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MARCELA CHAMEE SYDOL
UNIDADE DIDÁTICA PARA PROFESSORES DE LÍNGUA
ESTRANGEIRA MODERNA DO COLÉGIO ESTADUAL
PEDRO STELMACHUK – ENSINO FUNDAMENTAL E
MÉDIO
UNIÃO DA VITÓRIA 2009
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MARCELA CHAMEE SYDOL
UNIDADE DIDÁTICA PARA PROFESSORES DE LÍNGUA
ESTRANGEIRA MODERNA DO COLÉGIO ESTADUAL
PEDRO STELMACHUK – ENSINO FUNDAMENTAL E
MÉDIO
Produção de material didático apresentado à Equipe Pedagógica do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) da Secretaria de Estado da Educação do Paraná.
UNIÃO DA VITÓRIA 2009
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APRESENTAÇÃO Esta unidade didática para professores da disciplina de Língua Estrangeira
Moderna (LEM) do Ensino Fundamental e Médio foi construída a partir das leituras,
pesquisas e reflexões realizadas no primeiro ano do programa PDE (2008) e
materializadas no Projeto de Intervenção Pedagógica na Escola com o título Concepção
de Língua das Diretrizes Curriculares Estaduais para Língua Estrangeira Moderna
(DCE/LEM) e suas Implicações na Organização do Trabalho Pedagógico.
A necessidade de aprofundamento das discussões sobre o texto das DCE/LEM
entre os professores de LEM surgiu de minha experiência no trabalho com a Equipe de
Ensino do Núcleo Regional de Educação de União da Vitória como técnica-pedagógica
responsável pela disciplina. Acompanhei o processo de construção das diretrizes a partir
do ano de 2003 e tive acesso à leitura dos textos das propostas pedagógicas curriculares
que foram (re)escritas a partir das orientações das diretrizes no final do ano de 2006.
A maioria dos textos trazia os conteúdos organizados por funções, itens
gramaticais, itens de vocabulário (separados por série), não apresentavam critérios e
instrumentos de avaliação e, muitas vezes, mencionavam a importância do trabalho com
o texto, mas não deixavam claro quais os encaminhamentos metodológicos para isso.
Constatei que a concepção de ensino de língua ali revelada não correspondia ao
entendimento de ensino de língua estrangeira construído nas DCE/LEM.
Compreendo que a situação mencionada acima faz parte de um processo que não
acabou. Nos anos seguintes (2007 e 2008) os professores tiveram alguns momentos
(capacitação na semana pedagógica, grupos de estudos das disciplinas, DEB Itinerante,
GTRs) nos quais houveram espaços para a discussão, reflexão e reescrita das propostas
pedagógicas das diversas disciplinas e dos planos de trabalho docente.
Assim, a proposta deste material é a reflexão com os professores sobre o conceito
de língua construído no texto das DCE/LEM e como este se materializa na prática
pedagógica.
O texto abaixo é uma citação das DCE/LEM/EF/2006/VERSÃO PRELIMINAR. Os
trechos grifados foram suprimidos da versão atual, porém, os considero importantes para
a compreensão da concepção de língua nestas diretrizes:
Toda língua é uma construção histórica e cultural em constante transformação. Assim, como princípio social e dinâmico não se limita a uma visão sistêmica e estrutural do código lingüístico, é heterogênea, ideológica e opaca. Nessa perspectiva, a língua repleta de sentidos a ela conferidos por nossas culturas, nossas sociedades, organiza e determina as possibilidades de percepção do mundo e estabelece entendimentos possíveis. Segundo Bakhtin (1988), toda enunciação envolve a presença de duas vozes, a voz do eu e do outro. Para este
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filósofo, não há discurso individual, no sentido de que todo discurso se constrói no processo de interação e em função de um outro. E é no espaço discursivo criado na relação entre o eu e o tu que os sujeitos se constituem socialmente. Sendo assim, é no engajamento discursivo com o outro que damos forma ao que dizemos e ao que somos. Daí a língua estrangeira apresentar-se como um espaço para ampliar o contato com outras formas de conhecer, com outros procedimentos interpretativos de construção da realidade. Em outras palavras, a língua concebida como discurso, não como estrutura ou código a ser decifrado, constrói significados e não apenas os transmite. (PARANÁ, 2006, p. 24 e 25 – grifo meu)
Há outro ponto importante: até meados de 2006, tínhamos dois textos para as
DCE/LEM: um referente ao Ensino Fundamental e outro referente ao Ensino Médio. No
Simpósio da disciplina de Língua Estrangeira Moderna realizado em Outubro de 2006 em
Faxinal do Céu foi apresentada uma versão única para o Ensino Fundamental (EF) e o
Ensino Médio (EM) e que seria uma fusão de ambos os textos, por se compreender que
não havia necessidade de separar as orientações para um e para outro.
A partir de então não há referências explícitas à abordagem por Letramento Crítico
no texto das diretrizes. Porém, na versão atual das DCE/LEM ainda permanecem as
idéias principais referentes a esta abordagem, o que permite o respaldo das diretrizes
para o estudo proposto aqui.
Abaixo, transcrevo alguns destes trechos das DCE/LEM/EF/JUNHO/2006/VERSÃO
PRELIMINAR que permanecem no texto da versão atual, com as supressões do termo
Letramento Crítico sublinhadas:
O Letramento Crítico envolve a análise e a crítica das relações estabelecidas entre texto, língua, poder, grupos sociais e práticas sociais. Refere-se às formas de olhar o texto escrito, visual, oral e hipertexto para questionar e desafiar as atitudes, os valores e as crenças subjacentes a ele. (PARANÁ, 2009, p. 23) O Letramento Crítico é concretizado por meio do engajamento crítico com e através dos textos e da prática social crítica. Tendo em vista que texto e leitura são dois elementos indissociáveis, e que um não se realiza se não existir o outro, é importante que seja definido o que se entende por estes dois termos. (PARANÁ, 2009, p. 24) Dessa forma, ao ensinar e aprender uma LE, sob o viés da abordagem por Letramento Crítico, os alunos e professores percebem que é possível construir significados além daqueles permitidos pela língua materna. Desse modo, os sujeitos envolvidos no processo de ensino e de aprendizagem não aprendem apenas novos significados e nem a reproduzí-los, mas sim aprendem outras maneiras de produzir sentidos, outros procedimentos interpretativos que alargam suas possibilidades de entendimento do mundo. (PARANÁ, 2009, p. 25)
Procurei organizar as reflexões a partir de textos que explicitam:
• As diferenças entre concepção de língua apenas enquanto código e concepção de
língua enquanto discurso;
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• As diferenças entre Abordagem Comunicativa e Abordagem por Letramento
Crítico;
• A elaboração de material pedagógico na perspectiva do Letramento Crítico.
As atividades estão organizadas de maneira que o professor perceba que a teoria
traz implicações à prática pedagógica, que nossas escolhas não são “naturais”, mas
embasadas nas crenças que construímos ao longo de nossa formação inicial e
continuada sobre o objeto de nossa disciplina, neste caso, a língua.
Através da análise da prática (trechos de livros didáticos, trechos da tabela de
Conteúdos Básicos para LEM, trechos das DCE/LEM, Proposta Pedagógica Curricular de
LEM do nosso colégio e Plano de Trabalho Docente produzido por meus/minhas colegas)
procuro estabelecer uma série de reflexões e relações com a teoria (textos que serão
lidos ao longo desta unidade).
Os textos utilizados nesta unidade didática estão disponíveis nos Anexos.
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QUESTÕES
QUESTÃO A
Abaixo encontra-se transcrita a carta enviada aos professores por ocasião da divulgação do quadro de conteúdos (versão preliminar) da disciplina de LEM. Após a leitura deste documento, sugerimos algumas questões para reflexão: Prezado professor,
Esse é o quadro de conteúdos básicos (versão preliminar) da sua disciplina que a equipe disciplinar do Departamento de Educação Básica (DEB) sistematizou e agora apresenta para reflexões na semana pedagógica de julho de 2008. Este documento é fruto das discussões realizadas nos eventos de formação continuada que se tornaram conhecidos como DEB Itinerante.
Tais eventos tiveram início em maio de 2007 e serão concluídos em setembro de 2008. Ao terminarmos essa itinerância, os professores dos 32 NRE terão sido nossos interlocutores e colaboradores, tanto para o aprimoramento dos textos das Diretrizes Curriculares Estaduais (DCE), quanto para a organização final do quadro de conteúdos básicos.
Conteúdos básicos são os conhecimentos fundamentais e necessários para cada série da etapa final do Ensino Fundamental e para o Ensino Médio. O acesso a esses conhecimentos em suas respectivas séries é direito do aluno na etapa de escolarização em que se encontra e imprescindível para sua formação. O trabalho pedagógico com tais conteúdos é dever do professor que poderá acrescentar, mas jamais reduzi-los ou suprimi-los, pois eles são básicos e, por isso, não podem ser menos do que se apresentam. Não se trata de uma lista solta e isolada de conteúdos a serem trabalhados por série. Os quadros indicam como esses conteúdos se articulam com os conteúdos estruturantes da disciplina, que tipo de abordagem teórico-metodológica devem receber e, finalmente, a que expectativas de aprendizagem estão atrelados. Portanto, as Diretrizes Curriculares fundamentam essa proposta de seriação/seqüenciação de conteúdos básicos e sem uma leitura atenta e aprofundada das DCE a compreensão desses quadros estará comprometida. Além disso, os quadros de conteúdos básicos por série não substituem a proposta pedagógica curricular, nem devem ser confundidos com uma concepção curricular conteudista e imobilizadora. Tão somente complementam e dão concretude às DCE, pois focam o trabalho pedagógico das disciplinas naquilo que as constituem como conhecimento especializado e sistematizado para que fique garantido ao aluno uma formação conceitual de qualidade. Caberá ao professor efetivar o currículo no plano de trabalho docente (PTD) onde os conteúdos básicos serão desdobrados em conteúdos específicos, esses, de fato trabalhados em sala de aula. O plano é, portanto, o lugar da criação individual de cada professor. Nele o professor construirá as abordagens contextualizadas histórica, social e politicamente, de modo que os conteúdos façam sentido para seus alunos nas diversas realidades regionais, culturais e econômicas, contribuindo com sua formação cidadã. O plano de trabalho docente é, portanto, o currículo em ação, é a expressão singular e de autoria (de cada professor) da concepção curricular construída nas discussões coletivas.
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O texto sobre Conteúdo Estruturante da última versão das DCE/LEM/EF (2006, p.37) traz: “Diante da dificuldade de estabelecer conteúdos por série, nessas Diretrizes considerando a diversidade de textos em circulação na sociedade e a especificidade do tratamento da língua estrangeira na prática pedagógica, (...), cumpre tecer algumas considerações
a fim de estabelecer critérios norteadores a serem observados na definição dos conteúdos específicos, por série, para o ensino de LE na Educação Básica na escola.”
Conforme o exposto na apresentação desta Unidade Didática, a concepção discursiva de língua permanece nas DCE/LEM, assim como a orientação da abordagem por Letramento Crítico.
Desta maneira, como fica nosso entendimento
diante da orientação do DEB: “Portanto, as Diretrizes Curriculares fundamentam essa proposta de seriação/seqüenciação de conteúdos básicos e sem uma leitura atenta e aprofundada das DCE a compreensão desses quadros estará comprometida.”?
Qual é a “especificidade do tratamento da língua estrangeira na prática pedagógica”, na primeira
citação, que não nos permite seriar os conteúdos? Por
outro lado, quais são as orientações, na versão atual das
DCE/LEM, que “fundamentam essa proposta de seriação/seqüenciação” dos conteúdos básicos?
Você contribuiu para a formação desta tabela no DEB Itinerante ou
participou de alguma outra discussão sobre o assunto? Você concorda com a organização dos conteúdos básicos sistematizada pelo DEB? Por
quê?
Por que os itens das colunas Conteúdos Básicos, Abordagem
Teórico-Metodológica e Avaliação estão praticamente
repetidos em todas as séries?
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A seguir, observe o quadro de Conteúdos Básicos de LEM:
Conteúdos Básicos de Língua Estrangeira Moderna∗∗∗∗
Ensino Fundamental 2008 5ª Série
Conteúdo Estruturante
Conteúdos Básicos Abordagem Teórico metodológica
Avaliação
Discurso como prática
social
Leitura Identificação do tema, do argumento principal. Interpretação observando: conteúdo veiculado, fonte, intencionalidade e intertextualidade do texto. Linguagem não verbal.
Práticas de leitura de textos de diferentes gêneros. Utilização de materiais diversos ( fotos, gráficos, quadrinhos...) para interpretação de textos.
Análise dos textos levando em consideração a complexidade dos mesmos. Questões que levam o aluno a interpretar e compreender o texto. Leitura de outros textos para a observação das relações dialógicas.
Realizar leitura compreensiva do texto, levando em consideração a sua condição de produção. Localizar informações explícitas no texto. Emitir opiniões a respeito do que leu. Conhecer e utilizar a língua estudada como instrumento de acesso a informações de outras culturas e de outros grupos sociais.
Oralidade Variedades lingüísticas. Intencionalidade do texto. Exemplos de pronúncias e do uso de vocábulos da língua estudada em diferentes países.
Apresentação de pequenos textos produzidos pelos alunos. Seleção de discursos de outros como: entrevista, cenas de desenhos, reportagem. Análise dos recursos próprios da oralidade. Dramatização de pequenos diálogos.
Utilizar seu discurso de acordo com a situação de produção.(formal e informal)
Apresentar clareza nas idéias.
Escrita Adequação ao gênero: elementos composicionais, elementos formais e marcas lingüísticas. Clareza de idéias.
Discussão sobre o tema a ser produzido. Leitura de textos sobre o tema. Produção textual. Revisão textual. Reestrutura e reescrita textual.
Produzir textos atendendo as circunstâncias de produção proposta. Diferenciar a linguagem formal da informal.
Análise Lingüística Coesão e coerência. Função dos pronomes, artigos, numerais, adjetivos, palavras interrogativas, substantivos, preposições, verbos, concordância verbal e nominal e outras categorias como elementos do texto. Pontuação e seus efeitos de sentido no texto. Acentuação (espanhol). Vocabulário.
Estudo dos conhecimentos lingüísticos a partir: - de gêneros selecionados para leitura ou escrita. - de textos produzidos pelos alunos das dificuldades apresentadas pela turma. Leitura de textos diversos que permitam ampliar o domínio da língua.
Utilizar, adequadamente recursos lingüísticos, como o uso da pontuação, o uso do artigo, dos pronomes,etc. Conhecer e ampliar o vocabulário.
Sugestões de gêneros discursivos para a 5ª série: História em quadrinho, piada, poemas, exposição oral ( diálogos), comercial de TV, diário, quadrinhas, bilhetes, fotos, horóscopo, carta, textos midiáticos, e-mail, cartaz, lista de compras, avisos, música, etc.
∗ Tabela de julho/2008
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6ª série
Conteúdo Estruturante
Conteúdos Básicos Abordagem teórico metodológica
Avaliação
Discurso como prática social
Leitura Identificação do tema, do argumento principal. Interpretação observando: conteúdo veiculado, fonte, intencionalidade e intertextualidade do texto. Linguagem não verbal.
Práticas de leitura de textos de diferentes gêneros. Inferências de informações implícitas. Utilização de materiais diversos (fotos, gráficos, quadrinhos...) para interpretação de textos. Análise dos textos, levando em consideração o grau de complexidade dos mesmos. Questões que levam o aluno a interpretar e compreender o texto. Leitura de outros textos para a observação das relações dialógicas.
Realizar leitura compreensiva do texto, levando em consideração a sua condição de produção. Localizar informações explícitas no texto. Emitir opiniões a respeito do que leu. Conhecer e utilizar a língua estudada como instrumento de acesso a informações de outras culturas e de outros grupos sociais. Refletir e transformar o seu conhecimento, relacionando as novas informações aos saberes já adquiridos.
Oralidade Variedades lingüísticas. Intencionalidade do texto. Exemplos de pronúncias e de uso de vocábulos da língua estudada em diferentes países.
Apresentação de textos produzidos pelos alunos. Seleção de discursos de outros como: entrevista, cenas de desenhos, reportagem. Análise dos recursos próprios da oralidade. Dramatização .
Utilizar seu discurso de acordo com a situação de produção. (formal e informal). Apresentar clareza nas idéias.
Escrita Adequação ao gênero: elementos composicionais, elementos formais e marcas lingüísticas. Clareza de idéias. Adequar o conhecimento adquirido à norma padrão.
Discussão sobre o tema a ser produzido. Leitura de textos sobre o tema. Produção textual. Revisão textual. Reestrutura e reescrita textual.
Produzir textos atendendo as circunstâncias de produção proposta. Diferenciar a linguagem formal da informal.
Análise Lingüística Coesão e coerência. Função dos pronomes, artigos, numerais, adjetivos, palavras interrogativas, advérbios, preposições, verbos, substantivos, substantivos contáveis e incontáveis, concordância verbal e nominal e outras categorias como elementos do texto. Acentuação (espanhol). Vocabulário. Pontuação e seus efeitos de sentido no texto.
Estudo dos conhecimentos lingüísticos a partir: - de gêneros selecionados para leitura ou escrita. - de textos produzidos pelos alunos. - das dificuldades apresentadas pela turma. Leitura de textos diversos que permitam ampliar o domínio da língua.
Utilizar, adequadamente recursos lingüísticos, como o uso da pontuação, do artigo, dos pronomes, etc. Ampliar o vocabulário. Utilizar as flexões verbais para indicar diferenças de tempo e modo.
Sugestões de gêneros para a 6ª série: entrevista,notícia, música, tiras,textos midiáticos, propaganda, charges, provérbios, diário, cartoon, narrativa, música, etc.
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QUESTÃO B Observe, na tabela de Conteúdos Básicos na coluna Avaliação, o item destacado em amarelo “Conhecer e utilizar a língua estudada como instrumento de acesso a informações de outras culturas e de outros grupos sociais.”. Esta afirmação parece contradizer a concepção discursiva de língua presente nas DCE/LEM, que orienta: “Ao tomar a língua como interação verbal, como espaço de produção de sentidos marcado por relações sociais o conteúdo estruturante da Língua Estrangeira Moderna é o Discurso como prática social (...).” (Paraná, 2008, p.16)
Fonte: http://office.microsoft.com/pt-br/clipart/results.aspx?qu=mulheres&sc=20&CategoryID=CM790019251046
Para compreender melhor as implicações levantadas nesta pergunta vamos ler os textos provenientes do site Open Spaces for Dialogue and Enquiry (OSDE) Methodology:
Qual a diferença entre considerar a língua
como “instrumento de instrumento de instrumento de instrumento de acessoacessoacessoacesso” e considerá-la
como “interação interação interação interação verbalverbalverbalverbal”?
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CRITICAL LITERACY
The table below illustrates the central argument of a complex debate: the difference between two perspectives on language: one that says that language describes reality (positivism) – aqui cabe uma das implicações levantadas acima: ao considerar a língua como “instrumento de acesso”, ou código, acredito que não posso interagir com e na língua, apenas recebo ou transmito sentidos; a língua descreve a realidade que é exterior a mim, ou seja, eu os reproduzo, pois os sentidos já estão prontos, apenas preciso da chave do código para acessá-los - and another that says that language creates reality (post-positivism) – ou pós-estruturalista, na qual “Os pressupostos sobre o que seja a realidade nesta concepção de mundo são examinados a partir das relações de poder estabelecidas pela nossa percepção da realidade. Aqui, a realidade não pode ser separada de quem a observa, ou constrói. E quem a constrói nunca o faz sozinho, mas sim coletivamente nas relações sociais.” (JORDÃO, livro Valéria/Acir). Assim, a implicação de “língua como interação verbal” consiste em conceber a língua como espaço de construção de sentidos: o sujeito ao participar de várias práticas discursivas no dia-a-dia (ler um jornal, assistir à TV, comentar uma notícia, etc,) está interagindo com a língua e, ao mesmo tempo, interagindo na língua, pois vai fazê-lo a partir do lugar de onde fala, da comunidade à qual pertence, dos grupos dos quais participa (homem, branco, operário, pai, esposo, católico, etc,) ou (mulher, negra, solteira, doméstica, etc,), pois estas são as relações sociais nas quais este sujeito está envolvido: é influenciado por elas e, ao mesmo tempo, as influencia.
It simplifies and breaks down these perspectives to show the differences between traditional reading, critical reading and critical literacy. The OSDE project focuses on critical literacy as a complement to critical reading. Critical reading refers to the skills needed to evaluate a text or a perspective in terms of legitimacy and intentionality, whereas critical literacy refers to the skills needed to understand how our parameters of evaluation are culturally constructed and the implications of these constructions:
At this point...At this point...At this point...At this point...
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Traditional Reading
Critical Reading
Critical Literacy
Types of questions:
• Does the text represent the truth?
• Is it fact or opinion? • Is it biased or neutral? • Is it well written/clear? • Who is the author and
what level of authority/legitimacy does he/she represent?
• What does the author say?
Types of questions:
• What is the context? • To whom is the text
addressed? • What is the intention of
the author? • What is the position of the
author (his/her political agenda)?
• What is the author trying to say and how is he/she trying to convince/manipulate the reader?
• What claims are not substantiated?
• Why has the text been written in this way)
Types of questions:
• What could be the assumptions behind the statements?
• How do you think the author understands reality? What could be shaping his/her understanding?
• Who decides (what is real, can be known or needs to be done) in whose name and for whose benefit?
• What could be the implications of his/her claims (past/present/future: social, environmental, economic, etc…)?
• How could these statements be interpreted differently in different contexts?
• What are the sanctioned ignorances (blind spots) and contradictions?
Focus : content and authority and legitimacy of the speaker and the text.
Focus : context, intentions, style of communication
Focus : assumptions, knowledge production, power, representation and implications
Aim : to develop an understanding of the content To establish the truth-value of the text
Aim : to develop critical reflection (ability to perceive intentions and reasons)
Aim : to develop reflexivity (ability to perceive how assumptions are constructed)
Language : is fixed, transparent and gives us access to reality
Language : is fixed and translates reality
Language: is ideological and constructs reality
Reality: Exists and is easily accessed though sensory perceptions and objective thinking
Reality: Exists and is accessible, but it is often translated into false representations
Reality: Exists, but is inaccessible (in absolute terms) – we have only partial interpretations constructed in language
Knowledge: Universal, cumulative, linear, right versus wrong, fact versus opinion, neutral versus biased
Knowledge: False versus true interpretation of reality
Knowledge: Always partial, context dependent (contingent), complex and dynamic
Adapted and expanded from: Gina CERVETTI, Michael J. PARDALES, James S. DAMICO, A Tale of Differences: Comparing the Traditions, Perspectives, and Educational Goals of Critical Reading and Critical
Literacy, www.readingonline.com, 2001
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The key is to address:
“Who constructs the texts [or perspectives/discourses/ideologies] whose representations are dominant in a particular culture at a particular time; how readers come to be complicit with the persuasive ideologies of texts; whose interests are served by such representations and such readings; and when such texts and readings are inequitable in their effects, how these could be constructed otherwise.” Morgan, W. (1997). Critical literacy in the classroom: The art of the possible. New York : Routledge.
When approaching a text/discourse/ideology, the questions below become the focus of critical engagement:
• How are the meanings assigned to a certain figure or events in a perspective? • How does it attempt to get readers to accept its constructs? • Whose interests are served by the dissemination of this perspective? Whose
interests are not served? • What view of the world is put forth by the ideas in this perspective? What views are
not? • What are other possible constructions of the world?
Thus, critical engagement in the project is understood as the ability to trace the origins and implications of perspectives and assumptions. One of the implications for educational practice is that it changes our role as ‘teachers’, as Scholes (1985) points out:
"Our job is not to produce ‘readings’ for our students, but to give them the tools for producing their own (…) Our job is not to intimidate our students with our own suprior textual production; it is to show them the codes upon which all textual production depends and to encourage their own textual practice". Scholes, R., (1985)Textual power : literary theory and the teaching of English, New Haven, Conn. ; London : Yale university press
In this context ‘reading refers to ‘reading the world’ and ‘textual practice’ refers to ‘producing knowledge/meaning’. Freire (1985) also points in the same direction:
"When we try to be neutral we support the dominant ideology. Not being neutral, education must be either liberating or domesticating. Thus, we have to recognise ourselves as politicians. It does not mean that we have the right to impose on students our political
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choice (…) our task is not to impose our dreams on them, but to challenge them to have their own dreams, to define their choices, not just to uncritically assume them". Freire, P. (1985) Reading the world and reading the word: an interview with Paulo Freire.Language Arts 62 (1).
Fonte: http://www.osdemethodology.org.uk/criticalliteracy.html
QUESTÃO C Após algumas reflexões sobre concepção de língua e Letramento Crítico, transcrevo o resumo do texto “Ensino de Inglês, Letramento Crítico e Cidadania: um triângulo amoroso bem-sucedido” escrito por Clarissa Menezes Jordão e Francisco Carlos Fogaça, que relata uma experiência de elaboração de materiais didáticos para o ensino de línguas estrangeiras (inglês e espanhol) para as escolas da rede pública na perspectiva do Letramento Crítico: RESUMO: Este trabalho tem por objetivo relatar uma experiência de elaboração de materiais didáticos para o ensino de línguas estrangeiras (inglês e espanhol), a serem utilizados em escolas públicas do estado do Paraná, no ensino fundamental. O trabalho foi desenvolvido pela equipe de línguas estrangeiras (ensino fundamental) da Secretaria de Estado de Educação do Paraná (SEED) e por consultores externos em 2005 e 2006. Os materiais desenvolvidos incluem uma seleção de textos com orientações aos professores, o material do aluno, cartazetes, CDs de áudio e vídeo, e transparências. O projeto buscou o desenvolvimento de materiais flexíveis, não seriados, que pudessem contemplar tanto as realidades globais como as locais, atendendo às necessidades dos diversos contextos escolares no estado, sem a pretensão de ser um livro-texto acabado, com conteúdos pré-estabelecidos. Os materiais têm como base teórica o ensino/aprendizagem por letramento crítico, concebendo a língua como discurso, e tendo uma perspectiva de texto como unidade de sentido verbal e não verbal. Nossa proposta pretende ir além da visão da língua como código lingüístico a ser ensinado, enfatizando o processo de construção coletiva de sentidos, entendendo que a realidade é também uma construção coletiva. Procuramos contemplar diversos tipos textuais, como emails, folhetos, poemas, cartas, páginas da web, e imagens, possibilitando ao aluno ter acesso a uma diversidade de textos e contextos de uso da linguagem. Neste trabalho explicitamos as diversas seções que compõem as orientações ao professor, seus objetivos e os tipos de atividades recomendadas: preparação, exploração textual, problematização, e dicas ao professor. A seção chamada de “problematização” propõe a construção coletiva de sentidos, através de questionamentos dos temas abordados nos textos. Tanto objetivos educacionais como lingüísticos são contemplados em nossa proposta. PALAVRAS-CHAVE: letramento crítico; discurso; ensino de línguas
Agora, que tal uma “olhadinha” nas sugestões abaixo?! Elas fazem parte do material do Mini-Curso: De Código a discurso – implicações das concepções de língua para o ensino de línguas estrangeiras, utilizado pela professora Clarissa Menezes Jordão no II Simpósio Estadual de Língua Estrangeira Moderna, Faxinal do Céu, outubro de 2006. Elas também compõem as orientações ao professor do material didático elaborado para as escolas públicas do ensino fundamental, citado anteriormente:
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SUGESTÕES PARA O TRABALHO EM SALA DE AULA: Os diferentes momentos descritos a seguir foram desenvolvidos com referência a construções de salas de aula do ensino fundamental. Reflita sobre eles tendo seus próprios alunos e alunas, seus contextos e as práticas textuais das comunidades em que eles vivem como referência para a elaboração de atividades para uso em sala de aula. RETOMANDO... No texto de apresentação desta unidade didática vimos que as orientações da abordagem por Letramento Crítico permanecem nas DCE/LEM. Assim, por um lado, temos uma visão da construção de sentidos pela leitura, “várias posições diante dos tópicos”, “complexidade dos temas”, “diversas perspectivas para diferentes leituras de mundo”, “negociação de sentidos”, "construção coletiva de conhecimentos”.
1. Preparação – objetivo: contextualizar e motivar nos alunos e alunas o pensar sobre as representações do mundo relacionadas ao tema abordado, e partilhar estas representações, engajando-se e motivando-se para as discussões que seguirão. As atividades aqui poderão ser desenvolvidas em forma de discussões abertas sobre os temas, ou poderão sugerir um trabalho lingüístico mais específico, a fim de que os alunos e alunas possam ter um contato inicial com os elementos da língua estrangeira necessários para a leitura.
2. Exploração – objetivo: explorar aspectos discursivos dos textos, enfocando o processo de construção e negociação de sentidos envolvidos na leitura. Atividades de compreensão geral e específica e exploração de aspectos lingüístico-textuais podem acontecer neste momento do trabalho de sala de aula, a fim de que os alunos e alunas possam construir sentidos com o texto. Apresentar possibilidades de expansão do trabalho em sala de aula, levando o conhecimento produzido pelos alunos a outros espaços sociais, tornando mais significativo o aprendizado. Se necessário, este é o momento para sistematização e assimilação de conteúdos lingüísticos e de compreensão de diferentes perspectivas. Atividades de produção coletiva de sentidos além do texto apresentado, sob o pressuposto de que o conhecimento se constrói socialmente e precisa ser negociado, já que o conhecimento produzido não é apenas a soma dos conhecimentos individuais, mas sim um novo conhecimento partilhado que nenhum deles possui isoladamente (Wells, G. 1999).
3. Problematização – objetivo: questionar pressupostos do senso comum e perspectivas institucionalizadas culturalmente. Este momento enfatiza a complexidade dos temas abordados através da problematização dos temas abordados e do contato com diversas perspectivas para diferentes leituras de mundo. O presssuposto aqui é que não existem verdades absolutas e que todo conhecimento pode ser considerado legítimo, já que a realidade não é fixa, nem os julgamentos que fazemos dela. Os alunos devem se sentir à vontade para expressar-se livremente, debatendo as diferentes perspectivas. É preciso que alunos e professor estejam dispostos a negociar sentidos, a construir conhecimentos coletivamente, problematizando posturas mais do que encontrando respostas definitivas ou assumindo posições fixas.
4. Dicas para o professor – objetivo: orientar os colegas para lidarem com possíveis desafios oriundos da discussão dos temas abordados. Antecipação de eventuais problemas gerados pelos questionamentos propostos, ou ainda indicações de leituras para ampliar as perspectivas do professor e da professora em relação ao tema. É importante lembrar que o papel do professor e da professora não é o de um especialista nos diferentes tópicos e tão pouco precisa conhecer profundamente cada assunto abordado. Entretanto, é interessante informar-se sobre diferentes perspectivas sobre os assuntos abordados, a fim de que o professor possa conduzir com sucesso as atividades propostas e promover o questionamento dos pressupostos que embasam as várias posições diante dos tópicos.
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Podemos ver como isto se materializa na prática pedagógica, observando o encaminhamento metodológico dado ao anúncio abaixo:
Atividade: Anúncio Gatinhos Email do autor: [email protected]
Objetivos: Trabalhar a construção de sentidos a partir de um texto Descrição:
Atividade de leitura de uma anúncio publicitário, com foco no letramento crítico
Público alvo: Qualquer série do ensino regular Arquivo com a atividade: Anúncio Gatinhos
Este anúncio tem linguagem simples e pode ser explorado em qualquer série do ensino regular: tudo depende das tarefas propostas e do nível de língua com que se pretende trabalhar. Como exemplo, pode-se solicitar dos alunos que explorem o texto discutindo com eles seu formato, suas características visuais (a escolha pelo uso de fotos lado a lado, pelo texto em caixinhas abaixo das fotos, o uso de setas entre as caixas de texto, etc) e a implicações dessas características na nossa percepção do tipo de texto que vamos ler. Em termos mais especificamente lingüísticos, podemos concentrar nossas atenções nas funções de OR (entre os dois anúncios) e SEE BOTH AND DECIDE (na parte inferior do anúncio) – esses elementos não permitem que se leia os anúncios separadamente, e barram ao leitor a possibilidade de ficar com o gato e o marido ao mesmo tempo. A relação entre SEE BOTH AND DECIDE e OR com o resto do texto precisa ser entendida para que se faça uma boa leitura. É preciso também, numa abordagem de leitura crítica, ampliar as tradicionais perguntas de contextualização sobre o gênero textual, o contexto e o autor (por exemplo: “os anúncios foram escritos por uma mesma pessoa?”; “quem escreveu o anúncio?”; “qual o seu objetivo?”; “a quem se destina?”), discutindo também aspectos de relevância mais direta ao contexto dos alunos, como perspectivas sobre casamento (sua função social na comunidade nos dias de hoje e suas origens históricas); fatores que levam as pessoas a casarem (amor, exigência social, relação de posse ou doação, etc.), perspectivas sobre o
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relacionamento entre pessoas e animais de estimação, sobre as reações (inclusive do marido “anunciado” ao ler o anúncio) diante da aproximação dos sentimentos que nutrimos por pessoas e por animais. Ao expandir as discussões sobre implicações do texto na vida cotidiana dos alunos, pode ser interessante perceber também a possibilidade de diferentes contextos: este anúncio foi escrito em inglês, publicado num jornal para residentes de países de língua inglesa. Ele seria “possível” no Brasil? Qual seria o impacto de um anúncio semelhante publicado, digamos, na Gazeta do Povo? A seleção dos tópicos a serem abordados em sala de aula precisa, evidentemente, levar em consideração a idade dos alunos e suas experiências de vida, assim como a naturalidade ou não do professor ao tratar de cada assunto. Além da leitura inicial do texto, da discussão sobre as características do gênero anúncio de jornal e uma leitura crítica do conteúdo (pressupostos e implicações daquilo que se percebe como sendo o “assunto do texto”), pode-se sugerir uma atividade de escrita como “follow up”, em que os alunos pratiquem a elaboração de textos de gênero semelhante. Para tanto, é preciso encontrar situações de prática textual significativa. Caso você queira que seu aluno produza um texto em língua inglesa, é importante definir espaços em que anúncios semelhantes precisem ser feitos em inglês – a Internet pode ser um desses espaços. Os produtos postos à venda na World Wide Web (www) precisam ser concebidos como tendo interesse para um público internacional que lê os anúncios em diferentes países do mundo. Neste caso, é preciso atentar para as mudanças de gênero textual (anúncio de jornal e anúncio na Internet), bem como para as características dos leitores de um e de outro espaço. Outro ambiente para os anúncios em língua inglesa poderia ser a troca de anúncios (e produtos a venda) entre diferentes alunos de inglês da mesma escola ou de escolas diferentes. Embora este contexto seja um pouco mais artificial do que o primeiro, isso não invalida que o espaço seja significativo. Afinal, em nossas salas de aula o uso da língua inglesa terá freqüentemente um tom de faz-de-conta, já que em geral a comunicação entre os alunos pode se dar em língua portuguesa. Por isso é recomendável que de quando em vez o professor busque contextos reais de uso da língua para que os alunos percebam que há situações em que usar a língua inglesa é necessário para comunicar-se com o exterior. Em contextos onde tal comunicação não é possível, pode-se propor a troca “real” de objetos entre os alunos, a partir de anúncios escritos pelo alunos, como por exemplo com a estrutura “I have a ...... that I’d like to exchange for a ....” – os alunos estariam assim praticando a língua em situação motivadora e mais próxima de seus interesses reais. Os anúncios poderiam ser escritos em casa, acompanhados de fotos ou desenhos dos objetos a serem trocados. Essas são algumas idéias para o trabalho em sala de aula a fim de que se possa desenvolver com os alunos o letramento critico, utilizando a língua inglesa não apenas para instrumentalizar, mas principalmente para que eles tenham consciência das várias possibilidades de uso das línguas em suas diferentes formas e contextos, e possam com isso examinar as origens ou pressupostos de determinadas posturas, ao lado de suas implicações e conseqüências para as atitudes interpretativas adotadas.
Fonte: http://www.apliepar.com.br/site/
Por outro lado, o que consta dos Conteúdos Básicos, no item Avaliação: “Espera-se que o aluno identifique o tema e explique a idéia principal do texto.” (“idéia” no singular). Parece que o termo “identificar”, aqui, sugere que o sentido está no texto e deve ser decodificado a partir das pistas que o texto fornece, e que a idéia principal é só uma. Em Coracini, Kato (1985) afirma que essa maneira de ver o ato de ler está relacionada com a hipótese bottom-up ou ascendente, que enfatiza o texto e os dados
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nele contidos como ponto de partida para a compreensão. Esta orientação metodológica estaria contradizendo as orientações construídas nas DCE/LEM com relação à leitura?
Ainda em Coracini, Kato (1985) aponta outro tipo básico de processamento de informação: é a hipótese top-down a qual vê no leitor a fonte única do sentido, onde o texto serviria apenas como confirmador de hipóteses. Nos exemplos abaixo, retirados de alguns livros didáticos importados e nacionais, podemos observar os dois tipos de posturas teóricas referentes à leitura:
• Reading Strategies: make a hypothesis; choose a title; identify topic sentences…
Nesta visão, o texto se objetifica, ganha existência própria, indenpendente do sujeito e da situação de enunciação: o leitor seria, então, o receptáculo de um saber contido no texto, unidade que é preciso capturar para construir o sentido. Note-se que, neste caso, se constrói o sentido como se constrói uma casa, um objeto, a partir de unidades menores, combináveis e recombináveis entre si. (Coracini, 1995, p. 14)
Na concepção intermediária de leitura, vista como interação entre os componentes do ato da comunicação escrita, o leitor, portador de esquemas (mentais) socialmente adquiridos acionaria seus conhecimentos prévios e os confrontaria com os dados do texto, “construindo”, assim, o sentido. Nessa concepção, o bom leitor é aquele que é capaz de percorrer as marcas deixadas pelo autor para chegar à formulação de suas idéias e intenções. (Coracini, 1995, p. 14)
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Observando o exemplo da página anterior: PROPOSTA DE TRABALHO
Após tantas reflexões, pontos de vista “divergentes” (????), é interessante retomarmos as palavras de Paulo Freire “(…) our task is not to impose our dreams on them, but to challenge them to have their own dreams, to define their choices, not just to uncritically assume them."
Se a proposta da abordagem por Letramento Crítico é um caminho possível para isto, que tal tentarmos elaborar um plano de aula com base nas orientações que estão na página 10?
Ah! Os textos “Ensino de Inglês, Letramento Crítico e Cidadania: um triângulo amoroso bem-sucedido” e “O Ensino de Línguas Estrangeiras: de código a discurso” referente ao material do mini-curso citado anteriormente encontram-se nos Anexos.
[...] o estudo do vocabulário, nessas aulas, se faz sempre presente, apontando, pela maneira como é trabalhado, para a concepção de leitura enquanto decifração e para a concepção de texto enquanto conjunto de palavras que se sucedem umas às outras na linearidade espacial e temporal do papel, como se o sentido do texto resultasse da soma do significado isolado de cada palavra. Muitas vezes, aprender a ler equivale a descobrir o significado das palavras do texto, a pronunciar corretamente, a localizar os momentos (ou idéias) principais do texto ali depositados de forma definitiva pela vontade consciente do autor. (Coracini, 1995, p.18, grifo meu).
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7ª série
Conteú do
Estrutu rante
Conteúdos Básicos
Abordagem teórico
metodológica
Avaliação
Discurso
Como
prática social
Leitura Identificação do tema, do argumento principal e dos secundários. Interpretação observando: conteúdo veiculado, fonte, intencionalidade e intertextualidade do texto. Linguagem não- verbal.
Práticas de leitura de textos de diferentes gêneros. Inferências de informações implícitas. Utilização de materiais diversos (fotos, gráficos, quadrinhos...) para interpretação de textos. Análise dos textos visando reflexão e transformação. Questões que levam o aluno a interpretar e compreender o texto. Leitura de outros textos para a observação das relações dialógicas.
Realizar leitura compreensiva do texto, levando em consideração a sua condição de produção. Localizar informações explícitas e implícitas no texto. Emitir opiniões a respeito do que leu. Ampliar,no indivíduo, o seu horizonte de expectativas. Conhecer e utilizar a língua estudada como instrumento de acesso a informações de outras culturas e de outros grupos sociais. Refletir e transformar o seu conhecimento, relacionando as novas informações aos saberes já adquiridos.
Oralidade Variedades lingüísticas. Intencionalidade do texto. Exemplos de pronúncias e de vocábulos da língua estudada em diferentes países.
Apresentação de textos produzidos pelos alunos. Seleção de discursos de outros, como: entrevista, cenas de desenhos, recortes de filmes, reportagem. Análise dos recursos próprios da oralidade. Dramatização.
Utilizar seu discurso de acordo com a situação de produção(formal, informal). Apresentar clareza nas idéias. Desenvolver a oralidade através da sua prática.
Escrita Adequação ao gênero: elementos composicionais, elementos formais e marcas lingüísticas. Clareza de idéias. Adequar o conhecimento adquirido à norma padrão.
Discussão sobre o tema a ser produzido. Leitura de textos sobre o tema. Produção textual. Revisão textual. Reestrutura e reescrita textual.
Produzir textos atendendo as circunstâncias de produção proposta. Diferenciar a linguagem formal da informal.
Análise Lingüística Coesão e coerência. Função dos pronomes, artigos, numerais, adjetivos, verbos, preposições, advérbios, locuções adverbiais, palavras interrogativas, substantivos, substantivos contáveis e incontáveis, question tags, falsos cognatos, conjunções, e outras categorias como elementos do texto. Pontuação e seus efeitos de sentido no texto. Vocabulário. Acentuação (espanhol).
Estudo dos conhecimentos lingüísticos a partir: -de gêneros selecionados para leitura ou escrita. - de textos produzidos pelos alunos. - das dificuldades apresentadas pela turma. Leitura de textos diversos que permitam ampliar o domínio da língua.
Utilizar, adequadamente recursos lingüísticos, como o uso da pontuação, do artigo, dos pronomes, etc. Ampliar o léxico. Utilizar as flexões verbais para indicar diferenças de tempo e modo.
Sugestões de Gêneros discursivos para a 7ª série: reportagem, slogan,sinopse de filme, textos midiáticos, anúncio publicitário, outdoor, blog, etc.
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8ª Série
Conteúdo Estruturante
Conteúdos Básicos Abordagem teórico metodológica
Avaliação
Discurso como prática social
Leitura Identificação do tema, do argumento principal e dos secundários. Interpretação observando: conteúdo veiculado, fonte, intencionalidade e intertextualidade do texto. Linguagem não- verbal. Realização de leitura não linear dos diversos textos.
Práticas de leitura de textos de diferentes gêneros. Inferências de informações implícitas. Utilização de materiais diversos (fotos, gráficos, quadrinhos...)para interpretação de textos. Análise dos textos, levando em consideração o grau de complexidade dos mesmos. Questões que levam o aluno a interpretar e compreender o texto. Leitura de outros textos, através de pesquisas, para a observação das relações dialógicas.
Realizar leitura compreensiva do texto, levando em consideração a sua condição de produção. Localizar informações explícitas e implícitas no texto. Emitir opiniões a respeito do que leu. Ampliar, no individuo, o seu horizonte de expectativas. Conhecer e utilizar a língua estudada como instrumento de acesso a informações de outras culturas e de outros grupos sociais.
Oralidade Variedades lingüísticas. Intencionalidade do texto. Exemplos de pronúncias e de vocábulos da língua estudada em países diversos. Finalidade do texto oral. Elementos extralingüísticos: entonação, pausas, gestos.
Apresentação de textos produzidos pelos alunos. Seleção de discursos de outros, como: entrevista, cenas de desenhos, recortes de filmes, documentários, reportagem,etc. Análise dos recursos próprios da oralidade. Dramatização de textos.
Reconhecer as variantes lexicais. Utilizar seu discurso de acordo com a situação de produção(formal, informal). Apresentar clareza nas idéias. Desenvolver a oralidade através de sua prática.
Escrita Adequação ao gênero: elementos composicionais, elementos formais e marcas lingüísticas. Paragrafação. Clareza de idéias. Adequar o conhecimento adquirido à norma padrão.
Discussão sobre o tema a ser produzido. Leitura de textos sobre o tema. Produção textual. Revisão textual. Reestrutura e reescrita textual.
Produzir textos atendendo as circunstâncias de produção proposta. Diferenciar a linguagem formal da informal. Estabelecer relações entre partes do texto, identificando repetições ou substituições.
Análise Lingüística Coesão e coerência. Função dos pronomes, artigos, numerais, adjetivos, verbos, preposições, advérbios, locuções adverbiais, palavras interrogativas, substantivos, substantivos contáveis e incon- táveis, question tags, falsos cognatos, conjun ções e outras categorias como elementos do texto. Pontuação e seus efeitos de sentido no texto. Vocabulário. Acentuação (espanhol).
Estudo dos conhecimentos lingüísticos a partir: - de gêneros selecionados para leitura ou escrita. - de textos produzidos pelos alunos. - das dificuldades apresentadas pela turma. Leitura de textos diversos que permitam ampliar o domínio da língua.
Utilizar, adequadamente recursos lingüísticos, como o uso da pontuação, do artigo, dos pronomes, etc. Ampliar o vocabulário. Utilizar as flexões verbais para indicar diferenças de tempo e modo.
Sugestões de gêneros discursivos para a 8ª série: reportagem oral e escrita, textos midiáticos, histórias de humor, músicas, charges, entrevistas,depoimentos, narrativa, imagens,etc.
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QUESTÃO D Segundo a versão atual das DCE/LEM Observando a tabela de Conteúdos Básicos para a Educação Básica, encontramos na coluna Abordagem Teórico-metodológica:
inferência de informações implícitas
1. Você concorda com a menção de inferência da maneira como está no quadro de conteúdos?
2. Por que a inferência não aparece como conteúdo básico na 5ª série? Faça sua
análise.
“(...) Na abordagem de leitura discursiva, a inferência é um processo cognitivo relevante porque possibilita construir novos conhecimentos, a partir daqueles existentes na memória do leitor, os quais são ativados e relacionados às informações materializadas no texto. Com isso, o conhecimento de mundo e as experiências dos alunos serão valorizadas.” (página 30 – grifo meu)
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Ensino Médio
Conteúdo Estrutura
nte
Conteúdos Básicos
Abordagem teórico metodológica
Avaliação
Discurso como prática social
Leitura Identificação do tema, do argumento principal e dos secundários. Interpretação observando: conteúdo veiculado, fonte, intencionalidade e intertextualidade do texto. Linguagem não- verbal. As particularidades do texto em registro formal e informal. Finalidades do texto. Estética do texto literário. Realização de leitura não linear dos diversos textos.
Práticas de leitura de textos de diferentes gêneros. Relevância dos conhecimentos prévio dos alunos. Inferências de informações implícitas. Utilização de materiais diversos ( fotos, gráficos, quadrinhos...) para interpretação de textos. Análise dos textos, levando em consideração o grau de complexidade dos mesmos. Questões que levam o aluno a interpretar , compreender e refletir sobre o texto. Leitura de outros textos, através de pesquisa, para a observação das relações dialógicas.
Realizar leitura compreensiva do texto, considerando a construção de significados possíveis e a sua condição de produção. Perceber informações explícitas e implícitas no texto. Argumentar a respeito do que leu. Ampliar, no indivíduo, o seu horizonte de expectativas. Estabelecer relações dialógicas entre os diferentes textos. Conhecer e utilizar a língua estudada como instrumento de acesso a informações de outras culturas e de outros grupos sociais.
Oralidade Variedades lingüísticas. Intencionalidade do texto. Particularidade de pronúncias da língua estudada em diferentes países. Finalidade do texto oral. Elementos extralingüísticos: entonação, pausas, gestos.
Apresentação de textos produzidos pelos alunos. Seleção de discursos de outros como: entrevista, cenas de desenhos, reportagens, recortes de filmes, documentários, etc. Análise dos recursos próprios da oralidade. Dramatização de textos.
Reconhecer as variantes lexicais. Utilizar seu discurso de acordo com a situação de produção (formal , informal). Apresentar clareza nas idéias. Desenvolver a oralidade através da sua prática.
Escrita Adequação ao gênero: elementos composicionais, elementos formais e marcas lingüísticas. Paragrafação. Clareza de idéias. Adequar o conhecimento adquirido à norma padrão.
Discussão sobre o tema a ser produzido. Leitura de textos sobre o tema. Produção textual. Revisão textual. Reestrutura e reescrita textual.
Produzir e demonstrar na produção textual, a construção de significados. Produzir textos atendendo as circunstâncias de produção proposta. Diferenciar a linguagem formal da informal. Estabelecer relações entre partes do texto, identificando repetições ou substituições.
Análise Lingüística Coesão e coerência. Função dos pronomes, artigos, adjetivos, numerais preposições, advérbios, locuções adverbiais, conjunções, verbos, palavras interrogativas, substantivos, substantivos contáveis e incontáveis, falsos cognatos, discurso direto e indireto, vozes verbais, verbos modais, concordância verbal e nominal, orações condicionais, phrasal verbs e outras categorias como elementos do texto. Acentuação (espanhol) Vocabulário. Pontuação e seus efeitos de sentido no texto.
Estudo dos conhecimentos lingüísticos a partir: - de gêneros selecionados para leitura ou escrita. - de textos produzidos pelos alunos. - das dificuldades presentadas pela turma. Leitura de textos diversos que permitam ampliar o domínio da língua.
Utilizar, adequadamente recursos lingüísticos, como o uso da pontuação, do artigo, dos pronomes, etc. Ampliar o vocabulário. Utilizar as flexões verbais para indicar diferenças de tempo e modo.
Sugestões de gêneros discursivos para o Ensino Médio: crônica, lendas, contos,poemas,fábulas, biografias, classificados, notícias, reportagem, entrevistas, cartas, artigos de opinião, resumo, textos midiáticos, palestra, piadas, debates, folhetos, horóscopo, provérbios, charges, tiras, etc.
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OBS.: A diversidade de gêneros discursivos deve estar contemplada em todas as séries do Ensino Fundamental e do Médio. Ressalta-se que a diferença significativa entre as séries está no grau de complexidade dos textos e de sua abordagem. A partir do texto escolhido para desenvolver as práticas discursivas, define-se os conteúdos específicos a serem estudados, norteados pelo gênero do texto. A cultura Afro-brasileira e Africana e a Cultura Indígena devem ser contempladas em diversos momentos. QUESTÃO E Leia novamente a coluna Avaliação nos quadros acima. Dos itens que constam nesta coluna:
Quais deles são critérios de avaliação? Os itens que não podem ser compreendidos como critérios seriam entendidos como
objetivos, instrumentos...?
2. Considerando a especificidade do tratamento da língua estrangeira na
prática pedagógica: que outras sugestões você faria com relação aos critérios de avaliação de nossa
disciplina?
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QUESTÃO F Este é um trecho do texto sobre Conteúdo Estruturante das DCE/LEM/EF/JUNHO/2006/VERSÃO PRELIMINAR que foi suprimido da versão atual:
“Além disso, as características dos textos precisam estar de acordo com a análise da viabilidade de resultados factíveis e realistas a serem alcançados nas diferentes séries, de acordo com os objetivos específicos delineados. Assim, os conteúdos poderão dar aos alunos indicativos para perceber os avanços nos estudos, na medida em que forem baseados no planejamento estabelecido entre professores ao longo do ano. As considerações apontadas acima (estas considerações permanecem no texto atual) permitem a construção de um diagrama visando ilustrar a abordagem de ensino de LE proposta, articulando o Conteúdo Estruturante – o discurso – aos conteúdos específicos para esta disciplina. Tendo em vista que esses conteúdos são indissociáveis no todo do texto, eles precisarão ser tratados na prática pedagógica de forma articulada entre si.”
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O texto continua: PROPOSTA DE TRABALHO
http://www.maistrafego.com/cliparts/Mulhres%20Trabalhando/WWW.SUPERTRAFEGO.COM__0024.gif
Como você vem organizando os conteúdos na proposta pedagógica curricular em sua escola? Como você está fazendo a seleção dos conteúdos no momento da organização do Plano de Trabalho Docente? Considerando as orientações do texto acima, as leituras feitas e a discussão realizada entre nossos colegas sobre estas questões, você considera importante a revisão/reorganização dos conteúdos nestes documentos em nossa escola? Se a resposta for sim, mãos à obra!!!
“A proposta apresentada no diagrama tem como referencial básico o discurso, que envolve o texto e suas condições de produção – o contexto sócio-histórico-ideológico no qual foi produzido. As noções de intradiscurso e o interdiscurso, juntamente com as condições de produção do texto, são elementos facilitadores para a organização curricular. Cumpre ressaltar que a organização de conteúdos específicos baseados apenas em itens gramaticais não é recomendável, já que contraria a visão de língua em contexto. Isto não significa excluir a gramática da sala de aula. Ela estará subordinada aos usos que se faz da LE, ou seja, as formas lingüísticas serão tratadas de modo contextualizado.”
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QUESTÃO G O trecho a seguir é a resposta dos professores do NRE de União da Vitória à questão número 1 do Documento II que orientou/subsidiou a discussão do II Encontro Descentralizado (todos os professores de LEM do ensino fundamental das escolas públicas do Paraná participaram deste evento) para a construção das DCE/LEM. Leia atentamente: 1. Você percebe as DCE/LEM como uma construção coletiva? Explique. “Todos os professores percebem as DCE/LEM como uma construção coletiva, pois os assuntos têm sido abordados gradativamente nos encontros e todas as opiniões têm sido consideradas e, a partir dessas opiniões, é planejado o passo seguinte a caminho de um resultado onde todos os professores possam se ver retratados, conseqüentemente, comprometidos com o resultado final e, daí para a prática, é apenas uma questão de tempo e oportunidade.”
(Documento-síntese II Encontro Descentralizado – LEM – NRE União da Vitória/nov/2004)
• Passados quase cinco anos, considerando que você tenha realizado a leitura das várias versões das DCE/LEM que chegaram até as escolas, que você tenha participado (com seus colegas) das discussões sobre a proposta pedagógica curricular de LEM em sua escola e que vocês tenham construído o Plano de Trabalho Docente, juntos, é possível concordar com a afirmação acima?
• Segundo esta afirmação os professores acreditavam que era apenas uma questão
de tempo e oportunidade para que a prática pedagógica em relação à disciplina de LEM acontecesse de acordo com a orientação das DCE/LEM. O tempo passou... Houve oportunidades para que o exposto acima se efetivasse? Por quê?
• Considerando as várias versões das DCE/LEM que chegaram até sua escola (da
primeira à atual), responda: você conseguiu “se ver retratado” neste documento? Se a resposta foi sim: isso fez com que você ficasse mais comprometido com sua prática em sala de aula? Explique. Se a resposta foi não: o que aconteceu?
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Anexos
Anexo 1 - DIRETRIZES CURRICULARES DE LINGUA ESTRANGEIRA – versão preliminar. Capítulos II, III e IV. Secretaria de Estado da Educação. Superintendência da Educação. Departamento de Ensino Fundamental; Junho de 2006. ............................................... 33
Anexo 2 - DIRETRIZES CURRICULARES DE LINGUA ESTRANGEIRA MODERNA – para os anos finais do ensino fundamental e para o ensino médio. Capítulos II, III e IV. Governo do Estado do Paraná. Secretaria de Estado da Educação. Superintendência da Educação; 2008. 58 Anexo 3 - ENSINO DE INGLÊS, LETRAMENTO CRÍTICO E CIDADANIA: Um triangulo amoroso bem sucedido. JORDÃO, Clarissa; FOGAÇA, Francisco Carlos. .................................................................................... 76 Anexo 4 - O QUE TODOS SABEM... OU NÃO: letramento crítico e questionamento conceitual. Clarissa Menezes Jordão, Revista CROP, 12/2007. 77 Anexo 5 - ENSINO DE LINGUAS ESTRANGEIRAS – de código a discurso. Clarissa Menezes Jordão – 2006. ........................................... 78
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Anexo 1: II FUNDAMENTOS TEÓRICO METODOLÓGICOS
Com o objetivo de justificar a concepção teórico-metodológica que norteia estas
Diretrizes, pretende-se, inicialmente, problematizar o ensino da Língua Estrangeira, a
partir da análise do diagnóstico realizado junto aos professores que atuam na Rede
Pública do Estado do Paraná1. Ao explicitarem aspectos relativos ao ensino da LE no que
se refere às suas práticas e aos objetivos que atribuem à disciplina, identificou-se que a
Abordagem Comunicativa tem orientado o trabalho em sala de aula. Esta opção justifica-
se por favorecer o uso da língua pelos alunos, ainda que de forma limitada, evidenciando
uma concepção centrada numa perspectiva utilitarista de ensino na qual a língua é
concebida enquanto sistema para a expressão do significado, dentro de um contexto
interativo de uso. No entanto, os professores explicitaram também o reconhecimento dos
limites de tal abordagem, quando se pretende ampliar o papel deste componente
curricular na formação integral dos alunos, situação que exige a busca de fundamentos
teórico-metodológicos que subsidiem efetivamente o ensino da LE no processo de
escolarização.
Para realizar a análise dos limites e possibilidades da Abordagem Comunicativa,
com vistas à definição de novos referenciais teórico-metodológicos para o ensino de LE,
teve-se como referência o trabalho desenvolvido por Meurer. Este autor destaca a
premente necessidade de desenvolver formas de incentivar práticas pedagógicas no
contexto brasileiro que contestem “ou quebrem o círculo do senso comum, daquilo que
parece natural, não problemático, mas que recria e reforça formas de desigualdade e
discriminação” (2000, p.169). Cumpre ressaltar que as práticas pedagógicas decorrem de
concepções teórico-metodológicas, e, portanto, não são naturais, nem desvinculadas do
contexto sócio-histórico, mas carregadas de ideologias que explicitam as relações de
poder (Foucault, 2003), correspondendo a interesses distintos e que precisam ser
problematizadas.
1 As contribuições dos professores de línguas estrangeiras, lotados nas escolas de Educação Básica da rede pública do estado do Paraná, advindas dos Seminários e dos relatórios produzidos nos Encontros Descentralizados realizados no ano de 2004, bem como dos estudos da semana pedagógica em 2005, forneceram subsídios para a elaboração do diagnóstico das concepções educacionais subjacentes às suas práticas pedagógicas. Em tais estudos, foram propostas discussões acerca das concepções educacionais que fazem parte do discurso escolar. Cumpre ressaltar que na sua elaboração, a multiplicidade de vozes, característica deste processo, foi captada nos pontos convergentes, ainda que não possam ser reconhecidas ipsis litteris.
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Tendo como referência de análise tais apontamentos, apresenta-se a seguir uma reflexão
a respeito da Abordagem Comunicativa, considerando que essa corrente tem marcado o ensino
de LE na rede pública estadual. No Brasil, ela passou a fundamentar grande parte dos materiais e
livros didáticos disponíveis para uso em escolas de ensino regular, desde a década de 80 até os
dias atuais (PEREIRA, 2004; CORACINI, 1999). No Paraná, segundo Gimenez (1999), a
Abordagem Comunicativa foi apropriada como referencial teórico na elaboração da proposta de
ensino de LE do Currículo Básico (1992). Embora esse documento apresente uma concepção de
língua discursiva e sugira um trabalho em sala de aula com diferentes tipos de textos, a partir da
visão bakhtianiana, observa-se em sua proposta que a progressão de conteúdos, de 5ª a 8ª séries,
está voltada para o ensino comunicativo, centrado apenas em funções da linguagem ligadas ao
cotidiano esvaziando as práticas sociais mais amplas de uso da língua.
A Abordagem Comunicativa ao incorporar em seu modelo, o uso da gramática, exigida para a
interpretação, expressão e negociação de sentidos no contexto imediato da situação de fala,
colocando-se a serviço dos objetivos de comunicação, apresenta aspectos considerados positivos.
Análises recentes mencionam que o ensino comunicativo desenvolveu-se em três fases ao longo
das últimas décadas, representando assim avanços em seus pressupostos e proposições. Segundo
Mascia, “uma primeira é associada ao nocional-funcional e é calcada em práticas audiolinguais;
a segunda marcada pelos atos de fala com a incorporação de tendências sociolingüísticas e a
terceira corresponde a uma vertente mais crítica, em que se pretendeu promover as interações
culturais” (2003, p. 218).
Por outro lado, tal abordagem e os métodos que a antecederam, ao centrarem a atenção na
comunicação, não levaram em conta justamente aquilo que se constitui a essência da língua: as
diferentes vozes que permeiam as relações sociais e, principalmente, as relações de poder que as
entremeiam.
Nesta abordagem, o conceito de cultura configura-se numa visão homogênea que
a percebe dissociada da língua, ou seja, um o bom usuário de uma língua estrangeira
deveria assimilar um conjunto de manifestações de um povo, seus costumes e hábitos,
muitas vezes abordados de forma estereotipada. Conforme Gimenez,
a abordagem comunicativa, na tentativa de ensinar a se comunicar na LE deixou de lado a relação entre comunicação e cultura, e a necessidade de entender a comunicação entre falantes nativos e não-nativos como comunicação intercultural mais do que comunicação na língua-alvo” (2001, p.110).
Cabe salientar que mesmo havendo avanços na visão de cultura como prática
social, vertente mais crítica da Abordagem Comunicativa, no sentido de que ao olhar o
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outro, o sujeito aluno se olha também, permanece ainda a idéia de que para comunicar-se
adequadamente na língua estrangeira, deve-se olhar o mundo como o estrangeiro.
Nesse sentido, alguns autores trazem questões importantes para uma releitura crítica dos pressupostos subjacentes à Abordagem Comunicativa, não dissociada do contexto histórico. Kramsch questiona as “noções basilares do ensino comunicativo como comunicação autêntica, abordagem natural, necessidades do aprendiz, interação e negociação do sentido, corolárias da ideologia norte-americana, que pressupõe a solução pacífica dos conflitos e a coexistência harmoniosa das diferenças” (apud COX e ASSIS-PETERSON, 2001, p.5). Moita Lopes (1996) coloca sob suspeita o caráter apaziguador, harmonizador do ensino de língua e destaca que a finalidade de conhecer outra cultura precisa ser repensada no Brasil, enfatizando o caráter colonizador e assimilacionista do ensino comunicativo. Consoante a esse autor, Pennycook considera “que a expansão do inglês no mundo não é mera expansão da língua, mas também uma expansão de um conjunto de discursos que fazem circular idéias de desenvolvimento, democracia, capitalismo, neoliberalismo, modernização” (id.) e ainda afirma que “hoje, poderíamos dizer que as várias facetas do Comunicativo se desenvolveram com o objetivo principal de difusão do inglês como língua internacional” (apud MASCIA, 2003, p. 220).
Por esse enfoque pode-se perceber que, embora o discurso de tal abordagem se apresente como veiculador de idéias progressistas e inovadoras, é importante atentar para as suas origens históricas e as vinculações ideológicas dos seus princípios e conceitos. Torna-se evidente que esse modelo de ensino pauta-se num contexto-histórico em que questões acerca da hegemonia de uma língua, plurilinguismo e imperialismo lingüístico, bem como a ideologia e as relações de poder que a permeiam não eram problematizadas.
Tendo como referência tais reflexões pode-se depreender que tanto a opção teórico-
metodológica quanto o idioma a ser ensinado na escola não são neutros, mas, profundamente
marcados por questões político-econômicas e ideológicas, que resultam muitas vezes do
imperialismo de uma língua. Tais questões marginalizam razões históricas e/ou étnicas que
podem ser valorizadas, levando-se em conta a história da comunidade atendida pela escola.
Destaca-se, neste aspecto que o comprometimento com o plurilingüismo como política
educacional é uma das possibilidades de valorização e respeito à diversidade cultural, garantido
na legislação2, pois permite às comunidades escolares a definição da língua estrangeira a ser
ensinada.
A partir das reflexões em torno da Abordagem Comunicativa e das implicações desta no
ensino de LE, serão apresentados a seguir os fundamentos teórico-metodológicos que
referenciam estas Diretrizes. Inicialmente, destacam-se alguns princípios educacionais
fundamentais os quais orientaram esta escolha:
- o atendimento às necessidades da sociedade contemporânea brasileira e a garantia da eqüidade
no tratamento da disciplina de LE em relação às demais obrigatórias do currículo;
- o resgate da função social e educacional do ensino de línguas estrangeiras no currículo da
Educação Básica;
- o respeito à diversidade (cultural, identitária, lingüística), pautado no ensino de línguas que não
priorize a manutenção da hegemonia cultural.
Partindo desses princípios, identificou-se na pedagogia crítica o referencial teórico que
sustenta este documento de Diretrizes Curriculares, por entender que esta é a tônica de uma
abordagem que valoriza a escola como espaço social, responsável pela apropriação crítica e
2 Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) n. 9394/96, Art. 26, § 5º, na parte diversificada do currículo será incluído, obrigatoriamente, a partir da 5ª. Série, o ensino de pelo menos uma língua estrangeira moderna, cuja escolha ficará a cargo da comunidade escolar, dentro das possibilidades da instituição.
36
histórica do conhecimento, enquanto instrumento de compreensão da realidade social e de
atuação crítica e democrática para a transformação da realidade.
Ancorada nos pressupostos da pedagogia crítica, entende-se que a escolarização
tem o compromisso de prover aos alunos meios necessários para que não apenas
assimilem o saber enquanto resultado, mas apreendam o processo de sua produção, bem
como as tendências de sua transformação. Deste modo, a escola tem o papel de
informar, mostrar, desnudar, ensinar regras, não apenas para que sejam seguidas, mas
principalmente para que possam ser modificadas. Inspirando-se nas palavras de Simon,
nesta pedagogia
a prática pedagógica é vista como processo dedicado a fomentar a possibilidade através da implementação de modos de compreensão e ação que encorajem a transformação de relações específicas entre formas sociais e capacidades humanas, e assim permita a expansão do escopo de identidades sociais em que as pessoas possam se transformar (apud JORDÃO, 2004a, p. 164).
Nesse sentido, a proposta de ensino de LE será norteada para um propósito maior
de educação, considerando as contribuições de Giroux “ao rastrear as relações entre
língua, texto e sociedade, as novas tecnologias e as estruturas de poder que lhes
subjazem” (2004). Para este educador, é importante que os professores reconheçam a
importância da relação estabelecida entre língua e a pedagogia crítica no atual contexto
global educativo, pedagógico e discursivo na medida que se torna claro que as questões
de uso da língua, do diálogo, da comunicação, da cultura, do poder, das questões da
política e da pedagogia não se separam.
Isso implica superar uma visão de ensino de LE apenas como meio para se atingir
fins comunicativos, que restringem as possibilidades de sua aprendizagem como
experiência de identificação social e cultural, ao postular os significados como externos
aos sujeitos.
Para tanto, propõe-se fazer da aula de língua estrangeira um espaço para que o aluno
reconheça e compreenda a diversidade lingüística e cultural, oportunizando-o a engajar-se
discursivamente e a perceber possibilidades de construção de significados em relação ao mundo
que vive. Isso quer dizer que o aluno poderá compreender que os significados são sociais e
historicamente construídos e, portanto, passíveis de transformação na prática social. Nas
palavras de Moita Lopes,
aprender uma língua é aprender a se envolver nos embates discursivos que os discursos a que somos expostos em tal língua possibilitam, o que é igual a saber que estamos discursivamente posicionados de certos modos e que podemos alterar esses modos, para construir outros mundos sociais melhores ou outros significados sobre
37
quem somos na vida social, de maneira a alterar os significados que nos excluem como também que excluem os outros (2003, p. 45).
Desse modo, a proposta aqui adotada, baseada na corrente sociológica e nas teorias do
Círculo de Bahktin, bem como nos estudos de Orlandi (1999) e Foucault (2003), nos pontos que
as acepções de tais teóricos convergem, concebe a língua enquanto discurso, enquanto espaço de
produção de sentidos marcado por relações contextuais de poder, e não enquanto estrutura que
intermedia nosso contato com o mundo e através do qual sentidos seriam transmitidos.
Para tanto, faz-se necessário mapear o objeto de estudo da disciplina de LE, a língua, a partir do
quadro teórico conceitual de referência, apresentando os vários aspectos imbricados no processo
discursivo, a saber: língua e cultura, ideologia e sujeito, discurso e identidade, com vistas a
justificar epistemologicamente os objetivos de ensino de uma LE e resgatar a função social e
educacional desta disciplina na Educação Básica.
2.1 OBJETO DE ESTUDO DA LE
Toda língua é uma construção histórica e cultural em constante transformação. Assim, como
princípio social e dinâmico não se limita a uma visão sistêmica e estrutural do código lingüístico,
é heterogênea, ideológica e opaca. Nessa perspectiva, a língua repleta de sentidos a ela
conferidos por nossas culturas, nossas sociedades, organiza e determina as possibilidades de
percepção do mundo e estabelece entendimentos possíveis. Segundo Bakhtin (1988), toda
enunciação envolve a presença de duas vozes, a voz do eu e do outro. Para este filósofo, não há
discurso individual, no sentido de que todo discurso se constrói no processo de interação e em
função de um outro. E é no espaço discursivo criado na relação entre o eu e o tu que os sujeitos
se constituem socialmente. Sendo assim, é no engajamento discursivo com o outro que damos
forma ao que dizemos e ao que somos. Daí a língua estrangeira apresentar-se como um espaço
para ampliar o contato com outras formas de conhecer, com outros procedimentos interpretativos
de construção da realidade.
Em outras palavras, a língua concebida como discurso, não como estrutura ou código a
ser decifrado, significados e não apenas os transmite. Conforme Bakhtin, o sentido da linguagem
está no contexto de interação verbal e não no sistema lingüístico. Assim,
38
“o essencial na tarefa de decodificação não consiste em reconhecer a forma lingüística utilizada, mas
compreendê-la num contexto concreto preciso, compreender sua significação numa enunciação particular. Em
suma, trata-se de perceber seu caráter de novidade e não somente sua conformidade à norma. Em outros
termos, o receptor, pertencente à mesma comunidade lingüística, também considera a forma lingüística
utilizada como um signo variável e flexível e não como um sinal imutável e sempre idêntico a si
mesmo”.(BAKHTIN, 1992)
Nesse raciocínio, cultura é concebida como um processo dinâmico e conflituoso de
produção de significados sobre a realidade em que se dá em contextos sociais. Cultura, portanto,
não se refere a um “sistema estruturado e fixo de valores ou formas de comportamento [ou
sinônimo de erudição]: ela é um processo dinâmico de produção de sentidos possíveis,
aceitáveis, legítimos, mantido e reforçado tanto por coletividades (instituições sociais como
família, a religião, a escola) quanto por sujeitos” (JORDÃO, 2005, p. 3).
Entretanto, nos discursos presentes no intertexto da sociedade contemporânea, as
práticas de linguagem diferem entre si, uma vez que a língua envolve variantes sócio-
culturais, logo, as formas da língua variam de acordo com os usuários, o contexto em que
são usadas e a finalidade da interação. Para cada variante lingüística e cada grupo
cultural os valores sociais e culturais que lhes são atribuídos sofrem oscilações de
valores, de acordo com os diferentes contextos sócio-culturais e momentos históricos.
Dessa forma, a língua e a cultura são entendidas como variantes locais particularizadas
em contextos específicos e, portanto, configuram-se de forma heterogênea, complexa e
plural. (BORTONI-RICARDO, 2004).
Nesse sentido, a língua se apresenta como espaço de construções discursivas, de produção
de sentidos indissociável dos contextos em que ela adquire sua materialidade, inseparável das
comunidades interpretativas que a constróem e são construídas por ela. Desse modo, a língua deixa
de lado suas supostas neutralidade e transparência para adquirir uma carga ideológica intensa, e
passa a ser vista como um fenômeno carregado de significados culturalmente marcados.
Para Bakhtin (1988, 1992) as relações sociais ganham sentido pela palavra, sendo que a sua
existência só se concretiza no contexto real de sua enunciação. Por outro lado, os sentidos
assumidos pela palavra são múltiplos, não existindo, dessa forma, palavras vazias. Para este teórico,
“a palavra está sempre carregada de um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial. É
assim que compreendemos as palavras e somente reagimos àquelas que despertam em nós
39
ressonâncias ideológicas ou concernentes à vida” (BAKHTIN 1988, p.95). Com base nessas
considerações, Bakhtin (1988) afirma que a palavra é o fenômeno ideológico por excelência.
Nesse sentido, uma importante consideração é quanto ao valor social das línguas
existentes na sociedade. Conforme Bakhtin, “o papel organizador da palavra estrangeira –
palavra que transporta consigo forças e estruturas estrangeiras (...) – fez com que, na
consciência histórica dos povos, a palavra estrangeira se fundisse com a idéia de poder,
de força, de santidade, de verdade” (1999, p. 101). E é na e pela palavra que se percebe
as diferentes ideologias, condições sociais e hierarquias da vida social, possibilitando o
confronto de valores. Todo discurso está vinculado à história e ao mundo social e,
portanto, diretamente ligado às questões de poder, de verdade. Assim, os sujeitos, ao
engajarem-se em práticas discursivas, nas diferentes condições sócio-históricas que os
discursos e identidades são construídos, estarão posicionados em relações de poder,
determinados por ordens do discurso (FOUCAULT, 1971/1996).
Tendo em vista que os sujeitos se constituem no entrecruzamento dos vários
discursos a que estão expostos e que atuam no mundo por meio do discurso, eles são,
portanto, afetados pela ideologia e pela história para se constituírem e para produzirem
sentidos, construírem significados e identidades (ORLANDI, 1999).
Tal perspectiva nos remete a pensar em discurso e identidade e defini-los como elementos
socialmente construídos. A língua estrangeira pode ser propiciadora da construção das
identidades dos sujeitos alunos ao oportunizar o desenvolvimento da consciência sobre o papel
exercido pelas línguas estrangeiras na sociedade brasileira e no panorama internacional,
favorecendo ligações entre a comunidade local e planetária.
2.2 OBJETIVOS DA LE NA EDUCAÇÃO BÁSICA
Ao conceber que a língua, objeto de estudo da LE, contempla as relações com a
cultura, a ideologia, o sujeito e a identidade, tem-se clareza de suas implicações no
processo de ensino e de aprendizagem da disciplina. Nesta perspectiva, é fundamental
que os professores compreendam o que se pretende com o ensino da LE na Educação
Básica, ou seja: ensinar e aprender línguas é também ensinar e aprender percepções de
mundo e maneiras de construir sentidos, é formar subjetividades, independentemente do
grau de proficiência atingido. Deste modo, as aulas de LE configuram-se como espaços
nos quais identidades são construídas, pela forma como as interações entre professores e
40
alunos são organizadas, pelas representações e visões de mundo que vão sendo
reveladas no dia-a-dia. Deste modo, objetiva-se que os alunos possam analisar as
questões da nova ordem global, suas implicações e, acima de tudo, desenvolvam uma
consciência crítica a respeito do papel das línguas na sociedade.
Tal perspectiva pretende também, superar a idéia de que o objetivo de ensinar LE na
escola é apenas o lingüístico, ou ainda, que o modelo de ensino dos Institutos de Idiomas seja
parâmetro para se definir os objetivos de ensino de LE na Educação Básica. Essa aproximação
constitui-se num equívoco, considerando que o ensino de LE praticado pelas escolas de línguas
não tem necessariamente as mesmas preocupações educacionais a que a escola está voltada. De
forma geral, os objetivos de uma escola de idiomas estão mais direcionados para a proficiência
lingüístico-comunicativa em situações de viagens, negócios, preparação para testes etc. O
comentário de Gimenez, visa esclarecer melhor a situação que se apresenta.
Embora com características distintas, estes dois setores (público e privado3) têm sido equiparados na
avaliação de resultados, quando se espera, por exemplo, que os alunos sejam proficientes na habilidade
oral. Isto também se reflete nas expectativas de alunos e pais que freqüentemente consideram a
aprendizagem de uma LE como importante fator para uma empregabilidade futura e a atrelam à fala. A
importância da LE é tal que a mídia impressa tem se ocupado de abordá-la especialmente neste aspecto.
Essas mensagens penetram as paredes das escolas e obscurecem as razões para inclusão de língua
estrangeira no currículo (2004, p. 172).
Este contexto e suas implicações para o ensino de LE na escola justificam a
necessidade de retomar o que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
n.°9394/96 estabelece como objetivo da escolarização básica no art. 32, por meio do qual
institui ser o Ensino Fundamental voltado para a formação básica do cidadão. E, no
art.35, estabelece que o Ensino Médio terá a finalidade de consolidar e aprofundar os
conhecimentos adquiridos pelos alunos, com vistas ao prosseguimento de seus estudos.
Embora a aprendizagem de LE também possa servir como meio para progressão no
trabalho e estudos posteriores, como ressalta a mesma lei4, este componente curricular,
obrigatório a partir dos anos finais do Ensino Fundamental, deve também contribuir para a
3 O termo privado refere-se aos Institutos particulares de Línguas. 4 A educação básica tem por finalidades desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores. (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira Nacional nº. 9394/96, Art. 22. - grifo nosso).
41
constituição das identidades dos alunos sujeitos como agentes críticos e transformadores
ao longo da Educação Básica.
Nesse sentido, estas Diretrizes estão comprometidas com o resgate da função
social e educacional da LE na Educação Básica de modo a conciliar a apropriação dos
conhecimentos específicos da LE com uma compreensão crítica de sociedade, com vistas
à sua transformação, de forma a superar os fins utilitaristas, pragmáticos ou instrumentais
que historicamente têm marcado o ensino desta disciplina.
De acordo com a concepção de língua apregoada nestas Diretrizes entende-se que o
ensino de língua estrangeira deve oportunizar aos alunos a aprendizagem de conteúdos que
ampliem as possibilidades de ver o mundo, de avaliar os paradigmas já existentes e novas
maneiras de construir sentidos do e no mundo, considerando as relações que podem ser
estabelecidas entre a LE e: a inclusão social; o desenvolvimento da consciência do papel das
línguas na sociedade, o reconhecimento da diversidade cultural e o processo de construção das
identidades transformadoras, apresentadas a seguir.
As sociedades contemporâneas não podem sobreviver isoladas; é fundamental que se
relacionem, atravessem fronteiras geopolíticas e culturais, comuniquem-se e entendam-se
mutuamente. Possibilitar aos alunos que utilizem uma língua estrangeira em situações de
comunicação (produção e compreensão de textos verbais e não-verbais) é também inseri-los na
sociedade como participantes ativos, não limitados a suas comunidades locais, mas capazes de se
relacionar com outras comunidades e outros conhecimentos. Um dos objetivos da língua
estrangeira é proporcionar a todos os envolvidos no processo de ensino e de aprendizagem este
tipo de inclusão social, ou seja, fazer uso da língua que estão aprendendo em situações
significativas, isto é, reconhecidamente relevantes e não como mera prática de formas
lingüísticas descontextualizadas. O termo inclusão social aqui citado não se refere apenas à
educação inclusiva, mas à inclusão dos sujeitos numa sociedade reconhecidamente diversa e
complexa, através do comprometimento mútuo.
O aprendizado de uma língua estrangeira possibilita proporcionar a consciência
sobre o que seja língua e suas potencialidades na interação humana. Assim, os alunos ao
serem expostos às diversas manifestações da língua na sociedade, entendendo suas
implicações político-ideológicas e comparando os procedimentos de construção de
significados na língua materna e na língua estrangeira, têm a oportunidade de alargar
horizontes e expandir suas capacidades interpretativas e cognitivas. Com esse fim, é
necessário chamar a atenção para o modo como as possibilidades lingüísticas definem os
significados construídos nas interações sociais.
42
O aluno vem para a escola trazendo consigo determinadas leituras de mundo que
constituem sua cultura e como tal devem ser respeitadas. Dependendo da vivência dos
sujeitos escolares e das situações históricas (portanto políticas e sociais) em que eles se
encontram, diferentes tipos de interação são estabelecidas entre as várias culturas
presentes na escola, bem como entre as culturas construídas nas e pelas línguas
estrangeiras, e presentificadas na sala de aula.
Ao utilizar uma língua estrangeira na interação com outras culturas, os alunos terão
a oportunidade de refletir sobre a língua como um artefato cultural, como um produto que
constrói e é construído por determinada(s) comunidade(s) que reagem a determinados
acontecimentos com base em histórias e contextos específicos. Podem igualmente,
reconhecer as implicações da diversidade cultural construída lingüisticamente em
diferentes línguas, culturas e modos de pensar, compreendendo que os significados são
social e historicamente construídos e passíveis de transformação. Deste modo, os alunos
têm a possibilidade de constatar e vivenciar criticamente a diversidade cultural,
problematizando as tensões advindas destas diferenças, sem perder suas identidades
locais, embora elas sejam produtivamente transformadas por tal contato.
Concebendo-se a língua como discurso, conhecer e ser capaz de usar uma língua
estrangeira, permite aos sujeitos perceberem-se como parte integrante da sociedade e
como participantes ativos do mundo em que vivem. Dessa maneira, ao aprender uma
língua estrangeira, o aluno sujeito aprende também procedimentos de construção de
significados, ampliando as possibilidades de entendimento ao seu alcance. Além disso, é
a partir do confronto com a cultura do outro que ele é capaz de delinear um contorno para
a sua própria identidade. Assim, poderá atuar sobre os sentidos possíveis e reconstruir
sua identidade como agente social, partilhando das responsabilidades sobre os processos
de construção de conhecimentos e sentindo-se capaz de participar ativamente de uma
possível transformação do mundo em que vive.
2.3 LETRAMENTO CRÍTICO
Diante da necessidade de novos referenciais teórico-metodológicos que melhor atendam
às demandas da sociedade contemporânea brasileira e aos propósitos de ensino de LE
preconizados nessas Diretrizes, o Letramento Crítico apresenta-se como uma abordagem que
contribui para tais objetivos, na medida que se constitui numa ferramenta poderosa para
desenvolver uma consciência crítica dos propósitos sociais e dos interesses aos quais os mesmos
43
servem, considerando que a língua é também é poderosa como prática social (BAYNHAM,
1995). Entende-se por abordagem de ensino os pressupostos teóricos acerca das concepções de
linguagem e aprendizagem, os quais orientam a prática pedagógica, sem necessariamente definir
métodos e/ou metodologias de ensino e aprendizagem a partir de tais referenciais (SILVEIRA,
id.).
O Letramento Crítico envolve a análise e a crítica das relações estabelecidas entre texto,
língua, poder, grupos sociais e práticas sociais. Refere-se às formas de olhar o texto escrito,
visual, oral e hipertexto para questionar e desafiar as atitudes, os valores e as crenças subjacentes
a ele. Tomando-se por base os trabalhos de Gee, o letramento crítico oferece a possibilidade de
confrontar discursos e perceber como os discursos posicionam os sujeitos em relações de poder
intra e interdiscursivas (apud BRAHIM, 2005).
Portanto, o Letramento Crítico é uma concepção mais inclusiva de leitura e escrita porque requer
uma compreensão de que tais habilidades são influenciadas uma pela outra, bem como pela
oralidade, ou seja, diz respeito aos usos heterogêneos de língua como prática sócio-cultural, nas
quais formas de leitura, escrita e oralidade interagem entre si.
Esta abordagem refere-se às estratégias de compreensão, discussão, organização e produção de
textos, bem como ao contexto social no qual o discurso é produzido e nos papéis que os leitores e
escritores de textos exercem e seus respectivos grupos sociais. Analogamente, ele envolve tanto
o processo de aprendizagem quanto o produto; o estilo tanto quanto as atitudes; não apenas a
forma mas também o conteúdo; os papéis, bem como os propósitos dos leitores e dos escritores.
O Letramento Crítico é concretizado por meio do engajamento crítico com e através
dos textos e da prática social crítica. Tendo em vista que texto e leitura são dois
elementos indissociáveis, e que um não se realiza se não existir o outro, é importante que
seja definido o que se entende por estes dois termos.
O texto, entendido como uma unidade de sentido, no qual todos os elementos
entrelaçados, interligados vão constituir a unidade de sentidos, pode ser oral, escrito, verbal e
não-verbal. Nessa definição, uma figura, um gesto, um slogan, tanto quanto um trecho de fala
gravado em áudio ou uma frase em linguagem verbal escrita, podem ser considerados textos, a
partir dos quais os conteúdos específicos de LE serão tratados.
O texto, que segundo Bakhtin (1992) corresponde a enunciado, é entendido como unidade
contextualizada da comunicação verbal.
44
As pessoas não trocam orações assim como não trocam palavras (numa acepção rigorosamente lingüística), ou combinações de palavras, trocam enunciados constituídos com a ajuda das unidades da língua – palavras, conjunto de palavras, orações; mesmo assim, nada impede que o enunciado seja constituído de uma única oração, ou de uma única palavra por assim dizer, de uma unidade de fala (o que acontece sobretudo na réplica do diálogo). Mas não é isso que converterá uma unidade da língua numa unidade da comunicação verbal. (BAKHTIN, 1992,p.297)
O enunciado, embora necessite do aparato técnico da oração, não corresponde aos aspectos
sistêmicos da língua, ele se organiza em formas relativamente estáveis, determinadas pelas
condições materiais de produção, que são denominados por Bakhtin (id.) de gêneros do discurso.
Para este teórico os gêneros se desenvolveram ao longo do tempo e correspondem a formas típicas
criadas por esferas de atividades humanas.
A riqueza e a variedade dos gêneros do discurso são infinitas, pois a variedade virtual da atividade humana é inesgotável, e a cada esfera dessa atividade comporta um repertório de gêneros do discurso que vai diferenciando-se e ampliando-se à medida que a própria esfera se desenvolve e fica mais complexa.(BAKHTIN, 2000)
Cumpre destacar que os tipos de textos aos quais a sociedade está exposta são de
natureza genérica. Conforme aponta Moita Lopes (2004, p. 30-31), vivemos num mundo
multisemiótico, cujos textos extrapolam a letra, ou seja, “um mundo de cores, sons, imagens e
design que constroem significados em textos orais/escritos e hipertextos”. Isso vem ao encontro
da linguagem específica usada na comunicação mediada pelo computador, que, aparentemente,
trata-se da linguagem escrita, mas quando desenvolvida em uma interação em tempo real,
distancia-se da forma tradicional, adquirindo características semelhantes às do imediatismo e
redundância da fala, bem como é acrescida de ícones, cores, recursos sonoros, por exemplo, para
comunicar aspectos que estariam presentes na fala. Conforme o exposto, as diferenças entre
comunicação escrita e falada se diluem na construção desse novo tipo de texto.
A concepção discursiva de língua não a segmenta em habilidades: ler, falar,
escrever, ouvir, considerando que essas práticas não se separam em situações concretas
de comunicação e, logicamente, naquelas efetivadas na sala de aula. Todavia, essas
práticas no ensino de LE ao longo da história não foram tratadas de forma integrada em
função das concepções de língua nas quais se pautavam, sendo privilegiada ora uma, ora
outras habilidades em detrimento às demais. Daí o conceito tradicional das “quatro
habilidades” isoladas que pressupõe uma visão de linguagem como totalidade
homogênea. Entende-se que a escolha de textos e atividades no trabalho pedagógico,
45
ocasionalmente privilegiará uma ou mais habilidades, mas tais ações acabarão por
vincular uma habilidade a outra (s), de forma mais marcada (ou menos) dependendo das
demandas do contexto.
É preciso também atentar, para o fato de que os sentidos legitimados, reconhecidos como
válidos por determinada comunidade, são atribuídos aos textos, considerando-se sempre o
contexto e o momento histórico em que eles foram produzidos: uma construção à qual não se
considere possível atribuir sentidos não será vista como texto por uma determinada comunidade.
Nessa visão, é importante que os alunos sujeitos tenham consciência de que há
várias formas de produção e circulação de textos em nossa cultura e em outras, de que
existem diferentes práticas de linguagem dentro de cada cultura, e que essas práticas são
valorizadas também de formas diferentes nas distintas sociedades.
A leitura, processo de atribuição de sentidos aos textos, estabelece diferentes
relações entre o sujeito e o texto de acordo com as concepções de texto e sujeito em que
se apóie. O trabalho com a leitura proposto nessas Diretrizes está basicamente ancorado
na perspectiva de uma leitura crítica a qual efetiva-se no confronto de perspectivas e na
(re)construção de atitudes diante do mundo.
Nesse sentido, supera-se uma visão de leitura tradicional, unicamente como
extração de informação de determinada unidade de sentido, ou ainda, com ênfase no
leitor e na atribuição de significados. Numa abordagem de leitura crítica, o trabalho com a
leitura extrapola a relação entre o leitor e as unidades de sentido na construção dos
significados possíveis, priorizando, em conseqüência, a relação que se estabelece com os
outros sujeitos que atribuem sentidos, porém ampliando a percepção do sujeito leitor, que
é capaz de criar significados e ao mesmo tempo é limitado pelos procedimentos
interpretativos das várias comunidades nas quais atua.
Nesta perspectiva, há confronto entre autor, texto e leitor. O leitor abandona uma
atitude de passividade diante do texto e passa a ser participante do processo de
construção de sentidos. Entretanto, ele não está sozinho ao construir os sentidos, com
ele estão suas culturas, sua língua, seus procedimentos interpretativos, os discursos
construídos coletivamente em sua comunidade, as ideologias. A leitura é considerada,
então, como interação entre todos estes elementos e ocorre na relação entre o leitor, o
texto e o autor; entre o leitor e outros leitores; entre o leitor e suas experiências, seu
conhecimento de mundo e seu conhecimento lingüístico, todos influenciando diretamente
as interpretações de um texto consideradas possíveis.
46
A abordagem de leitura crítica como processo discursivo, entendida enquanto construção
de sentidos a partir de unidades de sentido culturalmente produzidas, converge com a visão pós-
estruturalista de língua adotada nessas Diretrizes, bem como com a abordagem interacionista de
leitura ao preconizar que o sujeito desempenha um papel ativo na compreensão do mundo e,
conseqüentemente, dos textos que ele identifica como unidades de sentido. Assim, os sujeitos
leitores têm a possibilidade de estabelecer relações entre os diversos elementos envolvidos no
processo de construção de sentidos (como por exemplo cultura, língua, procedimentos
interpretativos, contextos, ideologias), percebendo-se inserido na prática social do uso da
linguagem, a fim de construir as leituras possíveis de um texto.
Esta concepção de leitura crítica está estritamente relacionada à prática da
abordagem por Letramento Crítico, uma vez que sua ênfase recai sobre a necessidade de
que os sujeitos interajam ativamente com o discurso, sendo capazes de comunicar-se
com e em diferentes formas discursivas materializadas em diferentes tipos de texto.
Diante disso, essa abordagem postula que é preciso desenvolver a capacidade crítica
diante da imensa quantidade de informações das quais a sociedade está exposta em seu
cotidiano, a fim de que além de atribuir sentido a essas informações, possam participar
dos processos sociais de construção de linguagem e de seus sentidos legitimados.
Assim, propõe-se ensinar, na aula de LE, não apenas uma língua, mas os discursos que a
compõem dentro de uma sociedade, ou seja, os discursos, manifestados em formas de textos de
diferentes naturezas (BAKHTIN,1988). Com base nesses pressupostos, cabe salientar que se
trata de fazer da aula de língua estrangeira um espaço de
acesso a diversos discursos que circulam globalmente, para construir outros discursos alternativos que possam colaborar na luta política contra a hegemonia, pela diversidade, pela multiplicidade da experiência humana, e ao mesmo tempo, colaborar na inclusão de grande parte dos brasileiros que estão excluídos dos tipos de [....] [conhecimentos necessários] para a vida contemporânea, estando entre eles os conhecimentos [em língua estrangeira] (MOITA LOPES, 2003, p. 43).
Significa, portanto, desenvolver com os alunos sujeitos maneiras de construção de
sentidos, de relação com os textos, não simplesmente para extrair deles significados que
supostamente estariam latentes em sua estrutura, mas para comunicar-se com eles, para
conferir a eles sentidos e travar com eles batalhas pela significação; é oportunizar aos
alunos sujeitos maneiras de perceber a língua como “arena de conflitos” (Bakhtin, 1992) e
o uso da linguagem como prática social e cultural contextualizada e heterogênea. O
trabalho com a LE, então, fundamenta-se nesta diversidade de tipos textuais e busca
alargar a compreensão dos diversos usos da linguagem e a ativação de procedimentos
47
interpretativos alternativos no processo de construção de significados possíveis.
Assim, ao ensinar e aprender uma LE, sob o viés da abordagem por Letramento Crítico,
os alunos e professores percebem que é possível construir significados além daqueles permitidos
pela língua materna. Desse modo, os sujeitos envolvidos no processo de ensino e de
aprendizagem não aprendem apenas novos significados e nem a reproduzi-los, mas sim
aprendem outras maneiras de produzir sentidos, outros procedimentos interpretativos que
alargam suas possibilidades de entendimento do mundo. Sentido, na acepção de Orlandi, é “uma
relação determinada do sujeito – afetado pela língua – com a história. É o gesto de interpretação
que realiza essa relação do sujeito com a língua, com a história, com os sentidos. Esta é a marca
da subjetivação e, ao mesmo tempo, o traço da relação da língua com a exterioridade: não há
discurso sem sujeito” (1999/2005, p.47).
Portanto, é na língua, e não através dela, que se percebe e entende a realidade e,
conseqüentemente, a percepção do mundo está intimamente ligada às línguas que se
conhece. Jordão diz a esse respeito que
... [ao] aprender uma língua estrangeira [...] eu adquiro procedimentos de construção de significados diferentes
daqueles disponíveis na minha língua (e cultura) materna; eu aprendo que há outros dispositivos, além
daqueles que me apresenta a língua materna, para construir sentidos, que há outras possibilidades de
construção do mundo diferentes daquelas a que o conhecimento de uma única língua me possibilitaria. Nessa
perspectiva, quantas mais [...] línguas estrangeiras eu souber, potencialmente maiores serão minhas
possibilidades de construir sentidos, entender o mundo e transformá-lo (2004a, p.164).
Tendo como referência o Letramento Crítico, o objeto de estudo da LE e os objetivos de
ensino desta disciplina, serão apresentados a seguir os conteúdos estruturantes, a partir dos quais
serão identificados os conteúdos específicos da disciplina, bem como a explicitação de
orientações relativas ao encaminhamento metodológico coerente com a concepção de ensino de
LE defendido neste documento de diretrizes.
III CONTEÚDO ESTRUTURANTE
Com base no exposto e na concepção de língua defendida nestas Diretrizes serão
estabelecidos a seguir os conhecimentos que identificam e organizam os campos de estudos desta
disciplina escolar, os quais são considerados basilares e fundamentais para a compreensão do
objeto de estudo. Esses saberes são concebidos como Conteúdos Estruturantes, uma vez que
48
deles derivam os conteúdos específicos que fazem parte do trabalho pedagógico na relação de
ensino e de aprendizagem. Os mesmos constituem-se historicamente e são legitimados
socialmente e por isso, não têm sido sempre os mesmos.
Assim, tomando a língua como interação verbal, enquanto espaço de produção de
sentidos marcado por relações contextuais de poder, o Conteúdo Estruturante será aquele que a
traz de forma dinâmica – o discurso enquanto prática social - efetivado por meio das práticas
discursivas, as quais envolvem a leitura, a oralidade e a escrita.
Desta forma, para que os alunos sujeitos percebam a interdiscursividade nas diferentes
relações sociais, ou seja, as condições de produção dos diferentes discursos, as diferentes vozes
que permeiam as relações sociais e as relações de poder que as entremeiam para agir no mundo
social, é preciso que os níveis de organização lingüística (fonético-fonológico, léxico-semântico
e de sintaxe) sirvam ao uso da linguagem na compreensão e na produção escrita, oral, verbal e
não-verbal.
Assim, a linguagem do texto passa a ser a materialidade para alcançar tal fim, ou
seja, o trabalho em sala de aula precisa partir de um texto de linguagem num contexto em
uso, tendo em vista que o objetivo do trabalho em sala de aula é a construção do
significado por meio do engajamento discursivo e não meramente a prática de estruturas
lingüísticas. E, com o foco na abordagem crítica de leitura, a ênfase do trabalho
pedagógico recai sobre a necessidade dos sujeitos interagirem ativamente com o
discurso, sendo capazes de comunicar-se com e em diferentes formas discursivas
materializadas em diferentes tipos de texto.
Portanto, os conteúdos específicos a serem desdobrados a partir do Conteúdo Estruturante
serão estabelecidos com referência aos textos de diferentes tipos, contemplando seus elementos
lingüístico-discursivos: unidades lingüísticas que se configuram como as unidades de linguagem
que compõem o texto, derivadas da posição que o locutor exerce no enunciado; temáticas, as
quais referem-se ao que pode tornar-se dizível por meio de um gênero e composicionais,
compreendidas como a estrutura específica dos textos pertencentes a um gênero.
Diante da dificuldade de estabelecer conteúdos por série, nessas Diretrizes,
considerando a diversidade de textos em circulação na sociedade e a especificidade do
tratamento da língua estrangeira na prática pedagógica, com base no exposto, cumpre
tecer algumas considerações a fim de estabelecer critérios norteadores a serem
observados na definição dos conteúdos específicos, por série, para o ensino de LE na
Educação Básica na escola.
49
Inicialmente, é preciso levar em conta o princípio da continuidade, ou seja, a manutenção
de uma progressão entre as séries considerando as especificidades da língua estrangeira ofertada,
as condições de trabalho existentes na escola, o projeto político-pedagógico, a articulação com as
demais disciplinas do currículo e o perfil dos alunos.
A partir dessas considerações, caberá ao professor selecionar um conjunto de textos para
o trabalho em sala de aula, tendo como referência os fundamentos teórico-metodológicos da
disciplina, bem como os objetivos do ensino de LE, de modo que o aluno:
- seja capaz de usar a língua em situações de comunicação oral e escrita;
- vivencie, na aula de língua estrangeira, formas de participação que lhe possibilite estabelecer
relações entre ações individuais e coletivas;
- compreenda que os significados são sociais e historicamente construídos e, portanto, passíveis
de transformação na prática social;
- tenha maior consciência sobre o papel das línguas na sociedade;
- reconheça e compreenda a diversidade lingüística e cultural, bem como seus benefícios para o
desenvolvimento cultural do país.
Cumpre destacar que tais objetivos são suficientemente flexíveis para contemplar as
diferenças regionais, mas ainda assim específicos o bastante para apontar um norte e permitir um
direcionamento comum na seleção de conteúdos específicos por série por ocasião do
planejamento.
No ato da seleção de textos, propõe-se analisar os elementos lingüístico-discursivos neles
presentes, mas de forma que não seja levado em conta apenas objetivos de natureza lingüística,
mas principalmente fins educativos, na medida que apresentem possibilidades de tratamento em
sala de aula de assuntos polêmicos, adequados à faixa etária e que contemplem os interesses dos
alunos. É importante também que os textos abordem os diversos tipos textuais e que apresentem
diferentes graus de complexidade da estrutura lingüística.
Recomenda-se que seja dada aos alunos a oportunidade para participar ativamente da
escolha das temáticas dos textos, uma vez que um dos objetivos é justamente possibilitar formas
de participação que permitam o estabelecimento de relações entre ações individuais e coletivas.
Por meio desta experiência, os alunos poderão compreender a vinculação entre auto-interesse e
interesses do grupo. Além disto, esta iniciativa poderá levar a escolhas de conteúdos mais
significativos porque resultam da participação dos alunos.
Um outro ponto a ser destacado é a atenção, no momento da escolha de textos, para que
os mesmos não reforcem uma visão monolítica de cultura, muitas vezes abordada de forma
50
estereotipada. Além disso, as características dos textos precisam estar de acordo com a análise
da viabilidade de resultados factíveis e realistas a serem alcançados nas diferentes séries, de
acordo com os objetivos específicos delineados. Assim, os conteúdos poderão dar aos alunos
indicativos para perceber os avanços nos estudos, na medida em que forem baseados no
planejamento estabelecido entre professores ao longo do ano.
As considerações apontadas acima permitem a construção de um diagrama visando
ilustrar a abordagem de ensino de LE proposta, articulando o Conteúdo Estruturante – o discurso
– aos conteúdos específicos para esta disciplina. Tendo em vista que esses conteúdos são
indissociáveis no todo do texto, eles precisarão ser tratados na prática pedagógica de forma
articulada entre si.
A proposta apresentada no diagrama tem como referencial básico o discurso, que envolve
o texto e suas condições de produção – o contexto sócio-histórico-ideológico no qual foi
TEXTO
INTRADISCURSO (PARTE INTEGRANTE DO
TEXTO)
ELEMENTOS LINGÜÍSTICO-DISCURSIVOS
INTERDISCURSO (ENTORNO DO
TEXTO)
CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO
PRODUÇÃO DE SENTIDOS ENTRE INTERLOCUTORES
LEITURA ORALIDADE ESCRITA
51
produzido. As noções de intradiscurso e o interdiscurso, juntamente com as condições de
produção do texto, são elementos facilitadores para a organização curricular.
Cumpre ressaltar que a organização de conteúdos específicos baseados apenas
em itens gramaticais não é recomendável, já que contraria a visão de língua em contexto.
Isto não significa excluir a gramática da sala de aula. Ela estará subordinada aos usos
que se faz da LE, ou seja, as formas lingüísticas serão tratadas de modo contextualizado.
IV ENCAMINHAMENTO METODOLÓGICO
Diante da abordagem de ensino por Letramento Crítico, o qual implica em engajar
os alunos sujeitos em atividades críticas e problematizadoras, que se concretizam por
meio da língua como prática social, o trabalho com a língua estrangeira em sala de aula
precisa partir do entendimento do papel das línguas nas sociedades como mais do que
meros instrumentos de acesso à informação: as línguas estrangeiras são também
possibilidades de conhecer, expressar e transformar modos de entender o mundo e de
construir significados.
O texto apresenta-se como um espaço para a discussão de temáticas
fundamentais para o desenvolvimento intercultural, manifestados por um pensar e agir
críticos, por uma prática cidadã imbuída de respeito às diferentes culturas, crenças e
valores. Possibilita-se, deste modo, a capacidade de analisar e refletir sobre os
fenômenos lingüísticos e culturais como realizações discursivas, as quais se revelam
na/pela história dos sujeitos que fazem parte deste processo. O texto, nesta proposta,
apresenta-se como um princípio gerador de unidades temáticas e de desenvolvimento
das práticas lingüístico-discursivas.
Para tanto, é importante trabalhar a partir de temas referentes a questões sociais emergentes,
tarefa que se encaixa perfeitamente nas atribuições da língua estrangeira, disciplina que se presta
à utilização de textos abordando assuntos relevantes presentes na mídia nacional e internacional
ou no mundo editorial. No entanto, torna-se fundamental superar a visão de que apenas a
presença, em aula, de textos com assuntos pertinentes a questões como saúde, meio ambiente,
vida familiar e social, por exemplo, seja suficiente para o desenvolvimento dessa consciência
cidadã.
É preciso considerar que o trabalho com textos em contexto de uso, isto é, autênticos,
sem uma mudança metodológica não é capaz de suscitar a consciência crítica da língua, nem
tampouco promover a construção dos significados (ou engajamento discursivo) nas práticas
52
sócio-culturais. Conforme Coracini, “a criticidade nada tem a ver com o tipo de texto, mas com a
atitude problematizadora daquele que lê e que se envolve” (2003, p. 280). Trata-se, portanto, de
abordar o uso da língua estrangeira como espaço de construção de significados dependentes da
situação de uso, dos propósitos dos interlocutores e dos recursos lingüísticos de que dispõem.
Isto significa, dentre outras coisas, pensar que o falante/escritor tem papel ativo na construção do
significado da interação, assim como seu interlocutor.
Nesse sentido, as reflexões discursivas e ideológicas dependem de uma interação
primeira com o texto. Isto não representa privilegiar a prática da leitura em detrimento às demais
no trabalho em sala de aula, visto que na interação com o texto, pode haver uma complexa
mistura da linguagem escrita, visual e oral como na seguinte situação: o professor lê o texto em
voz alta, apontando ora para imagens ou ilustrações, ora para palavras escritas na página, não
apenas narrando ou contando uma história, mas realizando perguntas aos alunos. Assim, na aula
de língua estrangeira será possível fazer discussões orais sobre sua compreensão, bem como
produzir textos orais, escritos e/ou visuais a partir do texto lido, integrando todas as práticas
discursivas neste processo.
Daí a importância da utilização de recursos visuais para auxiliar o trabalho pedagógico
em sala de aula. Tais materiais podem auxiliar na preparação da leitura, na medida que auxiliam
os alunos no processo de inferência sobre o tema e sentidos dos textos. Neste caso, os alunos
com deficiência auditiva, terão possibilidades de participar da aula, na medida que elas se
configuram como espaços nos quais os diversos sentidos são mobilizados para a aprendizagem
de língua: visuais, orais, cognitivos. Para maior detalhamento das especificidades de ensino para
alunos surdos, verificar as Diretrizes específicas para a Educação Especial.
A inferência é um processo cognitivo relevante nesta abordagem de leitura
discursiva, na medida que o processo inferencial possibilita a construção de novos
conhecimentos, a partir daqueles existentes na memória do leitor, os quais são ativados e
relacionados às informações materializadas no texto.
A base do Letramento Crítico é o questionamento visando identificar como algo funciona
através de uma atividade problematizadora, a qual se concretiza por meio da língua enquanto
prática social. Os alunos, nesta abordagem, são encorajados a ter uma postura crítica frente aos
textos, envolvendo questionamentos acerca das visões de mundo que os subjazem, tais como:
Que pressupostos estão por traz de tal discurso? Qual é o seu propósito? Aos interesses de quem
serve? Como o autor compreende a realidade? Quais as implicações de sua postura/afirmação?
Percebe-se que tais questionamentos superam as perguntas comuns de uma abordagem de leitura
tradicional cujas questões centralizam-se na compreensão do conteúdo do texto, quais sejam:
53
Quem é o autor? O que ele disse? Ou ainda, de questões meramente com foco nas intenções do
autor: Para quem é destinado o texto? Qual é a intenção do autor? O que o autor está tentando
dizer e como ele o faz? Por que o texto é escrito desta forma?
Reconhece-se, porém, que o desconhecimento lingüístico pode dificultar essa interação
com o texto, impossibilitando a crítica (Busnardo & Braga, 2000). No entanto, o conhecimento
lingüístico, ainda que condição necessária, não é suficiente para chegar à compreensão,
considerando que o leitor precisa executar um processo ativo de construção de sentidos,
relacionando a informação nova ao conhecimento adquirido ao longo da vida: o conhecimento
discursivo da sua língua materna, da sua história, de outras leituras utilizadas ao longo de sua
vida (Vygotsky, 1989).
A ativação dos procedimentos interpretativos da língua materna, a percepção das
diferentes formações discursivas intra e inter línguas, a mobilização do conhecimento de
mundo e da capacidade de abstração e reflexão dos alunos são alguns dos elementos
que podem permitir a interpretação de grande parte dos sentidos produzidos no contato
com textos. Desse modo, não é preciso que o professor, nem o aluno, entendam os
significados de cada palavra ou estrutura do texto para que produzam sentidos com ele; o
estudo gramatical por si só não garante que os textos sejam interpretados de acordo com
as expectativas do professor. A leitura é um processo de negociação de sentidos, de
contestação de significações possíveis – como num embate, leituras consensuais
dependem do uso de estratégias acordadas entre as partes. Assim, o papel da gramática
relaciona-se ao entendimento, quando necessário, dos procedimentos para construção de
significados utilizados na língua estrangeira: o trabalho com a gramática, portanto,
estabelece-se como importante na medida em que permite o entendimento dos
significados possíveis das estruturas apresentadas.
Assim, o professor precisa criar estratégias para que os sujeitos alunos percebam a
heterogeneidade da língua, cujos sentidos possíveis atribuíveis, muitas vezes, poderão
distanciar-se daqueles permitidos pelo texto e das condições nas quais ele foi produzido.
Nesse caso, pode-se dizer que um texto apresenta várias possibilidades de leitura, não
trazendo em si um sentido preestabelecido pelo seu autor, mas sim uma demarcação
para os sentidos possíveis, restringidas pelas suas condições de produção e, por isso,
constrói-se a cada leitura: não é o texto que determina a sua interpretação, mas sim o
sujeito com sua constituição histórica. Logo, os textos não têm sentido em si mesmos até
que sejam interpretados, sendo o seu significado modificado com as várias leituras pelo
leitor realizadas.
54
Desse modo, na medida que os alunos sujeitos reconheçam que os textos são representações da
realidade e que tais representações são construções sociais, eles terão maior oportunidade de
assumir uma posição mais crítica em relação a tais textos. Eles poderão rejeitá-los ou reconstruí-
los, a partir de seus universos de sentidos, os quais lhes atribuem coerência através da
negociação de significados.
Para alcançar tal fim, pode ser interessante trabalhar com textos que apresentem um
grande número de palavras transparentes, principalmente para turmas iniciantes. Isto pode
auxiliar o aluno a perceber que é possível ler um texto em língua estrangeira sem muito
conhecimento da língua. No entanto, é preciso conscientizar os alunos da complexidade do ato
de ler e que o texto não é portador de um significado único e fechado em si mesmo.
Uma proposta interessante no auxílio da conscientização da linguagem é
apresentar um texto com cognatos e termos transparentes e outro no qual os
conhecimentos de língua materna não favoreçam a sua compreensão imediata. A
pesquisa de palavras no dicionário também pode auxiliar essa conscientização, na
medida que os alunos percebam os possíveis sentidos apresentados para tais palavras,
mas que ainda assim, são limitados, podendo ser produzidos outros adequados a
determinados contextos, e, principalmente, que os sentidos não são únicos e dados
unilateralmente, mas construídos na interação verbal.
Uma outra sugestão, no sentido de promover a consciência lingüística, é após a
leitura de um texto com frases complexas, oferecer aos alunos uma lista de frases e suas
respectivas traduções e pedir que observem como as duas línguas se diferem nos dois
idiomas. Esse é um dos exemplos de estudo da gramática implícita, embora a visão de
língua assumida neste documento, não preconize a necessidade do domínio total das
regras gramaticais como pressuposto para leitura de textos, ainda que tais conhecimentos
possam ser explicitados aos alunos (CORACINI, 2003).
No Ensino Fundamental, os objetivos com foco no desenvolvimento da consciência
lingüística e cultural exigirão o uso da língua materna para sua realização, ainda que isto
possa diminuir a exposição do aluno à língua estrangeira.
Caberá assim, ao professor, trabalhar o texto em seu contexto social de produção
e dele selecionar itens gramaticais que indiquem a estruturação da língua. Isto não quer
dizer fazer uso do texto apenas para ensinar gramática, mas tê-lo como conteúdo a ser
explorado para, a partir dele, produzir outros textos. Numa perspectiva discursiva, o
conhecimento formal da gramática deve estar subordinado ao conhecimento discursivo,
ou seja, reflexões gramaticais devem ser decorrentes de necessidades específicas dos
55
alunos, a fim de que possam expressar-se ou construir sentidos com os textos.
Destaca-se, assim, a necessidade dos professores nas aulas de línguas
estrangeiras explorarem com seus alunos os diversos tipos de textos, comparando: as
unidades temáticas, lingüísticas e composicionais de um texto com outros textos e
construindo a sua estrutura a partir das reflexões da sala de aula; textos de países que
falam o mesmo idioma estudado na escola e observar aspectos culturais que ambos
veiculam; textos publicados nacional e internacionalmente sobre um mesmo tema e
observar as abordagens de tais publicações e, ainda, as estruturas fonéticas, sintáticas e
morfológicas da língua estrangeira estudada com a da língua materna.
O professor, portanto, no trabalho com textos concebidos como unidades de
sentido, precisa valorizar o conhecimento de mundo e as experiências dos alunos, por
meio de discussões referentes aos temas abordados, explorando pressupostos,
formulando hipóteses com eles e estabelecendo situações que os ajudem não apenas a
construir expectativas relativas aos sentidos possíveis de relação com os textos
estudados, mas que também possam subsidiá-los a posicionar-se em relação a esses
sentidos e desenvolver seus próprios sentidos conscientes dos diferentes contextos que
os perpassam. Deste modo, o professor desempenha um papel fundamental no processo
de leitura, já que é através da forma como conduz o trabalho em sala de aula que os
significados poderão ser mais (ou menos) problematizados, ou as possibilidades de
construção de sentidos percebidas como mais (ou menos) significativas, como espaços
para exercício de agência (agir no mundo social) ou submissão aos sentidos dos outros.
Faz-se importante destacar que o trabalho com a produção de textos na aula de LE
também precisa ser concebido como um processo dialógico ininterrupto, no qual escreve-
se sempre para alguém e de quem se constrói uma representação. Conforme Bakhtin
(apud Mussalin, 2004, p. 250), “um discurso nasce de outros discursos e se produz para
um outro sujeito, sendo que esse outro é construído imaginariamente pelo sujeito-autor”.
Assim, a prática escolar de produção escrita em LE, ainda que restrita a construção
de uma frase, a um parágrafo, a um poema ou a uma carta, precisa fazer desta produção
uma atividade menos artificial possível: buscar leitores efetivos dentro ou fora da escola,
ou seja, elaborar pequenos textos direcionados a um público determinado.
Fica claro que a reflexão crítica ou ideológica diante dos discursos que circulam em
LE só é possível mediante o contato com textos, por meio da leitura. Do mesmo modo, a
produção de um texto, uma ‘contra-palavra’, é construído sempre a partir do contato com
outros textos. Tais textos servirão de apoio, ampliando sempre as possibilidades de
expressão dos alunos.
56
Nesse sentido, o aluno, agente ativo do processo de ensino e aprendizagem, deve
ser instigado pelo professor a buscar respostas e soluções aos seus questionamentos,
necessidades e anseios relacionados à aprendizagem. A aula de língua estrangeira
nessa perspectiva tem por objetivo oportunizar o domínio dos procedimentos de construção de sentidos aceitos pela língua e cultura maternas, através da comparação entre os sistemas de significação da língua materna e da língua estrangeira, por exemplo, mas ao mesmo tempo apresentar, e enfatizando, a possibilidade de transformação destes procedimentos usados para nomear o mundo, como diria Freire (JORDÃO, 2004a).
Passa a ser função deste componente curricular, então, possibilitar aos alunos o
conhecimento dos valores estabelecidos nas e pelas comunidades de que querem participar, bem
como os procedimentos adotados para tal valoração e o domínio das formas de construção de
significados aceitos pelas comunidades em que transitam. Entretanto, ao mesmo tempo, caberá ao
professor propiciar aos alunos situações de aprendizagem que favoreçam o desenvolvimento de um
olhar crítico que reflita sobre essas mesmas comunidades, fomentando a transformação e não
apenas o alargamento, dos procedimentos utilizados para a produção de sentidos.
Um último ponto a ser considerado refere-se às maneiras com que as diferenças e
semelhanças entre diferentes línguas/culturas. serão exploradas em sala de aula. Numa
visão diferente da tradicional, na qual o aluno de LE deve conhecer e entender a cultura
do outro para ter um bom desempenho ao usar a língua, a abordagem intercultural
apresenta-se incluindo reflexões sobre a cultura nativa e a cultura-alvo, da mesma forma
que se refere à língua nativa e língua-alvo. Nesta abordagem, a apresentação de fatos
culturais e comportamentos é substituída pelo ensino de um processo que se aplica ao
entendimento do que seja ser estrangeiro ou “o outro”. Ensina-se cultura como diferença,
salientando que em cada cultura há variedade de fatores relacionados à idade, gênero,
origem regional, background étnico, classe social etc (GIMENEZ, 2006).
Com base no exposto, torna-se importante tecer algumas considerações sobre o livro didático, material que tem assumido uma posição central na definição de conteúdos e metodologia nas aulas de LE no contexto educacional paranaense5. Como já mencionado anteriormente, as concepções de ensino e língua subjacentes às atividades dos livros didáticos tendem a se fundamentar em grande parte na Abordagem Comunicativa. Corroborando as reflexões concernentes a tal abordagem, presentes neste documento, Pereira (2004, p. 199) afirma que “embora as mudanças ocorridas nos livros didáticos a partir do advento da abordagem comunicativa tenham representado um enriquecimento lingüístico e sociocultural em relação aos LDs de abordagem formalista, os mesmos continuam sendo criticados pelo tratamento elementar, fragmentado e descontextualizado com que apresentam a língua, a sociedade, a cultura-alvo e outras culturas.”
Por outro lado, é sabido que grande parte dos professores sente a necessidade de
adoção de livro didático em função de seus efeitos, proporcionando previsibilidade,
homogeneidade, facilidade para planejamento de aulas, acesso a textos, figuras, etc.
Suas vantagens também são percebidas em relação aos alunos, que podem dispor de
5 Conforme diagnóstico já mencionado, realizado junto aos professores que atuam na Rede Pública do Estado do Paraná.
57
material para estudos, consulta, exercícios, enfim acompanhar de modo mais efetivo as
atividades planejadas.
Assim, descortinar os valores subjacentes ao livro didático faz parte do papel do professor na abordagem de ensino como Letramento Crítico. Será preciso utilizar o material didático disponível na prática pedagógica, livro didático, dicionários, livros paradidáticos, vídeos, DVDs, fitas de áudio, CD-ROMs, Internet etc, sob a ótica do seu público e das propostas destas Diretrizes. Cumpre descartar que a elaboração local de materiais didáticos, pautado nas propostas dessas Diretrizes, poderá permitir a flexibilidade para incorporação de especificidades e interesses dos alunos, bem como contemplar a diversidade regional.
Por fim, entende-se que ao tratar os conteúdos de língua estrangeira na perspectiva do Letramento Crítico, o professor proporcionará ao aluno pertencente a uma determinada cultura ir ao encontro de outras línguas e culturas. Desse encontro, espera-se que possa surgir a consciência do lugar que se ocupa no mundo, extrapolando assim o domínio lingüístico que o aluno possa vir a ter.
58
Anexo 2: 2 FUNDAMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS
A fim de justificar a concepção teórico-metodológica destas Diretrizes, pretende-se
problematizar o ensino da Língua Estrangeira a partir da análise do diagnóstico realizado junto
aos professores da Rede Pública do Estado do Paraná 2.
Ao explicitarem aspectos relativos ao ensino da Língua Estrangeira no que se refere a
suas práticas e objetivos atribuídos à disciplina, identificou-se que a abordagem comunicativa tem
orientado o trabalho em sala de aula. Esta opção favorece o uso da língua pelos alunos, mesmo
de forma limitada, e evidencia uma perspectiva utilitarista de ensino, na qual a língua é concebida
como um sistema para a expressão do significado, num contexto interativo.
No entanto, os professores explicitaram também o reconhecimento dos limites de tal
abordagem ao pretenderem ampliar o papel deste componente curricular na formação integral dos
alunos. Trata-se de uma situação que exige a busca de fundamentos teórico-metodológicos para
subsidiar efetivamente o ensino da Língua Estrangeira Moderna no processo de escolarização.
Para analisar os limites e possibilidades da abordagem comunicativa e definir novos
referenciais teórico-metodológicos para o ensino de Língua Estrangeira, teve-se como base o
trabalho de Meurer. Este autor destaca a premente necessidade de desenvolver formas de
incentivar práticas pedagógicas que contestem “ou quebrem o círculo do senso comum, daquilo
que parece natural, não problemático, mas que recria e reforça formas de desigualdade e
discriminação” (MEURER, 2000, p. 169).
Tendo como referência de análise tais apontamentos, apresenta-se a seguir uma reflexão
a respeito da abordagem comunicativa, considerando que essa tendência tem marcado o ensino
de Língua Estrangeira na Rede Pública Estadual.
No Brasil, ela passou a fundamentar grande parte dos materiais e ros didáticos para uso
em escolas de ensino regular, desde a década de 1980 até os dias atuais (PEREIRA, 2004;
CORACINI, 1999).
No Paraná, Gimenez (1999) afirma que a abordagem comunicativa foi apropriada como
referencial teórico na elaboração da proposta de ensino de Língua Estrangeira do Currículo
Básico (1992). Embora esse documento apresente uma concepção de língua discursiva e sugira
um trabalho com diferentes tipos de textos, a partir da visão bakhtianiana, observa-se que a
progressão de conteúdos, de 5ª a 8ª séries, está voltada para o ensino comunicativo, centrado em
funções da linguagem do cotidiano, o que esvazia as práticas sociais mais amplas de uso da
língua.
A abordagem comunicativa apresenta aspectos positivos na medida que incorpora em seu
modelo o uso da gramática exigida para a interpretação, expressão e negociação de sentidos, no
contexto imediato da situação de fala, colocando-se a serviço dos objetivos de comunicação.
Análises recentes mencionam que o ensino comunicativo desenvolveu-se em três fases ao longo
59
das últimas décadas, com avanços em seus pressupostos e proposições. Segundo Mascia (2003,
p. 218), “uma primeira é associada ao nocional-funcional e é calcada em práticas audiolinguais; a
segunda marcada pelos atos de fala com a incorporação de tendências sociolingüísticas e a
terceira corresponde a uma vertente mais crítica, em que se pretendeu promover as interações
culturais”.
Por outro lado, ao centrarem a atenção na comunicação, tal abordagem e os métodos que
a antecederam não levaram em conta as diferentes vozes que permeiam as relações sociais e as
relações de poder que as entremeiam.
Nessa abordagem, o conceito de cultura configura uma visão homogênea que a percebe
dissociada da língua, muitas vezes abordados de forma estereotipada.
Conforme Gimenez,
[...] a abordagem comunicativa, na tentativa de ensinar e se comunicar na Língua Estrangeira, deixou de lado a relação entre comunicação e cultura, e a necessidade de entender a comunicação entre falantes nativos e não-nativos como comunicação intercultural mais do que comunicação na língua-alvo. (2001, p.110)
Cabe salientar que a vertente mais crítica da abordagem comunicativa apresenta avanços
na visão de cultura como prática social. Alguns autores trazem questões importantes para uma
releitura crítica dos pressupostos subjacentes à abordagem comunicativa, não dissociada do
contexto histórico. Kramsch (apud COX e ASSIS-PETERSON, 2001, p. 5) questiona as
noções basilares do ensino comunicativo como comunicação autêntica, abordagem natural, necessidades do aprendiz, interação e negociação do sentido, corolárias da ideologia norte-mericana, que pressupõe a solução pacífica dos conflitos e a coexistência harmoniosa das diferenças.
Moita Lopes (1996) coloca sob suspeita o caráter apaziguador, harmonizador do ensino de
língua e destaca que a finalidade de conhecer outra cultura precisa ser repensada no Brasil, em
função do caráter colonizador e assimilacionista do ensino comunicativo. Consoante a esse autor,
Pennycook (apud MASCIA, 2003, p. 220) considera que
a expansão do inglês no mundo não é mera expansão da língua, mas também uma expansão de um conjunto de discursos que fazem circular idéias de desenvolvimento, democracia, capitalismo, neoliberalismo, modernização (...). [Afirma ainda que] hoje, poderíamos dizer que as várias facetas do Comunicativo se desenvolveram com o objetivo principal de difusão do inglês como língua internacional.
Torna-se evidente que esse modelo de ensino se pauta num contexto histórico em que
questões acerca da hegemonia de uma língua, do plurilingüismo e do imperialismo lingüístico que
as permeiam, não eram problematizadas.
Tendo como referência tais reflexões, depreende-se que tanto a opção teórico-
metodológica quanto o idioma a ser ensinado na escola não são neutros, mas profundamente
60
marcados por questões político-econômicas e ideológicas, que resultam muitas vezes do
imperialismo de uma língua. Tais questões marginalizam razões históricas e/ou étnicas que
podem ser valorizadas, levando-se em conta a história da comunidade atendida pela escola.
Destaca-se que o comprometimento com o plurilingüismo como política educacional é uma das
possibilidades de valorização e respeito à diversidade cultural, garantido na legislação, pois
permite às comunidades escolares a definição da Língua Estrangeira a ser ensinada.
A partir das reflexões em torno da abordagem comunicativa e de suas implicações no
ensino de Língua Estrangeira Moderna, serão apresentados a seguir os fundamentos teórico-
metodológicos que referenciam estas Diretrizes. Inicialmente, destacam-se alguns princípios
educacionais que orientam esta escolha:
- o atendimento às necessidades da sociedade contemporânea brasileira e a garantia da eqüidade
no tratamento da disciplina de Língua Estrangeira Moderna em relação às demais obrigatórias
do currículo; - o resgate da função social e educacional do ensino de Língua Estrangeira no currículo da
Educação Básica; - o respeito à diversidade (cultural, identitária, lingüística), pautado no ensino de línguas que
não priorize a manutenção da hegemonia cultural.
Partindo desses princípios, a pedagogia crítica é o referencial teórico que sustenta este
documento de Diretrizes Curriculares, por ser esta a tônica de uma abordagem que valoriza a
escola como espaço social democrático, responsável pela apropriação crítica e histórica do
conhecimento como instrumento de compreensão das relações sociais e para a transformação da
realidade.
Ancorada nos pressupostos da pedagogia crítica, entende-se que a escolarização tem o
compromisso de prover aos alunos meios necessários para que não apenas assimilem o saber
como resultado, mas apreendam o processo de sua produção, bem como as tendências de sua
transformação. A escola tem o papel de informar, mostrar, desnudar, ensinar regras, não apenas
para que sejam seguidas, mas principalmente para que possam ser modificadas. Inspirando-se
nas palavras de Simon (apud JORDÃO, 2004a, p. 164),
a prática pedagógica é vista como processo dedicado a fomentar a possibilidade através da implementação de modos de compreensão e ação que encorajem a transformação de relações específicas entre formas sociais e capacidades humanas, e assim permita a expansão do escopo de identidades sociais em que as pessoas possam se transformar.
Nestas Diretrizes, o ensino de Língua Estrangeira Moderna será norteado para um
propósito maior de educação, considerando as contribuições de Giroux (2004) “ao rastrear as
relações entre língua, texto e sociedade, as novas tecnologias e as estruturas de poder que lhes
subjazem”. Para este educador, é fundamental que os professores reconheçam a importância da
61
relação entre língua e pedagogia crítica no atual contexto global educativo, pedagógico e
discursivo, na medida em que as questões de uso da língua, do diálogo, da comunicação, da
cultura, do poder, e as questões da política e da pedagogia não se separam.
Isso implica superar uma visão de ensino de Língua Estrangeira Moderna apenas como
meio para se atingir fins comunicativos que restringem as possibilidades de sua aprendizagem
como experiência de identificação social e cultural, ao postular os significados como externos aos
sujeitos.
Propõe-se que a aula de Língua Estrangeira Moderna constitua um espaço para que o
aluno reconheça e compreenda a diversidade lingüística e cultural, de modo que se envolva
discursivamente e perceba possibilidades de construção de significados em relação ao mundo em
que vive. Espera-se que o aluno compreenda que os significados são sociais e historicamente
construídos e, portanto, passíveis de transformação na prática social.
A proposta adotada nestas Diretrizes se baseia na corrente sociológica e nas teorias do
Círculo de Bakhtin 3, que concebem a língua como discurso.
Busca-se, assim, estabelecer os objetivos de ensino de uma Língua Estrangeira Moderna
e resgatar a função social e educacional desta disciplina na Educação Básica.
2.1 OBJETO DE ESTUDO DA LÍNGUA ESTRANGEIRA
Toda língua é uma construção histórica e cultural em constante transformação. Como
princípio social e dinâmico, a língua não se limita a uma visão sistêmica e estrutural do código
lingüístico. Ela é heterogênea, ideológica e opaca.
Segundo Bakhtin (1988), toda enunciação envolve a presença de pelo menos duas vozes,
a voz do eu e do outro. Para este filósofo, não há discurso individual, no sentido de que todo
discurso se constrói no processo de interação e em função de um outro. E é no espaço discursivo
criado na relação entre o eu e o outro que os sujeitos se constituem socialmente. É no
engajamento discursivo com o outro que damos forma ao que dizemos e ao que somos. Daí a
língua estrangeira apresentar-se como espaço para ampliar o contato com outras formas de
conhecer, com outros procedimentos interpretativos de construção da realidade.
Em outras palavras, a língua concebida como discurso, não como estrutura ou código a ser
decifrado, constrói significados e não apenas os transmite. O sentido da linguagem está no
contexto de interação verbal e não no sistema lingüístico. Conforme Bakhtin,
o essencial na tarefa de decodificação não consiste em reconhecer a forma lingüística utilizada, mas compreendê-la num contexto concreto preciso, compreender sua significação numa enunciação particular. Em suma, trata-se de perceber seu caráter de novidade e não somente sua conformidade à norma. Em outros termos, o receptor, pertencente à mesma comunidade lingüística, também considera a forma lingüística utilizada como um signo variável e flexível e não como um sinal imutável e sempre idêntico a si mesmo (BAKHTIN, 1992)
62
Nesse raciocínio, a cultura é concebida como um processo dinâmico e conflituoso de
produção de significados sobre a realidade em que se dá em contextos sociais. Para Raymond
Williams (2003, p. 41) há três categorias na definição de cultura
A primeira a “ideal” na qual a cultura é um estado ou processo de perfeição humana em termos de valores universais. A segunda é a “documentária” na qual cultura é o corpo de um trabalho intelectual e imaginativo em que, numa forma detalhada, são gravadas de diferentes maneiras as experiências e o pensamento humano. A terceira é a definição “social” de cultura, relatada como um modo de vida particular que expressa certos sentidos e valores, não somente na arte e conhecimento, mas também em instituições e comportamentos.
A partir destas três definições intercambiantes da cultura, Williams afirma que as
disciplinas se reúnem em uma adição geral” que representa, por meio de variações e conflitos,
uma “cultura humana geral”. Esta contudo, realiza-se em sociedades específicas contextualizadas
local e temporalmente. A história cultural não é a soma de todas as culturas particulares, mas sim
o estudo das relações entre elas.
Na construção de sua teoria, Bakhtin exclui a perspectiva do absoluto, rejeitando o estático
e fechado, noções associadas à perspectiva tradicional de cultural.
Nos discursos presentes no intertexto das sociedades contemporâneas, as práticas de
linguagem são diversas porque a língua envolve variantes socioculturais. Logo, as formas da
língua variam de acordo com os usuários, o contexto em que são usadas e a finalidade da
interação.
Para cada variante lingüística e cada grupo cultural os valores sociais e culturais que lhes
são atribuídos sofrem oscilações, de acordo com os diferentes contextos socioculturais e
históricos. Dessa forma, a língua e a cultura são entendidas como variantes locais particularizadas
em contextos específicos; portanto, configuram-se de forma heterogênea, complexa e plural
(BORTONI-RICARDO, 2004).
Assim, a língua se apresenta como espaço de construções discursivas, indissociável dos
contextos em que ela adquire sua materialidade, inseparável das comunidades interpretativas que
a constroem e são construídas por ela. Desse modo, a língua deixa de lado suas supostas
neutralidade e transparência para adquirir uma carga ideológica intensa, e passa a ser vista como
um fenômeno carregado de significados culturais.
Para Bakhtin (1988, 1992), as relações sociais ganham sentido pela palavra e a sua
existência se concretiza no contexto da enunciação. Por outro lado, os sentidos assumidos pela
palavra são múltiplos, não existindo, dessa forma, palavras vazias. Para esse teórico,
a palavra está sempre carregada de um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial. É assim que compreendemos as palavras e somente reagimos àquelas que despertam em nós ressonâncias ideológicas ou concernentes à vida (BAKHTIN 1988, p.95).
63
Com base nessas considerações, Bakhtin (1988)
ideológico por excelência. Uma importante consideração
existentes na sociedade. Conforme Bakhtin (1999, p. 101),
afirma que a palavra é o fenômeno é
quanto ao valor social das línguas
o papel organizador da palavra estrangeira – palavra que transporta consigo forças e estruturas estrangeiras (...) – fez com que, na consciência histórica dos povos, a palavra estrangeira se fundisse com a idéia de poder, de força, de santidade, de verdade.
Todo discurso está vinculado à história e ao mundo social. Dessa forma, os sujeitos estão
expostos e atuam no mundo por meio do discurso e são afetados por ele.
No ensino de Língua Estrangeira, a língua, objeto de estudo dessa disciplina, contempla as
relações com a cultura, o sujeito e a identidade. Torna-se fundamental que os professores
compreendam o que se pretende com o ensino da Língua Estrangeira na Educação Básica, ou
seja: ensinar e aprender línguas é também ensinar e aprender percepções de mundo e maneiras
de atribuir sentidos, é formar subjetividades, é permitir que se reconheça no uso da língua os
diferentes propósitos comunicativos, independentemente do grau de proficiência atingido.
As aulas de Língua Estrangeira se configuram como espaços de interações entre
professores e alunos e pelas representações e visões de mundo que se revelam no dia-a-dia.
Objetiva-se que os alunos analisem as questões da nova ordem global, suas implicações e que
desenvolvam uma consciência crítica a respeito do papel das línguas na sociedade.
Busca-se, também, superar a idéia de que o objetivo de ensinar Língua Estrangeira na
escola é apenas o lingüístico ou, ainda, que o modelo de ensino dos Institutos de Idiomas seja
parâmetro para definir seus objetivos de ensino na Educação Básica. Tal aproximação seria um
equívoco, considerando que o ensino de Língua Estrangeira nas escolas de língua não tem
necessariamente as mesmas preocupações educacionais a que a escola pública está voltada.
De forma geral, os objetivos de uma escola de idiomas estão mais direcionados para a
proficiência lingüístico-comunicativa em situações de viagens, negócios e preparação para testes.
Gimenez (2004, p.172) esclarece que
embora com características distintas, estes dois setores (público e privado4) têm sido equiparados na avaliação de resultados, quando se espera, por exemplo, que os alunos sejam proficientes na habilidade oral. Isto também se reflete nas expectativas de alunos e pais que freqüentemente consideram a aprendizagem de uma LE como importante fator para uma empregabilidade futura e a atrelam à fala. A importância da LE é tal que a mídia impressa tem se ocupado de abordá-la especialmente neste aspecto. Essas mensagens penetram as paredes das escolas e obscurecem as razões para inclusão de língua estrangeira no currículo.
Embora a aprendizagem de Língua Estrangeira Moderna também sirva como meio para
progressão no trabalho e estudos posteriores, este componente curricular, obrigatório a partir dos
anos finais do Ensino Fundamental, deve também contribuir para formar alunos críticos e
4O termo privado refere-se aos institutos particulares de linguas.
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transformadores.
Estas Diretrizes estão comprometidas com o resgate da função social e educacional da
Língua Estrangeira Moderna na Educação Básica, de modo a superar os fins utilitaristas,
pragmáticos ou instrumentais que historicamente têm marcado o ensino desta disciplina.
Desta forma espera-se que o aluno: - use a língua em situações de comunicação oral e escrita; - vivencie, na aula de Língua Estrangeira, formas de participação que lhe possibilite estabelecer
relações entre ações individuais e coletivas;
- compreenda que os significados são sociais e historicamente construídos e, portanto,
passíveis de transformação na prática social;
- tenha maior consciência sobre o papel das línguas na sociedade; - reconheça e compreenda a diversidade lingüística e cultural, bem como seus benefícios para
o desenvolvimento cultural do país.
Destaca-se que tais objetivos são suficientemente flexíveis para contemplar as diferenças
regionais, mas ainda assim específicos o bastante para apontar um norte comum na seleção de
conteúdos específicos.
Entende-se que o ensino de Língua Estrangeira deve considerar as relações que podem
ser estabelecidas entre a língua estudada e a inclusão social, objetivando o desenvolvimento da
consciência do papel das línguas na sociedade e o reconhecimento da diversidade cultural.
As sociedades contemporâneas não sobrevivem de modo isolado; relacionam-se,
atravessam fronteiras geopolíticas e culturais, comunicam-se e buscam entender-se mutuamente.
Possibilitar aos alunos que usem uma língua estrangeira em situações de comunicação –
produção e compreensão de textos verbais e não verbais – é também inseri-los na sociedade
como participantes ativos, não limitados a suas comunidades locais, mas capazes de se
relacionar com outras comunidades e outros conhecimentos.
Um dos objetivos da disciplina de Língua Estrangeira Moderna é que os envolvidos no
processo pedagógico façam uso da língua que estão aprendendo em situações significativas,
relevantes, isto é, que não se limitem ao exercício de uma mera prática de formas lingüísticas
descontextualizadas. Trata-se da inclusão social do aluno numa sociedade reconhecidamente
diversa e complexa através do comprometimento mútuo.
O aprendizado de uma língua estrangeira pode proporcionar uma consciência sobre o que
seja a potencialidade desse conhecimento na interação humana. Ao ser exposto às diversas
manifestações de uma língua estrangeira e às suas implicações político-ideológicas, o aluno
constrói recursos para compará-la à língua materna, de maneira a alargar horizontes e expandir
sua capacidade interpretativa e cognitiva. Ressalta-se como requisito a atenção para o modo
como as possibilidades lingüísticas definem os significados construídos nas interações sociais.
65
Ainda, deve-se considerar que o aluno traz para a escola determinadas leituras de mundo que
constituem sua cultura e, como tal, devem ser respeitadas.
Além disso, ao conceber a língua como discurso, conhecer e ser capaz de usar uma língua
estrangeira, permite-se aos sujeitos perceberem-se como integrantes da sociedade e participantes
ativos do mundo. Ao estudar uma língua estrangeira, o aluno sujeito aprende também como
atribuir significados para entender melhor a realidade. A partir do confronto com a cultura do outro,
torna-se capaz de delinear um contorno para a própria identidade. Assim, atuará sobre os
sentidos possíveis e reconstruirá sua identidade como agente social.
2.2 AS PRÁTICAS DISCURSIVAS
Neste documento, o ensino de Língua Estrangeira deve contemplar os discursos sociais
que a compõem, ou seja, aqueles manifestados em forma de textos diversos efetivados nas
práticas discursivas (BAKHTIN,1988). Trata-se de tornar a aula de Língua Estrangeira um espaço
de
acesso a diversos discursos que circulam globalmente, para construir outros discursos alternativos que possam colaborar na luta política contra a hegemonia, pela diversidade, pela multiplicidade da experiência humana, e ao mesmo tempo, colaborar na inclusão de grande parte dos brasileiros que estão excluídos dos tipos de (...) [conhecimentos necessários] para a vida contemporânea, estando entre eles os conhecimentos [em língua estrangeira] (MOITA LOPES, 2003, p. 43).
Tal proposta de ensino se concretiza no trabalho com textos, não para extrair deles
significados que supostamente estariam latentes em sua estrutura, mas para comunicar-se com
eles, para lhes conferir sentidos e travar batalhas pela significação. É perceber a língua como
“arena de conflitos” (BAKHTIN, 1992). Isto envolve a análise e a crítica das relações entre texto,
língua, poder, grupos sociais e práticas sociais. Refere-se às formas de olhar o texto escrito, o
visual, o oral e o hipertexto 5 para questionar e desafiar as atitudes, os valores e as crenças a ele
subjacentes.
As reflexões discursivas e ideológicas dependem de uma interação primeira com o texto.
Considerando que as práticas discursivas são influenciadas umas pelas outras, não se trata de
privilegiar a prática da leitura, visto que na interação com o texto pode haver uma complexa
mistura da linguagem escrita, visual e oral. Numa concepção discursiva de língua, as práticas de
oralidade, escrita e leitura não são segmentadas, pois elas não se separam em situações
concretas de comunicação.
Nestas Diretrizes, a ênfase do ensino recai sobre a necessidade de os sujeitos interagirem
5Hipertexto vai além do texto. Dentro do hipertexto existem vários links, que permitem acessar outras janelas, conectando algumas expressões com novos textos, distanciando-se assim da linearidade da página. Na Internet, cada site é um hipertexto – clicando em certas palavras vamos para novos trechos, e vamos construindo, nós mesmos, uma espécie de texto. Na definição de Jay Bolter 1991): “ as partes de um hipertexto podem ser agrupadas e reagrupadas pelo leitor”.
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ativamente pelo discurso, sendo capazes de comunicar-se de diferentes formas materializadas em
diferentes tipos de texto, considerando a imensa quantidade de informações que circulam na
sociedade. Isto significa participar dos processos sociais de construção de linguagem e de seus
sentidos legitimados e desenvolver uma criticidade de modo a atribuir o próprio sentidos aos
textos.
O trabalho com a Língua Estrangeira Moderna fundamenta-se na diversidade de gêneros
textuais e busca alargar a compreensão dos diversos usos da linguagem, bem como a ativação de
procedimentos interpretativos alternativos no processo de construção de significados possíveis,
pelo leitor. Tendo em vista que texto e leitura são dois elementos indissociáveis, e que um não se
realiza sem o outro, é importante definir o que se entende por esses dois termos.
O texto, entendido como uma unidade de sentido, pode ser verbal ou não verbal. Para
Bakhtin (1992), o texto é a materialização de um enunciado e é entendido como unidade
contextualizada da comunicação verbal.
As pessoas não trocam orações assim como não trocam palavras (numa acepção rigorosamente lingüística), ou combinações de palavras, trocam enunciados constituídos com a ajuda das unidades da língua – palavras, conjunto de palavras, orações; mesmo assim, nada impede que o enunciado seja constituído de uma única oração, ou de uma única palavra por assim dizer, de uma unidade de fala (o que acontece sobretudo na réplica do diálogo). Mas não é isso que converterá uma unidade da língua numa unidade da comunicação verbal (BAKHTIN, 1992, p. 297).
Embora necessite do aparato técnico da oração, o texto não corresponde aos aspectos
sistêmicos da língua. Ele se organiza em formas relativamente estáveis, determinadas pelas
condições materiais de produção, denominados por Bakhtin (1992) de gêneros do discurso. Para
esse teórico, os gêneros se desenvolveram através do tempo e correspondem a formas típicas
criadas por esferas de atividades humanas.
A riqueza e a variedade dos gêneros do discurso são infinitas, pois a variedade virtual da atividade humana é inesgotável, e a cada esfera dessa atividade comporta um repertório de gêneros do discurso que vai diferenciando-se e ampliando-se à medida que a própria esfera se desenvolve e fica mais complexa (BAKHTIN, 1992,p.279).
Nessa definição, podem ser considerados textos uma figura, um gesto, um slogan, tanto
quanto um trecho de fala gravado em áudio ou uma frase em linguagem verbal escrita, a partir dos
quais os conteúdos específicos de Língua Estrangeira Moderna serão tratados. No entanto, é
preciso atentar para o fato de que são atribuídos aos textos os sentidos reconhecidos como
válidos por determinada comunidade, considerando-se sempre o contexto e o momento histórico
em que eles foram produzidos: uma construção à qual não se considere possível atribuir sentidos
não será vista como texto por uma determinada comunidade.
Nessa visão, é importante que os alunos tenham consciência de que há várias formas de
produção e circulação de textos em nossa cultura e em outras, de que existem diferentes práticas
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de linguagem no âmbito de cada cultura, e que essas práticas são valorizadas também de formas
diferentes nas distintas sociedades.
Destaca-se que os textos aos quais a sociedade está exposta são de natureza genérica.
Conforme aponta Moita Lopes, vivemos num mundo multisemiótico, cujos textos extrapolam a
letra, ou seja, “um mundo de cores, sons, imagens e design que constroem significados em textos
orais/escritos e hipertextos” (LOPES, 2004, p. 30-31). Isso vem ao encontro da linguagem
específica usada na comunicação mediada pelo computador. Aparentemente trata-se da
linguagem escrita, mas quando desenvolvida em uma interação em tempo real, distancia-se da
forma tradicional, adquirindo características semelhantes às do imediatismo e da redundância da
fala, bem como é acrescida de ícones, cores, recursos sonoros, por exemplo, para comunicar
aspectos que estariam presentes na fala. Conforme o exposto, as diferenças entre comunicação
escrita e falada se diluem na construção desse novo tipo de texto.
A leitura, processo de atribuição de sentidos, estabelece diferentes relações entre o sujeito
e o texto de acordo com as concepções que se têm de sujeito e texto. O trabalho proposto nestas
Diretrizes está ancorado na perspectiva de uma leitura crítica, a qual se efetiva no confronto de
perspectivas e na (re)construção de atitudes diante do mundo. A abordagem da leitura crítica
extrapola a relação entre o leitor e as unidades de sentido na construção de significados
possíveis. Busca-se, então, superar uma visão tradicional da leitura condicionada à extração de
informações.
Nessa perspectiva, há confronto entre autor, texto e leitor. O leitor abandona uma atitude
de passividade diante do texto e passa a ser participante do processo de construção de sentidos.
Entretanto, ele não está sozinho ao construí-los, com ele estão sua cultura, sua língua, seus
procedimentos interpretativos, os discursos construídos coletivamente em sua comunidade e a
ideologia na qual está inserido. A leitura é considerada, então, como interação entre todos esses
elementos, os quais influenciam diretamente nas possíveis interpretações de um texto.
Dessa forma, ao ensinar e aprender uma Língua Estrangeira, alunos e professores
percebem ser possível construir significados além daqueles permitidos pela língua materna. Os
sujeitos envolvidos no processo pedagógico não aprendem apenas novos significados nem a
reproduzi-los, mas sim aprendem outras maneiras de construir sentidos, outros procedimentos
interpretativos que alargam suas possibilidades de entendimento do mundo. Sentido, na acepção
de Orlandi (2005, p. 47), é
uma relação determinada do sujeito – afetado pela língua – com a história. É o gesto de interpretação que realiza essa relação do sujeito com a língua, com a história, com os sentidos. Esta é a marca da subjetivação e, ao mesmo tempo, o traço da relação da língua com a exterioridade: não há discurso sem sujeito.
Portanto o momento histórico, o contexto sócio-cultural, os elos com o cotidiano (familiares,
amigos etc.) que acompanham a vida, a criação artística e o conhecimento científico estão
68
presentes na produção e na recepção dos sentidos do enunciado.
Conseqüentemente, é na língua, e não por meio dela, que se percebe e entende a
realidade e, por efeito, a percepção do mundo está intimamente ligada ao conhecimento das
línguas. Para Jordão (2004a, p. 164),
[ao] aprender uma língua estrangeira [...] eu adquiro procedimentos de construção de significados diferentes daqueles disponíveis na minha língua (e cultura) materna; eu aprendo que há outros dispositivos, além daqueles que me apresenta a língua materna para construir sentidos, que há outras possibilidades de construção do mundo diferentes daqueles que o conhecimento de uma única língua me possibilitaria. Nessa perspectivas, quantas mais [...] linguas estrangeiras eu souber, potencialmente maiores são as minhas possibilidades de construir sentidos, entender o mundo e transforma-lo.
Assim, os sujeitos leitores têm a possibilidade de estabelecer relações entre os diversos
elementos envolvidos, como por exemplo cultura, língua, procedimentos interpretativos, contextos
e ideologias.
3 CONTEÚDO ESTRUTURANTE
Os conhecimentos que identificam e organizam os campos de estudos escolares de
Língua Estrangeira são considerados basilares para a compreensão do objeto de estudo dessa
disciplina. Esses saberes são concebidos como conteúdos estruturantes, a partir dos quais
abordam-se os conteúdos específicos no trabalho pedagógico. Os conteúdos estruturantes se
constituem através da história, são legitimados socialmente e, por isso, são provisórios e
processuais.
Ao tomar a língua como interação verbal, como espaço de produção de sentidos marcado
por relações sociais, o conteúdo estruturante da Língua Estrangeira Moderna é o Discurso como
prática social, que a tratará de forma dinâmica, por meio das práticas de leitura, de oralidade e de
escrita.
Para que os alunos percebam a interdiscursividade, as condições de produção dos
diferentes discursos, das vozes que permeiam as relações sociais e de poder, é preciso que os
níveis de organização lingüística – fonético-fonológico, léxico-semântico e de sintaxe – sirvam ao
uso da nguagem na compreensão e na produção verbal e não verbal.
Sob tal pressuposto, o trabalho em sala de aula deve partir de um texto num contexto de
uso, sob a proposta de construção de significados por meio do engajamento discursivo e não pela
mera prática de estruturas lingüísticas. Com o foco na abordagem crítica de leitura, a ênfase do
trabalho pedagógico é a interação ativa dos sujeitos com o discurso.
Por sua vez, os conteúdos específicos contemplam diversos gêneros discursivos, além de
elementos lingüístico-discursivos, tais como: unidades lingüísticas que se configuram como as
unidades de linguagem, derivadas da posição que o locutor exerce no enunciado; temáticas que
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se referem ao objeto ou finalidade discursiva, ou seja, ao que pode tornar-se dizível por meio de
um gênero; composicionais, compreendidas como a estrutura específica dos textos pertencentes a um gênero (BAKHTIN, 1992).
O professor deve considerar a diversidade de gêneros existentes e a especificidade do
tratamento da língua estrangeira na prática pedagógica, a fim de estabelecer critérios para definir
os conteúdos específicos para o ensino.
Inicialmente, é preciso levar em conta o princípio da continuidade, ou seja, a manutenção
de uma progressão entre as séries considerando as especificidades da Língua Estrangeira
ofertada, as condições de trabalho existentes na escola, o projeto político-pedagógico, a
articulação com as demais disciplinas do currículo e o perfil dos alunos.
No ato da seleção de textos, propõe-se analisar os elementos lingüístico-discursivos neles
presentes, na medida que apresentem possibilidades de tratamento de assuntos diversos,
adequados à faixa etária e que contemplem os interesses dos alunos. É importante também que
os textos abordem os diversos gêneros textuais e que apresentem diferentes graus de
complexidade da estrutura lingüística.
Recomenda-se que seja dada aos alunos a oportunidade para participar da escolha das
temáticas dos textos, uma vez que um dos objetivos é justamente possibilitar formas de
participação que permitam o estabelecimento de relações entre ações individuais e coletivas. Por
meio dessa experiência, os alunos poderão compreender a vinculação entre auto-interesse e
interesses do grupo. Além disso, esta iniciativa poderá levar a escolhas de conteúdos mais
significativos porque resultam da participação de todos.
Outro ponto a ser destacado é a atenção, no momento da escolha de textos, para que os
mesmos não reforcem uma visão monolítica de cultura, muitas vezes abordada de forma
estereotipada. Os conteúdos dos textos devem viabilizar os resultados pretendidos nas diferentes
séries de acordo com os objetivos específicos propostos no planejamento do professor.
4 ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA
Estas Diretrizes propõem redirecionar o ensino de Língua Estrangeira Moderna nas
escolas da Rede Pública Estadual do Paraná. O trabalho com a Língua Estrangeira em sala de
aula parte do entendimento do papel das línguas nas sociedades como mais do que meros
instrumentos de acesso à informação: as línguas estrangeiras são possibilidades de conhecer,
expressar e transformar modos de entender o mundo e de construir significados. A partir do conteúdo estruturante Discurso como prática social, serão abordadas questões
lingüísticas, sociopragmáticas, culturais e discursivas, bem como as práticas do uso da língua:
leitura, oralidade e escrita. Propõe-se que nas aulas de Língua Estrangeira Moderna o professor aborde os vários gêneros textuais, em atividades diversificadas, analisando a função do gênero estudado, sua composição, a distribuição de informações, o grau de informação presente ali, a intertextualidade, os recursos
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coesivos, a coerência e somente depois de tudo isso a gramática em si. Sendo assim, o ensino deixa de priorizar a gramática para trabalhar com o texto, sem no entanto, abandoná-la. Cabe lembrar que disponibilizar textos aos alunos não é o bastante. É necessário provocar uma reflexão maior sobre o uso de cada um deles e considerar o contexto de uso e os seus interlocutores. Por isso, os gêneros discursivos têm um papel tão importante para o trabalho na escola.
Os gêneros do discurso organizam as falas e se constituem historicamente a partir de
novas situações de interação verbal, por isso as mudanças nas interações sociais geram
mudança de gênero, bem como o surgimento de novos gêneros.
Se não existissem gêneros, se fossem criados pela primeira vez em cada conversa, a
comunicação verbal seria quase impossível (Bakhtin, 1992). Portanto, é importante que o aluno
tenha acesso a textos de vários gêneros: publicitários, jornalísticos, literários, informativos, de
opinião etc. A estrutura de uma bula de remédio, por exemplo, difere da estrutura de um poema.
Além disso, é necessário que se identifiquem as diferenças estruturais e funcionais, a autoria, o
público a que se destina, e que se aproveite o conhecimento já adquirido de experiência com a
língua materna. O objetivo será interagir com a infinita variedade discursiva presente nas diversas
práticas sociais.
A reflexão crítica acerca dos discursos que circulam em Língua Estrangeira Moderna
somente é possível mediante o contato com textos verbais e não verbais. Do mesmo modo, a
produção de um texto se faz sempre a partir do contato com outros textos, que servirão de apoio e
ampliarão as possibilidades de expressão dos alunos.
A aula de LEM deve ser um espaço onde se desenvolvam atividades significativas que
explorem diferentes recursos e fontes, a fim de que o aluno vincule o que é estudado com o que o
cerca.
As discussões poderão acontecer em língua materna, pois nem todos os alunos dispõem
de um léxico suficiente para que o diálogo se realize em língua estrangeira. Elas servirão como
subsídio para a produção textual em língua estrangeira.
O trabalho pedagógico com o texto trará uma problematização e a busca por sua solução
deverá despertar o interesse dos alunos para que desenvolvam uma prática analítica e crítica,
ampliem seus conhecimentos lingüístico-culturais e percebam as implicações sociais, históricas e
ideológicas presentes num discurso e que nele se revele o respeito às diferentes culturas, crenças
e valores.
Espera-se que o professor crie estratégias para que os alunos percebam a
heterogeneidade da língua. Nesse caso, pode-se dizer que um texto apresenta várias
possibilidades de leitura, que não traz em si um sentido preestabelecido pelo seu autor. Traz, sim,
uma demarcação para os sentidos possíveis, restringida pelas suas condições de produção e, por
isso, constrói-se a cada leitura: quem faz a leitura do texto é o sujeito, portanto o texto não
determina a sua interpretação.
Na abordagem de leitura discursiva, a inferência é um processo cognitivo relevante porque
possibilita construir novos conhecimentos, a partir daqueles existentes na memória do leitor, os
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quais são ativados e relacionados às informações materializadas no texto. Com isso, o
conhecimento de mundo e as experiências dos alunos serão valorizadas.
Desse modo, o professor desempenha um papel importante na leitura, já que, pela forma
como encaminha o trabalho em sala de aula, os significados poderão ser mais ou menos
problematizados, ou as possibilidades de construção de sentidos percebidas como mais ou menos
significativas, como espaços para exercício de ação no mundo social ou submissão aos sentidos
do outro.
Espera-se que o trabalho com a leitura vá além daquela superficial, linear. Uma questão é
linear quando busca respostas já visualizando-as no próprio texto. Será não linear quando o
aspecto sobre o qual incide a questão não se localiza apenas na materialidade do texto. A não
linearidade permite o estabelecimento das relações do texto com o conhecimento já adquirido, o
reconhecimento das suas opções lingüísticas, a intertextualidade e a reflexão, o que possibilita a
reconstrução da argumentação.
Na medida em que os alunos reconheçam que os textos são representações da realidade,
são construções sociais, eles terão uma posição mais crítica em relação a tais textos. Poderão
rejeitá-los ou reconstruí-los a partir de seu universo de sentido, o qual lhes atribui coerência pela
construção de significados.
Assim, os alunos devem entender que ao interagir com/na língua, interagem com pessoas
específicas. Para compreender um enunciado em particular, devem ter em mente quem disse o
quê, para quem, onde, quando e porque.
Destaca-se ainda, que o trabalho com a produção de textos na aula de Língua Estrangeira
Moderna precisa ser concebido como um processo dialógico ininterrupto, no qual escreve-se
sempre para alguém de quem se constrói uma representação. Conforme Bakhtin “um discurso
nasce de outros discursos e se produz para um outro sujeito, sendo que esse outro é construído
imaginariamente pelo sujeito-autor” (apud MUSSALIN, 2004, p. 250).
Reconhece-se que o desconhecimento lingüístico pode dificultar essa interação com o
texto, o que impossibilita a crítica (Busnardo e Braga, 2000). O conhecimento lingüístico é
condição necessária para se chegar à compreensão do texto, porém não é suficiente,
considerando que o leitor precisa executar um processo ativo de construção de sentidos e
também relacionar a informação nova aos saberes já adquiridos: o conhecimento discursivo da
sua língua materna, da sua história, de outras leituras utilizadas ao longo de sua vida (Vygotsky,
1989).
A ativação dos procedimentos interpretativos da língua materna, a mobilização do
conhecimento de mundo e a capacidade de reflexão dos alunos, são alguns elementos que
podem permitir a interpretação de grande parte dos sentidos produzidos no contato com os textos.
Não é preciso que o aluno entenda os significados de cada palavra ou a estrutura do texto para
que lhe produza sentidos.
O papel do estudo gramatical relaciona-se ao entendimento, quando necessário, de
72
procedimentos para construção de significados usados na língua estrangeira. Portanto, o trabalho
com a análise lingüística torna-se importante na medida em que permite o entendimento dos
significados possíveis das estruturas apresentadas. Ela deve estar subordinada ao conhecimento
discursivo, ou seja, as reflexões lingüísticas devem ser decorrentes das necessidades específicas
dos alunos, a fim de que se expressem ou construam sentidos aos textos.
Conhecer novas culturas implica constatar que uma cultura não é necessariamente melhor
nem pior que outra, mas sim diferente. É reconhecer que as novas palavras não são
simplesmente novos rótulos para os velhos conceitos. A análise lingüística não é apenas uma
nova maneira de arrumar e ordenar as palavras e as novas pronúncias não são somente as
distintas maneiras de articular sons, mas representam um universo sócio-histórico e
ideologicamente marcado.
Destaca-se que nenhuma língua é neutra e pode representar diversas culturas e maneiras
de viver; inclusive, pode passar a ser um espaço de comunicação intercultural, por ser usada em
diversas comunidades, muitas vezes até por falantes que não a têm como língua materna.
Passa a ser função da disciplina possibilitar aos alunos o conhecimento dos valores
culturais estabelecidos nas e pelas comunidades de que queiram participar. Ao mesmo tempo, o
professor propiciará situações de aprendizagem que favoreçam um olhar crítico sobre essas
mesmas comunidades.
Cabe ao professor criar condições para que o aluno não seja um leitor ingênuo, mas que
seja crítico, reaja aos textos com os quais se depare e entenda que por trás deles há um sujeito,
uma história, uma ideologia e valores particulares e próprios da comunidade em que está inserido.
Da mesma forma, deve ser instigado a buscar respostas e soluções aos seus questionamentos,
necessidades e anseios relativos à aprendizagem.
Ao interagir com textos diversos, o aluno perceberá que as formas lingüísticas não são
sempre idênticas, não assumem sempre o mesmo significado, mas são flexíveis e variam
conforme o contexto e a situação em que a prática social de uso da língua ocorre.
Para que o aluno compreenda a palavra do outro é preciso que se reconstrua o contexto
sócio-histórico e os valores estilísticos e ideológicos que geraram o texto. O maior objetivo da
leitura é trazer um conhecimento de mundo que permita ao leitor elaborar um novo modo de ver a
realidade. Para que uma leitura em Língua Estrangeira se transforme realmente em uma situação
de interação é fundamental que o aluno seja subsidiado com conhecimentos lingüísticos,
sociopragmáticos, culturais e discursivos.
As estratégias específicas da oralidade têm como objetivo expor os alunos a textos orais,
pertencentes aos diferentes discursos, lembrando que na abordagem discursiva a oralidade é
muito mais do que o uso funcional da língua, é aprender a expressar idéias em língua estrangeira
mesmo que com limitações. Vale explicitar que, mesmo oralmente, há uma diversidade de
gêneros que qualquer uso da linguagem implica e que existe a necessidade de adequação da
variedade lingüística para as diferentes situações, tal como ocorre na escrita e em língua materna.
73
Também é importante que o aluno se familiarize com os sons específicos da língua que está
aprendendo.
A finalidade e o gênero discursivo serão explicitados ao aluno no momento de orientá-lo
para uma produção, assim como a necessidade de adequação ao gênero, planejamento,
articulação das partes, seleção da variedade lingüística adequada – formal ou informal. Ao fazer
escolhas, o aluno desenvolve sua identidade e se constitui como sujeito crítico. Ao propor uma
tarefa de escrita, é essencial que se disponibilize recursos pedagógicos, junto com a intervenção
do próprio professor, para oferecer ao aluno elementos discursivos, lingüísticos, sociopragmáticos
e culturais para que ele melhore sua produção.
Nos textos de literatura, a reflexão sobre a ideologia e a construção da realidade fazem
parte da produção do conhecimento, sempre parcial, complexo e dinâmico, dependente do
contexto e das relações de poder. Assim, ao apresentar textos literários aos alunos, deve-se
propor atividades que colaborem para que ele analise os textos e os perceba como prática social
de uma sociedade em um determinado contexto sociocultural.
Outro aspecto importante com relação ao ensino de Língua Estrangeira Moderna é que ele
será, necessariamente, articulado com as demais disciplinas do currículo para relacionar os vários
conhecimentos. Isso não significa ter de desenvolver projetos envolvendo inúmeras disciplinas,
mas fazer o aluno perceber que conteúdos de disciplinas distintas podem estar relacionados. Por
exemplo: a relação interdisciplinar da Literatura com a História e a Geografia podem colaborar
para o esclarecimento e a compreensão de textos literários.
Tais atividades serão propostas a partir de textos e envolverão simultaneamente práticas e
conhecimentos mencionados, de modo a proporcionar ao aluno condições para assumir uma
atitude crítica e transformadora com relação aos discursos apresentados.
O diagrama abaixo demonstra como o discurso se materializa no texto (verbal e não
verbal) por meio das práticas da oralidade, leitura e escrita.
74
Nesta proposta, para cada texto escolhido verbal e/ou não verbal o professor poderá
trabalhar levando em conta os itens abaixo sugeridos:
a) Gênero: explorar o gênero escolhido e suas diferentes aplicabilidades. Cada atividade da
sociedade se utiliza de um determinado tipo de gênero;
b) Aspecto Cultural/Interdiscurso: influência de outras culturas percebidas no texto, o contexto,
quem escreveu, para quem, com que objetivo e quais outras leituras poderão ser feitas a partir do
texto apresentado; c) Variedade Lingüística: formal ou informal; d)Análise Lingüística: será realizada de acordo com a série. Vale ressaltar a diferença entre
o ensino de gramática e a prática da análise lingüística:
ENSINO DE GRAMÁTICA PRÁTICA DE ANÁLISE LINGÜÍSTICA
Unidade privilegiada: a palavra, a frase e o Unidade privilegiada: o texto. período.
Preferência pelos exercícios estruturais, de Preferência por questões abertas e atividades identificação e classificação de de pesquisa, que exigem comparação e unidades/funções morfossintáticas e correção. reflexão sobre adequação e efeitos de sentidos.
Concepção de língua como sistema, estrutura Concepção de língua como ação interlocutiva inflexível e invariável. situada, sujeita às interferências dos falantes. (adaptado: MENDONÇA, M. Análise Lingüística no Ensino Médio: um novo olhar, um outro objeto, 2006, p.207) e) Atividades: - Pesquisa: será proposta para o aluno, acerca do assunto abordado. Lembrando aqui que
pesquisa é entendida como uma forma de saber mais sobre o assunto, isso significa que
poderá ser realizada não só nos livros ou internet. Uma conversa com pessoas mais
experientes, uma entrevista, e assim por diante, também serão consideradas pesquisas.
- Discussão: conversar na sala de aula a respeito do assunto, valorizando as pesquisas feitas
pelos alunos. Aprofundar e/ou confrontar informações. Essa atividade poderá ser feita em
língua materna. - Produção de texto: o aluno irá produzir um texto na língua estrangeira, com a ajuda dos
recursos disponíveis na sala de aula e a orientação do professor.
Os conteúdos poderão ser retomados em todas as séries, porém em diferentes graus de
profundidade, levando em conta o conhecimento do aluno.
A bagagem de conhecimentos que o aluno trará em língua estrangeira será diferenciada,
pois os estabelecimentos de ensino possuem matrizes curriculares diferentes e nem sempre o
aluno terá estudado o mesmo idioma em séries anteriores.
É importante aqui tecer algumas considerações sobre os livros didáticos comumente
utilizados como apoio didático pelo professor, materiais que têm assumido uma posição central na
definição de conteúdos e metodologias nas aulas de Língua Estrangeira moderna. As concepções
de ensino e língua subjacentes às atividades dos livros didáticos tendem a se fundamentar, em
grande parte, na Abordagem Comunicativa. Corroborando as reflexões concernentes a tal
75 abordagem, presentes nestas Diretrizes, Pereira (2004, p.199) afirma que
embora as mudanças ocorridas nos livros didáticos a partir do advento da abordagem comunicativa tenham representado um enriquecimento lingüístico e sociocultural em relação aos LDs de abordagem formalista, os mesmos continuam sendo criticados pelo tratamento elementar, fragmentado e descontextualizado com que apresentam a língua, a sociedade, a cultura-alvo e outras culturas.
Entende-se que muitos professores prefiram o trabalho com o livro didático em
função da previsibilidade, homogeneidade, facilidade para planejar aulas, acesso a textos,
figuras etc. Suas vantagens também são percebidas em relação aos alunos, que podem
dispor de material para estudos, consultas, exercícios, enfim acompanhar melhor as
atividades.
Além de descortinar os valores subjacentes no livro didático, recomenda-se que o
professor utilize outros materiais disponíveis na escola: livros didáticos, dicionários, ros
paradidáticos, vídeos, DVD, CD-ROM, Internet, TV pendrive etc.
A elaboração de materiais pedagógicos pautado nestas Diretrizes, permite
flexibilidade para incorporar especificidades e interesses dos alunos, bem como para
contemplar a diversidade regional.
Ao tratar os conteúdos de Língua Estrangeira Moderna, o professor proporcionará
ao aluno pertencente a uma determinada cultura, o contato e a interação com outras
línguas e culturas. Desse encontro, espera-se que possa surgir a consciência do lugar
que se ocupa no mundo, extrapolando o domínio lingüístico.
Ressalta-se a importância do Livro Didático Público de Língua Estrangeira
Moderna, Inglês e Espanhol, elaborado por professores da Rede Pública do Estado do
Paraná, que não esgota todas as necessidades, nem abrange todos os conteúdos de
língua estrangeira, mas constitui suporte valoroso e ponto de partida para um trabalho
bem sucedido em sala de aula.
76 Anexo 3: ENSINO DE INGLÊS, LETRAMENTO CRÍTICO E CIDADANIA: UM TRIÂNGULO AMOROSO BEM-SUCEDIDO
JORDÃO, Clarissa1
FOGAÇA, Francisco Carlos2
RESUMO: Este trabalho tem por objetivo relatar uma experiência de elabo-ração de materiais
didáticos para o ensino de línguas estrangeiras (inglês e espanhol), a serem utilizados em escolas
públicas do estado do Paraná, no ensino fundamental. O trabalho foi desenvolvido pela equipe de
línguas estrangeiras (ensino fundamental) da Secretaria de Estado de Educação do Paraná
(SEED) e por consultores externos em 2005 e 2006. Os materiais desenvolvidos incluem uma
seleção de textos com orientações aos profes-sores, o material do aluno, cartazetes, CDs de áudio
e vídeo, e transparên-cias. O projeto buscou o desenvolvimento de materiais flexíveis, não seria-
dos, que pudessem contemplar tanto as realidades globais como as locais, atendendo às
necessidades dos diversos contextos escolares no estado, sem a pretensão de ser um livro-texto
acabado, com conteúdos pré-estabeleci-dos. Os materiais têm como base teórica o
ensino/aprendizagem por letramento crítico, concebendo a língua como discurso, e tendo uma
pers-pectiva de texto como unidade de sentido verbal e não verbal. Nossa pro-posta pretende ir
além da visão da língua como código lingüístico a ser ensinado, enfatizando o processo de
construção coletiva de sentidos, en-tendendo que a realidade é também uma construção coletiva.
Procuramos contemplar diversos tipos textuais, como emails, folhetos, poemas, cartas, páginas da
web, e imagens, possibilitando ao aluno ter acesso a uma diver-sidade de textos e contextos de
uso da linguagem. Neste trabalho explicitamos as diversas seções que compõem as orientações
ao professor, seus objetivos e os tipos de atividades recomendadas: preparação, explora-ção
textual, problematização, e dicas ao professor. A seção chamada de “problematização” propõe a
construção coletiva de sentidos, através de questionamentos dos temas abordados nos textos.
Tanto objetivos educaci-onais como lingüísticos são contemplados em nossa proposta. PALAVRAS-CHAVE: letramento crítico; discurso; ensino de línguas Por questões de restrição de cópia, não foi possível anexar este artigo nesta pesquisa. Ele pode ser encontrado na integra na internet, atravéz do endereço:
http://200.189.113.123/diaadia/diadia/modules/mydownloads_01/visit.php?cid=43&lid=3586
77 Anexo 4:
Revista Crop – 12/2007 Revista do Programa de Estudos Lingüísticos e Literários em Inglês www.fflch.usp.br/dlm/inglês/crop JORDÃO, C. M. O que todos sabem... ou não: letramento crítico e questionamento conceitual. pp 21-46. 21
O que todos sabem.... ou não: letramento crítico e questionamento conceitual Clarissa Menezes Jordão Resumo: este texto apresenta a metodologia do questionamento conceitual como alternativa para o processo de formação de professores. Partindo do pressuposto de que os professores precisam desenvolver uma consciência crítica sobre os procedimentos de construção e circulação do conhecimento, e com a esperança de que uma consciência destes procedimentos leve a uma atitude de engajamento crítico com a diversidade de leituras de mundo existentes, esta metodologia é aqui brevemente apresentada em alguns de seus fundamentos teóricos e objetivos, sendo abordada como possibilidade de posicionamento e produção de novos conhecimentos por parte de professores e alunos.
Por questões de restrição de cópia, não foi possível anexar este artigo nesta pesquisa. Ele pode ser encontrado na integra na internet, atravéz do endereço: http://200.189.113.123/diaadia/diadia/modules/mydownloads_01/visit.php?cid=43&lid=3585
78 Anexo 5:
O ENSINO DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS – de código a discurso1
Clarissa Menezes Jordão
(UFPR)
Toda prática está embasada em alguma teoria. Alguma concepção de mundo
sempre informa nossas atitudes e orienta nossas escolhas. Diante disso, é preciso estar,
como os escoteiros, sempre alertas para os pressupostos que fundamentam não apenas
nossas ações, mas também nossos pensamentos, nossos valores, nossos procedimentos
interpretativos diante das coisas do mundo.
Assim, ao ensinar línguas estrangeiras, os professores e seus alunos adentram as
salas de aula munidos de uma ou várias séries de pressupostos sobre o que seja uma
língua, sobre o processo de ensino/aprendizagem daquela língua, sobre seu capital
cultural no contexto social em que se insere. Tais pressupostos nem sempre encontram
respaldo nas teorias desenvolvidas por lingüistas renomados, mas resultam do
entrecruzamento ao mesmo tempo particular e socialmente construído que cada indivíduo
realiza entre as diferentes comunidades discursivas de que faz parte. Esses
entrecruzamentos, muitas vezes culturalmente determinados, são determinantes de nossas
atitudes para com práticas de sala de aula e dependem tanto de nossas preferências
individuais quanto de nosso condicionamento social, cultural, intelectual. Dependem de
nossas filiações teóricas, de nossas predileções interpretativas, de nossas visões de mundo
particulares e daquelas que partilhamos com nossas comunidades – comunidades às vezes
constituídas por pessoas fisicamente presentes em nosso entorno, outras vezes
espacialmente distribuídas milhares de quilômetros de distância uns dos outros,
aproximadas pela Internet e pelas identidades interpretativas de que partilham.
Desse modo, é importante que estejamos prontos para identificar e desafiar
constantemente nossos pressupostos e suas implicações: ao fazê-lo, podemos entender mais
facilmente de onde eles vêm, como se formam e quais as suas conseqüências em termos de
ações, escolhas, estabelecimento de valores e julgamentos. Podemos, através da construção
dessa consciência crítica, compreender melhor o que nos leva a agir como agimos, e
principalmente perceber as possibilidades que temos para mudar aquilo com o que não
estamos satisfeitos, e entender por que não estamos satisfeitos e queremos mudar. Tais
79 entendimentos propiciam intervenções em nível epistemológico, ou seja, podem levar a
mudanças mais radicais do que a simples coibição ou o auto-policiamento. O tipo de
mudança conseqüente de um rearranjo epistemológico permite que atitudes
interpretativas sejam reavaliadas e portanto possibilita transformações profundas na
maneira de conceber o mundo e de perceber as relações entre os diferentes sistemas que o
constituem, bem como altera os modos de avaliar ações, de interpretar comportamentos,
de atribuir critérios de valor e relevância à arte, à ciência, ao pensamento, às emoções.
Por isso proponho-me a investigar neste texto duas grandes linhas teóricas de
concepção de língua e suas implicações para contextos educacionais formais como a
escola e a sala de aula de línguas estrangeiras (LE). A esperança é de que, através
dessa discussão, possamos reformular nossos conceitos e perceber como nossas
concepções de língua enquanto código ou enquanto discurso informam atitudes muito
diferentes em relação ao processo de ensino e aprendizagem.
1. Estruturalismo
Nesta tradição de pensamento, concebe-se a língua como um intermediário
entre o sujeito e o mundo; a língua daria acesso ao mundo, permitiria que agíssemos
nele. Conseqüentemente, a realidade aqui é concebida como algo externo ao sujeito,
independente dele. A língua representaria esse mundo para nós, ao mesmo tempo em
que nos permitiria acesso a ele.
Ela seria um sistema fechado, transparente e passível de estudo quando abstraída de
seu uso social e ideológico. Em outras palavras, seria factível separar a língua como sistema
(langue, como diria Saussure) da língua em seu uso (parole para Saussure) a fim de que o
sistema lingüístico pudesse ser estudado, já que o uso da língua, por ser muito complexo e
relativo a cada individuo que a usa, não consistiria objeto razoável para estudos científicos.
Pressupondo-se a existência de um mundo dado, pré-existente e exterior ao sujeito,
que o representa através da língua, pressupõe-se também graus de aproximação e
afastamento deste mundo único, concreto, “natural” e portanto “verdadeiro”. Assim,
80 haveria a possibilidade de que diferentes pessoas estivessem mais ou menos próximas
da realidade, mais ou menos “equivocadas” em relação a um mundo concreto, mundo
este que seria a única realidade “verdadeira”. O critério para que se emitissem
julgamentos científicos de verdade seria a proximidade em que se encontram as
afirmações feitas em relação a um mundo verdadeiramente existente, a um mundo
que independe de quem o observa porque em sua essência ele é o mesmo para todos.
Existiria aqui um mesmo objeto-mundo que seria observado por pessoas diferentes de
maneiras diferentes; essas maneiras diferentes de ver poderiam ser hierarquicamente
classificadas conforme estivessem mais ou menos próximas da verdade sobre esse
mundo único, ou conforme abrangessem mais ou menos facetas dele.
Seria como se tivéssemos todos olhando, de fora, para uma laranja: conforme
reuníssemos mais detalhes da laranja em nosso pensamento sobre ela, mais próximos
estaríamos de obter uma descrição real da laranja; quanto mais ângulos de visão
tivéssemos, mais completa estaria nossa descrição dessa laranja. Observador e objeto
observado são aqui concebidos como distintos um do outro: pressupõe-se uma realidade
concreta exterior a quem pensa sobre ela e a observa. Essa visão da realidade é chamada
de objetiva, porque concebe a realidade como algo que está lá para quem quiser, puder e
souber vê-la, e desse modo se coloca como exterior ao sujeito, como independente dele.
Conseqüentemente, existe nessa concepção a possibilidade de que se encontre
uma maneira universalmente melhor do que as outras para entender o mundo.
Melhor porque mais abrangente e portanto mais próxima da realidade (que é
sinônimo de verdade). Isso permite que uma tal maneira universalmente superior seja
legitimamente imposta sobre as outras, já que as outras são maneiras equivocadas de
ler o mundo. Esse pressuposto pode implicar em que algumas pessoas, as consideradas
mais capazes, sejam responsáveis por instituir o bem no mundo, por levar aos menos
privilegiados as verdades sobre o mundo, sobre as pessoas, sobre a vida, sobre o que e
quem realmente somos. Tal concepção é basilar ao projeto Iluminista, que almejava
“levar a luz” a todos aqueles que viviam no escuro.
Essa crença de que alguém seja capaz de alcançar um modo objetivo (neutro,
descomprometido, acima do bem e do mal) e superior (universal, mais abrangente e mais
completo) de entender o mundo implica numa determinada percepção do que possa ser
81 considerado como real e verdadeiro, e afeta o conhecimento que temos de nós mesmos e
dos outros, a maneira de nos percebermos existindo no mundo. Imaginar que existam
graus de proximidade maior ou menor em relação à realidade, e que a verdade das coisas
esteja em sua materialidade concreta, ou seja, no fato de serem “reais”, coloca como mais
próximos da verdade aqueles que estiverem mais próximos da realidade. O verdadeiro
seria o real e, portanto, realidade e verdade seriam a mesma coisa: aqueles que tivessem
acesso à realidade seriam também os donos da verdade.
2. Pós-estruturalismo
As principais preocupações do pós-estruturalismo envolvem questões fundamentais
sobre quem somos, de onde viemos e para onde vamos. A relação entre sujeito e
realidade, construção e distribuição de conhecimento estão no âmago das conjecturas
pós-estruturalistas.
O pós-estruturalismo procede à desconstrução de pressupostos, ao questionamento
das noções menos conscientes e das estruturas a partir das quais promovemos nossos
entendimentos do mundo. A concepção aqui é de que tudo pode e deve ser questionado,
inclusive nossos valores mais arraigados. Deste modo, o pós-estruturalismo estabelece uma
visão de mundo em constante reflexividade, desafiada permanentemente por si mesma.
Os pressupostos sobre o que seja a realidade nesta concepção de mundo são
examinados a partir das relações de poder estabelecidas pela nossa percepção da
realidade. Aqui, a realidade não pode ser separada de quem a observa, ou constrói. E
quem a constrói nunca o faz sozinho, mas sim coletivamente nas relações sociais. Não
existe, nessa concepção, a possibilidade de acesso a uma realidade objetiva, neutra,
independente da subjetividade que a forma: nós podemos apenas interpretar a
realidade a partir de nossa experiência dela (ou da experiência de outros com que
tenhamos contato). As interpretações que construímos nunca são neutras, nunca estão
em maior ou menor grau de distância em relação a uma determinada realidade
externa objetiva, porque a realidade não é dada, não tem existência independente de
quem pensa sobre ela ou a experimenta (JORDÃO, 2005).
Nossos entendimentos desta dita realidade se fazem na linguagem, que é sempre
ideológica, ou seja, localizada (isto é, determinada pela perspectiva de quem a constrói e a
82 utiliza) e com sua existência baseada em relações estabelecidas culturalmente. Por isso
a neutralidade é impossível: nossos olhares são estabelecidos por lentes que, embora
cambiantes, usamos permanentemente e das quais não nos podemos desfazer. Assim, a
própria linguagem é um desses pares de lentes, que faz com que nossos entendimentos
do mundo sejam construídos de uma determinada maneira e não de outra – é um dos
sistemas de representação desenvolvidos culturalmente, adquiridos socialmente e
determinante dos procedimentos interpretativos de que dispomos. A cultura, nesse
sentido, está longe de ser um sistema estruturado e fixo de valores ou formas de
comportamento: ela é um processo dinâmico de produção de sentidos possíveis,
aceitáveis, legítimos, mantido e reforçado tanto por coletividades (instituições sociais
como a família, a religião, a escola) quanto por indivíduos.
Como explica Gina Cervetti (2001), “a realidade não pode ser conhecida em
definitivo, e não pode ser capturada pela linguagem; decisões sobre a verdade, portanto,
não podem basear-se numa teoria de correspondência com o real, mas devem, isso sim,
ser tomadas localmente”. Essa visão implica em assumir uma responsabilidade maior
sobre as decisões tomadas, já que o critério referencial para sua pertinência não está num
mundo exterior ao sujeito, independente dele, mas sim na percepção construída pelos
sujeitos em relação a suas concepções, a seus valores. Embora nossos valores sejam
socialmente construídos, o sujeito, como parte do mundo social, tem responsabilidade
sobre suas visões de mundo, sobre seus valores, já que eles resultam da interação do
sujeito com o mundo: não se trata simplesmente de um elemento dado naturalmente (ou
biologicamente) ao indivíduo. Ao falarmos sobre valores e visões de mundo estamos
falando sobre relações, sobre trocas estabelecidas entre o sujeito e seus mundos, sobre
entrecruzamentos de estruturas sociais e individuais. Tais trocas são determinadas
culturalmente, mas são também escolhidas pelo sujeito de acordo com suas preferências,
identificações, possibilidades. O sujeito, mesmo num mundo repleto de determinações
sociais, precisa assumir a responsabilidade por suas escolhas, já que faz parte deste
mundo e contribui para a constituição, o estabelecimento e a manutenção da sociedade.
O que pode ser considerado como conhecimento e validado pelos indivíduos e suas
comunidades, deste modo, é definido justamente por sistemas de representação transmitidos
culturalmente de modo a ter sua arbitrariedade apagada (BOURDIEU, 1992) e parecerem
83 naturais, dados, reais e portanto verdadeiros. Estes sistemas estão imbuídos de relações de
poder que não são inerentemente nem boas nem más, nem produtivas nem impeditivas: o
poder existente nas relações que se estabelecem entre pessoas, entre instituições, entre
formas de conhecimento, não é necessariamente uma coisa nem outra – mas o uso que se
faz dele, sim. O poder concebido desta forma não é algo que se possui, mas algo que se
exerce ou pratica, de diferentes maneiras em diferentes contextos e esferas (Foucault,
1983). Sem ser inerentemente negativo ou positivo, ele pode ser exercido de modo a criar
efeitos de superioridade, inferioridade ou igualdade entre os diferentes sistemas de
representação e, internamente a eles, entre as diferentes pessoas que constituem as
diferentes comunidades que por sua vez integram esses sistemas.
A percepção de nossa parcialidade e da localização de nossas perspectivas, ou seja, de
nossas determinações culturais, torna-se extremamente importante no pós-estruturalismo, a
fim de que não se percebam como naturais as relações de poder construídas culturalmente.
Assim sendo, o exame constante dos pressupostos e implicações de nossos entendimentos é
constitutivo desta visão: a consciência crítica e a reflexividade permanente instauram-se como
atitudes características do pensar pós-estruturalista.
Aqui, a língua constitui a realidade: se tudo o que temos são interpretações,
impressões, entendimentos determinados pelos procedimentos interpretativos a nossa
disposição e pelos entrecruzamentos discursivos que efetuamos (JORDÃO, 2001); se
não existe realidade independente do observador (MATURANA, 2001), então tudo o
que temos é a língua, ou como diria Derrida, “não há nada fora do texto”.
As implicações da visão pós-estruturalista para os professores de línguas estrangeiras
são imensas. Conceber língua como discurso, dentro desta visão, significa perceber as
estruturas de poder que permeiam a língua; significa conceber o conhecimento como
determinado social e lingüisticamente; significa entender língua e cultura como indissociáveis,
ou seja, inseparáveis não apenas porque sua união seja desejável, ou mesmo altamente
recomendável, mas porque mesmo que o quiséssemos não as poderíamos separar. É preciso
enfatizar essa relação entre língua e cultura já que, dentro de uma visão pós-estruturalista e
mais especificamente foucaultiana de discurso, sempre que se ensina língua se está ensinando
cultura, uma vez que cultura é concebida não apenas como os costumes
84 socialmente instituídos, transmitidos e partilhados, mas principalmente como conjuntos de
procedimentos interpretativos construídos socialmente, estruturas de pensamento que
possibilitam e legitimam determinadas interpretações (e excluem possibilidades de elaboração
de outras). Tais conjuntos existem na língua, adquirem materialidade na arena de conflitos de
sua existência social, nos contextos em que se estabelecem os enunciados. Como tudo o que
temos são interpretações, o que ensinamos quando ensinamos língua são interpretações, são
possibilidades de construção de sentidos, quer o façamos explicita e conscientemente, ou não.
Nessa visão, não há como recomendar ao professor de línguas que trabalhe com cultura em
sala de aula, pois ele estará sempre trabalhando com cultura, mesmo que não a tematize –
língua e cultura são indissociáveis, e não apenas por uma questão de vontade: ambas são
procedimentos interpretativos arbitrária e socialmente constituídos e legitimados,
interdependentes e mutuamente influenciadores.
Desse modo, a língua não é percebida como um código a ser decifrado, um
emaranhado de pistas que devemos investigar. Ao invés de mediar nossas relações
com o mundo, num mundo supostamente transparente e neutro, a língua constitui
nosso mundo, e não apenas o nomeia. Ela constrói discursos, produz efeitos de sentido
indissociáveis dos contextos em que se constituem (BAKHTIN, 1988). Conceber língua
como discurso é perceber a língua como ideológica, perpassada por relações de poder
que ela mesma constrói; é perceber as marcas de determinações culturais nos textos
que produzimos; é perceber os gêneros discursivos como mecanismos de
estabelecimento de sentidos possíveis.
Segue-se daí que a sala de aula de língua estrangeira é um local onde se estabelece o
contato com formas de entendimento diferentes daquelas legitimadas pela cultura nacional. É
um espaço de encontro com diferentes procedimentos de construção da realidade, de
confronto entre maneiras de produzir sentidos e de se perceber no mundo não características
daquelas que a língua materna nos apresenta. Segundo as Diretrizes Curriculares Estaduais
para Línguas Estrangeiras do Estado do Paraná – Versão Preliminar (2005: 155), “ao ensinar
uma LEM, não se ensina simplesmente um código lingüístico transparente e neutro,
dissociado dos processos de construção de identidades, dos contextos envolvidos na interação.
Ensina-se a perceber possibilidades de construção de significados, a elaborar procedimentos
interpretativos e a construir sentidos do e no mundo”. Desse
85 modo, dentro da perspectiva de língua como discurso, ensinar línguas estrangeiras é ensinar
procedimentos interpretativos determinados por culturas outras que não a cultura da língua
materna; aprender uma língua estrangeira é, por sua vez, aprender procedimentos
interpretativos de construção de sentidos, de percepções de mundo diferenciadas,
independentemente do grau de proficiência atingido. Assim, o espaço de sala de aula é
percebido como local de formação de subjetividades. Na sala de aula de língua estrangeira o
trabalho pedagógico possibilita marcadamente a construção/aquisição de dispositivos que
propiciam entendimentos de mundo diferenciados daqueles possibilitados pela língua
materna: a sala de aula de línguas estrangeiras pode oferecer aos alunos pares de lentes que
lhes permitam olhar o mundo diferentemente, lançando mão dos procedimentos
interpretativos utilizados discursivamente na língua estrangeira ou simplesmente estando
consciente da existência e conseqüentemente das possibilidades interpretativas das
determinações discursivas concebidas pela língua estrangeira. Ou ainda construindo novos
procedimentos interpretativos a partir da combinação e/ou da resignificação dos
procedimentos construídos em uma ou outra língua.
Portanto, na perspectiva do professor que concebe a língua como discurso, o valor
educativo do ensino e aprendizagem de língua estrangeira é o contato com procedimentos
alternativos de construção de sentidos, com perspectivas diferenciadas sobre os
acontecimentos, com maneiras variadas de entender o mundo. Para este professor, o valor
educativo da disciplina língua estrangeira prevalece como critério principal para a
escolha de atividades a serem desenvolvidas em sala de aula. Têm primazia sobre as
possibilidades de tratamento gramatical as potencialidades formativas da atividade, ou
seja, a capacidade que se tem, através do desenvolvimento de determinada atividade, para
levar os alunos à reflexão sobre o mundo fora da sala de aula, à consciência de seu papel
na sociedade, às possibilidades de ação informada que se lhe apresentam.
Esta concepção de língua leva à necessidade de reestruturação do sistema educacional.
Ela requer, além da revisão dos papéis sociais da escola e dos sujeitos que dela participam, um
modo diferente de formação profissional, muito mais participativa e que leve os professores à
conscientização sobre sua agência, sobre o papel social que eles desempenham na vida dos
alunos e de suas famílias, bem como das comunidades nas quais participam. Mais do que uma
formação em que os professores de línguas estrangeiras
86
aprendam técnicas para uso em sala de aula, ou conheçam abordagens teoricamente
coerentes e atuais, precisamos de cursos de formação em que os professores possam
exercitar sua reflexão, explorar possibilidades de atuação, construir soluções
provisórias coletivamente, perceber-se em seu assujeitamento e ao mesmo tempo
capazes de exercitar sua agência informadamente. Como escreveu Freire (1998:46), é
preciso “assumir-se como sujeito porque capaz de reconhecer-se como objeto”:
perceber-se assujeitado para reconhecer as limitações das estruturas de poder e
conseqüentemente agir sobre elas; perceber-se não só capaz de agir, mas agindo
independentemente de sua vontade, atuando sobre o mundo constantemente e capaz
de fazê-lo também conscientemente.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS PARANÁ. Secretaria da Educação. Diretrizes Curriculares da Educação
Fundamental da Rede de Educação Básica do Estado do Paraná – Versão Preliminar. 2005.
BOURDIEU, P. & PASSERON, J.C. A Reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1992.
FOUCAULT, M. Posfácio: The subject and power. In: DREYFUS, H.L. & RABINOW, P. (eds.) Michel Foucault: beyond structuralism and hermeneutics. Chicago: University of Chicago Press, 1983.
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