trabalho de iniciação científica - univali€¦ · trabalho de iniciação científica a...
TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ LUIZ CRISTÓVÃO PINTO DE AZEVEDO
Trabalho de Iniciação Científica A IMPORTÂNCIA DOS P&I CLUBS
ITAJAÍ 2009
LUIZ CRISTÓVÃO PINTO DE AZEVEDO
Trabalho de Iniciação Científica A IMPORTÂNCIA DOS P&I CLUBS
Monografia desenvolvida para a disciplina de Estágio 3 do curso de Comércio Exterior do Centro de Ciências Sociais Aplicadas – Gestão, da Universidade do Vale do Itajaí Orientador: Prof. Bruno Tussi
ITAJAÍ 2009
Agradeço a todos os professores e ao coordenador do Curso de Comércio Exterior, à coordenação de Estágio do referido curso e, principalmente, ao professor orientador deste trabalho de monografia, Prof. Bruno Tussi, por todo o auxílio, paciência e dedicação demonstrados durante a realização do mesmo.
“A persistência é o caminho do êxito.”
Charles Chaplin
5
EQUIPE TÉCNICA
a) Nome do Acadêmico: Luiz Cristóvão Pinto de Azevedo
b) Área de Estágio: Direito Marítimo
c) Orientador de conteúdo: Prof. Bruno Tussi
d) Responsável pelo estágio: Profª Natalí Nascimento
6
RESUMO
No campo do seguro marítimo, as companhias seguradoras nem sempre cobrem o valor total dos prejuízos de um sinistro ocorrido a uma embarcação. No caso de uma colisão, um quarto do valor das perdas e danos fica por conta do próprio armador do navio em questão. O objetivo principal deste trabalho é demonstrar a importância dos P&I Clubs, que é justamente a maneira mais eficaz encontrada pelos armadores ao redor do globo para se protegerem desta prática. Desta forma, reúnem-se em torno de sociedades de ajuda mútua e, através de um fundo comum, cobrem as perdas uns dos outros. Para o levantamento de dados fez-se amplo uso da Pesquisa Bibliográfica, para esclarecer e informar a respeito do tema em questão. Os resultados disto foram bastante satisfatórios, demonstrando de maneira simples, através das principais funções destes clubes, a sua importância. Além disto, para que o funcionamento dos clubes fosse melhor evidenciado, o estudo realizado sobre o seguro marítimo e o propriamente dito, mostrou-se de grande relevância para que o objetivo principal do trabalho fosse alcançado. Palavras-chave: seguro, marítimo, P&I clubs.
7
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 8
1.1 Objetivo geral ................................................................................................ 9
1.2 Objetivos específicos .................................................................................... 9
1.3 Justificativa ................................................................................................. 10
1.4 Abordagem geral do problema .................................................................... 11
1.5 Questões específicas .................................................................................. 12
1.6 Pressupostos .............................................................................................. 12
2 METODOLOGIA ................................................................................................ 14
2.1 Tipo de pesquisa ......................................................................................... 14
2.2 Área de abrangência ................................................................................... 15
2.3 Coleta e tratamento dos dados ................................................................... 15
2.4 Apresentação e análise dos dados ............................................................. 16
3 SEGURO............................................................................................................ 17
3.1 Definição e considerações gerais ............................................................... 17
3.2 Origens da atividade seguradora ................................................................ 20
3.3 Entidades intervenientes no seguro brasileiro ............................................ 22
3.3.1 CNSP – Conselho Nacional de Seguros Privados ............................... 23
3.3.2 SUSEP – Superintendência de Seguros Privados ............................... 24
3.3.3 Brasil Resseguros S.A. – IRB .............................................................. 24
3.4 Elementos integrantes de um contrato de seguro ....................................... 25
3.4.1 O Segurador e o corretor de seguros .................................................. 25
3.4.2 O Segurado e o beneficiário do seguro ............................................... 26
3.4.3 Risco .................................................................................................... 27
3.4.4 Prêmio ................................................................................................. 28
4 A NATUREZA DO CONTRATO, OS PRINCÍPIOS E A MULTIPLICIDADE DO SEGURO ................................................................................................................... 29
4.1 Natureza do contrato de seguro .................................................................. 29
4.2 O princípio da boa-fé ................................................................................... 31
4.3 O princípio do interesse segurável .............................................................. 32
4.4 O princípio da sub-rogação ......................................................................... 33
4.5 Contratos de seguros múltiplos ................................................................... 35
4.5.1 Cosseguro ........................................................................................... 35
4.5.2 Seguro múltiplo .................................................................................... 37
4.5.3 Resseguro ........................................................................................... 37
4.5.4 Retrocessão ......................................................................................... 38
5 NATUREZA E IMPORTÂNCIA DOS P&I CLUBS .............................................. 40
5.1 Definição de P&I Club ................................................................................. 40
5.2 Origem histórica dos P&I Clubs .................................................................. 43
5.3 Funções dos P&I Clubs ............................................................................... 47
5.4 O Grupo Internacional de P&I Clubs ........................................................... 50
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 51
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 53
8 1 INTRODUÇÃO
Em um mundo globalizado e integrado como o de hoje, o Comércio Exterior
de cada país possui um papel cada vez mais importante para o seu desenvolvimento
econômico e social. O Comércio Internacional é uma realidade, que apresenta
infindáveis oportunidades de negócios para todos: grandes, médias e pequenas
empresas.
Tanto para o Brasil quanto para qualquer outro país do mundo, o Comércio
Internacional é, e sempre foi, desde a antiguidade, extremamente dependente da
navegação, seja a fluvial, lacustre ou, principalmente, a marítima.
Entretanto, armar um navio, deixando-o em pleno estado de navegabilidade e
pronto para carregar inúmeras cargas diferentes mundo afora, envolve muito mais
fatores relevantes do que, a princípio, se pode imaginar. E um destes fatores é
justamente a grande quantidade de riscos e avarias a que uma embarcação está
sujeita, simplesmente por já estar na água.
Muitos destes riscos, como falhas causadas por falta de manutenção ou erros
humanos acarretados pela ausência de preparo e treinamento, podem ser evitados
tomando-se as medidas preventivas adequadas. Porém, mesmo quando todo
cuidado é tomado, ainda existe a possibilidade de estas falhas acontecerem. Além
disso, existem ainda os fatores que estão totalmente alheios ao controle humano,
como, por exemplo, uma violenta tempestade que pode pegar um navio de surpresa
no meio do oceano.
Nestes casos, não há o que se possa fazer, a não ser tomar as medidas
adequadas para reverter, o máximo possível, os estragos e danos sofridos pelas
embarcações envolvidas na situação e pelo meio em que elas se encontravam. Isto
nos remete à grande importância e necessidade de existência do Direito Marítimo e,
sobretudo, do Seguro Marítimo, que transferirá a outra pessoa o risco de danos
inesperados dos quais a sua embarcação, a embarcação de um terceiro, ou mesmo
o meio ambiente, possam ser vítimas, assim também como pela indenização a ser
paga pela perda de alguma vida ou carga a bordo.
Porém, apesar de a contratação de um seguro marítimo internacional ser algo
praticamente obrigatório em qualquer expedição marítima, é ainda arriscado demais
para um armador, no caso de algum sinistro vir a ocorrer a alguma de suas
9 embarcações, confiar apenas na cobertura oferecida pelo seguro. Nem sempre o
seguro marítimo cobrirá todos os danos sofridos ou causados a um navio. Desta
forma, como uma maneira de aumentar a proteção das embarcações perante os
infortúnios do mar, surgiram os P&I Clubs, os Clubes de Proteção e Indenização,
que atuam juntamente com o seguro marítimo e visam complementar a proteção
dada às embarcações de grandes armadores.
Esta monografia se dedica justamente a demonstrar a grande importância
internacional destes P&I Clubs, apresentando as principais funções e tarefas
realizadas por estas instituições no auxílio aos armadores filiados, destacando a sua
relevância.
Este trabalho visa também realizar esclarecimentos a respeito do que é o
seguro e do que é o seguro de mútuo, temas cujo entendimento prévio é
imprescindível para que se possa entender melhor a área em que atuam os Clubes
de Proteção e Indenização.
1.1 Objetivo geral
Demonstrar a importância dos Clubes de Proteção e Indenização – P&I Clubs.
1.2 Objetivos específicos
• Explicar o que é o Seguro e como funciona.
• Explicar o que são os P&I Clubs.
• Verificar quais são as principais funções e atividades realizadas por um
P&I Club, descrevendo-as para demonstrar a sua importância.
10 1.3 Justificativa
Durante o período de quatro anos de duração do curso de Comércio Exterior
da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, um acadêmico se depara com infinitos
fatos e temas relevantes para o seu aprendizado, percebendo todas as extensões
do curso e também todas as áreas relacionadas a este.
Ao se aproximar do final do curso, surge a missão da elaboração de um
trabalho de conclusão, podendo o aluno optar pela confecção de uma monografia ou
de um relatório de estágio. Caso opte por realizar um relatório de estágio, o
acadêmico já estará, automaticamente, se deparando com algo que pode ser
considerado um grande desafio, pois o trabalho não envolve apenas pesquisa
bibliográfica comum, mas também depende de uma série de outros fatores alheios
ao próprio acadêmico.
Entretanto, caso opte pela realização de uma monografia, o nível de desafio a
ser enfrentado pelo acadêmico dependerá da complexidade do tema escolhido. Se
escolher um tema relativamente comum, terá diversas fontes de dados para basear
a sua pesquisa, mas, mesmo com grande dedicação à tarefa que está cumprindo,
talvez o reconhecimento que receberá pelo trabalho que realizou não seja tão
grande, pois, por se tratar de um tema fácil e comum, a probabilidade de outros
acadêmicos já terem realizados trabalhos semelhantes é muito grande.
Por outro lado, se escolher um tema menos comum, mais “desafiador”, para o
seu trabalho, o aluno poderá se deparar com o fato de haver poucas fontes
disponíveis para a aquisição de dados para basear a pesquisa. Isto aumentará
significativamente o desafio de realizar a tarefa escolhida, obrigando o pesquisador
a não apenas basear a sua pesquisa em livros nacionais, mas também em outras
publicações, como livros em outros idiomas e artigos retirados de fontes como a
Internet. Com isto, ao terminar a pesquisa, o acadêmico poderá vir a receber um
reconhecimento muito maior pelo trabalho que realizou, pois este se mostrou um
verdadeiro desafio e a chance do tema ser explorado em trabalhos semelhantes é
pequena.
A escolha do tema desta monografia, de demonstrar a importância dos P&I
Clubs, recai exatamente neste caso, principalmente por ser um tema de grande
relevância internacional, mas que foi muito pouco explorado no Brasil.
11
Além disto, este trabalho permitirá, ao acadêmico que o realiza, ampliar os
horizontes de seu conhecimento de Direito e Seguro Marítimo, já que é evidente,
para um aluno de Comércio Exterior, que, para um bom desempenho de
negociações e operações de Comércio Internacional, um bom entendimento das
práticas legais, principalmente as do Direito Marítimo, se faz necessário. Sem a
navegação, seriam impossíveis as exportações e importações em larga escala.
1.4 Abordagem geral do problema
Na Inglaterra do século XVIII, o mercado de seguros marítimos era
extremamente monopolizado. Desta forma, as poucas companhias que atuavam
nele cobravam altas taxas dos armadores que desejavam contratar seus serviços.
Em resposta, como uma maneira de evitar este monopólio, surgiram as primeiras
sociedades de armadores, inteiramente controladas e governadas por eles mesmos,
com o intuito de proteger os seus associados contra danos sofridos pelos seus
navios. Porém, estas sociedades de armadores apenas davam cobertura às avarias
com a estrutura e o maquinário dos navios.
As sociedades de armadores foram eficientes em realizar aquilo que se
propunham. No entanto, a partir do século XIX, mudanças legais aumentaram
significativamente as responsabilidades dos armadores e nenhuma empresa
seguradora cobria os crescentes gastos advindos da responsabilidade civil dos
armadores por danos que os seus navios causassem a terceiros. Desta forma, fez-
se necessária uma evolução das sociedades de esforço mútuo dos armadores, para
que estas também passassem a ampará-los nestas questões legais de
responsabilidade civil. Isto resultou no surgimento dos primeiros Clubes de Proteção
e Indenização, ou P&I Clubs.
Estes clubes existem até hoje, em constante evolução desde o seu
aparecimento, e são de grande importância para o seguro marítimo. Cada um deles
atua como uma mistura de companhia de seguro, escritório de advocacia e
controlador de perdas, auxiliando os armadores a lidar com todos os aspectos de
eventuais acidentes que envolvam suas embarcações. A lista de funções realizadas
12 por estes clubes é bastante grande, incluindo desde pagamentos de indenizações a
terceiros até participação ativa na resolução de derramamentos de óleo. E é
exatamente por isso, devido às suas inúmeras funções, que os P&I Clubs são tão
importantes, sobretudo para os armadores, que, eventualmente, mesmo fazendo
parte de um destes clubes, podem nem sempre saber todas as vantagens que
podem obter junto a eles.
1.5 Questões específicas
a) O Seguro é a melhor forma de se minimizar perdas e danos, mas no que
ele consiste exatamente?
b) Como funciona um Seguro de Mútuo?
c) O que são os Clubes de Proteção e Indenização, ou P&I Clubs?
1.6 Pressupostos
a) Toda e qualquer pessoa possui ao menos uma coisa a que lhe é de grande
importância e valor. A história da civilização humana mostra que sempre se
buscou meios de tentar controlar, ou pelo menos minimizar, os riscos aos
quais ele ou suas posses estão sujeitos. Atualmente, uma das formas mais
comuns de o Homem suprir esta necessidade que tem desde a antiguidade é
a contratação de um Seguro junto a uma empresa autorizada a fazê-lo.
Através deste contrato, a companhia de seguro se compromete a ressarcir
financeiramente o beneficiário do seguro caso o sinistro contratado venha a
ocorrer ao bem que foi segurado. Tanto pessoas quanto bens podem ser
segurados.
b) Uma maneira muito eficiente de se prevenir ou remediar acontecimentos ruins
a alguém ou a algo importante é associar-se a outras pessoas que também
13
estejam sujeitas aos mesmos riscos, juntando forças para enfrentar o
infortúnio, que pode vir a acontecer ou não. O Seguro de Mútuo está
justamente baseado neste princípio de mutualismo, onde um grupo de
pessoas se reúne e cada um dos integrantes contribui igualmente para um
fundo. Este fundo será, então, utilizado para cobrir as perdas que um ou mais
membros do grupo venham a ter. Mesmo que algum dos membros nunca
venha a sofrer alguma perda, ele continuará contribuindo da mesma forma
que os outros, enquanto estiver no grupo, pois ele sempre estará sujeito aos
mesmos riscos.
c) Um navio é um bem de grande valor. Da mesma forma que também são as
vidas e as mercadorias a bordo dele. Os chamados P&I Clubs são clubes
formados, sem fins lucrativos, por armadores, com o objetivo de
complementar o seguro marítimo normal, aumentando a proteção dos navios
de longo curso e de suas respectivas cargas e tripulação. Vários armadores
se juntam para formar um grupo, e cada um deles contribui igualmente para o
fundo que será utilizado para cobrir prejuízos que o seguro não cobrir.
14 2 METODOLOGIA
Neste capítulo, será apresentada a metodologia a ser utilizada para o
desenvolvimento desta monografia. Os itens que compõem este capítulo são: tipo de
pesquisa; área de abrangência; coleta e tratamento dos dados; apresentação e
análise dos dados.
2.1 Tipo de pesquisa
Esta pesquisa se utilizará do método qualitativo, pois tem o objetivo de
demonstrar a Importância dos Clubes de Proteção e Indenização no campo do
Seguro Marítimo, sem levar em conta dados estatísticos e rigores matemáticos.
De acordo com Azevedo (2006, p. 05), a pesquisa qualitativa é a: “de
natureza exploratória e possui menor ou nenhum rigor estatístico”.
Para Oliveira (2000, p. 61), o método qualitativo é racional subjetivo e:
“sempre foi considerado como método exploratório e auxiliar na pesquisa científica”.
O principal meio de investigação a ser utilizado para este trabalho será a
pesquisa bibliográfica, que, segundo Fachin (2005) diz respeito ao conjunto de
conhecimentos humanos reunidos em obras já publicadas, e tem por finalidade
principal justamente fazer com que o leitor, ao ler e se inteirar de um assunto
específico, possa coletar e armazenar informações, para que, através delas, possa
conduzir sua pesquisa e produzir os resultados esperados.
Desta forma, a Pesquisa Bibliográfica é o procedimento básico empregado na
elaboração de monografias, pois é método que busca explicar um assunto ou tema
problema a partir de referências teóricas já publicadas.
Quanto à sua finalidade, este trabalho se caracteriza como uma Pesquisa
Descritiva, já que, nele, as fontes de dados, informações e fatos serão apenas
observados, registrados, analisados, classificados, interpretados e, por fim, expostos
tais quais eles são, sem sofrer manipulação, alteração ou interferência alguma.
15
“A pesquisa descritiva observa, registra, analisa e correlaciona fatos ou fenômenos (variáveis) sem manipulá-los. Procura descobrir, com a precisão possível, a freqüência com que um fenômeno ocorre, sua relação e conexão com outros, sua natureza e características.” (CERVO, 2002, p. 66)
Em outras palavras, este tipo de pesquisa, independentemente da forma que
ela tome ou da maneira que seja apresentada, trabalha com base em dados e fatos
estritamente extraídos da própria realidade.
2.2 Área de abrangência
Este trabalho será realizado na área do Direito Marítimo, mais
especificamente no campo do Seguro Marítimo Internacional, demonstrando a
importância dos P&I Clubs e explicando as principais atividades realizadas por eles.
2.3 Coleta e tratamento dos dados
Por se tratar de uma pesquisa bibliográfica, as principais fontes para a coleta
dos dados necessários à mesma não poderiam ser outras senão livros, artigos e
publicações sobre o tema. Livros sobre Seguro e Direito Marítimo, assim como livros
a respeito de Comércio Exterior serão os mais utilizados.
Pelo tema desta monografia se tratar de um assunto de grande importância
internacional, serão também utilizadas publicações internacionais, principalmente
livros em inglês.
Artigos e dados extraídos diretamente da Internet também terão grande
relevância na condução da pesquisa. A Internet, quando usada com moderação e
discernimento, é uma fonte que apresenta grande facilidade para encontrar artigos e
informações atualizadas sobre qualquer tema.
16 2.4 Apresentação e análise dos dados
Após a reunião, assimilação e interpretação dos dados pesquisados nas
fontes citadas anteriormente, estes serão, então, apresentados na forma de texto
corrido. Texto este, que será desenvolvido mantendo-se sempre em mente os
objetivos a serem supridos por esta monografia: o aprimoramento do conhecimento
do acadêmico que a desenvolve e o esclarecimento do tema para os leitores.
Mesmo esta não se tratando de uma pesquisa quantitativa, existe a
possibilidade de números e outros valores matemáticos serem apresentados. Neste
caso, eles poderão aparecer em forma de tabelas e gráficos, para facilitar a sua
compreensão.
17 3 SEGURO
Pessoas desejando se proteger de uma perda qualquer sempre existiram. A
aparição de uma empresa, instituição ou companhia disposta a cobrir estas perdas,
mediante pagamento de uma taxa por conta deste serviço, foi algo simplesmente
natural. Desde os primórdios da civilização humana, sempre houve a preocupação
da precaução contra riscos. A operação de seguro surgiu, portanto, a partir desta
preocupação constante.
Estas operações de seguros cresceram e se tornaram um grande
empreendimento, envolvendo, hoje, milhões de indivíduos e organizações. O
resultado disto foi que, na atual realidade, quanto maior for a economia de um país,
mais complexo será o mercado de seguros existente nele.
Mas o que é exatamente esta tão importante atividade seguradora? É
exatamente isto que este primeiro capítulo busca esclarecer. Nele será definido o
que é o Seguro, demonstrando, também, as origens desta atividade e os elementos
que a compõem.
Além disto, será apresentada a estrutura da atividade seguradora no Brasil,
apontando quais são os seus principais órgãos intervenientes e as funções de cada
um.
3.1 Definição e considerações gerais
Mais do que uma maneira inteligente de se minimizar perdas e riscos,
prevenindo ou remediando acontecimentos imprevistos, o Seguro representa o ato
em que uma pessoa assume uma obrigação de indenizar outra, por perdas e danos
que resultem de um evento específico, futuro e incerto.
Seguro é uma operação que se realiza entre duas partes, isto é, entre o segurado que precisa proteger uma mercadoria e o segurador que esta disposto a fazer essa proteção. Isto é coordenado por uma terceira parte, denominada corretora, de modo que a parte segurada, que aderiu a este propósito, possa resguardar seus bens em eventuais danos ou perdas. (MENDONÇA, 2000, p. 192)
18
É uma obrigação gerada por meio de um contrato, onde uma seguradora, na
figura de uma pessoa jurídica, compromete-se a indenizar um segurado, ou
contratante do seguro, na figura de outra pessoa jurídica ou física, caso um
acontecimento previamente estabelecido, e conhecido como Sinistro, venha a
ocorrer.
Para que tenha os bens de seu interesse segurados, o contratante do seguro
paga à companhia seguradora um valor em dinheiro que é acordado quando da
contratação do serviço. A seguradora, por sua vez, indeniza o segurado por todos os
danos, provenientes de riscos previstos no contrato, sofridos pelos bens sinistrados.
A trama das relações jurídicas que se concretiza no contrato do seguro tem como conseqüência básica o fato de o segurador obrigar-se, mediante o compromisso do segurado de pagar o prêmio, a garantir o interesse legítimo do segurado, relativo à pessoa ou coisa contra riscos pré-determinados. (MOURA, 1991, p. 264)
O seguro não tem por objetivo a produção de lucros através dos bens
segurados, mas sim repor o item segurado, quando este sofre o sinistro previsto.
Desta forma, nem o segurador, nem o segurado, têm interesse que o sinistro ocorra,
pois o segurado terá problemas com a perda de seu patrimônio, mesmo que ele
venha a ser reposto futuramente, e o segurador não deseja ter que indenizar o
segurado.
Diante disto, Issa (1986) afirma que a atividade seguradora está baseada em
dois princípios muito simples: O Cálculo da Probabilidade e o Mutualismo.
O cálculo da probabilidade é a maneira com que se determina a freqüência
com que o sinistro pode ocorrer, isto é, quais são as chances que o risco previsto no
contrato de seguro tem para acontecer. A partir daí, pode-se, então, calcular o valor
do prêmio, que é a contribuição que o segurado paga à seguradora para ter a
cobertura de seu bem em caso de evento danoso futuro.
O mutualismo, por sua vez, representa a união de várias pessoas em um
grupo com o objetivo de suprir eventuais necessidades de algum dos membros
integrantes, decorrente de algum acontecimento ao qual todos estão sujeitos, mas
de que nem todos serão vítimas.
Trata-se de um sistema não tão complexo, em que um grupo de pessoas com interesses comuns somam suas forças para a
19
formação de um fundo único, cuja finalidade é suprir, em determinado momento, necessidades eventuais de alguns dos seus membros afetados por um acontecimento imprevisto. (GUIMARÃES, 2002, p. 15).
Este grupo pode ser formado por membros com características
completamente diferentes um do outro, ou então por pessoas totalmente
desconhecidas, que morem até mesmo em países diferentes. Podem, também, ser
formados por pessoas que já façam parte de um grupo, como, por exemplo,
membros de uma mesma sociedade ou colaboradores de uma mesma empresa.
Não importa a origem dos integrantes do grupo, nem os seus interesses pessoais,
para que o mutualismo exista. Basta que o fator de agregação destas pessoas seja
o objetivo em comum de evitar e remediar riscos futuros, que podem vir a acontecer
ou não, através do esforço mútuo e da criação de um fundo específico para isto.
Issa (1986) compara o mutualismo a um consórcio de automóvel, pois cada
integrante deste consórcio paga uma pequena contribuição periódica, que
proporcionará a um deles a obtenção de um carro, através de sorteio. O sorteio
então se repete até que todos tenham adquirido um automóvel.
O seguro funciona exatamente desta forma, pois as cotas pagas por cada
contratante, quando somadas, garantem a reposição de um bem perdido por um
deles. O mutualismo no seguro tem a função de dividir o prejuízo sofrido entre todos
os segurados, tornando viável o pagamento da indenização. Isto apenas é possível
pois todos pagam, mas, apesar de todos estarem sujeitos aos mesmos riscos de
perdas, com o evento danoso sendo totalmente aleatório em sua ocorrência, nem
todos que contataram o seguro terão o infortúnio de sofrer o sinistro de que estão
protegidos, não necessitando, portanto, retirar dinheiro do fundo arrecadado.
Ainda segundo Issa (1986), outros princípios também podem ser
considerados como integrantes do seguro, sendo eles a dispersão dos riscos, a
homogeneização dos riscos e a pulverização dos riscos.
Com base nestes princípios, é facilmente perceptível que a principal condição
para a concretização do seguro é a existência de um risco de perda. Sem ele, o
seguro perde a sua utilidade.
O seguro é, antes de tudo, um instituto social de previsão e reparação material. A noção de seguro fundamenta-se nas exigências primordiais da vida humana, conservação e preservação da existência, provisão econômica para o presente e futuro. Daí o conceito de previdência abranger
20
o sentido de previsão dos fatos e acontecimentos, com base no cálculo da respectiva extensão de seus efeitos e reflexos, seguindo-se a realização de providências que neutralizem os fatos nocivos ou pelo menos condicionam efeitos benéficos. (MOURA, 1991, p. 263).
Com base neste pensamento, a abrangência da atividade seguradora não se
restringe apenas à analise das causas de danos materiais ao patrimônio de um
indivíduo e cobertura destes, mas também pondera as formas de enfrentar
eficientemente acontecimentos ruins que possam incapacitar uma pessoa para a
vida e atingir o equilíbrio econômico de um trabalhador, encontrando a melhor
maneira de oferecer cobertura a isto. Dentre estes acontecimentos estão fatores
biológicos, como doenças e a velhice; fatores sociais, como pobreza e desemprego;
e lesões físicas, como acidentes de qualquer natureza.
Um indivíduo sozinho pode não ter forças para fazer frente a circunstâncias
inesperadas como estas, e é por isso que busca em um segurador a garantia de
ressarcimento de seu interesse legítimo, relativo a uma pessoa ou coisa
predeterminada.
3.2 Origens da atividade seguradora
Desde o início dos tempos, o Homem já se preocupa com formas de
minimizar seus prejuízos diante da ocorrência de um acontecimento ruim e
imprevisível. Portanto podemos afirmar que, de certa forma, a instituição do seguro
como um modo de proteção contra fatalidades às quais um indivíduo está sujeito, já
é algo bastante antigo.
Guimarães (2002), com relação a isto, traz o exemplo de um grupo de
cameleiros da Babilônia, no século XIII antes de Cristo, que viajavam pelo deserto
constantemente. Cada viagem durava, pelo menos, uma semana, e cerca de dez
camelos eram perdidos em cada uma. Ao chegarem ao seu destino, eles então
dividiam o prejuízo igualmente entre todos, comprando animais novos para substituir
os que perdiam.
Neste exemplo, os cameleiros não tinham em mãos um estudo estatístico de
quantos acidentes aconteciam e de quantos animais perdiam em cada viagem, e a
21 figura de uma seguradora não existia, sendo esta representada pelos próprios
cameleiros. Mesmo assim, já se pode perceber um esboço do que é a atividade
seguradora hoje em dia. Até mesmo a figura do prêmio já está presente, como os
custos e prejuízos divididos igualmente por todos os cameleiros.
Contudo, o ponto de partida para o estabelecimento do seguro, propriamente
dito, foi a navegação marítima, que era uma atividade com operações altamente
arriscadas. Os grandes riscos desta atividade geravam a necessidade de uma maior
proteção das embarcações, muito pouco seguras, e das cargas transportadas.
O primeiro contrato de seguro, de acordo com Mendonça (2000), foi firmado
no ano de 1347, em Gênova, na Itália. Esta apólice ainda não possuía a figura de
uma seguradora gerenciando o risco, mas já oferecia aos mercadores proteção
contra os riscos mais comuns decorrentes da navegação, como ataques de piratas e
degradação das cargas.
O seguro, na forma como realmente o conhecemos, se estabeleceu apenas
no século XVII na Inglaterra, durante a Revolução Industrial, período em que
nasceram as primeiras sociedades de seguro. A grande necessidade de proteção
das embarcações marítimas levou à formação das primeiras companhias, que se
dedicavam exclusivamente para o seguro marítimo.
A mais significativa destas foi a Lloyd’s of London, um mercado que teve seu
início em 1690, em uma taberna de Londres, de propriedade de Edward Lloyd. Este
era um local onde comerciantes e capitães dos navios costumavam se reunir para
trocar informações e tratar do seguro de suas mercadorias e embarcações. A partir
daí, a Lloyd’s evoluiu até se tornar hoje a mais importante e tradicional companhia
de seguros mundial.
[...] a economia social evoluiu através dos séculos, e o seguro é o resultado da evolução nos negócios e bens patrimoniais onde cresce a necessidade da previsão de danos nas coisas possuídas e os riscos de vida do homem. (MOURA, 1991, p. 43).
A idéia de se aplicar os mesmos princípios utilizados para a indenização no
seguro marítimo, a uma infinidade de outras situações surgiu, então, no século XIX,
com o seguro marítimo se tornando o precursor do seguro terrestre.
22 3.3 Entidades intervenientes no seguro brasileiro
No Brasil, a atividade seguradora teve início com a vinda da família real
portuguesa, pois com isso houve a abertura dos portos nacionais ao comércio
internacional.
A primeira companhia seguradora brasileira, segundo Keedi (2008), chamou-
se Companhia de Seguros Boa-Fé e surgiu em 1808. Como o Brasil ainda não tinha
uma legislação específica sobre seguros, que apenas surgiu em 1850 para tratar do
seguro marítimo, esta companhia era regulada pela Casa de Seguros de Lisboa.
Ainda de acordo com Keedi (2008), esta legislação, que surgiu juntamente com o
Código Comercial Brasileiro, permitiu a criação de outras companhias seguradoras
no país, sendo de grande relevância para o desenvolvimento do seguro nacional.
Com o passar dos anos a atividade seguradora no país foi se consolidando,
resultando no surgimento do Sistema Nacional de Seguros Privados, em 1966, para
regular as operações, tanto de seguros quanto de resseguros, e determinar a área
de atuação de cada órgão interveniente.
O Sistema Nacional de Seguro Privado, criado em 1966, tem por objetivo normatizar, regulamentar, controlar e incentivar o mercado de seguros, inserindo-o cada vez mais na economia nacional. (MENDONÇA, 2000, p. 193-194)
O Sistema Nacional de Seguros Privados tem, portanto, a finalidade de fazer
com que toda a atividade seguradora no Brasil se desenvolva da forma mais
harmoniosa possível, garantindo o cumprimento de todos os compromissos
estipulados por todas as partes dentro de cada operação de seguro realizada.
Para tanto, este sistema é formado por vários órgãos diferentes, cada um com
sua função e finalidade. O controle principal fica por conta do Conselho Nacional de
Seguros Privados (CNSP), enquanto que a Superintendência de Seguros Privados
(SUSEP) fica incumbida de fiscalizar todo o mercado. Por fim, os resseguros,
operações que demandam bastante atenção, são geridos pelo Instituto de
Resseguros do Brasil (IRB).
Além destes órgãos, o Sistema Nacional de Seguros Privados ainda abrange
todas as companhias seguradoras e as corretoras de seguros.
23 3.3.1 CNSP – Conselho Nacional de Seguros Privados
O Conselho Nacional de Seguros Privados faz parte da estrutura do Ministério
da Fazenda e é o órgão que normatiza as atividades e operações securitárias do
Brasil.
Na época de seu surgimento, sua principal função era a de, segundo
Guimarães (2005, p. 31): “fixar diretrizes e normas da política governamental para os
segmentos de seguros privados e capitalização”. Posteriormente, estas
incumbências também se estenderam à previdência privada, no âmbito das
entidades abertas.
Hoje, após várias mudanças ao longo dos anos, pode-se dizer que as
principais funções do CNSP são, entre outras, as de: regulamentar, normatizar,
autorizar e fiscalizar organizações envolvidas no campo do seguro, como
seguradoras e corretoras; reger as características dos contratos e dos diferentes
ramos do seguro; estabelecer e gerenciar políticas para o setor de operações
securitárias; criar diretrizes e normas para os seguros que envolvam mais de uma
seguradora simultaneamente, bem como para os resseguros.
[...] tem por função fixar as diretrizes e normas da política de seguros privados; regular a constituição, organização, funcionamento e fiscalização dos que exercem atividades subordinadas ao Sistema Nacional de Seguros Privados; bem como a aplicação das penalidades previstas; fixar as características gerais dos contratos de seguros; estabelecer as diretrizes gerais das operações de resseguro; prescrever critérios de constituição das sociedades seguradoras, com fixação dos limites legais e técnicos do mercado e a profissão de corretor de seguros. (KEEDI, 2008, p. 164)
Com isto, o CNSP se constitui na entidade máxima da atividade securitária no
país e órgão de cúpula do Sistema Nacional de Seguro Privado, sendo que todos os
seus integrantes são indicados pelo Presidente da República. São eles: o Ministro
de Estado da Fazenda, que atua como o Presidente; o Superintendente da SUSEP,
que atua como Vice-Presidente; o presidente do IRB, o presidente do Banco Central;
o secretário de Direito Econômico do Ministério da Justiça – SDE/MJ; o
representante do Ministério do Planejamento e Orçamento; representantes da
iniciativa privada, como companhias seguradoras, companhias de previdência
privada aberta, sociedades de capitalização e corretores de seguro.
24 3.3.2 SUSEP – Superintendência de Seguros Privados
Da mesma forma que acontece com o CNSP, a Superintendência de Seguros
Privados – SUSEP – também é uma entidade subordinada ao Ministério da Fazenda
e os membros de sua direção, cinco no total, sendo um superintendente e quatro
diretores, também são escolhidos pelo Presidente da República.
O intuito da sua criação foi o de funcionar como uma espécie de secretaria do
CNSP, fiscalizando as normas fixadas por este e controlando todas as organizações
que atuam na atividade securitária.
Administrada por um conselho diretor, composto pelo superintendente e por quatro diretores. Também integram o colegiado, sem direito a voto, o secretário-geral e procurador-geral. Compete ao colegiado fixar políticas gerais da autarquia (SUSEP), com vistas à ordenação das atividades do mercado, cumprir e fazer cumprir as deliberações do CNSP e aprovar instruções, circulares e pareceres de orientação em matérias de sua competência. (KEEDI, 2008, p.164)
Neste sentido, a SUSEP age aplicando sanções que se façam necessárias,
estabelecendo condições das apólices de seguro e garantindo o encerramento das
atividades de companhias que tenham o seu funcionamento cassado. Desta forma,
todo o sistema de operações de seguros no Brasil funciona em equilíbrio.
3.3.3 Brasil Resseguros S.A. – IRB
Esta entidade de economia mista foi criada para promover o melhor
desenvolvimento das operações de seguro no Brasil, esta entidade é responsável
por regular, gerir e fiscalizar as operações do tipo cosseguro, resseguro e retrocesso
no país.
O IRB é uma espécie de câmara de compensação do setor de seguros. Quando uma seguradora ultrapassa suas capacidades de garantia, o IRB absorve o excesso via resseguro. Caso as quantias envolvidas ultrapassem a capacidade do próprio IRB, ele repassa a diferença para as diversas empresas do mercado, pulverizando o risco, na operação que se chama retrocessão. Se mesmo assim não for possível obter todo o montante
25
necessário para a garantia, procuram-se outras seguradoras no exterior. O papel predominante do IRB como monopolista do resseguro e administrador do excedente único, levou o órgão a exercer um papel normativo e regulador, arbitrando praticamente todos os aspectos do mercado relativo às práticas comerciais e de formação de preços. (GUIMARÃES, 2005, p. 34)
Sendo a única companhia que opera o resseguro no Brasil, o IRB deve
exercer as funções normativas relacionadas à sua área de atuação, estabelecer
taxas e receber prêmio e pagar indenizações em moeda estrangeira.
Quem administra este órgão é o seu presidente em conjunto com um
conselho formado por três membros eleitos pelas companhias seguradoras e três
membros eleitos pelo Presidente da República.
3.4 Elementos integrantes de um contrato de seguro
Todo o contrato de seguro apresentará, de acordo com Filho (2005), como
partes integrantes: o Segurador, o Segurado, o Objeto, ou risco, e a Remuneração,
ou prêmio.
3.4.1 O Segurador e o corretor de seguros
O Segurador, ou a companhia seguradora, é a parte do contrato de seguro
que ficará responsável por segurar os bens que os contratantes do seguro desejam
proteger.
São empresas que assumem os riscos realizando os seguros para os seus clientes. Oferecem os produtos para os quais são autorizados a operar pela SUSEP, e agem de acordo com as solicitações de seus segurados. Estabelecem taxas de seguro, havendo concorrência entre elas. (KEEDI, 2008, p. 165)
26
A companhia seguradora é, portanto, a parte em um contrato de seguro que
tem a obrigação de pagar, ao segurado, a indenização diante da ocorrência do
sinistro.
Apenas uma entidade autorizada legalmente pode constar em um contrato de
seguro como segurador, e, no Brasil, o funcionamento destas companhias é
autorizado pelo Ministério da Fazenda, através do CNSP, e fiscalizado pela SUSEP.
Desta forma estas companhias podem apenas atuar nos ramos de seguro para os
quais elas recebem permissão, necessitando, para receber esta autorização, ser,
obrigatoriamente, ser uma S/A.
Além disto, estas companhias devem, por obrigação, ressegurar todos os
riscos que venham a assumir e que excedam os limites de sua responsabilidade e
capacidade de suporte, sendo, portanto também fiscalizadas pelo IRB, ao qual
apresentam balanços semestrais.
Dentro da atividade seguradora, além da Companhia de Seguros, existe ainda
a figura do Corretor de Seguros. Este, segundo Mendonça (2000), é uma pessoa
física ou jurídica que está previamente autorizada a realizar a intermediação entre o
cliente, que deseja contratar um seguro, e uma determinada empresa seguradora
que tenha interesse em prestar este serviço.
Quando a contratação do seguro se dá através de uma corretora de seguros,
é através dela que a seguradora receberá o seu pagamento e que será
providenciada a indenização a ser paga ao segurado. Neste caso, a corretora
também adquire responsabilidade civil sobre esta operação, podendo ser
responsabilizada e penalizada por qualquer problema junto ao segurado ou
seguradora.
3.4.2 O Segurado e o beneficiário do seguro
O segurado, em um contrato de seguro, pode ser tanto uma pessoa jurídica
quanto uma pessoa física. É ele a parte interessada em contratar um seguro junto a
uma companhia seguradora e o dono do bem para o qual está sendo contratado o
27 seguro. De acordo com Filho (2005, p. 33), o segurado é: “aquele que objetiva se ver
coberto do risco previsto no contrato”.
Apesar de o segurado ser a parte que contrata o seguro, nem sempre ele
também será o beneficiário deste.
Beneficiário de um seguro é aquele que será informado num eventual sinistro com o bem segurado. Pode ser o próprio segurado que efetua o seguro para proteger algo que lhe pertence, [...] ou um terceiro. (MENDONÇA, 2000, p. 197).
Diante disto, notamos que é possível a celebração de um contrato de seguro
no qual o contratante não será quem receberá a indenização caso o sinistro previsto
ocorra. Esta prática é bastante comum no caso da contratação de um seguro de vida
onde, no caso um determinado sinistro ocorrer ao segurado, estará prevista uma
indenização para um familiar ou conhecido deste.
3.4.3 Risco
O risco se caracteriza como o principal elemento que influencia a atividade
seguradora, sendo o motivo pelo qual o segurado deseja contratar o segurador. É o
objeto do seguro para que este possa existir como negócio jurídico específico, de
modo que sem a sua possibilidade de acontecimento no momento da celebração do
contrato, este contrato não surtirá efeito.
[...] o objeto do seguro não pode ser outro senão o risco contra o qual se precata o segurado, sendo sua “causa” a função sócio-econômica de satisfazer uma necessidade da pessoa em se acobertar de certo evento pernicioso aos seus interesses. (FILHO, 2005 p. 37).
Este risco, para ser válido, deve ser genuíno e concreto. Mas apenas isso, de
acordo com Issa (1986), não é necessário. É preciso que ele seja incerto, aleatório,
pois se sua ocorrência fosse certa, não haveria companhias seguradoras dispostas a
cobri-lo. Deve ser futuro, pois são se pode segurar algum sinistro que já aconteceu.
Deve ser independente da vontade do segurador, pois a vontade deste é que o risco
jamais se concretize. Deve envolver uma perda muito grande, seja econômica ou
28 não. E, por fim, deve ameaçar um número muito grande de pessoas, para que haja
muitos contratantes que desejem evitá-lo.
O segurador é apenas obrigado a indenizar os danos advindos de causas
compreendidas no campo de riscos assumidos, devendo estarem presentes no
contrato e na apólice de seguro.
3.4.4 Prêmio
Todos os contratantes de um serviço de seguro pagam uma contribuição à
empresa seguradora, pois é desta forma que estas empresas levantam o fundo
necessário para as indenizações de seus segurados vítimas de sinistros.
Esta contribuição, ou Prêmio, é, para Filho (2005, p. 43), o: “elemento
patrimonial do contrato de seguro, representando a cota-parte pela qual o
contratante ingressa na mutualidade de segurados.”
O prêmio representa o valor pago pelo segurado ao segurador, sendo que seu
montante é calculado com base na maior ou menor possibilidade de ocorrência do
sinistro.
O termo “prêmio” tem um significado totalmente distinto do seu sentido comum. Não se trata de uma importância que o segurado recebe, mas sim o que ele deve pagar à companhia seguradora. O prêmio é o preço do seguro, que, obrigatoriamente, está especificado no contrato. Isso garante que o segurador assuma a responsabilidade de determinado risco, ao mesmo tempo em que o segurado adquire o direito a uma indenização previamente combinada. (GUIMARÃES, 2002, p. 49).
Sendo o prêmio uma contribuição obrigatória por parte do segurado, caso
este não o pague nas condições estabelecidas no contrato, salvo em casos de força
maior, o segurador fica dispensado da obrigação de indenizá-lo. O não pagamento
do prêmio pode, até mesmo, vir a acarretar o cancelamento do contrato de seguro.
29 4 A NATUREZA DO CONTRATO, OS PRINCÍPIOS E A
MULTIPLICIDADE DO SEGURO
Após entender melhor no que consiste a atividade seguradora e como ela
surgiu, chegando a ser o que é hoje, bem como o seu funcionamento em território
nacional, é preciso se aprofundar melhor no estudo do contrato que formaliza uma
operação de seguro.
Este segundo capítulo trata exatamente da natureza deste contrato e suas
principais características e princípios.
Além disto, o capítulo também apresenta a como se dá a multiplicidade dentro
destes contratos, demonstrando como é possível a participação de mais de uma
companhia seguradora em um mesmo contrato.
4.1 Natureza do contrato de seguro
O produto oferecido por uma companhia seguradora, por ser um serviço, não
é algo tangível. A assinatura do contrato entre as duas partes interessadas,
segurador e segurado, dá inicio à validade da apólice de seguro, representando,
segundo Guimarães (2002), a materialização e a mudança do intangível para o
tangível. É a apólice de seguro que garante ao segurado o direito aos serviços
prestados pela seguradora quando dá ocorrência dos eventos predeterminados no
contrato.
É através do contrato de seguro que ficam definidos todos os pontos da
relação entre o segurador e o segurado. É nele que estará definido o valor do
prêmio, a especificação do sinistro e as condições para a sua ocorrência, o valor da
indenização a ser paga em cada caso, os deveres e direitos de cada parte, entre
outras coisas.
As partes de um contrato de seguro podem estipular direitos e obrigações de
acordo com seus interesses, tornando possível a contratação de um seguro para
algum bem, patrimônio ou a vida de uma pessoa. Porém, independentemente do
30 bem segurado os contratos de seguro apresentam uma série de características em
comum. De acordo com Filho (2005, p. 25), a “doutrina em geral classifica o contrato
de seguro como bilateral, oneroso e aleatório”.
É dito bilateral, pois ambas as partes tem obrigações recíprocas uma para
com a outra. Isto é, para ver-se livre de um risco que é seu, o segurado
compromete-se em pagar o prêmio, transferindo, desta forma, o seu risco para o
segurador. Este, por sua vez, mediante o recebimento do prêmio, se compromete
em aceitar o risco do segurado, livrando-o dos possíveis prejuízos ocasionados pelo
acontecimento do sinistro previsto no contrato.
De um lado o segurado se obrigando a pagar certa soma em dinheiro, [...], de outro, o segurador se comprometendo a indenizá-lo dos prejuízos, que resultem de um fato futuro e incerto. (MARQUES, 1998, p.13).
Em um contrato de seguro, uma das partes sofre um prejuízo que
corresponde à vantagem que deseja. Em outras palavras, o segurado paga o prêmio
para se proteger contra perdas e danos futuros, mas o valor do prêmio será
proporcional ao valor da indenização que o segurador irá pagar por estes danos. Por
isso o contrato é dito oneroso. O contrato de seguro não visa produzir
enriquecimento ao segurado, ato este proibido pelo Código Civil. Portanto, quanto
maior o benefício que o segurado deseja obter, maior será o valor a ser pago por ele
por conta da obtenção deste benefício.
O caráter aleatório do contrato diz respeito apenas ao segurado, pois este
paga a sua contribuição, previamente estabelecida, sem que exista ainda o fator que
obrigará o segurador a indenizá-lo. Mesmo que o segurado pague o valor integral do
prêmio que lhe foi imposto, o pagamento da indenização por parte do segurador está
necessariamente ligado ao acontecimento do risco contra o qual o segurado está
protegido. Caso este risco não venha a se concretizar, o segurador não é obrigado a
repor o valor investido pelo segurado. Já o segurador, no momento da assinatura do
contrato, já tem o conhecimento do valor que irá receber em troca de assumir o risco
do segurado.
31 4.2 O princípio da boa-fé
Derivado do latim bona fides, o princípio da boa-fé é essencial para qualquer
tipo de contrato, seja ele nacional ou internacional, e engloba honestidade,
fidelidade, confiança, crença e sinceridade. Ou seja, é o elemento que garante a boa
intenção das partes envolvidas em um contrato. Sem ela, um contrato perde a sua
confiabilidade, tornando-se nulo.
[...] é entendida como a convicção ou consciência de praticar ato legítimo ou de não prejudicar outrem, possuindo um conceito ético-social ligado à moralidade da conduta social dos indivíduos, despertando interesse do direito para conceder-lhe efeitos jurídicos ou revestir-lhe de elementos acessórios. (FILHO, 2005, p. 84).
Se tratando de um elemento necessário para qualquer contrato, a boa-fé é
algo ainda mais importante em um contrato de seguro. O principal motivo disto é que
a sinceridade é o primeiro fator em que está baseada a declaração de vontade que
dá origem à contratação do seguro e à relação do segurado com o segurador. Tanto
o segurador, quanto o segurado devem agir sempre com veracidade e boa-fé.
Para Guimarães (2002) a análise da questão da boa-fé e a sua presença ou
ausência é algo muito importante, pois, na sua concepção subjetiva a boa-fé se
opõe à má-fé. Entretanto, isto não ocorre com boa-fé objetiva, aplicada na prática
em um contrato de seguro. Esta não se opõe especificamente à má-fé, mas sim à
ausência da boa-fé.
Na boa-fé crença, também chamada de subjetiva, existe a convicção do agente na legalidade de sua conduta, baseando-se no erro ou ignorância da verdadeira situação jurídica que envolve a coisa [...]. Na boa-fé lealdade, também denominada objetiva, o comportamento honesto e probo acompanha a atitude do agente de forma tão evidente que não necessita ser demonstrado, dispensando indagar acerca de sua intenção em prejudicar os outros e fraudar a lei, pois considera apenas a sinceridade que deve existir no comércio jurídico, segundo o padrão de usos sociais e bons costumes [...]. (FILHO, 2005, p. 85)
Portanto, em um contrato de seguro, mesmo uma atitude não revestida de
má-fé ou dolo, mas que careça de boa-fé, já é fator suficiente para gerar sanções ao
segurado ou segurador.
32
É de suma importância que o segurado jamais omita qualquer informação, a
respeito do bem para o qual está contratando o seguro, que possa vir a influenciar a
análise dos riscos envolvidos e do prêmio a ser pago, bem como o cálculo do seu
valor, sob pena de perder garantias e o direito à indenização, mesmo que esta
omissão não tenha sido intencional.
De acordo com Martins (2008), é dever do segurado sempre manter a
companhia seguradora informada a respeito de qualquer novo fator ou que possa vir
a exercer influência sobre os riscos aos quais o bem segurado está sujeito e sempre
evitar todo e qualquer acontecimento que possa agravar estes riscos.
O princípio da boa-fé também deve se manifestar por parte da seguradora,
que deve sempre se portar de maneira honesta e clara durante toda a validade do
contrato de seguro, seja na assinatura, na conclusão ou na execução do mesmo.
Segurado e segurador são obrigados a guardar, na conclusão e na execução do contrato, as mais estritas boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes [...]. Declarações inexatas ou omissão de circunstâncias por parte do segurado podem resultar na perda de garantia [...] e em nulidade ou anulação do contrato [...]. (MARTINS, 2008, p. 409)
O simples fato de uma das partes não agir de acordo com os padrões de
conduta exigíveis no contrato de seguro, já caracteriza um desrespeito a este.
4.3 O princípio do interesse segurável
Este é um dos mais importantes princípios em um contrato de seguro e o
principal requisito para a efetivação do mesmo.
O Interesse Segurável é a relação legal e válida entre o valor econômico de
um bem e o risco, com possibilidade concreta de causar danos, que possa vir a
afetar este bem. De uma forma mais simples, pode também ser entendido como o
interesse por parte do segurado de que o sinistro não venha a ocorrer. Interesse
este, que apenas se torna, de fato, segurável, quando o valor econômico de um bem
de sua propriedade se encontra ameaçado.
33
O interesse segurável não é só um requisito essencial do contrato – é também um elemento que preserva a natureza autêntica da instituição seguradora e sustenta as bases técnicas do seguro, já que sem interesse segurável a sinistralidade seria impossível, em virtude da impossibilidade muito grande de ocorrência de fraudes no contrato de seguros, contra as companhias seguradoras, objetivando o recebimento da indenização por parte do segurado para um dano que não se efetivou ou foi efetivado propositalmente. (GUIMARÃES, 2002, p. 52).
Sendo assim, a importância do interesse segurável vem do fato de que este é
o princípio que legitima o contrato de seguro, pois é o que garante que o segurado
não está disposto a ter o objeto para o qual contratou o seguro, danificado. Isto
evita, pelo menos em teoria, que ele queira prejudicar a si mesmo apenas para
receber a indenização da seguradora.
O interesse segurável deve existir antes mesmo que o contrato de seguros
seja assinado e concluído. De acordo com Marques (1998, p. 42): “uma pessoa pode
ser considerada titular de um interesse segurável, sempre que detiver alguma
relação de natureza legal ou contratual com a mesma ou com qualquer bem
segurável nela envolvido”.
Sendo assim para que o interesse segurável exista, três elementos se fazem
necessários: a existência do bem em si; a relação jurídica do segurado com este
bem; e, por fim, que esta relação esteja sujeita a algum risco.
4.4 O princípio da sub-rogação
Este princípio surgiu inicialmente no seguro marítimo, sendo, posteriormente
estendido aos outros campos do seguro.
Quando algo, como uma pessoa ou objeto, é colocado no lugar de outra
coisa, consitui-se um ato conhecido como sub-rogar.
No campo do seguro, a sub-rogação representa exatamente o direito que a
companhia seguradora tem de se apossar dos bens indenizados para que, com eles
em mãos, possa se ressarcir do valor pago ao segurado como indenização.
Afirma Keedi (2008) que: “após paga a indenização, a seguradora terá o
direito à sub-rogação, até o valor da indenização, contra aquele que tenha causado
o prejuízo indenizado”. Desta maneira, para que a sub-rogação possa ocorrer, a
34 seguradora necessita, primeiro, pagar a indenização pelo sinistro ocorrido ao
segurado, para, apenas então, exigir o ressarcimento dos valores pagos.
Para que o segurador possa fazer uso dessa prerrogativa legal, é imprescindível comprovar ter indenizado o seu segurado, pois nesta matéria vigora o princípio de que sem desembolso não há reembolso. Face a isso, na sua ação regressiva, além de demonstrar a qualidade de sub-rogado através do recibo de pagamento emitido pelo segurado, deverá provar também a culpa do terceiro no evento, pois esta constitui o fato gerador da obrigação de indenizar. (FILHO, 2005, p. 184).
O segurador assume um papel de terceiro interessado, buscando a devolução
da quantia que desembolsou para cobrir o sinistro. O processo de sub-rogação
transfere a ele todos os direitos, garantias, ações e privilégios que antes pertenciam
ao segurado. Ou seja, assim que a seguradora paga a indenização pelo sinistro
sofrido pelo bem segurado, ela adquire o direito de cobrar judicialmente, de quem
provocou o sinistro, a reparação dos danos provocados por ele. A ela são também
transferidas e fornecidas todas as condições necessárias para que esta ação possa
ser movida com sucesso.
O princípio legal que suporta essa idéia é o de que, se existe um contrato indenitário e ocorre um prejuízo ou um dano, tudo o que contribuir para reduzi-lo também contribuirá para diminuir o valor da indenização que o seguro deverá pagar. (MARQUES, 1998, p. 53)
Assim sendo, a seguradora que efetua o pagamento de uma indenização, terá
direito sobre qualquer bem que possa, de fato, diminuir a quantia do prejuízo tido
por ela. Entretanto, isto apenas se aplica se ela realmente efetuar este pagamento.
Os sinistros aos quais os bens segurados estão sujeitos são inúmeros,
podendo resultar tanto em perda parcial, quanto em perda total.
A perda total real se opera nas hipóteses do objeto segurado ser destruído, ou tão extensamente danificado que fica destituído das características que tinha quando iniciou-se o seguro. A perda total presumida abrange as hipóteses de o segurado ficar privado do objeto segurado ou o objeto segurado ser dado como desaparecido após período razoável. A ocorrência de perda total construtiva (ou legal) consagra as hipóteses de abandono sub-rogatório e compreende o objeto segurado ser abandonado à seguradora em razão de ser inevitável sua perda total real ou o custo de preservação, recuperação, reparação ou reconstrução do objeto segurado ser igual ou superior a 75% do valor de mercado [...]. (MARTINS, 2008, p. 445)
35
Desta forma, os efeitos da sub-rogação acompanham a natureza do tipo de
sinistro ocorrido. Por exemplo: no caso de comprovada a destruição total ou parcial
do bem segurado, a companhia seguradora pode requisitar a propriedade dos restos
deste bem. No caso de uma indenização não por destruição, mas sim por
desaparecimento de um bem por um período de tempo considerável, a seguradora
pode requisitar a posse integral deste bem caso ele venha a aparecer
posteriormente.
4.5 Contratos de seguros múltiplos
A multiplicidade de seguros torna possível a participação de mais de uma
companhia seguradora dentro de uma mesma operação de contratação de seguro.
Isto pode se dar por uma infinidade de motivos diferentes, como, por exemplo,
quando uma seguradora não tem capacidade técnica suficiente para suportar um
determinado contrato de seguro, ou então o risco deste contrato é muito alto para
que a seguradora o assuma sozinha.
Os tipos especiais de contratos de seguro que permitem a participação de
duas ou mais seguradoras na mesma operação são: o cosseguro, o seguro múltiplo,
o resseguro e a retrocessão.
No Brasil, estas operações, de cosseguro, resseguro e retrocessão, são
reguladas pelo Instituto de Resseguros do Brasil – IRB.
4.5.1 Cosseguro
O cosseguro é um tipo de contrato de seguro que se caracteriza pela
participação de várias companhias seguradoras ao mesmo tempo, onde o risco total
é dividido entre todas as seguradoras participantes. Entretanto, existe apenas uma
única apólice de seguro abrangendo todas elas.
36
Cosseguro significa a diluição da responsabilidade de um seguro entre duas ou mais seguradoras ou, em outras palavras, a quebra de um seguro em vários seguros menores. Isto significa que um seguro de valor muito grande, para ser assumido por uma única seguradora, é dividido com outras. [...] Os vários seguros somados deverão ser equivalentes ao seguro total, não podendo excedê-lo. (MENDONÇA, 2000, p. 214-215).
Não é obrigatório que esta divisão de riscos e responsabilidades seja feita de
maneira igual. Cada seguradora pode assumir uma parte do risco à qual estiver
disposta, mesmo que esta seja maior ou menor do que a parte de uma outra, desde
que a soma total das partes de cada seguradora seja igual ao risco total coberto pelo
seguro.
O mesmo ocorrerá também com o valor do prêmio a ser pago pelo segurado.
O prêmio também é dividido entre todas as seguradoras de maneira proporcional ao
risco que cada uma delas assumiu. Quanto maior a responsabilidade de uma
seguradora, maior será a parte do prêmio destinada a ela.
As seguradoras que participam de um contrato de cosseguro, de acordo com
Guimarães (2005), são denominadas de cosseguradas cotizantes e, pelo fato de o
cosseguro ter apenas uma única apólice de seguro, nesta deve constar a
participação de cada uma delas no total do valor segurado.
Caso não haja um registro documentado informando a parte do risco que foi
assumida por alguma destas cosseguradoras cotizantes, esta estará assumindo
automaticamente uma responsabilidade solidária pelo valor que ainda restar ser
indenizado, juntamente com todas as outras seguradoras que se encontrarem na
mesma situação, conforme afirma Martins (2008, p. 422) ao citar o art. 668 do
Código Comercial:
Sendo diversos os seguradores, cada um deve declarar a quantia por que se obriga, e esta declaração será datada e assinada. Na falta de declaração, a assinatura importa em responsabilidade solidária por todo o valor segurado. Se um dos seguradores se obrigar por certa e determinada quantia, os seguradores que depois dele assinarem sem declaração de quantia por que se obrigam, ficarão responsáveis cada um por igual soma.
O cosseguro pode ser realizado tanto por uma seguradora incumbida de
realizar o seguro total, quanto pelo próprio segurado.
O primeiro caso, no entanto, é o mais comum. A seguradora escolhida,
denominada de seguradora-líder, deverá então gerir o contrato de seguro, ficando
responsável pela sua conclusão e execução. É responsável também, de acordo com
37 Mendonça (2000), pela emissão da apólice de seguro, regulação do sinistro,
distribuição da porcentagem do prêmio que cabe a cada uma das cosseguradoras
cotizantes e recolhimento do valor da indenização, para então repassá-la ao
segurado quando este a solicitar.
Quando o cosseguro é realizado pelo segurado, não existe a figura da
seguradora-líder, pois, conforme Mendonça (2000, p. 215) é o segurado que:
“negociará com cada seguradora uma parte do seguro total, bem como a taxa de
seguro, e pagará a cada uma delas o prêmio correspondente”. Desta maneira cada
uma destas seguradoras deve ser acionada de maneira individual, diante a
ocorrência de um sinistro, não sendo responsabilidade de uma delas em específico
gerir todo este processo.
4.5.2 Seguro múltiplo
O seguro múltiplo funciona de maneira muito similar ao cosseguro, pois o
risco total também é coberto por mais de uma companhia seguradora.
Porém, no seguro múltiplo, cada seguradora cobre este risco dividindo-o
simultaneamente com as outras seguradoras participantes processo. Conforme
afirma Martins (2008): “no seguro múltiplo, há mais de um segurador garantindo, ao
mesmo tempo, o mesmo interesse do segurado, sem que exista sobreposição do
mesmo seguro”.
Diferentemente do cosseguro, no seguro múltiplo cada seguradora tem o seu
próprio contrato e a sua própria apólice de seguro.
4.5.3 Resseguro
O contrato de resseguro pode ser entendido como uma espécie de seguro do
seguro. Isto porque ele consiste na transferência, em parte ou em sua totalidade, da
38 responsabilidade assumida por uma seguradora, dentro de um contrato de seguro,
para outra seguradora.
Em outras palavras, é quando um segurador contrata outro segurador para
que, caso ocorra um sinistro, possa repartir com este a responsabilidade de
indenizar o segurado. Esta outra companhia seguradora, contratada pela seguradora
original, fica conhecida como resseguradora e a ela é pago, por parte da seguradora
que a contrata, uma espécie de prêmio.
Em linhas gerais, é o contrato de seguro que uma companhia seguradora contrata com outra companhia (aqui no caso uma resseguradora), na condição de segurada. Por ter assumido riscos muito elevados, e que poderão comprometer a sua liquidez ou mesmo levá-la à falência, a companhia seguradora, precavendo-se, divide o risco com outra companhia, resseguradora, pagando a esta um prêmio. (GUMARÃES, 2002, p. 60)
O principal fator que leva à contratação de um resseguro ocorre justamente
quando uma seguradora assume um risco muito maior do que ela pode arcar,
gerando uma responsabilidade grande demais e que ultrapasse a capacidade que
esta seguradora tem de indenizar o seu segurado. Desta maneira, para evitar
problemas com o segurado, ela recorre a uma resseguradora para a divisão da
responsabilidade.
Entretanto, perante este segurado, a responsabilidade pelo pagamento da
indenização é unicamente da companhia seguradora que ele contratou. A
resseguradora apenas irá pagar um seguro à seguradora original, caso esta tenha
que pagar uma indenização devido a algum sinistro ocorrido. O segurado cobrará a
indenização apenas da seguradora contratada, não da resseguradora.
4.5.4 Retrocessão
A retrocessão consiste na extensão do direito de resseguro aos próprios
resseguradores.
Da mesma forma que uma seguradora tem a opção de transferir parte da sua
responsabilidade pelos riscos assumidos a um ressegurador, este também pode
fazê-lo, indo ao mercado de seguros e repassando parte do resseguro que assumiu
39 a outros resseguradores, quando este resseguro assumido ultrapassar a sua
capacidade cobrir indenizações.
De acordo com Martins (2008, p. 423) retrocessão é: “a operação pela qual o
ressegurador procede á colocação se seus excedentes, no mercado interno ou
externo, junto a outros seguradores. Trata-se de novo resseguro do ressegurador.”
Esta nova operação de contratação de resseguro não tem nada a ver com a
anterior (o resseguro contratado pela seguradora original), se tratando de uma
operação totalmente nova, portanto não significa que o ressegurador está
devolvendo os resseguros recebidos das seguradoras.
40 5 NATUREZA E IMPORTÂNCIA DOS P&I CLUBS
Uma embarcação de transporte internacional é um bem de imenso valor.
Sendo assim, é praticamente obrigatório que esteja constantemente amparada por
um contrato de seguro marítimo, que a proteja das perdas e riscos diversos aos
quais ela, bem como sua tripulação, carga e passageiros, estão sujeitos durante
expedições marítimas.
Assim como existem casos onde várias seguradoras participam
simultaneamente de uma mesma contratação de seguro, conforme ocorre nos
contratos de seguros múltiplos, há também os casos onde vários segurados se
reúnem, sob forma uma associação, para que, mutuamente, possam prestar auxílio
um ao outro, complementando o benefício concedido por suas respectivas
seguradoras.
No campo do direito marítimo, o exemplo mais evidente deste tipo de
sociedade são os P&I Clubs (Protection and Indemnity Clubs – Clubes de Proteção e
Indenização em português), cujos membros associados são armadores
interessados, basicamente, em aumentar a cobertura fornecida aos seus navios
pelas companhias de seguro marítimo.
5.1 Definição de P&I Club
Em um contrato de transporte marítimo internacional, dependendo da
legislação aplicável ao mesmo, podem ou não existir cláusulas que isentem o
transportador da mercadoria de indenizar embarcadores e/ou terceiros por quaisquer
perdas e riscos ocorridos à esta mercadoria.
Certas legislações isentam quase que totalmente o transportador marítimo da
responsabilidade por eventuais sinistros que ocorram com as cargas a bordo.
Outras, por sua vez, aumentam ainda mais a responsabilidade do transportador
perante estes perigos. Isto significa que alguns dos riscos amparados pelo seguro
41 contratado pelo embarcador ou dono da mercadoria, passam para o seguro de
responsabilidade civil do transportador por perdas e danos à mercadoria.
As principais necessidades de um armador, ao contratar um seguro são,
basicamente, segurar a própria embarcação, maquinário e tripulação a bordo, e se
precaver contra eventuais responsabilidades para com terceiros. A embarcação em
si já está geralmente protegida pela apólice de seguro padrão no mercado de
seguros. Já responsabilidades para com terceiros, nem sempre estão cobertas desta
forma, sendo tradicionalmente cobertas por P&I Clubs. Segundo Martins (2008), este
seguro de responsabilidade civil por perdas e danos à mercadoria é geralmente
efetuado perante os P&I Clubs, sendo também chamado de Seguro dos P&I.
Primeiramente, um P&I Club, ou Clube de Proteção e Indenização, é uma
associação formada por armadores e operadores de navios, de diferentes centros
náuticos do mundo, agrupados com o intuito de, mutuamente, prestarem ajuda uns
aos outros, e não de produzir lucros com isso. De acordo com Martins (2008) são
“associações de seguro mútuo, entidades sem fins lucrativos mantidas através de
contribuição de seus membros”.
O website do UK Club, conforme ressalta Anderson (2007), define os P&I
clubs como um clube que fornece auto-segurança coletiva a seus membros, onde a
participação de um membro está compromissada com o interesse comum do grupo
em direcionar esforços para obter coberturas de seguros.
Em outras palavras, P&I Clubs são basicamente grupos de armadores que,
mesmo concorrendo profissionalmente entre si, concordam em cooperar e segurar
uns dos outros quanto às responsabilidades por perdas e danos que recaiam sobre
cada um, em um espírito de mutualidade e sem fins lucrativos.
São sociedades de seguro mútuo, pois cada sócio participante contribui com
uma anuidade que será posteriormente utilizada, juntamente com as demais, para o
ressarcimento dos prejuízos que qualquer um dos membros do clube venha a ter, e
que não sejam cobertos pelo seguro marítimo contratado pelo sócio em questão.
As anuidades também representam a fonte de renda do próprio clube,
servindo também para cobrir suas despesas.
To a significant degree, those individuals who are the ones being insured and who ultimately run their own club/insurance facility can also decide which risks they cover and which they do not, which claims they pay and which claims they reject. Their club is likely to employ a very experienced, knowledgeable diverse staff to run the club on a day-to-day basis but can be
42
called upon by any of the members to assist them and provide advice and help on a wide range of problems and issues. (ANDERSON, 2007, p. 9-10).1
Em partes, o funcionamento de um P&I Club se assemelha ao de uma
companhia seguradora. Contudo, os P&I Clubs são dirigidos e operados pelos seus
próprios sócios membros. Estes tomam, em conselho, todas as principais decisões,
apenas contando com o auxílio de outros funcionários contratados para funções
específicas.
P&I and liability insurance will have many things in common with other insurances you will have looked […]. However, in many ways it is very diffetent, particularly in the way in which the clubs are set up and operated within the concept of mutuality. (ANDERSON, 2007, p. 5)2
Para se associar a um destes clubes, além de estar apto a arcar com os
custos e anuidade do mesmo, basta que um armador inscreva pelo menos um de
seus navios como beneficiário das vantagens oferecidas pelo clube.
Este fato torna a adesão a um P&I Club relativamente acessível e faz com que
o número de adesões em um ano seja bastante significativo, já que a grande maioria
dos navios em atividade hoje, faz parte de algum P&I Club.
Para inscrever um navio, o armador preenche o formulário próprio de pedido de admissão, que contém todos os dados e detalhes da embarcação. A contribuição (anuidade) é calculada em dólares por tonelada do navio inscrito, e feita de forma adiantada. Na hipótese dos gastos com indenizações e despesas de administração superarem a quantia arrecadada mais as reservas, os armadores são chamados a fazerem contribuições adicionais. O navio que se inscrever em um P&I paga prêmio promocional no período do ano P&I posterior a 20 de fevereiro, pois o ano para os Clubes P&I inicia e termina ao meio-dia do dia 20 de fevereiro. (MARTINS, 2008, p. 489)
Desta forma, nota-se também que um mesmo armador não precisa associar
todos os seus navios ao mesmo clube, podendo inscrever cada navio em um clube
diferente.
1 Tradução livre do autor: Em um grau significativo, os indivíduos que estão sendo segurados é que dirigem seu próprio clube, podendo também decidir quais riscos são cobertos e quais não são, quais exigências serão atendidas e quais não serão. O clube pode também empregar uma vasta e experiente rede de funcionários para cuidar dos assuntos do dia-a-dia do clube, mas que também podem ser convocados por qualquer um dos membros para auxiliar e oferecer conselhos em diversos assuntos e problemas diferentes. 2 Tradução livre do autor: Seguro de P&I tem muito em comum com outras formas de seguros que podem ser encontradas [...]. Entretanto, é diferente em muitas maneiras, particularmente no modo de organização e operação dos clubes, dentro do conceito de mutualidade.
43
Ao comparar os P&I Clubs de hoje, às sociedades precursoras dos mesmos,
na época de seu surgimento, perceberemos que foi principalmente por força da
necessidade dos armadores que os clubes prosperaram e evoluíram ao ponto em
que estão hoje.
5.2 Origem histórica dos P&I Clubs
A origem histórica dos P&I Clubs está intimamente ligada ao desenvolvimento
do seguro marítimo, tendo também ocorrido na Inglaterra.
O mercado inglês de seguros marítimos no século XVIII estava monopolizado
nas mãos da Royal Exchange Assurance Co. e da London Assurance Co., que, de
acordo com Anderson (2007), eram as únicas duas companhias com autorização
legal para operar neste campo.
Este fato representava uma enorme desvantagem para os operadores de
navios da época, pois as companhias detentoras do monopólio ditavam as regras do
mercado, definindo preços e termos contratuais, da forma que desejassem.
Além disso, boa parte dos armadores ingleses não estava sediada em
Londres, mas sim em outras localidades. Este fato acabava por dificultar o seu
acesso ao mercado londrino de seguros e aos serviços oferecidos pelas duas
companhias. Para contornar este fato, a saída para estes armadores foi a de eles
mesmos começarem a se organizar em clubes ou sociedades de ajuda mútua. Estas
sociedades sem fins lucrativos, na época, ficaram conhecidas como Mutual Hull
Clubs, e tinham o intuito de proteger seus membros contra danos aos cascos de
suas embarcações. Nelas, caso uma embarcação de algum membro sofresse algum
problema ou avaria, uma contribuição financeira era arrecadada de cada um dos
outros sócios participantes para cobrir este prejuízo.
Shipowners were developing in clusters in the great maritime ports of the country, such as Liverpool, Sunderland, Newcastle, Bristol, Falmouth and Hull, as well as many ports which were much more significant in importance in the early 18th century than are perhaps now. The shipowners of these maritime towns and cities did not have easy access to the limited insurance market in London, nor were they prepared to pay unreasonably high levels of premium. […] the shipowners of this towns and cities started to form
44
themselves into associations of clubs whereby they agreed to insure each other in a mutual basis. These became known as mutual hull clubs. Initially, it would appear, the insurance concept was quite simple such that it a member of the club was to lose one of his ships, then a financial call was made on the rest of the members of that club to raise money to compensate that shipowner member for his loss. (ANDERSON, 2007, p. 12)3
Este sistema de ajuda mútua, entretanto, não era perfeito, pois era muito
comum que os sócios bons e honestos pagassem pelos erros dos maus. Mesmo
assim, estas sociedades seguiram em frente, formando a base para o surgimento
dos primeiros P&I Clubs, no início do século XIX.
Esta evolução se deu de maneira natural, devido, principalmente a mudanças
significativas na legislação de seguros inglesa.
No ano de 1810, havia mais de vinte destes Mutual Hull Clubs atuando e
prosperando no mercado inglês, conforme aponta Martins (2008). Em 1824, contudo,
o monopólio das duas companhias sobre o mercado de seguros foi quebrado por um
ato parlamentar inglês, permitindo que novas companhias seguradoras adentrassem
o mercado, com preços e ofertas muito mais acessíveis. Isto permitiu aos bons
armadores a obtenção de maiores lucros no mercado, pois não eram mais obrigados
a pagar altos preços por serviços de seguro, muitas vezes, pouco vantajosos.
Por outro lado, a quebra do monopólio representou uma enorme perda de
importância das sociedades mútuas de armadores. Muitos clubes perderam alguns
de seus melhores membros, ficando a mercê de armadores que mais traziam
problemas do que soluções, conseqüentemente, entrando em declínio quase
inevitável. Este declínio foi justamente o que abriu caminho para que os primeiros
clubes de proteção e os primeiros clubes de indenização, que inicialmente atuavam
separadamente, se estabelecessem.
Durante a primeira metade do século XIX, a responsabilidade civil por perdas e
danos a terceiros não era algo de exigia grande preocupação por parte das
empresas navegadoras. Conseqüentemente, as companhias de seguros também
3 Tradução livre do autor: Armadores estavam se desenvolvendo aos montes em grandes portos marítimos do país, como Liverpool, Sunderland, Newcastle, Bristol, Falmouth e Hull, bem como em muitos outros portos com mais importância no início do século 18 do que hoje em dia. Os armadores destas cidades marítimas não tinham acesso fácil ao limitado mercado de seguros em Londres, nem estavam eles dispostos a pagar prêmios de valores absurdos. [...] estes armadores começaram a se juntar em sociedades ou clubes pelos quais eles concordavam em segurar uns aos outros em uma base mútua, Estes ficaram conhecidos como mutual hull clubs. Inicialmente, o conceito de seguros neles era muito simples, onde se um membro do clube estava para perder um de seus navios, então uma chamada financeira era feita junto aos outros membros remanescentes para levantar fundos e compensar aquele membro por sua perda.
45 não precisavam se preocupar em ter que oferecer coberturas para estes casos.
Entretanto, conforme aponta Anderson (2007), este fato começou a mudar devido a
novas leis sociais e trabalhistas e também a um caso jurídico em especial, Vaux x
Salvador, em 1836, onde um armador precisou indenizar outro, por conta de uma
colisão entre seus navios, e posteriormente cobrou este prejuízo de sua seguradora.
Como resultado, os armadores começaram a se voltar para suas seguradoras,
exigindo alterações em nas apólices de seguro para incluir cláusulas que os
protegessem da responsabilidade por colisões. As seguradoras, por sua vez,
concordaram em ressarcir os segurados em apenas 75% do valor total dos prejuízos
com sinistros desta natureza, deixando os outros 25% do valor por conta do próprio
segurado.
The insurers agreed to include cover under a Running down Clause (RDC), but only to the extend of 3/4th of the claim, leaving the remaining 1/4th with the shipowner. Apparently, the thinking behind leaving this level of risk with the shipowner […] was to encourage them to exercise greater care with their navigation and collision avoidance of their vessels. The shipowners considered this uninsured risk too high to carry themselves and turned to the mutual hull clubs to see if they would cover the 1/4th RDC risk. (ANDERSON, 2007, p. 13)4
Desta forma, as companhias seguradoras poderiam evitar negligências por
parte de armadores, capitães e tripulação, obrigando-os a tomar mais cuidado em
todos os momentos da expedição marítima, já que em caso de perdas e danos a
embarcação, por mais que estivessem segurados, estes teriam que arcar ainda com
um quarto do valor do sinistro.
Para não sair em um prejuízo maior, os armadores se voltaram para os antigos
Mutual Hull Clubs, na esperança de que estes pudessem arcar com a parcela de
valor não coberta pelo seguro. Esta necessidade trouxe um novo fôlego para estas
sociedades mútuas, que a partir daí começaram a se reerguer e evoluir.
Esta transformação foi impulsionada também pelas reformas sociais inglesas,
que concederam aos trabalhadores, incluindo os marinheiros, direitos legais nunca
vistos antes.
4 Tradução livre do autor: As seguradoras consentiram em incluir a cobertura sob uma Cláusula Running Down (RDC), que se estendia apenas a ¾ do valor total exigido, deixando o remanescente ¼ para o armador. Aparentemente, o pensamento por trás desta prática de deixar este valor para os armadores era justamente encorajá-los a exercitar um cuidado maior com sua navegação e prevenção de colisões de seus navios. Os armadores ainda consideraram este risco não coberto alto demais e recorreram aos mutual hull clubs para ver se estes cobririam este ¼ de valor restante na RDC.
46
[…] employers had to provide safe places of work, hours of work were to be regulated, the minimum age of workers was to be regulated. Employers would face liability claims if employees were injured at work, particularly if the accident could be traced to some failure to comply with their legal obligations. (ANDERSON, 2007, p. 14)5
Desta forma, a suscetibilidade dos armadores à todas as suas obrigações
legais era grande e, naquela época, ainda não possuíam coberturas de seguradoras
para estes casos. Além disto, cada vez mais, os armadores se viam sendo
responsabilizados por danos à propriedade de terceiros, como portos, piers e docas.
Como saída, os armadores, aos poucos voltavam a recorrer e ressuscitar as
antigas sociedades mútuas. Porém estas sociedades também tiveram que se
adaptar à nova realidade do mercado de seguros britânico, fornecendo coberturas
em casos de mortes e ferimentos e também cobertura da parcela de ¼ dos valores
por perdas e danos à propriedade.
Responsabilizar os armadores por perda de cargas a bordo também não era
uma preocupação significativa, mas isto acabou mudando a partir da segunda
metade do século XIX. Segundo Anderson (2007), por lei os armadores eram
obrigados a manter seus navios em perfeitas condições de navegabilidade, devendo
ser responsabilizados por qualquer dano sofrido pela carga e que fosse ocasionado
por falta destas condições de navegabilidade adequadas. Mesmo assim,
pouquíssimos donos de cargas avariadas tentavam entrar na justiça para obrigar os
armadores a indenizá-los por suas perdas. Isto acabou mudando, e armadores
passaram a ser cada vez mais responsabilizados nestes casos, voltando-se também
para as sociedades mútuas, dando-lhes ainda mais força.
O primeiro P&I Club propriamente dito foi formado em 1886, chamado de
North of England Protection and Indemnity Association, e muitos outros surgiram nos
anos seguintes, permanecendo na ativa até os dias de hoje.
Desde o final do século XIX, houve pouca alteração na estrutura dos P&I
Clubs e nos riscos cobertos por eles. No início do século XX, o papel de um P&I
Club já era, basicamente, cobrir ¼ do valor dos prejuízos devido a colisões,
5 Tradução livre do autor: [...] empregadores tinham que fornecer condições seguras de trabalho e estabelecer cargas horárias e idades mínimas para os trabalhadores. Empregadores seriam responsabilizados judicialmente caso seus empregados se machucassem no trabalho, particularmente se o acidente fosse fruto de uma falha do empregador a se adequar às suas obrigações legais.
47 indenizações por ferimentos e mortes, indenizações por danos a propriedade de
terceiros e responsabilidades relativas à perda e avaria de cargas.
5.3 Funções dos P&I Clubs
Um P&I Club, não é uma Companhia de Seguro Marítimo, nem atua da
mesma maneira. Seu papel é, basicamente, aumentar a proteção que os armadores
recebem das companhias seguradores, garantindo a cobertura dos prejuízos que,
eventualmente, não forem amparados por estas. É uma sociedade que não visa
lucro, mas sim um esforço mútuo de seus membros para reduzir ao máximo seus
prejuízos em acidentes e infortúnios envolvendo suas embarcações.
A primeira e principal função de um P&I Club é a de cobrir a parcela de 25%
dos prejuízos provenientes de um sinistro por colisão. Parcela esta, que recai sobre
os ombros do armador, conforme já citado anteriormente.
The incomplete cover provided by the 3/4ths Collision Liability clause reflects a practice of leaving the assured to be his own insurer for part of the risk, so as to urge him to take grater care, to the advantage of the insurer. As a consequence, however, it became common for shipowners to arrange mutual insurance of the uninsured sum, by P&I Clubs. (ROSE, 2004, p. 302)6
Conforme aponta Martins (2008), a lista de coberturas de prejuízos, por
responsabilidade civil por perdas e danos, oferecidas pelos P&I Clubs a seus
membros é bastante diversificada, englobando, principalmente, os casos abaixo:
• Participação em avaria grossa;
• Riscos de colisão, em relação a carga e ás avarias causadas à
propriedade de terceira parte, a objetos fixos e flutuantes;
6 Tradução livre do autor: A cobertura incompleta suprida pelos ¾ (três quartos) da Cláusula de Responsabilidade por Colisão reflete a prática de deixar o segurado como seu próprio segurador em relação a parte do risco, para forçá-lo assim a tomar um cuidado maior, em vantagem da seguradora. Como conseqüência, entretanto, tornou-se comum para os armadores se reunirem e arranjarem uma cobertura mútua do valor não coberto pela seguradora, sob a forma de P&I Clubs. (ROSE, 2004, p. 302)
48
• Avarias a navios, carga e outros objetos que não decorram em
abalroamento ou colisão;
• Perda ou falta de carga ou outra propriedade;
• Cobertura de danos pessoais;
• Multas por infrações à legislação;
• Despesas de quarentena e de greves;
• Cobertura de prejuízos e penalidades em casos de poluição marinha;
• Avarias ou compensação por perda de vida, acidente pessoal ou doença
causada a uma terceira parte;
• Pagamento de indenizações a vítima ou seus familiares em casos de
acidentes de trabalho.
Contudo, apesar de atuar principalmente oferecendo coberturas de prejuízos
com perdas e riscos, diferentemente das sociedades que os originaram, os P&I
Clubs também desempenham outras funções de grande relevância em prol de seus
associados, atuando também na prevenção de riscos e perdas para a embarcação,
carga, passageiros e tripulação.
No caso de um armador ainda não ter recebido o pagamento de algum frete ou
demurrage que lhe é devido, um P&I Club pode auxiliá-lo significativamente a obter o
pagamento destes valores, conforme explica Anderson (2007). O clube não ressarci
os valores devidos ao armador, no entendo, cobre todos os custos legais, como
advogados, especialistas, e custos de tribunal, que o armador contrair durante
disputa com seu credor. O clube também arca com estas despesas legais no caso
de o armador sócio ser o réu, e estiver devendo alguma demurrage ou frete. Esta
cobertura é conhecida como Frete, Demurrage e Defesa (FD&D), ou simplesmente
cobertura de defesa.
Uma embarcação em expedição marítima está também, direta ou
indiretamente, sujeita a riscos e danos causados por motivos de guerra e/ou
ataques. Estes tipos de risco são amparados por cláusulas específicas em apólices
de seguros especiais.
It became common to exclude such risks (war and strikes) from ordinary “marine” policies by means of a “free of capture e seizure” (“fc&s”) clause. The practice of separately insuring marine and war risks has been regularized since a resolution at Lloyd’s in 1898 that, as a general rule, war
49
risks should be excluded from marine policies. Consequently, separate insurances are usually effected for war risks, either in the market or with a mutual insurance association (P&I Club). (ROSE, 2004, p. 320) 7
Caso um navio se encontre não intencionalmente em uma área com risco de
guerra e vier sofrer alguma avaria por isto, mesmo que a cobertura do seguro
marítimo destes sinistros seja feita por uma apólice de seguro separada e especial,
um P&I Clubs poderá prestar auxílio ao armador do navio em questão, cobrindo seus
prejuízos com o fato.
É também função de um P&I Club realizar vistorias nas cargas de um navio
nele inscrito, toda vez que houverem dúvidas a respeito da proveniência desta carga
ou de seu acondicionamento. Ao solicitar esta inspeção, o comandante do navio
evita que maiores chances de avarias ou de, até mesmo, embarcar uma carga já
avariada, sendo o armador responsabilizado posteriormente.
Nas hipóteses de mercadorias avariadas, o comandante poderá solicitar ao inspetor do clube para proceder com o acompanhamento e verificação das quantidades avariadas na procura das causas da avaria. Assim, poderá o inspetor do Clube P&I tomar providencias diretamente ou solicitá-las, visando a minimização de prejuízos. (MARTINS, 2008, p. 492)
Além das vistorias às cargas a bordo, um P&I Clube pode também vistoriar a
embarcação juntamente com suas atuais condições de navegabilidade. Mesmo que
esta vistoria seja complementar, como aponta Martins (2008), não substituindo a
vistoria obrigatória das sociedades classificadoras, ela também é de grande
relevância na prevenção de perdas e riscos.
Por último, os P&I Clubs ficam encarregados de prestar auxílio geral e legal a
seus membros e sócios em diversos possíveis litígios que os mesmos venham a se
envolver, arcando inclusive com os custos jurídicos decorrentes disto. Dentre estas
questões legais, segundo Martins (2008), estão o arresto de navios, ocorrência de
avarias, questões relativas ao fornecimento de combustíveis e reparos de
embarcações, bem como outras necessidades dos armadores membros do clube.
7 Tradução livre do autor: Tornou-se comum excluir estes riscos (guerra e ataques) das apólices de seguro marítimo tradicionais por meio de uma cláusula “livre de captura e apreensão” (“fc&s”). A prática de se fazer seguros marítimos e de guerra separadamente foi regularizada desde uma resolução na Lloyd’s em 1898 onde, como regra geral, riscos de guerra deveriam ser excluídos das apólices marítimas. Conseqüentemente, apólices separadas são geralmente firmadas para riscos de guerra, tanto no mercado comum de seguros quanto em associações mútuas de seguros (P&I Clubs). (ROSE, 2004, p. 320)
50 5.4 O Grupo Internacional de P&I Clubs
Cada clube é uma organização autônoma e independente, conduzindo seus
negócios à sua própria maneira, de acordo com as decisões tomadas pelo conselho
de diretores formado por representantes dos armadores membros.
No entanto, desde o surgimento dos P&I Clubs, sempre vigorou a idéia de que
seria muito mais vantajoso para eles cooperarem entre si, trabalhando juntos em
muitos aspectos.
Para Anderson (2007), isso nada mais é que uma extensão do que o próprio
conceito de mutualidade representa, já que a exposição de cada membro a perigos
diversos e a divisão dos riscos poderia muito bem transcender as barreiras de um
clube, e chegar a um grupo maior, de vários clubes, independentes entre si,
trabalhando em cooperatividade.
O primeiro exemplo disto surgiu em 1899, formado por cinco clubes distintos, e
conhecido como o Grupo Londrino de P&I Clubs.
Entretanto, com o passar dos anos e a internacionalização dos P&I Clubs,
devido a entrada de membros de outras nacionalidades, este grande clube evoluiu.
Hoje é conhecido como Grupo Internacional de P&I Clubs e integrado por treze P&I
Clubs mundiais.
It is a fact that even after 150 years of existence, more than 90% of the shipowners of the world continue to cover their liabilities on one of only 13 clubs of the International Group. (ANDERSON, 2007, p. 5)8
Sendo o principal e maior clube do mundo, o Grupo Internacional, de acordo
com Martins (2008), cadê a ele a importante função de atuar como regulador e
ressegurador dos outros P&I Clubs.
É ele também que representa seus clubes membros em assuntos de interesse
comum e que requerem a atenção de todos.
8 Tradução livre do autor: Seguro de P&I tem muito em comum com outras formas de seguros que podem ser encontradas [...]. Entretanto, é diferente em muitas maneiras, particularmente no modo de organização e operação dos clubes, dentro do conceito de mutualidade.
51 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho teve como seu objetivo principal demonstrar a
importância dos P&I Clubs (Protection and Indemnity Clubs), entidades sem fins-
lucrativos, que auxiliam os armadores a lidar com todos os aspectos de eventuais
acidentes que envolvam suas embarcações e que nem sempre são cobertos pelas
companhias seguradoras, no campo direito marítimo mundial.
Este objetivo foi alcançado de maneira simples, pois a importância destas
sociedades mútuas de armadores pode ser facilmente entendida ao se analisar suas
origens históricas, a maneira como se estruturam, conceito e suas principais funções
para com seus membros associados.
Fez-se também necessário para esta análise, o entendimento a respeito do
que é o Seguro, quais as origens desta atividade, como ele funciona, como está
estruturado e inserido na atual realidade mundial.
De maneira geral, o resultado deste trabalho foi bastante positivo, permitindo
ao acadêmico aprender primeiramente, acerca do seguro, um tema bastante comum
e presente no dia-a-dia de praticamente qualquer pessoa ou organização, e que
exatamente por conta disto, é de grande importância em nossa sociedade.
Em segundo lugar, o resultado positivo do trabalho se reflete no melhor
entendimento a respeito dos P&I Clubs, pois, apesar de sua grande relevância para
o direito marítimo internacional, é ainda um assunto pouco comentado e difundido
em nosso país.
No entanto, aqui aparece o ponto negativo encontrado durante a realização
deste trabalho, que foi justamente a pouca quantidade de bibliografias disponíveis,
tratando do tema de maneira mais aprofundada. Foram poucos os livros em
português com conteúdo significativamente grande sobre o tema, obrigando o
acadêmico a recorrer a bibliografias em inglês. Isto novamente se mostrou um
desafio, pois, o acesso a este tipo de bibliografia é muito mais restrito, tornando
necessária a exploração exaustiva de uma única obra durante a elaboração do
último capítulo.
Desta forma, nem todos os aspectos a respeito dos P&I Clubs foram
abordados durante esta monografia. Foi feito um apanhado geral sobre o tema,
enfatizando seus aspectos mais importantes, mas ainda deixando muitos campos a
52 serem explorados por outros acadêmicos que desejem realizar trabalhos acerca
destes clubes, mas que queiram seguir por um caminho diferente.
53 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDERSON, P. Postgraduate Diploma in Marine Insurance: Law, Prac tice and
the Markets – Module 3: P&I Clubs and Mutual Insurance. Londres: Lloyd’s Maritime
Academy, 2006-2007.
ANDRADE, M. M. Introdução à Metodologia do Trabalho Científico. 2ª Edição. São Paulo: Atlas, 1997. CERVO, L. A.; BERVIAN, P. A. Metodologia Científica. 5ª Edição. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2002. FACHIN, O. Fundamentos da Metodologia. 4ª Edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2005. FILHO, D. A. K. Seguro no Código Civil. Florianópolis: OAB/SC, 2005. GUIMARÃES A. M. C. Contratos Internacionais de Seguros. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. ISSA, M. O Seguro no Comércio Exterior. 2ª Edição. São Paulo: Aduaneiras, 1986. KEEDI, S.; MENDONÇA, P. C. C. Transportes e Seguros no Comércio Exterior. 2ª Edição. São Paulo: Aduaneiras, 2000. KEEDI, S. Transportes, Unitização e Seguros Internacionais de Carga: Prática e Exercícios. 4ª Edição. São Paulo: Lex Editora, 2005. MARQUES, F. J. Direito do Seguro Marítimo: Doutrina e Jurisprudência. Rio de Janeiro: FEMAR, 1998. MARTINS, E. M. O. Curso de Direito Marítimo – Volume II. Barueri: Manole, 2008. MOURA, G. B. Direito de Navegação e Comércio Exterior. São Paulo: Aduaneiras, 1991. OLIVEIRA, C. S. Metodologia Científica, Planejamento e Técnicas de Pesquisa: Uma Visão Holística do Conhecimento Humano. São Paulo: Editora LTr, 2000. ROSE, F. D. Marine Insurance: Law and Practice. Londres: London Singapore, 2004.
54
ASSINATURA DOS RESPONSÁVEIS
Nome do estagiário Luiz Cristóvão Pinto de Azevedo
Orientador de conteúdo Prof. Bruno Tussi
Responsável pelo Estágio Profª Natalí Nascimento