teste da escola de direito da ucp

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UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA – ESCOLA DE DIREITO Rua Diogo Botelho, 1327 // 4169005 Porto, Portugal T. +351 226 196 200 // F. +351 226 196 291 // www.porto.ucp.pt TEORIA GERAL DA RELAÇÃO JURÍDICA Segundo teste escrito de avaliação contínua (regime diurno) — 3 de Maio de 2013 Advertências: A ordem de resposta às perguntas pode ser alterada, desde que as respostas identifiquem claramente a questão a que se referem. É permitida a consulta de quaisquer diplomas legais. O tempo disponível é de 30 minutos. Cotação das perguntas: 7 valores (grupo I); 7 valores (grupo II); 6 valores (grupo III). I. Alberto é gerente da sociedade “Arte no Ar, Lda” e, na qualidade de representante e em nome desta, compra o imóvel X, de que Bia é proprietária. Na celebração deste negócio Alberto intervém também como procurador de Bia, uma vez que esta lhe havia conferido poderes para vender o imóvel X pelo preço mais conveniente. O negócio celebrado é válido? Justifique. R: Alberto actua no mesmo negócio jurídico como representante de uma pessoa colectiva (sociedade) e de Bia (1). Na verdade, presta declaração(ões) em nome de outrem (sociedade e Bia), dentro dos poderes que lhe competem (art. 258.º) (1) Dupla representação [Na celebração do negócio jurídico, Alberto actua como representante do vendedor (Bia) e do comprador (sociedade)] (1,5) Art. 261.º/1- Negócio consigo mesmo - “negócio jurídico celebrado pelo representante consigo (…) em representação de terceiro” (1,5) Excepção (parte final do 261.º/1 não se verifica porquanto há conflito de interesses e representados (neste caso, pelo menos, Bia) não consentiram na celebração (1) Art. 261.º - negócio anulável (1) II. Francisco, casado com Gabriela, pretende ter acesso a um imóvel onde possa conviver com a sua amante, Helena. Em desabafo com o seu amigo de infância Isaías, Francisco afirma que, de modo a poder partilhar momentos de privacidade com Helena, o ideal seria tomar de arrendamento um pequeno apartamento no centro da cidade. Isaías afirma-lhe que «compreende perfeitamente» a sua infidelidade, dispondo-se até a arrendar-lhe um imóvel do tipo pretendido por Francisco. Supondo que vem a ser celebrado, indique o valor jurídico do negócio celebrado entre Francisco e Isaías, pronunciando-se sobre a produção dos respectivos efeitos. R.: foi celebrado um contrato de arrendamento entre Francisco e Isaías (arts. 1022.º e segs. e, mais especificamente, 1064.º e segs. CC) [1 v. ]. Ao que tudo indica, em si mesmo considerado — mormente no que concerne ao respectivo objecto —, o contrato em apreço é perfeitamente conforme à ordem jurídica, não pondo em causa os requisitos do objecto negocial constantes do art. 280.º CC [1,5 v. ]. Contudo, o fim do negócio — i.e., o intuito (=motivo) que presidiu à respectiva celebração — já não se pode dizer conforme à ordem jurídica, pois do enunciado resulta claramente que o arrendamento do imóvel se

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2 º Teste AC (3 de Maio de 2013) (Regime Diurno) (Com Tópicos de Correcção Grupo)

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  • UNIVERSIDADE CATLICA PORTUGUESA ESCOLA DE DIREITO Rua Diogo Botelho, 1327 // 4169-005 Porto, Portugal T. +351 226 196 200 // F. +351 226 196 291 // www.porto.ucp.pt

    TEORIA GERAL DA RELAO JURDICA

    Segundo teste escrito de avaliao contnua (regime diurno) 3 de Maio de 2013

    Advertncias: A ordem de resposta s perguntas pode ser alterada, desde que as respostas identifiquem claramente a questo a que se referem. permitida a consulta de quaisquer diplomas legais. O tempo disponvel de 30 minutos. Cotao das perguntas: 7 valores (grupo I); 7 valores (grupo II); 6 valores (grupo III).

    I. Alberto gerente da sociedade Arte no Ar, Lda e, na qualidade de representante e em

    nome desta, compra o imvel X, de que Bia proprietria. Na celebrao deste negcio Alberto intervm tambm como procurador de Bia, uma

    vez que esta lhe havia conferido poderes para vender o imvel X pelo preo mais conveniente.

    O negcio celebrado vlido? Justifique. R: Alberto actua no mesmo negcio jurdico como representante de uma pessoa colectiva (sociedade) e de

    Bia (1). Na verdade, presta declarao(es) em nome de outrem (sociedade e Bia), dentro dos poderes que lhe

    competem (art. 258.) (1) Dupla representao [Na celebrao do negcio jurdico, Alberto actua como representante do vendedor

    (Bia) e do comprador (sociedade)] (1,5) Art. 261./1- Negcio consigo mesmo - negcio jurdico celebrado pelo representante consigo () em

    representao de terceiro (1,5) Excepo (parte final do 261./1 no se verifica porquanto h conflito de interesses e representados

    (neste caso, pelo menos, Bia) no consentiram na celebrao (1) Art. 261. - negcio anulvel (1)

    II.

    Francisco, casado com Gabriela, pretende ter acesso a um imvel onde possa conviver com a sua amante, Helena. Em desabafo com o seu amigo de infncia Isaas, Francisco afirma que, de modo a poder partilhar momentos de privacidade com Helena, o ideal seria tomar de arrendamento um pequeno apartamento no centro da cidade. Isaas afirma-lhe que compreende perfeitamente a sua infidelidade, dispondo-se at a arrendar-lhe um imvel do tipo pretendido por Francisco.

    Supondo que vem a ser celebrado, indique o valor jurdico do negcio celebrado entre Francisco e Isaas, pronunciando-se sobre a produo dos respectivos efeitos.

    R.: foi celebrado um contrato de arrendamento entre Francisco e Isaas (arts. 1022. e segs. e, mais especificamente, 1064. e segs. CC) [1 v .].

    Ao que tudo indica, em si mesmo considerado mormente no que concerne ao respectivo objecto , o contrato em apreo perfeitamente conforme ordem jurdica, no pondo em causa os requisitos do objecto negocial constantes do art. 280. CC [1,5 v .].

    Contudo, o fim do negcio i.e., o intuito (=motivo) que presidiu respectiva celebrao j no se pode dizer conforme ordem jurdica, pois do enunciado resulta claramente que o arrendamento do imvel se

  • UNIVERSIDADE CATLICA PORTUGUESA ESCOLA DE DIREITO 2/2 Rua Diogo Botelho, 1327 // 4169-005 Porto, Portugal T. +351 226 196 200 // F. +351 226 196 291 // www.porto.ucp.pt

    destina a permitir que Francisco, casado, possa partilhar momentos de privacidade com Helena, sua amante: ou seja, possa cometer adultrio e assim violar os deveres para si emergentes do casamento [1,5 v .].

    Com efeito, seja porque contrrio lei (por atentar contra o dever de fidelidade emergente do casamento: cf., p. ex., arts. 1612. e 2196./1 CC), seja porque contrrio aos bons costumes, enquanto moral ou tica pblica dominante (mesmo em tempos de costumes mais flexveis como os actuais), sempre se diria ser o fim do contrato de arrendamento desaprovado pela ordem jurdica [1,5 v .].

    Assim, e porque esse fim comum a Francisco e a Isaas, que estava a par do mesmo e que com ele se conformou, dir-se- ser o negcio em apreo nulo, conforme disposto no art. 281. CC, pelo que o negcio no produzir os efeitos pretendidos por Francisco e Isaas [1,5 v .].

    III.

    Antnio professor do ensino secundrio e concorreu a uma vaga para uma escola de Coimbra, estando esperanado em conseguir ser a colocado.

    Em virtude deste facto, Antnio celebrou com Bianca um contrato de arrendamento de um apartamento em Coimbra pela renda mensal de 300, tendo o contrato respeitado todos os trmites legais.

    Todavia, existindo a possibilidade de Antnio ser colocado noutra localidade, acordou com Bianca incluir no contrato uma clusula pela qual os efeitos deste ficam dependentes do facto de Antnio vir, efectivamente, a ser colocado em Coimbra, o que s se saber quando forem publicados pelo Ministrio da Educao os resultados do mencionado concurso.

    O que suceder ao contrato de arrendamento se (a) Antnio vier a ser colocado em Coimbra ou (b) Antnio ficar colocado noutra localidade?

    R.: Estamos perante um negcio, um contrato de arrendamento, sujeito a uma condio, que um acontecimento futuro (em relao data da celebrao do negcio) e incerto (art. 270 CCiv.). 2,0 val .

    A condio pode ser suspensiva ou resolutiva: no primeiro caso o negcio s produz efeitos se a condio se verificar; no segundo caso o negcio comea desde logo a produzir os seus efeitos tpicos, mas estes cessam se, e no momento em que, a condio se verificar.

    Aqui, estamos face a uma condio suspensiva: o negcio s ficar apto a produzir efeitos se Antnio for colocado em Coimbra. 2,0 val .

    a) Caso Antnio venha a ser colocado em Coimbra, o contrato de arrendamento produzir todos os seus efeitos a partir da data nele prevista, verificando-se a condio suspensiva; 1,0 val .

    b) Caso Antnio venha a ser colocado noutra localidade, ento a condio no se preenche, e temos a certeza de que no poder jamais vir a verificar-se (art. 275, n 1, CCiv), pelo que o contrato no vir nunca a produzir efeitos. 1,0 val .

    FIM