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Treliças espaciais formadas por perfis tubulares de aço: design bio- inspirado e dimensionamento via Algoritmos Genéticos” Juarez Franco 1 , Eduardo de Miranda Batista 2 , Alexandre Landesmann 3 Resumo O objetivo deste trabalho é uma metodologia de procura de soluções arquitetônicas inusitadas e competitivas para treliças espaciais com perfis tubulares de aço, próprias para grandes vãos. Esta proposta é apresentada em duas partes: (i) analogias formais com a Natureza e (ii) síntese estrutural através de Algoritmos Genéticos. A sinergia entre estas ferramentas busca refinar a concepção arquitetônica inspirada na observação da Natureza, minimizando a função custo sem prejuízo de considerações estéticas. São observadas limitações de montagem, efeitos de não linearidade geométrica, ação de vento e as recomendações do projeto de norma ABNT “Projeto de estruturas de aço e de estruturas mistas de aço e concreto de edificações com perfis tubulares” no critério de dimensionamento. Palavras-chave Estruturas de aço, treliça espacial, perfis tubulares, síntese estrutural, algoritmos genéticos. 1 Arq to , Aluno de Doutorado, COPPE/UFRJ – Programa de Engenharia Civil; [email protected] 2 Engº Civil, Professor Associado, COPPE/UFRJ – Programa de Engenharia Civil; [email protected] 3 Engº Civil, Professor Adjunto, COPPE/UFRJ – Programa de Engenharia Civil; [email protected] CONSTRUMETAL 2010 – CONGRESSO LATINO-AMERICANO DA CONSTRUÇÃO METÁLICA São Paulo – Brasil – 31 de agosto a 2 de setembro 2010

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Page 1: Treliças espaciais formadas por perfis tubulares de aço ... · arquitetônica e estrutural motivada pela observação da Natureza e (ii) os modelos numérico- ... decomposição

“Treliças espaciais formadas por perfis tubulares de aço: design bio-

inspirado e dimensionamento via Algoritmos Genéticos”

Juarez Franco1, Eduardo de Miranda Batista2, Alexandre Landesmann3

Resumo

O objetivo deste trabalho é uma metodologia de procura de soluções arquitetônicas

inusitadas e competitivas para treliças espaciais com perfis tubulares de aço, próprias para

grandes vãos. Esta proposta é apresentada em duas partes: (i) analogias formais com a

Natureza e (ii) síntese estrutural através de Algoritmos Genéticos. A sinergia entre estas

ferramentas busca refinar a concepção arquitetônica inspirada na observação da Natureza,

minimizando a função custo sem prejuízo de considerações estéticas. São observadas

limitações de montagem, efeitos de não linearidade geométrica, ação de vento e as

recomendações do projeto de norma ABNT “Projeto de estruturas de aço e de estruturas

mistas de aço e concreto de edificações com perfis tubulares” no critério de dimensionamento.

Palavras-chave

Estruturas de aço, treliça espacial, perfis tubulares, síntese estrutural, algoritmos

genéticos.

                                                            1 Arqto, Aluno de Doutorado, COPPE/UFRJ – Programa de Engenharia Civil; [email protected] 2 Engº Civil, Professor Associado, COPPE/UFRJ – Programa de Engenharia Civil; [email protected] 3 Engº Civil, Professor Adjunto, COPPE/UFRJ – Programa de Engenharia Civil; [email protected] 

CONSTRUMETAL 2010 – CONGRESSO LATINO-AMERICANO DA CONSTRUÇÃO METÁLICASão Paulo – Brasil – 31 de agosto a 2 de setembro 2010

Page 2: Treliças espaciais formadas por perfis tubulares de aço ... · arquitetônica e estrutural motivada pela observação da Natureza e (ii) os modelos numérico- ... decomposição

Introdução

Design bio-inspirado é o processo e o produto da sinergia entre a (i) concepção

arquitetônica e estrutural motivada pela observação da Natureza e (ii) os modelos numérico-

computacionais de otimização em engenharia baseados em Algoritmos Genéticos (AG).

Trata-se de uma ferramenta de engenharia para o projeto arquitetônico de estruturas não

usuais, onde não exista experiência prévia de dimensionamento.

Seu propósito é explorar as possibilidades formais e estruturais das treliças espaciais

em aço, visando sua inovação, competitividade e sustentabilidade. Estas três noções, que

permeiam processos distintos, ajudam a explicar desde a seleção natural das espécies até

algumas escolas de economia e computação. Isto acontece porque a idéia de que as soluções

observadas na Natureza são a resposta mais eficaz para um dado problema nos leva ao desejo

de transpor estas soluções para os domínios humanos, na expectativa de atingir também os

melhores resultados com o menor custo possível.

Em certos setores da ciência as analogias com a Natureza são sistemáticas: biônica,

inteligência artificial, robótica, nanorobótica, engenharia bélica e de materiais são apenas

alguns exemplos. Em arquitetura e engenharia civil, um dos pesquisadores mais famosos das

analogias entre estruturas técnicas e naturais é Frei Otto, do Instituto de Estruturas Leves, em

Stuttgart.

Na construção civil não existe engenharia reversa que transcreva literalmente

estruturas naturais em estruturas técnicas, porque os processos construtivos e as funções

desempenhadas em cada caso são diferentes. Copiar significaria impor a “melhor solução”

para o problema errado. Por isto, a ênfase em nosso aprendizado recai sobre os princípios

mecânicos essenciais da Natureza. No último século, a menos que o custo da edificação não

fosse uma condicionante, analogias formais tinham grande chance de serem descartadas.

A adaptação aos novos tempos pode mudar este cenário. Os motivos convergem de

diversas frentes: (i) na Arquitetura, o “espírito de época” que deseja o equilíbrio das

demandas humanas com a capacidade da Natureza de supri-las ainda não encontrou uma

expressão regional. Em outros países, isto representou uma fusão do movimento HighTech

com princípios de racionalização de consumo energético. Nicholas Grimshaw, Jean Nouvel e

Norman Foster estão entre os grandes arquitetos que já produziram nesta linha; (ii) na

engenharia, a robustez dos sistemas computacionais e dos métodos numéricos de análise e

otimização permitem proposição de estruturas com índices de desperdício cada vez menores.

Page 3: Treliças espaciais formadas por perfis tubulares de aço ... · arquitetônica e estrutural motivada pela observação da Natureza e (ii) os modelos numérico- ... decomposição

Entre estes métodos estão os AG, que empregamos neste trabalho; (iii) Na cadeia produtiva

do aço, a tecnologia de Controle Numérico por Computador (CNC) pode levar ao

barateamento de construções out-standard; (iv) nas Normas Brasileiras, atualizações recentes

apontam para a competitividade das seções tubulares de aço.

Acreditamos que esta seja uma linha de investigação contemporânea e necessária. Em

uma reedição recente do clássico “Sistemas de Estruturas”. ENGEL (2006, p134) afirma que

“O emprego dos sistemas estruturais de vetor-ativo [treliças] nas

construções é caracterizado pelo desempenho estrutural de alto nível, por um

lado, e pelo descuido estético, por outro. (...) Os sistemas em treliça nas

construções do futuro serão também dirigidas esteticamente e desempenharão

este papel formal que o potencial estético e estrutural do projeto merece”.

Contemporaneamente, no entanto, uma coletânea de estruturas tubulares em todo o

mundo aponta enfaticamente para realização magistral desta aspiração. Por todas estas razões,

consideramos oportuna a ocasião para investigar até que ponto as analogias formais com a

Natureza podem contribuir para a renovação do repertório formal da Arquitetura de treliças

espaciais em aço.

1. Arquitetura e Engenharia inspiradas na Natureza

Edificações inspiradas pela observação da Natureza não são uma novidade. Desde a

antiguidade os seres humanos constroem com este princípio, por diferentes motivações. Seja

de modo figurativo, como as colunas de seres antropormórficos dos templos gregos, seja de

maneira mais abstrata, como as pirâmides egípcias que se mimetizam com as dunas de areia,

supõe-se que estas semelhanças tratem mais de aspectos estéticos e simbólicos da Arquitetura

do que de seu desempenho estrutural.

Na Era Moderna, algumas investigações começaram a abordar sistematicamente as

estruturas na Natureza segundo uma avaliação de desempenho. Segundo REBELLO (2000,

pag. 200), referência do assunto na literatura nacional, os primeiros estudos remontam a 1870,

na obra do reverendo J. G. Wood. Aparentemente, este naturalista estaria mais interessado na

interpretação de estruturas naturais do que na sua transposição para a esfera técnica.

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Ao longo do século XX, algumas obras emblemáticas apresentaram certo grau de

semelhança com estruturas naturais. REBELLO (2000, pag. 199) apresenta diversos exemplos

destas analogias. Sua metodologia consiste em (i) analisar um ser vivo, (ii) identificar o

princípio que confere competitividade estrutural ao seu corpo e (iii) apontar uma edificação

ou parte dela onde este princípio foi aplicado. Os arquitetos/engenheiros citados por ele

incluem Nervi, Santiago Calatrava, Felix Candela, Frei Otto, Buckminster Fuller, Gustave

Eiffel, Antonio Gaudi e Frank Loyd Wright. Entre estes, alguns adotaram analogia de

princípios mecânicos, outros deram mais ênfase a aspectos formais.

Mas não apenas arquitetos se inspiram na Natureza. A COPPE/UFRJ tem aplicado

esta diretriz a diversas frentes de inovação em engenharia. Entre estas, está o desenvolvimento

do aplicativo “Síntese e Análise de Treliças” (SAT) pelo Laboratório de Estruturas (Labest).

Baseado em Algoritmos Genéticos, este aplicativo é voltado para a otimização dimensional de

treliças espaciais. Segundo Engel (2006, p135), treliças são

“sistemas de estrutura de elementos sólidos e em linha reta (barras,

hastes), nas quais a redistribuição das forças faz-se efetiva através da

decomposição vetorial, isto é, da decomposição multidirecional de forças. Os

componentes do sistema são sustentados em parte por compressão, em parte

por tração. As características típicas deste tipo de estrutura são a triangulação

e os pontos de conexão.”

Embora, simplificadamente, se considere que os elementos de treliça atuam somente

sob a ação de esforços axiais, algumas análises levam em conta os possíveis momentos que

surgem nas conexões entre as barras.

Otimização, por sua vez, é a busca automática por soluções com melhor desempenho

dentro de uma área de busca preestabelecida. Os

algoritmos  de  otimização  trabalham, basicamente,

por ciclos entre um módulo de síntese e outro de

análise. O módulo de síntese gera elementos (ou

indivíduos, em AG) no espaço de busca e envia para

análise. O módulo de análise avalia o desempenho e

retorna a aptidão deste indivíduo para o módulo de

síntese.

Síntese Análise

indivíduo

aptidãoFigura 1: ciclos de síntese e análise

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Computadores não trabalham com variáveis contínuas, apenas simulam isso adotando

grandezas suficientemente pequenas. Tendo isto em mente, qualquer variável dimensional ou

geométrica pode ser assumida como discreta ou contínua. Em um caso geral de otimização,

poderíamos variar continuamente as propriedades geométricas dos perfis, como área ou

momento de inércia. Por este caminho, provavelmente chegaríamos a perfis não disponíveis

em escala comercial. O aplicativo SAT não é adequado a este tipo de trabalho, uma vez que o

seu usuário deve necessariamente adotar uma biblioteca de perfis.

Os elementos deste espaço de busca são,

portanto, arranjos de variáveis. Em estruturas de

treliça existem basicamente três classes de

variáveis: (i) a dimensão das seções, (ii) a geometria

da estrutura e (iii) sua topologia. Há uma

abordagem de otimização para cada classe. Se as

únicas variáveis são os perfis das barras, trata-se de

uma otimização dimensional (fig. 2a).

Por outro lado, fixar os nós nos impede de

testar outras formas. Na otimização geométrica,

observada na figura 2b, poderíamos fixar os perfis

das barras e variar a posição dos nós no espaço. É

possível, ainda, manter fixos os perfis e as posições

dos nós, mas variar as relações de adjacência das

barras, chamada topologia (fig. 2c). A isto se refere

a otimização topológica.

A otimização por algoritmos genéticos foi criado na década de 70 por John Holland,

da Universidade de Michigan. É mais facilmente explicado pelas analogias com a teoria da

seleção natural das espécies, na qual se inspira.

(a)

(b)

(c)

Figura 2: classes de variáveis em treliças

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Trabalhamos com AG de representação

binária (o conjunto de variáveis com que se

trabalha é armazenada na forma de um vetor de

bits), mas existem outros sistemas de representação.

Neste modelo, um elemento contido na área de

busca é chamado indivíduo e sua representação

binária (um vetor de bits) é um cromossomo. Uma

população é uma matriz de bits, onde cada linha

representa o cromossomo de um indivíduo. Entende-se como população inicial uma

distribuição aleatória inicial sobre a área de busca. Todos os indivíduos gerados são avaliados

e a cada um deles é atribuído um valor, que representa sua aptidão. Nesta teoria, o processo

que conduz à convergência em um ótimo global é interpretada como a seleção do mais apto.

As iterações são identificadas como gerações subseqüentes, que recebem as características

dos melhores pais da geração anterior por um mecanismo chamado torneio. No torneio, um

determinado número de indivíduos é selecionado aleatoriamente dentro da população. O mais

apto em cada torneio pode transmitir suas características para a próxima geração.

A hereditariedade pode ser direta (o

filho é uma cópia idêntica do pai) ou por

crossover. No crossover são escolhidos dois

pais pelo método do torneio e seus

cromossomos trocam informação. Se os

descendentes apresentam melhor

desempenho que seus pais, seu código é

passado para as gerações seguintes; caso

contrário, não geram descendência.

Lado ao crossover existe a mutação, um mecanismo que aumenta a variabilidade

dentro da população. A posição do bit sobre o qual a mutação ocorre é aleatória. Ela inverte o

valor do bit sobre a qual incide. Em geral, a taxa de mutação é pequena (entre 0,01 e 0,1) e a

taxa de crossover é elevada (entre 0,9 e 0,95).

Desta forma, a teoria da seleção das espécies inspira e ajuda a explicar um algoritmo

de otimização robusto.

1 2 3 4 5 6

5 6

2 3 4

1

barras

perfis na biblioteca

cromossomo

00101001110111100101101110000011011

10011101101100010101001110110001100

0010100111 1101110000011011

1001110110 1001110110001100

0010100111 1101110000011011110001010

1001110110 1001110110001100011110010

pai 1

pai 2

filho 1

filho 2

operação crossover

Figura 3: representação binária de um cromossomo

Figura 4: operador crossover

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2. Síntese e Análise

O módulo de síntese não armazena o modelo estrutural completo no cromossomo,

apenas o que efetivamente varia fica registrado nele. O indivíduo, portanto, é um arranjo de

variáveis admissíveis em uma n-upla ordenada. Aquilo que será incluído como variável

depende do objetivo da otimização e da capacidade de processamento do computador frente

ao custo computacional do problema.

Como comparação, suponhamos que os

ciclos de síntese e análise consumam 0,1 s para

serem efetuados. Imagine-se uma treliça plana de

duas barras, com uma articulação entre elas e as

demais extremidades com apoio rotulado. Temos

duas variáveis assumindo valores discretos, que são

a identificação dos perfis em uma biblioteca. Ao

número de elementos desta biblioteca chamaremos

“b” e ao número de variáveis chamaremos “v”. Temos então que o vetor solução está contido

em um conjunto de soluções. Se o projetista dispusesse de cinco perfis admissíveis para

cada barra, o que chamaremos de biblioteca de perfis, analisar as 25 soluções possíveis

demandaria 2,5s de processamento.

Suponha uma treliça de 20 barras e uma biblioteca de 10 perfis. O domínio passa a ser

um conjunto de astronômicas 10 alternativas. Neste caso, uma busca exaustiva

levaria mais de um milhão de anos para ser concluída.

O algoritmo genético deve efetuar uma busca

pela solução de melhor desempenho, mas não pode

fazê-lo exaustivamente. Para que isto seja possível,

o módulo de síntese gera uma primeira população

indivíduos com uma distribuição aleatória. A seguir,

com a avaliação dos indivíduos da primeira geração,

ele gera mais soluções no entorno de onde foram

encontrados os melhores resultados. Isto se repete

até que seja atendido um critério de convergência.

Figura 5: Treliça plana

Figura 6: processo de busca

Page 8: Treliças espaciais formadas por perfis tubulares de aço ... · arquitetônica e estrutural motivada pela observação da Natureza e (ii) os modelos numérico- ... decomposição

Como a distribuição da população inicial é

aleatória, nem sempre é possível garantir que a

convergência aconteceu em um máximo global. É

possível reduzir a chance disto ocorrer, repetindo-se

várias vezes o processo de gerar uma população

inicial e guardar o melhor resultado de uma geração

para outra, mas isto não exclui completamente a

chance de que exista uma solução com melhor

desempenho e ainda desconhecida.

Em uma única busca é possível incluir variáveis de espécies distintas e mais de uma

meta a ser atingida pela estrutura. A isto se chama otimização multiobjetivo. Os objetivos

devem ser quantificáveis e podem ser conflitantes, como o caso em que mais elementos de

ligação podem eventualmente favorecer uma geometria que leve à menor massa da edificação.

O projetista deve atribuir um peso a cada objetivo, o que nem sempre é tarefa simples. Os

pesos atribuídos aos nós e a massa total são os seus preços unitários, que flutuam com o

mercado. Em conseqüência disto, quando se trata de otimização multiobjetivos de treliças, a

solução considerada mais adequada também varia no tempo

Os requisitos mínimos de uma estrutura são (i) não ruir e (ii) preservar sua forma

contra ações externas e internas. No entanto, mesmo que em uma ordem de grandeza inferior

a nossa capacidade de percepção, os edifícios se deformam, seja pelo peso próprio, seja pela

ação de agentes externos. Preservar a forma significa, mais precisamente, manter os

deslocamentos dentro de uma margem de tolerância. Estas são as restrições na otimização de

treliças. Em geral, muitas soluções dentro do domínio obedecem às restrições do problema,

algumas com maior custo do que outras. As restrições podem ser locais, se dizem respeito às

barras, ou globais, se atingem a treliça inteira.

Figura 7: Convergência em máximo local

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Para avaliar a capacidade da estrutura de atender as restrições pelo

menor custo, o AG emprega uma função objetivo.

Observe-se o exemplo ao lado, onde um cabo a ser especificado

deve suportar um corpo de massa . Considerando constantes as

propriedades físicas do material do cabo, sua capacidade de resistir

dependerá exclusivamente da área de sua seção. Podemos, observando a

NBR 8800, calcular o esforço solicitante de cálculo e a capacidade

resistente de cálculo . Ao fazer a verificação, apenas um destes

resultados é possível:

1 ; significa que o esforço solicitante foi maior do que a resistência, logo

a estrutura não é segura;

1 ; apresenta a situação ideal onde o cabo está no limite de sua

capacidade na qual pode ser usado com segurança;

1 ; este caso nos interessa em particular, porque indica que o cabo

poderia ser mais solicitado ou ter uma resistência menor, sem risco para a estrutura.

Suponhamos 0,75. Isto quer dizer que existe uma folga de 25% no

dimensionamento do cabo. Definimos o desperdício neste elemento pela expressão

1 . 01

Voltemos ao caso geral da otimização de uma treliça com um número de

elementos que não violam restrições. O desperdício na estrutura é dado pelo somatório do

desperdício de seus elementos:

1 1 . 02

Esta é uma função objetivo na versão atual do SAT. A meta do programa é minimizar

esta função, diretamente relacionada com o custo da estrutura, sem violar restrições. Quando

uma solução não atende aos requisitos, seu desperdício é majorado por uma função de

penalização.

Figura 8: Massa suspensa por cabo

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No SAT, se uma solução não viola nenhuma restrição, sua aptidão é numericamente

igual ao seu desperdício: quanto menor o desperdício, maior sua aptidão.

Imagine uma pequena estrutura com 10 elementos, cada um deles com 12kg, onde há

coincidentemente 0,83 Kg de desperdício em cada um. Se nenhuma restrição for violada, sua

aptidão é numericamente igual a 8.3.

Em outra solução para a mesma treliça, o desperdício em cada barra é de 0,72kg. Em

princípio, este indivíduo é mais apto do que o primeiro. Contudo, suponhamos um elemento j

desta última solução, onde 1. Isto significa instabilidade ou ruptura da barra,

implicando no desperdício total de sua massa e risco para a edificação. Neste caso, o

indivíduo sofre uma penalização, diminuindo sua aptidão frente a outros que não tenham

violado nenhuma restrição. A função de penalidade tem grande influência no resultado da

otimização, porque indivíduos com bom desempenho podem se encontrar na vizinhança

daqueles que violam restrições. As penalizações devem ser proporcionais à quantidade e

intensidade das violações, mas se forem muito severas diminuem a probabilidade de

convergência no indivíduo de melhor desempenho.

Tendo isto em vista, definimos penalidade como o somatório para os k elementos que

violam restrições:

1 . 03

A penalidade é somada ao valor da função objetivo, de modo que o valor numérico da

aptidão (considerando apenas as restrições locais) se expressa por

Ou seja:

1 . 04

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Identificamos três tipos de violações de restrição global: (i) a estrutura se torna

instável devido a seu peso próprio, (ii) instabilidade devido às forças externas e (iii)

deslocamentos acima do valor máximo prescrito .

Nos dois primeiros casos, a penalização é a massa total da estrutura; no terceiro caso,

adotamos uma expressão que incorpora a quantidade e a intensidade de violações.

. 05

Onde são os deslocamentos dos nós da estrutura que maiores do que e

é a massa total da estrutura. Seja qual for a restrição violada, um marcador impede que a

solução seja registrada como o melhor cromossomo de sua geração.

A proposta com o menor desperdício de material,

mesmo sendo a mais leve entre outras possíveis,

pode não ser a mais barata. Devemos ainda

considerar a fabricação e montagem da treliça, que

agregam um custo significativo à edificação e

possuem as suas próprias restrições. No desenho ao

lado (fig. 9, acima) onde uma otimização hipotética

definiu uma seção diferente para cada barra, os

custos de montagem podem ser maiores do que na

alternativa “não otimizada” (fig. 9, abaixo), onde a

padronização dos perfis reduz os custos de produção

em escala, a despeito do desperdício de material na

estrutura. Somente uma visão integrada da cadeia

produtiva do aço pode conduzir a soluções

eficientes e economicamente viáveis.

O projetista pode, com base nos resultados de uma otimização preliminar, agrupar os

elementos que, por conta da fabricação, sabe-se que terão o mesmo perfil. Esta segunda

rodada trabalha com n-upla de menor dimensão, que exige um custo computacional menor.

Pela comparação dos resultados, é possível concluir se a padronização será ou não vantajosa.

O módulo de análise do SAT não emprega AG. A solução do sistema de equações não

lineares deste módulo emprega o algoritmo de Newton-Raphson modificado. Trata-se um

Figura 9: otimização dimensional x fabricação

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Page 14: Treliças espaciais formadas por perfis tubulares de aço ... · arquitetônica e estrutural motivada pela observação da Natureza e (ii) os modelos numérico- ... decomposição

Espécie é um conjunto de indivíduos cujo

cruzamento dá origem a outros indivíduos que

guardam determinado grau de semelhança com os

primeiros. Em princípio, não pode haver cruzamento

entre espécies diferentes. Depende da abordagem

que se dá ao tratamento das variáveis, esta analogia

faz sentido no projeto de treliças.

Na competição inter-específica, duas

espécies concorrem por um nicho, com risco de

extinção para a menos apta. Por seu turno, os

indivíduos da “espécie vencedora” também

competem entre si, novamente com vantagem para

os mais aptos, o que caracteriza a competição intra-

específica.

 Na figura ao lado, cada tipologia de ponte representa uma espécie diferente, dentre

uma enorme variedade de outras possíveis. O aplicativo SAT simula uma competição intra-

espécie com o objetivo de encontrar o indivíduo com o menor desperdício possível de

material. A competição inter-específica, por sua vez, ainda é uma prerrogativa do projetista.

Na versão atual do aplicativo, devemos modelar um indivíduo de cada espécie para simulação

no SAT.

O SAT depende da interface gráfica de outros programas, os chamados pré e pós

processadores (nós empregamos FEMAP, versão 9.2). Eles permitem visualizar a estrutura,

aplicar carregamentos e restrições de apoio e gerenciar bibliotecas de perfis e materiais. A

forma inicial da estrutura pode ser desenvolvida dentro destes ambientes ou importada de

outros aplicativos vetoriais, como o AutoCAD ou o Rhinoceros.

O FEMAP gera um arquivo em formato ASCII com todas as informações necessárias

sobre o modelo estrutural para o início do processamento no SAT. Complementarmente,

alguns parâmetros de otimização devem ser listados em um arquivo de texto. Quando

executado, o SAT acessa estes arquivos e as bibliotecas de perfis e materiais do FEMAP,

procede à otimização e imprime um arquivo para leitura.

Figura 12: Possíveis espécies para ponte‐cobra

(a)

(b)

©

(d)

(e)

(f)

Page 15: Treliças espaciais formadas por perfis tubulares de aço ... · arquitetônica e estrutural motivada pela observação da Natureza e (ii) os modelos numérico- ... decomposição

Este arquivo contém o mais apto modelo estrutural proposto pelo módulo de síntese e

os resultados obtidos pelo módulo de análise – deslocamentos em cada nó, esforços

solicitantes, esforços resistentes e o quociente entre eles em cada barra.

A próxima edição do SAT deve modificar seu conceito de competição intra-espécie.

Se o valor ótimo de uma variável é função de outra variável dentro do mesmo problema, diz-

se que estas variáveis são dependentes. Em geral, estes problemas são de difícil convergência.

Alternativamente, pode-se separar estas variáveis em diferentes etapas de otimização, de

modo que os indivíduos de cada etapa pertencendo a espécies distintas na cadeia evolutiva. O

SAT2 irá proceder nesta ordem: (i) otimização geométrica (ii) otimização dimensional. Não

será possível operar crossover entre indivíduos de etapas diferentes da otimização, porque

seus cromossomos serão relativos a espécies distintas. Assim, uma pequena parte da

competição inter-específica também será simulada.

Conclusões

O conceito de design bio-inspirado procura aproximar Arquitetura e Engenharia na concepção

de projetos estruturais comprometidos com a inovação tecnológica e um mundo mais

sustentável. O código do SAT é relativamente simples e acessível mesmo a quem não tem

larga experiência de programação. O aplicativo, que está em desenvolvimento, já apresenta

resultados e tem um grande escopo de implementações a serem realizadas, visando a redução

Figura 13: Análise de deslocamentos em SAT. Ponte cobra, espécie (e)

Page 16: Treliças espaciais formadas por perfis tubulares de aço ... · arquitetônica e estrutural motivada pela observação da Natureza e (ii) os modelos numérico- ... decomposição

de seu custo computacional e refinamento dos módulos de síntese e análise. Entre os

próximos aperfeiçoamentos, está a incorporação de outras abordagens de otimização

(geométrica e topológiva), generalização para modelos de pórtico espacial visando análise

mais acurada das conexões e incorporação de restrições relativas à fabricação e montagem.

Bibliografia

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