umbanda é xamanismo

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  • 7/27/2019 Umbanda Xamanismo

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    Umbanda Xamanismo - por AlexandreCumino

    H tempo venho estudando o Xamanismo, procurando estabelecer pontos desemelhanas e diferenas com a Umbanda. Uma das questes que me direcionou a esseestudo e sempre fez despertar minha curiosidade por outras culturas religiosas e

    espiritualidades diversas o fato de que na Umbanda se manifestam espritos de origensdiversas, desde um caboclo brasileiro, um escravo, um aborgene, um hindu, um inca ouegpcio.

    Essas entidades que alcanaram, e agora se manifestam na Umbanda, no foramumbandistas em sua ltima encarnao, logo nos ensinam que possvel evoluir eascender por meio de qualquer tradio, desde que encontre um caminho tico e umaproposta virtuosa. Querer conhec-los a esses mentores de Umbanda, mergulhar emuniversos diferentes e muito ricos cultural e espiritualmente. Essas incurses nos permitemdar conta de que h algo de incomum que permeia as vrias culturas do sagrado,independente da complexidade ou evoluo tecnolgica que certo povo tenha em relaoa outro.

    As experincias de transcendncia, a mstica, o transe e o xtase espiritual so inerentesao ser humano, so antropolgicos e encontrados em todos os lugares no espao e notempo. E da mesma forma encontraremos na Umbanda esses mesmos fenmenos que aliga e aproxima de todas as outras tradies. Esse algo em comum j fez muita gentepensar na existncia de uma religio primeira e original da qual todas as outras seriamdesdobramentos, enquanto evoluo e degradao da raiz primeva. Assim surgirammuitas teorias cientificistas defendidas por cristos, ocultistas, esotricos e atumbandistas, que adotaram a idia de aumband, que uma forma adaptada do conceitode teosofia, ambos com a racionalizao de um mito, o mito de uma religio pura, original,que permeia e est presente em todas as outras.

    As experincias comuns em todas religies so mais humanas que religiosas, maisespirituais que rituais, mais instintivas que metodolgicas, mais pertencentes sensibilidade que tcnica, muito mais poesia do que prosa. So experincia que vem de

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    nossas entranhas, so viscerais, humano, demasiado humano, existem desde que omundo mundo, desde que o homem homem, podemos assim busc-las nassociedades mais primitivas, antigas e simples.

    Essas experincias em sua forma mais bruta (no lapidada), nos mais isolados e remotosgrupos sociais que se tem notcia, em toda sua simplicidade em lidar com o transcendente,

    o que se convencionou chamar de Xamanismo. No entanto, as mesmas experinciasxamnicas, boa parte delas, se repetem em culturas mais complexas, consideradas maisevoludas socialmente ou tecnologicamente falando.

    O que Xamanismo, afinal?

    Mircea Eliada, um especialista no assunto, nos afirma que um xam pode ser um feiticeiro,um mago ou sacerdote, mas nem todo feiticeiro, mago ou sacerdote um xam, inclusivedefinindo que em muitas tribos, o sacerdote-sacrificante coexiste, sem contar que todochefe de famlia tambm chefe do culto domstico.

    O xam o grande mestre do xtase. Que tem por primeira definio desse fenmeno

    complexo, e possivelmente a menos arriscada: xamanismo = tcnica do xtase. E porxtase aqui podemos entender transe, estado alterado de conscincia.

    O xamanismo uma tcnica arcaica de xtase, ao mesmo tempo mstica, magia e religio,no sentido amplo do termo.

    Desde o incio do sculo, os etnlogos se habituam a chamar como sinnimos os termosxam, medice-man, feiticeiro e mago (em portugus poderamos acrescentar a essalista os termos curandeiro e paj nota da traduo da verso de 2002) para dotarcertos indivduos dotados de prestgio mgico-religioso encontrados em todas associedades primitivas (p15).

    Vemos na obra de Eliade, na traduo para o portugus, a observao de quepoderamos acrescentar a essa lista de xamanismo, os termos curandeiro e paj aolado de feiticeiro, mago e medice-man, o que nos leva pajelana indgena e pajelanacabocla e suas ramificaes e encontros com a cultura afro e europia, a qual fez surgemum sem nmero de espiritualidades.

    A pajelana indgena um xamanismo realizado pelos diversos grupos indgenas,guardando suas semelhanas e diferenas, em sua pluralidade de prticas, sem noentanto nos ater a quaisquer peculiaridades, podemos dizer que no geral e no especfico,seu conjunto de prticas xamanismo indgena brasileiro.

    A pajelana cabocla aquela praticada por grupos populares que tiveram ou no contatocom a pajelana indgena e que realizam prticas muito semelhantes, nas quais algus

    casos se verifica o praticante justificando a sua ao por meio da explicao de queincorpora o esprito de um paj (indgena) e que ele quem realiza a pajelana, na qual omdium em questo est em transe de incorporao.

    Agora, trazendo essa reflexo para a Umbanda, temos por parte dos caboclos queincorporam nos adeptos (mdiuns) trabalhos medinicos que podem perfeitamente sequalificar como pajelana, em muitos casos a justificativa de que se manifesta um cabocloque em vida (em uma das tantas encarnaes) foi um paj e que agora volta paracontinuar seu trabalho junto ao mdium de Umbanda como uma misso assumida. Comrelao a essa explicao podemos dizer que aqui quem realiza o xamanismo o esprito,no entanto, a um observador externo, fora dos conceitos teolgicos e doutrinrios, o quese v aquele homem ou mulher exercendo uma prtica xamnica, na qual suas

    explicaes sobre mediunidade e incorporao de espritos so simples observaes doque acontece com ele, o mdium, enquanto se realiza o processo que tem em si todas as

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    caractersticas xamnicas. Est incorporado de um esprito indgena, paj e xam, e nessemomento est realizando xamanismo, pois o mdium em sua constituio fsica est alipresente, seja consciente ou no desse fato. Se faz uma cura, essa se realizou por meiodele, a se fizer alguma bobagem, a culpa dele tambm.

    Ao incorporar um caboclo que trabalhe com prticas xamncias, posso no me tornar um

    caboclo, posso no me sentir um xam, mas de fato estou sendo o veculo dessa prticaque est acontecendo por meu intermdio, estou praticando xamanismo em parceria comuma fora, inteligncia, uma outra conscincia que toma a frente de meu mental e queidentifico como caboclo, uma entidade (esprito) manifestante da qual me consideroapenas um instrumento, mas que de fato est em mim, realizando a prtica xamnica.

    Talvez por esse e outros aspectos, o professor de teologia Edmundo Pellizari afirma que aUmbanda uma poderosa pajelana urbana, o que podemos, por associao, expressarcomo a Umbanda um poderoso xamanismo urbano; no apenas um xamanismo, masxamanismo, mas tambm xamanismo em algumas de suas expresses.

    Fontes consultados: ELIADE, Micea. O Xamanismo e as Tcnicas Arcaicas do xtase.

    So Paulo. Ed. Martins Fontes, 2002. CUMINO, Alexandre. Histria da Umbanda. SoPaulo, Editora Madras, 2010.