sobre o «trans-iberism.o» como metanarrativa.josé saramago entre universalismo e...

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Orlando Grossegesse (org.) «o estado do nosso futuro» Brasil e Portugal entre identidade e globalização edition tranvía· Verlag Walter Frey Berlin 2004

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Burghard Baltrusch: "Sobre o «Trans-iberism.o» como Metanarrativa. José Saramago entre Universalismo e Pós-colonialismo"

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Orlando Grossegesse (org.)

«o estado

do nosso futuro»

Brasil e Portugal entre identidade e globalização

edition tranvía· Verlag Walter Frey

Berlin 2004

Bibliografische Infor"mation der Deutschen Bibliothek Die Deutsche Bibliothek verzeichnet diese Publikation in der Deutschen Nationalbibliografie; detaillierte bibliografische Daten sind im Internet über http://dnb.ddb.de abrufbar

."

Copyright: edition tranvía - Verlag Walter Frey

Druck: Rosch-Buch, ScheBlitz ISBN 3-925867-83-X

Berlin 2,0,04

edition tranvía' Postfach 15,0455 . D-l,0666 Berlin E-mail: [email protected] . Internet: www.tranvia.de

Dieses Buch wurde auf aiterungsbestandigem und saurefreiem Papier gedruckt"

Índice geral

Orlando Grossegesse

O estado do nosso futuro. Um epílogo como prólogo

Onésimo Teotónio Almeida

Identidade nacional- a doce tirania do passado

Fernando Clara O futuro foi ontem. Tempo e Identidade nacional

Eduardo Subirats

Antropofagia contra globalização

Eneida Leal Cunha Comemorações dos Descobrimentos: reconfigurações

contemporâneas da nacionalidade no Brasil e em Portugal

Albert von Brunn

Cidade de Deus ou Sodoma? A visão apocalíptica da cidade

em Caio Fernando Abreu

Isabel Pires de Lima Como a gente se vai (des)entendendo: interrogações identitárias

10

25

40

66

88

em Madame de Maria Velho da Costa 101

Burghard Baltrusch Sobre o «Trans-iberismo» como Metanarrativa.

José Saramago entre Universalismo e Pós-colonialismo

Ruth Tobias O regresso de Dom Sebastião? Metamorfoses do mito

na literatura contemporânea

111

134

português e brasileiro de Eça e Machado. Alguma ponte utópica (?) poderá ser lançada através de uma cultura que do texto se faça mediáti­ca, que envolva Evas e Eunices, teatros, telenovelas e o mais que per­mita que Eulálias e Franciscas conversem assim (p. 44):

EULÁLIA ( ... ) Olha rapariga ...

FRANCISCA Ah,· isso aí eu não sou, não. Rapariga na fala da gente é

mulher da vida.

EULÁLIA Pois na nossa é moça em flor, coisa que tu já não és.

FRANCISCA Nem vosmicê é isso mais, 'irge Maria! (Pausa. Imitando

Eulália:) Carago!

EULÁLIA Ora vês como a gente já se vai entendendo?

Bibliografia

COSTA, Maria Velho da (1999), Madame, Lisboa: Dom Quixote.

COSTA, Maria Velho da (2000), Madame, Lisboa: Edições Cotovia / Porto: Teatro Nacional de S. João.

LIMA, Isabel Pires de (1987), As Máscaras do Desengano - Para uma abordagem sociológica de Os Maias de Eça de Queirós, Lisboa: Editorial Caminho.

110

Burghard Baltrusch

Sobre o «Trans-iberism.o» como Metanarrativa. José Saramago entre Universalismo e Pós-colonialismo

Um livro é, acima de tudo, a expressão de uma

parcela identificada da humanidade: o seu autor.

(José Saramago, 1997)

No que se refere à Europa, continuo a

acreditar que ela é um grande engano.

(José Saramago, in Reis, 1998a: 146)

A grande descoberta dos portugueses é que

o mundo é um arquipélago.

(Agostinho da Silva, 1988: 40)

É sabido que o discurso literário e ensaístico de José Saramago alberga

um empenho de desmitificação, não só da história portuguesa e da sua

imagologia, mas também de conceitos universais e modernos como

o Cristianismo, a Democracia ou a Europa. No que diz respeito à Península Ibérica salienta-se, por exemplo, a crítica saramaguiana à inte­

gração europeia, que, depois da publicação do romance A Jangada de Pedra (1986, cit. JdP), culminou no lançamento do conceito do trans­-iberismo. Saramago reincidiu em várias ocasiões na importância da ma­

nutenção do espelho que representariam as culturas americanas e afri­

canas de fala portuguesa e espanhola para a pluralidade sócio-histórica

da Península e da sua diferença cultural em relação à Europa central.

.'

A Dissolução dos Níveis Narrativos

Entre as desmitificações saramaguianas de institucionalizações históri­

cas sofridas por escritores portugueses, destacam-se as de Luís de

Camões e Fernando Pessoa. Saramago argumenta que o uso, feito pelo

respectivo poder político e cultural destas figuras históricas, transfor-

111

mou-os em 'vacas sagradas' e que agora estariam, praticamente, "a

caminho da invisibilidade" (1988: 15). Especialmente em O ano da Morte de Ricardo Reis C 1984, cit. AMRR), e nas entrevistas dadas por

ocasião da sua publicação, Saramago denunciou a continuada explo­ração política d'Os Lusíadasao longo da história, a qual teria confluído numa paralisação e mutilação do imaginário português. 1

A crítica saramaguiana mais significativa dos discursos literários tra­dicionais consiste numa ferramenta estética que é a dissolução dos ní­

veis narratiyos. Saramago pretende que seja um mito que 'tenha de existir uma diferença entre os sujeitos do autor, do narrador e do crítico. Levado pela intenção de ressaltar a imprescindibilidade do carácter lúdico e ritual da escrita2

, Saramago emprega como elemento estrutural de toda a sua narrativa romanesca desde 1980 um complexo de vozes que descrevem, desmontam, sentenciam, dialogam, profetizam, se apa­

gam, manipulam, ironizam, dominam, etc. Cc! também Real, 1995), substituindo, assim, os sujeitos narrativos tradicionais.

O exemplo de um aspecto do funcionamento deste coro pós­moderno, metanarrativo e metalinguístico dá-se em AMRR. Este ro­mance oferece uma revisão de vários aspectos do imaginário nacional português a partir da confrontação do heterónimo neo-helenista de Fer­

nando Pessoa com a realidade histórica de 1936. É uma revisão construída como um palimpsesto.

As caracterizações próprias e alheias de Reis transluzem, através da densa textura, composta de poesia citada e parafraseada, e da narração

1) Mas também Saramago ele-próprio já está sendo o alvo das mais variadas tentativas de institucionalização e mitificação. O académico e crítico Carlos Reis, p. ex., que pu­blicou uma colecção de entrevistas com o autor (Diálogos com José Saramago, 1998), deriva da circunstância de Saramago ser, já, um escritor transnacional que para a litera­tura portuguesa seria nocivo se o "efeito literário deste Nobel" resultasse no surgimento de uma escola epígona (Reis, 1998b: 22). Estas opiniões e, sobretudo, as suas publi­cações por críticos influentes, constituem uma operação semântica nefasta em dois sentidos: Por um lado imobiliza-se o autor num estrado dourado, dificultando para a futura geração literária o jogo sem preconceitos com as suas propostas narrativas e ideárias; pelo outro lado desacredita-se a condição 'transnacional' de um escritor, res­tando demasiada importância às características nacionais das literaturas, um perfil que na contemporaneidade está a perder cada vez mais valor argumentativo.

2) Cf: "O jogo é, talvez, a mais séria das actividades humanas" (Saramago, 1990: 17).

112

que a interpreta e valoriza, como variações sobre um só tema: a inacei­

tabilidade do cinismo de um observador aparentemente sereno do mun­

do, de um voyeur sossegado do "espectáculo do mundo". Reis é inca­

paz de sentir compaixões das quais poderiam resultar actuações comprometidas com a realidade histórica: "Sou somente o lugar onde se pensa e sente" (c! Pessoa: 180), são os versos da sua própria ode que

relê no romance e pensa:

Se somente isto sou, pensa Ricardo Reis depois de ler, quem estará pen­sando agora o que eu penso, ou penso que estou pensando no lugar que

sou de pensar, quem estará sentindo o que sinto, ou sinto que estou sen­

tindo no lugar que sou de sentir, quem se serve de mim para sentir e pen­sar, e, de quantos inúmeros que em mim vivem, eu sou qual, quem, Quain, que pensamentos e sensações serão os que não partilho por só me

pertencerem, quem sou eu que outros não sejam ou tenham sido ou ven­

ham a ser. (AMRR: 24)

Porém, o 'narrador' sugere uma consciência metanarrativa do prota­

gonista, produzindo, ao mesmo tempo, uma autêntica embrulhada dos

sujeitos narrativos no enredo textual: Reis I poeta como fingimento de

Pessoa, Reis I poeta como palco dos "inúmeros" que sente em si, Reis I poeta como ficção I fingimento de Saramago, Reis I poeta como perso­

nalidade independente, etc. Mas sobre toda esta encruzilhada de níveis

narrativos paira a confissão de um autor que se serve desta para fins

ressentidos, porque lhe irritava profundamente a indiferença de Reis e a

vontade deste de ser um mero espectador dos acontecimentos (c! Sa­ramago, 1985a: 8). O jogo com a ficção enleada por outras ficções

obedece, portanto, a directivas tanto estéticas como éticas. Assim, a sobreposição subversiva do autor ao narrador, que Sarama­

go ultimamente vem propagand03, e devido à qual já tem sido criticado

(c! Batista, 1998), pode ser considerada uma tentativa de unificar o ideário pessoal com o ficcional. No seu discurso nobilístico Saramago eleva esta sobreposição a uma identificação de vida e arte: "Em certo

3) Cf "a [ ... ] aceitação muito consciente do papel do autor como pessoa, como sensi­bilidade, como inteligência, como lugar particular de reflexão, na sua própria cabeça" (Saramago in Reis, 1998a: 97).

113

sentido poder-se-á mesmo dizer que [ ... ] tenho vindo, sucessivamente, a implantar no homem que fui as personagens que criei." (Saramago,

1998: 4) A identificação -entre vida e obra, que Saramago parece querer

empreender, também se verifica em níveis metanarra~ivos. Saramago começou nos últimos anos a nadar contra a corrente de opinião que defende a ideia de que um escritor nunca deveria interpretar a sua obra. Isto tornou-se um discurso político-cultural geralmente aceite na medi­da em que aqueles que o empregam também exercém, através dele, um certo poder. Saramago, porém, iniciou com os seus ensaios, inter­venções públicas, nas entrevistas e nos Cadernos de Lanzarote (1994 ss.) um auto-comentário dos grandes temas e das grandes ideias que

motivam a sua escrita. As suas auto-exegeses demonstram, também, que ele incorpora no

seu discurso certos conceitos que a crítica académica maneja na explica­ção da sua narrativa (cf Saramago in Reis, 1998a). Estabeleceu-se um diálogo reflexivo e cônscio da sua responsabilidade que Saramago man­tém quer com os seus leitores normais, quer com os seus intérpretes aca­démicos. A confabulação de ética e estética deste diálogo intertextual está relacionada com o sonho de totalidade do seu conceito romanesco e do romance, nas mais vastas amplitudes dos seus significados (ca­rácter de romance, romântico, maravilhoso, devaneador, apaixonado, fabuloso; ou novela, conto, fantasia, objecto imaginário e enredo de falsidades ).

Mas Saramago vai ainda mais longe na sua remodelação dos mitos literários: questiona não só a veracidade da existência do género do ro­mance histórico, mas também a função de género do romance em si4

,

definindo-o como simples "lugar literário" (Saramago in Reis 1998 a: 138). A pretensão do seu romance seria, então, a "tentativa de uma des-

_ 4) Esta crítica do género traduz-se, p. ex., no emprego da ironia como meio de indeter­minação ou como jogo com a "semiose e deriva ilimitada" (Eco, 1992: 425-442). Eco exemplificou esta prática nos seus romances, depois de analisar já em Opera aperta a arte modema em termos de uma "frustração dos instintos romanescos" do leitor / espec­tador (1973: 203), supondo que "a abertura, no sentido de uma ambiguidade fundamen­tai da mensagem artística, seria uma constante de todas as obras e em todas as épocas" (ibid.: II, as traduções são minhas).

114

«

crição totalizadora"s, de "dizer tudo" (ibid.). Saramago recria com estas aspirações a ideia romântica da obra de arte total,6 incluindo o próprio leitor / espectador que as teorias wagnerianas ainda não tinham tomado em consideração.7 A mitificação da inexistência do narrador8 faz tam­bém que o romancista se substitua ao "lugar literário": "o leitor não lê o romance, o leitor lê o romancista" (ibid.: 97), uma vez que "um livro é,

acima de tudo, a expressão [ ... do] seu autor". 9

Saramago fornece indicações para a leitura, como se quisesse adap­tar certas intenções do teatro épico: 1) A autocrítica inerente nas vozes

narrativas dos seus romances destaca sempre algumas das precaridades dos papéis que se protagonizam; 2) as vozes têm um carácter altamente explicativo que convida à crítica; e 3) o conhecido através da história tradicional e através do imaginário colectivo é enleado e reavaliado.

Outro aspecto do discurso literário que Saramago emprega: as já re­feridas interacções de indeterminação e ironia. 10 Um caso seria a ironia da "História como ficção" (Saramago, 1990: 17) e do historiador como "escolhedor de factos" que "substitui o que foi pelo que poderia ter sido" (ibid.). A ironia subversiva desta ideia obedece, no entanto, a uma intenção didáctico-iluminista que retoma, até, algum ideário do neorea­lismo: Uma consciência histórica crítica gera, através do meio de co­municação romance, a narração de uma outra história, que manipula,

5) Cf também: "quando convoco o romance, no fundo entendo-o como uma tentativa de o transformar numa espécie de soma." (ibid).

6) Cf: "aquilo a que eu aspiro é traduzir uma simultaneidade, é dizer tudo ao mesmo tempo. [ .. ] Isto mostra até que ponto os escritores [ ... ] aspiramos a essa forma de ex­pressão total" (ibid.: 99 s.).

7) Cf: "ele [o leitor] só pode entender o texto se estiver 'dentro' dele, se funcionar como alguém que está a colaborar na finalização que o livro necessita" (ibid.: 101 s.); acerca da ad'aptação do conceito da obra de arte total (Gesamtkunstwerk) no modernis­mo cf Baltrusch (1997: 356 s).

8) Cf: "como o meu romance é um romance em construção contínua, é um romance que se vai fazendo a si mesmo" (ibid.: 133) e: "a figura do narrador não existe" (Sara­mago, 1997, 7).

9) Cf também a sua ideia de os romances serem "o sinal de uma pessoa" (ibid.: 98).

10) Também Real considera o narrador saramaguiano nascido "justamente do cruza­mento singular entre uma consciência determinista e uma consciência contingente da História" (Real, 1995: 29).

115

retroactivamente, a consclencia do leitor em consonância com esta

consciência histórica crítica, incitando-o a reler e reavaliar a própria

História (c! Baltrusch, 1997: 201ss). A aparência do autor, oscilando

entre o carácter lúdico e o impulso ético

[ ... ] produzirá uma espécie de jogo contínuo em que o leitor participa di­rectamente, por meio duma sistemática provocação que consiste em ser­-lhe negado, pela ironia, o que lhe fora dito antes, levando-o a perceber que se vai criando no seu espírito uma sensação de dispersão da matéria

. . histórica na matéria ficcionada, o que, não significando desorganização

duma e outra, pretende ser uma reorganização de ambas. (ibid.: 20)

Meio essencial de uma determinação relativa, a ironia aparece, assim, como tentativa de harmonização da oposição dialéctica de História e Verdade, de carácter lúdico e seriedade, de auto-relativização e recla­mação universalista e essencialista. Esta ânsia de síntese alberga um impulso ético que também se oferece como modelo de identificação

positiva para o público leitor. A História do Cerco de Lisboa (1989, cit. HCL) constitui um bom

exemplo de como se realiza esta teoria estética da indeterminação e ironia na sobreposição de ficção e realidade. O protagonista, o revisor Raimundo Silva, introduziu durante a correcção de uma obra historio­gráfica sobre o cerco da Lisboa 'moura no século XII um "não" numa passagem decisiva. Depois de a sua alteração ter sido descoberta, o revisor começa, insatisfeito pela historiografia tradicional, por escrever a sua própria versão do cerco. Dão-se interferências entre o narrador reflexivo Raimundo Silva e as vozes reflexivas e auto-referenciais do autor (c! Baltrusch, 1990).

A análise da técnica irónica do narrador Silva, empreendida pelo autor / narrador, é um irónico exercício estilístico, cuja complexidade pretende evocar, na consciência do público leitor, aquela "sensação de dispersão da matéria histórica na matéria ficcionada" (Saramago, 1990: 20) para que adopte uma nova perspectiva histórica:

Raimundo Silva encontra-se numa interessante situação, a de quem, jo­gando o xadrez consigo mesmo e conhecendo de antemão o resultado fi­nal da partida, se empenha em jogar como se o não soubesse e, mais ain-

116

da, em não favorecer conscientemente nenhuma das partes em litígio, as negras ou as brancas, neste caso os mouros ou os cristãos, segundo as co­res. E muito abertamente o tem vindo a demonstrar, haja vista a simpatia, diríamos mesmo o apreço, com que tem tratado os infiéis, em particular o almuadem, sem falar no respeito que manifestou quando se referiu ao porta-voz da cidade, aquele tom, aquela nobreza, em contraste com uma certa secura, uma impaciência, uma ironia, até, que sempre vêm à tona do discurso quando se trata dos cristãos. (HeL: 233)

A ironia contamina aqui a respectiva posição contrária sem a destruir,

apresenta a própria posição sem reclamar a verdade absoluta., Ela distancia o narrador da sua narração, distancia o narrador na narração da sua narração dentro da narração, distancia, finalmente, o público

leitor da sua leitura e percepção histórica habitual e provoca, além dis­so, em ambos consternação e compromisso. A ironia obedece aqui a um impulso ético; revela-se, ao mesmo tempo, como ,característica ideo­lógica de um pensamento estético e da sua expressão crítica, empre­

gando-se esta como outro modelo de identificação positiva para o público leitor, como metanarrativa 'reescrita'.

A Crítica Imagológica

Ao contrário do que se tornou opinião geral, desde António Sérgio até Eduardo Lourenço e António José Saraivall

, as interpretações aqui ex­postas partem da assunção, de que é possível entrever uma tradição alternativa de filosofia portuguesa.

Não se podem agora desenvolver as respectivas perspectivas meto­dológicas ou argumentos históricos. Mas já a longa e ramificada tra­dição das ideias, utopias e exegeses a respeito do imaginário português so"re o destino nacional representam, em si, um testemunho da perpé­tua inclinação filosófica da cultura portuguesa. Outro aspecto a ter em conta é o facto de o pensamento filosófico de alguma repercussão em Portugal sempre ter estado inserido num contexto literário, ou artístico

11) Cf também Real (1998: 11-152).

117

em geral, ou seja, de nunca ter distinguido entre a estética e o perguntar filosófico. 12

Uma tal reavaliação da história das ideias, na linha das propostas dos

métodos pós-coloniais, requereria também desfazer-se da colonização sofrida pelo conceito franco-anglo-germânico da filosofia. Em oposição a isto, dever-se-ia analisar o perguntar filosófico português nas suas revelações e interdependências estéticas, como um discurso metanarra-

. tivo, p. ex., em obras literárias (existe uma rica tradição se observar­

mos, simplesmente, a respectiva continuidade da póesia filosófica des­

de os finais do séc. XIX, passando por Antero, Pessoa e Sena até à

actualidade pós-revolucionária). Assim, seria inevitável denotar tam­bém nos romances de Saramago uma constante inquietação filosófico­-ética, que o autor conota com elaborados elementos estéticos e que continua a explicitar em trabalhos ensaÍsticos.

A mitologia relacionada com o destino nacional tem sido, certamen­te, um dos mecanismos mais relevantes da memória cultural portugue­

sa. Recentemente, Miguel Real tentou sintetizar os respectivos ideários

e propôs o conceito dos centros históricos imaginários para denominar aquelas apropriações do passado pelo futuro (1998: 18), que vão insti­tucionalizando o Mito como uma realidade superior e teleologicamente ordenada (1998: 19). Real advertiu, ainda que não tenha sido o primeiro mas com toda a razão aliás, que as obras de Eduardo Lourenço e Antó­nio José Saraiva representam um autêntico "tournant do imaginário filosófico português" (1998: 63), uma vez que introduziram um diálogo crítico, mas ao mesmo tempo normalizado, com o pensamento europeu contemporâneo. Assim, Lourenço tinha introduzido o conceito da "ima­gologia" como "discurso crítico" sobre a autognose portuguesa (1978: 14), dirigindo-se abertamente contra o que chamou o "irrealismo prodi­gioso" (1978: 17) do imaginário nacional.

Se quiséssemos incluir o discurso de Saramago neste debate imago­lógico, quase teríamos de falar duma 'nova Mensagem', não querendo estabelecer através desta conotação com Fernando Pessoa um parale-

12) Talvez seja a "Estética não-aristotélica" de Álvaro de Campos uma das melhores ilustrações de certos aspectos desta peculiaridade do pensamento português (cf tam­bém Baltrusch, 1997: 142-153).

118

,

lismo semântico, mas sim um antagonismo. Mensagem não constituiu uma renovação imagológica da memória colectiva relativa ao destino

nacional. Esta obra transferiu-a, antes bem, em metanarração esotérico­gnóstica em termos de um universalismo cultural, seguindo as ten­dências messiânicas e esteticistas do Bandarra, do Sebastianismo e da História do Futuro de Vieira. Seguiu-lhe, mais tarde, na renarração deste imaginário providencialista, Agostinho da Silva com a concepção da missão messiânica do Império do Espírito Santo que Portugal teria

que cumpnr. Segundo Lourenço, este desejo de superioridade deriva de um pro­

fundo complexo de inferioridade, surgido de três traumatismos históri­cos: o "acto sem história" e "injustificável" do surgimento de Portugal

como estado, o impacto psicológico de Alcácer Quibir e a perda defini­

tiva dos restos do império colonial em 1974/75. Saraiva adjudica esta interacção de imaginários antagónicos ao "eterno balanceamento do português entre a solicitação de 'aventura' e o 'complexo de ilhéu'" (cf também Real, 1998: 152) surgidos do Espírito de Cruzada e da limi­tação geográfica.

Contra o providencialismo, tanto Saraiva como Lourenço argumen­tam que Portugal sempre tinha sido uma parte da Europa, que interagiu com ela, verificando-se, somente, um afastamento durante os quatro­centos anos entre o século XVI e o século XX. Porém, o reencontro com a Europa, depois da sua formalização política em 1986, consumiu­-se quando esta Europa já se encontrava "vazia por dentro de qualquer intenção e desígnio que transcendam a realidade quotidiana das suas performances, da sua existência infantilmente paradisíaca de Disney­land" (Lourenço, 1984: 34), quando ela já se revelava "imageticamente desequilibrada" (Real, 1998: 82).

Se enc'arássemos os imaginários do destino nacional, ou seja a ima­gologia portuguesa, como uma meta-literatura ou como um meta­discurso estético e auto-reflexivo da memória colectiva, ser-nos-ia pos­sível encadear com ela o pensamento saramaguiano, seja o ensaístico seja o deduzido da obra literária. Em geral, pode-se dizer que a au­

tognose de Saramago reduz a interacção entre os imaginários de infe­

rioridade e superioridade àquilo que ele denominou, com extremo prag­

matismo, como o "emblemático bifronte humano do possível e do dese-

119

jável, a realidade e a utopia, máscaras que para ocultar o rosto o repe­

tem, rostos que sempre acabam por imitar a máscara" (1993: 22).

Em substituição de uma memória de inferioridade, ainda que tivesse sido suavizada pela mitificação do 25 de Abril, este autor propõe indi­rectamente introduzir no imaginário colectivo português um sentimento de culpabilidade europeia, perante aquilo que se costuma chamar o Terceiro Mundo. O último testemunho deste empenho ofereceu-o no seu discurso ante a Real Academia Sueca, no qual falava da necessida­

de de uma "nova utopia" (1998: 6), ou seja, de uma Europa que se de­

via orientar "para o Sul, a fim de, em desconto dos seus abusos colonia­listas antigos e modernos, ajudar a equilibrar o mundo. Isto é, Europa finalmente como ética" (ibid.: 7).

Três meses antes, numa conferência proferida durante o 11 0 Con­gresso Iberoamericano de Filosofia em Cáceres, também já tinha reivin­dicado que a Europa assumisse as responsabilidades das injustiças co­metidas durante os descobrimentos. Saramago inclui, até, o actual sistema político na sua crítica pós-colonialista, quando em 1993 adver­

tiu num ensaio da ilusão democrática que encobriria· a inexistência de uma verdadeira democracia na Europa, uma ilusão que estaríamos a exportar ao resto do mundo (1993: 34).

A grande crítica cultural, aqui inerente, provém de JdP, onde a ficção faz que a Península Ibérica se desprenda do continente para flutuar oce­ano abaixo até, metaforicamente, parar entre a África e a América. Sara­mago ignora deliberadamente as advertências de Lourenço e de Sarai­va, de que seria imprescindível situar a imagologia histórica e futura de Portugal no contexto europeu. 13 Ele até admitiu, no seu discurso nobe­

lístico, que JdP tinha sido o "fruto do ressentimento colectivo português pelos desdéns históricos de Europa" (1998: 6), alçando-se com tal afir­mação o porta-voz contemporâneo da memória colectiva portuguesa.

Porém, a sua reclamação da existência de factos diferenciais entre a cultura ibérica e a europeia l4 não fica por aí. A jangada ibérica, como

13) Aos quais se juntou recentemente Real, 1998: 152-153 (cf também Saramago, 1988: 24).

14) Cf: "Neste livro [JdP] tentei mostrar duas coisas; primeiro: a Península Ibérica tem pouco a ver com a Europa no plano cultural. Dir-me-ão que a língua vem do latim, que

120

alegoria de um renovado iberismo, diferencia-se de maneira significati­

va dos simbolismos nacionalistas ou providencialistas de um 'brave

new world' shakespeariano, de uma 'Ilha dos Amores' camoniana ou

do nacionalismo atlântico de um Sarmiento de Gamboa (c! Vidal­Noguet, 1988). Dois anos depois da publicação de JdP, devido às críti­

cas por anti-europeismo que lhe foram feitas, Saramago sentiu a neces­sidade de esclarecer a sua posição num artigo titulado "O meu iberis­mo" (1988). Nele separa-se o ideário do iberismo português do elemen­

to providencialista-irrealista como também das suas raízes nacionalistas

e rácicas, que culminaram no século XIX na ideia da União Ibérica (c!

Marques III: 35-36). Da apreensão da "constelação socio-histórico-cultural pluriforme" da

Península Ibérical5, que ainda assim constituiria "uma cultura fortemen­

te caracterizada e distinta" da europeia, Saramago deduz a necessidade de uma "harmonização dos interesses" ibéricos e um "previlegiamento

das permutas culturais" (1986b: 24). Ante o temor de uma, ainda que

utópica, permutação cultural ibérica se dissolver no caldo europeu, o

autor chega à conclusão que a "Península Ibérica não poderá ser hoje

plenamente entendida fora da sua relação histórica" com as culturas da América Latina e da África (ibid.). Estes representarIam, então, o futu­

rível da própria pluralidade cultural, de maneira que, e continuando a pensar nesta linha, a utopia do trans-iberismo requereria para a manu­

tenção da identidade cultural ibérica uma continuação crítica do cami-

o Direito vem do Direito Romano, que as instituições são europeias. Mas o certo é que, com este material comum, fez-se nesta península uma cultura fortemente caracterizada e distinta. Segundo: há na América um número muito grande de povos cujas línguas são a espanhola e a portuguesa. Por outro lado, nascem em África novos países que são as nossas antigas colón.ias. Então imagino, ou antes, vejo, uma enorme área ibero­-americana e ibero-africana, que terá certamente um grande papel a desempenhar no futuro. Esta não é uma afirmação rácica, que a própria diversidade das raças desmente. Não se trata de nenhum quinto nem sexto nem sétimo império. Trata-se apenas de sonhar - acho que esta palavra serve muito bem - com uma aproximação entre estes

II dois blocos, e com o modo de o demonstrar. Ponho a Península a vogar para o seu lugar próprio, que seria no Atlântico, entre a América do Sul e a África Central. Imagine,

portanto, que eu sonharia com uma bacia cultural atlântica." (l986b: 24)

15) Saramago (1988: 32). Cf também: "Pude sair duma visão histórica globalizada para a apreciação dinâmica das diferenças" (ibid.).

121

nho empreendido pela expansão providencialista dos descobrimentos,

assumindo, esta vez, responsabilidades laicas e pós-coloniais.

A Utopia Pós-colonial

Saramago é, talvez, um dos primeiros escritores portugueses ou até ibéricos, que se aperceberam, e que defenderam com bastante clareza, que vivemos numa época em que o conflito pós-colonial de sistemas (p.ex. comunismo vs. capitalismo) se está deslocando cada vez mais para o que se pode passar a conceituar, desde uma perspectiva dos estudos culturais, como "cultural conflict" (S. Huntington, c! Turk, 1994: 244). Este conflito cultural desenvolve-se tanto no âmbito intra­-ocidental como na relação Ocidente -Oriente ou Ocidente -África.

A situação ibérica na Europa, e de Portugal em concreto, é, portanto, um balanceamento precário, uma vez que os laços imagéticos com as ex-colónias parecem ter sido mais profundos e duradoiros do que os que permaneceram, p. ex., depois do declive dos imperialismos inglês e francês. Saramago tenta manter o equilíbrio imagético através da intro­dução do conceito da culpabilidade de toda a Europa em relação aos países colonizados por ela, um discurso ainda bastante inovador no que diz respeito à imagologia portuguesa literariamente tratada.

Por conseguinte, a sua utopia literária do futuro ibérico também re­

toma alguns fios estéticos procedentes da suposição de um destino

messiânico português que partia da premissa "que a humanidade é espi­ritualmente [ ... ] uma só" (Real, 1998: 36). Mas o providencialismo de

Saramago substituiu a unidade simbólica do povo português, como a defendia Agostinho da Silva (c! 1994), pela unidade simbólica de po­vos ibéricos dentro de um discurso global trans-ibérico, dentro de uma "bacia cultural atlântica" (Saramago, 1986b: 24). No que diz respeito à vertente do complexo de inferioridade e de pessimismo nacionaJl 6

, a qual Lourenço via resumida naquela interrogação de Garrett: "que ser é o meu, se a pátria a que pertenço não está segura de possuir e ter o

16) Cf a suposição de Agostinho da Silva que, desde o século XVI, o melhor de Portu­gal se tivesse mudado para o Brasil.

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seu?"l7, Saramago reveste-a de uma escatologia positiva: a permutação

cultural ibérica e a dissolução numa trans-ibericidade .

O conceito imagético do trans-iberismo aproxima-se, assim, de uma forma muito interessante do conceito cultural universalista de Ernst Cassirer. Este filósofo alemão pretendia chegar, a partir de um "concei­to geral do mundo", a um "conceito geral da cultura", ou seja, conside­

rando a língua, o conhecimento científico, o mito, a religião, a arte,

enfim, todas as "produções da cultura mental" como partes de um gran­

de contexto problemático, como uma tarefa comum (c! Turk, 1995: 18). A "Europa finalmente como ética", que Saramago reclama, implica não só um tal alargamento do conceito cultural, mas também um actua­lizado modelo de percepção a grande escala: se a teoria, de que a/orma

mentis portuguesa sempre se tivesse alimentado "imageticamente do Outro (mouro, castelhano, índio oriental e ocidental, espanhol, francês, Europa)" (Real, 1998: 152), se esta teoria fosse certa, então encontra­

ríamos no conceito imagético do trans-iberismo uma importante inova­ção semântica, já que viabiliza, intencionalmente, um interrelaciona­

mento das representações próprias e das representações alheias do pró­prio. E isto é considerado pelos estudos pós-coloniais da actualidade justamente COlno o grande problema cultural do Ocidente no seu diálogo

racional e humanitário com culturas, que, depois da sua colonização mo­derna, adquiriram a capacidade de combinar a crítica social com a defe­sa das suas culturas e tradições não-modernas (c! Turk, 1994: 245).18

Como agora Saramago, também Cassirer pretendia que se respeitasse

a diversidade dos fenómenos culturais e que se conceitualizasse o signi­ficado das diferentes unidades subjacentes à cultura (c! Orth, 1988).

Neste contexto semiótico-filosófico dever-se-ia situar, p. ex. a crítica ao discurso europeu em JdP, ou seja, a interdependência da diversidade cultural pen'insular com o 'facto diferencial' ibérico perante a Europa.

17) Lourenço (1978: 86). Se Lourenço revisasse O Labirinto da Saudade, escrito entre 1973 e 1978, certamente incluiria a obra de Saramago entre as poucas obras capitais da

autognose nacional que ali citou, à parte de O Delfim de José Cardoso Pires (ibid.: 68).

18) Cf por exemplo, o projecto da análise de uma Europa vista de fora que se deixa entrever na obra de Salman Rushdie.

123

A confabulação de ética e estética, que Saramago emprega como

elemento discursivo pós-moderno (c! Baltrusch, 1998), é também utili­zada para denunciar certos discursos de poder que actuam sobre e nas memórias colectivas. Em JdP e posteriormente no ensaio "O meu Ibe­rismo" (l988), como também recentemente no seu discurso nobelístico, o autor defendia a "nova utopia" de uma "Europa finalmente como ética" (1998) que se devia orientar para o Sul, a fim de assumir as responsabilidades pelos estragos causados durante a colonialização e

., descolonialização.

Consequentemente, e ao contrário daquilo que propagara o provi­

dencialismo, Saramago reduz os conceitos da Nação e da Identidade

Nacional a uma linguagem cultural, dissolvendo-a na necessidade multicultural de uma trans-ibericidade. Na linha do já mencionado Cas­sirer, Saramago propõe um actualizado modelo de percepção a grande escala, reclamando um interrelacionamento das representações próprias

e das representações alheias do próprio. A grande crítica saramaguiana às consequências tidas como negati­

vas das identidades nacionais e das memórias colectivas, e da portugue­sa em concreto, poderia ser estruturada por três aspectos: O primeiro visaria as sínteses feitas pelos estudos pós-coloniais que alertam para os processos de re-possessão dos processos de imaginação depois das imposições coloniais europeias. 19 O segundo seria a percepção de uma pós-modernidade como fenómeno global e globalizador que tem como consequência uma desterritorialização cultural tanto de pessoas como de valores e de ideários que antes viabilizavam os processos de identi­ficação. O terceiro aspecto, consequência do segundo, parte da ideia de a identidade (tanto cultural como da personalidade) aparecer, na actua­lidade, em muitos âmbitos como uma ficção, uma utopia inverosímil que retrocede ante o anti-miticismo do hibridismo cultural.

Na JdP, por exemplo, Saramago joga com os referidos níveis da des­territorialização, quer negativa quer positivamente, e propaga um hibri­dismo cultural ibérico como substituto identificatório. John R. Gillis definiu a identidade constituída pela interdependência com a memória,

19) Cf as análises de autores como Edward Said, Gayatri Spivak e Homi K. Bhabha, entre outros.

124

um processo no qual a história actuaria corno intermediário. Saramago

acrescenta a este modelo a possibilidade e o dever do sujeito contem­

porâneo de questionar a identidade através de urna reavaliação e 'cor­

recção' da História e da historiografia oficial e colonizadora.20 Assim, a

atitude ateísta de Saramago combina-se frequentemente com a ideia

materialista de urna História modulável e com a ideia neo-existencialista

de adquirir segurança e identidade ontológica através da actuação e do

compromisso humanitário: "O homem não se deve contentar com o

papel do observador. Tem responsabilidade perante o mundo, tem que actuar, intervir".21

Porém, Saramago não encadeia os factos-signos e mitemas da His­

tória, mantendo uma ordenação totalmente teleológica, corno o requere­

ria a sistemática de urna formação corno a dos centros históricos ima- . ginários (Real, 1998: 19). O seu discurso inverte estes processos no

sentido de a reordenação e remitificação da história, por ele empreendi­

das, partirem de urna percepção por vezes não-linear do tempo históri­

co. As repetidas afirmações do autor, de o historiador / narrador ser um

"escolhedor de factos" (1990: 19) que "faz a História", que a corrige

deliberadamente para perturbar e que "toda a apreensão do mundo e da

vida é ficcionante" (1989: 45), oferecem um perspectivismo atemporaI.22

Saramago sintetizou esta tentativa de renovação do imaginário míti­co português com a "ideia do tempo como urna tela gigante, onde tudo

20) Um exemplo deste processo, e também para a crítica dos discursos de poder na

obra saramaguiana, é o tratamento do cristianismo. Assim, em AMRR e no Evangelho segundo Jesus Cristo (1991), o autor desmitifica quer os conteúdos religiosos do fascis­mo europeu quer os asp~ctos totalitários do ideário cristão. Em AMRR, a peregrinação a Fátima, presenciada por Ricardo Reis, é apresentada como exemplo da paralisada e mutilada mentalidade nacional que o Estado Novo institucionalizara. Através da boca de Pessoa, o autor rejeita tanto a ânsia passiva de redenção como a ordenação teleo­lógica da História: "perturbar a ordem, corrigir o destino, [ ... ], Para melhor ou para

pior, tanto faz, o que é preciso é impedir que o destino seja destino" (AMRR: 334).

21) Saramago (1987: 49), tradução do alemão minha.

22) No que diz respeito à sobreposição de estética e observação historiográfica, estas ideias alinham com as teses de historiógrafos e críticos contemporâneos como Hayden White e Northrop Frye.

125

está projectado (o que a História conta e o que a História não conta)".23 Esta "arrumação caótica"24, ou "transversal" (c! Welsch 1996) da His­tória'permite-Ihe, depois, "a reinvenção do passado", isto é, a "reavalia­

ção dos factos progressos, como condição, inclusive, de futuro" (Sara­

mago, 1989: 45). A utopia de uma "Europa ética" e a pretensão de perturbar o leitor

para "reclamar a presença" histórica (Saramago in Reis, 1998a: 85) daqueles que não foram registados pela historiografia, oriunda, porven­tura, da discussão sobre o "Novo Humanismo" neofealista que chegou a definir a literatura como um "meio de consciencialização do homem humano" (Alberto, 1940), ainda que na reformulação do imaginário português o neo-realismo tenha sido pouco revolucionário (c! Lou­renço, 1978: 31 e Saraiva, 1963; 1973) e demasiado androcêntrico. O trans-iberismo de Saramago alberga, portanto, tanto um humanismo

moderno - ou até pós-moderno, dado· que as vozes narrativas dos ro­mances sempre oferecem um perspectivismo crítico e relativista.

Também contém uma refutação do fim da História2S, uma vez que seria disparatado aplicar a estética do posthistoire à realidade histórica global. Quer dizer: segundo o discurso cultural desenvolvido em JdP, a integração na UE não significaria o fim da história do imaginário nacio­nal, nem o posthistoire cultural ibérico. O ideário é mais filosófico, pois é justamente a consciência dolorosa do presente, do presente "inexis­tente" segundo Saramago, que leva a interrogar o passado e que, atra­

vés de uma "rarefacção" e reavaliação do referencial histórico, viabiliza

a imaginação como suporte da História, oferecendo novas vias imagéti­cas de futuro (c! 1990: 19).26

A revisão crítica do mito de Camões em AMRR - centro histórico imaginário que simboliza, para Saramago, a paralisação imagética na­cional - é exemplar para o dito processo de consciencialização. Neste

23) Saramago in Reis (l998a: 80), fazendo referência a Jacques Le Gofr.

24) Ibidem.

25) Cf Saramago in Reis (l998a: 45) e Grossegesse (1999: 79 ss).

26) Porém, o Iberismo e, em maior medida ainda o trans-iberismo, representam, por enquanto, um discurso irrealista, tanto em Portugal como em Espanha, por mor da estreiteza dos conceitos gerais da Europa e da cultura vigentes.

126

romance, a consciência histórica reflexiva do autor identifica Camões,

com cuja estátua Ricardo Reis se vê confrontado quotidianamente, com

uma novela que Reis subtraiu da biblioteca do navio que o levou a

Lisboa. O título e o nome do autor, The God of the Labyrinth de Herbert

Quain, provêm do conto "Examen de la obra de Herbert Quain" das

Ficciones de Jorge Luis Borges. Camões é no meandro de Lisboa, co­

mo também o é na maranha da literatura portuguesa, o deus deste labi­

rinto, o objecto de um culto instrumentalizado pelo Estado Novo, da

mesma maneira que Fernando Pessoa vem sendo institucionalizado pela

Segunda República. Para desmitificá-los, o narrador ironiza-os, falando de Camões como

de uma "espécie de D' Artagnan, premiado com uma coroa de louros por

ter subtraído, no último momento, os diamantes da rainha às maquina­

ções do cardeal" (AMRR: 70).27 Saramago entrevê nestas estilizações de

autores consagrados ainda outro perigo para a forma mentis portuguesa,

uma postura da qual se deriva a sua renovada leitura d' Os Lusíadas: estes seriam "o recado de um grande desígnio nacional que nos parali­

sou naquele tempo e que, pior ainda, nos manteve paralisados" (Sara­

mago, 1986a: 36). O texto épico, na sua função de fundador de um

imaginário nacional, revaloriza-se, portanto, como espelho esperpêntico

de uma época cheia de falsos valores. Saramago apelida-o de "imensa

galeria de poses" (ibid.) e responsabiliza a sua mitificação pela fixação

melancólica do imaginário nacional na grandeza perdida do passado.

A crítica da paralisação e mutilação do imaginário colectivo através

deste mito pode ser considerada um topos na obra de Saramago, do que

também dão prova as numerosas entrevistas. Em contraposição ao mito

rácico da "progénie forte e bela", descendente da deusa marina Thétis, ,.

27) A alusão visa aquela coincidência, sobradamente explorada, de Camões ter salvo com muito custo o seu manuscrito de um naufrágio, como também a de o ter consegui­do publicar exactamente antes da queda do império em Alcácer Quibir. Cf: "Seria bom que soubesse que dele se servem, à vez ou em confusão, os principais cardeais incluí­dos, assim lhes aproveite a conveniência" (AMRR: 70). Cardoso Pires comentou estas estilizações de autores consagrados em ocasião do cinquentenário da morte de Pessoa: "quando oficialmente descobrem um herói utilizam-no para castrar o futuro" (in Sara­mago] 985b: ] 54, tradução do castelhano minha).

127

predestinada a servir de exemplo ao mundo (Lusíadas, IX, 42), a re­

escrita saramaguiana situa os portugueses como "descendentes do rei

D. João Veda sua amante, a freira Paula de Odivelas, frutos de amores

de sacristia, procriados pelo poder absoluto e a corrupção da igreja"

(Saramago, 1985a). Os elementos submissos e fatalistas, para não dizer cristãos, do ima­

ginário português, se continuássemos a insistir nesta linha, teriam favo­recido a mitificação labiríntica das 'vacas sagradas' do respectivo dis­

curso político ou cultural no poder: Camões, D. Sebastião, a Saudade, o

Quinto Império, o Império do Espírito Santo, Pessoa28, Europa e, recen­

temente, a Lusofonia. Em AMRR, a incarnação de Ricardo Reis surge como a alegoria da

passividade da burguesia portuguesa, e lisboeta em concreto, ante a

deformação fascista da sociedade pelo Estado Novo. Saramago identi­

fica esta "capacidade de esperar" com um "desejo de pospor" (Sarama­

go, 1985a: 8), uma indecisão e incoerência, também imanente em Reis,

que incapacita a forma mentis para qualquer esperança, condicional de

actuações assertórias.29 Desta arqueologia crítica da mentalidade portu­guesa, depreende-se que a paralisação e mutilação mental, derivada das instrumentalizações diferentes que se fizeram d' Os Lusíadas, levara o

imaginário nacional a uma incapacidade de autognose e renovação, da qual o Ricardo Reis do romance seria o símbolo supremo.

Enquanto Camões tinha pessoalizado Portugal (c! Lourenço, 1978:

81) e Pessoa o tinha enigmado, Lourenço psicanalisou a Nação pessoa­

lizada que Saramago agora despessoaliza e desconstrói, reduzindo-a a

uma linguagem cultural e dissolvendo-a no trans-iberismo. José Sara-

28) AMRR publicou-se no ano anterior ao cinquentenário da morte do poeta (1984) e no ano da mudança da sepultura do Cemitério dos Prazeres ao Mosteiro dos Jerónimos, símbolo por excelência do mito messiânico-colonial dos Descobrimentos, vis-à-vis do Monumento dos Descobrimentos, erigido em tempos de Salazar. Saramago definiu o acto como uma "grandilocuencia" e como "la típica ídea de político. En vez de entender lo que Pessoa es para los portugueses de hoy, se cae en el culto necrófilo de las aparien­cias. No el culto a los muertos, [ ... ], sino el comerse ai muerto" (Saramago, 1985b: 156).

29) Cf "A esperança é uma atitude activa, mas nos portugueses é uma fonna cómoda de projectar para um futuro cada vez mais longínquo o que deveríamos fazer agora, de pospor até ficarmos sem saber se desejamos ou não o entretanto acontecido" (ibid.).

128

mago continua, no entanto, a "gesta de consciência universal" (Lou­

renço: 107) que Pessoa empreendera, e é, talvez, por isso que ele ironi~

cam ente reproduz na JdP o célebre dito de Unamuno que Portugal

representa a"proa da Europa".30

A 'nova Mensagem', ou seja, a grande metanarração da sua confabu­

lação de ética e estética do imaginário nacional é a utopia de um huma­

nismo universalista e, simultaneamente, uma advertência contra a para­

lisação do imaginário europeu que deveria multiplicar a importância

conferida às representações alheias do próprio ser.·

Este novo humanismo universalista também envolve uma moderni­

zação ou, melhor dito, uma pós-modernização da memória cultural por­

tuguesa. Através da estética da dúvida e da relatividade que Saramago

cultiva com o perspectivismo crítico das suas vozes narrativas, ele

aproxima-se de um juízo que a filosofia pós-moderna designa como

"transversal" (cf Welsch, 1996). Esta "razão transversal" consiste na

sua capacidade de pensar os paradoxos (cf Derrida, 1967), enlaçando o

heterogéneo e encarando a realidade como pluralidade e transição

(Welsch, 1996: 762), sem que se perca o impulso ético (c! Baltrusch,

200Ia).

Não é só com estas inovações semânticas e operativas do imaginário

nacional que o próprio Saramago nos sugere, ainda que involuntaria­

mente, a ideia de que, antes, poderia ser ele um Super-Camões, bem

diferente daquele com quem Pessoa sonhara, sem que se tivesse ousado

identificar abertamente com a ideia - ao contrário do que tinha afirma­

do no seu discurso nobelístico (Saramago, 1998: 5): um Super-Camões

trans-iberista e decididamente pós-colonial.3l

30) JdP: 93. Aqui caberia, naturalmente, uma interrogação crítica da lógica universa­lista e essencialista contida no discurso saramaguiano desde uma perspectiva feminista (cf. Baltrusch, 2001 b).

31) De qualquer modo, a sua consagração nobilística tem sido um golpe de efeito feliz, voluntaria ou involuntariamente, porque o primeiro prémio Nobel a um escritor portu­guês não distinguiu a tópica veia poética da literatura portuguesa, como era de esperar, mas, curiosamente, o romance e com ele a continuação do histórico elemento oral e po­pular.

129

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Conclusão

Em resumo, ficamos com duas características centrais e inovadoras,

desde um ponto de vista discursivo, na obra saramaguiana. Por um

lado, entrevê-se um esboço, cada vez mais concretizado e teorizado, de •

uma teoria literária e / ou historiográfica que parte de um perspectivis­

mo atemporal, exemplificado através da continuada crítica dos discur­

sos e dos níveis narrativos institucionalizados. Por outro, oferece-se-nos

uma crítica imagológica da memória cultural e colectiva (portuguesa e

europeia), à qual se contrapõe uma utopia cultural e de identidade, mo­

tivada por um ideário próximo das teorias pós-coloniais.32

A' crítica das meta-narrativas históricas, dos níveis narrativos tradi­

cionais e das imagologias culturais repete-se na obra através de certas

características topológicas. O seu emprego é intencional e obedece a

um propósito ilustrado e claramente político. Desde a perspectiva artís­

tica sobressaem, sobretudo, o interrelacionamento de ética e estética e a

inclinação para uma renovada ideia da obra de arte total (no sentido de

um entretecimento de vida e arte). Este ideário manifesta-se nas seguin­

tes características topológicas antes mencionadas:

o enleio da ficção / narrativa através doutras ficções / narrativas que

lhe são sobrepostas ou subordinadas;

a tentativa de estabelecer um estilo de representação universalista,

através do qual transluz um sonho de totalidade (pós-)moderno da

narrativa literária;

a sobreposição, intencionalmente subversiva, do autor ao narrador;

uma redefinição humanitária da crítica pós-moderna dos discursos,

entretecida com uma reorientação do ideal romântico da obra de arte total;

o emprego de certas técnicas do teatro épico;

a modernização do ideal neo-realista de um "Novo Humanismo";

a interacção entre ironia e indeterminação para deixar margens de in­terpretação;

32) Pode-se acrescer um terceiro elemento inovador (dentro do discurso androcêntrico

reinante na literatura) que é a recriação pós-moderna de um mito feminino e matriarcal (cf Baltrusch, 200 I b).

130

uma auto-interpretação que envolve a crítica literária académica; a contínua re-avaliação e 'correcção' da história e da historiografia, que se aproxima da dialéctica da filosofia das luzes de Adorno e

Horkheimer (1944; 1986); a tentativa de dissolução dos discursos de poder 1) da identidade apoiada no conceito da nação-estado, 2) da perspectiva neo-colonia­lista em geral e 3) da perspectiva eurocêntrica em especial; a utopia de uma identidade pós-colonial a partir da "bacia cultural atlântica'" , a reclamação de permutação cultural, de identidades híbridas e supra­naCIOnaiS; a tentativa metanarrativa de uma re-ocupação positiva do conceito ideologia através das exigências trans-individuais e trans-culturais antes mencionadas.

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