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TRÊS ARTISTAS E SEU FABULÁRIO ANIMAL
THREE ARTISTS AND THEIR ANIMAL FABULARY
Rosângela Miranda Cherem / UDESC Janaina Fornaziero Borges / UDESC
RESUMO Os animais fabulosos são uma característica comum a três artistas do século XX, moradores da Ilha-capital de Santa Catarina, embora apresentem muitas diferenças, em termos de procedência e emergência, tanto em relação ao seu arquivo pessoal, como às soluções poéticas. Franklin Cascaes visibiliza desenhos e textos com seres mitológicos, num esforço para registrar a diversidade cultural do homem litorâneo catarinense. Ernesto Meyer Filho desenha e pinta com a minúcia de um ourives uma coleção de vidas rastejantes, voadoras e andantes, resultante de combinações como sereias anfíbias, anjas, centauros, dragões, unicórnios, rochas antropomórficas, tatus-lagartos, veados-bois, pássaros-borboletas. Eli Heil cria formas assumidas como fruto de sua imaginação, cuja cosmogonia inclui anfisbenas e mandrágoras, além de um pássaro e seu ovo gigante. PALAVRAS-CHAVES Franklin Cascaes; Meyer Filho; Eli Heil; Animais; História da Arte. ABSTRACT The fabulous animals are a characteristic common to three artists of the twentieth century, residents of the island-capital of Santa Catarina, although they have many differences, in terms of provenance and emergence, both in relation to their personal archive, as the poetic solutions. Franklin Cascaes visibilize drawings and texts with mythological beings, in an effort to record the cultural diversity of the coastal man Catarinense. Ernesto Meyer Filho draws and paints with the nicety of a goldsmith a collection of creeping, flying and walking lives, resulting from combinations such as amphibian mermaids, anjas, centauros, dragons, unicorns, anthropomorphic rocks, tatus-lizards, deer-oxen, birds-butterflies. Eli Heil creates forms assumed as the fruit of his imagination, whose cosmogony includes amphisbaenians and mandrakes, in addition to a bird and its giant egg. KEYWORDS Franklin Cascaes; Meyer Filho; Eli Heil; Animals; Art History.
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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Refletindo sobre a diferença entre origem e começo a partir de Nietzsche, Michel
Foucault destaca que enquanto um termo remete ao entendimento de que se pode
chegar a um princípio primordial, ponto a partir do qual todo enredo passa a existir e
se desdobrar, o outro termo considera a origem como uma empreitada impossível,
uma vez que este ponto é inapreensível e sempre será arbitrário, sendo que só o
que se pode apreender são as tramas discursivas, as quais vão depender das forças
em jogo na determinação dos recortes e começos. Como fazer uso deste
entendimento e que proveitos o mesmo ainda pode render, considerando o campo
de História da arte?
Tomemos um exemplo: existem abundantes e variadas representações de animais
desde um período muito remoto das experiências humanas. Tais figurações estão
desenhadas nas paredes pré-históricas, esculpidas nos palácios da antiguidade,
coloridas nas iluminuras medievais e assim por diante. Ora estão marcadas por uma
vitalidade realista, ora estão imaginadas como formas híbridas e metamorfoseadas.
Conforme as circunstâncias são dotadas de caráter mais simbólico e religioso ou
meramente ornamental. De todo modo, estão presentes nas mais diferentes
sociedades e tempos. Na atualidade os artistas continuam recorrendo às formas
animais, seja para pensar a vida humana, a relação com a natureza, com a ciência
ou qualquer outra temática que considere conveniente dentro de seu leque poético e
processo investigativo. Assim, se é verdade que as formas animais possuem
enquadramentos cronológicos e sociais específicos, também é verdade que elas
escapam destas molduras e talvez seja este um bom motivo para pensarmos o
quanto elas ainda nos afetam, apesar de sua origem imprecisa em termos de
significados e perturbadora em termos de significantes.
No sentido de considerar as complexidades do pensamento plástico, longe de contar
uma história universalizante, capaz de tudo abarcar sobre a iconologia ou a
imagética animal, um recorte mais delimitado pode ser bastante proveitoso. Vejamos
se tal afirmação é procedente quando o tema se refere aos animais na Ilha-capital
de Santa Catarina, tal como registrado por três artistas aqui destacados: Franklin
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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Cascaes (1908 – 1983, Florianópolis/SC), Ernesto Meyer Filho (1919, Itajaí – 1991,
Florianópolis/SC) e Eli Heil (1929, Palhoça – 2017, Florianópolis/SC). Embora
tenham se empenhado para abordar a temática animal, se observados com maior
acuidade, seus trabalhos guardam enormes diferenças. Comecemos por observar
as singularidades de cada um.
Registrar o conhecido e testemunhar o espantoso
Franklin Cascaes não possuía o ensino médio, mas sua formação básica esteve
voltada para ser professor de artes, considerando uma trajetória formada pelas aulas
de desenho, modelagem e escultura na Escola de Aprendizes Artífices, sendo que
uma parte desta bagagem também foi adquirida por correspondência, depois
ampliada nos cursos de desenho e de museologia, ambos feitos no Rio de Janeiro.
Em sua biblioteca pessoal encontram-se alguns livros de mitologia medieval
(dragões e bruxaria), história da Bíblia, mitos e lendas de Roma Antiga, além de
revistas científicas vendidas para leitores leigos. Desde 1931 apresentou seus
trabalhos, notadamente esculturas, em igrejas, escolas, cines e clubes, quer em
bairros da cidade em que nasceu, como Estreito e Itaguaçu, ou os municípios
próximos, como Imaruí e São José, além de cidades como Criciúma, Tubarão,
Tijucas, Blumenau. Em 1959, finalmente, apresentou-se no Museu de Arte de
Florianópolis.
Distanciado das principais interlocuções e do que então eram considerados
epicentros artísticos, seus registros não apresentam referências relacionadas a um
repertório europeu, mas prioriza a clave litorânea mais próxima, cujo palco era,
sobretudo, a cidade em que nasceu. Trata-se menos de buscar a representação
visual realista e mais de um local que servia como cenografia para os procedimentos
paródicos, de um artista que se reconhecia como um antropólogo-amador, ou um
colecionador de costumes e crenças, sendo possível observar uma sensibilidade
voltada para o tema do primitivo, muito próxima de certas nuances surrealistas do
período do entre guerras. Todavia, aqui parece necessário ponderar uma importante
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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diferença: a perturbadora convicção e proximidade de Franklin Cascaes com o
objeto, processado mais como verdade inquestionável do que como licença poética
ou ficção artística. Em seus 476 manuscritos avulsos e em seus quase 150
cadernos, além de cartazes feitos para suas próprias exposições, ele insiste no
caráter folclórico e enfatiza a dimensão do imaginário litorâneo de seus desenhos
feitos com grafite e bico de pena, frequentemente refeitos da primeira para a
segunda fatura, validando seu interesse, ora pelo repertório de uma cultura iletrada,
ora por criar um repertório ótico para seu Estado.
A partir da vasta documentação pertencente à coleção Elizabeth Pavan Cascaes no
Museu de Antropologia da UFSC, é possível constatar duas maneiras a que recorria
para levar a cabo suas sensibilidades e percepções: os desenhos silenciosos que
não eram replicados, estendidos e/ou acompanhados por textos escritos e os
desenhos que eram rebatidos em produção textual. Do primeiro grupo, destaca-se
uma série de seres marinhos e do segundo, os seres antropozoomórficos,
frequentemente acompanhados de escritos sob forma de explicação rascunhada e
complementar. Em ambos os casos, trata-se de seres entendidos como mitológicos,
delineados pelo esforço de elaborar um sentido simbólico, cujos signos pudessem
ser partilhados numa abrangência de caráter pedagógico sobre a diversidade
cultural do homem litorâneo catarinense. Deve ser ressaltado que, para fins desta
apresentação, estão excluídas as representações humanas e as bruxas. Apesar de
que em sua biblioteca constassem revistas como Conhecer, Naturama e Realidade,
Franklin Cascaes preferia afirmar um território com uma diversidade de formas
híbridas, tal como se observa no desenho intitulado Olho-tesoura ou no desenho
Boi-guaçu, para o qual acrescenta tratar-se de uma mistura de cobra e boi que
conforme a mitologia indígena devorava as pessoas, fazendo com que os olhos
comidos iluminassem seu corpo à noite.
Na série de mitologia marinha, realiza o gesto imaginar seres num território desviado
da natureza, embora baseado nas próprias denominações conhecidas, tal como no
caso de O fundo do mar com sereia, dragão e cérbero; Rádio oceanográfica, Peixe
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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bocica (Figura 1); Galinha do mar; Peixe porco; Peixe simoníaco; Bagre-morcego;
Peixe espada; Peixe cana; Peixe marreco. Na série de seres antropozoomórficos
merece destaque o gesto compulsivo presente nos desenhos feitos sobre todo tipo
de papel, incluindo pedaços reaproveitados e colados, deslindando uma espécie de
pensamento que opera por extensão e acumulação, produzindo um deslocamento
que segue do pilhado ao imaginado, ao desenhado, ao escrito e assim por diante.
No registro que encena uma língua iletrada e nativa, é possível reconhecer menos
uma história infantil e mais um estado delirante que contamina ou concilia ancestral-
sideral, bruxa-pombo, local-universal, mito-ciência.
Figura 1. Franklin Cascaes, Peixe bocica, 1974. Nanquim sobre papel, s/d.
Fonte: Acervo do Museu Universitário Professor Oswaldo Rodrigues Cabral-Secretaria de Cultura e Arte/ Universidade Federal de Santa Catarina.
Em Baleia Cabeluda merece destaque um desenho-colagem com três tipos de papel
emendados, os quais incluem no verso um desenho de carro de boi sobre rascunho,
onde o artista reflete sobre argila e lodo, deixando a pista para alcançar seu próprio
pensamento plástico que opera pelo princípio de metamorfose e contra-forma “Da
tua ciência ó homem/Não quero obter nem um naco/ Tu és um homem de
lama/Descendente do macaco” (faltou referenciar). Cabe ressaltar que o artista possuía
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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dois cadernos onde montou um dicionário, ou seja, elegeu palavras e atribuiu-lhes
significado, seguindo uma ordenação de palavras na língua tupi-guarani e outra em
português. Suas criaturas recebiam denominação conforme uma composição
silábica, frequentemente extraída destes cadernos. É ali que se pode compreender
sua série com bois, cabras, vacas, bodes complementados pelo nome de tatás,
sinônimo de fogo na língua tupi, observando assim Figura 2 logo abaixo:
Figura 2. Franklin Cascaes, O Boitatá, 1968. Nanquim sobre papel, 47,8 x 64,0 cm.
Fonte: Acervo do Museu Universitário Professor Oswaldo Rodrigues Cabral-Secretaria de Cultura e Arte/ Universidade Federal de Santa Catarina.
Além das formas femininas abordadas como bruxas, inúmeros seres masculinos e
híbridos frequentam seu repertório imagético, tais como: Demo-surfista (1981);
Ferrabrumi, Hobarra (referências antropofágicas); Hobarcu, Abahurupur, Mocobrupe
(abrangência cósmica: terra, ar-céu, mar-profundezas-infernos); Monsbarfo: trinóculo
Crinisparso, Mons/tro bar/co foguete. Em todos estes, Franklin Cascaes coloca em
cena dados e registros conforme uma pesquisa de campo, incluindo explicações
complementares. Mas ao fazer isto, frequentemente carnavaliza as formas, como no
caso de: Procissões, conjuntos bem humorados e específicos de produtos locais
como tainha, café, laranja, mandioca; além de Peruando; Cabeça sem mula; Cobra
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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com duas cabeças; Cactos voadores (com asas). Bule, associado a vértebras de
baleia ou em um desenho sem titulo com o corpo de leme de lancha de baleeira
como identificamos na Figura 3.
Figura 3. Franklin Cascaes, Sem título, 1969. Nanquim sobre papel, 52,5 x 36,7 cm.
Fonte: Acervo do Museu Universitário Professor Oswaldo Rodrigues Cabral-Secretaria de Cultura e Arte/ Universidade Federal de Santa Catarina.
Maquinar o delírio e (des-) conjuntar as formas
Seguindo na contramão do realismo, nelas vigora uma potência imaginativa que se
multiplica incessantemente e cuja geração de seres híbridos resulta em invenções
surpreendentes e inversões perversas, produzindo uma coleção de vidas
rastejantes, voadoras e andantes, resultante de combinações entre os reinos animal,
vegetal e mineral e/ ou compostos orgânicos e inorgânicos, tais como sereias
anfíbias na Figura 4, anjas, centauros, dragões, unicórnios, rochas antropomórficas,
tatus-lagartos, veados-bois, pássaros-borboletas.
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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Figura 4. Meyer Filho, A sereia anfíbia, 1974. Nanquim sobre papel, 37 x 32.3 cm.
Fonte: Livro, Meyer Filho: (exercício de imaginação). Sandra Meyer, Kamilla Nunes e Teresa Siewerdt (organizadoras), Florianópolis: Instituto Meyer Filho, 2011.
Meyer Filho inventa novas taxionomias, originárias da botânica e da zoologia, da
agricultura e da astronomia, da história da arte e da mineralogia. Registrando
espécies e variedades diferentes das encontradas, tanto no macro como no
microcosmo, opera através de cortes e desmontes, acabando por produzir novas
sínteses e composições, formas e conteúdos. Concebendo a arte em sua articulação
planetária e como ponto luminoso que ocupa seu lugar no universo, em seus
trabalhos comparece um bestiário antropozoomórfico, cujo parentesco remete ao
antigo oriente e ao mundo medieval, à mitologia dos viajantes e às experimentações
científicas mais atuais. Para além das referências de seu meio como o imaginário
ilhéu e a cultura popular, as lendas e as crendices ou dos eventos de seu tempo,
filtrados pelos meios de comunicação e relativos às experiências atômicas e à
conquista espacial, aos conhecimentos derivados do microscópio eletrônico e dos
satélites, impossível ignorar a frontalidade egípcia recombinada anacronicamente
com a gramática surrealista, o psicodelismo casado com a arte-pop. De modo
impremeditado, rearmam-se os gabinetes de curiosidades e as coleções, as quais
desde o renascimento se constituíam numa espécie de relicário profano e cujos
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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critérios constelares e operações obsessivas faziam fluir estranhas classificações e
combinações entre naturalias e artificialias. Prefigurações da natureza inventada
pela relação entre ciência e arte na contemporaneidade, seus corpos perturbadores
e com elevada dose de ambiguidade despontam como reproduções desordenadas
e/ ou como máquinas esplendorosas, aberrações maravilhosas da engenharia
genética e/ ou da arquitetura ecológica. Podemos ver alguns desses exemplos na
Figura 5.
Figura 5. Meyer Filho, Sem título, 1982. Acrílica sobre Eucatex, 110 x 80 cm.
Fonte: Acervo Adriano Pauli.
Assim, suas pinturas contemplam um sol com brilho lunar, as rochas são ainda
adornos dormentes e amolecidos aguardando o toque para despertar,
apresentando-se como blocos polimórficos, enquanto as nuvens se formam como
maciços que se abrem para a alteridade do cosmos. Por sua vez, a água do mar
emerge como um muro de vidro espelhando um céu fosco, enquanto as penas dos
pássaros surgem como lantejoulas e as folhagens como pétalas-escamas-ovos-
olhos. Híbridos, anfíbios, esfinges e seres alados portam ora estranhas tatuagens,
ora surpreendentes e contrastantes penugens-plumas. E mesmo que possuam
chifres ou cristas, há em seus rostos uma estranha familiaridade humana. Em certas
ocasiões uma referência brota do tocado em forma de coroa faraônica ou do
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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capacete em forma viking, mas como ignorar o rabo bifurcado numa mão-flor e as
estampas corporais que multiplicam corações-ocelos e remetem aos traços do pós-
humano? Do mesmo modo, faisões-lagartos e peixes-homens são apresentados
através das minúcias do precioso e pelo artifício de uma aleatoriedade calculada
com a mesma desenvoltura da flor-casulo, da cabeça-chapéu, da árvore-vitral, da
boca-cachimbo, da cauda-mosaico, dos falos-torpedos ou de assoalhos-ladrilhos e
bordados de flores-estrelas.
No registro de um mundo orgíaco, compósito e andrógeno, cuja potência
ambivalente e desmedida afeta todos os seres, implicando numa indistinção
licenciosa e cômica é que surgem galos-sereios, pássaros-pênis, corpos-vasos,
rostos-testículos, glandes-corações, pedras-nádegas. Mascarada do humano e do
animal, os atributos da sexualidade guardam suas ambivalências e derivações. Um
cachimbo acomodado na boca é, ao mesmo tempo, extensão e orifício; enquanto
um dos testículos contém um rosto que remete aos traços masculinos, o outro
sugere o feminino; por sua vez, o barco que avança é penetrado pela cabeça e a
língua gulosa que se lança para fora é a mesma que suga e absorve. Enquanto um
enorme pênis jorra seu líquido feito torneira para saciar o minúsculo animal que o
aguarda embaixo, sua ponta com o olho invertido é uma cabeça amolecida de cobra
que repousa sobre uma muleta, recolocando um falo desfalecido.
Espécie de catarse ótica que domestica o sinistro ou cilada astuciosa que pretende
driblar a putrefação e triunfar sobre a finitude, a alteração das formas encontra aqui
sua impagável importância. Se o acaso é a fonte geradora da vida, a distribuição de
suas forças é contingente, bem como os motivos que levam a medi-las. Assim,
através dos detalhes sutis pode-se reconhecer que o paraíso já nasceu babélico,
sendo portador de uma inexorável beligerância desde seu alvorecer. Se por vezes o
pecado e a maldade se insinuam, em certas ocasiões são indisfarçáveis, sendo as
disputas e lutas indicadas pela presença de aljavas, caveiras, lanças, cavaleiros,
caçadores e/ou galos que pinicam. Segundo com a lógica de Nietzsche (1987) no
mundo em que a natureza é farsa e burla pouco valem os recursos de advertência e
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pregação, pedagogia e lei, sendo que os mesmos podem apenas restabelecer os
jogos de força através de disfarces, recolocando e confirmando os atributos
constitutivos desta natureza irresoluta.
O galo surge como um ser poderoso e capaz de impor sua potência seminal, eleito
pelo artista como o emblema da virilidade. Assim, no território onde ele habita
resplandecem em luz solar ou brilho noturno as árvores, flores e pedras, revelando
uma natureza afetada pela sua nobreza galática e podendo se fazer acompanhar
por uma corte de dóceis querubins, disfarçados de minúsculos pássaros, lagartos e
tartarugas ou mini-bois, dragões e assim por diante. Reconfigurando variados
elementos, tais como unhas, pétalas, ovos, folhas, pedrarias e vidrilhos, o efeito é
suntuoso e luxuriante. Mesmo quando se revestem com economia de cores, suas
asas se parecem com um manto plumário e sua roupagem não abandona o
dispêndio das minúcias bordadas por um exímio joalheiro. Como Zeus em suas
aparições inusitadas, observa-se sua elevada capacidade mutante: a crista pode se
tornar chifre, cocar ou coroa, as penas escamas-jardim e o papo bolsa escrotal-
nádegas. Senhor do império do ornamento, sua vestimenta real, extravagante e
esplendida, afirma-se nas penas multiformes e multicoloridas, tecida com diversos
materiais, os quais aparecem pelo recurso de colagens e sobreposições de selos,
conchas, anotações e carimbos, como na figura 6 abaixo:
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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Figura 6. Meyer Filho, Galo filatélico nº 5 – arte postal e colagem, 1985. Nanquim e selo sobre papel,
45 x 32 cm. Fonte: Livro, Meyer Filho: (exercício de imaginação). Sandra Meyer, Kamilla Nunes e Teresa Siewerdt (organizadoras), Florianópolis: Instituto Meyer Filho, 2011.
Engendrar o vínculo primordial e processar a fabulação
Eli Heil foi pintora, desenhista, escultora, ceramista, tapeceira e poeta. Inventou as
mais diversas soluções técnicas a partir do uso de materiais como saltos de sapato,
tampos de bacio, caixas de fósforo, tubos de tinta e canos de PVC, etc. Participou
de inúmeras exposições individuais e coletivas no Brasil, incluindo cidades como
Florianópolis, Blumenau, Criciúma, Joinville, Curitiba, Brasília e São Paulo, bem
como países no exterior: França, Holanda, Espanha, Marrocos, dentre outros.
Segundo Amarante (1989), entre suas mais de duzentas participações, consta
também a XVI Bienal Internacional de São Paulo em 1981, cabendo uma sala
especial para um tipo catalogado como arte incomum.
Sem nenhuma formação especializada, sua atividade criadora se revelou aos 33
anos, após uma carreira com professora de educação física numa escola primária,
uma entrevista concedida ao Jornal O Estado (1984): “sou uma artista cuja mente
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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ficou grávida durante cinco anos para depois renascer e produzir aos borbotões (...)
sou uma maternidade artística”. No catálogo da exposição Eli Heil, 85 anos, seu
curador e médico, Ylmar Corrêa Neto (2014) chama atenção para “sua copiosa
produção, cujos detalhes contemplam pequenas epifanias”. Lembrando
denominações como outsider e marginal, o curador também remete ao termo
primitivo e bruto para reconhecer um tipo de artista com um repertório visual
proliferante, cujas técnicas e vocabulário se desenvolvem de modo muito
espontâneo e perturbador, à maneira das crianças e loucos. (p.11)
Tal aspecto se explicita no seu livro de crônicas e poesias Vomitando os
sentimentos (2000), onde constam seus desenhos e poemas com teor muito
biográfico, sendo que a relação recorrente com a palavra poética pode ser
reconhecida em inúmeros de seus quadros. Vaso Cérebro, datado de 1970,
Vomitando Criações, de 1974, Mulheres Bicho, de 1990, Olhos D’Alma, de 2008 são
alguns títulos que permitem estabelecer um elo entre a realidade e um mundo
imaginário ao qual só a artista tem acesso. Destaque para o fato de que o tema da
ave e seu ovo gigante aparecem desde seu primeiro quadro: “A arte é a expulsão
dos seres contidos, doloridos, em grande quantidade, num parto colorido (...) o
mundo ovo é a explosão do meu cérebro e do meu ovário” (p.17). Em diversas
entrevistas registra que, logo após os primeiros meses em que decidiu pintar,
sonhou que era uma bailarina com seu cérebro na mão e, em outra ocasião, sonhou
com um pássaro que pousou no seu telhado e gritou: estou caído! (p.19).
Tinha cerca de 58 anos quando finalmente construiu o espaço definitivo que lhe
serviu como ateliê, moradia e acervo expositivo, após 25 anos de vida artística. Sua
obra constitui-se em mais de dois mil trabalhos e seu acervo pode ser visitado no
museu O Mundo Ovo de Eli Heil, criado em 1987 no bairro de Santo Antônio de
Lisboa, lado norte da Ilha-capital de Santa Catarina, transformado em Fundação
Mundo Ovo em março de 1994. Imagem cosmogônica e forma originária, a partir
desta imagem- forma Eli Heil foi capaz de realizar, tanto uma inflexão em relação ao
seu meio, como passou a se reconhecer enquanto artista.
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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Na sua cosmologia mágica a figura do animal emerge com as mais inusitadas
formas. O pássaro principalmente é seu bicho predileto, como podemos ver na
Figura 7. Três vidas, 1974 consiste num mural divido em três partes coloridas, sendo
que cada uma representa um tipo de espécie de vida:
vegetal, animal e a humana. Flores/amebas, dinossauros, cérebro, formas signicas, emblemísticas, quase um código. Embora tenha reservado uma faixa para cada reino, nota-se como em Eli a simbiose deste três níveis é constante, o que sempre percebemos em seus bichos e pessoas que desdobram-se em flores, em personagens que parecem bichos, e vice-versa. (LORENZ, 1984, P.79).
Figura 7. Eli Heil, O pássaro, 1999. Esferográfica sobre papel, 44 x 62 cm. Fonte: Coleção particular do Museu Mundo Ovo.
No seu quadro Furna (1976) encontra-se a forma cilíndrica de onde surgem seres
prontos para voar. Trata-se de figurações relacionadas a um bestiário muito
particular: dragões, anfisbenas e mandrágoras, todos muito coloridos: “estes bichos
não assustam, quanto mais terríveis na aparência, para mim são mais doces, mais
eu gosto” (LORENZ, 1984, P.81). A forma cilíndrica da furna aparece também em
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outros quadros como se o animal estivesse tentando sair dessa geometria, mas que
ao mesmo tempo integra seu corpo. Como percebemos na Figura 7:
Figura 8. Eli Heil, Sem título, 1979. Acrílica sobre tela, 157 x 290 cm.
Fonte: Acervo do Masc, tombo n.º0525.
Para a artista, tratam-se de seres reais, que dançavam em seu cérebro, formas
hibridas em incessante metamorfose. Trata-se de pássaros, minhocas, peixes,
amebas, gatos sempre prontos a voar, rastejar, copular e/ ou terem suas caras
assemelhadas ao rosto humano, ver figura 9. Com seus olhos esbugalhados, muitas
vezes são montados e incorporam diferentes materiais, incluindo dentes humanos.
Assim, essas massas que saltam para fora da área pictórica são como aparições,
ora familiares, ora personagens de acidentes e fatalidades. Em seus quadros e
esculturas tornam-se viventes e recebem as mais distintas denominações:
Jacaré-ovo, Animal-ovo, Bicho-ovo, Animal ovíparo. Bicho-folha, Mãe cobra no ninho, Bicho-flor, Galinha chocada, Comedor de ovos, Animal cobra, Pedras, cobra e flores, Cobrinha, Bicho fêmea, Bicho- ovíparo, Enrolado, Galinha cheia de ovos, Peixe pássaro, Cobra-peixe ovíparo, etc. “Os pássaros? São momentos, são tudo que me vêm (ideias); as vezes, acho que estou voando, como pássaro. Estão tão alta, em relação às pessoas, que me duplico, me divido. Eu mesmo sou como diversos pássaros. Daí os animais todos botam ovos. Não vê como eu faço animais carregando ovos?” (Eli, apud LORENZ, 1984, p. 94).
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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Figura 9. Eli Heil, Sobrevoando, 1991. Óleo sobre tela, 60 x 90 cm.
Fonte: Acervo do Masc, tombo n.º1601.
De volta ao princípio (do texto)
Muito já se disse sobre o fato de que a Arte, como a Filosofia, remete sempre às
mesmas questões e que toda obra se constitui num universo ou labirinto portátil que
guarda uma profusão de incontáveis refrações e inumeráveis inquietações, numa
espécie de projeção infinita. Próximo deste ponto chega-se ao entendimento de que
a obra de arte é, ao mesmo tempo, clausura e escapatória, sendo que seu alcance
tem menos a ver com os encadeamentos cronológicos e mais com a reinstauração
de enigmas, potencializados pela conexão entre descontinuidades e pelas
particularidades de certos detalhes irredutíveis que retornam.
Neste sentido, enquanto para Bataille (2003) o animal consiste no primeiro espelho
humano e no mais antigo e próximo vestígio de nossa ancestralidade, para Derrida
(2002) o animal é a imagem do humano que ali se reconhece em sua semelhança-
alteridade, posto que se trate de um ser que produz linguagem. E porque se percebe
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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nu e em falta, nomeia e se faz autobiogáfico. Pressentindo uma perda e elaborando
um luto, aquele animal que se denominou humano produziu uma zoosfera povoada
por um bestiário com assobrado parentesco, carnavalizando a morte desde os
tempos da caverna. Fazendo-se animot, ou seja, animal que se percebe múltiplo e
produz pensamento-palavra, seu ancestral sobrevive na imagem do gato pelas
poesias de Baudelaire, do corvo pelos contos de Poe ou no tigre pelos escritos de
Borges. Dentre tantas possibilidades também se tornou bode pelas telas de Chagal
e touro pelas tintas de Picasso. Eis o ponto que incide a imagem do humano-animal:
figura que se faz no mundo, encenação e sonho, delírio e ficção.
Tanto os trabalhos de Franklin Cascaes, como os de Eli Heil e de Meyer Filho
oferecem diversas questões para pensar a imagem do animal e sua relação com a
História, a Teoria e a Crítica da Arte. Através do repertório ímpar e intransferível de
cada um é possível refletir sobre as diferentes noções operatórias que trouxeram ao
mundo suas figuras híbridas, desproporcionadas e jocosas, capazes de realizar
travessias para além dos limites do meio em que viveram. Assim, se a arte é
linguagem e, portanto fala, é preciso lê-la nos seus próprios termos.
Referências
AMARANTE, Leonor. As bienais de São Paulo, 1951-1987. São Paulo: Projeto, 1989. BATAILLE, G. Lascaux o el nacimiento del arte. Argentina: Ed. Alción, 2003. CORREA NETO, Ylmar. Eli Heil, 85 anos. Florianópolis: FCC, 2014, p. 11. DERRIDA, J.O animal que logo sou. São Paulo: Ed. UNESP, 2002. HEIL, Eli. Vomitando os sentimentos. Florianópolis: Fundação, 2000. LORENZ, Jandira. A obra plástica de Eli Heil. Florianópolis: FCC, 1984. MALLMANN, Regis. Eli Heil. Florianópolis: Tempo Editorial, 2010, p.14. NIETZSCHE, F. Para a genealogia da moral. In: Os pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1987. JORNAL O ESTADO. 08-07-1984.
CHEREM, Rosângela Miranda; BORGES, Janaina Fornaziero. Três artistas e seu fabulário animal, In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISADORES EM ARTES PLÁSTICAS, 28, Origens, 2019, Cidade de Goiás. Anais [...] Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019. p. 763-780.
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Rosângela Miranda Cherem
Doutora em História pela USP (1998) e Doutora em Literatura pela UFSC (2006); Profa. Associada de História e Teoria da Arte no Curso Artes Visuais e Programa de Pós-graduação em Artes Visuais no Centro de Artes da Universidade do Estado de Santa Catarina; coordenadora do Grupo Imagem-acontecimento; orienta, possui pesquisas e publicações sobre História das Sensibilidades e Percepções Modernas e Contemporâneas; atualmente desenvolve pesquisa intitulada Acervos e Arquivos artísticos em Santa Catarina, implicações e conexões.
Janaina Fornaziero Borges
Licenciada em Artes Visuais pela Universidade Estadual de Maringá (2016); Mestranda do Programa de Pós-graduação em Artes Visuais pela Universidade do Estado de Santa Catarina no Centro de Artes CEART/UDESC na linha de Teoria e História das Artes Visuais (2018); integrante da Equipe Editorial da Revista Palíndromo do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais e do grupo de Pesquisa História da arte: Imagem-Acontecimento.