toracotomia trans-esternal e intercostal simples em caprinos

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Toracotomia trans-esternal e intercostal simples em caprinos Transsternal and intercostal thoracotomy in goats Ezequiel C. S. de Almeida 1 , Francisco S. Feitosa Júnior* 2 , Severino V. da Silva 2 , Dêmis C. R. Menezes 3 , Antonio A. N. Machado Júnior 3 , Raimundo R.C. Rocha 3 , Paull A. C. dos Santos 3 , João M. F. Sobrinho 3 , Antônio M. M. da Silva 4 1 Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Piauí (CCA/UFPI) 2 Departamento e Clínica e Cirurgia Veterinária, CCA/UFPI 3 Curso de Mestrado em Ciência Animal da Universidade Federal do Piauí 4 Curso de Medicina Veterinária, CCA/UFPI RPCV (2007) 102 (561-562) 87-95 87 Resumo: Neste experimento, foram realizadas e avaliadas duas técnicas cirúrgicas para acesso ao tórax em modelos experi- mentais caprinos. A primeira, toracotomia por esternotomia mediana, utilizou 11 caprinos machos, pertencentes ao grupo I (GI). A segunda, toracotomia intercostal simples, utilizou 3 caprinos machos e 3 fêmeas, pertencentes ao grupo II (GII). Todos os animais eram adultos, sem raça definida, clinicamente sadios, com idade média de 22,36±2,8 meses e peso médio de 19,18±5,91 kg. Os animais foram anestesiados com aceproma- zina (0,25 mg/kg) na pré-medicação, quetamina (3 mg/kg) e midazolam (0,2 mg/kg) associadas na indução, e halotano na manutenção, sob ventilação controlada. A técnica de tora- cotomia por esternotomia mediana (GI) objetivou o acesso à cavidade torácica através do esterno e a técnica de toracotomia intercostal simples (GII) objetivou o acesso à cavidade torácica pelo 4º espaço intercostal. A síntese dos tecidos moles foi feita com fio categute cromado 2-0. A síntese da derme foi feita com fio náilon monofilamentar 2-0. A retirada de ar e algum líquido, quando presente, foi feita com sonda colocada na cavidade. A técnica de toracotomia trans-esternal é indicada para utilização experimental clínica na espécie caprina. Ela pos- sibilita uma ampla exposição e exploração cirúrgica dos órgãos torácicos. A técnica de toracotomia intercostal, independente do espaço abordado, também demonstrou-se indicada à utilização experimental nessa espécie, com algumas vantagens em relação à primeira. A drenagem com conjunto sonda/válvula de três vias/seringa também demonstrou-se eficaz quanto a sua utiliza- ção, não sendo notadas alterações pós-operatórias indesejáveis. Palavras–chave: caprino, técnica cirúrgica, toracotomia Summary: This study was designed to accomplish and to evaluate two surgical techniques for access the thorax in expe- rimental goat models. The first technique, medial esternotomy thoracotomy, enrolled 11 males, belonging to group I (GI). The second one, intercostal thoracotomy, involved 3 males and 3 females, belonging to group II (GII). All the animals were healthy mixed adults, medium 22.36±2.8 months old and with mean body weight of 19.18±5.91 kg. The animals were anes- thetized with acepromazine (0.25 mg/kg) on premedication, ketamine (3 mg/kg) and midazolam (0.2 mg/kg) combined in the same syringe on induction, and halothane on maintenance, with controled ventilation. The purpose of the first technique (GI) was to access the thorax by medial esternotomy and the second one (GII) was designed to access the thorax through the 4 th intercostal space. Soft tissue synthesis was made by 2-0 chromic catgut. Derm synthesis was made by 2-0 monofilamentar nylon. The drainage of air and some liquid was made by a ounding-line placed in thoracic cavity. Transsternal thoracotomy is indicated to clinical experimental use in goats. It can expose and explore thoracic viscera widely. Intercostal thoracotomy, independently of the approached space, is also indicated to experimental use in goats, demonstrating some advantages compared to the first technique. The drainage was efficient in these surgeries. There were not undesirable postoperative modifications. Keywords: goat, surgical technique, thoracotomy Introdução Atualmente, a utilização de técnicas cirúrgicas rela- cionadas à cavidade torácica na espécie caprina restringe-se, quase que totalmente, à elaboração de modelos que têm por objetivo explorações cirúrgicas experimentais. Tais experiências visam testar novos tratamentos para lesões que ocorrem nos órgãos desta cavidade. Estes estudos servem de base para adap- tações das técnicas desenvolvidas com sucesso para a espécie humana. Um dos fatores responsáveis pela escolha da espécie caprina para o desenvolvimento de estudos desta natureza é a similaridade de estruturas torácicas apre- sentadas entre esta e a espécie humana (Lawrence et al., 1997). Baseados nas informações colhidas e no interesse de desenvolver uma pesquisa nesta área resolveu-se buscar e avaliar as técnicas atualmente em uso e tecer informações que possibilitassem a construção de REVISTA PORTUGUESA CIÊNCIAS VETERINÁRIAS DE *Correspondência: [email protected] Universidade Federal do Piauí, Centro de Ciências Agrárias Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária, Clinica de Grandes Animais, Campus da Socopo, Teresina, Piauí – CEP 64049-550

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Toracotomia trans-esternal e intercostal simples em caprinos

Transsternal and intercostal thoracotomy in goats

Ezequiel C. S. de Almeida1, Francisco S. Feitosa Júnior*2, Severino V. da Silva2,Dêmis C. R. Menezes3, Antonio A. N. Machado Júnior3, Raimundo R.C. Rocha3,

Paull A. C. dos Santos3, João M. F. Sobrinho3, Antônio M. M. da Silva4

1Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Piauí (CCA/UFPI)2Departamento e Clínica e Cirurgia Veterinária, CCA/UFPI

3Curso de Mestrado em Ciência Animal da Universidade Federal do Piauí4Curso de Medicina Veterinária, CCA/UFPI

RPCV (2007) 102 (561-562) 87-95

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Resumo: Neste experimento, foram realizadas e avaliadas duastécnicas cirúrgicas para acesso ao tórax em modelos experi-mentais caprinos. A primeira, toracotomia por esternotomiamediana, utilizou 11 caprinos machos, pertencentes ao grupo I(GI). A segunda, toracotomia intercostal simples, utilizou 3caprinos machos e 3 fêmeas, pertencentes ao grupo II (GII).Todos os animais eram adultos, sem raça definida, clinicamentesadios, com idade média de 22,36±2,8 meses e peso médio de19,18±5,91 kg. Os animais foram anestesiados com aceproma-zina (0,25 mg/kg) na pré-medicação, quetamina (3 mg/kg) e midazolam (0,2 mg/kg) associadas na indução, e halotanona manutenção, sob ventilação controlada. A técnica de tora-cotomia por esternotomia mediana (GI) objetivou o acesso àcavidade torácica através do esterno e a técnica de toracotomiaintercostal simples (GII) objetivou o acesso à cavidade torácicapelo 4º espaço intercostal. A síntese dos tecidos moles foi feitacom fio categute cromado 2-0. A síntese da derme foi feita comfio náilon monofilamentar 2-0. A retirada de ar e algum líquido, quando presente, foi feita com sonda colocada na cavidade. A técnica de toracotomia trans-esternal é indicadapara utilização experimental clínica na espécie caprina. Ela pos-sibilita uma ampla exposição e exploração cirúrgica dos órgãostorácicos. A técnica de toracotomia intercostal, independente doespaço abordado, também demonstrou-se indicada à utilizaçãoexperimental nessa espécie, com algumas vantagens em relaçãoà primeira. A drenagem com conjunto sonda/válvula de trêsvias/seringa também demonstrou-se eficaz quanto a sua utiliza-ção, não sendo notadas alterações pós-operatórias indesejáveis.

Palavras–chave: caprino, técnica cirúrgica, toracotomia

Summary: This study was designed to accomplish and to evaluate two surgical techniques for access the thorax in expe-rimental goat models. The first technique, medial esternotomythoracotomy, enrolled 11 males, belonging to group I (GI). Thesecond one, intercostal thoracotomy, involved 3 males and 3females, belonging to group II (GII). All the animals werehealthy mixed adults, medium 22.36±2.8 months old and with

mean body weight of 19.18±5.91 kg. The animals were anes-thetized with acepromazine (0.25 mg/kg) on premedication,ketamine (3 mg/kg) and midazolam (0.2 mg/kg) combined inthe same syringe on induction, and halothane on maintenance,with controled ventilation. The purpose of the first technique(GI) was to access the thorax by medial esternotomy and thesecond one (GII) was designed to access the thorax through the4th intercostal space. Soft tissue synthesis was made by 2-0chromic catgut. Derm synthesis was made by 2-0 monofilamentarnylon. The drainage of air and some liquid was made by a ounding-line placed in thoracic cavity. Transsternal thoracotomyis indicated to clinical experimental use in goats. It can exposeand explore thoracic viscera widely. Intercostal thoracotomy,independently of the approached space, is also indicated toexperimental use in goats, demonstrating some advantagescompared to the first technique. The drainage was efficient in these surgeries. There were not undesirable postoperative modifications.

Keywords: goat, surgical technique, thoracotomy

Introdução

Atualmente, a utilização de técnicas cirúrgicas rela-cionadas à cavidade torácica na espécie caprinarestringe-se, quase que totalmente, à elaboração demodelos que têm por objetivo explorações cirúrgicasexperimentais. Tais experiências visam testar novostratamentos para lesões que ocorrem nos órgãos destacavidade. Estes estudos servem de base para adap-tações das técnicas desenvolvidas com sucesso para aespécie humana.

Um dos fatores responsáveis pela escolha da espéciecaprina para o desenvolvimento de estudos destanatureza é a similaridade de estruturas torácicas apre-sentadas entre esta e a espécie humana (Lawrence etal., 1997).

Baseados nas informações colhidas e no interesse de desenvolver uma pesquisa nesta área resolveu-sebuscar e avaliar as técnicas atualmente em uso e tecer informações que possibilitassem a construção de

R E V I S T A P O R T U G U E S A

CIÊNCIAS VETERINÁRIASDE

*Correspondência: [email protected] Federal do Piauí, Centro de Ciências AgráriasDepartamento de Clínica e Cirurgia Veterinária, Clinica de Grandes Animais, Campus da Socopo, Teresina,Piauí – CEP 64049-550

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informações práticas para outros pesquisadores quepossam vir a ter dúvidas sobre que tipo de procedi-mento invasivo utilizar em situações em que sejanecessário trabalhar a cavidade torácica.

Este trabalho teve por finalidade observar a aplicação das técnicas de toracotomia trans-esternal e intercostal em caprinos, verificando se as vias de acesso testadas adequam-se à realização de proce-dimentos cirúrgicos na cavidade torácica e aindaobservando e avaliando essas vias no que diz respeitoaos órgãos que podem ser acessados pelas mesmas,determinando assim suas abrangências e limitações.

Material e métodos

Nesse experimento foram realizadas e avaliadasduas técnicas cirúrgicas, a primeira, toracotomia poresternotomia mediana utilizou 11 caprinos machos, asegunda, toracotomia intercostal simples, utilizou 3caprinos machos e 3 fêmeas. Todos os animais eramadultos, com idade média de 22,36±2,8 meses e pesomédio de 19,18±5,91 kg, procedentes de algunsmunicípios circunvizinhos à cidade de Teresina – PI.

Os animais classificados como clinicamente sadios,após exames realizados, foram vermifugados comCloridrato de Levamisol a 5% (Ripercol. Fort DodgeSaúde Animal Ltda. São Paulo - SP) na dose de 5 mg/kg por via oral. A alimentação durante o experi-mento foi feita com volumoso e água à vontade e suplementada com ração concentrada. Todos os animais receberam um jejum sólido de 24 horas,acompanhado de jejum hídrico de 6 horas antes darealização das cirurgias.

Utilizou-se na pré-medicação acepromazina 2%(Acepran 1%. F. A. Univet S.A. São Paulo - SP) nadose de 0,25 mg/kg. Na indução, feita 30 minutosapós a MPA, foi utilizada uma associação de queta-mina 5% (Ketamin 5%, Cristália Produtos Químicos e Farmacêuticos Ltda. São Paulo – SP) na dose de 3 mg/kg e midazolam (Dormium 0,5%, União Quím.Farm. Nacional S.A. São Paulo – SP) na dose de 0,2 mg/kg, sendo, em seguida, o animal posto na calhacirúrgica.

Após a indução cada animal foi colocado emdecúbito dorsal sobre a calha cirúrgica, sendo rapida-mente entubado com sonda endotraqueal n.º 7(Embramac-Empresa Bras. Mat. Cir. Ind. Com. Imp.Exp. Ltda.) e ligado a um aparelho de anestesia volátil(Takaoka. Série Nisei Takaoka do Brasil) com circuitosemi-fechado do tipo circular bivalvular, mantido sobo efeito do halotano (Cristália Produtos Químicos eFarmacêuticos Ltda. São Paulo – SP) em respiraçãoexpontânea com oxigênio a 100% até atingir o planocirúrgico. Em seguida, cada paciente continuourecebendo halotano e oxigênio a 100% a um fluxo de30 ml/kg/min (com uma concentração aproximada de5%), misturados em vaporizador do tipo universal,

com regime de ventilação passando a ser controlado,com freqüência constante de 20 movimentos respi-ratórios por minuto, ciclado a pressão inspiratória de15 cm de H20 e desinsuflação passiva. Logo em seguida a calha era retirada e o paciente era colocadoem decúbito lateral para realização da cirurgia. Cadaanimal foi preparado com anti-sepsia local comsolução de iodo a 1% e fixação de pano de campocirúrgico sobre o tórax do animal.

A técnica de toracotomia por esternotomia mediana(trans-esternal) iniciava-se, em média, 5 minutos apósa indução anestésica, com o animal já sob manutençãopelo halotano e mantido sob ventilação controlada.

A cirurgia tinha início através de uma incisão nosentido crânio-caudal sobre a linha média ventral naderme que recobre o esterno (Figura 1-A). Tal incisãocomeçava na altura do manúbrio e se estendia até passar dois a três centímetros da cartilagem xifóide,em direção à cavidade abdominal. Em seguida, atravésde uma segunda incisão, foram acessados os tecidossubcutâneos e ligamentos fasciais até a linha médiaesternal delimitada pela estrutura esternal, que deter-minou a profundidade da incisão. Essa mesma incisãocontinuou até atingir a cavidade abdominal, sendofeita sobre a linha alba até os limites da primeiraincisão.

Com a exposição da estrutura esternal, procedeu-sea abertura da cavidade torácica. Inicialmente, umosteótomo foi introduzido na cavidade abdominalatravés da incisão sobre a linha Alba. Com a lâmina do osteótomo tocando a extremidade caudal da cartilagem xifóide e estando o mesmo voltado emdireção ao manúbrio, iniciou-se a abertura da cavidadetorácica com a ajuda de uma marreta ortopédica(Figura 1-B). A incisão, prolongada até o manúbrio(sentido caudo-cranial), dividiu o esterno ao meio,evitando-se em todo momento o contato com as estru-turas intratorácicas, até a total abertura da cavidade.

Em seguida foi colocado um afastador de costelastipo Finochietto para que fossem feitas as observaçõespertinentes a este trabalho a respeito das estruturasque podem ser acessadas nessa técnica (Figuras 1- C,D e E).

Após a exploração da cavidade torácica e retirada de fragmentos necessários para realização de microscopia em outros experimentos, os animaisforam sacrificados.

A técnica cirúrgica pela via intercostal simples, utilizada no grupo II, foi realizada sobre o 4º espaçointercostal. A cirurgia iniciava-se com o animal já sobmanutenção pelo halotano e mantido sob ventilaçãocontrolada em decúbito lateral direito. Inicialmente,tracionava-se o membro anterior esquerdo para frente,fixando-o de modo a expor o campo operatório. Apósa localização do 4º espaço intercostal, procedeu-se adiérese da pele com uma incisão no sentido dorso-ven-tral de aproximadamente sete centímetros, seguida dedivulsão da tela subcutânea (Figura 2-A). Em seguida,

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Figura 1 - Desenvolvimento da técnica de toracotomia trans-esternal: A – Incisão crânio-caudal sobre a linha média ventral na derme que recobre o esterno; B – abertura da cavidade torácica com osteótomo e marreta ortopédica; C – dissecação da artéria torácica interna esquerda; D – pericardiotomia; E – visualização do sulco interventricular.

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foram feitas incisões sobre os músculos grande dorsale serrátil ventral, no mesmo sentido da incisão inicial,até a evidenciação da quarta e quinta costelas e mus-culatura intercostal correspondente. Em continuação,o músculo intercostal externo, seguido do interno e pleura parietal foram incididos por cerca de 1 cen-tímetro. Posteriormente, ampliou-se a incisão no sentido dorsal e ventral até os limites da incisão inicial, visualizando-se por fim a cavidade torácica,observando-se o pericárdio que recobria o coração emseu terço médio, além de parte do lobo pulmonarmédio.

Após exploração da cavidade torácica, fez-se umapequena perfuração na musculatura intercostal doquinto espaço, em um ponto médio-ventral da paredelateral da cavidade, até o limite da derme, porém, semperfurá-la. Em seguida, observando uma linha para-lela ao dorso do animal fez-se uma pequena incisão naderme, afastada entre três e quatro centímetros daprimeira perfuração, onde, através desta e com oauxílio de uma pinça hemostática curva, levou-se umasonda uretral n.º 8 esterilizada (Embramed Ind. Com.Ltda. São Paulo-SP), até a altura da primeira per-furação, transpassando-a. Em seguida, liberou-se asonda, já na cavidade torácica e retirou-se a pinça. Asonda foi então tracionada em cinco centímetros parao interior da cavidade e colocada de forma que, quando a cavidade fosse fechada, a ponta da sondapermanecesse nas proximidades do ápice do coração,no limite ventral da cavidade. Acoplada a esta sondacolocou-se uma válvula de três vias e uma seringa de20 ml (Figuras 2-C e D), para posterior drenagem erestabelecimento da pressão negativa da cavidadetorácica.

A síntese da cavidade torácica nos animais se deu daseguinte forma: inicialmente, procedeu-se a miorrafiaintercostal interna e externa com fio categute croma-do n.º 2-0 (Somerville Ltda. Jaboatão dos Guararapes-PE) com sutura em "X" separado (Figura 2-B). Amiorrafia dos músculos serrátil ventral e grande dorsal foi feita individualmente em cada grupamentocom fio categute cromado n.º 2-0 em sutura contínuado tipo festonada, no sentido dorso-ventral. Em seguida,procedeu-se a redução do espaço morto subcutâneocom sutura contínua tipo "Cushing", também com fiocategute n.º 2-0. A dermorrafia foi feita com fio nylonmonofilamentar n.º 2-0 (Somerville Ltda. Jaboatãodos Guararapes-PE) em suturas tipo "X" (Figura 2-C).Na ferida cirúrgica foi aplicada uma pomada a base denitrofurazona, fazendo-se ainda um curativo com gazesobre a ferida (Figura 2-E).

Depois de fechada a cavidade completamente, como auxílio do conjunto sonda/válvula/seringa, retirou--se da cavidade o ar e líquido que havia se acumulado.A retirada só terminou quando, após vários movimen-tos de retirada de ar, a pressão na seringa se tornavanegativa. Nesse momento, a sonda foi removida e oorifício da pele coberto com esparadrapo.

Logo após, a manutenção anestésica foi retirada e oanimal passou a receber apenas o oxigênio a 100%.Reduziu-se a ciclagem da pressão controlada gradativa-mente até que o paciente começasse a respirar por movi-mentos voluntários novamente, momento em que foifeito o desacoplamento do aparelho anestésico. O paci-ente era então retirado da mesa cirúrgica para observaçãoe colocado em decúbito lateral direito (Figura 2-F).Quando o paciente apresentava o reflexo laríngeo, eraentão extubado e acompanhava-se o pós-operatório imediato ainda na sala de cirurgia por mais três horas.Em seguida, o paciente era enviado para baia-enfermariapara acompanhamento do pós-mediato, que durou oitodias. Após este período, era procedida a retirada dospontos, faziam-se exames radiográficos para avaliaçãode possíveis seqüelas decorrentes do ato cirúrgico que,após descartadas, implicavam em alta dos pacientes.

Resultados

A duração média da técnica cirúrgica trans-esternalvariou entre sessenta a noventa minutos, fazendo partedesse período as etapas de abertura, exploração e dis-secação das estruturas envolvidas até o sacrifício dosanimais para colheita de material para outros estudos.

A técnica de toracotomia trans-esternal no caprinopermitiu uma exploração ampla de todas as estruturastorácicas. Essa abordagem apresentou uma excelentevisualização, exploração e palpação dos lobos pul-monares dos lados direito e esquerdo, pleura, sacopericárdio, coração e suas estruturas de interesse emprocedimentos experimentais como ventrículos direitoe esquerdo, sulco coronário esquerdo com o ramointerventricular paraconal da artéria coronária esquer-da, a grande veia cardíaca, aurícula esquerda e parteda direita, aorta ascendente, veia cava cranial, artériamamária, esôfago e diafragma. Dissecou-se a artériatorácica interna esquerda (Figura 1-C) e em seguidarealizou-se a pericardiotomia com fixação do mesmoe exposição do coração (Figura 1-D), com suas estru-turas, em especial, o sulco interventricular (Figura 1-E), por onde passa a artéria interventricular anterior,alvo mais freqüente das cirurgias de revascularizaçãoatravés da anastomose desta com a artéria torácicainterna (mamária) esquerda ou direita.

Ao final do experimento, todos os pacientes foramsacrificados dado à necessidade da retirada de fragmentos do endotélio vascular para avaliação emestudos posteriores.

A duração média da cirurgia pela via intercostal variou entre quarenta e cinqüenta minutos. A técnicade toracotomia intercostal simples pelo hemitóraxesquerdo em caprinos permitiu uma exploração maisrestrita que a demonstrada pela técnica anterior. Nessaabordagem, o que se observou foi uma exposição eexploração limitadas de órgãos, ficando restritas àsestruturas torácicas adjacentes à incisão localizada na

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categute n.º 2-0 e a dermorrafia feita com nylonmonofilamentar n.º 2-0 com pontos em "X" separa-dos, também proporcionaram um fechamento daincisão livre de complicações.

A técnica de drenagem através da inserção de sondapor orifícios não-comunicantes na cavidade torácica,com sua retirada imediata após drenagem, mostrou-seeficaz, não sendo observados sinais de penoumotórax,o que foi confirmado também por exames radiológicosrealizados no pós-operatório.

Neste segundo grupo, todos os animais passarampor tratamento pós-operatório e foram acompanhadosaté a total recuperação, não ocorrendo nenhum óbitoneste período.

parede lateral do hemitórax esquerdo. As estruturasacessadas foram o saco pericárdio e músculo cardíacoe parte dos lobos apical e médio que não foram exteriorizados.

A miorrafia intercostal, com categute cromado 2-0com sutura em "X" separado em alguns momentoslacerou a musculatura no memento da sua perfuração.A miorrafia dos músculos serrátil ventral e grandedorsal, feitas individualmente com o mesmo tipo defio e sutura contínua "festonada" no sentido dorso--ventral proporcionaram o fechamento da paredecostal sem complicações trans ou pós-operatóriasexpressivas. A redução do espaço morto subcutâneocom sutura contínua tipo "Cushing", feita com

Figura 2 – Desenvolvimento da técnica de toracotomia intercostal simples na espécie caprina: A – Incisão sobre o 4º espaço intercostal com divulsãoda tela subcutânea; B – Miorrafia intercostal interna com fio categute com sutura tipo "X"; C – Dermorrafia com fio de náilon com sutura tipo "X";C e D – colocação de sonda na cavidade torácica para posterior drenagem; E – Curativo com aplicação de pomada a base de nitrofurazona; F – Animalna posição de decúbito lateral direito.

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Discussão

Há algum tempo, os pequenos ruminantes vêmsendo utilizados como modelos experimentais em procedimentos cirúrgicos na cavidade torácica. As técnicas utilizadas já descritas envolvem procedimen-tos experimentais como correções de cardiomiopatiase realização de biópsias (Radermecker et al., 1993),testes de válvulas cardíacas (Dohmen et al., 2002) eimplantes cardíacos (Santos et al., 2002).

As toracotomias são classificadas de acordo com otipo de incisão utilizada em: transversal, lateral, ventral,anterior e transabdominal. O acesso lateral pode serfeito de três maneiras diferentes: por secção inter-costal, por ressecção costal e por semi-ressecção dacostela ou em bloco (Archibald e Harvey, 1974).

A utilização da via trans-esternal para a realizaçãode toracotomias vem sendo utilizada rotineiramente,de acordo com a literatura estudada em diferentesespécies animais (Ranzani et al., 1990; Sweet eWaters, 1991; Radermecker et al., 1993; Faria, 1999;Ringwald, 1996). A via lateral intercostal também émuito utilizada em técnicas que utilizam acessos simples (Pinto et al., 1993; Oliveira et al., 1999; Saderet al., 2000; Santos et al., 2002; Brondani et al., 2003;Mazzanti et al., 2001, 2003; Ishizaki et al., 2005) ouem bloco (Moura et al., 1991; Baccarin e Alvarenga,1999). Todas essas pesquisas envolveram procedimen-tos experimentais e terapêuticos, o que demonstra aabrangência desse tipo de cirurgia para medicinahumana e veterinária.

A toracotomia trans-esternal realizada neste experi-mento deu-se, nas etapas iniciais, de acordo comRingwald (1996), através de uma incisão na linhamédia ventral, que se prosseguiu através dos tecidossubcutâneos e ligamentos até a linha média esternal,seguida de procedimento diferente na abertura dacavidade torácica, utilizando-se para a abertura damesma um osteótomo e uma marreta, que, posiciona-dos sobre a cartilagem xifóide, abriram caminhoatravés de incisão crânio-caudal que atingiu toda aextensão da cavidade. Este autor sugere que, para aincisão inicial, seja utilizada uma serra óssea oscilantecom profundidade de corte delimitada pela linha dasesternebras. Após a incisão inicial, a mesma seriaampliada por osteótomo e marreta. Sweet e Waters(1991) relataram sobre o papel da cirurgia por viatrans-esternal no controle e tratamento de diversascomplicações patológicas passíveis de ocorrer notórax de cães, citando essa via como sendo muitoimportante para tal fim. Ranzani et al. (1990) utili-zaram a via trans-esternal para correção de patologiadiafragmática iatrogênica (hérnia) em cães. Nesseexperimento, o autor colheu parte do saco pericárdiode eqüinos, procedeu a assepsia do mesmo e o conser-vou em glicerina, utilizando-o posteriormente emimplante em solução de continuidade no diafragmados animais. Além da correção de hérnia em cães, essa

via foi também explorada em modelo experimentalcaprino, porém, com outras finalidades. Rademeckeret al. (1993) desenvolveram uma técnica de cardiomioplastia em caprinos, onde um fragmento demúsculo esquelético homólogo foi utilizado de duasformas: na substituição de uma parte do miocárdio ecomo reforço do mesmo sem substituição.

Apesar de não haver sido realizado o fechamentodas cavidades torácicas dos animais do GI, a literaturacita que, em carnívoros domésticos, esse procedimentoé feito envolvendo as quatro camadas incididas: esterno,fáscia muscular, tecido subcutâneo e pele. Na união doesterno, o fechamento é feito com fio de aço inoxi-dável monofilamentar em animais com mais de dezquilos ou com náilon ou polipropileno monofila-mentares em cães e gatos com menos de dez quilos.Os padrões de fechamento podem ser: em forma de"oito", envolvendo intercostos e esternebras; oufechamento com cerclagem completa simples nosespaços intercostais. Nesses casos, deve-se ter cuidado durante a colocação da sutura para se evitar asartérias torácicas internas e os vasos intercostais. Apóstodas as suturas ou fios terem sido colocados, sãoapertados até que se obtenha a estabilidade esternal. Ofechamento da fáscia, tecido subcutâneo e pele sãofeitos de forma rotineira (Ringwald, 1996).

Ringwald (1996) apontou como sendo compli-cações incisionais decorrentes da esternotomia mediana: o edema, presença de secreção, infecção edeiscência. Elas ocorreriam principalmente devido àlocalização ventral da incisão. Outras complicaçõesassociadas seriam o retardo da união esternal e ainfecção esternal. A deiscência e a não-união ocorre-riam secundariamente à infecção, ao puxamento dosfios através do esterno, ao rompimento do fio e àinstabilidade esternal. O autor citou que a correção detais complicações envolve a reestabilização do esternoe o tratamento da infecção, quando presente.

A escolha do antímero e a localização da incisão natoracotomia intercostal simples vão depender do tipode procedimento a se realizar. Nelson (1986) citou quequando o objetivo da cirurgia for acessar o coração ouárea hilar dos pulmões, a toracotomia deve ser realiza-da no quarto ou quinto espaço intercostal, enquantoque se o objetivo for acessar o esôfago caudal oudiafragma, a mesma deve ser feita no oitavo espaçointercostal.

O hemitórax esquerdo é muito acessado para inter-venções nos vasos torácicos, coração, suas válvulas esaco pericárdio, pulmão (ipsilateral) e diafragma.Oliveira et al. (1999), em seus estudos com cães,avaliaram a utilização do clampeamento da aorta torácica como forma de manutenção da pressão e circulação sanguíneas para os órgãos vitais quando daocorrência de traumas seguidos de hemorragias nosórgãos abdominais. Nesse clampeamento, os autoresutilizaram como via de acesso o oitavo espaço inter-costal com uma incisão na porção dorsal do tórax;

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áreas localizadas abaixo do coração também podemser acessadas. Dohmen et al. (2002) ressaltaram aimportância de trabalhar com modelos valvulares substitutos na correção de patologias circulatóriascardíacas. Os autores, trabalhando com ovinos jovens,prepararam válvulas através da engenharia de tecidose, posteriormente, as implantaram através de minitora-cotomia no segundo intercosto. Também com ovinos,trabalharam Santos et al. (2002). Nessa pesquisa, foidesenvolvido e implantado para testes em ovinos, umtubo valvulado bioprótese do tipo "stentless". Aimplantação do mesmo deu-se através de toracotomialateral ao nível do quarto espaço. Pesquisas no pericárdio também podem ser motivos para inter-venções intercostais pelo lado esquerdo. Sader et al.(2000), informaram que esta estrutura não é indispen-sável ao funcionamento do coração, entretanto, a suafalta, mesmo parcial, pode causar alguns problemas.Nesse experimento, os autores apontam como alterna-tiva para a substituição de partes do saco pericárdio, aimplantação de uma membrana de látex natural, como acesso acontecendo pelo quinto espaço intercostal.Os pulmões também constituem importantes estru-turas que podem ser acessadas cirurgicamente atravésdessa via. Ishizaki et al. (2005), trabalhando com felinos, propôs a lobectomia pulmonar parcial comoforma de terapêutica alternativa para várias patolo-gias, como neoplasias, abscessos, lacerações pulmo-nares, torções, corpos estranhos, atelectasia irreversível,fístulas bronco-esofageanas e pneumotórax espontâ-neo. A via de acesso ao pulmão para essa cirurgia é aincisão no quinto espaço intercostal, onde o lobo caudal esquerdo é exposto e isolado para posteriorfragmentação e retirada de parte da estrutura comoforma de modelo experimental. Outras patologiastorácicas que também podem ser acessadas por essavia são as referentes ao diafragma como hérnia decor-rente de choques traumáticos. Mazzanti et al. (2001)propuseram a reparação de defeito na estrutura dodiafragma de cães através do implante de músculodiafragma homólogo, conservado em solução super-saturada de açúcar. Nessa ocasião, os autores utilizaram como via de acesso para tal procedimento odécimo espaço intercostal. Os mesmos autores, em2003, trabalhando ainda com cães, indicaram a utilização de fragmentos de pericárdio de bovino, conservados em solução supersaturada de açúcar, noreparo de hérnias iatrogênicas do diafragma para testar a viabilidade da membrana cardíaca bovina nacorreção dessa patologia. Nesta ocasião, o acesso parao procedimento se deu a partir do oitavo espaço intercostal.

O hemitórax direito também aparece como via deacesso à cavidade torácica em alguns procedimentoscirúrgicos, notadamente, os realizados no pulmão(ipsilateral) e no diafragma. A ressecção pulmonartambém foi proposta por este lado da cavidade porPinto et al. (1993), que propuseram em suas pesquisas

avaliar possíveis alterações fisiológicas pós-res-secções pulmonares em cães. Nesse experimento, avia de acesso à cavidade e ao pulmão ocorreu atravésde incisão no sexto espaço intercostal, partindo doponto médio do hemitórax direito no sentido dorso-ventral. A partir dessa incisão, foram então localiza-dos, clampeados, suturados e seccionados os lobosapical, médio, diafragmático e acessório. Outros pro-cedimentos que também foram observados podendoser realizados por essa via, foram a implantação de segmento autólogo de pericárdio em hérnia dia-fragmática em gatos submetidos à toracotomia inter-costal simples (Brondani et al., 2003) e a drenagem doespaço pleural, procedimento que é necessário emcasos de remoção de fluidos ou ar da cavidade(Weirich, 1996), sendo que esse último pode ser realizado pelos dois antímeros.

A extensão da abertura no sentido crânio-caudaltambém pode variar. Nesses casos, alia-se o tipo deprocedimento a ser realizado a um novo fator, a espécie animal a ser trabalhada. Isso ocorre em razãoda anatomia óssea do tórax ser tão diferente entre asespécies no tocante às costelas e espaços intercostais.Nos eqüinos, as costelas são mais estreitas e seusrespectivos espaços intercostais acentuadamente maislargos, em especial nas suas partes ventrais, emrelação aos bovinos, que apresentam suas costelasmais largas e espaços intercostais bastante reduzidos,o que dificulta a prática cirúrgica por toracotomia comincisão simples, requerendo a ressecção de uma oumais costelas para esse fim (Dyce et al., 1990).

Ainda segundo os autores, os carnívoros apresentamcostelas mais estreitas e maleáveis, além de um maiorespaço intercostal em relação aos bovinos e aos eqüinos; uma vantagem para a realização de cirurgiastorácicas. Em alguns procedimentos, pode sernecessária uma ampliação da abertura cirúrgica paraoutras costelas e seus respectivos espaços para que sepossa trabalhar com mais espaço e em maiores áreas.Moura et al. (1991), em seus estudos, descreveram arealização da técnica de toracotomia em bloco, utilizada em doze cães. Nesse tipo de cirurgia, aequipe abriu na cavidade torácica dos animais estuda-dos uma incisão em forma de "U" invertido, ficando abase da letra paralela à coluna vertebral, distando 4 a5 centímetros desta, e mais duas perpendiculares,sendo a primeira mais cranial no quarto espaço inter-costal, estendendo-se de cima para baixo até a junçãocosto-condral; a segunda, mais caudal, no nonoespaço intercostal, estendendo-se até a inserção daporção muscular do diafragma. Após a diérese da pelee musculatura, procederam as secções das costelas 5,6, 7, 8 e 9 que integraram o bloco, o qual foi rebatidoventral-ventralmente para exposição da cavidade torácica. Após explorada, procedeu-se a osteossíntesedas costelas, miorrafia e dermorrafia. Essa técnica emrelação a outras anteriores que também utilizavam oacesso lateral tem a vantagem de preservar as costelas

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seccionadas quando da realização da toracotomia. Emestudos anteriores, alguns procedimentos que tambémdemonstraram uma ampla abertura do tórax mais umavez utilizavam a incisão em forma de letra "U", comsecção e retirada permanente de várias costelas.Nesses casos, após a cirurgia, por pressão da gravi-dade, observou-se uma depressão permanente no localdo acesso (Alexander, 1989). Em procedimento deacesso semelhante, Stopiglia et al. (1986) substituíramo local ocupado pela sexta, sétima e oitava costelaspor uma placa de pericárdio de eqüino, com resultadossatisfatórios na cirurgia reconstrutiva da parede toráci-ca de cães. Um outro exemplo de cirurgia lateral comaumento da incisão através da secção de costelas foiobservado, agora na espécie eqüina, nos trabalhos deBaccarin e Alvarenga (1999). Nesse estudo, ospesquisadores buscaram avaliar a técnica cirúrgicaque utilizava como via de acesso o hemitórax direitode eqüinos. Segundo os autores, a técnica consistia emincisão sobre a derme e musculatura localizadas sobrea sexta costela, seguidas de secção e retirada damesma, abrindo-se então o acesso. Após explorada, acavidade foi então fechada por miorrafia seguida dedermorrafia. Os pesquisadores concluíram que taltécnica permitia a realização de procedimentos cirúrgicos nos lobos pulmonares cranial e acessório,além de fornecer uma boa exploração da cavidadepleural direita, sendo considerada uma técnica segurapor não causar transtornos respiratórios ou mesmosinais de pneumotórax.

A sutura intercostal com fio categute 2-0 com pontos em "X" demonstrou resultados questionáveisem razão das lacerações provocadas. Acredita-se que melhores resultados seriam observados substituin-do-se o fio utilizado por um mais fino, como o denúmero 3-0 ou mesmo 4-0. Cabe-se ressaltar que arafia do músculo serrátil, feita de forma a cobrir osespaços criados pelas lacerações provocadas pelo fio2-0, serviu para lacrar a cavidade, evitando a entradade ar na cavidade. A miorrafia dos demais grupamen-tos com sutura contínua no modelo "festonado", também com categute cromado 2-0 não demonstroudeiscência ou outras complicações associadas, assimcomo a redução de espaço com sutura tipo "Cushing",com categute 2-0 e dermorrafia com náilon monofila-mentar 2-0. Moura et al. (1991), na síntese muscularde seus pacientes (cães), utilizaram pontos simplescontínuos com categute cromado do mesmo calibre. Apele foi suturada com pontos isolados simples com fiode poliéster trançado cirúrgico n.º 4-0 sem compli-cações posteriores. Pinto et al. (1993), em cães,usaram o mesmo padrão de sutura na musculaturaintercostal, porém com tipo de fio diferente, o náilonmonofilamentar 1-0. Nessa ocasião, a única compli-cação relacionada à sutura foi a ocorrência de deis-cência restrita à camada cutânea em um dos animais,onde os autores utilizaram mononylon de espessuramais fina, mas que cicatrizou por segunda intenção. Já

Mazzanti et al. (2003) preferiram utilizar pontos sim-ples contínuos para todos os grupamentos muscularescom poliamida 3-0. Na dermorrafia o mesmo fio foiutilizado, mas com padrão de sutura diferente, compontos simples separados.

O procedimento de drenagem da cavidade e retiradaimediata da sonda, com permanência do animal emposição estática de decúbito lateral direito, nãodemonstrou complicações pós-operatórias imediatasou em longo prazo. Essa metodologia, apesar de bemsucedida, diverge das utilizadas por Moura et al.(1991), que após alojar os animais em jaulas individu-ais, alternaram o decúbito lateral a cada 20 minutosaté a recuperação da anestesia; e por Weirich (1996),que ao retirar o animal da sala de operação para a salade recuperação, considerou que o mesmo deve per-manecer com o lado operado para baixo, permitindoque o pulmão que estava dependente se reinfle. Oautor observou ainda que, a cada 15 minutos o animaldeve ser virado para evitar a formação de atelectasiano pulmão que estiver para baixo. O dreno pode per-manecer em cirurgia torácica não-complicada por atéuma hora. No ato da remoção deste, a selagem do ferimento cutâneo é feita com uma fita adesivagrande, do tamanho da articulação do animal, acol-choada com gaze. O revestimento do acolchoado degaze, impregnado com vaselina, servirá para selar oorifício até que os tecidos moles tenham se fechadocom um selo de fibrina. Isso evitará que o ar siga para baixo, no túnel subcutâneo, e entre na caixa torácica.

O índice de mortalidade zero em nosso experimento,especificamente no GII, justificou-se pela simplicidadeda técnica de laparotomia intercostal. Segundo a litera-tura, a incisão cirúrgica da parede do tórax não repre-senta nenhum risco maior do que a abertura do abdomense forem seguidos os princípios apropriados. É semprenecessário revisar a anatomia do tórax e da parede torá-cica antes de realizar-se uma cirurgia deste tipo(Weirich, 1996). Algum grau de mortalidade pode seratribuído não ao procedimento de toracotomia, mas àsintervenções experimentais que as motivam, comotransplantes de válvulas, por exemplo, onde a ocorrênciade mortalidade sempre é atribuído a falhas na técnica desubstituição valvular, infarto agudo do miocárdio comfalha na manutenção das condições hemodinânicas forada circulação extracorpórea e hipóxia refratária ao tér-mino do procedimento (Santos et al., 2002).

O que observamos em nossos resultados e na litera-tura existente a esse respeito é que a abertura do tóraxpor via trans-esternal, mesmo permitindo que se trabalhe cirurgicamente praticamente todas as estru-turas dessa cavidade, é de realização dispensável casoo procedimento a ser utilizado seja restrito a pequenasáreas, uma vez que nessas situações, o mais indicadoseria trabalhar pela via intercostal lateral. Corroboramcom essas afirmações os achados de Accioly que, em1965, já pesquisando e comparando a utilização de

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diferentes técnicas de toracotomia (laterais direita eesquerda, mediana e transversal bilateral) enfatizouque, de fato, cada via de acesso está relacionada àexposição de determinada estrutura anatômica. O autorconcluiu ainda que as técnicas que se demonstrarammenos cruentas foram as toracotomias por via lateral.

Seria muito difícil determinar por métodos quanti-tativos qual das duas técnicas melhor se adequa ao atocirúrgico da toracotomia. E de fato este não é um bomobjetivo a se alcançar, já que, em cirurgia, tem-se porconvenção a utilização da técnica cirúrgica a qual ocirurgião está mais familiarizado. Além disso, adiciona-se o fato de que cada técnica está mais relacionada a um dado tipo de procedimento cirúrgico.Em todo caso, são premissas básicas à realização, nãosó destas, mas de todas as técnicas cirúrgicas, umexcelente conhecimento anátomo-patológico e morfo-funcional da área a ser abordada, uma vez que grandeparte do sucesso final de uma cirurgia deve-se a taisfatores.

De acordo com os resultados obtidos pode-se concluir que a técnica de toracotomia trans-esternal éindicada para utilização experimental na espécie caprina por possibilitar uma ampla exposição e explo-ração cirúrgica dos órgãos pertencentes a cavidadetorácica. A técnica de toracotomia intercostal, tambémdemonstrou-se indicada à utilização em experimen-tação nessa espécie, com algumas vantagens emrelação à técnica trans-esternal.

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