.

O parágrafo 2º, inciso I preconiza a possibilidade de dispensa da caução

(prevista no inciso III) em caso de necessidade do credor e no limite de 60 (sessenta)

salários-mínimos (requisitos cumulativos). O parágrafo segundo do artigo 588 já previa a

hipótese quando o crédito fosse de natureza alimentar.

Inova o projeto quando inclui a possibilidade de dispensa de caução no caso de

crédito decorrente de ato ilícito.

Tal inovação em muito amplia o campo das possibilidades em que se poderá

dispensar a caução, tendo em vista que grande parte das execuções são fundamentadas em

decisões condenatórias de atos ilícitos.

Sendo assim, enorme importância terá a demonstração inequívoca pelo devedor

de sua situação de necessidade, que sempre deverá ser comprovada, seja nos casos de

créditos de natureza alimentar ou naqueles em que o crédito se baseia em ato ilícito.

Aparentemente, a inclusão da hipótese de dispensa da caução nesses casos tem

natureza de punição ao devedor que agiu contrariamente à lei, não sendo, portanto,

razoável que o mesmo receba proteção legal em sede de execução. No parágrafo 2º, inciso

II é admitida outra hipótese de dispensa de caução por parte do credor. Trata-se do caso em

que o devedor interpõe agravo contra a decisão que inadmite recurso extraordinário ou

especial.

Muitas vezes estes recursos últimos são utilizados como forma de se atentar

contra o princípio da celeridade nas relações processuais, por meio da utilização de

medidas meramente protelatórias.

Esta previsão visa a desestimular a interposição de recursos para retardar

injustificadamente a execução. Todavia, esta regra comporta exceção nos casos em que a

dispensa da caução possa manifestamente resultar em ricos de grave dano de difícil ou

incerta reparação.

Anteriormente, a execução provisória era promovida em autos suplementares

(quando existem) ou por carta de sentença, conforme artigos 521, in fine e 589 do CPC. A

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nova lei altera esta disposição, preconizando que a execução provisória se iniciará por

meio de petição (artigo 475-O, §3º), e o artigo 9º da Lei revoga expressamente os artigos

589 e 590 do CPC.

Todavia, por mais que seja suprimida a carta de sentença, a petição prevista no

dispositivo ora comentado necessariamente fará as vezes daquela. Isso porque a execução

provisória não poderá prosseguir nos autos principais, já que estes serão remetidos ao juízo

ad quem.

Assim, não obstante a revogação dos artigos 589 e 590, entendemos vigorar a

figura da carta de sentença, agora com o nome genérico de “petição”, até mesmo porque

encontra-se prevista no artigo 521, in fine, que não será revogado pelo referido artigo 9º da

Lei.

O parágrafo 3º do artigo 475-O traz os requisitos desta petição guardando

semelhanças com a redação do artigo 590.

Continuarão necessárias a sentença exeqüenda ou acórdão (oportuna inserção),

a procuração das partes e a decisão de habilitação (se for o caso), podendo também o

requerente juntar outras peças que considerar necessárias.

O projeto, no entanto, não obriga a juntada da autuação, da petição inicial e da

contestação, bem como não exige o despacho do recebimento do recurso, ordenando

apenas que haja juntada da certidão de interposição.

Isso importa dizer, numa primeira reflexão, que a execução provisória poderá

ser iniciada enquanto pender de decisão a admissibilidade do recurso. A instrução da

petição deverá ser feita com cópias autenticadas das peças acima enumeradas, mas poderá

o advogado valer-se do disposto no artigo 544, § 1º, in fine, que determina que a

autenticidade das peças do processo poderá ser declarada pelo próprio, sob sua

responsabilidade pessoal.

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3.5 - A Sistemática da Execução de Alimentos

O artigo 475-Q regula a matéria contida no artigo 602, incluído na lista dos

revogados pelo artigo 9º da Lei. Diferenciam-se as redações no que concerne à constituição

de capital por parte do devedor para que a renda assegure o pagamento da dívida.

Na sistemática do artigo 602, o juiz deveria condenar o devedor à constituição

do capital sempre que estivesse envolvida a prestação de alimentos na indenização por ato

ilícito. Na redação do caput do artigo ora em análise, utiliza-se a expressão “poderá

ordenar”, refletindo uma faculdade do juiz.

Antes mesmo da modificação introduzida pela Lei, decisões jurisprudenciais já

vinham reconhecendo a discricionariedade do juiz para aferição da necessidade da

constituição do capital, mitigando a força do termo “condenará”, constante da redação do

dispositivo.

O parágrafo primeiro reproduz em parte a redação de seu equivalente no artigo

602, trazendo apenas a inclusão expressa da possibilidade de constituir-se o capital por

aplicação financeira em banco oficial.

A jurisprudência, já vinha admitindo esta e outras formas de constituição de

capital, como, por exemplo, depósitos com correção monetária.

Igualmente seguindo posicionamento da jurisprudência, o parágrafo segundo

permite a substituição da constituição de capital pela inclusão do beneficiário em folha de

pagamento, por fiança bancária ou, ainda, por garantia real em valor arbitrado de imediato

pelo juiz.

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Todas as novas formas expressas de garantia vêm substituir a prestação de

caução fidejussória prevista no parágrafo segundo do artigo 602. Em relação ao parágrafo

terceiro, não houve modificações, eis que continua permitido às partes requerer o aumento

ou redução da prestação quando ocorrer modificação nas condições econômicas, atendendo,

assim, à dinâmica da realidade social.

O parágrafo quarto, por sua vez, alinha-se a entendimento pacificado do

Supremo Tribunal Federal no sentido de que a fixação dos alimentos com base no salário

mínimo não viola o disposto no artigo 7°, inciso IV, in fine, da Carta Constitucional,

havendo diversos julgados expressando tal posicionamento.

O parágrafo quinto, por fim, não sofreu modificações relevantes, reproduzindo

a idéia já contida no parágrafo quarto do artigo 602.

3.6 - A Aplicação Subsidiária do Livro II do C.P.C.

O escopo da Lei, conforme demonstrado, é trazer para o interior da

regulamentação do processo de conhecimento as disposições relativas ao processo de

execução fundado em título judicial, em prol da simplicidade e celeridade processuais, tão

defendidas pela moderna ciência processual.

Destarte, os dispositivos contidos no Livro II que se referem tão somente

à execução por título judicial foram, em sua maioria, incluídos no rol dos artigos a serem

revogados pelo projeto.

Contudo, não se pode olvidar que, apesar de criar-se regulamentação

específica para o ‘cumprimento de sentença’, o mesmo não perde sua natureza de

procedimento executório, sujeito como tal aos princípios e regras gerais disciplinados no

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Livro II, que trata de processo execução, os quais se aplicarão subsidiariamente às

disposições relevantes do Livro I, Título VII, Capítulo X.

3.7 - Os Embargos à Execução Contra a Fazenda Pública

A execução contra a Fazenda Pública é disciplinada pelos artigos 730 e 731,

sendo certo que existem determinadas prerrogativas especiais outorgadas à mesma quando

se encontra no pólo passivo do processo executivo.

Sendo assim, apesar das novas regras dispondo sobre o cumprimento de

sentença judicial, em substituição ao processo autônomo de execução, serem aplicáveis à

Fazenda Pública, esta não se sujeita, na sistemática do projeto, à disciplina da impugnação,

sendo-lhe reservado o direito a oposição dos embargos previstos neste artigo 741

reconfigurado.

3.8 - Os Embargos em sede de Ação Monitória

As alterações processadas na redação do artigo 1.102-C visam apenas a adaptá-

lo à nova organização do Código, uma vez que o cumprimento de sentença, ao qual se

submeterão as hipóteses aventadas neste dispositivo, encontra-se agora no Livro I, Título

VIII, Capítulo X.

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CONCLUSÃO

Ao encerrar o presente trabalho, é necessário que se faça algumas ponderações

acerca do tema que, diga-se de passagem, está longe de ser esgotado por, tratar-se de ser

objeto de muitas considerações debates a seu respeito.

Também cabe frisar, que a busca por uma prestação jurisdicional eficiente, não

é uma preocupação que atinge somente o nosso país, a necessidade de atender aos

jurisdicionados, tem levado juristas de todo o globo, a refletir e encontrar uma maneira

pela qual o Estado possa cumprir seu propósito de garantir a paz social.

Desta forma, devem ser louvadas todas as tentativas de alcançar tal escopo,

mesmo aquelas que, de certo modo, venham a sacrificar conceitos e dogmas anteriormente

estabelecidos. Assim sendo, reconhece-se que houve um salto qualitativo importante, em

termos de celeridade e simplificação procedimental, através da remodelação do processo

ao novo paradigma do sincretismo.

Porém, sem que se adapte a estrutura jurisdicional, as alterações efetuadas não

surtirão, de forma plena, os objetivos pretendidos.

De nada adianta para a sociedade uma legislação moderna, com instrumentos

capazes de atender às demandas apresentadas se a máquina judiciária não corresponde em

igual eficiência. Com a devida vênia, é como, por exemplo, dispor de um automóvel

moderno, confortável e rápido e somente poder trafegar em estradas “de chão”, totalmente

esburacadas.

Urge, portanto, que não se faça apenas reformas legislativas, deve-se

igualmente, romper as barreiras do formalismo e da estagnação também na estrutura do

Poder Judiciário, para que o mesmo possa adequar-se aos clamores vindos da sociedade.

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BIBLIOGRAFIA

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______________. Lições de direito processual civil. vol. 1. 20°. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo. DINAMARCO, Cândido Rangel. GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria geral do processo. 22.ed. São Paulo: Malheiros, 2007.

MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual: sexta série.São Paulo, 1997.

NERY JUNIOR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação extravagante:atualizado até 20 de setembro de 2007. 10.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

PACHECO, José da Silva, Evolução do processo civil brasileiro: desde as origens até o advento do novo milênio. 2. ed. Rio de Janiero: Renovar, 1999.

SANTOS, Moacyr Amaral, Primeiras linhas de direito processual civil. Vol. 1., 27.ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

DEDICATÓRIA 3

AGRADECIMENTO 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

1. - REFORMA PROCESSUAL 10

1.1 - Histórico da Reforma do CPC 10

1.2 - O C.P.C. de 1973, Reformar ou Revogar?: Eis a Questão 16

1.3 - As Tendências Basilares da Reforma 20

1.3.1 - A Questão da Instrumentalidade 20

1.3.1.1 - O Aspecto Negativo da Instrumentalidade 21

1.3.1.2 - O Aspecto Positivo da Instrumentalidade 22

1.3.2 - A Questão da Efetividade 23

CAPÍTULO II

2. - O PROCESSO DE EXECUÇÃO 26

2.1 - Antiga Estrutura Executória 26

2.2 - A Atual Estrutura Executória 27 2.3 - A Concepção do Termo “Sentença” 29

2.4- Cumprimento de Sentença das Obrigações 29

de Emitir Declaração de Vontade

2.5 - A Liquidação de Sentença 31

2.5.1- Liquidação por Cálculo 33

2.5.2 - Liquidação por Arbitramento 34

2.5.3 - Liquidação por Artigos 35

2.5.4 O Agravo de Instrumento em Face

da Decisão de Liquidação

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CAPÍTULO III

3. - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA 37

3.1 - O Procedimento de Cumprimento de Sentença 37

3.1.2 - O Art 475 – J do Código de Processo Civil 38

3.2 - A Impugnação 41

3.3 - Os Títulos Executivos Judiciais 43

3.4 - Execução Provisória 45

3.5 - A Sistemática da Execução de Alimentos 48

3.6 - A Aplicação Subsidiária do Livro II do C.P.C 49

3.7 - Os Embargos à Execução Contra a Fazenda Pública 50

3.8 - Os Embargos em sede de Ação Monitória 50 CONCLUSÃO 51

BIBLIOGRAFIA 52

ÍNDICE 53

FOLHA DE AVALIAÇÃO 55

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição: Universidade Cândido Mendes – Instituto a Vez do Mestre.

Título da Monografia: Aspectos Gerais do Processo de Execução de Título Judicial.

Autora: Kaline de Oliveira Lyrio

Data da entrega: 02 de outubro de 2010.

Avaliado por: Jean Alves Conceito: