sem título 2

6
Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO QUINTA TURMA RECURSAL Padre Casimiro Quiroga, SN, Imbuí, Salvador - BA Fone: 71 3372-7460 PROCESSO Nº 0078207-73.2015.8.05.0001 CLASSE: RECURSO INOMINADO RECORRENTE: QUALICORP ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS S.A e SULAMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE RECORRIDO: MATHILDE DOS SANTOS ALVES ORIGEM: JEC – IMBUI VESPERTINO (FABIANA A. DE ALMEIDA OLIVEIRA PELLEGRINO) RELATORA: CRISTIANE MENEZES SANTOS BARRETO EMENTA RECURSOS INOMINADOS INTERPOSTOS PELAS EMPRESAS DEMANDADAS. PLANO DE SAÚDE COLETIVO. REAJUSTE DE MENSALIDADE. CRITÉRIO DE SINISTRALIDADE. IMPOSIÇÃO UNILATERAL. RECONHECIMENTO DA ABUSIVIDADE DO ÍNDICE APLICADO, POR MALFERIR NORMAS E PRINCÍPIOS CONSAGRADOS DO CDC. MANUTENÇÃO INTEGRAL DO JULGADO. NÃO PROVIMENTOS DOS RECURSOS. Dispensado o relatório nos termos do artigo 46 da Lei n.º 9.099/9. Circunscrevendo a lide e a discussão recursal para efeito de registro, saliento que as Recorrentes SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE e QUALICORP ADMINISTRADORA DE BENEFICÍOS S/A pretendem a reforma da sentença lançada nos autos que afastou o reajuste das mensalidades do plano de saúde contratado pela Recorrida MATHILDE DOS SANTOS ALVES, aplicado a partir de janeiro/2012, por critério de sinistralidade, considerando abusivo o valor aplicado, com ordem de incidência dos percentuais indicados pela ANS para os planos individuais, além da devolução simples do valores eventualmente pagos a maior pela Autora. Presentes as condições de admissibilidade de ambos os recursos, conheço-os, apresentando voto com a fundamentação aqui expressa, o qual submeto aos demais membros desta Egrégia Turma.

Upload: marcus-serra-jr

Post on 13-Jul-2016

216 views

Category:

Documents


3 download

DESCRIPTION

1

TRANSCRIPT

Page 1: Sem Título 2

Tribunal de Justiça do Estado da BahiaPODER JUDICIÁRIO

QUINTA TURMA RECURSAL

Padre Casimiro Quiroga, SN, Imbuí, Salvador - BA Fone: 71 3372-7460

PROCESSO Nº 0078207-73.2015.8.05.0001

CLASSE: RECURSO INOMINADO

RECORRENTE: QUALICORP ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS S.A eSULAMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE

RECORRIDO: MATHILDE DOS SANTOS ALVES

ORIGEM: JEC – IMBUI VESPERTINO (FABIANA A. DE ALMEIDA OLIVEIRAPELLEGRINO)

RELATORA: CRISTIANE MENEZES SANTOS BARRETO

EMENTA

RECURSOS INOMINADOS INTERPOSTOS PELAS EMPRESASDEMANDADAS. PLANO DE SAÚDE COLETIVO. REAJUSTE DEMENSALIDADE. CRITÉRIO DE SINISTRALIDADE. IMPOSIÇÃOUNILATERAL. RECONHECIMENTO DA ABUSIVIDADE DOÍNDICE APLICADO, POR MALFERIR NORMAS E PRINCÍPIOSCONSAGRADOS DO CDC. MANUTENÇÃO INTEGRAL DOJULGADO. NÃO PROVIMENTOS DOS RECURSOS.

Dispensado o relatório nos termos do artigo 46 da Lei n.º 9.099/9.

Circunscrevendo a lide e a discussão recursal para efeito de registro, salientoque as Recorrentes SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE eQUALICORP ADMINISTRADORA DE BENEFICÍOS S/A pretendem a reforma dasentença lançada nos autos que afastou o reajuste das mensalidades do plano desaúde contratado pela Recorrida MATHILDE DOS SANTOS ALVES, aplicado a partirde janeiro/2012, por critério de sinistralidade, considerando abusivo o valor aplicado,com ordem de incidência dos percentuais indicados pela ANS para os planosindividuais, além da devolução simples do valores eventualmente pagos a maior pelaAutora.

Presentes as condições de admissibilidade de ambos os recursos, conheço-os,apresentando voto com a fundamentação aqui expressa, o qual submeto aos demaismembros desta Egrégia Turma.

Page 2: Sem Título 2

VOTO

A sentença recorrida, tendo analisado corretamente todos os aspectos dolitígio, merece confirmação integral, não carecendo, assim, de qualquer reparo oucomplemento dentro dos limites traçados pelas razões recursais, culminando ojulgamento do recurso com a aplicação da regra inserta na parte final do art. 46 da Leinº 9.099/95, que exclui a necessidade de emissão de novo conteúdo decisório para asolução da lide, ante a integração dos próprios e jurídicos fundamentos da sentençaguerreada.

A título de ilustração apenas, fomentada pelo amor ao debate e para realçaro feliz desfecho encontrado para a contenda no primeiro grau, alongo-me nafundamentação do julgamento, nos seguintes termos:

Os direitos fundamentais à vida e à saúde gozam de proteção constitucional,cujo texto magno reserva especial abrigo à dignidade da pessoa humana, condutorinterpretativo de toda e qualquer legislação vigente em nosso País.

Por outro lado, embora regidos por lei específica (Lei nº 9.656/98) e sigamorientações da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e do Conselho de SaúdeSuplementar (CONSU), os contratos privados de assistência à saúde, individuais oucoletivos, não estão imunes aos princípios e normas contidos do CDC, porqueintegram a categoria dos contratos de consumo.

Como bem leciona Cláudia Lima Marques, “(...) não é a figura dos operadoresou fornecedores que une os campos de aplicação do CDC e da lei especial, o que asune é a figura do consumidor-usuário ou beneficiário de um plano privado deassistência à saúde, remunerado por ele diretamente, por seu empregador ou pelocontratante principal dos planos coletivos e/ou familiares ou individuais. Como não hácontrato de plano de assistência privada à saúde não remunerado (Art. 3º, § 2º, doCDC), todos são remunerados por algum agente do mercado, os beneficiários,destinatários finais, os contratantes e as pessoas jurídicas, que se expõem ouintervém nestas relações de consumo como representantes ou em benefício de seusempregados, associados ou sindicalizados, acabam todos por ser consideradosconsumidores, segundo o CDC.” (in Contratos no Código de Defesa do Consumidor -Ed. Revista dos Tribunais - 4ª edição, p. 409/410).

Como norma de ordem pública constitucional (arts. 5º, XXXII, e 170, V, daCF), o Código de Defesa do Consumidor foi promulgado com o objetivo precípuo degarantir o equilíbrio de direitos e deveres entre o consumidor e o fornecedor nasrelações de consumo, pautado nos princípios da boa fé e lealdade.

Também o Código Civil consagra os princípios da probidade e boa fé não sóna conclusão, como também, na execução do contrato (art. 422), impondo balizas àliberdade de contratar, a qual será “exercida em razão e nos limites da função social

Page 3: Sem Título 2

do contrato” (art. 421), expressando, ainda, que “nenhuma convenção prevalecerá secontrariar preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código paraassegurar a função social da propriedade e dos contratos” (art. 2.035, § único, dasdisposições finais e transitórias).

Outrossim, não se deve esquecer que o art. 6º, da Lei nº 9.099/95, autorizaao juiz adotar “em cada caso a decisão que reputar mais justa e equânime, atendendoaos fins sociais da lei e às exigências do bem comum”.

Assim, por força dos princípios e normas legais aqui lembradas, ao juiz épermitido restabelecer o equilíbrio entre a operadora do plano e os beneficiáriosquando houver onerosidade excessiva decorrente ou não de fatos supervenientes e,não necessariamente imprevisíveis, podendo, assim, promover a exclusão dascláusulas e condições que estabeleçam prestações desproporcionais (art. 6º, V, doCDC), bem como a revisão das que forem excessivamente onerosas ao consumidor,reconhecendo a abusividade ou o desacordo com o sistema de proteção ao consumidor(art. 51, IV e XV, do CDC), privilegiando a interpretação que lhe seja mais favorável(art. 47, CDC).

A ideia de aumento de mensalidade de planos de saúde, seja coletivo ouindividual, por cálculo de sinistralidade, ou seja, em função do suposto volume deutilização do seguro pelos beneficiários em período anterior, estabelecidounilateralmente, em contrato de adesão, sem prévio esclarecimento e participação dosconsumidores, seja atuando pessoalmente ou mediante representação, é de todaabusiva, por conferir vantagem excessiva em favor da operadora do plano, colocando,por outro lado, os consumidores em posição de desvantagem acentuada, além de semostrar incompatível com a boa-fé, encontrando vedação no art. 51, X, do CDC,impondo-se sua desconsideração nos termos do inciso V de seu art. 6º.

O repúdio ao reajuste de mensalidade de plano de saúde com base emcritério unilateral se encontra pacificado na jurisprudência:

- RECURSO INOMINADO - CONSUMIDOR - PLANO DE SAÚDECOLETIVO - Reajustes anuais por aumento de sinistralidaderelativos aos anos de 2003, 2004 e 2005. Preliminar de prescriçãosuscitada de ofício. Matéria de ordem pública. Prescrito o direito dequestionar o aumento ocorrido no ano de 2003 e 2004. Inteligênciado art. 206, II, b), do código civil. Reajustes unilateralmentedefinidos pela seguradora, sem que seja possibilitado aoconsumidor o conhecimento prévio dos critérios de reajuste aolongo da execução do contrato. A cláusula de reajuste baseada noaumento da sinistralidade elimina a aleatoriedade própria docontrato de seguro, gerando vantagem exagerada para aseguradora e onerosidade excessiva ao consumidor. Abusividade da

Page 4: Sem Título 2

cláusula contratual autorizadora ante o que estatui o arts. 51, IV eX, e parágrafo 3º, do cdc. Reajuste limitado ao percentualanualmente fixado pela ANS para os contratos individuais, à falta deoutro parâmetro específico. Sentença parcialmente reformada.Recurso conhecido parcialmente provido. (TJBA - RIn 49276-0/2005-1 - 1ª T. - Relª Maria Lucia Coelho Matos - DJe 31.08.2009 -p. 457)

- AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - SEGURO SAÚDE - PLANOCOLETIVO - Reajuste financeiro do prêmio e reajuste em razão desinistralidade. Imposição unilateral dos índices. Falta deaclaramento da gênese dos índices. Afronta ao disposto nos artigos6º, inciso II, e 51, inciso X, da Lei nº 8.078/90. Razoabilidade, àfalta de demonstração da origem do índice relacionado ao reajustefinanceiro do prêmio, da adoção do índice utilizado nos contratosindividuais (11,75%). Verba honorária. Natureza declaratória dasentença. Necessidade de arbitramento em consonância com odisposto no artigo 20, parágrafo 4º, do CPC. Verba arbitrada em15% sobre o valor atualizado da causa. Sentença reformada nestaparte. APELO dos AUTORES PARCIALMENTE PROVIDO, comDESPROVIMENTO do RECURSO INTENTADO PELA RÉ SUL AMÉRICA.(TJSP - Ap-Rev 559.706.4/9 - (0002385214) - São Paulo - 3ªCDPriv. - Rel. Donegá Morandini - DJe 13.07.2009 - p. 735)

- PLANO DE SAÚDE - Mensalidade - Critério de reajustamento anual- Expressão indecifrável que o sujeita ao arbítrio do segurador -Condição potestativa - Nulidade pronunciada - Restituição devida -Ação civil pública julgada procedente - Provimento parcial aorecurso - Aplicação do artigo 115, 2ª alínea e 964, 1ª alínea doCódigo Civil. É nula cláusula que, em contrato de plano de saúde,estabelece critério indecifrável de reajuste das mensalidades,subordinando-o ao arbítrio do segurador' (Apelação Cível nº67.750-4 - São Paulo - 2ª Câmara de Direito Privado - Relator:Cezar Peluso - 02.03.99 - V.U.).

Destaque-se que apesar de a Recorrente Sul América alegar que o reajusteimpugnado refere-se ao aniversario do contrato, percebe-se, claramente, que osaludidos aumentos decorreram do “elevado perfil de utilização deste grupo debeneficiários”, ou seja, da sinistralidade e variação de custos médicos e hospitalares,sem, contudo, indicar critérios objetivos que levaram ao percentual fixado,contrariando, em última análise, o dever de informação consagrado no CDC.

Com isso, mostra-se incensurável o comando sentencial que, com osirrefutáveis argumentos apresentados pela MM. Juíza a quo, aqui incorporados, obstou

Page 5: Sem Título 2

o aumento pretendido pelas Recorrentes, ordenando, ainda, a devolução, simples, dosvalores eventualmente pagos a maior pela consumidora.

Assim sendo, ante ao exposto, voto no sentido de CONHECER e NEGARPROVIMENTOS aos recursos interpostos pelas Recorrentes SUL AMÉRICACOMPANHIA DE SEGURO SAÚDE e QUALICORP ADMINISTRADORA DEBENEFICIOS S/A, confirmando, consequentemente, todos os termos da sentençahostilizada, com a condenação de ambas ao pagamento das custas processuais ehonorários advocatícios, que arbitro em 10% (dez por cento) do valor da causa,observando, especialmente, a natureza e a expressiva importância econômicaatribuída a ação, bem como o trabalho do profissional que defendeu os interesses daparte recorrida.

Salvador, Sala das Sessões, 29 de setembro de 2015.

CRISTIANE MENEZES SANTOS BARRETO

Juíza Relatora

COJE – COORDENAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS

TURMAS RECURSAIS CÍVEIS E CRIMINAIS

QUINTA TURMA - CÍVEL E CRIMINAL

PROCESSO Nº 0078207-73.2015.8.05.0001

CLASSE: RECURSO INOMINADO

RECORRENTE: QUALICORP ADMINISTRADORA DE BENEFICIOS S.A ESULAMERICA COMPANHIA DE SEGURO SAUDE

RECORRIDO: MATHILDE DOS SANTOS ALVES

ORIGEM: JEC – IMBUI VESPERTINO (FABIANA A. DE ALMEIDA OLIVEIRAPELLEGRINO)

RELATORA: CRISTIANE MENEZES SANTOS BARRETO

EMENTA

RECURSOS INOMINADOS INTERPOSTOS PELAS EMPRESAS

Page 6: Sem Título 2

DEMANDADAS. PLANO DE SAÚDE COLETIVO. REAJUSTE DEMENSALIDADE. CRITÉRIO DE SINISTRALIDADE. IMPOSIÇÃOUNILATERAL. RECONHECIMENTO DA ABUSIVIDADE DOÍNDICE APLICADO, POR MALFERIR NORMAS E PRINCÍPIOSCONSAGRADOS DO CDC. MANUTENÇÃO INTEGRAL DOJULGADO. NÃO PROVIMENTOS DOS RECURSOS.

ACÓRDÃO

Realizado julgamento dos recursos do processo acima epigrafado, a QUINTATURMA, composta dos Juízes de Direito, ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA,MARIA VIRGÍNIA ANDRADE DE FREITAS CRUZ e CRISTIANE MENEZESSANTOS BARRETO, decidiu, à unanimidade de votos, CONHECER e NEGARPROVIMENTOS aos recursos interpostos pelas Recorrentes SUL AMÉRICACOMPANHIA DE SEGURO SAÚDE e QUALICORP ADMINISTRADORA DEBENEFICIOS S/A, confirmando, consequentemente, todos os termos da sentençahostilizada, com a condenação de ambas ao pagamento das custas processuais ehonorários advocatícios, que arbitro em 10% (dez por cento) do valor da causa,observando, especialmente, a natureza e a expressiva importância econômicaatribuída a ação, bem como o trabalho do profissional que defendeu os interesses daparte recorrida.

Salvador, Sala das Sessões, 29 de setembro de 2015

ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA

JUIZ PRESIDENTE

CRISTIANE MENEZES SANTOS BARRETO

JUÍZA RELATORA

Assinado eletronicamente por: CRISTIANE MENEZES SANTOS BARRETOCódigo de validação do documento: 4f832436 a ser validado no sítio do PROJUDI - TJBA.